Você está na página 1de 9

17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

COMPETÊNCIA LEGISLATIVA. O ESTADO-


EMPREGADOR

COMPETÊNCIA LEGISLATIVA. O ESTADO-EMPREGADOR


Revista de Direito do Trabalho | vol. 20 | p. 123 | Jul / 1979
Doutrinas Essenciais de Direito do Trabalho e da Seguridade Social | vol. 1 | p. 935 | Set /
2012DTR\1979\130
Aluysio Sampaio
Juiz do Trabalho - 2.ª Região

Área do Direito: Constitucional

; Trabalho
Sumário:

1. Introdução
Dadas as circunstâncias sociais e culturais da época, é evidente que a Constituição de 1891,
primeira da era republicana, não poderia incluir norma relativa a Direito do Trabalho, nem mesmo
estatuir a respeito da competência para legislar sobre matéria do trabalho. Ao tempo, todas as
relações que tinham por objeto a prestação de serviços eram alcançadas pelo direito civil ou pelo
direito comercial.
Limitava-se, pois, a nossa primeira Constituição Republicana (LGL\1988\3) a dispor, em seu art.
34: "Compete privativamente ao Congresso Nacional:... 23) Legislar sobre o direito civil, comercial
e criminal da República e o processual da justiça federal".
No âmbito da legislação ordinária, pois, as relações de trabalho privado se continham no âmbito
dos Códigos Comercial e Civil.
Todavia, fatores vários, de ordem material e cultural, passaram a impor a necessidade de leis
específicas referentes ao trabalho. Não nos propomos, aqui, a um estudo de natureza sociológica
para explicar as origens do direito do trabalho brasileiro, o surgimento de nossas primeiras leis
trabalhistas. Registre-se apenas o fato de que, já neste século, e especialmente no período da
Primeira Guerra Mundial, deu-se acentuado incremento à indústria nacional, cio que decorreu o
crescimento das camadas trabalhadoras assalariadas. Além disso, sob a influência atuante dos
trabalhadores imigrantes, muitos imbuídos das idéias anarquistas e maximalistas, ocorreram vários
movimentos operários, inclusive greves, das quais as mais expressivas foram as de 1917 e 1919.
Por outro lado, nos países mais adiantados passou a adquirir expressão o direito do trabalho como
um direito autônomo, e de tal modo a constituir direitos trabalhistas objeto do Tratado de
Versalhes.
Estas e outras circunstâncias ocasionaram a edição de leis trabalhistas no Brasil.
Todavia, foi somente no ano de 1926, quando se efetivou reforma à Constituição de 1891, que se
cogitou, a nível de direito constitucional, sobre a competência de legislar sobre o trabalho. Com
efeito, em virtude da aludida reforma, passou a dispor a nossa primeira Constituição Republicana
(LGL\1988\3), em seu art. 34:
"Compete privativamente ao Congresso Nacional: (...) 28) Legislar sobre o trabalho".
Refere-se a norma citada ao trabalho na órbita privada e não relativamente ao Poder Público.
Relativamente a este, a competência legislativa no que diz respeito a seu pessoal era da União,
dos Estados ou dos Municípios, conforme o caso.
Observa Floriano Corrêa Vaz da Silva, em seu Direito Constitucional do Trabalho, referindo-se à
norma supracitada: "Não se falava ainda em Direito do Trabalho, mas já se reconhecia a
necessidade de que a União legislasse sobre o trabalho. O dispositivo procurava também impedir
as possíveis argüições de inconstitucionalidade, pois, tal como nos EUA, muitos entendiam
inconstitucional qualquer lei que protegesse o trabalhador e que lhe reconhecesse certos direitos
e garantias".
Empolgados pelos princípios doutrinários do mais acendrado liberalismo, repugnava aos juristas a
intervenção do Estado na liberdade contratual. Daí por que observa o mesmo autor, que "vários
constitucionalistas brasileiros entendiam que a legislação trabalhista infringia o princípio da
liberdade contratual".

www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 1/9
17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

