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2ª Frequência
Capítulo IV – Das Empresas
1.- Conceções jurídicas de empresa
1.1.- Terminologia
A primeira nota que temos neste capítulo é saber se, dois termos que se usam
recorrentemente – empresa e estabelecimento –, são sinónimos, ou se querem dizer coisas
diferentes. A resposta a esta pergunta tem na doutrina conteúdos diversos:
Para nós é possível usarmos os dois termos como sinónimos. Para a lei talvez sim
ou não, uma vez que não há uma só noção de empresa ou de estabelecimento. Para o
legislador, por vezes estabelecimento é equivalente a empresas, e por vezes parece que tem
duas noções diferentes, pois no mesmo artigo ele utiliza dois conceitos diferentes, e se
fossem iguais não faria sentido invocar os dois. Há normas que o legislador utiliza apenas
um dos conceitos. Porém, não é clara a diferença que o legislador entende.
Nota: na nossa doutrina, diversos autores permitem a utilização das duas expressões com
uma relação de sinonímia. Mas é também certo que, podemos dizer que a expressão
empresa designa preferencialmente o perfil subjetivo (processo produtivo), enquanto que,
o estabelecimento exprime preferencialmente o bem, o perfil objetivo da mesma realidade.
Consumidores privados;
Estado ou outros entes públicos que adquirem bens para satisfação de necessidades
próprias, sem a intenção de os reintroduzir no mercado;
Coutinho de Abreu, critica esta solução, com base no seguinte argumento: não é
atividade económica consistente na oferta de bens em um determinado mercado a
atividade de prestação de serviços financiada integral ou maioritariamente, por via
fiscal (sem, em rigor “contraprestação”). Apesar de o escopo lucrativo não ser um
pressuposto necessário, a verdade é que a noção de “atividade económica”
pressuposta implica uma finalidade concorrencial, ou seja, o intuito de competir
com outros operadores económicos, a fim de se conseguir determinadas vantagens
económicas. As entidades que exercem atividades exclusivamente sociais, além de
não prosseguirem objetivos lucrativos, realizam trocas de bens gratuitas, pelo que
não poderão ser qualificadas como empresas para estes efeitos.
Valores do estabelecimento
A generalidade dos autores parte para o estudo do estabelecimento através de uma
observação da realidade: observa-se ou identifica-se qualquer coisa diferente entre as peças
e o todo. Sendo que essa coisa diferente, é observada de uma forma muito simples: posso
ser dono de um café e não ser titular de um direito real de nenhum dos elementos que
utilizo no café. Entre as partes que compõem o estabelecimento e aquilo que o
estabelecimento é, há-de haver algumas diferenças. Isto mostra-nos que mesmo numa visão
estática de um determinado momento conseguimos ver que há algo diferente entre os
elementos que integram a organização e a própria organização. Numa outra faceta,
podemos ver as negociações do bem – ex.: alguém que é dono de uma fábrica e transmite
a fábrica. Quando tal acontece, é frequente acontecer que nessa transmissão do bem, nem
tudo o que estava originariamente nessa organização que se transmita também (por vezes
há sinais distintivos, ou equipamentos que não acompanham a transmissão). Isto faz-nos
perceber que algo de diferente há-de haver. Naturalmente o que acontece é que quando
eu transmito este conjunto, o valor que ele tem (o valor que alguém está disposto a pagar
para o ter), é raramente o valor da soma dos elementos de cada um deles, que integram o
estabelecimento, ex.: o valor de uma pizzaria não é o valor dos equipamentos que lá estão,
ou das cadeiras, ou o valor imobiliário – o valor que existe será o valor de conjunto, que
será superior ao valor das partes, podendo ser muitíssimo superior. Outro exemplo, o
facebook tem um valor muito superior aos valores que tem, o valor dele é uma “máquina”
a funcionar.
Às vezes, dá-se o caso de o conjunto valer menos do que a soma das partes. É estranho,
mas pode acontecer. Por exemplo, em Lisboa alguém comprou uma loja histórica para a
Valores de organização
O estabelecimento não é um qualquer conjunto de meios – é um conjunto
organizado. Sendo aliás, através desta organização de meios que resultam os primeiros
valores sui generis (típicos) do estabelecimento, que por isso mesmo se designam como
valores de organização.
À reunião de elementos para se formar o estabelecimento há-de presidir uma ideia
ou plano organizatório. Com base nesta ideia ou plano, os diferentes elementos que hão-
de integrar a organização vão, apesar da sua heterogeneidade, tornar-se economicamente
complementares. Ex.: um quadro tanto pode ser integrado numa organização que consista
num hotel (função decorativa e associa-se à mobília do quarto); como numa galeria de arte,
onde aí teria uma função completamente distinta e associar-se-ia a outras obras de artes.
Valor da seleção ótima – resultante da seleção ideal dos elementos para aquela
empresa em concreto;
Valor da dimensão ótima – os elementos hão-de ser selecionados de acordo com
uma ideia de optimidade;
Valor da combinação ótima – que é o valor organizativo final.
Posto isto, tem que se ter em consideração que esta é apenas uma lei tendencial e
não uma lei absoluta. E tal é assim, uma vez que tem limites à partida e à chegada:
Assim, podemos ver que o estabelecimento, nos aparece como um bem jurídico
distinguível, e como um bem complexo, feito de vários bens ou elementos. Não é possível
dizer os elementos com precisão, uma vez que eles variam de empresa para empresa. Mas
em termos gerais podemos apontar alguns:
É certo que a empresa exige organização, mas sendo esta de meios, não se
confunde com eles, nem ela própria é elemento componente da empresa. É sim
um modo de ser ou de estar ou meios empresariais (inter-relacionados).
Os financiadores, fornecedores e clientes também não merecem esta qualificação.
Eles estão de algum modo, ligados à empresa. Todavia, tais ligações ou relações
não são internas mas externas à mesma; “o campo de forças” onde se situam está
fora do “núcleo ”- empresa (atrativo).
Quanto aos direitos, também considerados como alguns autores como elementos
de empresa, o que temos desde logo, a apontar, é que os meios empresariais são objeto de
relações jurídicas, logo de direitos subjetivos. Por isso, notamos uma incongruência no
discurso referido acima: qual é a necessidade de se falar em direitos e obrigações, quando
já se refere os bens e coisas objetos desses direitos e obrigações? Além disto, o que se
verifica é a referência a estes direitos e obrigações serem feitas de forma indiscriminada –
coloca um problema na medida em que, está-se a apontar a generalidade dos contratos,
créditos e débitos como elementos da empresa, quando nada têm a ver com a empresa,
exemplos:
No “começo”
I. Critério formal
É preciso então que a organização esteja completa. Só que isto é muito difícil de
assumir como critério, a organização é por natureza aberta, logo vive num permanente
equilíbrio entre completo e incompleto (ex.: estima-se que vai ser necessário uma máquina
de café para o terceiro piso do hotel, mas ainda apenas se tem para o primeiro piso – será
que ainda não há hotel?). O critério não pode ser este.
A organização tem de estar apta para funcionar. Mas este também não serve, uma
vez que, por exemplo, a EDP só vai realizar o fornecimento de energia daqui a uma semana
ao hotel – será que vai ser a EDP a fazer com que o hotel fique apto a funcionar? Este
critério seria arrasador, uma vez que sempre que cortassem a luz eu deixava de ter hotel.
A verdade é que já estamos perante um conjunto de bens heterógenos e complementares,
devidamente organizados com vista à consecução de determinado fim. Esses elementos
organizados já conseguem projetar no público a imagem de um bem novo.
No “termo”
Quando é que o estabelecimento termina? Por exemplo, as fábricas que ficaram
destruídas com o incendio de Pedrogão deixaram de existir nesse dia? A reconstrução
permitiu construir a mesma essência da organização que existia antes? Tem-se dito que a
calamidade destrói elementos muito importantes da organização, mas esta não se destrói
instantaneamente. Apesar da atividade empresarial ter ficado temporariamente suspensa,
os bens que restam servirão para exprimir a permanência (em estado mais ou menos
latente) de uma concreta organização produtiva qualificável como estabelecimento. Os
elementos restantes continuam na esfera patrimonial do sujeito – e o direito de tutela a essa
continuação (ex.: podem restar patentes, marcas, firmas, etc.).
Há, portanto, um momento em que conseguimos reestabelecer a organização do
estabelecimento, mas com outros elementos – sendo que esta é identificável como a
mesma, porque a que foi refeita, no fundo, suporta a que já vinha de trás. Este é um critério
que vem da noção de estabelecimento, que é uma organização com valor no mercado, com
projeção pública.
Por fim, há muitos caos de negociações de bens qualificados pelas partes como
estabelecimentos, apesar de convencionada a exclusão de elementos que dos
estabelecimentos dos transmitentes faziam parte – ex.: vendem-se restaurantes sem mesas,
cadeiras, máquinas de café e de sumos, etc. Significa isto não serem verdadeiras empresas
os objetos de tais negócios?
Não é possível responder a priori. A própria lei admite expressamente a
transmissão a transmissão de estabelecimentos desfalcados de um ou outro
estabelecimento. Isto porque, apesar de desfalcado, e impossibilitado de reentrar em
funcionamento logo após o negócio, o conjunto de bens transmitidos pode ser suficiente
para continuar-se em presença da organização produtiva publicamente identificada como
sendo a empresa x. Mais ainda, porque a empresa já funcionou, porque possui “valores de
exploração”, depende agora menos dos seus elementos, dos “valores ostensivos”. Quanto
mais um estabelecimento comercial funciona, de menor número de valores ostensivos
necessita para se afirmar como valor de posição no mercado (portanto, para ser
transmitida, a empresa que já funcionou depende menos dos seus elementos).
Resolução- O EIRL surgiu numa época onde não havia sociedades por quotas individuais,
e por isso seria um regime que permitiria ao comerciante individual limitar a sua
responsabilidade relativamente às dividas que iam sendo contraídas no exercício da sua
atividade. Este regime surgiu numa tentativa de respeitar o velho dogma do contrato em
relação às sociedades. O CC tem o regime do contrato de sociedade.
Empresas da indústria extrativa – apesar de haver autores que entendem que estas
são comerciais, tal não é a opinião de Coutinho de Abreu. Com efeito, estas não
estão previstas como comerciais em qualquer norma legal, e não se vê como será
possível admitir o recurso à analogia legis, nem à analogia iuris. Concluindo, não
parece haver uma “necessidade irrecusável do comércio jurídico” para se
qualificarem estas como empresas comerciais.
Empresas agrícolas – as explorações agrícolas, bem como as organizações
industriais-transformadoras auxiliares da atividade agrícola do produtor, não são
empresas mercantis tanto porque não se encontram especialmente reguladas na lei
comercial, como porque a sua exclusão do âmbito da comercialidade resulta dos
Porque optou pelas ações? Será por motivos fiscais? Por motivos jurídicos? A maior
parte dos negócios que se fazem materialmente sobre um estabelecimento, fazem-se por
transmissão de participações sociais. É necessário sabermos distinguir o que é um “asset
deal” de um “share deal”:
5.1.- Trespasse
Noção e forma
O legislador português não definiu o que era o trespasse, o que deu aso a muitos
desencontros doutrinais e jurisprudenciais no domínio da compreensão e do alcance do
conceito. Contudo, Coutinho de Abreu, neste contexto retira algumas conclusões:
Âmbito de entrega
Dada a natureza sui generis do estabelecimento, a sua transmissão suscita muitas
questões, porque se, por exemplo, se eu fosse dona do telemóvel e o quisesse vender, era
fácil ver o que estava a vender, e também o que tinha de entregar – o bem é finito neste
sentido. Num estabelecimento não é assim. Então como é que se transmite um
estabelecimento?
Âmbito natural
Âmbito máximo (convencional)
Âmbito mínimo
Âmbito imperativo ou legal (Coutinho de Abreu não identifica este)
Na ausência de uma vontade das partes, quais são os elementos que se transmitem
com o acordo sobre a transmissão do estabelecimento? A e B celebram um contrato
dizendo que “transmito a minha sapataria por 20mil” – quais foram os elementos da
sapataria transmitidos, sendo que não houve acordo de vontades?
I. Âmbito mínimo
Assim, com base no que acabamos de ver, cada um dos elementos pertence ao âmbito
mínimo ou não pertence ou âmbito mínimo: o âmbito mínimo contrapõe ao não âmbito
mínimo (aquele conjunto de elementos cuja transmissão pode ser excluída pelas partes, ao
abrigo da liberdade de conformação do estabelecimento na negociação)
Orlando de Carvalho, difere neste ponto de Coutinho de Abreu, quanto aos créditos
e aos débitos. O Doutor distingue créditos “impuros” e débitos “impuros”:
Temos ainda o âmbito imperativo ou legal, que Coutinho de Abreu não reconhece,
mas que Orlando de Carvalho identifica. Este âmbito compõe-se daqueles elementos que
a lei impede que as partes, transmitindo o estabelecimento, excluam da transmissão.
