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17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

A REFORMA DA PREVIDÊNCIA PRIVADA (A


CONSTITUCIONALIDADE DO DECRETO 3.721, DE
08.01.2001)

A REFORMA DA PREVIDÊNCIA PRIVADA (A CONSTITUCIONALIDADE DO


DECRETO 3.721, DE 08.01.2001)
Revista dos Tribunais | vol. 791 | p. 11 | Set / 2001
Doutrinas Essenciais de Direito Constitucional | vol. 6 | p. 833 | Mai / 2011
Doutrinas Essenciais de Direito do Trabalho e da Seguridade Social | vol. 5 | p. 1085 | Set /
2012DTR\2001\370
Arnoldo Wald
Advogado. Professor Catedrático de Direito Civil na Universidade Estadual do Rio de Janeiro.
Presidente da Academia Internacional de Direito e Economia. Doutor Honoris Causa pela Faculdade
de Direito de Paris.

Área do Direito: Geral

Sumário:

"... o art. 6.º da LICC ... só tem relevo em se tratando de aplicá-lo em relação jurídica em que
se discute questão de direito intertemporal, para se impedir, se for o caso, que a lei nova
prejudique direito que se adquiriu com base na lei anterior. O mesmo se dá com o direito
adquirido sob condição ou a termo que só se configura quando a condição ou o termo é
inalterável ao arbítrio de outrem, requisito este indispensável para tê-lo como direito adquirido.
Por isso mesmo, em se tratando de direito público com referência a regime jurídico estatutário,
não há direito adquirido a esse regime jurídico, como sempre sustentou esta Corte, e isso porque
pode ele ser alterado ao arbítrio do legislador."
Min. Moreira Alves
"É fundamental que o Estado zele pelo equilíbrio atual dos fundos de pensão."
Mailson da Nóbrega
<d4>SUMÁRIO: 1. Introdução - 2. Do regime jurídico da previdência complementar: 2.1 As
normas constitucionais - 3. A jurisprudência dos tribunais superiores: 3.1 A prevalência da norma
de ordem pública; 3.2 A inexistência de direito a regime jurídico determinado - 4. A posição da
doutrina quanto à aplicação intertemporal de normas legais e regulamentares à previdência
privada - 5. Análise da Lei 6.435/77 - 6. O equilíbrio econômico-financeiro (ou financeiro e
atuarial) - 7. Conclusões.</d4>
1. INTRODUÇÃO
O problema da adequada garantia das aposentadorias pela previdência complementar existe em
todos os países. À medida que a duração da vida aumentou, o tempo de trabalho foi diminuindo e
se reduziu o crescimento da população, uma nova realidade social e econômica foi obrigando o
legislador a intervir para assegurar os pagamentos futuros devidos pelo sistema. No Brasil, a
reformulação da previdência, pela EC 20, abrangeu também a fixação de teto para a contribuição
do empregador no setor público, não mais permitindo que fosse superior a do segurado, o que
também repercutiu na estrutura financeira dos fundos de pensão.
Compreende-se, assim, que, diante de dificuldades crescentes surgidas no setor, era dever do
Poder Público restabelecer um novo equilíbrio entre as contribuições e os benefícios da previdência
complementar, tendo em vista os direitos tanto dos atuais contribuintes como dos futuros
beneficiários, o que foi feito com o recente Dec. 3.721, cuja constitucionalidade ora se discute
nos tribunais, alegando-se direito adquirido do segurado ao regime vigente na data do seu
ingresso no plano.
Ocorre que a vida não é estática e que não é possível estratificar as condições estabelecidas para
a evolução do plano de um grupo de pessoas, não havendo como fazer sobreviver um contexto
passado que já não existe, especialmente, quando se trata do regime jurídico de caráter
institucional que complementa a previdência social.
De um lado, o Estado e, em particular, as empresas estatais ou suas sucessoras privatizadas não
mais podem arcar com o maior peso das contribuições aos fundos, devendo estabelecer-se um
justo equilíbrio entre as contribuições de todas as partes interessadas. De outro, idade mínima
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para a aposentadoria deve ser modificada num momento em que a medicina tem aumentado não
só o prazo de vida do homem, mas também a sua qualidade de vida quando mais idoso e a sua
possibilidade de continuar trabalhando. Tais modificações devem ter, necessariamente, reflexos no
direito para que a previdência seja economicamente viável e as contribuições e aposentadorias
representem valores eqüitativos.
Esclarece a este respeito o Min. Mailson da Nóbrega que:
"Os investidores institucionais dos EUA mobilizam estonteantes US$ 20 trilhões de poupança
financeira (mais de 200% do PIB). Os fundos de pensão, que constituem a parte mais importante,
nasceram há mais de um século e experimentaram grande desenvolvimento no pós-guerra. Hoje,
existem mais de 800 mil planos com cerca de 75 milhões de participantes ou 40% da população
economicamente ativa. Nos anos 80, surgiram os fundos 401 (k), cujo saldo pode ser sacado na
aposentadoria. São mais de 300 mil planos com 35 milhões de participantes ou 80% dos
trabalhadores elegíveis para o programa.
Essa revolução está chegando no Brasil. Os nossos fundos começaram a se expandir depois da Lei
6.435, de 1977, que dispõe sobre as Entidades Fechadas e Abertas de Previdência Privada (as
EFPP e as EAPP). Mais recentemente, foi criado mecanismo semelhante ao 401 (k), isto é, o Plano
Gerador de Benefícios Livres - PGBL. Ao final de 2000, o patrimônio das entidades de previdência
privada era de cerca de R$ 145 bilhões, sendo R$ 128 bilhões nos fundos de pensão e R$ 17
bilhões nas entidades abertas. Isso corresponde a cerca de 14% do PIB, em comparação com
apenas 3% do PIB em 1985.
A importância desse conjunto exige regulação e supervisão adequadas para evitar desequilíbrios.
Afinal, os fundos de pensão já envolvem o interesse de 6,3 milhões de brasileiros: 1,6 milhão de
ativos e 4,7 milhões de dependentes e assistidos, o que realça a sua importância social e
econômica. É fundamental, assim, que o Estado promova incentivos ao seu desenvolvimento e
zele por seu equilíbrio atuarial". 1
Por sua vez, a jornalista Miriam Leitão lembra que:
"Um levantamento feito pela Secretaria de Previdência Complementar mostrou que, ao todo, de
1995 a 2000 as empresas públicas federais estaduais e municipais transferiram aos fundos R$ 22
bilhões. Nos últimos cinco anos, o Estado poderia ter economizado no mínimo R$ 2,2 bilhões se
estivesse em vigor a norma da paridade". 2
Justifica-se, assim, a posição do Estado de estabelecer na matéria uma nova regulamentação, que
consta no Dec. 3.721, de 08.01.2001, que tem a seguinte redação:
Decreta:
"Art. 1.º O inc. II do art. 20 e os incisos IV e V do art. 31 do Dec. 81.240, de 20.01.1978, passam
a vigorar com a seguinte redação:
'Art. 20. (...)
(...)
II - período de carência e idade mínima, quando exigidos, para concessão de benefício;
(...)' (NR)
'Art. 31. (...)
(...)
IV - na aposentadoria por tempo de contribuição prevalecerá a idade mínima de 55 (cinqüenta e
cinco) anos, sendo acrescido, no mês de julho de cada ano, a contar de 2001:
a) 6 (seis) meses até 2010, nos planos de contribuição definida; ou
b) 6 (seis) meses até 2020, para os demais planos;
V - exclusivamente, para os planos de benefícios de contribuição definida, quando da concessão
de aposentadoria especial, a idade mínima será de 53 (cinqüenta e três), 51 (cinqüenta e um) ou
49 (quarenta e nove) anos, conforme o tempo de contribuição exigido pela Previdência Social, de
25 (vinte e cinco), 20 (vinte) ou 15 (quinze) anos;
(...)' (NR)
Art. 2.º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação".
Foi suscitada a inconstitucionalidade do mencionado decreto pelo Partido Socialista Brasileiro na
Argüição (ADIn 2.387), no STF, que dela não conheceu em 21.02.2001, por se tratar de matéria
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regulamentar, que, no máximo, poderia ensejar a ilegalidade, a matéria que não era da
competência da Corte Suprema.
Atualmente, estão em curso vários processos em primeira instância, tendo sido até concedida
medida liminar num deles, recentemente.
A constitucionalidade e a legalidade do mencionado diploma legal, que já foram defendidas, em
artigo, pelo eminente Prof. Octávio Bueno Magano ( Folha de S. Paulo, de 19.12.2001), e em
parecer e artigo nosso (Valor, de 01.03.2001), constituindo o objeto do presente estudo.
2. DO REGIME JURÍDICO DA PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR
2.1 As normas constitucionais
O art. 202 da CF, com a redação que lhe deu a EC 20, esclarece que:
"Art. 202. O regime de Previdência Privada, de caráter complementar e organizado de forma
autônoma em relação ao regime geral de Previdência Social, será facultativo, baseado na
constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar"
(grifos nossos).
O mencionado artigo integra a Seção III (Da Previdência Social), do Capítulo II (Da Seguridade
Social), do Título VIII (Da Ordem Social), da Constituição Federal, concebendo-se, pois, a
previdência privada como forma de complementar a previdência social a fim de garantir a
seguridade social. Esta, por sua vez, é definida no art. 194, cuja redação atual é a seguinte:
"Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos
Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à
previdência e à assistência social.
Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com
base nos seguintes objetivos:
I - universalidade da cobertura e do atendimento;
II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;
III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços;
IV - irredutibilidade do valor dos benefícios;
V - eqüidade na forma de participação no custeio;
VI - diversidade da base de financiamento;
VII - caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com
participação dos trabalhadores, dos empregados, dos aposentados e do Governo nos órgãos
colegiados" (grifos nossos).
Resumindo o regime legal das entidades fechadas de previdência, o então ilustre advogado e hoje
Min. Nelson Jobim teve o ensejo de expor que:
"Os programas de Previdência Social, no Brasil, são subdivididos em:
a) Previdência Social básica, financiada por recursos provenientes dos orçamentos da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e, ainda, de contribuições sociais dos empregadores
e dos trabalhadores, além de receita oriunda de concursos de prognósticos;
b) Previdência Complementar, com adesão voluntária a planos, através do aporte regular de
contribuições e que se subdivide em:
I) Previdência Complementar aberta, destinada a uma clientela de caráter geral;
II) Previdência Complementar fechada, destinada somente a grupos restritos de empregados de
empresas, estas denominadas patrocinadoras.
A Previdência Complementar é regida pela Lei 6.435, de 15.07.1977, a qual determina que as
entidades que operam na Previdência Complementar fechada não possam ter fins lucrativos (art.
4.º, § 1.º).
Enquanto as entidades que operam na Previdência Complementar aberta integram o Sistema
Nacional de Seguros Privados (art. 7.º), as entidades da Previdência Complementar fechada
'consideram-se complementares do sistema oficial de previdência e assistência social,
enquadrando-se suas atividades na área de competência do Ministério de Previdência e
Assistência Social' (art. 34).

