Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
INTRODUÇÃO
O Direito do Trabalho, também conhecido por Direito Laboral, pode ser definido como
sendo a parte do ordenamento jurídico constituído pelas normas e princípios jurídicos
que disciplinam as relações de trabalho.
Mas conforme veremos a seguir, nem todo o trabalho prestado a favor de alguém
interessa o Direito de Trabalho.
O Direito do Trabalho não é o Direito de todo o trabalho; não toma como objecto de
regulação de todas as modalidades de exercício de uma actividade humana produto ou
socialmente útil.
Como ramo do Direito, o seu domínio é dos fenómenos de relação, excluindo-se dele
actividades desenvolvidas pelos indivíduos para a satisfação imediata de necessidades
próprias (preparação de uma refeição, arrumação da casa, condução de uma viatura
pessoal, etc)2.
1
Lobo Xavier , Curso de Direito do Trabalho.
2
Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho.
1
um compromisso livremente assumido mas uma imposição externa (da lei ou
autoridade pública).
Não relevam para efeitos do Direito do Trabalho situações tais como a do Agricultor
que cultiva aos seus campos e colhe e vende a produção. Por isso se diz que há um
acto de “alheação” ou alienação, em que o trabalhador transfere para outrem
actividade que resulta do seu trabalho.
2
Trabalho remunerado: ao Direito do Trabalho só interessa o trabalho remunerado,
aquele que se realiza mediante uma contrapartida económica fornecida pelo seu
beneficiário directo. O trabalho gratuito só comporta três possibilidades na sua relação
com o Direito:
Ou se apresenta sob formas ilícitas e liminarmente rejeitadas pela ordem jurídica que
assim se abstém de regular as condições da sua realização (servidão ou trabalho
forçado);
3
Normas respeitantes as relações entre o empregador e o Estado: cujo conteúdo
consiste em certo número de deveres que ao primeiro incumbe observar no
desenvolvimento da relação individual, inspirados na tutela dos interesses gerais que
relevam ao trabalho, cuja fiscalização incumbe ao segundo. Estão em jogo interesses
públicos, pois tem a ver com o direito de protecção de trabalho, cujas normas impõem
não só as entidades empregadoras mas também aos trabalhadores, deveres jurídicos
frente ao Estado para a tutela directa do trabalho, e cuja execução é assegurada
através de meios administrativos e coercivos especiais.
Várias são as teorias elaboradas para delimitar os critérios de classificação dos ramos
do Direito, as quais foram objecto de estudo em outras disciplinas jurídicas. O que nos
interessa neste momento é saber em qual dos dois grupos se enquadra o Direito do
Trabalho.
4
O argumento acima não é de todo convincente na medida em que a origem de um
ramo do Direito não é critério de taxonomia do Direito, conforme já foi
demonstrado. Mais ainda, todos os juslaboralistas concordam que o Direito do
Trabalho surgiu na Inglaterra, em plena Revolução Industrial, com normas de
protecção ao trabalho do menor. Assim, se adoptarmos o critério de origem, estaria
evidenciado o carácter público do Direito do Trabalho.
Tal classificação padece de críticas. A mais importante revela que todos os ramos do
Direito possuem carácter social. Ademais, sendo a taxonomia clássica utilizada
apenas para compreensão geral do quadro das ciências jurídicas não parece
razoável modificá-la, criando novo género Melhor seria abandoná-la e analisar cada
desdobramento da ciência jurídica com suas particularidades.
Portanto, trata de sujeitos que não estão investidos de poderes públicos, donde se pode
concluir que o Direito de Trabalho enquadra-se no Direito Privado. Porém, confrontado
com o Direito Civil, o Direito do Trabalho há-de ser, à semelhança do Direito Comercial,
um Direito Privado especial.
A doutrina propõe três critérios para que a autonomia de um ramo seja alcançada,
designadamente a existência de um campo temático específico, a elaboração de teorias
próprias e uma metodologia específica.
