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Direito do Trabalho

Regente: Professor António José Moreira


Autoria: Francisco Lemos de Almeida – 21536917

Este resumo – não passa precisamente disso – e, portanto, não dispensa a leitura da
bibliografia que abaixo indicarei e que fora recomendada pelo regente desta unidade
curricular. Assim, com o intuito de ajudar os demais estudantes, segue-se este documento
que poderá servir de auxílio ao vosso estudo.
O presente documento poderá conter erros ou imprecisões e, por isso, não me
responsabilizo por estes, sendo que, como referi, este deverá servir como complemento ao
estudo e nunca como base - base essa que deverá ser a leitura das obras recomendadas.

Bibliografia:

- Direito do Trabalho e Ideologia, Manuel Carlos Palomeque Lopez, Tradução: António José
Moreira
- Direito do Trabalho, 19ª Edição, António Monteiro Fernandes

Universidade Lusíada Norte - Porto

3º Ano – 2º Semestre
Direito do Trabalho

Capítulo I – Introdução

Para o Direito, o trabalho é a atividade humana decorrente da aplicação do esforço físico e


psíquico tendo em vista a realização de uma finalidade lícita e útil. Neste contexto, só
assume relevância o trabalho que se inscreve em relações sociais, isto é, efetuado em
proveito alheio.
Autonomizar-se uma definição de trabalho não é tão dispensável quanto à primeira vista
possa parecer. É que, tratando-se da exteriorização da personalidade do agente,
confrontamo-nos com uma área jurídica sensível que carece de tutela: a dos direitos
fundamentais do trabalhador.
Ademais, o trabalho é o meio através do qual se obtém o sustento para sobreviver. Em
algumas situações, o trabalhador surge em posição de vantagem, controlando a seu gosto
o esforço empregue e a medida do seu ganho – v.g., como sucede nas profissões liberais.
Mas, por outro lado, e na maioria das vezes, a relação entre trabalho e contrapartida
económica é definida e controlada pelo beneficiário, naturalmente em conformidade com
o seu interesse. Estas relações são caracterizadas por um desequilíbrio, em que o
trabalhador ocupa, indubitavelmente, a posição mais fraca/débil.
Deparamo-nos, então, com as típicas relações de poder: poder de quem beneficia sobre
quem realiza a prestação. Trata-se de situações de supremacia de um sujeito privado sobre
outro.
E, assim, é neste contexto que surge o Direito do Trabalho – que se traduz no conjunto de
normas cujo objeto é o trabalho humano, nas várias modalidades em que ele se apresenta
na vida social. Todavia, não cabem no seu âmbito todas as modalidades de exercício de uma
atividade humana produtiva ou socialmente útil.
Ora, como ramo do direito, o seu domínio é o dos fenómenos de relação, desde que em
causa estejam atividades que, prima facie, visem satisfazer as necessidades de outras
pessoas, Em segundo lugar, este ramo apenas se ocupa de formas de trabalho livre,
voluntariamente prestado, pelo que ficam afastadas as atividades forçadas, ou seja,
aquelas que não se fundam num compromisso livremente assumido. O que se exige é uma
liberdade formal, isto é, a possibilidade abstrata de aceitar ou recusar um compromisso de
trabalho, de escolher a profissão (artigo 47º CRP) e de concretizar tais escolhas mediante
negócios jurídicos específicos1.
Aqui chegados, podemos concluir que a este ramo só lhe interessa o trabalho livre e em
proveito alheio. No entanto, o seu objeto poderá restringir-se ainda mais: é que o trabalho
deve ser remunerado, isto é, realizado mediante uma contrapartida económica fornecida
pelo seu beneficiário direto.
O trabalho livre, em proveito alheio e remunerado traduz-se sempre na aplicação de
aptidões pessoais, de natureza física, psíquica e técnica; para a pessoa que o realiza, trata-
se de fazer render essas aptidões, de modo a obter uma contrapartida económica2.
Este objetivo pode ser alcançado de diversas formas. Senão vejamos: através da auto-
organização do agente – com vista à obtenção de um resultado pretendido por outra

1
Normalmente, o contrato de trabalho.
2
A retribuição.

2
Direito do Trabalho

pessoa, o agente programa a sua atividade, recorre aos meios necessários, socorrendo-se
eventualmente a outras pessoas, fornecendo, por fim, o resultado pretendido (v.g., o
advogado). Nestes casos, o agente dispõe da sua aptidão profissional de acordo com o seu
critério, trabalhando com autonomia; noutras ocasiões, o mesmo indivíduo poderá aplicar
as suas aptidões numa atividade organizada e dirigida por outra: pelo beneficiário do
trabalho, deixando o agente de ser responsável pela obtenção do resultado desejado. O
trabalho é dependente, uma vez que é dirigido por outra pessoa e o trabalhador se integra
em organização alheia3.
Fora do escopo do Direito do Trabalho, situa-se o estatuto dos trabalhadores da função
pública, regulado pelo Direito Administrativo.
O ramo em estudo regula, assim, relações jurídico-privadas de trabalho livre, dependente
e subordinado4.
Quando alguém transmite a outrem a disponibilidade da sua aptidão laboral, está não só a
assumir o compromisso de trabalhar, mas também o de se submeter a vontade alheia. Deste
modo, compromete-se a proceder em conformidade com as ordens, instruções, etc. que da
outra pessoa emanem – falamos em trabalho subordinado.
Os frutos do trabalho são originariamente distribuídos a pessoa diversa do trabalhador – e,
assim falamos de trabalho por conta alheia. O resultado e o risco da sua frustração escapam,
igualmente, desde a sua origem ao trabalhador.
Para Monteiro Fernandes, o “elemento-chave” destas relações é a
subordinação/dependência.
À prestação de trabalho corresponde, como dissemos, um título jurídico próprio – o
contrato de trabalho, do qual decorre que uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a
prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a
autoridade destas (artigo 11º CT).
No âmbito destas relações, existe um contraente que se encontra inevitavelmente numa
posição mais débil: o trabalhador. Pelo que o Direito do Trabalho vem, na medida do
possível, atenuar essa fragilidade, pretendendo instaurar uma paridade entre as partes.
O ordenamento jurídico-laboral apresenta-se como o signo da proteção do trabalhador e
como um limite à autonomia privada individual, na medida em que, com recurso a normas
imperativas, estipula desde aspetos pré-contratuais até aspetos pós-contratuais que as
partes não poderão contrariar.
Para além do que ficou dito, o Direito do Trabalho cobre também as relações coletivas que
se estabelecem entre organizações de trabalhadores e empregadores, organizados ou não5.

Subcapítulo I – Funções do Direito do Trabalho

Ao Direito do Trabalho são reconhecidas várias funções, pelo que será delas que nos iremos
ocupar neste momento.

3
O trabalho juridicamente subordinado.
4
Direito do Trabalho como a ordenação jurídica do trabalho assalariado ou prestado por conta de
outrem – in Direito do Trabalho e Ideologia, Manuel Palomeque Lopez, página 15.
5
Reflexo do reconhecimento da liberdade sindical.

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Direito do Trabalho

Função compensatória e tutelar – normalmente, as condições pelas quais são regidas as


relações de trabalho são estipuladas por quem oferece a vaga a ocupar (o empregador), e
não por quem procura essa oportunidade (o trabalhador). Daqui resulta, portanto, uma
situação de debilidade contratual do trabalhador, uma vez que as suas vontades e
pretensões são apenas raramente tidas em conta.
Por isto, a função mais reconhecida ao Direito do Trabalho é a de compensar a debilidade
contratual do trabalhador. Ao contrário do que sucede na maioria dos outros ramos de
direito privado, neste não se parte do pressuposto de uma igualdade paritária entre os
sujeitos. Na verdade, o padrão de referência é a desigualdade originária dos sujeitos.
Este objetivo é prosseguido pela limitação da autonomia privada individual, isto é, pelo
condicionalismo de não se poder fixar livremente o conteúdo do contrato de trabalho.
Por outro lado, e dada a dependência e subordinação económica do trabalhador, o
ordenamento laboral estrutura e delimita os poderes de direção e organização do
empregador, submetendo-os a um controlo externo (administrativo, judicial e sindical).
Estabelece-se, ainda, um sistema de tutela dos direitos dos trabalhadores que tende a
suprir a sua diminuída capacidade de exigir e reclamar – falamos de meios e processos
administrativos, meios jurisdicionais e meios de autotutela coletiva.
Função garantística – o Direito do Trabalho procura promover a específica realização, no
domínio das relações laborais, de valores e interesses reconhecidos como fundamentais na
ordem jurídica laboral. O que se pretende é que a implicação do trabalhador na relação de
trabalho não afete negativamente os seus direitos, liberdades e garantias.
Nota: a Constituição é tão vasta no que concerne a esta matéria que, pelo conjunto de
normas que a ela se destinam, poderíamos chamar de “constituição laboral”. E, diga-se, a
produção legislativa nesta área pertence, quase exclusivamente, à área de competência
reservada da Assembleia da República.
Mesmo o Direito do Trabalho consagra, entre os artigos 14º a 22º CT, direitos de
personalidade.
Função padronizadora – garantir a padronização das condições de uso da força do trabalho,
sendo-lhe atribuído um efeito duplo: condicionar a concorrência entre as empresas, ao nível
dos custos do fator trabalho; limitar a concorrência entre trabalhadores, na procura de
emprego e no desenvolvimento das relações de trabalho.
Função de ajustamento – esta função prende-se com o ajustamento do modo por que se
organizam e estruturam as relações de trabalho face às condições reais das economias e das
empresas.
As normas laborais devem obedecer, pois, a ideias de adequação e compatibilidade.

A confrontação entre o trabalho assalariado e o capital informa, assim transversal e


longitudinalmente, a sociedade de classes, o que iria exigir, historicamente, a criação de
uma nova estrutura normativa canalizadora do novo conflito básico, uma vez que eram
inúteis já, a tal fim, os corpos normativos da sociedade pré-industrial, que seria, então, o
ordenamento jurídico-laboral. A funcionalidade ou razão de ser histórica do Direito do
Trabalho como disciplina jurídica independente é, por isso, servir ao processo de
juridificação do conflito entre o trabalho assalariado e o capital, da sua canalização ou

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Direito do Trabalho

institucionalização pelo Estado. – in Direito do Trabalho e Ideologia, Manuel Palomeque


Lopez.

Capítulo II – Formação e Evolução do Direito do Trabalho

A Revolução Industrial trouxe consigo a necessidade de regulação das relações


estabelecidas pelo operário assalariado com o capitalista ou empresário que eram titulares
de interesses antagónicos. Ora, face à insuficiência dos elementos normativos existentes à
data, vislumbrava-se a necessidade de se criar um ordenamento jurídico-laboral que
regulasse as relações de trabalho e, outrossim, protegesse o contraente débil – o
trabalhador -, que se via obrigado a vender a sua força de trabalho para poder subsistir.
No entanto, e antes de voltarmos aqui, afigura-se oportuno referir que as relações de
trabalho não surgiram das Revoluções Industriais. Na verdade, o estabelecimento destas
relações data de há muitos séculos atrás e remonta ao Direito Romano.
Na antiguidade, a disciplina jurídica do trabalho esteve vazada em corpos de normas
jurídicas de âmbito mais genérico: como os das várias formas da propriedade (para regular
as relações de trabalho servil), a locação ou arrendamento (para regular as relações de
serviço livre, já que o trabalho era visto como uma coisa que o seu titular alugava6). Ou seja,
não havia um corpo de normas ou princípios jurídicos tendo o trabalho como objeto
específico. As normas sobre o trabalho, na Idade Média e Moderna, no âmbito das
corporações de artes e ofícios, foram influenciadas pelo próprio caráter comunitário,
hierarquizado e semifamiliar das relações existentes entre empresários (mestres) e
trabalhadores (oficiais ou companheiros e aprendizes). Do facto de essas normas (os
regimentos corporativos) conterem uma regulamentação estatuário-profissional muito
minuciosa da situação do prestador de trabalho não resulta que já houvesse, nessas épocas,
Direito do Trabalho (na verdade, tratava-se de regimes sem autonomia, ligados aos aspetos
técnicos do trabalho e à concorrência). A preocupação pela proteção do trabalhador,
princípio basilar deste ramo do direito, à época, ainda não existia – o trabalho e os
trabalhadores pouco interessavam no plano económico e muito menos no plano político.
Desta forma, se justifica a despreocupação pela necessidade de implementação de um
ordenamento autónomo que procurasse regular as relações de trabalho.
Esta tendência acabaria por começar a inverter-se nos finais do século XVII, aquando da
Revolução Industrial. É deste momento histórico e do que lhe sucedera que nos
ocuparemos de agora em diante.
Fruto desta revolução e de uma outra – a Revolução Burguesa – surge um novo paradigma
no âmbito das relações de trabalho entre assalariados e os detentores dos meios de
produção: o trabalho por salário, como o novo meio de produção.
A Revolução Burguesa traduz-se no processo histórico através do qual a burguesia7 foi capaz
de impor às demais classes sociais os seus produtos ideológicos e culturais, expressivos do

6
Locatio condutio operarum – o locator obriga-se perante o conductor a prestar-lhe certos serviços,
durante determinado tempo, mediante retribuição.
7
Que foi construindo a sua imagem, prestígio e poder ao longo da Idade Média.

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Direito do Trabalho

seu interesse revolucionário. O paradigma de todo este processo surgiu em França, em


1789, com a Revolução Burguesa, a qual foi secundada por outros movimentos
revolucionários, de entre os quais destacamos o que sucedeu em Inglaterra e nos Estados
Unidos da América. A burguesia acabara por triunfar face às classes do ancien regime,
acabando, com isso, por implementar novos ideais culturais: o liberalismo e um novo
sistema de produção – o capitalismo.
O liberalismo é o reflexo do instrumento que possibilitou à Burguesia a chegada ao poder.
Por outras palavras, foi assente numa perspetiva liberal que a classe burguesa se construiu,
aliando a sua perseverança à ideia de que as classes sociais não eram imutáveis, acreditando
que se podia ascender e subir na pirâmide social estratificada característica do Antigo
Regime. E foi, com sucesso, que a Burguesia alcançou o poder, deixando para trás a ideia de
que os privilégios de nascimento ou crença definiam a forma de vida e o destino de cada
um, e de todos.
Esta corrente filosófica disseminou-se por todos os domínios da vida e ocupação humanos.
Na política repudiou-se o recurso a toda a instância ou realidade institucional intermédia
entre a pessoa e o Estado soberano. Difundiram-se os ideais democráticos e a separação de
poderes, o parlamentarismo ou o republicanismo; o liberalismo económico assentava na
abstenção do Estado na atividade económica, que seria regulada por leis que se situavam à
margem da vontade dos homens – como a lei da “oferta e da procura”; finalmente, no plano
jurídico deu-se primazia à “autonomia da vontade” das partes, ideia que passou a integrar
nos Códigos Nacionais, concedendo-se às partes a possibilidade de estabelecer o conteúdo
das suas relações contratuais.
Por sua vez, o sistema de produção capitalista repousa sobre a propriedade privada dos
meios de produção. Neste contexto, a prestação de trabalho assalariado realizada
livremente pelo trabalhador8 convertia-se, pela primeira vez na história, em elemento
caracterizador do sistema produtivo.
A revolução industrial identifica a transição de uma fase primitiva e imatura do capitalismo
para um momento posterior deste, baseado no maquinismo e mudança tecnológica,
desenvolvido em redor da “fábrica”. A mão-de-obra humana foi, gradualmente, substituída
pelas máquinas, o que originou uma situação de excedente de “oferta de trabalho”. Isto
trouxe consequências aterradoras no seio social, acabando por levar a excessos e a uma
exploração da classe trabalhadora. Na verdade, nestas circunstâncias, o empregador
poderia fixar as condições de trabalho que pretendesse, tendo em conta apenas os seus
interesses, na medida em que no meio da imensa “oferta de mão-de-obra acabaria por
haver sempre algum trabalhador que aceitaria as suas condições (desde jornadas laborais
“de sol a sol”, salários de fome, condições de segurança e higiene no trabalho medíocres).
Ora, isto levaria como que a um “regresso ao passado”. Dito por outras palavras, este novo
sistema que pretendia acabar com a exploração da classe trabalhadora, assente na
conceção liberal da não intervenção do Estado na atividade económica, levou à
potencialização dessa mesma exploração9. De facto, dado este cenário dantesco no

8
Reitere-se, em troca de salário (por isso, assalariado).
9
Denominada na época por questão social.

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Direito do Trabalho

panorama laboral, era urgente que se apresentassem novas soluções que tutelassem os
direitos da classe operária.
Neste sentido, a resposta a este estado de coisas chegou através de uma dupla via: a
organização e mobilização do proletariado industrial a partir da “consciência de classe”, que
representa uma ideia de autotutela coletiva dos próprios trabalhadores face à sua injusta
situação; a intervenção do Estado através de uma legislação protetora do trabalho
assalariado (legislação operária).
A noção de movimento operário é composta por vários elementos, cuja ideia é a seguinte:
apelando à consciência de classe, unir os membros da classe operária contra o domínio da
classe burguesa, através de organizações políticas e sindicais. Esta mobilização operária
ficou historicamente marcada numa dupla manifestação: no ludismo ou anti-maquinismo –
conjunto de atuações violentas de sabotagem e destruição de meios de produção, máquinas
ou fábricas inteiras; na constituição de organizações de classe, para lutar diretamente
contra o sistema capitalista na sua vertente política (partidos operários) e económica
(sindicatos).
Todo este desenrolar de acontecimentos, mas, nomeadamente, a acentuada exploração da
classe trabalhadora, fez emergir a necessidade de intervenção do Estado, através do seu
poder legislativo. Ao contrário da ideologia liberalista, houve lugar a um fenómeno
contrário: o da intervenção do Estado nas relações de produção. O Estado do laissez-faire é
forçado a acordar para não deixar cair o poder nas ruas.
Com esta intervenção visou-se estabelecer limites à fixação das condições de trabalho por
parte do empresário e, por outro lado, consagrar um núcleo protetor da posição da classe
do proletariado.
Este movimento legislativo veio intervir nos domínios onde a exploração dos trabalhadores
mais se fazia sentir e, assim, limitando o trabalho das mulheres e menores10, reduzindo os
tempos de trabalho, estabelecendo salários mínimos e exigindo condições mínimas de
segurança e higiene no trabalho.
Estavam, então, dados os primeiros passos para a consagração de um verdadeiro Direito
operário. Ao longo de sucessivos anos, este caminho foi se desenvolvendo – com maior ou
menos dificuldade -, tendo acabado por ficar marcado por outros avanços: falamos da
criação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e da consequente
“internacionalização” da legislação laboral11.
Deste modo, ia-se edificando um verdadeiro sistema protetor dos direitos dos
trabalhadores. A nível constitucional12, mas não só, encontram-se plasmados direitos
fundamentais, como a liberdade sindical, o direito à greve e outros, com um cariz mais
individual, como o estabelecimento de descanso semanal, a duração das jornadas laborais,
a estipulação de um salário mínimo, etc.

10
As mulheres eram vistas como a “mão de obra mais dócil e mais barata”. A exploração das mulheres e
dos menores era hedionda.
11
Neste contexto, cumpre enfatizar a importância do Tratado de Versalhes (1919). Mais tarde, em 1944,
a Declaração de Filadélfia veio reiterar a ideia veiculada pelo referido Tratado: a Internacionalização do
Direito do Trabalho.
12
Como sucede entre nós.

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Direito do Trabalho

Donde, podemos concluir que o Direito do Trabalho acabaria por construir-se à volta de um
propósito maior: a proteção do trabalhador (o contraente débil)13, sendo essa a sua
principal razão de ser.

Subcapítulo I – A Evolução do Direito do Trabalho em Portugal

O desenvolvimento do Direito do Trabalho deveu-se, sobretudo, à lei. Como ponto de


partida do seu processo de formação esteve o contrato de trabalho (como instrumento de
regulação das situações do empregador e do trabalhador).
Através do Código Civil de 1867, foram feitas as primeiras menções ao trabalho
subordinado; os tipos predominantes (à época) eram os seguintes: o serviço doméstico, o
serviço salariado e a aprendizagem.
Com a 1ª República, surgiu a preocupação com novas realidades: um decreto-lei de 1891
veio regular o trabalho de menores e mulheres; a partir deste, surgiu todo um
desenvolvimento legislativo no campo das relações de trabalho. Ora, em 1907 ergueu-se
um novo marco neste âmbito: consagrou-se o Princípio da Obrigatoriedade do Descanso
Semanal (“24 horas consecutivas de descanso”).
Neste movimento legislativo surgiram novas leis avulsas que se debruçaram sobre a
consagração de certos direitos: reconhecimento do direito à greve (e ao locaute); instituiu-
se um regime específico relativo à responsabilidade por acidentes de trabalho (mais tarde,
este tornaria obrigatório o seguro contra acidentes); surgiram também diplomas que
consagraram regime de duração de trabalho para o comércio e para a indústria (o período
máximo de 10 horas). Aqui, cumpre notar que um decreto-lei de 10 de maio de 1919
estabeleceu um período máximo de 8 horas diárias e 48 horas semanais para a função
pública, para as atividades comerciais e industriais.
Estamos no período que antecedeu o Estado Novo. Durante a vigência deste regime, a
evolução normativa neste domínio estagnou (se não regrediu). Ora, isto mais não é do que
o reflexo de que o Direito do Trabalho é extremamente influenciado pelo regime político
vigente.
Durante o Estado Novo, procedeu-se à (“re”)proibição da greve, uma vez que os ideais
deste regime passavam pela instauração de um sistema laboral corporativo.
Mas, com a queda deste regime, o Direito do Trabalho foi objeto de uma fase de transição,
durante os anos pós-revolução. Nesta conjetura, surgiram várias (novas) orientações:
referimo-nos ao igualitarismo (impuseram-se limitações ao acréscimo dos salários mais
elevados e, por outro lado, procedeu-se à uniformização de estatutos profissionais de
negociação coletiva); outra diretriz consistiu no enfraquecimento da posição de supremacia
e controlo do empregador na relação individual do trabalho (nomeadamente no que

13
É a ideia de proteção do contraente débil que está em causa. Esta é a causa das coisas; esta é a razão
primeira do surgimento do Direito do Trabalho; esta é a carga axiológica deste ramo do Direito, este é o
seu ADN, o seu legado histórico.

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Direito do Trabalho

concerne ao despedimento. Desta forma, limitou-se o poder patronal, uma vez que privado
do seu instrumento principal – o despedimento14 – ficava mais fragilizado).
As décadas de 70 e 80 ficaram marcadas pelo esforço pela “constitucionalização” do
ordenamento laboral; entre os finais dos anos 80 e inícios dos anos 90 o Direito do Trabalho
adotou o caminho da flexibilidade, fundado pelos ideais liberais-económicos.
O movimento legislativo do qual temos vindo a dar conta levou, em 2003, à elaboração de
um Código do Trabalho. Este surgiu com o intuito de reorganizar o Direito do Trabalho
português que se via “mergulhado” em leis avulsas e em imprecisões semânticas e
gramaticais, o que dificultava a aplicação das normas; visou, também, o congelamento da
contratação coletiva.
Por fim, referir que ao Código de 2003 sucederam as reformas laborais de 2009, 2011 e
2014, fruto da conjetura económico-social que se instalou no nosso país em 2008 (falamos,
nomeadamente, do desemprego).

Capítulo III – “Características” do Direito do Trabalho

Subcapítulo I – Direito do Trabalho Concertado ou Pluralmente Pactuado

O Direito do Trabalho é dos poucos ramos de direito em que é necessária a intervenção dos
representantes dos trabalhadores na atividade de produção legislativa – fala-se, neste
contexto, de Direito do Trabalho Concertado.
Na expressão de António Moreira, estamos num típico ambiente de diálogo social, do
“toma lá, dá cá”. Ou seja, são concedidos direitos em troca de contrapartidas, mas sempre
respeitando a ideia de concertação e diálogo, característica da produção legislativa no
âmbito laboral.
Na elaboração das leis de trabalho, a Constituição institucionaliza um certo tipo de
participação das comissões de trabalhadores (artigo 54º, nº4, alínea d)) e das associações
sindicais (artigo 56º, nº2, alínea a)).
Esta participação é regulada pelos artigos 469º e seguintes do Código de Trabalho: ora, as
leis ordinárias são previamente publicadas para que as entidades referidas tenham
oportunidade para se pronunciarem sobre o seu conteúdo, devendo as suas opiniões ser
tidas em conta, ainda que não sejam vinculativas (artigo 475º, nº1 CT) – e aqui reside, então,
a ideia de concertação entre o poder legislativo estadual e as entidades representantes dos
trabalhadores.
Com isto, visou-se impedir uma produção legislativa “surpresa”, abrindo espaço para um
debate social no procedimento legislativo.
Esta participação engloba três momentos: publicação de projetos e propostas de diplomas,
com estipulação de prazo para apreciação pública, que não será inferior a 30 dias (em regra)
– artigo 473º CT; o anúncio nos temos do artigo 472º, nº3 CT; a indicação dos resultados da
apreciação pública (artigo 473º CT).

14
Não obstante motivo grave e objetivo.

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Direito do Trabalho

O artigo 470ºCT vem impor a participação das organizações dos trabalhadores e dos
empregadores, impedindo a adoção de qualquer ato legislativo que não haja sido submetido
à sua apreciação. Caso este imperativo seja desrespeitado, estaremos (eventualmente)
perante uma inconstitucionalidade formal.

Por outro lado, podemos ter uma concertação social. Esta traduz-se numa mera
possibilidade (artigo 471º CT e artigo 56º, nº2 CRP). Todavia, entre nós, há muito que esta
é obrigatória, então: à Comissão Permanente de Concertação Social (CPCS) devem ser
apresentados, para apreciação, todos os projetos legislativos do Governo em matéria sócio-
laboral. Esta participação acontece no próprio processo da elaboração dos diplomas pelo
Governo; difere, no entanto, da participação (acima descrita), na medida em que já não
resulta de imperativos, mas de compromissos políticos. O seu não cumprimento resultará
em sanções políticas, mas não afetará em qualquer caso a validade jurídicas dos diplomas.
A concertação é somente aplicável aos processos de decisão do Governo (em relação às leis
da Assembleia da República, os resultados da concertação realizada na fase de elaboração
são tomadas como meras expressões da iniciativa do Governo); ao contrário da apreciação
pública, este é um processo “fechado” de negociação, em que apenas participam certas
organizações – as confederações sindicais e patronais com assento na CPCS -,
independentemente da natureza e amplitude dos interesses em jogo.

Estes sistemas de participação e concertação refletem bem a preocupação em incluir-se no


processo legislativo, os grupos que, por fim, serão os destinatários das normas para que,
dessa forma, se consiga alcançar a eficácia das mesmas.

Subcapítulo II – Laboralização da Constituição ou Constituição do Direito do Trabalho

O direito do trabalho foi bem tratado no Estado Novo, no que diz respeito ao direito
individual do trabalho. Durante o período de Salazar, se o direito individual evoluiu no seio
europeu, o direito coletivo (associações sindicais, greves e contratação coletiva) foi alvo de
um total esquecimento.
Não se apadrinhava o que era coletivo, mas apenas o que era individual. O que era coletivo
era banido. O Estado era a esquadra da polícia. Os movimentos sindicais foram proibidos,
bem como as greves. Portugal encontrava-se muito atrasado em relação aos países
autoritários15.
Chegados ao 25 de abril, havia que consagrar na Constituição aquilo que havia sido
esquecido no campo dos direitos liberdades e garantias (artigo 18º CRP). Para tanto,
procedeu-se à laboralização - em sede de direitos fundamentais, visou-se tutelar a posição
tipicamente mais débil do trabalhador, mas, por outro lado, garantir, em sede de segurança
no emprego, a proteção do empregador (o artigo 13º16 conjugado com o artigo 53º

15
Espanha, Itália, etc.
16
Este artigo terá sempre de ser tido em conta no que concerne à matéria dos “direitos, liberdades e
garantias” já que consagra um seu princípio basilar: o Princípio da Igualdade (baseia-se na ideia de que
devemos tratar por igual o que é, pela sua natureza, igual; tratando o que é diferente, aquilo que é
diferente).

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Direito do Trabalho

refletem, em si, um indício de laboralização da Constituição; o mesmo poderá ser dito em


relação ao que resulta do artigo 13º com o artigo 59º, nº1).
Outras expressões desta ideia de laboralização são os artigos 54º a 57º que acabam por se
referir a aspetos de natureza coletiva, instituindo valores que foram esquecidos durante a
vigência do Estado Novo.
Neste momento, cumpre assinalar uma contradição existente entre o texto constitucional
e a lei ordinária: o artigo 55º, nº2, alínea e) e nº4 CRP e o artigo 405º CT vêm enfatizar e,
até, reiterar a ideia de independência entre as estruturas de representação coletiva dos
trabalhadores e do Estado. Todavia, o artigo 468º CT vem contrariar essa ideia.
A greve constitui um direito constitucional dos trabalhadores (57º, nº1 CRP)17. É clássica a
distinção entre greve-delito, greve-liberdade e greve-direito. Costuma dizer-se que o
ordenamento jurídico percorre, no que respeita à greve, uma evolução que comporta três
fases: a greve começa por ser considerada como uma conduta contrária ao interesse
público, sendo proibida e penalmente punida – é o que se denomina greve-delito; depois
passa a ser entendida como liberdade, no sentido de se admitir que os grevistas se movem
no domínio da atividade lícita, a qual não pode comportar consequências penais ou de
responsabilidade civil, sendo garantida essa liberdade – é a greve-liberdade; numa fase final,
acentua-se a tutela jurídica da greve que se transforma num direito que os trabalhadores
podem exercer contra o empresário, à sombra do próprio regime do contrato de trabalho –
a greve-direito. A passagem da greve-liberdade a greve-direito marca a consciencialização
de que, enquanto mera liberdade, a greve poderia ser entendida como inexecução do
contrato de trabalho, isto é, como não cumprimento da prestação devida, o que permitiria
a atuação da entidade empregadora no sentido de responsabilizar os grevistas, contratual
e disciplinarmente. A ideia de greve-direito surge quando se fala da imunidade contratual,
isto é, do direito a não cumprir em confronto do empresário, sem que este possa utilizar
mecanismos de defesa contratual ou disciplinar.
No Código do Trabalho, o direito à greve encontra-se regulado nos artigos 530º e seguintes.
Durante o Estado Novo, tendo em conta a conceção política defendida, a greve esteve
proibida, sendo os grevistas punidos criminalmente. A partir de 1974 a greve passou a ser
entendida como direito dos trabalhadores.
Em 1997, acrescentou-se o nº3 ao artigo 57º da CRP, tendo em vista limitar o direito de
greve de modo a serem assegurados (constitucionalmente) os serviços mínimos.
Na Constituição, existem outros direitos respeitantes aos trabalhadores, nomeadamente os
“Direitos Económicos, Sociais e Culturais”, dispostos nos artigos 58º e seguintes. No
entanto, estes precisam de ser concretizados através de leis ordinárias para que possam,
efetivamente, conceber verdadeiros direitos aos trabalhadores.

17
A greve deve ser precedida de um aviso prévio e deve ser decretada pela associação sindical.

11
Direito do Trabalho

Subcapítulo III – Desadministrativização e Desaplicação do Direito do Trabalho

- Desadministrativização do Direito do Trabalho: Inicialmente, o Estado tinha uma


intervenção macro nas condições de trabalho por via do seu braço armado: a Inspeção Geral
do Trabalho (IGT).
Depois desta época marcadamente intervencionista, seguiu-se um tempo marcado por
ventos neoliberais, traduzidos no afastamento do Estado destas questões, optando-se pelo
endeusamento das partes. Colocou-se-lhes, em termos de conformação dos negócios
jurídicos laborais, o contrato de trabalho e a ACT/IGT em condições de uma intervenção
minimalista.
Ao longo do Código do Trabalho existem apenas dois casos em que é notória a intervenção
da ACT:
Artigo 213º CT – este preceito trata do intervalo de descanso, estabelecendo o nº1 a regra
geral. Por sua vez, o nº3 estipula uma possibilidade de excecionar esta regra: mediante
requerimento do empregador, dirigido ao Ministério com competência inspetiva
responsável pela área laboral. Ora, este preceito reflete uma ideia de administrativização,
contrária à ideia de desadministrativização que temos vindo a referir;
Artigo 119º CT – esta norma trata da mudança do trabalhador para categoria inferior.
Poderá ser alcançada mediante acordo, com fundamento na necessidade da empresa ou do
trabalhador, carecendo da autorização do serviço com competência inspetiva do ministério
responsável pela área laboral no caso de determinar a diminuição da retribuição.
Mais uma vez, encontra-se presente uma ideia (diga-se, excecional) de administrativização.
Princípio da Irredutibilidade – a retribuição é um requisito primário da relação contratual
laboral, garantindo ao trabalhador, o seu recebimento, a sua subsistência bem como a da
sua família. Dada a sua função social, o legislador conferiu-lhe uma especial proteção,
traduzida na garantia de irredutibilidade da retribuição.
Este princípio visa garantir ao trabalhador que a retribuição não possa ser diminuída ou
retirada. Este encontra-se circunscrito às prestações patrimoniais, em dinheiro ou em
espécie, regulares ou periódicas, que são devidas ao trabalhador por força do seu trabalho.
Como sabemos, os princípios consagram regras que, não-raras vezes, acabam por ser
excecionadas por disposições legais: ora, o artigo 119º CT é um desses exemplos.

Esta ideia de desadministativização consta, igualmente, de outros preceitos. Sem os


analisarmos, vamos referi-los: artigo 340º CT, artigo 337º CT, artigo 205º, nº1 CT, artigo
206º, nº2 CT, artigo 155º CT, artigo 349º CT, artigo 350º CT, artigo 397º CT, artigo 402º CT.

- Desaplicação do Direito do Trabalho: O Código do Trabalho estabelece uma classificação


das empresas, sendo este, em regra, o económico; no entanto, e no que respeita à
desaplicação do Direito do Trabalho, o critério é distinto e é o do número de trabalhadores
que, de resto, se encontra disposto no artigo 100º CT.
Do que é que se trata a desaplicação do Direito do Trabalho? Ora, com base na referida
classificação, o Direito do trabalho ou se aplica, ou não se aplica, ou se aplica em moldes

12
Direito do Trabalho

diferentes. Ao longo do Código, existem inúmeros exemplos destas situações que, de


seguida, analisaremos, mas não sem antes classificarmos as empresas à luz do referido
artigo 100º CT.
Assim:
- são microempresas as que empregam menos de 10 trabalhadores;
- são pequenas empresas as que empregam de 10 a menos de 50 pessoas;
- são médias empresas as que empregam de 50 a menos de 250 trabalhadores;
- são grandes empresas as que empregam 250 ou mais trabalhadores.

Por outro lado, se atentarmos ao disposto no artigo 554º CT, parece-nos que este artigo
vem afastar esta classificação, estabelecendo outro critério, nomeadamente um que tem
por base o volume de negócios das empresas.
Dito isto, passemos à análise dos exemplos presentes ao longo do Código:
Artigo 228º CT – nomeadamente as alíneas a) e b) em que é estabelecido um regime
diferente conforme se trate de micro ou pequena empresa, ou média ou grande empresa.
O trabalho suplementar só pode ser prestado quando a empresa tenha de fazer face a
acréscimo eventual e transitório de trabalho e não se justifique para tal a admissão de novo
trabalhador (artigo 227º CT).
Por sua vez, o artigo 228º, nº2 CT demonstra a confiança que o legislador deposita nos
instrumentos de regulação coletiva de trabalho (bem como o nº3).
O nº5 do artigo 228º estabelece que a violação do disposto nos nº1 e nº2 constitui delito
contraobrigacional. No entanto, nada dispõe quanto à violação do nº3, consubstanciando
esta uma situação de desaplicação do Direito do Trabalho.
Artigo 217º, nº2 CT – trata da alteração do horário de trabalho, relevando a classificação
das empresas quanto ao número de trabalhadores.
Artigo 241º, nº3 CT – quanto à marcação do período de férias nas pequenas e médias
empresas.
Artigo 358º CT – normalmente, por força dos artigos 328º e 351º CT, não é possível
estabelecer uma sanção ao trabalhador sem que lhe seja garantido o contraditório; e,
tratando.se da aplicação de uma sanção punitiva mais grave, o legislador impõe todo um
processo disciplinar (artigos 352º e seguintes CT). No entanto, atento à qualificação da
empresa quanto ao número de trabalhadores, as exigências poderão ser diferentes.
Artigo 317º, nº3, alínea d) CT – apenas faz referências às pequenas e médias empresas.
Artigo 392º, nº1 CT – só se refere às microempresas.

Capítulo IV – As Fontes

No âmbito do Direito do Trabalho, podemos entender fontes num sentido restrito ou num
sentido mais amplo.
Assim, ao lado das fontes em sentido técnico, assumem relevo outras (que, no entanto,
podem escapar ao caráter de normas): as cláusulas contratuais gerais, quando o contrato
de trabalho seja celebrado por adesão (artigo 105º CT); os atos organizativos e diretivos do

13
Direito do Trabalho

empregador, quando assumam forma genérica (regulamentos, por exemplo); os usos e


práticas laborais (quando gerados no quadro de uma empresa); a doutrina e jurisprudência.
Todavia, todos estes elementos acima mencionados estão subordinados às fontes em
sentido próprio, não estando, entre si, sujeitos a uma relação hierárquica.
Em relação à doutrina e à jurisprudência: em Portugal, é normal que estas sejam tidas em
conta na formulação de decisões. O Supremo Tribunal de Justiça recorre, com frequência, à
posição de autores conceituados, citando literatura jurídica, na prolação das suas decisões
(apontando-as como seu fundamento). Na relação entre estas duas fontes informais, entre
nós, a doutrina assume mais importância do que a jurisprudência, nomeadamente no que
respeita à construção teórica dos institutos.
Ainda assim, nem uma nem outra podem aspirar, no nosso ordenamento jurídico, a ser
reconhecidas como fontes de direito em sentido técnico.

- Espécies de Fontes:

Fontes autónomas e fontes heterónomas: as primeiras traduzem intervenções externas


(do Estado) na definição de condições de trabalho e aspetos conexos, isto é, na composição
dos interesses de empregadores e trabalhadores (v.g., a lei); as segundas constituem formas
de autorregulação, isto é, exprimem soluções de equilíbrio ditados pelos próprios titulares
daqueles, os trabalhadores e os empregadores, coletivamente organizados ou não (v.g., as
convenções coletivas de trabalho).
Fontes internacionais e internas: as internas são o produto de mecanismos inteiramente
regulados pelo ordenamento jurídico interno de cada país; as internacionais resultam do
estabelecimento de relações internacionais, no âmbito de organizações existentes ou fora
dele (através da negociação entre Estados).
Neste plano das fontes internas, a Constituição da República Portuguesa assume especial
relevância – no texto constitucional foram estabelecidos pelo legislador constituinte um
conjunto de direitos fundamentais dos trabalhadores, próprios do “Estado Social” que se
quis implementar em 1976. Para além destes, conhecem-se outros direitos que, não sendo
próprios apenas das relações laborais, também poderão ser invocados pelos trabalhadores:
artigos 21º, 25º, 26º, 35º, 37º e 41º, todos da CRP.
Por força do artigo 17º e do artigo 18º, este conjunto de direitos é abrangido pelo regime
dos direitos, liberdades e garantias, valendo igualmente para estes o Princípio da
Aplicabilidade Direta. Daqui resulta que estes vinculam, sem mais, as “entidades públicas e
privadas”.
Ao texto constitucional são, assim, atribuídas duas funções: função precetiva –
nomeadamente na afirmação de direitos fundamentais; e uma função de controlo – ao
estabelecer diretrizes básicas para os diversos institutos juslaborais.

Referência às fontes internacionais:


No âmbito da Organização das Nações Unidas, destacamos a Declaração Universal dos
Direitos Humanos (não tem um caráter vinculativo, mas que, entre nós, assume especial
relevância, por força do artigo 16º, nº2 CRP. Donde, os preceitos dispostos nos artigos 53º

14
Direito do Trabalho

a 57º CRP, 58º, 59º e 63º CRP devem ser interpretados e integrados segundo a DUDH); o
Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos; e o Pacto Internacional sobre os
Direitos Económicos, Sociais e Culturais.
No quadro do Conselho da Europa, referimos a Convenção Europeia dos Direito do Homem
(proíbe no artigo 4º a escravatura; consagra a liberdade sindical; e reconhece um nível
jurisdicional. Todavia, a vocação “normativa” que dela constam referentes ao Direito do
Trabalho é escassa); a Carta Social Europeia (apenas considerada com caráter doutrinário.
A ratificação da referida Carta pelo estado português obriga-o a proceder em conformidade
com o artigo 4º).
As maiores fontes internacionais do Direito do Trabalho Português são as convenções
celebradas pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). Dependendo do grau de
vinculação, as convenções são recebidas automaticamente pelo ordenamento jurídico
português (artigo 8º, nº2 CRP) – assim, ratificados pelo Estado e publicados no Diário da
República, as convenções passam a integrar o ordenamento jurídico interno
independentemente de transposição do seu conteúdo para a lei ordinária interna (são três
os requisitos: vigência na ordem internacional; ratificação; publicação).
A ordem jurídica europeia – falamos da União Europeia -, nomeadamente através do
Tratado de Funcionamento da União Europeia (TFUE) pretendeu, entre outras finalidades,
promover o emprego. Esta finalidade, bem como as outras, são prosseguidas através da
emanação de regulamentos e diretivas.

Referência às fontes internas:


No artigo 1º do Código do Trabalho estão elencadas as fontes específicas do Direito do
Trabalho.
Fora deste escopo situam-se as fontes comuns (e, portanto, comuns a todos os ramos do
direito), que são as seguintes: leis constitucionais (as que aprovam e reviram o texto
constitucional); leis ordinárias comuns (com especial ênfase para o Código Civil,
nomeadamente no que concerne ao regime dos contratos e das obrigações).
Assim, o artigo 1º CT apenas se refere aos instrumentos de regulamentação coletiva de
trabalho18 e aos usos laborais.

Instrumentos de Regulação Coletiva


O conjunto dos instrumentos de regulamentação coletiva abrange os instrumentos de
índole convencional (contratos coletivos, acordos coletivos, etc.), os de natureza
administrativa (portarias de condições de trabalho, acordos de adesão) e, ainda, as decisões
arbitrais, que assumem uma fisionomia semiautónoma.
Os elementos de todos estes instrumentos descendem de uma mesma ordem de exigências
sociais – a da adequação de regimes de prestação de trabalho e da melhoria das condições
em que é prestada -, situando-se sob os ângulos das “coletividades” e dos interesses
coletivos.

18
De entre estes ter-se-ão de destacar as convenções coletivas de trabalho (é-lhes reconhecido um
caráter normativo).

15
Direito do Trabalho

- Portarias de extensão: são instrumentos administrativos de alargamento do âmbito


originário de convenções coletivas e decisões arbitrais (artigo 504º CT).
Estas poderão ser emitidas para alargar o âmbito da sua aplicação, nomeadamente quando
haja empregadores e trabalhadores não abrangidos por uma convenção anterior (artigo
515º CT), obedecendo ao disposto no artigo 514º, nº2 CT.
Assim, nos termos do artigo 515º CT, estas podem ser emitidas, de forma subsidiária, na
falta de instrumento negocial; estando, no entanto, afastadas se, no seu âmbito, surgir uma
convenção coletiva.
Finalmente, referir que as entidades atingidas gozam de um direito de oposição (nos termos
do artigo 516º, nº2 CT).
- Portarias de condições de trabalho: são atos administrativos de conteúdo genérico, da
competência do Ministro do Trabalho e do Ministro da Tutela ou responsável pelo setor de
atividade (artigo 518º, nº1 CT).
Deve, no entanto, obedecer aos seguintes pressupostos: inexistência de associações
sindicais ou de empregadores, verificação de “circunstâncias económico-sociais que o
justifiquem”, não sendo possível o recurso ao regulamento de extensão (artigo 517º CT).
- Convenções Coletivas de Trabalho: no âmbito do Direito do Trabalho, a regulamentação
por via convencional ocupa um lugar predominante, no seio das quais se destacam as
Convenções Coletivas de Trabalho.
Estas podem resultar de um acordo celebrado entre associações de empregadores e de
trabalhadores (contrato coletivo – agem associações de ambos os lados); ou de acordo
celebrado entre empresas e organizações representativas de trabalhadores (acordo coletivo
- intervém uma pluralidade de empregadores de diferentes empresas).
Através de tais convenções visa-se estabelecer para determinado setor da atividade
económica, um regime particularizado e complexo, pretendendo, no geral, definir
juridicamente a situação profissional dos trabalhadores envolvidos.
As convenções coletivas possuem uma faceta negocial e uma faceta regulamentar: por um
lado, resulta de um acordo obtido através de negociações, valendo como uma forma de
equilíbrio entre os interesses coletivos dos trabalhadores e dos empregadores envolvidos.
Deste acordo decorrem obrigações – para o sindicato e para a entidade patronal (cf. artigo
492º, nº2, alínea a) CT); por outro lado, do acordo nascem normas jurídicas incidentes sobre
os contratos individuais de trabalho vigentes ou futuro, dentro do seu âmbito de aplicação
(artigo 496º CT): preenchem os pontos deixados em claro pelas partes e, sendo de caráter
imperativo, se substituem às condições, individualmente contratadas, que delas divirjam
(artigo 121º, nº2 CT).
Ora, estas duas facetas articulam-se entre si.
Se vigora a renovação sucessiva da convenção, nos termos do artigo 499º CT, a
regulamentação por ela definida vigora indefinidamente; se a convenção caduca, as normas
deixam automaticamente de vigorar (artigo 501º CT).
Da convenção devem constar obrigatoriamente os seguintes elementos: designação das
entidades celebrantes, o nome e qualidade em que intervêm o os representantes das
entidades celebrantes, etc., o prazo de vigência acordado (artigo 492º, nº1 CT). Estas estão

16
Direito do Trabalho

sujeitas a um controlo administrativo: depósito no Ministério do Trabalho, sem o qual não


há publicação.
À interpretação das convenções – nomeadamente da sua vertente normativa – deve fazer-
se de acordo com a vontade real dos contraentes e com as regras próprias da interpretação
da lei. Diga-se que é entendimento da jurisprudência que a atividade interpretativa deve
obedecer a juízos objetivistas, desvalorizando-se a vontade real dos contraentes.
Finalmente, entende Monteiro Fernandes que a interpretação destas deve obedecer ao
disposto no artigo 9º do Código Civil. Pode, até, inclusivamente, ser objeto de uma ação
judicial – artigos 183º e seguintes do Código de Processo do Trabalho.
As convenções coletivas de trabalho só entram em vigor após a sua publicação no Boletim
de Trabalho e Emprego (artigo 519º CT), no quinto dia após essa mesma publicação, salvo
convenção expressa em contrário.

