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17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

AS ENTIDADES ABERTAS DE PREVIDÊNCIA


COMPLEMENTAR SEM FINS LUCRATIVOS E O NOVO
CÓDIGO CIVIL

AS ENTIDADES ABERTAS DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR SEM FINS


LUCRATIVOS E O NOVO CÓDIGO CIVIL
Revista dos Tribunais | vol. 830 | p. 77 | Dez / 2004
Doutrinas Essenciais de Direito do Trabalho e da Seguridade Social | vol. 5 | p. 1157 | Set /
2012DTR\2004\704
Rodrigo José de Kühl e Carvalho
Advogado no Rio de Janeiro.

Área do Direito: Geral

Sumário:

1.Introdução - 2.Entidades de Previdência Complementar Sem Fins Lucrativos (EAPCSFL) são


sociedades de seguro mútuo - 3.As entidades de previdência complementar sem fins lucrativos e o
Código Civil de 1916 - 4.Código Civil de 2002 (Lei 10.406/2002), art. 2.031, é inaplicável às
entidades abertas de previdência complementar sem fins lucrativos - 5.Portaria SPC 2, de
08.01.2004, da Secretaria de Previdência Complementar quanto às entidades fechadas -
6.Conclusão

1. Introdução
Foi-nos solicitado pela Anapp - Associação Nacional da Previdência Privada, que atualizássemos
nosso parecer de 15.09.2003, que abordava a legislação a ser observada pelas entidades abertas
de previdência privada sem fins lucrativos, ante o que dispõe o § 1.º do art. 77 c/c o art. 73 da
LC 109/2001, com análise sobre a necessidade, ou não, de se adaptarem ao que disposto no
Código Civil (LGL\2002\400) de 2002 (art. 2.031 da Lei 10.406/2002), e com abordagem sobre os
efeitos da revogação da Lei 6.435/1977 e possível vigência e eficácia de seu Decreto
regulamentador 81.402/1978, com atenção à Portaria 2, da Secretaria de Previdência
Complementar, publicada nesse mês de janeiro de 2004.
No parecer ora atualizado enfatizamos a impossibilidade de as entidades de previdência
complementar sem fins lucrativos, pessoas jurídicas sui generis que são e regradas por "lei
específica e complementar", serem enquadradas no conceito de "associação" ou "sociedade" tal
como insertos no Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, pensamento esse que mais se consolidou
ao longo dos meses.
Demos, todavia, no parecer anterior, por estarmos a refutar tese de quem as considerava como
"associações", ênfase ao fato de que se "associações fossem seriam sui generis", especiais, sem
nos estendermos sobre outra possibilidade também factível, que é a de serem reputadas como
"sociedades sui generis", o que fazemos agora, depois de termos conhecimento de que assim
entendem alguns outros doutrinadores, tendo todos em comum, porém, a total inaplicação do
disposto no art. 2.031 do CC/2002 (LGL\2002\400) às referidas entidades.
As teses que sustentam serem as entidades de previdência complement ar sem fins lucrativos
"associações sui generis" ou "sociedades sui generis" foram, como o demonstraremos, fruto da
verificação de que as entidades de previdência complementar têm algo em comum com cada uma
dessas pessoas jurídicas, em que pese nada tragam de concreto no que diz com as normas
regentes das entidades, pois todos os que defendem este ou aquele ponto de vista são contestes
ao afirmar que a legislação aplicável é especial e não o Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, que,
quando muito, é aplicável apenas subsidiariamente.
2. Entidades de Previdência Complementar Sem Fins Lucrativos (EAPCSFL) são
sociedades de seguro mútuo
As atuais "entidades de previdência complementar sem fins lucrativos", antigas "entidades de
previdência privada sem fins lucrativos", foram, outrora, conhecidas como sociedades de "seguro
mútuo", "sociedades de montepio", ou simplesmente de "montepios".
Arnoldo Wald esposa esse entendimento, pois ao definir o contrato de previdência privada
sustenta ser esse um "seguro mútuo de caráter". Diz o mencionado jurista, verbis:
"(...) o contrato previdenciário é um contrato de seguro mútuo de natureza privada, de caráter
sui generis, bilateral, aleatório, de adesão e formal" (Curso de direito civil brasileiro, obrigações e
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contratos. 13. ed. São Paulo: Ed. RT, 1998. p. 615).


Também, no sentido de que as entidades de previdência privada sem fins lucrativos são
"sociedades de seguro mútuo" previstas no art. 1.466 do CC/1916 (LGL\1916\1), com as
alterações previstas na legislação posterior Manuel Sebastião Soares Póvoas, Previdência privada,
Ed. Funenseg, 1985, p. 200, item 1.1; e Rodrigo José de Kühl e Carvalho, Cadernos de Seguros
11/93, Ed. Funenseg.
Nossos tribunais também acolheram a tese de que as atuais entidades de previdência privada são
as antigas sociedades de seguro mútuo previstas no art. 1.466 do CC/1916 (LGL\1916\1), o que
se pode confirmar pela decisão abaixo, na ApCív 1335/2002, julgada pela 1.ª Câm. Cív. do TJRJ,
tendo por relator o Des. Maurício Caldas Lopes, verbis:
"Ação ordinária, pecúlio, entidade de previdência privada aberta - Natureza jurídica do pecúlio por
morte, instituído sem qualquer prestação continuada posterior - esta sim de natureza
previdenciária - de autêntico seguro mútuo (CC, art. 1.466). Incidência, por força da Lei 6.435/
1977 (art. 10), do Dec. 81.402/1978 (art. 9.º) e da LC 109/2001 (art. 73), da legislação atinente
aos seguros privados, na qual se insere a regra da prescrição ânua, das ações do segurado contra
seu segurador, tal como previsto no inc. II do § 6.º do art. 178 do CC. Prescrição verificada.
Extinção do processo com apreciação do respectivo mérito que, ademais, se exibe desfavorável à
apelante" (TJRJ, 1.ª Câm. Cív., ApCív 1335/2002, rel. Des. Maurício Caldas Lopes, apelante:
Rosalina de Araújo Bordalo, apelada: Capemi - Caixa de Pecúlios, Pensões e Montepios-
Beneficente).
Há, outrossim, precedente do STF no RE 115.308-3-RJ, que teve por relator o Min. Néri da
Silveira, que sustentou, para afastar a incidência do ISS, que a Prefeitura do Rio de Janeiro
tentava cobrar sobre a atividade das empresas denominadas de "medicina de grupo", que as
empresas que ofereciam o plano de pré-pagamento previsto no art. 135 do Dec.-lei 73/1966
seriam também seguradoras (esvaziou-se a discussão sob a forma pela qual estariam constituídas
para analisar objetivamente a atividade) e o contrato seria típico contrato de seguro-saúde
previsto nos arts. 129 e 130 do referido Dec.-lei 73/1966, ou seja, mesmo as empresas chamadas
de "medicina de grupo", se operarem com planos de "pré-pagamento", são seguradoras pelo que
decidido pelo STF, pois para o Tribunal Excelso "qualquer contrato onde se receba algo para cobrir
risco futuro e incerto é seguro".
Diz trecho do voto do Min. Néri da Silveira, no RE 115.308-3-RJ:
"(...) Destarte, para o deslinde da controvérsia devemos atentar para uma análise objetiva da
verdadeira natureza das atividades desenvolvidas pela apelante, em atendimento ao contrato
firmado com seus clientes, pois, é, especificamente, com relação a este ponto que se discute a
incidência ou não do imposto municipal.
No caso específico os serviços compromissados são de natureza técnica e profissional.
Os valores recebidos pela apelante do cliente não se destinam ao pagamento da prestação de
qualquer serviço médico, hospitalar ou similar.
Ao contrário, supondo-se que estes serviços possam eventualmente não ser jamais prestados,
pois como ocorre com qualquer empresa no ramo de seguro a lucratividade do investimento está
determinada por uma relação atuarial entre o valor dos pagamentos recebidos e a freqüência com
que é demandada a empresa ao pagamento dos custos e riscos segurados.
Assim, quem presta o serviço de assistência médica e hospitalar é o médico ou o hospital
credenciado, porém nunca a apelante que não dispõe da habilitação técnica ou profissional para
tanto adequada.
A apelante é, tão-somente, responsável pelo pagamento que assumiu pelo contrato firmado com
o cliente.
(...)
A atividade da apelante - cobertura de custos de assistência médica hospitalar - caracteriza-se
pela celebração do nítido contrato de seguro, do tipo seguro-saúde, previsto nos artigos 129 e
130 do Dec.-lei 73, de 21.11.1966 , robustecido pelo documento fornecido pela Susep.
Obriga-se a apelante a indenizar o associado ou cliente do prejuízo resultante de riscos futuros,
previstos no contrato, preenchendo, pois, integralmente, a definição legal, doutrinária e
jurisprudencial de contrato de seguro.
O contrato é aleatório e não comutativo. Enquanto as taxas ou mensalidades são devidas pela
mera celebração do contrato, o risco situa-se no campo de mera possibilidade de vir a ser devido,
se ocorrido o evento previsto no contrato. É cediço que, para o segurador, só a soma de prêmios
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é que permite uma contrapartida equivalente: o prêmio, em verdade, isoladamente considerado


não é cifra de compensação, senão tida em seu conjunto pela dispersão das probabilidades de
ocorrência de eventos, só estatisticamente previsíveis e atuarialmente estimáveis (...).
Configurando, irreprochavelmente, a atuação da apelante típica atividade securitária, da espécie,
seguro-saúde, não está ela submetida ao ISS e, por isto, não está sujeita à competência
tributária do Município, ex vi dos arts. 21, VI, e 24, II, da CF (LGL\1988\3) (...)" (STF, 1.ª T., RE
115308-RJ, rel. Min. Néri da Silveira, j. 17.05.1988, DJ 1.º.07.1988, Ementário, vol. 01508-09, p.
1.988, recorrente: Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro; recorrida: Amil - Assistência Médica
Internacional Ltda. Obs.: consta do site do STF - grifamos).
Vê-se, pois, que sempre houve ressalva à afirmação genérica e sem fundamento de que as "todas
as seguradoras são constituídas sob a forma de sociedades anônimas".
A autarquia que cuida da Previdência Social adota o termo "seguro" em sua denominação, sem
equívoco ou censura a ser feita (INSS - Instituto Nacional do Seguro Social) ante o que decidido
pelo STF.
As entidades fechadas de previdência privada, portanto, podem também ser consideradas
seguradoras lato sensu e o par. ún. do artigo 1.º da Lei 6.435 de 1977 atesta esse fato ao
chamar o "participante" de "segurado", quando diz: "Para os efeitos desta lei, considera-se
participante o associado, segurado ou beneficiário incluído nos planos a que se refere este artigo".
Entidades de previdência complementar, portanto, são seguradoras, porque qualquer contrato
onde haja pré-pagamento, para cobertura de riscos futuros e incertos, é contrato de "seguro",
segundo o STF, independentemente da forma pela qual está constituída a empresa que o opere.
Adiantamos nosso entendimento de que as entidades abertas de previdência complementar sem
fins lucrativos, que foram constituídas sob a forma de "sociedades civis sem fins lucrativos" antes
da entrada em vigor do novo Código Civil (LGL\2002\400) de 2002 eram e são, atualmente,
"pessoas jurídicas" sui generis, regradas por leis próprias, específicas, que demarcam os direitos e
obrigações dos que participam dos planos (participantes) e dos que administram a sociedade
(controladores), principalmente quanto à Administração, designação de diretoria e
responsabilidade dos que eram chamados de associados controladores e privilégios dos
denominados associados participantes e que não se submetem a todas disposições legais da Lei
10.406/2002, por não quadrarem com todos os conceitos pertinentes às pessoas jurídicas de
direito privado ali definidas, tais como associações ou sociedades.
Caso seja de mister aproveitar a terminologia do novo Código Civil (LGL\2002\400) para designar
as entidades abertas de previdência complementar sem fins lucrativos, do que discordamos,
certamente haverá divisão na doutrina, porquanto, sejam consideradas "associações" ou
"sociedades", serão as entidades de previdência privada sempre sui generis, especiais, com
regramentos próprios, pela ausência da finalidade lucrativa - própria às sociedades tal como
definidas no Código Civil (LGL\2002\400) de 2002 - e por terem regras especiais quanto a direitos
e obrigações dos associados, mormente quanto à governança - o que as distinguem das
"associações" de que trata a Lei 10.406/2002. Quanto a esse último aspecto, impossibilidade de
quadrarem no conceito de "associação" inserto no Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, dependerá
mais da interpretação que se der aos arts. 55 e 59 daquele Diploma Legal, conforme,
oportunamente, o demonstraremos.
2.1 Evolução legislativa
As entidades de previdência privada, ou montepios, necessitavam de autorização específica do
Poder Público (art. 20 do CC/1916 (LGL\1916\1)) e estavam previstas dentro do capítulo do
seguro, no art. 1.466 do CC/1916 (LGL\1916\1), que regrava o seguro mútuo com dizer, ipsis
verbis:
"Art. 1466. Pode ajustar-se o seguro, pondo certo número de segurados em comum entre si o
prejuízo, que a qualquer deles advenha, do risco por todos corrido.
Em tal caso o conjunto dos segurados constitui a pessoa jurídica, a que pertencem as funções
de segurador" (grifamos).
Pontes de Miranda, ao comentar o disposto no art. 1.466 do CC/1916 (LGL\1916\1), leciona que o
"segurado" de sociedade de seguro mútuo é "sócio" da seguradora e usa do termo "sócio" porque o
Código Civil de 1916 (LGL\1916\1) não distinguia "sócio" de "associado":
"(...) Não se pode dizer que, nas empresas de seguro mútuos, os segurados sejam os próprios
seguradores; mas verdade é que o segurado já está incluso na coletividade social. Todavia, é
preciso que não se confundam os seguros feitos em sociedades cooperativas e os seguros
mútuos. Naquelas, o seguro pode ser feito pela cooperativa, sem que resulte da própria entrada

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do sócio. A entrada do sócio não determina o seguro, como se daria no mútuo de seguros. No
seguro mútuo, a qualidade de sócio não é só pressuposto necessário, é pressuposto suficiente e
determinante" (Tratado de direito privado. São Paulo: Ed. RT. t. XLVI, p. 109 et seq. - grifamos).
Pontes de Miranda entende, pois, ser "obrigatório" pela própria natureza do negócio que no
"seguro mútuo" o "segurado" seja "sócio", sendo claro, porém, que, de acordo com a nova
terminologia do Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, terá de primeiro ser definido se as entidades
abertas de previdência complementar sem fins lucrativos são "sociedades" ou "associações", para
depois, por conseqüência, poderem ser designados os segurados (participantes) de "sócios" ou
"associados", conforme o caso, ou mesmo "simples contratantes de planos previdenciários" em
oposição aos reais "associados ou sócios" que controlam as entidades.
Clóvis Beviláqua, ao comentar o art. 1.466, também ressalta a natureza dúplice do contrato de
"seguro mútuo", sem fazer distinção, ainda não existente, entre "sócio" e "associado", ipsis litteris:
"1. As sociedades de seguros mútuos constituem-se pela reunião de certo número de pessoas,
que põem em comum determinado prejuízo, para que a repercussão do mesmo se atenue pela
dispersão. (...)
Os sócios são os próprios segurados, e a sociedade considerada em conjunto, a pessoa jurídica,
é o segurador" (Código Civil (LGL\2002\400) dos Estados Unidos do Brasil. 10. ed. Rio de Janeiro:
Francisco Alves. vol. V, p. 171, observação ao art. 1.466 - grifamos).
No mesmo sentido, J. M. de Carvalho Santos, in verbis:
"Embora seja a mutualidade a base de todo seguro, o certo é que o seguro mútuo se distingue do
seguro de prêmio fixo, principalmente porque os sócios considerados individualmente são os
segurados, enquanto que esses mesmos sócios, considerados em conjunto, formam a pessoa
jurídica, que é o segurador" (Código Civil (LGL\2002\400) brasileiro interpretado. 12. ed. Rio de
Janeiro: Freitas Bastos. vol. XIX, p. 381-382 - grifamos).
Razão assiste a Pontes de Miranda ao concluir com o alerta quanto à necessidade de o segurado
continuar na sociedade de seguro mútuo sob pena de perder a cobertura do seguro, ipsis verbis:
"Os figurantes, nos seguros mútuos, de certo modo se seguram a si mesmos. Somente têm
cobertos os riscos a que se refere o contrato de seguro, enquanto fazem parte da entidade
mutualística. Dissemos 'de certo modo'; porque tal correlação é apenas econômica e social:
nenhum dos sócios é segurador" (grifei) (op. cit., p. 115, § 4.991).
O problema será, pois, definir como - perante o novo Código Civil (LGL\2002\400) de 2002 - o
"segurado", atualmente chamado de "participante", continuará vinculado à entidade, id est, se
será: "sócio", "associado" ou "simples contratante de plano".
Sendo certo, porém, que tal fato foi um pouco mitigado com a publicação da Lei 6.435/1977 que
permite às entidades fechadas de previdência privada, que são sem fins lucrativos, serem também
constituídas sob a forma de "fundação", o que afasta, neste caso, a figura do "sócio" ou
"associado".
2.2 Crescimento das EAPC sem fins lucrativos e necessidade de imposição de direitos e
obrigações diferenciados para simples participantes de planos e associados controladores
Como visto acima, as qualidades de "sócio" ou "associado" (conforme o que entender o intérprete)
e "segurado" são obrigatórias e intrínsecas ao contratante de "seguro mútuo", de tal sorte que
não podem existir isoladamente sem que, com tal, se desnature o próprio contrato; todavia, pela
evolução das referidas entidades de previdência privada sem fins lucrativos e o grande número de
segurados que granjearam, foi mister alterar a legislação, para que não tivesse, exempli gratia, de
realizar uma "assembléia com um milhão de pessoas" - pois há entidade que ultrapassou essa
marca em número de segurados e outras que não ficaram longe disso.
Assim, o mutualismo que permitia cobrar dos associados eventual diferença que faltasse ao
cumprimento dos compromissos assumidos (pagamento de benefícios) foi substituído por sistema
em que os simples participantes de planos previdenciários não possuíam nenhum poder de controle
sobre a entidade e também não respondiam pelos déficits porventura existentes, além de
possuírem "direito creditório privilegiado em caso de liquidação da pessoa jurídica"; ao passo que
os controladores" respondiam civil e criminalmente pelo insucesso da entidade, inclusive com
indisponibilidade dos bens que possuíssem. Com isso os participantes de planos previdenciários se
aproximaram muito mais da figura de "simples contratantes" que de "sócio" ou "associado", pelo
total descomprometimento com as decisões tomadas pelas entidades e pelo sucesso ou insucesso
destas. Ao parecer, o "corporativismo", próprio às associações segundo a tese esposada entre
outros por Pontes de Miranda, somente existiria nas entidades abertas de previdência
complementar sem fins lucrativos quanto aos "associados fundadores e controladores" que

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preexistem à personificação da entidade (o grupo de pessoas que já estava unida por ideais e ou
outros laços significativos e resolveu criar a entidade).
2.3 Lei 6.435/1977 e Dec. 81.402/1978 definem a forma de organização das entidades de
previdência complementar como sociedades civis especiais
Foi com esse entendimento que as antigas "sociedades de seguro mútuo", "sociedades de
montepio", ou simplesmente "montepios", ganharam legislação própria (Lei 6.435/1977, Dec.
81.402/1978 e Dec. 81.240/1978 entre as principais normas) e outro nomem iuris ("entidades de
previdência privada"), sendo-lhes aplicáveis, tal como agora, só em caráter subsidiário a legislação
de seguros (rectius, dos demais ramos de seguro, pois previdência privada é também "seguro"),
por força do disposto no artigo 10 da Lei 6.435 de 1977 e artigo 9.º do Dec. 81.402 de 1978.
Os elementos que caracterizam as seguradoras de seguro mútuo (atuais entidades de previdência
complementar do art. 77, § 1.º, da LC 109/2001) e as diferenciam das demais seguradoras
subsistiram na Lei 6.435/1977 e no Dec. 81.402/1978, ou seja, pelas normas posteriores ao Código
Civil de 1916 (LGL\1916\1) ficou consignado, também, que as entidades de previdência privada
abertas sem fins lucrativos dependiam de autorização para funcionar (artigo 2.º da Lei 6.435/
1977, c/c o artigo 17 do Dec. 81.402 de 1978, e atual art. 1.123 da Lei 10.406/2002 - novo
Código Civil (LGL\2002\400)) e que os "segurados" (chamados de "participantes") eram também
"associados" ou "sócios" (cf. artigo 1.º, par. ún., da Lei 6.435 de 1977: "Para os efeitos desta Lei,
considera-se participante o associado, segurado ou beneficiário incluído nos planos a que se
refere este artigo e 85 da Lei 6.435/1977, artigo 14 do Dec. 81.402/1978 e art. 1.466, in fine, do
CC/1916 (LGL\1916\1)").
Muitas alterações feitas pela Lei 6.435/1977 e Dec. 81.402/1978 tiveram o condão apenas de
confundir a doutrina quanto à natureza jurídica do contrato, tais como: a de se alterar o nome de
"seguro" para "plano previdenciário"; de "segurado" para "participante"; de "prêmio" para
"contribuição"; e, entre as alterações que pouco acresceram se inclui a alteração do próprio nome
das "seguradoras de seguro mútuo" para "entidades de previdência privada".
No entanto, muitas modificações importantes foram feitas, tais como as referentes às disposições
do art. 1.468 do CC/1916 (LGL\1916\1), em que havia possibilidade de os "segurados" se
quotizarem pela diferença, no caso de pagamento de prêmios fixos não cobrirem a importância dos
riscos verificados, responsabilidade essa que foi substituída, pois pela legislação que se seguiu (Lei
6.435/1977, Dec. 81.402/1978 e LC 109/2001) somente o patrimônio da entidade e dos que a
administram possuem responsabilidades quanto a eventual diferença.
A tentativa de se ver nos antigos planos de "renda" oferecidos pelas entidades de previdência
complementar diferença entre "previdência privada" e "seguro" não resiste à análise mais profunda,
pois o contrato de "renda" já existia no Código Civil de 1916 (LGL\1916\1) e também o seguro para
recebimento em vida ("renda", art. 1.424; e "seguro dotal", no art. 1.471, in fine, do CC). Pontes
de Miranda (Tratado de direito privado. 3. ed. São Paulo: Ed. RT, 1984. t. 46, § 4.959, p. 10, item
3), nesse aspecto, com acerto, explica que se o contrato de "renda" cobre algum risco sobre a
vida do contratante (inclusive o "risco de sobrevivência a determinado período", em que há
presumivelmente diminuição da capacidade laborativa) não se trata de contrato de "renda" e sim
de "seguro dotal". Nesse sentido o RE 115.308-3-RJ que será adiante transcrito.
Pela segurança que os segurados ("participantes") que apenas participam do seguro/plano
previdenciário e não administram ou controlam a seguradora ("entidade de previdência privada")
ganharam de não concorrerem com quotas para cobrir eventual insucesso financeiro e pela
responsabilidade civil e criminal que os "segurados administradores/controladores" assumiram pela
nova legislação, claro ficou que não seria mister nas decisões uma "assembléia geral de todos os
participantes" (isso se fossem estes tidos por "sócios" ou "associados"), o que estampado na
redação dada aos artigos 30 da Lei 6.435/1977 e artigos 14 e 38 do Dec. 81.402/1978, que dizem,
ipsis litteris:
Lei 6.435/1977:
"Art. 30. Os estatutos das entidades abertas, sem fins lucrativos, ao disciplinarem a forma de sua
administração e controle, estabelecerão distinção expressa entre associados controladores e
simples participantes dos planos de benefícios.
§ 1.º Associados controladores, para os efeitos desta Lei, são os integrantes de colegiados,
obrigatoriamente instituídos, compostos de número ímpar e integrados de, no mínimo, 9 (nove)
membros, todos pessoas físicas, com poderes normativos de fiscalização e de controle,
especialmente os de estabelecer a política operativa, de designar a diretoria e de dispor, em
instância final, do patrimônio da entidade.
§ 2.º Os associados controladores, mesmo que não exerçam diretamente funções de diretores,