5
Campo temático específico: o Direito do Trabalho tem por objecto principal o estudo
da relação de emprego, relação esta jamais sistematizada por qualquer outro ramo. Por
outro lado, possui ainda em seu campo de estudo outras especificidades, tais como a
negociação colectiva e a greve. Ou seja, o Direito de Trabalho legitima formas de
autotutela, como a greve, que não tem paralelo nos outros ramos do Direito.
Teorias próprias: o Direito do Trabalho possui teorias próprias, sendo uma delas a da
hierarquia das normas jurídicas, que determina que uma norma de hierarquia inferior
pode prevalecer sobre outra de natureza superior desde que observado o princípio da
norma mais benéfica.
Direito Constitucional: para além da particular relação que este ramo de Direito tem
com todos os outros, há a considerar que os princípios fundamentais e dominantes dos
vários institutos do Direito do Trabalho se encontram constitucionalizados. Por outro
lado, muitas das aplicações mais fecundas do Direito Constitucional quanto a certos
temas situam-se nas relações de trabalho, nomeadamente perspectivação das relações
privadas em que há uma situação de poder, refracção nos contratos do princípio da
igualdade, influências dos direitos constitucionais fundamentais nas relações privadas.
6
Direito Civil: são evidentes as conexões do Direito do Trabalho com o Direito Civil,
pois é no Direito Civil que o Direito do Trabalho vai buscar os conceitos de pessoa
natural e jurídica, capacidade e incapacidade, de actos e factos jurídicos, de erro, dolo,
coacção e simulação. Aliás, as relações individuais de trabalho são relações jurídicas de
Direito Privado de carácter obrigacional e contratual, aplicando-se-lhes nesses domínios
o Código Civil.
Nas relações do Direito Trabalho com outras ciências, destacam as medidas de higiene
e segurança do trabalho que demonstram as relações do Direito do Trabalho com a
Medicina, Biologia e Engenharia.
Por outro lado, se o Direito do Trabalho tem por objecto a sociedade humana,
regulando e solucionando os conflitos existentes entre os grupos profissionais e
económicos, a Sociologia estuda a sociedade humana sob o ângulo cultural de suas
instituições. Assim, a Sociologia constrói inclusive teorias que esteiam as directrizes do
Direito do Trabalho.
7
primeiro lugar, que tem um cunho unilateral, já que postula uma disciplina imperativa
a favor dos trabalhadores.
É que no quadro geral do direito comum das obrigações e dos contratos, o padrão de
que se parte é de índole paritária, isto é, assume-se a igualdade originária dos sujeitos
quanto as oportunidades e capacidades objectivas de realização de interesses próprios.
8
Este objectivo é prosseguido, antes de mais, pela limitação da autonomia privada
individual, isto é, pelo condicionamento da liberdade de estipulação do contrato de
trabalho.
No plano social na medida em que ainda que o Direito do Trabalho não tenha por
objecto todas as formas de actividade humana e se ocupe fundamentalmente do
trabalho subordinado, o facto é que este diz respeito à pluralidade dos cidadãos. Aliás,
o facto de o Direito de Trabalho conter normas que regulam aspectos relevantes para a
maioria das pessoas, torna-o importante na redução de conflitos e tensões
extremamente graves, com profunda repercussão em toda a comunidade;
9
No plano da gestão o Direito do Trabalho envolve restrições e, de certo modo, impõe e
propõe modelos de administração do factor trabalho na empresa.
Ademais, ainda que o Direito do Trabalho não tenha por objecto todas as formas de
actividade humana e se ocupe fundamentalmente do trabalho subordinado, o facto é
que este diz respeito à pluralidade dos cidadãos.
Muito embora as relações de trabalho sejam tão antigas como a sociedade humana, só
recentemente se tornaram objecto de um corpo de normas jurídicas específicas,
conforme melhor se compreenderá a seguir.
10
E sabido que se encontram, desde o mundo antigo, normas jurídicas avulsas atinentes
ao trabalho. Simplesmente elas não assumem especial significado, sobretudo num
quadro em que há trabalho escravo, em que não é predominante o serviço livre por
conta de outrem e em que esse trabalho é considerado pouco dignificante.
