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17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

DO "JUS VARIANDI"

DO "JUS VARIANDI"
Revista de Direito do Trabalho | vol. 49 | p. 8 | Mai / 1984
Doutrinas Essenciais de Direito do Trabalho e da Seguridade Social | vol. 1 | p. 1039 | Set /
2012DTR\1984\111
Francisco Antônio de Oliveira

Área do Direito: Trabalho

Sumário:

1.Introdução - 2.Da relação jurídica do trabalho: contrato e instituição - 3.Caracteres da


instituição empresa-econômica - 4.Origem da hierarquia - 5.Conceito de hierarquia - 6.Natureza
do poder hierárquico - 7.Fundamentos do poder hierárquico - 8.Limites do poder hierárquico - 9.Da
intensidade - 10.Das alterações unilaterais efetuadas pela empresa - 11.Da variação e gradação
da pena - 14.Do ônus da prova

1. Introdução
A relação de trabalho subordinado na empresa não se confina em um simples negócio patrimonial
nem é uma fugaz transação comercial. Nela se entranham vínculos sociológicos pessoais e
permanentes, observa, e bem, P. Botija. 1 "Agir em comum não é agir paralelamente, como dois
viajantes que seguem o mesmo caminho sem se conhecerem; é compartilhar os encargos, e a
divisão destes implica uma direção que os reparta e ajuste". 2
2. Da relação jurídica do trabalho: contrato e instituição
A relação jurídica de trabalho assume, atualmente, além do seu tradicional aspecto contratual,
uma feição eminentemente institucional, por causa da natureza da empresa econômica moderna,
em que ela se desenvolve. Além do aspecto interindividual, que diz respeito ao empregado e ao
empregador, face a face um do outro, isto é, individualmente considerados, há, na relação de
trabalho subordinado, uma realidade mais profunda, que é a integração de ambos numa
comunidade econômica: a empresa. O tradicional aspecto contratual diz respeito à prestação
individual do trabalho feita pelo empregado ao empregador, que, em contraprestação, lhe paga um
salário. O contrato vincula, deste modo, uma pessoa à outra, por uma relação interindividual,
consistente em cada uma das partes entregar a sua prestação à outra, como foi nele estipulado.
O domínio do contrato é, pois, o estrito campo da justiça comutativa. A instituição une pessoas
que se integram numa comunidade por um vínculo não interindividual, mas intersocial. O moderno
aspecto institucional da relação de trabalho tem por objeto não uma prestação e uma
correspondente contraprestação, mas sim, uma colaboração econômico-social entre os membros
da comunidade da empresa. 3
3. Caracteres da instituição empresa-econômica
Dúvida não há de que a empresa-econômica moderna é uma autêntica instituição econômico-
social. Luiz José de Mesquita 4 nos dá notas características da empresa-econômica:
1.ª a empresa-econômica moderna é uma instituição de direito privado, que desempenha uma
função econômico-social em que, por isso mesmo, predomina sobre o interesse particular de
qualquer das partes individualmente tomadas, o interesse social do grupo, devendo ser
assegurado, acima de tudo, o bem comum dele, subordinado, naturalmente, ao bem comum da
coletividade em geral;
2.ª a empresa-econômica é uma instituição hierarquizada, na qual as pessoas que nela intervém
não estão, funcionalmente, num mesmo plano de igualdade, mas em que há um chefe natural,
sendo ela uma instituição em que cabe ao empreendedor, em princípio, como seu chefe, as
prerrogativas institucionais, no que toca ao exercício do poder legislativo, executivo e judiciário
disciplinar;
3.ª não obstante, o pessoal que nela se integra como fornecedor de força-trabalho pode e deve
ser chamado a participar, realmente, na sua vida jurídica e econômica, já que eles são os que, na
verdade, constituem a comunidade de trabalho e contribuem com a melhor parte para os frutos
econômicos do empreendimento, não desempenhando, ademais, um papel puramente passivo, mas
sim ativo, para o incremento da produção. Assim, intervindo nos seus poderes todos os elementos