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serão solidariamente responsáveis pelos atos ilegais ou danosos praticados, com o seu
consentimento, pelo próprio colegiado ou pela diretoria da entidade".
Dec. 81.402/1978:
"Art. 14. Quando se tratar de entidade aberta de previdência privada sem fins lucrativos, será
observado:
I - constituição sob a forma de sociedade civil sem fins lucrativos, com os seguintes requisitos:
a) o grupo organizador será constituído de, no mínimo, nove pessoas físicas, com os poderes e
responsabilidades dos associados controladores;
b) os primeiros associados, em número mínimo de mil, constituirão a categoria de sócios
fundadores (...).
Pelo artigo 30 da Lei 6.435/1977 ficou claro que aos "associados controladores" foi cometido o
poder de "designar a diretoria" da entidade, ou seja, não é feita "assembléia geral de todos os
participantes" para esse fim e sim "assembléia de associados controladores", nem sequer é dito
pelo referido artigo que os "participantes são associados" (embora se possa concluir nesse sentido
pela redação dada ao art. 85), pelo contrário, faz-se questão de enfatizar que são "simples
participantes dos planos de benefícios", porquanto não se usou do termo associados (ficaria "(...)
simples associados participantes (...)") como anteriormente para controladores.
Já pelo artigo 14 do Dec. 81.402/1978 pode-se notar que permanece a distinção entre
"controladores" e simples "participantes" de planos previdenciários - distinção essa que deve
constar dos estatutos das entidades ("Art. 38. Os estatutos das entidades abertas sem fins
lucrativos estabelecerão distinção entre associados controladores e simples participantes dos
planos de benefícios"), bem como naquele artigo ficou claro, pela redação dada à alínea b, que
todos são "associados" ("(...) os primeiros associados (...)") ou "sócios" ("(...) constituirão a
categoria de sócios fundadores").
Chamamos a atenção, porém, para o fato de que o decreto não pode inovar e ultrapassar a lei, id
est, onde a lei não disse que todos são "associados" não pode o decreto dizer, pois regular não é
o mesmo que criar direitos, tudo dependerá, pois, da interpretação que se der também ao par. ún.
do art. 1.º e art. 85 da Lei 6.435/1977 que também faziam menção a "associados". Para nós a
redação é suficientemente clara para dispor que todos são integrantes da pessoa jurídica ("sócios"
ou "associados", segundo o que se entender), mas com direitos e obrigações necessariamente
diferenciados.
Outrossim, aqui já se destaca a inexistência, à época, de distinção entre os termos "associado" e
"sócio", que o Dec. 81.402/1978 toma como sinônimos, pela utilização dos dois termos no mesmo
artigo indistintamente e que o Código Civil de 1916 (LGL\1916\1) - e mesmo o Código Comercial -
também toma por sinônimos.
Nesse sentido, Manuel Sebastião Soares Póvoas, com propriedade, diz, in verbis:
" As entidades abertas sem fins lucrativos têm a forma jurídica de sociedade civil ou mais
especificadamente, de sociedade mútua.
(...)
Tal como definidos, os sócios controladores pareciam esgotar a categoria dos sócios da sociedade
civil, não fosse o caso do decreto regulamentar, no citado art. 14, estabelecer que os primeiros
mil associados constituirão a categoria de sócios fundadores.
Esta disposição não deixa dúvidas de que a sociedade civil é uma sociedade mútua, pois diz
textualmente que 'os primeiros associados, em número de mil, constituirão a categoria de sócios
fundadores' o que pressupõe que todos os participantes são associados, e, mais do que isso, que
a sociedade tem que ter um mínimo de mil associados" (grifei) (Op. cit., p. 234-235).
Enquanto os simples participantes gozavam e gozam de créditos privilegiados em caso de
liquidação extrajudicial (§ 2.º do artigo 67 da Lei 6.435/1977; e § 3.º do art. 50 da LC 109/2003),
pelo artigo 71 da Lei 6.435 de 1977 (e art. 59 da LC 109/2001): "Os administradores e membros de
conselhos deliberativos, consultivos, fiscais ou assemelhados, das entidades de previdência
privada sob intervenção ou em liquidação extrajudicial, ficarão com todos os seus bens
indisponíveis, não podendo, por qualquer forma, direta ou indireta, aliená-los ou onerá-los, até
apuração e liquidação final de suas responsabilidades", o que justifica o tratamento diferenciado
também quanto à direção da entidade, in casu os poderes cometidos aos "associados
controladores" para designar diretoria.
Verdade seja que, por ser da natureza do contrato de "seguro mútuo" (art. 1.466 do CC/1916

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(LGL\1916\1)) que o "segurado" seja "sócio" (pelo novo Código Civil (LGL\2002\400) de 2002 será
"associado" ou "sócio" segundo o entendimento doutrinário adotado) da seguradora, e tendo
inclusive a boa doutrina afirmado que "somente haverá cobertura do seguro enquanto o segurado
gozar da qualidade de 'sócio' ou 'associado'", a ninguém será lícito argüir que a legislação
societária mais adequada a regrar as entidades de previdência privada sem fins lucrativos seja a
Lei das Sociedades Anônimas, que desconhece a figura do "associado" ou "sócio" participante.
Organização como sociedades civis especiais:
Com eficácia de lei complementar, por força do inc. II dos arts. 192 (antes da EC 40/2003) e 202
da CF (LGL\1988\3), portanto, a Lei 6.435/1977 regrou a "constituição, organização e
funcionamento" dos estabelecimentos de previdência complementar e dispôs que as entidades
abertas de previdência complementar sem fins lucrativos seriam "sociedades civis especiais" (pois
deviam obedecer regras não comuns a todas as "sociedades civis do Código Civil de 1916
(LGL\1916\1)"), em bastos artigos, entre os quais destacam-se os abaixo que grifamos:
" Art. 4.º Para os efeitos da presente Lei, as entidades de previdência privada são classificadas:
I - de acordo com a relação entre a entidade e os participantes dos planos de benefícios, em:
a) fechadas, quando acessíveis exclusivamente aos empregados de uma só empresa ou de um
grupo de empresas, as quais, para os efeitos desta Lei, serão denominadas patrocinadoras;
b) abertas, as demais;
II - de acordo com seus objetivos, em:
a) entidades de fins lucrativos;
b) entidades sem fins lucrativos.
(...)
Art. 5.º As entidades de previdência privada serão organizadas como:
I - sociedades anônimas, quando tiverem fins lucrativos;
II - sociedades civis ou fundações, quando sem fins lucrativos.
(...)
Art. 11. A autorização para funcionamento de entidade aberta será concedida mediante portaria
do Ministro da Indústria e do Comércio, a requerimento dos representantes legais da
interessada.
§ 1.º Concedida a autorização, a entidade terá o prazo de 90 (noventa) dias para comprovar,
perante o órgão Executivo do Sistema Nacional de Seguros Privados, o cumprimento de
formalidades legais e outras exigências.
§ 2.º A falta da comprovação a que se refere o parágrafo anterior acarretará a caducidade
automática da autorização para funcionamento.
Art. 12. Aprovada a documentação apresentada em decorrência das disposições do artigo
anterior, será expedida carta-patente pelo órgão executor do Sistema Nacional de Seguros
Privados.
(...)
Art. 17. Os participantes dos planos de benefícios que sejam credores destes têm privilégio
especial sobre reservas técnicas, fundos especiais ou provisões garantidoras das operações.
(...)
Art. 30. Os estatutos das entidades abertas, sem fins lucrativos, ao disciplinarem a forma de sua
administração e controle, estabelecerão distinção expressa entre associados controladores e
simples participantes dos planos de benefícios.
§ 1.º Associados controladores, para os efeitos desta Lei, são os integrantes de colegiados,
obrigatoriamente instituídos, compostos de número ímpar e integrados de, no mínimo, 9 (nove)
membros, todos pessoas físicas, com poderes normativos de fiscalização e de controle,
especialmente os de estabelecer a política operativa, de designar a diretoria e de dispor, em
instância final, do patrimônio da entidade.
§ 2.º Os associados controladores, mesmo que não exerçam diretamente funções de diretores,
serão solidariamente responsáveis pelos atos ilegais ou danosos praticados, com o seu
consentimento, pelo próprio colegiado ou pela diretoria da entidade.
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Art. 31. Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, as entidades abertas, sem fins lucrativos,
poderão remunerar seus diretores e membros de conselhos deliberativos, consultivos, fiscais ou
assemelhados, desde que respeitadas as exigências estabelecidas no artigo 23.
Parágrafo único. No caso de acumulação de funções, a remuneração corresponderá apenas a uma
delas, cabendo opção.
Art. 32. Nas entidades abertas, sem fins lucrativos, as despesas administrativas não poderão
exceder os limites fixados, anualmente, pelo órgão normativo do Sistema Nacional de Seguros
Privados".
Quer se as tratem de "sociedades civis especiais" quer de "associações especiais" pela definição
do Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, o que é certo é que lhes devem ser respeitadas as regras
próprias às entidades abertas de previdência complementar sem fins lucrativos previstas na Lei
6.435/1977, pois é daquelas que resulta a "organização de sociedade civil" a que se refere o § 1.º
do art. 77 da LC 109/2001 que permite a continuidade dessa organização especial. Principalmente,
deverão sempre ser observadas as distinções entre "associados controladores" (que designam a
diretoria e respondem com os próprios bens ao insucesso da atividade) e simples participantes de
planos previdenciários (que possuem crédito privilegiado quanto à reserva do plano de benefício e
não respondem pelo insucesso da atividade), constantes entre outros dos arts. 17 e 30 acima
mencionados.
2.3.1 Lei 6.435/1977 e sua eficácia de lei complementar inc. II do art. 192 e art. 202 da CF
A Lei 6.435/1977, que regrou a organização, funcionamento e atividades das entidades abertas e
fechadas de previdência complementar, é lei ordinária com eficácia de lei complementar a partir de
1988, pois o art. 192 da CF (LGL\1988\3), em seu inc. II (antes da EC 40/2003), previa que "lei
complementar" ( caput) disporia sobre "autorização e funcionamento dos estabelecimentos de
previdência e capitalização".
O Código Civil (LGL\2002\400) de 2002 foi publicado em 2001, e começou a viger em 2002, antes
da EC 40/2003, razão pela qual o texto do inc. II do art. 192 da CF (LGL\1988\3) estava em pleno
vigor e deixava sem nenhuma possibilidade de dúvida ao intérprete a certeza de que a "lei geral
ordinária" não poderia regrar aquilo que era cometido constitucionalmente à "lei complementar
especial" e regrado por esta.
Mesmo após a EC 40/2003, que modificou o art. 192 da CF (LGL\1988\3) - e revogou o inc. II -
persiste a necessidade de "lei complementar" ("Art. 192. O sistema financeiro nacional será (...)
regulado por leis complementares (...)") para regular o sistema financeiro nacional, no qual estão
insertas as entidades de previdência complementar.
Também o art. 202 da CF (LGL\1988\3) deixa claro ser necessária lei complementar para regular o
"regime de previdência privada", o que, mais uma vez, enfatiza a eficácia de lei complementar
atribuída à Lei 6.435/1977.
2.3.2 Pessoas jurídicas sui generis "sociedades civis especiais" e não apenas "sociedades
civis" até 2002
As entidades de previdência privada sem fins lucrativos, que são simples evolução das
seguradoras de "seguro mútuo" - cujo contrato era previsto no art. 1.466 do CC/1916
(LGL\1916\1) - são, pois, estruturadas de tal forma que o proponente, tão logo seja aceita a
proposta de ingresso em plano previdenciário, passa a gozar da condição de "sócio ou associado"
(artigo 14, b , do Dec. 81.402 de 1978) e ganha o nome de "participante" (artigos 1.º da Lei
6.435/1977 e 8.º da LC 109/2001), havendo categorias diferenciadas de associados (os simples
"participantes", que só participam de planos previdenciários; e os "controladores" - que participam
dos planos previdenciários e controlam a entidade).
Isso as torna pessoas jurídicas sui generis que não quadram com nenhum dos tipos previstos no
Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, em especial as regras que lhe são próprias não frisam com a
totalidade das que regem as "associações", bem como a ausência de finalidade lucrativa também
faz com que não possam se encaixar perfeitamente no conceito de "sociedade" prevista no Código
Civil (LGL\2002\400), quer simples, quer empresária, nada obstante a "atividade econômica"
exista.
A menção feita pelo § 1.º do art. 77 da LC 109/2001 de que permitida a manutenção como
"sociedades civis" não remete, pois, ao Código Civil de 1916 (LGL\1916\1), e sim à Lei 6.435/1977.
O termo "civil" aí utilizado era próprio da distinção feita entre "sociedades civis" e "sociedades
comerciais", e só o seguro marítimo era tido por "comercial".
2.4 LC 109/2001
Em atenção ao caput e inc. II do art. 192 da CF (LGL\1988\3) (antes da EC 40/2003) que previa a

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necessidade de lei complementar para disciplinar as entidades de previdência privada e as suas


atividades, bem como em atenção ao art. 202 da Carta Magna (LGL\1988\3) que dispunha que o
"regime de previdência privada" (redação dada pela EC 20/1998) seria regulado por lei
complementar, foi promulgada a LC 109/2001.
A LC 109/2001, quanto às entidades abertas de previdência complementar sem fins lucrativos,
expressamente no § 1.º do art. 77, permitiu que continuassem organizadas na forma da Lei 6.435/
1977 e Dec. 81.402/1978 e, no seu art. 79, revogou a Lei 6.435/1977.
Dispõe a LC 109/2001 no seu art. 73, c/c o § 1.º do art. 77 e art. 79, in verbis:
"Art. 73. As entidades abertas serão reguladas também, no que couber, pela legislação aplicável
às sociedades seguradoras."
"Art. 77. (...)
§ 1.º No caso das entidades abertas sem fins lucrativos já autorizadas a funcionar, é permitida a
manutenção de sua organização jurídica como sociedade civil, sendo-lhes vedado participar,
direta ou indiretamente, de pessoas jurídicas, exceto quando tiverem participação acionária:"
(grifamos).
"Art. 79. Revogam-se as Leis 6.435, de 15 de julho de 1977, e 6.462, de 09 de novembro de 1977"
(grifamos).
É importante frisar que os artigos que tratam das entidades sem fins lucrativos foram acrescidos
às pressas, por haverem sido esquecidas pelo legislador que somente curou de legislar para as
entidades abertas com fins lucrativos e para as entidades fechadas (cf. art. 36 da LC 109/2001).
2.4.1 § 1.º do art. 77 da LC 109/2001 mantém organização das entidades abertas de
previdência complementar sem fins lucrativos
Quanto à tese que alguns juristas sustentam na tentativa de forçar as entidades abertas de
previdência complementar a se transformarem, obrigatoriamente, em sociedades anônimas,
lembramos, pelo acima transcrito, que a LC 109/2001 permitiu às entidades abertas de previdência
complementar sem fins lucrativos que mantivessem sua organização jurídica como sociedades
civis, o que seria impossível de atender se a legislação aplicável fosse a Lei de Sociedades
Anônimas (Lei 6.404/1976), pois esta, em seu art. 2.º, diz: " Pode ser objeto da companhia
qualquer empresa de fim lucrativo, não contrário à lei, à ordem pública e aos bons costumes"
(grifamos). O atual Código Civil (LGL\2002\400), Lei 10.406/2002, por sua vez, considera as
"sociedades" por si sós com finalidade lucrativas, o que mantém afastada a hipótese de incidência
mesmo quanto à legislação atual, conforme faremos ver pela ausência de finalidade de lucro das
entidades.
2.4.2 Art. 79 da LC 109/2001. "Ab-rogação" ou "derrogação" da Lei 6.435/1977?
Quem lê, isoladamente e de fugida, o que dispõe o art. 79 da LC 109/2001 não tem dúvidas
quanto à revogação total (ab-rogação) da Lei 6.435/1977 - pela forma usualmente adotada para
tanto ("Revogam-se as Leis 6.435 (...)"), sendo esta a lei que dispunha sobre a organização das
entidades abertas de previdência complementar sem fins lucrativos como sociedades civis
especiais (nas alíneas b dos incisos I e II do art. 4.º, c/c o inc. II do art. 5.º, arts. 11 a 15, e
arts. 30 a 33).
Mesmo em nosso parecer anterior, julgamos desnecessário abordar o tema em profundidade, pois o
§ 1.º do art. 77 da LC 109/2001, somado às disposições do Dec. 81.402/1978, nos parecia
suficiente a ilidir qualquer possibilidade de incidência do Código Civil (LGL\2002\400) de 2002. Em
que pese ainda pensarmos do mesmo modo, entendemos também deva melhor ser observado o
disposto no art. 79 da LC 109, em face do contido no § 1.º do art. 77 e as regras básicas de
hermenêutica.
Como interpretar lei é antes que tudo verificar se a norma está de acordo com o ordenamento
jurídico vigente, não se pode interpretar o art. 79 da LC 109/2001 sem lembrar da remissão que o
§ 1.º do art. 77 faz à legislação anterior, ou seja, justamente à lei que a princípio estaria
totalmente revogada.
Daí, sem grande esforço, pode-se sustentar a ocorrência de mera derrogação (revogação parcial)
da Lei 6.435/1977 pelo art. 79 da LC 109/2001 e não sua ab-rogação (revogação total), por
necessidade de o intérprete entender vigentes as normas que estruturam as entidades abertas de
previdência privada sem fins lucrativos como "sociedades civis", id est, Lei 6.435/1977 (as alíneas
b dos incisos I e II do art. 4.º, c/c o inc. II do art. 5.º, arts. 11 a 15, e arts. 30 a 33) e Dec.
81.402/1978 (arts. 14 a 21 c/c os arts. 38 a 40), como que integradas na LC 109/2001 e com
eficácia de leis complementares.
2.4.3 As regras de Saredo sobre revogação das leis integração das normas pertinentes à
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sociedade civil ao § 1.º do art. 77 da LC 109/2001