Depende da vontade das partes transmitir o estabelecimento; mas transmitindo-o, já não
depende da vontade delas a transmissão do elemento. Sendo isso que se sucede com os
contratos de trabalho.
Entre nós, nem todos reconhecem a obrigação de não concorrência (Nuno Aureliano).
Recorre para isso à analogia com o artg.9º DL 178/86 – após a cessação do contrato de
agência, o agente fica apenas obrigado a não concorrer se tal for acordado por escrito. Mas
esta questão coloca-se quanto ao contrato respeito, enquanto que no trespassante, o
problema surge por causa da celebração de um contrato e, por efeito do negócio, é
obrigação do trespassante entregar efetivamente o estabelecimento. Além disso, o direito
de iniciativa económica privada não é inconstitucionalmente ilimitado (61º/1 CRP). O
trespassário tem direito a receber devidamente o estabelecimento que adquiriu e a usá-lo
e fruí-lo, nos termos permitidos pelo direito de propriedade.
Além do trespassante, que outras pessoas é que podem ficar vinculadas pela obrigação
implícita de não concorrência?
o Esta é uma solução que incomoda dr. Pedro Maia, pois a sociedade é
composta por muitos sócios que nem todos tiveram algo a ver com a
empresa. Não estão abrangidos os trabalhadores, por tutela deste mesmo,
mas já estão abrangidas as sociedades.
Entre os sujeitos ativos ou credores da obrigação implícita de não concorrência
conta-se o primeiro trespassário e os eventuais sucessivos trespassários (cada um deles será
credor do primeiro sujeito passivo da obrigação), enquanto a obrigação durar.
A obrigação de não concorrência, está funcionalizada para garantir a entrega do
estabelecimento ao trespassário, o que implica duas coisas: ela só existe para isso, e não
pode existir para além disso. Como se depreende, ela tem limites, caso contrário tal
consubstanciaria uma violação do princípio da liberdade de iniciativa económica (artg.61º
CRP) e das regras da defesa de concorrência:
Note-se por último, que a obrigação pode ser afastada por estipulação contratual (o
sujeito dos interesses patrimoniais tutelados pela obrigação é o trespassário, que deles pode
dispor livremente). Significa a cláusula de livre concorrência a inexistência de um
A redação deste preceito não se mostrava clara, desde logo porque parecia assentar
numa aparente contradição lógica: a de que um comportamento do trespassário posterior
ao negócio — que desse ao imóvel um novo destino— pudesse vir a afetar a prévia
qualificação do próprio negócio.
Não faria decerto sentido que, tendo A celebrado um negócio de compra e venda
do estabelecimento mediante acordo com B, aquele visse a qualificação e,
consequentemente, o regime desse mesmo negócio alterados por força de um
comportamento posterior e unilateral de B. Se a qualificação do negócio como
trespasse assentava no acordo das partes, só de um acordo poderia resultar a “des-
qualificação” desse mesmo negócio.
Com base nestas e noutras considerações, a doutrina limitou, por via da interpretação,
o alcance do referido art.115º, nº 2, b), do Regime do Arrendamento Urbano. Para a
inexistência de trespasse seria necessário que, logo à data da celebração do negócio, as
partes (ambas) pretendessem a mudança de destino, isto é, tivessem simulado um trespasse
para dissimular a transmissão da posição de arrendatário. Nesse caso não haveria trespasse.
Se, ao invés, a mudança de destino fosse posterior ao trespasse ou fosse resultado da
vontade do trespassário apenas, nenhuma consequência se verteria sobre o regime da
cessão da posição de arrendatário: o consentimento do senhorio continuaria a ser
desnecessário para este efeito, posto que, tendo efetivamente ocorrido um trespasse se
preenchera a hipótese do nº 1 da norma.
Hoje, a interpretação do disposto na al. b) do nº 2 não pode deixar de conjugar-se com
o nº 5 do mesmo artigo: “quando, após a transmissão, seja dado outro destino ao prédio,
ou o transmissário não continue o exercício da mesma profissão liberal, o senhorio pode
resolver o contrato”.
Ora, a leitura conjugada da redação do atual art.1112º, nº 2, b) e do nº 5, CC permite
concluir que a lei distingue dois tipos de casos:
Ora, sempre que o valor da renda estivesse abaixo do valor de mercado (o que
facilmente podia suceder, visto que o regime vinculístico permitia que os arrendamentos
vigorassem ao longo de décadas sem atualização material de rendas), o arrendatário podia
usufruir de uma especial valorização do estabelecimento, caso negociasse acompanhado
do direito sobre o imóvel: o adquirente do estabelecimento tomaria a posição de
arrendatário, o que lhe facultava o gozo do prédio contra o pagamento de uma renda de
escasso montante. E o adquirente do estabelecimento passava a ter o direito (na mesma
medida que o anterior titular o tivesse também) de instalar no prédio arrendado outro
estabelecimento, desde que respeitasse os limites eventualmente fixados no contrato de
arrendamento.
Esta circunstância levou a que persistissem valores de renda muito baixos em imóveis
cujo contrato de arrendamento fora objeto de sucessivas cessões sem o consentimento do
senhorio: sempre incluída em trespasses, a posição de arrendatário circulava ao longo de
décadas, mantendo sempre o montante das rendas tendencialmente inalterado. Só não
seria assim se não tivesse havido trespasse.
2019/2020 Rita Nina – FDUC 47
À luz do novo regime do arrendamento urbano, parece claro que tal já não acontece,
por vários motivos.
Desde logo, porque é natural que, sendo permitido limitar a duração do contrato,
passe a ser menor o valor que a cessão pode incorporar: o adquirente não estará disposto
a pagar um montante elevado para que o trespasse inclua a posição de arrendatário se o
contrato estiver perto do seu termo (por exemplo, a 1 ou 2 anos). Encurtando-se,
temporalmente, o direito de arrendamento sobre o imóvel, encurta-se, do mesmo passo, o
valor económico desse direito.
Ora, a circunstância de à posição de arrendatário em causa estar associada uma
renda de valor abaixo do mercado não justificará, economicamente, o pagamento de um
preço elevado pelo trespasse: a duração limitada do arrendamento determinará que,
decorrido o prazo, o senhorio venha logicamente a opor-se à renovação, ao menos sem
uma revisão do montante da renda. Recorde-se que, anteriormente, não era assim, visto
que os contratos de arrendamento — mesmo que celebrados com prazo — ficavam sujeitos
a renovação automática, bastando, para o efeito, que o arrendatário a ela não se opusesse.
Mas acresce ainda que, quem adquire o estabelecimento acompanhado da posição
de arrendatário ficará, por força do disposto no art.1112º, nº 5, CCiv, numa posição
diminuída: o seu direito sobre o imóvel ficará à mercê da resolução pelo senhorio logo que
seja dado “outro destino ao prédio”. Aquilo que era permitido ao primitivo inquilino
(dentro do âmbito estabelecido no contrato de arrendamento), já não o será ao cessionário.
O direito sobre o imóvel fica, por força da cessão não autorizada, limitado por lei, visto
que o direito do novo arrendatário se sujeita a uma causa de resolução específica (Orlando
de Carvalho).
A interpretação deste preceito está longe de ser consensual na doutrina:
Não tem relevância autónoma, uma vez que, já cobre a hipótese do 1112º/2 b) CC
– Sousa Ribeiro;
Coutinho de Abreu, entende que a norma é criticável, mas considera que é
fundamento autónomo de resolução, uma vez que existiu trespasse, e esta se trata
de uma alteração de destino lícita, uma vez que como proprietário do
estabelecimento, o trespassário podia perfeitamente converter o estabelecimento
adquirido em outro. Assim, neste caso, dá-se fundamento ao senhorio para a
resolução do contrato (artg.1112º/5 CC), mas sem direito a indemnização (a cessão
da posição de arrendatário foi lícita).
Como se não bastasse, a Lei nº 6/2006 impôs uma outra diminuição aos contratos
de arrendamento cedidos no âmbito do trespasse. Por força do arts.28º e 26º, nº 6, al. a),
daquela lei (que aprovou o NRAU, agora constante do CCiv), os contratos sem duração
limitada (celebrados antes da entrada em vigor do NRAU) sujeitam-se a uma denúncia livre
pelo senhorio com pré-aviso de cinco anos, sempre que “ocorra trespasse ou locação de
estabelecimento após a entrada em vigor da presente lei”.
Ou seja:
2º parte
Mais uma vez temos de ver que é necessário saber o que é estabelecimento. Se
houver trespasse, está dispensado o consentimento do senhorio. Aquele estabelecimento
ainda subsiste sem os automóveis, vai depender de caso para caso, o âmbito mínimo é
apurado em concreto. Perante o que existia na titularidade do trespassante temos de ver o
que é necessário abranger na transmissão para se poder dizer que o estabelecimento
enquanto tal se transmitiu do trespassante para o adquirente. Os automóveis fazem parte
do âmbito mínimo? Vai depender da lei tendencial. Quanto mais o estabelecimento vai
Nota: nem todas as obras precisam da autorização do senhorio. Mas poderia haver algumas
que dessem aso à resolução do contrato.
Existe uma outra questão importante, relativamente a esta diferença. O que se pode
eventualmente discutir é se a afetação a outro destino se refere a um ramo diferente do
exercício do comércio. Em Lisboa, devido ao aumento das rendas dos apartamentos, muita
gente imigrante que estava a arrendar pequenos espaços para lojas, passou a utilizar o
espaço para arrendamento para fins habitacionais. O que temos no nosso caso é a mudança
de um ramo do comércio para outro ramo do comércio – caberá no nº5? Se couber pode-
se aplicar, se não couber não se poderá aplicar o artigo. O tipo de atividade tem diferenças
consideráveis, podemos dizer que ainda houve alguma alteração da mudança da sapataria
para o supermercado, mesmo que seja apenas uma mudança parcial. Isto tem relevo, uma
vez que, o tipo de clientela muda, é um tipo de procura que trás mais ruido. O Doutor
Ricardo Costa, diz que estas não seriam abrangidas pelo art.5º, pois na alínea b) uma parte
diz “ de outro ramo do comércio”, e outra diz “a sua afetação a outro destino” – faz-se
assim esta divisão. Mas o professor entende que a separação é superficial, a utilização de
“um modo geral”, diz mesmo isso a lei partiu de uma situação especial para uma situação
geral.
O problema adicional é de saber até quando é que a mudança de destino é relevante.
A longo prazo, muita coisa pode acontecer naquele imóvel. Até quando é relevante a
Para além das normas da secção VII, são aplicáveis à locação de estabelecimento outros
preceitos fora dessa secção (exs.: arts.1031º a 1050º e arts.1057º, 1058º e 1059º/2 CC).
Âmbitos de entrega
Tal como nos casos de trespasse, a locação de empresa não pode prescindir dos
elementos necessários ou essenciais para a identificação da empresa objeto do negócio – o
âmbito mínimo da empresa tem de ser locado.
Aliás, qualquer negócio jurídico que pretenda ter como objeto a “empresa” (como
bem jurídico unitário e autónomo, pois ela não é um mero conjunto ou soma de vários
elementos) terá de incidir, pelo menos, sobre esse âmbito mínimo, pois caso contrário não
estaremos em face de um negócio sobre a empresa, mas sim de vários negócios sobre os
vários elementos empresariais, enquanto elementos individuais.
Salvo quando outra coisa resulte da lei ou de contrato, é de entender que os
elementos empresariais se transferem naturalmente para o locatário. É que o
estabelecimento locado transmite-se a título meramente temporário (transfere-se para a
Resolução-
O artigo 1109º/1 e o 1110º CC, na falta de estipulação em contrário aplica-se as
regras relativas à duração, denuncia e oposição dos contratos de arrendamento para fins
não habitacionais. Ainda temos outra norma a ter em conta, relativamente ao
arrendamento para habitação (disposições especiais) – 1096º, há uma renovação
automática (já sabemos que a lei manda aplicar ao contrato o prazo de 5 anos). Existe outro
regime que permite a oposição à renovação, mas esta terá de ser dentro dos prazos (120
dias), caso contrário fica sem efeito. O professor defende a renovação automática.