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Além do mais, estas últimas entidades 'são reguladas pela legislação geral e pela legislação de
Previdência e Assistência Social' (art. 36).
A autorização para o seu funcionamento é concedida mediante Port aria do Ministério da
Previdência e Assistência Social (art. 37), e têm elas 'como finalidade básica a execução e
operação de planos de benefícios para os quais tenham autorização específica, segundo normas
gerais e técnicas aprovadas pelo órgão normativo do Ministério da Previdência e Assistência
Social' (art. 39)". 3
Tanto a doutrina como a jurisprudência caracterizaram a adesão a um plano de benefícios na
esfera da previdência complementar, como um contrato associativo, plurilateral, aberto e
evolutivo, de cooperação, pelo qual o interessado aceita os deveres e direitos de um determinado
regime legal de caráter dinâmico, baseado no equilíbrio econômico-financeiro da entidade, que é a
garantia de todos os seus participantes. Existe, no caso, a liberdade de contratar ou não
contratar, mas, uma vez feita a adesão ao plano, o participante deve aceitar as transformações
que vierem a ser introduzidas, vinculando-se, pois, a um regime jurídico de caráter estatutário
essencialmente dinâmico.
A doutrina salienta a analogia entre as cooperativas e as entidades de previdência privada,
destacando, por outro lado, a relação desta com a previdência social, a cujo regime se subordina,
inclusive por determinação constitucional e legal.
Assim, esclarece Orlando Gomes:
"A primeira qualificação a ser feita concerne à obrigação de pagar o benefício e sua fonte ou
causa geradora.
Origina-se, sem qualquer dúvida, do vínculo contratual que se estabelece entre o simples
participante e a entidade. Aquele ingressa nesta, ligando-se a um dos seus planos, precisamente
para obter o benefício nele assegurado, em contraprestação às contribuições periódicas que paga.
(...)
(a adesão) tem semelhanças com o fato gerador da Previdência Social, com a diferença
fundamental de que é voluntária enquanto esta é obrigatória. Observe-se que a causa dos dois
negócios jurídicos - a se entender a filiação na Previdência Social como contrato coativo - é
assegurar ao beneficiário uma pensão ou um pecúlio em 'eventual e futura situação de
necessidade'. Observe-se, ainda, que, nas duas relações de previdência, há vínculos sucessivos, o
de constituição e o de execução". 4
Assim, reconheceu-se que, embora decorrente de um contrato plurilateral, os benefícios da
previdência privada tinham um regime institucional, como as próprias cooperativas e as sociedades
anônimas, de conteúdo variável e evolutivo, aplicando-se de imediato a lei nova. Não haveria,
assim, direito adquirido a um regime jurídico determinado, vigente no momento da adesão do
participante.
A jurisprudência foi uniforme, mansa e pacífica nas suas conclusões, coincidindo com as da
doutrina, embora tivesse havido, no tempo, variação quanto aos fundamentos das decisões.
3. A JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES
3.1 A PREVALÊNCIA DA NORMA DE ORDEM PÚBLICA
Inicialmente, a jurisprudência do STF e do STJ teve o ensejo de examinar os casos dos planos,
nos quais se assegurava a correção dos benefícios em percentuais superiores à inflação,
garantindo a majoração dos mesmos pelo salário mínimo.
As decisões então proferidas entenderam que a lei nova de ordem pública, que modificava o
regime legal da correção dos benefícios, se aplicava imediatamente.
Embora existissem alguns acórdãos anteriores sobre a matéria, faremos o levantamento sumário da
jurisprudência do STF que, nas décadas de 89 e 90, e, especialmente, a partir de 1985,
sedimentou-se no sentido da inexistência de direito adquirido a um determinado padrão monetário,
abrangendo tanto a moeda de pagamento (cruzeiro, cruzeiro novo, cruzado antigo e novo) como a
moeda de conta (salário mínimo, ORTN, OTN, UPC, URV, UFIR etc.).
Efetivamente, a E. 2.ª T. do STF, julgando, em 31.05.1985, o RE 105.137 (JRP\1986\1446), sendo
recorrente a Aplub e relator o Min. Cordeiro Guerra, decidiu, conforme se verifica na respectiva
ementa do acórdão que:
"A moeda do pagamento das contribuições e dos benefícios da Previdência Privada tem o seu valor
definido pela Lei 6.435/77, segundo os índices das ORTN, para todas as partes.