Eduardo Espínola ("Da lei e da sua obrigatoriedade. Do direito intertemporal". Tratado de direito
civil brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1939. vol. II, p. 124, 134-136) após
elucidativas lições sobre o tema "revogação da lei", e sempre com a precisão técnica que lhe era
própria chamando de "ab-rogação" à revogação total, traz à lembrança as 10 regras de quem
considera "uma das maiores autoridades em assuntos concernentes à elaboração, atuação e
revogação das leis, Giuseppe Saredo, que em seus estudos ("Abrogazione delle Leggi". Digesto
Italiano. 1927. vol. 1, n. 127-128, 1.ª parte, p. 135) sugere deva o intérprete observar quanto ao
tema "Revogação das Leis". Pela especialidade do jurista consagrado e aplicação ao caso ora em
apreço, faz-se mister transcrever a primeira, segunda, terceira, oitava e, especialmente, a nona
das regras que criou sobre interpretação, o que abaixo fazemos:
Regras de Giuseppe Saredo:
"1.ª A ab-rogação da lei não se presume.
2.ª No silêncio do legislador, deve presumir-se que a lei nova pode conciliar-se com a lei
precedente.
3.ª Podem deduzir-se de uma lei ab-rogada os critérios nela contidos, para explicar a lei nova,
quando compatíveis com esta.
(...)
8.ª Um artigo de lei pode sobreviver a todo o resto de uma lei ab-rogada.
9.ª Quando uma lei se refere, para sua sanção, a outra lei, se esta é ab-rogada, ficam, todavia,
em vigor as suas disposições, a que a lei vigente se referiu, porque se consideram como parte
integrante da lei em vigor.
10.ª (...)".
Como a "ab-rogação da lei não se presume" e "um artigo de lei pode sobreviver a todo o resto de
uma lei ab-rogada", e, principalmente pela aplicação, a preceito, da nona regra de Saredo ao caso
vertente, em que o § 1.º do art. 77 da LC 109/2001 fez remissão a artigos da Lei 6.435/1977 e do
Dec. 81.402/1978 (e mesmo do Código Civil de 1916 (LGL\1916\1)) que dispunham sobre a
"organização das entidades abertas de previdência complementar sem fins lucrativos", mesmo que
"revogada a Lei 6.435/1977" (ou mesmo o Código Civil de 1916 (LGL\1916\1)) por lei posterior,
ficariam em vigor os artigos que foram incorporados à LC 109/2001, por remissão feita pelo § 1.º
do art. 77 desta.
Por força do disposto no § 1.º do art. 77 da LC 109/2001, que permite às entidades abertas de
previdência complementar permanecerem com a organização jurídica que possuíam, o que era
dado pelas alíneas b dos incisos I e II do art. 4.º, c/c o inc. II do art. 5.º, arts. 11 a 15, e artigos
30 a 33 da Lei 6.435 de 1977 e arts. 14 a 21 c/c os artigos 38 a 40 do Dec. 81.402 de 1978, tem-
se de ter referidos artigos por vigentes, eficazes e "integrados ao § 1.º do art. 77 da LC 109/
2001". Se lei posterior que revogasse a Lei 6.435/1977 não poderia atingir os artigos integrados ao
§ 1.º do art. 77 da LC 109/2001, com tanto mais razão o art. 79 desta mesma lei complementar
ao dizer que "revogou a Lei 6.435/1977" deve ser lido com a mesma ressalva, pois os artigos
devem ser interpretados de maneira a que se aproveitem todos.
Esses pequenos erros legislativos são, a revezes, encontrados na própria LC 109/2001 que, e.g.,
em seu art. 36, diz que "as entidades abertas são constituídas unicamente sob a forma de
sociedades anônimas" para, depois, no próprio § 1.º do art. 77, ressalvar a existência das
entidades abertas sem fins lucrativos sob a forma de sociedades civis. Ora, a mesma regra de
interpretação da LC 109/2001 que determina, pela ressalva feita pelo § 1.º do art. 77, seja
mitigado o preceito do art. 36 que era enfático ("...unicamente...") quanto a impossibilidade de
existência de entidade aberta sob outro tipo de pessoa jurídica, deve ser utilizado como "regra de
interpretação autêntica" e pode, perfeitamente e a fortiori, ser estendida como "mitigação também
da regra geral de 'revogação' inserta no art. 79 da mesma lei".
A simples remissão feita pelo § 1.º do art. 77 da LC 109/2001 à continuidade da organização das
entidades abertas de previdência complementar como sociedades civis, portanto, corresponde,
por si só, à integração à LC 109/2001 de todos os artigos que tratam da organização das
entidades sem fins lucrativos como se ali fielmente transcritos.
Somente lei complementar, pois, em atenção ao disposto no inc. II do art. 192 e art. 202 da CF
(LGL\1988\3) é que pode alterar tais dispositivos referentes ao "funcionamento e organização de
estabelecimento de previdência".
Daí estar correta a Resolução CNSP 53/01, que simplesmente tornou explícita a integração
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implícita, quando diz que as entidades abertas de previdência complementar sem fins lucrativos,
constituídas como sociedades civis, "poderão continuar operando com a estrutura organizacional
administrativa prevista nos estatutos aprovados sob a égide da Lei 6.435/1977", i.e., não se
limitou a utilizar da terminologia do § 1.º do art. 77 da LC 109/2001 que somente menciona que
poderão referidas entidades continuar como "sociedades civis". Mais que correta, não poderá a
Resolução CNSP 53/01 ser alterada nesse aspecto, em que menciona ser permitida às entidades
abertas de previdência complementar sem fins lucrativos a manutenção da estrutura prevista na
Lei 6.435/1977, pois se o fizer haverá flagrante ilegalidade.
A integração dos artigos da Lei 6.435/1977 e Dec. 81.402/1978 à LC 109/2001 faz com que o
corpo jurídico daí resultante seja lido como se fosse uma única lei complementar, como se fosse
um único e contínuo texto de lei complementar.
2.4.4 Vigência e eficácia do Dec. 81.402/1978 por compatibilidade com a LC 109/2001
Ainda quando, em análise superficial, se tivesse a Lei 6.435/1977 por inaplicável às entidades
abertas de previdência complementar sem fins lucrativos, com o argumento de que está
expressamente revogada pelo art. 79 da LC 109/2001, seria mister buscar qual a legislação que
está a reger essas entidades (à época da permissão concedida pelo § 1.º do art. 77 que, por
óbvio, remete à legislação vigente na data da publicação da própria LC 109/2001), no que se teria
de ter por ainda vigente e eficaz o Dec. 81.402/1978, que regulou a Lei 6.435/1977 e que não foi
"revogado" ( rectius não "perdeu a eficácia") pela LC 109/2001. A Resolução Susep 53/2001
atesta tal fato em seu art. 2.º, quando diz, verbis:
"Art. 2.º As EAPC/SFL constituídas como sociedades civis e já existentes na data de início de
vigência da LC 109, de 25 de maio de 2001, poderão continuar operando na forma jurídica original,
ficando mantida a estrutura organizacional administrativa prevista nos respectivos estatutos
sociais aprovados sob a égide da Lei 6.435, de 15 de julho de 1977, no que não venha a colidir
com a legislação e a regulamentação em vigor" (grifamos).
Indiferente, pois, será sustentar que o art. 79 da LC 109/2001 revogou apenas parcialmente
("derrogação" e não "ab-rogação") a Lei 6.435/1977, por maneira que permanecem em vigor os
dispositivos que tratam da organização das entidades de previdência privada abertas sem fins
lucrativos como pessoas jurídicas, ante o que dispõe o § 1.º do art. 77 da mesma LC 109/2001,
tese essa com a qual concordamos pela integração feita e sustentada no item acima (2.4.3); ou
que o Dec. 81.402/1978 continua, a todas as luzes, em vigor no que diz com os artigos que
tratam da organização societária das entidades abertas de previdência privada sem fins lucrativos
(arts. 14 a 21 e 38 a 40), e que teve seus artigos também integrados à LC 109/2001 e passaram
a ter eficácia de lei complementar, tese essa que também defendemos.
O art. 73 da LC 109/2001, ao dizer que "as entidades abertas serão reguladas também, no que
couber, pela legislação aplicável às sociedades seguradoras", em nenhum momento determinou a
aplicação da Lei das Sociedades Anônimas e, por outro lado, não é correto o argumento de que
todas as seguradoras são sociedades anônimas, pois as "seguradoras de seguro mútuo" ( in casu,
as entidades de previdência privada sem fins lucrativos) são "seguradoras" e a maioria foi
constituída sob a forma de sociedade civil.
Lembramos, outrossim, a decisão do STF no RE 115.308-3-RJ (vide item 2 do presente), que teve
por relator o Min. Néri da Silveira, em que afirmado que qualquer contrato no qual se receba pré-
pagamento (prêmio) para utilização futura e incerta (álea) de coberturas (risco coberto) é seguro,
e que uma empresa de "medicina de grupo" que ofereça plano de saúde sob a forma de pré-
pagamento está, na realidade, a praticar seguro, independentemente de sua constituição e
organização jurídica, o que enfatiza a tese aqui exposta.
Como não houve nenhuma outra menção à legislação subsidiária e como a forma de constituição e
organização das entidades sem fins lucrativos é dada pelo Dec. 81.402/1978 em seus arts. 14 a
21 e 38 a 40, não revogado (nem o poderia) expressamente pela LC 109/2001, nada obstante
possa ter a revogação da Lei 6.435/1977 como total - o que entendemos não tenha ocorrido, por
certo que referido decreto continua, quanto a isso, plenamente eficaz, integrado ao texto da lei
complementar e, nesse ponto, com eficácia de lei complementar.
Importante frisar, como já salientado, que as "entidades abertas sem fins lucrativos" quase foram
esquecidas pelo projeto de lei complementar, vertido na LC 109/2001, razão por que se vêem
apenas em dispositivos dispersos ( v.g., art. 77), como que se tais artigos destoassem do
conjunto e fossem incluídos, às pressas, fora da sistematização obedecida quanto às demais
entidades (fechadas e entidades abertas com fins lucrativos). Dito isso, fácil compreender que
eventuais omissões no que entende com as entidades abertas sem fins lucrativos se deram não
por intenção do legislador, mas pelo pouco cuidado com que foram tratadas.
Também força é ressaltar que a boa doutrina sempre teve por válido e eficaz decreto
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regulamentador de lei que foi revogada quando compatível com a nova lei.
Como a LC 109/2001 não revogou o Dec. 81.402/1978 (nem o poderia pelo princípio da
"independência entre os Poderes" inserto no art. 2.º da CF (LGL\1988\3)), e, principalmente, pelo
sustentado por doutrinadores de escol, entre os quais Helly Lopes Meirelles, na obra sempre citada
sobre direito administrativo ( Direito administrativo brasileiro. 16. ed. São Paulo: Ed. RT, p. 156),
conclui-se que o Dec. 81.402/1978 está em vigor e eficaz parcialmente (arts. 14 a 21 e 38 a 40),
pela remissão feita pelo § 1.º do art. 77 da LC 109/2001. Diz o saudoso jurista quanto ao "Decreto
Regulamentar ou de Execução": "Questiona-se se esse decreto continua em vigor, quando a lei
regulamentada é revogada e substituída por outra. Entendemos que sim, desde que a nova lei
contenha a mesma matéria regulamentada", razão pela qual os dispositivos legais aplicáveis às
entidades sem fins lucrativos ainda poderão ser considerados vigentes no Dec. 81.402/1978, em
especial os arts. 14 a 21 e 38 a 40, que dizem com a constituição das entidades abertas de
previdência privada sem fins lucrativos.
Outrossim, pela 9.ª regra de Saredo, mencionada no item 2.4.3, os artigos do Dec. 81.402/1978
teriam eficácia de lei complementar, por estarem integrados ao § 1.º do art. 77 da LC 109/2001, o
que implica dizer que somente lei complementar poderá revogá-los e nem mesmo o Poder
Executivo poderá baixar outro decreto alterando esses dispositivos.
Nesse sentido, também, Pontes de Miranda ( Comentários à Constituição de 1967. Forense, 1987.
t. III, p. 319) com dizer que: "f) Se a lei foi regulamentada pelo Poder Executivo, pode fazer-se
novo regulamento, salvo se o Poder Legislativo já fez lei aquele regulamento, isto é, se editou lei
que contenha os dispositivos daquele". Em outras palavras, se o Poder Legislativo, por força do §
1.º do art. 77 da LC 109, editou lei que contém dispositivos do Dec. 81.402/1978 - os pertinentes
à organização das entidades de previdência complementar sem fins lucrativos como sociedades
civis, nem mesmo o Poder Executivo, que detém o poder regulamentar, previsto no inc. IV do art.
84 da CF (LGL\1988\3), poderá dispor em contrário, pois seria tal fato ilegal e mesmo
inconstitucional (por ofensa aos limites constitucionais que deve ter o decreto regulamentar).
Há, ainda, quem tenha o referido Dec. 81.402/1978 por "decreto independente ou autônomo"
(decreto que teve origem na legislação italiana e que a doutrina nacional também diverge sobre a
subsistência no direito brasileiro após a Constituição Federal de 1988) - na definição dada por
Helly Lopes Meirelles (op. cit., p. 155, in fine), sendo certo que o referido jurista entende que
possa subsistir tal decreto em nosso ordenamento jurídico mesmo após a Constituição de 1988 e
esse fato - o ser "decreto autônomo" - ratificaria a tese de "não revogação pela LC 109/2001",
mormente pelo que disposto no § 1.º do art. 77 da referida Lei. Nesse sentido, decisão do TJRJ,
quanto ao Dec. 81.240/1978 (que regulou a Lei 6.435/1977 quanto às entidades fechadas; ao
passo que o Dec. 81.402/1978 regulou a Lei 6.435/1977 quanto às entidades abertas), verbis:
"Previdência privada - Aposentadoria - Limite de idade - Lei 6.435, de 1977 - Previdência privada.
Aposentadoria. Limite de idade imposto pelo Dec. 81.240/1978, regulamentador da Lei 6.435, que
silenciava a respeito. Inexistência de ilegalidade. 1. O Dec. 81.240 é daqueles, tipicamente,
autônomos ou independentes, assim chamados porque destinados a prover situação não
contemplada na lei, ao contrário do regulamento de execução que objetiva, simplesmente, a
explicar a lei. Neste passo, é inquestionável que o referido decreto poderia, sem vício de
ilegalidade, estabelecer limites de idade para o benefício da aposentadoria, de vez que a lei
regulada silenciara sobre a questão, deixando-a aberta ao critério do próprio administrador. Está
tornando explícito o que a própria lei encerra. 2. Apelo rejeitado" (TJRJ, 6.ª Câm. Cív., AC 2325/95
(Reg. 271095), Cód. 95.001.02325, rel. Des. Gustavo Kuhl Leite, j. 22.08.1995).
Paulo Lacerda, no clássico Manual do Código Civil (LGL\2002\400) brasileiro (Rio de Janeiro:
Jacintho Ribeiro dos Santos, 1929. t. I, p. 325-326, item 214, 1.ª parte), com precisão, sustenta
que nova lei não revoga o decreto que regulamentava a anterior se com este compatível, com
dizer, verbis:
"(...) a realidade das coisas jurídicas mostra que não é absoluta a proposição que diz que,
revogada uma lei, caem os decretos, regulamentos e instruções expedidos para a respectiva
execução; casos há em que ficam de pé, continuando a vigorar no todo, ou em parte. Quando? A
resposta é fácil: quando não se tratar de mera revogação, porém de substituição de leis, de
modo a se aplicarem no todo, ou em parte os decretos, regulamentos e instruções para a fiel
execução, já agora, da nova lei, da lei substituta. E o fato ocorre freqüentemente: com o
advento do Código Civil (LGL\2002\400), deu-se em larga escala, pois continuam a vigorar os
regulamentos sobre o registro civil, a averbação de títulos, as transmissões de propriedade
imóvel, os ônus reais etc.".
Pontes de Miranda, no seu Tratado de direito privado (São Paulo: Ed. RT, 1983. t. I, p. XXI, item
10, "prefácio"), sustenta, no mesmo sentido que Paulo Lacerda, sobre a vigência e aplicação dos
decretos e legislação anteriores ao Código Civil de 1916 (LGL\1916\1), após a publicação deste,
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que:
"Como toda codificação, o Código Civil (LGL\2002\400) não foi exaustivo senão por algum tempo
(= até a aparição de alguma regra jurídica derrogativa, ou a latere) e ainda assim não foi perfeita
à sua exaustividade: somente onde se regulou alguma matéria foi excluído o direito anterior (Art.
1.807. "Ficam revogadas as Ordenações, Alvarás, Leis, Decretos, Resoluções, Usos e Costumes
concernentes às matérias de direito civil reguladas neste Código").
Sérgio Ferraz, em Repertório enciclopédico do direito brasileiro (vol. 48, p. 47 et seq., verbete
"Regulamento", em especial p. 52), também sustentando a mesma tese de Helly Lopes Meirelles e
Paulo Lacerda, diz, verbis:
"(...) Da subordinação do regulamento de execução à lei deflui que, revogada esta, fica aquele
sem aplicação. Mas quando se trata de simples modificação, o regulamento anterior, no que
compatível com as novas normas, perdura eficaz.
Importante é realçar que o regulamento de que estamos tratando não é um ato de execução servil
da lei, mas um meio para se chegar plenamente a essa execução.
Realmente não pode ele ser contra legem, porque norma secundária, emanada sem atendimento
aos requisitos formais de formulação, e substantivos de competência da lei. Mas sua finalidade é a
execução do conteúdo da lei e não de seu limite formal. Pode, por isso, conter norma nova, desde
que não contrarie a ordem legal vigente e seja necessária à plena execução do diploma
regulamentado. O regulamento deve ser compatível com as leis, em sentido formal (não em
sentido material, porque aqui os próprios regulamentos caberiam). Dessa forma, observadas essas
cautelas, e atendidos os critérios de distribuição de competência, não deve um regulamento
submissão a outro. E, em relação à lei, estrito senso, deverá ele guardar uma relação de
compatibilidade, e não de mera conformidade. Eis por que, desde que não contrarie a ordem legal
formal, pode exercer-se livremente o poder regulamentar".
Não há, pois, como não ter por ainda vigentes os artigos da Lei 6.435/1977 que tratam da
organização das entidades abertas sem fins lucrativos - como sociedades civis especiais
("sociedades civis especiais" segundo terminologia do Código de 1916, pelo atual podem ser
denominadas "associações especiais"), por força do disposto no § 1.º do art. 77 da LC 109/2001;
e também não há como não se ter por vigente o Dec. 81.402/1978, mesmo após a revogação da
Lei 6.435/1977 - ainda que se tenha referida revogação como total (ab-rogação), por força do
art. 79 da LC 109/2001, pois a nova lei não extinguiu o conteúdo da anterior, simplesmente o
modificou, id est, não deixaram as entidades nem os planos previdenciários de existir, somente
foram pouco modificados pela necessária evolução da sociedade, razão por que o decreto
regulamentador subsiste a preceito, naquilo que não for incompatível com a nova lei, no que for
incompatível não é "revogado" - pois só a autoridade competente para decretar pode revogá-lo
(pela "independência entre os Poderes"), mas simplesmente "ineficaz" por "incompatível com a
nova lei" (ilegal) (cf. Paulo Lacerda, op. cit.; Pasquale Fiore, "Delle Disposizioni generali sulla
pubblicazione, applicazione ed interpretazione delle leggi", 1.ª parte de Il Diritto Civile italiano,
secondo la dottrina e la giurisprudenza, de vários autores, sob a direção de Fiore e Brgi, 2. ed.,
1925, vol. 2, p. 647, apud Eduardo Espínola, op. cit., p. 115).
Como é o próprio § 1.º do art. 77 da LC 109/2001 que dispõe sobre a possibilidade de as entidades
de previdência privada manterem sua organização como sociedades civis sem fins lucrativos, longe
de ser incompatível com a nova lei, o Dec. 81.402/1978 atende perfeitamente o comando legal.
A integração dos artigos da Lei 6.435/1977 e Dec. 81.402/1978 à LC 109/2001, como já afirmado
no item anterior, faz com que o corpo jurídico daí resultante seja lido como se fosse uma única lei
complementar, como se fosse um único e contínuo texto de lei complementar.
3. As entidades de previdência complementar sem fins lucrativos e o Código Civil de 1916
As entidades de previdência complementar sem fins lucrativos, como já visto no item 2 do
presente parecer, eram sociedades autorizadas a funcionar (montepios, art. 21 do CC/1916
(LGL\1916\1)), conhecidas como "sociedades de seguro mútuo" ou "mútuas", cujo contrato
especial de seguro era previsto no art. 1.466 do CC/1916 (LGL\1916\1).
3.1 "Sociedades" e "associações" no Código Civil de 1916
O art. 16 do CC/1916 (LGL\1916\1) sugeriu diferença entre os termos "associação" e "sociedade",
sugestão essa enfatizada nos arts. 22, caput, e 23, verbis:
"Art. 16. São pessoas jurídicas de direito privado:
I - As sociedades civis, religiosas, pias, morais, científicas ou literárias, as associações de
utilidade pública e as fundações.

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II - As sociedades mercantis.
(...)
§ 1.º As sociedades mencionadas no n. I só se poderão constituir por escrito, lançado no registro
geral (art. 20, § 2.º), e reger-se-ão pelo disposto a seu respeito neste Código, Parte Especial.
§ 2.º As sociedades mercantis continuarão a reger-se pelo estatuto nas leis comerciais.
(...)
Art. 22. Extinguindo-se uma associação de intuitos não econômicos, cujos estatutos não
disponham quanto ao destino ulterior dos seus bens, e não tendo os sócios adotado a tal respeito
deliberação eficaz, devolver-se-á o patrimônio social a um estabelecimento municipal, estadual ou
federal, de fins idênticos ou semelhantes.
(...)
Art. 23. Extinguindo-se uma sociedade de fins econômicos, o remanescente do patrimônio social
compartir-se-á entre os sócios ou seus herdeiros."
Ao utilizar as expressões "associação de intuitos não econômicos" no art. 22 e "sociedade de fins
econômicos" no art. 23, o Código Civil de 1916 (LGL\1916\1) apenas sugeriu ou permitiu que as
"sociedades sem fins econômicos" adotassem o nome de "associação", o que, inclusive, ocorreu
com várias entidades de previdência complementar que, àquela época, foram constituídas algumas
tendo por componente da denominação o termo "associação" (exemplo: "Associação
Previdenciária...").
No Código Civil de 1916 (LGL\1916\1), portanto, o conceito de "contrato de sociedade" (art.
1.363) não continha a "finalidade de praticar atividade econômica e partilhar o resultado" como no
atual (art. 981 da Lei 10.406/2002), pois simplesmente vinha disposto ser o contrato em que as
pessoas mutuamente se obrigam a combinar seus esforços ou recursos para lograrem fins
comuns (art. 1.363) - e os "fins comuns" poderiam ser outros que não a partilha de resultado de
atividade econômica, id est, poderiam ser fins "não lucrativos".
3.2 Inexistência de distinção legal entre "sociedade" e "associação" no Código Civil de
1916 tentativas doutrinárias
Ocorre que, quanto ao Código de 1916, a doutrina, em sua maioria, não acolheu a referida
distinção, nada obstante o disposto nos arts. 22 e 23, e Clóvis Beviláqua em suas observações ao
art. 16 do CC ( Código Civil (LGL\2002\400) dos Estados Unidos do Brazil. Rio de Janeiro: Livraria
Francisco Alves, 1916. vol. 1, p. 214 et seq.) diz que:
"As sociedades de fins não econômicos se costumam denominar associações; mas o Código não
distingue entre sociedade e associação, como se vê desse artigo. É verdade que reservou o
vocábulo associação para as agremiações de utilidade pública e que designou a seção III deste
capítulo - das sociedades e das associações civis; mas, desde que se não fornecem na lei
elementos para uma distinção dessa natureza, e desde que se tome em consideração que os
estabelecimentos pios e as sociedades, que o Código denominou Moraes, são de utilidade pública,
reconhecer-se-á que não houve o intuito de criar duas classes de pessoas jurídicas: as
sociedades civis lato sensu e as associações. O que se deve induzir da linguagem do Código é que
é lícito, mas não obrigatório, denominar associações as sociedades de fins não econômicos".
"Sociedade", do latim societas, etimologicamente sempre foi "associação, reunião, comunidade de
interesses" (DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário jurídico. Forense, vol. IV, p. 1463, verbete
"sociedade") e o termo sempre comportou as sociedades "com fins lucrativos" e as "sociedades
sem fins lucrativos".
Logo, "associação" e "sociedade" sempre foram termos utilizados para denominar a "reunião" de
pessoas que formam pessoa jurídica, e houve tentativa doutrinária não unânime, agora acatada
pelo novo Código Civil (LGL\2002\400), de se utilizar o termo "associação" para "reunião de
pessoas para fins não econômicos", embora a ausência de finalidade econômica, de si por si, não
seja suficiente para caracterizar a existência de "associação".
Rodrigo Otávio ( Manual do Código Civil (LGL\2002\400). Rio de Janeiro: Livraria Jacintho, 1932.
vol. I, p. 275, 2.ª parte, Introdução, § 281), do mesmo modo diz que "(...) não se encontram,
porém, quer no Código, quer em outra qualquer lei, dispositivo que de qualquer modo defina ou
caracterize o que seja associação de utilidade pública. Aliás, não há igualmente no Código, como
bem observa Beviláqua (Código. 2. ed., vol. 1, p. 209), elementos para se distinguir entre
sociedades e associações, denominações que nele são sinônimas e é certo que o desenvolvimento
dessa matéria no Código evidencia que, excluídas as fundações que têm natureza jurídica diversa
e foram especialmente tratadas na Seção IV desse Capítulo, todas as demais, mencionadas no

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referido item I do art. 16, constituem uma só classe - sociedades ou associações civis -
especialmente tratadas na Seção III do mesmo Capítulo".
Pontes de Miranda, por sua vez, destoando na fundamentação, concorda com a distinção entre
"sociedade" e "associação", conquanto não pelo "fim econômico" ou "fim não-econômico", mas sim
pela presença ou ausência do que chama elemento corporativo:
"(...) A associação diferença-se, em princípio, da sociedade em que essa é de número
determinado de membros, ao passo que aquela pode ter número indeterminado, com ou sem
mudança normal deles. A sociedade anônima é sociedade; a associação dos empregados do
comércio ou dos empregados públicos é associação. Mas o que diferença e regra, não diferença
essencialmente. Não se pode dizer que a associação se distinga da sociedade, porque, nessa, a
união de pessoas determinadas é essencial e a substituição excepcional: há as sociedades por
ações em que se elimina esse sinal. À sociedade, diz-se, é preciso a unanimidade; ao passo que o
princípio majoritário é o que rege as associações: isso não as caracteriza; resultaria, em regra
jurídica dispositiva, da existência de uma, ou de outra. Nem as distinguiria o fim econômico ou não
econômico: há associações de fim não-econômico e associações de fim econômico; sociedades de
fim econômico e sociedades de fim não-econômico. Também os arts. 22 e 23 não servem de base
para as distinguir: as sociedades de fins não-econômicos, de que o art. 23 não falou, têm de ser
tratadas conforme o art. 22; e as associações de fins econômicos, de que não falou o art. 22,
entram, a contrario sensu, no art. 23. Os arts. 22 e 23 apenas exprimem que, de ordinário, as
associações são só de fim não-econômico; e as sociedades, de fim econômico. (...)
A sociedade de regra não corporifica; a associação é essencialmente corporativa. Daí falar-se de
substrato corporativo da associação (Christian Meurer. Die juristischen Personem, 63): na
sociedade, há sócios; não associados. A reunião de pessoas é associação quando de tal maneira
se organizou que os seus membros se apresentam como todo único e uno e os cobre; isto é,
quando o membro tem qualidade comum, sem ser só o sócio, o que participa da vida social. A
individualidade do membro entra pouco, ou nada (P. Knoke, Das Recht der Gesellschaft, 21; O.
Swart. Der nichtrechtsfühige Verein, 7)" (Tratado de direito privado - Parte geral. São Paulo: Ed.
RT, t. I, p. 318).
Rubens Requião, por outro lado, já a interpretar os modelos de sociedades atuais sob a égide do
Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, lembra, porém, quanto ao vocábulo "associação" que o
Código Comercial usou dessa expressão como sinônima de sociedade comercial, em diversos
artigos, como no art. 290 ("Em nenhuma associação mercantil se pode recusar aos sócios o exame
de todos os livros...") (vide, também: arts. 291, 305, V, 319 e 325 do Código Comercial) e afirma
que:
"(...) No Código Civil (LGL\2002\400), de 1916, encontra-se o emprego da palavra associação para
designar a entidade de fim não-econômico, contrapondo à sociedade civil e à sociedade comercial.
Ao tratar matéria pertinente às pessoas jurídicas, com efeito, esse Código usa das expressões das
sociedades ou associações civis. O art. 22 alude à associação de fins não-econômicos e o art. 23
à sociedade de fins econômicos.
Para Silvio Rodrigues ( Direito civil. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. vol. 3, p. 315 et seq., §
146), "dentro do conceito de sociedade, a idéia de um comportamento ativo dos sócios é
elementar, pois essa noção se encontra na própria definição apresentada pelo legislador que, ao
definir o contrato de sociedade, se refere à conjunção de esforços ou recursos"; ao passo que "na
associação falta esse elemento dinâmico, da mesma forma que carece ela de caráter
especulativo. A associação reúne, de um modo mais ou menos estável, um grupo de pessoas, para
finalidades culturais, pias ou recreativas, pagando, em geral, cada associado determinada
mensalidade fixa e permanente para custeio da organização.
Não havia, durante a vigência do Código Civil de 1916 (LGL\1916\1), em que pesem ao esforço
doutrinário diferenças entre os termos "associação" e "sociedade", que eram usados
indistintamente e, ipso factu, o dispositivo constitucional que alude ao "direito de livre associação"
diz respeito à "associação" e também "sociedade" (na nomenclatura do atual Código Civil
(LGL\2002\400) de 2002).
Pouco importava, pois, que as entidades de previdência complementar adotassem na denominação
ou em seus estatutos os termos "associação sem fins lucrativos" ou "sociedade sem fins
lucrativos", desde que expressamente houvesse menção à ausência da finalidade lucrativa. Não
havia erro em tal prática.
Tal já não se pode afirmar ante a vigência do novo Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, como
abaixo se exporá, razão por que melhor se autodenominarem apenas "entidades de previdência
complementar" e esta, talvez, seja a única sugestão dada quanto à eventual alteração
estatutária, pois qualquer outra enfrentará resistência doutrinária pelas diversas teses
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sustentadas, todas com parcial verdade.


