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I.

INTRODUÇÃO

Noção, objecto e âmbito de aplicação do Direito do Trabalho

Definição do Direito do Trabalho1

O Direito do Trabalho, também conhecido por Direito Laboral, pode ser definido como
sendo a parte do ordenamento jurídico constituído pelas normas e princípios jurídicos
que disciplinam as relações de trabalho.

Contudo, o trabalho é polissémico, pois pode designar actividade (encarreguei A de


polir móveis); esforço (dá muito trabalho estudar problemas científicos); o emprego (ir
ao trabalho); o resultado de uma actividade ou obra (foi premiado o trabalho científico
de mérito); factor de produção (componente de custos de produção); classe ou
conjunto de classes sociais (o Governo quis ouvir o mundo do trabalho) ou os
representantes do trabalho.

Mas para efeitos do Direito do Trabalho, releva basicamente o conceito de trabalho


quando pretende significar uma actividade; uma actividade entre pessoas e, portanto,
a actividade prestada a alguém ou a favor de alguém.

Mas conforme veremos a seguir, nem todo o trabalho prestado a favor de alguém
interessa o Direito de Trabalho.

Objecto do Direito do Trabalho

O Direito do Trabalho não é o Direito de todo o trabalho; não toma como objecto de
regulação de todas as modalidades de exercício de uma actividade humana produto ou
socialmente útil.

Como ramo do Direito, o seu domínio é dos fenómenos de relação, excluindo-se dele
actividades desenvolvidas pelos indivíduos para a satisfação imediata de necessidades
próprias (preparação de uma refeição, arrumação da casa, condução de uma viatura
pessoal, etc)2.

Mas as mesmas actividades podem entrar no objecto do Direito do Trabalho quando


assumam as seguintes características:

Trabalho livre: trata-se de trabalho voluntariamente prestado, afastando assim as


actividades forçadas ou compelidas; de um modo geral aquelas que não resultam de

1
Lobo Xavier , Curso de Direito do Trabalho.
2
Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho.

1
um compromisso livremente assumido mas uma imposição externa (da lei ou
autoridade pública).

Excluem-se assim do objecto do Direito do Trabalho o trabalho escravo (proscrito no


Direito moderno), o trabalho penitenciário quando compelido, como é o caso do
trabalho a favor da comunidade prevista no Código Penal.

É verdade que o compromisso de trabalhar pode ser determinado por necessidades


iniludíveis de subsistência. Mas a liberdade que está em causa na definição do
Direito do Trabalho é uma liberdade formal que consiste na possibilidade abstracta
de aceitar ou recusar um compromisso de trabalho, de escolher a profissão ou
género de actividade, nos termos do artigo 84 da CRM, e de concretizar tais
escolhas mediante negócios jurídicos específicos, ao contrário do que ocorre com o
serviço militar obrigatório, trabalho penitenciário, requisição civil, etc,.

Por isso que o Direito de Trabalho desenvolve-se em torno do contrato de trabalho,


que é título típico do exercício dessa liberdade.

Trabalho em proveito alheio: refere-se a actividades para satisfação imediata de


necessidades de outra pessoa (e, ainda assim, em benefício indirecto de quem as
realiza, se forem remuneradas).

Não relevam para efeitos do Direito do Trabalho situações tais como a do Agricultor
que cultiva aos seus campos e colhe e vende a produção. Por isso se diz que há um
acto de “alheação” ou alienação, em que o trabalhador transfere para outrem
actividade que resulta do seu trabalho.

Trabalho subordinado: ainda que livre, a actividade que interessa o Direito do


Trabalho é exercida subordinadamente, isto é, sob ordens e direcção da pessoa que
aproveita a respectiva utilidade. A subordinação não é propriamente uma dependência
pessoal ou servil, mas sim funcional, informado pelo princípio da igualdade. É no
sentido de que a prestação do trabalho terá de ser fixado o como, onde e quando e há
uma necessidade de conexionar com todas as outras prestações e com diversos
factores de produção, o que supõe relações de autoridade.

Dai a diferença com a prestação de serviço, pois este corresponde a um trabalho


autónomo, como é o caso do trabalho de um artesão que realiza uma peça ou de
um médico que trata o doente no seu consultório, embora certas situações sejam
económica e sociologicamente muito próximas das que constituem objecto do
Direito do Trabalho.

Mas nem todo o trabalho subordinado constitui objecto do Direito do Trabalho: o


trabalho subordinado dos funcionários do Estado é objecto do Direito Administrativo.

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Trabalho remunerado: ao Direito do Trabalho só interessa o trabalho remunerado,
aquele que se realiza mediante uma contrapartida económica fornecida pelo seu
beneficiário directo. O trabalho gratuito só comporta três possibilidades na sua relação
com o Direito:

Ou é juridicamente indiferente, quando se insere no quadro das relações familiares,


afectivas, de cortesia, de filantropia;

Ou se apresenta sob formas ilícitas e liminarmente rejeitadas pela ordem jurídica que
assim se abstém de regular as condições da sua realização (servidão ou trabalho
forçado);

Ou, enfim, surge de modo inespecífico, como objecto de uma doação ou de um


contrato de outra natureza, sujeitando-se às regras gerais que sejam aplicáveis a tais
figuras.