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humanos da produção, o empreendedor, os empregados e os fornecedores de capital, a empresa


comunitária constituirá um grupo de estrutura constitucional e democrática.
4. Origem da hierarquia
O que caracteriza a relação de trabalho, como sua nota mais importante, é a atividade humana
produtiva do empregado. Essa atividade humana, além de ser fornecida ao empregador como uma
prestação individual, nos termos em que foi pactuada entre as partes, através do contrato, deve
ser também fornecida dentro de uma relação de colaboração para com a empresa. Tal relação de
colaboração se faz entre a atividade do empregado e a do empreendedor de uma maneira
diferençada, não igualitária, por causa da instituição social empresa-econômica, que exige, por
sua própria natureza, uma hierarquização de funções e atividades. Por isso, a atividade humana
produtiva do empregado, além da relação de colaboração para com a empresa, deve estar, por
causa da natureza da mesma empresa-econômica, submetida à autoridade humana do
empreendedor, por uma relação de subordinação. Assim, pela relação de colaboração, as
atividades do empregado e do empregador se unem entre si, numa mesma linha de finalidade para
com a empresa; porém, como esta, pela sua natureza, é uma instituição social hierarquizada, a
união de suas atividades não se faz num mesmo plano de igualdade, mas, sim, com subordinação
das atividades do empregado às do empreendedor, através de uma dependência hierárquica.
Colaboração subordinada, portanto.
5. Conceito de hierarquia
Hierarquia, vocábulo que etimologicamente quer dizer sociedade governada por uma autoridade
sagrada (gr. ieros, sagrado; arché. autoridade), significa ordem ou grau entre pessoas, unidas por
um vínculo de autoridade, sendo aqui tomada a palavra no sentido de poder exercido sobre a
atividade profissional de pessoas subordinadas umas às outras e unidas por um vínculo econômico-
social na empresa-econômica. Já na relação de trabalho que se processa na empresa, a palavra
hierarquia supõe, necessariamente, uma pluralidade de pessoas, a qual constitui um organismo
social. A função primordial da hierarquia é manter a unidade de ação dos elementos dispersos e
variados.
6. Natureza do poder hierárquico

Segundo Luiz José de Mesquita 5 a relação hierárquica é uma relação de direito entre a atividade
profissional de duas pessoas, sendo, uma sujeito ativo, que é quem exerce o poder em relação a
outra, o sujeito passivo, que deve sofrer o efeito desse poder. Tal poder hierárquico é um direito
institucional, inerente à pessoa investida de autoridade. Somente pela teoria da instituição ele se
justifica. Toda sua natureza é institucional, nada tendo de contratual.
7. Fundamentos do poder hierárquico
Sobre o assunto três concorrentes procuram explicar o fundamento do poder hierárquico: a) a
contratual; b) a do instituto da propriedade privada; e c) a institucional. 6 Quanto à primeira,
afirma Venturi que a natureza jurídica desse poder é contratual (in Il Diritto Fascista dei Lavoro).
Nessa mesma esteira trilham Barassi, Sanseverino, Fantini, De Litala, Pipia, Raggi, Ageo,
Antokoletz, Galart Folch, Orlando Gomes, Pinto Antunes, todos referidos por Nélio Reis (in O Poder
Hierárquico do Contrato de Trabalho).

A segunda corrente é defendida entre nós por Dorval de Lacerda 7 que preleciona: "O que
realmente explica o estado de subordinação do prestador é a sua inferioridade econômica". E mais
adiante, arremata: "Portanto, a origem do poder hierárquico que o empregador possui e o que
justifica e explica a sua existência é o direito de propriedade. No campo econômico e social, ele é
o superior econômico; o trabalhador, o inferior econômico. Tais situaç ões, ou melhor, tais
condições, transportadas para o contrato de trabalho, isto é, o vínculo jurídico que os liga, geram
e explicam, como correlativos, tanto a dependência jurídica ou econômica do empregado, como o
poder hierárquico do empregador. Toda e qualquer explicação, que não é essa, é contingente. Em
abono de sua tese, cita o autor as autoridades de Ubach Chaves, Gaete Barrios, Aida Belmar,
Renato Barrueto, Sinzheimer.