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Não há direito adquirido a um determinado padrão monetário pretérito, seja ele o mil réis, o
cruzeiro velho ou a indexação pelo salário mínimo. O pagamento se fará sempre pela moeda
definida pela lei do dia do pagamento". 5
No seu voto, após tecer considerações sobre a retroatividade das leis e o direito adquirido, o
relator salientou que:
"Não há, porém, direito adquirido à percepção de benefícios com base em unidade de valor extinta
por força de leis de ordem pública". 6
Transcreveu, ainda, a lição do eminente Des. e Prof. Galeno Lacerda, em voto proferido no TJRS,
no qual afirmou:
"Tenho opinião firmada a respeito do assunto. Entendo que os contratos em exame possuem
prazo indeterminado e que as Leis 6.205 (LGL\1975\15) e 6.423 (LGL\1977\6) são de Direito
Público e de natureza monetária. Na verdade, elas atribuíram poder liberatório à indexação legal
fixada nos padrões de variações das ORTNs. Nessas condições, incidem sobre os contratos em
curso..." (grifos nossos).
Em outro voto, também transcrito no mesmo acórdão do STF, examinando as Leis 6.205 e 6.423,
que modificaram as unidades de moeda de conta e o regime de indexação, concluiu Galeno
Lacerda que:
"Dispôs o art. 1.º da Lei 6.205:
'Os valores monetários fixados com base no salário mínimo não serão considerados para quaisquer
fins de direito'. E o art. 1.º da Lei 6.423 completou: 'A correção, em virtude de disposição legal ou
estipulação de negócio jurídico, da expressão monetária de obrigação pecuniária somente poderá
ter a base a variação nominal da Obrigação Reajustável do Tesouro Nacional (ORTN)'.
É evidente que essas leis possuem natureza monetária. O fato econômico-político mais grave, que
corrói há décadas a vida do País, é sem dúvida a inflação. Nada mais natural, portanto, que o
Governo cumpra o dever elementar de ditar normas de indexação monetária, no desesperado afã
de disciplinar o mal, já que não pode extirpá-lo de vez.
As leis monetárias, pela própria transcendência de Direito Público de que se revestem, são de
aplicação imediata, segundo o consenso dos mestres de Direito transitório, sobre os contratos em
curso, e, bem assim, sobre qualquer relação jurídica de outra natureza, pública ou privada, não
ressalvada pelo novo texto".
Finalmente, o acórdão do RE 105.137 invoca a lição de Georges Ripert:
"Como disse Ripert, com absoluta propriedade, 'a nova lei, que estabelece uma regra de ordem
pública, pode tolerar que algumas convenções antigas continuem a aplicar-se, ainda que
contrárias à regra, mas pode julgar, pelo contrário, que toda a derrogação à ordem estabelecida é
suscetível de comprometê-la, e torna-se então necessário anular cláusulas cuja regularidade era
incontestável na época em que foram aceitas pelas partes'.
'Quando a anulação é motivada pelo estabelecimento legal de um novo regime econômico, trata-
se de uma nova aplicação da idéia de ordem pública' ( O regime democrático e o direito civil
moderno, trad. bras., 1937, p. 312)". 7
Posição idêntica também foi adotada pela 1.ª T. do STF, pouco tempo depois, como se verifica
pelo acórdão referente ao RE 107.763, j. em 30.06.1987, que tem a seguinte ementa:
"Previdência Privada (plano de pensão reajustável).
É válida a substituição do valor do salário mínimo como fator contratual de reajustamento do
benefício, pelo índice de variação das Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (Leis 6.205/
75, 6.423/77 e 6.435/77).
Recurso extraordinário conhecido e provido para se julgar improcedente a ação.
8
Precedentes do STF".
Na referida decisão, o eminente relator, Min. Sydney Sanches, resumiu a jurisprudência, que se
tornara mansa e pacífica, em ambas as Turmas, nos seguintes termos:
"O recurso extraordinário, interposto pelas letras a e d, merece ser conhecido e provido, ante a
jurisprudência pacífica de ambas as Turmas do STF, com orientação oposta à do 105.322 (RTJ
118/70); Recursos Extraordinários 110.321, 107.512, 111.558, 110.930 (apenas para lembrar
alguns julgados).

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Destaco uma das ementas, por ser genérica e abrangente:


'Previdência Privada (plano de pensão reajustável).
É válida a substituição do valor do salário mínimo, como fator contratual de reajustamento do
benefício, pelo índice de variação das Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (Leis 6.205/
75, 6.423/77 e 6.435/77) (RE 107.512-1-RS - DJ de 29.05.1987, Ementário 1.463-2)'.
Diante disso e do que ficou exposto nesses acórdãos do STF, conheço do recurso e lhe dou
provimento para julgar improcedente a ação, invertidos os ônus da sucumbência". 9
Posteriormente, a matéria foi novamente apreciada no acórdão da 1.ª T., no RE 110.930-1, j. em
10.04.1987, que merece referência especial pelo amplo debate suscitado e pela riqueza dos votos
do eminentes Ministros, que, por maioria e com uma única divergência, consagraram a incidência
da nova lei monetária sobre os efeitos posteriores de contratos firmados anteriormente à entrada
em vigor da mesma.
O voto que veio a prevalecer foi o do eminente Min. Sydney Sanches, designado relator para o
acórdão, que transcreveu a melhor doutrina nacional e estrangeira, para concluir pela vigência
imediata das leis monetárias em relação aos contratos em curso. Invocou, inicialmente, a lição de
Vicente Ráo, para quem:
"... se uma lei posterior passa a atribuir a uma obrigação o caráter, que dantes não possuía, de
matéria de interesse social predominante, como, por exemplo, sucedeu com os contratos de
trabalho na generalidade das legislações, a nova norma jurídica passa a disciplinar os efeitos
mesmos dos contratos anteriormente constituídos, sem atingir, entretanto, nem a existência dos
direitos, nem a sua extinção, nem os efeitos já praticados sob o império da lei anterior". 1 0
Faz ainda referência o voto do Min. Sydney Sanches às lições de Pontes de Miranda, Washington
de Barros Monteiro e Orlando Gomes, para concluir que as normas de política monetária, sendo de
ordem pública, devem ter aplicação imediata, pelas seguintes razões:
"... De resto, houve de parte do legislador, a partir da Lei 6.205, de 29.04.1975, passando pela Lei
6.423, de 17.06.1977, uma preocupação de política monetária (de ordem pública), que
praticamente generalizou, através das variações das ORTNs, a correção monetária a ser
observada, no cumprimento das leis vigentes e dos contratos.
E com a Lei 6.435 estendeu o tratamento aos contratos da Previdência Privada, que, pelo
crescimento da área, começou a envolver interesse público.
Inspiração de ordem pública, repita-se, de conteúdo político-administrativo econômico financeiro
previdenciário, voltado para o interesse do país, que precisou impor sacrifícios a muitos, a tantos
e a quase todos, e não apenas às compreensíveis e respeitabilíssimas aspirações de contribuintes
e beneficiários da Previdência Privada".
Finalmente, o voto lembra a jurisprudência anterior de ambas as Turmas do STF, referindo-se não
tão-somente aos acórdãos dos Recursos Especiais 105.137 (JRP\1986\1446) ( RTJ 115/379) e
106.132 (RTJ 117/376), mas ainda aos dos Recursos Especiais 105.322 e 107.720, cujas ementas
foram as seguintes:
"Aplub - Benefício previdenciário - Reajuste - Salário mínimo - ORTN. Não há direito adquirido a
que os benefícios de Previdência Privada sejam fixados segundo o valor do salário mínimo, se lei
posterior fixa nova escala móvel, alcançando obrigações de origem contratual ou não". 1 1
"Benefício previdenciário. Aplub. Reajuste. Salário mínimo e ORTN. Inexiste direito adquirido a que
os benefícios da Previdência Privada sejam fixados conforme o valor do salário mínimo, se lei nova
estabelece nova escala móvel. Precedentes. Recurso extraordinário conhecido e provido em parte"
12
(grifos nossos).
Mais recentemente, foi mantida a mesma orientação no Supremo Tribunal Federal (ERE 113.923,
rel. Min. Carlos Mário Velloso, RTJ 150/570), que reconheceu a natureza biface - privada e pública
- da previdência complementar na respectiva ementa que tem o seguinte teor:
"Constitucional. Administrativo. Civil. Previdência Privada. Aplub. Benefícios. Lei 6.435/77.
I - Indexação em salários mínimos. Substituição do índice, adotando-se a ORTN. Validade.
....".
No STJ, as decisões foram sempre no mesmo sentido, ora invocando o caráter de ordem pública
da nova legislação, ora afirmando a necessidade de acatar a necessária evolução do plano ao qual
o participante aderiu, como se verifica pela ementa seguinte do acórdão da 3.ª T. no REsp 450,

