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DIREITO DO TRABALHO

■ 1.1. CONCEITO DE DIREITO DO TRABALHO


O estudo do conceito de Direito do Trabalho permite identificar o
conteúdo e a extensão desse ramo da Ciência do Direito, ou seja, a
partir do conceito é possível distinguir a relação jurídica base que
compõe o seu objeto, os sujeitos que integram tal relação jurídica e a
finalidade das normas jurídicas que o compõem.
Em relação ao conteúdo amplo do Direito do Trabalho podemos, a
partir de uma síntese simplista, dizer que é representado pelo conceito
fundamental de trabalho. Assim, de forma genérica, é possível
afirmar que o Direito do Trabalho é o ramo do Direito que disciplina
as relações de trabalho.
No entanto, conform e visto acima, o conceito não pode se ater
apenas ao conteúdo, mas é necessária também a fixação de sua
extensão, ou seja, é preciso definir quais os tipos de trabalho
abrangidos pelo conteúdo do Direito do Trabalho, quais são os
sujeitos que integram a relação jurídica específica e qual o
fundamento desta regulamentação.
Considerando que trabalho é uma expressão genérica que abrange
toda e qualquer forma de prestação de serviço de uma pessoa física a
outrem (trabalho autônomo, trabalho eventual, trabalho voluntário
etc.), podemos afirmar que nem toda atividade considerada como
trabalho é regulada pelo Direito do Trabalho.

Existem diversas formas de trabalho, sendo certo que somente uma


dessas formas compõe o objeto do Direito do Trabalho e é por ele
regulada. Trata -se da relação de trabalho subordinado, que tem
características específicas que a diferenciam das demais formas de
trabalho e que estudaremos mais adiante. Portanto, o objeto do Direito
do Trabalho é a relação de trabalho subordinado, também denominada
relação de emprego.
Os sujeitos dessa relação jurídica são empregado e empregador, que se
relacionam não só no âmbito individual, mas também no coletivo,
através dos Sindicatos.
O fundamento do Direito do Trabalho é a proteção ao trabalhador,
partes economicamente mais fraca da relação jurídica, à semelhança
do Consumidor. Sem a proteção jurídica ao trabalhador, a relação
jurídica se mostra desequilibrada, portanto, injusta, desigual.
Assim, de maneira objetiva, podemos conceituar o Direito do
Trabalho como o ramo da Ciência do Direito composto pelo conjunto
de normas que regulam, no âmbito individual e coletivo, a relação de
trabalho subordinado, que determinam seus sujeitos (empregado e
empregador) e que estruturam as organizações destinadas à proteção
do trabalhador.

A conceituação do Direito do Trabalho pela doutrina não é, no


entanto, tema tratado de forma simples. Embora o conteúdo e a
extensão também sejam a base das definições de Direito do Trabalho
enunciadas pelos diversos doutrinadores, estes divergem em relação
ao enfoque dado, ou seja, há quem considere o Direito do Trabalho
como o ramo do Direito de tutela ou de proteção dos trabalhadores,
formando a chamada teoria subjetivista.
Outros autores entendem que a visão subjetivista, ligada aos sujeitos
tutelados, não é suficiente para definir o Direito do Trabalho, devendo
ser levado em conta o objeto das relações de trabalho (teoria
objetivista). Alguns outros afirmam que tanto o enfoque dos sujeitos
como o enfoque do objeto isoladamente são insuficientes para se
conceituar o Direito do Trabalho, ou seja, a sua definição, além dos
sujeitos e do objeto, deve necessariamente incluir os aspectos que o
diferenciam dos demais ramos do Direito (teoria mista).
Assim, identificaremos a seguir os elementos encontrados nas
definições doutrinárias do Direito do Trabalho, elementos estes que
variam conforme a teoria adotada.

1.1.1. Teoria subjetivista

Subjetivistas são as definições de Direito do Trabalho que têm


como enfoque os sujeitos da relação jurídica por ele regulada, isto é,
os trabalhadores e os empregadores.
A teoria subjetivista adota como centro da definição do Direito do
Trabalho o caráter protecionista das normas que o compõem. Os
doutrinadores adeptos de tal teoria tem como fundamento a busca
constante de meios para se alcançar a melhoria da condição
econômica e social do trabalhador.
Assim, para os subjetivistas, o Direito do Trabalho se caracteriza
como o Direito especial de proteção aos trabalhadores, como o
conjunto de normas que têm por finalidade proteger a parte
economicamente mais fraca (hipossuficiente) da relação jurídica, qual
seja, o empregado.