Usos laborais
O artigo 1º CT consagra os usos laborais como fonte, desde que estes não contrariem o
Princípio da Boa Fé. O que caracteriza as referidas práticas é a repetição, a continuidade,
sendo-lhe estranha a “convicção generalizada de juridicidade” – própria do costume como
fonte de direito.
Existindo usos, os contratos de trabalho passam a estar “sujeitos” a estes, não podendo
afastar-se do padrão que eles definem. Deste modo, os usos são soluções obrigatórias para
os contraentes, às quais não se poderá sobrepor a vontade deles. Os usos surgem, assim,
como limitação à liberdade de estipulação das partes (ao lado da lei e das convenções
coletivas).
Por isso, existem usos vinculantes, isto é, práticas generalizadas que são suscetíveis,
nomeadamente pela expetativa de continuidade que geram, de fundamentar obrigações de
conduta das partes. Ora, esta possibilidade depende de condições objetivas: a generalidade
– não pode tratar-se de práticas individuais, mas antes práticas adotadas para a coletividade
dos trabalhadores; a fixidez – deve manter sempre as suas características; a constância –
deve ser repetida; e a incondicionalidade – a inexistência de indicações que obriguem a
autonomizar cada uma das ocorrências de tais práticas.
E, claro, dependerá sempre da sua conformidade com a lei e com as convenções coletivas,
na medida em que uma prática ilegal nunca poderá ascender ao estatuto que lhe é
reconhecido pelo artigo 1º CTº
Os usos devem, igualmente, respeitar a boa fé, que é o fundamento do seu caráter
vinculativo. Para que a prática se considere vinculante é necessário que seja constante. No
entanto, não existe um critério que nos permita fixar um tempo mínimo para que o uso se
torne relevante. Deve, então, atender-se às circunstâncias de cada caso concreto.
Por fim, cumpre destacar a polivalência dos usos: os usos interpretativos, os usos
integradores19 e os usos laborais autónomos (que parecem ser o principal alvo do artigo 1º
CT, tornando-se em padrões de comportamento exigíveis. Estes são factos conformadores

19
Cf. artigo 3º do Código Civil

17
Direito do Trabalho

das relações de trabalho no seio de uma empresa sem, no entanto, constituírem uma fonte
“intencional” deste ramo do direito).

Subcapítulo I – A Hierarquia das Fontes

Fontes internacionais vs. Fontes internas: com ressalva para o texto constitucional, as
fontes internacionais prevalecem sobre as fontes internas, por força do artigo 8º, nº2 CRP.

Fontes internas: regra geral, a hierarquia seria a seguinte – primado do Direito


Constitucional, seguido da lei, esta seguida das convenções coletivas de trabalho e, por fim,
surgiriam os usos laborais.
Em Direito do Trabalho esta hierarquia sofre alguns desvios. Senão vejamos: a lei só pode
ser afastada por contrato de trabalho quando este estabeleça condições mais favoráveis
para o trabalhador (artigo 3º, nº4 CT); por sua vez, as convenções coletivas de trabalho só
podem ser afastadas através de contrato se este estabelecer condições mais favoráveis
(Artigo 476º CT) – Princípio do Tratamento Mais Favorável; as convenções coletivas de
trabalho podem, regra geral, e a menos que estejamos perante normas imperativas (artigo
478º, nº1, alínea a) CT), afastar disposições legais (artigo 3º, nº1 CT), ainda que estabeleçam
condições menos favoráveis ao trabalhador. No entanto, nas matérias consagradas no
artigo 3º, nº3 CT, as convenções coletivas de trabalho só poderão afastar a lei se dispuserem
em sentido mais favorável ao trabalhador.

Ora, o disposto no artigo 3º, nº4 CT é um dos muitos exemplos que constam do Código que
representam a desconfiança com que o legislador olha o contrato individual de trabalho.
Este só poderá afastar outras fontes normativas se estabelecer condições mais favoráveis,
caso contrário sucumbirá perante convenções coletivas de trabalho ou perante a lei. Na
verdade, e não nos esqueçamos, aquando da celebração de um contrato de trabalho
existem sempre uma parte mais frágil/débil – o trabalhador, pelo que não existem um
equilíbrio entre a vontade dos contraentes.
Outros exemplos poderiam ser apontados: vejamos o disposto no artigo 155º, nº2 e nº3 CT
– o legislador concede ao trabalhador a oportunidade de, no prazo de 7 dias, fazer cessar o
contrato, por meio de comunicação20. Estamos perante um direito de arrependimento do
trabalhador21.
Por outro lado, o legislador confia no processo de concertação e participação que precede
uma convenção coletiva de trabalho, já que estas, em todo o caso, resultarão de acordo
entre partes.

20
Dar o dito por não dito.
21
O mesmo sucede nos artigos 350º, nº1 CT; 397º, nº1 CT; 402º, nº1 CT.

18
Direito do Trabalho

Capítulo V – O Contrato de Trabalho

Ao Direito do Trabalho, conforme já dissemos, interessa o trabalho subordinado que,


enquanto disciplina jurídica, tem o seu campo delimitado a este. E, por isso, debruça-se
fundamentalmente sobre o instrumento jurídico que dá origem à prestação do trabalho
nesta modalidade: o contrato individual de trabalho22.
Assim, do artigo 11º do Código do Trabalho resulta a seguinte definição/noção: contrato de
trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga mediante retribuição, a prestar a
sua atividade a outra ou outras pessoas, no âmbito da organização e sob a autoridade desta.
Antes de analisarmos, em concreto, os elementos que resultam da referida noção, importa
fazer referência ao que resulta do artigo 1152º do Código Civil: a noção que deste preceito
decorre não coincide com a que resulta do Código do Trabalho. Por um lado, fala-se sob a
autoridade e autorização desta e, por outro, remete para a possibilidade da existência de
uma pluralidade de trabalhadores – regime que, de resto, se encontra previsto no artigo
101º CT.

Subcapítulo I – Elementos do Contrato de Trabalho

Atividade do trabalhador: este elemento é, simultaneamente, o objeto do contrato (de


trabalho). Em causa está a prestação a que o trabalhador se obriga perante a entidade
patronal – trata-se de uma prestação de atividade, consubstanciada na exteriorização da
força de trabalho tornada disponível, para a outra parte, por meio do contrato celebrado.
Neste momento, podemos apontar o elemento que nos permite fazer, prima facie, a
distinção entre as relações de trabalho subordinado23 e o trabalho autónomo.
É que, quanto ao trabalho autónomo, o fornecedor da força de trabalho (o trabalhador)
mantém o controlo da aplicação desta, isto é, pode organizar a forma como realizará a
prestação do trabalho e os meios através dos quais o fará.
Relativamente ao trabalho subordinado, o trabalhador está sujeito à direção e organização
da outra parte – o empregador -, sendo este a escolher de que forma será efetuada a
prestação laboral.
Dito isto, cumpre referir que, não obstante ser a atividade do trabalhador que preenche o
objeto do contrato, a sua inatividade não implica que este esteja em incumprimento ou “em
falta” para com a sua obrigação contratual. Na verdade, não-raras vezes o trabalhador,
ainda que em inatividade, está a cumprir a sua obrigação: em alguns casos, o contrato de
trabalho não faz referência a uma concreta atividade, no sentido de atos com expressão
física24; por outro lado, a inatividade poderá imputar-se a uma causa ligada à própria
empresa – a inatividade pura (artigo 197º, nº2, alínea c)).

22
Vulgo contrato de trabalho.
23
Pelo qual se interessa o Direito do Trabalho, disciplinando-o.
24
Exemplo disso são as estruturas de socorro nos aeroportos – nem sempre entram em efetiva atuação,
estando limitadas a situações em que possam entrar em atividade em sentido próprio. No entanto,
ainda que tal não suceda, não se poderá falar em incumprimento da obrigação contratual, já que, pelo

19
Direito do Trabalho

Dito isto, atividade deve entender-se no sentido de: colocar e manter a sua força de
trabalho disponível para a entidade patronal, em certos termos e dentro de certos limites
qualitativos e quantitativos, enquanto o contrato vigorar (cf. Artigo 197º, nº1). Ademais,
pelo contrato dispõe o trabalhador das suas aptidões profissionais e pessoais, em
contrapartida de uma retribuição económica, admitindo, no entanto, que seja o
empregador a fixar, através do contrato, os termos em que a prestação de trabalho será
efetuada.
Não se deve confundir a atividade com o resultado que o empregador espera alcançar com
a prestação laboral. Donde, o trabalhador não suporta o risco de a finalidade visada pela sua
entidade patronal se vier a frustrar. A verificação do resultado pretendido releva para
efeitos de execução do contrato, na determinação da prestação devida pelo trabalhador,
mas não poderá ser tida em consideração na averiguação do cumprimento ou
incumprimento contratual.
Dependendo da atividade visada pelo contrato de trabalho, pode ser admitida a prática de
atos jurídicos, em nome ou por conta do empregador. Desde logo, é também o que parece
resultar do artigo 115º, nº3 CT, concedendo-se ao trabalhador poderes de representação
para a prática de determinados atos que sejam implícitos à atividade a desempenhar e que
conste do contrato de trabalho.
Conforme dissemos, a finalidade que o empregador visa alcançar com a atividade do
trabalhador poderá ser importante para se definir a forma como este desenvolverá a sua
prestação. Com o contrato, o trabalhador obriga-se não só a despender a sua força
mecânica, mas também a, conhecendo o fim pretendido pela entidade patronal, atuar em
conformidade com este. Esta imposição decorre do artigo 126º, que se refere à boa fé no
cumprimento das obrigações laborais, pelo que os trabalhadores não deverão executar a
sua atividade de modo a contrariar ou impossibilitar o resultado pretendido pelo
empregador, desde que este seja ou possa ser conhecido.
Para além do que ficou dito, resulta do artigo 128º, nº1, alínea c) que o trabalhador fica
obrigado a realizar o trabalho com zelo e diligência (pelo que fica afastada a possibilidade
de ser feita uma greve de zelo).
Temos vindo a falar de diligência, sem, no entanto, darmos uma concreta noção deste
conceito. Ora, cumpre agora fazê-lo: grau de esforço exigível para determinar e executar a
conduta que representa o cumprimento de um dever. A diligência requerida, elemento
integrante da conduta, deve ser determinado caso a caso (artigo 487º do Código Civil), tendo
como ponto de partida a figura do bom pai de família.
O desprezo pelo grau de exigência exigível consubstancia, por força do artigo 351º, nº2, al.
d), um fundamento ao despedimento por justa causa e ao levantamento de processos
disciplinares. Não se confunda isto com a diminuição das aptidões e capacidades
decorrentes do envelhecimento, da perda de capacidade física ou mental, já que estas
situações não se traduzem na diminuição de diligência na execução do trabalho mas que,
ainda assim, poderão servir de fundamento ao despedimento (artigo 375º, nº2).

menos, se exige a atenção face a uma eventual situação que careça da sua intervenção e, quando assim
for, prontidão na sua atuação.

20
Direito do Trabalho

Sujeitos: o trabalhador e a entidade empregadora: este elemento diz respeito às partes da


relação laboral, tendo de um lado o trabalhador – aquele que, por contrato, coloca a sua
força de trabalho à disposição de outrem, mediante retribuição; e do outro a entidade
patronal – pessoa individual ou coletiva que, por contrato, adquire o poder de dispor da força
de trabalho de outrem, no âmbito de uma empresa ou não, mediante o pagamento de uma
retribuição.

Retribuição: este elemento traduz a contrapartida à disponibilidade da força do trabalho,


uma verdadeira retribuição devida ao trabalhador, normalmente satisfeita em dinheiro
(ainda que possa sê-lo em género, nos termos do artigo 259º, nº1).

Subordinação jurídica: consiste numa relação de dependência necessária da conduta


pessoal do trabalhador na execução do contrato face às ordens, regras ou orientações
ditadas pelo empregador, dentro dos limites do mesmo contrato e das normas que o regem.
Esta subordinação pode ser mais ou menos evidente. Muitas vezes, o trabalhador conhece
melhor o trabalho a realizar do que o próprio empregador, daí que este último se abstenha
de dar ordens ou instruções. A ausência de comportamentos diretivos pode dever-se,
igualmente, a estratégias do empregador com vista exponenciar ao máximo as capacidades
dos seus “subordinados”.
Sucede que, muitas vezes, o empregador apenas estabelece diretivas amplas, como a
fixação do horário, do local, de regras disciplinares, deixando o efetivo exercício da atividade
ao critério do trabalhador, confiando na sua diligência e zelo, já que estes poderão estar
mais capacitados do know-how associado ao ramo25.
Por outro lado, podemos falar de uma subordinação económica – o trabalhador para prover
ao seu sustento e ao sustento da sua família está dependente da retribuição que aufere
como contrapartida do seu trabalho; ou, entendendo esta noutro sentido, poderá suceder
que a atividade exercida seja “consumida” por um processo produtivo dominado por
outrem.
Finalmente, e ainda no que respeita à subordinação, cumpre aludir ao seu elemento
organizatório. A identificação da existência de trabalho subordinado passa pela
circunstância de um trabalhador não agir no seio de uma organização que domina, antes
integrando-se numa organização de trabalho alheia, dirigida à obtenção de fins alheios. Isto
explica a submissão às regras que exprimem o poder de organização do empregador e, por
conseguinte, à sua autoridade.

Subcapítulo II – Diferenciação do Contrato de Trabalho

Muitas vezes, não é fácil identificar relações de trabalho subordinado e esta questão é tanto
mais relevante quando percebemos que só estas interessam ao Direito de Trabalho,
deixando todas as outras à sua margem26.

25
Dizemos que, nestes casos, não existe uma subordinação técnica.
26
Que, enfim, se terão de sujeitar às regras gerais do Direito Privado.

21
Direito do Trabalho

Neste contexto, porque muitas vezes se torna inviável a identificação de relações


decorrentes de contrato de trabalho, é recorrente lançar mão de métodos aproximativos,
de forma a interpretar indícios.
Surge, então, a par destas dificuldades, a problemática e já velha questão da distinção entre
contrato de trabalho e contrato de prestação de serviços27.
O contrato de prestação de serviços encontra-se previsto nos artigos 1152º e seguintes do
Código Civil e dedica-se a outras relações contratuais que não sejam as que envolvam um
trabalho subordinado, submetendo, desde logo, o contrato de trabalho a um regime
especial – que será o que resulta do Código do Trabalho (cf. Artigo 1153º).
Estes contratos (de prestação de serviços) poderão versar sobre relações laborais, mas
nunca se ocupará daquelas que envolvam uma subordinação28, debruçando-se sobre
aqueles em que o trabalho não é dominado pelo beneficiário final – o trabalho autónomo.
No âmbito da prestação de serviço, podemos encontrar várias modalidades (que, de resto,
constam do artigo 1155º do CC): referimo-nos ao mandato, ao depósito e à empreitada.

Subcapítulo III – As Presunções de Existência de um Contrato de Trabalho

As presunções, conforme dispõe o artigo 34º do Código Civil, permitem-nos que tiremos
ilações “de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido”. Ora, no âmbito laboral,
estas podem surgir a propósito de dois problemas: o da consideração de existência de um
contrato de trabalho em situações que não se fundam em manifestações expressas de
vontade das partes; e o da qualificação laboral de outras situações, em que as declarações
das partes, ou outros elementos indicativos, apontem para a identificação de outro tipo
contratual.
Do artigo 110º do Código do Trabalho decorre a regra da liberdade de forma dos contratos
do trabalho, salvo as situações em que a lei o exige29. No entanto, o julgador não está livre
de se pronunciar sobre a existência da relação contratual e da sua qualificação, pelo que,
para tanto, se servirá da função presuntiva associada ao artigo 11º CT - isto é, verificados os
elementos subjacentes ao referido preceito, poder-se-á, recorrendo à via presuntiva,
identificar um contrato de trabalho30 (presunção judicial – artigo 351º do CC).
Por outro lado, e a par da presunção judicial, existem as presunções legais (artigo 350º do
CC) – nestas situações, é a própria lei que liga à verificação de certos factos uma conclusão
sobre factos desconhecidos; esta poderá ser provisória ou definitiva, ressalvando-se sempre
a possibilidade de prova em contrário (ou seja, provando-se que o trabalho não é
subordinado como se presumira, mas autónomo).
Entre nós, o artigo 12º CT vem estabelecer uma verdadeira presunção legal. Partindo do
pressuposto da existência de subordinação (“na relação entre uma pessoa que preste uma

27
Dada a sua proximidade enquanto figuras jurídicas parecem confundir-se, pelo que é essencial
proceder à sua distinção. Distinção esta que se consegue fazer, desde logo, com referência ao objeto –
que é distinto – dos tipos contratuais em apreço.
28
Como vimos infra.
29
Questão que abordaremos aquando do estudo dos contratos de trabalho “atípicos”.
30
Inferindo-se a verificação de outros elementos, adquiridos por presunção.

22
Direito do Trabalho

atividade e outra ou outras que dela beneficiam”) e verificadas algumas (pelo menos, duas)
das características que enumeraremos, poder-se-á presumir a existência de um contrato
de trabalho: a atividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele
determinado (alínea a)); os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam
ao beneficiário da atividade (alínea b)); o prestador da atividade observe horas de início e
de termo da prestação determinadas pelo beneficiário da mesma (alínea c)); seja paga, com
determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de atividade, como
contrapartida da mesma (alínea d)); o prestador de atividade desempenhe funções de
direção ou chefia na estrutura orgânica da empresa (alínea e)).
Assim, verificadas algumas destas circunstâncias, caberá ao empregador provar a existência
de uma situação de trabalho por conta própria, ou autónomo. Caso consiga prová-lo, fica
afastada a aplicação do Direito do Trabalho, aplicando-se as disposições gerais do direito
civil, nomeadamente no que concerne ao contrato de prestação de serviços (artigos 1152º
e seguintes do Código Civil).

Subcapítulo IV – As “Situações Equiparadas” ao Trabalho Juridicamente Subordinado

Trabalho autónomo economicamente dependente – a dependência económica que é


inerente a estas relações contratuais, suscita a preocupação do legislador em termos
idênticos às levantadas em razão da subordinação jurídica. Em determinadas situações, o
trabalhador pode ter acesso ao regime do subsídio de desemprego e ao regime jurídico da
segurança social.
O artigo 10º CT vem, por isso, evidenciar a proximidade destas situações à do trabalho
subordinado, sendo-lhes estendida a aplicação do regime relativo aos “direitos de
personalidade, igualdade e não discriminação e segurança e saúde no trabalho”.

Trabalho no domicílio – estas situações só a partir de 2009 começaram a ser reguladas,


através da lei nº 101/2009, de 8 de setembro, consubstanciando até então uma lacuna legal.
Em termos muitos genéricos, a lei impõe que o beneficiário da atividade proceda, em lugar
devido, ao registo dos trabalhadores domiciliários ocupados; os que trabalham nestes
moldes terão acesso ao regime dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, das
contribuições e beneficiários da segurança social; e, claro, terão direito a uma retribuição
correspondente, eventualmente, à retribuição mínima mensal31.
Quanto à cessação do contrato, poderá efetivar-se das mais diversas formas: denúncia por
qualquer das partes; a caducidade resultante da falta de encomendas durante um lapso de
60 dias consecutivos; a resolução pelo beneficiário da atividade, com “motivo justificado” e
com aviso prévio, ou pelo trabalhador, apenas com observância do aviso prévio.
Os efeitos associados à cessação estão, finalmente, previstos no artigo 11º da referida lei.

31
Vulgo salário mínimo.

23
Direito do Trabalho

Subcapítulo V – Caracterização Jurídica do Contrato de Trabalho

Antes de mais, o contrato de trabalho é sinalagmático – tanto o empregador como o


trabalhador contraem obrigações, havendo entre as prestações um nexo de
correspetividade; ora, de um lado temos a obrigação de trabalho e do outro a obrigação de
retribuir, encontrando-se estas ligadas por um vínculo de condicionalidade recíproca32.
A lei não exige forma específica para a sua celebração – artigo 110º CT. Vale, por isso, a
liberdade de forma e, nessa medida, estamos perante um contrato consensual.
No entanto, esta regra conhece várias exceções que se encontram dispostas ao longo do
Código: artigo 153º (contrato de trabalho a tempo parcial); artigo 166º (contrato de
teletrabalho subordinado); artigo 181º (contrato de trabalho temporário); entre outras.
Finalmente, uma vez que o contrato de trabalho pressupõe uma ideia de subordinação e
esta assenta na ideia de integração estável de uma das partes na organização de meios
predisposta pela outra, podemos afirmar que se trata de um contrato duradouro33 –
fundado, assim, numa ideia de continuidade da prática de atos.
A esta característica subjaz a ideia de que o contrato de trabalho tem, em regra, uma
duração indeterminada34.

Subcapítulo VI – As Cláusulas Acessórias

Conforme estudámos, aos contratos podem ser aditadas cláusulas acessórias, possibilidade
que decorre do Princípio da Liberdade Contratual e, nomeadamente, dentro deste, da
liberdade de estipulação35 conferida às partes – neste caso, do contrato de trabalho.
Das cláusulas acessórias destacam-se, no seio do contrato de trabalho, a condição36 e o
termo37. Aliás, esta última reveste uma importância tão acentuada neste domínio que,
conforme veremos, levou à consideração de uma modalidade “atípica” de contrato que, em
sede própria, estudaremos com o devido detalhe.
Quanto à condição, apelando à noção civilística, podemos defini-la da seguinte forma: um
acontecimento futuro e incerto a cuja verificação as partes subordinaram a produção ou
resolução de efeitos jurídicos. Se as partes tiverem subordinado à sua verificação a produção
de efeitos jurídicos, então estaremos perante uma condição suspensiva38; se, pelo

32
Neste contexto, veja-se o sentido do artigo 295º, nº1 CT e do artigo 255º CT.
33
Ou de execução duradoura.
34
Por razões de estabilidade ou segurança do emprego.
35
Traduz-se na faculdade concebida às partes de poderem estabelecer os efeitos jurídicos que querem
ver produzidos e, outrossim, estabelecer o conteúdo dos contratos. – In Apontamentos de Teoria Geral
das Obrigações.
36
Cf. Artigo 270º do Código Civil.
37
Cf. Artigo 278º do Código Civil.
38
Para que fiquemos, de facto, elucidados quanto ao que aqui se trata, recorro a um exemplo de
Monteiro Fernandes. Assim: um empresário teatral contrata um ator para desempenhar certo papel
numa peça, se para ela obter financiamento; enquanto este não surgir, a eficácia do contrato fica
suspensa.

24
Direito do Trabalho

contrário, as partes subordinarem à sua verificação a resolução dos efeitos jurídicos, será
esta uma condição resolutiva39.
No domínio laboral, e no que respeita aos contratos de trabalho, é unânime a
admissibilidade das condições suspensivas, na medida em que esta possibilidade tem,
inclusive, assento legal no artigo 135º do CT. Por outro lado, relativamente à suscetibilidade
de serem aditadas cláusulas resolutivas aos contratos de trabalho, a questão já levanta mais
problemas. É que, em primeiro lugar, estamos perante uma lacuna – a lei nem o admite nem
o proíbe -, pelo que caberá recorrer aos meios tradicionais para procedermos à sua
integração. O argumento mais forte e que vai no sentido negativo – e, assim, na proibição
de aditação destas cláusulas -, resulta da própria letra da lei. De facto, o artigo 135º CT ao
admitir que os contratos sejam celebrados a termo e condição suspensivos, não considera
a condição resolutiva; por outro lado, a exceção feita ao termo resolutivo – artigo 140º, nº1
– deixa, mais uma vez, de parte a admissibilidade destas cláusulas. Donde, poderemos
concluir que nem a título excecional estas poderão considerar-se e, por conseguinte,
admitir-se.
Assim sendo, e como defende Monteiro Fernandes, é forçoso reconhecer, à luz do direito
positivo, que o contrato de trabalho não suporta condição resolutiva.
Quanto ao termo, o legislador admitiu esta possibilidade, que consta do artigo 135º CT –
nomeadamente, a admissibilidade do contrato a termo suspensivo. No que toca à
possibilidade de se aditar um termo resolutivo ao contrato, é verdade que o legislador o
admitiu, no entanto, mostrando-lhe algumas reservas (é alvo até de um regime próprio –
artigos 139º e seguintes CT). Este, como veremos daqui a pouco, só pode ser celebrado em
situações excecionais (e até contadas) – cf. artigo 140º CT -, uma vez que a contratação a
termo resolutivo coloca o trabalhador numa posição (mais) frágil e porque é sempre
preferível a contratação por duração indeterminada (fica mais acautelada a posição do
trabalhador).

Subcapítulo VII – A Invalidade do Contrato de Trabalho

A falta de capacidade dos sujeitos e a inidoneidade do objeto, além de outros vícios que
tenham afetado a formação do contrato40, refletem-se sobre a sua validade, podendo torná-
lo nulo ou anulável.
Dessa forma, e consoante a gravidade do vício, estaremos perante um caso de nulidade
(artigo 286º do CC) ou de anulabilidade (artigo 287º do CC), estando-lhe associados a
produção dos efeitos prescritos no artigo 289º, nº1 – e, por isso, declarado nulo ou anulável
o contrato, ter-se-á que devolver tudo o que houver sido prestado ou, não sendo possível a
sua restituição em espécie, o valor correspondente.
O regime consagrado para o contrato de trabalho consagra, no entanto, algumas
particularidades – artigos 122º e 123º do Código do Trabalho. As soluções apresentadas

39
Mais uma vez, recorro a um exemplo de Monteiro Fernandes: um operário adoece gravemente e
deixa o serviço por essa razão; a entidade recruta outro para o substituir, ficando entendido que este
contrato cessará se e quando o primeiro puder regressar ao trabalho.
40
Como sejam os vícios na formação da vontade e a divergência entre a vontade e declaração – artigos
240º e seguintes do Código Civil.

25
Direito do Trabalho

pelo nosso legislador têm influência alemã, fazendo funcionar os efeitos da invalidade
somente para o futuro.
Assim, entre nós, o contrato de trabalho declarado nulo ou anulável: produz os seus efeitos
como se fosse válido em relação ao tempo em que esteve em execução (artigo 122º, nº1 CT);
produzem efeitos, nos termos do respetivo regime legal, os atos extintivos41 praticados
naquele período; se o contrato for celebrado com estipulação de termo, as consequências
normais da aposição de tal cláusula no respeitante ao regime de cessação do vínculo deixam
de se produzir, substituindo-se-lhes os regimes de despedimento ilícito ou da denúncia pelo
trabalhador sem aviso prévio; produzem efeitos os atos modificativos inválidos desde que
não afetem as garantias do trabalhador (artigo 122º, nº2 CT).
A nulidade ou anulação parcial não determina a invalidade de todo o contrato de trabalho,
salvo quando se mostre que as partes não teriam contratado sem a parte viciada (artigo
121º, nº1 CT).

Capítulo VI – Contratos de Trabalho “Atípicos”

Neste capítulo, debruçar-nos-emos sobre o regime de contratos que, embora não se


afastando dos aspetos essenciais das relações laborais, mereceram um tratamento
específico/especial42 por parte do legislador. Trata-se de modalidades que, ao longo do
tempo e no entender do legislador, tornaram-se “normais” no panorama laboral, como
instrumento jurídico de admissão de trabalhadores e, ao mesmo tempo, como uma
alternativa à contratação sob a modalidade de trabalho por tempo indeterminado 43.

Subcapítulo I – Contrato a Termo (Resolutivo)

Conforme dissemos anteriormente, do artigo 135º CT resulta a possibilidade de aos


contratos de trabalho ser aposto um termo44 suspensivo e, portanto, subordinar-se a
produção dos seus efeitos jurídicos à sua verificação; e, através da exceção consagrada no
artigo 140º, nº1 CT, é admitida a aposição de (reitere-se, a título excecional) um termo
resolutivo.
Os contratos de trabalho celebrados a termo devem constar de documento escrito – cf.
artigo 141º, nº1 do CT -, sob pena de este ser havido como contrato de trabalho sem termo
(artigo 147º, nº1, alínea c) 1ª Parte CT).

Admissibilidade da Contratação a Termo


A contratualização a termo começou por ser uma realidade esporádica mas, com o passar
dos anos, e nomeadamente e partir da década de setenta do século XX, começou por se
desenvolver, acabando por se tornar uma modalidade “normal” de acesso ao trabalho. Com

41
Maxime despedimento, mútuo acordo, etc.
42
“Atípicos” pelo facto de merecerem um tratamento específico.
43
Exemplo paradigmático é o do contrato a termo.
44
Lembremo-nos de que este se traduz num acontecimento futuro, mas certo.

26
Direito do Trabalho

isto, não queremos dizer que a contratação a termo é a regra – porquanto a regra é e
continuará a ser a contratação por tempo indeterminado (por várias razões mas,
nomeadamente, pelas normas que restringem a contratação por tempo determinado) -,
mas, de facto, tem sido uma modalidade de contratação cada vez mais utilizada pelos
empregadores.
O regime do contrato de trabalho a termo encontra-se consagrado nos artigos 139º e
seguintes do Código do Trabalho.
Do estudo da unidade curricular de Teoria Geral do Negócio Jurídico, sabemos que a figura
do termo se subdivide em termo certo do termo incerto. O termo é certo quando se trata
de um momento ou acontecimento que seguramente ocorrerá em momento rigorosamente
determinado45; é incerto quando se trata de um evento que seguramente ocorrerá, mas em
momento indeterminado46.
A contratação a termo só é lícita se, antes de mais, se verificarem, em concreto, dois
pressupostos: que a celebração do contrato nestes moldes vise a satisfação de
necessidades temporárias da empresa (objetivamente determinadas pela entidade
empregadora); e apenas pelo período estritamente necessário à satisfação dessas
necessidades (artigo 140º, nº1 CT). Ora, neste sentido, o legislador veio dizer quais são os
motivos que consubstanciam uma necessidade temporária da empresa, estando estes
elencados no nº2, principalmente (repare-se que o elenco deste preceito não é taxativo –
mas meramente exemplificativo -, algo que resulta do vocábulo “nomeadamente” utilizado
na redação do artigo), mas também no nº4. A este propósito, diga-se que o nº2 e o nº4
consagram hipóteses em que é admitida a contratação a termo certo; donde, para se
contratar a termo incerto deve ter-se como fundamento uma das hipóteses previstas no
nº3, uma vez que este elenco é taxativo (só nesses casos se poderá contratar a termo
incerto).
No entender de António J. Moreira, o artigo 140º, nº2, alínea b) CT consubstancia um
incentivo à litigiosidade judicial, na medida em que o empregador só poderá contratar um
trabalhador, apondo uma cláusula de termo, se houver uma ação pendente para apurar a
licitude do despedimento. De outra forma, e conforme diz o nº2 do referido artigo, não
haverá “necessidade temporária” e, por conseguinte, um motivo que justifique a
contratação nestes moldes (o motivo justificativo).
De qualquer forma, caberá sempre ao empregador provar os factos que levaram à
contratação a termo (nº5 do artigo 140º CT), solução que se entende na medida em que é
este que tem interesse em contratar a termo.
O legislador visou, portanto, restringir a admissibilidade de contratação a termo, porquanto
(e já o dissemos) a posição do trabalhador por tempo determinado é ainda mais frágil (o
vínculo laboral é precário). À aversão a esta modalidade de contratação, contrapõe-se o
endeusamento da modalidade-regra: o contrato por tempo indeterminado – isto porque a
cessação do contrato não se verifica pelo atingir de um prazo ou pela verificação de um
evento que, apesar de certo, não se sabe quando se irá verificar.

45
Exemplo: acesso à maioridade de um indivíduo.
46
Exemplo: a morte de um indivíduo (incerto quanto à sua verificação).

27
Direito do Trabalho

Atendendo à razão axiológica do Direito do Trabalho, o legislador viu-se obrigado a


restringir a contratação nestes moldes, sob pena de esta se tornar a regra no domínio
laboral, o que não é, de todo, desejável.
A preferência pela contratação por tempo indeterminado encontra-se evidenciada nas
consequências previstas no artigo 147º CT: nomeadamente, em resultado do desrespeito
pela forma escrita (artigo 141º, nº1 CT); e pela indicação expressa do motivo justificativo
(que levou à contratação nestes moldes) e dos factos que o integram47 (artigo 141º, nº1,
alínea e) e nº3 CT). É que resulta do referido artigo 147º CT que a violação (ou a não
verificação) de algumas destas exigências, leva a que o contrato celebrado seja considerado
sem termo (nº1, alínea c) 1ª parte e in fine) – e, portanto, o trabalhador considera-se
contratado por tempo indeterminado (aplicando-se, por conseguinte, o regime geral).
A estipulação do termo e o motivo justificativo invocado devem estabelecer entre si uma
relação lógica, isto é, o motivo deve justificar a estipulação do termo a que se refere (de
resto, esta exigência resulta do artigo 141º, nº3 in fine).

Duração do Contrato de Trabalho a Termo


Em regra, o contrato de trabalho a termo certo não pode ser celebrado por um período
inferior a seis meses (artigo 148º, nº2 CT), nem por um período superior a dois anos (nº1
do mesmo artigo). Contudo, excecionalmente, admite-se que este prazo mínimo seja
inferior – falamos dos casos previstos nas alíneas a) a g) do nº2 do artigo 140º (na verdade,
esta possibilidade, ainda que excecional, poderá verificar-se em várias situações); por outro
lado, ressalvados estão, igualmente, os casos abrangidos pelo artigo 142º CT (em que o
legislador impõe que a duração do contrato não ultrapasse o prazo de 35 dias).
A violação do prazo mínimo de seis meses (afora os casos em que tal se admita), importa
que o contrato (que haja sido celebrado com desrespeito por esta imposição legal) se
considere celebrado por seis meses (conforme preceitua o artigo 148º, nº3 CT), desde que
tal corresponda à satisfação das necessidades temporárias da empresa.
No concernente ao contrato de trabalho a termo incerto, este não pode ser celebrado por
período inferior a seis meses (aplica-se o referido artigo 148º, nº2 CT, já que este preceito
não faz distinção), nem por período superior a quatro anos (artigo 148º, nº5 CT) – não
obstante não se saber quando o acontecimento se verificará (por certo se verificará, não se
sabe é quando tal irá suceder), o legislador entendeu que, de forma a tutelar os interesses
do trabalhador e a segurança no trabalho, o prazo não poderá exceder os quatro anos (para
que a insegurança não se protele ainda mais no tempo).
Dito isto, por ora importa analisar o regime de renovação dos contratos a termo certo,
disposto no artigo 149º CT. Neste enquadramento, em regra, o contrato a termo renova-se
de forma automática, a menos que as partes acordem que este não fica sujeito a renovação
– é o que resulta do nº1 e do nº2 do artigo supracitado (as partes ao estabelecerem cláusulas

47
A indicação dos factos que integram o motivo justificativo é de uma singular importância. Não basta
que do contrato conste o motivo justificativo – v.g., o acréscimo excecional de atividade da empresa -, é
ainda necessário que se aponham os factos que o integram (v.g., uma fábrica de sapatos que se depara
com uma encomenda que envolve a produção de 100 000 pares de sapatos por dia), sob pena de o
contrato se considerar celebrado sem termo (como, aliás, já referimos) – artigo 147º, nº1, alínea c) in
fine.

28
Direito do Trabalho

de não renovação, pretendem obstar a que se produza a renovação automática imposta


pelo nº2). Assim sendo, o contrato (no silêncio das partes) renovar-se-á pelo mesmo período
convencionado aquando do primeiro contrato, sem prejuízo das partes estipularem prazo
diverso. Diga-se, ainda, que as renovações de um contrato a termo estão limitadas a três
vezes e a duração total das renovações não pode exceder o período inicial daquele (v.g., um
contrato celebrado a termo certo com a duração de uma ano e meio; as três renovações
seguintes não podem exceder aquele período, podendo vigorar, cada uma delas, por
exemplo, por seis meses) – neste sentido, fala-se da regra da renovabilidade limitada dos
contratos a termo certo.
Recapitulando: a regra é a de que os contratos a termo se renovam automaticamente, salvo
se as partes se opuserem a tal, acordando em sentido diverso (artigo 149º, nº1 CT). Neste
último caso, o contrato extinguir-se-á, findo o prazo estipulado, por caducidade; donde, se
as partes pretenderem prolongar o vínculo – renovando-o -, terão de acordar nesse sentido
(renovação convencional). Ora, esse acordo poderá estabelecer a prolongação do vínculo
nos mesmo moldes (i. é., com o mesmo conteúdo), valendo para a celebração deste o que
ficou dito anterior – nomeadamente, o que concerne à indicação do motivo justificativo.
Este ponto, aliás, merece algum desenvolvimento da nossa parte. A existência e validade do
motivo justificativo que leva à contratação a termo é apurada e relevante no momento da
celebração do contrato. Donde, na hipótese de o motivo justificativo deixar de existir (qual
seja a razão) durante a execução do contrato, tal não importará nunca a cessação imediata
do mesmo (fundada nesta razão). E esta doutrina vale tanto para os casos em que opere a
renovação automática – isto é, se o motivo não persistir à data da renovação do vínculo, a
renovação automática não opera, uma vez que desapareceu o motivo que levou a contratar
(e o que levaria à renovação do vínculo) -, como para a renovação convencional – deixando
de se verificar o motivo que levou à contratação o contrato não pode ser renovado48 (cf.
artigo 149º, nº3 CT).
Por outro lado, impõe-se-nos que demos conta dos requisitos de forma a que o contrato a
termo renovado se encontra adstrito. Vimos já que, aquando da sua celebração (inicial),
este deve ser reduzido a escrito (impõe-no o artigo 141º, nº1 CT); mas é, também, esta a
regra relativamente às suas renovações, salvo em duas exceções que, em seguida,
enumeraremos: 1) renovação automática ope legis (artigo 149º, nº2 CT); 2) nos casos
abrangidos pelo artigo 142º CT – na verdade, nem inicialmente nem a posteriori (para a
renovação) é exigida forma escrita.
De resto, vigora a regra de que as renovações (convencionais) devem ser reduzidas a
escrito, bem como devem respeitar sempre as demais exigências estipuladas no artigo 141º
(ex vi artigo 149º, nº3 CT).

Sucessão do Contrato de Trabalho a Termo


Tendo em vista a segurança no emprego (cf. artigo 53º CRP) e, nesse sentido, a preferência
pela contratação por tempo indeterminado, o legislador consagrou no artigo 143º CT um
mecanismo (se assim podemos chamá-lo) impeditivo do defraude da lei e, em concreto, da

48
Ou, melhor dito, prorrogado.

29
Direito do Trabalho

regra da renovabilidade limitada dos contratos a termo (artigo 149º, nº4 CT)49. Na verdade,
atendendo à prossecução dos seus interesses enquanto empregadores, estes poderiam
defraudar o disposto por aquela regra (o contrato não pode ser renovado por mais de três
vezes), recorrendo à celebração de sucessivos (novos) contratos a termo com o mesmo ou
com outro trabalhador. Assim, celebrando sucessivos contratos diversos com (por exemplo)
o mesmo trabalhador, quando cessasse o precedente, não se estaria a violar o disposto
naquela norma.
Para evitar este logro, o legislador impôs que entre a celebração de contratos sob esta
modalidade – entre o trabalhador e uma mesma entidade empregadora - haja um hiato
temporal que não deve ser inferior a um terço da duração do contrato precedente,
incluindo renovações (143º, nº1 CT).
Para que alcancemos a abrangência deste impedimento, tomemos em consideração o
seguinte exemplo: A, entidade empregadora, celebrou com B um contrato a termo (certo)
por um período de seis meses. Findo esse prazo, o contrato (porque as partes não se
opuseram a tal) renovou-se por igual período. Poderá a entidade empregadora celebrar um
novo contrato a termo com o mesmo trabalhador, B? O alcance do artigo 143º CT é
precisamente impedir que este tipo de situações se verifique; segundo esta norma, A não
poderá contratar (diga-se, a termo) novamente com B, podendo apenas, caso o queira, fazê-
lo decorridos 4 meses (duração inicial do contrato a termo – seis meses; período da
renovação – seis meses; período total – 12 meses; 1/3 de 12 meses – 4 meses).
Neste enquadramento, defende Monteiro Fernandes, que o artigo 143º CT não visou
apenas proibir esta prática quando se pretenda celebrar novo contrato a termo com o
mesmo trabalhador, mas, também, quando se trate da admissão de novo trabalhador. Isto
porque – adianta -, se não fosse este o logro do legislador, então bastaria para proibir esta
espiral de contratação a termo o disposto no artigo 129º, nº1, alínea J) CT.
Contudo, a aplicação deste preceito implica que se verifiquem alguns requisitos
(cumulativos): que a celebração do contrato a termo se deva a razão não imputável ao
trabalhador (resulta expresso do artigo 143º, nº1, 1ª parte CT); inexistência de um período
de espera equivalente a um terço da duração do contrato anterior (incluindo renovações);
e esta proibição só vale para o preenchimento do mesmo posto de trabalho50.
Excecionalmente, esta regra não vigorará – falamos, nomeadamente, dos casos a que se
refere o nº2 do artigo 143º CT: a) nova ausência do trabalhador substituído, quando o
contrato de trabalho a termo tenha sido celebrado para a sua substituição; b) acréscimo
excecional da atividade da empresa, após a cessação do contrato; c) atividade sazonal. Ainda
assim, as exceções não se esgotam nestas hipóteses porque, conforme referimos, aquele
regime só opera nos casos em que o vínculo não tenha cessado por facto imputável ao
trabalhador; donde, a contrario, o regime não operará quando o primitivo vínculo tenha
cessado por facto imputável àquele (por decisão unilateral ou razões disciplinares).

49
António José Moreira, neste sentido, fala da existência de um período de nojo.
50
Daí que se entenda o ponto de vista de Monteiro Fernandes – ora, admitir-se a possibilidade de
contratar a termo outro trabalhador para ocupar o mesmo posto de trabalho acabaria, indiretamente,
por se traduzir numa violação do disposto no artigo 149º, nº4 CT. Poder-se-ia sempre contratar a termo,
ainda que não com um mesmo trabalhador, com um trabalhador diverso, o que, por certo, frustraria o
espírito da lei.

30
Direito do Trabalho

As relações laborais duradouras devem, sempre, fundar-se em contratos de duração


indeterminada, e nunca na celebração sucessiva de contratos a termo. E, nesse sentido, veio
o legislador no artigo 143º CT estabelecer uma descontinuidade na contratação sob esta
modalidade, devendo encarar-se tal disposição como uma sanção à má utilização da
contratação a termo.

As consequências prescritas no artigo 147º CT


Fomos já adiantando algumas das causas que levam à aplicação deste preceito e, com isso,
das sanções que ele prevê. No entanto, porque esta norma se reveste de desmesurada
importância, dedicar-lhe-emos este ponto.
Ora, as consequências são apenas duas e que, na verdade, levam a uma mesma solução: ou
considera-se o contrato celebrado sem termo (nº1 do artigo 147º) ou o contrato converte-
se ope legis num contrato de trabalho por duração indeterminada (nº2 do artigo 147º)51.
Dito isto, importa analisar as causas que levam a cada uma destas consequências. Levam a
que o contrato se considere sem termo (nº1)52, a estipulação de termo que tenha por fim
iludir as disposições que regulam o contrato sem termo53; os contratos celebrados fora dos
casos previstos no nº1, nº2 e nº3 do artigo 140º CT; em que falte a redução a escrito, a
identificação e assinatura das partes, ou, simultaneamente, as datas de celebração do
contrato e de início do trabalho, bem como aquele em que se omitam ou sejam insuficientes
as referências ao termo e ao motivo justificativo; o contrato celebrado em violação o artigo
143º, nº1 CT.
Por outra via, determinadas circunstâncias, poderão levar à conversão ope legis do contrato
em contrato por tempo indeterminado (nº2). Levam a tanto, a renovação que não tenha
respeitado o disposto no artigo 149º CT – normalmente, são as situações em que o motivo
que justifica a contratação a termo já não existe aquando da renovação e, outrossim,
quando não se respeite a forma legal exigida; aquele em que seja excedido o prazo de
duração ou o número de renovações (cf. artigo 148º); o contrato celebrado por termo
incerto, quando o trabalhador permaneça após a data de caducidade indicada na
comunicação do empregador ou, na falta desta, decorridos 15 dias após a verificação do
termo. Este segundo grupo de casos traduz situações em que, originalmente, o contrato é
celebrado conforme a lei mas que, contudo, a estipulação de termo, supervenientemente,
vem a colidir com a lei (fala-se da caducidade da cláusula de termo).
Como dissemos, as soluções acabam por se fundir – o contrato considera-se ou converte-
se em contrato sem termo. Ademais, também o regime aplicável no concernente à
antiguidade do trabalhador é similar, começando esta a contar-se desde o início da
prestação laboral como se esta tenha sido, desde sempre, fundada num contrato de duração
indeterminada (artigo 147º, nº3 CT), exceto no caso de violação do disposto no artigo 143º,
nº1 CT.

51
Mais uma vez, fica evidenciada a preferência do legislador pela modalidade de contratação por tempo
indeterminado.
52
Neutraliza-se a cláusula de termo.
53
Falamos, por exemplo, da hipótese de o empregador subordinar a cessação do contrato a termo por
sua decisão unilateral; ou incumbido o empregador da prova dos factos que integram o motivo
justificativo (artigo 140º, nº5), este não os consiga provar.

