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17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

PROTEÇÃO AO TRABALHADOR MIGRANTE

PROTEÇÃO AO TRABALHADOR MIGRANTE


Revista de Direito do Trabalho | vol. 67 | p. 3 | Mai / 1987
Doutrinas Essenciais de Direito Internacional | vol. 3 | p. 1117 | Fev / 2012
Doutrinas Essenciais de Direito do Trabalho e da Seguridade Social | vol. 3 | p. 1029 | Set /
2012DTR\1987\240
Arnaldo Sussekind
Ministro aposentado do TST

Área do Direito: Trabalho

Sumário:

I - Conceito de trabalhador migrante

Trabalhador migrante é aquele que se transfere para um país que não é o seu, com o ânimo de
nele se integrar ou, pelo menos, de trabalhar em caráter não transitório.
2. Guillermo Cabanellas, de saudosa memória, em volume escrito com Luis Alcalá e Zamora Castillo,
acentuou a propósito: "La imigración se configura por el traslado o llegada a un país, que no és el
propio, con idea de establecerse en él, definitiva o prolongadamente, y trabajar, exercer profisión
o desplegar alguna otra actividad lucrativa" ( Tratado de Política Laboral y Social, Buenos Aires,
Editorial Heliosta, 1973, t. II, p. 433).
3. A Convenção 97/49, da OIT, que dispõe sobre o trabalhador migrante, o define como "Toda
persona que emigra de un país a otro para ocupar un empleo que no habrá de exercer por su
propia cuenta, e incluye a cualquier persona normalmente admitida como trabajador migrante"
(art. 11, § 1.º).
4. Esse tratado multilateral, que se encontra ratificado por 38 países, inclusive o Brasil, se aplica
tanto aos trabalhadores recrutados e contratados em virtude de acordos sobre migrações
coletivas sobre o controle governamental (Anexo II), como aos recrutados e contratados
diretamente pelos respectivos empregadores (Anexo I). Tem por objetivo, portanto, o trabalhador
que emigra do seu país para exercer um emprego no país receptor, e não o que neste pretende
estabelecer-se por conta própria. Daí a limitação constante da definição supra transcrita,
repetida, mais tarde, pela Convenção 143/75 (ratificada por apenas 15 países), na parte em que
visa a garantir "la igualdad de aportunidades y de trato en materia de empleo o profesión,
seguridad social, derechos sindicales y culturales y liberdades individuales y colectivas para las
personas que, en su condición de trabajadores migrantes o como miembros de su família, se
encuentrem legalmente en su território" (art. 10).
5. O ânimo de integrar-se no país receptor ou, pelo menos, de nele trabalhar em caráter não
eventual, constitui pressuposto essencial à caracterização do trabalhador imigrante. Daí estatuir o
§ 2.º do art. 11 da Convenção de 1975:
"La presente parte del convenio no se aplicará a: a) los trabajadores fronteirizos; b) los artistas y
las personas que ejerzan una profesión liberal y que entren en el país por un período de corta
duración; c) la gente del mar; d) las personas que hayen entrado en el país con fines especiales
de formación o de educación; e) las personas empleadas en organizaciones o empresas que
operan dentro del territorio de un país que han sido admitidas temporalmente en dicho país, a
solicitud de sus empleadores, para cumplir trabajos o funciones específicas por un período definido
o limitado de tiempo y que están obligados a abandonar el país al término de sus trabajos o
funciones".
6. No Brasil, a Lei 6.815/80, que define a situação jurídica do estrangeiro, depois de prescrever
que "O visto permanente poderá ser concedido ao estrangeiro que pretenda se fixar
definitivamente no Brasil" (art. 16, caput), acentuou: "A imigração objetivará, primordialmente,
propiciar mão-de-obra especializada aos vários setores da economia nacional, visando à Política
Nacional de Desenvolvimento em todos os seus aspectos e, em especial, ao aumento da
produtividade, à assimilação de tecnologia e à captação de recursos para setores específicos"
(parágrafo único do art. cit.).
7. As normas de seleção de imigrantes são estabelecidas, em nosso país, pelo Conselho Nacional
de Imigração (art. 17 da Lei cit.), sendo que "A concessão do visto permanente poderá ficar
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condicionada, por prazo não superior a cinco anos, ao exercício de atividade certa e à fixação em
região determinada do território nacional" (art. 18 da Lei cit.).
8. O termo migração se aplica também a movimentos populacionais verificados dentro de um país.
Mas às migrações internas não se aplicam as normas internacionais relativas ao tema, sendo certo
que o direito de livre circulação no território nacional impossibilita a proibição de deslocamentos
demográficos capazes de afetar o desenvolvimento sócio-econômico harmonioso e desejado. A
essas migrações internas se aplicam, porém, se for o caso, as convenções internacionais sobre a
abolição do trabalho forçado (Convenção OIT n. 29/30, ratificada por 129 países; Convenção OIT
n. 105/57, ratifica da por 109 países; ambas ratificadas pelo Brasil).
II - Normas de proteção ao trabalhador migrante
9. Recorda Daniel Antokoletz que, ao surgir a legislação de proteção ao trabalho e de Previdência
Social, foi suscitada a questão da sua aplicabilidade aos trabalhadores estrangeiros, visto que
numerosos Códigos Civis, baseados no Código de Napoleão, exigiam a reciprocidade contratual ou
legal para a aquisição dos direitos sociais por parte dos imigrantes ( Tratado de Legislación
delTrabajo y Previsión Social, Buenos Aires, Ed. Guillermo. Kraft, 1941, vol. I, pp. 220/1).
Começaram, então, os Estados a celebrar tratados bilaterais de trabalho e Previdência Social,
com o objetivo de equiparar os trabalhadores estrangeiros aos nacionais. O primeiro desses
instrumentos foi concluído em 1904 entre a França e a Itália. A esse se seguiram diversos
tratados dispondo sobre a reciprocidade de tratamento ( Bélgica - Luxemburgo, em 1905; França
- Inglaterra, em 1909; Alemanha - Espanha, em 1913); sendo que, após a guerra de 1914, foram
celebrados inúmeros outros dispondo, não apenas sobre a reciprocidade de tratamento, mas
regulando a migração de trabalhadores, o recrutamento coletivo, o controle dos respectivos
contratos de trabalho etc.
