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Pró-Reitoria de Graduação
Escola de Direito e Relações Internacionais
Direito Econômico
Prof. Leonardo Buissa Freitas1
2. Conceito.
1
Doutor em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Faculdade de Direito da USP. Avaliador-
Doutor da Revista Direito Tributário Atual. Associado ao IBDT – Instituto Brasileiro de Direito Tributário.
Professor do Programa de Mestrado em Direito da UFG e Professor convidado na PUCGO e na ESMEG.
Juiz Federal.
2
CARVALHOSA, Modesto. Direito Econômico. São Paulo, RT: 1973, p. 361.
3
FONSECA, João Bosco Leopoldino da. Direito Econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 10.
1
ilizamos as expressões intervenção e atuação estatal na economia. Isto
porque alguns autores apontam que o uso intervenção carregaria um certo
preconceito liberal, sinalizando que a seara econômica é atividade somente da
iniciativa privada e só excepcionalmente do Estado.
Assim, há autores que a criticam, indicando um preconceito para com o
liberalismo, que o toma como exceção. Não atuar economicamente seria a regra,
enquanto intervir seria ir contra a regra.4
Diego Bomfim, analisando o vocábulo intervenção, arrimado na sua
utilização no artigo 4º, IV, da Constituição, em que figura o princípio da não
intervenção nas relações internacionais, crê que o seu emprego, na ordem
econômica, sinaliza a existência de uma ingerência não trivial. 5 Contudo, critica
a ideia de preconceito ideológico, aduzindo que “se há carga ideológica no uso
do vocábulo intervenção, haverá também em não utilizá-lo, já que a normalidade
e a essência da atuação do Estado seria efetivamente agir positivamente sobre o
domínio econômico (ou seja, o trivial seria intervenção, razão pela qual ela – a
intervenção – não poderia ser assim nomeada).”6
Eros Grau, por seu turno, acredita que a palavra intervenção e a expressão
atuação estatal são absolutamente intercambiáveis, uma vez que toda atuação
estatal expressa um ato de intervenção.7 Termina por apresentar a seguinte
conclusão: “Intervenção indica, em sentido forte (isto é, na sua conotação mais
vigorosa), no caso, atuação estatal em área de titularidade do setor privado;
atuação estatal, simplesmente, ação do Estado tanto na área da titularidade
própria quanto em área de titularidade do setor privado.”8
Ainda que se possa vislumbrar que a intervenção do poder público se dá
sobre o campo da economia, onde em regra deve imperar a liberdade dos agentes
econômicos9, acolhe-se a posição de que as expressões são intercambiáveis, pelo
4
SOUZA, Washington Peluso Albino de. Primeiras linhas de Direito Econômico. 4. ed. São Paulo:
LTr, 1999. p. 319.
5
BOMFIM, Diego. Tributação e livre concorrência. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 94.
6
BOMFIM, Diego. Tributação e livre concorrência. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 95.
7
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 15. ed. São Paulo: Malheiros,
2012. p. 90.
8
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 15. ed. São Paulo: Malheiros,
2012. p. 91.
9
MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Limites à abrangência e à intensidade da regulação estatal.
Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico (REDAE), Salvador: Instituto Brasileiro de
Direito Público, n. 4, nov.-dez. 2005 e jan. 2006. Disponível em:
http://www.direitodoestado.com.br/redae.asp. Acesso em: 13 jan. 2015.
2
que se pode utlizar, indiscriminadamente, intervenção e atuação estatal na
economia.
Sobre tal atuação/intervenção analisaremos adiante.
Domínio econômico.
Preliminarmente nesta aula inaugural da disciplina JUR 3490 (Direito
Econômico), cumpre estipular que o domínio econômico a sofrer a intervenção
estatal se restringe à atividade econômica em sentido estrito, podendo, portanto, ser
definido como “o conjunto de atos (mundo do ser) concatenados com o intuito da
obtenção de lucros, empreendido sob regime de direito privado, relativos à produção,
distribuição ou comercialização de produtos ou serviços.”10
Em sentido semelhante, pontua André Elali ser o domínio econômico o
conjunto de atividades econômicas próprias da produção e distribuição de bens no
mercado.11 Por isso, sentencia Diego Bonfim ser o domínio econômico o locus
fundamental da iniciativa privada.12
Vê-se que o domínio econômico que sofre a intervenção estatal assume uma
conotação restritiva de atividade econômica, jungindo-se ao campo de atuação da
iniciativa privada. Neste, o Estado pode atuar por intermédio de regulação, de forma
indireta, ou pela atuação direta, assumindo o papel de empresário, com será visto no
tópico posterior deste resumo, assim com no Ponto n. 3 do Programa apresentado
nesta optativa da PUCGO.