31
Direito do Trabalho

Dito isto, e antes de passarmos à análise do regime da cessação dos contratos a termo,
cumpre fazer (outras) breves considerações.
Em primeiro lugar, parece-nos que o artigo 145º CT consagra uma espécie de direito de
preferência. Isto porque, no período de 30 dias após a cessação do contrato, o trabalhador
goza de preferência na celebração de contrato sem termo, com o que isto importa,
nomeadamente, o facto de o empregador, caso pretenda admitir novo trabalhador por
tempo indeterminado, estar obrigado a fazer prevalecer a posição do anterior trabalhador
a termo. Isto funciona quando o recrutamento seja externo e se destine ao exercício de
funções idênticas exercidas pelo antigo trabalhador (a termo). A violação deste direito de
preferência obriga o empregador a indemnizar o trabalhador no valor correspondente a três
meses da retribuição base, para além de que constitui uma contraordenação grave.
Em segundo, o artigo 142º CT vem admitir, excecionalmente, que o contrato a termo seja
celebrado por período inferior a seis meses. Atividades sazonais – como as agrícolas -,
exigem, em determinada altura do ano, mais trabalhadores para fazer face às suas
necessidades. O legislador, reconhecendo essa necessidade, veio possibilitar a contratação
a termo por período não superior a 35 dias (afastando, inclusive, a necessidade de o
contrato seguir forma escrita). Ainda assim, estabelece uma limitação que se prende com a
impossibilidade de empregador e trabalhador contratarem por mais de 70 dias de trabalho
no mesmo ano civil (os 70 dias facilmente se preencherão com uma única renovação por
igual período (35 dias) do contrato a termo).
Por seu turno, o artigo 146º CT estabelece um Princípio de Igualdade (de Tratamento). Isto
implica que os trabalhadores a termo estão vinculados aos mesmos deveres e gozam dos
mesmos direitos que os trabalhadores por tempo indeterminado.
O artigo 144º CT refere-se ao dever de o empregador comunicar à comissão de
trabalhadores e à associação sindical em que o trabalhador (contratado) esteja filiado, no
prazo de cinco dias úteis, a celebração do contrato a termo, bem como o motivo justificativo
sobre o qual assenta esse vínculo contratual54.

Caducidade do Contrato a Termo


Neste enquadramento, regem os artigos 344º e 345º CT, sendo que o primeiro consagra o
regime da caducidade do contrato de trabalho a termo certo, e o segundo refere-se ao
contrato de trabalho a termo incerto.
O contrato celebrado a termo certo caduca no final do prazo estipulado, ou da sua
renovação, desde que o empregador ou o trabalhador comunique à outra parte a vontade
de o fazer cessar, por escrito, respetivamente, 15 ou oito dias antes de o prazo expirar. Ao
contrário do que se possa pensar, o contrato não cessa pela mera verificação do termo a
que se subordinou a resolução dos efeitos do contrato, exigindo-se um momento volitivo –
isto é, um momento em que um dos contraentes expressa que é sua vontade que o contrato
não se protele para lá da verificação do termo. Quando o contrato cesse, então, pela

54
Este está adstrito a outros deveres, mas remetemos para a lei (e sua leitura).

32
Direito do Trabalho

verificação do seu termo, o trabalhador tem direito à compensação prescrita no nº2 do


artigo 344º CT.
Se celebrado a termo incerto, o contrato caduca quando, prevendo-se a verificação
daquele, o empregador comunique a cessação do mesmo ao trabalhador, com uma
antecedência mínima de sete dias (se o contrato tiver durado por período até seis meses),
de 30 dias (se tiver vigorado entre seis meses a dois anos) ou de 60 dias (se tiver durado por
período superior a dois anos). Ora, caso o empregador não proceda a tal comunicação,
constituir-se-á no dever de indemnizar o(s) trabalhador(es) no valor da retribuição que estes
aufeririam pelo período correspondente ao aviso prévio em falta (v.g., se de sete dias,
deverá indemnizá-lo(s) pelo valor retributivo que receberiam nesse período). Quando o
contrato caducar com base neste motivo, o trabalhador terá direito a uma compensação –
a que consta do artigo 345º, nº4 CT.
Neste registo, é de referir que o despedimento por iniciativa do empregador só é lícito, em
princípio, havendo justa causa (ou no período experimental). Donde, em caso de
despedimento ilícito (vale por dizer, sem justa causa), o empregador é condenado a pagar
uma determinada quantia ao trabalhador, a título indemnizatório por danos patrimoniais e
não patrimoniais (nº2, alínea a) do artigo 393º CT).

Por remissão de uma norma do regime da pré-reforma (artigo 322º, nº1, alínea a) CT, é
importante que atentemos o disposto no artigo 348º CT. O que sucede nestas situações é o
seguinte: quando ambas as partes tenham conhecimento da reforma do trabalhador por
velhice, o contrato celebrado por tempo indeterminado converter-se-á ope legis num
contrato celebrado a termo. Aplicar-se-lhe-á, nesse caso, o regime do contrato a termo
resolutivo (artigos 139º e seguintes CT), com as especificidades previstas naquele preceito.
Isto é, é dispensada a redução do contrato a escrito; o contrato vigora pelo prazo de seis
meses, renovando-se por períodos iguais e sucessivos, sem sujeição a limites máximos; a
caducidade fica sujeita a um aviso prévio de 60 ou 15 dias, consoante a iniciativa pertença
ao empregador ou ao trabalhador; a caducidade não determina o pagamento de qualquer
compensação ao trabalhador.
O nº3 do artigo 348º CT consagra uma cláusula de extensibilidade do regime supracitado.
Na verdade, ao abrigo desta norma, aquele regime aplica-se igualmente aos trabalhadores
que tenham 70 anos e ainda não tenham atingido reforma (por motivos de idade) 55.
Se o contrato tiver duração inferior a 6 meses, o período de férias é calculado à razão de
dois dias úteis de férias por cada mês (artigo 239º, nº4 CT).

Finalmente, ao abrigo do Princípio da Igualdade de Tratamento (cf. artigo 146º CT),


conforme ficou dito, o trabalhador goza dos mesmos direitos que os demais trabalhadores
(nomeadamente, tendo como referência os trabalhadores por tempo indeterminado). Com
o que isso implica, destacamos o direito ao subsídio de Natal (artigo 263º CT) – equivalente
a um mês de retribuição, devendo este ser pago até dia 15 de dezembro; e ao subsídio de
férias (artigo 264º CT) – este correspondente à retribuição que o trabalhador auferiria se

55
Neste sentido, fala-se numa medida de flexibilização interna da saída da empresa (a ideia que lhe
subjaz é a de uma saída mais ou menos prolongada, sem que isso importe uma desvinculação radical).

33
Direito do Trabalho

estivesse em serviço efetivo; tem, igualmente, direito a férias regendo, neste sentido, o
regime geral disposto nos artigos 238º e seguintes CT. Ainda assim, quando o contrato a
termo seja celebrado por prazo inferior a seis meses (o que é admitido pelo artigo 148º, nº2
CT e nos casos prescritos pelo artigo 142º CT), aplica-se o regime especial disposto no nº4
do artigo 239º CT, tendo o trabalhador a termo direito a dois dias úteis

Subcapítulo II – O Trabalho Temporário

Trabalho temporário é a expressão utilizada para designar as situações em que uma


empresa cede, a título oneroso ou gratuito, e por tempo limitado, a outra empresa a
disponibilidade de trabalho de certo número de trabalhadores. O pessoal cedido, embora
seja remunerado pela entidade cedente, fica funcionalmente integrado na organização da
empresa utilizadora e, nomeadamente, enquadrado pela sua direção ou chefia.
Sucede que a obrigação de pagar a retribuição incumbe à empresa cedente, mas a
prestação laboral do trabalhador é feita em favor da entidade cessionária56.
Os motivos que levam à contratação nestes moldes são variados; por um lado, é uma
alternativa à contratação a termo, por outro pode visar a satisfação de necessidades futuras
“previsíveis” sem que, para a sua satisfação, seja necessário proceder ao alargamento dos
quadros de pessoal da empresa.
Contudo, o trabalho temporário, tal como é concebido, é caracterizado por traços
antissociais que levam à fragilização da posição jurídica do seu trabalhador, porquanto a sua
situação laboral não é nítida. Ora, isto acaba por implicar que os direitos e garantias do
trabalhador não sejam tão bem tutelados como o são por outros regimes de contratação.
Ainda assim, impõe-se, nesta sede, que façamos um exercício de ponderação. É que, não
obstante a posição do trabalhador ficar relativamente mais desprotegida – desde logo,
porque presta o seu trabalho a favor de uma entidade e recebe a sua retribuição através de
outra -, o trabalho temporário oferece vantagens significativas, tanto às empresas como aos
trabalhadores. Vejamos: as empresas ficam exoneradas de preocupações com a
administração dos contratos e do pagamento de retribuições, além de que não suportam o
risco que envolve o recrutamento de novo pessoal; é-lhes possibilitado contratar pessoal
com as aptidões e qualificações que pretendem, estas atestadas pela entidade cedente. Os
trabalhadores têm mais oportunidades de acesso a trabalho que, de outra forma, não
existiriam. Daí que, tudo pesado, o legislador tenha optado por admitir o trabalho
temporário, ainda que tenha estipulado alguns limites à sua admissão.
A atipicidade desta modalidade de circulação de força de trabalho levanta algumas
questões. É certo que o trabalhador se encontra sobre a direção da entidade utilizadora (cf.
artigo 97º CT), já que é em favor desta que presta a sua atividade. Mais dúbio é perceber
quem, na verdade, é titular do poder disciplinar (artigo 98º CT) e, outrossim, quem tem a
obrigação de pagar as contribuições à Segurança Social.
Neste sentido, e quanto à primeira questão – saber quem exerce o poder disciplinar -, vem
reger o artigo 185º, nº4 CT. Dita-nos este que o exercício do poder disciplinar, durante a

56
Cisão do empregador.

34
Direito do Trabalho

execução do contrato pertence à empresa de trabalho temporário, mediante participação


do utilizador. Isto coloca problemas, nomeadamente, de imediação; vejamos, se é esta
entidade que se encontra incumbida do exercício deste poder, impõe-se-lhe que, na
eventualidade do trabalhador temporário cometer alguma infração, julgue o seu
comportamento através da disciplina consagrada no quadro interno da entidade utilizadora.
Ora, se o trabalhador se encontra sob a direção do utilizador, então, esta entidade, melhor
do que a empresa de trabalho temporário, saberia conduzir um processo disciplinar,
segundo a disciplina interna que a rege. Não desenvolveremos mais este aspeto, até porque
a sua importância acaba por ser reduzida, atento à curta duração que envolvem os vínculos
de trabalho temporário.
No que tange à segunda questão – o pagamento das contribuições à Segurança Social -, o
artigo 27º do Código Contributivo da Segurança Social parece vir-nos dar a resposta, dizendo
que o pagamento destas contribuições fica a cargo da empresa de trabalho temporário.
Todavia, a responsabilidade desta entidade vislumbra-se de natureza relativa57, porquanto
o artigo 174º, nº2 CT consagra a responsabilidade subsidiária da entidade utilizadora (e de
outras entidades) pelos créditos dos trabalhadores e, bem assim, pelos encargos sociais que
a eles correspondem.
Este fenómeno é regulado pelo Código do Trabalho nos artigos 172º a 192º CT, distinguindo
a lei duas modalidades: a do trabalho temporário como objeto de uma atividade
empresarial58 (artigos 172º a 192º CT) e a de cedência ocasional de trabalhadores por uma
empresa a outra (artigos 288º e seguintes CT).
Dito isto, percebemos que poderão existir entidades que, constituídas como empresas de
trabalho temporário (ETT), têm como logro o exercício desta atividade, e outras que,
dedicando-se a outro ramo de atividade, ocasionalmente, cedem trabalhadores a outra
empresa. Neste enquadramento, podemos referir que o primeiro caso retratado constitui a
regra no domínio do trabalho temporário – as empresas constituem-se para prosseguirem
especificamente esse fim.
Nestas ocasiões, estaremos perante uma relação jurídico-laboral mais complexa do que o
que normalmente sucede. As relações estabelecidas neste cenário, poderão decompor-se
em dois vínculos distintos articulados entre si: o contrato de utilização de trabalho
temporário – este, tendo como contraentes, a entidade cedente (a ETT) e a entidade
utilizadora, cujo regime se encontra disposto nos artigos 175º e seguintes CT (e artigo 172º,
alínea c)); e o contrato de trabalho temporário – por seu turno, celebrado entre o
trabalhador e a entidade cedente, constitui-se como um verdadeiro contrato de trabalho a
termo resolutivo, estando sujeito a um regime idêntico ao do contrato a termo (artigo 172º,
alínea a) e artigos 180º e seguintes CT).
Tendo em conta o caráter complexo destas relações, o que nos importa – em sede de
Direito do Trabalho -, é a análise da relação resultante do contrato de trabalho temporário
e, por isso, será desta que nos ocuparemos (nomeadamente).

Relativamente ao contrato de trabalho temporário:

57
Relativa no sentido de não ser só esta que responderá pelos créditos e contribuições supracitados.
58
Quanto ao exercício e licenciamento, DL n.º 260/2009, de 25/9.

35
Direito do Trabalho

O contrato de trabalho temporário só pode ser celebrado a termo resolutivo, certo ou


incerto, nas situações previstas para a celebração de contrato de utilização – é o que resulta,
talqualmente, da letra da lei (artigo 180º CT). Mas em que situações é que se poderá
celebrar um contrato de utilização? A esta pergunta dá-nos resposta o artigo 175º CT: a
celebração deste contrato é possível nas hipóteses prescritas nas alíneas a) a g) do nº2 do
artigo 140º CT59 e nos demais casos previstos no preceito referido (nas alíneas do nº1 do
artigo 175º CT). Donde, como se vê, o legislador ainda que tenha admitido a contratação
em regime de trabalho temporário, restringiu, simultaneamente, essa possibilidade aos
casos em que a lei admite (daí que possamos falar do caráter excecional desta modalidade
de contratação como, aliás, não poderia deixar de ser).
Uma vez celebrado sem um dos fundamentos legais admitidos, o termo estipulado no
contrato é nulo, considerando-se este celebrado por duração indeterminada (artigo 180º,
nº2 CT). No entanto, caso esta nulidade concorra com a nulidade do contrato de utilização
de trabalho temporário (artigo 176º, nº2 e artigo 177º, nº5 CT), considera-se que o trabalho
é prestado ao utilizador em regime de contrato de trabalho por duração indeterminada.
Fica, novamente, patente a intenção do legislador privilegiar a contratação sem termo e,
por outro lado, sancionar a má utilização da contratação a termo.
Relativamente à forma, vem o artigo 181º CT consagrar um regime especial ficando, desse
modo, afastado o regime geral disposto no artigo 110º CT (que estipula a liberdade de
forma. Aqui, impõe-se que o contrato seja reduzido a escrito, devendo ser celebrado por
meio de dois exemplares, dos quais devem constar os elementos prescritos no artigo 181º,
nº1 CT. E, mais uma vez, aconselha-se a ETT a cumprir integralmente estes requisitos –
nomeadamente, o requisito de forma e a indicação do motivo justificativo devidamente
fundamentada -, sob pena de se considerar o contrato celebrado sem termo 8artigo 181º,
nº2 CT).
A duração do contrato de trabalho temporário não pode exceder a do contrato de
utilização – artigo 178º CT (ex vi artigo 182º, nº1 CT). Quando celebrado a termo certo, não
se encontra sujeito ao limite disposto no artigo 148º, nº2 CT (e, portanto, a um prazo
mínimo de seis meses), podendo, caso se mantenha o motivo justificativo, ser renovado até
seis vezes. Tratando-se da celebração de um contrato de trabalho temporário a termo
incerto, este pode durar pelo tempo necessário à satisfação de necessidade temporário do
utilizador, sendo certo que, em todo o caso, não poderá exceder seis meses ou um ano,
consoante o motivo que tenha levado à contratação (artigo 182º, nº5 CT).
No que toca à caducidade dos contratos de trabalho temporário, aplica-se o regime dos
artigos 344º e 345º CT60.

Relativamente ao contrato de utilização de trabalho temporário:


Este só pode ser celebrado, e já o dissemos (indiretamente), nas hipóteses abrangidas pelos
artigos 140º, nº2, alíneas a) a g) e 175º, nº1 CT.

59
Para efeitos da contratação com fundamento na alínea f) do nº2 do artigo 140º CT, é apenas
considerado acréscimo excecional de atividade da empresa a que se protele por um período que tenha a
duração até 12 meses.
60
Uma vez que já o analisámos supra, para lá remetemos – pp. 30-31.

36
Direito do Trabalho

A par do que sucede para os contratos a termo, o contrato de utilização não pode exceder
o período estritamente necessário à satisfação da necessidade do utilizador (nº3 do artigo
175º CT). Ademais, está vedada à entidade utilizadora a possibilidade de socorrer-se de
trabalhador que haja anteriormente pertencido aos seus quadros (de recursos humanos),
se o vínculo cessou em virtude de despedimento coletivo ou por extinção de posto de
trabalho (nº4 do mesmo preceito).
No artigo 176º, mais uma vez, fica comprovada e evidenciada a identidade do regime do
contrato de utilização de trabalho temporário com o que vigora para o contrato a termo:
incumbe ao utilizador a prova dos factos que justificam a celebração do contrato de
utilização de trabalho temporário (norma que tem o seu paralelo no artigo 140º, nº5 CT).
Os contratos que sejam celebrados sem que se verifique um dos fundamentos previstos no
artigo 175º, nº1 CT são nulos, considerando-se celebrados por tempo indeterminado – e,
assim, o trabalhador e o utilizador ficam vinculados por um contrato sem termo (sem
prejuízo do trabalhador poder optar pelo pagamento de uma indemnização – cf. artigo 173º,
nº6 CT). Ora, pretendeu o legislador punir a má utilização do contrato de trabalho
temporário, ficando manifestada, mais uma vez, a adoração pelo contrato por duração
indeterminada.
A validade deste contrato está dependente da verificação de forma escrita (artigo 177º, nº1
CT) e da aposição no papel de todos os elementos previstos no mesmo preceito, na medida
em que, desrespeitada a forma ou não constando do contrato um dos elementos, este é
nulo. Donde, o trabalho prestado pelo trabalhador ao utilizador ter-se-á como fundado num
contrato sem termo (artigo 177º, nº5 e nº6 CT).
Podendo ser celebrado por termo certo ou incerto, este não poderá subsistir, em regra, por
mais de dois anos; ou de seis meses ou 12 meses, respetivamente, quando fundado na
alínea a), nº1 do artigo 175º CT ou acréscimo excecional da atividade da empresa.
Tendo cessado o contrato de utilização e, ainda assim, o trabalhador ter continuado ao
serviço do utilizador por 10 dias, considera-se que o trabalhão passa a ser prestado ao
utilizador com base em contrato de trabalho por duração indeterminada (artigo 178º, nº4
CT) – de resto, com o devido paralelismo, idêntico ao que estipula o artigo 147º, nº2, alínea
c) CT.
Por seu turno, o artigo 179º CT vem proibir, caso se tenha completado a duração máxima
de contrato de utilização de trabalho temporário, a sucessão no mesmo posto de trabalho
de (outro) trabalhador temporário ou de trabalhador contratado a termo durante um hiato
temporal de um terço de duração do contrato que haja cessado, incluindo renovações (por
se ter atingido a sua duração máxima)61. A ratio desta norma passa pela limitação da
contratação a termo ou a título temporário, para que a exceção não se torne regra; regra
essa que é (e deve ser), já sabemos, a contratação por tempo indeterminado.

A regra, neste enquadramento, é de facto a contratação a termo certo ou incerto. Com isto
não queremos dizer que este é o cenário desejável, antes pelo contrário; afirmamos que é
a regra porque, do que ficou dito, concluímos que, no seio da contratação temporária e,

61
Não obstante das exceções previstas no nº2 do mesmo preceito.

37
Direito do Trabalho

referindo-nos ao contrato de trabalho temporário, o expediente a que mais se recorre é,


indubitavelmente, o da aposição de um termo (qual seja) ao contrato – artigos 180º e
seguintes CT -, uma vez que, desde logo, não implica custos permanentes. Todavia, ainda
que assim seja, não podemos desconsiderar a possibilidade de a ETT e o trabalhador
poderem celebrar, assim o pretendam, um contrato de trabalho por tempo indeterminado
para cedência temporária (artigo 172º alínea b) e artigos 183º e 184º CT)62.
Este importa – porque celebrado por tempo indeterminado – um vínculo permanente entre
a empresa de trabalho temporário e o trabalhador. Aquela fica com a possibilidade de ceder
o trabalhador através da celebração de sucessivos contratos de utilização com empresas
que dele necessitem. Aliás, é conditio da sua celebração que o trabalhador aceite
expressamente esta sua cedência sucessiva a utilizadores (artigo 183º, nº1, alínea b) CT).
Entre utilizações é normal que sucedam hiatos temporais em que o trabalhador não irá
prestar a sua atividade a utilizadores e, neste cenário, vislumbram-se duas possibilidades
(artigo 184º CT): ou o trabalhador presta normalmente a sua atividade à ETT, sendo
remunerado por isso; ou, caso não exerça qualquer atividade, tem direito a uma
compensação retributiva prevista em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho
(maxime convenções coletivas de trabalho) ou, se esta não existir, a uma retribuição no
valor de dois terços da última retribuição ou retribuição mínima mensal garantida,
consoante o que for mais favorável.

Regime de Prestação de Trabalho do Trabalhador Temporário


O trabalhador pode ser cedido a mais do que um utilizador, ainda que não esteja vinculado
a um contrato que o vincule permanentemente à ETT que o cede aos respetivos utilizadores
– maxime por um contrato de trabalho por tempo indeterminado para cedência temporária
(artigo 185º, nº1 CT).
Ficou dito que o trabalhador, apesar de ver a sua retribuição ser paga pela empresa de
trabalho temporário, está sujeito ao poder de direção (artigo 97º CT) da entidade
utilizadora. Já o poder disciplinar – conforme também adiantámos supra – incumbe à ETT.
Com o que isso importa, nomeadamente a possibilidade de aplicar sanções disciplinares
mediante a instauração do processo devido (artigos 328º e seguintes)63. Aliás, o exercício
do poder disciplinar por parte do utilizador consubstancia uma contraordenação grave
(nº12 do artigo 185º CT).
O artigo 185º, nº5 CT vem consagrar o direito do trabalhador a uma retribuição (o que, por
certo, não poderia deixar de ser – cf. artigo 11º CT), sendo esta, em todo o caso, equivalente
ao mínimo estipulado por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho aplicável à
empresa de trabalho temporário ou ao utilizador que corresponda às suas funções. Vem,
igualmente, o artigo 185º mas, desta feita, no nº6 e no nº7 conceder o direito do
trabalhador a férias, ao subsídio de férias e ao subsídio de Natal (bem como a outras
prestações regulares e periódicas) – cf. artigos 258º e seguintes CT.
O trabalhador temporário tem direito ao mesmo nível de proteção em matéria de
segurança e saúde que os demais trabalhadores do utilizador (artigo 186º CT); tem,

62
O que pode suceder quando o trabalhador seja portador de qualificações raras, por exemplo.
63
Vimos que esta solução consagra alguns problemas, sobretudo de imediação.

38
Direito do Trabalho

ademais, direito a formação profissional – a assegurar pela empresa de trabalho temporário,


sempre que a duração do contrato seja superior a três meses (artigo 187º CT).
Na eventualidade do contrato do trabalhador temporário cessar (ou, inclusive, na ausência
deste), a empresa de trabalho temporário deve ceder outro trabalhador ao utilizador, no
prazo de 48 horas (artigo 188º, nº1).
O legislador, com o objetivo de conceder ao utilizador um período para que este conheça o
trabalhador temporária (as suas capacidades, aptidões), estipulou no artigo 188º, nº2 CT
um prazo durante o qual o utilizador poderá recusar a prestação do trabalhador temporário
(poderá não ser do seu agrado o trabalhador cedido), tendo para o efeito 15 ou 30 dias,
consoante o contrato de utilização tenha ou não duração inferior a seis meses. Recusado o
trabalhador, a ETT fica encarregada de proceder à substituição do trabalhador (cedendo um
outro).
A utilização de esquemas de trabalho temporário está legalmente limitada e condicionada.
Para que possa ocorrer, é necessário que as entidades cedentes possuam licença, cuja
concessão incumbe ao serviço competente e depende do preenchimento de requisitos de
idoneidade, organização e capacidade financeira, além de ser exigida a prestação de uma
caução (artigo 190º e 191º CT).
A constituição de caução garante o pagamento de créditos do trabalhador temporário
relativo a retribuição, indemnização ou compensação devida pelo empregador pela
cessação do contrato de trabalho e outras prestações pecuniárias, em mora por período
superior a 15 dias64; bem como o pagamento de contribuições da segurança social, em mora
por período superior a 30 dias.

Posto isto, cumpre, por fim, referir o regime disposto no artigo 173º CT. Dissemos que, para
que seja possível a uma empresa dedicar-se à cedência de trabalhadores a utilizadores, é
necessário que seja concedida uma licença (Decreto-Lei n.º 260/2009, de 25 de setembro),
concedido por entidade competente para o efeito.
Ora, se uma empresa de trabalho temporário não for titular desta licença, não pode
celebrar contratos de utilização (ou outros, com trabalhadores ou utilizadores – quais
sejam). Donde, os contratos que, ainda assim, sejam celebrados são nulos, sendo
considerados, outrossim, celebrados por tempo indeterminado.
Fica, também, vedada a possibilidade de empresas de trabalho temporário celebrarem
contratos entre si com o logro de ceder um trabalhador a um terceiro (v.g., a empresa A
cede um trabalhador a empresa B que, por sua vez, o cede à empresa C). A consequência
para os contratos celebrados com este intuito é a nulidade.
Finalmente, se uma ETT ceder um trabalhador a uma entidade utilizadora sem, no entanto,
ter com este celebrado um contrato de trabalho temporário (ou outro, por tempo
indeterminado), considera-se que o trabalho é prestado ao utilizador em regime de contrato
sem termo.

64
Note-se que, sendo a caução insuficiente para o pagamento dos créditos solicitados, o primeiro a ser
pago será o crédito do trabalhador temporário relativo à retribuição (artigo 191º, nº6, alínea a) CT).

39
Direito do Trabalho

Nada do que se disse prejudica o disposto no nº6, podendo o trabalhador substituir


qualquer uma das consequências previstas, por uma indemnização nos termos do artigo
396º CT.

Demos conta, de forma detalhada, de (quase) todo o regime do trabalho temporário.


Contudo, e para que o aluno perceba a logística das relações estabelecidas neste domínio,
iremos copiar um esquema de Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 19ª Edição, pp.
216-217:

Contrato de Trabalhador
Trabalho
Temporário
ETT
Prestação de
Trabalho

Contrato de
Utilização Utilizador

Subcapítulo III – Contrato de Trabalho em Comissão de Serviço

O regime da prestação de trabalho em comissão de serviço foi instituído pelo Decreto-Lei


n.º 404/91, de 16 de outubro, e é lhe atribuído o mérito de ter possibilitado aos
trabalhadores o exercício de funções de direção (naturalmente, de cargos superiores do
que, por norma, estão incumbidos), sem que para tal se precisem de atestar de uma
estatuto profissional. Vale por dizer que, no momento anterior, à instituição deste regime o
acesso de trabalhadores a estes cargos superiores era difícil, tendo em conta que, para
tanto, era necessária a aquisição da categoria profissional respetiva.
Neste enquadramento, vem o artigo 161º CT delimitar a abrangência da comissão de
serviço (isto é, das atividades laborais que se consideram prestadas a este título). Assim,
pode ser exercido, em comissão de serviço, cargo de administração ou equivalente, de
direção ou chefia diretamente dependente da administração ou de diretor-geral ou
equivalente, funções de secretariado pessoal de titular de qualquer desses cargos, ou ainda,
desde que instrumento de regulamentação coletiva de trabalho o preveja, funções cuja
natureza também suponha especial relação de confiança em relação a titular daqueles
cargos e funções de chefia.
Dito isto, parece-nos que já nos encontramos em posição de tirar algumas conclusões (que
resultam, de per si, da leitura da lei). Vejamos: o legislador pretendeu limitar a celebração
de contratos em comissão de serviços, tendo restringido essa possibilidade aos casos
prescritos no referido artigo 161º CT, mas a outros, que não resultando expressos, envolvam
uma especial relação de confiança entre o comitente (empregador) e o comitido (o
trabalhador). Exige-se, pois, que a vinculação das partes se funde na confiança depositada
pelo superior hierárquico no trabalhador que, através da comissão de serviços, fica

40
Direito do Trabalho

incumbido do exercício de um determinado cargo (pelo que, nessa medida, se trata de um


requisito de índole psicológica).
Como qualquer contrato, impõe-se que as partes acordem na contratação (o negócio só se
considera perfeito com o encontro da vontade das partes no mesmo sentido). No entanto,
e neste registo, o consenso, de per si, não basta para que estejamos perante uma comissão
de serviço. É cumulativamente exigido que o objeto do acordo seja o exercício de funções
que envolvam uma especial relação de confiança.
Esta atitude restritiva do legislador – nomeadamente, com a imposição de uma relação de
confiança entre os contraentes – permite-nos, desde logo, distinguir com relativa facilidade
os casos que se encontram abrangidos por este regime e os que se situam fora do seu
escopo. Neste sentido, e a título exemplificativo, atente-se na seguinte hipótese: a empresa
XPTO, que se dedica ao transporte de mercadorias, contrata Bento para camionista. Ora,
ainda que este caso seja dos mais evidentes, é de fácil conclusão que não estamos perante
uma comissão de serviço. Na verdade, a condução de um camião não implica uma especial
relação de confiança entre trabalhador e empregador; não obstante, por certo, o facto de o
empregador confiar que o trabalhador que admitiu é prudente e zeloso na condução das
mercadorias. Ainda assim, é evidente que tal não exige uma especial relação de confiança,
como exigiria, por exemplo, o exercício de um cargo de chefia de um qualquer
departamento daquela empresa.
As características que se costumam apontar à comissão de serviços são a sua
transitoriedade e a sua reversibilidade. Trata-se da uma prestação laboral a título
transitório, porquanto, normalmente, é prestada durante um período pré-determinado; e
reversível, uma vez que essa função pode cessar a qualquer momento (o que se
compreende, dada a sensibilidade que envolve o conceito de relação de confiança).
A comissão de serviço pode, por seu turno, ser interna (ou superveniente) – caso se recorra
a um trabalhador já vinculado à empresa, o que leva a uma modificação temporária de uma
relação de trabalho preexistente; e externa (ou originária) – no caso em que se admita um
novo trabalhador para o efeito, sendo a comissão de serviço o próprio fundamento da
contratualização (cf. artigo 162º, nº1 CT).
Finda a comissão de serviço, e quando esta seja interna, o trabalhador regressa à base, isto
é, volta a exercer as funções de que estava incumbido antes daquela começar (artigo 164º,
nº1, alínea a) CT). Se se tratar de comissão de serviço externa, o (novo) trabalhador admitido
vê cessar as suas funções na empresa, a qualquer título, salvo se as partes acordarem na
permanência daquele após o termo da comissão (artigo 162º, nº2 CT). Quando não se
acorde nesse sentido, o trabalhador tem, todavia, o direito a ser indemnizado nos termos
do artigo 366º (ex vi artigo 164º, nº1, alínea c) CT).
Desta última premissa, concluímos (e bem) que, relativamente à comissão de serviço
externa, não operam mecanismos que tutelem suficientemente a posição do trabalhador
admitido para o cargo. Isto revela uma certa atipicidade destas situações, porquanto não se
fazem valer ideias de segurança no emprego (aliás, com assento constitucional – artigo 53º
CRP).
De acordo com o disposto no artigo 163º CT, a comissão de serviço pode cessar a todo o
tempo, quer seja por iniciativa do empregador ou do trabalhador. Esta cessação depende

41
Direito do Trabalho

(e, em bom rigor, nem disso) de um aviso prévio por escrito, com a antecedência mínima de
30 ou 60 dias, consoante a comissão haja durado por um período não superior a dois anos
ou superior a este. A falta de aviso prévio não obsta, no entanto, à cessação da comissão de
serviço, constituindo apenas a parte faltosa na obrigação de indemnizar a contraparte pelo
período em falta (artigo. 163º, nº2 CT). Com esta indemnização, e até porque é essa a
finalidade do artigo 401º CT, visa-se recuperar a situação económica se verificaria se a
comissão fosse cumprida até ao fim.
Mais uma vez nos deparamos com uma solução que se encontra desligada da ideia
constitucional de segurança no emprego65. A constitucionalidade desta norma (artigo 163º
CT), chegou a ser alvo de fiscalização preventiva, tendo o Tribunal Constitucional se
pronunciado pela constitucionalidade desta. Entendeu que a cessação de funções que
envolvam uma relação de confiança justificam um regime diverso, desligado das
preocupações que são apanágio do Direito do Trabalho – quais sejam, nomeadamente a
tutela da posição do trabalhador.
A celebração de um contrato para exercício de funções ou cargos em comissão de serviço
está sujeito a forma escrita (afastando-se a aplicação do regime-regra – cf. artigo 110º CT).
O incumprimento desta exigência legal por parte do empregador, traz-lhe consequências
nefastas que se traduzem na não consideração do exercício das funções em comissão de
serviço (artigo 162º, nº2 e nº3 CT). Donde, as funções confiadas ao trabalhador são-no de
forma definitiva e a título irreversível, não se aplicando as normas que se referem à cessação
da comissão (artigo 163º CT) – perde-se o caráter transitório e reversível, características da
comissão de serviço; com o que isso importa, nomeadamente o facto de o empregador não
poder fazer cessar o contrato mediante comunicação prévia, por escrito, ao trabalhador. À
mesma solução levará a não aposição no contrato da indicação do cargo ou funções a
desempenhar, com menção expressa do regime de comissão de serviço (artigo 162º, nº2,
alínea b) CT).
Por outro lado, a falta de menção dos elementos a que se referem as alíneas c) e d), nº3 do
artigo 162º CT, não influencia a validade formal do contrato celebrado. As consequências
que lhe estão associadas são as dispostas nas alíneas a) e c), do nº1 do artigo 164º CT.
E, aqui chegados, afigura-se-nos de uma considerável importância analisar o preceituado
pelo artigo 164º, nº1, alínea b) CT. De acordo com esta norma, se o empregador fizer cessar
a comissão de serviço interna, é concedido ao trabalhador o direito de resolver, de forma
definitiva, o contrato que o liga à empresa (falamos do contrato que lhe instituiu as funções
que primitivamente ocupava). Por outras palavras, caso o empregador destitua o
trabalhador das funções lhe confiou a título de comissão de serviço, este poderá
desvincular-se do contrato que o liga à sua entidade empregadora. Esta solução, no
entender de António José Moreira é, no mínimo, contestável; a verdade é que, não obstante
se ter feito cessar a comissão de serviço, o trabalhador tem o seu emprego garantido.
Donde, não parece fazer sentido, apenas porque o empregador deixou de confiar no
trabalhador para o exercício daquelas funções, conceder-se o direito de resolver o contrato,
uma vez que tal atenta contra a segurança no emprego e, inclusivamente, contra o próprio

65
António J. Moreira entende que este preceito põe em causa o disposto no artigo 53º CRP.

42
Direito do Trabalho

trabalhador66, pelo que dever-se-á afastar a solução consagrada nesta disposição (através
de uma interpretação corretiva da norma).

Subcapítulo IV – Contrato de Trabalho Intermitente

Este regime – a prestação do trabalho em regime de intermitência -, vem admitir que a


prestação da atividade se efetue de forme intermitente, isto é, intercalada por períodos de
inatividade mais ou menos prolongados.
Previsto nos artigos 157º e seguintes CT, este regime traduz-se num instrumento (mais um)
de flexibilização das relações de trabalho. Na verdade, atualmente, as características do
mercado levam a que, não raras vezes, se verifique uma variável intensidade das
necessidades de trabalho.
O caráter descontínuo de que se reveste o exercício de algumas atividades, leva
regularmente à desvinculação das empresas dos respetivos trabalhadores e torna frequente
recorrer-se a vínculos precários (como são, por exemplo, os contratos a termo). Ora, para
que o trabalhador não se veja numa situação de incerteza e, até, de afogo económico, o
legislador, ao estabelecer este regime, permitiu que os vínculos contratuais se mantenham,
ainda que em períodos de manifesta inatividade, desde que se encontrem reunidos alguns
pressupostos (nomeadamente, de duração dos períodos de atividade). Ademais, visou-se
evitar que se recorra a vínculos precários na contratação de trabalhadores, na medida em
que isso contribui para a situação de incerteza vivida por aqueles e porque, à luz da
segurança no emprego, isso não é desejável.
A celebração deve obedecer a requisitos formais, devendo respeitar forma escrita, por
força do artigo 158º, nº1 CT. Por outro lado, o trabalho intermitente tem, obrigatoriamente,
de ser celebrado por tempo indeterminado, o que resulta a contrario do artigo 157º, nº2
(que proíbe a contratação de trabalho intermitente a termo resolutivo ou em regime de
trabalho temporário).
Desrespeitada a forma escrita ou se do contrato não constar a indicação do número anual
de horas de trabalho, ou do número anual de dias de trabalho a tempo completo, o contrato
considera-se celebrado sem período de inatividade (artigo 158º, nº3 CT).
A organização dos períodos de trabalho e de inatividade fica ao encargo das partes, sendo
certo que do contrato deve constar o número de horas de trabalho. Todavia, o nº2 do artigo
159º CT impõe um número mínimo de meses (anual) para a celebração destes contratos:
cinco meses de trabalho a tempo completo, sendo três consecutivos.
Durante os períodos de inatividade, pode o trabalhador exercer outra atividade
remunerada67 (artigo 160º, nº1 CT), devendo, nesse caso, informar o seu empregador. Neste
cenário, o empregador deve informar com uma antecedência mínima de 30 dias do
(re)começo da atividade; e, nos restantes casos, isto é, quando o trabalhador não exerça

66
É que, ademais, tratando-se de um caso de despedimento voluntário, o trabalhador não terá direito a
ser indemnizado e ficará numa situação de desemprego.
67
Note-se que o trabalhador continua adstrito ao dever de lealdade – artigo 128º, nº1, alínea f) CT.

43
Direito do Trabalho

uma atividade remunerada no período de inatividade, a antecedência não deve ser inferior
a 20 dias (artigo 159º, nº1 e nº3 CT).
Ademais, o trabalhador tem direito, durante o período de inatividade, a uma compensação
retributiva paga pelo empregador, com uma periodicidade igual à da retribuição (mensal),
cujo valor pode estar estipulado em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho
ou, na sua falta, de 20% da retribuição base (artigo 160º, nº2 CT). Se o trabalhador exercer
outra atividade remunerada durante o período de inatividade, terá direito a essa mesma
compensação retributiva mas, desta feita, deduzida do montante que aufere em sede de
retribuição (artigo 161º, nº3 CT).
Relativamente aos períodos de atividade, o trabalhador intermitente terá, pois, direito a
uma retribuição, aplicando-se o regime geral.

Subcapítulo V – Contrato de Trabalho a Tempo Parcial68

Do que dissemos até aqui, percebemos que, em regra, a prestação laboral a um


empregador preenche a totalidade do número de horas que é normal para a função
exercida. Por outras palavras, o trabalho é geralmente prestado a tempo inteiro (ou
completo). Ainda que assim seja, nada obsta a que as partes, tendo em conta os seus
interesses, possam celebrar um contrato que envolve a prestação de atividade num período
inferior ao que é considerado normal e, nesse caso, estaremos precisamente perante um
contrato de trabalho a tempo parcial (vulgo part-time).
São de vária ordem as razões que podem levar à contratação nestes moldes, sendo certo
que, como em qualquer contrato, as partes têm de acordar nesse sentido. Do ponto de vista
do empregador, uma técnica para elevar a produtividade, poderá ser a da contratação de
duas pessoas para a ocupação do mesmo posto de trabalho, para que, dessa forma, consiga
extrair o máximo possível do trabalho prestado pelos seus funcionários; por outro lado, do
ponto de vista do trabalhador, o part-time pode-se-lhe afigurar uma boa opção. Isto, por
exemplo, quando seja titular de qualificações raras e, por isso, prefira distribuir a sua
jornada laboral por mais de um empregador, ou, tendo família, interessa-lhe reservar um
tempo para ela.
A particularidade deste regime é só uma: o facto de a prestação laboral ser prestada
durante período inferior ao normal na mesma atividade. Daí que a lei não obste nem
coloque entraves à celebração de contratos de trabalho em regime de part-time, porquanto
a sua única preocupação é, como sabemos, estabelecer limites máximos ao horário de
trabalho diário e semanal (de modo a evitar abusos por parte do legislador). Todos os
contratos que envolvam a prestação laboral durante período inferior a 8 horas diárias e a
40 horas semanais são válidos, até porque isso, em muitos casos, se poderá afigurar mais
favorável ao trabalhador (cf. artigo 203º, nº1 CT).
Antes do Código de Trabalho, o regime do contrato de trabalho em regime de trabalho
parcial era retratado em legislação própria, assente apenas num Princípio de

68
Part-time. Chamamos a atenção para o facto desta denominação não dever ser empregada em
momentos de avaliação, sejam estes escritos ou orais. Apenas a utilizaremos por ser mais prático.

44
Direito do Trabalho

Proporcionalidade. No entanto, porque pecava por demasiado simplista, deixando sem


resposta várias questões, pelo que se tornou real (ou sempre o foi) a necessidade de se
reestruturar aquele regime, especificando-o, constando, hoje, fruto de um processo de
codificação, do Código de Trabalho – nos artigos 150º e seguintes CT.
Trata-se de um expediente de flexibilização das relações laborais, na medida em que
permite ao empregador ajustar o volume de trabalho às necessidades específicas da sua
empresa e, outrossim, adaptar horários de trabalho ao interesse comum das partes
(inclusivamente, durante a execução do contrato, já que os horários não são fixos).
Feito este introito, cumpre-nos analisar o regime legal. Ora, do artigo 150º, nº1 CT resulta
a definição de trabalho a tempo parcial; citá-la-emos: considera-se trabalho a tempo parcial
a um período normal de trabalho semanal inferior ao praticado a tempo completo em
situação comparável.
Pode a atividade ser prestada todos os dias, com um horário diário reduzido (natureza
horizontal do part-time) ou apenas em alguns dias por semana, por mês ou por ano
(natureza vertical do part-time). São as partes que, no âmbito da sua liberdade contratual,
estipulam como se irá distribuir a prestação laboral no tempo.
Nos termos do artigo 228º, nº1, alínea c) é admitida a prestação de trabalho suplementar,
num máximo de oitenta horas por ano, sendo certo que este limite máximo pode ser
reduzido em resultado da aplicação do Princípio da Proporcionalidade.
Este regime não pode ser excluído por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho
(artigo 151º CT) – donde, o contrato de trabalho prevalece sobre qualquer instrumento
daquela natureza que exclua esta modalidade. No acesso a prestação laboral neste regime,
gozam de preferência as pessoas com responsabilidade familiares, com capacidade de
trabalho reduzida, com deficiência ou doença crónica ou que frequente estabelecimento de
ensino (artigo 152º, nº1 CT).
O contrato de trabalho em regime de part-time está sujeito a forma escrita69 (artigo 153º,
nº1 CT). Quando esta não seja observada, considera-se que o contrato foi celebrado a tempo
completo (nº3 do mesmo artigo).
A celebração deste contrato pode ser feita a termo ou por tempo indeterminado.
Celebrado a termo, quando este se verifique, o trabalhador tem o direito de retomar a
prestação de trabalho por tempo completo – direito de reversão (artigo 155º, nº4 CT).
Neste enquadramento, vale, igualmente, o Princípio da Igualdade de Tratamento, segundo
o qual os trabalhadores a tempo parcial gozam dos mesmos direitos e estão adstritos aos
mesmos deveres dos trabalhadores a tempo inteiro (artigo 154º, nº2 CT), ressalvados os
casos que opere a proporcionalidade ou, então, quando por razões objetivas se imponha
solução diversa. Donde, e conforme é estipulado por lei, o trabalhador a tempo parcial tem
direito a uma retribuição base e a outras prestações, com ou sem caráter retributivo na
proporção70 do período normal de trabalho semanal; e ao subsídio de refeição quando o
período normal diário de trabalho seja igual ou superior a cinco horas.

69
Ainda que se trate de acordo novatório entre empregador e trabalhador. Estes acordos são
celebrados com trabalhador que já integra o quadro da empresa, procedendo-se à alteração do regime
contratual, nomeadamente no que concerne ao período de trabalho.
70
Vigora quanto à retribuição o Princípio da Proporcionalidade.

45
Direito do Trabalho

A este regime subjaz a ideia de flexibilização das relações laborais. Nesse sentido, é possível
que o trabalhador a tempo parcial passe a prestar a sua atividade a tempo inteiro e vice-
versa, mediante acordo com o empregador – é desta possibilidade que nos dá conta o artigo
155º, nº1 CT. Por seu turno, o nº2 do mesmo preceito vem consagrar uma espécie de direito
de arrependimento, consubstanciado na possibilidade de o trabalhador poder fazer cessar
o acordo mediante comunicação escrita ao empregador, tendo para o efeito sete dias após
a sua celebração (sem embargo do disposto no nº3).
O empregador está adstrito aos deveres especificados no artigo 203º CT (bem como aos
dispostos no artigo 127º CT).
Por fim, assinale-se que, em caso de acidente de trabalho, as prestações devidas ao
trabalhador são calculadas com base na retribuição que lhe corresponderia a tempo
inteiro71.