10. Vale sublinhar, neste passo, que o art. 427 do Tratado de Versailles incluiu entre as
finalidades da OIT, instituída nesse Pacto de 1919, o princípio de que "As regras que em cada país
se adotam com referência às condições de trabalho deveriam assegurar um tratamento econômico
equitativo a todos os operários residentes legalmente no país". E a Constituição da OIT, no seu
preâmbulo, inseriu, entre os seus objetivos, a "proteção dos interesses dos trabalhadores
ocupados no estrangeiro".
11. Em decorrência da expansão dos sistemas de seguridade social depois da 2.ª Guerra Mundial,
multiplicaram-se os tratados bilaterais sobre a conservação dos direitos do trabalhador migrante,
adquiridos ou em curso de aquisição no país de emigração, para o efeito de lhe serem concedidos,
no país receptor, as prestações de seguro social e as de natureza assistencial. Por outro lado, a
instituição de organismos regionais para a integração econômica da região, cujo exemplo mais
eloqüente é a Comunidade Econômica Européia, enseja a aplicação comum de normas de Direito
do Trabalho e de Seguridade Social aos nacionais dos correspondentes países, aos quais assegura
maiores facilidades para a circulação de pessoas e bens.
12. Conforme assinala Nicolas Vacticos, "la reglamentación internacional que ha de intervenir en
esto campo puede, evidentemente, tomar distintas formas, teniendo en cuenta la naturaleza de
los problemas considerados: en cuanto a las custiones de alcance general y de carater universal,
las normas internacionales han de determinarse en convenios o recomendaciones de la OIT, pero
ciertos aspectos de estos problemas necesitan igualmente la conclusión de acuerdos técnicos y
precisos en base bilateral o regional" ( Derecho Internacional del Trabajo, ed. espanhola, Madrid,
Tecnos, 1977, p. 137).
13. Aduza-se que a multiplicação das empresas multinacionais, com a conseqüente transferência
de empregados de um a outro país, não coloca o trabalhador estrangeiro em situação de
desvantagem frente ao nacional, dada a prevalência no Direito Comparado do princípio da
territorialidade das leis sociais-trabalhistas. A aplicação desse princípio constitui a regra geral para
a solução dos conflitos de leis no espaço em matéria de contrato de trabalho e comporta apenas
algumas justificadas exceções. (Cf. nosso Conflitos de Leis do Trabalho, Rio, Freitas Bastos,
1979).
14 . No caso de empresas multinacionais, não é rara a concessão de melhores condições de
trabalho ao estrangeiro transferido, em detrimento do trabalhador local. Essa discriminação pode
ser atenuada com a adoção do princípio do salário igual para trabalho igual, sem distinção de
nacionalidade, e a observância de uma determinada proporcionalidade, seja em relação ao número
de nacionais empregados, seja no tocante à remuneração que lhes correspondem na folha global
de salários (cf., p. ex., a legislação brasileira: arts. 352, 354, parágrafo único, e 358 da CLT
(LGL\1943\5)).
15. Por fim, entre as normas de proteção ao imigrante, nos campos de Direito do Trabalho e da
Seguridade Social, incluem-se as leis nacionais: as de hierarquia constitucional, de proteção ao
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trabalho e de Previdência Social, que proíbem distinguir entre nacionais e estrangeiros, salvo nos
casos excepcionais e justificadamente previstos. Mutatis mutandis, a convenção coletiva
aplicável ao contrato de trabalho do imigrante, ainda que empregado transferido de empresa
multinacional, também o beneficia, pois o seu "caráter territorial é unanimemente reconhecido"
("Deuxième Congrès International de Droit du Travail" "Rapport Géneral", OIT, Genève, 1957, p.
302).
16. No Brasil, a Constituição "assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade" (art.
153, caput), na conformidade dos direitos e garantias individuais constantes dos 36 parágrafos
desse artigo. Tirante as exceções expressamente consignadas no texto constitucional, não poderá
haver discriminação entre brasileiros e estrangeiros para o exercício de cargos e atividades
econômicas. Essas exceções, que não podem ser ampliadas pela legislação ordinária, reserva aos
brasileiros natos o exercício de alguns cargos de relevo e de certas atividades de interesse da
segurança nacional (arts. 145, parágrafo único, 173, § 1.º, e 174, § 1.º) e aos brasileiros em geral
o acesso aos cargos públicos (art. 97). O art. 106 do Estatuto do Estrangeiro ( Lei 6.815)
enumera, numa relação imperfeita, os cargos e atividades econômicas que não podem ser
exercidos por estrangeiro.
17. Quanto aos direitos sociais-trabalhistas, tanto as normas jurídicas de proteção ao trabalhador,
como a legislação de Previdência Social, são igualmente aplicáveis a brasileiros e estrangeiros.
Como bem assevera Segadas Vianna, "A Constituição brasileira, no que concerne à proteção ao
estrangeiro que vem trabalhar em nosso país, pode ser apontada como uma das mais liberais, pois
lhe assegura os mesmos direitos do brasileiro, inclusive o do livre exercício de qualquer profissão,
observadas as condições de capacidade que a lei estabelecer (art. 153, § 23), admitindo,
entretanto, a fixação de percentagens de brasileiros nos serviços públicos dados em concessão e
nos estabelecimentos de determinados ramos do comércio e da indústria (art. 165, XII)" (
Instituições deDireito do Trabalho, Rio, Freitas Bastos, 9.ª ed., 1984, p. 827).
18. Sublinhe-se, porém, que a exigência legal de 2/3 de brasileiros em determinados ramos da
economia, com a mesma proporcionalidade em relação à folha de salários da correspondente
empresa (art. 354 da CLT (LGL\1943\5)), configura medida de amparo ao trabalhador nacional e
não de discriminação ou contra o trabalhador estrangeiro. Aliás, cabe realçar que os estrangeiros
com mais de 10 anos de residência no país, que tenham cônjuge ou filho brasileiro, assim como os
portugueses residentes no Brasil, estão equiparados aos brasileiros para a composição da
precitada proporcionalidade (art. 353 da CLT (LGL\1943\5)).