2. A Constituição de 1934
Sabe-se, e salientam os constitucionalistas, que a Constituição de 16.7.1934, foi de cunho
eminentemente social-democrático. E embora de social-democrático se possa considerar, no que
diz respeito à legislação do trabalho, o período posterior a 1930, não se chegou ao ponto de
desgarrar do direito comum o direito do trabalho, considerado como ramo autônomo. Apenas leis
esparsas sobre a matéria se elaboraram, mesmo depois da aludida Constituição, devendo-se
mencionar as seguintes: Lei 62, de 1935, dispondo sobre a rescisão do contrato de trabalho; Lei
185, instituindo as Comissões de Salário Mínimo e Lei 367, de 1936, criando o IAPI.
A refletir tal situação, a Constituição de 16.7.1934 dispunha, em seu art. 5.º; "Compete
privativamente à União: (...) XIX, legislar sobre: (...) i) comércio exterior e interestadual,
instituições de crédito; câmbio e transferência de valores para fora do país; normas geraissobre o
trabalho, a produção e o consumo, podendo estabelecer limitações exigidas pelo bem público".
Saliente-se, todavia, que o § 3.º, do citado art. 5.º, dispunha: "A competência federal para
legislar sobre as matérias dos números XIV e XIX, letras c e i, in fine, e sobre registros públicos,
desapropriações, arbitragem comercial, juntas comerciais e respectivos processos; requisições
civis e militares, radiocomunicação, emigração, imigração e caixas econômicas; riqueza do subsolo,
mineração, metalurgia, águas, energia hidrelétrica, florestas, caça e pesca, e a sua exploração
não exclui a legislação estadual supletiva ou complementar sobre as mesmas matérias. As leis
estaduais, nestescasos, poderão, atendendo às peculiaridades locais, suprir as lacunas ou
deficiências da legislação federal, sem dispensar as exigências destas".
Em conseqüência do aludido parágrafo, conclui-se, relativamente ao tema em foco, que a
competência da União para dispor normas sobre o trabalho não era exclusiva, embora prevalente,
pois tal competência remanescia ainda aos Estados, em caráter supletivo ou complementar, ainda
que sempre subordinada às exigências da legislação federal.
3. Constituição de 1937
Foi a Constituição de 10.11.1937, que elevou a legislação do trabalho ao nível de direito autônomo
e especial. Ao contrário dos que a antecederam, não se refere a legislação trabalhista, nem a
normas relativas ao trabalho. Emprega a locução - direito operário. E o faz no dispositivo
referente à competência legislativa: "Art. 16. Compete privativamente à União o poder de legislar
sobre as seguintes matérias: (...) XVI, o direito civil, o direito comercial, o direito aéreo, o direito
operário, o direito penal e o direito processual".
Observa-se no texto citado, comparando-o com a Constituição de 1934, que:
1.º) A Constituição de 1934 referia-se apenas a normas gerais para o trabalho, sem que ainda se
houvesse formado a consciência de um direito do trabalho autônomo e especial; a Constituição de
1937 adota a expressão direito operário) o que evidencia o surgimento da consciência de um
direito do trabalho especial e autônomo, ainda que restrito a operário e não ao trabalhador em
geral.
2.º) A competência da União para legislar sobre o trabalho, na Constituição de 1934, não era
privativa, mas prevalente, pois não excluía a legislação estadual supletiva ou complementar sobre
a matéria. Por força do § 3.º, do art. 5.º da referida Constituição, leis estaduais poderiam,
atendendo às peculiaridades locais, suprir as lacunas ou deficiências da legislação federal, sem
dispensar as exigências desta. Já na Constituição de 1937, autoritária e centralizadora, a
competência de legislar sobre a matéria - direito operário - passou a ser da competência
privativa da União, conforme o expressamente disposto no caput, do art. 16.
E foi sob a égide da Constituição de 1937 que, efetivamente, a esparsa legislação do trabalho se
corporificou na Consolidação das Leis do Trabalho ( Decreto-lei 5.452, de 1.5.1943) que reuniu a
legislação esparsa a respeito, de forma sistemática e com algumas alterações ou inovações. A CLT
(LGL\1943\5) veio dar expressividade à natureza autônoma e especial do Direito do Trabalho.
Fundamentalmente, a CLT (LGL\1943\5) aplicava-se aos empregados de empresas privadas
urbanas e, excepcionalmente, aos rurícolas. De seu manto protetor, eram excluídos, por seu art.
7.º, além dos domésticos:
1. os funcionários públicos da União, dos Estados e dos Municípios e os respectivos
extranumerários em serviços nas próprias ( CLT (LGL\1943\5), art. 7.º, c);
2. os servidores das autarquias paraestatais, desde que sujeitos a regime próprio de proteção ao
trabalho que lhe assegure situação análoga à dos funcionários públicos ( CLT (LGL\1943\5), art.
7.º, d).
A regra, pois, era a inaplicabilidade do direito do trabalho aos funcionários públicos da União, dos

www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 2/9
17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