Subcapítulo VI – Contrato de Trabalho com Pluralidade de Trabalhadores

Neste contexto, estamos normalmente perante situações de coligação de sociedades, em


que a sua relação de interdependência justifica que estas se coliguem para uma melhor
satisfação dos seus interesses (em regra, são casos em que as sociedades se encontram em
relação de domínio ou de grupo – cf. artigos 481º e seguintes Código das Sociedades
Comerciais). Por outro lado, este regime em nada afeta a posição dos trabalhadores, já que
cada sociedade será, à partida, um centro autónomo de imputação de direitos e obrigações.
O artigo 334º CT vem estabelecer a responsabilidade solidária das sociedades coligadas
pelos créditos laborais, vencidos há mais de três anos, de trabalhadores de qualquer delas.
O pressuposto de existência destas realidades encontra-se disposto no artigo 101º CT, e é
o de que um trabalhador se obriga a prestar trabalho a vários empregadores entre os quais
exista uma relação societária de participações recíprocas, de domínio ou de grupo ou que,
independentemente da natureza societária, tenham estruturas organizativas comuns.
O contrato de trabalho deve seguir forma escrita e que dele conste o nome de todos os
trabalhadores e que seja designado aquele que representará os demais no cumprimento dos
deveres e no exercício dos direitos emergentes do contrato de trabalho (artigo 101º, nº2,
alínea c) CT)72. Este empregador é o que se apresentará em primeira linha face a terceiros73
e ao qual compete assegurar a gestão do contrato.
Os empregadores são solidariamente responsáveis pelo cumprimento das obrigações
decorrentes do contrato de trabalho, cujo credor seja o trabalhador ou terceiro – artigo

71
Solução que se percebe porque o acidente de trabalho não afeta apenas a capacidade de trabalho
para aquela atividade desempenhada a tempo parcial, mas também para qualquer outra atividade que
o trabalhador pudesse exercer no período normal de trabalho, diminuindo-lhe a capacidade de ganho
durante todo o tempo possível de desempenho da correspondente atividade profissional.
72
Não obstante a exigência feita por este preceito, tem entendido a doutrina e a jurisprudência que
para que opere o regime da pluralidade de empregadores basta que se verifique a existência de uma
relação societária entre vários empregadores ou existência de estruturas organizativas comuns e que se
prove que o trabalhador presta, em regime de subordinação, serviço a todos ou vários dos
empregadores envolvidos. Assim, dispensa-se a exigência formal imposta pelo nº2.
73
Nomeadamente a Segurança Social.

46
Direito do Trabalho

101º, nº3 CT. Esta parece ser a norma que, de facto, tutela e assegura devidamente a
posição jurídica do trabalhador e dos seus créditos.
Dissolvendo-se o grupo empresarial em causa e, por conseguinte, cessando a coligação
societária em que ele se fundava, o contrato de trabalho não cessa, ficando o trabalhador
vinculado ao empregador “principal” (artigo 101º, nº4 CT). O contrato com pluralidade de
empregador converte-se num contrato de trabalho comum; por outro lado, pode suceder
que se celebre um contrato com pluralidade de trabalhadores sem que, em concreto, se
encontrem verificados os requisitos a que se reporta o nº1 do artigo 101º CT. Nesse caso,
visando a lei proteger a continuidade do emprego, abstém-se de atingir o contrato com uma
invalidade, concedendo ao trabalhador a possibilidade de escolher a que empregador
prefere ficar vinculado (artigo 101º, nº5 CT).
O próprio artigo 11º CT, do qual consta a noção de contrato de trabalho, consagra
expressamente a possibilidade de o trabalho ser prestado a vários empregadores quando
se refere a (uma pessoas singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade
a outra ou) outras pessoas.

Subcapítulo VII – Contrato de Trabalho Subordinado à Distância (Teletrabalho)

Nestas situações, o trabalho subordinado realiza-se em instalações que não pertencem ao


empregador. O trabalhador presta a sua atividade a partir do domicílio ou noutro sítio que
não seja as instalações da entidade patronal.
Ora, antes de avançarmos, cumpre enunciar as vantagens e as desvantagens desta
modalidade de prestação de trabalho:
De entre as vantagens, podemos destacar a possibilidade de prestar trabalho no domicílio
evita a necessidade de mobilização para o local de trabalho, obstando ao stress e à
ansiedade que está associada ao trânsito; proporciona mais bem-estar; maior
disponibilidade para a família; diminuição de despesas, nomeadamente as de circulação –
como o combustível e as portagens; possibilita ao trabalhador controlar o seu ritmo de
trabalho; permite simultaneamente a separação entre os agentes laborais, e a sua
comunicação74; entre outras.
De entre as desvantagens, referimos as seguintes: poderá levar a jornadas de trabalho mais
longas, com uma probabilidade de se prolongarem para além do horário de trabalho, uma
vez que existe uma maior flexibilidade; a falta de contacto regular pode gerar
desentendimentos e discussões, pelo que a comunicação à distância tem de ser muito
trabalhada; pode levar ao afastamento e, até, ao isolamento face à entidade patronal75;
obriga-se a adquirir meios técnicos para a prestação em teletrabalho; risco de intromissão
do empregador na privacidade do trabalhador; entre outras.

74
Nessa medida, não é um contrato de trabalho standard, uma vez que, não exigindo uma prestação
presencial, é um instrumento de flexibilização das relações laborais.
75
Ao abrigo do artigo 168º, nº1 CT, na falta de estipulação no contrato, os instrumentos de informação
e de comunicação utilizados pelo trabalhador presumem-se propriedade do empregador. Donde, o
teletrabalhador está adstrito a um dever de custódia destes instrumentos, conforme preceitua o artigo
168º, nº2; aliás, não pode, em princípio, servir-se deles para fim diverso da prestação da sua atividade.

47
Direito do Trabalho

A noção de teletrabalho encontra-se prevista no artigo 165º CT e é a seguinte: prestação


de trabalho realizada com subordinação jurídica, habitualmente fora da empresa e através
do recurso a tecnologias de informação e de comunicação.
Desta noção resultam dois requisitos cumulativos: “habitualmente prestado fora da
empresa” – poderá sê-lo de forma parcial, não sendo necessário que seja sempre prestado
fora das instalações da empresa; e “e através do recurso a tecnologias de informação e
comunicação”.
E, neste momento, cumpre fazer uma distinção: entre teletrabalho e trabalho no domicílio.
Para que haja teletrabalho não basta que o trabalho seja prestado fora da esfera geográfica
de domínio e controlo direto do empregador, ao contrário do que sucede nos casos de
trabalho no domicílio. É, ainda, necessário que a relação entre o empregador e o trabalhador
se processe “à distância” mediante o uso de processos eletrónicos de comunicação. Por
outras palavras, o sistema de trabalho organiza-se de modo a que o empregador tenha, a
cada momento, a possibilidade de transmitir instruções, acompanhar diretamente a sua
execução, sem que se achem na presença um do outro.
Desde logo, o artigo 169º CT estabelece um Princípio de Igualdade de Tratamento entre os
teletrabalhadores e os demais trabalhadores, uma vez que as normas relativas ao contrato
de trabalho são aplicáveis, na medida do possível, a estas situações (isso importa, claro está,
o cálculo e pagamento da retribuição nos termos gerais – artigo 169º CT); bem como é
assegurada a participação destes trabalhadores na vida sindical (artigo 171º CT). Para evitar
a ingerência do empregador na vida pessoal e familiar do trabalhador, impõe-lhe, no artigo
170º CT, o respeito pela privacidade deste76. Em suma, os trabalhadores em regime de
teletrabalho não serão prejudicados, uma vez que lhes são concebidos os mesmos direitos
e deveres quando comparados com os demais trabalhadores.
A relação de teletrabalho pode classificar-se em originária e superveniente. A relação de
teletrabalho pode resultar da admissão de um novo trabalhador e, nesse caso, falamos de
teletrabalho originário ou externo; ou mediante acordo entre empregador e trabalhador77,
para que este último passe a exercer a sua atividade em regime de teletrabalho78 –
teletrabalho superveniente ou interno.
Em sentido inverso, o trabalhador em teletrabalho pode passar a prestar a sua atividade no
regime dos demais trabalhadores da empresa, a título definitivo ou por período temporário,
mediante acordo escrito com o empregador (artigo 166º, nº6).
Celebrado o acordo com o trabalhador, qualquer das partes poderá denunciar o contrato
nos primeiros 30 dias da sua execução79, sendo certo que cessando o contrato em regime
de teletrabalho, o trabalhador voltará a prestar trabalho presencialmente (artigo 167º, nº2
e nº3 CT, respetivamente). Neste contexto, estamos perante um período experimental.
Todavia, a possibilidade de se passar a prestar trabalho em teletrabalho poderá, em
determinadas situações, ser imposta pelo trabalhador ao empregador, sem que este se

76
Por outro lado, também tem o dever de evitar o isolamento do trabalhador – artigo 169º, nº3 CT.
77
Modificação do conteúdo contratual.
78
Nestas situações, a duração inicial do contrato não pode exceder três anos, por força do artigo 167º,
nº1 CT, a menos que exista prazo diferente em instrumento de regulação coletiva de trabalho.
79
Não se trata de um direito de arrependimento porque o empregador também pode denunciar o
contrato.

48
Direito do Trabalho

possa opor, desde que a atividade desempenhada possa ser prestada em teletrabalho. Isto
sucede, nomeadamente, nos casos de violência doméstica e resulta do artigo 195º CT ex vi
do artigo 166º, nº2 e 4 CT, e nos casos previstos no nº3 do artigo 166º.
Posto isto, importa referir que o artigo 166º, nº3 CT impõe forma escrita para a celebração
desta modalidade de contrato. Ainda assim, trata-se de uma formalidade ad probationem e
não ad substantiam, na medida em que, conforme preceitua o nº7 do mesmo preceito, esta
é exigida apenas para prova de estipulação do regime de teletrabalho. Donde, a sua
inobservância não irá afetar a validade do contrato.
Dito tudo isto, resta-nos fazer uma referência à questão do subsídio de refeição. Afinal, os
trabalhadores em regime de teletrabalho têm, ou não, direito ao subsídio de refeição?
Neste contexto, é difícil encontrarmos uma solução unânime. Vários são os pontos de vista
e estes são fundamentados através de diversificados argumentos, pelo que apenas
abordaremos, em traços gerais e superficiais, esta querela.
O subsídio de refeição tem como finalidade compensar o trabalhador por uma despesa que
não faria se não estivesse a trabalhar fora de casa. Ou seja, trabalhando fora de casa, o
trabalhador, de um modo geral, irá fazer a sua refeição num restaurante (eventualmente),
o que terá um custo. Este custo é o que o subsídio de refeição visa cobrir.
Dito isto, poderíamos afirmar que, trabalhando no seu domicílio, o trabalhador em regime
de teletrabalho, fazendo a sua refeição em casa, não irá ter qualquer custo de refeição. Pelo
que não se vislumbra razão para se atribuir o subsídio de refeição.
Ainda assim, teremos de observar o disposto no artigo 169º CT quanto ao Princípio da
Igualdade de Tratamento. Na verdade, se os teletrabalhadores gozam dos mesmos direitos
e deveres dos demais trabalhadores, então, sendo a estes últimos atribuído subsídio de
refeição, também este terá de ser atribuído àqueles.
Concluindo, esta é uma situação non liquet, pelo que deve ser analisada caso a caso.

Face à situação epidemiológica do novo Coronavírus – Covid 19, foi aprovado um decreto-
lei que veio estabelecer uma alteração ao regime de teletrabalho, pelo que importa dar
notícia desta e contextualizá-la, de modo a perceber qual o ponto do regime constante do
Código do Trabalho que foi derrogado excecionalmente por esta alteração.

DECRETO-LEI Nº 10-A/2020

Artigo 29.º - Teletrabalho

1 – Durante a vigência do presente decreto-lei, o regime de prestação subordinada de


teletrabalho pode ser determinado unilateralmente pelo empregador ou requerida pelo
trabalhador, sem necessidade de acordo das partes, desde que compatível com as funções
exercidas.
2 – O disposto no número anterior não é aplicável aos trabalhadores abrangidos pelo artigo
10.º

49
Direito do Trabalho

DECRETO-LEI Nº 2-A/2020

Artigo 6.º - Teletrabalho

É obrigatória a adoção do regime de teletrabalho, independentemente do vínculo laboral,


sempre que as funções em causa o permitam.

Ora, esta norma afasta-se e estabelece solução diversa à consagrada no artigo 166º, nº1
CT. Quando se tratasse de teletrabalho interno, para que o trabalhador passasse a exercer
a sua prestação laboral ao abrigo dessa modalidade, seria sempre necessário que houvesse
um acordo entre este e o empregador – o acordo novatório80.
Dos artigos 29º e 6º dos respetivos decretos-lei, o teletrabalho poderá ser determinado
unilateralmente pelo empregador ou requerida pelo trabalhador, sem acordo das partes,
desde que compatível com as funções exercidas. Donde, para que tal suceda não é
necessário o acordo entre as partes, já que é, inclusivamente, obrigatória a sua adoção. É,
aliás, um regime excecional que veio reforçar o teletrabalho, em ordem a prover pela saúde
pública.

Capítulo VII – Suspensão do Contrato de Trabalho e a Redução de Atividade

A suspensão do contrato de trabalho consiste na manutenção do vínculo apesar da


paralisação dos seus principais efeitos (vale por dizer que a suspensão do contrato não
afeta a sua vigência): por um lado, da obrigação de trabalho e, se for caso disso, da
obrigação de retribuir.
A descontinuidade que subjaz a este regime pode dever-se a vários motivos81 que, no
entanto, se reconduzirão sempre a uma impossibilidade superveniente temporária82 da
prestação de trabalho, quando não seja imputável ao trabalhador83.
A impossibilidade é superveniente porque surge após a celebração do contrato de
trabalho84. Caso contrário, se fosse originária85, tal circunstância levaria à nulidade do
contrato.
A ratio desta solução passa pela estabilidade no emprego. É que, ocorrendo uma
impossibilidade superveniente temporária e não imputável ao trabalhador, à luz do
Princípio da Segurança no Emprego, é preferível manter o vínculo contratual e, portanto, a

80
Sem embargo do disposto no artigo 166º, nº2 e nº3 CT.
81
Pode resultar de um obstáculo na esfera pessoal do trabalhador (uma doença, por exemplo) como do
facto de a empresa não querer ou não poder receber a prestação de trabalho (a empresa encerra para
renovação do equipamento, por exemplo).
82
A impossibilidade definitiva leva à cessação do contrato de trabalho por caducidade (artigo 343º CT).
83
Sendo imputável ao trabalhador, pela conjugação dos artigos 801º do CC e 351º CT, poderia levar ao
despedimento por justa causa.
84
Cf. artigo 790º do Código Civil.
85
Cf. artigo 411º do Código Civil.

50
Direito do Trabalho

vigência do contrato de trabalho, do que impor a cessação da sua vigência. Ora, visa-se a
sobrevivência do vínculo até que este não possa sobreviver mais (até ao limite extremo da
sua provável utilidade para as partes).
A suspensão do contrato não serve só para cobrir estas situações. Em situações de crises
empresariais graves, surge com o intuito de impedir a destruição de empregos86.
Para além destes casos, o empregador e o trabalhador poderão acordar na suspensão do
contrato de trabalho, donde não poderemos falar, aqui, de impossibilidade da prestação,
mas de uma modificação convencional do contrato, através da qual as partes utilizam este
instrumento para alcançar fins úteis.
Posto isto, cumpre analisar os efeitos jurídicos que derivam da suspensão do contrato de
trabalho:
a) Conservação do vínculo – o primeiro efeito que decorre da suspensão do contrato, é a
manutenção da sua vigência, embora num estado de inexecução temporária (artigo
295º, nº1 CT). Todavia, não fica impossibilitada a cessação nos termos gerais (artigo
295º, nº3 CT), pelo que qualquer das partes poderá fazer cessar o contrato, desde que
se verifiquem os requisitos da respetiva modalidade extintiva utilizada, e desde que o
fundamento não seja o mesmo que fundamentou a suspensão. O vínculo não se irá
desfazer pela causa que serviu de fundamento à suspensão, sendo certo que poderá
cessar com fundamento numa qualquer outra causa justificativa.
b) Conservação da antiguidade – a contagem da antiguidade prossegue87, uma vez que a
suspensão não determina a quebra da “continuidade” da relação laboral. Os efeitos
ligados às diuturnidades, promoções automáticas, mudanças de escalão retributivo,
etc. produzem-se na mesma, ainda que o trabalhador não esteja “ativo” (artigo 295º,
nº2 CT). É que, ademais, o contrato não cessa a sua vigência.
c) Permanência de deveres acessórios – com a celebração do contrato, tanto o
trabalhador como o empregador assumem deveres acessórios, intrinsecamente ligados
à ideia de “pertença à empresa” (artigo 295º, nº1 CT). Tal como a antiguidade, a
prestação destes deveres acessórios não se relaciona nem pressupõe diretamente a
execução do contrato. Implica, antes, que este se encontra vigente e que, por isso,
permaneça. Ora, dentro destes deveres acessórios que continuam a ser devidos,
destacamos os que decorrem do dever de lealdade: nomeadamente, o trabalhador não
poderá praticar atos que prejudiquem a entidade patronal88. Caso este imperativo seja
desrespeitado, o trabalhador poderá ser alvo de um processo disciplinar (artigos 329º,
330º, 352º e seguintes CT) e, eventualmente, poderá levar a uma situação de
despedimento por justa causa.
d) Paralisação dos efeitos do contrato condicionados pela possibilidade da prestação de
trabalho efetivo – desde logo, com a suspensão do contrato de trabalho, fica
igualmente suspensa a prestação da obrigação principal por parte do trabalhador: a
prestação de trabalho (artigo 295º, nº1 CT).

86
Lay off.
87
Ideia ligada à “pertença à empresa”.
88
Como divulgar o know-how, concorrer com a empresa, contribuir para o descrédito dos seus
produtos, etc.

51
Direito do Trabalho

Mas, por outro lado, mantêm-se os “direitos, deveres e garantias” que não
pressuponham a efetiva prestação de trabalho: assim, a obrigação de retribuição
continua a existir, não sendo afetada pela suspensão do contrato, a menos que esta
derive de causa imputável ao trabalhador ou, outrossim, a uma crise empresarial,
situações que levam à substituição da retribuição por uma compensação retributiva. No
que concerne ao direito a férias, temos de distinguir várias potencias circunstâncias:
ora, em regra, o direito a férias mantém-se, tendo o trabalhador, não obstante, a
situação de suspensão do seu contrato, direito a gozar férias em relação a esse ano,
como se tivesse estado em serviço efetivo anteriormente (artigo 240º, nº1 CT), sem
prejuízo do disposto no artigo 239º, nº6 CT; se, por outro lado, o período de suspensão
iniciar-se antes das férias do trabalhador, por ele protelar-se e só em momento
posterior ao término destas cessar, o período de férias ficará, em princípio, inutilizado
e irrecuperável; nas situações de crise empresarial, o artigo 306º CT vem salvaguardar
o direito a férias, ficcionando o período de suspensão89 como um período em que o
trabalho foi efetivamente prestado em “condições normais”. O legislador pretendeu
salvaguardar este direito do trabalhador, na medida em que este é completamente
alheio ao motivo que levou à suspensão do seu contrato de trabalho e, por isso, não
seria sensato prejudicá-lo.

Subcapítulo I – Suspensão do Contrato de Trabalho por Causa Ligada ao Trabalhador

Trata-se de um conjunto de situações surgidas na esfera do trabalhador que determinam a


suspensão do contrato, uma vez que impossibilitam a prestação de trabalho que deste
deriva. Ora, o artigo 296º, nº1 CT enumera características que, à partida, são comuns a todas
situações que possam surgir: existência de um impedimento temporário (superior a um
mês); ligação desse impedimento à pessoa do trabalhador; não imputabilidade do
impedimento ao trabalhador90.
Estas situações devem constituir uma situação de indisponibilidade por parte do
trabalhador91 para o exercício da atividade de que foi incumbido, mas também para o
exercício de outras – falamos do afastamento da atividade da empresa.
A impossibilidade pode ser meramente subjetiva, não se exigindo que seja objetiva, isto é,
existente para a generalidade das pessoas. Isto decorre da natureza infungível da prestação
de trabalho, ou seja, pelo facto de se presumir que o contrato de trabalho é celebrado
intuitus personae relativamente ao trabalhador.
A lei consagra, como dissemos, um período mínimo para que estejamos perante uma
impossibilidade temporária: mais de um mês. Este limite mínimo deve-se, essencialmente,
à possibilidade da existência de um período menos prolongado, que, simultaneamente,
possa ser articulado com o regime das faltas. Por outro lado, nada dispõe quanto a um limite
máximo, isto é, o decurso do tempo até ao qual se pode considerar a impossibilidade como

89
Ou de redução da atividade.
90
Por outras palavras, deve tratar-se de um impedimento não culposo.
91
Por motivo de doença, acidente ou obrigação militar, por exemplo.

52
Direito do Trabalho

temporária92. Certo é que a estipulação de um limite só terá relevância quanto aos casos
em que o impedimento não é determinado por via legal (como é o caso da obrigação
militar), pelo que, nessas hipóteses, dever-se-á ter em conta o critério da ponderação dos
interesses em vista dos quais as partes se vincularam, ou seja, tendo em consideração a
conservação ou a perda da utilidade das prestações contratuais após a cessação do
impedimento.
Conforme foi dito, a impossibilidade não pode ser imputável, a título de culpa93, ao
trabalhador, já que, se assim for, a não prestação de trabalho justificará a aplicação do
regime disposto no Código Civil: artigo 801º. Todavia, haverá casos em que o trabalhador
provoca o impedimento, mas este já levaria à suspensão por força da lei: falamos dos casos
em que o trabalhador assume, por exemplo, a função de deputado. A lei faz prevalecer o
exercício destas funções94 em relação às contratualmente assumidas (artigo 296º, nº5 CT).
Ao trabalhador é, ainda, facultada a possibilidade de suspender o contrato de trabalho
unilateralmente, mas desde que tenha como fundamento a falta de pagamento total ou
parcial da retribuição devida. Desse modo, o trabalhador terá acesso ao subsídio de
desemprego (artigo 325º, nº2 CT) – Artigo 25º da Lei nº 105/2009, de 14/9.
Quanto à retribuição, por força do artigo 309º CT, esta continuará a ser devida. Esta norma
vem contrariar a “regra” da suspensão do crédito retributivo, fundada na ideia de que não
havendo trabalho não há salário.

Subcapítulo II – Suspensão do Contrato de Trabalho por Facto Ligado à Empresa

Neste momento, trataremos das situações em que a suspensão do contrato de trabalho se


deve a causas relacionadas com a empresa e, portanto, nada tendo a ver com a pessoa do
trabalhador.
A prestação de trabalho poderá ser temporariamente impedida pelo total ou parcial
encerramento do estabelecimento onde se situa o local de trabalho. Nestas situações, a
prestação de trabalho encontra-se duplamente condicionada: requer-se que o trabalhador
esteja à disposição do empregador; e é necessário que lhe seja concedida oportunidade
para trabalhar. Ora, conforme vimos, quando a suspensão deriva de facto relacionado com
o trabalhador, o que sucede é que este não se encontra à disposição do empregador,
existindo, no entanto, oportunidade para trabalhar.
O encerramento temporário pode resultar de facto imputável ao empregador ou motivo do
seu interesse95 (artigo 309º, nº1, alínea b) CT) ou, por outro lado, ser imposta por fatores
objetivos externos ou internos (artigos 298º e 309º, nº1, alínea a) CT).
Quando o estabelecimento encerre por motivo fortuito ou de força maior96, caberá ao
empregador decidir se esse encerramento será temporário ou, em vez disso, definitivo.
Aliás, esta é uma das decorrências do Princípio da Liberdade e Iniciativa Económica Privada

92
E a partir do qual se pode considerar definitiva.
93
Culpa graduada no dolo – exige-se intencionalidade.
94
Tendo em conta o interesse público.
95
Impossibilidade voluntária.
96
Por exemplo, um incêndio que destrua grande parte das instalações da empresa.

53
Direito do Trabalho

(artigo 61º, nº1 CRP) – o empresário pode decidir sem qualquer constrangimento se, em
virtude de um incêndio que destrua grande parte das instalações da sua empresa, quer
reconstruir o estabelecimento e, por conseguinte, reabri-lo ou se o encerra definitivamente.
Quando tal suceda, dispõe o artigo 309º CT que, ao trabalhador afetado pela suspensão do
contrato, apenas é devido 75% da retribuição normal (nº1, alínea a)). Esta solução deve ser
vista pelo empregador como um incentivo a que a situação seja temporária e não definitiva,
visando-se a manutenção dos vínculos contratuais com os trabalhadores; outrossim, a
aplicação do Princípio da Responsabilização do Empregador poderia agravar o risco de o
impedimento temporário se transformar em definitivo.
A cessação da impossibilidade, nestas ocasiões, depende objetivamente de uma atitude
positiva do empregador.
Por outro lado, o encerramento da empresa pode ser determinado pelo empregador. Aqui,
o artigo 309º, nº1, alínea b) CT oferece-nos um conceito demasiado lato, pelo que teremos
de concretizar em que hipóteses é que esta situação poderá suceder: o empregador, por
meio de uma declaração unilateral, poderá determinar o encerramento da empresa e, neste
âmbito, podem ser várias as motivações – apontamos, a título exemplificativo, a
substituição dos equipamentos, a diminuição das encomendas, etc.; poderá ser
determinado por uma entidade pública competente, nomeadamente quando no seio da
empresa se pratiquem atos que contrariem a saúde pública (por exemplo). Nestas situações,
o encerramento deriva, indiretamente, de um ato da vontade do empregador, pelas práticas
levadas a cabo no seio empresarial.
Em qualquer caso, ainda que consideremos a amplitude do preceito disposto no artigo
309º, nº1, alínea b) CT, teremos de articulá-lo com a disposição constitucional seguinte: o
artigo 57º CRP, a respeito da proibição do locaute. Ora, sem entrar em grandes
desenvolvimentos, cumpre dizer, prima facie, o que é o locaute – qualquer paralisação total
ou parcial da empresa ou a interdição do acesso a locais de trabalho a alguns ou à totalidade
dos trabalhadores e, ainda, a recusa em fornecer trabalho, condições e instrumentos de
trabalho que determine ou possa determinar a paralisação de todos ou alguns setores da
empresa, desde que, em qualquer caso, vise atingir finalidades alheias à normal atividade
da empresa, por decisão unilateral do empregador; em seguida, cumpre referir o
procedimento previsto nos artigo 311º e 312º CT – o empregador é obrigado a comunicar a
estrutura representativa dos trabalhadores dos motivos que levaram ao encerramento. E
obriga-se o empregador â prestação de uma caução que cubra o pagamento das
retribuições em mora, caso existam, e das retribuições referentes ao período de
encerramento e de compensações por despedimento.
Todas estas disposições (nas quais incluímos o artigo 313º CT) visam afastar o locaute, em
conformidade ao que dita o artigo 57º CRP. O empregador não poderá, sem mais, encerrar
a empresa tendo, para tanto, de invocar um motivo determinado ou determinável, sob pena
de tal encerramento ser considerado locaute.
Dito isto, importa perceber o que sucede quanto aos salários. Neste seio, conforme
preceitua o artigo 309º, nº1, alínea b) CT, são devidos aos trabalhadores a totalidade das
suas retribuições, inclusivamente o subsídio de refeição bem como as comissões ou

54
Direito do Trabalho

participações nas vendas (cf. artigo 261º CT), sem prejuízo do disposto no artigo 309º, nº2
CT.
A cessação da impossibilidade ocorrerá mediante um comportamento declarativo da
entidade patronal, que torne conhecida a impossibilidade ou a sua conversão em definitiva,
produzindo, após a referida comunicação, os efeitos inerentes à cessação – nomeadamente,
a reativação da prestação laboral ou, sendo caso disso, a caducidade do contrato (artigo
310º CT).

Subcapítulo III – Suspensão de Contratos de Trabalho em Situações de Crise Empresarial


(lay off)

O lay off trata-se de uma forma atípica de suspensão do contrato de trabalho por razões
ligadas à empresa, encontrando-se consagrada nos artigos 298º e seguintes do CT.
O empregador poderá suspender os contratos de trabalho, desde que se observem as
exigências processuais dos artigos 299º e 300º CT e desde que tal medida se mostre
indispensável para assegurar a viabilidade da empresa e a manutenção dos postos de
trabalho (artigo 298º, nº1 CT).
Dito isto, podemos apontar várias características que fundamentam o caráter atípico desta
modalidade: não pressupõe a impossibilidade material da prestação de trabalho (a empresa
pode continuar em funcionamento); a lei adota o regime que vigora para a impossibilidade
respeitante à pessoa do trabalhador: cessação do crédito remuneratório, sendo substituído
por uma prestação de caráter misto, a compensação retributiva (artigo 305º, nº3 CT).
Para acorrer a situações de crise empresarial, o legislador consagrou dois expedientes: por
um lado, a redução da atividade (e, portanto, dos horários normais de trabalho) e, por outro,
a suspensão dos contratos de trabalho (artigo 298º, nº1 CT).
Os trabalhadores abrangidos pelo lay off ficam parcial ou totalmente inativos na empresa
porque o empregador considera dispensável ou excedentária a sua prestação, podendo,
ainda assim, exercer atividade profissional fora da empresa97 (artigo 305º, nº1, alínea c) CT),
desde que a comunique ao empregador (artigo 304º, nº1, alínea b) CT).
A existência desta modalidade de suspensão tem de ser vista como um instrumento de
segurança do emprego (artigo 303º, nº2 CT), uma vez que impossibilita a cessação dos
contratos de trabalho durante a execução destas medidas e mesmo durante um
determinado prazo após o término da sua aplicação (30 ou 60 dias após a sua cessação,
conforme as medidas tenham sido aplicadas por um prazo inferior ou igual a seis meses, ou
por tempo superior). No entanto, esta regra comporta exceções e, por isso, não impede a
cessação da comissão de serviço, a cessação de contrato a termo, ou despedimento
disciplinar.
Nestas circunstâncias, a situação económica dos trabalhadores é atendida por meio de uma
compensação retributiva (artigo 305º, nº1, alínea a) e nº3 CT), tendo esta um limite mínimo
(a retribuição mínima mensal garantida para o setor) e um limite máximo (o triplo dessa
retribuição mínima mensal garantida para o setor). Assim, o trabalhador receberá um

97
A retribuição que possa auferir nesta empresa será deduzida na compensação retributiva que lhe
caberá.

55
Direito do Trabalho

montante equivalente à sua retribuição mínima mensal ou a dois terços da remuneração


que auferia, conforme o valor mais alto (artigo 305º, nº1, alínea a) CT).
Cabe ao empregador a responsabilidade do pagamento da compensação ao trabalhador,
embora o encargo seja comparticipado em 70%, pela instituição da segurança social (artigo
305º, nº4 CT) – ficando os restantes 30% a cargo daquele.
A suspensão dos contratos pelo empregador nestas circunstâncias depende, no entanto,
da observância do procedimento que consta dos artigos 299º e 300º CT. Este procedimento
consiste numa comunicação escrita, dirigida pelo empregador a uma estrutura interna de
representação dos trabalhadores, em que se manifesta a intenção de promover a suspensão
ou redução, devidamente fundamentada (artigo 299º, nº1 CT). Com isto, visa-se criar um
consenso preliminar entre o empregador e os representantes dos trabalhadores quanto ao
projeto de suspensão, daí que o artigo 300º, nº1 se refira mesmo à ideia de “negociação”.
Esta “negociação” deve ocorrer num prazo máximo de cinco dias, de modo a respeitar a
urgência que a crise empresarial possa suscitar98.
Este processo culmina com a decisão da entidade empregadora que poderá ter sido tomada
por acordo, ou não tendo este sido possível, representar uma decisão unilateral. Contudo,
esta deverá ser comunicada aos trabalhadores até ao sexto dia posterior à data da
comunicação inicial99, devendo ser efetuada por escrito, contendo a indicação do motivo e
das datas de início e termo – que, regra geral, tem como limite máximo uma duração de seis
meses e, excecionalmente, de um ano (artigo 301º, nº3 CT).
A suspensão dos contratos de trabalho pode cessar antes do tempo previsto, por
intervenção administrativa (artigo 307º, nº2 CT).
Finalmente, o artigo 298º-A CT vem proibir o empregador de suspender contratos e/ou
reduzir períodos de trabalho mediante decisões sucessivas, impondo que se verifique um
hiato temporal equivalente a metade do tempo abrangido pela medida anteriormente
utilizada.

Face à situação epidemiológica provocada pelo novo Coronavírus – Covid 19, foi aprovado
um regime de lay off simplificado, que visa evitar a burocracia e a morosidade deste tipo de
processos. É deste que, neste momento, daremos conta.

Lay off Simplificado (Decreto-Lei nº 10-G/2020)

Em primeiro lugar, importa precisar quais foram as motivações que levaram à adoção de
um regime de lay off simplificado. Para tanto, iremos recorrer ao preâmbulo do referido
decreto-lei:

98
Este prazo reflete, ainda, a pouca confiança do legislador no alcance em acordos neste contexto.
99
Do empregador à entidade representativa dos trabalhadores.

56
Direito do Trabalho

A figura da redução temporária do período normal de trabalho ou suspensão do contrato


de trabalho por facto respeitante ao empregador em situação de crise empresarial, prevista
no Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, na sua redação
atual (vulgo lay-off), tem demonstrado ao longo da história ser um instrumento robusto para
ajudar a responder à situações de crise como a que o País atravessa, importando, no
entanto, garantir a sua flexibilidade procedimental de forma que este possa ser
operacionalizado rapidamente, à semelhança do que foi aprovado na Portaria n.º 71-
A/2020, de 15 de março, na sua redação atual.

E ao artigo 1.º - Objeto:


O presente decreto-lei estabelece medidas excecionais e temporárias, definindo e
regulamentando os termos e as condições de atribuição dos apoios destinados aos
trabalhadores e às empresas afetados pela pandemia da COVID-19, tendo em vista a
manutenção dos postos de trabalho e a mitigação de situações de crise empresarial.

Dito isto, importa perceber em que é que consiste o referido regime e de que forma se
processará, precisando, na medida do possível, em que aspetos difere do regime de lay off
(“normal”, constante do CT).
O Decreto-Lei n.º 10-G/2020 veio estabelecer, como dissemos, algumas especificidades em
relação ao regime geral, derrogando excecionalmente, algumas das suas normas. Ainda
assim, no concernente ao regime da redução do período normal de trabalho e ao regime de
suspensão do contrato por facto respeitante ao empregador, o decreto-lei remete para o
Código de Trabalho, valendo o disposto nessa legislação (artigo 2º, nº2 CT).
Conforme resulta do artigo 3º, nº1 do decreto-lei, para que este regime possa ser aplicado
é necessário que se verifique algum dos seguintes critérios: a paragem total da atividade da
empresa ou estabelecimento que resulte da interrupção das cadeias de abastecimento
globais, da suspensão ou cancelamento de encomendas (nº1, alínea a)); ou a quebra
abrupta e acentuada de, pelo menos, 40% da faturação, nos 60 dias anteriores ao pedido
junto da segurança social com referência ao período homólogo ou, para quem tenha
iniciado atividade há menos de 12 meses, à media desse período (nº1, alínea b)).
Estes critérios são alternativos100. No entanto, o segundo critério é o que oferece mais
garantias de diferimento porque mais objetiva e é baseada em prova documental101, o que
confere menos discricionariedade.
Ora, é então necessário pedir à Contabilidade que confirme se estão reunidas as condições
da alínea a) ou da alínea b). Com a apresentação da certidão e com base na informação que
dela consta, irá ser ponderado o início do processo e será apresentado um pedido.
Em relação ao procedimento que permite às empresas ser abrangidas pelo regime de lay
off, cumpre-nos, em primeiro lugar, referir que as formalidades previstas no decreto-lei em
pouco se afasta do regime estabelecido no Código de Trabalho – nomeadamente, nos artigo
299º e 300º. Ora, se o logro passava pela simplificação deste processo, parece-nos que tal

100
Apenas tem de se verificar um deles para que o regime possa ser aplicável.
101
Mediante declaração do empregador conjuntamente com certidão do contabilista certificado da
empresa (…).

57
Direito do Trabalho

não foi (pelo menos) eficazmente conseguido. É esta a nossa opinião, porquanto o artigo 4º,
nº2 do Decreto-Lei, vem impor que o empregador que pretenda aderir ao lay off
simplificado, tem de ouvir os delegados sindicais ou a comissão de trabalhadores. Esta
mesma exigência resulta do regime consagrado no CT, pelo que não se afasta
(aparentemente) a fase de negociação a que se refere o artigo 300º, nº1. Por outro lado,
impõe-se a apresentação de uma certidão de contabilista devidamente credenciado da qual
conste a situação económico-financeira da empresa que lugre ser abrangida pelo regime.
Em que medida o lay off se afigura simplificado, na verdade, não sabemos; certo é que, pelo
menos, este regime excecional não vem falar de prazos (nomeadamente, o de cinco dias
atinente à fase de negociação), donde, acreditamos que, ainda que seja necessária a audição
dos delegados sindicais e das comissões de trabalhadores, a negociação não seja a sua
motivação.
À Segurança Social deverá comunicar-se a decisão, devendo esta ser elaborada por meio
de comunicação que contenha os seguintes elementos: todas as comunicações individuais
dirigidas aos trabalhadores a informar da intenção de lay off; declaração do empregador,
que deverá acompanhar a certidão contabilística e ser compatível com o conteúdo da
mesma; certidão do contabilista certificado da empresa (atestando que a empresa se
encontra numa posição em que pode pedir este apoio).
Além das empresas que se vejam abrangidas por alguma destas previsões, têm legitimidade
para recorrer aquelas cujo encerramento foi decretado pelo estado (cf. Decreto-Lei n.º 2-
A/2020).
Quanto aos salários dos trabalhadores102, estes terão direito a dois terços da retribuição
ilíquida, com um limite mínimo103 no valor da retribuição mensal mínima garantida104
correspondente ao seu período normal de trabalho e máximo de três retribuições, sendo
que 70% deste montante será suportado pela Segurança Social e 30% pelo empregador.
Contudo, num primeiro momento, deverá ser o empregador a satisfazer este montante,
acabando por, posteriormente, ser reembolsado pela Segurança Social (nos 70% que lhe
compete) – artigo 305º, nº3 e nº4 CT ex vi artigo 6º, nº4 do decreto-lei.
Conforme resulta do artigo 11º do DL, a entidade empregadora fica isenta do pagamento
das contribuições devidas à Segurança Social; bem como do pagamento da Taxa Social Única
(TSU).
As entidades que beneficiarem deste apoio não podem proceder ao despedimento de
trabalhador abrangido por estas medidas, durante o tempo em que estas estiverem a ser
aplicadas nem, outrossim, poderão fazê-lo nos 60 dias subsequentes à cessação da aplicação
das mesmas. Isto sem prejuízo do despedimento por motivo disciplinar e, portanto, fundado
em justa causa (artigos 98º e 328º e seguintes CT).
A duração deste apoio é de um mês, podendo excecionalmente ser prorrogado por um
período máximo de três meses.

102
Que terão de continuar a descontar para a Segurança Social, numa percentagem de 11%.
Exemplificando: o trabalhador que aufira a retribuição mensal mínima garantida – 635 euros -, terá de
descontar o valor de 69,85 euros.
103
E máximo de, abstratamente, 1905 euros.
104
No valor de 635 euros (Decreto-Lei n.º 167/2019, de 21 de novembro).

58
Direito do Trabalho

Qualquer incumprimento do regime estabelecido – nomeadamente, no caso do


empregador que recorreu às medidas do lay off, despedir sem justa causa um dos
trabalhadores abrangidos pelas referidas medidas -, leva a que este se constitua no dever
de restituir todo o montante que lhe houver sido pago a este título – é o que resulta do
artigo 14º do Decreto-Lei.
Ademais, a par do que dispõe o Código do Trabalho, os “direitos, deveres e garantias” de
ambas as partes que não pressuponham a efetiva prestação da atividade laboral, mantêm-
se e de entre eles destacamos o dever de sigilo e de lealdade (não obstante, durante a
aplicação das medidas de lay off, o trabalhador poder prestar a sua atividade a outra
entidade, desde que o comunique ao empregador), pelo que, o seu desrespeito poderá, ao
abrigo do poder disciplinar (porque este também não fica suspenso), levar ao despedimento
por justa causa (o que sucederá, por exemplo, se o trabalhador divulgar o know-how
daquela empresa a empresa concorrente).
Por fim, note-se que até ao dia 30 de abril de 2020 as empresas que tenham dívidas
poderão, excecionalmente, beneficiar deste regime. Isto reflete uma enorme exceção neste
domínio, uma vez que, em regra, para que as entidades empresariais possam requerer este
apoio é necessário que tenham a sua situação tributária e contributiva regularizada (artigo
17º do DL).

Para mais informação:


https://www.jornaldenegocios.pt/economia/coronavirus/detalhe/novo-lay-off-guia-para-
trabalhadores-e-empresas

Subcapítulo IV – A Redução da Atividade

A redução da atividade trata-se de um expediente utilizado como alternativa à efetiva


suspensão dos contratos de trabalho (nessa medida, deve considerar-se preferível).
Este regime, por seu turno, não implica uma inatividade absoluta dos trabalhadores, mas
uma mera redução do período normal de trabalho (artigo 298º, nº1, 1ª parte). Assim, estes
irão continuar a prestar a sua atividade ao empregador, ainda que tal envolva mais períodos
de inatividade (no entanto, esta inatividade nunca será total). Ora, a adoção destas medidas
poderá resultar de uma decisão unilateral do empregador ou de um acordo destes com os
trabalhadores (assumindo, neste último caso, uma natureza coletiva).
Quando resulte de uma decisão unilateral do empregador, a compensação salarial a que os
trabalhadores têm direito é, mais uma vez, a que consta do artigo 305º, nº1, alínea a) CT.
Donde, a diminuição do período normal de trabalho não afeta este direito dos
trabalhadores; solução que se percebe na medida em que a redução do período normal de
trabalho resultou de uma decisão alheia (do empregador).
Contudo, quando a redução da atividade resulte de acordo do empregador com os
trabalhadores, essa compensação poderá sofrer, também ela, uma redução proporcional.
Também esta nos parece uma solução sensata, ainda mais quando a empresa se encontre
numa situação de afogo económico-financeiro; nesse sentido, a redução salarial afigurar-

59
Direito do Trabalho

se-á como uma medida que visa obstar ao encerramento definitivo da empresa, uma vez
que vê reduzido os seus encargos no que concerne às retribuições dos seus trabalhadores.
Ficam, assim, abordados os traços essenciais deste regime, sendo certo que o maior já ficou
dito em sede da análise da suspensão dos contratos de trabalho – na verdade, o Código do
Trabalho não autonomiza nenhuma destas hipóteses, tratando-as conjuntamente (sem
embargo das especificidades que revestem cada uma das situações).

Subcapítulo V – Pré-Reforma

A pré-reforma encontra-se legalmente prevista nos artigos 318º e seguintes do Código de


Trabalho e reporta-se, no plano jurídico-laboral, à situação do trabalhador que antecede a
sua reforma.
O trabalhador que tiver idade igual ou superior a 55 anos poderá, mediante acordo com o
seu empregador, passar a auferir uma prestação pecuniária mensal a título de pré-reforma
(artigo 318º CT). Não basta, contudo, que seja celebrado um acordo entre as partes; para
que se vislumbre, efetivamente, uma situação de pré-reforma é necessário que o referido
acordo se destine a cobrir o hiato temporal que separa o trabalhador da reforma. Donde,
atingida a reforma por velhice, a pré-reforma cessará (artigo 322º, nº1 CT).
Este acordo (novatório) está sujeito a forma escrita e dele devem constar as menções
prescritas no artigo 319º CT.
A prestação pecuniária auferida a título de pré-reforma não pode extravasar os limites
máximo e mínimo estabelecidos pela lei – artigo 320º, nº1 CT. E, por isso, não poderá ser
superior à retribuição auferida pelo trabalhador à data do acordo, nem pode, por outro lado,
ser inferior a 25% desta.
Por seu turno, o trabalhador fica adstrito a um período de trabalho inferior ao normal e,
nesse sentido, trata-se de uma figura atípica de redução da atividade; mas nada obsta a que
o trabalhador – abrangido pelo regime da pré-reforma – deixa, inclusivamente, de prestar
trabalho à entidade empregadora. E, nessa medida, importará a suspensão do contrato.
Admite o artigo 318º ambas as possibilidades tendo, em qualquer caso, o trabalhador,
direito a um montante de prestação de pré-reforma.
Assim, celebrado o acordo de pré-reforma, o conteúdo contratual constante do pacto (ou
contrato) primitivo é modificado em aspetos essenciais da relação jurídico-laboral – como
são o período normal de trabalho e a retribuição auferida pelo trabalhador. Ademais, este
vínculo destina-se a permanecer, em regra, até que trabalhador e empregador fiquem
definitivamente desvinculados, em resultado da verificação de uma das causas de cessação
previstas no artigo 322º, nº1 CT.
O artigo 321º consagra o direito do trabalhador a exercer, caso o pretenda, outra atividade
profissional remunerada (nº1); vem, outrossim, conceder ao trabalhador, no caso de falta
de pagamento culposo, por mais de 30 dias, da prestação de pré-reforma, o direito de
retomar o pleno exercício das suas funções105 ou a resolver o contrato, com direito a uma

105
Esta reversibilidade está, aliás, prevista de forma expressa na alínea b), nº1 do artigo 322º CT.

60
Direito do Trabalho

indemnização (equivalente ao valor das prestações a título de pré-reforma que auferiria até
à idade legal de reforma por velhice – cf. artigo 322º, nº2 CT) (nº3).
Tudo (ou quase tudo) dito, importa, enfim, referirmo-nos ao regime disposto no artigo 348º
CT. Tratando-se de contrato por tempo indeterminado, este irá converter-se ope legis num
contrato a termo quando o trabalhador permaneça ao serviço decorridos 30 dias do
conhecimento, por ambas as partes, da reforma do trabalhador por velhice.
Cessando a pré-reforma com a reforma do trabalhador por velhice, ainda que este continue
ao serviço da entidade empregadora, a referida conversão ope legis confere ao empregador
a possibilidade de se desvincular do trabalhador (que em razão da sua avançada idade já
não é tão produtivo), sem necessidade de, para tanto, invocar justa causa.
Nesta medida, podemos concluir que a pré-reforma é uma medida de flexibilização de
saída da empresa do trabalhador.
Por outro lado, a pré-reforma permite que o trabalhador se desligue progressivamente da
atividade que exerce na empresa, facilitando a transição da idade ativa para o regime de
aposentação.