III - Normas da OIT sobre migração
19. Dentre os múltiplos objetivos da atividade normativa, dos estudos e investigações e dos
programas de cooperação técnica da OIT, no campo da migração, destacam-se: a) igualdade de
oportunidades e de tratamento em matéria de emprego, compreendendo a formação profissional,
aos serviços de colocação e as condições de trabalho; b) igualdade de tratamento quanto aos
direitos sindicais e aos demais direitos humanos decorrentes das liberdades individuais e coletivas;
c) igualdade de tratamento no que tange à seguridade social e aos programas assistenciais,
inclusive no setor da habitação; d) abolição das migrações abusivas e do tráfego clandestino de
mão-de-obra.
20. Releva ponderar que a Conferência Mundial do Emprego (Genebra - 1976), realizada pela OIT
por solicitação das Nações Unidas, enfatizou que a estratégia da referida Organização
especializada, compreendendo os seus programas de cooperação técnica, deve ser o de evitar o
aumento excessivo e não controlado dos movimentos migratórios, oferecendo aos trabalhadores
soluções mais interessantes no seu próprio país.
21. Ressalvadas algumas exceções, as convenções e recomendações adotadas no âmbito da OIT
não distinguem entre o trabalhador nacional e o estrangeiro. Não obstante, alguns instrumentos
são explícitos no sentido de que suas disposições se aplicam sem distinção de nacionalidade,
sendo que outras prevêem medidas especiais em favor dos trabalhadores migrantes.
22. A Convenção 19/25 (ratificada por 106 países, inclusive o Brasil), tem objetivo específico: a
igualdade de tratamento em matéria de acidentes do trabalho, contemplando os trabalhadores
estrangeiros e seus herdeiros, na base da reciprocidade entre os países que a ratificaram e sem
condição de residência (art. 1, §§ 1.º e 2.º).
23. A Convenção 88/48 (ratificada por 70 países, inclusive o Brasil), concernente ao serviço de
emprego, complementada pela Recomendação 83, do mesmo ano; a Convenção 96/49 (ratificada
por 38 países), alusivo às agências remuneradas de colocação, e, bem assim, a Convenção 122/64
(ratificada por 70 países, inclusive o Brasil), relativa à política de emprego e complementada pela
Recomendação 122, do mesmo ano, contêm, todas elas, disposições de remarcado interesse para
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o imigrante.
24. A Convenção 97/49 (ratificada por 38 países, inclusive o Brasil), que reviu a de n. 66/39, e é
complementada pela Recomendação 86, do mesmo ano, e a Convenção 143/75 (ratificada por 15
países), complementada pela Recomendação 151, do mesmo ano, estabelecem normas gerais
sobre o problema migratório. Como assinalou a Comissão de Expertos na Aplicação de Convenções
e Recomendações da OIT, enquanto que a primeira visa "a eliminar as desigualdades de
tratamento resultantes da ação dos poderes públicos, a última tem, além de outras finalidades, a
"de fomentar a igualdade de oportunidades e eliminar as discriminações na prática" ( Informe III -
Parte 4-B; 66.ª reunião da Conferência, Genebra, 1980, p. 97). O art. 6.º da Convenção 97, que
se aplica tanto às migrações de trabalhadores organizados e sob controle governamental, como às
espontâneas, obriga os Estados que a ratificaram a aplicar aos imigrantes que se encontrem
legalmente nos seus territórios, sem discriminação, um tratamento não menos favorável do
concernente aos seus próprios nacionais, nos seguintes setores: a) principais aspectos das
condições de trabalho, formação profissional, filiação às organizações sindicais, direito às
vantagens estipuladas nas convenções coletivas e habitação - na medida em que estas matérias
estejam reguladas pela legislação ou dependem das autoridades administrativas; b) seguridade
social, sob reserva de certos acordos; c) impostos, taxas e contribuições devidas como
trabalhador; d) ações judiciais relativas às questões aqui mencionadas.
25. A Convenção 143/75 compreende duas partes: migrações em condições abusivas e igualdade
de oportunidade e de tratamento. Os Estados, ao ratificá-la, podem excluir uma dessas partes
(art. 16). No que tange à igualdade, o instrumento se inspirou nas normas da Convenção 111/58,
referente à discriminação em matéria de emprego e profissão; mas possibilita certas restrições ao
acesso a empregos ou funções, quando assim o exija o interesse do Estado (art. 14, "c").
26. A Convenção n. 118/62 (ratificada por 35 países, inclusive o Brasil), mais abrangente do que a
de n. 19/25, dispõe, também na base da reciprocidade, sobre a igualdade de tratamento entre
nacionais e estrangeiros em matéria de seguridade social. O princípio fundamental desse tratado
está inscrito no seu art. 3.º: "1 - Todo Membro para o qual a presente Convenção esteja em vigor
deverá conceder, em seu território, aos nacionais de qualquer outro Estado-membro para o qual
esta Convenção esteja igualmente em vigor, igualdade de tratamento com os seus próprios
nacionais no que se refere à sua legislação, tanto no que concerne aos requisitos de admissão,
como ao direito às prestações, em todos os ramos da seguridade social a respeito dos quais haja
aceito as obrigações da Convenção".
Nos termos do art. 2.º, o país, ao ratificar essa Convenção, pode aceitar suas obrigações em
relação a uma ou mais das seguintes prestações, para as quais possua legislação aplicável no seu
território aos próprios nacionais: assistência médica e prestações de doença, maternidade,
invalidez, velhice, sobreviventes, acidentes do trabalho e doenças profissionais, desemprego e
familiares. É interessante ressaltar que esse tratado reconhece expressamente o direito de
represália, ao facultar que um Estado derrogue a aplicação da norma em relação a outro país que,
apesar de possuir legislação sobre a prestação a que aquele se obrigou, não concede igualdade de
tratamento aos seus nacionais (§ 3.º do art. 3.º). A Convenção faculta a fixação de prazos de
residência para a concessão de certas prestações aos estrangeiros, os quais não poderão exceder
de seis meses, nos casos de maternidade e desemprego; cinco anos, nos de invalidez e morte; e
10 anos, no de velhice (art. 4.º, § 2.º).