Em suma o Direito de Trabalho regula as relações jurídico-privadas de trabalho livre, a


favor de outrem, remunerado e subordinado.

Âmbito do Direito do Trabalho:

O âmbito ou conteúdo do Direito do Trabalho, de acordo com a noção apresentada,


pode ser descrito com referência a três núcleos fundamentais de normas:

Normas respeitantes as relações individuais de trabalho: determinada pelo


contrato individual de trabalho, que tem como sujeitos, o trabalhador e a entidade
empregadora. Neste tipo de relações estão em jogo interesses meramente individuais e
privados. Referem-se à dinâmica e ao conteúdo das relações jurídicas entre o
empregador e o trabalhador individualmente considerados, e portanto, as normas
relativas ao contrato de trabalho, aos contratos especiais de trabalho (trabalho rural,
doméstico, marítimo) e ainda a contratos equiparados ao contrato de trabalho.

Normas respeitantes as relações colectivas de trabalho: em que os sujeitos da


relação individual de trabalho aparecem considerados do ângulo das categorias em que
inserem, podendo resultar delas a regulamentação de relações por via de convenção
colectiva. Estão em jogo interesses colectivos, de classe, categoria profissional ou ramo
de actividade económica. Há a considerar desde logo as normas que dizem respeito a
organização dos sujeitos de natureza colectiva que se estabelecem de forma
institucional no âmbito da empresa (comissões sindicais, comissões de trabalho); de
forma conflitual (greve e lock-out); de forma consensual (meios de composição pacífica
de conflitos – conciliação, mediação e arbitragem – e o instrumento privilegiado da
concertação social que é a convenção colectiva de trabalho);

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Normas respeitantes as relações entre o empregador e o Estado: cujo conteúdo
consiste em certo número de deveres que ao primeiro incumbe observar no
desenvolvimento da relação individual, inspirados na tutela dos interesses gerais que
relevam ao trabalho, cuja fiscalização incumbe ao segundo. Estão em jogo interesses
públicos, pois tem a ver com o direito de protecção de trabalho, cujas normas impõem
não só as entidades empregadoras mas também aos trabalhadores, deveres jurídicos
frente ao Estado para a tutela directa do trabalho, e cuja execução é assegurada
através de meios administrativos e coercivos especiais.

Trata-se, sobretudo, da legislação sobre a segurança e higiene no trabalho,


reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais, sobre períodos máximos
de duração do trabalho e ainda normas que tutelam as actividades de certos
estratos particularmente sensíveis (trabalho de mulheres, menores e de deficientes).

Natureza jurídica do Direito do Trabalho

Tradicionalmente, o Direito tem sido dividido em dois grandes grupos: Público e


Privado. Por conseguinte, fixar a natureza de um ramo da ciência jurídica é estabelecer
em qual dos grandes grupos clássicos se enquadra.

Várias são as teorias elaboradas para delimitar os critérios de classificação dos ramos
do Direito, as quais foram objecto de estudo em outras disciplinas jurídicas. O que nos
interessa neste momento é saber em qual dos dois grupos se enquadra o Direito do
Trabalho.

Contudo, diversas são as correntes doutrinárias que procuram estabelecer a taxonomia


do Direito do Trabalho, cada uma apresentando argumentos e enfoques diferenciados.
Com efeito;

A corrente do Direito Público considera o Direito do Trabalho como Direito Público,


com o fundamento no facto de que existem, no Direito do Trabalho, normas de carácter
imperativo, para além de conter normas semelhantes as normas aplicáveis aos
servidores públicos.

Entretanto, tais argumentos não prosperam visto que a natureza jurídica de um


ramo do Direito não se determina pela imperatividade ou dispositividade de suas
normas. Se assim fosse, o Direito de Família, por exemplo, jamais seria ramo
componente do Direito Civil.

A corrente do Direito Privado, que congrega a maioria de adeptos, considera o


Direito do Trabalho um ramo do Direito Privado. Um dos motivos apresentados para
essa classificação é a origem do contrato de trabalho, que deriva do contrato de
locação do Direito Civil, eminentemente um ramo do Direito Privado.

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O argumento acima não é de todo convincente na medida em que a origem de um
ramo do Direito não é critério de taxonomia do Direito, conforme já foi
demonstrado. Mais ainda, todos os juslaboralistas concordam que o Direito do
Trabalho surgiu na Inglaterra, em plena Revolução Industrial, com normas de
protecção ao trabalho do menor. Assim, se adoptarmos o critério de origem, estaria
evidenciado o carácter público do Direito do Trabalho.

A corrente do Direito Social considera o Direito do Trabalho como um terceiro


segmento jurídico, o Direito Social. O Direito Social seria um ramo distinto que se
posicionaria ao lado do Direito Público e Privado. Essa classificação ocorre, segundo
seus adeptos, em razão do carácter social do Direito do Trabalho, ou seja, em virtude
do maior destaque dado ao elemento colectivo em detrimento do individual.