Capítulo VIII – Formação do Contrato de Trabalho

As relações contratuais de trabalho são precedidas de um momento prévio – o


recrutamento -, que visa ou que se traduz na convergência dos interesses das partes, isto é,
do trabalhador e do empregador.
Daquilo que já temos vindo a dizer, concluímos que estas relações encetadas pelas partes
são, atento à posição superior e mais forte do empregador, são regidas por este – e,
concretamente, pelos seus interesses. Este visa preencher um posto de trabalho e, nessa
medida, especificará e estabelecerá, consoante as suas pretensões, os moldes em que se irá
contratar. Donde, e só em vezes escassas, é que haverá lugar à negociação das prestações
principais – como são a atividade contratada e a retribuição.
Daí que o Direito do Trabalho entre a regular (também) estas relações pré-contratuais,
estabelecendo limites ao poder do empregador, já que o trabalhador, necessitando do
trabalho para prover ao seu sustento, poderia sentir-se obrigado a aceitar as condições
impostas (quais fossem) por aquele.
A fase de recrutamento visa, sobretudo, a obtenção de informações de parte a parte – do
empregador sobre o trabalhador e vice-versa. Mas, na verdade, a ratio é conferir ao
empregador (o que oferece a possibilidade de ocupação do posto de trabalho vago) a
possibilidade de obter e juntar informações sobre o trabalhador, para que, dessa forma,
consiga perceber se a pessoa com quem está a contratar é, ou não, a ideal para preencher
o posto de trabalho.
Durante esta fase, trabalhador e empregador devem adotar uma conduta pautada pela
transparência e pela veracidade dos factos que invocam e transmitem à contraparte, o que
é imposto pelo artigo 105º CT. O desrespeito por este imperativo, consubstanciado no
Princípio da Boa Fé (o que tem paralelo no artigo 227º do Código Civil, já que este preceito
também se reporta ao momento pré-contratual), poderá levar à invalidade do contrato de

61
Direito do Trabalho

trabalho, na vertente da anulabilidade; isto porque, a prolação de declarações falsas poderá


induzir a outra parte em erro, viciando a sua vontade. Donde, nesse caso, em causa estará
um vício de vontade – dolo (cf. artigo 254º CC), a menos que a prestação dessas declarações
não seja contrária às conceções dominantes do comércio jurídico (artigo 253º, nº2).
Além do facto de estas situações determinarem a anulabilidade do negócio, estatui o
referido artigo 102º CT o dever de o contraente culposo indemnizar o outro pelos prejuízos
de lhe tenha causado.
Ademais, o direito do empregador a informações pessoais do trabalhador, deve ser
articulado e limitado pela tutela da privacidade deste, conforme preceitua o artigo 22º. Com
o que isso importa a impossibilidade de se exigir a prestação de certas informações e a
realização de exames médicos para provar, porventura, a privacidade dos factos invocados
pelo trabalhador, nomeadamente, no que concerne à sua lucidez psíquica ou saúde física.
Assim sendo, admite-se ao empregador a formulação de certas perguntas –
nomeadamente, as que se enquadram no escopo do artigo 17º - em situações escassas,
apenas se a situação concreta se subsumir numa das hipóteses previstas nas alínea a) e b),
nº1 do artigo 17º. Isto é, quando “particulares exigências inerentes à natureza da atividade
profissional o justifiquem” – refere-se o legislador, predominantemente, às características
do posto a ocupar; ou quando “sejam estritamente necessárias e relevantes para avaliar da
respetiva aptidão do trabalhador, mas desde que a justificação seja fornecida por escrito.
Fora destas hipóteses, as formulações destas questões pelo empregador possuem um
caráter indagatório, cujo fim é reprovado pelo Direito. Neste contexto, a doutrina (ainda
que não seja consensual) tende a admitir um direito a mentir, cujo alcance traduz-se na
possibilidade de o trabalhador mentir, por forma a ocupar o posto de trabalho; é que, de
outra forma, respondendo veridicamente à questão colocada pelo empregador, o
trabalhador colocar-se-ia em posição de perder a vaga a ocupar, por razões da sua vida
privada ou pelo estado de gravidez de uma candidata.
Ultrapassada toda esta fase, o empregador terá o direito, de entre os trabalhadores
escolhidos, optar pelo que mais lhe aprouver, independentemente dos méritos de cada um.
Ainda assim, este poder concedido ao empregador encontra-se limitado por um dever de
não-discriminação. Isto é, no acesso do trabalhador à vaga, o empregador não deve vedar-
lhe tal acesso, fundamentando-o numa das razões prescritas pelo artigo 24º, nº1.

Posto isto, pronunciar-nos-emos de forma breve em relação aos pressupostos que devem
estar verificados para a celebração do vínculo laboral.
Primeiramente, analisaremos os pressupostos subjetivos – atinentes às partes.
No concernente à capacidade jurídica, deve dizer-se que, em princípio, apenas as pessoas
físicas e singulares (excluídas estão as pessoas coletivas), com 16 anos ou mais, podem
suportar os direitos e obrigações que provêm do vínculo laboral – artigo 68º, nº2. Donde, a
capacidade não é originária, sendo apenas adquirida quando se perfaça a idade
mencionada. Contudo, excecionalmente, um menor de 16 anos, desde que haja concluído
a escolaridade obrigatória, pode ser admitido para um “trabalho leve”, cujo alcance (ainda
que não determinado) se encontra no artigo 68º, nº3.

62
Direito do Trabalho

A capacidade de exercício de direitos é, regra geral, adquirida com a maioridade, o que, ao


abrigo do Código Civil, ocorre aos 18 anos (cf. artigos 122º e 130). No entanto, e no seio do
direito laboral, a capacidade para se exercerem direitos de per si, adquire-se em momento
anterior: aos 16 anos de idade e caso o menor tenha concluído o ensino obrigatório. Se uma
destas condições não se verificar, o contrato só é válido mediante autorização dos seus
representantes legais (artigo 70º, nº1 e nº2). Em todo o caso, o menor tem capacidade para
receber a retribuição, a menos que os representantes legais se oponham a tal por escrito
(artigo 70º, nº3).
O contrato celebrado por quem não tenha capacidade jurídica é nulo; ou, se não tiver
capacidade de exercício de direitos é anulável – cf. artigo 122º CT.

Analisados os pressupostos subjetivos, passaremos à análise dos pressupostos objetivos –


e, por isso, que atendem ao objeto do contrato de trabalho.
Estes requisitos encontram-se dispostos no artigo 280º do Código Civil, pelo que de algum
modo já foram alvo de estudo em Teoria Geral das Obrigações. Ainda assim, abordaremos
cada um deles em traços gerais.
Determinabilidade – exige-se que o objeto do contrato esteja determinado; isto não
prejudica a possibilidade de, num momento inicial, a atividade ser genericamente
delimitada, para que, num momento posterior, seja determinada. Ora, o objeto tem, no
limite, de ser determinável.
Contudo, não poderão apor-se cláusulas que confiram ao empregador a possibilidade de
usar e abusar do trabalhador, o que, por certo, traria para o domínio da relação jurídico-
laboral um cunho servil que, sendo repugnado pela nossa ordem jurídica (como em quase
todas, no geral), não pode conceber-se.
A indeterminação da atividade a que o trabalhador fica obrigado a prestar, soluciona-se
com a atribuição, por parte do empregador, da atividade que pretende que aquele
desempenhe. E este ponto é essencial porquanto, só depois de determinado o objeto, é que
o cumprimento da obrigação se torna exigível.
Possibilidade física – para que um contrato seja válido, é necessário que a atividade
acordada seja possível fisicamente. Dado o caráter intuito personae destes contratos (de
trabalho) entende-se que para que uma prestação se torne impossível é apenas necessário
que esta seja subjetiva, isto porque não se pode dissociar do trabalhador que se obrigou –
natureza infungível.
Este juízo (impossibilidade/possibilidade) deve ser efetuado, tendo em conta as
circunstâncias concretas de tempo e lugar e, bem assim, as características pessoais do
trabalhador.
Licitude – em traços gerais, este requisito exige que o objeto do contrato não seja contrário
à lei; sendo-o, fica ferido de uma invalidade, na vertente da nulidade. É o que resulta do
artigo 124º CT.
A ilicitude pode derivar de vários motivos; pode resultar de uma atividade que, em si
mesma, é ilícita; de uma atividade que, embora lícita, destina-se a um fim ilícito; e, enfim, a
sua ilicitude pode derivar da pessoa do trabalhador – a verdade é que existem atividades
que, envolvidas de características que podem colocar em perigo o nascituro, são vedadas às

63
Direito do Trabalho

grávidas, puérperas ou lactantes (artigo 62º, nº5); por outro lado, os menores também se
encontram impedidos de prestar determinadas atividades (artigo 68º).

Subcapítulo I – Formas de Celebração do Contrato de Trabalho

Provindo as relações jurídicas, de um contrato de trabalho, para que o vínculo se considere


celebrado, é necessário que trabalhador e empregador direcionem as suas pretensões num
mesmo sentido e, por isso, ainda que partam de polos diferentes, as vontades se encontrem
num ponto comum – o que dará lugar, então, à celebração do contrato de trabalho (cf.
artigo 11º).
Em regra, parte do empregador a iniciativa de contratar, já que é este que carece de força
de trabalho suficiente, pelo que deverá dirigir uma proposta ao trabalhador e esta, sendo
ou não alvo de negociação, poderá ser aceite ou recusada pelo seu destinatário.
Caso o trabalhador a aceite, teremos um consenso. Ora, este, em regra, não precisa de
obedecer a forma escrita – cf. artigo 110º. Vale por dizer que a celebração do contrato de
trabalho não está, em princípio, sujeito a forma legalmente exigida, vigorando a regra da
liberdade de forma. Basta, então, que o consenso se exprima através de duas declarações
orais convergentes.
No entanto, esta regra (como, de resto, já analisámos) é derrogada por algumas exceções
que a lei reconhece – nomeadamente, no caso do contrato de trabalho a termo.
O contrato pode, ainda, ser celebrado por adesão. Nestes casos, a iniciativa cabe, por certo
ao empregador que, por meio de uma proposta-tipo integrada por cláusulas contratuais
gerais, insuscetíveis de negociação. Ou seja, as condições à contratualização encontram-se
tipificadas no documento apresentado (a proposta) e o trabalhador ou as aceitas ou as
recusa, sem possibilidade de as negociar.
A vontade contratual do empregador, conforme resulta do artigo 104º, nº1, pode resultar
de regulamento interno da empresa, mas para que tal possa suceder, é fundamental que
desse documento constem os elementos que devem integrar uma proposta contratual –
nomeadamente, a retribuição, o local de trabalho, a duração de trabalho, as férias, entre
outros.
Por conseguinte, o trabalhador pode aderir às condições que constam da proposta-tipo
através de uma declaração expressa ou tácita; será expressa se, por exemplo, assinar o
respetivo documento, ou tácita, quando este não se opuser por escrito no prazo de 21 dias,
a contar do início da execução do contrato ou da divulgação do regulamento, se esta for
posterior (artigo 104º, nº2).

Sem embargo da sua importância, o contrato de trabalho regula apenas uma pequena
parte da disciplina por que se há de reger a relação laboral. É que, em grande medida, a sua
disciplina consta já de lei ou de convenção coletiva de trabalho. Nesse sentido, o legislador
não considerou ser necessário impor às partes (em regra), a celebração do contrato de
trabalho por escrito, tendo este um caráter consensual.

64
Direito do Trabalho

De modo a reforçar e a esclarecer as partes – nomeadamente, o trabalhador – das posições


contratuais que ocupam, o artigo 106º vem estabelecer deveres de informação recíprocos,
o que, como vimos, não só existe em sede pré-contratual, mas também se mantém durante
a execução do contrato. Ora, o nº1 deste preceito, vem obrigar o empregador a informar o
trabalhador de todos os aspetos relevantes do contrato de trabalho; nessa medida, aquele
deve comunicar à sua contraparte as regras porque se há de reger a relação que
estabeleceram, quer estas resultem do contrato ou de outro instrumento – como são as leis
ou as convenções coletivas de trabalho. Mas também este dever impende sobre o
trabalhador (nº2, artigo 106º).
Em todo o caso, a prestação destas informações deve ser feita por escrito (artigo 107º, nº1).

Subcapítulo II – Período Experimental

O período experimental atende a interesses de ambas as partes. Na verdade, os contratos


de trabalho são, via de regra, celebrados sob um clima/panorama de grande
indeterminação, em que as partes não conhecem a realidade uma da outra. A isto, acumula-
se o facto de as relações laborais serem normalmente duradouras e, por isso, essa
predisposição, em parte, perpétua das relações jurídicas laborais, justifica a criação de uma
figura – o período experimental -, que faculte às partes a possibilidade de se conhecerem
melhor uma à outra.
Do ponto de vista do empregador, interessa-lhe conhecer as capacidades físicas e psíquicas
do trabalhador, bem como as suas aptidões para a ocupação de um determinado cargo;
para o trabalhador, ainda que precise de prover ao seu sustento, o que conseguirá mediante
a retribuição auferida, poderá concluir que a realidade da entidade empregadora não se
coaduna com as suas expetativas e, por isso, que é insuportável manter-se ao serviço
daquela.
Neste contexto, o legislador veio consagrar nos artigos 111º e seguintes, a figura de que
agora nos ocuparemos – o período experimental. Trata-se do período inicial de execução
do contrato, durante o qual as partes avaliam os seus interesses na sua manutenção.
A regra é, assim, a da existência de um período de experiência, em que as partes podem
atuar com vista a apreciar o interesse na manutenção do vínculo (artigo 111º, nº2). Até
porque este existirá em relação a qualquer contrato celebrado, a menos que seja excluído
por acordo escrito entre as partes (nº3 do mesmo preceito) ou se estivermos perante um
contrato em comissão de serviço, caso em que a existência deste período tem de ser
estipulada no acordo (artigo 112º, nº3). Ora, se assim é, por maioria de razão, o período
experimental também pode ser objeto de redução (se se pode excluir, também podem as
partes reduzi-lo – a ideia de que se se pode o mais, também se pode o menos), possibilidade
essa que é concedida pelo artigo 112º, nº5).
Por outro lado, e partilhando da visão de Monteiro Fernandes, não se percebe a opção do
legislador pela consagração de tal período de experiência em relação aos contratos cuja
duração é curta (limitada).

65
Direito do Trabalho

Regra geral, o período experimental tem a duração de 90 dias; para os casos previstos na
alínea b) do artigo 112º, a duração deste período é de 180 dias; e, para os trabalhadores
que exerçam cargos de direção ou quadro superior, este período estende-se a 240 dias.
Para os contratos de trabalho a termo foi estipulado um regime especial, disposto no artigo
112º, nº2. Quando estes contratos tenham a duração igual ou superior a seis meses, este
período é de 30 dias; se o contrato a termo certo for celebrado por uma duração inferior a
seis meses ou se se tratar de contrato a termo incerto cuja duração previsível não ultrapasse
esse limite (seis meses), então a duração do período experimental é de 15 dias.
Ademais, este período é reduzido ou excluído imperativamente nos casos prescritos do
artigo 112º, nº4 – nomeadamente, quando o mesmo trabalhador já se haja encontrado ao
serviço do mesmo empregador. Neste caso, presume-se que a entidade empregadora já
conhece o trabalhador, pelo que, assim sendo, não faria sentido estar a conceder um
segundo período experimental quando as partes já se conhecem.
Na prática, esta figura permite que as partes se façam desvincular do contrato, sem se
encontrarem subordinados aos condicionalismos e restrições de que essa desvinculação é
dotada no regime dito geral. Dispõe o artigo 114º, nº1, a possibilidade de qualquer das
partes denunciar, durante este período, o contrato sem necessidade de aviso prévio e
invocação de justa causa, nem direito a indemnização.
A exigência de aviso prévio apenas existe para os casos em que o período experimental
dure mais de 60 dias – cf. artigo 114º, nº2 e nº3; e o seu desrespeito importa o pagamento
da retribuição correspondente ao aviso prévio em falta.
Contudo, note-se que apesar de ser livre a desvinculação, isto não importa que não haja
um limite que a esta possibilidade. A lei presume que a denúncia do contrato se fundamenta
na inadaptação do trabalhador ou nas inconveniências das condições de trabalho
concedidas pela empresa. Quando tal pretensão se funde em motivos arbitrários, deve
convocar-se o abuso de direito (artigo 334º), em nome da tutela do próprio artigo 53º CRP
e, por conseguinte, da segurança no emprego.
Note-se que este regime é supletivo, valendo se a vontade das partes não for contrária à
sua vigência; donde, poderá ser afastado no seu todo ou apenas em parte – cf. artigos 111º,
nº3 e 114º, nº1.
Do momento da celebração do contrato até ao início da execução da prestação de trabalho
pode mediar um hiato temporal mais ou menos longo, pelo que o legislador veio estipular
que o período experimental apenas se começa a contar desde o início da execução da
prestação; solução que se percebe tendo em conta que só a partir dessa data é que, tanto
empregador e trabalhador, poderão avaliar os seus interesses na manutenção do vínculo
contratual (artigo 113º, nº1).

Subcapítulo III – Trabalhador-Estudante

O legislador entendeu que o trabalhador-estudante se situa numa posição diferente dos


demais trabalhadores, uma vez que se ocupa de duas atividades diferentes: por um lado,

66
Direito do Trabalho

trabalha e, por outro, investe na sua formação académica. E, tendo isso em consideração,
para não desincentivar o trabalhador de estudar, veio-lhe conceder alguns privilégios que
não reconhece a outros trabalhadores, atribuindo-lhe um estatuto especial. Este, encontra-
se previsto nos artigos 89º e seguintes e na Lei n.º 105/2009, de 14 de setembro, e dele nos
ocuparemos neste instante.
Dispõe a lei que se considera trabalhador-estudante o que frequente qualquer nível de
educação escolar, bem como o curso de pós-graduação, mestrado ou doutoramento em
instituição de ensino, ou ainda curso de formação profissional ou programa de ocupação
temporária de jovens com duração igual ou superior a seis meses.
Dito isto, podemos concluir que, qualquer um de nós, estudantes, se encetarmos uma
relação laboral durante o período em que estejamos a tirar a licenciatura em Direito,
podemos beneficiar deste estatuto.
O horário de trabalho, quando não individualmente contratado, é definido pelo
empregador (artigo 212º, nº1). Ora, quando se trate de trabalhador-estudante, o
empregador deve ter o cuidado de ajustar o horário, sempre que possível, de modo a
possibilitar aquele a frequentar as aulas e a sua deslocação para o estabelecimento de
ensino. Quando tal não se vislumbre possível, o trabalhador-estudante tem direito a
dispensa106 de trabalho para frequência de aulas, se assim o exigir o horário escolar, sem
perda de direitos e conta como efetiva prestação de trabalho (artigo 90º).
Em momento de prestação de prova de avaliação, o trabalhador-estudante pode faltar
justificadamente no dia de prova e no dia imediatamente anterior, sendo certo que, em
todo o caso, não as faltas não podem exceder quatro dias por disciplina em cada ano letivo
(artigo 91º).
Por outro lado, tem direito a marcar o período de férias de acordo com as suas necessidades
escolares, podendo gozar até 15 dias de férias interpoladas, desde que isso seja compatível
com as exigências do funcionamento da empresa (artigo 92º).
Para que o trabalhador-estudante possa, então, gozar, deste estatuto é necessário que o
comprove perante o empregador, apresentado igualmente o horário das atividades
educativas a frequentar; e, para que lhe possa ser atribuído o estatuto pelo estabelecimento
de ensino, o estudante deve fazer prova da sua condição de trabalhador.
Segundo a lei n.º 105/2009, de 14 de setembro, o trabalhador-estudante não se encontra
sujeito à frequência de um número mínimo de disciplinas de determinado curso, em graus
de ensino em que isso seja possível, nem ao regime de prescrição ou que implique mudança
de estabelecimento de ensino; a qualquer disposição legal que faça depender o
aproveitamento escolar de frequência de um número mínimo de aulas por disciplina; a
limitação de número de exames a realizar em época de recurso.
Este estatuto cessa, no entanto, se o trabalhador-estudante não tiver aproveitamento
escolar no ano letivo anterior (artigo 89º, nº2). Nesse contexto, considera-se
aproveitamento escolar a transição de ano ou a aprovação ou progressão em, pelo menos,
metade das disciplinas em que o trabalhador-estudante esteja matriculado (artigo 94º, nº4),
sem prejuízo do disposto no nº5 do mesmo artigo.

106
A dispensa tem as limitações a que se refere o nº3 do artigo 90º.

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Direito do Trabalho

Assim, se o trabalhador-estudante não tiver aproveitamento, verá cessar o direito a horário


de trabalho ajustado ou a dispensa de trabalho para frequência de aulas, a marcação do
período de férias de acordo com as suas necessidades escolares, entre outros (artigo 95º,
nº1).
Para este efeito, o trabalhador-estudante deve comprovar o seu aproveitamento perante
o empregador, no final de cada ano letivo (artigo 96º, nº1).

Capítulo IX – Local de Trabalho

Como é de fácil de apreensão, o local de trabalho traduz-se no sítio onde deve ser prestada
a atividade contratada (ou executada). Daí que este se trate de um elemento essencial e
delimitador da prestação de trabalho, podendo, inclusive, ser decisivo na opção do
trabalhador em aceitar ou não a proposta. É, em todo o caso, objeto de acordo entre as
partes, ressalvados os casos em que a contratação resulta da adesão do trabalhador (caso
em que, conforme vimos, não existe a negociação dos elementos do contrato entre as
partes).
O local de trabalho é, então, a “dimensão espacial” da subordinação jurídica, devendo ser
conformado pelo empregador. Do ponto de vista de ambas as partes, trata-se de um
elemento essencial: para o empregador, porque em função deste organiza todo o processo
produtivo, e para o trabalhador, uma vez que este influencia decisivamente a organização
da sua vida pessoal e familiar.
É, ademais, um conceito relativo, uma vez que tanto se lhe pode atribuir a amplitude de um
local preciso, como de um país. Isto irá influenciar, como veremos, na qualificação da
mudança de um local para o outro, sem que, no entanto, isso prefigure uma transferência
do trabalhador (cf. artigo 194º).
A identificação do local de trabalho é determinante para a produção de alguns efeitos:
desde logo, é lá que o trabalhador deve prestar a sua atividade; depois, em princípio, o
trabalhador não pode ser transferido do local de trabalho – artigo 129º, nº1, alínea f) -,
valendo o Princípio da Proibição da Transferência. O intuito do legislador foi preservar a
estabilidade da vida familiar e social do trabalhador; segundo o artigo 277º, nº1 a
retribuição deve ser paga no local de trabalho; os acidentes de trabalho são os que ocorrem
no local e no tempo do trabalho; entre outros.

Neste contexto, vale o Princípio da Inamovibilidade (artigo 129º, nº1, alínea f)), segundo o
qual o empregador está proibido de transferir o trabalhador para local diferente do
contratado. Todavia, este princípio sofre alguns desvios – situações que o referido preceito
salvaguarda; o Código do Trabalho prevê, em algumas disposições, a possibilidade deste
local ser alterado, o que pode suceder, também, por força de uma convenção coletiva. Por
outro lado, a mudança deste local pode ser alvo de acordo (que não precisa de ser escrito)
entre as partes, pelo que também, nesse caso, é legítima.
Se, prima facie, o legislador deu primazia à tutela dos interesses do trabalhador –
nomeadamente, salvaguardando a conciliação entre a sua vida profissional e particular -,

68
Direito do Trabalho

posteriormente veio admitir que o princípio mencionado fosse invertido, consagrando


exceções ou desvios – os que constam, grosso modo, dos artigos 194º e 196º. É que, por
outro lado, a liberdade de iniciativa económica impõe que a lei admita aos empregadores,
por exemplo, a possibilidade de estes transferirem o local de trabalho de um sítio para
outro.
E, assim, neste contexto fala-se de mobilidade ou flexibilidade geográfica.
O primeiro dos casos em que o legislador admite a transferência do local de trabalho do
trabalhador é o da mudança, total ou parcial, do estabelecimento onde aquele preste serviço
– artigo 194º, nº1, alínea a). Trata-se de uma transferência orgânica ou “coletiva”, que não
é mais do que uma consequência da mudança do suporte da prestação de trabalho;
transferido o seu suporte, o estatuto contratual do trabalhador onde se insere, transfere-se
com ele (numa lógica parecida à que se encontra consagrada para a transmissão de
estabelecimento – artigo 285º).
Em todo o caso, o trabalhador pode reagir negativamente à transferência de local de
trabalho, ainda que esta se situe no âmbito dos poderes legítimos do empregador,
mormente a coberto da sua liberdade de iniciativa empresarial. E poderá fazê-lo ao abrigo
do artigo 194º, nº5 CT, invocando prejuízo sério e se esse de facto existir, encontra-se
legitimado a resolver o contrato. Se se aplicasse o regime do artigo 394º, nº3, al. b) CT (vide
artigo 396º) o trabalhador não teria, em caso de cessação do vínculo, o direito a uma
indemnização. Assim, grosso modo, o que vem o nº5 estipular é que, não obstante a
resolução assentar em justa causa objetiva (ou não culposa) terá o trabalhador direito a
uma compensação (que, de outra forma, não teria, afastando-se o dispositivo mencionado).
Pode, porém, acontecer que, ainda que não haja prejuízo sério para o trabalhador, este
queira fazer cessar o vínculo, através de denúncia (artigo 400º) ou, fundando a sua
pretensão em “alteração substancial e duradoura das condições de trabalho no exercício
lícito de poderes do empregador”, por meio da resolução (artigo 394º, nº3, alínea b) CT)107.
Pode suceder que outro motivo da empresa exija a transferência do local de trabalho,
operando a transferência do trabalhador desde que não resulte prejuízo sério para o
trabalhador (alínea b) do mencionado preceito) – transferência individual. Ora, nesta
hipótese, o trabalhador pode opor-se, exercendo o direito à resolução do contrato nos
termos do artigo 194º, nº5, precisando, para tanto, de invocar o prejuízo sério108.
Aqui sucede o inverso, isto é, que o suporte organizativo da prestação de trabalho
permaneça no mesmo local e o trabalhador seja transferido para outro. Esta pode suceder,
em virtude de um pedido do trabalhador ou por iniciativa do empregador.
O artigo 195º, nº1 confere o direito ao trabalhador de ser transferido a seu pedido para
outro estabelecimento da empresa – caso o haja -, se for vítima de violência doméstica e já

107
Defende António Moreira que o trabalhador se encontra dispensado de aviso prévio, sem qualquer
direito a compensação.
108
A averiguação da existência de juízo prévio implica um juízo (concreto) de probabilidade – isto é,
avaliando a situação e condições concretas em que vive o trabalhador, se é provável que da
transferência resulte prejuízos sérios. Este juízo depende da confrontação das implicações que derivam
da alteração unilateral do contrato de trabalho com as condições de vida do trabalhador. E, neste caso,
cabendo a sua alegação ao trabalhador, também este se encontra incumbido de o provar – artigo 342º,
nº1 CC.

69
Direito do Trabalho

tiver sido apresentada a respetiva queixa-crime e se opere à mudança de residência


aquando da sua transferência. O empregador não pode recusar este pedido, mas apenas
adiá-lo, invocando para o efeito exigências imperiosas ligadas ao funcionamento da
empresa ou serviço. Em caso de adiamento, o trabalhador pode requerer a suspensão do
contrato imediatamente, até que ocorra a transferência (nº3 do mesmo artigo).
Em todo o caso, quando seja o empregador que pretenda a transferência, deve informar
o trabalhador, por escrito109, com uma antecedência de oito ou 30 dias de antecedência,
conforme esta seja temporária ou definitiva (artigo 196º, nº1).
Em caso de transferência temporária, à partida, esta não poderá exceder seis meses, sendo
certo que o empregador deverá sempre cobrir o acréscimo de gastos do trabalhador nas
suas deslocações, mudança de residência ou, em caso de transferência temporária, no
alojamento (artigo 194º, nº3 e nº4).
Por fim, resta-nos referir que este regime – maxime o consagrado no nº1 do artigo 194º -
poderá ser alvo de restrições, exclusão ou alargamento mediante acordo das partes.
Todavia, se não for aplicado no prazo de dois anos após a sua celebração, caduca (nº2 do
artigo 194º); e pode também ser afastado através de instrumento de regulamentação
coletiva – neste caso, poder-se-á afastar todo o regime do artigo 194º, sem embargo da
impossibilidade do afastamento do nº7.

Capítulo X – Obrigações

Subcapítulo I – Do trabalhador: A atividade contratada

A prestação do trabalho é a obrigação principal que decorre do contrato para o trabalhador.


Este, conforme resulta do artigo 11º CT, obriga-se a prestar a sua atividade a outra pessoa
– o empregador -, mediante retribuição.
Conforme resulta do artigo 115º CT, a atividade é objeto de negociação entre as partes,
cabendo-lhes definir quais são os serviços e tarefas que integram esta prestação. A
determinação da atividade a prestar pode ser feita através de menção expressa, com a
caracterização pormenorizada das respetivas funções, através de remissão para categoria
de uma convenção coletiva de trabalho ou de regulamento interno da empresa (cf. artigo
99º).
Quando não resulte expressamente do contrato a atividade contratada com o empregador,
é necessário averiguar-se concretamente as práticas desenvolvidas no seio da relação de
trabalho, para que se consiga, por fim, averiguar qual é, então, a atividade contratada pelas
partes.
Como dissemos anteriormente, a relação existente entre empregador e trabalhador
pressupõe a existência de uma subordinação jurídica – em que o primeiro ocupa uma
posição prevalecente face ao segundo, traduzida na sujeição deste ao poder de direção e ao

109
O desrespeito pela forma escrita leva à invalidade da ordem de transferência e, consequentemente,
à dispensa do trabalhador de a cumprir.

70
Direito do Trabalho

poder disciplinar daquele; algo que resulta, de certa forma, do artigo 116º. No entanto, a
subordinação a estes poderes reconhecidos â entidade empregadora, não prejudica a
autonomia técnica do trabalhador (em regra). Parte-se do pressuposto (e bem) de que o
trabalhador saberá melhor do que o empregador, quais são as técnicas a empregar no
exercício da atividade para que foi contratado, não estando adstrito às ordens daquele que
versem sobre a forma como este deve atuar e proceder no seu desempenho.
A categoria consubstancia um âmbito genérico de funções e tarefas que o trabalhador se
propõe exercer. Dentro desta, há de caber, pelo menos, uma função principal, sem prejuízo
de outras que assumam um caráter acessório ou secundário. A atribuição de categoria ao
trabalhador é obrigatória, até porque a partir dela se determinam inúmeros aspetos, tais
como o estatuto salariar, o patamar da sua carreira profissional, entre outros. Em suma, é
essencial para a determinação dos direitos, garantias e expetativas que o trabalhador pode
ter, com base no seu trabalho.
Em geral, o trabalhador deve exercer funções correspondentes à categoria em que se
insere, devendo o empregador atribuir-lhe, dentro do que foi acordado, as funções mais
adequadas às suas aptidões e qualificação profissional (artigo 118º, nº1).
A mudança da categoria do trabalhador para uma categoria inferior é, em regra, proibida –
funcionando o Princípio da Irreversibilidade da Carreira. A carreira profissional do
trabalhador deve progredir com o arrecadar de experiência e à medida que vai
desempenhando a sua atividade. Contudo, excecionalmente, e com fundamento em
necessidade premente do trabalhador ou do empregador, e mediante acordo, o trabalhador
pode ver a sua categoria mudar para uma inferior, sendo certo que se impõe a necessidade
de autorização da inspeção do trabalho, no caso dessa mudança determinar a diminuição
da retribuição (artigo 119º; artigos 129º, nº1, alíneas d) e e)).
Por outro lado, também a promoção do trabalhador para uma categoria superior carece do
seu consentimento. É que, não-raro, a promoção implica o exercício de funções diferentes
das contratadas e das suas responsabilidades na empresa. Daí que o trabalhador possa não
estar na predisposição de a aceitar, ainda que tal possa implicar o aumento da remuneração.
Estamos no domínio da consensualidade, podendo o trabalhador opor-se a tal promoção.
Questão diversa é a das promoções automáticas. Estas não levantam problema de maior
porquanto apenas envolvem o aumento da retribuição, o que, por certo, sendo benéfico
para o trabalhador e não importando a assunção de mais responsabilidades e o exercício de
novas funções, não carece do consentimento deste.
A atividade contratada extravasa, muitas vezes, os limites da categoria que foi (e é)
atribuída ao trabalhador; e nisso não há nada de errado, a categoria não tem um caráter
delimitador, visando somente a atribuição de um determinado estatuto profissional ao
trabalhador. Vale, neste contexto, um princípio da realidade, do qual deriva a prevalência
das funções efetivamente exercidas pelo trabalhador sobre as designadas na categoria.
Não-raras vezes, o trabalhador exerce, no seio empresarial, funções diferentes das que
foram designadas categorialmente, situação que desperta a necessidade do controlo judicial
da classificação profissional dos trabalhadores, dada pelo empregador110.

110
Pode suceder, por exemplo, que um ajudante de cozinha esteja a exercer, de forma efetiva, a função
de cozinheiro. Ora, nesse caso, o trabalhador está, desde logo, a ser prejudicado pelo empregador, uma

71
Direito do Trabalho

Em nenhum caso, quando se trate de uma remissão para categoria constante de convenção
coletiva de trabalho, pode a entidade empregadora exigir que o trabalhador exerça funções
que não tenham correspondência na categoria para que se remeteu.
Note-se que a atribuição de categoria pode ser feita nos termos do regulamento interno de
uma empresa (cf. artigo 99º). E este pode estabelecer regras remuneratórias diversas (mais
favoráveis do que as estabelecidas em convenção coletiva de trabalho) e classificações de
funções distintas das que constam dos instrumentos de regulamentação coletiva. De modo
geral, e não obstante as restrições que se impõe a tal possibilidade, a empresa pode
estabelecer a sua própria disciplina, atendendo aos seus interesses.

Neste enquadramento, tem-se vindo a falar na necessidade da existência da flexibilidade


funcional, no seio das relações laborais.
Dissemos que a categoria, ainda que tenha sempre de ser atribuída ao trabalhador, é
imprescindível para definir o estatuto profissional deste, mas não se lhe é reconhecido um
caráter delimitador das funções que pode desempenhar. Se assim fosse, o empregador ver-
se-ia impedido de exigir ao trabalhador que realizasse outras funções ou tarefas que não se
incluiriam na categoria, ainda que estas assumissem natureza excecional ou esporádica.
Ora, isto levaria a que tivesse de contratar mais trabalhadores para colmatar essas
necessidades que, assumindo caráter esporádico, levariam a que os trabalhadores
contratados permanecessem inativos durante grande parte do dia. Por seu turno, o
trabalhador veria restringida a possibilidade de melhorar o seu estatuto profissional, às
hipóteses em que a antiguidade o imporia ou aos casos em que o empregador tomaria tal
iniciativa.
A flexibilidade funcional traduz-se na possibilidade de o trabalhador exercer funções ou
ocupar-se de tarefas que, à partida, não constam do descritivo da categoria e, por isso, se
situam fora do escopo da atividade contratada. A concretização teórica desta ideia é feita
através de dois instrumentos distintos: um que consta do artigo 118º, nº2 e nº4, e outro do
artigo 120º.
No artigo 118º encontra-se consagrada a polivalência funcional. Trata-se de um
instrumento que deve ser entendido num sentido restrito, uma vez que ao empregador,
ainda que lhe seja admitido exigir do trabalhador atividades acessórias que se situem fora
do escopo do núcleo central da situação do trabalhador, não pode, em todo o caso,
subverter o que foi contratado. Isto quer significar que, desde logo, a atividade do
trabalhador deve ter correspondência, grosso modo, às atividades abrangidas pela
categoria; por outro lado, que aquelas que eventualmente lhe sejam exigidas e não tenham
sido alvo de contratação ocupem, no horário de trabalho, menos tempo do que a atividade
principal.

vez que, sendo cozinheiro uma categoria superior àquela que foi contratada, confere o direito ao
trabalhador a uma remuneração mais alta. Daí que, com vista a tutelar os interesses dos trabalhadores,
a classificação da categoria dos trabalhadores pelo empregador esteja sujeita a controlo externo.
Diga-se, neste sentido, que as convenções coletivas de trabalho tipificam, normalmente, o leque de
funções que se encontram abrangidas por uma determinada categoria.

72
Direito do Trabalho

Ora, o empregador pode exigir do trabalhador atividades que sejam “conexas” ou “afins à
atividade principal (contratada). Com afinidade, quer-se significar que entre a atividade
contratada e a exercida (acessoriamente), exista uma relação de semelhança; isto é, que se
encontrem compreendidas no mesmo grau ou carreira profissional (artigo 118º, nº2 e nº3).
Por outro lado, podem encontrar-se funcionalmente ligadas, se exista uma proximidade
lógico-funcional entre as duas atividades, ou seja, que convivam como segmentos de um
determinado “processo”. Para que tal possa suceder, o trabalhador deve possuir
qualificações para tal e o exercício dessas funções não pode importar uma desvalorização
profissional. Se o exercício de funções acessórias exigir especial qualificação, a entidade
empregadora deverá investir na formação do trabalhador (que, aliás, tem esse direito) cuja
duração não pode ser inferior a 10 horas anuais (artigo 118º, nº4).
Enquanto o exercício destas atividades se mantiver, o trabalhador tem direito à
remuneração que lhes corresponde, que é, por certo, mais elevada, na medida em que tal
não pode envolver (como se disse) uma desvalorização profissional deste. No entanto, não
é concedido o direito à reclassificação (da categoria), a menos que esta seja expressamente
estipulada – cf. artigo 120º, nº5.
Posto isto, resta-nos analisar o regime do artigo 120º - o direito de variação da atividade. O
âmbito deste instrumento de flexibilização é mais lato/largo, uma vez que não se reduz à
prática de atividades acessórias não abrangidas pela categoria ou atividade contratada;
implica, antes, o exercício de tarefas ou funções que se situem fora do objeto do contrato.
Para que este opere, é necessário que se verifiquem determinados requisitos: o interesse
da empresa deve exigi-lo; esta variação da posição do trabalhador deve ser transitória – isto
porque, caso contrário, estaríamos perante uma mudança de categoria; não implicar uma
modificação substancial da posição do trabalhador – isto não contende com o exercício de
atividades de categoria inferior, uma vez que a lei admite essa possibilidade
(excecionalmente)111. Impõe-se que a variação – entre a atividade contratada e a atividade
agora exercida – seja insuscetível de provocar desprestígio do trabalhador ou de afetar a
sua dignidade profissional; o trabalhador deve ser tratado de forma mais favorável
(nomeadamente, em termos remuneratórios); e que tal resulte de uma decisão unilateral
do empregador, com indicação do motivo e da duração da variação.
Verificados estes requisitos, o trabalhador deve obedecer à ordem emanada pelo
empregador, na medida em que se encontra subordinado ao poder de direção deste, sob
pena de responder disciplinarmente pela recusa.
Caso a variação importe o exercício de atividades de categoria inferior, o trabalhador não
pode ver a sua retribuição ser diminuída (artigos 129º, nº1, alínea d) e artigo 120, nº4); no
entanto, em todo o caso, o trabalhador não goza, mais uma vez, de um direito à
reclassificação – isto é, não adquire a categoria correspondente às funções
temporariamente exercidas.

111
Variação in peius.

73
Direito do Trabalho

Subcapítulo II – Do empregador: A retribuição

Iniciando, mais uma vez, com referência à noção disposta no artigo 11º, dela resulta que o
trabalhador presta a sua atividade a outra pessoa, mediante retribuição. Se assim é, está
bom de ver que a retribuição o “outro lado” da prestação da atividade, é, se quisermos, a
sua contraprestação.
A retribuição é, aliás, o principal motivo que fará o trabalhador celebrar um qualquer
contrato de trabalho, na medida em que carece do montante retributivo para fazer face às
suas despesas, para prover ao seu sustento e ao da sua família.
Nos termos do artigo 258º, a retribuição é a prestação a que, nos termos do contrato, das
normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do trabalho
que presta112. Esta, por sua vez, ainda que não seja muito usual, pode ser satisfeita em
espécie (com bens diferentes de dinheiro); não obstante a regra ser a do cumprimento em
dinheiro. Em todo o caso, importa referir que retribuição tem de ser entendido num sentido
amplo, de forma a abranger a própria retribuição base e outras prestações regulares e
periódicas feitas.
Dada a essencialidade de que se reveste esta prestação do empregador, não só para o
trabalhador, mas também porque se trata de um elemento cuja existência é essencial no
panorama de uma relação laboral, existem alguns princípios dignos de nota que importa
referir. Desde logo, o artigo 59º, nº1, alínea a) CRP consagra um Princípio da Igualdade, com
o que isto quer significar que todos os trabalhadores têm direito a uma retribuição e, por
outro lado, que trabalho igual salário igual (o próprio artigo 270º CT tem uma redação
idêntica à deste preceito constitucional).
No artigo 129º, nº1, alínea d) CT encontra-se vertido o Princípio da Irredutibilidade da
Retribuição. Quer este significar a impossibilidade de o empregador determinar
unilateralmente a redução da retribuição, esta que nem por convenção (leia-se, entre as
partes no contrato de trabalho) pode operar. Na verdade, a anuência do trabalhador
afigura-se irrelevante, uma vez que, posteriormente, não obstante ter aceitado a redução
da sua retribuição, poderá reclamar as diferenças salariais que do acordo advierem.
Também aqui funciona o grande princípio civilístico do pacta sunt servanda (artigo 406º,
nº1 do Código Civil), segundo o qual os contratos devem ser pontualmente cumpridos, com
o que isso importa a impossibilidade de serem alterados unilateralmente por uma das
partes.
Não podemos, no entanto, olvidarmo-nos de que todos os princípios são, em determinados
casos (ditos excecionais) derrogados. E também este princípio (qual seja, o da
irredutibilidade da retribuição) é excecionado em determinados casos que, diga-se, o artigo
129º, nº1, d) reconhece (salvo nos casos previstos neste Código). São eles: na passagem da
prestação de trabalho a tempo completo para tempo parcial (artigo 155º, nº1 CT) – nada
impede que as partes acordem na diminuição da retribuição; suspensão de contratos de
trabalho (artigos 294º e seguintes); variação in peius (ou seja, para categoria inferior – artigo

112
Por força do nº3, presume-se constituir retribuição toda a prestação do empregador ao trabalhador.
Contudo, porque se trata de uma presunção relativa (ou iuris tantum) admite prova em contrário nos
termos gerais.

74
Direito do Trabalho

119º), sendo certo que nesta hipótese, caso implique a diminuição da retribuição, esta deve
ser autorizada pela Autoridade para as Condições de Trabalho.
A retribuição é obrigatória e deve ser prestada de forma periódica e regular. Na verdade, o
pagamento de certo valor, de forma repetida, gera no trabalhador a convicção que esse
montante continuará a ser pago, com a mesma regularidade, pelo que este também
adequará os seus níveis de consumo à medida da prestação retributiva que auferirá, cujo
pagamento incumbe ao empregador.
Quando a prestação retributiva se efetive em espécie, esta deve destinar-se à satisfação de
necessidades pessoas do trabalhador ou da sua família (artigo 259º). Nada impede que a
retribuição seja prestada numa parte em dinheiro, e noutra em espécie – é o que sugere o
nº2 do artigo 259º.
Não se consideram retribuição, as prestações elencadas no artigo 260º, sendo estas,
nomeadamente, prémios ou gratificações pelos resultados obtidos. Trata-se de prestações
que visam recompensar os trabalhadores pelo seu bom desempenho e produtividade; mas
também não se considera retribuição, as importâncias recebidas pelo trabalhador, com vista
a cobrir as suas despesas de transporte ou custos de deslocação. Note-se que, se as
gratificações tiverem sido objeto de contratualização, estas consideram-se retribuição (nº3,
alínea a) do referido preceito).
A retribuição pode assumir diferentes modalidades: certa, variável ou mista. É certa se
calculada em função do tempo de trabalho; é variável quando calculada em razão da média
dos montantes das prestações correspondentes aos últimos 12 meses, ou ao tempo de
execução de contrato que tenha durado menos tempo; se for mista, terá uma parte certa e
o parte variável (artigo 261º).
O trabalhador tem direito ao subsídio de Natal, cujo montante será igual a um mês de
retribuição, e que deve ser pago até ao dia 15 de dezembro de cada ano (artigo 263º); tem,
também, direito a retribuição no período de férias, bem como a um subsídio – artigo 264º.
Conforme ficou dito, a retribuição mensal não pode situar-se abaixo de um limite mínimo
legalmente imposto – atualmente, esse limite traduz-se no montante de 635,00 euros
(retribuição mensal mínima garantida, vulgo salário mínimo), e é imposto pelo Decreto-Lei
n.º 167/2019, de 21 de novembro. Excecionalmente, este limite pode ser reduzido,
nomeadamente nos casos previstos no artigo 275º.
Dito isto, finalmente, cumpre-nos dar notícia de como, onde e quando a retribuição se
efetiva.
Forma de cumprimento – indo ao encontro do que já referimos anteriormente, a prestação
retributiva tanto pode ser satisfeita em dinheiro ou em espécie, se tal tiver sido acordado
(cf. artigo 276º). Quando esta seja satisfeita em dinheiro – o que é a regra -, pode ser paga
através de cheque, vale postal ou depósito à ordem do trabalhador (sendo esta última forma
o meio mais usual).
Lugar do cumprimento – alertámos, aquando do estudo do local de trabalho, que a sua
determinação era relevante para vários efeitos. Ora, este é precisamente um deles: a
retribuição deve ser paga no local de trabalho, a menos que outro seja o local acordado.
Certamente que, quando a prestação seja efetivada por depósito à ordem do trabalhador,
não está em causa a aplicação desta regra (mas já estará se for paga através de cheque).