27. Sendo os sistemas de seguridade social constituídos de normas de Direito Público, impõe-se a
jurídica conclusão de que devem aplicar-se, igualmente, tanto aos nacionais, como aos
estrangeiros regularmente admitidos no respectivo país. O problema, em relação ao trabalhador
migrante, diz respeito ao cômputo, no país de imigração do período de filiação ao regime de
Previdência Social do país de onde emigrou.
28. Com essa finalidade, foi aprovada, em 1935, a Convenção 48, dispondo sobre a conservação
dos direitos do trabalhador migrante em matéria de seguro social. Ratificado por apenas 8 países,
esse instrumento motivou, não obstante, a adoção de inúmeros tratados bilaterais sobre a
questão e despertou, para o tema, o interesse de diversos congressos e conferências. Sublinha-
se, a propósito, que a V Conferência dos Estados da América, Membros da OIT, realizada no Brasil
(Petrópolis), em 1952, concluiu que a maneira mais prática de dar solução adequada à
conservação dos direitos do trabalhador migrante, concernentes à Seguridade Social, consistiria
na celebração de tratados: a) plurilaterais, entre nações de imigração e de emigração,
corporificando os princípios mínimos sobre a Seguridade Social dos trabalhadores migrantes; b)
bilaterais, destinados a solver as questões de detalhe e as peculiaridades entre os países
convenentes. Também o 1.º Congresso Iberoamericano de Seguridade Social, reunido em 1951 na
capital espanhola, adotou tese de nossa autoria recomendando que "as nações iberoamericanas
procurem assegurar, mediante o correspondente documento diplomático, o estabelecimento,
quanto à seguridade social de seus nacionais residentes na zona Iberoamericana e nas Filipinas,
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dos princípios de não-discriminação, império da lei territorial e respeito aos direitos adquiridos ou
em curso de aquisição".
29. O precitado instrumento de 1935 foi recentemente revisto pela Convenção 157/82, cujo
objetivo é o estabelecimento de um sistema internacional para a conservação dos direitos em
matéria de Seguridade Social, que alcance todos os ramos ou prestações; mas, das regras
enunciadas, algumas dependerão de instrumentos bilaterais ou plurilaterais que garantam o
cumprimento das correspondentes obrigações "nas condições que estabeleçam de comum acordo
os Membros interessados" (art. 4.º, § 1.º). Consoante o estatuído no § 2.º do art. 4.º, as
seguintes normas serão aplicáveis, independentemente de qualquer acordo internacional
complementar, aos Estados-membros que ratificarem a Convenção:
a) "Se uma pessoa cumpriu períodos sob as legislações de três ou mais Membros que estejam
obrigados por diferentes instrumentos bilaterais ou multilaterais, esses períodos deverão ser
totalizados, na medida necessária, de conformidade com as disposições desses instrumentos, por
todo Membro simultaneamente obrigado por dois ou mais dos instrumentos pertinentes, para os
fins da aquisição, conservação ou recuperação do direito às prestações (§ 4.º do art. 7.º);
b) "O mesmo critério será aplicado em relação ao cálculo das prestações,"tendo em conta a
totalização dos períodos cumpridos ao amparo das legislações dos Membros mencionados" (§ 2.º
do art. 8.º);
c) "Se, pela aplicação dessas regras, "um Membro deva conceder prestações da mesma natureza
a uma pessoa em virtude de dois ou mais instrumentos bilaterais ou multilaterais, este Membro
estará obrigado a tornar efetiva somente a prestação mais favorável ao interessado", como tal
considerada no momento da concessão inicial dessas prestações (§ 3.º do art. 8.º);
d) "Todo Membro deverá assegurar o pagamento das prestações econômicas de invalidez, velhice
e sobrevivência, das pensões em caso de acidentes do trabalho e enfermidades profissionais e dos
abonos por falecimento, aos quais se haja adquirido direito em virtude da sua legislação, aos
beneficiários que sejam nacionais de um Membro, ou a refugiados ou apátridas, sem distinções
baseadas no lugar de sua residência, sob reserva das medidas a tomar com este fim, sempre que
sejam necessárias, de comum acordo entre os Membros ou outros Estados interessados" (§ 1.º do
art. 9.º);
e) "A norma anterior poderá deixar de ser aplicada em relação às prestações concedidas em
virtude de regimes transitórios e às especiais, de caráter não contributivo, concedidas a título de
socorro ou para auxiliar pessoas em situação de necessidade (§ 4.º do art. 9.º);
f) "As regras de reajustamento das prestações serão aplicáveis às concedidas de conformidade
com a Convenção (art. 11);
g) "As autoridades e instituições dos Estados-membros prestarão assistência mútua, a fim de
facilitar a aplicação da Convenção e de suas legislações (§ 1.º do art. 12). Essa ajuda
administrativa será, em princípio, gratuita; mas os Membros poderão acordar o reembolso de
certos gastos (§ 2.º do art. cit.);
h) "As autoridades, instituições e jurisdições de um Membro não poderão deixar de conhecer das
solicitações ou demais documentos que lhes sejam dirigidos, pelo fato de que estejam redigidos
num idioma oficial de outro Membro (§ 3.º do art. 12);
i) "Todo Membro deverá favorecer o desenvolvimento de serviços sociais para assistir às pessoas
amparadas pela presente Convenção, especialmente os trabalhadores migrantes, em suas relações
com suas autoridades, instituições e jurisdições, particularmente para facilitar sua admissão ao
gozo das prestações e ao exercício eventual de seus direitos de recurso, assim como para
fomentar seu bem estar pessoal e familiar (art. 14);
j) "Toda prestação mencionada no § 1.º do art. 9.º (V, alínea "d" supra) da presente Convenção,
que não haja sido concedida ou haja sido suspensa em razão da residência do interessado no
território de um Estado distinto do Membro competente, se tornará efetiva ou se restabelecerá,
por solicitação do interessado, a contar da data da entrada em vigor da presente Convenção para
este último Membro ou da data da entrada em vigor para o Membro do qual o interessado é
nacional, tomando-se em consideração a mais recente destas datas, salvo se o interessado
obteve anteriormente uma liquidação em forma de capital em lugar da aludida prestação. As
disposições da legislação do Membro competente relativas à prescrição ou extinção dos direitos
não serão aplicáveis ao interessado, quando presente sua solicitação dentro do prazo de dois
anos a partir da data referida, ou, se for o caso, a partir da data em que forem efetivadas as
medidas previstas no § 1.º do art. 9.º (§ 3.º do art. 18);
k) "Os Membros interessados determinarão, de comum acordo, à medida que o sistema de

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conservação de direitos em curso de aquisição se aplica a uma contingência ocorrida antes da


entrada em vigor deste sistema para estes Membros (§ 4.º do art. cit.)".