Tal classificação padece de críticas. A mais importante revela que todos os ramos do
Direito possuem carácter social. Ademais, sendo a taxonomia clássica utilizada
apenas para compreensão geral do quadro das ciências jurídicas não parece
razoável modificá-la, criando novo género Melhor seria abandoná-la e analisar cada
desdobramento da ciência jurídica com suas particularidades.

Além da Teoria do Direito Social, existem, também, outras teorias de classificação do


Direito do Trabalho que não o colocam nem como Direito Público, nem como Direito
Privado. Classificam-no como Direito Misto, pois nele há coexistência pacífica das
normas de Direito Público e de Direito Privado.

Apesar das querelas doutrinárias acima, analisando o Direito do Trabalho na óptica da


teoria da natureza dos sujeitos, constata-se que o mesmo cuida essencialmente dos
empregados, empregadores e suas entidades representativas.

Portanto, trata de sujeitos que não estão investidos de poderes públicos, donde se pode
concluir que o Direito de Trabalho enquadra-se no Direito Privado. Porém, confrontado
com o Direito Civil, o Direito do Trabalho há-de ser, à semelhança do Direito Comercial,
um Direito Privado especial.

Autonomia do Direito do Trabalho

Entende-se geralmente que o Direito do Trabalho possui autonomia científica em


confronto com outras disciplinas jurídicas, embora houvesse quem afirmasse que fazia
parte do Direito das Obrigações.

A doutrina propõe três critérios para que a autonomia de um ramo seja alcançada,
designadamente a existência de um campo temático específico, a elaboração de teorias
próprias e uma metodologia específica.

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Campo temático específico: o Direito do Trabalho tem por objecto principal o estudo
da relação de emprego, relação esta jamais sistematizada por qualquer outro ramo. Por
outro lado, possui ainda em seu campo de estudo outras especificidades, tais como a
negociação colectiva e a greve. Ou seja, o Direito de Trabalho legitima formas de
autotutela, como a greve, que não tem paralelo nos outros ramos do Direito.

Teorias próprias: o Direito do Trabalho possui teorias próprias, sendo uma delas a da
hierarquia das normas jurídicas, que determina que uma norma de hierarquia inferior
pode prevalecer sobre outra de natureza superior desde que observado o princípio da
norma mais benéfica.

Metodologia específica: a metodologia específica do Direito do Trabalho pode ser


comprovada pelos métodos peculiares de criação do Direito, como a possibilidade da
criação de normas gerais através da negociação colectiva ou da sentença normativa.

Relações com outros ramos do Direito

Autonomia, porém, não significa “independência” nem se confunde com “isolamento”.


Isso porque a interdependência no mundo científico assinala as relações do Direito do
Trabalho não só com os outros ramos da ciência jurídica, mas também com outras
ciências.

No que se refere ao Direito Público:

Direito Constitucional: para além da particular relação que este ramo de Direito tem
com todos os outros, há a considerar que os princípios fundamentais e dominantes dos
vários institutos do Direito do Trabalho se encontram constitucionalizados. Por outro
lado, muitas das aplicações mais fecundas do Direito Constitucional quanto a certos
temas situam-se nas relações de trabalho, nomeadamente perspectivação das relações
privadas em que há uma situação de poder, refracção nos contratos do princípio da
igualdade, influências dos direitos constitucionais fundamentais nas relações privadas.

Direito Administrativo: para além da importância pública dos problemas do


emprego, aponte-se que o funcionamento dos órgãos fiscalizadores do cumprimento
das normas de ordem pública do Direito do Trabalho é disciplinado pelo Direito
Administrativo.

Direito Criminal: a especial relevância dos interesses tutelados pelo Direito do


Trabalho, exige, muitas vezes, uma tutela jurídico-criminal para as respectivas normas,
estando previstas coimas, bem como verdadeiras sanções penais relativamente as
respectivas infracções.

No que se refere aos vários ramos do Direito Privado:

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Direito Civil: são evidentes as conexões do Direito do Trabalho com o Direito Civil,
pois é no Direito Civil que o Direito do Trabalho vai buscar os conceitos de pessoa
natural e jurídica, capacidade e incapacidade, de actos e factos jurídicos, de erro, dolo,
coacção e simulação. Aliás, as relações individuais de trabalho são relações jurídicas de
Direito Privado de carácter obrigacional e contratual, aplicando-se-lhes nesses domínios
o Código Civil.

Direito de Família: o princípio de que o trabalho deve ser organizado de modo a


permitir a conciliação da actividade profissional com a vida familiar, torna
interpenetráveis os dois ramos do Direito.

Direito Comercial: o Direito Comercial dispõe sobre a organização e funcionamento


das sociedades comerciais, no âmbito das quais se enquadram as relações de trabalho.
Por outro lado, as situações emergentes da recuperação de empresas e insolvência tem
obviamente o maior interesse relativamente a posição dos trabalhadores como credores
e como titulares de postos de trabalho.