75
Direito do Trabalho

Tempo de cumprimento – a retribuição é paga de forma periódica, vencendo-se de tempo


a tempo. Antes do seu vencimento, ou nesse dia, o montante da retribuição já se deve
encontrar à disposição do trabalhador, sob pena do empregador se constituir em mora
(artigo 278º).
Note-se que o empregador, constituído em mora, não pode compensar a retribuição em
dívida com um crédito que tenha sobre o trabalhador, nem fazer desconto ou dedução no
montante daquela (em regra) – artigo 279º.
Outra garantia do trabalhador é a disposta no artigo 337º CT – os prazos de prescrição dos
créditos do empregador que derivem do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação
só começam a contar a partir o dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
Mas o legislador não se ficou por aqui. O incumprimento culposo do pagamento de
prestações pecuniárias constitui o empregador na obrigação de pagar os juros de mora à
taxa legal (ou se superiores, os resultantes de instrumento de regulamentação coletiva de
trabalho ou do acordo das partes) – artigo 323º, nº2 -, o que consubstancia a possibilidade
de o trabalhador requerer judicialmente o cumprimento dessa obrigação. Ademais, a falta
de pagamento pontual da retribuição confere-lhe a faculdade de suspender ou fazer cessar
o contrato.
Quanto à suspensão, esta seria sempre admitida pelo artigo 294º, nº3 (pode ter querido o
legislador reforçá-lo), devendo para que tal possa suceder verificarem-se os requisitos a que
se refere o artigo 325º, ou seja, a falta de pagamento pontual da retribuição por período de
15 dias sobre a data do vencimento mediante comunicação por escrito ao empregador e ao
serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral, com a
antecedência mínima de oito dias em relação à data de início da suspensão. A suspensão
pode ainda ser antecipada nos termos dos números seguintes do referido artigo.
Durante o período da suspensão, a lei admite que o trabalhador possa exercer outra
atividade remunerada, suspendendo-se, como é sabido, todos os direitos, deveres e
garantias que não pressuponham a efetiva prestação de trabalho (artigo 295º). Donde,
outros deveres se mantêm como, por exemplo, o dever de lealdade ao empregador
originário (cf. artigo 129º, nº1, alínea f) CT) – artigo 326º.
Finalmente, o artigo 327º vem determinar o momento em que cessa a suspensão do
contrato de trabalho, podendo esta operar de três formas sejam elas: a comunicação do
trabalhador ao empregador, informando que põe termo à suspensão a partir de
determinada data; o pagamento integral das retribuições em divida e juros de mora; o
acordo entre trabalhador e empregador para regularização das retribuições em dívida e
juros de mora.
Pode, como dissemos, o trabalhador optar por resolver o contrato. Admite-o o artigo 323º,
nº3, podendo fazê-lo fundando a sua pretensão em justa causa culposa, se a falta de
pagamento pode ser imputada ao empregador, ou em justa causa não culposa ao abrigo da
alínea c), nº3 do artigo 394º. No primeiro caso, terá direito a uma indemnização a calcular
nos termos do artigo 396º, ao passo que na segunda hipótese não terá direito a qualquer
compensação.

76
Direito do Trabalho

Em caso de falta de pagamento pontual da retribuição, não pode o empregador praticar os


atos previstos no artigo 313º (para o qual remete o artigo 324º, nº1), sob pena da prática
de um crime punível com pena de prisão até três anos.

Capítulo XI – Tempo de Trabalho

O tempo de trabalho é um elemento que deve constar obrigatoriamente do contrato de


trabalho. Ainda que celebrado oralmente (fora dos casos em que a lei exige forma), este
deve ser verbalmente acordado entre as partes. É, aliás, uma exigência constitucional – cf.
artigo 59, nº1, alínea d) -, visando a proteção dos direitos dos trabalhadores e vedando ao
empregador a possibilidade de abusar da disponibilidade do trabalhador para prestar o seu
trabalho.
Assim sendo, é necessário que se estipule o tempo durante o qual o trabalhador irá prestar
atividade ao trabalhador, que poderá ser maior ou menor consoante os interesses das
partes. Não obstante, a lei estabelece limites à liberdade de estipulação deste período, os
quais analisaremos em sede devida. Esta preocupação visa evitar os abusos do passado,
onde se verificaram verdadeiros atentados à dignidade da pessoa humana que, de sol a sol,
trabalhavam incessantemente em benefício do empregador, a troco das míseras condições
que o empregador estava disposto a oferecer.
Nesta conjetura, e ainda que essa realidade pelo menos no contexto dos países mais
desenvolvidos e no dos países em desenvolvimento que não pertençam ao terceiro mundo
já se encontre, grosso modo, afastada, trabalhadores e seus representantes continuam a
lutar por melhores condições de trabalho, de entre as quais se destaca o esforço pela
redução do tempo de trabalho; ponto que, entre nós, já se encontra mais ou menos
estabilizado (desde o 1º de maio).
Aliás, esta preocupação – o estabelecimento de limites ao tempo de trabalho – tem ganho,
nas últimas décadas, uma vocação internacional, pelo que hoje está estipulado em vários
textos internacionais de caráter vinculativo, limites máximos ao tempo de trabalho.
O Código de Trabalho vem definir tempo de trabalho como qualquer período durante o
qual o trabalhador exerce a atividade ou permanece adstrito à realização da prestação, bem
como as interrupções e os intervalos legalmente previstos (artigo 197º, nº1). Estabelece-se,
então, que existem cinco intervalos que se encontram compreendidos no tempo de trabalho
– os que se encontram dispostos no nº2 do mesmo artigo, dos quais daremos conta
sumariamente: a interrupção de trabalho como tal considerada por convenção coletiva de
trabalho, em regulamento interno da empresa ou resultante do uso da empresa; a
interrupção ocasional do período de trabalho diário inerente à satisfação de necessidades
pessoais inadiáveis do trabalho ou resultante do consentimento do empregador; a
interrupção de trabalho por motivos técnicos; o intervalo para refeição em que o
trabalhador tenha de permanecer no espaço habitual de trabalho ou próximo dele, para
poder ser chamado a prestar trabalho normal em caso de necessidade; a interrupção ou
pausa no período de trabalho imposto por normas de segurança e saúde no trabalho.
Parece que o legislador compreendeu no tempo de trabalho duas realidade distintas: uma
correspondente à efetiva prestação de trabalho por parte do trabalhador; outra, tendo em

77
Direito do Trabalho

conta o estado de prontidão e disposição do trabalhador para prestar a sua atividade,


quando isso lhe for ordenado pelo empregador; solução que se percebe dado o estado de
limitação pessoal em que o trabalhador se encontra por estar à disposição da entidade
empregadora.
Ao tempo de trabalho que o trabalhador se obriga a prestar, medido em número de horas
por dia e por semana, denomina-se de período normal de trabalho (artigo 199º). Este
regime pode ser fixo – igual a cada dia em todas as semanas -, ou variável – variando de
semana para semana, sendo mais comprido numas e mais curto noutras (cf. artigos 204º a
206º). Este período não pode, no entanto, exceder oito horas por dia e 40 horas por semana
(artigo 203º, nº1); por outro lado, não pode ser aumentado por decisão unilateral do
empregador, ainda que possa, pelo contrário, por sua iniciativa, ser diminuído, o que
contenderá com o regime da redução da atividade, pré-reforma e da passagem da prestação
de trabalho em tempo completo para part-time.
O período de funcionamento é o período durante o qual o estabelecimento pode exercer
a sua atividade (artigo 201º).
O horário de trabalho é a determinação das horas de início e termo do período normal de
trabalho diário e do intervalo de descanso, bem como do descanso semanal de cada
trabalhador (trata-se de uma determinação individual). A elaboração do contrato de
trabalho compete ao empregador que, nessa tarefa, deve atender às exigências de proteção
da segurança e saúde do trabalho, permitir-lhe a conciliação da atividade profissional com
a vida familiar e facilitar-lhe a frequência de curso escolar, bem como de formação técnica
ou profissional; sem prejuízo de este poder ser objeto de acordo em sede de contrato
individual de trabalho ou de negociação coletiva (artigo 212º).
Neste contexto, importa distinguir três realidades distintas: o horário flexível – o período
normal de trabalho encontra-se estabelecido, mas o trabalhador pode, com respeito por
aquele, escolher dentro de certas margens, a hora de entrada e a hora de saída; horário
adaptável – o empregador tem a faculdade de adaptar os horários de semana para semana,
de mês para mês, de modo a respeitar um número médio de horas semanais (pode ser maior
numa semana e menor noutra); isenção do horário de trabalho – em determinadas
situações, o legislador admitiu a possibilidade de o empregador contar com a
disponibilidade do trabalhador sem estar adstrito a um horário de trabalho.
Regra geral, o empregador poderá, de forma unilateral, determinar a alteração do horário
de trabalho, desde que consulte as entidades a que se refere o nº2 do artigo 217º e,
outrossim, avise o trabalhador da alteração com antecedência de sete dias, ou de três em
caso de microempresa (artigo 217º, nº2). Se o horário tiver sido acordado em sede de
contrato de trabalho, este não poderá ser alterado por declaração unilateral do empregador
(artigo 217º, nº4).
Em suma, e nas palavras de Monteiro Fernandes, o horário traduz-se na configuração de
trabalho no tempo que, por sua vez, traduz o modo pelo qual o período normal de trabalho
se enquadra no período de funcionamento113.

113
In ob. cit., p. 500.

78
Direito do Trabalho

Na fixação do tempo de trabalho, existe uma determinada margem concedida às partes


(nomeadamente, ao empregador) para estipular o seu preenchimento, pelo que, neste
contexto, se fala da adaptabilidade. O tempo de trabalho pode, assim sendo, exceder os
limites legais impostos ou, outras vezes, situar-se aquém, devendo o empregador ter como
ponto de referência a média desses períodos que, em todo o caso, não devem extravasar
aqueles limites (artigos 204º a 206º).
O Código de Trabalho consagra vários regimes que traduzem uma ideia de flexibilidade
temporal: é o caso do banco de horas – as partes podem acordar no acréscimo do período
normal de trabalho, cujos limites são impostos por lei. Isto permite que o empregador
consiga fazer face às necessidades que existem em alguns períodos, uma vez que pode exigir
que o período normal de trabalho dos trabalhadores se estenda por mais uma hora,
excedendo o limite legal do artigo 203º. Todavia, as horas que excederem esse limite serão
compensadas mediante mais tempo livre, férias ou retribuição (cf. artigos 208º e seguintes);
horário concentrado – trata-se de um regime em que se permite a acumulação do período
normal de trabalho em menos do que os cinco dias úteis, sendo mais que dois os dias de
descanso obrigatório (artigos 209º e seguintes); isenção do horário de trabalho – já nos
referimos a este regime anteriormente, traduzindo-se, também ele, num instrumento de
flexibilidade temporal (artigos 218º-219º). Ora, a lei prevê que, através de acordo escrito,
os titulares de certas funções ou cargos possam não estar adstritos a um horário de
trabalho, sendo certo que quem beneficiará com isso é o empregador porque, por um lado,
não precisa de elaborar o horário do trabalhador e, por outro, tem-no à sua disposição
independentemente de um esquema temporal pré-determinado114. O trabalhador que
preste a sua atividade neste regime terá direito a uma retribuição especial, nos termos do
artigo 265º.

Dito isto, e já fora do campo da flexibilidade, cumpre-nos fazer referência ao regime do


trabalho suplementar – considera-se prestado nestes termos, o trabalho prestado fora do
horário de trabalho (artigos 226º e seguintes). Este só pode ser prestado para fazer face a
acréscimo eventual e transitório de trabalho e não se justifique a admissão de trabalhador;
ou quando, em caso de força maior, seja indispensável para prevenir ou reparar prejuízo
grave para a empresa ou para a sua viabilidade. Nestes casos, quando seja determinada pelo
empregador, a prestação de trabalho suplementar é obrigatória – desde que se respeitem
os limites do artigo 228º -, sem embargo dos casos em que a lei admite não existir esta
obrigatoriedade.
A prestação de trabalho neste regime deve ser objeto de registo, com menção das horas
suplementares prestadas. E concede, por outro lado, o direito a uma remuneração acrescida
nos termos do artigo 268º.
Finalmente, no concernente ao trabalho noturno importa fazer algumas considerações:
considera-se trabalhador noturno o que presta, pelo menos, três horas de trabalho noturno
em cada dia ou que efetua durante o período noturno parte do seu tempo de trabalho anual
correspondente a três horas por dia; por sua vez, considera-se trabalho noturno o prestado

114
In ob. cit., p. 523.

79
Direito do Trabalho

num período que tenha a duração mínima de sete horas e máxima de onze, compreendendo
o intervalo entre as 00h e as 5h (artigos 223º e seguintes).
O trabalhador noturno terá direito a uma remuneração acrescida calculada nos termos do
artigo 266º.

Subcapítulo I – Direito à Desconexão

Constitucionalmente consagrados estão os direitos do trabalhador ao lazer e ao repouso,


com assento específico no artigo 59º, nº1, alínea d). Ainda que, à primeira vista, possam
parecer realidades semelhantes e, nessa medida, que o legislador constitucional teria caído
em tautologia, na verdade são realidades com escopo e abrangência diversas. Por um lado,
consagra-se a ideia de que o trabalhador tem direito a descansar, a repor as suas energias
(repouso); por outro, subjaz a ideia de que o trabalhador, no tempo livre deve poder ocupá-
lo da forma que bem entender, isto é, como lhe aprouver (lazer).
Como consequência do crescente e contínuo fluxo de inovações tecnológicas que têm
caracterizado os nossos tempos, as relações de trabalho têm sofrido inúmeras mutações,
sendo objeto de constantes adaptações. Na verdade, a possibilidade que empregador e
trabalhador têm de entrar em contacto através de um toque (qual seja o meio, e-mail, SMS,
entre outros) leva a que não raro se ponha em causa e se faça perigar o gozo efetivo do lazer
e do repouso que, em todo o caso, se situam para lá do período em que o trabalhador deve
encontrar-se ao serviço do empregador.
Neste contexto, surge o direito à desconexão. Para que, efetivamente, no contexto atual,
sejam respeitadas as máximas de lazer e repouso – sendo esse o filão axiológico do direito
agora tratado -, admite-se que o trabalhador, nos seus tempos livres, não atenda a qualquer
contacto profissional ou a qualquer imposição que lhe seja feita por parte do empregador.
E, assim, visa-se conceder ao trabalhador o máximo gozo desses períodos, afastando
eventuais preocupações profissionais que poderiam advir (e que adviriam, por certo) se se
impusesse ao trabalhador um estado de disponibilidade permanente – isto é, o dever de
responder aos sucessivos contactos de cariz profissional do empregador.
Este direito à desconexão encontra-se, de certa forma, tutelado pelos limites impostos pela
lei, no concernente ao período normal de trabalho (artigo 203º, nº1 CT), ao direito de
descanso semanal (artigo 232º CT).

Capítulo XII – As descontinuidades da Prestação de Trabalho

Como sabemos, a prestação de trabalho não se protela no tempo de forma contínua, uma
vez que existem direitos (constitucionalmente reconhecidos) que impõe a descontinuidade
dessa prestação, em virtude do direito a intervalo de descanso, a férias, a descanso semanal
obrigatório, entre outros.
E, assim, nem o empregador pode exigir a prestação contínua de trabalho ao trabalhador,
nem este pode prestá-la, ainda que seja essa a sua vontade. Isto porque a lei lhe confere

80
Direito do Trabalho

direitos que, muitas vezes, são irrenunciáveis e que visam tutelar direitos de natureza
superior, como é o direito à integridade física (que, decerto, se poria em causa se o
trabalhador trabalhasse oito horas por dia sem intervalo para descansar ou sete dias por
semana, sem um único dia de descanso semanal).
Neste enquadramento, surge-nos, desde logo, o intervalo de descanso (artigo 213º CT).
Trata-se de um direito subjetivo do trabalhador que lhe confere a possibilidade de exigir um
intervalo para descansar, diariamente, de duração não inferior a uma hora nem superior a
duas, de modo a que a sua jornada laboral diária não seja prestada in toto de forma
consecutiva. Excecionalmente, este intervalo poderá ser alvo de redução ou exclusão, desde
que se verifiquem os pressupostos do nº3 do referido preceito e, outrossim, tal se mostre
favorável ao interesse do trabalhador ou se justifique pelas condições particulares de
trabalho de certas atividades.
Tem o trabalhador direito a um descanso diário, isto é, a um período de descanso de onze
horas entre jornadas laborais diárias consecutivas (artigo 214º), sem prejuízo dos casos em
que tal não se aplica (nomeadamente, os dispostos no nº2).
Do artigo 232º resulta, por sua vez, o direito do trabalhador a, pelo menos, um dia de
descanso por semana – o descanso semanal. Em regra, este dia será o domingo, sendo certo
que se os trabalhadores prestarem atividade numa das situações previstas pelo nº2, este
dia poderá ser distinto. Neste contexto, o artigo 233º vem estabelecer a regra da cumulação
do descanso semanal e do descanso diário – ou seja, devem ser gozados de forma contínua.
Existem, depois, feriados que são obrigatórios – os dispostos no artigo 234º -, e outros que,
por seu turno, são facultativos (artigo 235º). Com o que isto importa o facto de, quando
obrigatórios, as atividades que não são admitidas aos domingos serem obrigadas a encerrar
ou a suspender a laboração (artigo 236º, nº1).

Subcapítulo I – Férias

As férias são um direito concebido ao trabalhador e que se traduz em interrupções da


prestação de trabalho, por vários dias (em princípio, consecutivos), com o objetivo de lhe
proporcionar um repouso anual, sem perda da retribuição115.
Trata-se de um direito inerentemente ligado ao estatuto de trabalhador subordinado, que
deriva da celebração do contrato de trabalho. No entanto, este estatuto não lhe confere a
possibilidade de estas serem gozadas de imediato, estando dependentes de vencimento;
este ocorre no dia 1 de janeiro de cada ano civil (artigo 237º, nº1).
As férias reportam-se, em princípio, ao trabalho prestado no ano civil anterior (donde, as
férias que um trabalhador goza em 2020 reportam-se ao trabalho que prestou em 2019),
não podendo o trabalhador renunciar a este direito – nº2 e nº3 do artigo 237º.
Excecionalmente, e nos termos do nº5, o trabalhador poderá renunciar ao gozo de férias
que excedam os 20 dias úteis (se tiver 22 dias úteis de férias, poderá renunciar de dois
deles), desde que isso não determine a redução da retribuição e do subsídio relativos ao
período de férias vencido, que cumulam com a prestação do trabalho prestado nesses dias.

115
In ob. cit., 552.

81
Direito do Trabalho

Em regra, o período anual de férias corresponde, no mínimo, a 22 dias úteis (segunda a


sexta-feira, com exceção dos feriados) – artigo 238º.
O trabalhador, no ano de admissão, tem direito a dois dias úteis de férias pagas a cada mês
de duração do contrato, num máximo de 20 dias, cujo gozo pode ter lugar após seis meses
completos de execução do contrato (artigo 239º, nº1)116. Concretizando: se o trabalhador
A, no ano de admissão, tiver celebrado um contrato cuja vigência se iniciou em junho de
2020, em 2021 terá direito a 12 dias de férias – até dezembro, dois dias por mês; se, pelo
contrário, tiver celebrado o contrato em janeiro, terá direito ao limite máximo de 20 dias de
férias.
Se o trabalhador tiver vinculado a um contrato de trabalho cuja duração seja inferior a seis
meses, terá direito a dois dias úteis de férias por cada mês completo de duração do contrato
(artigo 239º, nº4).
As férias são obrigatoriamente gozadas no ano civil em que se vencem (em regra), sem
embargo do disposto nos números subsequentes do artigo 240º. Estas devem ser marcadas
mediante acordo entre trabalhador e empregador, sendo que, na falta de acordo, o
empregador poderá marcá-las com respeito pelo disposto no artigo 241º. Pode, também, o
empregador se isso lhe aprouver, e se tal for compatível com a natureza da atividade,
encerrar a empresa ou o estabelecimento (artigo 242º).
As férias podem ser alteradas por facto relativo à empresa ou ao trabalhador, nos termos
dos artigos 244º e 245º CT, respetivamente. Se o facto derivar da empresa, então o
trabalhador terá um direito à indemnização pelos prejuízos sofridos por ter deixado de
gozas as férias no período marcado; se for relativo ao trabalhador que, em virtude de
doença ou outro motivo esteja impedido de gozar as férias, estas suspendem-se ou, sendo
caso disso, não se iniciam enquanto o trabalhador não tiver apto a gozá-las.
Neste contexto, a cessação do contrato de trabalho tem particular relevo. Se tal suceder, o
trabalhador tem direito a receber a retribuição de férias e respetivo subsídio
correspondentes a férias vencidas e não gozadas e proporcionais ao tempo de serviço
prestado no ano de cessação (artigo 254º, nº1).
O empregador não pode obstar ao gozo de férias, sob pena de ter de indemnizar o
trabalhador no valor do triplo da retribuição correspondente ao período em falta (artigo
246ºº, nº1).
O trabalhador não pode exercer outra atividade remunerada durante as férias, salvo
quando já a exerça cumulativamente ou o empregador o autorize (artigo 247º, nº1). O
desrespeito por tal proibição, poderá levar ao exercício do poder disciplinar e o dever de o
trabalhador restituir ao empregador o valor correspondente à retribuição de férias e o
respetivo subsídio.

116
Período de garantia. Exemplo: o trabalhador admitido a 1 de outubro de 2019, só vê o seu direito a
férias vencer no dia 1 de abril de 2020. Os 6 dias úteis de férias a que terá direito (dois por mês até
dezembro), têm, no entanto, de ser gozados até dia 30 de junho (artigo 239º, nº2). O direito do
trabalhador a férias correspondentes ao ano de 2020 vencem-se no dia 1 de janeiro, donde resultará a
acumulação de 28 dias de férias (22 dias úteis (2016) e 6 dias úteis (2015)). Este montante é aceite pelo
nº3.

82
Direito do Trabalho

Subcapítulo II – Faltas

Dado o pendor objetivo destes regimes, achamos que ao aluno interessará essencialmente
perceber qual a sua dinâmica, sem entrar em grandes devaneios doutrinais, pelo que
incidiremos, essencialmente, no conteúdo normativo destes.
Faltas é um conceito que utilizamos frequentemente no nosso dia-a-dia, ao qual
associamos a ideia de ausência de alguém do sítio onde deveria estar num determinado
momento. E, sabemos também, que as faltas podem estar justificadas ou injustificadas,
consoante haja ou não um motivo plausível, do qual se tenha dado conhecimento à entidade
a quem interessa conhecê-lo.
No domínio jurídico-laboral, falta considera-se a ausência do trabalhador do local em que
devia desempenhar a atividade durante o período normal de trabalho diário (artigo 248º,
nº1). E, também aqui, a falta pode ser justificada ou injustificada.
Neste sentido, a lei veio estabelecer quais as faltas que se consideram justificadas – artigo
249º, nº2: as dadas, 15 dias seguidos, por altura do casamento (licença de casamento); a
motivada por falecimento de cônjuge, parente ou afim, nos termos do artigo 251º; a
motivada pela prestação de prova em estabelecimento de ensino, nos termos do artigo 91º;
a motivada por impossibilidade de prestar trabalho devido a facto não imputável ao
trabalhador, mediante declaração que a ateste; a motivada pela prestação de assistência
inadiável e imprescindível a filho, a neto ou a membro do agregado familiar de trabalhador;
entre outras (remetemos para redação legal).
No entanto, não é necessário que o motivo justificativo da falta seja um dos elencados no
preceito referido; é ainda fundamental que o trabalhador faça prova deste e a comunique.
Sendo a falta previsível, o trabalhador deve comunicá-la ao empregador, fazendo constar
da comunicação o motivo justificativo, com a antecedência de cinco dias. Se, no entanto, a
ausência não for previsível e, por isso, não se poder respeitar a antecedência referida, o
trabalhador deve comunicá-la à entidade empregadora, assim que seja possível (artigo
253º, nº1 e nº2). Não havendo comunicação, a falta considera-se injustificada (nº5 do
mesmo artigo).
Por outro lado, o empregador pode exigir ao trabalhador que faça prova do facto invocado
para a justificação, em prazo razoável, desde que o requeira nos 15 dias seguintes à
comunicação da ausência (artigo 254º, nº1). A prova de declaração de doença é feita através
de declaração de estabelecimento hospitalar, ou centro de saúde ou atestado médico. Mais
uma vez, o desrespeito por esta imposição, determina que a ausência seja considerada
injustificada (nº5).
As faltas justificadas não afetam quaisquer direitos do trabalhador, e mesmo quando
determine a perda da retribuição correspondente ao período da ausência, a lei só o admite
quando o salário seja substituído por um sucedâneo (artigo 255º).
Mas são já atribuídos efeitos diferentes à falta injustificada (artigo 256º), solução que
facilmente se compreende, na medida em que o trabalhador não tinha um motivo
justificativo para faltar ou, tendo-o, não o comunicou ou não fez prova deste. Tendo isto em
consideração, a lei determina que as faltas injustificadas constituem uma violação do dever
de assiduidade e determinam a perda da retribuição do período de ausência (não sendo o

83
Direito do Trabalho

salário substituído por um sucedâneo) que, por conseguinte, não é contado para a
antiguidade do trabalhador.
Em caso de atraso injustificado, o empregador pode não aceitar a prestação de trabalho
durante todo o período normal de trabalho, se este for superior a 60 minutos; se o atraso
for superior a 30 minutos, o empregador pode não aceitar a prestação de trabalho durante
essa parte do período normal de trabalho. Donde, a contrario, se o atraso, ainda que
injustificado, for inferior ou igual a 30 minutos, o empregador tem de aceitar a prestação de
trabalho (artigo 256º, nº4).
Em caso de falta injustificada, o trabalhador pode optar por substituir a perda de retribuição
pela renúncia a dias de férias em igual número, mediante declaração expressa comunicada
ao empregador, ou por prestação de trabalho em acréscimo ao período normal (artigo
257º).
Nas situações mais graves, as faltas não justificadas poderão levar ao acionamento do poder
disciplinar, podendo, inclusive, determinar o despedimento com justa causa por facto
imputável ao trabalhador – cf. artigo 351º, nº2, alínea g).

Capítulo XIII – Poderes do Empregador

Da celebração do contrato de trabalho, resulta que o trabalhador fica obrigado a prestar a


sua atividade a favor de outra pessoa, mediante retribuição, sob a sua direção e autoridade.
Assim sendo, o empregador, enquanto titular dos meios de produção e de toda a
organização onde o trabalhador irá prestar a sua atividade, exerce alguns poderes sobre
estes que, desse modo, se lhe encontram subordinados. É que, conforme referimos
anteriormente, as relações de trabalho envolvem uma subordinação jurídica que, de certa
forma, se reflete no facto de o empregador ser titular de poderes que exerce (ou pode
exercer) sobre os seus trabalhadores.
E que poderes são esses? Na verdade, o empregador é titular de um poder legislativo, de
um poder executivo e de um poder judicial – fazendo-se, em certa medida, e com as
necessárias adaptações, um paralelo com os poderes atribuídos ao Estado pela Constituição.
No seio laboral, o poder legislativo corresponde ao poder regulamentar; o poder executivo,
ao poder de direção (ou diretivo); e o poder judicial, ao poder disciplinar.
Dito isto, fica a promessa de que agora os analisaremos de forma particularmente
detalhada.

Subcapítulo I – Poder Regulamentar

Este poder, grosso modo, prende-se com a possibilidade de o empregador emanar regras,
independentemente de quais sejam os meios que utilize, de forma a regular e a estipular a
disciplina segundo a qual a empresa, nomeadamente na pessoa dos trabalhadores, se há de
guiar e reger.
No entanto, ainda que as regras sejam, naturalmente, gerais e abstratas, abrangendo, em
princípio, todos os trabalhadores, para que possam produzir os seus efeitos, é necessário
que sejam levadas ao conhecimento dos trabalhadores, porque têm uma natureza recetícia.

84
Direito do Trabalho

O exemplo paradigmático deste poder traduz-se na possibilidade de o empregador


estipular a “organização e disciplina do trabalho” através de um regulamento interno
(artigo 99º, nº1), por meio do qual, de um modo geral, se terão de guiar os trabalhadores.
Isto não prejudica que este poder possa ser exercido através de outros meios que, inclusive,
regulam matérias mais restritas, como as “ordens de serviço”, as “comunicações” ou as
“instruções”. Em todo o caso, estes só ficam aptos a produzir os seus efeitos aquando da
aplicação.
No processo de elaboração de um regulamento interno, ainda que este seja elaborado pelo
empregador, é necessário que se obedeça a determinados atos impostos por lei. Ora, nesse
sentido, o artigo 99º, nº2 vem estipular que deve ser ouvida a comissão de trabalhadores.
Na verdade, a disciplina que consta de um regulamento interno influencia as condições de
trabalho dos trabalhadores, fazendo sentido que seja necessária a consulta das entidades
que melhor os representam para que, dessa forma, consigam fazer valer os seus interesses.
Como dissemos, existem atos que são emanados ao abrigo do poder regulamentar, mas
que são dirigidos a alguns setores da empresa e que não contendem, necessariamente, com
a posição dos trabalhadores – nomeadamente, com as suas condições de trabalho. Donde,
e a menos que se trate de matérias abrangidas pelo artigo 425º CT, não se impõe que a
comissão de trabalhadores seja ouvida.
Quando o regulamento interno funcione como proposta individual de trabalho, a sua
alteração contende, claro está, com o contrato dos trabalhadores. Nesse caso, se os
trabalhadores nada disserem nos 21 dias após a publicitação do regulamento (através da
fixação na sede da empresa e nos locais de trabalho), presume-se que os trabalhadores
aceitaram a modificação unilateral do contrato (cf. artigo 104º).

Subcapítulo II – Poder de Direção

O empregador, num primeiro momento, encontra-se adstrito ao dever de atribuir ao


trabalhador uma categoria profissional (qual seja o meio que adote para o efeito) e, dessa
forma, estabelecer o conjunto de tarefas e funções que este deve exercer. Trata-se de uma
condição necessária para que o trabalhador possa prestar as atividades a que se
comprometeu (artigo 129º, nº1, alínea b) CT). Por outro lado, e no âmbito deste poder, pode
ainda exigir-lhe que preste uma atividade diferente da contratada, que se situe fora do
escopo da categoria atribuída, desde que se encontre funcionalmente ligada à atividade
principal ou que estabeleça, com ela, uma relação de afinidade.
Num segundo momento, a intensidade deste poder variará, conforme o trabalhador esteja
subordinado tecnicamente ao empregador, ou não o esteja; sendo certo que, regra geral,
os trabalhadores gozam de autonomia técnica. Ainda assim, qualquer que seja o caso, ao
longo da execução do contrato, o trabalhador está adstrito a um dever de obediência e, por
isso, obrigado a “cumprir as ordens e instruções do empregador respeitantes a execução ou
disciplina do trabalho, bem com a segurança e saúde no trabalho, que não sejam contrárias
aos direitos, liberdades e garantias”, ao abrigo do artigo 128º, nº1, alínea e). A este dever
do trabalhador, como se percebe, contrapõe-se o poder de direção do empregador que,

85
Direito do Trabalho

nesta altura, consiste na definição dos termos em que o trabalho deve ser prestado (artigo
97º).
Mas, como dissemos, este poder tem uma intensidade variável. Se o trabalhador se
encontrar numa situação de subordinação técnica, ver-se-á obrigado a acatar as ordens ou
instruções do empregador sobre a forma como a sua atividade deve ser prestada, isto é, as
técnicas e condutas que devem ser empregues no exercício de determinada função ou
tarefa.
Se, todavia, o trabalhador gozar de autonomia técnica, então o poder consagrado no artigo
97º deve ser entendido num sentido mais restrito, até porque, desde logo, ficam excluídas
ordens ou instruções cujo conteúdo verse sobre técnicas a empregar. Neste caso, o poder
do empregador limita-se à definição do tempo e do local do trabalho – traduzido,
nomeadamente, na elaboração do horário de trabalho (artigo 212º, nº1).
As refrações deste poder podem, ainda, ver-se na possibilidade de alterar temporariamente
a atividade contratada (artigo 120º CT); na faculdade de “impor” a prestação de trabalho
suplementar (artigo 227º CT); no poder de alterar o horário de trabalho (artigo 217º CT) –
só não poderá ser modificado pelo empregador, o horário individualmente acordado (nº4);
transferir o trabalhador para outro local de trabalho, à luz do artigo 194º CT (nesta época
de emergência, tem sido utilizado com alguma abundância).

Subcapítulo III – Poder Disciplinar

Por último, mas não menos importante, cumpre-nos analisar o poder judicial do
empregador, o poder de controlo que este exerce sobre os seus trabalhadores e que, em
situações extremas, poderá levar ao despedimento.
Dispõe o artigo 98º que o empregador tem poder disciplinar sobre o trabalhador ao seu
serviço, enquanto vigorar o contrato de trabalho.
A lei reconhece o poder do empregador atuar sobre um trabalhador, quando este adote
uma conduta contrária à que deveria adotar e, nessa medida, inadequada à efetivação do
contrato – as infrações disciplinares.
Assim, e perante um comportamento abusivo e/ou censurável do trabalhador, o
empregador pode, por via punitiva, reagir com o intuito de intimar o autor do
comportamento inadequado a proceder em conformidade com as regras da disciplina da
empresa.
Saber o que é uma infração disciplinar é algo que não se pode determinar abstratamente.
Poderíamos dar casos de condutas que, por certo, não teríamos dúvidas em afirmar que se
traduzem em infrações disciplinares, mas esta tarefa não é sempre assim tão evidente e
clara, pelo que, não-raras vezes, é necessário fazer-se uma ponderação concreta, avaliando
o comportamento do trabalhador e a sua conformidade com a disciplina que vigora no seio
de uma empresa. Daí que a lei não estabeleça qualquer elenco de infrações disciplinares,
pois entende que só em concreto, e atendendo às vicissitudes de cada situação, é que se
pode averiguar a inconformidade de um comportamento.
Naturalmente que tudo o que for objeto de contratação entre as partes, encontra-se dentro
do domínio do poder disciplinar do empregador. Se o trabalhador assume uma dada

86
Direito do Trabalho

responsabilidade, tê-la-á de cumprir, até porque, além do mais, os compromissos são para
se honrar e, em concreto, os contratos são para ser pontualmente cumpridos (pacta sunt
servanda). No entanto, outras condutas extralaborais poderão ser alvo do poder disciplinar,
nomeadamente se violarem o dever de lealdade a que os trabalhadores se encontrem
adstritos. Tal sucederá quando um trabalhador, fora do exercício da atividade laboral que
presta à entidade patronal, toma atitudes capaz de aniquilar o interesse do seu empregador;
neste sentido, imagine-se uma loja que se dedica à comercialização de produtos naturais,
em que o trabalhador, no seu tempo livre, contacta com os clientes a dizer para não
comprarem mais certos produtos porque diz não terem qualquer efeito. Neste caso, o
trabalhador, provocando o descrédito da sua entidade patronal, está a violar o dever de
lealdade (artigo 128º, nº1, alínea f)), pelo que poderá ser alvo de uma ação disciplinar.
Ademais, o trabalhador, mesmo fora do exercício da sua atividade, encontra-se adstrita ao
dever de tratar o seu empregador (ou superior hierárquico) com urbanidade e respeito, pelo
que qualquer conduta que viole tal imposição, poderá ser alvo de um procedimento
disciplinar (artigo 128º, nº1, alínea a)).
As sanções disciplinares encontram-se previstas no artigo 328º do Código do Trabalho, o
que não prejudica a possibilidade de outras serem criadas ou constarem de instrumento de
regulamentação coletiva de trabalho, desde que não prejudiquem os direitos e garantias do
trabalhador (cf. artigo 129º CT).
Das que se encontram previstas da lei, daremos agora conta: a repreensão – pressupõe um
ato revestido de certa solenidade, praticado perante outros trabalhadores, de forma oral
(não é escrita); a repreensão escrita – como facilmente se depreende, esta sanção é, ao
contrário da precedente, alvo de registo; a sanção pecuniária – esta é efetivada através do
desconto do montante no salário do trabalhador, ficando obrigado, de certa forma, à
prestação de trabalho gratuito. Contudo, esta não poderá exceder um terço da retribuição
diária e, em cada ano civil, a retribuição correspondente a 30 dias; a perda de dias de férias
– esta sanção nunca pode pôr em causa o gozo de 20 dias de férias; a suspensão do trabalho
com perda da retribuição e de antiguidade – o empregador retém o valor da retribuição. A
suspensão não pode exceder 30 dias por cada infração e, em cada ano civil, o total de 90
dias117; o despedimento sem indemnização ou compensação – a infração disciplinar ao
despedimento por justa causa, nos termos do artigo 351º118.
Do que ficou fito, conclui-se que as sanções estão sistematicamente ordenadas em razão
da sua gravidade, começando pela mais leve (a repreensão) e terminando com a mais grave
(o despedimento sem indemnização ou compensação).
Além dos limites que nos referimos, o empregador deverá respeitar uma ideia de
proporcionalidade na aplicação da sanção. Por outras palavras, e conforme resulta do artigo
330º, nº1, a sanção disciplinar deve ser proporcional à gravidade da infração e à
culpabilidade da infração, não se podendo aplica mais de uma pela mesma infração. A
sanção deve ser aplicada no prazo de três meses subsequentes à prolação da decisão que
ordene a sua aplicação (nº2), sob pena de caducidade.

117
Sanções disciplinares conservatórias.
118
Sanção disciplinar expulsiva.

87
Direito do Trabalho

A aplicação de uma sanção tem de ser precedida de um procedimento – a ação disciplinar.


Contudo, e nesta fase, o que se exige apenas é a audiência prévia do trabalhador (artigo
329º, nº6), pelo que o termo “procedimento” pode induzir-nos em erros e levar-nos a
imaginar uma realidade judicial que, pelo menos, agora, não existe. Questão diversa é a da
aplicação da sanção que pode levar ao despedimento; aí o procedimento é mais complexo
e dele daremos conta adiante.
Para que se possa recorrer à ação disciplinar, é fundamental que se atue temporaneamente
e, por isso, que se respeitem os prazos que a lei prevê: o empregador tem um ano para
exercer o poder disciplinar, a contar da data em que sejam praticadas as infrações
disciplinares (artigo 329º, nº1), ou no prazo de prescrição da lei penal se o facto constituir
igualmente crime (prazo prescricionário); o procedimento deve iniciar-se nos 60 dias
subsequentes àquele em que o empregador, ou o superior hierárquico com competência
disciplinar, teve conhecimento da infração (nº2). Então, aqui chegados o empregador tem
um ano para intentar um procedimento disciplinar, sendo irrelevante para este efeito, se
conhece ou não as infrações cometidas. Mas, quando delas tome conhecimento, tem um
prazo de 60 dias para intentar o procedimento – na verdade, a lei pressupõe que a inércia
do empregador durante esse período, após tomar ciência das infrações, significa que não
existe uma relevância disciplinar; o direito de punir prescreve, igualmente, quando
decorrido um ano da instauração do procedimento disciplinar, o trabalhador não seja
notificado da decisão final (nº3).
Iniciado o procedimento disciplinar, o empregador pode suspender o trabalhador se a sua
presença se mostrar inconveniente, mantendo o pagamento da retribuição (artigo 329º,
nº4).
No entanto, ainda que a aplicação de uma sanção seja precedida do procedimento devido,
haverá casos em que a sua efetivação poder-se-á considerar abusiva – as denominadas
sanções abusivas (artigo 331º). Nestas situações, quando seja aplicada uma sanção que
derive de um facto que não a justifique, o trabalhador tem direito a uma indemnização e,
no caso, de despedimento, à sua reintegração na empresa (nº3 e nº4 do mesmo artigo).
Neste contexto, surge-nos imperioso fazer uma menção à alínea c), do nº1, do artigo 331º;
sendo a consistência e harmonia legislativa o logro de qualquer sistema (concretamente, do
sistema jurídico-laboral), não podemos deixar de referir que o referido preceito, deve ser
concatenado com o artigo 410º, nº3 CT e, bem assim, com o Estatuto Jurídico do
Trabalhador Protegido.
Os trabalhadores que exerçam ou se candidatem ao exercício de funções em estrutura de
representação coletiva dos trabalhadores, gozam de uma proteção jurídica especial (ao abrigo
do Estatuto Jurídico do Trabalhador Protegido119). No entanto, parece-nos haver uma

119
O Estatuto Jurídico do Trabalhador Protegido traduz-se no conjunto de normas que, atento às
qualidades especiais de alguns trabalhadores, lhes conferem uma posição especial. Por outras palavras,
existem trabalhadores que, por se encontrarem em circunstâncias diversas dos demais, merecem uma
tutela mais forte por parte da lei, sendo titulares de alguns direitos e até garantias de que grande parte
dos trabalhadores não gozam. Sejam eles os trabalhadores membros de uma estrutura de
representação coletiva (cf. artigos como o 410, nº3, o 411º, o 466º, entre outros), as grávidas, as
puérperas ou lactantes (cf. artigo 63º), o trabalhador-estudante, etc.

88
Direito do Trabalho

incongruência entre o vertido no artigo 331º, nº1, alínea c) e o disposto no artigo 410º, nº3 –
ambos do CT.
Do artigo 331º, nº1, al. c) resulta que é vedado ao empregador aplicar uma sanção, fundando
tal aplicação no facto de um trabalhador exercer ou candidatar-se ao exercício de funções em
estrutura de representação coletiva de trabalhadores. E, portanto, não estão abrangidos os
trabalhadores que já hajam exercido funções dessa natureza. Existe, pois, uma projeção
presente e futura.
Por seu turno, do artigo 410º, nº3 (com o qual devemos concatenar o preceito anterior, já
perceberemos porquê) resulta que, em matéria de despedimento, encontram-se tuteladas as
posições dos trabalhadores que hajam já exercido funções dessa natureza (sindical). Pelo que,
ao contrário do preceito anterior, vislumbra-se, aqui, uma projeção passada.
Donde, não parece que esta incongruência favoreça uma harmonia legislativa, pelo que se deve
considerar que, através de uma interpretação corretiva da alínea c), nº1, do artigo 331º, as
sanções assumem um caráter abusivo quando se fundem no facto dos trabalhadores já
houverem exercido funções de representação coletiva.

Subtítulo I – Processo de Despedimento Disciplinar

Quando haja lugar à aplicação da decisão mais grave, o despedimento disciplinar por justa
causa, em virtude facto imputável ao trabalhador (artigo 328º, nº1, alínea f)), o
procedimento que lhe precede está adstrito a exigências formais mais apertadas,
revestindo-se de outra solenidade; o que se percebe, tendo em conta que a aplicação da
sanção levará à desvinculação do trabalhador da entidade empregadora.
Em termos genéricos, constitui justa causa de despedimento, o comportamento culposo
(recte doloso) do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e
praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho – artigo 351º, nº1. Neste
sentido, o nº2 do preceito referido vem estabelecer um elenco exemplificativo (o que
resulta do vocábulo “nomeadamente”) dos comportamentos do trabalhador que
constituem justa causa de despedimento.
Neste contexto, para o exercício do direito de punir continuam a valer os prazos que
referimos anterior e que resultam do artigo 329º. O procedimento, em regra, inicia-se com
a nota de culpa. No entanto, se para a fundamentar for necessária uma investigação, é esta
precedida de um inquérito (artigo 352º) – desde que ocorra nos 30 dias seguintes à suspeita
de comportamentos irregulares - o que, em todo o caso, fará interromper os prazos
prescricionários e de caducidade a que nos referimos. Nos 30 dias subsequentes à conclusão
desta fase, a nota de culpa deve ser notificada (cf. artigo 353º, nº3).
Quando não for necessária a existência da fase de inquérito, o empregador deve comunicar,
por escrito, ao trabalhador a intenção de proceder ao seu despedimento, juntando a nota
de culpa120 com a descrição circunstanciada dos factos que lhe são imputados (subjaz a ideia
de que o trabalhador deve saber o que está a ser acusado) – artigo 353º, nº1.

120
A notificação da nota de culpa é condição de licitude do despedimento – cf. artigo 382º, nº2.

89
Direito do Trabalho

Com a notificação da nota de culpa, o empregador pode suspender preventivamente o


trabalhador se a sua presença na empresa se mostrar inconveniente121 (tal como admite o
artigo 329º, nº5) – cf. artigo 354º, nº1.
O trabalhador, por sua vez, dispõe de 10 dias úteis para consultar o processo e responder
à nota de culpa, deduzindo por escrito os elementos que considera relevantes para
esclarecer os factos e a sua participação nos mesmos, podendo, inclusive, solicitar as
diligências probatórias que se mostrem pertinentes para o esclarecimento da verdade
(artigo 355º, nº1).
Caso sejam requeridas diligência probatórias, seguir-se-á uma fase instrutória (artigo 356º).
Uma vez encerrada esta fase, o empregador deverá apresentar cópia integral do processo à
comissão de trabalhadores e, caso o trabalhador seja representante sindical, à associação
sindical respetiva, que podem, em prazo devido, juntar um parecer fundamentado.
Posto tudo isto, o empregador dispõe de 30 dias para proferir a decisão de despedimento,
sob pena de caducidade do direito de aplicar a sanção (artigo 357º, nº1).
De denotar que o procedimento será distinto no caso das microempresas (cf. artigo 100º),
pelo que estamos perante um caso de desaplicação do Direito de Trabalho (artigo 358º).
O despedimento que não seja precedido do respetivo procedimento é ilícito (artigo 381º,
alínea c) CT). Com o que isso importa a condenação do empregador a indemnizar o
trabalhador por todos os danos causado, patrimoniais e não patrimoniais e a reintegração
o trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa – cf. artigo 389º.