Estados e dos Municípios e aos respectivos extranumerários em serviços na própria repartição;


aplicável, contudo, aos extranumerários em serviços fora da repartição (pessoal de obra) ou em
empresas industriais da União, dos Estados e dos Municípios.
Quanto aos servidores das autarquias paraestatais era em regra aplicável o direito do trabalho,
exceto quando sujeitos a regime próprio de proteção ao trabalho que lhes assegurasse situação
análoga à dos funcionários públicos.
Referindo-se a empresas incorporadas pelo poder público, observava Russomano em seus
Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho: "Criou-se, há alguns anos, um problema de
difícil solução prática. O Estado incorporou várias empresas ao patrimônio nacional. Considerou
extranumerários os trabalhadores das mesmas. Perguntava-se, portanto, se aqueles que eram
empregados antes da Consolidação haviam perdido o apoio desta, pelo fato de, procedida a
incorporação, serem classificados como extranumerários.
A solução veio pela esfera legal.
O Decreto-lei 8.349, de 29.11.1945, determinou que se aplicasse a legislação trabalhista aos
empregados admitidos antes da incorporação da empresa ao patrimônio nacional e a legislação
pertinente aos extranumerários àqueles nomeados após tal fato".
Esta, sem dúvida, a regulamentação final do dispositivo pertinente da Constituição de 1937,
embora posteriormente voltasse à baila o debate sobre a questão - mas, aí, já sob a vigência da
Constituição de 18.9.1946.
4. A Constituição de 1946
A Constituição de 18.9.1946 consagra a autonomia do direito do trabalho, com essa mesma
denominação. Evoluiu, assim, e muito em relação às Constituições anteriores, que se referiam à
legislação do trabalho, normas relativas ao trabalho e direito operário.
Dispõe a Constituição de 1946: "Art. 5.º - Compete à União: (...) XV - legislar sobre: a) direito
civil, comercial, penal, processual, eleitoral, aeronáutico e do trabalho".
Saliente-se que, na sistemática daquela Constituição, a competência para legislar sobre direito do
trabalho era da competência privativa da União, excluindo-se do Estado (e dos Municípios)
competência legislativa a respeito, ainda que supletiva ou complementar. Daí por que não inclui,
em seu art. 6.º (que prevê em determinados casos legislação estadual supletiva ou complementar)
a hipótese da letra a, do art. 5.º.
Sob a vigência da Constituição de 1946 desenvolveram-se, no Brasil, as autarquias, bem como as
empresas públicas industriais e de economia mista, o que ocasionava problemas relativos ao
regime legal aplicável ao respectivo pessoal. Daí por que adveio a Lei 1.890, de 13.6.1953,
aplicando dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho aos mensalistas e diaristas da União,
dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios, dos Municípios e das entidades autárquicas.
Assim dispunha o seu art. 1.º: "Aos mensalistas e diaristas da União, dos Estados, do Distrito
Federal, dos Territórios, dos Municípios e das entidades autárquicas, que trabalharem nas suas
organizações econômicas, comerciais ou industriais em forma de empresa e não forem funcionários
públicos ou não gozarem de garantias especiais, aplicam-se, no que forem aplicáveis, as
providências constantes dos arts. 370 a 378 - 391 a 398 - 400 - 402 a 405, letra a e parágrafos -
407 - 408 - 411 - 424 - 427 - 446 e parágrafo único - 450 - 457 e §§ 1.º e 2.º - 464 - 472 - 473
- 477 a 482 - 487 - 492 a 495 e 497 da Consolidação das Leis do Trabalho.
§ 1.º. A dispensa do empregado com mais de dez anos de serviço, prevista no art. 492 da
Consolidação das Leis do Trabalho, só poderá ser feita mediante inquérito administrativo, sem
prejuízo da apreciação judicial da respectiva prova na ação porventura proposta pelo dispensado,
desde que a decisão lhe seja flagrantemente contrária.
§ 2.º. Entre os atos de indisciplina ou insubordinação a que se refere o art. 482, alínea h, da
Consolidação das Leis do Trabalho, incluem-se, no tocante aos empregados declarados no
presente artigo, incitar, promover, tomar parte ou fazer propaganda de greve de qualquer
natureza e finalidade, bem como pertencer a partido político, associação, clube ou grupo etc.,
proibido como nocivo à ordem social ou política".
A citada lei, assim, regulamentando os preceitos constitucionais pertinentes ao direito do trabalho
em relação à Administração Pública, direta ou indireta, e consoante o disposto em seu art. 1.º,
previa, explícita ou implicitamente, os seguintes regimes:
1. estatutário de funcionário público ao pessoal da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Territórios e dos Municípios, bem como de suas respectivas autarquias;
2. estatutário de funcionário público aos mensalistas e diaristas do poder público ou das
www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 3/9
17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

autarquias que trabalhassem em suas organizações econômicas, comerciais ou industriais em