Nas relações do Direito Trabalho com outras ciências, destacam as medidas de higiene
e segurança do trabalho que demonstram as relações do Direito do Trabalho com a
Medicina, Biologia e Engenharia.

Por outro lado, se o Direito do Trabalho tem por objecto a sociedade humana,
regulando e solucionando os conflitos existentes entre os grupos profissionais e
económicos, a Sociologia estuda a sociedade humana sob o ângulo cultural de suas
instituições. Assim, a Sociologia constrói inclusive teorias que esteiam as directrizes do
Direito do Trabalho.

São íntimas, também, as relações entre o Direito do Trabalho e a Economia pois a


esta incumbe estudar a produção, a circulação e consumo de bens, assim, como o
capital, o trabalho e a natureza como factores de produção, enquanto ao Direito do
Trabalho cumpre regular a ordenação profissional das grandes massas da população,
estabelecendo a maneira pela qual os homens colocam sua produção a serviço de
outros.

Caracterização do Direito do Trabalho

Sendo autónomo, significa que o Direito do Trabalho apresenta características próprias


que o distinguem dos demais ramos do Direito.

Partindo do pressuposto de que o Direito do Trabalho tem por fim a consecução de


uma igualdade substancial e prática para os sujeitos envolvidos, há que dizer, em

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primeiro lugar, que tem um cunho unilateral, já que postula uma disciplina imperativa
a favor dos trabalhadores.

Em segundo lugar, ao pôr em causa a tradicional divisão entre o Direito Público e o


Direito Privado, o Direito do Trabalho terá carácter híbrido, pela presença de
elementos públicos e privados, pessoais e patrimoniais e ainda pela interacção que nele
se divisa entre as situações individuais e colectivas.

Em terceiro lugar, o Direito do Trabalho é um ramo ligado ao concreto, no sentido de


que possui formas de produção normativa, nomeadamente as convenções colectivas de
trabalho, marcadamente aderentes à realidade, do que resulta também um especial
dinamismo.

Em quarto lugar, o Direito do Trabalho está bastante sujeito à instabilidade das


flutuações políticas e a sua estruturação depende, sobretudo no que se refere ao
domínio das relações colectivas de trabalho, do tipo de sistema económico (socialista ou
de mercado) em que se insere.

Finalmente, há a assinalar que a relativa juventude do Direito do Trabalho não


impediu a constitucionalização dos seus princípios fundamentais, e a rápida
internacionalização da disciplina jurídica referente a alguns aspectos mais sensíveis,
sobretudo pelas convenções e recomendações da OIT.

Função do Direito do Trabalho

Tradicionalmente, o Direito do Trabalho é um ordenamento que visa a protecção dos


trabalhadores nas relações de trabalho subordinado. Fala-se, por isso, da normal
debilidade contratual do trabalhador, consistente na desvalorização da sua vontade real
no processo de formação do contrato.

Assim, a função mais correntemente atribuída ao Direito do Trabalho é justamente a de


compensar a debilidade contratual originária do trabalhador, no plano individual
(função protectora).

É que no quadro geral do direito comum das obrigações e dos contratos, o padrão de
que se parte é de índole paritária, isto é, assume-se a igualdade originária dos sujeitos
quanto as oportunidades e capacidades objectivas de realização de interesses próprios.

No Direito do Trabalho, o padrão de referência é marcado pela desigualdade originária


dos sujeitos, ou seja, pela diferença de oportunidades e capacidades objectivas de
realização de interesses próprios, e daí que a finalidade “compensadora” seja assumida
como pressuposto da intervenção normativa.

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Este objectivo é prosseguido, antes de mais, pela limitação da autonomia privada
individual, isto é, pelo condicionamento da liberdade de estipulação do contrato de
trabalho.

Depois, e tendo em conta a subordinação e dependência económica, do trabalhador, o


ordenamento laboral estrutura e delimita os poderes de direcção e organização dos
empregados, submetendo-os a um controlo externo (administração, judicial e sindical).

Em terceiro lugar, o ordenamento laboral organiza e promove a transferência do


momento contratual fundamental do plano individual para o colectivo.

Para além da função de protecção, o Direito do Trabalho tem também a função de


promover a específica realização, no domínio das relações laborais, de valores e
interesses reconhecidos como fundamentais na ordem global. Daí que o
ordenamento laboral esteja amplamente constitucionalizado.

A terceira função do Direito do Trabalho diz respeito ao funcionamento da economia,


que é de garantir uma certa padronização das condições de uso da força de trabalho.
Esta padronização tem um duplo efeito regulador: condiciona a concorrência entre as
empresas, ao nível dos custos do factor de trabalho; e limita a concorrência entre
trabalhadores, na procura de emprego e no desenvolvimento das relações de trabalho.