1.1.2. Teoria Objetivista

Forma a teoria objetivista as teorias que têm em vista a relação de


emprego e seu resultado (trabalho subordinado), e não as pessoas que
participam daquela relação. Em tais definições, a relação jurídica de
emprego é disposta como objeto do Direito do Trabalho.
Enquadra -se como objetivista a definição de Orlando Gomes e
Elson Gotts Gottschalk: “Direito do Trabalho é o conjunto de
princípios e regras jurídicas aplicáveis às relações individuais e
coletivas que nascem entre os empregadores privados — ou
equiparados — e os que trabalham sob sua direção e de ambos com o
Estado, por ocasião do trabalho ou eventualmente fora dele”.
O enfoque conceitual está portanto, na relação jurídica de dependência
ou subordinação que se forma entre as pessoas que exercem certa
atividade em proveito de outrem e sob suas ordens.

1.1.3. Teoria Mista

As definições mistas são aquelas que fazem combinação entre os


elementos subjetivos e objetivos, isto é, consideram tanto o sujeito
como o objeto da relação jurídica regulada pelo Direito do Trabalho,
além da finalidade do conjunto de normas que compõem este ramo da
Ciência do Direito.
A maioria dos doutrinadores contemporâneos assumiu uma
conceituação do Direito do Trabalho a partir da teoria mista.

Para Amauri Mascaro Nascimento, o Direito do Trabalho é “o ramo


da ciência do direito que tem por objeto as normas jurídicas que
disciplinam as relações de trabalho subordinado, determinam os seus
sujeitos e as organizações destinadas à proteção desse trabalho, em
sua estrutura e atividade”.
Para Amauri Mascaro Nascimento, o Direito do Trabalho é “o ramo

Desta forma, as definições que se fundam na teoria mista consideram


a ciência do direito que tem por objeto as normas jurídicas que
disciplinam as relações de trabalho subordinado, determinam os seus
sujeitos e as organizações destinadas à proteção desse trabalho, em
sua estrutura e atividade”.