Não obstante, é de notar que agora o Código, quando se refere à empresa, o faz
quase sempre respeitando a noção adiantada no art.5º (exs.: arts.3º/3/b; 53º/2; 55º/4;
161º/3/a; 195º/2/c; 249º/1/a).
O plano de recuperação não está ao dispor de todos os empresários. Na verdade,
há uma nota no CIRE, um pouco traiçoeira – artg.250º CIRE, que dispõe que, se
recuarmos uns artigos vemos que o artg.9º trata do plano de insolvência, por sua vez, o
artg.250º dispõe que relativamente aos processos de insolvência aí em causa, não se aplica
o artg.9º a tais. Estamos a falar de um conjunto de normas que abrange os devedores,
pessoas singulares, que não são empresários, ou que sendo empresários, são apenas
titulares de pequenas empresas (249º e ss.). O que são pequenas empresas? São pequenas
como tal entendidas no CIRE (critérios específicos distintos das pequenas e médias
empresas). Serão muitos poucos devedores singulares empresários para este efeito. O
artg.249º a), faz referência a devedores, que são apenas meros consumidores (não nos
interessa agora, uma vez que estamos a falar da recuperação de empresas).
Resolução- Esta é uma matéria que não é tratada nas lições. José é uma pessoa singular,
tendo em conta isso, tal obriga a ter em mente o regime 249º e ss (capítulo da insolvência
de pessoas singulares). Claro que apenas nos interessa este regime, se estiver em causa uma
insolvência de empresas, não nos interesses a insolvência de não empresas. A norma do
artg.249º é importante porque nos permite ver, o que é uma pequena empresa para este
efeito. Tudo isto é relevante porque o 250º diz que, não são aplicáveis as normas do
capítulo IX neste âmbito.
No 249º b): trata do que é considerado pequeno empresário – quem não tiver dividas
laborais; o nº dos seus credores não pode ser superior a 20; o passivo global não pode ser
superior a 300 mil euros. Uma nota importante deste regime: estamos a falar do passivo
global, a pessoa singular aqui em causa, vai ter necessariamente de ponderar para este
efeito, todo o seu passivo (não apenas o da empresa) – ex: pagar durante mais de 10 anos
o empréstimo da casa, este é considerado no passivo global. Facilmente extravasa este valor.
Por um lado, este regime é absurdo porque não é possível recorrer ao plano do
pagamento, se tiver dívidas laborais. O que significa que se um devedor quiser o plano de
insolvência, basta que ele deixe de pagar aos credores para recorrer ao título IX em causa.
Parece ter estado na mente do legislador, que o regime aqui em causa é um regime que
tem muitas vantagens para o devedor, portanto um titular de uma pequena empresa, se
quiser beneficiar deste regime tem muitas vantagens e como tal não pode deixar de pagar
aos seus trabalhadores. O regime que estamos a falar, tem algumas vantagens: a insolvência
pode ser requerida pelo credor ou algum dos legitimados do artg.20º, e o devedor pode
por sua vez, apresentar em alternativa o plano de pagamentos à contestação na petição
inicial.
Se ele quiser apresentar o plano de pagamentos, este depois tem de ser aprovado
pelos credores. Se o plano de pagamentos é aprovado pelos credores, o 259º diz-nos que
nesse caso o juiz promulga o plano de pagamentos por meio de sentença de homologação.
Após o trânsito em julgado desta sentença, emite-se a declaração de insolvência. No
processo de insolvência que não siga estes termos, apenas vamos ter um plano de
insolvência após a declaração de insolvência.
Mas, até agora, não vimos nenhuma vantagem do devedor de pequena empresa.
As vantagens são as seguintes: a sentença de declaração de insolvência, que vai ter um
Atente-se o artg.17º-H, que protege certos negócios que sejam realizados no âmbito
do PEV, para o caso de depois ser declarada a insolvência do devedor. Porque é que estas
garantias são importantes? No processo de insolvência pode haver margem para o
administrador de insolvência resolver em benefício da massa, certos negócios celebrados
antes da declaração de insolvência. Assim, as garantias convencionadas entre a empresa e
os credores, com a finalidade de proporcionar à empresa meios financeiros para o seu
desenvolvimento, mantêm-se, mesmo que seja declarado o processo de insolvência (nº1);
o nº2 é referente aos negócios de financiamento. Ora tanto as garantias do nº1 como os
negócios do nº2 são insuscetíveis de resolução em beneficio da massa insolvente (no caso
de o devedor vir a ser declarado insolvente) – 120º/6.
Outra nota diz respeito à apresentação do plano, que tem de ser aprovado durante
as negociações. O artg.17º-F é dedicado à aprovação desse plano de recuperação. Este
artigo diz-nos que o plano deve ser apresentado até ao último dia de negociações. Plano
esse que, depois deverá ser apreciado pelos credores, que deverão pronunciar-se sobre ele
e seguidamente haverá uma votação. Para a aprovação desse plano (duas alternativas, por
um de dois caminhos):
Isto é importante pois o nº10 do artg.17º-F, diz que o plano de recuperação objeto
de decisão de homologação ou a não homologação e a decisão de homologação do plano
vincula a empresa e os credores mesmo que não hajam reclamados os seus créditos ou
participados nas negociações. O devedor deve convidar os credores a participar nas
negociações, mas mesmo que não tenham participado, eles ficam vinculados uma vez
homologado o plano.
O 17º-G tem um regime importantíssimo, trata dos casos em que chega ao fim do
período das negociações sem ter acordo, em que nesse caso, o processo negocial é
encerrado (diferente do PEV). O AJP publica esse facto, e este terá que ver se a empresa
está em situação de insolvência atual ou não, se concluir que a empresa não está nessa
situação, o juiz vai declarar o encerramento do PEV.
Pode acontecer uma coisa diferente: pode o AJP concluir que a empresa está numa
situação de insolvência atual, aqui encontramos o referido “bypass” para o plano de
insolvência – 17º-G/3. O AJP vai então requerer a declaração de insolvência do devedor
(17º-G/4). Devemos olhar para o Ac. do TC 675/2018, que veio declarar a
inconstitucionalidade com força obrigatória geral do 17º-G/4, quando é entendido como
dever de apresentação à insolvência, por não assegurar o contraditório. Tem de se ver se,
uma vez que é o AJP a apresentar o pedido da declaração de insolvência, tem de se ver se
o pedido é encarado como um pedido apresentado por terceiro com legitimidade (não há
garantia de qualquer contraditório, o devedor não tem de ter um prazo para se pronunciar
quanto àquele), ou se deveria ser equiparado à situação de apresentação pelo próprio
devedor. No entanto, o professor Soveral Martins já em 2012, entendia que a solução era
inconstitucional, uma vez que, o devedor deveria ter a possibilidade para se pronunciar
sobre o requerimento apresentado pelo AJP, tinha de ter a possibilidade de exercer o
contraditório – o TC também foi no sentido desta posição, uma vez que a garantia do
contraditório é uma garantia constitucional. É certo que o devedor é ouvido antes de se
apresentar o requerimento, mas tal não é a mesma coisa que exercer o contraditório, ou
seja, de se defender do pedido que foi feito de declaração de insolvência. Assim desde que
se assegure o prazo para o devedor exercer o contraditório, não há qualquer problema a
nível constitucional.
2019/2020 Rita Nina – FDUC 78
A segunda modalidade do PER está regulada no art.17º-I, que remete
abundantemente para artigos anteriores. O que importa aqui realçar é o facto de o PER,
nesta modalidade, iniciar-se com a apresentação ao tribunal, pelo devedor, de um acordo
extrajudicial de recuperação assinado por ele e por credores seus, que representam, pelo
menos, a maioria dos votos prevista no art.212º/1, acompanhado de outros documentos
(art.17º-I/1).
Resolução- Vimos que havia dois PER (dois processos especiais) – artg.17º-H e o 17º-I.
Quem tem legitimidade para pedir um PER é o próprio devedor com o acordo de alguns
credores. AJP – administrador provisório. O prazo inicial é de dois meses para as
negociações, podendo ser prorrogado (17º-D/5) por um mês, por acordo com o AJP e a
empresa. O prazo acabou sem qualquer acordo no nosso caso, e o 17º-F diz-nos que se foi
negociando com os credores que deveriam participar em tal. Após isto, há um prazo de 5
dias em que qualquer credor pode alegar algum inconveniente que tenha – visa a
possibilidade de evitar a recusa da negociação. Depois temos o prazo da votação, que vai
ter lugar por escrito (17º-F/6) – importante para orais. Não está proibido que eles façam a
votação por escrito em assembleia, apesar de não ser isso que está na lei.
Dentro do prazo de negociações tem de ser apresentado um projeto (projeto uma
vez que ainda não foi aprovado). Se dentro daquele prazo, nada é apresentado, então
evidentemente decorreu o prazo. Segue-se uma série de consequências.
Quando se diz no enunciado que terminou o período de negociações sem ser
alcançado nenhum acordo, pode não haver no âmbito das negociações qualquer proposta
obtida – hipótese do artg.17º-G/1, de não ter sido alcançado um acordo. Pode também
dar-se o caso de haver a recusa do projeto do plano de revitalização – isso é uma outra
Mais uma vez, só é possível recorrer a este regime se houver apenas uma situação de
insolvência iminente, ou uma situação económica difícil. Por outro lado, não é qualquer
situação que pode ficar sujeita a este regime.
Começando pelo protocolo de negociação, para que as negociações visando um acordo
de reestruturação sejam disciplinadas pelo RERE, o nº1 do artg.6º diz que, é necessário
que o devedor e os credores representem pelo menos 15% do passivo não subordinado, e
que assinem um “protocolo de negociação” e promovam o seu depósito na Conservatória
de Registo Comercial (artg.6º/1/2/4). Há aqui também um controlo de seriedade, esse vai
ser justamente realizado através da declaração exigida pelo artg.6º/4. Este protocolo de
negociação só por si não basta, para além de haver essa vontade das partes de se sujeitar ao
RERE, é necessário proceder ao depósito desse protocolo, é esse depósito que vai ter certas
consequências muito importantes também. Antes de se chegar ao protocolo de negociação
foi necessário negociar esse protocolo, esta fase não está prevista no RERE, portanto a
negociação vai-se processar como acontece nos outros contratos.
O depósito desse protocolo tem efeitos:
Artg.9º - obriga o devedor a manter o curso normal dos negócios e a não praticar
atos de especial relevo (exceto se previstos no referido protocolo ou se previamente
autorizados) – é importante para criar confiança para quem está a negociar.
Obrigações dos credores (10º/1) – parece que os credores, mesmo que exerçam o
direito de resolução do protocolo, continuam obrigados durante aquele período a
não instaurar as ações previstas na e) do artg.7º/1.
Artg.11º/1 – nos casos em que haja depósito do protocolo, determina que há
suspensão de eventuais processos de insolvência onde ainda não tenha sido
declarada a insolvência do devedor.
2.- Logótipo
2.1.- Noção
É talvez o sinal distintivo com o regime mais confuso, ainda deixa margem para
muitas dúvidas, porque o logotipo vem fazer um sumário de 3 sinais distintivos existentes
anteriormente (nome de estabelecimento, insígnia de estabelecimento e o do logótipo que
já existia), tendo sido essa uma alteração de 2003. Esta agregação permitiu distinguir com
mais clareza as diversas modalidades de proteção da propriedade industrial, evitando o
recurso a diversos registos e a diversos pagamentos para o mesmo fim.
O logótipo é signo suscetível de representação objetiva e autónoma para distinguir
“sujeitos” ou entidade e, eventualmente, estabelecimento(s) deste (artg.281º, 282º e 295º
CPI).
Este logótipo surge como um sinal que visa fundamentalmente distinguir sujeitos
(individuais ou coletivos, públicos ou privados – 282º), que prestem serviços ou que
produzam determinados bens destinados (total ou parcialmente) ao mercado (281º/2).
Também pode servir para distinguir os seus estabelecimentos. O sujeito titular do logótipo
não tem de ser empresário. Não tem de ter empresa ou estabelecimento. Mas quando
tenha estabelecimento, é natural (mas não necessário) que use o logótipo (também) para
individualizá-lo e distingui-lo de outros estabelecimentos (função que era típica do nome
e/ou insígnia). Coutinho de Abreu, diz que o logótipo é normalmente sinal distintivo
bifuncional – distingue sujeitos e estabelecimentos.
O que a lei diz, é que este sinal depois pode ser utilizado para também ser colocado
no estabelecimento, para distinguir o estabelecimento. Esta é uma afirmação que pode ser
objeto de alguma distinção.