30. O princípio básico dessa recente Convenção da OIT consiste em que todo Estado-membro
"deverá esforçar-se em participar, com cada um dos demais Membros interessados, num sistema
de conservação de direitos em curso de aquisição", com referência a todos os ramos da
Seguridade Social, "em favor das pessoas que hajam estado sujeitas, sucessiva ou
alternativamente, às legislações" dos países interessados (art. 6.º).
IV - O expressivo exemplo das Comunidades Européias
31. Inspirada no êxito da Comunidade Econômica do Carvão e do Aço (CECA), que havia sido
criada pelo Tratado de Paris de 1951, seis Estados da Europa (República Federal da Alemanha,
Bélgica, França, Holanda, Itália e Luxemburgo) instituíram a Comunidade Econômica Européia(CEE)
pelo Tratado de Roma ele 1957, ao qual aderiram, mais tarde, outros países.
32. A CEE, a CECA e a EURATON (Comunidade Européia de Energia Atômica) formam as
Comunidades Européias, que possuem, em conjunto, o Conselho da Europa, o Parlamento Europeu,
uma Comissão Executiva, um Tribunal de Justiça (não obstante a competência conferida pelos
respectivos tratados aos tribunais nacionais) e um Tribunal de Contas (cf. Derecho Social
Europeo, de Ribas, Donezy, Seche e Garrido, Madrid, IES, 1980, pp. 176 a 191).
33. Dentre os instrumentos produzidos pelas Comunidades Européias no setor social-trabalhista,
merecem destaque: a Carta Social Européia e o Código Europeu de Seguridade Social, este
completado pela Convenção Européia de Seguridade Social. Esses tratados visam a estabelecer,
tanto quanto possível, um Direito uniforme regional, atendendo, assim, por via oblíqua, ao princípio
da isonomia entre o trabalhador nacional e o imigrante (v. o resumo da Carta Social Européia, do
Código Europeu de Seguridade Social e da Convenção que complementa esse código em nosso
Direito Internacional do Trabalho, São Paulo, LTr., 1983, pp. 291 e 292).
34. A mencionada Convenção Européia de Seguridade Social, adotada em 1972, contém normas
sobre a igualdade de tratamento entre nacionais e estrangeiros, a conservação dos direitos
adquiridos junto a sistemas nacionais de seguridade social que funcionam em outros países e a
transferência de prestações para pagamentos em outros países. Essa Convenção beneficia não
apenas os nacionais dos Estados contratantes, mas também os refugiados e apátridas que neles
residam e, bem assim, a todos os que, mesmo sem a condição de assalariado, necessitam das
prestações prescritas, quando no território de outro país que a ela haja aderido. Todas as
modalidades de prestações de seguridade social estão incluídas no diploma. Assinale-se, ainda,
que Estados não integrantes das Comunidades Européias podem aderir à Convenção.
35. Dentre as instituições regionais que compõem as Comunidades Européias, a CEE merece
especial destaque no que tange ao tema em foco. Além das normas de caráter social inseridas no
Tratado de Roma de 1957, a Comunidade pode expedir, sobre determinadas matérias,
regulamentos obrigatórios para os seus Membros e diretivas que lhes criam obrigações quanto aos
objetivos fixados, embora faculte aos Estados a escolha dos meios e da forma de alcançá-los. O
tratado proclama "a necessidade de promover a melhoria de condições de trabalho e de vida da
mão-de-obra", como "resultados do funcionamento do Mercado Comum", para harmonizar os
sistemas sociais dos Membros da Comunidade e nivelar, tanto quanto possível, "as medidas
legislativas, regulamentares e administrativas" (art. 117); assegura o direito de livre circulação e
de emprego dentro da Comunidade (art. 48); garante aos respectivos trabalhadores o direito às
prestações de seguridade social em cada um dos Estados-membros, com o cômputo do período
trabalhado nos outros (art. 51); relaciona, no art. 118, as questões que devem ser objeto de uma
ação comunitária, mediante colaboração estreita entre os seus Membros (emprego, direito ao
trabalho, condições de trabalho, formação e aperfeiçoamento profissional, seguridade social,
acidentes do trabalho e enfermidades profissionais, higiene no trabalho, direito sindical e
negociação coletiva); e, para promover a mobilidade geográfica e profissional dos trabalhadores no
âmbito da Comunidade, criou o "Fundo Social Europeu" (art. 123).
36. Ressalta Alonso Oléa que o principal objetivo da CEE é impedir que qualquer dos seus membros
"discrimine na aplicação de suas próprias normas contra o trabalhador estrangeiro procedente de
outro país da Comunidade, buscando a equiparação ao máximo com o trabalhador nacional (Lyon-
Caen e Giugni), ainda que possa pensar que, a largo tempo, se chegue a uma igualdade dos
direitos" ( Derecho del Trabajo, Madrid, Universidad de Madrid, 1971, p. 293). Obviamente, como
adverte esse ilustre professor, a liberdade de circulação, objeto de vários regulamentos, é
respeitada "com a reserva das limitações justificadas por motivos de ordem, de segurança e de
saúde públicas, que estão indissoluvelmente ligadas à soberania nacional" (ob. e p. cits.). Vale
registrar que o Conselho Nórdico, formado por Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega e Suécia, foi
pioneiro nessa questão, ao instituir, em 1954, o "mercado de trabalho comum", em virtude do qual
os trabalhadores oriundos dos Estados que firmaram a respectiva convenção regional adquiriram o
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direito de trabalhar, com ressalva de alguns serviços, em qualquer dos mencionados países.