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sendo relator o Min. Waldemar Zveiter:


"Processual civil. Recurso especial. Montepio. Lei de Ordem Pública. Incidência imediata. Art. 105,
III, c, da CF vigente, ou art. 119, III, d, da Magna anterior.
I - O plano, por seu estatuto, há de ser cumprido na forma pela qual a ele aderiu o associado.
Não está em jogo o requisito ao estatuto originário, a caracterizar direito imutável do segurado,
integrado em seu patrimônio, senão alteração da regra contratual, desde o início prevista, sob
forma de futuras alterações no estatuto.
II - Incide a lei nova (Lei 6.435, de 1977) a regular a atualização das contribuições e dos
benefícios da Previdência Privada, sem violação do direito adquirido.
III - Configurado o dissídio entre o acórdão recorrido e a jurisprudência pretoriana, conhece-se do
recurso, para julgar improcedente a ação" (grifos nossos).
Também em numerosas outras decisões do STJ foi salientada a inexistência de direito adquirido no
caso de obrigações de execução sucessiva (REsp 1.530, RSTJ 7, mar./1990, p. 470).
Se examinamos detidamente a jurisprudência que se aplicou à previdência privada no caso de
modificações monetárias, foi pelo fato de encontrar nas decisões proferidas um consenso quanto a
dois pontos básicos:
a) a natureza institucional e o conteúdo evolutivo e dinâmico do regime da previdência, que não
se cristaliza no momento da adesão do participante;
b) a aplicação imediata de normas imperativas que correspondam às exigências da política
governamental, seja ela monetária ou previdenciária, especialmente quando corresponde, na
palavra do Min. Sydney Sanches, a uma "inspiração de ordem pública, repita-se, de conteúdo
político-administrativo econômico financeiro previdenciário, voltado para o interesse do país, que
precisou impor sacrifícios a muitos, a tantos e a quase todos, e não apenas às compreensíveis e
respeitabilíssimas aspirações de contribuintes e beneficiários da Previdência Privada". 1 3
Efetivamente, houve uma certa evolução na fundamentação das decisões que, inicialmente,
consideraram preponderantemente a natureza de ordem pública das leis monetárias como
fundamento adequado para excluir a existência de direito adquirido e, posteriormente, passaram a
reconhecer que não existe direito adquirido a um determinado regime jurídico, seja ele monetário
ou previdenciário. Nessa última fase não se discute mais a natureza imperativa da lei, mas a
existência de um regime jurídico que livremente pode ser modificado pelo Poder Público.
Convergem, assim, as decisões jurisprudenciais específicas referentes aos planos das instituições
da previdência complementar com os acórdãos que reconhecem que todo regime jurídico, seja o
da propriedade, do contrato, ou da previdência, pode mudar, não havendo, em relação a ele,
direito adquirido.
3.2 A INEXISTÊNCIA DE DIREITO A REGIME JURÍDICO DETERMINADO
Na realidade, a proteção constitucional do direito adquirido encontra os seus limites na própria
definição da garantia da propriedade, que, em termos constitucionais, abrange a totalidade dos
direitos patrimoniais, como bem esclarece Pontes de Miranda. 1 4
Ora, os diplomas legais que não se referem à aquisição de direitos, mas sim ao modo de exercê-
los, se aplicam imediatamente, salvo determinação em contrário do legislador, ou reserva
constitucionalmente assegurada.
É que a propriedade constitui direito fundamental de conteúdo eminentemente normativo, cuja
própria existência, em si, depende da disciplina jurídica que lhe der a lei. Nesses casos, entende-
se que as normas legais relativas a esses institutos não têm caráter limitativo, mas de verdadeira
regulação ou conformação, como salienta Gilmar Ferreira Mendes ao afirmar que:
"A vida, a possibilidade de ir e vir, a manifestação de opinião e possibilidade de reunião preexistem
a qualquer disciplina jurídica. Ao contrário, é a ordem jurídica que converte o simples ter em
propriedade e institui o direito de herança. A proteção constitucional do direito de propriedade e
do direito de sucessão não teria, assim, qualquer sentido sem as normas legais relativas ao direito
de propriedade e ao direito de sucessão.
Como essa categoria de direito fundamental, que se apresenta, a um só tempo, como garantia
institucional e como direito subjetivo, confia ao legislador, primordialmente, o mister de definir, em
essência, o próprio conteúdo do direito regulado, fala-se, nesses casos, de regulação ou de
conformação (Regelung oder Ausgestaltung) em lugar de restrição (Beschränkung).
É que as normas legais relativas a esses institutos não se destinam, precipuamente, a estabelecer