Por outro lado, e partindo da relevância do seu objecto (o trabalho), este é


crescentemente valorizado nos planos ideológico, social, económico, político e de
gestão, porquanto:

No plano ideológico o trabalho é a expressão suprema da personalidade humana,


causa eficiente da transformação do mundo e domínio da natureza do homem;

No plano social na medida em que ainda que o Direito do Trabalho não tenha por
objecto todas as formas de actividade humana e se ocupe fundamentalmente do
trabalho subordinado, o facto é que este diz respeito à pluralidade dos cidadãos. Aliás,
o facto de o Direito de Trabalho conter normas que regulam aspectos relevantes para a
maioria das pessoas, torna-o importante na redução de conflitos e tensões
extremamente graves, com profunda repercussão em toda a comunidade;

No plano económico pelo seu significado na produção na medida em que a fixação


das condições do trabalho pelas normas do Direito do Trabalho reflecte-se em maior ou
menor grau na definição dos custos de produção, dos preços, das formas de
distribuição e ainda para a estrutura e nível de emprego;

No plano político sendo de destacar o aumento da força eleitoral e política solidária


dos prestadores de trabalho, assumindo-se ou não como classes trabalhadora;

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No plano da gestão o Direito do Trabalho envolve restrições e, de certo modo, impõe e
propõe modelos de administração do factor trabalho na empresa.

Ademais, ainda que o Direito do Trabalho não tenha por objecto todas as formas de
actividade humana e se ocupe fundamentalmente do trabalho subordinado, o facto é
que este diz respeito à pluralidade dos cidadãos.

Noções sobre a evolução histórica do Direito do Trabalho

O trabalho humano produtivo, livre, por conta alheia e  subordinado corresponde


a um modelo generalizado de relações que surge apenas – como se verá – a partir da
Revolução Industrial. É nessa altura que se verifica uma cisão completa entre a
titularidade do trabalho e a dos meios de produção, em que uns, poucos, detêm esses
meios e a maior parte somente o seu trabalho. Por isso, os mais numerosos – os
trabalhadores, basicamente os que pertencem ao operariado, alienam previamente o
seu labor a troco de meios de subsistência ao titular dos meios de produção, que é
investido na posição de patrão.

O patrão, que necessita da energia laborativa humana para o processo de produção,


como que a compra ao trabalhador que, embora livre, é compelido a vendê-la para
angariar meios de subsistência. É o que se designou como diálogo entre o estômago,
mais ou menos vazio, e o saco de dinheiro, mais ou menos cheio.

Ora desse processo resultaram situações de gravíssima injustiça no modelo de relações


– desequilibrado cada vez mais pela desproporção de forças – o que tornou necessário
em toda a parte um Direito do Trabalho, tutelar ou de protecção aos trabalhadores. Por
isso, se pode dizer que o Direito do Trabalho é um Direito moderno que surge com a
Revolução Industrial, o operariado, as lutas entre o capital e o trabalho e as reflexões
provocadas por essas mesmas questões, isto é, a “Questão Social”.

Na verdade, a antiguidade do fenómeno trabalho não significou que se encontrassem


desde o início dos tempos formas jurídicas próprias para enquadrar o particular tipo de
trabalho que referimos, que só modernamente postula um ramo muito específico.

Muito embora as relações de trabalho sejam tão antigas como a sociedade humana, só
recentemente se tornaram objecto de um corpo de normas jurídicas específicas,
conforme melhor se compreenderá a seguir.

Antiguidade: Direito Romano

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E sabido que se encontram, desde o mundo antigo, normas jurídicas avulsas atinentes
ao trabalho. Simplesmente elas não assumem especial significado, sobretudo num
quadro em que há trabalho escravo, em que não é predominante o serviço livre por
conta de outrem e em que esse trabalho é considerado pouco dignificante.

No pensamento grego o trabalho (manual, prático ou técnico) é considerado desvalioso.


O ócio (contraposto ao negócio) enquanto vida contemplativa eleva o homem que,
cultivando o seu espírito, acede ao saber teórico. Aristóteles refere-se como inferiores
aos executantes: como o são o corpo em relação a alma e o animal em relação ao
homem.

Os Romanos herdaram esta concepção dos Gregos. O trabalho, no tempo da


República e do Império romanos, e predominantemente escravo ou forçado e,
portanto, está longe da zona do contrato, que supõe liberdade e igualdade, e até a
ideia da do trabalhador como pessoa que dispõe de si própria. O escravo é considerado
uma coisa, um objecto do direito de propriedade, destituído quase de capacidade
patrimonial.

Mas para além da escravidão ou outras espécies de trabalho forçado, havia formas de
trabalho livre; aí o trabalho (mas não o trabalhador) é concebido como uma coisa, a
qual se aplicam as regras de locação ou aluguer.

Há ainda a apontar a existência em Roma de associações de trabalhadores e, portanto,


de possíveis antepassados dos modernos sindicatos. Trata-se da collegia sodalicia, que
tinham actividade sobretudo de entreajuda aos seus membros.