V - A ação meritória da Organização Iberoamericana de Seguridade Social
37. Criada em Madrid, no ano de 1951, em congresso do qual tivemos a honra de participar, a
Organização Iberoamericana de Seguridade Social (OISS) possui características que lhe são
peculiares: a) os seus membros sob as instituições nacionais de seguridade, previdência ou
seguros sociais, e não os correspondentes Estados; b) não tem por finalidade a integração política
ou econômica dos países da Iberoamérica e Filipinas, posto que os seus objetivos são
predominantemente sociais, limitada sua ação à Seguridade Social.
38. Coroando excelente trabalho empreendido pelo Secretário Geral da OISS, Carlos Marti Bufill, foi
assinada em Quito, a 26.1.78, pelos plenipotenciários de 15 governos de países da Iberoamérica, a
Convenção Iberoamericana de Seguridade Social considerando que "os esforços bilaterais e sub-
regionais podem ser acelerados por uma convenção multinacional entre Governos, que tenha o
caráter de Convenção-tipo e cuja vigência prática seja flexibilizada pela vontade das Partes
Contratantes por meio de Acordos Administrativos que determinem a data de entrada em vigor que
cada país deseje, a aplicabilidade da Convenção no todo ou em parte, o âmbito das pessoas às
quais haja de aplicar-se e os países com os quais se deseja iniciar sua aplicação" (Preâmbulo).
39. A Convenção concerne aos direitos de assistência médico-sanitária e prestações de invalidez,
velhice e sobreviventes previstos nos sistemas obrigatórios de Seguridade, Previdência ou Seguros
Sociais (art. I); mas essas contingências poderão ser ampliadas, "quando assim o acordarem todas
ou algumas das partes signatárias" (art. II), no Acordo Administrativo a que alude o preâmbulo. Em
virtude do que estabelecem suas principais disposições, as pessoas protegidas de cada um dos
Estados contratantes que prestem serviços no território de outro, terão no país receptor os
mesmos direitos e estarão sujeitos às mesmas obrigações dos nacionais deste, relativamente à
assistência e às prestações referidas no art. I (arts. VI e X). O período de espera para a aquisição
do direito à assistência médico-sanitária completado num Estado será respeitado no país receptor
(art. VII), sendo totalizadas, para efeito da concessão das prestações de invalidez, velhice e
sobreviventes, as contribuições recolhidas nos diferentes Estados contratantes (art. XI). Essa
Convenção não modifica automaticamente os tratados bilaterais, plurilaterais ou sub-regionais
sobre Seguridade Social, que vinculam apenas os Estados que a ela aderiram; mas estes poderão
adequar esses tratados às normas da Convenção Iberoamericana, "na medida em que resultem
mais favoráveis aos benefícios" (art. XXV).
40. Como bem acentuou Juan Gilbert, esse tratado regional "significa um documento de grande
transcendência para que a Iberoamérica vá adequando seus direitos positivos a um modelo de
Seguridade Social"... constituindo "um dos passos mais avançados para a proteção do homem sem
distinção de credos, raças ou nacionalidades" ("El Convenio Iberoamericano de Quito - 1978", in
revista Trabajo y Seguridad Social, Buenos Aires, 1982, n. 5, p. 404).
41. Na mesma data foi celebrada, ainda em Quito, a Convenção Iberoamericana de Cooperação em
Seguridade Social. Ambas as convenções se acham em vigor, ratificadas pela quase totalidade dos
países iberoamericanos, inclusive o Brasil.
42. Três anos depois, a OISS obteve a celebração do Tratado da Comunidade Iberoamericana
deSeguridade Social, instituída como instrumento da Organização para promover a execução das
duas precitadas convenções, sendo estruturada por dois órgãos: o Conselho de Ministros e o
Comité Técnico.
VI - Os tratados bilaterais
43. Historicamente, os tratados bilaterais entre países de emigração e de imigração constituíram,
sem dúvida, fator de relevo no desenvolvimento dos sistemas legais de proteção ao trabalho e de
Previdência Social, contribuíram para o estabelecimento de relativa uniformidade entre suas
normas e abriram caminho para a regulamentação internacional das questões sociais. E, como bem
elucida Valticos, ainda hoje conservam, "a pesar de la existência de un número cada vez mayor y
cada vez más perfeccionado de convenios multilaterales o universales, una razón de ser y una
utilidad incontestables: las de proceder a las adaptaciones requeridas por la variedad de las
legislaciones nacionales, complementar la norma internacional y regular las modalidades de
ejecución de los principios internacionales" (ob. cit., p. 180).
44. Aliás, como vimos nos itens III e V deste trabalho, tanto a Convenção OIT 157/82, que reviu a
Convenção OIT 48/35, como as convenções iberoamericanas firmadas na cidade de Quito, em
1978, pressupõem a celebração de acordos bilaterais para a consecução de determinados fins.
45. O "Código Internacional do Trabalho", elaborado sob a direção do inesquecível Conselheiro
Jurídico da OIT, Wilfred Jenks, publicado em 1955, relaciona todos os acordos e tratados bilaterais
registrados na Organização sobre migração ou reciprocidade de direitos sociais entre nacionais dos
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países signatários: a) 55 referentes a remuneração e outras condições de trabalho, filiação a


sindicato, ações judiciais ou impostos e taxas (ob. cit., v. I/1.346-49); b) 69 relativos às
questões específicas da migração de trabalhadores (ob. e v. cits., pp. 1.354 e 5); c) 35 alusivos
ao recrutamento coletivo de trabalhadores no estrangeiro (ob. e v. cits., pp. 1.380 e 1); d) 45
sobre a conservação dos direitos de pensão de invalidez, velhice e morte dos trabalhadores
migrantes (ob. e v. cits., pp. 771-3).
46. Além de alguns acordos de migração, o Brasil, iniciou, a partir de 1965, a celebração de uma
série de tratados bilaterais sobre seguridade social com países de emigração e países fronteiriços.