Pedro Sousa Silva diz que, mesmo que o logótipo esteja colocado num
estabelecimento, desde logo, até na própria frontaria do estabelecimento, mesmo
B. Princípio da verdade
C. Princípio da novidade
Pedro Sousa e Silva, não entende assim esta remissão. Para ele, esta remissão, não
significa que estes logótipos tenha, uma tutela reforçada, simplesmente significa que
o próprio logotipo pode ser recusado pela existência de um logotipo de prestígio.
Estes artigos são importantes porque conseguimos ver que há uma margem para
proteger logótipos não registados.
Por sua vez, o artg.289º dispõe que também é recusado o registo do logótipo que
seja reprodução ou imitação de marca anteriormente registada por outrem para produtos
idênticos ou afins abrangidos na atividade da entidade que se pretende distinguir com o
logótipo; reprodução ou imitação não autorizada de firma ou denominação de outrem - a
proteção concedida à firma pode ser estendida para impedir este tipo de situação, através
do registo da firma podemos impedir o registo de outros sinais distintivos.
“Produtos ou serviços” é redundante, uma vez que, os “produtos” são bens que
resultam da “produção”, da atividade produtiva – bens materiais ou corpóreos e
bens imateriais ou serviços.
Os bens assinalados por determinada marca não têm de ser “de uma empresa”;
Não visam em regra, as marcas individualizar certos bens de determinados sujeitos
relativamente a quaisquer bens de outros sujeitos.
Posto isto, Coutinho de Abreu afirma que a função distintiva das marcas não se
confunde ou identifica com a de indicação de origem ou de proveniência. Esta é apenas
parte daquela. As marcas destinam-se a distinguir os produtos através de outras mensagens:
o titular e/ou os utentes legítimos da marca (emissores) comunicam por ela ao público
(recetor) algo respeitante a produtos (referente) – comunicam, no mínimo, que os produtos
assinalados com a marca são produtos individualizados e distintos.
A função distintiva para muitos autores, ainda hoje, (como Pedro Sousa e Silva) é
associada a uma função de indicação de origem – aquele produto tem uma certa origem,
que daria segurança às pessoas. Mas, a verdade, como Soveral Martins diz, é que o regime
da transmissão das marcas hoje mostra que nem sempre a marca vai assegurar essa
indicação de origem. Em relação à transmissão da marca, é possível transmitir a empresa
(primitiva origem dos produtos) sem transmitir a marca – ora, por isso, nem sempre a
marca vai identificar a origem dos produtos. Aliás temos marcas de certificação e de
garantia que permitem mostrar que aquele produto segue determinados protocolos, o que
não tem a ver com a função da marca.
Mas será que esta é a única função jurídica das marcas? Se olharmos para o
artg.235º, vemos que, visa proteger a função atrativa ou publicitária ou excecional das
marcas de prestígio. Como se vê a proteção alargada das marcas de prestígio é agora
assegurada por específico normativo relativo às marcas. Proteção essa que rompe com o
princípio da especialidade, não se limitando a prevenir aqueles riscos. Já não está em causa
a função distintiva das marcas, mas sim a tutela direta ou autónoma da função atrativa ou
É duvidoso, contudo que se possa dizer que o CPI, tenha um regime para proteger esta
função, com exceção das marcas de prestígio.
Será que as marcas têm também uma função de garantia de qualidade direta e
autonomamente tutelada pelo direito?
Um ponto que é importante de referir é que não podemos concluir que a tutela
dos interesses dos consumidores é o objetivo central da legislação sobre marcas. Num
sistema capitalista e de marcas facultativas, o direito sobre a marca serve essencialmente e
primordialmente os interesses do respetivo titular. É certo que os consumidores também
beneficiam, dessa função distintiva, mas este interesse só é protegido de forma eventual e
indiretamente, dado depender da reação do titular da marca às contrafações.
Porém, também não se deve pensar que o regime de caducidade das marcas
decetivas nada tem a ver com a necessidade de tutela dos interesses dos consumidores. Os
interesses dos consumidores também aqui são tidos em conta e protegidos.
Também não podem ser marcas sinais que se tenham tornado de uso comum para
designar certos bens (ex.: desenho retratando um peixe para artigos de pesca) ou para
qualificar certos produtos (ex.: “Super”, “ótimo”, etc.).
Quanto às expressões em língua estrangeira (denominações específicas, genéricas,
descritivas e de uso comum) – têm capacidade distintiva?
“Forma imposta pela própria natureza do produto (forma natural) – forma usual
ou normal de que se revestem bens a cujo género ou espécie pertence o produto
(ex.: uma tesoura, que por definição é formada por duas lâminas que se movem
em torno de um eixo em comum);
“Forma do produto necessário à obtenção de um resultado técnico” (forma
funcional) – forma dada por um objeto de que resulta um aumento de utilidade ou
melhoria de aproveitamento do mesmo e que poderá ser protegido como patente
ou como modelo de utilidade – 50º e ss., 119º e ss.
o Mas uma vez estamos perante uma situação em que algo que represente
uma evolução técnica, não pode ficar numa situação de monopólio.
o A lei não permite que as formas funcionais deste tipo sejam apropriadas a
título de marcas, uma vez que seriam tuteladas por tempo ilimitado
(artg.247º); ao invés, sendo tuteladas ao nível de patentes e modelos de
utilidade, estas têm uma duração que não pode exceder 20 e 10 anos,
respetivamente.
“Forma que confira um valor substancial ao produto” (forma esteticamente
necessária) - (ex.: produtos de decoração do lar), a proteção é apenas dada também
por via dos desenhos ou modelos.
Caso 10- Alberto, fabricante de bicicletas, pretende registar como marca para os seus
produtos a palavra Sepeda (Bahasa para bicicleta – língua exótica e muito pouco
conhecida). Poderá fazê-lo?
Resolução- Hoje admite-se como marca uma só cor – uma nova alteração do CPI. Ao fim
de tantos anos, começou a esgotar-se as possibilidades de marcas, e começa-se assim a
alargar o âmbito de registo, também para abranger aquilo que as novas tecnologias
permitem (ex.: holograma). No artg.222º/1 CPI f), está disposto que se poderá registar “a
cor ou as cores” em que a marca é usada. É fácil de apresentar a representação da cor. A
questão está em saber como é que uma só cor tem capacidade distintiva.
Isto foi objeto de apreciação do TJ no caso Libertel, em que nesse caso tinha-se a
cor de laranja como marca de serviços de telecomunicações (um retângulo). O problema
aqui, é que mesmo a amostra em papel se poderá alterar com o tempo, vai-se degradando,
e o TJ disse que se fosse apenas só em papel não teríamos a característica da durabilidade
presente. Evidentemente, mais uma vez, a tecnologia evoluiu, e pode vir a surgir uma outra
forma que vem a permitir um caráter duradouro. No acórdão, dá-se muito mais valor à
descrição verbal da cor, só que esta era claramente insuficiente (sendo só “laranja”),
constituía uma representação inadequada. Deste modo, quanto à descrição verbal, terá que
B. Princípio da verdade
Também a propósito das marcas não tem o princípio da verdade “manifestações
positivas necessárias” (o sinal pode ser de mera fantasia). A marca é verdadeira se não for
decetiva ou enganosa.
O art.238º/4/d CPI estatui a irregistabilidade das marcas que, em todos ou alguns
dos seus elementos, contenham “sinais que sejam suscetíveis de induzir o público em erro,
nomeadamente sobre a natureza, qualidades, utilidade ou proveniência geográfica do
produto ou serviço a que a marca se destina”.
Em regra, as marcas devem ser novas, isto é, distintas ou inconfundíveis. Mas este
princípio apenas vale em regra no quadro do princípio da especialidade, relativamente a
sinais que visem distinguir produtos idênticos ou afins – é fundamental ter esta ideia
presente.
Tendo em vista o artg.232º/1 a) e b) CPI, é possível traçar o seguinte quadro dos casos
em que o registo de marca deve ser recusado:
Caso 13- A X, S.A., é titular da marca «XPTO», que foi registada para identificar um
perfume muito caro e desejado, usado por estrelas de cinema, tv, rádio e redes sociais.
Trata-se de um produto que rapidamente se tornou muito conhecido em todo o mundo
desenvolvido e que é o resultado de combinações de elementos muito felizes, dando-lhe
um toque de extremo bom gosto. Alberto ofereceu à sua mulher, como prenda de
aniversário de casamento, um frasco de 250 ml do famoso «XPTO», mas viu que houve
uma reação de algum desagrado por parte daquela. Após alguma insistência, Alberto ficou
a saber que a entidade que limpa a fossa sanitária da fábrica em que a mulher trabalha tem
como marca… «XPTO», sinal que utiliza na própria cisterna com que presta os serviços
em causa. Alberto contou a história a Carlos, administrador da X, S.A., que pretende saber
se esta tem fundamento para reagir. O que lhe diria?
Resolução-
A marca XPTO trata-se de uma marca de prestígio – associada a uma boa imagem,
imagem de qualidade. Tem um regime próprio presente no artg.235º - tem uma tutela
especial, uma vez que, relativamente, ao princípio da especialidade, apenas se pode
proteger as marcas registadas quando estejam em causa produtos afins, no caso das marcas
de prestígio, não terão que ser produtos afins -
Se virmos o artg.260º, vemos que justamente o registo da marca é anulável se for
infringido o artg.235º. Assim, ele poderia reagir solicitando que parassem de utilizar a
marca, tendo também um procedimento cautelar previsto (artg.345º).
ACÓRDÃOS
Louboutin S.A v Yves Saint Laurent – a questão da cor da sola dos sapatos do Louboutin
(“the red sole mark”)
Na EU isto hoje é aceite, da localização da cor da marca (por exemplo na sola do
sapato), como algo que pode ser registado.
Cor
Estava-se a discutir se uma cor poderia só por si, ser uma marca (tratava-se da cor-
de-laranja para atividades no âmbito das telecomunicações). Acabou por decidir que
poderia, de facto registar apenas uma cor, visto que poderia de facto, ter caráter distintivo
(tendo de ter contudo alguns requisitos). Mas atenção que a cor tem de ser vista no seu
todo, no contexto, para ter capacidade distintiva. Foi com esta jurisprudência que se deu o
impulso legislativo para a alteração relativamente a esta matéria.
Produto novo;
Processo novo de obter produto já conhecido;
Nova utilização desse produto (sob certas condições);
No caso de o invento não ser patenteado, por o invento nunca ter pedido ou por não
ser suscetível de patente, nada impede que essa invenção seja utilizada por qualquer pessoa,
uma vez que, nesse caso, o invento pertence ao domínio público.
O inventor até pode optar por não patentear invenção, tentando resguardá-la através
do segredo comercial, que goza de tutela própria. Mas esta trata-se de uma proteção mais
precária e de duração indefinida, podendo cessar a qualquer momento, caso o segredo seja
divulgado publicamente (mesmo contra a vontade do inventor).
Uma alternativa intermédia, de que falaremos mais tarde, será a de proteger o
invento através dos modelos de utilidade.
A invenção patenteável – pré-requisito do caráter técnico
A patente tem por objeto uma “invenção” – solução de um problema específico no
domínio da tecnologia. Para uma invenção ser patenteável tem que preencher não apenas
os requisitos enumerados nos Artgs.50º e 54º CPI e 52º CPE (novidade, atividade inventiva
e aplicabilidade industrial), mas também o (pré)requisito do caráter técnico – o invento
deve ter por objeto um “ensinamento técnico”, ou seja deve indicar ao perito na
especialidade como proceder para resolver um determinado problema técnico utilizando
certos meios técnicos (decorre do 50º/2 CPI e 52º/1 CPE).
As conceções intelectuais apenas se tornam patenteáveis na medida em que tenham
sido incorporadas em aplicações técnicas (51º/1 CPI 52º CPE). Consequentemente, é
recusada proteção às descobertas, às teorias científicas a os métodos matemáticos, aos
materiais já existentes na natureza, às criações estéticas, às apresentações de informação e
aos projetos, princípios e métodos do exercício das atividades intelectuais em matéria de
jogo ou no domínio das atividades económicas – pois estas realidades por mais importantes
que sejam, revestem natureza abstrata ou intelectual, sem caráter técnico.
Assim, uma patente não é uma pura teoria. Trata-se de uma solução técnica para
um problema técnico – por exemplo, como tratar de determinada doença e encontra-se
uma solução técnica para resolver essa doença.