Sobre o assunto, assim se pronunciou o mestre Evaristo de Morais Filho: 8 "... é no direito de
propriedade que reside todo o poder hierárquico e disciplinar". E segue: "Que é no regime de
propriedade privada que reside todo o poder dirigente, hierárquico e disciplinar do empregador
sobre o empregado, mostrou-o toda a escola socialista desde os mais antigos doutrinadores até
hoje. É, portanto desnecessário repisar neste terreno, tão pacífica é a matéria".

Luiz José de Mesquita 9 entende que esse fato econômico não pode ser o fundamento de uma
relação essencialmente pessoal. E assevera: "É verdade que sob o signo do dinheiro e da
propriedade se tem usado e abusado do poder de autoridade, mas jamais podemos dizer, em sã
fundamentação jurídica, que o poder hierárquico, relação fundamentalmente pessoal, derive do
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poder do homem sobre a coisa (André Rouast e Paul Durand, in Précis de Législation Industrielle,
Paris, 1947, p. 111). Um poder assim sem base para tanto e desvirtuado de sua finalidade, como
foi maravilhosamente descrito por Gurvitch (in La Déclaration des Droits Sociaux, p. 168) em suas
próprias expressões: "pouvoir de 1'homme sur 1'homme, pour autant qu'il decoulerait du pouvoir de
l'homme sur les choses", não pode, juridicamente, fundamentar uma superioridade pessoal. Por isso
disse bem Nélio Reis criticando os que vêem no direito de propriedade o embasamento do poder
hierárquico: "Não estaremos longe da verdade se afirmarmos que eles se impressionaram mais com
os aspectos econômicos do que com os aspectos jurídicos que devem presidir à análise do
problema". A Prof.ª Sanseverino, partidária do contratualismo notara já, contra a corrente em foco
que: "il datore di lavoro comanda come creditore, e non come signore (proprietário): piú
precisamente, e tenendo presente Ia citata VII Dich, delia Carta dei Lavoro, il datore di lavoro
comanda, perene titolare di un rapportò obligatorio, in cui si projetta anche Ia sua qualità di
organizzatore responsabile".
A terceira corrente, a institucionalista, vê na empresa uma instituição, isto é, um grupo de
pessoas que realizam um empreendimento econômico-social através de uma organização
permanente. Entre nós Luiz José de Mesquita 1 0 defende essa terceira corrente com apoio em
Brethe de La Gressaye e Laborde-Lacoste. (Introduction Générale a l'Étude du Droit, 1947, pp.
332-333). "Essencial, para a realização dos fins da empresa a existência de órgãos, que a
organizem hierarquicamente, os quais devem ser exercidos, pela direção da mesma, mas tendo em
vista o seu bem comum, e como que por delegação de todos os que participam do grupo humano
constitutivo da comunidade de trabalho. Qual o fundamento desse poder hierárquico? Um direito
subjetivo ou poder jurídico qualquer existe sempre a serviço de um interesse, que é o seu
fundamento. Esse interesse pode ser individual ou social. No primeiro caso, o interesse serve a
pessoas individuais, para seu exclusivo bem particular. No segundo caso, o interesse é comum a
um grupo de homens, a uma coletividade, a um corpo social organizado. Não será difícil, pois,
responder a qual desses interesses serve o poder hierárquico numa empresa, pois ela é uma
instituição, um grupo, um corpo social organizado. O detentor desse poder hierárquico não pode
pretender tirar dele apenas um interesse individual, porque semelhante poder preenche, antes,
uma função social. Seu poder é um direito-função que só existe nos corpos sociais organizados, e
não um direito-interesse exercido por uma pessoa particular para adquirir vantagens para si,
individualmente. O fundamento do poder hierárquico está, portanto, no interesse social ou coletivo
da empresa. Não no contrato, que é, quando muito, e às vezes nem sempre, apenas, uma
condição para o seu exercício. Também não está na propriedade, que nem pressuposto é para a
existência de tal poder".
8. Limites do poder hierárquico
O empregado não se liga à empresa em função de sua pessoa humana, já que a empresa é uma
sociedade imperfeita e não necessária em si mesma. Também não se subordina em função de toda
a sua atividade humana, mas somente em relação àquela necessária para que a empresa atinja a
sua finalidade. Em suma: o empregado subordina-se à empresa tão-somente pela sua mana
profissional. Ensina Tacques Maritain 1 1 que: "assim como subordina todo ele à sociedade segundo
certas coisas que estão nele, mas não totalmente segundo tudo que está nele", assim também a
atividade humana profissional do empregado se subordina toda ela à empresa, segundo certas
coisas que estão nela, mas não totalmente segundo tudo que está nela. 1 2 Temos, pois, que o
exercício do poder hierárquico não pode ser absoluto, nem pode ser desenvolvido de um modo
arbitrário. Com vistas ao controle da vida do empregado, Durand e Jaussaud 1 3 firmam como regra
a possibilidade do exercício de um semelhante poder desde que dentro, no tempo e nos lugares do