3. Objeto.
Importa observar que a ciência se delimita pelo seu objeto. O objeto pode ser
material ou formal. O primeiro diz respeito à matéria, ao fato, sobre o qual o
investigador se debruça (Exemplo: contrato). Já o objeto formal está ligado a como
se observa, como se vê tal realidade fenomênica. Daí é que surgem os diversos
ramos da ciência a investigar dado elemento fático. O referido contrato então pode
ser apreciado sob a ótica da relação de emprego, sob os princípios de proteção ao
consumidor, sob a análise da ocorrência de fato típico e ilícito e daí por diante.
10
BOMFIM, Diego. Tributação e livre concorrência. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 96.
11
ELALI, André. Tributação e regulação econômica. São Paulo: APET/MP Editora, 2007. p. 47.
12
BOMFIM, Diego. Tributação e livre concorrência. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 97.
3
Com isso, pode-se afirmar que o Direito Econômico é uma disciplina jurídica
que estuda as relações econômicas, especialmente a atuação estatal no e sobre o
domínio econômico, ou seja, a ação do Estado de forma direta ou indireta, por
direção ou por indução.
Formas de intervenção estatal na economia.
Nas duas primeiras aulas de nossa optativa de Direito Econômico ( 09 e
16/08/2017), foi comentado, preliminarmente, que o Estado atua no setor econômico
basicamente por duas formas ou modalidades: direta ou indireta. No primeiro caso,
assume a forma de empresas, enquanto no segundo fiscaliza, incentiva e planeja a
economia.13
Eros Grau chama a forma direta de atuação na economia de intervenção no
domínio econômico, em contraste com a forma indireta, que seria a intervenção
sobre o domínio econômico.14 Na forma direta, o Estado assume o papel de agente
econômico no mesmo nível do agente econômico privado. 15 Atua, então, como
“empresário, comprometendo-se com a atividade produtiva quer sob forma de
empresa pública quer sob o de sociedade de economia mista. Sob estas duas formas,
pode atuar em regime concorrencial, equiparando-se a empresas privadas ou em
regime monopolístico.”16 A primeira, como comentado em sala de aula, se denomina
intervenção direta por participação, enquanto a segunda seria por absorção.
Por outro lado, a intervenção indireta, denominada por Eros Grau como
intervenção sobre o domínio econômico, se realiza quando o Estado atua como
agente regulador da atividade econômica em sentido estrito. 17 Tal função reguladora
pode se dar, na esteira da classificação do mencionado autor, por direção ou por
indução.
No caso da intervenção por direção há a presença de comandos imperativos,
dotados de cogência, impositivos de certos comportamentos a serem necessariamente
cumpridos pelos agentes que atuam no campo da atividade econômica em sentido
13
FONSECA, João Bosco Leopoldino da. Direito Econômico. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p.
207.
14
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 15. ed. São Paulo: Malheiros,
2012. p. 143.
15
SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro:
Forense, 2005. p. 41.
16
FONSECA, João Bosco Leopoldino da. Direito Econômico. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p.
207.
17
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 15. ed. São Paulo: Malheiros,
2012. p. 143.
4
estrito. Exemplo clássico é o do controle de preços, com tabelamentos e
congelamentos.18
Neste caso a estrutura da norma é um imperativo cogente complementado por
uma sanção, caso tal imperativo não seja cumprido. Não pode poluir mais do que um
patamar, emitir sons acima de tantos decibéis, não pode dirigir acima de uma
velocidade, sob pena de MULTA.
Já na intervenção por indução as normas não são cogentes, mas sim
dispositivas, atuando o Estado de acordo com as leis que regem os mercados. Assim
em vez de, por exemplo, proibir uma conduta, tornando-a ilícita, o legislador pode
induzir o agente econômico a não realizá-la, sem que se considere a sua realização
um ilícito, ensejador da correspondente sanção. Há, desse modo, a alternativa de se
realizar ou não a conduta indesejada.
De igual forma, se a indução manifestar-se em termos positivos, a sanção é
então substituída pelo convite; estímulos e incentivos são oferecidos, cabendo ao
destinatário da norma a alternativa de deixar-se seduzir ou não pela “oferta”.
Sinaliza, pois, Eros Grau que se penetra aí no universo do Direito premial. 19 Com o
crescimento da intervenção estatal na economia, a sanção-castigo é paulatinamente
substituída pela sanção-premial20.
