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17/04/13 Envio | Revista dos Tribunais

À MARGEM DO NOVO CÓDIGO DO TRABALHO O


AVISO PRÉVIO

À MARGEM DO NOVO CÓDIGO DO TRABALHO O AVISO PRÉVIO


Doutrinas Essenciais de Direito do Trabalho e da Seguridade Social | vol. 3 | p. 1325 | Set /
2012DTR\2012\450836
Clovis Ribeiro Nogueira

Área do Direito: Geral

Sumário:

Revista dos Tribunais • RT 186/13 • jul./1950


As resilições bruscas do contrato de trabalho trariam, inevitavelmente, enormes prejuízos para a
parte colhida de surpresa. Por essa razão mesma, teve nascimento o instituto do aviso prévio,
acolhido em nossa legislação desde o Código Comercial. Coube, no entretanto, ao Código Civil
(LGL\2002\400) graduar o prazo do aviso prévio, de acordo com o seu art. 1.221.
Como se vê pelo citado dispositivo, o maior ou menor prazo do aviso prévio estava em relação ao
tempo transcorrido entre um pagamento e outro do salário. Assim, se o salário era fixado por
tempo de um mês ou mais, devia o aviso prévio ser dado com uma antecedência de oito dias; para
os que percebiam a remuneração semanalmente, tornava-se neces-sário um aviso prévio de
quatro dias; em se tratando, finalmente, dos contratados por menos de sete dias, bastava que o
aviso da dispensa fôsse dado de véspera.
Portanto, mesmo antes do advento dos novos princípios, que viriam abalar todo o arcabouço da
antiga escola liberal, já era o aviso prévio admitido pelos velhos códigos, oriundos da Revolução
Francesa.
Decorre daí que o aviso prévio não constitui uma conquista do moderno Direito do Trabalho, tendo
sido incorporado a êste como uma herança do antigo Direito Civil, embora sob novos fundamentos.
Nem por isso deixou de causar espécie o fato da lei 62, de 5 de junho de 1935, a qual pretendia
justamente introduzir em nosso meio os novos princípios jurídicos, ao dispor sôbre o aviso prévio,
revelar uma técnica inferior à do próprio Código Civil (LGL\2002\400).
Teve a lei civil, ao menos, o mérito de dispensar tratamento idêntico tanto ao empregador como
ao empregado, estabelecendo o mesmo prazo para o aviso prévio, quer partisse de um como de
outro, o mesmo ocorrendo com o Código Comercial. Na lei 62, porém, foi o empregado não
comerciário colocado em situação de manifesta inferioridade, pois, continuou a receber o aviso
prévio de acordo com os prazos estabelecidos pelo Código Civil (LGL\2002\400), que veio, assim,
em amparo da nova legislação, suprindo a sua lacuna, ao passo que ficou obrigado a conceder ao
empregador um aviso prévio de trinta dias.
Tal situação, como é evidente, não podia perdurar. Com o advento da Consolidação das Leis do
Trabalho, revigorado ficou o sistema de prazo idêntico do aviso prévio para ambas as partes do
contrato de trabalho.
Nesse ponto andou acertadamente o legislador da Consolidação, atendendo o equilíbrio de direito
existente no assunto, pois, como salienta Hirose Pimpão1 “o aviso prévio, pelo papel que lhe
reserva no concêrto das relações de trabalho, é um dêsses fenômenos raros, em que o empregado
ao mesmo tempo que tem direito a êle, tem obrigações com respeito a êle, o mesmo ocorrendo
com o empregador.”
Se a lei consolidada, no entretanto, merece encômios no que se refere à paridade de prazos, o
mesmo não se pode dizer quanto ao revigoramento do sistema de se graduar o aviso prévio de
acordo com o tempo transcorrido entre um pagamento e outro dos salários. Na verdade, razão
alguma existe, quer na prática como na doutrina, para a manutenção dês-se sistema. O motivo
determinante do aviso prévio, como pode se concluir com Luigi de Litala2 , reside na presunção de
que o empregado dispensado tem dificuldades para conseguir novo emprego e a atividade do
empregador sofre prejuízos com a impossibilidade da pronta substituição do empregado demitido.
Assim, nenhuma influência exerce sôbre êsses fatores a circunstância de perceber o empregado
por dia, semana ou mês. A mesma dificuldade de um trabalhador que receba mensalmente os seus
salários para conseguir novo emprêgo, poderá ter o que perceba por semana. E é inexata a
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afirmativa de que, recebendo semanalmente, tem o empregado a sua vida financeira mais bem
organizada. Na realidade, as dificuldades monetárias são as mesmas, quer se trate de empregado
que receba por semana, como por quizena ou mês. Igualmente, o fato de receber por semana não
torna o empregado mais facilmente substituível do que aquêle que perceba mensalmente.
Quanto ao fundamento jurídico da graduação do prazo do aviso prévio pelo tempo do pagamento,
parece que se assenta na tese de Rubem de Couder, citado por Bento de Faria, para o qual os
contratos de trabalho sem estipulação de prazo renovam-se continuamente, de pagamento a
pagamento. Assim, de acordo com essa tese, o aviso prévio constitui uma denúncia do contrato
de trabalho, feita sempre por ocasião do pagamento, implicando na sua não renovação, a partir do
próximo pagamento.3
Sem embargo de terem Sussekind-Lacerda-Viana aceito esse fundamento, ao admitirem que
“alguma razão assiste a tais autores, porque a estipulação do prazo para pagamento, constitui, a
nosso ver, um compromisso que se realiza em etapas sucessivas, não havendo como se negar que
tal compromisso, assumido antecipadamente, como cláusula contratual, se tornaria efetivo desde,
e sempre, o início de cada prazo, implicando a obrigatoriedade da terminação dêste, só depois da
qual se poderia falar em rescisão do contrato”,4 a verdade é que tal conclusão somente poderia
nascer, como de fato nasceu, antes do advento do moderno Direito do Trabalho. Atualmente, o
princípio da renovação sucessiva do contrato de trabalho por tempo indeterminado, de pagamento
a pagamento, é inaceitável, pois, se admitido faltaria apoio ao instituto da indenização por
despedida injusta. De fato, se o contrato de trabalho por tempo indeterminado se renovasse de
pagamento a pagamento, ao rescindi-lo o empregador, mediante o aviso prévio, ainda que o
empregado tivesse mais de um ano de serviço, sem o cometimento de qualquer falta grave, não
cometeria qualquer abuso de direito, razão pela qual não se justificaria a sua condenação ao
pagamento de uma indenização ao empregado despedido. Isso, no entretanto, não ocorre, porque,
de acordo com os princípios aceitos pela nossa legislação do trabalho, o tempo de serviço do
empregado, que tenha trabalhado continuamente sob o regime do contrato por tempo
indeterminado, é indivisível, gerando importantes direitos como, por exemplo, o da estabilidade no
emprêgo.
Não se justifica, portanto, a aceitação por parte da Consolidação do sistema adotado pelo Código
Civil (LGL\2002\400). Como se vê pelo art. 487 da Consolidação, esta se limitou a aumentar os
prazos do aviso prévio estabelecidos pelo art. 1.221 do Código Civil (LGL\2002\400), para três dias
se o empregado percebe diàriamente o seu salário; oito, se o pagamento fôr efetuado por semana
ou tempo inferior; e de trinta, nos demais casos. Foi, nessas condições, mantida a tradição da
legislação anterior, de se graduar o prazo do aviso prévio pelo tempo que medeia entre um
pagamento e outro do salário, tradição essa inteiramente condenável, como demonstramos.