trabalho. Fora do estabelecimento é medida excepcional. E arrematam: "Mas, pode ser que assim
não seja, o que acontece quando os atos contrários à moral geral, realizados na vida privada, fora
da empresa, podem ser incriminados em razão da desconsideração que deles resulta para o corpo
social". Exemplo clássico é o da concubinagem entre empregados da empresa. Tanto assim que
Legal e Brethe, para prevenir situações extremas e com intuitos morais, afirmam a possibilidade de
uma cláusula estatutária recusando vantagens pecuniárias, como, por exemplo, abonos familiares,
para os empregados que vivam em concubinagem.
9. Da intensidade
No que concerne à intensidade com que o poder diretivo se manifesta sobre o empregado, em se
cuidando de comando de ordens técnicas, dele naturalmente se subtrai mais ou menos o técnico
ou empregado competente, conforme a necessidade do serviço e sua própria competência
profissional. Nesse sentido é que, à medida que o trabalho se intelectualiza, diminui, geralmente, o
poder diretivo em relação ao trabalhador,
10. Das alterações unilaterais efetuadas pela empresa
É bem de ver que as alterações das condições contratuais, embora feitas com o assentimento do
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empregado, são nulas, desde que, direta ou indiretamente, prejudiciais a ele (art. 468, CLT
(LGL\1943\5)). Assim, v.g., são nulas e proibidas as alterações que importem no rebaixamento de
cargo, na mudança da forma de pagamento de salário se desta redunda em sua diminuição, na
transferência do local de trabalho de um para outro domicílio, na mudança da jornada diurna para
noturna e vice-versa, etc. Entretanto, outras alterações existem que necessitam sejam feitas,
resultantes que são do comando técnico do trabalho e da própria administração da empresa. Em
se cuidando de alterações de caráter ou conteúdo técnico, via de regra, devem ser admissíveis
ainda que unilateralmente provocadas, não se lhes aplicando a vedação do art. 468, CLT
(LGL\1943\5), eis que oriundas do exercício daquilo que Nélio Reis intitula o comando técnico, que
cabe ao empregador exercer como líder que é de uma instituição de fins econômicos. Ensina
Cotrim Neto 1 4 que: "são alterações técnicas, por exemplo, a transferência do empregado de uma
seção para outra, de uma função para outra (desde que compatível, a segunda função, com as
suas condições físicas, com sua capacidade profissional, e não discrepantes do espírito do
contrato), a modificação das normas reguladoras do trabalho, a mudança de horário de trabalho
(sem alteração da duração da jornada), etc., tudo isto, compreende-se, sem agravação das
obrigações do empregado e das condições de trabalho, e dentro do que o bom-senso e a eqüidade
autorizam, sem reprimir, ou contra indicar. Certa ordem de alteração técnica, como a mudança de
local de trabalho, além de proibi-la a Consolidação, em seu art. 469, é formalmente contrária à sua
possibilitação a doutrina nacional e estrangeira, além de certa jurisprudência nacional, desde data
anterior a 1.º.5.43".
O julgador se depara na prática diária com os mais variados casos, onde o bom-senso e a busca
do equilíbrio hão de nortear a sua decisão, aproximando-a o mais perto possível da Justiça.
Merece aqui ser transcrito Acórdão do TRT da 2.ª Região, Relator o Juiz Pedro Benjamin Vieira:
"Se é inaceitável o absolutismo da prestação patronal, também deve sê-lo aquele que é fruto da
imposição unilateral do empregado. Ambos são formas de exteriorização do egoísmo, incompatíveis
com o espírito social que deve presidir ao ambiente em que se desenvolve a relação de trabalho. A
preocupação dominante na Justiça Obreira de proteger o hipossuficiente, não deve levar ao
exagero de se lhe tutelarem todos os caprichos, mormente se atentatórios contra o desejo da
maioria e o bem-estar comum. A transitória e pequena alteração de jornada de trabalho dos
reclamantes, medida de caráter geral, feita não em benefício exclusivo da reclamada, mas da
própria coletividade obreira, constitui uma forma atenuada e, a meu ver admissível, do exercício do
jus variandi, em nada contrária à índole do art. 468 da CLT (LGL\1943\5)" (in LTr 44/890).
Hugo Gueiros Bernardes (LTr 46/660), em comentando às "Limitações do suposto poder
regulamentar" conclui que: "Será melhor, portanto, por ora, considerar o assim chamado "poder
regulamentar" como integrante do poder diretivo ou de comando, de tal modo que se possa dizer,
prima facie que o seu conteúdo é o mesmo: o "trabalho e suas circunstâncias" (Riva
Sanseverino); e o seu limite também é o mesmo: excesso, abuso ou desvio de poder".
11. Da variação e gradação da pena
Existe entendimento mais ou menos generalizado na doutrina e jurisprudência no sentido de que
não cabe ao Judiciário graduar ou variar a penalidade aplicada pelo empregador, quando tal
penalidade não guardou proporcionalidade com o ato praticado pelo empregado.
Discorrendo sobre o assunto, Hugo Gueiros Bernardes (ob. cit.) dispõe que: "Se uma pena não é