Assim, na Antiguidade a disciplina jurídica do trabalho esteve vazada em corpos de


normas jurídicas de âmbito mais genérico: como os das várias formas de propriedade
(para regular a escravidão e situações de trabalho servil) ou os da locação ou
arrendamento (para regular as relações de serviço livre, em que o trabalho é
assemelhado a uma coisa que o seu titular aluga). Portanto, não havia corpos de
normas ou princípios jurídicos tendo o trabalho como objecto.

Idade Media: o corporativismo

Findo o mundo antigo, verifica-se a influência de uma concepção diversa sobre o


trabalho. O conceito de trabalho, como implicando uma dignidade própria, faz parte da
cultura cristã: o trabalho, envolvendo embora sofrimento, é também realização humana
e colaboração na obra do Criador, e é componente da ascese que eleva o homem.

Por outro lado, assumem necessariamente influência, ao menos difusa, os conceitos


cristãos de afastamento da riqueza, de justiça e de igualdade essencial entre os

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homens, o que os motiva a uma fraternidade incompatível com a escravatura e as
formas agudas de exploração.

De qualquer modo, a valorização cristã do homem e do trabalho não tem efeitos


práticos imediatos. Mantém-se ainda a e escravatura, porventura mais humanizada e
com menos significado económico, como se mantêm relações servis (trabalho não
livre), sobretudo na exploração da terra (adscrição à terra ou à gleba) ou nos serviços
devidos a um senhor (adscrição pessoal).

A importância social e política de quem trabalha é evidentemente diminuta, sobretudo


do sistema feudal, mesmo nos casos em que há trabalho livre. Muitos trabalhadores
agrícolas vivem em situação servil e ligados à terra em que trabalham até a idade
moderna e depois, ainda.

Na idade média acaba por desenvolver-se uma economia urbana com produção de
bens, baseada no trabalho relativamente livre (não compelido), organizada em
profissões sob forma corporativa. A produção é integrada. Os profissionais estão
hierarquizados: aprendizes, companheiros ou oficiais e mestres, os quais têm a
titularidade e a responsabilidade da oficina. O mestre, que dirige a produção, sendo
embora proprietário das matérias-primas e da utensilagem, trabalha também muitas
vezes com os oficiais.

Na hierarquia profissional acede-se por exame, e as relações que se estabelecem entre


aprendizes, companheiros e mestre, dentro de cada oficina, estão impregnadas do
espírito comunitário e mesmo familiar. Não deixam, contudo, de se registar tensões, às
vezes graves, entre os profissionais. Há uma reduzida divisão de trabalho e a produção
é feita, em regra, por encomenda. As corporações têm também carácter religioso e de
entreajuda.

De qualquer modo, a regulamentação corporativa não constitui nada semelhante ao


moderno Direito do Trabalho. Na verdade tratava-se de regimes especiais, não
autónomos (por incindivelmente ligados aos aspectos técnicos do trabalho e à
ordenação geral da economia), regimes que, aliás, estavam desprovidos daquele
sentido tutelar do trabalhador que é apanágio do Direito do Trabalho, (a
regulamentação fixava salários máximos e não salários mínimos).

Com efeito, os regimentos corporativos – sendo embora de defesa profissional –


emanavam predominantemente da classe que aproveitava o trabalho e pagava os
salários (tabelados, destinando-se muitas vezes a ser instrumento duma tentativa de
monopólio da organização do trabalho na cidade).

Idade Moderna

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Mesmo antes do fim da Idade Média começa a registar-se o declínio das corporações.
Esboça-se a dissociação entre o capital e o trabalho e verifica-se a separação entre
oficiais e mestres, pelas tentativas destes de fechar o acesso à sua qualificação e pela
prioridade da sucessão dos familiares dos mestres, nessa mesma qualidade.

Eclodem frequentemente conflitos violentos e os oficiais ou companheiro agregam-se


para defesa dos seus interesses contra os mestres. O sistema passa a ser inadaptado às
condições económicas, gera monopólios aquilosantes, tornando-se frequente o
abaixamento da qualidade dos produtos.

Começam, entretanto, a surgir manufacturas em unidades industriais relativamente


grandes, apropriadas à coordenação das técnicas de produção, com possibilidade de
produção em massa, com regimes de trabalho fixados normalmente através da
autoridade pública ou discricionariamente pelos seus proprietários.

Nas manufacturas os trabalhadores usam utensílios e matéria-prima fornecida pelo


proprietário, estão submetidos ao ritmo do trabalho que lhes é imposto pelo salário.

Também não há propriamente Direito do Trabalho. A estrutura normativa,


extremamente simplificada, fragmentada e de carácter autónomo, correspondia um
mundo em que se não punha o problema do trabalho; na verdade, o trabalho e os
trabalhadores pouco interessavam no plano económico (em que os estudiosos se
preocupavam com o regime de troca e não com o da produção) e muito menos no
plano político.

Revolução Industrial

No final do século XVIII a designação dos quadros da economia corporativa e o início


da sociedade industrial e do capitalismo ocorrem, dominando já os espíritos certo
enaltecimento político e ético do trabalho e, no plano económico, uma preocupação
com a produção que levava a colocar o problema do valor do trabalho.