3.3 Definição de "fim econômico" e "fim não-econômico" no Código Civil de 1916
Pelo que dispuseram os comentadores do Código Civil de 1916 (LGL\1916\1), quanto aos arts. 22 e
23, ficou claro que os termos "fim econômico" e "fim não-econômico" eram utilizados como
sinônimos de "fim lucrativo" e "fim não-lucrativo" respectivamente.
J. M. de Carvalho Santos ( Código Civil (LGL\2002\400) brasileiro interpretado. 8. ed. Rio de
Janeiro: Freitas Bastos, 1958. vol. I, p. 399-400), ao comentar o art. 22 do CC/1916
(LGL\1916\1), diz que "associações de intuitos não econômicos" são as associações de fins ideais,
como as científicas, literárias, artísticas, religiosas, beneficentes e recreativas, em contraposição
às sociedades de fins econômicos. Também sustenta que o vocábulo "intuito" deve ser tomado no
sentido de "fim principal".
Importante transcrever o pensamento de J. M. de Carvalho Santos (Op. cit, p. 399-400), que bem
distingue "finalidade econômica" ou "fim lucrativo ou econômico" de "atividade econômica ou fim
econômico acessório", lembrando lição de Curtir Forrer, verbis:
"Mesmo que a associação tenha igualmente intuito ou um fim econômico acessório, com um
caráter de atividade secundária, para os efeitos legais deve ser considerada como de fins ou
intuitos não econômicos. Exemplos: uma sociedade de música possui uma orquestra que dá
concertos mediante entrada paga; uma associação científica publica uma revista, aceitando
anúncios mediante remuneração. O que é decisivo é o fim não econômico, é a atividade para um
fim ideal. Uma associação filantrópica, igualmente, para melhor cumprir a sua missão, pode
explorar uma empresa econômica. Mas nem por isso deverá ser considerada como associação
de intuitos econômicos. Cabe bem aqui a distinção sugerida por Curti Forrer: entre o fim e os
meios empregados para realizá-lo.
A circunstância de esses meios serem de natureza econômica não importa em transformação
dos intuitos da associação, e, como a esses intuitos é que se refere o legislador, parece evidente
que a solução acertada é a que acima referimos" (Cf. Curti Forrer, op. cit., nota 2 ao art. 60,
onde aceita a distinção para outros efeitos).
Clóvis Beviláqua (Op. cit., vol. 1, p. 191) diz que, "diferentemente das associações de intuitos
não-ecomômicos, organizadas para a realização de um interesse moral, as sociedades de fins
econômicos se formam no interesse dos próprios sócios", enfocando mais o "fim não-econômico
('moral') do que tinha por associação" que a "atividade que desenvolvia" (organizadas para a
realização de um interesse moral...) quando as quis definir como tal.
Logo, "fim ou intuito econômico" equivale a "fim ou intuito lucrativo" e, por sua vez, difere de
"atividade econômica", com o que dificulta a interpretação dos arts. 53 e 981 do atual CC ("Art.
53. Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não
econômicos". "Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se
obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha,
entre si, dos resultados"), pois as entidades de previdência complementar sem fins lucrativos
atendem ao art. 53 em parte - pelo fim não econômico e também atendem em parte ao disposto
no art. 981 pelo "exercício de atividade econômica", em que pese não terem "fim econômico".
Mesmo a participação nos lucros da sociedade não é suficiente a caracterizar alguém como
"sócio", pois os trabalhadores participam dos lucros das empresas sem possuírem "vínculo social".
Nesse sentido, à justa, Pontes de Miranda (Op. cit., t. XLIX), ao citar decisão do TJSP. Por outro
lado, simples "união de pessoas com determinado fim" não é suficiente a caracterizar "associação",
porque pode se tratar de mera "reunião" ou de "comunidade". Com o que, nada obstante a
redação dos arts. 53 e 981, a doutrina ainda terá papel importante na interpretação científica do
que tem o Código Civil (LGL\2002\400) de 2002 por "associação" e "sociedade".
Fábio Ulhoa Coelho ( Curso de direito comercial. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. vol. 2) afirmou
que "a distinção entre associação e sociedade é doutrinária, porque, no direito civil positivo
brasileiro, as expressões são sinônimas", no que foi criticado por Sérgio Campinho (Op. cit.) com
razão; porquanto hoje, ao contrário de 1916, nosso Código Civil (LGL\2002\400) de 2002 positivou
a distinção, somente que há de se verificar, e talvez aí tenha razão aquele jurista ao dar
importância à doutrina, quais outros elementos compõem a identificação da "sociedade" além do
"fim lucrativo" e quais ajudam a caracterizar a associação, além da "ausência de finalidade
lucrativa".
Será, por enquanto, completamente subjetiva a adoção da tese de que a entidade de previdência
complementar sem fins lucrativos é "associação especial", como também o será a adoção da tese
de que se trata de "sociedade especial" - pela ausência do fim econômico (partilha entre si dos
resultados), sendo certo, porém, que se trata de pessoa jurídica de direito privado regida por lei

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própria e especial.
4. Código Civil de 2002 (Lei 10.406/2002), art. 2.031, é inaplicável às entidades abertas
de previdência complementar sem fins lucrativos
Com a publicação do novo Código Civil (LGL\2002\400) de 2002 (Lei 10.406/2002), iniciou-se
discussão entre o mercado das entidades abertas de previdência complementar e a Susep -
Superintendência de Seguros Privados, que é o órgão fiscalizador a que estão subordinadas e que,
contrariando ao princípio da legalidade (pois viola inclusive Resolução 53/01 do CNSP - Conselho
Nacional de Seguros Privados - que é o órgão normatizador), determinou às entidades abertas de
previdência complementar que se adaptassem ao que dispõe o Código Civil (LGL\2002\400) de
2002 - em observância ao art. 2.031, sem dizer ao certo o que entende como "necessárias
adaptações".
O assunto deu ensejo a que nos pronunciássemos no parecer suso aludido, do qual o presente é
atualização, no que fomos seguidos por outros juristas, e o que ficou assente é que todos refutam
a tese de "necessidade de adaptação ao Código Civil (LGL\2002\400) prevista no art. 2.031",
embora haja alguma divergência doutrinária sobre o tipo da pessoa jurídica de direito privado que
frisa melhor com as entidades abertas de previdência complementar sem fins lucrativos:
"sociedade" ou "associação".
Os arts. 777, 1.123 e 2.033 do CC/2002 (LGL\2002\400) ressalvam que o "seguro regido por lei
própria e a sociedade autorizada a funcionar" continuarão regidos por leis especiais e que somente
no que couber é que seriam aplicáveis as demais regras do Código, entre as quais as adaptações
pretendidas pelo art. 2.031, como veremos adiante.
A ressalva feita por esses artigos é coerente com os princípios de interpretação que dizem que "lei
especial não pode ser revogada por lei geral" e o outro que diz que "lei ordinária não pode revogar
lei complementar em assunto específico (de competência) de lei complementar".
Não se podem, ao analisar norma jurídica, levar em conta apenas artigos isolados e pretender que
regras gerais tenham incidência sobre fatos regidos por leis específicas, principalmente quando a
nova lei com regras gerais é "lei ordinária geral" e o assunto que se pretende alterado deva ser
regido por "lei complementar e especial" contendo ordenamento próprio à lei complementar.
O novo Código Civil (LGL\2002\400) (Lei 10.406/2002), que é norma geral, não poderá ser tomado
como norma aplicável às entidades de previdência complementar sem fins lucrativos naquilo que
não regulou, pois os artigos referentes à "associação" e à "sociedade" são regras gerais ante as
específicas da LC 109/2001, Lei 6.435/1977 e seu Dec. 81.402/1978, em parte naquela integrados
(vide itens 2.4.3 e 2.4.4 do presente) ao art. 77.
O próprio art. 2.033 do CC/2002 (LGL\2002\400)ressalva o disposto em lei especial, quanto à
obrigatoriedade de modificações de atos constitutivos das pessoas jurídicas referidas no art. 44,
bem como a sua transformação, incorporação, cisão ou fusão ao que previsto no Código.
4.1 Impossibilidade de lei ordinária derrogar lei complementar em assunto próprio a esta
Princípio comezinho de direito, baseado na hierarquia das normas prevista no art. 59 da CF
(LGL\1988\3), é o que dispõe sobre a impossibilidade de lei ordinária regular assunto cometido pela
Constituição Federal (LGL\1988\3) à lei complementar.
Como "autorização e funcionamento de estabelecimento de previdência" é assunto que exige lei
complementar, conforme disposto no inc. II do art. 192 da CF (LGL\1988\3) (antes da EC 40/
2003), bem como pelo disposto no art. 202 da Carta Magna (LGL\1988\3) (redação dada pela EC
20/1998), e tendo a "autorização e funcionamento" das entidades abertas de previdência
complementar sem fins lucrativos sido regulada pelo § 1.º do art. 77 da LC 109/2001 e demais
artigos que este integrou (artigos da Lei 6.435/1977 e Dec. 81.402/1978), não há falar em
"derrogação" desta pelo disposto no novo Código Civil (LGL\2002\400).
4.2 Impossibilidade de lei geral revogar lei especial (ressalvas dos arts. 777, 1.123 e
2.033 do CC)
A tese de que o novo Código Civil (LGL\2002\400) teria derrogado as normas pertinentes à
organização "societária" ("societária" aí lato sensu e no sentido do Código de 1916, pois pelo de
2002 poderá ser "organização associativa" dependendo da visão do intérprete) das entidades
abertas de previdência privada sem fins lucrativos esbarra não só nas próprias ressalvas feitas
pelo Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, mas também na impossibilidade de "lei geral revogar lei
específica" e "lei ordinária revogar lei complementar" em matéria afeta à lei complementar.
Incidem, in casu, os §§ 1.º e 2.º da chamada Lei de Introdução ao Código Civil (LGL\2002\400),
que trazem regras de hermenêutica aplicáveis ao caso, ipsis verbis:
"Lei de Introdução ao Código Civil (LGL\2002\400), Dec.-lei 4.657/1942
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17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

Com as alterações introduzidas pela Lei 3.238/1957


(...)
Art. 2.º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou
revogue.
§ 1.º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela
incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.
§ 2.º A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não
revoga nem modifica a lei anterior.
§ 3.º Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora
perdido a vigência" (grifamos).
Ora, nem a LC 109/2001 nem o Código Civil (LGL\2002\400) de 2002 regularam inteiramente o
modo de atuar e de se constituir pertinentes às entidades abertas de previdência privada sem fins
lucrativos, havendo normas integradas ao § 1.º do art. 77 da LC 109/2001 que o fazem e devem
ser observadas (Lei 6.435 de 1977, artigos 5.º e 30 e Dec. 81.402 de 1978, artigos 14 a 21 e 38 a
40).
De tudo o exposto, está demonstrado que somente há distinção verdadeira entre "associação" e
"sociedade" na Lei 10.406/2002 (novo Código Civil (LGL\2002\400)) e não no Código Civil de 1916
(LGL\1916\1) e que a sociedade civil a que alude o § 1.º do art. 77 da LC 109/2001 é "sociedade
civil especial" (ou "associação especial" segundo cada intérprete) organizada por lei e decretos
específicos.
Com já afirmado (item 3.1), no Código Civil de 1916 (LGL\1916\1) o conceito de "contrato de
sociedade" (art. 1.363) não continha a "finalidade de praticar atividade econômica e partilhar o
resultado" como no atual (art. 981 da Lei 10.406/2002), pois simplesmente vinha disposto ser o
contrato em que as pessoas mutuamente se obrigam a combinar seus esforços ou recursos para
lograrem fins comuns (art. 1.363) - e os fins poderiam ser outros que não a partilha de resultado
de atividade econômica, id est, poderiam ser fins "não lucrativos".
Quanto à eventual dúvida a respeito do "tipo de sociedade civil em que seriam organizadas as
entidades abertas de previdência privada sem fins lucrativos", é bem esclarecer que se dissolvem
quando atentamente analisados os dispositivos legais, tal como o fizemos nos itens 2.4 a 2.4.1
acima, ou seja, quando analisado entre outros o § 1.º do art. 77 da LC 109/2001, pois este
parágrafo diz que podem referidas entidades "manter" sua organização jurídica como sociedade
civil ("(...) é permitida a manutenção de sua organização jurídica como sociedade civil, (...)", o
verbo "manutenir" de onde se origina "manutenção" tem aí o mesmo sentido de manter) o que
torna suficientemente claro que podem "continuar", "permanecer" no estado em que se
encontravam - há recepção do tipo societário existente - e se a lei diz "(...) como sociedade civil"
é porque entende, como o Código Civil de 1916 (LGL\1916\1) e como Clóvis Beviláqua, e Rodrigo
Otávio entre outros, que "não havia distinção entre associação e sociedade" que a doutrina
apenas esboçava sem nitidez (vide pensamento de Pontes de Miranda e Silvio Rodrigues quanto às
diferenças entre "associação" e "sociedade", transcritas no presente parecer). É contraditório,
incoerente e grave erro de interpretação pretender que o disposto no referido § 1.º do art. 77
concedesse liberdade de as entidades de previdência privada alterarem sua organização jurídica
para "sociedades limitadas, em nome coletivo etc.", quando as regras societárias eram dadas por
lei próprias, ou seja, nenhum dos tipos societários da legislação comercial (que poderiam, com
exceção da "sociedade anônima", ser adotados pelas sociedades civis) trazia disposições
específicas sobre "associados controladores", "associados participantes", responsabilidades e
direitos de uns e de outros, "autorização para funcionamento" etc. Logo, a forma societária,
anteriormente à Lei 6.435/1977 e Dec. 81.402/1978, era dada pelo próprio Código Civil
(LGL\2002\400) em seu art. 1.363 et seq. c/c o 1.466 (que dispunha sobre "seguro mútuo", pois
os participantes/segurados se tornavam "associados"), no que coubesse e, depois das referidas
normas, seguiram o que a legislação específica determinava.
É de lembrar, ainda, que o art. 1.364 do CC/1916 (LGL\1916\1) permitia que as sociedades civis
revestissem as formas estabelecidas nas leis comerciais, mas que o artigo seguinte (art. 1.365)
dispunha que se não revestissem nenhuma dessas formas reger-se-iam pelo que disposto naquele
capítulo. Ou seja, o dispositivo legal resolve o aparente problema sobre "qual o tipo societário das
entidades de previdência privada sem fins lucrativos", determinando que, se não revestirem
nenhuma forma estabelecida em lei comercial, as sociedades reger-se-iam pelo Capítulo XI do
Código Civil (LGL\2002\400).
Posteriormente, foi derrogado o art. 1.364 pela legislação que se seguiu, notadamente a Lei
6.404/1976 que vedava em seu art. 2.º a natureza civil das sociedades anônimas e, quanto às
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entidades de previdência privada, especificamente, passou a ser obrigatória a observação da


estrutura societária dada pela Lei 6.435/1977 e pelo Dec. 81.402/1978, o que foi ratificado pela
LC 109/2001.
Quanto a aparente impossibilidade de existir uma associação sui generis cujo conceito abarque as
entidades de previdência complementar sem fins e confira à minoria dos participantes o poder de
submeter a universalidade de associados a sua vontade, já existia na legislação anterior e deverá
ser mantida na atual por expressa previsão legal, sem que tal fato cause espanto, mormente
enquanto vigorar no direito brasileiro o princípio da não essencialidade do direito de voto, tal como
disposto no art. 111 da Lei 6.404/1976.
Sempre bom ressaltar que, enquanto alguns defendem a "extinção das entidades abertas sem fins
lucrativos, no que expõe mais a paixão do que a razão - outros, como Villela (Álvaro da Costa
Machado Villela. Seguro de vida. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1898. p. 86), por exemplo,
sustentam que somente as sociedades sem fins lucrativos - os Montepios - é que poderiam
atender corretamente aos reclamos da vida social pela "virtude ética primacial", pois nele a
"associação dos segurados não é um fato inconsciente provado por um especulador, mas um
movimento consciente determinado pelo reconhecimento do poder enorme da solidariedade". Diz
Villela que ao seguro mútuo é que cabe em pleno a frase de Courcy: "o seguro é uma instituição
maravilhosa de que a álgebra lançou as bases e de que a moral forma a coroa". Para se manter a
coerência no raciocínio, deveriam também os juristas, que assim praticam, defender o "fim das
entidades fechadas de previdência privada", que são também "sem fins lucrativos", o que até
agora não vimos ocorrer.
Cabe, por derradeiro, lembrar que a tese de que o § 1.º do art. 77 da LC 109/2001 está derrogado
pelo Novo Código Civil (LGL\2002\400) é absurdo tão grande como sustentar que "as entidades
fechadas de previdência privada, que tenham por patrocinadora a União", v.g., tenham de se
adaptar ao que disposto no novo Código Civil (LGL\2002\400), quanto à eleição de diretoria,
quando dispõe o § 6.º do art. 202 que isso é assunto específico de lei complementar. Da mesma
forma, "autorização e funcionamento de entidade de previdência privada" era matéria prevista
constitucionalmente como afeta à lei complementar (art. 192, II, c/c o art. 202 da CF
(LGL\1988\3)) que a regulamentou justo no parágrafo que ensejou a discussão sobre a suposta
"derrogação" pelo novo Código Civil (LGL\2002\400).
A legislação que regra a organização e funcionamento das entidades de previdência complementar
sem fins lucrativos como sociedades civis (naquela época "associações" ou "sociedades"), após o
Código Civil de 1916 (LGL\1916\1), e que foi integrada pelo § 1.º do art. 77 da LC 109/2001 é,
como já vimos, a Lei 6.435/1977 : "Art. 5.º As entidades de previdência privada serão organizadas
como: (...); II - sociedades civis ou fundações, quando sem fins lucrativos (...)"; e Dec. 81.402/
1978: "Art. 4.º (...) § 3.º As entidades abertas de previdência privada serão organizadas como:
(...); II - sociedades civis, quando sem fins lucrativos (...)" (grifamos).
Eduardo Espínola ("Da lei e da sua obrigatoriedade. Do direito intertemporal" . Tratado de direito
privado brasileiro. Rio de Janeiro: Feritas Bastos, 1939. p. 131 et seq. Tópico leis gerais e leis
especiais) esclarece bem o alcance da regra contida no art. 4.º da LICC (LGL\1942\3), que diz
que "disposição especial não revoga a geral, nem a geral revoga a especial, senão quando a ela ou
ao seu assunto se referir", quando diz que "por efeito de uma codificação, isto é, da decretação
de um Código sobre determinada matéria, não se deve decidir, sem mais exame, que ficam
revogadas ou ab-rogadas todas as leis esparsas anteriores, que se destinavam a reger a mesma
disciplina".
Acrescenta o consagrado jurista:
" Essas leis esparsas se reputam leis especiais em confronto com o nosso Código, que é a lei
geral.
O nosso Código Civil (LGL\2002\400) dispõe no art. 1.807: 'Ficam revogadas as Ordenações e
Costumes concernentes às matérias de direito civil reguladas neste Código'.
A jurisprudência de nossos tribunais não teve dúvida em afirmar que existem matérias de direito
civil, que se encontravam reguladas em lei e que não foram contempladas pelo Código,
continuando, pois, em vigor a lei anterior respectiva.
Foi o que decidiu a propósito da Lei 2.681, de 07.12.1912, que regula a responsabilidade civil das
estradas de ferro, a qual se não considerou ab-rogada pelo Código Civil (LGL\2002\400).
Vêm a propósito as palavras de Saredo: 'quando leis especiais regulam uma matéria compreendida
num Código ou em outra lei geral, mas contêm sobre a mesma matéria disposições que não se
encontram no Código ou na lei geral e que não contradizem ao novo direito, aquelas leis especiais
continuam em vigor, em relação a todas as disposições que devem ser consideradas como parte
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integrante do novo Código ou da nova lei' (b).


À igual solução chega Fiore, quando observa que: 'no caso de ser determinada matéria regulada
por uma lei geral, havendo certas relações atinentes à mesma matéria reguladas por uma lei
particular, o fato de ser publicada uma lei geral, que regule a matéria em sua integridade, não traz
como conseqüência ab-rogação implícita da lei especial relativa à mesma matéria, quando se não
apresenta incompatibilidade absoluta entre essa lei especial e a geral, ou quando a ab-rogação
não resulte claramente da intenção legislativa, do objeto, do espírito ou do fim da lei geral'.
Fiore alude ao caso da lei italiana de 24.01.1864, relativa às prestações devidas aos corpos morais
de mão morta: grave foi a discussão que se estabeleceu a propósito de ter sido, ou não, essa lei
ab-rogada depois da atuação do Código Civil (LGL\2002\400), prevalecendo a opinião negativa".
Logo, não há falar em "revogação dos dispositivos especiais integrados ao § 1.º do art. 77 da LC
109/2001, por norma geral que não disciplinou essa matéria.
Ressalvas dos arts. 777, 1.123 e 2.033 do CC, art. 777 do CC/2002 (LGL\2002\400) - Seguros
regidos por leis próprias:
Por esse motivo o art. 777 do CC/2002 (LGL\2002\400) dispõe que o seguro regido por lei própria,
só no que couber, obedecerá ao disposto naquele capítulo, sendo certo que o "seguro mútuo"
(antes previsto no art. 1.466 do CC/1916 (LGL\1916\1)) é tipo de "seguro regido por lei especial",
qual seja Lei 6.435/1977, Dec. 81.402/1978 e LC 109/2001 entre outras normas, o que refuta a
incidência do art. 2.031 do CC/2002 (LGL\2002\400).
Portanto, mesmo o Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, no seu art. 777, ao tratar de seguros, o
fez com cuidado e prudência, ao permitir que o seguro regido por lei própria (o que é o caso das
entidades abertas de previdência privada sem fins lucrativos, que são simples sociedades de
seguro mútuo previstas no art. 1.466 do CC/1916 (LGL\1916\1)) somente no que fosse aplicável
seguisse suas determinações, senão vejamos:
"Art. 777. O disposto no presente Capítulo aplica-se, no que couber, aos seguros regidos por leis
próprias".
Jones Figueiredo Alves (In: Ricardo Fiuza (Coord.) Novo Código Civil (LGL\2002\400) comentado.
São Paulo: 2003. p. 703, comentário ao art. 777) sustenta, com acerto, que as disposições
referentes ao seguro (entre os quais se insere o "seguro mútuo" e atual "plano previdenciário
privado") no novo Código Civil (LGL\2002\400) "assumem, em sua maioria, caráter principiológico,
pelo que deverão ser aplicadas, na maioria dos casos, coadunando-se, outrossim, com as leis
especiais que tratam da matéria".
Também o Capítulo XI do Código Civil (LGL\2002\400), que trata da "sociedade dependente de
autorização", ou seja, entre outras, de pessoas jurídicas como as "entidades abertas de
previdência complementar sem fins lucrativos" que necessitam de autorização para funcionar,
dispõe que são regidas por aquele título, sem prejuízo do disposto em lei especial, como se vê do
disposto abaixo, ipsis verbis:
"Art. 1.123. A sociedade que dependa de autorização do Poder Executivo para funcionar reger-se-
á por este título, sem prejuízo do disposto em lei especial.
Parágrafo único. A competência para a autorização será sempre do Poder Executivo federal"
(grifamos).
Entre as sociedades que dependem de autorização para funcionar estão as previstas na Lei 4.564/
1964, entre as quais se incluem as seguradoras de seguro mútuo (entidades abertas de
previdência privada), e Modesto Carvalhosa, em seus comentários a este capítulo, diz:
"Ressalte-se que o que determina a prévia autorização não é a forma da sociedade, mas os atos e
operações que esta pretende praticar consoante o seu objeto" (p. 545).
Com relação às sociedades brasileiras, dependem de autorização do governo para funcionar
apenas aquelas em que houver previsão legal específica.
Assim, dependem de autorização para funcionar, nos termos dos §§1.º e 3.º do art. 18 da Lei
4.595/1964 : "§ 1.º Além dos estabelecimentos bancários oficiais ou privados, das sociedades de
crédito, financiamento e investimentos, das caixas econômicas e das cooperativas de crédito ou a
seção de crédito das cooperativas que a tenham, também se subordinam às disposições e
disciplina desta lei no que fôr aplicável, as bôlsas de valores, companhias de seguros e de
capitalização, as sociedades que efetuam distribuição de prêmios em imóveis, mercadorias ou
dinheiro, mediante sorteio de títulos de sua emissão ou por qualquer forma, e as pessoas físicas ou
jurídicas que exerçam, por conta própria ou de terceiros, atividade relacionada com a compra e
venda de ações e outros quaisquer títulos, realizando nos mercados financeiros e de capitais
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operações ou serviços de natureza dos executados pela instituições financeiras.