Exceções à patenteabilidade
Há certas invenções, que abstratamente seriam patenteáveis, mas que o legislador
não admite patentear, por opção política ou legislativa. Deste modo, os artg.52º do CPI e
53º CPE excluem a patenteabilidade de inventos cuja exploração seja contrária à lei, ordem
pública, saúde pública e aos bons costumes, fornecendo um elenco exemplificativo, de
inventos não patenteáveis: processos de clonagem de seres humanos ou de modificação da
sua identidade genética geminal, as utilizações de embriões humanos para fins industriais
ou comerciais, ou processos de engenharia genética causando sofrimento a animais sem
utilidade médica substancial.
Nós somos uma sociedade com muitas preocupações éticas, mas tal não se verifica
em todos os países (ex.: Ásia), e o que está a acontecer é que a esmagadora maioria das
invenções feitas, são maioritariamente feitas na Ásia – uma vez que podem fazer outras
experiências, que na Europa são proibidas.
São igualmente excluídas, essencialmente por motivos éticos e de interesse público,
patentes sobre o corpo humano, as variedades de vegetais ou raças animais e os métodos
de tratamento cirúrgico ou terapêutico do corpo humano ou animal. O domínio da
Biologia e das Ciências médicas ditaram diversas exceções a esta regra no artg.53º CPI (a)
e b)).
6.3.- Função
A patente confere o seu titular o exercício exclusivo de uma atividade de conteúdo
económico. Este monopólio, justificado como a recompensa do inventor ou como
contrapartida da divulgação pública do invento, tem o objetivo de incentivar o esforço
Os requisitos da patenteabilidade são enunciados nos arts.54º a 56º CPI e 54º a 57º
CPE – novidade, atividade inventiva e a aplicabilidade industrial. A estes três requisitos,
alguns autores acrescentam, mais um: a descrição do invento de modo suficientemente
claro e completo, para permitir a execução por qualquer pessoa competente na matéria,
conforme é exigido pelos Artgs.62º, 75º/1 d) e 114º d) CPI – contudo, esta exigência não
constitui propriamente um requisito substancial do objeto de invenção, mas antes um
requisito formal.
Novidade
Uma invenção é considerada nova, quando não estiver compreendida no estado da
técnica, o qual abrange tudo o que, dentro ou fora do país foi tornado acessível ao público
(por descrição, utilização, ou qualquer outro meio) ou foi descrito em pedidos de outras
patentes ou modelos de utilidade destinados a produzir efeitos em Portugal (artg.55º/1 CPI
e 54º/1 CPE). A novidade afere-se à escala mundial – ex.: basta que a descrição do invento
tenha ocorrido antes na Nova Zelândia para destruir a novidade da invenção.
Pode suceder que alguém invente algo que, sem o seu conhecimento, já antes tenha
sido inventado por outrem. Não é que deixe de ser uma invenção (produto da criatividade
humana), mas não será patenteável por carecer de novidade.
A nossa lei consagra um princípio de novidade absoluta: a novidade do invento é
medida à luz de toda a informação disponível na data do pedido ou prioridade da patente,
independente do modo, tempo ou do local onde ocorreu a divulgação.
Por “público” deve-se entender todo o universo de pessoas que não estejam
obrigadas perante o inventor a manter a informação em segredo. Ou seja, se o
inventor contar a um amigo, pedindo-lhe que mantenha a informação secreta, ou
se essa informação for conhecida de colaboradores contratualmente vinculados à
confidencialidade, não haverá divulgação ao público.
o Contudo, se alguma destas pessoas, ainda que ilicitamente, transmita a
informação a terceiros, ela torna-se acessível ao público, para efeitos de
aferição de novidade. Apesar disso, a divulgação mediante “abuso evidente”
poderá não ter esse efeito caso o pedido de patente seja apresentado
durante os 6 meses seguintes – artg.56º/1 a) CPI.
Por último, note-se que, em Portugal, não está consagrado o período de graça, isto
é, um lapso de tempo anterior ao pedido de patente, dentro do qual o requerente pode
explorar ou divulgar o invento sem o fazer cair no domínio público. Deste modo, a
divulgação pelo titular implica a destruição da novidade da invenção. E mesmo que venha
a conseguir obter uma patente, ela poderá ser declarada nula mais tarde (114º a) CPI).
Atividade inventiva
O requisito da atividade inventiva (“non obviosness” ou “inventive step”) estabelece
um patamar qualitativo respeitante ao mérito do invento. Uma invenção goza de
“inventividade” quando, para um perito na especialidade, não resultar de maneira evidente
do estado da técnica (artg.54º/2 CPI e 56º CPE).
O artg.54º/3 CPI determina que, a análise da atividade inventiva desconsidere o
conteúdo dos pedidos de patente e de modelos de utilidade a produzir efeitos em Portugal
ainda não publicados à data de pedido da patente, dado que os mesmos não podem influir
sobre a atividade criativa do inventor – o estado da técnica aqui considerado é diferente do
que no requisito da novidade.
Na verdade, este requisito trata-se de um com uma grande dose de subjetividade. Os
peritos não são todos iguais, pelo que aquilo que é evidente para um, pode não o ser, para
outro. Exige-se um especialista no ramo, mas não alguém especialmente dotado ou acima
da média, bastando um técnico competente, adequadamente experiente e atualizado.
Não é fácil determinar aquilo que é ou não “evidente”. Mas exige-se ao inventor uma
certa dose de criatividade ou imaginação, pois a invenção tem que ser algo mais que a
Aplicabilidade industrial
De acordo com o artg.54º/4 CPI, o invento é suscetível de aplicação industrial se o
seu objeto puder ser fabricado ou utilizado em qualquer tipo de indústria ou na agricultura.
Este requisito exprime a ideia de que o invento não pode situar-se apenas no plano abstrato
das criações intelectuais, devendo ter uma concretização tangível e concreta. É necessário
que a solução técnica a patentear possa ser executada com um grau de homogeneidade e
repetibilidade suficientes para tornarem a invenção apta à produção em série.
Este requisito na prática é muito pouco utilizado. Porque, na verdade não se sabe
bem qual é que a aplicabilidade que terá no futuro, e há várias legislações estrangeiras que
o excluem. Porém, ele continua a ser de alguma utilidade, exclui aspetos do domínio do
lunático – tentativas de patentear ideias que manifestamente não atingem os fins que se
propõem, tais como máquinas destinadas ao movimento perpétuo.
Resolução- Em primeiro lugar há que ter caráter técnico, e o método filosófico atual não
parece ter esse requisito. Além disso, não se tem aqui uma invenção que permita resolver
um problema técnico, uma descoberta e uma invenção não são a mesma coisa. Veja-se que
Capacidade inventiva
Aplicabilidade industrial
A invenção tem de ser nova, e ela é considerada nova quando não está
compreendida no estado da técnica. Tem de haver um certo grau de surpresa, de
inesperado do que se está a descobrir, que não seja algo que flui naturalmente do
estado da técnica, porque se for, então não haverá verdadeiramente uma novidade.
Suscetibilidade de aplicabilidade industrial (nº4). É evidente que parece que este
método de análise filosófica, não poderá ser utilizado, nem na indústria, nem na
agricultura, só por si.
É verdade que podemos ter patentes de produto e patentes de processo, mas agora
aqui não há então a possibilidade de registar este método.
Caso 15- O caso do tapa-gravatas
Bernardo inventou um produto invisível que permite proteger as gravatas enquanto se
come sopa. Eufórico, contou aos amigos Carlos e Diana, seus companheiros de sueca.
Estes últimos contaram isso mesmo a Eduardo, que tem um ódio secreto por Bernardo.
Eduardo quer saber se, pelo facto de Bernardo ter revelado nos termos referidos o que
inventou, está afastada a possibilidade de este registar uma patente que tenha aquela
invenção por objeto. O que lhe diria?
Resolução- Em primeiro lugar, temos de ver se depois do que aconteceu, Bernardo pode
registar a patente. A partir do artg.50º (objeto de patente), qual será o requisito que se
pretende discutir aqui? Eduarda está a falar dos requisitos da patenteabilidade, mais
precisamente a novidade da invenção. Pode ser objeto de patente as invenções novas e o
nº1 do artg.54º dispõe que uma invenção será nova quando não estiver compreendida no
caso da técnica. Houve ou não esse tornar acessível ao público a invenção? Sim, quando
avaliamos a novidade da invenção ela não é aferida apenas relativamente aquilo que já
esteja registado – artg.55º/2, é considerado compreendido no estado da técnica, desde que
6.5.- Titularidade
O direito à patente, pertence ao respetivo inventor ou aos seus sucessores por
qualquer título (artg.57º CPI e 60º CPE). No entanto, a maior parte das invenções são hoje
feitas no âmbito de empresas ou universidades que têm ao seu serviço equipas de
investigadores, que “são pagos para inventar”. De quem é a invenção? Existem normas
específicas para regular os casos de invenções realizadas no âmbito de execução de
contratos de trabalho:
Resolução- O artg.58º é aqui decisivo. Temos que dar atenção aos requisitos presentes no
artigo. Desde logo, José como investigador contratado, tem-se que se ver se a atividade
inventiva esteja prevista no trabalho de José (o que é muito provável, sendo José, um
investigador). Se previa a atividade inventiva, e se a descoberta foi feita durante a duração
do contrato de trabalho, nomeadamente, nas horas de trabalho. Segundo o artg.58º/1, se
estiverem preenchidos todos os requisitos a patente pertence à empresa.
Depois, temos de ver se há alguma renumeração pela atividade inventiva no contrato,
se não estiver uma especialmente prevista, será uma dada depois. O nº6 do artg.58º diz
precisamente que se as partes não chegaram a acordo, devem recorrer à arbitragem.
O artg.58º/3 dispõe que, independentemente das situações previstas no nº2, se a
atividade inventiva não estiver prevista no contrato (foi o que aconteceu no nosso caso), e
se ela se integrar na atividade da empresa, então a empresa tem o direito de opção
As patentes de processo
Quando alguém obtém uma patente de processo de fabrico de um dado produto,
adquire o direito de impedir terceiros de empregar o mesmo processo para fabricar o
produto (98º/2 CPI). Porém o titular não se poderá opor ao fabrico desse produto através
de um processo alternativo, já conhecido ou inédito. Neste caso o seu direito não está a ser
violado, pois versa apenas sobre uma das formas possíveis de fabricar o produto.
Neste tipo de situações, quando ocorre um litígio, é crucial saber quem tem o ónus
da prova relativamente ao processo que foi empregue para fabricar o produto suspeito de
contrafação. É claro que o titular da patente, pode sentir grandes dificuldades quanto à
prova, quanto mais não seja por falta de acesso às instalações do terceiro, ou ao
desaparecimento de meios de prova. Já a prova de diversidade do processo será muito
mais fácil, uma vez que a única coisa que o alegado infrator terá de apresentar é a
documentação e demais material probatório necessário para tal. Deste modo, o artg.99º
prevê uma presunção favorável ao titular da patente, que apenas funciona relativamente a
patentes de processo de fabrico de produtos novos. Será então o terceiro a fazer a prova
em contrário, mostrando que, fabricou um produto por um processo diferente daquele
protegido pela patente.
Limites de proteção
Para além dos limites objetivos que resultam do âmbito das reivindicações, a
exclusividade de que goza o titular de uma patente tem ainda outros limites, que resultam
de imperativos de interesses públicos, e da natureza e da função destes direitos privados.
Deste modo, importa assinalar as exceções enunciadas no artg.103º/1 CPI, que dispõe que
os direitos conferidos pela patente não abrangem:
a) Os atos realizados num âmbito privado e sem fins comerciais – é necessário estes
dois requisitos cumulativos. Ex.: se alguém, produz uma grande quantidade de
exemplares de um produto patenteado e os distribui gratuitamente pelo público,
apesar de não haver uma finalidade comercial, o titular da patente poderá ser
manifestamente lesado com isto.
b) A preparação de medicamentos feita no momento e para casos individuais,
mediante receita médica nos laboratórios de farmácia, nem os atos relativos a
medicamentos assim preparados – esta tem hoje uma menor importância, tendo
em conta que é cada vez mais rara a preparação de medicamentos em farmácia.
c) Os atos realizados exclusivamente para fins de ensaio ou experimentais, incluindo
experiências para preparação dos processos administrativos à aprovação dos
produtos pelos organismos oficiais competentes – esta previsão assume uma
enorme importância estratégica, pois permite realizar livremente investigação a
partir de conhecimento técnico abrangido pela patente, que pode acabar por gerar
novas patentes.
d) A utilização de material biológico para fins de cultivo ou descoberta e
desenvolvimento de novas variedades vegetais – trata-se da exceção do produtor de
variedades vegetais, que, conjugada com o previsto no nº3 deste 103º, lhe permitirá
produzir e comercializar essa variedade.
