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TEMA II. CLASSIFICAÇÃO DOS MÉTODOS E TÉCNICAS EM CIENCIAS SOCIAIS.

Já nos referimos para que uma ciência seja considerada como tal deve possuir um objecto

de estudo e método. Estes dois elementos constituem os pressupostos fundamentais,

basilares para se construir um ramo do conhecimento científico. Além destes elementos,

importa realçar que há outros factores que concorrem para construção de um campo

científico como um saber autónomo e independente, entre os quais, destacamos o corpus

teórico que enquadra os utensílios conceptuais, as teorias, as perspectivas de abordagem.

Ora, neste tema vamos abordar a problemática do conhecimento científico em ciências

sociais, a questão relacionada com a objectividade em ciências sociais, para que entendemos

a especificidade das ciências sociais; apresentaremos alguns elementos para ultrapassar os

obstáculos epistemológicos impostos à análise dos fenómenos sociais. Outrossim, faremos

uma incursão aos métodos e técnicas mais usuais em sociologia, para possamos nos

familiarizar com os procedimentos metodológicos típicos da disciplina sociológica.

2.1. Conhecimento Científico em Ciências Sociais.

Falamos no capítulo anterior, de conceituação de ciência e seus aspectos característicos. As

ciências sociais foram os últimos saberes autonomizarem-se da filosofia. Já as ciências

físicas – naturais terão sido as primeiras a se libertar e, em seguida, a estabelecer o

paradigma daquilo que se poderia considerar como ciência. Dada a natureza do objecto das

ciências exactas e naturais, ou seja, as ciências que se situam a nível do conhecimento

cientifico inorgânico e orgânico, permite que haja um maior distanciamento entre o sujeito e

o objecto no âmbito do processo de investigação, por outras palavras, não há uma coincidência

entre o sujeito e objecto que se conhece. A título de exemplo, o químico que analisa a

composição da agua não é oxigénio, o biólogo que analisa micróbio não é micróbio, o

lepidopterologista que analise a borboleta não é borboleta, o ictiólogo que analisa o peixe não

peixe. Contudo, em ciências sociais há uma aproximação entre o sujeito e objecto do

conhecimento, uma vez que o economista que estuda a sociedade é consumidor ou produtor,

o politólogo é cidadão, o sociólogo é membro de uma sociedade.

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O conhecimento científico das ciências sociais tem maior probabilidade de se revestir de

senso comum e de ideologia, por causa da coincidência que existe entre o sujeito e objecto a

ser investigado.

Convém neste momento distinguir o senso comum do conhecimento científico que se

fundamenta no senso crítico.

O conhecimento do senso comum não procura explicar os fenómenos na sua profundidade,

baseia-se nas aparências, na primeira impressão que tem do fenómeno. É um conhecimento

acrítico, amétodico, imediatista, crédulo, não problematiza a relação sujeito objecto, não faz

nenhuma abordagem sistemática e metódica com vista a verificação dos factos e da

realidade.

Ciência é um conjunto sistematizado de conhecimentos explicados e relacionados. A ciência

interessa a descoberta de leis para os fenómenos (instrumentos teóricos de explicação),

estabelecimento de relações necessárias entre os factos. Outrossim, o conhecimento

cientifico as suas conclusões são provisórias, não dogmáticas, reformáveis, revogáveis,

fundamenta a sua análise no método e as suas teorias e concepções tem de ter validade

cientifica.

2.2. Objectividade em Ciências Sociais.

A preocupação com a objectividade é inerente ao conhecimento científico e todas as ciências

preocupam-se atingi-la. Por objectividade podemos entender a preocupação de explicar a

realidade tal como ela é, e não como gostaríamos que fosse. A título de exemplo 1+1=2 é um

conhecimento objectivo, porque este resultado é o mesmo para um muçulmano, cristão ou

hindu.