Capítulo XIV – A Cessação do Contrato de Trabalho

Antevemos, com relativa facilidade, que este é um tema que, no âmbito das relações
jurídico-laborais, se reveste de natureza particularmente sensível, uma vez que, ainda que
outros motivos se pudessem invocar, as faz cessar. E, assim sendo, o legislador muniu-se de
algumas preocupações especiais, consagrando soluções e regimes que visam reduzir, ao
máximo, a possibilidade de desvinculação dos contratos de trabalho, sem, no entanto,
descurar ou impossibilitar essa realidade.
O trabalhador baseia todo o seu modo de vida e da sua família, o seu estatuto social, as
suas possibilidades económicas no vínculo contratual que o liga ao empregador. Donde,
existem expetativas que este vai criando e mantendo, à medida que se protela o vínculo,
que, por isso, carecem de tutela – mais do que as expetativas e interesses de que o
empregador possa ser titular; isto porque, e aliás, como é característica das relações deste
caráter, também aqui sobressai a posição mais frágil ocupada pelo trabalhador.
Uma vez despedido, o trabalhador, atento a razões de idade, qualificação (v.g.), poderá
encontrar dificuldades em celebrar um novo vínculo laboral, pelo que, também por esta
razão, é essencial que se proteja a continuidade dos vínculos.
O empregador, quando a cessação do vínculo não tenha sido promovida por si, poderá
naturalmente sofrer outras consequências – por hipótese, a perda de um trabalhador com

121
Pode o trabalhador impugnar esta suspensão preventiva através de uma providência cautelar.

90
Direito do Trabalho

elevada qualificação profissional, poderá repercutir-se negativamente no seio da empresa -


, mas que, contudo, nunca contenderá com a sua esfera pessoal e familiar.
Atentando nesta panóplia de circunstancialismos, o legislador optou por estabelecer um
regime mais apertado quando seja o empregador a querer promover o despedimento,
nomeadamente porque se reveste de formalidades e exigências que não encontram
paralelo quando essa seja a pretensão do trabalhador.
Dada a sensibilidade e relevância desta matéria, o legislador afastou a possibilidade de o
regime da cessação do contrato de trabalho ser objeto de derrogação pelas partes –
mediante contrato individual – ou através de negociação coletiva. Trata-se, conforme exalta
Monteiro Fernandes122, de uma imperatividade absoluta, da qual só escapa a definição
quantitativa das indemnizações e prazos, o que resulta expresso do artigo 339º CT.
A interpretação literal do artigo 339º - nomeadamente no concernente à fixação de
indemnizações e compensações -, não se afigura benéfica. Na verdade, e ao contrário do
que da leitura da norma parece resultar, o cálculo de compensações deve considerar-se
abrangido por aquele preceito; e, por outro lado, não é de todo de afastar a possibilidade
de as partes, em relação a uma situação concreta de cessação de um contrato de trabalho,
negociarem e fixarem entre si valores diferentes, em matéria de indemnização e
compensações123, dos que em princípio resultariam da aplicação de normas legais.
Entre nós, o artigo 340º CT vem consagrar um elenco exemplificativo (“Para além de outras
modalidades legalmente previstas”) das modalidades através das quais pode operar a
cessação do contrato de trabalho; enumerá-las-emos: caducidade, revogação,
despedimento por facto imputável ao trabalhador, despedimento coletivo, despedimento
por extinção de posto de trabalho, despedimento por inadaptação, resolução pelo
trabalhador, denúncia pelo trabalhador. Estas, então, para além do já analisado período
experimental (cf. artigos 111º e seguintes)124 e da cessação de comissão de serviços
externa125 (cf. artigo 162º, nº1), constituem as modalidades de cessação do contrato de
trabalho126 – não podendo, reiteramos, outras ser criadas por contrato de trabalho ou por
meio de negociação coletiva e, assim, através de instrumento de regulamentação coletiva
de trabalho, mormente as convenções coletivas.

122
Ob. cit., 640.
123
Note-se que falamos de indemnizações quando a cessação do contrato de trabalho se afigure ilícita; e
falamos de compensações quando a rutura do vínculo laboral resulte de conduta lícita.
124
O empregador pode denunciar o contrato sem necessidade de invocar uma justificação (artigo 114º,
nº1), tal como o trabalhador, sendo que este, conforme veremos, o poderá fazer noutras ocasiões.
125
Caso em que, como vimos, o trabalhador não permanece na empresa, a menos que esta seja ou
esteja acordada.
126
Nas quais se integram as previstas no artigo 391º CT – caso em que, não obstante se tratar de um
despedimento ilícito, o trabalhador opta por uma indemnização em substituição da reintegração da
empresa (cf. artigo 389º, nº1, alínea b)); e no artigo 392º - apesar de a cessação do contrato de trabalho
consubstanciar um despedimento ilícito, o empregador (em casos contados) pode requerer
judicialmente que o tribunal exclua a reintegração do trabalhador na empresa, desde que invoque
factos e circunstâncias que a torne gravemente onerosa para o funcionamento da empresa (nº1).
Contudo, tal não poderá ser aplicado sempre que a ilicitude do despedimento de funde em motivo
discriminatório (nº2). E, assim sendo, se o tribunal deferir a pretensão do empregador, o trabalhador
tem direito a uma indemnização calculada nos termos do nº3 do preceito supracitado.

91
Direito do Trabalho

No seguimento do que temos vindo a dizer, a cessação do contrato de trabalho por


iniciativa do empregador foi, a partir da segunda metade do século passado, muito
constrangida pela legislação laboral constante do Código de Trabalho mas, principalmente,
atento à posição sistemática da lei fundamental, pelo Princípio da Segurança no Emprego,
cujo assento se situa no artigo 53º CRP. Ora, o legislador, por um lado, veio atender aos
interesses do empregador que, em determinadas situações, podem justificar o
despedimento de trabalhadores (por exemplo, em caso de despedimento por extinção do
posto de trabalho) mas, por outro, impossibilita (proibindo mesmo) um despedimento sem
que este se funde em justa causa. Reconhece-se a posição débil do trabalhador e, outrossim,
a desmesurada importância de que se reveste o vínculo laboral para esta parte – que, já
dissemos, é através da retribuição auferida que consegue prover ao seu sustento e ao da
sua família, não olvidando o facto de o emprego conferir ao trabalhador um dado estatuto
social.
A proteção do trabalhador no contexto que agora tratamos, culmina no princípio da
proibição do despedimento por justa causa, constante do artigo 338º. Donde, à partida127,
o empregador não poderá proceder ao despedimento se a sua pretensão não se fundar num
dos motivos elencados pelo nº2 do artigo 351º CT ou, por outro lado, se se fundar em
motivos políticos ou ideológicos, o que, de certa forma, ainda que com abrangência
diferente mas com redação idêntica já resultava expresso no artigo 53º CRP.
Ao longo do estudo das modalidades de cessação do contrato de trabalho,
depreenderemos que a desvinculação é muito mais facilmente obtida se operar por
iniciativa do trabalhador (que readquire a sua liberdade, libertando-se dos poderes do
empregador) do que se resultar da iniciativa do empregador. Em todo o caso, o
despedimento é considerado a ultima ratio, isto é, a solução irreversível para um mal em
relação ao qual a aplicação de outras sanções (quais sejam) se prefigurem insuficientes.

Subcapítulo I – Revogação

A revogação é uma modalidade de cessação do contrato de trabalho, cuja admissibilidade


resulta do artigo 349º do Código de Trabalho. Esta traduz-se na possibilidade de as partes,
mediante acordo escrito, acordarem na cessação do vínculo laboral e, por isso, nessa
medida, é um negócio jurídico bilateral extintivo.
A celebração destes acordos resulta, na maioria dos casos, da iniciativa do empregador,
sendo certo que, não raro, este concede ao trabalhador informações que lhe fazem imaginar
uma realidade que, na verdade, não existe. É o que sucede quando empregador se dirige ao
trabalhador, comunicando-lhe que devem fazer cessar o contrato através da revogação,
porquanto, em virtude de motivações tecnológicas, este poderá perder o posto de trabalho.
Donde, acreditando em tais afirmações, e porque a compensação devida em caso de
despedimento por extinção de posto de trabalho é menor do que a devida quando a
cessação resulta de revogação, o trabalhador acede a tal pretensão, revogando-se o
contrato. Ainda assim, porque se trata de um negócio jurídico e a vontade do trabalhador

127
Porque o elenco do artigo 351º, nº2 não é, mais uma vez, exaustivo (nomeadamente).

92
Direito do Trabalho

fundou-se em erro, este acordo padece de um vício que, sendo essencial, poderá levar à sua
anulação (artigo 254º do Código Civil).
A revogação e, por conseguinte, a extinção dos efeitos do vínculo laboral poderão remontar
à data da celebração do acordo ou ser diferidos para momento posterior, o que resulta
implícito do nº3 do artigo 349º. Ao contrário do que costuma suceder ao abrigo de outras
modalidades, e porque neste caso nos situamos perante um acordo revogatório, não há, a
menos que se estipule, lugar a uma compensação em resulta da cessação do contrato de
trabalho. Contudo, é normal que a estipulação de tal contrapartida suceda, na medida em
que a revogação tutela, em regra, interesses de que é titular o empregador que, por isso, a
propõe ao trabalhador. E, por supuesto, o trabalhador, em princípio, não acederá a tal
pretensão, sem que lhe seja concedida essa contrapartida (nº5128).
Naturalmente que se o acordo de revogação for proposto pelo trabalhador, não será (salvo
casos raríssimos) estipulada qualquer compensação, até porque este só o proporá se tiver
devidamente acautelada a sua situação (nomeadamente, quando tenha em mãos a
possibilidade de exercer funções noutra empresa).
A lei concede ao trabalhador a possibilidade de fazer cessar o acordo de revogação
mediante comunicação escrita dirigida ao empregador, desde que efetuada até ao sétimo
dia seguinte à data da sua celebração e, outrossim, aquele ponha à disposição deste a
totalidade das compensações pecuniárias (se forem acordadas) pagas em cumprimento do
referido acordo (artigo 350º, nº1 e nº3). Todavia, esta faculdade encontra-se vedada ao
trabalhador quando o acordo esteja devidamente datado e as assinaturas que dele constem
sejam objeto de reconhecimento notarial presencial (nº4).

Subcapítulo II – Caducidade

À caducidade está normalmente associada uma ideia de cessação automática do vínculo.


Contudo, e pelo menos no panorama jurídico-laboral da cessação dos contratos de trabalho,
a caducidade envolve de uma forma ou de outra, a existência de elementos volitivos,
dependendo, dessa forma, de declarações das partes nesse sentido.
Na verdade, e se atentarmos às causas de caducidade que integram o artigo 343º,
reparamos que a todas elas é comum a necessidade de comunicação à contraparte da
intenção de fazer cessar o contrato por meio de caducidade. Senão vejamos: quanto à
verificação do termo (al. a)) – caso se trate de termo certo, a lei exige (e já o estudámos)
que o contrato só caducará findo o prazo estipulado (ou da sua renovação), se o empregador
ou o trabalhador comunicar à outra parte a vontade de o fazer cessar, por escrito, com 15
ou 8 dias de antecedência, respetivamente (artigo 344º, nº1). Se o contrato de trabalho for
celebrado a termo incerto, exige-se que o empregador, prevendo a sua ocorrência, a
comunique ao trabalhador com a antecedência de 7, 30 ou 60 dias conforme o contrato
tenha durado até seis meses, de seis meses a dois anos ou por período superior; por outro
lado, para que a caducidade opere em razão da impossibilidade superveniente, absoluta e

128
Devemos notar que este preceito consagra uma presunção iuris tantum, já que o trabalhador pode
demonstrar que os créditos de que é titular em relação ao empregador, não foram tidos em conta na
estipulação da compensação. A lei presume que sim, admitindo, no entanto, prova em contrário.

93
Direito do Trabalho

definitiva, de o trabalhador prestar o seu trabalho ou de o empregador o receber (al. b)) –


a lei exige que a impossibilidade, sendo superveniente, seja comunicada à outra parte, para
que a cessação do vínculo por caducidade possa operar, uma vez que o motivo que
impossibilita a manutenção do contrato de trabalho nem sempre é conhecido por ambas as
partes. Por outro lado, e concatenando tal preceito com o artigo 360º, nº1, com esta
comunicação também se pretende controlar, sendo caso disso, a cessação coletiva de
contratos de trabalho que do encerramento definitivo pode resultar129; finalmente,
relativamente à cessação por caducidade em virtude da reforma do trabalhador, por velhice
ou invalidez (al. c)), é igualmente imposto ao trabalhador que informe o empregador que,
agora, recebe uma pensão a título de reforma. Só dessa forma, e não obstante a
temporaneidade da comunicação, é que poderá operar esta modalidade de cessação de
contrato.
Não nos ocuparemos da cessação por caducidade nos casos de contratos a termo,
porquanto esta já foi alvo de análise em momento anterior, pelo que voltaremos, neste
momento, à análise da alínea b) do artigo 343º.
Dado o caráter intuito persona (ou pessoal) do contrato de trabalho, este, à morte da
pessoa que nele perfila como trabalhador, não poderá subsistir, consubstanciando uma
impossibilidade superveniente definitiva de o trabalhador prestar o seu trabalho, porquanto
esta não integra o elenco de relações jurídicas hereditáveis. Mas não só esta hipótese, a lei
pretendeu salvaguardar e abranger com esta alínea b); na verdade, poderá suceder que o
trabalhador, por qualquer razão, se veja impossibilitado de prestar normalmente a atividade
contratada, o que, nesse caso, pode levar (legitimamente) à perda do interesse do
empregador na manutenção do vínculo.
Neste contexto, importa distinguir dois grupos de hipóteses: a impossibilidade dever-se a
acidente pessoal ou doença não profissional ou, por outro lado, dever-se a acidente
profissional ou doença laboral. Este ponto é essencial porque, conforme o caso, a solução é
substancialmente distinta; derivando a impossibilidade de acidente pessoal ou doença não
profissional, atestada esta pelo médico de trabalho, o empregador não se encontra adstrito
ao dever de fazer permanecer o vínculo, uma vez que a atividade contratada já não pode
ser prestada pelo trabalhador. Contudo, e podendo o mesmo trabalhador exercer outras
funções diversas das contratadas (atento ao seu estado de incapacidade), o empregador
pode incumbi-lo destas, sendo certo que essa não é uma sua obrigação. É-lhe, então,
reconhecida legitimidade para fazer cessar o vínculo contratual ao abrigo da alínea b) do
artigo 343º. A solução dada pela lei, quando a impossibilidade resulte de doença profissional
ou acidente laboral é diferente; neste caso, o empregador – porque o acidente ocorreu no
exercício da sua atividade ou porque a doença surgiu em resultado da atividade prestada –
está obrigado, por força de legislação especial, a conceder ao trabalhador funções e
condições compatíveis com o seu estado, só se exonerando se invocar a inexistência de tais
funções e o serviço de emprego a reconhecer.
Até aqui analisámos, grosso modo, as causas ligadas ao trabalhador que importam a
caducidade do contrato de trabalho, assentes na impossibilidade de este poder prestar a

129
Analisaremos, em seguida, esta alínea b) do artigo 343º-

94
Direito do Trabalho

sua atividade. No entanto, também pode suceder que o empregador fique impossibilitado
de receber tal prestação, em virtude da morte do empregador, da extinção da pessoa
coletiva ou encerramento da empresa (artigo 346º) ou da insolvência da empresa (artigo
347º).
Ora, da morte do empregador pode resultar a cessação do contrato de trabalho por
caducidade, se o sucessor daquele não continuar a atividade para que o trabalhador foi
contratado, ou se não houver a transmissão da empresa ou estabelecimento (nº1); a
extinção da pessoa coletiva empregadora, importa a caducidade do contrato do trabalho se,
mais uma vez, não se der a transmissão da empresa ou do estabelecimento (nº2); também
o encerramento total e definitivo determina a caducidade, sendo certo que, neste caso, é
necessário seguir o procedimento previsto no artigo 360º e seguintes (disposto para o
despedimento coletivo). Ainda assim, no caso de microempresa, parece que basta que se
informe os trabalhadores do encerramento (nº4), com respeito pelo preceituado no artigo
363º, nº1 e nº2. Caducando o contrato de trabalho, o trabalhador tem direito a uma
compensação calculada nos termos do artigo 366º (ex vi nº5 do artigo 346º).
A declaração judicial de insolvência não implica de per si a cessação do contrato de trabalho,
devendo o administrador (de insolvência) continuar a satisfazer as obrigações para com os
trabalhadores enquanto o estabelecimento não for definitivamente encerrado (artigo 347º,
nº1). Caso a colaboração de um dado trabalhador se afigure dispensável, o administrador
pode fazer cessar o vínculo laboral. Em todo o caso, a sua cessação deverá ser precedida do
procedimento a que se referem os artigos 360º e seguintes, não obstante de em caso de
microempresa bastar a comunicação aos trabalhadores (a par do que já referimos
anteriormente para a cessação do contrato de trabalho em resultado do encerramento
definitivo da empresa), culminando no pagamento de uma compensação pecuniária.
Posto isto, falta analisar a causa de caducidade a que se refere a alínea c) do artigo 343º -
reforma do trabalhador, por velhice ou invalidez.
A cessação do contrato de trabalho através de caducidade fundada na reforma do
trabalhador só opera se obedecer a determinados requisitos, de entre os quais se destaca a
necessidade do conhecimento por ambas as partes da reforma por velhice (artigo 348º,
nº1). Naturalmente, sendo o empregador um terceiro face à relação jurídica estabelecida
entre o trabalhador reformado e a instituição da segurança social, muitas vezes não tem
conhecimento da reforma deste, pelo que o trabalhador, requerente da pensão de reforma,
deve, à luz dos artigos 126º, nº1 e 106º, nº2, informar o seu empregador.
Porque a reforma do trabalhador não hipoteca nem inutiliza a continuidade da vigência do
contrato de trabalho, não se produzem, de forma imediata, os efeitos extintivos. A lei não
fixa um prazo para a cessação do contrato de trabalho mas, através da confrontação com o
artigo 348º, nº1, esta, sendo caso disso, há de suceder nos 30 dias subsequentes ao
conhecimento, por ambas as partes, da reforma do trabalhador. Contudo, e no seguimento
desta ordem de ideias, a lei não veda às partes a possibilidade de, mediante acordo, o
trabalhador continuar ao serviço do empregador (qualquer que seja o motivo) para lá dos
30 dias referidos. A verificar-se esta hipótese, opera-se a conversão do contrato num
contrato de trabalho a termo que, por força do mencionado preceito, sucede ope legis.

95
Direito do Trabalho

Tratando-se, agora, de um contrato de trabalho a termo resolutivo certo, este guiar-se-á,


em traços gerais, pelo regime vertido nos artigos 139º e seguintes do CT. Isto não embarga
a vigência das especificidades dispostas no nº2 do artigo 348º e, assim, o contrato não
precisa de ser reduzido a escrito (derrogando-se o disposto no artigo 141º, nº1), vigorando
por períodos de seis meses, após os quais as partes podem avaliar o seu interesse na
renovação do vínculo, sem sujeição a limites máximos (afastando-se, de certa forma, o
regime do nº4 do artigo 149º). A caducidade deste contrato fica sujeita a aviso prévio de 60
ou 15 dias, consoante a iniciativa pertença ao empregador ou ao trabalhador (o que afasta
a aplicação do artigo 344º, nº1), não implicando esta o pagamento de qualquer
compensação pecuniária, solução que se entende na medida em que o trabalhador já aufere
uma pensão a título de reforma.
Note-se, por fim, que este regime se aplica igualmente aos trabalhadores que, atingindo 70
anos de idade, não hajam requerido a reforma por velhice (nº3).

Subcapítulo III – Rutura do contrato pelo trabalhador

Apesar de já o termos referido, nunca é demais vincar que a desvinculação do contrato de


trabalho, quando resulte da iniciativa do trabalhador pode, pelas razões que enunciámos
anteriormente, ser mais facilmente obtida. É que este, desvinculando-se, readquire a sua
liberdade pessoal e encontra-se livre para celebrar novo vínculo com outra entidade
empregadora que, possivelmente, se pode adequar melhor às suas aptidões e qualidades
enquanto trabalhador.
Deste modo, a lei concede ao trabalhador vias para se desvincular do vínculo laboral, quais
sejam: a resolução (artigos 394º ss.), a denúncia (artigo 400º) e a rutura irregular do
contrato (artigos 399º e 401º) e o abandono do trabalho (artigo 403º).

Subtítulo I – Denúncia

A denúncia afigura-se, talvez, no expediente mais simples ao qual o trabalhador pode


recorrer para fazer cessar o vínculo contratual que o liga ao empregador. Isto porque não
lhe é imposto que funde a sua pretensão num motivo justificativo (justa causa), podendo
alegar um qualquer motivo ou mesmo não alegar nenhum, bastando que cumpra um
requisito formal – comunicação por escrito ao empregador, com a antecedência de 30 ou
60 dias, conforme tenha, respetivamente, até dois anos ou mais de dois anos de antiguidade
(artigo 400º, nº1).
A ratio da exigência deste aviso prévio é conceder ao empregador o tempo necessário para
encontrar um substituto que possa ocupar o posto vago deixado pelo trabalhador. Neste
contexto, note-se que, em caso de despedimento coletivo, e durante o período de aviso
prévio a que está adstrito o empregador, o trabalhador pode denunciar o contrato de
trabalho, mediante antecedência de três dias úteis, mantendo o direito à compensação
(artigo 365º). O encurtamento do prazo introduzido pelo artigo 400º, nº1, deve-se ao facto
de, aqui, não ser necessário proteger interesses do empregador, porquanto a decisão do

96
Direito do Trabalho

despedimento parte de si e, à partida, este não terá de procurar um substituto para o(s)
trabalhador(es)130.
Assinale-se que o trabalhador pode revogar a denúncia do contrato, salvo se a sua
assinatura tiver sido objeto de reconhecimento notarial presencial, até ao sétimo dia
seguinte em que a mesma chegar ao poder do empregador, mediante comunicação escrita
dirigida a este (artigo 402º).
Na eventualidade de o trabalhador não respeitar o aviso prévio a que está adstrito, fica
obrigado a indemnizar o empregador ao abrigo do artigo 401º.

Subtítulo II – Resolução

Ao contrário do que sucede na denúncia, para que o trabalhador possa fazer cessar o
contrato de trabalho através da resolução, é necessário que invoque justa causa (artigo
394º). Não é, contudo, exigido que esta se revista de uma natureza de ultima ratio, isto é,
apenas se admitindo que o trabalhador a ela recorra quando se encontre em situações
extremas, bastando que a permanência do vínculo contratual lhe cause perturbações
graves.
A justa causa pode ser imputável ao empregador (justa causa subjetiva) mas também pode
não o ser (justa causa objetiva), conforme esta se traduza num comportamento culposo do
empregador ou, pelo contrário, se trate de um motivo ao qual é completamente alheio. O
nº2 do artigo 394º vem estabelecer um elenco exemplificativo (nomeadamente) de
comportamentos que, sendo imputáveis ao empregador, são considerados justa causa de
resolução do contrato pelo trabalhador, de entre os quais destacamos o vertido na alínea a)
– falta culposa do pagamento pontual da retribuição. Quanto a este preceito, tem firmado
a doutrina e a jurisprudência que se considera culposa a atuação do empregador que,
estando com dificuldades de tesouraria, não opte por fazer qualquer coisa para debelar tal
panorama e, assim, de alguma forma, conseguir cumprir com o pagamento da retribuição.
O nº5, por seu turno, vem considerar culposa a falta de pagamento pontual da retribuição
que se prolongue por período superior a 60 dias, ou quando o empregador, a pedido do
trabalhador declare por escrito a previsão de não pagamento da retribuição em falta, até
ao termo daquele prazo. Tem-se entendido que, quando o trabalhador vise socorrer-se de
tal norma para fundar a sua pretensão, fica exonerada de provar a culpa do empregador, na
medida em que a lei já o dá como dado adquirido.
Outros comportamentos, não duvidamos, são da inteira responsabilidade do empregador
e, na realidade, não hão de poder verificar-se sem a culpa deste; falamos, por exemplo, das
sanções abusivas (artigo 331º) e ofensa à integridade física ou moral.
Já não são imputáveis ao trabalhador, as circunstâncias a que se refere o nº3. E esta
distinção entre causas subjetivas ou objetivas reveste-se de enorme importância, uma vez
que, no primeiro caso, o trabalhador terá direito a uma indemnização (fundada em
comportamentos ilícitos do trabalhador), o que no segundo caso já não sucederá – é o que
resulta expressa ou implicitamente do artigo 396º.

130
Na prática, o que sucede é uma antecipação da cessação do contrato, porque, em qualquer caso,
este iria cessar.

97
Direito do Trabalho

Querendo resolver o contrato, o trabalhador tem, à partida, um período de 30 dias para o


efeito, a contar do conhecimento dos factos nos quais fundou a sua pretensão (artigo 395º,
nº1), tendo, não obstante, a possibilidade de a revogar nos termos do artigo 397º.
Face a uma resolução que considere ilícita, o empregador pode intentar uma ação para que
seja avaliada a licitude daquela, contanto que o faça no prazo de um ano (artigo 398º, nº1
e nº2). Declarada ilícita a resolução, o empregador tem direito a ser indemnizado pelos
prejuízos que lhe foram causados (artigo 399º).

Subtítulo III – Extinção irregular do contrato pelo trabalhador

Trataremos, nesta sede, de um assunto que, atento às referências que temos vindo a fazer,
quase não se justificaria dar-lhe um tratamento autónomo. Ainda assim, e para que
percebamos o alcance do que agora se trata, optámos por desenvolvê-lo em separado,
sempre com o cuidado de não entrarmos em repetição porque, de facto, há pontos nos
quais já tocamos em momento anterior.
O trabalhador, ainda que não funde a sua pretensão em motivo justificativo (justa causa)
ou não proceda em conformidade com as formalidades que lhe são impostas, consegue
sempre alcançar o seu logro principal – a desvinculação do vínculo laboral.
O que sucede e, de resto, conforme dispõe o artigo 399º para a resolução infundada e o
artigo 401º para a preterição do aviso prévio na denúncia, é que o trabalhador fica vinculado
ao dever de indemnizar a entidade empregadora pelos prejuízos que lhe causar e que
imediatamente resultem da cessação do contrato de trabalho.
Por vezes, a entidade empregadora compromete-se a investir na formação profissional do
trabalhador, comprometendo-se este a ficar ao seu serviço por um período mínimo (o
denominado pacto de permanência a que se refere o artigo 401º, in fine). Quando a
denúncia ocorra e produza efeitos antes do termo do período convencionado, o trabalhador
fica obrigado a restituir a “soma das importâncias despendidas” com a sua formação.

Subtítulo IV – Abandono do trabalho

O abandono do trabalho acaba, na sua substância, por consubstanciar uma rutura irregular
do contrato por parte do trabalhador. Para que possa ser convocada pelo empregador, é
imperioso que se verifiquem dois requisitos: a ausência do trabalhador do serviço, desde
que acompanhada de factos que, com toda a probabilidade, revelam a intenção de não o
retomar. A lei não exige que esta ausência se verifique durante um determinado arco
temporal, podendo operar independentemente da sua projeção espácio-temporal. Ora, isto
importa a possibilidade de o empregador, tendo notícia de que um trabalhador seu se
encontra ao serviço de outra empresa durante o período em que se deveria encontrar ao
seu serviço, convocar a figura extintiva do abandono do trabalho, vertida no artigo 403º.
Isto porque, neste caso, o trabalhador se ausentou do serviço e, cumulativamente, o facto
de se apresentar ao serviço de outra empresa, denota, com toda a probabilidade, a intenção
de não o retomar.

98
Direito do Trabalho

Contudo, para que o empregador possa invocar o abandono e, desse modo, associar-lhe os
efeitos prescritos para a denúncia sem aviso prévio (cf. artigo 401º, ex vi nº5), é fundamental
que comunique ao trabalhador os factos constitutivos do abandono, por carta registada com
aviso de receção para a última morada conhecida deste (nº3, artigo 403º).
Situações haverá em que, não sendo concludentes os factos que acompanham a ausência,
o empregador poderá presumir o abandono do trabalho (nº2). Isto poderá suceder quando
o trabalhador se ausente do serviço durante 10 dias seguidos, sem que o empregador seja
informado da ausência. Trata-se de uma presunção iuris tantum que, por isso, poderá ser
afastada pelo trabalhador mediante a prova dos factos que o levaram a ausentar-se e,
outrossim, a impossibilitá-lo de entrar em contacto com o empregador, em tempo devido,
para lhe comunicar a ausência (vencendo, aqui, uma mesma lógica que subjaz ao regime
das faltas e, concretamente, ao artigo 253º).
A extinção do contrato de trabalho por abandono do trabalho, opera, quando estejamos
no campo de aplicação do nº1 do artigo 403º, no momento do envio da carta registada; na
verdade, o trabalhador pode ter mudado de residência sem que atualize esses dados ou
pode voluntariamente furtar-se à receção da carta enviada. No entanto, assim não será se
funcionar a presunção de abandono de trabalho consagrada no nº2, porquanto se admite
ao trabalhador a possibilidade de, mediante a prova dos factos que levaram à sua ausência
e à impossibilidade de a comunicar ao empregador, a vir afastar; daí que, nestas ocasiões,
o envio de per si não tenha um efeito extintivo.

Subcapítulo IV – Regime comum do despedimento

Desde o regime consagrado pela LCT até ao regime que hoje consta do Código do Trabalho,
mediaram largos anos, que caracterizados por contextos político-económico distintos,
levaram, em certos momentos, a reformas no panorama jurídico-laboral. Sem, no entanto,
nos ocuparmos dessas reformas e da evolução de que elas são espelho, cumpre-nos
(porque, ademais, é isso que nos interessa) referir e analisar o regime vigente.
Atualmente, o Código do Trabalho consagra as seguintes modalidades de despedimento131:
despedimento por facto imputável ao trabalhador – de resto, já analisámos com algum
cuidado esta modalidade, onde nos referimos, em traços gerais, ao procedimento que deve
preceder o despedimento como sanção disciplinar; despedimento coletivo; despedimento
por extinção do posto de trabalho; despedimento por inadaptação; resolução pelo
trabalhador; denúncia pelo trabalhador. A par destas, não podemos olvidar a possibilidade
de o tribunal, em caso de despedimento ilícito, decidir pela não reintegração do trabalhador
na empresa, o que configura uma resolução judiciária do contrato de trabalho (artigo 392º).
Antes de avançarmos, importa, porém, fazer duas considerações, uma de natureza
substancial e outra de natureza processual. Foi-se progressivamente excluindo a
possibilidade de o empregador despedir um trabalhador sem necessidade de invocação de
um motivo justificativo e plausível. Hoje, e sem embargo de isso poder suceder em alguns
casos (ainda que reduzidos), é consagrado um princípio de proibição do despedimento sem

131
O despedimento resulta, obviamente, da iniciativa do empregador.

99
Direito do Trabalho

justa causa (artigo 338º)132, com o que isso implica a impossibilidade de o empregador se
desvincular de um contrato ad nutum, isto é, sem invocar um motivo que o justifique. Por
outro lado, qualquer despedimento (qual seja a modalidade) deve ser – e para que seja lícito
tem de o ser – precedido de um procedimento. Estas exigências processuais podem ser mais
evidentes e rígidas nuns casos do que noutros, assumindo maior preponderância
relativamente ao despedimento por facto imputável ao trabalhador.
Através da suspensão do despedimento, qualquer trabalhador pode, tendo sido despedido
ao abrigo de uma qualquer modalidade, opor-se provisoriamente à eficácia da decisão do
despedimento, enquanto se afere, através de ação intentada com essa finalidade, sobre a
sua licitude ou ilicitude (artigo 386º). Grosso modo, o que esta providência cautelar133
permite é que os efeitos do vínculo laboral se mantenham, nomeadamente no concernente
à retribuição que continua a ser devida, já que a prestação laboral foi dispensada pelo
empregador.
Não raro sucede que os trabalhadores são despedidos de forma ilícita, o que lhes pode
causar danos patrimoniais e não patrimoniais, da mais diversa ordem e que, em princípio,
têm de ser indemnizados pelo empregador (que promoveu o correspetivo despedimento) –
estamos perante o despedimento ilícito. A ilicitude do despedimento averigua-se
judicialmente, mediante a proposição de uma ação judicial com essa finalidade,
pronunciando-se, por fim, o tribunal pela licitude ou ilicitude daquele (artigo 387º).
A ilicitude do despedimento pode derivar de várias causas, nomeadamente: da preterição
de uma qualquer formalidade, da improcedência do motivo justificativo (da justa causa), ou
se se fundar em motivos discriminatórios (artigo 381º CT). Convocando-se um destes
motivos, o tribunal terá de se pronunciar pela ilicitude do despedimento em apreço, o que
dará origem às seguintes consequências: o trabalhador terá direito a ser indemnizado por
todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais e deve ser reintegrado (seja essa
a sua vontade) no mesmo estabelecimento da empresa, com a categoria e antiguidade
respetivas (artigo 389º, nº1)134. No entanto, como tivemos oportunidade de referir em
momento anterior, o trabalhador pode optar por uma indemnização em substituição da
reintegração (artigo 391º) e, a requerimento do empregador, pode suceder que o tribunal
exclua a reintegração, nos termos do artigo 392º135. Ora, operando um destes cenários, não
se poderá aplicar a alínea b), nº1 do artigo 389º, o que o preceito de forma expressa acaba
por dizer.
Além da indemnização, o trabalhador tem direito a uma compensação correspondente às
retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da
decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento (artigo 390º, nº1) – trata-se de
um direito aos salários de tramitação (ou salários intercalares) que, em todo o caso, não

132
Já o desenvolvemos supra.
133
Regulado nos artigos 34º a 40º do Código de Processo do Trabalho.
134
Note-se que o legislador pretendeu garantir o estatuto do trabalhador – com a manutenção da
categoria e da antiguidade -, mas já não a posição funcional que ocupava antes da cessação ilícita do
vínculo, podendo o empregador incumbi-lo do exercício de outra função.
135
Para tanto, é imperioso que invoque factos e circunstâncias que tornem o regresso do trabalhador
gravemente prejudicial e perturbador do funcionamento da empresa.

100
Direito do Trabalho

fosse o despedimento ilícito este teria normalmente auferido. Contudo, ao valor da


compensação deverá ser deduzido o montante das prestações a que se refere o nº2.
Na verdade, a reintegração do trabalhador dificilmente correrá. Depois de um
despedimento ilícito, tanto o trabalhador como o empregador têm motivos de sobra para
não quererem voltar a estabelecer entre si um vínculo laboral. O trabalhador porque,
sentindo-se maltratado e desrespeitado, nomeadamente quando não se trate de vícios
procedimentais, não quererá voltar a sujeitar-se aos poderes do empregador, preferindo
ver a retribuição ser substituída por uma indemnização; o empregador, vislumbrando um
mal-estar no seio empresarial e até a pouca produtividade que um trabalhador ferido lhe
pode trazer, também preferirá que a reintegração seja excluída (caso em que, conforme
ficou dito, opera uma outra causa de cessação de contrato: a resolução judicial). Seria
demasiado oneroso, atento ao circunstancialismo de que se reveste a cessação ilícita de um
contrato de trabalho, impor às partes que se sujeitassem a uma reintegração que raramente
é desejada.
O despedimento ilícito que se funde em motivos discriminatórios (artigo 381º, alínea a))
obsta à possibilidade de o empregador requerer a exclusão da reintegração (nº2 do artigo
392º, nº2). Neste caso, a reintegração só não acontecerá, caso o trabalhador opte por uma
indemnização, nos termos do artigo 391º, nº1 (o que, diga-se, é o que provavelmente
ocorrerá).

Subcapítulo V – Despedimento individual

Nesta sede, iremos dar notícia do despedimento de um trabalhador, ao abrigo de uma de


três modalidades de despedimento: despedimento por facto imputável ao trabalhador, à
qual impõe-se que se funde em justa causa (subjetiva); despedimento por extinção de posto
de trabalho ou despedimento por inadaptação (qualquer uma destas modalidades constitui
justa causa objetiva de despedimento).

Subtítulo I – Despedimento por facto imputável ao trabalhador

A admissibilidade do despedimento por facto imputável ao trabalhador encontra-se


legalmente limitada, porquanto se subordina tal hipótese à verificação de alguns requisitos,
quer de natureza material quer de natureza processual.
Não é concedida ao empregador a faculdade de proceder ao despedimento, com recurso a
um procedimento disciplinar prévio, do trabalhador se a sua pretensão não se fundar em
motivo plausível, isto é, em justa causa. De entre os motivos que podem consubstanciar
justa causa, podemos apontar os elencados no nº2 do artigo 351º - deles já nos ocuparemos.
As sanções disciplinares aparecem dispostas por ordem crescente de gravidade no artigo
328º, nº1 – sendo, reitere-se, taxativas. Ora, tendo em consideração esta ordem de
gravidade, verteu o legislador como a mais grave das sanções o despedimento disciplinar
(sem indemnização ou compensação), donde podemos concluir que esta se reveste como a
ultima ratio das sanções aplicáveis. Na verdade, qualquer uma das outras sanções
caracterizam-se por se pautarem pela conservação do vínculo laboral – repreensão,
repreensão escrita, sanção pecuniária, perda de dias de férias, suspensão do trabalho com

101
Direito do Trabalho

perda de retribuição e antiguidade -, ou seja, visam a manutenção e continuidade do vínculo


laboral, ainda que o trabalhador possa ter adotado um comportamento que não seja
adequado à correta execução do contrato de trabalho. Assim, não se revestindo o
comportamento de gravidade suficiente para se fazer romper o vínculo contratual por meio
do despedimento, o empregador deve aplicar uma das outras sanções que, ao contrário
desta última, visam a manutenção do vínculo e, por conseguinte, do trabalhador no seio da
sua empresa.
Esta ideia resulta mais ou menos expressa do artigo 330º, nº1, o qual consagra uma ideia
de proporcionalidade na aplicação das sanções, pelo que o despedimento só deve ser
aplicado quando o comportamento de um trabalhador impossibilite a permanência do
vínculo – atento à gravidade da infração e à culpabilidade do infrator.
A averiguação da existência de justa causa guia-se por meio de juízos objetivos e através
de uma apreciação casuística (artigo 351º, nº3). Isto implica que o julgador, quando tenha
de apreciar a justa causa invocada, se coloque na posição de um empregador razoável e,
deparando-se com a conduta alegada, averigue a culpa do infrator. Por outro lado, não se
pede, obviamente, que o empregador percorra e aplique todas as sanções tipificadas na lei,
para que, por fim, possa encontrar-se legitimado a despedir o trabalhador que, por meio de
várias condutas tem vindo a infringir o regulamento da empresa ou deveres que lhe são
legalmente impostos. É verdade que o despedimento deve ser a ultima ratio, mas também
não devemos olvidar o facto de que uma conduta, tão grave que seja, possa, desde logo,
viabilizar o despedimento, tornando impossível a manutenção do vínculo e inútil a aplicação
de outras sanções que, dado o seu caráter conservatório, não se vislumbrarão eficazes.
Referimos que a lista disposta no nº2 do artigo 351º é meramente exemplificativa – e agora
acentuamo-lo. Tanto poderá suceder que uma determinada causa/motivo consubstancie
justa causa sem estar prevista naquele elenco, como também poderá ocorrer que se
verifique uma das alíneas daquele preceito sem, no entanto, tal consubstanciar justa causa.
Tudo depende do que seja apurado concretamente, tendo em conta a gravidade da infração
e a culpa do infrator, sempre através de juízos objetivos.
Para que se possa, então, proceder ao despedimento (por facto imputável ao trabalhador)
é conditio que se verifique um pressuposto de cariz material: a justa causa. Contudo, tal não
basta, sendo necessário que, cumulativamente, o despedimento seja precedido de um
procedimento – o procedimento disciplinar (requisito processual). Assim sendo,
encontramo-nos em condições de concluir que a verificação de um facto que consubstancie
justa causa não é bastante para que o empregador se posicione em condições de proceder
à imediata cessação do contrato de trabalho. Ora, à luz do vertido nos artigos 352º e
seguintes, mas numa lógica que já resultava impregnada no artigo 329º, nº6, o empregador
deverá instaurar um procedimento disciplinar com o intuito de, por fim, poder fazer cessar
o vínculo. E, neste domínio, esta tramitação assume mais relevância se tivermos em
consideração que para a aplicação de outras sanções, este procedimento se basta, grosso
modo, com a audiência prévia do trabalhador. É que, agora, não se visa a aplicação de uma
sanção de natureza conservatória, mas antes de cariz extintivo.
Ademais, a estatuição do artigo 381º determina a ilicitude do despedimento, quando este
não seja precedido do respetivo procedimento (alínea c)), da qual retiramos a importância

102
Direito do Trabalho

que o legislador confere a esta fase processual, chegando, inclusivamente, ao ponto de


inutilizar a existência de justa causa136.
O procedimento disciplinar que, de certa forma, constitui a antecâmara do despedimento
(se procedente a pretensão do empregador) inicia-se com a comunicação escrita ao
trabalhador, pelo empregador, da intenção de proceder ao seu despedimento, à qual vai
anexa a nota de culpa (artigo 353º, nº1), da qual deve constar a descrição dos factos que se
lhe imputam (ideia de acusação). Devem ser metidas cópias da acusação (entenda-se, em
sentido amplo) à comissão de trabalhadores e, sendo o trabalhador representante sindical,
à associação sindical respetiva (nº2). Posto isto, o trabalhador goza de 10 dias úteis para se
defender, consultando o processo e respondendo à nota de culpa, devendo esta ser
deduzida por escrito e integrada pelos elementos que considera relevantes para esclarecer
os factos e a sua participação dos mesmos, cumulando, sendo caso disso, os documentos
que lhe convier e, outrossim, a solicitação das diligências probatórias que se afigurem
preponderantes para a descoberta da verdade (artigo 355º).
Requeridas as diligências probatórias, seguir-se-á uma fase instrutória onde estas se
realizarão, devendo o empregador (ou quem encarregue desta fase) prover nesse sentido
(artigo 356º, nº1). A preterição de algumas formalidades que devem ocorrer neste
momento processual, não implica a ilicitude do despedimento mas, como dissemos, apenas
a redução da indemnização a que o trabalhador teria, em princípio, direito.
Terminada a realização das diligências probatórias, o empregador, havendo comissões de
trabalhadores, deve apresentar-lhes a cópia do processo (nº5). Esta entidade (tal como a
associação sindical se o trabalhador for representante) podem emitir um parecer
fundamentado.
Não havendo comissão de trabalhadores (ou havendo, aplica-se o nº2 do artigo 357º), o
empregador dispõe de 30 dias para proferir a decisão de despedimento, findo o qual o seu
direito de punir se extingue (este prazo de caducidade acresce aos dispostos no artigo 329º).
Contudo, para que a decisão de despedimento produza os seus efeitos, é necessário que
seja comunicada ao trabalhador – exige-o o nº6 do artigo 357º -, determinando a sua
receção a imediata cessação do contrato de trabalho.
Este procedimento pode, eventualmente, ser antecedido de uma fase prévia de inquérito
(artigo 352º), a qual destinar-se-á para fundamentar a nota de culpa (artigo 352º).
Por outro lado, o procedimento em caso de microempresa é distinto, assumindo um caráter
mais simplificado137 (artigo 358º), porquanto se dispensam inúmeras formalidades que,
normalmente, devem respeitar-se.
Durante o desenrolar das diligências procedimentais, o empregador pode requerer a
suspensão preventiva do trabalhador do seio empresarial, vedando o acesso ao seu local de
trabalho (ao estabelecimento da empresa onde o trabalhador agora acusado presta o seu
serviço) – artigo 329º, nº5. É certo que este não fica prejudicado a nível económico, uma
vez que continua a receber a retribuição, mas a decisão que determine a suspensão
preventiva do trabalhador, causa-lhe, desde logo, o transtorno de não poder prestar a sua

136
Note-se que não é suscetível de provocar a ilicitude as meras irregularidades a que se refere o nº2 do
artigo 389º.
137
Caso de aplicação do Direito do Trabalho, atento ao critério disposto no artigo 100º CT.

103
Direito do Trabalho

atividade, o que de per si já se afigura um tanto ou quanto oneroso. Ainda que a lei não o
admite expressamente, e por forma a evitar alguns abusos que, em certos casos poder-se-
iam protelar de forma mais ou menos longa no tempo (desde a emissão da nota de culpa –
ou, eventualmente, antes -, até à decisão), admite-se o recurso à via judicial para se
impugnar tal medida adotada unilateralmente pelo empregador. Nesse caso, o tribunal
deverá ponderar objetivamente sobre a adequação dessa medida e, sendo estas
injustificada – isto é, não se afigurando inconveniente a presença do trabalhador -, poderá
qualificar-se como abuso de direito.

Subtítulo II – Despedimento por extinção do posto de trabalho

Neste subtítulo (bem como no subsequente) estará em causa uma modalidade de cessação
de contrato de trabalho que se funda na existência de justa causa objetiva (objetiva porque,
desta feita, o facto que origina a pretensão de fazer cessar o contrato não é imputável ao
trabalhador). E, às características próprias da justa causa patentes nesta modalidade,
cumulam-se algumas próprias do despedimento coletivo que, a seu tempo, teremos
oportunidade de analisar, ainda que, quando tal se impuser, nos debruçaremos sobre elas
de um modo superficial.
Dita o artigo 367º, nº1 que se considera despedimento por extinção de posto de trabalho
a cessação de contrato de trabalho promovida pelo empregador e fundamentada nessa
extinção, quando esta seja devida a motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos,
relativos à empresa. Dito isto, é legítimo questionarmo-nos sobre o que são, para estes
efeitos, considerados motivos de mercados, estruturais ou tecnológicos, cuja resposta nos
vem a ser dada pelo artigo 359º, nº2. Vislumbrar-se-ia de pouca utilidade, transcrevermos
para aqui a redação da referida norma, no entanto não podermos alhear-nos ao facto de,
neste momento, nos poder parecer que esta modalidade de despedimento e despedimento
coletivo, em grande medida, coincidem. Essa observação não é, de todo, descabida mas,
conforme estudaremos, estas modalidades operam mediante pressupostos diferentes –
nomeadamente, de cariz quantitativo (no sentido em que mais adiante lhe impregnaremos).
A admissibilidade da cessação de contrato de trabalho por extinção de posto de trabalho
está subordinada à verificação de alguns requisitos. Senão vejamos: antes de mais, já o
dissemos, o empregador tem de fundar a sua pretensão em motivos de mercado, estruturais
ou tecnológicos (definidos nos termos do artigo 359º, nº2); os motivos indicados não sejam
devidos a conduta culposa de nenhum das partes (seja do empregador ou do trabalhador);
seja praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho (subjaz a este requisito
uma ideia de inexigibilidade)138; não existam, na empresa, contratos de trabalho a termo
para tarefas correspondentes às do posto de trabalho extinto; não seja aplicável o
despedimento coletivo – resulta, é claro, a exteriorização da natureza subsidiária ou
supletiva que o legislador ousou dar a esta modalidade de cessação de contrato de trabalho.
Ou seja, só opera se não estivermos perante uma hipótese em que se aplique o
despedimento coletivo (o que, não raro, pode suceder).

138
E é-lhe (ao empregador) inexigível que faça subsistir o vínculo quando não disponha de outro
compatível com a categoria profissional do trabalhador.