§ 3.º Dependerão de prévia autorização do Banco Central da República do Brasil as campanhas
destinadas à coleta de recursos do público, praticadas por pessoas físicas ou jurídicas abrangidas
neste artigo, salvo para subscrição pública de ações, nos têrmos da lei das sociedades por ações"
(p. 546) (Comentários ao Código Civil (LGL\2002\400) (arts. 1.052 a 1.195). São Paulo: Saraiva.
p. 546).
Concluímos esse tópico com a afirmação de que o art. 1.123 da Lei 10.406/2002 se aplica às
entidades abertas de previdência privada sem fins lucrativos, mesmo sem necessidade de definir o
que sejam ("sociedades" ou "associações"), porque o inc. II do art. 192 da CF (LGL\1988\3), antes
da EC 40/2003, dispunha que as entidades de previdência privada terão de ter autorização para
funcionamento, bem como porque o art. 73 da LC 109/2001 dispõe que se aplica subsidiariamente
às entidades de previdência privada aberta a legislação de seguro e o art. 1.123 do CC é
"legislação aplicável ao seguro".
Logo, a ressalva feita pelo art. 1.123 do CC/2002 (LGL\2002\400) mais uma vez preserva o
princípio da especialidade da lei, ao dizer que referidas sociedades autorizadas a funcionar
somente no que couber seriam regidas pelo Código.
O art. 2.033 do CC/2002 (LGL\2002\400) contém ressalva quanto à necessidade de adaptação
prevista no art. 2.301. Diz o art. 2.033, ipsis verbis:
"Art. 2.033. Salvo o disposto em lei especial, as modificações dos atos constitutivos das pessoas
jurídicas referidas no art. 44, bem como a sua transformação, incorporação ou fusão, regem-se
desde logo por este Código".
Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery ( Novo Código Civil (LGL\2002\400) e legislação
extravagante anotados. São Paulo: Ed. RT, 2002. p. 32, art. 44, nota 3), com pequeno equívoco
ao comentar o art. 2.033 do novo CC, por mencionarem apenas "sociedade" no título, no que logo
corrigem e usam os termos "pessoas jurídicas", ratificam a tese aqui esposada:
"3. Sociedade prevista em lei especial. Salvo disposto em lei especial, as modificações dos atos
constitutivos das pessoas jurídicas referidas na norma ora comentada, bem como a sua
transformação, incorporação, cisão ou fusão, regem-se, desde logo por este Código" (grifei).
Maria Helena Diniz (In: Antônio Junqueira de Azevedo (Coord.). Comentários ao Código Civil
(LGL\2002\400). São Paulo: Saraiva, 2003. vol. 22, p. 139) também ressalva que as alterações
pretendidas pelo Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, em seu art. 2.031, somente serão imediatas
quando não houver disposto em contrário em lei especial, verbis:
"Qualquer modificação feita em estatuto ou ato constitutivo de pessoas jurídicas de direito privado
(CC, art. 44), ou seja, de associações, sociedades e fundações, reger-se-á, salvo disposto em lei
especial, pelo novo Código Civil (LGL\2002\400) (arts. 59, IV, par. ún., 67, I a III, 68, 997, 999,
par. ún., 1.003, 1.031, 1.048, 1.071, V e VI, e 1.077), bem como a sua transformação,
incorporação, cisão ou fusão (CC, arts. 1.113 a 1.122)" (grifei).
Nem poderia ser de outra forma, pois "lei geral e ordinária" não poderia revogar "lei específica e
complementar" em assunto que pede a forma de "lei complementar".
4.3 Diferença entre associação e sociedade no Código Civil de 2002
Problema que terá de ser enfrentado, e que continua longe de se ter por resolvido, é definir
doutrinária e jurisprudencialmente o que efetivamente distingue a "associação" da "sociedade",
principalmente quando se tem de definir pessoa jurídica que contém traços de associação
(ausência de finalidade econômica) e traços de sociedade (atividade econômica).
Será de suma importância a resposta dessa questão prévia, visto que somente enquadrar as
entidades como "associação" ou "sociedade" é que se pode, posteriormente, verificar a incidência
ou não do novel Código Civil (LGL\2002\400) (subsidiariamente) e quais os artigos que incidem.
O art. 44 do CC/2002 (LGL\2002\400), ao dizer que "são pessoas jurídicas de direito privado",
colocou no inc. I as associações e no inc. II as sociedades, o que já é suficiente a demonstrar a
intenção em diferençá-las.
Referido art. 44, no entanto, contém o mesmo erro do Código Civil de 1916 (LGL\1916\1), pois
existem sociedades não personificadas, ou seja, que não são "pessoas jurídicas', nada obstante
existam e sejam válidas, e legalmente previstas no próprio Código (arts. 986 a 996), com o que se
demonstra a dificuldade do próprio Código em precisar os termos.
Que há tentativa de diferençar "associação" de "sociedade" no Código atual não resta dúvidas,
pois não se usa o termo "sociedade" na definição de associação, mas sim o termo "união" ("união
de pessoas que se organizem para fins não econômicos"); enquanto o art. 981 do mesmo Diploma
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define "sociedade" como a união de pessoas com o fim de praticar atividade econômica, com o fim
de lucro e de partilha do resultado. Logo, ao contrário do Código de 1916, o de 2002 adotou,
claramente, a tese de que "associação" é a união de pessoas (e aí poder-se-ia usar o termo
"sociedade" só lato sensu em substituição ao vocábulo "união") para fins não-econômicos e se
valeu do termo "sociedade" para a união de que tenha "atividade econômica e fim econômico"
(repartição dos resultados).
Dos doutrinadores atuais, à exceção de Fábio Ulhoa Coelho ( Curso de direito comercial. São
Paulo: Saraiva, 2004. vol. 2, p. 13, in fine), que enfatiza, talvez com excesso, a importância da
doutrina nesse aspecto, bem como um outro que arrisca análises mais profundas, a maioria fica na
superfície, analisando apenas a ausência ou não de finalidade lucrativa, o que não basta a
caracterizar nem "associação", nem tampouco "sociedade".
Não basta dizer que "se há participação no lucro há sociedade", pois os trabalhadores podem
também participar dos lucros da empresa em que trabalham "sem criação de vínculo social", do
mesmo modo que diretores de sociedades anônimas podem participar do lucro (art. 190 da Lei
6.404/1976) sem serem "sócios" ou empregados, e poderá haver participação de empregados em
"superávit" de associação sem que com tal configure vínculo associativo ou mesmo "distribuição de
lucro". Pontes de Miranda (Op. cit., vol. XLIX, p. 12) acrescenta que nem o empréstimo com
participação nos lucros; nem a outorga de poder (mandato ou outra figura) ou comissão para
venda de mercadorias, com parte nos lucros; nem a compra por duas ou mais pessoas de
patrimônio ou massa, para que se dividam os lucros ou lucros e perdas, criam vínculo social.
A definição de "associação" e "sociedade", que aparentemente seria fácil ante o que dispõem os
arts. 53 e 981 do CC/2002 (LGL\2002\400), além dos elementos óbvios (ausência ou não de
finalidade lucrativa), terá de ser acrescida dos comumente citados pela doutrina, pois a existência
ou ausência de finalidade lucrativa não será suficiente à caracterização e mesmo a indicar a
existência das referidas pessoas jurídicas, pois união de pessoas organizadas para atividade sem
finalidade lucrativa poderá ser, e.g., "reunião para o chá da tarde com amigos" ou "comunidade" e
não necessariamente "associação".
A importância da definição doutrinária se dá, v.g., como já vimos no item 4.2, pelo fato de que
entre os inúmeros artigos cuja incidência será discutida temos o art. 1.123 do CC, suso transcrito,
que dispõe sobre a "sociedade que dependa da autorização do Poder para funcionar", e que usa
apenas o termo "sociedade" e não "associação".
Rubens Requião, já mencionado no item 3.1, sustenta quanto ao vocábulo "associação" que o
Código Comercial usou essa expressão como sinônima de sociedade comercial, em diversos artigos,
entre os quais o art. 290 ("Em nenhuma associação mercantil se pode recusar aos sócios o exame
de todos os livros (...)") e afirma que:
"Ao contrário de alguns juristas pátrios, pensamos que dos textos da lei se pode esclarecer uma
exata nomenclatura, destinando o uso da palavra associação para as entidades de fins não-
econômicos (por exemplo: "Associação Comercial do Paraná"). Os usos e costumes, que tão
grande papel desempenham na formação do direito comercial, consagram, no sentido indicado, o
emprego do vocábulo.
Sociedade. Nessa ordem de pensamento destinaríamos a palavra sociedade para designar a
entidade constituída por várias pessoas, com objetivos econômicos" ( Curso de direito comercial".
São Paulo: Saraiva, 2003. 1.º vol., p. 356 et seq., § 207).
José Edwaldo Tavares Borba, ao comentar a Lei 10.406/2002, afirma que:
"(...) As associações e sociedades têm nos seus associados ou sócios a sua origem e a fonte
maior da formação da vontade social. O novo Código, ao defini-las, afasta a imprecisão
terminológica outrora dominante, na medida em que estabelece uma nítida distinção entre
associação e sociedade, aliás consagrando o entendimento doutrinário, que já considerava a
primeira uma entidade sem fins econômicos, enquanto a segunda objetivava o lucro para
distribuição aos seus sócios ('Direito societário'. 8. ed. Rio de Janeiro: Renovar. p. 5. Apud
Cleysson de Moraes Mello e Thelma Araújo Esteves (Org.). O novo Código Civil (LGL\2002\400)
comentado. Rio de Janeiro: Freitas Bastos. vol. 1, p. 41).
J. Franklin Alves Felipe e Geraldo Magela Alves, quanto ao tema, dizem:
"4. Pessoas jurídicas de direito privado. Valendo-se da melhor nomenclatura jurídica, o Código
define as pessoas jurídicas de direito privado: associações, sociedades e fundações. As primeiras
desenvolvem atividades sem escopo econômico, ou seja, não visam a lucro e podem ter natureza
cultural, esportiva, educacional, hospitalar e outras. As sociedades visam à obtenção de lucro, em
proveito e seus sócios (...)" ( O novo Código Civil (LGL\2002\400) anotado. 2. ed. Forense).

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Melhor seria, no entanto, que se valessem do termo "união" (tal como na definição dada pelo art.
53: "Constituem-se as associações pela união de pessoas (...)") como gênero e "associação" e
"sociedade" como espécies, pois há a "sociedade não personificada", ou seja, sociedade que não é
ainda "pessoa jurídica" (art. 985 et seq. do CC/2002 (LGL\2002\400)) por faltar registro dos atos
constitutivos ou por ser "sociedade em conta de participação", o que o Código Civil
(LGL\2002\400) trata especificamente no Subtítulo I, do Título II, nos Capítulos I e II, arts. 986 a
996.
Como, porém, a só participação nos lucros não cria vínculo social, pois os trabalhadores e
diretores também participam dos "lucros das empresas" sem se tornarem sócios (cf. art. 190 da Lei
das Sociedades Anônimas), e, que a "união de pessoas" não é de si por si "associação", pois pode
ser mera "reunião de amigos" ou "comunidade", faz-se mister o aprofundamento doutrinário para
que se caracterizem bem "associação" e "sociedade", o que vimos que os doutrinadores atuais não
o fizeram, como se verifica nos exemplos acima.
4.4 Crítica ao enquadramento como associação
No novo Código Civil (LGL\2002\400), nada obstante os doutrinadores tenham se manifestado -
em sua maioria - pela distinção baseada apenas em fins econômicos ou não-econômicos ao
definirem as "associações", haverá dúvidas, como já afirmado no item anterior, quanto à
classificação das entidades de previdência privada, pelos elementos que possuem e que as
caracterizam em parte como associações ("ausência de finalidade lucrativa") e em parte como
sociedades ("atividade econômica").
Não basta a leitura do art. 53 do CC/2002 (LGL\2002\400), como pensa Sérgio Campinho (Op. cit.,
p. 35), para se definir o que seja "associação", pois a união de pessoas, v.g., que "se organizem
para tomar chá à tarde (fim não econômico)", terá preenchido o caput do referido artigo sem
caracterizar o contrato de "associação".
Os elementos que constituem a "associação", tais como a "ausência de reciprocidade" (par. ún. do
art. 53) e o fato de o caput do art. 53 não mencionar "atividade econômica", certamente serão de
grande importância quando tiverem os contornos definidos pelo STJ, para que se ponha fim às
divergências doutrinárias. Pode ser que, ante o que dispõem os arts. 53 e 981, haja evolução
doutrinária e jurisprudencial no sentido de que sejam tidas por "associações" apenas as que, além
da ausência de finalidade lucrativa, também não tenham como objeto principal "atividade
econômica". Neste caso, seguro e previdência, por serem essencialmente "atividade econômica",
não poderiam ser objeto de "associação", e sim de "sociedade" que, no caso, seria "sociedade
simples, especial, sem fins lucrativos".
Doutrinamos no parecer, que ora curamos de atualizar, que as "entidades abertas de previdência
privada sem fins lucrativos" são "associações especiais" e assim o fizemos tomados apenas pela
"ausência de finalidade lucrativa" das referidas entidades e para aproximar da terminologia do
Código Civil (LGL\2002\400) de 2002; porém, o raciocínio suso transcrito, pela lógica, também nos
agrada e entendemos possa ser utilizado a locução "sociedade simples, especial, sem fins
lucrativos" sem agressão ao texto legal desde que adotada a tese de que somente pode ser tida
por associação a pessoa jurídica que não tenha como atividade principal "atividade econômica".
Neste caso, somente as pessoas jurídicas que, além da ausência de finalidade lucrativa, também
não possuíssem como atividade principal "atividade econômica" é que poderiam ser tidas como
"associação".
Não houve substituição das "sociedades civis" pelas "sociedades simples" e não é este o motivo
pelo qual as entidades de previdência privada sem fins lucrativos assim podem ser consideradas. O
que permite tal conclusão é a existência de "atividade econômica", cuja ausência pode ser
considerada elemento obrigatório a caracterizar a associação.
Certo é, no entanto, que, se adotada a tese de necessária "ausência de atividade econômica",
somente poderão ser tidas como "associações" as que tenham objetivos "pios, morais, artísticos e
beneficentes", e que não tenham por objetivo (atividade) principal "prestações de serviços
(apresentações musicais, por exemplo) remuneradas dos que lhes forem associados", nada
obstante possam ter atividade econômica secundária para se manterem (apresentações
esporádicas, com reversão de todos os recursos para a associação).
Isso é lógico, pois, como o art. 53 não diz que as "associações praticam atividade econômica",
permitir isso seria acréscimo dado pela doutrina, como sempre ocorreu, e a limitação a esta
"atividade econômica" pode ser fruto de interpretação científica do disposto no artigo.
Mesmo a distinção feita por J. M. Carvalho Santos, pois sustentou, baseado na legislação da
época, que a associação pode ter "atividade econômica", desde que não tenha "fins lucrativos",
terá de ser revista, não para lhes retirar essa possibilidade, mas para quadrá-las, talvez, com as
novas realidades sociais. Assim, aceitamos que se considere "associação" apenas a pessoa jurídica
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que atenda ao disposto no art. 53 et seq. do CC e que não tenha como atividade principal
"atividade essencialmente econômica". Neste caso, as entidades de previdência privada sem fins
lucrativos" não poderiam ser tidas por "associações especiais", pois a atividade que lhes é própria
é essencialmente econômica; ao passo que teriam de ser tomadas como "sociedades simples,
especiais, sem fins lucrativos" e os participantes, clientes que são, teriam de ser reputados meros
contratantes (como ocorre nas entidades fechadas constituídas sob a forma de fundação), o que
de maneira alguma altera a conclusão do presente parecer, quanto à inaplicação do art. 2.031 do
CC.
Ficaria garantido, neste caso, que associações pudessem ter "atividade econômica", desde que
utilizadas para mantê-las e que não lhes fosse atividade principal (exemplo: a "associação de
músicos", citada por J. M. Carvalho Santos, somente poderia ser considerada "associação" se o
objetivo principal não fosse a apresentação remunerada de seus membros, e que referidas
apresentações remuneradas fossem feitas apenas como atividade acessória necessária a manter a
associação).
4.4.1 Liberdade de associar e não-intervenção estatal
Interessante notar, outrossim, que o art. 5.º, XVIII, da CF (LGL\1988\3) dispõe que "a criação de
associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a
interferência estatal em seu funcionamento"; o que foi usado como argumento para afastar prima
facie a hipótese de as entidades de previdência privada abertas sem fins lucrativos serem
associações, tese essa com a qual não concordamos porque as premissas foram mal colocadas e
esse inciso é aplicável, também, às sociedades.
Antes do Código Civil (LGL\2002\400) de 2002 não havia distinção entre associação e sociedade,
como já exposto nos itens 3.1 e 3.2, o que força a conclusão de que a liberdade de associação
mencionada no inc. XVIII é liberdade de criar "associação" ou "sociedade" independentemente de
autorização estatal.
Nesse sentido José Afonso da Silva ( Curso de direito constitucional positivo. 19. ed. São Paulo:
Malheiros, 2002. p. 269-271), apoiado em lição de Pontes de Miranda, quando diz, conforme
legislação anterior ao Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, que a liberdade de associação inclui
tanto as associações em sentido estrito quanto as sociedades, além de compreender as bases
gerais e os fundamentos primeiros dos partidos políticos, que seriam, para ele, "espécies de
associações com disciplina constitucional específica estabelecida no art. 17".
Faz-se mister distinguir, no entanto, a "restrição de atividade" ( v.g., atividade inserta no "sistema
financeiro nacional" - art. 192 da CF (LGL\1988\3)) com intervenção e restrição à liberdade de
"associação".
A atuação irregular de determinada pessoa jurídica em atividade para a qual não possui a
necessária autorização não transforma sua estrutura, ou seja, continua ela a ser a mesma pessoa
jurídica, somente atua irregularmente. Logo, se é associação que está a atuar em atividade que
necessita de intervenção e autorização estatal com autorização do Estado, se tal fato fosse
irregular - e não o é -, não se despiria por isso, de si por si, da condição de associação para se
transformar em sociedade.
Embora haja realmente o referido inc. XVIII da CF (LGL\1988\3) disposto que "é livre a criação de
associação e que o Estado não pode intervir em seu funcionamento", isso não serve como
argumento jurídico para descaracterizar as entidades de previdência complementar sem fins
lucrativos e transformá-las, de si por si, em sociedades. Não. O inc. XVIII da CF (LGL\1988\3)
deve ser lido em consonância com o anterior (XVII) que diz que "é plena a liberdade de associação
para fins lícitos", ou seja, se o Estado pode intervir e mesmo dissolver com uma associação que
tenha fins ilícitos ou que com o tempo passe a tê-lo, como o fez, v.g., com a Associação de
Torcedores Grêmio Gaviões da Fiel Torcida (TJSP, 3.ª Câm., AP 102.023-4/3, rel. Des. Ênio
Santarelli Zuliani, j. 17.10.2000, RT 786/163) e o fará com relação a qualquer "associação de fins
criminosos", o princípio do inc. XVIII de "não-intervenção" estatal já aí está mitigado.
Razão por que entendemos afastado o argumento de que não possam existir "associações"
autorizadas a funcionar, dado que a recepção feita pelo inc. II dos arts. 192 e 202 da CF
(LGL\1988\3) às regras da Lei 6.435/1977 e Dec. 81.402/1978 atesta justamente isso, que havia e
há entidades consideradas "associações" que têm de ter autorização estatal, cujo funcionamento
também pode lhes ser disciplinado, além de ser o dispositivo constitucional aplicável às
associações e sociedades.
É que para que a atividade fosse lícita como requeria o inc. XVII do art. 5.º havia de observar a
lei, e foi a própria Constituição (a "Lei Maior") que determinou que essa lei regrasse "autorização e
funcionamento de entidades de previdência privada" independentemente do que fossem
(associações ou sociedades), o que mitiga o princípio do inc. XVIII do art. 5.º.
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Quando se tratasse de "associação cuja atividade integrasse o sistema financeiro nacional" a que
aludia o inc. II do art. 192 da CF (LGL\1988\3), a autorização para funcionamento tinha de ser
dada e sofria referida associação intervenção estatal sem nenhuma ofensa ao princípio
constitucional de "liberdade de associação", porquanto o que se limitava aí era a "atividade" e o
preceito constitucional era dirigido às associações e sociedades indistintamente.
Pontes de Miranda (Op. cit., p. 40), ao tratar da proteção constitucional da liberdade de
associação, diz que isso não significa que se tenha de permitir a exploração de qualquer atividade
a estrangeiro. A liberdade que se assegura é de associação. Se a associação ou a sociedade tem
por fim atividade que só a brasileiros se admite, com isso não se restringiu a liberdade de
associação; o que se estabeleceu foi a restrição, no interesse nacional, de determinada atividade.
Mutatis mutandis, o que afirmado serve ao caso sob apreço, em que não se nega o direito
constitucional de "livre associação", mas há restrição de atividade ligada ao sistema financeiro por
quem não devidamente autorizado.
O raciocínio acima, posto tenha sido elaborado com base na redação do inc. II do art. 192 da CF
(LGL\1988\3), vigente à época da promulgação da Constituição Federal (LGL\1988\3) e da
recepção da Lei 6.435/1977 que regrava as entidades tal como constituídas, continua válido
mesmo ante a revogação do referido inciso pela EC 40/2003.
As "associações" que sejam de interesse público, notadamente as que integram o Sistema
Financeiro Nacional, como as "associações de poupança e empréstimo", mencionadas por Aloysio
Lopes Pontes ( Instituições financeiras privadas. Forense, 1972. p. 163 et seq.), não podem, pois,
dispensar a "autorização" a ser dada por lei complementar.
4.4.2 Categorias diferentes de associados "vantagens especiais" - CC, art. 55
É bom que se ressalte que mesmo o novo Código Civil (LGL\2002\400), ao dispor sobre
"associações", permite categorias diferentes de associados, no art. 55, abaixo transcrito, verbis:
"Art. 55. Os associados devem ter iguais direitos, mas o estatuto poderá instituir categorias com
vantagens especiais" (grifamos).
Ficará a cargo do doutrinador, e do julgador, dizer o que sejam as "vantagens especiais", mas, de
qualquer forma, não destoa da regra contida na legislação previdenciária privada, que permite a
existência dos "associados controladores" e dos "simples participantes de planos previdenciários".
Maria Helena Diniz (In: Ricardo Fiuza (Org.). Novo Código Civil (LGL\2002\400) comentado. São
Paulo: Saraiva, 2003. p. 70, comentário ao art. 55), quanto ao art. 55 da Lei 10.406/2002, diz
que:
"Posições privilegiadas e outorga de direitos especiais: O ato constitutivo poderá, apesar de os
associados deverem ter direitos iguais, criar posições privilegiadas ou conferir direitos
preferenciais para certas categorias de membros, como, por exemplo: a dos fundadores, que
não poderá ser alterada sem o seu c onsenso, mesmo que haja decisão assemblear aprovando tal
alteração; a de sócios remidos de determinado clube, que pagam certa importância em dinheiro
para ter o direito de pertencer vitaliciamente à associação, sem mais dispêndios, não podendo,
assim, a assembléia deles exigir pagamento de outra contribuição, salvo se houver seu expresso
consentimento ou se for tal exigência imprescindível para obter meios necessários à sobrevivência
da associação".
De Plácido e Silva ( Vocabulário jurídico. Forense, 1980. Verbete vantagem, t. 4) expõe que o
termo "vantagem" provêm do francês avantage (benefício, proveito, lucro) e que em sentido
especial "a vantagem pode manifestar-se como uma prioridade, um benefício particular, ou uma
regalia, que se estabelece em favor de um, em relação a outros".
Pelo exposto, nada de mais que, tendo-se as entidades abertas de previdência complementar sem
fins lucrativos por "associações" tal como previstas no Código Civil (LGL\2002\400) de 2002,
subsistam as categorias chamadas de "associados controladores" e dos associados simplesmente
"participantes de planos previdenciários" previstas na Lei 6.435/1977, Dec. 81.402/1978 e demais
normas aplicáveis perdurem cada qual com seus "deveres", "privilégios" e "vantagens" (quanto aos
controladores o de designar a diretoria e responder em caso de insucesso, inclusive com
"indisponibilidade de seus bens"; quanto aos "participantes", o de possuírem crédito privilegiado em
caso de "liquidação extrajudicial" e não responderem por insucesso da atividade).
De suma relevância notar que não há "vantagens" apenas para os "controladores" (poderem
designar a diretoria), porquanto os que são simples "participantes" também as possuem, bem que
de ordem diferente (créditos privilegiados e não responderem por insucesso). As desvantagens,
por assim dizer, são, pois, plenamente razoáveis ante os direitos próprios a cada categoria de
associado.