Entendia-se, contudo, que existiria uma ordem económica natural, fundada sobre a
propriedade e a liberdade, resultando em equilíbrio harmonioso (a célebre mão invisível
de ADAM SMITH).

Foi a época da Revolução Francesa e subsequente desintegração em toda a Europa do


antigo Regime, substituído por sistemas mais ou menos liberais. Iniciou-se a Idade
Contemporânea.

No plano jurídico procurava-se obstar ao associativismo profissional (visto como não


natural e contrário à liberdade do trabalho), tendia-se à integração do contrato de
trabalho no modelo de aluguer de serviços sujeitos à lei da oferta e da procura e da

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soberania da empresa, resultante da propriedade dos bens de produção (o direito de
propriedade era considerado sagrado e inviolável).

A Revolução Industrial caracteriza-se pelo aproveitamento de formas de energia


humanas e pela máquina e, portanto, pela necessidade de importantes bens de
equipamento, da propriedade de quem não trabalha: sistema de dissociação entre o
capital e o trabalho. O capital dirige a produção e prossegue o lucro, que é o verdadeiro
motor da economia (sistema capitalista).

Apesar da abundância de bens produzidos, ao capitalismo correspondeu, na prática, o


envilecimento das condições de trabalho. O novo sistema que, como vimos, dissociava
o capital do trabalho e o trabalhador do produto do seu trabalho, encarou a actividade
humana como mero factor de produção, sujeita à lógica do mercado (e, portanto, à
pressão da diminuição de custos para obtenção de lucros), fraccionou-a, tornou-a
fungível (ganhando o trabalhador destreza numa operação concreta, mas perdendo o
conhecimento global do ofício) e submeteu-a aos ritmos das máquinas.

Por outro lado, a mecanização e novas exigências de disciplina do trabalho (eliminação


do pagamento à peça e do trabalho domiciliário ou em pequena oficina) criava tensões
e desemprego tecnológico. Surge assim a chamada “ Questão Social”, posta pela incrível
miséria da classe operária no século XIX, porque isolada, desprovida de protecção legal
e sujeita a uma intensíssima exploração.

A concentração dos trabalhadores nas cidades (frequentemente em determinados


bairros), e em maiores unidades de produção, facilita a eclosão de reacções violentas
(greves e outras formas de conflito), às vezes implacavelmente reprimidos. De qualquer
modo, os trabalhadores tomam progressivamente consciência da sua própria força e
procuram dinamizar a solidariedade de classe por associativismo crescente. Aparecem
assim os sindicatos como organizações do movimento operário; este é um movimento
de ideias e sobretudo de acção tendente a melhorar as condições de vida e em certo
sentido a promover a emancipação dos operários, fortalecendo o seu sentido de classe.
O movimento surge como esperança do fim da exploração, preconizando, quer por
meios revolucionários quer por reformas , um novo sistema político e, sobretudo,
económico.

A Questão Social desencadeou um vivo debate ideológico dominado pela ideia de


valorização do trabalho e pela necessidade de modificação da situação de exploração
em que se encontravam os trabalhadores, que postulava, ou a revolução social e o
desaparecimento do sistema capitalista assente nos regimes de propriedade e do
salariado (como as várias correntes socialistas propugnavam) ou, pelo menos, uma
reforma e uma mudança de sentido desses regimes (assim, a doutrina social da Igreja,
doutrina tradicional do corporativismo, etc.).

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Com efeito, para além da correntes dos chamados socialistas utópicos (assim
designados pelos marxistas, que se reclamam do socialismo científico), tem
especialíssima importância o pensamento de Marx, sendo o Manifesto do Comunismo
de 1848 um marco fundamental na crítica ao capitalismo.

Em outro quadrante, a condenação da desumanidade do sistema capitalista foi também


formulada por correntes ideológicas mais conservadoras e ruralistas, pelos
tradicionalistas, neocorporativistas e pelo catolicismo social, em que viriam assentar
algumas experiências dos futuros Estados corporativistas.

O nascimento do Direito do Trabalho

No final do século XIX observa-se, pois, uma confluência de críticas ao sistema


capitalista, uma grande sensibilização das classes dirigentes à questão social e, no
plano político, um considerável acréscimo da ordem dos trabalhadores pela
generalização do sufrágio universal e, em certos países, pela ligação do sindicalismo a
fortes partidos políticos (na Inglaterra do Partido Trabalhista às Trade Unions, na
Alemanha do Partido Social-Democrata aos Sindicatos).

Certos acontecimentos políticos, como a Comuna de Paris em 1871, as violências então


praticadas e a repressão subsequente abalam consideravelmente as mentalidades e
instituições dominantes. Do mesmo modo, os incidentes de Chicago (1886) por ocasião
das manifestações para a limitação das horas do trabalho diário e a repressão
subsequente com a execução de activistas ocasionaram uma comoção enorme e
estabeleceram uma corrente de solidariedade internacional, passando-se a festejar o
dia do trabalhador em 1 de Maio, data do início desses incidentes.