2019/2020 Rita Nina – FDUC 130
e) Atos relacionados com a utilização a bordo de navios de outros países membros da
União ou da OMC, ou de veículos de locomoção terrestre ou aérea desses países,
quando estes meios de transporte entrarem temporária ou acidentalmente em
território nacional – visa permitir a livre circulação internacional dos meios de
transporte.
f) Prevê-se ainda a possibilidade de um agricultor utilizar para fins agrícolas o produto
da sua colheita para fins de reprodução pi multiplicação na sua exploração (103º/1
h) CPI), bem como de animais protegidos ou outro material de reprodução animal
– desde que os materiais em causa tenham sido vendidos ou comercializados de
outro modo ao agricultor, ao titular da patente ou com o seu consentimento.
g) A fim de garantir que as utilizações livres estabelecidas na diretiva/24/CE relativa à
proteção de programas de computador por direito de autor, transposta em Portugal
pelo DL 252/94, de 20 de Outubro, não são neutralizadas pelo direito de patente,
o legislador consagra que ainda são uma exceção relativa aos atos e a utilização das
informações obtidas em termos permitidos pela legislação vigente me matéria de
proteção jurídica dos programas de computador, nomeadamente pelas respetivas
disposições em matéria de descompilação e interoperabilidade (103º/1/j) CPI).
Ascarelli por sua vez, criticou a noção de Vivante por considerar que a mesma
partia exclusivamente dos regimes jurídicos de cada documento em causa, e não da
realidade para que esses regimes tinham sido pensados. Ascarelli dizia que a nota
dominante é colocada no momento da circulação: “documento socialmente considerado
como destinado à circulação que ateste a qualidade de sócio de uma sociedade por ações”.
Esta noção é muito menos precisa, estamos a partir de uma conceção social, a forma como
Ferri, coloca agora a tónica não na consideração social, mas na vontade de quem
cria o documento, se o emitente do documento o destinava à circulação. É impreciso à
mesma, uma vez que estamos a depender da vontade do sujeito, sendo que por vezes é um
pouco impossível saber da vontade do sujeito.
Há muitos autores alemães que escrevem sobre esta matéria, como Brunner
(Alemanha): “o documento que incorpora um direito de caráter privado de tal forma que
para o exercício do mesmo é necessária a posse do documento”. O que ele destacava era,
a incorporação de um direito de caráter privado, e o momento necessário para o exercício
do direito (era necessário ter o documento na posse para exercer o direito). Quanto à
incorporação do direito no papel, esta também era importante.
Um outro autor alemão, Ulmer, criticou brunner por último autor acentuar
somente o momento do exercício do direito. Ulmer, por sua vez, realça a vertente da
disposição – disposição do direito através da disposição do documento (realça-se o
momento da transmissão/disposição do direito).
Não obstante as críticas e alternativas enunciadas, reconhecemos na noção de
Vivante méritos descritivos e um alto valor pedagógico, que permitem a sua utilização para
clarificar o regime dos títulos de crédito. Por isso a exposição que se segue recorrerá com
frequência a essa noção.
5.- Circulabilidade
O professor Soveral Martins acrescenta uma nota à noção de Vivante:
circulabilidade – aptidão para circular de acordo com regras próprias que a favorecem.
Vivante não menciona expressamente esta nota característica, mas consideramos que esta
encontra-se pressuposta.
Esta autonomia e literalidade protegem de certo modo, mas também revelam esta
circulabilidade. Só respeitando estas regras, é que o portador pode invocar a literalidade e
autonomia, sendo que estas, vão proteger o portador mediato. Só que esta literalidade e
autonomia apenas podem ser invocadas se aquele documento chegou às mãos do portador
imediato (não valem nas relações imediatas) – ou seja, foram respeitadas as regras da
circulação, impostas pela lei para aquele título de crédito.
2.- Noção
O que é uma letra? É um documento em papel, que contém uma ordem de
pagamento (“saque”) de uma quantia determinada dada pelo sacador ao sacado e à ordem
do tomador. Quem dá a ordem de pagamento é o “sacador”, e quem recebe é o “sacado”,
à ordem do tomador (o tomador pode ser o próprio sacador, ou um terceiro). Em regra, a
emissão de uma letra ocorre porque existe relação entre o sacador e o sacado e uma relação
entre o sacador e o tomador, que justificam aquela emissão.
A grande diferença entre a letra e a livrança, é que na letra temos uma ordem de
pagamento e na livrança é uma promessa de pagamento. No cheque, vamos ter na mesma
uma ordem de pagamento, só que essa ordem é dada sobre o banqueiro. E o banqueiro
vai ter fundos à disposição do sacador, e esses fundos resultam de uma convenção que
pode ser eventualmente um contrato de abertura de conta, depois de depósito. Há uma
convenção do cheque que levou à entrega de uma caderneta de cheque, e que autoriza o
cliente a mobilizar fundos que tem à disposição junto do banco. O cliente do banco pode
ter esta disposição, por ter aberto lá uma conta. Também podem estar à disposição, porque
o banco concede crédito (contrato de concessão de crédito), que será mobilizado através
do cheque. Já a letra não tem de ser sacada sobre um banqueiro; o sacado também não
terá fundos à disposição do sacador da letra de câmbio.
Tem que constar a palavra “letra” inserta no próprio texto e expressa na língua
empregada para a redação desse título – a obrigatoriedade da inserção da palavra
“letra” resulta da necessidade de alertar qualquer subscritor para a importância do
ato que vai realizar. Isto, tendo em conta que a letra e cada um dos negócios
cambiários têm um regime próprio, que pode implicar consequências gravosas para
o subscritor.
Mandato de uma quantia determinada – no sentido de ser uma ordem de
pagamentos, pura e simples, precisamente por causa da literalidade (é necessário
que tudo resulte do documento). Aquele mandato é o que constitui o saque –
declaração do sacador.
O nome daquele que tiver de pagar (sacado) – é, portanto, a essa pessoa que a letra
será apresentada ao aceite. O nome do sacado deverá ser indicado com a
determinação suficiente para que se possa identificar o sujeito em causa através do
documento.
Data do vencimento – há que ter em conta que a lei determina como ela pode ser
feita: sacada à vista; a um certo termo de vista; a um certo termo de data; ou ser
pagável em dia fixado. Não são admissíveis indicações de épocas de pagamento não
previstas na lei.
Indicação do lugar onde se terá de efetuar o pagamento – lugar de pagamento é,
aqui, não apenas uma localidade (ex.: Coimbra), mas na opinião do Professor
Soveral Martins, um endereço concreto. A letra até pode ser pagável no domicílio
de terceiro. Teremos então uma letra domiciliada. Tendo em conta o disposto no
A letra apenas pode ter uma das modalidades previstas na lei uniforme. O artg.33º
dessa lei identifica as modalidades da letra.
Quando estamos a falar de negócios cambiários, estamos a referirmo-nos a realidade
que podem surgir em momentos diferentes. O documento em causa pode vir a recolher
essas declarações em momentos diferentes. A letra pode primeiro recolher a assinatura do
aceitante, depois a letra é entregue ao tomador indicado que coloca a declaração de
endosso, e só posteriormente é que é colocada a assinatura do sacador (em que apenas aí
é letra). Outro exemplo, o sacador pode colocar a letra da circulação, endossá-la sem ter o
aceite e assim sucessivamente. É evidente que quem recebe a letra por endosso, sem ter a
declaração do aceitante, deve saber que o sacado não assumiu a obrigação cambiária, ele
assume esse risco. A letra pode cumprir já as suas funções, sem ainda ser aceite. Até porque
o sacado pode ter várias razões para não aceitar logo a letra, mas combinar com o sacador
que na data de vencimento aceitará a letra e procederá ao pagamento.
R.18. A letra não tem todos os seus elementos. Esta letra tem uma data de vencimento
(05/01/2020). Só é possível o saque da letra se esta respeitar as modalidades previstas no
artg.33º.
O artg.1º/5 dispõe que a letra deve conter o lugar do pagamento, o que é
importante, porque permitia à pessoa que tinha de pagar, os meios para o local onde teria
de pagar. Com a falta de local para pagar, tal pode ser preenchido através de uma norma
que vai equiparar o lugar do domicílio ao lugar de pagamento. Evidentemente, que pode
dar-se o caso de não haver sequer lugar de domicílio. Numa situação destas, o documento
não valerá como letra, podendo valer apenas como documento particular ou como
documento de reconhecimento de dívida. O documento não é nulo, simplesmente não
produz efeitos como letra.
Veja-se que o lugar do domicílio e o lugar do pagamento, podem às vezes envolver-
se em situações curiosas. O lugar do pagamento pode ser por exemplo, as instalações de
um banco, em que normalmente, haverá um acordo entre o obrigado a pagar e o seu
Se faltar este acordo, o documento não pode valer como letra – estaremos perante
uma letra incompleta.
A lei admite a existência de acordos de preenchimento entre, desde logo, o sacador
e o tomador. Tal admissibilidade resulta do disposto no artg.10º LULL. Se assim
for, se existir um acordo de preenchimento, estaremos perante uma lei em branco.
Neste caso, a imperfeição é apenas tida como passageira.
Mas será que todos os requisitos podem ser deixados para preenchimento posterior?
Na opinião do Professor Soveral Martins, a letra em branco, para poder ser considerada
como tal, terá de conter necessariamente a palavra “letra” e, a assinatura do sacador (que
deverá ter sido colocada com a intenção, por parte do subscritor, de se obrigar
cambiariamente) – estes dois são requisitos que desde o início devem ser cumpridos pelo
documento.
Mesmo que exista acordo de preenchimento, a letra em branco não produzirá efeitos
como letra enquanto for letra em branco – isto é, antes do preenchimento com os requisitos
essenciais em falta.
É muito frequente quando o banco concede o crédito, que obriga o cliente a realizar
determinadas prestações, é frequente o banco exigir que além de o cliente ficar obrigado a
prestar prestações, fique também obrigado a ir buscar fiadores. Exigem então que o
devedor assine uma letra ou uma livrança, normalmente uma letra ou livrança promessa
de pagamento, em branco quanto a alguns elementos. Normalmente os elementos por
preencher são o valor e a data de pagamento. Porque se trata de um crédito a prestações,
portanto não se sabe quanto vai estar em divida quando ele deixar de pagar. Assim, como
a letra/livrança é a garantia da dívida, e a assinatura do sujeito já lá está, fica em branco o
espaço da quantia e a data. Depois o banco irá preencher de acordo com o acordo de
preenchimento.
Normalmente além do seu cliente, vamos encontrar um aval da mãe, do pai, etc. Isto
significa que quando ele deixa de pagar, vai haver uma série de pessoas que serão arrastadas
pelas obrigações cambiárias.
Caso 19- O caso da letra que ainda não era e passou a ser
Alberto, vendedor de eletrodomésticos, sacou uma letra sobre Joana, que a aceitou, para
garantia do pagamento de uma quantia em dinheiro que esta devia àquele por lhe ter
comprado um frigorífico no-frost. A letra foi sacada à ordem de Alberto, que a endossou
posteriormente a Bernardo, seu fornecedor. Na data de vencimento da letra, Bernardo
Resolução- A Joana quando aceita, é o obrigado principal, porque é ao aceitante que deve
ser apresentado na data de vencimento (aceitante porque aceita a ordem que é dada). No
entanto, normalmente quem emite a primeira declaração é o sacador, e o artg.9º diz que o
sacador quando emite a declaração cambiário, é logo obrigado a cambiar, portanto o
primeiro obrigado a cambiar é o sacador, só que é o obrigado de garantia, o obrigado
principal será o aceitante.
A letra foi sacada à ordem de Alberto, sendo ele simultaneamente, sacador e
tomador, podendo ele endossar a letra se quiser. Que foi precisamente o que ele fez,
endossando a letra a Bernardo – o endosso é como se fosse uma nova ordem de
pagamento, por isso é que a letra é um documento à ordem. O Bernardo é um portador
mediato em relação ao que se passou entre Alberto e Joana, agora nas relações entre
Alberto e Bernardo, Bernardo é portador imediato (ele está nas relações imediatas). A
Joana recusa o pagamento, alegando que a quantia era muito superior ao que tinha sido
combinado.
Acontece que a letra tinha sido sacada sem indicação da quantia em dívida em
prestações. Quando a letra é apresentada ao pagamento ela já está totalmente preenchida
(sendo que Bernardo preencheu a quantia). O problema é que Joana alega que o que lá
está não foi o que ficou estabelecido entre Alberto e Joana – acordo de preenchimento.