juridicamente adequada, deve comportar correção judicial, pois implicou em lesão de norma
vigente. Se uma gradação é excessiva, implicando abuso do jus puniendi, o Poder Judiciário deve
substituir-se ao empregador, para aplicar a pena que imporia se fosse ele próprio. É uma exigência
de eqüidade que leva a corrigir o excesso, preservando o que é válido: utile per inutile non
vitiatur.
Luiz José de Mesquita (in LTr 39/1.125), em analisando o assunto, conclui que: "Quanto à
doutrina, pode dizer-se que ela é já ou tende a ser exatamente oposta à jurisprudência, no
tocante à necessidade de a Justiça do Trabalho rever a sua posição, diminuindo os dias de
suspensão disciplinar impostos, exageradamente ou com rigor excessivo, pelo empregador". Mais
adiante: "Sempre fomos e continuamos a nos bater pela impossibilidade de a Justiça do Trabalho
converter penalidade em outra, aplicar nova ou diferente sanção, dosar a aplicação das sanções
disciplinares, exceto quanto à diminuição de intensidade da mesma penalidade aplicada pelo
empregador, o que se verifica unicamentemente no caso de redução de suspensão, ponto de vista
este que reformulamos, seguindo a maioria dos autores". A seguir o referido autor faz
levantamento sobre doutrinadores que se manifestam prol e contra. Vejamos. Contrários à
dosagem: Cesarino Júnior (in Direito Social Brasileiro, Saraiva, S. Paulo, 1970, 2.º vol., p. 54);
Orlando Gomes e Elson Gottschalk (in Curso de Direito do Trabalho, Forense, 1972, p. 79); Aluysio
Sampaio (in Dicionário de Direito Individual do Trabalho, LTr, 2.ª ed., 1972, verbete "Suspensão
Disciplinar", p. 266); Amauri Mascaro Nascimento (in Compêndio de Direito do Trabalho, 1973, LTr,
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1973, p. 398). Favoráveis à dosagem: Evaristo de Moraes Filho (in Introdução ao Direito do
Trabalho, LTr, 1971, p. 241); Beresford Martins Moreira ("Da Graduação da Pena de Suspensão
pela Justiça do Trabalho", in Revista da Faculdade de Direito de Pelotas, março de 1959); Paulo
Emílio Ribeiro de Vilhena (in "Suspensão disciplinar e graduação da pena pelo Juiz", art. publ. in
Revista LTr 26/445-448); José Martins Catharino (in Compêndio Universitário de Direito do
Trabalho, S. Paulo, 1972, vol. I, p. 42, Ed. Jurídica e Universitária); Antônio Lamarca (in Contrato
de Trabalho, 1959, p. 124, Ed. Revista dos Tribunais); Roberto Barretto Prado (in Tratado de
Direito do Trabalho, Ed. Revista dos Tribunais, vol. I, pp. 162-163).
Prossegue o mesmo autor (ob. cit., p. 133): "A faculdade de apreciar a falta disciplinar e impor a
sanção segundo os ditames do maior ou menor bem administrativo da comunidade, das
conveniências técnicas deste ou daquele modo de punir, da eqüidade, do interesse enfim de se
usar determinada sanção, e aplicada por este ou aquele modo pertence, tudo isso, ao direito
institucional da empresa. Não por causa do princípio da autonomia da vontade, manifestação do
individualismo jurídico e do liberalismo burguês, mas pelo princípio da autonomia da instituição é
que os juízes e tribunais não devem poder assim intervir na vida jurídica da instituição empresa-
econômica.
"O empregador tem o direito de punir o empregado que comete infração contratual, mas a punição
deve guardar proporcionalidade com a falta cometida. Se não houver tal proporcionalidade, abusa
o empregador do seu poder de comando, o qual não é absoluto, como não o são os demais
poderes" (in LTr 44/99).
12. Da relatividade do "jus variandi" dentro do poder diretivo
Preleciona Délio Maranhão que o jus variandi pressupõe, sempre, alteração temporária e que não
afete fundamentalmente a índole da prestação contratual. O respeito à personalidade moral do
empregado constitui barreira intransponível ao uso daquele direito. 1 5 Barassin, in Il Diritto dei
Lavoro, 1949, II, n. 189, p. 311 e ss. e I ns. 84 e 85, pp. 372 a 380, apud Mesquita (ob. cit., p.
75) define os limites a saber: 1.º) a lei e o contrato coletivo; 2.º) a qualificação do empregado.
Quanto ao primeiro o poder diretivo encontra limites nas exigências sanitárias e morais que a lei
particular ou o sistema de direito comum tutelam. Quanto ao segundo - e este é o mais
importante - eis uma norma: o empregador pode modificar a prestação do seu dependente, mas
sempre dentro dos limites do jus variandi, porque a "qualificação" do empregado é também um
estado jurídico e, por isso, um limite ao estado de subordinação. Quanto aos limites resultantes da
qualificação, eles podem ser entendidos num sentido geral e num sentido menos amplo. Refere-se
o primeiro ao trabalho e às circunstâncias atinentes a ele. Quanto ao segundo, e aqui está a
dificuldade, não pode o empregador ultrapassar de tudo o que está circunscrito na qualificação, a
qual pode pôr dois limites ao poder diretivo: do ponto de vista extensivo e do ponto de vista
intensivo. Finalmente, ele estuda a matéria em face da organização da empresa, assunto de muita
importância hodiernamente.