forma de empresa;
3. regime específico, com garantias especiais, aos mensalistas e diaristas das organizações
econômicas, comerciais, ou industriais em forma de empresa pertencentes ao poder público ou às
respectivas autarquias;
4. regime especial previsto na mesma lei, com aplicação de determinados artigos da Consolidação
das Leis do Trabalho, aos mensalistas e diaristas da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Territórios, e dos Municípios, que trabalharem em suas organizações econômicas, comerciais ou
industriais em forma de empresa, e não previstos nas três hipóteses anteriores.
Destarte, em nenhuma hipótese aplicava-se ao pessoal da Administração direta ou indireta da
União, dos Estados e dos Municípios, Distrito Federal e Territórios, suas autarquias e empresas, a
integralidade da Consolidação das Leis do Trabalho.
Acrescente-se, doutra parte, que excluía-se o referido pessoal, inteiramente, da esfera da Justiça
do Trabalho. Veja-se que a Lei 1.890, de 13.6.1953, dispunha: "Art. 2.º. As ações dos
empregados referidos no artigo anterior contra a entidade empregadora correrão na justiça comum
perante o juiz de Direito do lugar ou da comarca do estabelecimento".
Apenas de passagem fazemos esta observação, porque no presente trabalho não se inclui o
estudo a respeito da competência judicial, mas apenas da competência legislativa e legislação
aplicável aos que prestam serviços à administração direta ou indireta do Estado.
5. A Constituição de 1967
A Constituição de 14.1.1967 dispõe, em seu art. 8.º; "Compete à União: (...) XVII - Legislar
sobre: (...) b) direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, aéreo, marítimo e do
trabalho".
Preservou, assim, e com a mesma denominação, a autonomia do Direito do Trabalho. E, da mesma
forma, explicitou ser da União a competência para legislar sobre Direito do Trabalho.
Por sua vez, dispõe o art. 13, da mesma Constituição: "Os Estados se organizam e se regem pelas
Constituições e pelas leis que adotarem, respeitados dentre outros princípios estabelecidos nesta
Constituição, os seguintes: (...) V - As normas relativas aos funcionários públicos".
E explicita, no § 1.º, do mesmo artigo, aquele princípio que é inerente ao regime federativo:
"Cabem aos Estados todos os poderes não conferidos por esta Constituição à União e aos
Municípios".
Assim, a Constituição de 1967 deferia aos Estados a competência para legislar sobre o seu
pessoal, respeitadas, porém, as normas constitucionais relativas aos funcionários públicos. Tais
normas constitucionais contêm se nos arts. 95 a 106, da Constituição Federal (LGL\1988\3).
Saliente-se, neste passo, o que dispõe o art. 104, da referida Constituição:
"Aplica-se a legislação trabalhista aos servidores admitidos temporariamente, para obras, ou
contratados para funções de natureza técnica ou especializada".
Por outro lado, dispõe o art. 163, § 2.º: "Na exploração, pelo Estado, da atividade econômica, as
empresas públicas, as autarquias e sociedades de economia mista, reger-se-ão pelas normas
aplicáveis às empresas privadas, inclusive quanto ao direito do trabalho e das obrigações".
As duas supracitadas normas, impossibilitando a existência de um terceiro gênero legislativo com
relação ao pessoal da administração direta ou indireta da União, revogou a Lei 1.890, de
13.6.1953, de tal sorte que ou o servidor é funcionário ou é empregado sujeito à legislação
trabalhista.
Em face dos aludidos dispositivos, os servidores da Administração direta da União, dos Estados e
dos Municípios são, em regra, funcionários públicos, com apenas uma exceção: os servidores
admitidos temporariamente, para obras ou contratados para funções de natureza técnica ou
especializada.
No que diz respeito à Administração indireta, na exploração de atividade econômica, proíbe o §
2.º, do art. 163, a implantação do regime estatutário de funcionário público, ordenando
imperativamente a aplicação do Direito do Trabalho - tanto em relação às empresas públicas, de
economia mista, como também relativamente às autarquias.
A Constituição de 1967, pois, estabelecia como regra geral: a aplicação do regime de funcionário
público ao pessoal da Administração direta da União, dos Estados e dos Municípios e a aplicação
exclusiva do direito do trabalho ao pessoal da Administração indireta (empresas de economia

www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 4/9
17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

mista, públicas e autarquias na exploração econômica). Ressalvam-se, apenas, e no que diz