O artg.10º é o ponto de partida. Por um lado, se realmente a letra foi sacada e aceite
sem conter ainda o montante da quantia e a data de vencimento (ou há acordo de
preenchimento; se não houver, vale a regra do artg.5º/2 e será considerada uma letra “à
vista”), sendo que Joana nada diz relativamente à data de vencimento. O problema está na
quantia da dívida. Havendo acordo de preenchimento quanto a essa quantia temos uma
letra em branco e não uma letra incompleta, porque embora falte elementos essenciais há
um acordo de preenchimento. No artg.10º, a letra incompleta é mal utilizada do ponto de
vista dogmático, tendo-se aí uma letra em branco.
6.- O saque
O saque é a ordem de pagamento que o sacador dá ao sacado. O saque é o negócio
cambiário é o que dá origem à letra.
O saque, está desde logo previsto no artg.1º. Este artigo, referencia a necessidade
de a letra conter o mandato (ordem) puro e simples de pagar numa quantia determinada.
Isto é assim, para garantir uma das características deste tipo de crédito – a literalidade, o
portador mediato deve poder confiar no teor literal do documento, e portanto, não ter que
ser obrigado a realizar indagações fora do título. Isto, permite ter mais confiança no
documento e se é possível depositar mais confiança, torna-se mais fácil negociá-lo. A
circulação é maior, quanto maior for a confiança que se possa depositar.
Quanto às modalidades do saque:
No regime geral das obrigações solidárias, vemos que a culpa entre os diversos
obrigados é diferente, portanto pode-se distribuir de maneira diferente
(internamente) – eles vão responder na medida das suas culpas.
Na LULL, o artg.49º da LULL diz que, a pessoa que pagou a letra, pode reclamar
a soma integral daquilo que pagou (sem ter em consideração a culpa de cada
obrigado).
A data deve ser o dia em que o aceite é dado, a menos que o portador exija a data
de apresentação ao aceite.
8.- O endosso
A letra é um título à ordem, o que significa, que o seu modo normal de circulação é
um endosso. O endosso transmite os direitos emergentes da letra, portanto o endosso tem
desde logo essa função de transmissão. Essa transmissão não pode ser notificada ao
aceitante, o que constitui uma diferença importante relativamente ao regime da cessão de
créditos.
Tal endosso deve constar da letra ou de folha ligada à letra anexo e deverá ser
assinado pelo endossante. O endosso deve ser puro e simples, que funciona para permitir
a literalidade. O endosso não pode ser parcial! Tem de ser sempre total – artg.12º II LULL.
Com o endosso é dado ao sacado uma nova ordem de pagamento – é-lhe dada a
ordem para pagar ao endossado. Por isso se diz que o endosso é o novo saque.
O primeiro endosso deve ser realizado pelo tomador e os seguintes pelos sucessivos
endossados. Desta forma, se garante uma série ininterrupta de endossos. O endosso pode
também ser “em branco”, como veremos a seguir (16º I LULL).
O endosso também poderá ser feito a favor do próprio sacado, seja ou não aceitante,
ou a favor do sacador ou outro obrigado cambiário. Qualquer destas pessoas agora
referidas poderá de novo endossar a letra (reendoso – 11º III LUL).
Mais uma vez, o endosso assume uma responsabilidade de garantia e de pagamento
perante os posteriores portadores da letra – artg.15º LULL, tendo uma função de garantia.
Nessa medida o endossante, será o obrigado cambiário.
O endosso ainda tem uma função de legitimação, pois é através de uma série
ininterrupta de endossos que vamos encontrar o portador legítimo, que é aquele que
justifica a posse de títulos.
Preencher o espaço em branco, com o seu nome ou com o nome de outra pessoa
ou pode remeter para um terceiro, sem preencher o seu nome
o Ex.: A endossa a B, o B está legitimado, o B pode endossar em branco sem
indicar C, e entrega a letra a C, C pode colocar o seu nome lá (e passa a ser
ele o indicado) ou pode querer transmitir a letra a D, colocando o nome de
D lá (C pode ter feito isto, porque não queria ter responsabilidade
cambiária, por exemplo);
Manter consigo a letra como ela está;
Entregar a letra a outrem, sem necessidade de preencher o espaço em branco e
sem necessidade de endossar a letra (14º II, 3º LULL). Neste ultimo caso, como
quem recebe a letra pode voltar a fazer o mesmo, a letra começará a circular como
se fosse um título ao portador.
Ferrer Correia, entendia que o endossante que introduz a cláusula não à ordem ainda
responderia nos termos em que responde o cedente de créditos. A cláusula não à ordem
apenas proíbe a transmissão por endosso mas não proíbe a transmissão por cessão, e que
a conversão do endosso em cessão corresponderia à vontade hipotética dos interessados.
o Ora, esta não é uma posição correspondente à de Soveral Martins. Este por sua
vez, entende que o endossante que proibiu o endosso “não garante pagamento”
aos posteriores endossados, ele parece excluir qualquer responsabilidade de
regresso. Se fosse de aplicar o regime de cessão de créditos às posteriores
transmissões da letra através de endosso, então também a garantia se transmitia –
coisa que a lei não quis.
Modalidades do endosso
Há duas modalidades de endosso:
A letra pode ser utilizada como instrumento para constituir uma garantia a favor de
um credor – contém a menção “valor em garantia”, “valor em penhor”, ou então outra
menção que implique uma caução.
O portador pode exercer todos os direitos emergentes da letra, mas os co-obrigados
não podem invocar quanto ao portador as exceções invocadas perante o endossante que
fez o endosso em garantia, ou seja, não podem invocar exceções fundadas nas relações
pessoais que tivessem com aquele que realizou o endosso em garantia (19º II LULL) – dá-
se maior proteção ao endossado.
Se o endossado em garantia por sua vez endossar a letra, esse endosso apenas vale
“como endosso a título de procuração”, sujeito ao disposto no artg.18º LULL. O
endossado em garantia não se torna por isso titular da letra e dos direitos emergentes dela.
Por outro lado, o endossante em garantia também garante o endossado imediato
quanto à aceitação e pagamento de letra.
9.- O aval
É mais um negócio cambiário, bilateral, pelo qual o sujeito que emite a declaração
garante o pagamento da letra, no todo ou em parte (30º). Poderá ser um negócio que pode
ter natureza parcial.
Este avalista pode obrigar-se a pagar como garante por qualquer obrigado cambiário
(artg.30º II LULL), pode garantir o pagamento pelo sacador, pode garantir o pagamento
por qualquer endossante, pode garantir o pagamento pelo sacado. Podemos ter aqui uma
dupla garantia: o endossante a garantir o pagamento e o avalista a garantir o pagamento
pelo endossante.
O aval deverá indicar a pessoa por quem o avalista o dá (31º). E se essa indicação
não for dada? Poder-se-ia pensar que seria pelo aceitante, mas tal não é assim. Na falta de
indicação, entende-se que o aval é dado pelo sacador (artg.31º IV LULL). Porém quando
a letra não saiu das relações imediatas, é de grande importância saber se é possível alegar
e provar que o aval sem a indicação referida foi dado por pessoa diferente do sacador:
Nas relações mediatas, compreende-se que, para tutela dos interesses relacionados com
a circulação da letra, a presunção não possa ser ilidida. Até porque a prova em contrário
resultaria de factos estranhos ao teor do título. Mas, nas relações imediatas, parece ser de
defender que se trata aqui da oponibilidade de uma exceção fundada nas relações causais
ou extracartulares.
Não está afastada a possibilidade de o aval ser apenas dado como assinatura, sendo
que apenas vale como aval se consta da face anterior da letra, e desde que não seja a
assinatura do sacado ou do sacador. Mas se tem expressões da praxe (ex.: “bom para aval”),
pode valer na face anterior ou posterior.
A responsabilidade do avalista
O avalista responde nos mesmos termos em que responde aquele por quem é dado
o aval (artg.32º LULL), ex.: se o avalista deu o aval pelo o aceitante, responde nos mesmos
termos que ele responde, o que significa que o avalista do aceitante continua a responder
nos mesmos termos que este último ainda quando o portador, por aplicação do disposto
no artg.53º I LULL, perdeu os direitos de ação contra endossantes, sacador e outros co-
obrigados (Ferrer Correia, Gonçalves Dias, Soveral Martins).
Contudo esta obrigação do avalista não é idêntica à obrigação do fiador (apesar do
teor literário do artg.32º LULL). Desde logo, o avalista assume uma obrigação cambiária
que tem características e regime próprio e responde quando a obrigação que garantiu é
nula (salvo em caso de vício de forma). É responsável nos mesmos termos que o avalizado.
O fiador, assume uma obrigação civil (com caraterísticas e regime próprios – arts.627º e ss.
CC) e não responde quando a obrigação principal é inválida. É responsável
acessoriamente.
Quando o avalista paga a letra, ele fica sub-rogado nos direitos emergentes da letra
contra a pessoa por quem deu o aval. Além disso, fica ainda sub-rogado nos direitos
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emergentes da letra contra os que sejam obrigados cambiários para com a pessoa por quem
deu o aval. Suponha-se, então, que o avalizado é o endossante. Pagando a letra o avalista,
ele ficará sub-rogado nos direitos emergentes da letra contra o próprio endossante
(avalizado), bem como nos direitos emergentes da letra contra, por exemplo, a pessoa que
havia anteriormente endossado a letra ao avalizado (um endossante anterior).
Nos termos já desvelados, se a obrigação daquele por quem é dado o aval (o
avalizado) for nula, o avalista só não responderá caso essa nulidade decorra de vício de
forma; em caso de nulidade substancial, a responsabilidade do avalista subsiste (art. 32º
LULL).
Obrigações
A letra pode conter diversas declarações cambiárias de que resultam obrigações para
os respetivos subscritores. As declarações cambiárias apostas na letra, são em regra
independentes entre si. A independência das obrigações cambiárias, resulta do artg.7
LULL. Isto significa que os vícios mencionados que afetem uma das obrigações cambiárias
não se transmitem, na medida do exposto, às obrigações dos outros subscritores.
Ex.: A endossa a B e B endossa a C (sociedade limitada), sendo que C aparece a
endossar, por seus representantes, a D. Aparecem depois dois fulanos, que aparecem a
endossar a letra a D, mas sendo que estes não eram os representantes de C! Ora, D
endossou a E, e E endossou a F. Quem endossou a letra não era gerente da sociedade,
logo não tinha poderes de representação, assim C não ficou obrigado. Mas não é por isso
que as posteriores obrigações são afetadas, E e D também são obrigados cambiários – é
aqui que está a nota da independência recíproca.
Há limitações a esta independência, não sendo ela absoluta:
A obrigação cambiária caracteriza-se por ser abstrata. Tal significa que a obrigação
cambiária é independente da sua causa – a obrigação pode servir qualquer causa, uma vez
que ela lhe é indiferente. Deste modo, perante o portador mediato do título, o devedor
cambiário não poderá invocar, em regra, exceções fundadas nas relações causais
estabelecidas com anteriores portadores ou com o sacador.
Quando falamos em causa, esta pode ser uma “causa remota” ou uma “causa
próxima”. Vamos supor que A compra a B um automóvel, e como A não tem todo o
dinheiro necessário para pagar a B, combinam que A ficará a dever parte do preço.
Acordam que B sacará uma letra à sua própria ordem, A aceitará, da qual consta o
montante em dívida:
Exige-se aqui a intenção de causar prejuízo, uma vez que se bastasse apenas com o
conhecimento de que o devedor seria prejudicado, então qualquer portador teria essa
consciência de atuar em detrimento do devedor, visto que, sabendo que existia uma
exceção que o devedor pudesse invocar contra um anterior possuidor, essa nunca poderia
Atente-se que, caso um portador intermédio se encontre de boa fé, tal facto torna
irrelevante a má fé de um posterior portador da letra. Isto porque nestes casos a má fé do
portador posterior não causa qualquer tipo de prejuízo ao devedor, pois ele já teria que
pagar ao portador mediato anterior que estava de boa fé (pelo que estaria tutelado pelo art.
17º LULL).
Direitos
Literalidade do direito
O obrigado cambiário tem que respeitar o direito do portador nos termos em que
tal direito é definido pelo texto da letra de câmbio. Nesta linha, ao portador mediato de
boa fé não podem ser opostas exceções que se baseiem em acordos, celebrados entre
anteriores sujeitos cambiários, que não tenham manifestação no texto da letra (art. 17º
LULL).
A literalidade anda a par do formalismo, no que diz respeito aos negócios cambiários:
a lei impõe requisitos formais rigorosos (por ex.: a letra tem que conter a palavra “letra”)
sem os quais o obrigado cambiário não está obrigado.