O primeiro deles foi firmado com o Grão-Ducado de Luxemburgo, no referido ano, visando à
facilitar o trabalho de técnicos luxemburgueses em uma empresa siderúrgica localizada no Estado
de Minas Gerais. De sua elaboração e negociação participamos pessoalmente, na qualidade de
Ministro do Trabalho e Previdência Social.
47. O Acordo de Previdência Social Brasil-Espanha, firmado em 1969, serviu de modelo a outros
tratados celebrados posteriormente por nosso País. A norma fundamental preceitua que as leis
brasileiras e espanholas de seguridade social atinentes aos direitos à assistência médica e às
prestações nos casos de incapacidade de trabalho transitória, invalidez, velhice, morte e
natalidade, além da aposentadoria por tempo de serviço vigente apenas no Brasil, "aplicar-se-ão
igualmente aos trabalhadores brasileiros na Espanha e aos trabalhadores espanhóis no Brasil, os
quais terão os mesmos direitos e as mesmas obrigações que os nacionais do Estado contratante
em cujo território se encontrem" (art. 2.º). Essa regra, entretanto, não se aplica, salvo em
relação à assistência médica (art. 6.º), ao trabalhador de empresa com sede num dos países
contratantes enviado ao território do outro por um período limitado (em princípio, até 12 meses),
ao pessoal de vôo das empresas aeronáuticas e à tripulação de navio sob bandeira de um dos
Estados contratantes (art. 3.º). Os períodos de vinculação aos sistemas de seguridade social dos
dois países serão totalizados para o fim de concessão das prestações de invalidez, velhice, tempo
de serviço e morte pela instituição ou Estado onde se encontrar o trabalhador (art. 7.º),
ressalvados os casos de inaplicação mencionados no art. 3.º. Se o trabalhador já fizer jus à
prestação antes da sua transferência para o território da outra parte contratante, conservará
esse direito perante a instituição do Estado onde adquiriu o direito (art. 5.º). Os arts. 8.º e 9.º
regulam os procedimentos para a concessão das precitadas prestações, quando forem totalizados
os períodos de contribuição atinentes a instituições gestoras dos dois países. Pelo Protocolo
adicional de 1980 foram esclarecidos alguns pontos e estabelecido que, anualmente, os Estados
contratantes fixarão, de comum acordo, o valor da assistência médica, farmacêutica e
odontológica prestada pelo país acolhedor, para fins de indenização ou reembolso das despesas
(art. V, § 6.º).
48. O Acordo de Previdência Social Brasil-Portugal, celebrado em 1969, repete, praticamente, as
normas do Acordo Brasil-Espanha.
49. O Acordo de Previdência Social Brasil-Itália foi assinado em 1973 para dar aplicação aos arts.
37 a 43 do Acordo de Migração celebrado entre os dois países em 1960. Ele determina que, para a
concessão das prestações por motivo de doença, invalidez, morte, maternidade e funeral, o país
de acolhimento levará em conta, quando necessário, os períodos de vinculação ao seguro social
cumpridos no país de origem (art. 3.º, § 1.º). Na hipótese de o trabalhador haver adquirido, antes
da migração, direito às prestações de enfermidade, maternidade e funeral, na conformidade da
legislação do país de origem, poderá valer-se desse direito perante a instituição de seguros sociais
do país de acolhimento (art. 3.º, § 2.º). As prestações por invalidez e por morte serão concedidas
e pagas ao trabalhador migrante ou a seus dependentes pela instituição gestora de cada um dos
países contratantes, consoante o determinado na respectiva legislação, computando-se, se
necessário, o período de Vinculação à instituição do outro Estado (art. 3.º, § 3.º). Antes de deixar
o país de origem, o migrante deverá obter um certificado do qual constem os períodos de filiação
ao seguro social, assim como os direitos adquiridos às prestações referidas nos §§ 1.º e 2.º do
art. 3.º (art. 7.º). Completado o período de carência fixado pela legislação do Estado acolhedor
para cada uma das aludidas prestações, o migrante receberá o mesmo tratamento concedido aos
nacionais (art. 8.º). O pagamento das prestações ao migrante ou aos dependentes, na hipótese
de regresso ao país de origem, será efetuado diretamente ao beneficiário pela instituição de
seguros sociais do país de origem (art. 9.º, § 3.º). As instituições competentes de cada uma das
partes contratantes serão sempre "responsáveis pelo ônus resultante da proporção estabelecida
entre o período total considerado para o cálculo da prestação e o período de seguro social
cumprido, exclusivamente, sob a égide de sua própria legislação" (art. 3.º, § 4.º).
50. O Acordo Brasil-Cabo Verde sobre Previdência Social corresponde a uma troca de notas dos
Ministros responsáveis pelas relações exteriores dos dois países, estendendo aos nacionais de
ambos os países, residentes no território do outro, as disposições do Acordo Brasil-Portugal que
sobre o tema lhes eram aplicáveis antes da independência política desse país africano, verificada a

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5.7.75.
51. Os acordos de Previdência Social Brasil-Uruguai, de 1978, Brasil-Chile, de 1980, e Brasil-
Argentina, também de 1980, são similares. Tirante as disposições de caráter nitidamente
regulamentar, eles estabelecem, de um modo geral, as seguintes regras básicas: a) igualdade de
tratamento entre os trabalhadores dos Estados Contratantes, inclusive dos de outras
nacionalidades, que neles prestem ou tenham prestado serviços, quando passarem a residir no
território da outra parte contratante; b) desse princípio são excluídas as mesmas categorias de
trabalhadores citadas no Acordo Brasil-Espanha (no Acordo Brasil-Uruguai, também as domésticas;
no Acordo Brasil-Argentina, o pessoal de trânsito das empresas de transporte terrestre); c) o
direito adquirido a prestações pecuniárias será conservado perante a instituição dos seguros
sociais no país de origem, nos termos da sua própria legislação; d) os direitos em curso de
aquisição serão regidos pela legislação do Estado perante o qual forem exercitados, totalizando-
se, para o deferimento das prestações, os períodos de filiação nos dois países; e) a assistência
médica, farmacêutica e odontológica prestada pela instituição de um Estado por conta da
instituição do outro Estado será reembolsada na conformidade do ajustado pelas autoridades
competentes dos países.