respeito à Administração direta, as hipóteses acima apontadas.
6. Emenda Constitucional 1, de 17.10.1969
Algumas alterações a respeito da matéria em foco foram introduzidas à Constituição de 1967, pela
Emenda Constitucional 1, de 17.10.1969.
Preservou o mesmo princípio de que compete à União legislar sobre Direito do Trabalho: "Art. 8.º.
Compete à União: (...) XVII - legislar sobre: (...) b) direito civil, comercial, penal, processual,
eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho".
E dispõe, em seu art. 13: "Os Estados organizar-se-ão e reger-se-ão pelas Constituições e leis
que adotarem, respeitados, dentre outros princípios estabelecidos nesta Constituição, os
seguintes: (...) V - as normas relativas aos funcionários públicos, inclusive a aplicação, aos
servidores estaduais e municipais, dos limites máximos de remuneração estabelecidos em lei
federal".
Como se vê, trata-se de norma idêntica à redação originária do dispositivo constitucional,
acrescido de um limite relativo à remuneração.
E o § 1.º, do mesmo art. 13, dispõe: "Aos Estados são conferidos todos os poderes que, explícita
ou implicitamente, não lhes sejam vedados por esta Constituição".
De competência dos Estados, pois, a legislação relativa a seus funcionários públicos, atendidos os
limites fixados no art. 13, n. V, da Constituição.
As normas constitucionais inarredáveis pelos Estados encontram-se nos arts. 97 a 111, da
Constituição, na redação dada pela Emenda Constitucional 1.
Entre tais normas, encontra-se uma que altera a sistemática originária da Constituição, no que diz
respeito ao regime jurídico de certos servidores. Trata-se do art. 106, que assim dispõe: "O regime
jurídico dos servidores admitidos em serviços de caráter temporário ou contratados para funções
de natureza técnica especializada será estabelecido em lei especial".
Por outro lado, dispõe o art. 170, em seu § 2.º: "Na exploração, pelo Estado, da atividade
econômica, as empresas públicas e as sociedades de economia mista reger-se-ão pelas normas
aplicáveis às empresas privadas, inclusive quanto ao Direito do Trabalho e ao das obrigações".
Em relação ao texto constitucional de 1967, os dispositivos citados da Emenda Constitucional 1, a
qual traz duas alterações básicas:
1.ª) refere-se a lei especial que estabelecerá o regime jurídico dos servidores admitidos em
serviços de caráter temporário ou contratados para funções de natureza técnica especializada;
2.ª) não impõe às autarquias, na exploração de atividade econômica, mas apenas às empresas
públicas e de economia mista, o regime jurídico da legislação do trabalho.
Ao exame do § 2.º, do art. 170, da Constituição em vigor, constata-se a impossibilidade do regime
estatutário de funcionário público ao seu pessoal. Todos os que trabalharem nasempresas
públicas ou de economia mista estarão sempre sujeitos ao regime peculiar ao direitodo trabalho.
Se é singela e inarredável a conclusão decorrente a exegese do § 2.º, do art. 170, o mesmo não
ocorre com a interpretação do art. 106, supracitado.
Saliente-se, antes de tudo, que a regra geral quanto ao pessoal da Administração direta da União,
dos Estados e dos Municípios é a de que se lhe aplica o regime jurídico de funcionário público.
Também assim relativamente às autarquias.
Mas no que diz respeito ao regime jurídico dos servidores admitidos em serviços de caráter
temporário ou contratados para funções de natureza técnica especializada, referido no art. 106,
que entender-se por lei especial no mesmo dispositivo mencionada?
Vejamos duas hipóteses de interpretação:
1.ª hipótese: a norma cria a possibilidade de um tertius genus distinto dos regimes jurídicos de
funcionário público e de Direito do Trabalho.
2.ª hipótese: a norma apenas dispõe que a lei especial estabelecerá, em relação ao pessoal nela
referido, que regime jurídico se aplicará: o de funcionário público ou o da legislação do trabalho.
A opção por uma das duas hipóteses é de importância primacial porque fixadora de premissa
básica, em especial no que diz respeito à competência legislativa.
Floriano Corrêa Vaz da Silva, em seu Direito Constitucional do Trabalho, manifesta-se no sentido

www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 5/9
17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