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restrições. Elas cumprem antes relevante e indispensável função como normas de concretização
ou de conformação desses direitos". 1 5
Daí decorre, teoricamente, a franquia propiciada pela Constituição ao legislador de redesenhar o
instituto sujeito à regulação ou conformação, ainda que, em determinadas situações, modificando
a posição do titular do direito. Essa possibilidade de mudanças decorre do caráter institucional e
do conteúdo normativo da proteção ao direito de propriedade. Por isso que não se atribui natureza
expropriatória às leis que estabelecem ou alteram a regulação e a conformação do direito de
propriedade.
Um dos precedentes mais importantes do STF ocorreu no julgamento em que se decidiu pela
constitucionalidade do Dec.-lei 25/1937 (LGL\1937\1), que regulou o tombamento de bens de valor
histórico e artístico, representando, inclusive, uma restrição ao poder de disposição sobre esses
bens. Vale registrar uma passagem notável do voto do Min. Orozimbo Nonato:
"É impossível reconhecer na propriedade moderna aqueles traços, por exemplo, que aparecem na
definição do Código do Consulado e em que Josserand encontra puro valor legendário ou simbólico.
Aliás, nunca foi a propriedade, no próprio direito romano, um poder sem contraste; um direito
absoluto, o que seria incompatível com as condições de existência do consórcio civil. Não foi dos
menores méritos de Jhering mostrá-lo e evidenciá-lo.
O direito brasileiro não podia ser insensível a esse movimento que, às vezes, assume aspectos
excessivos e condenáveis, mas que, em linha geral, tende a fazer do direito o que ele deve ser -
um instrumento da felicidade humana.
As limitações da propriedade - já não se falando das de origem contratual e das que derivam dos
iura vicinitatis - aparecem em número crescente.
A Constituição de 1891 falava nas garantias da propriedades 'em toda a sua plenitude'. Já na
Constituição de 1934 a linguagem é menos expressiva e enfática. E a de 1937, resolutamente,
admite restrições maiores, pois defere às leis ordinárias não só a regulamentação de seu exercício
como a própria definição de seu conteúdo.
Dir-se-á, e é verdade, que o domínio, assim reduzido, já não apresenta os traços de sua feição
primitiva, como na revelação quiritária. Mas, ainda assim, é propriedade. Não se trata aqui de
apoiar ou aplaudir a transformação, mas apenas de verificar-lhe a existência e reconhecer-lhe os
efeitos.
É à luz da concepção constitucional da propriedade - direito relativo que vive muito daquilo que
Duguit chamou dever social - que, a meu ver, deve a questão dos autos ser solvida.
(...)
O que, a meu ver, retira ao decreto a balda de inconstitucional é a própria concepção da
propriedade na Constituição, que proclama a possibilidade de se dar ao conteúdo desse direito
definição, e, pois, limitação ...". 1 6
Vê-se, com clareza, que o voto consagrou o caráter institucional do direito de propriedade,
reconhecendo ao legislador a possibilidade de definir o próprio conteúdo desse direito.
Em outra ocasião, o STF voltou a pronunciar-se sobre o tema, a propósito da argüição de
inconstitucionalidade do art. 125 do CPI, que sujeitava o titular de privilégio concedido
anteriormente à obrigação de manter procurador domiciliado no Brasil. Dizia-se que, configurando o
registro anterior direito adquirido, não podia a lei nova impor obrigação antes inexistente (RE
94.020, j. em 04.11.1981). Adotando a orientação do relator, Min. Moreira Alves, o Excelso
Pretório decidiu que se a lei nova modifica o regime jurídico de determinado instituto (como é a
propriedade), essa alteração aplica-se de imediato (RTJ 104/269).
No mesmo teor as decisões referentes à mudança de legislação sobre vencimentos de funcionários
públicos, entre as quais se destacam os acórdãos dos Recursos Extraordinários 148.137-4-DF e
164.855-4-DF (ambos publicados no DJU de 1.º.10.1995), dos quais foi relator o eminente Min.
Celso de Mello. Poder-se-ia também citar, entre outros, as decisões referentes à enfiteuse e à
aposentadoria, para só mencionar os casos mais importantes.
Mais recentemente, a matéria tem sido objeto de decisões do STF tanto em relação aos
vencimentos dos funcionários como no tocante ao FGTS.
No primeiro caso, decidiu o Excelso Pretório no RE 189.839, cuja ementa esclarece na sua parte
final:
"Reajuste trimestral de vencimentos pela variação do IPC (84,32%). Revogação por norma
superveniente, que precedeu a aquisição do direito e o exercício desse. Direito adquirido
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inexistente" (DJU de 15.09.1995 - grifos nossos).


No mesmo sentido, a judiciosa manifestação do Min. Celso de Mello, por ocasião do julgamento do
MS 21.216-DF, do qual foi relator o Min. Octavio Gallotti, em acórdão que se transformou em
leading case sobre a matéria:
"... Quando sobreveio a MedProv 154/90, posteriormente convertida na Lei 8.030/90, estava ainda
pendente uma situação jurídica indefinida, cujo processo de formação revelava-se em curso de
mera constituição, a exigir, para efeito de sua definitiva consolidação, a ocorrência de um
segundo elemento positivo, caracterizado pela efetiva prestação de serviços à Administração
Pública" (RTJ 134, p. 1.122-1.123) (grifos nossos).
Finalmente, no recente julgamento do RE 226.855 referente ao FGTS, o STF fez expressamente a
adequada distinção entre as situações nas quais só vigora a vontade contratual das partes e, por
outro lado, aquelas nas quais prevalece o regime legal. Assim, na respectiva ementa foi salientado
que:
" O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), ao contrário do que sucede com as
cadernetas de poupança, não tem natureza contratual, mas, sim, estatutária, por decorrer da Lei
e por ela ser disciplinado.
Assim, é de aplicar-se a ele a firme jurisprudência desta Corte no sentido de que não há direito
adquirido a regime jurídico".
No seu minucioso voto, o Min. Moreira Alves, respondendo a ponderações que lhe foram feitas,
concluiu com precisão que:
"... O que o art. 6.º da Lei de Introdução ao Código Civil faz, com relação ao direito adquirido, é
conceituá-lo com base na doutrina relativa a esse conceito, ou seja, a de que o direito adquirido é
o que se adquire em virtude da incidência da norma existente no tempo em que ocorreu o fato
que, por esta, lhe dá nascimento em favor de alguém, conceito esse que, para o efeito do
disposto no art. 5.º, XXXVI, da Constituição, só tem relevo em se tratando de aplicá-lo em
relação jurídica em que se discute questão de direito intertemporal, para se impedir, se for o caso,
que a lei nova prejudique direito que se adquiriu com base na lei anterior. O mesmo se dá com o
direito adquirido sob condição ou a termo que só se configura quando a condição ou o termo é
inalterável ao arbítrio de outrem, requisito este indispensável para tê-lo como direito adquirido. Por
isso mesmo, em se tratando de direito público com referência a regime jurídico estatutário, não há
direito adquirido a esse regime jurídico, como sempre sustentou esta Corte, e isso porque pode ele
ser alterado ao arbítrio do legislador. Não fora isso, e todos os que ingressarem no serviço público
sob a égide de lei que estabeleça que, se vierem a completar 35 anos, terão direito à
aposentadoria, esse direito para eles será um direito adquirido sob a condição de completarem
esses 35 anos de serviço público, o que jamais alguém sustentou" (grifos nossos).
A jurisprudência reiterada da Suprema Corte autoriza concluir, como acertadamente o fez Gilmar
Ferreira Mendes:
"Todos esses precedentes estão a corroborar a idéia de que o caráter institucional do direito de
propriedade e, por conseguinte, o conteúdo normativo de seu âmbito de proteção permitem e
legitimam a alteração do regime jurídico da propriedade, a despeito dos possíveis reflexos sobre as
posições jurídicas individuais. Embora essas disposições de conteúdo conformativo-restritivo
possam provocar uma diminuição ou redução no patrimônio do titular do direito, não há como
deixar de reconhecer que tal redução ou diminuição resulta das próprias limitações impostas pela
constituinte à garantia da propriedade" (op. cit., p. 167).
Tratando-se, pois, do regime jurídico a ser adotado e aplicado no campo de previdência
complementar, a lei nova se aplica imediatamente, não se admitindo a chamada retroatividade
mínima em virtude da qual se consagra, em alguns casos, a ultra-atividade da lei antiga.
Quando há modificação do regime jurídico, o novo diploma legal só encontra barreira nos direitos
que, efetivamente, já entraram no patrimônio do titular, sem dependerem de condição ou termo.
Não há, pois, dúvida quanto à existência de um verdadeiro regime jurídico, ao qual adere o
interessado, devendo aceitar as suas modificações legais e regulamentares futuras, como aliás
ocorre, também, em outros casos, como o das cooperativas e em outras organizações
decorrentes inicialmente de uma adesão que cria uma posição contratual em virtude da qual o
aderente se sujeita às normas estatutárias, regulamentares e legais, assim como às modificações
que vierem a sofrer.
4. A POSIÇÃO DA DOUTRINA QUANTO À APLICAÇÃO INTERTEMPORAL DE NORMAS LEGAIS E
REGULAMENTARES À PREVIDÊNCIA PRIVADA