104
Direito do Trabalho

Se forem vários os trabalhadores que se integram na mesma secção, ocupando postos de


trabalho idênticos, a decisão do empregador deve versar sobre o trabalhador que registe
pior avaliação de desempenho; menores habilitações académicas e profissionais; maior
onerosidade pela manutenção do vínculo laboral do trabalhador para a empresa; menos
experiência na função; em último caso, pela menor antiguidade na empresa (nº2 do artigo
368º). Ora, encontrando-se vários trabalhadores em situação/posição idêntica, o
empregador deverá, atendendo e respeitando os critérios enunciados, proferir a sua
decisão (consentânea com estes) – só deve atender ao critério subsequente, se o que lhe
precede não for, in casu, aplicável ou não resolver de per si o conflito.
Em todo o caso, o empregador deve – e resulta implícito do nº4 do artigo 368º - demonstrar
que não existe na empresa outro posto de trabalho que possa ser exercido pelo trabalhador
cujo posto foi extinto ou, tendo-lhe sido oferecido, este não aceitou.
Finalmente, e antes de passarmos à análise do procedimento a levar a cabo pelo
empregador, cumpre-nos alertar para o disposto no nº3 do artigo 368º; é que, tendo um
trabalhador sido transferido para outro posto de trabalho, nos três meses anteriores ao
início do procedimento para despedimento, que ao abrigo deste venha a ser extinto, tem
direito a ser reafetado ao posto de trabalho anterior, caso este ainda exista.
O procedimento inicia-se com a comunicação do empregador, por escrito, à comissão de
trabalhadores e ao trabalhador da necessidade de extinguir o posto de trabalho, alegando
os motivos justificativos – tecnológicos, estruturais ou de mercado - e a necessidade de
despedir o trabalhador afeto ao posto de trabalho a extinguir, desde que seja explícito ao
ponto de se conseguir depreender o nexo de causalidade entre os motivos alegados e a
respetiva extinção do posto (artigo 369º, nº1); bem como os critérios para seleção dos
trabalhadores a despedir (cf. artigo 368º, nº2).
Recebida a comunicação, o trabalhador e a comissão de trabalhadores (ou outras
entidades, sendo caso disso) têm um prazo de 15 dias para emitir um parecer fundamentado
ao empregador relativos aos elementos integrantes da comunicação daquele; podendo,
ademais, requerer no prazo de cinco dias úteis a intervenção da inspeção do trabalho, por
forma a averiguar sobre a veracidade e conformidade com a lei dos critérios invocados e
descritos na comunicação do empregador (artigo 370º, nº1 e nº2), tendo esta entidade um
prazo de sete dias para enviar o seu relatório ao requerente e ao empregador.
Culmina o procedimento, como não poderia deixar de ser, com a decisão do empregador,
tendo para o efeito cinco dias (a contar nos termos do artigo 371º, nº1), da qual deve constar
as indicações a que se refere o nº2 da referida norma.
A decisão deve ser comunicada ao trabalhador (e a outras entidades) com a antecedência
a que se refere o nº3 do artigo 371º, que varia conforme a antiguidade do trabalhador – de
15 a 75 dias. Durante o período de aviso prévio (até ao seu termo), o empregador deverá
colocar à disposição do trabalhador a compensação devida – a calcular nos termos prescrito
para o despedimento coletivo (artigo 366º, para o qual remete o artigo 372º) -, os créditos
vencidos e os exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho (artigo 368º, nº5).
Aliás, é aconselhável que o empregador atue dessa forma, sob pena de o despedimento ser
considerado ilícito por força da alínea d) do artigo 384º.

105
Direito do Trabalho

Por outro lado, e porque assim o dita o artigo 372º, o trabalhador terá, durante o aviso
prévio, um direito a crédito de horas correspondente a dois dias de trabalho por semana
(artigo 364º, nº1) e pode, outrossim, fazer cessar o contrato mediante denúncia com um
aviso prévio reduzido de apenas três dias (artigo 365º).
A ratio do aviso prévio em benefício do trabalhador é conceder-lhe a oportunidade de
procurar um novo emprego e, de preferência, que o consiga durante o período em que
aquele vigore.
Resta-nos, por fim, fazer referência à ilicitude de despedimento por extinção de posto de
trabalho, cujo regime se encontra vertido no artigo 384º CT. As causas que podem
determinar a ilicitude da cessação do vínculo através desta modalidade são várias e, por
isso, falaremos daquelas que ainda não abordámos (é que, não esqueçamos, existe um
regime comum, já abordado, de ilicitude – cf. artigo 381º, com as respetivas consequências
dispostas no artigo 389º): não se verifique um dos requisitos consagrados no nº1 do artigo
368º (cumulativos); o empregador desrespeite os critérios hierarquizados, cuja aplicação
deve respeitar a ordem de precedência pela qual foram redigidos no nº2 do artigo 368º; o
empregador não proceda às comunicações impostas pelo artigo 369º; e ter desrespeitado
o disposto no artigo 368º, nº5 (e o artigo 371º, nº4).
Todas estas causas são suscetíveis de determinar a ilicitude de despedimento, com o que
isso importa a aplicação das consequências prescritas no artigo 389º.

Subtítulo III – Despedimento por inadaptação ao posto de trabalho

Trataremos, agora, de uma modalidade que, partindo de pressupostos distintos,


consubstancia justa causa objetiva de despedimento.
Esta funda-se na cessação do contrato de trabalho pelo empregador, motivada pela
inadaptação superveniente do trabalhador ao posto de trabalho (artigo 373º). E esta
inadaptação superveniente supõe a existência de um de dois cenários: a ocorrência de
modificações no posto de trabalho (nº1 do artigo 375º) ou a modificação substancial da
prestação realizada pelo trabalhador (nº2 do artigo 375º), operando, cada um deles,
mediante a verificação de diferentes requisitos cumulativos que, a seu tempo,
identificaremos.
Fica, pois, mais facilitada a exclusão do quadro de pessoal da empresa de trabalhadores
mais desgastados, com uma idade mais avançada e, também por isso, menos permeáveis às
inovações tecnológicas que, numa ótica de facilitar o trabalho e fomentar a produção, são
introduzidas nos processos produtivos da empresa.
Em todo o caso, a inadaptação superveniente há de verificar-se quando se verifique(m) o
preenchimento de alguma(s) alínea(s) do nº1 do artigo 374º, e assim: em caso de redução
de produtividade ou de qualidade, avarias repetidas nos meios afetos ao posto de trabalho,
risco para a segurança e saúde do trabalhador, de outros trabalhadores ou de terceiros; e
nos demais casos que se enquadrem no nº2 (e sem prejuízo da proteção de que gozam os
trabalhadores com capacidade de trabalho reduzida, deficiência ou doença crónica (nº3).
Voltando ao artigo 375º, para que a cessação do contrato de trabalho por inadaptação
superveniente do trabalhador possa operar é imperioso que, quando sejam promovidas

106
Direito do Trabalho

modificações no posto de trabalho se verifiquem outros requisitos; a saber: tenha sido


ministrada formação profissional adequada às modificações do posto de trabalho; tendo
sido facultado ao trabalhador, após a sua formação, um período de adaptação de, pelo
menos, 30 dias; e que não exista na empresa outro posto de trabalho disponível e
compatível com a categoria profissional do trabalhador. Da enunciação destes requisitos,
retiramos que, para que o empregador se encontre legitimado a proceder à cessação do
contrato, deve, prima facie, adotar um conjunto de diligência com vista à adaptação do
trabalhador, e só se esta perdurar, não sendo o logro alcançada, nesse caso, é que poderá
fazer cessar o contrato. Mas não só. É preciso, ademais, que no seio da empresa não exista
outro posto de trabalho disponível e compatível com a categoria profissional do
trabalhador139; ora, só nesse cenário é que o empregador poderá, então, fazer cessar o
contrato com fundamento na inadaptação superveniente do trabalhador às modificações
introduzidas no posto de trabalho.
Dissemos que pode suceder que, apesar de não serem introduzidas quaisquer
modificações, a prestação do trabalhador se modifique substancialmente (artigo 375º, nº2,
alínea a) CT). Esta alteração deve ser de tal modo evidente que, em face das circunstâncias,
se possa deduzir que, com alguma probabilidade, será definitiva (“redução continuada de
produtividade ou de qualidade, avarias repetidas nos meios afetos ao posto de trabalho (…)
que, em face das circunstâncias, seja razoável prever que tenham um caráter definitivo”).
Mas, para que a pretensão do empregador se possa fundar na modificação substancial da
prestação realizada pelo trabalhador, impõe-se que, cumulativamente, se verifiquem
outros pressupostos: o empregador deve informar o trabalhador dos factos dos quais retira
a modificação substancial da prestação; deve, de seguida, emitir ordens e instruções com o
intuito de o corrigir e conceder-lhe um período de adaptação e a devida formação. Ora, mais
uma vez, exige-se que o empregador, antes de mais, diligencia com o logro de corrigir e
readaptar o trabalhador ao seu posto de trabalho.
Tomadas todas as diligências legalmente impostas sem que o trabalhador se consiga
(re)adaptar, considera-se que é praticamente impossível (inexigível) ao empregador manter
o vínculo.
Afastado o trabalhador por inadaptação, impõe-se à empresa que mantenha o seu nível de
emprego nos 90 dias seguintes ao despedimento, com o que isso importa a admissão de
novo trabalhador para o posto de trabalho que ficou vago (artigo 380º).
No concernente ao procedimento que deve ser adotado, cumpre-nos, grosso modo,
remeter para o que tivemos oportunidade de dizer quanto ao que deve ser adotado para o
despedimento por extinção de posto de trabalho. Em síntese, este inicia-se com a
comunicação do empregador ao trabalhador (artigo 376º) que, posteriormente, terá a
possibilidade de se defender (artigo 377º - 10 dias). Culminará esta fase processual com a
decisão a proferir, no prazo de 30 dias, pelo empregador que, sendo caso disso, será
precedida de uma fase instrutória (artigo 378º, nº1).

139
O que, em todo o caso, deve provar.

107
Direito do Trabalho

Também aqui deve mediar um período entre a comunicação da decisão ao trabalhador e


a data em que se pretende ver cessar o vínculo laboral, o qual variará consoante a
antiguidade do trabalhador (artigo 378º, nº2).
Os direitos de que é titular o trabalhador despedido por inadaptação coincide, em muito,
com os de que goza o despedido através de despedimento coletivo (artigo 379º). Assim, se
não for respeitado o prazo mínimo de aviso prévio, o contrato cessa decorrido o período de
aviso prévio em falta a contar da comunicação de despedimento, devendo o empregador
proceder ao pagamento da retribuição correspondente a esse período; o pagamento da
compensação – a calcular nos termos do artigo 366º - deve ocorrer até ao final do aviso
prévio, bem como o dos créditos vencidos e dos exigíveis por efeito da cessação do contrato
de trabalho. Há, igualmente, lugar à aplicação do regime de crédito de horas vertido no
artigo 364º.
Do artigo 385º resultam as causas que, especificamente, podem ditar a ilicitude de
despedimento por inadaptação (sem embargo das que constam do artigo 381º). Vale,
mutatis mutandis, o que dissemos para o despedimento por extinção de posto de trabalho,
na medida em que as causas são em tudo idênticas.

Subcapítulo VI – Despedimento Coletivo

Deixamos, agora, a análise de modalidades de despedimento individual, para passarmos à


análise do despedimento coletivo, cuja admissibilidade não é, de todo, nova no nosso
ordenamento jurídico-laboral (tendo, inclusive, já alguma tradição). Como a própria
designação sugere, em causa está um requisito de ordem quantitativa, porquanto o que
aqui se passa – e não olvidemos o que dissemos anteriormente, nomeadamente no que
respeita à modalidade de despedimento por extinção de posto de trabalho -, é o
rompimento (ou, em termos técnicos, a cessação) de vínculos laborais de mais do que um
trabalhador, durante um determinado lapso de tempo. Este requisito, ainda que não se
abdique da verificação de outros, é o que primacialmente caracteriza esta modalidade de
despedimento.
Feito o introito, debrucemo-nos sobre o preceituado no artigo 359º: considera-se
despedimento coletivo a cessação de contratos de trabalho promovida pelo empregador e
opera simultânea ou sucessivamente no período de três meses, abrangendo, pelo menos,
dois ou cinco trabalhadores, conforme se trate, respetivamente, de microempresa ou de
pequena empresa, por um lado, ou de média de grande empresa, por outro (…). Impõe-se,
então, a exigência quantitativa a que nos referimos, ou seja, para que o despedimento seja
coletivo é necessário que, antes de mais, se faça cessar – de forma simultânea ou sucessiva
- uma pluralidade de vínculos laborais, durante um hiato temporal de três meses. Mas para
que estejamos perante um despedimento coletivo, tal não basta; à cessação de contratos
de trabalho sob esta modalidade, devem alhear-se quaisquer fatores ou elementos de
índole subjetiva, isto é, de factos que, de uma forma ou de outra, poderão ser imputados
aos trabalhadores. É que, nesse caso, atento à individualidade e pessoalidade de cada
conduta, em causa não estará um despedimento coletivo – ainda que se faça cessar uma
pluralidade de vínculos -, mas um despedimento individual (porventura, por facto imputável

108
Direito do Trabalho

ao trabalhador). Esta modalidade só funciona quando em causa estejam razões de natureza


objetiva, sendo o que resulta, aliás, do artigo 359º - (…) sempre que aquela ocorrência se
fundamente em encerramento de uma ou várias secções ou estrutura equivalente ou
redução do número de trabalhadores determinada por motivos de mercado, estruturais ou
tecnológicos.
Sintetizando, para que opere o despedimento coletivo é, por um lado, imposto que se
proceda a uma cessação em massa de vínculos laborais, limitada temporalmente por um
período de três meses (será maior a exigência no caso das médias e grandes empresas, do
que em relação às microempresas e pequenas empresas – cf. artigo 100º CT) e,
cumulativamente, que essa cessação surja em virtude de motivações objetivas – e, por isso,
não imputáveis aos trabalhadores -, quais sejam: motivos de mercado, estruturais ou
tecnológicos140.
Não o dissemos, mas na génese da cessação dos contratos de trabalho abrangidos pelo
despedimento coletivo, deve estar em causa um mesmo razão – que de per si justifique ou
o imponha. Neste contexto, não vigora uma ideia de justa causa, não se referindo sequer a
lei a uma ideia de inexigibilidade que, conforme vimos, carateriza e é requisito de outras
modalidades de despedimento individual. Donde se poderia suscitar a conformidade desta
modalidade com o princípio da segurança do emprego – artigo 53º; no entanto, é
entendimento pacífico que esta modalidade, por se tratar de uma medida de gestão da
empresa, contendente, por isso, com a liberdade de iniciativa económica, se situa fora do
escopo daquele preceito. É que seria demasiado oneroso impor ao empregador a
permanência de vínculos quando, por exemplo, uma súbita redução da procura que se torne
permanente, deixasse de justificar a sua vigência141.
Tal como qualquer modalidade até agora abordada, também o despedimento coletivo deve
ser precedido do respetivo procedimento, sendo certo que o desrespeito por esta imposição
legal determina a ilicitude do despedimento, nos termos do artigo 381º, alínea c). Desta
feita, as exigências processuais, se não se afiguram mais rígidas, assumem outra relevância
e uma tramitação em parte diversa, relativamente à imposta noutras modalidades, o que se
entende na medida em que nos situamos perante despedimento coletivo, com o que isso
importa a cessação simultânea ou sucessiva de vários vínculos contratuais.
Ora, o legislador veio impor uma fase de comunicação, uma fase de consulta e uma fase de
negociação – sendo esta última, para já, uma novidade.
O processo inicia-se com a comunicação, por escrito, do empregador dirigida à comissão
de trabalhadores ou, não a havendo, a cada um dos trabalhadores abrangidos pela medida,
da qual deve constar a intenção de despedir, alegando, nomeadamente, os motivos
invocados para o despedimento coletivo, o número de trabalhadores a despedir e as
categorias profissionais abrangidas e os critérios para seleção dos trabalhadores a despedir
– estes, ao contrário dos requisitos que operam para o despedimento por extinção de posto

140
Cf. artigo 359º, nº2 CT.
141
Este exemplo permite-nos concluir, em princípio, pela inevitabilidade da cessação dos contratos. No
entanto, nem sempre assim é pelo que, não raro, dada a margem de decisão de que gozam os
empregadores, poderão verificar-se despedimentos coletivos que, antolhando-se injustificados, são
inatacáveis.

109
Direito do Trabalho

de trabalho (artigo 368º, nº2) podem ser definidos pelo empregador, sendo certo que, em
todo o caso, estes não poderão ser discriminatórios (cf. artigo 53º CRP e artigo 381º, alínea
a) CT). Segue-se, nos cinco dias posteriores à comunicação feita pelo empregador, uma fase
de negociação e de informações que, diga-se, também deve ser este a promovê-la (artigo
361º, nº1 CT). O logro desta fase é que, através de cedências mútuas, se possa acordar outra
solução diversa da do despedimento (inicialmente pretendido)142. De entre as soluções
possíveis, podem as partes acordar na suspensão dos contratos de trabalho (cf. artigos 298º
e seguintes, sem prejuízo do disposto no nº2 do artigo 361º), na redução dos períodos
normais de trabalho, na reconversão ou reclassificação profissional ou na reforma
antecipada ou pré-reforma – estamos, é claro, a falar de uma negociação entre a entidade
empregadora e, porventura, a comissão de trabalhadores143.
Partilhamos, porque achamos oportuno fazê-lo, a citação de Monteiro Fernandes144 no
concernente ao objetivo a que se vota a fase de negociação: a obtenção de “um acordo
sobre a dimensão e efeitos das medidas a aplicar e, bem assim, de outras medidas que
reduzam o número de trabalhadores a despedir”.
A lei impõe, nesta fase de negociação, a coadjuvação do serviço competente do ministério
responsável pela área laboral no controlo da legalidade e na promoção do acordo entre as
partes, tendo em conta o seu interesse (artigo 362º, nº1). Contudo, a esta entidade está
vedada uma intervenção decisiva, preponderante e, mais do que isso, vinculativa no
resultado. Tudo se passa entre a comissão representativa dos trabalhadores (qual seja) e a
entidade empregadora, cabendo a estas partes a negociação dos termos do acordo sendo
este possível, já que, por sempre, será na sua esfera jurídica (naturalmente, dos
trabalhadores, ainda que em sua representação atue um órgão) que se irão repercutir os
efeitos daquele.
Não havendo comissão representativa dos trabalhadores, esta fase de negociação e de
informações não pode existir, pelo que, nesse cenário, deve, desde logo, o empregador
comunicar a sua intenção a cada um dos trabalhadores (artigo 360º, nº3), podendo
proceder de imediato à elaboração da decisão final nos 15 dias posteriores à data da
comunicação inicial (artigo 363º, nº1).
Alcançado ou não o logro a que se vota a fase de negociação, deve o empregador dar conta
da sua decisão, comunicando-a a cada um dos trabalhadores afetados, no prazo de 15 dias
a contar nos termos do artigo 363º, nº1. Esta comunicação deverá ser feita, no mínimo, com
uma antecedência de 15 dias e, no máximo, de 75 dias, consoante a antiguidade do
trabalhador, relativamente à data em que pretenda fazer cessar o contrato de trabalho.
(data essa que, em todo o caso, deve constar da comunicação escrita da decisão).
O desrespeito pelos prazos legais de aviso prévio, prejudica a cessação do vínculo na data
pretendida pelo empregador. Dita o nº4 que, nesse caso, o contrato só cessa findo o período
de aviso prévio legalmente imposto, estando o empregador obrigado a pagar a retribuição
correspondente a esse lapso temporal. Ademais, durante este período cada trabalhador

142
Mais uma vez se encontra patente a natureza de ultima ratio do despedimento.
143
No entanto, a aplicação das medidas a que se referem as alíneas c) e d) do nº1 do artigo 361º
depende do acordo do trabalhador.
144
In ob. cit., 775.

110
Direito do Trabalho

tem direito a um crédito de horas correspondente a dois dias de trabalho por semana (artigo
364º, nº1)145, podendo, inclusive, fazer cessar o vínculo laboral mediante denúncia com a
antecedência mínima de três dias úteis, sem perda do direito à retribuição (artigo 365º).
No respeitante à compensação (diz-se compensação porque, à partida, esta deriva de uma
cessação lícita do contrato de trabalho pelo empregador), o trabalhador tem direito a uma
prestação pecuniária que corresponda a 12 dias de retribuição base e diuturnidades por
cada ano completo de antiguidade, cujo cálculo deve ser feito com respeito pelo nº2 (do
artigo 366º). Mais uma vez, o pagamento desta compensação até ao final do aviso prévio
(bem como o dos créditos vencidos e os que se tornem exigíveis em virtude da cessação do
vínculo) é conditio da licitude do despedimento – artigo 383º, alínea c).
Digno de nota afigura-se o conteúdo que consta do artigo 366º, nº4. É que resulta
inequivocamente deste preceito que se presume que o trabalhador aceita o despedimento
quando recebe do empregador a totalidade da compensação. Ora, trata-se de uma
presunção relativa – iuris tantum – que, por isso, pode ser ilidida (nos termos gerais)
mediante prova em contrário, admitindo-o o nº5. Mas o conteúdo deste último preceito
reduz-se, na verdade, às hipóteses em que o trabalhador, não aceitando o despedimento,
mas tendo aceitado a compensação na sua totalidade, queira intentar uma ação de
impugnação fundada na ilicitude daquele. Pois que, só entregando ou pondo à disposição
do empregador a totalidade da compensação, é que este poderá impugnar judicialmente o
despedimento. Ora, na linha de António José Moreira e de Monteiro Fernandes146, parece-
nos que esta norma não é, de todo, feliz; atento à situação de afogo económico em que o
trabalhador se encontre após o despedimento, pode ver-se na necessidade de gastar o
montante que lhe foi atribuído a título compensatório. Tal irá constituí-lo na impossibilidade
de restituir a compensação o que, por conseguinte, impossibilita a instauração de ação de
impugnação de despedimento, se só mais tarde este der conta da ilicitude de que se revestiu
aquele. Pois, bem, assim sendo, outro cenário não se poderá vislumbrar que não seja o da
prevalência da ilicitude que, em certa medida, acaba por ser patrocinado pelo vertido no
nº4 e nº5 do artigo 366º.
Também o despedimento coletivo pode ser ilícito, bastando que (não obstante os
fundamentos gerais dispostos no artigo 381º) se verifique, concretamente, um dos
fundamentos que se encontram especificamente previstos para esta modalidade no artigo
383º.
A ilicitude do despedimento coletivo só pode ser apreciada por tribunal judicial (artigo
388º), tendo o interessado seis meses a contar da data da cessação do contrato para propor
a respetiva ação.
Em todo o caso, também aqui e enquanto não seja tomada uma decisão sobre a licitude ou
ilicitude, o trabalhador pode requerer a suspensão preventiva do despedimento, devendo o
tribunal julgar procedente a sua pretensão, caso se encontrem reunidos os pressupostos
atinentes à admissibilidade das providências cautelares (vertidos no CPC) e, também, de

145
A ratio deste direito é conceder a possibilidade de, durante dois dias por semana, o trabalhador ir
procurar um novo emprego, sem que isso implique a perda da retribuição.
146
Ob cit., 781.

111
Direito do Trabalho

alguns que possam ser exigidos pelo Código de Processo de Trabalho – compreendidos entre
os artigos 34º a 40º.

Capítulo XV – Direito de Greve

Conhecido de todos nós é o direito de greve que, de certa forma, foi objeto de estudo –
ainda que abordado superficialmente – na unidade curricular de Direitos Fundamentais. Na
verdade, com assento constitucional no artigo 57º CRP que, sistematicamente se situa
abrangido pelo Título II da lei fundamental, este direito consubstancia um dos direitos,
liberdades e garantias, em específico dos trabalhadores.
Poder-se-ia equacionar erradamente, mas partindo do pressuposto que a greve não é
compatível com a prestação da atividade do trabalhador, que o seu exercício poderia
legitimar o empregador a fazer cessar os contratos de trabalho dos trabalhadores que a ela
adiram. Em princípio, o empregador não tem esse direito, consagrando a legislação laboral,
no artigo 536º, nº1 que a greve implica apenas a suspensão do vínculo laboral, com o que
isso importa algumas consequências dignas de nota, das quais adiante nos ocuparemos.
Por ora, cumpre-nos evidenciar e dissecar o substrato e o filão axiológico, a razão de ser do
direito de greve, para depois, oportunamente, nos ocuparmos das consequências/efeitos
que do exercício deste direito advêm.
O direito de greve (ou à greve) não se traduz numa mera liberdade, mas num verdadeiro
direito, na medida em que a abstenção de trabalho por parte do trabalhador pressuposto
daquela, prevalece sobre os interesses do empregador e, por isso, por ele tem de ser
suportada. Contudo, é preciso entendermos este desenho em termos restritivos, uma vez
que nem toda a paralisação de trabalho se afigura lícita; aliás, só será lícita a paralisação
resultante do direito de greve que se funde na reivindicação de pretensões (regalias,
direitos) que, direta ou indiretamente, se repercutam na relação jurídico-laboral
estabelecida pelo respetivo trabalhador com o seu empregador.
Em causa está, então, um direito de todos os trabalhadores, o que resulta do artigo 530º,
nº1, mas que também já resultava da concatenação/articulação do artigo 57º CRP com o
artigo 13º CRP – Princípio da Igualdade. Ademais, o nº2 do preceito constitucional referido
retira ao legislador a possibilidade de vir limitar o exercício deste direito por parte dos
trabalhadores.
A titularidade deste direito pertence a cada trabalhador individualmente considerado,
ainda que a greve se apresente como um direito de exercício coletivo, implicando a
participação de um grupo de trabalhadores, em princípio, pertencentes à mesma classe
profissional.
A greve pressupõe – já o dissemos – a abstenção da prestação da atividade contratada pelo
trabalhador. Mas não se trata de uma qualquer abstenção, e com isto queremos significar
que esta deve ser total e absoluta, ou seja, o trabalhador recusa pura e simplesmente a
prestar a atividade prometida para que, dessa forma, através de uma espécie de
reclamação, consiga – coletivamente, conjuntamente com outros trabalhadores – alcançar
o logro a que se vota a greve à qual este decidiu aderir. Por isso, excluídos deste escopo se

112
Direito do Trabalho

encontram as denominadas “meias greves” e, bem assim, a atividade prestada pelo


trabalhador, cujo modus de prestação é regida por critérios definidos por este (e não com o
empregador), com o intuito de, eventualmente, prejudicar a sua entidade patronal.
As motivações que levam à greve não são indiferentes. Apesar do artigo 57º, nº2 CRP e do
próprio artigo 530º, nº2 CT não se debruçarem sobre esta questão ou, debruçando-se,
deixam um campo demasiado lato, a verdade é que a definição do âmbito de interesses a
defender através da greve não pode naturalmente ser objeto do arbítrio dos trabalhadores,
uma vez que, se assim fosse, justificada por sempre a licitude da greve, qualquer motivo
serviria admitido para ser levada a cabo, e não parece, de todo, ter sido essa a intenção do
legislador. Desde logo, as motivações grevistas não podem, de forma alguma, contender
com outros direitos fundamentais da comunidade – e de cada um -, ao ponto de os negar
ou destruir; na verdade, se se admitisse a greve dos médicos, sem que a ele se estabelecesse
qualquer limite, negar-se-ia o direito à saúde e, por certo, indiretamente (talvez) o direito à
vida de uns quantos cidadãos. Para evitar esse cenário, vêm os artigos 537º e 538º
estabelecer os serviços que devem ser assegurados durante a greve. Por outro lado, e
interpretando o artigo 57º, nº2 CRP à luz do contido no Decreto-Lei n.º 392/74, de 27/8,
parece que a greve deve fundar-se “na defesa e promoção dos interesses coletivos
profissionais dos trabalhadores”. Assim, grosso modo, e sem prejuízo de visões doutrinárias
discordantes, a greve traduz-se na reivindicação, pelos trabalhadores, de melhores
condições contratuais e, por isso, é motiva por interesses socioprofissionais daqueles.
A ilicitude da greve pode fundar-se em razões de ordem distinta: uma, já vimos, traduz-se
nas motivações que se situam na sua origem, e outra tem a ver com adoção do procedimento
que a lei impõe para o exercício do direito de greve – e deste agora trataremos.
Competência para declarar a greve têm, em princípio, os sindicatos; no entanto, ainda que
tal seja de verificação rara na prática, a assembleia de trabalhadores da empresa pode
deliberar o recurso à greve desde que a maioria dos trabalhadores não esteja representada
por associações sindicais, a assembleia seja convocada para o efeitos por 20% ou 200
trabalhadores, a maioria dos trabalhadores participe na votação e a deliberação seja
aprovada por voto secreto por maioria dos votantes (artigo 531º).
Decidido o recurso à greve, a decisão deve ser comunicada à entidade empregador e ao
Ministério do Trabalho com a antecedência mínima de cinco dias úteis ou, no caso das
empresas abrangidas pelo artigo 537º, nº1, de 10 dias (artigo 534º, nº1). Visa-se com a
imposição de um aviso prévio, por um lado, proibir-se a greve surpresa e, por outro,
conceder-se a possibilidade de, em tempo suficiente, serem estipulados os serviços mínimos
e preparar a entidade empregadora e os utentes para as perturbações e prejuízos que, em
resultado da greve, poderão ter de suportar. Esta decisão, da qual deve constar o aviso
prévio, deve ser comunicada por escrito ou através dos meios de comunicação social.
Da decisão deve constar o enunciado objetivo das finalidades que se pretendem atingir com
a greve, para que se possa, também, limitar o seu escopo. E, do aviso prévio, deve constar
a data e hora do início da greve, sendo certo que não é necessário indicar-se quando se dará
o seu termo, podendo esta protelar-se por tempo indeterminado. Contudo, estipulando-se
uma data de termo, considera-se que esta vincula a entidade declarante, pelo que, caso esta
pretenda alargar o período durante o qual se estenderá a greve, deve emitir um novo pré-

113
Direito do Trabalho

aviso. Pelo contrário, cessando a greve em momento anterior ao estipulado, não existe
nenhuma outra formalidade à qual se deva dar provimento, uma vez que o término precoce
da greve consubstancia um menor prejuízo para os seus destinatários, quais sejam: a
entidade empregadora e os utentes de bens e serviços fornecidos pela empresa.
Durante a greve, o empregador não pode substituir os grevistas por pessoas que, à data do
aviso prévio, não trabalhavam no respetivo estabelecimento ou serviço, nem pode, desde
dessa data, admitir trabalhadores para aquele fim (artigo 535º). Desde logo, exclui-se o
recrutamento de novos trabalhadores e, atento ao disposto no nº2 vedada também se
encontra a possibilidade de se recorrer a uma empresa para a prossecução da tarefa a que
está afeto um trabalhador grevista, salvo se for necessário para assegurar os serviços
mínimos. Em regra, é inadmissível a substituição dos trabalhadores que hajam aderido à
greve147.
Com o pré-aviso, qualquer trabalhador que se possa considerar abrangido pelo âmbito da
greve pode, por via da adesão, exercer esse seu direito.
A adesão à greve é uma faculdade atribuída a cada trabalhador individualmente
considerado de nela participar. In extremis, poderá suceder que uma greve seja convocada
e porque nenhum trabalhador quis aderir, não chega a consumar-se. Daí que, ainda que não
se possa negar o seu caráter coletivo, esta revela, por certo, uma feição individualista, uma
vez que não se efetivará se os trabalhadores, ao abrigo da sua capacidade de
autodeterminação, não aderirem a ela.
Ora, questão que deve ser agora abordada é a de saber como pode o empregador ter
conhecimento da adesão à greve por partes dos seus trabalhadores. Neste contexto, temos
de distinguir dois grupos: os trabalhadores filiados no sindicato declarante da paralisação –
quanto a estes, parece que a mera abstenção da prestação de trabalho é bastante para que
o empregador reconheça a sua adesão; e os trabalhadores membros de sindicatos não
declarantes de greve e os trabalhadores não sindicalizados – quanto a estes, impõe-se-lhes
que demonstrem a sua vontade em aderir à greve e, assim sendo, que, por meio de
comunicação ao empregador, lhe levem o conhecimento da sua pretensão.
Precisamente para evitar que uma greve declarada não chegue a efetivar-se por falta de
adesão, a lei veio admitir os piquetes de greve (artigo 533º). De modo a persuadir os
trabalhadores a aderirem à greve, podem as associações sindicais ou a comissão de greve
desenvolver atividades que, em todo o caso, se traduzam em meios pacíficos. Donde, todos
os meios não pacíficos não adotados nesta atividade de persuasão se consideram excluídos
do escopo desta norma, sendo ilícitos; é que, além do mais, deve sempre respeitar-se a
liberdade de trabalho dos não aderentes.
O termo da greve opera, em conformidade com o preceituado pelo artigo 539º, por acordo
das partes, por deliberação de entidade que a tenha declarado ou no final do período para
o qual foi declarada (o que contende, neste último caso, com a aposição de uma data de
termo no aviso prévio que, sabemos nós, não é obrigatória). Enquanto a greve não terminar,
os trabalhadores estarão abrangidos pelo regime da suspensão dos contratos de trabalho

147
Como ensina Monteiro Fernandes, A lei pretende assim obviar ao “esvaziamento” do direito de greve
por expedientes destinados a manter a laboração sem significativo acréscimo de encargos – in ob. cit.,
1066.

114
Direito do Trabalho

(artigo 536º, nº1), mas se esta terminar e os trabalhadores continuarem sem prestar a
atividade contratada, não comparecendo no local de trabalho, deixarão de estar protegidos
pelo direito de greve, aplicando-se o regime das faltas injustificadas (o que pode
desencadear uma atuação disciplinar que, inclusive, pode determinar o despedimento por
facto imputável ao trabalhador – artigo 351º, nº2, alínea g) e artigo 541º).
Um dos principais – se não o principal – efeito da greve é, sem dúvida, a suspensão dos
contratos de trabalho dos trabalhadores aderentes (artigo 536º). Contudo, não se trata de
uma aplicação no todo idêntica do regime vertido nos artigos 294º e seguintes; desde logo
porque a suspensão por facto respeitante ao trabalhador (artigo 296º) impõe que a causa
em apreço não seja imputável ao trabalhador, o que no contexto da adesão à greve não
sucede. É que o trabalhador recusa prestar o trabalho e adere à greve, o que consubstancia
um ato volitivo da sua parte, o que lhe é imputável. Por outro lado, também a suspensão do
contrato de trabalho tal como é considerada nos seus termos gerais pressupõe que a
atividade não seja prestada durante um hiato temporal mais ou menos prolongado, o que,
em caso de greve, dificilmente ocorrerá – esta, em regra, estender-se-á durante umas horas
ou dias.
A suspensão do contrato implica, tal como é consagrada no artigo 536º, a suspensão da
retribuição e dos deveres de assiduidade e de subordinação (cf. artigo 128º, nº1, alínea b)
e nº2). Contudo, mantêm-se outros direitos, deveres e garantias, nomeadamente, os que
não pressuponham a efetiva prestação do trabalho – referimo-nos, porque se reveste de
maior relevância, ao dever de lealdade (cf. artigo 128º, nº1, alínea f) CT) que, sendo
desrespeitado, poderá legitimar o empregador a atuar disciplinarmente (poder disciplinar).
O nº3 do artigo 536º vem, por seu turno, estabelecer que, durante a suspensão, se continua
a contar a antiguidade – o que é relevante, mormente no cálculo da compensação ou
indemnização devida em caso de despedimento.
Atendendo ao disposto no artigo 540º é proibido ao empregador praticar atos que
impliquem a coação, prejuízo ou discriminação de trabalhador por motivo de adesão ou não
a greve. Pretendeu o legislador evitar futuras retaliações por parte da entidade
empregadora, considerando nulos todos os atos que se subsumam na previsão normativa
deste preceito.
Adiantámos que a ilicitude da greve pode, em situações contadas, resultar das suas
motivações, já que na maioria das vezes este juízo deriva da violação de formalidades
procedimentais a adotar para o adequado exercício do direito à greve. Afiançamos, pois,
que poderão determinar a ilicitude da greve, por exemplo, a utilização de meios violentos
em piquetes, não coadunáveis com os meios pacíficos a que se refere o artigo 533º; o
desrespeito pelo prazo de pré aviso que a lei impõe; a declaração da greve resulte de quem
não tem legitimidade para tal nos termos do artigo 531º.
Pois, bem, ao trabalhador que aderir a greve ilícita é aplicável o regime das faltas
injustificadas (cf. artigo 256º)148, podendo inclusivamente ter de indemnizar o empregador
pelos prejuízos que lhe possa ter causado a sua ausência (artigo 541º).

148
Deve, em todo o caso, provar o empregador que os trabalhadores conheciam da ilicitude da greve.

115
Direito do Trabalho

Durante a greve, devem ser assegurados os denominados serviços mínimos, assegurados


pelos trabalhadores. De facto, existem setores de atividade que se afiguram fundamentais
para a conservação do bem-estar de cada um (e da comunidade no geral), pelo que a lei
impõe a prestação de serviços mínimos que, dentro do possível, e em contexto de greve,
possam satisfazer as necessidades da comunidade. A elas se refere, prima facie, o nº1 do
artigo 537º quando alude à satisfação de necessidades sociais impreteríveis através de
serviços mínimos indispensáveis. Como não poderia deixar de ser, o legislador limitou149 o
direito à greve neste sentido: é que, em todo o caso, o exercício deste direito não pode
contender – excluindo ou atentando – com direitos fundamentais, como são o direito à vida
(artigo 24º CRP) ou outros. E diz mais, especificando quais as empresas ou estabelecimentos
que se considera destinar-se à satisfação de necessidade sociais impreteríveis: os correios,
os hospitais, os bombeiros, entre outros (nº2).
Por outro lado, e de acordo com o nº3, os trabalhadores devem prestar os serviços
necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações; ora, visa-se,
sobretudo, assegurar a operacionalidade futura da organização produtiva.
A determinação dos serviços mínimos faz-se de acordo com o preceituado no artigo 538º
CT. No entanto, não convém esquecermo-nos (e se ainda não o frisámos, fá-lo-emos agora)
de que o aviso prévio deve conter uma proposta de definição de serviços necessários,
entendidos aqui em sentido amplo, pretendendo-se englobar tanto os afetos à satisfação
de necessidades sociais impreteríveis como à segurança e manutenção de equipamentos e
instalações (artigo 534º, nº3)150. Estes devem ser determinados por instrumento de
regulamentação coletiva de trabalho ou por acordo entre representantes dos trabalhadores
e empregadores (nº1 do artigo 538º). Na falta de previsão de instrumento de
regulamentação coletiva de trabalho, convoca-se o Ministério do Trabalho para que venha
coadjuvar na negociação dos serviços mínimos e dos meios necessários para os assegurar.
Diga-se, a final, que a definição destes serviços deve respeitar sempre os princípios da
necessidade, da adequação e da proporcionalidade – artigo 538º, nº5.
Se incumpridos os serviços mínimos, o Governo pode determinar a requisição ou
mobilização civil, nos termos do artigo 541º, nº3.
Por fim, é importante denotar que o direito à greve é irrenunciável (artigo 530º, nº3). Pelo
que, em regra, são inadmissíveis e proibidas cláusulas de paz social absolutas – ainda que
estipuladas em convenções coletivas de trabalho -, porquanto violariam um direito
fundamental do trabalhador: o direito à greve (artigo 57º CRP). Já as cláusulas de paz social
relativa podem, sendo fruto de negociação coletiva, considerar-se lícitas, admitindo-o de
forma mais ou menos expressa o artigo 542º, nº1 CT. Em suma, admite-se que o direito de
greve seja limitado, não podendo nunca ser totalmente restringido ou aniquilado.

149
“Limites externos” do direito de greve.
150
O que sendo desrespeitado poderá inclusive determinar a ilicitude da greve.

116
Direito do Trabalho

Capítulo XVI – Proibição do Locaute (ou lock-out)

A proibição do locaute está constitucionalmente consagrada no artigo 57º, nº4 da


Constituição da República Portuguesa e, a nível ordinário, no artigo 544º, nº2 do Código de
Trabalho.
Poder-se-ia equacionar que o lock-out é uma espécie de antítese ou de correspetivo do
direito de greve, situando-se, desta feita, na esfera jurídica do empregador, não fosse este
proibido entre nós. O que não está, de todo, errado.
Considera-se lock-out qualquer paralisação total ou parcial da empresa ou a interdição do
acesso a locais de trabalho a alguns ou à totalidade dos trabalhadores e, ainda, a recusa em
fornecer trabalho, condições e instrumento de trabalho que determine ou possa determinar
a paralisação de todos ou alguns setores da empresa, desde que, em qualquer caso, vise
atingir finalidades alheias à normal atividade da empresa, por decisão unilateral do
empregador.
Três razões se apontam como justificadoras da proibição do lock-out151: o encerramento
pode atingir trabalhadores que sejam alheios ao conflito ou não aderentes à greve, o que
limita a liberdade de trabalho; atento à posição débil do trabalhador, a greve parece ser um
meio aproximador de duas posições ambíguas – do empregador e do trabalhador. Ora, já
assim não é no lock-out, uma vez que este meio acentua as diferenças e reforça o poder do
empregador; a greve, embora seja um direito concedido a cada trabalhador, é de
concretização e de exercício coletivo – votando-se à defesa de interesses de uma
coletividade -, ao passo que o lock-out, operando por meio de uma decisão unilateral do
empregador, apenas visa a prossecução dos interesses deste.

151
Ob. cit., 1092-1093.

117
Direito do Trabalho

Índice
Capítulo I – Introdução ................................................................................................................. 2
Subcapítulo I – Funções do Direito do Trabalho.......................................................................... 3
Capítulo II – Formação e Evolução do Direito do Trabalho ......................................................... 5
Subcapítulo I – A Evolução do Direito do Trabalho em Portugal ................................................ 8
Capítulo III – “Características” do Direito do Trabalho ............................................................... 9
Subcapítulo I – Direito do Trabalho Concertado ou Pluralmente Pactuado .............................. 9
Subcapítulo II – Laboralização da Constituição ou Constituição do Direito do Trabalho ........ 10
Subcapítulo III – Desadministrativização e Desaplicação do Direito do Trabalho ................... 12
Capítulo IV – As Fontes ............................................................................................................... 13
Subcapítulo I – A Hierarquia das Fontes .................................................................................... 18
Capítulo V – O Contrato de Trabalho ......................................................................................... 19
Subcapítulo I – Elementos do Contrato de Trabalho................................................................. 19
Subcapítulo II – Diferenciação do Contrato de Trabalho .......................................................... 21
Subcapítulo III – As Presunções de Existência de um Contrato de Trabalho............................ 22
Subcapítulo IV – As “Situações Equiparadas” ao Trabalho Juridicamente Subordinado ......... 23
Subcapítulo V – Caracterização Jurídica do Contrato de Trabalho ........................................... 24
Subcapítulo VI – As Cláusulas Acessórias .................................................................................. 24
Subcapítulo VII – A Invalidade do Contrato de Trabalho .......................................................... 25
Capítulo VI – Contratos de Trabalho “Atípicos” ........................................................................ 26
Subcapítulo I – Contrato a Termo (Resolutivo) ......................................................................... 26
Subcapítulo II – O Trabalho Temporário.................................................................................... 34
Subcapítulo III – Contrato de Trabalho em Comissão de Serviço ............................................. 40
Subcapítulo IV – Contrato de Trabalho Intermitente................................................................ 43
Subcapítulo V – Contrato de Trabalho a Tempo Parcial ........................................................... 44
Subcapítulo VI – Contrato de Trabalho com Pluralidade de Trabalhadores ............................ 46
Subcapítulo VII – Contrato de Trabalho Subordinado à Distância (Teletrabalho) ................... 47
Capítulo VII – Suspensão do Contrato de Trabalho e a Redução de Atividade ........................ 50
Subcapítulo I – Suspensão do Contrato de Trabalho por Causa Ligada ao Trabalhador ......... 52
Subcapítulo II – Suspensão do Contrato de Trabalho por Facto Ligado à Empresa ................. 53
Subcapítulo III – Suspensão de Contratos de Trabalho em Situações de Crise Empresarial (lay
off) ............................................................................................................................................... 55
Subcapítulo IV – A Redução da Atividade.................................................................................. 59
Subcapítulo V – Pré-Reforma ..................................................................................................... 60
Capítulo VIII – Formação do Contrato de Trabalho ................................................................... 61
Subcapítulo I – Formas de Celebração do Contrato de Trabalho ............................................. 64

118
Direito do Trabalho

Subcapítulo II – Período Experimental ...................................................................................... 65


Subcapítulo III – Trabalhador-Estudante ................................................................................... 66
Capítulo IX – Local de Trabalho .................................................................................................. 68
Capítulo X – Obrigações ............................................................................................................. 70
Subcapítulo I – Do trabalhador: A atividade contratada .......................................................... 70
Subcapítulo II – Do empregador: A retribuição ......................................................................... 74
Capítulo XI – Tempo de Trabalho ............................................................................................... 77
Subcapítulo I – Direito à Desconexão ........................................................................................ 80
Capítulo XII – As descontinuidades da Prestação de Trabalho ................................................. 80
Subcapítulo I – Férias.................................................................................................................. 81
Subcapítulo II – Faltas................................................................................................................. 83
Capítulo XIII – Poderes do Empregador ..................................................................................... 84
Subcapítulo I – Poder Regulamentar ......................................................................................... 84
Subcapítulo II – Poder de Direção .............................................................................................. 85
Subcapítulo III – Poder Disciplinar ............................................................................................. 86
Subtítulo I – Processo de Despedimento Disciplinar ................................................................. 89
Capítulo XIV – A Cessação do Contrato de Trabalho ................................................................. 90
Subcapítulo I – Revogação ......................................................................................................... 92
Subcapítulo II – Caducidade ....................................................................................................... 93
Subcapítulo III – Rutura do contrato pelo trabalhador ............................................................. 96
Subtítulo I – Denúncia ................................................................................................................ 96
Subtítulo II – Resolução .............................................................................................................. 97
Subtítulo III – Extinção irregular do contrato pelo trabalhador ............................................... 98
Subtítulo IV – Abandono do trabalho ........................................................................................ 98
Subcapítulo IV – Regime comum do despedimento ................................................................. 99
Subcapítulo V – Despedimento individual............................................................................... 101
Subtítulo I – Despedimento por facto imputável ao trabalhador .......................................... 101
Subtítulo II – Despedimento por extinção do posto de trabalho ........................................... 104
Subtítulo III – Despedimento por inadaptação ao posto de trabalho .................................... 106
Subcapítulo VI – Despedimento Coletivo ................................................................................ 108
Capítulo XV – Direito de Greve ................................................................................................ 112
Capítulo XVI – Proibição do Locaute (ou lock-out) .................................................................. 117

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