Délio Maranhão, 1 6 pronunciando-se sobre o tema, afirma que: "Os contratos são feitos para
serem cumpridos: pacta sunt servanda. Daí uma conseqüência lógica: qualquer alteração em suas
cláusulas há de resultar, também, de mútuo acordo". E mais adiante: "O Direito do Trabalho,
porém, tem um sentido marcante de proteção aos hipossuficientes e, assim, abrandando a força
do jus variandi e partindo da presunção da coação do empregado, não permite, ainda que por
acordo, alteração que lhe traga, direta ou indiretamente, prejuízos. A pedra-de-toque para a
validade da alteração bilateral do contrato de trabalho é, pois, o prejuízo que dela possa advir ao
empregado".
13. Do "jus resistentiae"
Defeso ao empregado, em tese, deixar de cumprir ordens emanadas da direção da empresa.
Entretanto, em se configurando excesso de poder, poderá fazê-lo, já que pessoa humana e
merecedora de todo o respeito. Nesse sentido as lições de L. J. Mesquita (ob. cit.). 1 7 O
empregado não pode, em tese, recusar o cumprimento de ordens emanadas da direção da
empresa, mas se as mesmas configurarem um excesso de poder, poderá fazê-lo, eis que ele é
também pessoa humana, que deve ser respeitada por todos e protegida pelo direito. Ê sob este
fundamento, que certos fatos, como a sua qualificação profissional, os limites de duração do
trabalho, a periculosidade profissional de que o trabalho possa se revestir, a insuperável
dificuldade na execução da ordem e outros limites, autorizam-no a analisar as ordens que recebe
com visos de legalidade, a fim de exercer o seu jusresistentiae. Alicerçada nesse fundamento, a lei
proíbe seja o trabalhador tratado com rigor excessivo (art. 483, "b" da CLT (LGL\1943\5)) ou
"exigidos serviços superiores às forças do prestador" (art. 483, "a", da CLT (LGL\1943\5)).
Observa Délic Maranhão: 1 8 "Daí o jusresistentiae, o direito que tem o empregado de se opor às
determinações ilegais do empregador", às que fujam à natureza do serviço ajustado, que humilhem
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ou diminuam moralmente ou que o coloquem em grave risco. Decidiu, por isso, o Supremo Tribunal
Federal que: "Não constitui ato de indisciplina o do empregado que recusa transferência ilegal (2.ª
Turma, AI 18.967, Relator Hahnemann Guimarães)".
14. Do ônus da prova
Diz Venturi muito judiciosamente que: "Do reconhecimento desta faculdade de ação pertencente
ao empregado, deve deduzir-se que o empregador tem sempre a obrigação de notificar o
empregado de sua falta ou pelo menos de lhe dar comunicação do motivo pelo qual lhe foi infligida
qualquer sanção". Continuando, Venturi, com base numa opinião de Barassi, sustenta a tese de
que ao empregador compete provar a justiça da sanção aplicada e não ao empregado a injustiça
da mesma. Uma visão apressada nos poderia induzir à conclusão contrária, segundo o brocardo
ônus probandi, incumbit et qui dicit: mas, o certo é que a prova compete ao autor do
procedimento que se pretende ilegítimo, pois à justiça trabalhista se aplicam os princípios gerais
referentes à prova dos fatos jurídicos. Deve, portanto, sustentar-se que ao autor incumbe a
prova dos fatos normalmente constitutivos do direito que reclama e à parte contrária a dos fatos
impeditivos ou restritivos que impediram a formação daquele direito ou o paralisaram. 1 9