da primeira hipótese aludida. Escreve ele: "Note-se, desde logo, que essa lei especial deverá ser
uma "lei federal especial". E o fato é que inexiste, até hoje, no plano federal, uma lei especial, que
crie ou regulamente uma terceira categoria de servidores, ao lado dos funcionários no regime
estatutário e dos servidores no regime trabalhista. Pelo contrário, há lei recente com a qual, de
certo modo, o Poder Público federal tacitamente renuncia a criar, ao menos por enquanto, esse
regime especial de que fala o art. 106. Trata-se da Lei 6.185, que coloca os servidores em apenas
dois campos: o campo do Estatuto e o campo da CLT (LGL\1943\5)".
Já foi nosso entendimento o esposado por Floriano Corrêa Vazo Considerávamos possível a fixação
de um regime especial distinto das categorias de funcionário público e do regime trabalhista e que
tal regime especial deveria ser fixado por lei federal.
Meditação maior em relação à sistemática constitucional, que agora tentamos, nos abalançou de
tal entendimento.
Em primeiro lugar, o art. 106, da Constituição não se refere a "lei especial" que institua "regime
jurídico especial", mas apenas a "lei especial" que estabeleça o "regime jurídico". Lei especial não
quer dizer regime jurídico especial. A Constituição Federal (LGL\1988\3) consagra dois regimes: o
de funcionário público e o de direito do trabalho. Não estabelece um terceiro regime. E, com a
Emenda Constitucional 1, apenas arredou-se do rigorismo da redação anterior que ordenava
sempre aplicar-se ao pessoal temporário sempre a legislação trabalhista. A lei especial a que se
refere o art. 106 é apenas definidora de qual regime aplicar-se: se o de funcionário público, se o
de Direito do Trabalho. Não um tertius genus.
Em segundo lugar, fosse admitido constitucionalmente um regime jurídico especial diferenciado do
de funcionário público e do regime trabalhista, a competência de legislar a respeito não seria
privativa da União.
É que não se conteria tal regime, por ser especial, em nenhuma das classes de direitos
mencionados no art. 8.º, XVII, da Constituição Federal (LGL\1988\3), artigo esse que se refere à
competência legislativa da União. Ora, no regime federativo tudo o que não for explícita ou
implicitamente deferido à União, será da competência dos Estados. Relembra-se o disposto no §
1.º, do art. 13, da Constituição: "Aos Estados são conferidos todos os poderes que, explícita ou
implicitamente, não lhes sejam vedados por esta Constituição".
Atente-se, além disso, para o disposto no art. 109, da Constituição: "Lei federal, de iniciativa
exclusiva do Presidente da República, respeitado o disposto no art. 97 e seu § 1.º e no § 2.º do
art. 108, definirá: I - o regime jurídico dos servidores públicos da União, do Distrito Federal e dos
Territórios; II - a forma e as condições de provimento dos cargos públicos; e III - as condições
para aquisição de estabilidade".
Veja-se que o artigo citado restringe a lei federal à definição do regime jurídico dos servidores
públicos da União, do Distrito Federal e dos Territórios - e não dos Estados e dos Municípios.
Conseqüentemente, não sendo conferida, explícita ou implicitamente, à União a competência para
legislar regime especial aludido, tal competência seria do Estado.
Em face dessas considerações, modificamos nosso entendimento anterior relativamente ao
disposto no art. 106, da Constituição Federal (LGL\1988\3). E isso porque nos parece que a
interpretação válida do texto é a contida na 2.ª hipótese aventada: a norma apenas dispõe que a
lei especialestabelecerá, em relação ao pessoal nela referido, que regime jurídico se aplicará: o
de funcionário público ou o da legislação do trabalho.
E parece-nos que este foi o entendimento do legislador ao editar a Lei 6.185, de 1974 que, como
acentua Floriano Corrêa Vaz, coloca todos os servidores apenas em dois campos: o campo do
Estatuto e o campo da CLT (LGL\1943\5).
Essa interpretação nos parece a mais válida ainda porque mais consentânea com o regime
federativo. Não se deveria atribuir à União a competência para legislar sobre o regime jurídico dos
servidores dos Estados, por prejudicar a autonomia destes. Deferir aos Estados, por outro lado, a
possibilidade de estabelecer regime jurídico distinto do ele funcionário público e do trabalhista,
seria prejudicar direitos dos cidadãos, que poderiam ser lançados ao desabrigo de normas
protecionistas inerentes a um daqueles regimes. Os Estados, pois, não minimizados em sua
autonomia, mas limitados na possibilidade do arbítrio, hão de definir a adoção de um dos regimes,
nos limites fixados na Constituição Federal (LGL\1988\3): o de funcionário público, ou o
trabalhista. Jamais um tertius genus, isto é, um regime especial distanciado da alternativa
constitucional.
Observe-se que os dispositivos agora enfocados não foram afetados por reforma constitucional
posterior.

www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 6/9
17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