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Renan Lotufo ( Código Civil (LGL\2002\400) comentado. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 160,
comentários ao art. 55), sem muita clareza nesse aspecto, diz que "(...) A exceção à igualdade de
direitos dos sócios deve decorrer de exceção expressa, que confirme o princípio da igualdade na
sua operacionalidade, isto é, desigualdade decorrente das condições participativas dos
associados, quer pelas contribuições, quer pela intensidade do labor", o que, aparentemente,
ratifica também a tese de que, pela "intensidade do labor" (responsabilidades inclusive civis e
criminais), possam os controladores designar a diretoria.
Nosso direito pátrio, longe de repelir a possibilidade de "sócios ou associados" poderem ter
"vantagens pecuniárias ou políticas", expressamente as prevê, em vários dispositivos legais, entre
os quais no art. 17 da Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6.404/1976), em que as "ações
preferenciais" têm "preferência ou vantagem pecuniária" (direito a dividendos 10% maiores do que
os atribuídos às ações ordinárias) com prejuízo de "direito ou vantagem política", ou seja, o "direito
de voto" que lhe foi suprimido pelo art. 111 da mesma Lei.
Ainda na Lei de Sociedades Anônimas, sob o Título "Vantagens políticas", o art. 18 dispõe em seu
caput que "o estatuto pode assegurar a uma ou mais classes de ações preferenciais o direito de
eleger, em votação em separado, um ou mais membros dos órgãos de administração".
Fran Martins ( Comentários à Lei das Sociedades Anônimas. 3. ed. Forense, 1989. vol. 1, p. 120-
121, itens 68 e 69), ao comentar o art. 18, diz que, "pela lei anterior, as vantagens ou privilégios
atribuídos às ações preferenciais eram apenas de ordem pecuniária; não tinham tais acionistas
direito a uma representação na administração da sociedade, cabendo-lhes, apenas, eleger um
membro do conselho fiscal (art. 125), que é órgão fiscalizador e não de gestão da sociedade".
Finalizando, ressalta que a lei atual ampliou as vantagens políticas dos acionistas preferenciais (p.
121, item 69), ou seja, enfatiza a existência de "vantagens políticas".
Este era o entendimento do Dec.-lei 2.627/1940 comentado por ilustres juristas, entre os quais
Trajano Miranda Valverde ( Sociedades por ações. 2. ed. Forense, 1953. vol. 1, p. 124) que, em
parágrafo elucidativo, expõe que a vantagem poderá consistir justamente no "direito de voto":
"Veio, pois, o referido decreto possibilitar a criação de duas sortes de ações preferenciais, tomado
esse termo em sentido amplo: as ações de direção e as ações preferenciais, em sentido estrito.
As primeiras, se os estatutos recusam o direito de voto às segundas, constituirão, praticamente,
ação de voto privilegiado. A sua vantagem consistirá no fato de somente poderem os seus
titulares votar nas assembléias, tomar, enfim, parte ativa na administração da sociedade. As
segundas gozarão de vantagens exclusivamente pecuniárias (art. 10)".
No mesmo sentido, Carlos Fulgêncio da Cunha Peixoto ( Sociedades por ações. São Paulo:
Saraiva, 1972. vol. 1, p. 120), quando enfatiza que a vantagem pode consistir no direito de votar:
" A vantagem, caracterizadora da ação preferencial, é de ordem econômica, pois não resta dúvida
de que as ações ordinárias, hoje, no Brasil, são também privilegiadas no tocante ao direito de
voto. (...) Desta maneira, podemos dizer que, em sentido lato, todas as ações no Brasil são
privilegiadas: as ordinárias, mantendo para seus titulares a exclusividade do direito de voto, e as
preferenciais uma vantagem econômica".
Como o Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, em seu art. 55, diz que o estatuto pode prever
categorias de associados com vantagens especiais, sem dizer se são "vantagens políticas" ou
"vantagens pecuniárias", presume-se aí a liberdade de cada associação ditar as vantagens que
quadrarem melhor com o funcionamento para atingirem as finalidades para as quais foram criadas,
que não só podem ser "políticas", mas também "pecuniárias".
Claro, portanto, que, no Brasil, o direito de "voto" não é direito essencial de sócio ou associado,
tem natureza contratual, e pode ser suprimido, isto não só pela orientação seguida assim pelo
direito brasileiro, como também alemão, norte-americano, suíço e italiano, entre outros, como
abaixo demonstraremos.
4.4.3 Designação de diretoria eleição indireta - Art. 59 do CC/2002 direitos-específicos
preferentes
Como afirmado no item anterior, há problema de interpretação que surge com o advento do novo
Código Civil (LGL\2002\400) quanto ao alcance do art. 59, e a tentativa de aplicá-lo às entidades
de previdência privada sem fins lucrativos, artigo esse que diz:
"Art. 59. Compete privativamente à assembléia geral:
I - eleger os administradores;
II - destituir os administradores; (...)".
Pelo art. 59 do novo CC, seria a assembléia geral (presume-se "de todos os associados") que

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privativamente teria de eleger e destituir os administradores, o que seria incompatível com os


comandos da LC 109/2001, Lei 6.435/1977 (art. 30) e Dec. 81.402/1978 (art. 38), que fazem
distinção entre "controladores" e simples "participantes de planos previdenciários". Só que, como é
cediço, a nova lei geral não revoga a especial (Lei de Introdução ao Código Civil (LGL\2002\400),
Dec.-lei 4.657, de 04.09.1942, com as alterações introduzidas pela Lei 3.238, de 1.º.08.1957, art.
2.º, §§ 1.º e 2.º), além de ser cabível a realização de "assembléia de associados com poder de
voto" (categoria que teria essa "vantagem especial", no dizer do art. 55 da Lei 10.406/2002 -
novo Código Civil (LGL\2002\400)).
Pontes de Miranda, ao estudar as pessoas jurídicas do Código Civil de 1916 (LGL\1916\1), deteve-
se no "princípio de igualdade" que norteia a relação dos membros, sobremaneira no assunto que
denominou "direito-específico preferente" ( Tratado de direito privado. Campinas: Bookseller,
1999. t. I, p. 464-468), diz:
" Os direitos-específicos preferentes (Sonderrechte) são aqueles que pertencem aos membros,
sem que todos os membros os tenham. Nasceram da desigualdade, embora sem infração dos
princípios; razão por que, para os eliminar ou diminuir, se precisa do assentimento dos seus
titulares. Tal o verdadeiro conceito, que se presta à doutrina e muito nos revela da natureza dos
direitos-específicos e da dupla classe em que se distribuem. Direitos-específicos preferentes são
os que, pelos estatutos, se atribuem a um, alguns ou classe de membros. Já P. Laband fixava-o,
em 1874 (sobre isso, K. Lehmann, 'Einzelrecht und Mehrheitswillw', Archiv für Bürgerliches Recht,
vol. IX, p. 301 et seq.). O que pertence a todos os membros não é direito-específico preferente;
é específico geral. Daí as críticas que sofreu, por exemplo, G. Planck, nas edições anteriores à 4.
ed. do Kommentar. O princípio igualitário rege os direitos-específicos gerais e os preferentes da
mesma classe, embora, para a preferência, se haja aberto exceção àquele; e, é tal princípio que
impede eliminar-se ou diminuir-se o direito-específico geral contra um ou alguns membros e outros
não. O direito de voto plural, que é específico (voto) e preferente (plural), o direito a ser diretor
de tal departamento, que é realização da possibilidade de ser direito mais preferência, a dispensa
de contribuição, que é preferência que elimina obrigação específica, a maior participação nos
lucros, que é direito-específico (participação) e preferente (maior), o direito de uso exclusivo, ou
em classe, do salão de conferências, todos eles são direitos-específicos preferentes. Depende do
ato constitutivo, ou de alteração dele, de acordo com ele (...)" (grifamos).
Ao prosseguir, enfatiza Pontes de Miranda que foi repelida a opinião que confundia indistintos os
direitos específicos gerais e os preferentes e que o direito a voto pode ou não ser outorgado ao
membro da pessoa jurídica. Diz o saudoso jurista (Op. cit., p. 467):
"O direito de voto é direito formativo (gerador, nas eleições; modificativo, e.g., nas alterações de
estatutos; extintivo, nas exclusões e dissoluções). A afirmação, que fazemos, opõe-se à
construção de A.von Tuhr (Der Allgemeine Teil, vol. I, p. 551), para que se trataria de simples
faculdade de poder. Ora, o poder que tem o representante, digamos, o mandatário, é todo o
conteúdo do que se lhe outorgou, ao passo que o direito de voto é direito por si, que pode estar,
ou não, incluído no rol de direitos e poderes que tem o membro de pessoa jurídica. Quanto à
capacidade eleitoral passiva (elegibilidade para órgão, ou membro de órgão), não é direito, é
possibilidade de ter direito, que não se pode eliminar nem restringir sem se atenderem os
princípios".
Trajano Miranda Valverde ( Sociedades por ações. 2. ed. Forense, 1953. vol. 1, p. 124), em
parágrafo elucidativo quer quanto à possível supressão do direito de voto, quer quanto à
vantagem que poderá consistir no "direito de voto", expôs, ao comentar o artigo 9.º do Dec.-lei
2.627/1940, que regia as sociedades anônimas antes da Lei 6.404/1976:
"Veio, pois, o referido decreto possibilitar a criação de duas sortes de ações preferenciais, tomado
esse termo em sentido amplo: as ações de direção e as ações preferenciais, em sentido estrito.
As primeiras, se os estatutos recusam o direito de voto às segundas, constituirão, praticamente,
ação de voto privilegiado. A sua vantagem consistirá no fato de somente poderem os seus
titulares votar nas assembléias, tomar, enfim, parte ativa na administração da sociedade. As
segundas gozarão de vantagens exclusivamente pecuniárias (art. 10)".
No mesmo sentido Carlos Fulgêncio da Cunha Peixoto ( Sociedades por ações. São Paulo: Saraiva,
1972. vol. 1, p. 120), quando enfatiza que o direito de voto pode ser suprimido e quanto à
vantagem que consiste no direito de votar:
" A vantagem, caracterizadora da ação preferencial, é de ordem econômica, pois não resta dúvida
de que as ações ordinárias, hoje, no Brasil, são também privilegiadas no tocante ao direito de
voto. (...) Desta maneira, podemos dizer que, em sentido lato, todas as ações no Brasil são
privilegiadas: as ordinárias, mantendo para seus titulares a exclusividade do direito de voto, e as
preferenciais, uma vantagem econômica".

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Carlos Fulgêncio da Cunha Peixoto ( Sociedades por ações. São Paulo: Saraiva, 1972. vol. 2, p.
346-348, em especial § 638), mais adiante, conclui dizendo que o voto não é direito essencial e
que pode ser suprimido. Eis o comentário que faz ao analisar o princípio da "proporcionalidade" do
voto:
"O princípio de que cada ação representa um voto é decorrência deste princípio e tem sido, com
maior ou menor largueza, aceito pela legislação das diversas nações. De fato, estes países
admitem representar seu voto apenas um direito natural e não essencial à qualidade de sócio e,
assim, torna-se lícito introduzir modificações e até suprimir este direito. Por isto é que alguns
países, posto adotem o princípio da proporcionalidade, estabelecem o número de votos máximos
que pode reunir um acionista.
(...)
638. Filiou-se a atual lei brasileira a esta corrente. Para o Dec.-lei 2.627 , de 1940, o voto é um
direito natural, mas não essencial. Destarte, é correta a afirmativa de ser o voto um direito social
legal, o que indica advir ele de um preceito de lei".
Waldemar Ferreira ( Tratado das sociedades mercantis. 5. ed. Ed. Nacional de Direito, 1958. vol.
IV, p. 1.029), ao comentar o Dec.-lei 2.627/1940, citou o decreto anterior, Dec. 21.536/1932, que
cortou controvérsias doutrinárias sobre a possibilidade de existência das ações preferenciais e
ações com direitos e vantagens diferentes, nos seguintes termos:
"Os estatutos, criando as ações preferenciais, ao lado das ordinárias, também de comuns
chamadas, podiam deixar de conferir àquelas algum ou alguns dos direitos reconhecidos a estas,
inclusive o de voto; ou conferi-lo com restrições.
(...)
Se esse era o regime das ações privilegiadas emergente do Dec. 21.536, de 15.06.1931, estão
elas agora submetidas ao do Dec.-lei 2.627. Podem ser, referem o art. 9.º e par. ún., de uma ou
mais classes. As sem direito de voto não podem ultrapassar a metade do capital social".
Com o que, ante o conteúdo do art. 55 do CC/2002 (LGL\2002\400), não é de estranhar que
possa ser lido o art. 59 como "assembléia dos associados com direito a votos", mormente pelo que
disposto no art. 58 do mesmo Diploma.
Inclusive a possibilidade de o "associado deter quotas do patrimônio da associação" (par. ún. do
art. 56) atesta a existência do direito-específico preferente e inclusive não muito justificável ante
o "fim não-econômico" que deve ter a associação (art. 53), pois valorização do patrimônio desta
implicará automaticamente "aumento do valor da quota patrimonial do associado" e, quer se queira
quer não, "lucro" ( lato sensu) para o titular - indisponível enquanto na associação, mas ainda
assim "lucro", que poderá ser auferido caso seja facultada a transmissão da qualidade de
associado (art. 54). Essa é apenas uma das questões que futuramente terão de ser solucionadas
pela doutrina e jurisprudência sobre o tema.
Com tantos "direitos e vantagens diferenciados", inclusive quanto ao patrimônio da associação,
que muito que alguns detenham poder de controle e responsabilidade por isso, enquanto outros
não?
O novo Código Civil (LGL\2002\400), quando quis garantir o direito de voto a integrante de
sociedade o fez expressamente, como no inc. VI do art. 1.094, quanto à cooperativa; abstendo-
se de regular as sociedades anônimas (art. 1.089), permitiu continuassem regradas por lei que
prevê "ações" sem direito a voto.
Na Lei de Sociedades Anônimas (Lei 6.404/1976), como afirmado, o direito de voto não está
elencado entre os "direitos essenciais dos acionistas" previstos no art. 109, razão pela qual,
seguindo a escola contratual da common law do direito anglo-americano, o legislador brasileiro, ao
disciplinar o "direito de voto", o teve como as demais prerrogativas inerentes à qualidade de
acionista, ou seja, com origem contratual, conforme destaca Modesto Carvalhosa (Comentários à
Lei de Sociedades Anônimas. Atual. São Paulo: Saraiva, 1997. vol. 3, p. 323 et seq., comentários
ao art. 110).
Antes de serem extintas pela Lei 8.021/1990 (que revogou o art. 33 da Lei 6.404/1976), existiam
as "ações ordinárias ao portador" que não possuíam direito a voto e, ainda hoje, existem ações
preferenciais sem direito a voto e que somente o adquirem em situações excepcionais, conforme
disposto no art. 111 da Lei 6.404/1976, cujo caput reza: "O estatuto poderá deixar de conferir às
ações preferenciais algum ou alguns dos direitos reconhecidos às ações ordinárias, inclusive o de
voto, ou conferi-lo com restrições, observado o disposto no art. 109" (grifamos).
Tal como o direito brasileiro, o direito norte-americano, alemão, suíço e italiano permitem a

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emissão de ações sem direito de voto; ao passo que o direito francês e belga entendem que o
direito a voto seria preceito de ordem pública (cf. Modesto Carvalhosa, op. cit., p. 351-352).
Miguel Reale, supervisor da Comissão Revisora e Elaboradora do Código Civil (LGL\2002\400), em
artigo disponível em seu site (www.miguelreale.com.br), intitulado "As associações no novo Código
Civil (LGL\2002\400)", expõe que, ipsis litteris:
"(...) Não é dito, assim, que os cargos que compõem a Diretoria da associação devam ser eleitos
pela assembléia geral, para cada um deles, podendo o estatuto social estabelecer a escolha por
ela de todos os componentes de um Conselho, cabendo a este, depois, a designação, dentre os
seus membros, dos titulares dos cargos de direção.
Com tais medidas fica preservado o direito dos associados de decidir livremente sobre o processo
de administração que julguem mais adequado aos interesses da entidade, preferindo a eleição
indireta de seus diretores, bem como que a eleição não seja global, mas apenas para uma das
partes do Conselho, na proporção e datas previamente estabelecidas.
Parece-me que a eleição dos dirigentes feita em dois ou mais pleitos é a mais indicada para as
associações de grande porte e com valores da tradição a serem preservados, visto como, com
tais providências, a renovação do quadro dirigente se operará sem rupturas e descontinuidade
indesejáveis.
Como se vê, o entendimento que estou dando às determinações do novo Código Civil
(LGL\2002\400) sobre associações é o que melhor atende ao exercício da 'liberdade de associação'
assegurada pelo art. 5.º, XVII, da CF (LGL\1988\3), sem o seu prejudicial engessamento,
resultante de restrita interpretação da lei, sem se atender ao valor essencial da liberdade (...)".
Importante frisar que, apesar de Miguel Reale ser infenso à eleição da diretoria por "outro órgão
que não seja a assembléia geral, como, por exemplo, os chamados associados fundadores", não se
pronunciou quanto à possibilidade de vir expresso nos estatutos que somente poderá participar da
"assembléia" prevista no art. 59 determinada categoria de associados nem tampouco fez, ainda,
parecer específico para as "associações e sociedades" regidas por leis próprias (art. 2.033 do novo
CC), como é o caso das entidades abertas de previdência complementar sem fins lucrativos.
4.4.4 "Participantes": contratantes de planos previdenciários ou "associados/sócios"?
(entidades fechadas fundacionais)
Quanto ao argumento de que "não podem poucos associados (os controladores) dispor da
poupança de todos, sem que os demais associados tenham direitos e poderes iguais, reiteramos
que sob o ponto de vista jurídico é plenamente aceitável pelas razões já expendidas (tanto as
históricas pela evolução da sociedade de seguro mútuo como as insertas no novo Código Civil
(LGL\2002\400) e na própria Lei de Sociedades Anônimas) e sob ponto de vista social ser frágil o
argumento, pois nas sociedades anônimas que operam com planos previdenciários (e dispõem
sobre a poupança de milhares de pessoas) a eleição da diretoria se faz por assembléia dos
"acionistas" e não dos "clientes de planos previdenciários" (participantes), além do que nem todos
os acionistas têm direito a voto.
Embora o par. ún. do art. 1.º, artigos 30 e 85 da Lei 6.435/1977 mencionem expressamente que
os participantes das entidades abertas sem fins lucrativos seriam associados, o que deveria
ocorrer também com as entidades fechadas - que também são sem fins lucrativos, a evolução
legislativa permitiu que as entidades fechadas fossem também constituídas sob a forma de
fundação (art. 5.º), o que, por óbvio, implica a inexistência de "sócio" ou "associado" e força a
conclusão de que o "participante" é "participante de plano previdenciário" e não "participante da
entidade". Com isso, mitigou-se o alcance do art. 1.466 do CC/1916 (LGL\1916\1).
Necessário, para bem se pôr o problema, que se adote uma das teses integralmente, ou seja, ou
subsiste o § 1.º do art. 77 da LC 109/2001 com a Lei 6.435/1977 e o Dec. 81.402/1978, com a
figura do "participante que é sócio ou associado" (artigo 30 da Lei 6.435/1977 e artigo 14 do Dec.
81.402 de 1978), caso em que o Código Civil (LGL\2002\400) somente pode ser considerado norma
suplementar e aplicável apenas no que couber; ou se sustenta que está revogado ( sic) o § 1.º
do art. 77 da LC 109/2001, e a Lei 6.435/1977 e o Dec. 81.402/1978, caso em que se aplica in
totum o Código Civil (LGL\2002\400), mas sem a figura do "participante que é associado", pois
esta só existe no decreto e lei que se têm por revogados. O que não pode, e reside aí a grave
contradição, é pretender que todas as "entidades de previdência privada sem fins lucrativos"
adaptem os seus estatutos ao que, em tese desprovida de fundamentação, se entenda seja o
determinado pelo Código Civil (LGL\2002\400), id est, pretender que simples "participantes de
planos previdenciários" sejam chamados a participar de assembléia para eleição de diretoria da
associação, pois o novo Código Civil (LGL\2002\400) não prevê no seu capítulo referente às
associações que todos os que com ela contratarem serão "associados" e muito menos com direito
a voto.
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Nem tampouco menciona o novo Código Civil (LGL\2002\400) a existência da figura do associado
ou sócio "participante de plano previdenciário", daí afirmarmos que não há embasamento legal para
a tese de que as entidades de previdência privada são associações regidas pelas regras gerais do
Código Civil (LGL\2002\400), ou sociedades simples sem fins lucrativos como veremos.
Há ainda o grave problema que seria criado para os "participantes" que hoje, amparados pela LC
109/2001 e Dec. 81.402/1978, não respondem pelos insucessos da atividade econômica (não
"finalidade" e sim "atividade") e que doravante, a vingar a tese e necessidade de adaptação in
totum aos dispositivos do novo Código Civil (LGL\2002\400) que dizem com as "associações" e
principalmente pelo princípio da isonomia, teriam de responder como todos os demais associados -
caso fossem considerados como tais.
De par com os argumentos acima, somem-se os que dizem com a possibilidade de existência de
associados com vantagens políticas especiais (direito a voto) e outros sem essa vantagem,
conforme permitido pelo art. 55, comporem a assembléia mencionada no art. 59 do CC/2002
(LGL\2002\400), pois, tendo a lei brasileira (igualmente à norte-americana, alemã, suíça e italiana,
entre outras) permitido a supressão do direito de voto, não se tem este por "direito essencial dos
associados".
4.4.5 Possibilidade apenas se enquadradas como associações sui generis, regidas por lei
especial
Por tudo o exposto nos itens 4 a 4.3 do presente parecer, as entidades abertas de previdência
complementar sem fins lucrativos poderiam ser enquadradas como "associações especiais"
(associações sui generis) regidas por lei própria (LC 109/2001, § 1.º do art. 77; mais os artigos
5.º, 11 a 13 e 30 da Lei 6.435 de 1977 e artigos 14 a 21 c/c o 38 a 40 do Dec. 81.402/1978,
integrados que foram ao § 1.º do art. 77 da LC 109/2001; e Resolução CNSP 53/01) que não
devem se sujeitar às regras gerais pertinentes às associações previstas no Código Civil
(LGL\2002\400) de 2002, nem tampouco modificar seus estatutos na forma prevista no art. 2.031,
pela ressalva feita pelo art. 2.033 c/c o art. 777 e art. 1.123, todos do mesmo Diploma Legal.
O Código Civil (LGL\2002\400) de 2002 é lei ordinária e geral e não revoga lei complementar
específica, no que diz com as entidades abertas de previdência complementar sem fins lucrativos,
que continuam a ser "tipos especiais de seguro" (seguro mútuo do antigo art. 1.466 do CC/1916
(LGL\1916\1)) regidos por lei própria como ressalva o art. 777 do CC/2002 (LGL\2002\400) e
também entidades que têm que ter autorização para funcionar (art. 1.123 do CC), o que reforça a
remissão à legislação especial.
Podem, no entanto, dependendo do que a doutrina e o STJ utilizarem na interpretação científica
dos arts. 53 e 981 do CC/2002 (LGL\2002\400), ser tidas por "sociedades simples, especiais, sem
fins lucrativos", conforme já afirmado acima, no item 4.3, in fine, e será melhor expendido abaixo.
4.5 Críticas ao enquadramento como sociedade simples
A atipicidade societária, baseada na autonomia contratual e na necessidade de garantia da livre
atividade negocial (art. 170 da CF (LGL\1988\3)), é permitida no direito brasileiro, com algumas
restrições pertinentes às especificidades do direito societário, como sustentam Nelson Nery Junior
e Rosa Maria de Andrade Nery ( Novo Código Civil (LGL\2002\400) e legislação extravagante
anotados. São Paulo: Ed. RT, 2002. p. 348) em lição de Aurelio Morello (Le società atipiche,
1983), Paolo Spada (La Tipicità della società, 1974), e Rachel Sztajn (Atipicidade de sociedades
no direito brasileiro, Tese, USP, 1987), com o que não é de estranhar que se tomem as entidades
abertas de previdência complementar sem fins lucrativos, ainda hoje, como sociedades especiais,
mormente quando o próprio Código de 2002 não é rígido na regra baseada na "atividade" que usa
para distinguir as "sociedades simples da empresária" no caput do art. 982, pois o parágrafo único
deste artigo já dá exceção à regra determinando que "independentemente de seu objeto"
considera-se empresária a sociedade por ações e simples a cooperativa".
Como já afirmado (cf. item 4.3, supra), os doutrinadores atuais, à exceção de um ou outro, não
aprofundaram a distinção entre "associação" e "sociedade", preferindo apenas dizer que aquelas
não têm fins lucrativos e estas sim, o que não basta.
Pela tese apresentada por alguns autores, tais como Sílvio de Salvo Venosa ( Direito civil -
Contratos em espécie. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 327 e 330), que enfaticamente defendem
que as antigas "sociedades comerciais" são as atuais sociedades empresárias no novo Código Civil
(LGL\2002\400) de 2002, e que as "antigas sociedades civis" são as atuais "sociedades simples",
há quem pense estar resolvido o problema conceitual das entidades abertas de previdência
privada sem fins lucrativos ao incluí-las entre as sociedades simples. Destoamos desse
entendimento simplista e nos valemos do pensamento da maioria dos doutrinadores que defendem
a tese acima, pois entendem também que somente se aplica às antigas "sociedades civis com fins
lucrativos", pois as sem fins lucrativos seriam, hoje, associações. Nenhum deles afirmou a
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existência de "sociedade simples sem fins lucrativos"