1 . Curso de Derecho del Trabajo, Madrid, 1948, p. 176.

2. Georges Renard, La Philosofie de L'Institution, Paris, Sirey, 1939, p. 138.

3. L. J. Mesquita, Direito Disciplinar do Trabalho, Saraiva, 1950, p. 11.

4. Ob. cit., p. 37.

5. Ob. cit., p. 43.

6. Nélio Reis, "O poder hierárquico do Contrato de Trabalho", in Tratado de Seguro Social, julho de
1946, pp. 205-217.

7 . A Renúncia no Direito do Trabalho, p. 45 .

8 . Contrato de Trabalho, 1974, pp. 123-124.

9. Ob. cit., p. 46.

10. Ob. cit., p. 47.

11 . La Personne et le Bien Commun, 1947, pp. 63-64.

12. L. J. Mesquita, ob. cit., p. 49.

13 . Traité de Droit du Travail, Paris, Dalloz, 1947. l, p. 434.

14 . Contrato de Relação de Emprego, p. 116 .

15 . Direito do Trabalho, FGV, 1974, p. 219.

16. C. A. Barata Silva, Compêndio de Direito do Trabalho, LTr, 1978, pp. 225 e ss.

17. Ob. cit., p. 104.

18. Ob. cit., p. 31.

19. L. J. Mesquita, ob. cit., p. 108.


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