7. Lei 6.185, de 11.12.1974


A Lei 6.185, de 11.12.1974, encontra seu respaldo constitucional nos arts. 106 e 109, da
Constituição em vigor. Dispõe ela sobre os servidores públicos da Administração Federal direta e
autárquica, segundo a natureza do vínculo empregatício. Dispõem os seus arts. 1.º e 2.º:
"Art. 1.º. Os servidores públicos civis da Administração Federal direta e autárquica reger-se-ão
por disposições estatutárias ou pela legislação trabalhista em vigor.
Art. 2.º. Para as atividades inerentes ao Estado como Poder Público, sem correspondência no
setor privado, compreendidas nas áreas de Segurança Pública, Diplomacia, Tributação,
Arrecadação e Fiscalização de Tributos Federais e contribuições previdenciárias, e no Ministério
Público só se nomearão servidores cujos direitos e vantagens sejam definidos em Estatuto próprio,
na forma do art. 109 da Constituição Federal (LGL\1988\3)".
Os dois artigos supracitados ensejam algumas observações, pois delimitam o campo de aplicação
da Lei 6.185.
Com efeito, e dentro dos limites constitucionais, excluem-se da lei em foco todos os empregados
em empresas públicas e de economia mista da União (desnecessário até dizer que a lei não se
aplica aos Estados e Municípios). Limitado é, pois, seu campo de abrangência à administração
direta e autárquica da União.
Como já salientamos anteriormente, a lei em estudo não criou um regime especial de trabalho, mas
reiterou, em seu art. 1.º, a alternativa constitucional do art. 106: disposições estatutárias ou
legislação trabalhista.
O art. 2.º exclui a possibilidade de aplicação da legislação trabalhista a determinadas áreas do
Poder Público, sem correspondência no setor privado, e compreendidas no seguinte âmbito: a)
Segurança Pública, Tributação, Arrecadação e Fiscalização de Tributos federais e contribuições
previdenciárias e no Ministério Público. A parte final do dispositivo afirmando que na hipótese em
foco "só se nomearão servidores cujos deveres, direitos e vantagens sejam os definidos em
Estatuto próprio, na forma do art. 109 da Constituição Federal (LGL\1988\3)", pode induzir uma
conclusão apressada: a da existência de um regime especial fora da já apontada alternativa
constitucional. Assim, porém, não é. Embora possível a estatuição de normas especiais, estas não
poderão perder a substância peculiar do regime do funcionário público. Serão apenas normas
especiais relativas a determinada categoria de funcionário público. Jamais um tertius genus.
O art. 3.º, da mesma Lei, dispõe: "Para as atividades não compreendidas no artigo precedente só
se admitirão servidores regidos pela legislação trabalhista, sem os direitos de greve e
sindicalização, aplicando-se-lhes as normas que disciplinam o Fundo de Garantia do Tempo de
Serviço.
Parágrafo único. Os servidores a que se refere este artigo serão admitidos para cargos integrantes
do Plano de Classificação, com a correspondente remuneração".
O artigo em foco explicita que os servidores admitidos no regime da legislação trabalhista não têm
direito de greve e de sindicalização, o que encontra respaldo no art. 162, da Constituição: "Não
será permitida greve nos serviços públicos e atividades essenciais, definidas em lei".
Por outro lado, define o regime trabalhista aplicável ao servidor na hipótese: o Fundo de Garantia
do Tempo de Serviço. Elimina, pois, a dualidade de regimes: estabilidade, com indenização, ou
fundo de garantia do tempo de serviço. Poder-se-ia dizer inconstitucional tal dispositivo, em face
do que dispõe o art. 165, n. XIII, da Constituição?
Sabe-se que a norma constitucional aludida dispõe: "A Constituição assegura aos trabalhadores os
seguintes direitos, além de outros que, nos termos da lei, visem à melhoria de sua condição social:
(...) XIII - estabilidade, com indenização ao trabalhador despedido ou fundo de garantia
equivalente".
Inconstitucionalidade, porém, não há, pois a escolha ou opção do regime não é deferido
constitucionalmente ao trabalhador, podendo o legislador escolher um dos regimes da alternativa
para determinado setor ou categoria. Assim, por exemplo, inaplicável o regime do FGTS ao
trabalhador rural. No caso dos servidores públicos, inaplicável é o regime celitário da estabilidade,
com indenização.
O art. 4.º regulamenta a situação especial relativa à transformação de funcionário público em
servidor sujeito ao regime da legislação trabalhista: "A juízo do Poder Executivo, nos casos e
condições que especificar, inclusive quanto à fonte de custeio, os funcionários públicos
estatutários poderão optar pelo regime do art. 3.º.
§ 1.º. Será computado, para o gozo dos direitos assegurados na legislação trabalhista e de
www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 7/9
17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