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Na realidade, o regime da previdência social e da previdência complementar não é de direito


privado, mas deflui das normas constitucionais referentes à ordem social. Aplica-se-lhes, pois, a
lição de Pontes de Miranda, que se referia às normas de direito administrativo e já vimos que o
próprio Excelso Pretório tem invocado no caso da previdência complementar este ramo da ciência
jurídica. 1 7
Escreve a este respeito Pontes de Miranda que:
"A cada passo se diz que as normas de direito público - administrativo, processual e de
organização judiciária - são retroativas, ou contra elas não se podem invocar direitos adquiridos.
Ora, o que em verdade acontece é que tais regras jurídicas, nos casos examinados, não
precisam retroagir, nem ofender direitos adquiridos, para que incidam desde logo. O efeito, que
se lhes reconhece, é normal, o efeito no presente, o efeito imediato, pronto, inconfundível com o
efeito no passado, o efeito retroativo, que é anormal. Já no direito privado, o efeito imediato nos
deixa, por vezes, a ilusão da retroatividade. (...) No domínio do direito público, que é acima desse
ponto, pelo muito de institucional que tem, crescem a freqüência e a intensidade dele. Só
excepcionalíssimamente sobrevive a lei velha" 1 8 (grifos nossos).
Os publicistas consideram que, no tocante aos direitos que se regem pelo regime estatutário, as
obrigações ainda não vencidas, sendo suscetíveis de modificação pelo legislador, não constituem
direitos subjetivos, mas simples expectativas ou posição jurídica. 1 9 É o caso de aderente ao plano
em relação às prestações ainda não vencidas.
Em relação à previdência privada, a ausência de direito adquirido em relação às prestações futuras
deflui do fato de serem alteráveis ao arbítrio do legislador, como já salientado pelo Min. Moreira
Alves, ou da autoridade incumbida de sua regulamentação, não cabendo, pois, a aplicação do art.
6.º, § 2.º, da LICC. Outro argumento relevante enfatizado pela doutrina é o fato de se tratar de
contrato por prazo indeterminado, ou de contrato de execução sucessiva ao qual se aplica a lei
vigente no momento em que surge a exigibilidade da prestação.
Neste sentido manifestam-se, em excelentes pareceres sobre a matéria, os Professores
Washington de Barros Monteiro, 2 0 Orlando Gomes 2 1 e Miguel Reale, 2 2 que concordam em
reconhecer que não se aplica a garantia constitucional do direito adquirido em relação às
prestações não vencidas de contratos por prazo indeterminado, embora não se refiram ao regime
estatutário.
Em primeiro lugar, cabe lembrar que o próprio texto do art. 6.º, § 2.º, refere-se ao direito que já
se integrou no patrimônio do titular ("... que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer ...")
ou ao que depende de condição inalterável ou de termo prefixo. Esta expressão pressupõe a
existência de contrato por prazo determinado, o que não ocorre, necessariamente, nos contratos
previdenciários. Assim, não há, no caso, termo prefixado e a condição é alterável a arbítrio de
outrem (legislador ou autoridade regulamentar).
Conseqüentemente, Washington de Barros Monteiro, no parecer já citado, afirma que, embora se
tenha veiculado que os contratos em questão são de prazo determinado, o seu entendimento é no
sentido de considerar que:
"Em tal hipótese, o prazo é incerto, porque indefinida ou indeterminada a sua duração".
Por sua vez, o Prof. Miguel Reale, após ter salientado que a adesão do participante abrange as
regras atuais e futuras estabelecidas para o plano, enfatizado o caráter associativo do contrato e
a finalidade comum dos aderentes, conclui no mesmo sentido:
"Disse que a figura do 'contrato por tempo indeterminado' é incompatível com a existência de uma
associação 'de partes abertas', isto é, cujos prazos de duração, previstos quer para a vida da
entidade, quer para seus planos previdenciários, não vinculam o associado" (Parecer já citado).
Finalmente, Orlando Gomes distingue duas fases na relação entre o participante e a entidade de
previdência privada:
a) a primeira, que é a da constituição da relação jurídica, a adesão, que considera de natureza
contratual; e
b) a segunda, abrangendo a execução, que é estatutária e na qual cada fase deve reger-se pela
lei vigente no respectivo momento em que ocorre, por considerar que as eventuais prestações
periódicas devem ser consideradas como atos singulares de execuções juridicamente autônomas.
Partindo dessas premissas, conclui Orlando Gomes pela constitucionalidade das leis modificativas
do regime da previdência complementar vigente no momento da adesão do participante. Escreve a
respeito o saudoso jurista:

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"Válidas são, desse modo, as leis que alteram, para o futuro, o exercício de direitos em atividade,
mas oriundos de negócio jurídico constituído sob o império de lei já substituída. Hoje se reconhece
tranqüilamente a inexistência de direitos adquiridos em plena propriedade nos contratos
sucessivos, como diz um escritor. Têm esta natureza tão-somente as prestações já esgotadas
antes da vigência da lei nova.
Afirma-se que, em tais contratos, o direito do credor 'não se adquire instantaneamente, mas à
medida que se vai tempestivamente exercendo. Seja esta a explicação correta ou não, o certo é
que, antes do seu exercício no tempo devido, o direito à prestação do devedor ainda não se
incorporou ao patrimônio do credor, o que ocorreria apenas se estivesse definitivamente adquirido
e já fosse uma 'propriedade' do credor. Direito adquirido só existe, na hipótese, quanto aos efeitos
já produzidos do contrato, não quanto às obrigações que ainda não tiveram ocasião de ser
cumpridas e muito menos quanto ao modo de adimplemento". 2 3
O Prof. Limongi França, na sua excelente monografia sobre direito intertemporal, faz interessante
distinção entre os direitos de aquisição imperfeita, entre os quais inclui os dependentes de termo
ou condição, e os direitos de aquisição sucessiva, nos quais a integração no patrimônio do titular
se obtém mediante o decurso do tempo, como acontece na aposentadoria.
Escreve a respeito o eminente professor paulista que:
"c) Direitos de Aquisição Sucessiva. Trata-se, como vimos, daqueles que se obtêm mediante o
decurso de um lapso de tempo. É o caso de prescrição, do direito à aposentadoria, da maioridade
etc.
Não se confundem com os direitos a termo. Nestes últimos, a perfeição depende da mera
incidência de um evento futuro e certo; naqueles, o direito se adquire dia a dia, com o correr
sucessivo do prazo.
A retroação total, conforme o preceito de Müller, incorreria em ignorar a patrimonialidade do prazo
já decorrido. Por outro lado, a aplicação integral da lei antiga (Código francês, art. 3.381)
implicaria em considerar adquirido um direito cuja perfeição estava na dependência de elementos
ainda não verificados.
A solução, pois, parece encontrar-se na aplicação imediata da lei, considerando-se válido o lapso
já decorrido, e computando-se o lapso, por escoar de acordo com a lei nova. Está isto não apenas
de acordo com a lógica jurídica, senão também com a regra do efeito imediato, a qual constitui
atualmente uma das vigas mestras do nosso sistema de Direito Intertemporal.
Assim, pedimos licença para discordar do Mestre Haroldo Valladão, quando no § 1.º do art. 82 do
seu Anteprojeto exige que, em relação ao lapso já escoado, se observem os requisitos da lei
nova". 2 4
Assim, quer se admita a existência de regime estatutário, quer se prefira entender que há no caso
um contrato de conteúdo dinâmico com aquisição sucessiva de direitos, a conclusão é idêntica.
Reconhecida a constitucionalidade das modificações legislativas ou regulamentares, cabe agora
analisar mais detidamente a Lei 6.435 e os seus efeitos, diante das alterações decorrentes da EC
20 (LGL\1998\68).
5. ANÁLISE DA LEI 6.435/77
A Lei 6.435, de 15.07.1977, surgiu para regulamentar a previdência privada, abrangendo tanto as
entidades abertas quanto as fechadas, constituindo um diploma sistemático e coerente, que veio
pôr fim à relativa insegurança que existia no setor por falta de legislação e regulamentação
adequadas.
Trata-se de lei que foi fruto da colaboração do Executivo (que mandou a mensagem) e do
Legislativo (que apresentou e votou as emendas), recebendo sugestões de todas as áreas
interessadas e dando soluções equilibradas e eficientes para alcançar as suas finalidades.
Na Mensagem 155/77 ao Congresso Nacional foi salientado pelo Governo que:
"(...)
12. Os objetivos fundamentais que se procura atingir podem ser assim sintetizados:
- adequação da ação das entidades aos interesses sociais e econômicos do país;
- proteção aos interesses dos participantes;
- ampla liberdade de atuação de quaisquer interessados, mas com uma definição de
responsabilidades tão clara quanto possível;