Após havermos nos pronunciado no parecer de setembro de 2004, que ora curamos de atualizar,
foram emitidos pareceres de alguns juristas, entre os quais o Parecer Jurídico GAB/SPC 0000/03,
do Dr. Maurício Corrêa Sette Tôrres, Assessor Especial do Gabinete, o qual tivemos acesso pela
Internet, que, ao sustentar não ser aplicável às entidades fechadas o novo Código Civil
(LGL\2002\400) de 2002, por serem, segundo seu entendimento "sociedades civis especiais"
regidas por lei complementar, sobre esclarecer que teriam correspondência nas sociedades simples
do referido Código, deu ensejo à publicação da Portaria da Secretaria de Previdência
Complementar 02/2004.
Para justificar seu entendimento, expôs pensamento, entre outros, de Sérgio Campinho, quando
este jurista afirma que as "sociedades civis com fins lucrativos" teriam sido substituídas pelas
atuais sociedades simples. Nada obstante o respeito pela tese, ressaltamos, conforme por nós já
grifado, que Sérgio Campinho fala das antigas sociedades civis com fins lucrativos e não das sem
fins e que para ele as antigas sociedades civis sem fins seriam atualmente associações e sequer
esta correlação existe na prática em todos os casos.
Em que pese a ressalva feita, merece atenção especial a conceituação das cooperativas, que em
trabalho bem desenvolvido por Luiz Antonio Soares Hentz ( Direito de empresa no Código Civil
(LGL\2002\400) de 2002. 2. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003. p 141 et seq.) apresenta
discussão sobre se seriam "sociedade" ou uma "forma singular de empresa" e onde se sustenta
inclusive seriam melhor enquadradas como "associação de fins econômicos", com base na Lei
5.764/1971 que diz que as cooperativas têm forma e natureza jurídicas próprias e na ressalva
feita à lei especial (art. 1.093 do CC/2002 (LGL\2002\400)). Tal pensamento deixa claro que o
autor acrescenta ao art. 53 do CC elementos doutrinários, tais como o esposado por Pontes de
Miranda ao definir "associação" conferindo a esta elemento "corporativo" (cf. subitem 4.3), o que
é importante ao menos como incentivo ao aprofundamento do tema.
Diz Sílvio de Salvo Venosa (Op. et loc. cit.) quanto à subsistência das sociedades comerciais e
civis sob a forma atual de sociedades empresárias e simples respectivamente:
"Embora a linha divisória do direito civil e do direito comercial mostre-se cada vez mais tênue,
mormente com o novo Código Civil (LGL\2002\400), nosso sistema acolhe a distinção de
sociedades mercantis e sociedades civis, conforme a finalidade a que se propõem. Nas sociedades
comerciais, necessariamente, haverá um patrimônio e finalidade lucrativa. Em nosso ordenamento,
apenas as sociedades comerciais sujeitam-se à concordata e à falência. As sociedades civis
subordinam-se aos princípios de insolvência do Código de Processo Civil (LGL\1973\5).
(...)
Quanto às sociedades ditas empresárias, nova denominação das sociedades mercantis, na
sociedade em nome coletivo, todos os sócios respondem solidária e ilimitadamente pelas
obrigações sociais (arts. 315 e 316 do Código Comercial; CC/2002 (LGL\2002\400), arts. 1.039 a
1.044).
(...)
(p. 330) Quanto às sociedades civis, denominadas 'sociedades simples' no novo Código Civil
(LGL\2002\400) (arts. 997 et seq.), sem perfeita similitude, que ora nos interessam, podem
revestir-se das modalidades mercantis, segundo o art. 1.364 do antigo Código, com exceção da
sociedade anônima, como vimos, pois esta, qualquer que seja seu objeto, terá sempre natureza
mercantil".
Ricardo Fiúza ( Novo Código Civil (LGL\2002\400) comentado, diversos colaboradores, comentado
dos arts. 966 a 1.195 pelo próprio organizador Ricardo Fiúza, São Paulo: Saraiva, 2003, p. 888-
889) sustenta que a norma do art. 982 vem instituir uma nova divisão entre as formas societárias
até então definidas pelo direito privado brasileiro e conclui:
"Se adotarmos um paralelismo simétrico, a antiga sociedade comercial passou a ser denominada
sociedade empresária, enquanto a sociedade civil, regulada pelo Código de 1916, passou a ser
definida como sociedade simples".
Necessário notar que do texto não se pode concluir que o autor estivesse se referindo às antigas
"sociedades civis sem fins lucrativos", e sim às "sociedades civis com fins lucrativos" e que, de
qualquer forma, não é correta a afirmação feita, pois não há no novo Código Civil (LGL\2002\400)
nenhuma regra que assim disponha e o referido enquadramento (das antigas sociedades civis
como sociedades simples) pode, ou não, ocorrer.
Por outro lado, também importa ressaltar, em apoio dos que sustentam a tese de que as
sociedades simples podem em alguns casos estar a substituir as sociedades civis do Código Civil
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de 1916 (LGL\1916\1) (no caso as entidades abertas de previdência complementar sem fins
lucrativos seriam sociedades simples sui generis), que o art. 1.150 do CC/2002 (LGL\2002\400)
dispõe que as sociedades simples vinculam-se ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas e as
empresárias ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais, o que dá
ensejo a elucubrações, pois, se fosse de interesse da lei acabar totalmente com as antigas
distinções (civis e comerciais) em ordem a permanecerem apenas as novas (sociedades simples e
empresárias), deveria ao menos ter mudado o nome dos registros públicos (para registro de
sociedades empresárias e registro de sociedades simples, respectivamente), como o fez quanto a
regulação do "nome empresarial" nos arts. 1.155 a 1.168.
Válido acrescer, também, que o art. 970 prevê que as "microempresas" serão reguladas por leis
especiais, com o que os tipos societários apresentados não são exaustivos e comportam
"sociedades atípicas", como as previstas pela LC 109/2001 e demais normas que lhe integram o §
1.º do art. 77.
Sérgio Campinho ( O direito de empresa. 4. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 33-38) enfatiza
a distinção entre "associação e sociedade no novo Código Civil (LGL\2002\400)" tendo o "fim não-
lucrativo" daquela como elemento diferenciador - o que refutamos no item 4.3 por insuficiente a
tanto ("reunião de amigos organizada com objetivo de tomarem chá à tarde" não tem fim
lucrativos e não é contrato de "associação") e, em f., manifesta-se de maneira a contribuir - em
parte - para a tese dos que defendem que as entidades abertas de previdência complementar sem
fins lucrativos seriam "sociedades sui generis" e não "associações sui generis", com dizer:
"A sociedade simples, segundo o perfil legislativo que lhe foi destinado, empreende atividades
econômicas específicas. O ordenamento jurídico positivo é que lhe reserva o objeto.
Algumas das antigas sociedades civis com fins econômicos se enquadram como sociedades
simples, por força, repita-se, de reserva expressa do ordenamento jurídico positivo.
Afirmamos que só em parte pode-se usar o que afirmado por Sérgio Campinho, pois na menção
feita está consignado "antigas sociedades civis com fins econômicos" e as entidades a que nos
referimos não têm fins econômicos.
No mesmo sentido, podendo-se usar somente com reservas o raciocínio, Marino Pazzaglini Filho e
Andrea Di Fuccio Catanese ( Direito de empresa no Novo Código Civil (LGL\2002\400). São Paulo:
Atlas, 2003. p. 12 e 22).
"(p. 12, in fine) (...) Cumpre, neste prelúdio, salientar que o NCC desconsiderou a classificação
tradicional de sociedades civis e mercantis, conceituando e regulamentando as sociedades em
duas categorias amplas: sociedades simples, que englobam as ex-sociedades civis, e sociedades
empresárias, que compreendem as remanescentes sociedades mercantis ou comerciais (...).
(p. 22, in fine) As sociedades, que serão objeto aprofundado de nosso estudo, ao contrário das
outras pessoas de direito privado examinadas, dedicam-se a atividades de cunho lucrativo e,
diante da natureza dessas atividades, desdobram-se em duas categorias fundamentais:
'Sociedades simples - Desempenham atividades civis (ex-sociedades civis). Sociedades
empresárias - Desempenham, em geral, atividades de caráter empresarial (ex-sociedades
comerciais)".
José Edwaldo Tavares Borba ( Direito societário. 8. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 7), após
fazer distinção entre associação e sociedade, faz a seguinte afirmação gratuita, que depois
tecnicamente se apressa a desfazer:
"A sociedade bifurca-se, quanto à natureza da atividade desenvolvida, em duas subespécies,
quais sejam a sociedade simples e a sociedade empresária, as quais, por força do novo Código
Civil (LGL\2002\400), substituem a antiga nomenclatura, que compreendia a sociedade civil e a
sociedade comercial".
O posicionamento de quem sustenta, apenas para resolver questão secundária, que as entidades
abertas de previdência privada sem fins lucrativos sejam "sociedades simples sui generis", apesar
das razões em que se fundamentam, não é por nós de todo compartido justamente pela "ausência
de finalidade lucrativa", o que é elemento de qualquer "sociedade" pela nova conceituação do
Código Civil (LGL\2002\400) de 2002. Curvamo-nos, porém, à interpretação que tenha por
associação apenas as pessoas jurídicas que atendam ao art. 53 et seq. e que não tenham por
"atividade principal" uma "atividade essencialmente econômica", caso em que, por exclusão, teriam
as entidades de previdência privada sem fins lucrativos de ser classificadas como "sociedades
simples, especiais, sem fins lucrativos" - em que os participantes seriam meros contratantes. Isso,
porém, é questão, como afirmado, secundária, pois o que importa é a total desnecessidade de
atendimento ao art. 2.031 do CC/2002 (LGL\2002\400).

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Concluímos este subitem com a lembrança de que, mesmo que se adote a tese de que
associações não podem ter "atividade econômica" como objeto principal (pela ausência de
"atividade econômica" no art. 53 do CC/2002 (LGL\2002\400)), caso em que teríamos de ter
"sociedades simples sem fins lucrativos", esta construção é completamente subjetiva, pois o novo
Código Civil (LGL\2002\400), ao contrário do anterior, prevê no art. 981 que as sociedades terão
de ter por finalidade a divisão de resultados entre os sócios (finalidade lucrativa), o que teria de
ser desatendido. O enquadramento, pois, não será perfeito, embora atenda aos métodos de
interpretação científica.
4.5.1 Possibilidade apenas se enquadradas como "sociedades simples, especiais, sem fins
lucrativos", regidas por lei especial
Como afirmamos no item 4.3, no novo Código Civil (LGL\2002\400), nada obstante os
doutrinadores tenham se manifestado - em sua maioria - pela distinção baseada em apenas em
fins econômicos ou não-econômicos ao definirem as "associações", haverá dúvidas quanto à
classificação das entidades de previdência privada, pelos elementos que possuem e que as
caracterizam em parte como associações ("ausência de finalidade lucrativa") e em parte como
sociedades ("atividade econômica").
Não basta, repetimos, a leitura do art. 53 do CC/2002 (LGL\2002\400), como pensa Sérgio
Campinho, para definir o que seja "associação", pois a união de pessoas, v.g., que se organizem
para tomar chá à tarde (fim não econômico) terá preenchido o caput do referido artigo sem
caracterizar o contrato de "associação".
Os elementos que constituem a "associação", tais como a "ausência de reciprocidade" (par. ún. do
art. 53) e o fato de o caput do art. 53 não mencionar "atividade econômica", certamente serão de
grande importância quando tiverem os contornos definidos pelo STJ, para que se ponha fim às
divergências doutrinárias. Pode ser que, ante o que dispõem os art. 53 e 981, haja evolução
doutrinária e jurisprudencial no sentido de que sejam tidas por "associações" apenas as que além
da ausência de finalidade lucrativa também não tenham como objeto principal "atividade
econômica". Neste caso, seguro e previdência, por serem essencialmente "atividade econômica",
não poderiam ser objeto de "associação", e sim de "sociedade" que, no caso, seria "sociedade
simples, especial, sem fins lucrativos".
Doutrinamos, no parecer ora revisto, que as "entidades abertas de previdência privada sem fins
lucrativos" são "associações especiais" e assim o fizemos tomados apenas pela "ausência de
finalidade lucrativa" das referidas entidades e para aproximar da terminologia do Código Civil
(LGL\2002\400) de 2002; porém, o raciocínio suso transcrito, pela lógica, também nos agrada e
entendemos possam ser tidas por "sociedades especiais sem fins lucrativ os" sem agressão ao
texto legal. Isso, porém, desde que adotada a tese de que somente pode ser tida por associação
a pessoa jurídica que não tenha como atividade principal "atividade econômica". Neste caso,
somente as pessoas jurídicas que, além da ausência de finalidade lucrativa, também não
possuíssem como atividade principal "atividade econômica" é que poderiam reputadas como
"associação".
Pelo exposto, somente poderiam ser consideradas "associações as pessoas jurídicas sem fins
lucrativos, "pias, morais, artísticas e beneficentes", que também não tenham por objeto a
prestação de atividade considerada como essencialmente econômica.
Logo, até o objeto "artístico" e a ausência de lucro não podem caracterizar determinada pessoa
jurídica como "associação", seria mister, outrossim, que não fosse feita referida "associação"
exclusivamente para apresentação remunerada de seus associados, nada obstante possa praticar
atividade econômica para se manter.
5. Portaria SPC 2, de 08.01.2004, da Secretaria de Previdência Complementar quanto às
entidades fechadas
Após havermos nos pronunciado no parecer de setembro de 2003, que ora curamos de atualizar,
foram emitidos pareceres de alguns juristas, entre os quais o Parecer Jurídico GAB/SPC 0000/03,
do Dr. Maurício Corrêa Sette Tôrres, Assessor Especial do Gabinete, o qual tivemos acesso pela
Internet, e já mencionado no item 4.5, e que, ao sustentar não ser aplicável às entidades
fechadas o novo Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, por serem, segundo seu entendimento
"sociedades civis especiais" regidas por lei complementar, sobre esclarecer que teriam
correspondência nas sociedades simples do referido Código, deu ensejo à publicação da Portaria
da Secretaria de Previdência Complementar 02/2004. Diz o jurista em trechos de seu parecer,
verbis:
"(...) IV - as EFPC desempenham atividade econômica, compreendida pela organização destinada
à produção ou a circulação de bens ou serviços, utilizando-se dos resultados da exploração desta
atividade para o financiamento de seus planos de benefícios, servindo para assegurar a formação
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das reservas destinadas à cobertura dos compromissos atuariais contratados com os


participantes;
V - não se admite a constituição de EFPC sob a forma de associação, diante das características
que cercam esta modalidade de pessoa jurídica de direito privado, seja diante dos preceitos
constitucionais que impedem a interferência do Estado na sua constituição e funcionamento, e
rezam sobre a forma de sua dissolução, ou aqueles outros trazidos pelo novo Código Civil
(LGL\2002\400), todos em total contraposição à disciplina estabelecida pelas Leis Complementares
108 e 109, de 2001; seja pelo fato de que desenvolvem os fundos de pensão atividade
econômica;
VI - considerando as especificidades que guardam as atividades desempenhadas pelas entidades
fechadas de previdência complementar, e considerando a especialidade da legislação que reza
sobre sua constituição e funcionamento, a aplicação do novo Código Civil (LGL\2002\400), em
especial das regras que disciplinam as sociedades, não lhes pode incidir, sob pena de afrontar as
normas especiais (Leis Complementares 108 e 109) ou os próprios fundamentos deste específico
sistema jurídico;
VII - o novo Código Civil (LGL\2002\400) não altera a forma pela qual são constituídas as
entidades fechadas de previdência complementar, que, regidas por legislação própria, poderão
continuar sendo instituídas como fundações e sociedades de previdência complementar (ou
privada); e
VIII - a reserva constitucional à disciplina do regime de previdência privada por meio de lei
complementar (e eventual hierarquia deste tipo normativo em relação ao Código Civil
(LGL\2002\400)), a especialidade da legislação que lhes é aplicável e a proteção constitucional ao
ato jurídico perfeito impedem a imposição de alteração quanto à constituição e funcionamento
das entidades fechadas de previdência complementar instituídas regularmente sob a vigência das
normas anteriores ou do novo Código Civil (LGL\2002\400)" (g.n.).
Com esses fundamentos, e no exercício da competência que lhe foi outorgada pela LC 109/2001, a
Secretaria de Previdência Complementar baixou a Portaria 2, de 08.01.2004, que "dispõe sobre os
Estatutos das Entidades Fechadas de Previdência Complementar em face do artigo 2.031 da Lei
10.406, de 10.01.2002, Novo Código Civil (LGL\2002\400)", e que afirma enfaticamente em seu
art. 1.º:
"As entidades fechadas de previdência complementar, regidas por lei complementar, não estão
obrigadas a promover em seus estatutos as adaptações a que se refere o art. 2.031 da Lei
10.406, de 10.01.2002 (novo Código Civil (LGL\2002\400))" (grifado).
Como já se disse cima, a LC 109 encerra disposições comuns aos dois tipos de entidades sem fins
lucrativos (abertas e fechadas), o que afirmado na Portaria SPC 2/01, que entre os seus
fundamentos destacou:
"Considerando que a LC 109, de 29.05.2001, 'dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar
e dá outras providências', de modo que a disciplina exigida pela norma constitucional já existe.
Considerando o disposto no artigo 74 da LC 109, de 2001, segundo o qual as funções de órgão
fiscalizador das entidades fechadas de previdência complementar são desempenhadas pela
Secretaria de Previdência Complementar do Ministério da Previdência Social".
Outrossim, outros argumentos são arrolados no mesmo documento e encontram correspondência
em outros dispositivos da LC 109/2001, pertinentes às entidades abertas sem fins lucrativos,
entre os quais se destacam:
"Considerando que o artigo 31, § 1.º, da LC 109, de 2001, estabelece que as entidades fechadas
de previdência complementar "organizar-se-ão sob a forma de fundação ou sociedade civil, sem
fins lucrativos (correspondente aos art. 36 e art. 77)" (g.n.).
"Considerando que o artigo 33, I, da LC 109, de 2001, estabelece que dependerão de prévia e
expressa autorização do órgão regulador e fiscalizador 'a constituição e o funcionamento da
entidade fechada, bem como a aplicação dos respectivos estatutos (...) e suas alterações',
atribuindo à Secretaria de Previdência Complementar a competência para aprovar alterações nos
estatutos das entidades fechadas de previdência complementar (correspondente ao art. 38, I)"
(g.n.).
6. Conclusão
Na legislação vigente até a publicação do Código Civil (LGL\2002\400) de 2002 não havia distinção
legal nem mesmo doutrinária, porquanto a doutrina se dividia, quanto a isso, entre "associação" e
"sociedade civil" (cf. subitem 3.1), apenas havendo esboço no sentido de utilizar o termo
"associação" para as "sociedades civis sem fins lucrativos" - tal como adotado pela Lei 6.435/1977
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(arts. 1.º e 85) e Dec. 81.402/1978 (vide art. 4.º, § 3.º, II, c/c o art. 14, b). Todavia, nem o
Código Civil (LGL\2002\400) nem o Código Comercial fizeram expressamente tal distinção, tendo
este último, inclusive, empregado o termo "associação" para definir "sociedade comercial" em
diversos artigos (cf.: arts. 290, 291, 305, V, 311, 319 e 325 do Código Comercial), o que fez com
que algumas entidades de previdência sem fins lucrativos adotassem o termo "associação" em
suas denominações ("Associação Previdenciária (...)") e outras o termo "sociedade".
As sociedades de seguro mútuo, previstas no art. 1.466 do CC/1916 (LGL\1916\1), também
chamadas de "mútuas", "sociedades de Montepio" ou simplesmente de "Montepios", a partir da Lei
6.435/1977 passaram a ser denominadas de "entidades abertas de previdência privada sem fins
lucrativos" sem que, com isso, houvesse-lhes sido alterada a natureza jurídica. Continuaram, pois,
a ser "seguradoras", organizadas sob a forma de "sociedades civis especiais" (ou "associações
especiais" de acordo com a tese que preferir o intérprete) mesmo depois da Lei 6.435/1977 e da
LC 109/2001 (cf. item 2 e subitens).
Arnoldo Wald ao definir o contrato de previdência privada sustenta ser esse um "seguro sui
generis", o que endossa todos os argumentos aqui esposados, no que é seguido por Manoel
Póvoas, entre outros, e por julgados de nossos tribunais entre os quais o da 1.ª Câm. Cív. do TJRJ
na ApCív 1335/2002.
Há, outrossim, a ratificar a tese de que o contrato de previdência privada é típico contrato de
seguro, precedente do STF no RE 115.308-3-RJ, que teve por relator o Min. Néri da Silveira, em
caso pertinente à Empresa de Medicina de Grupo que cobrava de seus clientes sob a forma de
pré-pagamento, em que se afirma que " a empresa que se obriga a indenizar o associado ou
cliente do prejuízo resultante de riscos futuros, previstos no contrato, preenche, integralmente, a
definição legal, doutrinária e jurisprudencial de contrato de seguro", o que é exatamente o caso
das entidades de previdência privada (abertas ou fechadas).
A LC 109/2001, que é lei complementar e não pode ser alterada por lei ordinária ante o disposto
no art. 59 c/c o inc. II do art. 192 (antes da EC 40/2003) e art. 202 da CF (LGL\1988\3), dispôs
que, "no caso das entidades abertas sem fins lucrativos já autorizadas a funcionar, é permitida a
manutenção de sua organização jurídica como sociedade civil" (§ 1.º do art. 77).
A organização e constituição das entidades abertas de previdência privada sem fins lucrativos
como "sociedades civis especiais" eram dadas pelos arts. 5.º, 11 a 13 e especialmente 30 da Lei
6.435/1977 e pelos arts. 4.º, 14 a 21 e especialmente 38 do Dec. 81.402/1978, devendo referidos
artigos ter sido necessariamente integrados ao § 1.º do art. 77 da LC 109/2001 que fez remissão
à legislação anterior vigente, quando permitiu que as entidades abertas sem fins lucrativos
mantivessem a organização como sociedades civis.
A LC 109/2001 permite que se extraia de seu próprio texto regra autêntica de interpretação que
valida a tese de "derrogação" e não "ab-rogação" da Lei 6.435/1977, pois em seu art. 36 diz que
as entidades abertas podem ser constituídas unicamente sob a forma de sociedades anônimas e o
advérbio "unicamente" aí, a princípio, equivaleria à negativa total de incidência de qualquer outra
norma que permitisse meio de organização diverso, o que, no entanto, foi ressalvado pelo § 1.º do
art. 77 da própria LC 109/2001. Ora, a mesma possibilidade de ressalva feita pelo § 1.º do art. 77
da LC 109/2001 à redação enfática do art. 36 pode e deve ser estendida à do art. 79.
A revogação da Lei 6.435/1977 pelo art. 79 da nova LC 109/2001 deve ser lida, pois, como
"derrogação", tese essa que encontra apoio nas lições de Eduardo Espínola e Saredo, entre outros
(cf. subitem 2.4.3).
A doutrina, entre os quais podem-se citar Helly Lopes Meirelles, Paulo Lacerda e Sérgio Ferraz,
sustenta que o decreto regulamentador de lei que foi revogada por lei posterior continua a viger e
com eficácia se compatível com esta (cf. subitem 2.4.4).
O Dec. 81.402/1978, que é decreto regulamentador da Lei 6.435/1977, continua em vigor no que
for compatível com a nova LC 109/2001, principalmente os seus arts. 14 a 21 e 38, por expressa
permissão dada pelo art. 77, § 1.º, da LC 109/2001. O que implica considerarem-se as entidades
abertas de previdência privada sem fins lucrativos "associações ou sociedades sui generis",
regidas pelos artigos 4.º, 14 a 21 e 38 do Dec. 81.402/1978 e 1.123 do CC/2002 (LGL\2002\400)
(este por ser aplicável a estas entidades abertas de previdência complementar, subsidiariamente,
a legislação de seguros - cf.: art. 73 da LC 109/2001; independentemente de se considerarem as
entidades sem fins como "sociedades" pela nova terminologia adotada pelo Código de 2002 em seu
art. 981).
A integração ao texto da LC 109/2001 faz com que os artigos da Lei 6.435/1977 e Dec. 81.402/
1978 que tratam da organização das entidades abertas de previdência complementar sem fins
lucrativos como "sociedades civis" ("especiais") tenham de ser lidos como se fizessem um único