Observa-se, portanto, que as normas indutoras, diferentemente das normas de
direção, não impõem um único comportamento. Assim, a distinção entre normas de
direção e de indução, do ponto de vista jurídico, se assenta a partir do grau de
liberdade do administrado.21
Os agentes econômicos têm a liberdade de aderir ou não ao comportamento
estimulado pela Administração, sendo a não adesão não considerada como um ilícito,
porque o agente tem “como escolher praticar ou não o comportamento, a partir de
uma ponderação de interesses e valores.”22Aderindo ao comportamento desejado pela
administração, o agente econômico recebe um prêmio. Exemplos: quem economizar
energia ganha um bônus; quem efetuar o controle de dejetos, recebe um selo de
18
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 15. ed. São Paulo: Malheiros,
2012. p. 144.
19
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 15. ed. São Paulo: Malheiros,
2012. p. 145.
20
ELALI, André. Tributação e regulação econômica. São Paulo: APET/MP Editora, 2007. p. 114-115.
21
SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro:
Forense, 2005. p. 46.
22
ELALI, André. Tributação e regulação econômica. São Paulo: APET/MP Editora, 2007. p. 105.
5
qualidade; quem investir em determinado setor, em determinada região, recebe
incentivos fiscais.
4. Autonomia.
Como se sabe, o direito é uno. Todavia, existem diversos ramos, com objetos
específicos. Tais ramos são tidos por autônomos, porém não são independentes, haja
vista que há uma correlação entre os mesmos, mesmo porque um mesmo fato pode
ser visto por diversos prismas(ex: um acidente automobilístico causado por um
servidor público, pode ser visto pelo prisma penal, civil, administrativo, etc).
a) conceito: “Diz-se que há uma disciplina jurídica autônoma
quando corresponde a um conjunto sistematizado de princípios
e normas que lhe dão identidade, diferenciando-o das demais
ramificações do Direito.” (CELSO ANTÔNIO BANDEIRA
DE MELLO). Para que exista a autonomia é mister a existência
de princípios, conceitos, normas, institutos próprios. É o que se
denomina autonomia científica. Alfredo Augusto Becker
entende que a autonomia é um “falso problema”, eis que não se
pode falar em autonomia de nenhum ramo do direito.
6
específicos não encontrados nos demais ramos de direito.” (Luiz Emygdio F. da Rosa
Jr.). O Direito Econômico possui autonomia científica, já que tem princípios próprios
elencados nos incisos do artigo 170 da Constituição (soberania econômica, função
social da propriedade, livre concorrência, busca do pleno emprego, defesa do meio
ambiente, etc)., institutos próprios (mercado, que inclusive é patrimônio nacional nos
termos do art. 219 da CF) e conceitos próprios (consumo, produção, troca,
propriedade, poupança, investimento).
- Legislativa: apresenta-se por intermédio de uma legislação própria e
adequada ao ramo jurídico. No caso, por exemplo, do Direito Econômico, existe uma
ordem econômica, um conjunto ordenado de princípios e normas previstas na própria
Constituição. A chamada Constituição Econômica será estudada nas próximas três
aulas.
Por enquanto, impende notar que a Constituição mexicana de 1917 e a
Constituição alemã de 1919 (Weimar) foram as precursoras na abordagem
constitucional das relações econômicas. De lá para cá diversos textos constitucionais
cuidaram das ordens social e econômica, passando a abordar normas programáticas a
tutelar direitos fundamentais sociais. Para tanto, cuidam da vida econômica,
prevendo a atuação estatal na seara econômica.
A Constituição de 1988 é uma Constituição Econômica, programática,
interventiva, como se infere do Título VII que cuida da Ordem Econômica e
Financeira, adotando a mesma concepção da Constituição espanhola de 1978 que
tem um capítulo de economia e finanças.
Como disse em sala de aula, quando se abre a Constituição e se lê o artigo 1º,
o artigo 3º e o artigo 170, por exemplo, vislumbra-se nitidamente a opção política
fundamental, que é um Estado Social, como se observará na nossa aula do PONTO
N. 2 a respeito da evolução da atuação estatal na economia e a formação do Estado
Social.
Além da constitucionalização da matéria, impende ressaltar que apesar de
inexistir um Código de Direito Econômico há um conjunto de normas regulando as
relações econômicas e a intervenção estatal na economia, cuidando de temas como a
regulação, a fiscalização e a atuação direta do Estado na economia. Tais normas,
como a Lei 12.529 (Lei Antitruste) serão estudadas no decorrer desta Optativa da
PUCGO.