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- esquemas específicos para a fixação dos critérios gerais de atuação, a serem uniformemente
seguidos, com vistas à segurança das operações;
- adequado instrumental de fiscalização, que possibilite a identificação, em tempo útil, de
eventuais distorções, sua superação e efetiva punição dos responsáveis, quando caracterizada a
má-fé.
13. Considerando a importância do setor e as características peculiares de sua atuação, no
contexto da legislação até agora em vigor, o anteprojeto procura prevenir a possibilidade de
prejuízos à normal continuidade das operações de entidades já existentes, que sejam
criteriosamente organizadas e conduzidas.
(...)".
Verifica-se, assim, que as metas da legislação ordinária que constam no referido diploma se
coadunam plenamente com a nova redação dada ao art. 202 da Constituição, pela Emenda 20,
que também enfatiza a necessidade de formação de reservas "que garantam o benefício
contratado" e o pleno acesso às informações, adotando, ainda, outras medidas nas quais
estabelece limites para a contribuição das pessoas jurídicas de direito público às entidades de
previdência privada.
Não existindo conflitos entre o texto constitucional e a lei ordinária, não há revogação da mesma,
que permanecerá em vigor até a elaboração de nova lei complementar, nos moldes determinados
pela EC 20.
A regulamentação da lei pode ser baixada por decreto do Poder Executivo, nos precisos termos do
art. 84, IV, da Constituição, sem prejuízo da competência normativa prevista pelo art. 35, I, da
Lei, de acordo com o qual:
"Art. 35. Para os fins deste capítulo, compete ao Ministério da Previdência e Assistência Social:
I - através de órgão normativo a ser expressamente designado:
a) fixar as diretrizes e normas da política complementar de previdência a ser seguida pelas
entidades referidas no artigo anterior, em face da orientação da política de previdência e
assistência social do Governo Federal;
b) regular a constituição, organização, funcionamento e fiscalização dos que exercem atividades
subordinadas a este capítulo, bem como a aplicação das penalidades cabíveis;
c) estipular as condições técnicas sobre custeio, investimentos e outras relações patrimoniais;
d) estabelecer as características gerais para planos de benefícios, na conformidade do disposto na
alínea a, supra;
e) estabelecer as normas gerais de contabilidade, atuária e estatística a serem observadas;
f) conhecer dos recursos de decisões dos órgãos executivos da política traçada na forma da
alínea a deste inciso".
6. O EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO (OU FINANCEIRO E ATUARIAL)
No caso concreto, merece especial referência a necessidade de manter o equilíbrio econômico-
financeiro das instituições de previdência privada, garantido constitucionalmente (art. 202, caput)
e do qual tratam vários artigos da Lei 6.435, sendo da essência da entidade previdenciária, e
constituindo a sua manutenção a maior preocupação do Poder Público, a razão de sua intervenção
normativa e da sua fiscalização no setor.
Reconhece-se, assim, que houve, em relação à previdência privada, a passagem de um regime de
liberdade ampla para um relativo dirigismo, decorrente da necessidade de se instituir a adequada
regulamentação e fiscalização para dar a credibilidade ao novo mercado que se criou.
Em certo sentido, as mesmas razões que ensejaram a criação da Sumoc e, posteriormente, do
Banco Central, na área bancária, da CVM, no mercado de capitais, e da Susep, em relação às
seguradoras, justificaram a nova legislação e a criação de órgão próprio para regular, supervisionar
e fiscalizar as entidades da previdência privada, pelo fato de movimentarem recursos do público.
A dupla regulamentação pela Susep, em relação às entidades abertas, e pelo Ministério da
Previdência Social, no tocante às entidades fechadas, assim como a atribuição ao Conselho
Monetário Nacional da competência para baixar diretrizes referentes às aplicações de recursos
explicam-se, justamente, pela necessidade de garantir o equilíbrio entre as receitas, de um lado,
e, de outro , as obrigações efetivas ou virtuais assumidas pelas entidades previdenciárias, ou
seja, o quantum dos débitos e o correspondente aos riscos.

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Aliás, o conceito de equilíbrio econômico-financeiro está consagrado na legislação e na doutrina,