Mas para além da escravidão ou outras espécies de trabalho forçado, havia formas de
trabalho livre; aí o trabalho (mas não o trabalhador) é concebido como uma coisa, a
qual se aplicam as regras de locação ou aluguer.
11
homens, o que os motiva a uma fraternidade incompatível com a escravatura e as
formas agudas de exploração.
Na idade média acaba por desenvolver-se uma economia urbana com produção de
bens, baseada no trabalho relativamente livre (não compelido), organizada em
profissões sob forma corporativa. A produção é integrada. Os profissionais estão
hierarquizados: aprendizes, companheiros ou oficiais e mestres, os quais têm a
titularidade e a responsabilidade da oficina. O mestre, que dirige a produção, sendo
embora proprietário das matérias-primas e da utensilagem, trabalha também muitas
vezes com os oficiais.
Idade Moderna
12
Mesmo antes do fim da Idade Média começa a registar-se o declínio das corporações.
Esboça-se a dissociação entre o capital e o trabalho e verifica-se a separação entre
oficiais e mestres, pelas tentativas destes de fechar o acesso à sua qualificação e pela
prioridade da sucessão dos familiares dos mestres, nessa mesma qualidade.
Revolução Industrial
Entendia-se, contudo, que existiria uma ordem económica natural, fundada sobre a
propriedade e a liberdade, resultando em equilíbrio harmonioso (a célebre mão invisível
de ADAM SMITH).
13
soberania da empresa, resultante da propriedade dos bens de produção (o direito de
propriedade era considerado sagrado e inviolável).
14
Com efeito, para além da correntes dos chamados socialistas utópicos (assim
designados pelos marxistas, que se reclamam do socialismo científico), tem
especialíssima importância o pensamento de Marx, sendo o Manifesto do Comunismo
de 1848 um marco fundamental na crítica ao capitalismo.
Por outro lado estão também na ribalta, constantemente, os anarquistas que defendiam
e praticavam a violência contra a sociedade vigente. Propugnavam não só a abolição da
propriedade privada, mas a de toda autoridade constituída e eram hostis ao
envolvimento na política (em eleições ou partidos).
15
propriedade da empresa (de que resultava encarar-se o trabalho como mero factor de
produção).
Desde o último quartel do século XX e nos alvores do novo milénio colocam-se novas
questões ao Direito do Trabalho. As persistentes crises contemporâneas têm tido um
impacto particularmente destrutivo sobre o emprego, pondo em causa Direito do
Trabalho tal como ele esteve construído na sua época áurea nos anos 60.
O Direito do Trabalho – na medida e que induz um alto nível de tutela permanente aos
trabalhadores – tem sido como causador da rigidez do mercado de emprego e da alta
do custo de trabalho, com repercussões negativas sobre o nível de emprego.
É de registar também o declínio da classe operária como tal e ascensão dos sectores de
actividade e de certos trabalhadores autónomos, num mundo em que se vai esbatendo
a concentração industrial e em que se vão diversificando as grandes empresas e se vão
encontrando formas mais maleáveis de organização. Verifica-se assim o
desaparecimento da figura típica de trabalhador (varão, pai de família, operário
industrial, dependente da hierarquia rígida, com tarefas repetitivas, a tempo inteiro,
numa relação estável e por tempo indeterminado, com forte solidariedade
16
relativamente a camaradas de trabalho), o que leva a uma desadaptação do Direito do
Trabalho pensado para este protótipo.
O sindicalismo tem perdido força e militância, mas ganha poder de intervenção nas
decisões políticas, económicas e sociais. Por outro lado, a crescente intervenção
organizada dos trabalhadores nas empresas tem levado à busca de equilíbrios (no plano
jurídico, económico e de gestão) entre os poderes patronais e contrapoderes dos
órgãos representativos do pessoal, registando-se uma maior abertura patronal à
importância e protagonismo nas empresas do seu capital humano.
17