previdência social, inclusive para efeito de carência, o tempo de serviço anteriormente prestado à
Administração Pública pelo funcionário que fizer a opção referida neste artigo.
§ 2.º. A contagem do tempo de serviço de que trata o parágrafo anterior far-se-á segundo as
normas pertinentes ao regime estatutário, computando-se em dobro, para fins de aposentadoria,
os períodos de licença especial não gozada, cujo direito haja sido adquirido sob o mesmo regime".
O caput do artigo em foco estabelece, em princípio, a possibilidade da opção, pelo funcionário
público, do regime trabalhista. Mas tal possibilidade somente começa a existir efetivamente a juízo
do Poder Executivo. Não se trata, pois, de norma auto-aplicável, porque depende da vontade do
Poder Executivo. Somente depois do Poder Executivo fixar os casos e as condições, inclusive
quanto à fonte de custeio, é que surgirá para o funcionário público a possibilidade concreta de
optar pelo regime da legislação trabalhista.
A opção em foco implica na renúncia ao regime estatutário e aquisição dos direitos trabalhistas
(mas sempre sob o regime do FGTS). Porém a renúncia ao regime de funcionário público não
implica na perda de direitos adquiridos, especialmente no que diz respeito à contagem de tempo
de serviço. Daí a razão dos dois parágrafos do artigo em foco. O tempo de serviço anterior à
opção será computado para os efeitos trabalhistas e previdenciários, mas será contado na forma
do regime estatutário, inclusive calculado em dobro o tempo relativo à licença especial não
gozada.
O art. 5.º da lei em foco dispõe sobre os encargos sociais decorrentes da legislação trabalhista e
previdenciária pertinentes à situação: "Os encargos sociais de natureza contributiva, da União e
das respectivas autarquias, em relação ao pessoal regido pela legislação trabalhista, restringir-se-
ão às contribuições para o Instituto Nacional de Previdência Social, inclusive os incidentes sobre o
13.º (décimo-terceiro) salário, às cotas de salário família e aos depósitos para o Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço, nos termos das respectivas legislações.
Parágrafo único. Dos orçamentos da União e das autarquias deverão constar as dotações
necessárias ao custeio dos encargos de que trata este artigo".
O artigo em foco é suficientemente claro para dispensar maiores comentários. A explicitação é
feita sobretudo com vistas à previsão orçamentária.
O óbvio é o que vem preceituado no art. 6.º; "Os atuais funcionários que não fizerem a opção
prevista no art. 4.º, serão mantidos no regime estatutário".
Se a transferência do servidor de um para outro regime depende da manifestação de sua opção, é
evidente que no seu silêncio continua no regime estatutário. E também é claro que, por não optar,
não perderia seu cargo de funcionário.
Finalmente, dispõe o art. 7.º; "Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogados os
§§ 1.º e 2.º do art. 3.º, da Lei 5.886, de 31.5.1973; o parágrafo único, do art. 3.º, da Lei 5.914,
de 31.8.1973; o parágrafo único, do art. 3.º, da Lei 5.921, de 19.9.1973; o parágrafo único, do
art. 4.º da Lei 5.968, de 11.12.1973; o parágrafo único, do art. 3.º, da Lei 5.990, de... 17.12.
1973, e demais disposições em contrário".
8. Algumas conclusões
Das considerações feitas no presente estudo, especialmente no que se refere à legislação em
vigor, tiremos algumas conclusões:
1. O Direito do Trabalho, com essa denominação, é um direito autônomo, e é privativamente
competente para legislá-lo a União.
2. Em face do disposto no art. 170, da Constituição em vigor, somente podem ser contratados
para as empresas públicas e de economia mista empregados sob o regime da legislação trabalhista
vigente.
3. Na Administração direta e autárquica da União, dos Estados e dos Municípios a regra é a
aplicação do regime estatutário de funcionário público e só excepcionalmente o regime da
legislação trabalhista.
4. Inexiste um tertius genus estranho ao regime estatutário de funcionário público e ao regime
trabalhista.
5. Os Estados, nos limites fixados na Constituição Federal (LGL\1988\3), poderão escolher o
regime aplicável, estatuindo normas estatutárias de funcionário público ou sujeitando-se, em
determinados casos e condições, à legislação federal do trabalho. Não pode, contudo, legislar
instituindo regime especial fora dos dois apontados.
6. A Lei 6.185, de 11.12.1974, não institui um tertius genus, mas dispõe apenas a respeito da
www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 8/9
17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

dualidade de regimes aplicáveis na administração direta e autárquica da União.


7. A Lei 6.185, de 11.12.1974, não é aplicável às empresas públicas e de economia mista, nem
tampouco aos Estados e Municípios.
8. Não se aplica aos servidores públicos da Administração direta e autárquica da União, que
estejam sob o regime trabalhista, o sistema da estabilidade, com indenização, mas o regime do
FGTS.
Página 1

www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 9/9

Você também pode gostar