52. Por fim, cumpre referir os protocolos sobre relações de trabalho e Previdência Social firmados
em 1974, entre o Brasil e o Paraguai, como complementos do Tratado de Itaipu. Referência que se
faz para sublinhar que os trabalhadores empregados em obras fronteiriças não podem ser
conceituados como migrantes. Neste sentido, aliás, são explícitas as já citadas Convenções 97 e
143 da OIT.
53. Porque a obra, já em fase final de execução, abrange territórios do Brasil e do Paraguai, nos
quais, interpoladamente, prestam serviços os empregados contratados em ambos os países -
tornou-se imprescindível a celebração de atos internacionais dispondo sobre as normas de Direito
do Trabalho e de Previdência Social aplicáveis ao respectivo pessoal.
54. Os aludidos protocolos que, por constituírem tratados, foram ratificados pelos dois países,
instituíram um estatuto especial aplicável à área de Itaipu. Eles se esteiam, fundamentalmente,
em três princípios: 1) aplicação da lei do lugar de celebraçãodo contrato de trabalho às questões
de capacidade e identificação profissional dos trabalhadores, de formalidades e prova do contrato
e, bem assim, às relacionadas com sistemas cujo funcionamento depende de órgãos sindicais ou
administrativos nacionais; 2) aplicação de normas uniformes diretas às hipóteses nelas
contempladas; 3) aplicação das normas mais favoráveis, consideradas no conjunto de cada
matéria, às questões referentes ao contrato de trabalho, que não estejam sujeitas aos dois
princípios anteriores (v., sobre os dois protocolos, nosso Conflitos de Leis do Trabalho, Rio, Freitas
Bastos, 1979, pp. 109-132).
55. Foram, assim, mesclados, na disciplinação internacional, princípios de sobre-direito, próprios do
Direito Internacional Privado, com normas uniformes diretas. E estas foram editadas com a
finalidade de conciliar certa disparidade de tratamento, em alguns aspectos das relações do
trabalho, verificada no confronto entre a legislação brasileira e a paraguaia.
56. Os dois protocolos, cujos projetos foram por nós idealizados e redigidos, juntamente com o
Prof. Délio Maranhão, mereceram de Efrén Cordova, então chefe do "Serviço de Direito do
Trabalho e de Relações Operárias" da OIT, a afirmação de que configuravam "um frondoso sistema
normativo". Isto porque "um projeto binacional de tal envergadura, duração e alcance supõe a
criação de um regime jurídico especial, não sendo possível falar-se em mera aplicação dos
princípios tradicionais de Direito Internacional. Estes foram concluídos principalmente para a
solução de casos individuais e não bastam para alcançar as diversas eventualidades que derivam
do funcionamento contínuo de uma empresa que atua em territórios distintos. O Direito
Internacional tem assim de evoluir buscando um estatuto próprio para esse tipo de empresa"
("Régimen laboral de obras fronterizas: el caso de Itaipu", in Revista Internacional deI Trabajo,
OIT, Genebra, maio-junho/76, pp. 341 a 343 e 349).
57. Sistema similar veio a ser aprovado pelo protocolo firmado entre a Argentina e o Paraguai, em
1976, para a "Entidad Binacional Yacyretá". Esse ato internacional alterou a diretriz adotada em
1972 pelo "Convênio sobre Salto Grande", celebrado entre a Argentina e o Uruguai, o qual
determina que a relação de emprego do trabalhador contratado para prestar serviços
alternativamente no território dos dois países ou no leito do rio, "se regirá por la normativa legal y
convencional del país de su contratación" (art. 2.º), com o que permitiu tratamento diferenciado a
trabalhadores contratados para a mesma obra, que prestam serviços na mesma área territorial
(Capón Filas, "Cuenca del Plata y Obras Multinacionales", in Trabajo y Seguridad Social, Buenos
Aires, 1977, pp. 13-6).
58. É inqüestionável que o instrumento firmado em 1976 por Argentina e Paraguai, tal como os
aprovados em 1974 por Brasil e Paraguai, melhor atendem ao princípio da não-discriminação, que
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constitui um dos direitos humanos fundamentais, consagrado em atos internacionais da mais alta
hierarquia.
VII - Conclusões
59. Em face do exposto, parece-nos pertinente concluir que:
1.º - Trabalhador migrante é aquele que se transfere para um país que não é o seu, com o ânimo
de nele se integrar ou, pelo menos, nele trabalhar em caráter não eventual.
2.º - A igualdade de oportunidades e de tratamento entre o nacional e o estrangeiro, nos campos
do Direito do Trabalho e da Seguridade Social, constitui o princípio fundamental da proteção
jurídica ao trabalhador imigrante. A observância desse princípio pode resultar: a) da ratificação de
convenções internacionais, ainda que de âmbito regional; b) da celebração de acordos bilaterais
entre países de emigração e de imigração, seja para o recrutamento, colocação e condições de
trabalho do migrante, seja para a conservação dos direitos adquiridos ou em curso de aquisição
referentes à seguridade social; c) da adoção, no país acolhedor, do princípio da não-discriminação
entre o nacional e o estrangeiro na aplicação das leis sociais-trabalhistas, compreendidos no
respectivo sistema tanto os serviços de formação profissional:, emprego, assistência médica e
habitação, como as convenções coletivas de trabalho.
3.° - Os tratados bilaterais de migração ou, simplesmente, de Previdência Social, celebrados a
partir do início do nosso século com o fim de equiparar o estrangeiro ao nacional, influenciaram a
ação normativa da OIT sobre a proteção social do imigrante; mas esses tratados bilaterais não
perderam sua utilidade, sendo recomendados para a eficácia de algumas medidas previstas nas
convenções da OIT e da OISS.
4.º - Apesar de os trabalhadores empregados em obras, fronteiriças não poderem ser considerados
migrantes, é recomendável a disciplinação dos seus direitos sociais-trabalhistas em tratados
bilaterais que consagrem o princípio da não-discriminação, de forma a assegurar-lhes iguais
direitos na execução dos contratos de trabalho.
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