1.2 – EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DO TRABALHO

Trabalho é toda atividade desenvolvida pelo homem para prover o


seu sustento e para produzir riquezas e, ao longo do tempo,
diversas foram as suas formas, que variaram conforme as condições
históricas que vigoraram em cada época.
A história do trabalho começa exatamente quando o homem
percebe que é possível utilizar a mão de obra alheia não só para a
produção de bens em proveito próprio, mas também como forma de
produzir riquezas. Assim, o trabalho se desenvolve e torna –se
dependente e ligado às relações sociais e econômicas vigentes em
cada período histórico específico.
Escravismo, feudalismo e capitalismo podem ser considerados como
marcos históricos definidos na evolução das relações econômicas e
sociais e, consequentemente, na evolução do trabalho humano e de
suas formas de proteção.
No período histórico que pode ser caracterizado como de
sociedade
pré -industrial — que tem início nos primórdios da humanidade e
vai até o final do século XVIII, quando se inicia a chamada
Revolução
Industrial —, várias são as formas de trabalho encontradas, das
quais
podemos destacar, em momentos distintos, a escravidão, a
servidão e as corporações de ofício.
No entanto, até pelas características de cada uma dessas formas de
trabalho, não há, na sociedade pré -industrial, como se falar em um
sistema de normas jurídicas de proteção ao trabalhador e, muito
menos, em Direito do Trabalho.
Em todas as sociedades que nesse período histórico adotaram a
escravidão como modo de produção, o trabalho era executado por
quem, em razão de sua própria condição, era destituído de
personalidade, sendo equiparado a coisa, incapaz de adquirir
direitos
e de contrair obrigações. Desta forma, resta evidente que a
escravidão era absolutamente incompatível com a ideia de direito. A
condição do escravo era da mais absoluta inferioridade jurídica em
relação aos demais membros da sociedade, homens livres, para
quem o trabalho era visto como impróprio e até desonroso.
Durante a Idade Média, a principal forma de prestação de trabalho
era a realizada pelos camponeses, na modalidade de servidão,
que,
apesar de não apresentar grandes diferenças em relação à
escravidão, pois os trabalhadores ainda não tinham uma condição
livre, caracterizava -se por uma certa proteção política e militar
prestada ao servo pelo senhor feudal, dono das terras. Os servos
eram obrigados a entregar parte da produção como preço pela
fixação na terra e pela defesa recebida, sendo que os senhores
feudais detinham um poder absoluto no exercício do controle e
organização do grupo social.
Não havia, portanto, como se falar em direito dos trabalhadores.
Com o declínio da sociedade feudal e o consequente
desenvolvimento do comércio, atividades urbanas, como a produção
artesanal de bens, foram estimuladas. Com isso, surgiram os
artesãos profissionais, sendo que muitos deles eram os antigos
servos, que tinham algum ofício e até então o praticavam
exclusivamente para seus senhores.
Visando assegurar determinadas prerrogativas de ordem comercial e
social, os artesãos fundaram associações profissionais, dando início
às chamadas corporações de ofício. Em todas as cidades, havia
umacorporação para cada tipo de atividade especializada. Nelas
agrupavam-se os artesãos ou comerciantes do mesmo ramo, em
uma
determinada localidade, compostas pelos mestres, pelos
companheiros e pelos aprendizes.
A disciplina das relações de trabalho existentes nas corporações era
prevista em estatuto próprio de cada uma delas. Nas corporações
de
ofício, a produção era integrada, mas ainda não havia uma ordem
jurídica semelhante ao Direito do Trabalho, embora existisse maior
liberdade do trabalhador.
Com o surgimento dessas corporações, a vida econômica e social
sofreu uma profunda transformação, mas ainda assim não se podia
falar em inteira liberdade de trabalho, pois a sua estrutura baseava-
seno controle, não só profissional, mas também pessoal, que o
mestre exercia sobre os trabalhadores a ele subordinados. Além
disso, a corporação impunha diretrizes fundamentais que
subordinavam os seus integrantes, que tinham seus ofícios por ela
limitados e regulados.
Portanto, durante este longo período histórico, inexistiu qualquer
sistema de proteção jurídica dos trabalhadores e,
consequentemente,
não se pode falar em Direito do Trabalho.

1.2.2. Sociedade industrial


O declínio da sociedade feudal, o crescimento das cidades e o
desenvolvimento e ampliação do comércio levaram a Europa
Ocidental, a partir de meados do século XVIII, a um extenso
processo de transformação que marcou o estabelecimento do
sistema capitalista como modelo econômico dominante.
O acúmulo de capitais pela burguesia permitiu investimentos na
produção, que propiciaram o aperfeiçoamento das técnicas e a
invenção e desenvolvimento de máquinas capazes de fabricar
milhares de produtos em pouco tempo.
As mudanças na forma de produção levaram a uma grande
transformação socioeconômica, que, em seu conjunto, denominou –
se Revolução Industrial.
Sob o aspecto social, a sociedade tipicamente rural se transformou
em uma sociedade urbana. No âmbito econômico, a produção,
que até então era artesanal, passou, com o aperfeiçoamento dos
métodos
produtivos e o avanço tecnológico, a ser uma produção em larga
escala. As pequenas oficinas dos artesãos foram sendo substituídas
pelas fábricas. As ferramentas foram sendo substituídas pelas
máquinas. No lugar das tradicionais fontes de energia, passaram a
ser utilizados o carvão e a eletricidade.
Como consequência das mudanças sociais e econômicas, as
relações de trabalho também se modificaram.
A Revolução Industrial fez surgir o trabalho humano livre, por
conta alheia e subordinado, e significou uma cisão clara e
definitiva entre os detentores dos meios de produção e os
trabalhadores.
Com o objetivo de ampliação dos mercados consumidores e de
obtenção de uma lucratividade cada vez maior, os donos das
fábricas
queriam mais liberdade econômica e mão de obra barata para
trabalhar nas fábricas. Pagava -se o menor salário possível,
enquanto
se explorava ao máximo a capacidade de trabalho dos operários.