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corpo com a lei complementar, adquirindo eficácia de lei complementar e somente podendo ser
revogados por lei de igual hierarquia que revogue expressamente a LC 109/2001. Nesse sentido,
Pontes de Miranda esclarece que o decreto que teve os assuntos que regulamentou dispostos em
lei não pode sequer ser revogado pelo Poder Executivo (cf. subitem 2.4.5).
Por este motivo, está correta e perfeitamente legal a Resolução CNSP 53/2001 que permitiu que
as entidades abertas de previdência complementar sem fins lucrativos continuassem organizadas
na forma da Lei 6.435/1977, resolução essa que não poderá ser modificada quanto a isso, sob
pena de ilegalidade e nulidade.
A Lei de Sociedades Anônimas é inaplicável às entidades abertas de previdência complementar
sem fins lucrativos, pois o seu art. 2.º determina que as sociedades anônimas têm de ter fins
lucrativos.
A tentativa de juntar fatos dessemelhantes e que possuem hipóteses de incidência diferentes para
justificar pensamento isolado não pode ser reputada como regra de interpretação científica, assim
é que a mencionada modificação da lei de sociedades anônimas que, aparentemente, alterou
também a organização das entidades abertas com fins lucrativos não pode ser usada em apoio à
tese de possibilidade de modificação da estrutura das entidades abertas sem fins lucrativos pelo
novo Código Civil (LGL\2002\400), pois estas possuem, ao contrário daquelas, dispositivos próprios
baixados em lei complementar específica que determina que se mantenham como estão. Da
mesma forma, ninguém ainda teve a ousadia de sustentar que as entidades fechadas, que são
sem fins lucrativos, devem desconsiderar o que disposto no § 6.º do art. 202 da CF (LGL\1988\3),
que dá regras especiais quanto à eleição de diretoria - remetendo para lei complementar e
obedecer apenas ao Código Civil (LGL\2002\400) quanto à eleição de diretoria.
A própria LC 109/2001 é que permite às entidades com fins lucrativos que sofram as "alterações"
posteriores referentes às modificações na Lei de Sociedades Anônimas, quando determina que se
organizem como tais; às entidades abertas sem fins lucrativos, no entanto, é autorizado pela LC
109/2001 que se mantenham organizadas como estão, id est, na forma da Lei 6.435/1977 e Dec.
81.402/1978, razão por que não podem sofrer qualquer modificação dada por lei geral posterior
que não lhes diga respeito direto.
Não se podem, pois, ter por como aplicáveis as mesmas regras a substratos fáticos
dessemelhantes e que possuem hipótese de incidência diversa.
No caso das entidades sem fins lucrativos, em especial quanto ao ponto polêmico, que é a
existência de "associados controladores" e "simples participantes de planos previdenciários", ficou
clara a existência de "lei complementar específica sobre o assunto", pela integração feita aos
artigos da Lei 6.435/1977 (art. 30) e Dec. 81.402/1978 (art. 38) pelo § 1.º do art. 77 da LC 109/
2001.
Por certo, quanto a isso, se entre as alterações feitas na Lei das Sociedades Anônimas viesse
uma em especial que dispusesse que "sociedades constituídas sob a forma daquela lei (S.A.) não
poderiam ser fiscalizadas senão pelo Ministério Público", o Órgão Fiscalizador que é a Susep não
abriria mão de suas prerrogativas, direitos e atribuições dados pelo art. 74 da LC 109/2001, e, de
pronto, argüiria, como o fazem as entidades abertas sem fins lucrativos, que lei geral ordinária não
pode revogar lei complementar e específica em assunto próprio à lei complementar.
O plano previdenciário é tipo especial de seguro, o que se confirma pela decisão do STF no RE
115.308-3/RJ (no item 2 do presente), razão pela qual incide o disposto no art. 777 do CC/2002
(LGL\2002\400), o qual prevê que o disposto naquele capítulo (pertinente a seguro) somente é
aplicável no que couber ao seguro regido por lei própria (cf. subitem 4.2 acima).
A Lei de Introdução ao Código Civil (LGL\2002\400) dispõe em seu art. 2.º que a lei posterior geral
não revoga a lei anterior especial e mesmo lei especial posterior convive com a lei especial anterior
naquilo que compatível (§ 2.º), razão por que se tem de ter por vigente o disposto no § 1.º do
art. 77 da LC 109/2001, regulado pelo Dec. 81.402/1978.
As características específicas das entidades de previdência privada sem fins lucrativos
demonstram que a legislação acompanhou a evolução social, ao impedir a obrigatoriedade de se
realizar, v.g., "assembléia onde participariam um milhão de associados" (nos casos das entidades
que chegaram a este número de participantes). A legislação de previdência privada (LC 109/2001,
Lei 6.435/1977 e Dec. 81.402/1978) é, pois, a "legislação própria ou especial" a que se referem os
arts. 777, 1.123 e 2033 do CC/2002 (LGL\2002\400), no capítulo pertinente ao "contrato de
seguro", "sociedades autorizadas a funcionar" e "disposições finais" respectivamente.
Em que pese a já afirmada inexistência de diferença legal entre "sociedade" e "associação" até o
novo Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, havia, no entanto, distinção entre "fim ou intuito
econômico" que equivalia a "fim ou intuito lucrativo" e "atividade econômica", de maneira que as
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sociedades sem fins econômicos (ou associações sem fins econômicos) podiam ter atividade
econômica. J. M. Carvalho Santos lembra o exemplo da associação sem fins econômicos composta
de músicos cuja "orquestra" se apresenta e cobra ingressos (atividade econômica) para mantê-la.
No novo Código Civil (LGL\2002\400), nada obstante os doutrinadores tenham se manifestado -
em sua maioria - pela distinção baseada apenas em "fins econômicos" ou "não-econômicos" ao
definirem as "associações", haverá dúvidas quanto à classificação das entidades de previdência
privada, pelos elementos que possuem e que as caracterizam em parte como associações
("ausência de finalidade lucrativa") e em parte como sociedades ("atividade econômica").
Não basta a leitura do art. 53 do CC/2002 (LGL\2002\400), como pensa Sérgio Campinho (cf.
subitens 4.3 et seq., supra), para definir o que seja "associação", pois, e.g., "a reunião de amigos
que se organizem para tomar chá à tarde" (fim não econômico) terá preenchido o caput do
referido artigo sem caracterizar o contrato de "associação".
Os elementos que constituem a "associação", tais como a "ausência de reciprocidade" (par. ún. do
art. 53) e o fato de o caput do art. 53 não mencionar "atividade econômica", certamente serão de
grande importância quando tiverem os contornos definidos pelo STJ, para que se ponha fim às
divergências doutrinárias.
Pode ser que, ante o que dispõem os arts. 53 e 981, sejam consideradas "associações" apenas as
que além da ausência de finalidade lucrativa também não tenham como objeto principal "atividade
econômica". Neste caso, seguro e previdência, por serem essencialmente "atividade econômica",
não poderiam ser objeto principal de "associação" e sim de "sociedade" que, no caso em estudo,
de entidade aberta sem fins lucrativos seria "sociedade simples, especial, sem fins lucrativos".
Defendemos, no parecer de 15.09.2003 - que ora curamos de atualizar, que as "entidades abertas
de previdência privada sem fins lucrativos" são "associações especiais" (cf. subitem 4.4.5, supra)
e assim o fizemos tomados apenas pela "ausência de finalidade lucrativa" das referidas entidades e
para aproximar da terminologia do Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, porém o raciocínio suso
transcrito, pela lógica, também nos agrada e entendemos possam ser tidas as entidades abertas
de previdência privada sem fins lucrativos como "sociedades simples, especiais, sem fins
lucrativos" sem agressão ao texto legal, pelo contrário, por interpretação científica, todavia não
achamos ser correto o raciocínio de que as "antigas sociedades civis" são as atuais "sociedades
simples" (cf. subitens 4.3 et seq., supra).
Correto, neste ponto, Fábio Ulhoa Coelho, ao enfatizar a necessidade da doutrina na distinção
entre "associação" e "sociedade", talvez apenas com excesso por sustentar inexistência de
distinção legal.
Outros doutrinadores insistem na sustentação de que as "sociedades civis do antigo Código Civil
de 1916 (LGL\1916\1)" foram substituídas pelas "sociedades simples" do novo Código Civil
(LGL\2002\400) de 2002, ou pelo menos fazem essa afirmação gratuitamente, entre os quais
Ricardo Fiúza, Sérgio Campinho, Marino Pazzaglini Filho e Andrea Di Fuccio Catanese (cf. subitem
4.3, supra). Tal fato ensejou a construção da tese de que as entidades de previdência privada
sem fins lucrativos seriam "sociedades simples especiais" pelas regras que lhe são próprias quanto
aos direitos e obrigações dos "sócios controladores e dos sócios que forem simples participantes",
tanto quanto as "sociedades de advogados", v.g., são consideradas doutrinariamente "sociedades
simples" e, no entanto possuem a singularidade (são especiais nesse aspecto) de serem
registradas apenas na Ordem dos Advogados do Brasil, consoante art. 15 da Lei 8.906/1994, não
incidindo, pois, o art. 998 do CC/2002 (LGL\2002\400) que é genérico ante o dispositivo específico
do Estatuto da OAB (LGL\1994\58).
A atipicidade societária, baseada na autonomia contratual e na necessidade de garantia da livre
atividade negocial (art. 170 da CF (LGL\1988\3)), é permitida no direito brasileiro, com algumas
restrições pertinentes às especificidades do direito societário, como sustentam Nelson Nery Junior
e Rosa Maria de Andrade Nery, baseados em lição de Aurelio Morello, Paolo Spada e Rachel Sztajn,
o que aumenta ainda mais a dificuldade na classificação das entidades de previdência privada
como "sociedades especiais" ou "associações especiais".
Modesto Carvalhosa, ao analisar o art. 1.123 do novo CC (Lei 10.406/2002), que trata das
"sociedades que necessitam de autorização", e que dispõe que serão regidas por aquele título e
pela "legislação específica", diz que entre estas sociedades autorizadas a funcionar estão as
seguradoras. Como as entidades de previdência complementar sem fins lucrativos são
"seguradoras lato sensu" (antigas sociedades de mútuo do art. 1.466 do CC/1916 (LGL\1916\1) -
cf. item 2, supra), principalmente para quem as considera "sociedades especiais" pela terminologia
dada pelo novo Código Civil (LGL\2002\400), seria aplicável, a preceito, o referido artigo, que
remete à legislação específica (LC 109/2001, Lei 6.435/1977 e Dec. 81.402/1978).

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É de notar que esse art. 1.123 do CC/2002 (LGL\2002\400) somente menciona "sociedades que
necessitam de autorização" para funcionar, e não "associações que necessitam de autorização
(...)". Todavia, a ratio legis inclina, in casu, pela interpretação de que se refere também às
entidades abertas de previdência complementar sem fins lucrativos mesmo que se as tenha por
"associações especiais" e, que não se inclinasse. O art. 73 da LC 109/2001 determina que as
"entidades abertas serão reguladas também, no que couber, pela legislação aplicável às
sociedades seguradoras", o que obriga a incidência do art. 1.123. Também, o inc. II do art. 192 da
CF (LGL\1988\3) obrigava houvesse "autorização para funcionamento", o que ratifica a incidência
da regra do art. 1.123 às entidades de previdência complementar, mesmo as sem fins lucrativos.
Sendo "legislação específica de seguro" a legislação de previdência privada, que permite a
coexistência dos associados "controladores" com os "simples participantes" (que somente
participem dos planos previdenciários), com direitos e obrigações claramente dispostos em lei, não
pode ser revogada por normas gerais existentes no Código Civil (LGL\2002\400), em evidente
retrocesso legislativo e com flagrante ofensa aos princípios mais comezinhos de hermenêutica, que
o próprio Código preserva pela redação dos arts. 777, 1.123 e 2.033, entre outros.
Os dispositivos constitucionais (incisos XVII e XVIII do art. 5.º) que dizem ser "plena a liberdade
de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar", e que "a criação de associações
e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo proibida a interferência
estatal em seu funcionamento", são aplicáveis às associações e sociedades indistintamente, pois
os termos eram sinônimos até 2002 e a Carta Magna (LGL\1988\3) de 1988, (nesse sentido Pontes
de Miranda e José Afonso Silva, cf. subitem 4.4.1, supra), razão por que não procede o argumento
de que as entidades de previdência privada sem fins lucrativos não podem ser consideradas
associações por terem aquelas de ter "autorização para funcionar", enquanto a estas é vedada a
interferência estatal e desnecessária qualquer autorização. O que se autoriza ou se veda, com a
necessária intervenção estatal nestes casos, não é nem a constituição nem o funcionamento das
associações ou sociedades, mas sim exercício de determinada "atividade" de relevante interesse
social.
Além dos argumentos acima, ainda que se tentasse impor a aplicação in totum do capítulo
pertinente à administração, lembramos que não é tão simples, pelo que disposto nos arts. 55 e 59,
sustentar que todos os associados têm direito a voto.
A possibilidade de "eleição indireta" da diretoria é sustentada por Miguel Reale, ao analisar o
disposto no art. 59 do novo CC, ao passo que o art. 55 permite a categoria de associados com
vantagens especiais, o que de todo não proíbe a existência de "associados controladores" que, em
assembléia, designariam a diretoria, pois o direito de voto pode não ser outorgado a todos os
membros, como sustentam Pontes de Miranda, Trajano de Miranda Valverde, Carlos Fulgêncio da
Cunha Peixoto, Waldemar Ferreira, Franz Martins e Modesto Carvalhosa, entre outros
doutrinadores (cf. subitens 4.4.2 e 4.4.3, supra) de não somenos importância que estudaram o
"direito a voto" ante o que dispõe o direito positivo, mormente quanto à Lei das Sociedades
Anônimas.
Ainda quanto ao "direito a voto", o art. 55 do CC/2002 (LGL\2002\400) permite a existência de
categorias de associados com vantagens especiais, podendo essas vantagens ser pecuniárias ou
políticas.
A Lei 6.404/1976 (Lei das Sociedades Anônimas) previu expressamente os dois tipos de
vantagens, pecuniárias e políticas, ao outorgar às ações preferenciais, no art. 17, a preferência
ou vantagem pecuniária que consiste no direito a dividendos no mínimo 10% (dez por cento)
maiores do que os atribuídos às ações nominativas; e, no art. 18, sob o título "Vantagens
políticas", outorgou a "vantagem política", quando dispôs que "o estatuto pode assegurar a uma
ou mais classes de ações preferenciais o direito de eleger, em votação em separado, um ou mais
membros dos órgãos de administração". Como o novo Código Civil (LGL\2002\400) de 2002 não
explicou o que tem por "vantagens especiais", ante o que já estabelecem doutrina (Carlos
Fulgêncio da Cunha Peixoto e Trajano Miranda Valverde, entre outros, cf. subitem 4.4.2, supra) e
legislação sobre o assunto, forçoso é concluir que outorgou a cada associação o poder de, nos
estatutos, determinar quais as vantagens "políticas e pecuniárias" que cada categoria de
associado poderá ter, onde, mais uma vez, tem-se por possível a co-existência de "associados
controladores" com vantagens políticas especiais (direito de voto) e de "associados participantes",
com vantagens pecuniárias especiais (crédito privilegiado em caso de liquidação da entidade).
A supressão do direito de voto, longe de ser repulsiva ao direito brasileiro, foi legalmente adotada
quanto à legislação das sociedades anônimas, Lei 6.404/1976, que em seu art. 111 prevê que as
ações preferenciais podem ter o direito de voto suprimido e que em seu art. 109 não arrolou o
"direito de voto" como "direito essencial".
Inclusive, o direito brasileiro inovou ao retirar direito de voto às ações ordinárias ao portador,
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17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

antes de a Lei 8.021, de 1990, extinguir os títulos ao portador e revogar expressamente o art. 33
da Lei 6.404/1976 que criara esse tipo de ação com vantagens especiais em razão da "forma" e
não da "classe".
O direito brasileiro, no que segue o direito norte-americano, entende, pois, que o direito de voto é
"direito contratual", pode ser disposto pelas partes e suprimido. Tal fato também é constatado no
direito alemão, direito suíço e direito italiano, entre outros.
Nesse caso, a assembléia geral de associados prevista no art. 59 do novo CC, mesmo o tendo por
aplicável integralmente às entidades abertas de previdência complementar sem fins lucrativos, do
que discordamos, poderá ser "assembléia geral todos os associados integrantes da categoria com
vantagens políticas especiais (direito a voto)".
Não há defender que o Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, sem nenhuma disposição expressa
nesse sentido, tenha o "voto" como "direito essencial", porquanto esse mesmo Diploma quando
desejou conceder direito a voto a todos os sócios expressamente o fez, como com os sócios
cooperados, cujo direito a voto está expressamente previsto no inc. VI do art. 1.094; e, quando o
desejou, também expressamente, vetou o voto de condômino inadimplente (art. 1.335, III).
Trazer princípios de direito público, que somente podem ser usados para ilustrar relações privadas,
ao aproximar os conceitos de "voto" como instrumento da "democracia" com o "voto" oriundo de
"contrato", prejudica a correta compreensão da natureza jurídica deste último, pois em direito
público quem deve ao Estado não fica impedido de exercer o direito de voto relativo à eleição dos
representantes políticos, ao contrário do que dispõe o art. 1.335, III, do CC quanto ao voto do
condômino.
É preciso ter muito cuidado, portanto, em não trazer para o direito privado conceitos de direito
público, sob color de "evitar abusos de poucos em detrimentos de muitos", pois em alguns casos a
utilização desmedida desses mesmos princípios acarretará cortar por alguns contratos, tais como
os "aleatórios", nos quais a prestação e contraprestação não são igualitárias sem que nunca
jamais fossem tidos por inconstitucionais.
O Código Civil (LGL\2002\400) de 2002 podia conceder a todos os acionistas de sociedades
anônimas o direito de voto, e se isso fosse "direito essencial" certamente o teria feito, abstendo-
se (art. 1.089), no entanto, de assim praticar; e tendo permitido que as "sociedades anônimas"
permanecessem regradas por lei que não confere a todos acionistas o direito de voto (cf. art. 111
da Lei 6.404/1976) facultou a existência de sociedades sem que todos tivessem referido direito
que, por isso mesmo, não pode ser considerado "direito essencial inerente a qualquer membro de
sociedade ou associação", e o inc. III do art. 1.335 atesta tal fato.
De jure conditio o direito de votar, quanto a membro de sociedade ou associação, no Brasil não é
essencial e pode ser suprimido; e, de juro condendo, melhor que se outorgue por lei, sempre que
tal se desejar (como feito com as cooperativas no art. 1.094, VI, do CC/2002 (LGL\2002\400)) a
todos os sócios ou associados, sem tomar a concessão de direito de voto a todos os membros
indistintamente por expressão de "direito constitucional à igualdade", ou sem vingar o direito de
voto a patamar de "princípio de ordem pública" - como o fazem França e Bélgica, pois tal fato
tornaria inviável qualquer outra solução, talvez melhor, que se pudesse dar por lei ao problema dos
"direitos das minorias" em contrato de direito privado de sociedade ou associação.
As entidades de previdência privada abertas sem fins lucrativos, pois, que tenham se constituído
com observância do disposto na Lei 6.435/1977 e do Dec. 81.402/1978 não precisam alterar seus
Estatutos (desde que enquadrados na legislação de previdência privada) para adequá-los à Lei de
Sociedades Anônimas nem às regras gerais pertinentes às associações previstas no Código Civil
(LGL\2002\400) de 2002, ou seja, não precisam atender às determinações do art. 2.031 da Lei
10.406/2002, porquanto são regidas por legislação específica e não estão sob a incidência das
normas gerais, ressalva essa inclusive expressamente feita pelo art. 2.033 do mesmo Código.
Se vingasse a tese de que seriam aplicáveis in totum as regras pertinentes às "associações"
previstas no Código Civil (LGL\2002\400) de 2002, inclusive com a interpretação equivocada
quanto ao que dizem os arts. 55 e 59, com exclusão das normas específicas (art. 77 da LC 109/
2001 e Dec. 81.402/1978), para ser coerente com o que ocorre com todos os tipos de
"associações, fundações e sociedades", não se poderia considerar o "participante de plano
previdenciário", mero cliente que é, e ante o disposto no artigo 30 da Lei 6.435 de 1977 c/c o
artigo 38 do Dec. 81.402 de 1978, como "associado". Tal fato ocorre, inclusive, com os
participantes de planos previdenciários das entidades fechadas constituídas sob a forma de
"fundação" (artigo 5.º da Lei 6.435 de 1977) - que não são "associados" ou "sócios", ao contrário
dos que pertencem às entidades fechadas constituídas, tal como as abertas, como "sociedades
civis sem fins lucrativos" previstas na Lei 6.435/1977 (cf. subitem 4.4.4, supra).

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Nunca é demais lembrar que a tese exposta no item anterior, se vingar, acabará com a figura do
"seguro mútuo". Esse contrato de natureza dúplice em que o "interessado ao contratar o seguro
ao mesmo tempo se transforma em "segurado" e "associado" (ou "sócio", segundo a interpretação
a ser dada), que estava previsto no art. 1.466 do CC/1916 (LGL\1916\1) - sem correspondente no
atual - foi depois transformado no "plano previdenciário", com características especiais que a tese
refuta.
Logo, se não se podem considerar as entidades de previdência privada "associações sui generis"
ou "sociedades simples, especiais, sem fins lucrativos, para os fins de permanecerem as regras
para eleição de diretoria, a fortiori, não se pode considerar o mero cliente, simples "participante de
plano previdenciário", como "associado sui generis" ou "sócio", devendo na referida adaptação
estatutária das entidades abertas de previdência privada sem fins lucrativos ser observada a
extinção desse tipo de associado ou sócio, juntamente do contrato de seguro mútuo, cujas regras
estariam sendo extintas também por quem se filiasse à tese aqui refutada.
É o que nos parece.
Rio de Janeiro, 15 de janeiro de 2004.
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