7
5. Relação com outras ciências e outros ramos do Direito.
O Direito Econômico se encontra ligado com ciências sociais como a
economia, a ciência política, a ciência social, a ciência das finanças, entre outras,
com elas mantendo um constante diálogo.
Ademais, o estudo das questões jurídicas do fenômeno financeiro há de se
realizar de forma interdisciplinar, pelo que se mostra imprescindível a apreciação da
relação entre o ramo do Direito ora estudado e outros ramos jurídicos.
Em primeiro lugar, em face da constitucionalização das regras que tutelam a
atuação estatal no e sobre o domínio econômico, notadamente pelo advento da
chamada Constituição Econômica, não há como negar a estreita relação com o
Direito Constitucional, em especial em decorrência da evolução do
constitucionalismo.
Há, outrossim, uma estreita ligação com o Direito Financeiro, uma vez que a
atividade financeira do Estado, consistente em obter, gerir e aplicar recursos
influencia e sofre influência da economia. Neste contexto, impende analisar a relação
entre o planejamento econômico e o orçamento e a relação da atividade econômica
com a arrecadação e com o gasto público. Tais temas serão abordados no transcorrer
desta optativa.
No mesmo sentido, há irretorquível liame com o Direito Tributário. Os
princípios norteadores deste ramo do Direito devem ser analisados à luz da ordem
econômica, havendo uma inegável relação entre as ordens tributária e econômica
plasmadas na Constituição. Neste tema, não se pode perder de mira a influência do
princípio da livre concorrência sobre a tributação, como também a utilização, no
sistema pátrio, das chamadas contribuições sociais sobre o domínio econômico.
No mesmo diapasão, observa-se a relação com o direito administrativo
quando se analisa a atuação estatal na economia de forma direta, por intermédio dos
serviços públicos e de forma indireta, pela ação reguladora do Estado. Serviço
público e regulação mantêm, portanto, estreito liame com o disciplinamento das
relações econômicas.
O Direito Econômico mantém, ademais, estreita relação com o direito
internacional público, notadamente quanto à chamada ordem econômica
internacional, com a presença de institutos para harmonizar políticas econômicas,
especialmente no sentido de coibir atividades anticoncorrenciais, fomentando o livre
comércio e o desenvolvimento econômico.
8
Igualmente, vislumbra-se a relação com o direito privado, de onde se observa
a proteção à propriedade, desde que respeite a sua função social, o fomento ao
empreendedorismo (empresas de pequeno porte), o desenvolvimento de atividades
sustentáveis, que protejam o meio ambiente.
Enfim, o Direito Econômico não cuida sozinho dos aspectos jurídicos das
relações econômicas, necessitando da análise interdisciplinar e da relação com outros
ramos autônomos do Direito.
9
Esta, como se vê no artigo 170, tem dois fundamentos: a valorização do trabalho
humano e a livre iniciativa. Tem como objetivo assegurar a todos a existência digna,
conforme os ditames da justiça social. Assim, o primado do trabalho, a liberdade e
autonomia de iniciativa, a dignidade da pessoa humana e a busca da justiça social são
elementos que fundamentam o Estado Democrático de Direito brasileiro, estando
presentes concretamente na opção jurídico-política fundamental da nossa vida
econômica.
10
dispor ser assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica,
independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo os casos previstos em
lei.
Ademais, as empresas públicas e sociedades de economia mista não poderão
gozar de privilégios fiscais não extensivos ao setor privado (art. 173, § 2º, CF),
mesmo porque a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será
permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante
interesse social, conforme definido em lei.
Em síntese, o Estado pode atuar diretamente na economia, como agente
econômico, para salvaguardar o interesse público (evitar monopólios, realizar
serviços que a iniciativa privada não tem interesse, instalar-se em regiões pouco
atrativas, etc.), mas não pode sufocar a livre iniciativa, já que esta é tanto princípio
fundamental (artigo 1º), quanto fundamento da ordem econômica (art. 170).
11
comunidade e seus membros, o todo e a parte; ii) o “devido” consiste em assegurar
aos membros da coletividade uma equitativa “participação no bem comum”; iii) e a
“igualdade”, a ser estabelecida é proporcional ou relativa, e não absoluta ou simples,
como nas relações de justiça comutativa.25
Modernamente, Micheal Sandel explica que uma sociedade justa requer um
forte sentimento de comunidade, devendo, por conseguinte, encontrar uma forma de
incutir nos cidadãos uma preocupação com o todo, uma dedicação ao bem comum. 26
Por isso, o individualismo termina por macular a justiça social, conforme será visto,
inclusive, ao analisar o Estado Democrático de Direito no Ponto 2 do nosso
Programa.