Não pretendemos com isso avançar até o ponto onde chegou Barassi,5 para o qual o aviso prévio
deveria abranger todo o tempo em que o empregado permanecesse à procura de novo emprêgo,
somente cessando quando o trabalhador conseguisse, a final, nova colocação.
Da mesma maneira, de acordo ainda com o insigne jurista, somente poderia o empregado se retirar
definitivamente do emprêgo depois da admissão de um substituto por parte do empregador.
A nosso ver, a solução apontada se apresentaria como um verdadeiro ideal, caso não fôsse
impraticável devido às numerosas dificuldades que se antepõem à sua realização.
Resta, pois, a solução que se nos afigura como a mais acertada, a qual é encontrada na lei
italiana. O prazo do aviso prévio, segundo essa legislação, é graduado de acordo com o tempo de
serviço e a categoria do empregado.6
Não há dúvida que êsse sistema atende muito mais às realidades sociais. O empregado de
categoria elevada, ao ser dispensado, encontra, na maioria dos casos, dificuldades muitíssimo
maiores do que o simples operário para conseguir um novo emprêgo, pois tem que lutar contra o
fator confiança, enorme em seu caso, e se munir de tôda sorte de apresentações. Igualmente, ao
se retirar do emprêgo um trabalhador braçal, quase imediatamente consegue o empregador um
substituto. Tal, no entretanto, não acontece no caso de demissão de empregado de categoria
elevada, onde o fator confiança ou alta especialização exige uma cuidadosa seleção que, para ser
efetivada, requer um prazo mais ou menos longo.
Daí decorre que seria salutar a introdução dêsse sistema no futuro Código do Trabalho, o qual
poderia estabelecer uma graduação do prazo do aviso prévio de acordo com as diferentes
categorias, tendo em vista a escala hierárquica, e o tempo de serviço do empregado.

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1 Hirose Pimpão, “O Aviso Prévio”, pág. 58.

2 Luigi de Litala, “El Contrato de Trabajo”, edição arg., pág. 298.

3 Bento de Faria, “Código Comercial Brasileiro (LGL\1850\1)”, 3.ª ed., pág. 104.

4 Sussekind-Lacerda-Viana, “Direito Brasileiro do Trabalho”, Rio, 1943, 2.º vol., pág. 420.

5 Ludovico Barassi, “II Diritto dei Lavoro”, Milão, 1936, 2.º vol., pág. 410.

6 Luigi de Litala, Obra citada, pág. 301.


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