Verifica-se a mundialização da “Questão Social“, sendo criada em 1864 a I


Internacional para a associação dos operários de todos os países: “ Ploretários de todo o
mundo, uni-vos”. Na I Internacional predominam sucessivamente as doutrinas de
PROUDHOM e MARX, fundando-se sob o signo marxista a II Internacional em 1889.

Por outro lado estão também na ribalta, constantemente, os anarquistas que defendiam
e praticavam a violência contra a sociedade vigente. Propugnavam não só a abolição da
propriedade privada, mas a de toda autoridade constituída e eram hostis ao
envolvimento na política (em eleições ou partidos).

De facto, tornava-se necessário mudar os princípios jurídicos básicos do sistema


individualista e liberal do primeiro capitalismo que assentavam na proibição do
associativismo profissional, alegadamente, contrariar a perfeição e atomismo do
mercado, no primado do contrato e, portanto, da autonomia da vontade (que em face
da desigualdade económica provocava a ditadura contratual do patrão) e na

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propriedade da empresa (de que resultava encarar-se o trabalho como mero factor de
produção).

O Direito do Trabalho exprime precisamente as modificações do ordenamento jurídico


nesta matéria e surge: quando se aceitam juridicamente as associações profissionais
(os sindicatos ingleses e franceses têm considerável força desde o princípio do século
XIX e são reconhecidos respectivamente em 1825 e em 1884, o sindicalismo alemão
inicia-se nos meados do século XIX e tem grande importância no fim da centúria, sendo
o sindicalismo americano norte-americano mais recente, datando a sua efectiva
protecção legal já deste século); os direitos das associações sindicais ao conflito
(greve), como um pouco por todo o lado na Europa no final do século (em Inglaterra
em 1875, em França em 1864, na Alemanha em 1869; e o direito à negociação
(contrato colectivo), restabelecendo-se assim uma relativa paridade entre as forças; e
quando se restringem largamente os princípios da autonomia da vontade, submetendo
o contrato de trabalho a um conjunto especial de normas de ordem pública para tutela
a posição dos trabalhadores.

O estágio do Direito do Trabalho

Desde o último quartel do século XX e nos alvores do novo milénio colocam-se novas
questões ao Direito do Trabalho. As persistentes crises contemporâneas têm tido um
impacto particularmente destrutivo sobre o emprego, pondo em causa Direito do
Trabalho tal como ele esteve construído na sua época áurea nos anos 60.

O Direito do Trabalho – na medida e que induz um alto nível de tutela permanente aos
trabalhadores – tem sido como causador da rigidez do mercado de emprego e da alta
do custo de trabalho, com repercussões negativas sobre o nível de emprego.

O problema de emprego surge como determinante no novo Direito do Trabalho. Daí


que as legislações tendam para a flexibilização ou para o que se chama criticamente de
desregulamentação, admitindo-se mais facilidade a suspensão e cessação dos contratos
de trabalho , a maleabilidade da duração do trabalho, estimulando-se a mobilidade
geográfica e profissional dos trabalhadores.
Em suma, a legislação do trabalho está mais aberta à economia e as necessidades de
adaptação conjuntural.

É de registar também o declínio da classe operária como tal e ascensão dos sectores de
actividade e de certos trabalhadores autónomos, num mundo em que se vai esbatendo
a concentração industrial e em que se vão diversificando as grandes empresas e se vão
encontrando formas mais maleáveis de organização. Verifica-se assim o
desaparecimento da figura típica de trabalhador (varão, pai de família, operário
industrial, dependente da hierarquia rígida, com tarefas repetitivas, a tempo inteiro,
numa relação estável e por tempo indeterminado, com forte solidariedade

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relativamente a camaradas de trabalho), o que leva a uma desadaptação do Direito do
Trabalho pensado para este protótipo.

Há uma desestruturação das empresas e o desvanecimento das figuras patronais,


apresentando-se como empregador formal uma sociedade jogando-se com as
possibilidades de configuração societária para prejudicar os interesses dos
trabalhadores.

Verifica-se ainda um significativo recuo da força imperativa das leis do trabalho,


admitindo-se que sejam adaptadas pelas convenções colectivas com vista `as
particularidades dos tempos dos sectores e das empresas.

O novo Direito do Trabalho beneficia, entretanto, do protagonismo dos grupos


organizados e que buscam consensos trilaterais (Estado, organizações de
empregadores e organizações de trabalhadores) num desarmamento de luta de classes.
Esses consensos exprimem-se em acordos de concertação ou pactos sociais.

O sindicalismo tem perdido força e militância, mas ganha poder de intervenção nas
decisões políticas, económicas e sociais. Por outro lado, a crescente intervenção
organizada dos trabalhadores nas empresas tem levado à busca de equilíbrios (no plano
jurídico, económico e de gestão) entre os poderes patronais e contrapoderes dos
órgãos representativos do pessoal, registando-se uma maior abertura patronal à
importância e protagonismo nas empresas do seu capital humano.

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