Soberania.
A soberania econômica, prevista no art. 170,I, da CF, decorre do poder
soberano, princípio fundamental previsto no art. 1º, II, CF. Importa assinalar que não
significa isolamento e que celebrar tratados/acordos internacionais, bilaterais ou
multilaterais não fere a soberania, mas sim a confirmam.
Só podemos negociar em pé de igualdade com as demais nações porque
temos soberania, inclusive para denunciá-las à OMC (Organização Mundial do
Comércio) quando estiverem realizando práticas anticoncorrenciais, como foi o caso
do algodão em que o Brasil litigou com os EUA e venceu.
Neste sentido, ensina Régis Fernandes de Oliveira que a evolução das
relações internacionais não representa quebra da soberania, eis que, em verdade, há
25
André Franco Montoro. Introdução à ciência do direito. 12ª ed., 3ª tiragem. São Paulo: RT, 1985,
p.225-226.
26
Michael J. Sandel. Justiça – O que é fazer a coisa certa. Tradução 6ª ed. De Heloísa Matias e Maria
Alice Máximo. 6ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012, p.325.
12
uma afirmação da mesma, já que somente podem firmar tratados os Estados
soberanos.27
Assevera Francisco Rezek que “atributo fundamental do Estado, a soberania
o faz titular de competências que, precisamente porque existe uma ordem jurídica
internacional, não são ilimitadas; mas nenhuma outra entidade as possui
superiores.”28 Com isso, mesmo com o fenômeno da globalização, que é um processo
determinístico, consoante sentencia Brauner29, os Estados permanecem com a sua
soberania.
13
permitidas e que ao contrário de repudiar o princípio da isonomia acaba por
confirmá-lo.
Insta salientar que a norma de distinção tem de levar em consideração
aspectos diferenciadores lógicos e objetivos e não mero casuísmo, criando distinções
aleatórias, que não possuem qualquer correlação com o fato em que é tal lei
aplicada. Neste sentido, os seguintes ensinamentos do professor CELSO ANTÔNIO
BANDEIRA DE MELLO (Revista Trimestral de Direito Público, Malheiros
Editores, Vol. I, p.81,82 e 83):"Em verdade, o que se tem de indagar para concluir
se uma norma desatende a igualdade ou se convive bem com ela é o seguinte: se o
tratamento diverso outorgado a uns for "justificável", por existir uma "correlação
lógica" entre o "fator de discrímen" tomado em conta e o regramento que se lhe
deu, a norma ou conduta são compatíveis com o princípio da igualdade; se, pelo
contrário, inexistir esta relação de congruência lógica ou - o que ainda seria mais
flagrante - se nem ao menos houvesse um fator de discrímen identificável, a norma
ou a conduta serão incompatíveis com o princípio da igualdade.....Ao cabo do
quanto se disse, é possível afirmar, sem receio, que o princípio da igualdade consiste
em assegurar regramento uniforme às pessoas que não sejam entre si diferenciáveis
por razões lógicas e substancialmente (isto é, à face da Constituição), afinadas com
eventual disparidade de tratamento."
Assim, no campo econômico somente se permite uma desequiparação se
houver razão relevante e plausível para tanto. Caso contrário, a discriminação é um
privilégio odioso, como nomina Ricardo Lobo Torres, devendo ser afastada do
mundo jurídico.
Aliás, tal é o entendimento da Suprema Corte. Eis o teor da Súmula
Vinculante n. 49: ”Ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede
a instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área.”
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objeto de atenção da atuação estatal sobre o domínio econômico. Voltaremos a este
tema em breve.
Por fim, cumpre assinalar que a liberdade concorrencial pressupõe a livre
iniciativa, mas o contrário não é verdadeiro. Com isso, pode-se de pronto asseverar
que só a livre concorrência se houver liberdade de empreender. Sem livre iniciativa,
sem mercado, não há de se falar em concorrência. Por outro lado, pode existir a livre
iniciativa e não ocorrer a livre concorrência, quando houver o surgimento de
monopólios, a formação de cartéis, etc., que terminam por descumprir o objetivo
constitucional de ampla e livre concorrência.
A formação de monopólios e de oligopólios decorre do poder econômico e
deve ser cerceado e combatido; é uma falha do mercado que a “mão invisível”
preconizada por Adam Smith não consegue solucionar, pressupondo a atuação
estatal, com as medidas antitruste, combatendo práticas anticoncorrenciais.
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