Há uma particularidade no questionamento sobre a objectividade das ciências sociais, pelo

facto de coincidir o objecto e sujeito no processo de investigação. O cientista social é um

ser social que possui também crenças, valores, ideologias politicas e cresce no ambiente que

influencia a sua maneira de pensar, agir e sentir, ou seja, a sua visão do mundo. Este facto

torna mais provável que seja mais difícil de conseguir objectividade em todas as ciências

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sociais do que nas ciências naturais, pois os homens carregam inevitavelmente ao estudo de

si mesmo e da sua sociedade um conjunto de ideias quer lhes podem influenciar as

observações e conclusões. Como afirma Ely Chinoy (1989:27) « porque os homens adquirem

necessariamente, grande número de ideias e opiniões à proporção que crescem e se


convertem em membros de adultos da sociedade, os sociólogos trazem às suas investigações
uma séria de ideias preconcebidas que precisam eliminar ou controlar a fim de evitar

observações eivadas de preconceitos ou interpretações falseadas de seus descobrimentos».

No sentido dos investigadores aprenderem a controlar as influências ideológicas e do senso

comum1, estabeleceu-se um conjunto de princípios para atingirmos a objectividade. Eis os

princípios:

 A neutralidade ética: o sociólogo não é um indivíduo eticamente neutro, pois ele

pertence há um determinado grupo, possui normas e valores que adquiriu no seio do

seu grupo de pertença que vão orientar e guiar a sua vida social a todos os níveis.

Assim, o pesquisador não deve permitir que seus valores pessoais influenciem a sua

pesquisa, deverá abster-se de emitir juízos de valor., deverá registar os dados de

uma maneira não tendenciosa.

 O antidogmatismo: deve-se rejeitar as verdades absolutas, isto quer dizer que o

cientista social não poderá partir do princípio que existem verdades incontestáveis,

irrevogáveis, irreformáveis ou dogmas. Assim, os conhecimentos adquiridos a partir

da prática, da investigação científica deverão ser sempre questionados,

problematizados e revisados.

 A consciência dos preconceitos: os preconceitos podem ser definidos como um juízo

feito sobre um grupo antes de qualquer experiência ou análise. Os preconceitos são

ideias feitas que se tomam por absolutas, indiscutíveis, inavaliáveis pela análise

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O senso comum constituiu o conjunto de crenças, representações, noções de julgamento quotidianas caracterizado
pelo sentido acrítico, amétodico, assistemático, ingénuo. É um conhecimento que se contenta com as aparências,
não problematiza, não teoriza, não faz um questionamento profundo da realidade. Em síntese as ilusões de
transparência ilustrada pelo senso comum, se resume nos seguintes obstáculos epistemológicos:
 Obstáculos individualistas: Refere-se aquelas dimensões da vida em que os indivíduos pensam exercer
opções e decisões verdadeiramente livres. Ou seja, tendem atribuir a causalidade e ou condicionamento da
acção única e simplesmente ao indivíduo.
 Obstáculos naturalistas; Trata-se de naturalizar a complexidade dos fenómenos sociais.
 Obstáculos etnocêntricos; Refere-se em considerar como normal os nossos padrões e medir os outros a
partir dos nossos padrões de comportamentos, valores e sistemas crenças.

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científica. Há preconceitos de toda espécie (de raça, de sexo, de classe, de profissão,

de religião, de civilização).

A capacidade de alcançar a objectividade em ciências sociais depende da forma como

indivíduos e em particular os estudantes vão familiarizar – se com as teorias e pressupostos

metodológicos da disciplina, como afirma Ely Chinoy «a objectividade cientifica em relação

ao homem e a sociedade exige certo conhecimento das preferências e crenças do observador

e pode ser substancialmente facilitada pelo corpo ideias, conceitos e teorias que ele utiliza

na observação e na interpretação dos dados que colige. A objectividade, portanto, pode

nascer do próprio estudo sociológico. A familiaridade com os dados sociológicos e o

sistemático adestramento na natureza e nos métodos da investigação sociológica nos

possibilitam, potencialmente, não só controlar nossos preconceitos pela consciência que

temos dele, mas também contornar nossas ideias preconcebidas encarando os fenómenos

sociais por um prisma diferente. Ao examinamos a estrutura e o funcionamento de outras

sociedades podemos lograr uma perspectiva mais clara da nossa. Ao examinarmos nossa

sociedade talvez nos vejamos com mais clareza em relação ao mundo em que vivemos ».

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