O liberalismo econômico, aliado ao não intervencionismo o


Estado nas relações econômicas e sociais (Estado Liberal) e ao
individualismo que marcava o campo jurídico de então (todos
frutos da Revolução Francesa de 1789), fez com que a
desproporção de forças do trabalhador frente ao empregador se
agravasse, o que gerou uma realidade de grave injustiça no modelo
das relações de trabalho e levou ao surgimento da chamada
Questão Social, ou seja, a luta entre capital e trabalho derivada
do estado de extrema exploração em que se encontravam os
trabalhadores.

O sistema jurídico derivado da Revolução Francesa, fundado em


conceitos abstratos de liberdade e igualdade, permitiu que, como
decorrência da Revolução Industrial, surgisse um cenário de
extrema
injustiça social, no qual a natural desigualdade econômica
entre aspartes da relação de trabalho era acentuada.

A crise social se agravava e mesmo aqueles que defendiam o


liberalismo começaram a perceber que o Estado não poderia
permanecer por muito mais tempo sem atender aos anseios da
sociedade e sem intervir nas relações individuais a fi m de
assegurar uma igualdade jurídica entre trabalhadores e
empregadores, sob pena de comprometer a estabilidade e a paz
social.

O rico e caloroso debate ideológico que surgiu na época e que se


fundamentou na valorização do trabalho e na necessidade de
modificação da condição de exploração em que se encontravam os
trabalhadores levou à publicação, em 1848, do Manifesto
Comunista, escrito por Marx e Engels, no qual as ideias do
socialismo científico são difundidas, e, ainda, à publicação pelo Papa
Leão XIII, no final do século XIX (1891), da Encíclica “Rerum
Novarum”, caracterizando-se como marco no surgimento da
doutrina social da Igreja Católica.

As idéias defendidas em tais documentos tiveram grande relevância


no surgimento do Direito do Trabalho, à medida que contribuíram
para que o Estado percebesse que não podia deixar a
regulamentação das relações de trabalho à livre negociação das
partes interessadas, passando então a intervir na ordem econômica
e social e a fixar normas coativas, com condições mínimas de
proteção que deveriam
ser respeitadas pelos empregadores.
Assim, a evolução histórica do trabalho humano leva ao surgimento
de uma legislação estabelecendo normas mínimas de proteção ao
trabalhador, cuja importância foi aumentando com a evolução
econômica e política dos países.
O trabalho assalariado e subordinado que caracteriza a relação
de emprego passou a ser regulado de forma ampla, estando sujeito
a mecanismos de proteção contra eventuais arbítrios do
empregador, ou seja, houve limitação da vontade das partes, à
medida que não se
poderia mais negociar livremente as condições de trabalho.
Surge, então, o Direito do Trabalho, substituindo “a igualdade pura
pela igualdade jurídica, como regra de direito que impõe o interesse
geral sobre o particular sem que, entretanto, se anule o indivíduo”.
A partir de então o Direito do Trabalho se fixa como estrutura
de proteção do trabalhador e entra em um processo de evolução
contínua e dinâmica, tendo em vista a própria dinamicidade das
relações sociais e econômicas que dele são inseparáveis.

Os sistemas de proteção do trabalhador resultantes da evolução


ocorrida após a Revolução Industrial deparam-se atualmente com
uma nova revolução tecnológica — a da informática e das
telecomunicações, que tem imposto significativas modificações nos
modos de produção e, consequentemente, nos empregos, à medida
que se verifica uma automatização da produção e dos serviços,
levando, em muitos casos, à substituição do ser humano por
máquinas e robôs.
Assim, no contexto de sua evolução, o Direito do Trabalho convive
nos dias atuais com os efeitos da globalização econômica e,
paralelamente, com elevados índices de desemprego, caracterizando
uma nova realidade socioeconômica que terá que ser enfrentada.
A flexibilização das leis trabalhistas, que tem se ampliado nos
diversos ordenamentos jurídicos, coloca no centro das discussões a
função primordial do Direito do Trabalho, que é a proteção do
trabalhador, revelando, em certa medida, uma piora das condições
de trabalho, inclusive no que tange a salários, e algumas incertezas
para o futuro.

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