tendo chegado a ter consagração constitucional em relação aos contratos administrativos. 2 5
Na realidade, embora a maioria dos tribunais e dos autores identifique o sentido dos dois adjetivos
- econômico e financeiro -, a melhor doutrina é no sentido de distingui-los, tanto mais que não se
presume que o legislador utilize sinônimos inúteis para enfatizar o caráter de determinadas
obrigações. Como já foi salientado por Mário Henrique Simonsen, o equilíbrio financeiro se refere à
correspondência entre os dois elementos do fluxo de caixa: receitas e despesas (input e output),
enquanto o equilíbrio econômico (atuarial no caso dos fundos de pensão) se refere ao resultado
global final da operação, que não pode ser deficitária. 2 6
Essa dupla garantia é tanto mais importante que os fundos de pensão representam uma forma de
utilização da poupança, que já foi considerada como o instrumento de verdadeira "Resolução
invisível", 2 7 com reflexos na canalização dos recursos de empregados e empregadores e no próprio
desenvolvimento do mercado de capitais. 2 8
Ora, a sobrevivência do fundo de pensão pressupõe a manutenção do seu equilíbrio, conforme
reconhecem tanto os juristas como os economistas.
Assim, o Prof. Miguel Reale, no seu parecer já referido, teve o ensejo de salientar que:
"Em verdade, uma associação de Previdência Privada repousa sobre esse balanceamento
eqüitativo de valores, entre o que ela pode auferir mediante a aplicação das contribuições dos
participantes e o que pode e deve lhes pagar a título de aposentadoria ou de pensão. Quebrado
esse equilíbrio, pela superveniência de normas legais de ordem pública, impõem-se a correção e a
adaptação de ambas as escalas de valores da Receita e da Despesa, máxime em se tratando,
como vimos, de um 'contrato de colaboração'.
Isto posto, a invocação da ruptura do primitivo equilíbrio financeiro fundado na autonomia da
vontade ( ex contracto) para dar lugar a um novo equilíbrio ex lege, em razão da superveniência
de imprevisível e irresistível norma legal imperativa, não constitui mero argumento ad terrorem,
mas representa um dos pontos capitais em que a consulente funda legitimamente a sua decisão.
Fora disto é ignorar as mais elementares normas que presidem a base técnica ou atuarial essencial
à constituição e à vida dos entes previdenciários".
Por sua vez, o Min. Mailson da Nóbrega e alguns dos seus colaboradores de Tendência Consultoria
Integrada, em recentíssimo parecer, enfatizaram que o equilíbrio econômico-financeiro se reveste,
nas entidades de previdência social, da especialização sob a forma de equilíbrio financeiro e
atuarial, este último substituindo o econômico pelas peculiaridades do fundo de pensão.
Esclarecem os mencionados economistas que:
"Quanto ao regime previdenciário, é importante diferenciar dois tipos de equilíbrio: financeiro e
atuarial:
• O equilíbrio financeiro leva em conta apenas os desembolsos e as receitas correntes dos planos,
somadas às provisões e outras reservas acumuladas.
• O equilíbrio atuarial exige, além disso, que os desembolsos futuros sejam compatíveis com as
expectativas de receitas. Dessa forma, o equilíbrio financeiro analisaria a solvência do plano e o
equilíbrio atuarial demonstraria a solvabilidade, que é a capacidade de sustentar a solvência no
futuro". 2 9
Ora, como também consta no mencionado parecer e na própria Exposição de Motivos que inspirou
o Dec. 3.721, importantes fatores demográficos e econômicos transformaram o contexto dentro
do qual a legislação deve ser aplicada, justificando-se, pois, a modificação do Dec. 81.204/78,
que estabeleceu a idade mínima de 55 anos para a aposentadoria, que não mais se coaduna com
as condições existentes no século XXI.
Assim, um grande número de empresas privadas fixou, para os fundos por elas patrocinadas, a
idade mínima de 60 anos, sendo idêntica a tendência do direito estrangeiro. 3 0
Há, pois, uma incontestável justificação econômica e social para as mudanças contidas no
decreto, que preenche todos os requisitos de constitucionalidade, legalidade e razoabilidade.
Fixadas as premissas acima, podemos concluir.
7. CONCLUSÕES
Em conclusão, reconhecemos:
a) A plena vigência da Lei 6.435/77, com cujo texto não conflita a EC 20, que, assim sendo, não a

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revogou. A situação é mais ou menos análoga à existente, na área bancária, em relação à Lei
4.595, de 31.12.1964 (LGL\1964\14), que não foi alterada pelo art. 192 da Constituição de 1988 e
continua em vigor.
b) É válido, por ser constitucional, legal e ter fundamentos razoáveis e adequados, o Dec. 3.727,
de 08.01.2001, cuja Exposição de Motivos comprova que foi baixado no exercício do poder-dever
do Governo Federal de modificar a legislação anterior (Dec. 81.240/78), diante das modificações
ocorridas no contexto demográfico e econômico do país no decurso de mais de vinte anos.
c) Que a aplicação imediata do decreto aos participantes do fundo que ainda não se aposentaram
não constitui violação de direito adquirido pelo fato de se tratar de regime institucional e de não
ter sido incorporado ao patrimônio do titular o direito correspondente, existindo simples posição
jurídica ou expectativa de direito, que não goza de garantia constitucional.
d) No caso, não estão preenchidos os requisitos estabelecidos pelo legislador ordinário na Lei de
Introdução, pois de acordo com a melhor doutrina referida no presente estudo:
d.1) os contratos são de adesão e dirigidos;
d.2) não devem os mesmos ser considerados como de prazo determinado, mas de execução
sucessiva, ou de aquisição sucessiva de direito, tendo em vista, inclusive, a liberdade de entrar e
sair do plano;
d.3) a condição existente é alterável a critério das autoridades competentes.

(1) NÓBREGA, Mailson da. Valor Econômico, de 20.02.2001, p. A10.

(2) LEITÃO, Miriam. O Globo, de 25.02.2001.

(3) JOBIM, Nelson. Parecer dado à Abrapp, em 20.10.1994.

(4) GOMES, Orlando. Parecer dado à Aplub em setembro, 1980.

(5) RTJ 115/379.

(6) RTJ 115/385.

(7) RTJ 115/389.

(8) RTJ 122/1.076.

(9) RTJ 122/1.077.

(10) RÁO, Vicente. O direito e a vida dos direitos. Rio de Janeiro : Max Limonad, 1960. v. 1, t. III,
n. 303, p. 462.

(11) RE 105.322-4-RS, rel. Min. Francisco Rezek, j. 11.04.1986, DJU de 16.05.1986, Ementário
1.419-3.

(12) RE 107.720-4-RS, rel. Min. Djaci Falcão, j. 03.06.1986, acórdão publicado no DJU de
1.º.08.1986, p. 12.892.

(13) RE 107.763, j. 30.06.1987, rel. Min. Sydney Sanches.

(14) PONTES DE MIRANDA. Comentários à Constituição de 1967, com a Emenda Constitucional 1


de 1969. 2. ed. São Paulo : Ed. RT, 1971. vol. V, p. 392.

(15) MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade. 2. ed., p.


152-153.

(16) RDA 2/100.

(17) ERE 113.923, RTJ, p. 570, transcrito no presente parecer.

(18) PONTES DE MIRANDA. Op. cit., p. 99.

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17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

(19) LIMA, Ruy Cirne de. Princípios de direito administrativo. Porto Alegre : Sulina, 1964. p. 58.

(20) MONTEIRO, Washington de Barros. Parecer de 21.12.1981 dado à Aplub.

(21) GOMES, Orlando. Parecer de setembro 1980.

(22) REALE, Miguel. Parecer de 21.01.1982.

(23) Parecer já citado.

(24) FRANÇA, R. Limongi. Direito intertemporal brasileiro. 2. ed. São Paulo : Ed. RT, 1968. p. 468.

(25) Art. 167, II, da Constituição de 1967 com a redação que lhe deu a EC 1, de 17.10.1969. No
mesmo sentido, o art. 37, XXI, da Constituição de 1988, conforme entendimento jurisprudencial,
que tivemos o ensejo de salientar (Arnoldo Wald, "O equilíbrio econômico e financeiro no direito
brasileiro". Estudos em homenagem ao Professor Caio Tácito, obra organizada pelo Min. Carlos
Alberto Menezes Direito . Rio de Janeiro, Renovar, 1997. p. 75 et seq.).

(26) WALD, Arnoldo. Op. cit., na nota anterior, p. 88 et seq.

(27) DRÜCKER, Peter F. The unseen revolution - how pension fund socialism came to america
publicado no Brasil sob o título A revolução invisível - como o socialismo fundo de pensão invadiu
os Estados Unidos. São Paulo : Livraria Pioneira, 1977.

(28) WALD, Arnoldo. A imunidade dos fundos de pensão e o mercado de capitais, parecer, 1994.

(29) NÓBREGA, Mailson da, CAMARGO, José Marcio e GUEDES FILHO, Ernesto Moreira. Parecer
sobre a mudança da idade mínima nos planos de previdência complementar determinada pelo Dec.
3.721/2001, datado de 1.º.02.2001.

(30) As informações se fundamentam no parecer referido na nota anterior.


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