Autonomia do direito
Mais uma vez é uma certa autonomia, que resulta do artg.16º. O legítimo possuidor
da letra tem um direito que é autónomo relativamente aos direitos dos anteriores
possuidores. Nesse sentido, o direito do legítimo possuidor da letra não é afetado por vícios
dos direitos sobre a letra de anteriores possuidores.
Ex.: A aceita uma letra de B endossa a letra a C, sendo que C faz um endosso em
branco, e alguém roubou essa letra, e essa pessoa que roubou entrega a letra a D, que
entrega a letra a E. O que aqui se está a dizer é que o facto de a letra de ter sido furtada,
não vai afetar a obrigação cambiária do nosso aceitante, do sacador e endossante. O que
se diz é que C não pode exigir a letra de volta. O C que ficou sem a letra, não pode exigir
a letra de volta a E.
E é portador da letra. O E justifica o seu direito por uma série ininterrupta de
endossos. Daí que E não seja obrigado a restituir a letra a C e, na data de vencimento, o E
pode exigir o pagamento a A. O direito de E é autónomo.
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Porém, E já teria de restituir a letra se, no momento da aquisição da letra, estava de
má fé ou se, adquirindo-a, cometeu uma falta grave.
O que é má-fé? Entendemos que, má-fé existe quando o portador sabe que o
endossante não tem uma posse regular, mesmo ignorando que essa irregularidade
é consequência anterior do desapossamento.
Falta-grave, é se ao adquirir a letra o portador ignorava a posse irregular do
endossante, mas, atendendo às circunstancias, atuou com falta grave, não merece
proteção conferida pelo preceito em causa. O portador não se rodeou do mínimo
de diligencia exigível atendendo ao caso em concreto.
Ora, face a este regime, importa saber qual o tratamento a dar aos casos em que o
portador está de má fé ou cometeu falta grave, mas em que se prova que um portador
intermédio estava de boa fé. A proteção do portador intermédio implica que a sua boa fé
como que se “estenda” ao portador atual, em termos de não se exigir deste último a
restituição da letra. De facto, como se compreende, ao exigir-se ao portador atual a
devolução da letra, estar-se-ia a prejudicar o portador intermédio, que com a entrega da
letra cumpriu uma dívida e que, em virtude da sua devolução, volta a estar em dívida.
Resolução.
A questão está em saber se o Ramiro está ou não protegido em relação a esse vício
da compra e venda que deu origem à emissão da letra. Numa situação destas, podemos
afirmar que mesmo que ele não tivesse agido com intenção de prejudicar o A, ele tinha a
noção do prejuízo que resultaria dali e que aceitou esse prejuízo.
O que é fundamental nestes casos é apresentar estes critérios. Não se poderia dizer
exatamente que estava prejudicado a intenção de prejudicar, mas ele pelo menos
conformou-se com aquele prejuízo. O D poderia ser considerado de má-fé, e, portanto,
não poderia beneficiar da característica da abstração: a obrigação do A cambiária não ser
afetada em regra, pelos vícios da causa. A causa aqui é a compra e venda (causa remota),
sendo que esta sofre um vício – venda de coisa defeituosa, que se fosse invocada a tempo,
seria anulável. Este vício que afeta a compra e venda não afeta a relação, desde que esteja
dentro das relações mediatas e esta encontra-se nas relações mediatas, porque D nada tem
a ver com a compra e venda. Contudo, esta é uma abstração com limites, que resultam do
próprio 17º. Se o C estiver de boa fé, sendo C portador intermedio, (ele é de boa fe se não
tiver atuado conscientemente em detrimento de A), o C podia invocar a abstração da
obrigação cambiária, logo, se C ignorava tudo o que se tinha passado, estava claramente de
boa-fé, se a letra não tivesse sido endossada, A teria de pagar a C, logo, quando C endossa
a D não está a causar nenhum prejuízo a A, não é com o endosso que se causa o prejuízo
a A. Numa situação destas, não obstante de D ter atuado conscientemente em detrimento
de A, na verdade não há prejuízo porque A teria de pagar a C, caso a letra não tivesse sido
endossada, aqui a abstração vale totalmente. A compra e venda faz parte das relações
imediatas, pessoais entre A e B, sendo C e D estranhos. Esta compra e venda tem vícios,
mas isso não afeta a obrigação cambiária, por isso, é que se fala de uma certa abstração,
certa porque há limites. Há quem diga que a abstração só complica porque a única coisa
que aqui está em causa é um contrato de compra e venda que tem apenas eficácia
obrigacional entre A e B, logo, não há que falar da eficácia disto em relação a C e D que
são estranhos à compra e venda. Ou seja, estes autores dizem que a abstração não
acrescenta nada, estamos simplesmente perante um problema de eficácia inter partes. Mas
não é isso que está a ser discutido, diz SM. O que está em causa é saber se pelo facto de
12.- O vencimento
Modalidades
As modalidades do vencimento das letras de câmbio vêm identificadas no art.33º
LULL. Nos termos deste preceito uma letra pode ser sacada:
À vista: letra pagável à apresentação, isto é, letra que deve ser paga quando é
apresentada para tal – o portador pode exigir o pagamento do sacado a qualquer
momento, desde que dentro do prazo de 1 ano se outro não for estipulado pelo
sacador ou endossantes (art.34º LULL);
A um certo termo de vista: letra que se vence decorrido certo prazo a contar da
data do aceite ou da data do protesto por falta de aceite (art.35º LULL);
A um certo termo de data: letra que se vence decorrido certo prazo a contar da
data da sua emissão (portanto, da data em que a letra foi passada);
Pagável no dia fixado: letra que indica o preciso dia em que a letra é pagável.
13.- Pagamento
O pagamento pode ser exigido pelo portador legítimo da letra. Esse portador será
então legítimo se justificar por uma série ininterrupta de endossos.
A apresentação ao pagamento é, em regra, feita ao sacado, pois é a este que o sacador
dá a ordem de pagamento contida na letra. O sacado que paga pode exigir a entrega da
letra e a quitação correspondente. E pode inclusivamente realizar um pagamento parcial,
que o portador não pode recusar. Contudo, nesse caso o sacado não pode exigir a entrega
da letra. Pode, isso sim, exigir que se faça menção do pagamento parcial na letra e a entrega
na quitação.
Também qualquer dos co-obrigados que foi ou pode ser obrigado, e que pagou pode
exigir a entrega da letra com o respetivo protesto e recido.
De acordo com o artg.48º LULL, o portador da letra pode exigir ao demandado
não apenas o pagamento da quantia constante da letra e dos juros estipulados, mas ainda
dos juros à taxa de 6% desde a data de vencimento. Esta questão dos juros é muito
importante, sendo que a LULL fixa uma taxa de juro de 6%, mas, entretanto, entrou em
vigor o DL 262/83, que permite que o portador possa exigir a taxa que decorre para os
juros moratórios, do artg.4º desse diploma e não a dos artigos previstos no LULL. O que
está em causa, segundo Oliveira de Ascensão, é o que aplica o artg.13º do Anexo II à
Convenção, sendo que, o artg.4º do DL 262/83 é perfeitamente legal à luz daquele artigo,
desde que se entenda aquele como dizendo respeito às “letras, livranças e cheques passados
em Portugal”. Este preceito veio a permitir que o portador exija uma indemnização
relativamente à mora correspondente aos juros legais.
O protesto por falta de aceite ou por falta de pagamento consiste no: “ato formal de
comprovação de recusa de aceite ou de pagamento”.
A importância deste ato é evidente no art.53º LULL – são várias as hipóteses aí
previstas que conduzem à perda de direito de ação contra endossantes, sacador e outros
co-obrigados, á exceção do aceitante (e do seu avalista). Uma das hipóteses referidas é a de
o portador não realizar, nos prazos fixados, o protesto por falta de aceite ou por falta de
pagamento. Os referidos prazos encontram-se enunciados nos arts.44º LULL e 121º e
122º do Código do Notariado. O prazo para o protesto por falta de aceite é o prazo da
apresentação do aceite. Este último pode ser:
Letras sacadas a certo termo de vista: devem ser apresentadas ao aceite dentro do
prazo de 1 ano a contar das respetivas datas;
Letras sacadas a certo termo de data e com data certa: devem ser apresentadas ao
aceite até ao vencimento.
Quanto ao protesto por falta de pagamento, o prazo para o mesmo se realizar pode
ser:
Letras pagáveis em dia fixo, a certo termo de data ou a certo termo de vista: o prazo
é de dois dias úteis seguintes àquele em que a letra é pagável (art. 44º LULL). Aqui
o professor entende que, tal como Oliveira de Ascensão, a LULL fala nos “dois
dias úteis seguintes para designar os dias em que a letra é apresentável ao
pagamento”: ou seja, o vencimento e os dois dias úteis seguintes. Ou seja, durantes
esses dias em que a letra é apresentável a pagamento, ela é pagável. Só depois é que
parece começar a correr o prazo de dois dias uteis para o protesto.
Letras pagáveis à vista: o protesto deve ser feito nas condições indicadas pelo
protesto por falta de aceite. O prazo é o da apresentação a pagamento, ou seja, o
prazo de 1 anos a contar da sua data (art.44º LULL). Se a letra for apresentada no
último dia do prazo, parece que ainda é possível fazer o protesto no dia seguinte:
o Nota: Tratando-se de uma letra pagável à vista e nada foi fixado, quanto à
apresentação ao aceite, o que resulta da lei é que a apresentação é para
pagamento e não para aceite, não sendo para aceite, não há prazo para
realizar o aceite, apresenta-se a letra para pagamento, será pagável nesse
momento, se o sacado recusar o pagamento, tem que fazer o protesto pela
Ainda que não sejam respeitados os prazos para apresentação a protesto, tal não é
fundamento de recusa do mesmo (art.123º LULL). O apresentante pode ter interesse em
obter meio de prova da falta de aceite ou de pagamento.
Caso 20- o caso do sacador que conta com a falta de protesto para não pagar
A «Janota – Comércio de vestuário, S.A.», comprou à estilista Marie Jolie vários vestidos
de noite. Para garantia de parte do preço em dívida, Marie Jolie sacou à sua própria ordem
uma letra, que a «Janota» aceitou. A letra indicava como data de pagamento o dia 1 de
março de 2019. Marie Jolie endossou a letra ao seu fornecedor de tecidos, a quem devia
dinheiro. No dia do vencimento, o fornecedor apresentou a letra a pagamento à «Janota»,
mas esta recusou liquidar a dívida. Hoje, o fornecedor quer saber se ainda pode exigir o
pagamento da quantia aposta na letra a Marie Jolie. O que lhe diria?
Resolução-
Temos aqui uma sociedade anónima. Neste caso, a compra é feita com uma parte
do preço que fica em dívida. Aqui a questão que se coloca é a seguinte: quando uma letra
não é paga e já sabemos que o obrigado principal é o aceitante, há algo que o portador da
letra deve ter a preocupação de fazer – apresentação da letra a protesto. Isto é assim porque
se não é feito o protesto, o portador vai perder uma série de direitos: artg.53º da lei
uniforme. Qual é o prazo para efetuar o protesto? Esta é a questão central do caso. Isto
serve para analisar outras questões, qual seria o prazo para apresentar o protesto. O
protesto é um ato formal.
Fala-se em vários obrigados: temos o principal (aceitante), o obrigado garantido
(sacador). Veja-se que se a aceitação não tivesse lugar, o artg.53º também dizia para se fazer
um protesto para falta de aceite. Se o protesto não era feito dentro do prazo, o portador
perdia direito de ação contra a Marie Jolie (sacador e endossante). O endossante, por sua
vez, também vai ficar sujeito a determinadas responsabilidades – obrigada cambiária. Um
outro obrigado cambiário é o avalista, que pode dar o seu aval a qualquer outro obrigado
a cambiar (artg.30º e ss, sendo que no 32º, dispõe-se que o aval não é uma fiança).
Soveral Martins: uma vez que o avalista responde nos termos em que responde o
avalizado, entende-se que a interrupção da prescrição relativamente ao avalizado
também se estende ao avalista;
Vaz Serra: de acordo com o teor literal do art.71º LULL, a interrupção da
prescrição relativamente ao avalizado não pode abranger também o avalista (eles
não são a mesma “pessoa).
Importa ainda referir que, extinto o direito de ação cambiária, por prescrição, tal não
significa que se extinga pela mesma razão o crédito decorrente da relação fundamental
subjacente. Obviamente, este crédito só subsiste entre os sujeitos parte dessa relação, e não
já quanto aos demais obrigados cambiários.