Você está na página 1de 29

IMCS

I. A Ciência como forma particular de conhecimento: Construção Científica


e Rutura com o Senso-Comum (PPT1)

1. Realidade e Conhecimento sobre a realidade

1.2. O conhecimento científico como interpretação sobre a realidade e sua evolução

O modelo racional que baseia a e fundamenta toda a ciência moderna e a nossa ideia
do que é a ciência, constitui-se a partir do século XVI e foi desenvolvido nos séculos
seguintes, sobretudo no que se refere às ciências exatas e naturais.
É só no século XIX que tal modelo se estende às ciências sociais, então emergentes.
Como nos diz Alan Chalmers na obra What is this thing Called Science?, a opinião popular
nas sociedades modernas é a de que ciência, objetividade e rigor são uma e a mesma
coisa.
Esta conceção, embora esteja a sofrer algumas alterações na atualidade, está
profundamente enraizada nas descobertas científicas e no próprio método científico
desenvolvidos após o século XVI.

1.3. O conhecimento como construção e abstração

A observação dos fenómenos na realidade, depende de muitos fatores:


➢ Da teoria utilizada;
➢ Da cultura onde observador e fenómeno observado se inserem;
➢ Das expectativas do observador;
➢ Das suas próprias e subjetivas experiências.

É devido a esta relativização do método científico que, atualmente a ciência é cada vez
mais posta em questão.
Se na ciência clássica a natureza (e o mundo em geral) era concebida como um
autómato, uma máquina, explicada por leis matemáticas, da qual se julgava o
observador ausente (ou seja, não interferia no que observava), hoje em dia ela situa
também o Homem, e o protagonista da observação na realidade que estuda e pretende
explicar.
De certa forma, podemos considerar que a ciência se humanizou e se fragmentaram as
formas de conhecimento científico porque a realidade não é completamente
apreendida de um só modo e a partir de uma só perspetiva.
Mas o que é a verdade? Não será a verdade, mesmo no domínio da ciência, algo relativo,
dependente de condições mais vastas do que a metodologia utilizada pelo cientista?
Tal como nos diz Thomas Khun nas frases finais do seu livro A Estrutura das Revoluções
Científicas:
«O conhecimento científico, tal como a linguagem, é intrinsecamente propriedade de
um grupo ou não é nada. Para o compreendermos teríamos de reconhecer as
características particulares do grupo que a criou e utiliza».
Progresso científico segundo Khun:

Pré-Ciência Ciência Normal Crise Nova Ciência Normal

(…) Nova Crise

Para Khun o conhecimento científico avança através da rutura do conhecimento


anterior, a ciência não se pode desenvolver apenas pelo conhecimento, mas tem de
ter em conta a sociedade.
«a natureza da revolução científica que hoje atravessamos é estruturalmente diferente
da que aconteceu no século XVI. Sendo uma revolução científica ocorre numa sociedade
ela própria revolucionada pela ciência, o paradigma a emergir dela pode não ser apenas
um paradigma científico (o paradigma do conhecimento prudente), tem de ser também
um paradigma social (o paradigma para uma vida decente)»

2. Conhecimento de Senso Comum e conhecimento científico

2.1. As várias formas de interpretação sobre a realidade (filosóficas, religiosas,


estéticas, de senso comum, etc.)

Senso comum: Conhecimento prático, proveniente da experiência do quotidiano.


Religião: Conhecimento dogmático, fundamentado em normas subjetivas articuladas
num determinado pensamento.

Ideologias: Conhecimento dogmático, fundamentado em normas subjetivas articuladas


num determinado pensamento.
Estas interpretações não são:
❖ Abordagens próximas da realidade;
❖ Idênticas às abordagens que a ciência faz de um dado fenómeno;
❖ Abordagens com a mesma validade da ciência;
❖ Não se regem estas abordagens pelos mesmos critérios que a atividade científica.

Isto porque não são abordagens isentas, porque não estão sustentadas por métodos
e técnicas de construção, porque não têm subjacente a preocupação de analisar
objetivamente a realidade.

É precisamente essa necessidade de apropriação e questionamento do real, através de


um conjunto de métodos e técnicas apropriados e rigorosos, que confere à ciência o
seu estatuto de forma de conhecimento que mais se aproxima da verdade. O
conhecimento científico é a única forma relativamente isenta de abordar a realidade.
«A ciência é suscitada por procuras sociais, resultantes da necessidade de apropriação
cognitiva e prática do real» - João Ferreira de Almeida e José Madureira Pinto
«a realidade é silenciosa, torna-se indispensável questioná-la para produzir respostas».

O que é a Ciência?

➢ Racional: apoia-se em métodos e técnicas rigorosos e objetivos de observação


dos fenómenos reais;

➢ Empírica: testa teorias/hipóteses de trabalho, através da observação da


realidade, pela experimentação;

➢ Geral: utiliza factos para testar teorias e utiliza teorias gerais para fazer previsões
acerca de determinados fenómenos;

➢ Cumulativa: avança através de ruturas com o conhecimento anterior. As


conclusões científicas são testadas e concretizadas, através de tentativas.

De forma a sintetizar a natureza cumulativa do conhecimento científico, podemos recorrer às


palavras do sociólogo Boaventura Sousa Santos, no livro Um discurso sobre as ciências.
Escrevendo em 1985, dizia que:

«Estamos a 15 anos do final do século XX. Vivemos num tempo atónito, que ao debruçar-se
sobre si próprio descobre que os seus pés são um cruzamento de sombras. Sombras que vêm
do passado que ora pensamos já não sermos, ora pensamos nunca termos deixado de ser.
Sombras que vêm do futuro, que ora pensamos já sermos, ora pensamos nunca virmos a ser»
Nenhuma ciência se constitui como ciência sem ter um objeto de estudo. Assim, na
maior aproximação ao conhecimento da realidade, podemos dizer que cada ciência
produz o seu próprio objeto científico.
A base de construção do objeto científico ou objeto de estudo é semelhante aquela
que se encontra subjacente ao reconhecimento e utilização dos objetos com que
diariamente lidamos.
Todos os dias lidamos com objetos diversos que somos capazes de reconhecer e de
identificar, na medida em que sobre eles possuímos já imagens construídas. Estas
imagens são o nosso código de leitura da realidade que nos rodeia, são aquilo que
atribui significado ao que nos rodeia.
A ciência é precisamente uma outra forma de ler a realidade. A leitura científica da
realidade pressupõe uma rutura com aquilo que é evidente, ou seja, a ciência utiliza
um novo código de leitura da realidade, código esse que varia de acordo com a sua
abordagem da própria realidade. A leitura que a Economia faz de certos fenómenos
não é a mesma que a Sociologia.
O objeto científico é assim construído em função da natureza dos problemas que
cada ciência se propões estudar.
A ciência transforma os objetos reais em científicos através de um processo de
construção próprio dos problemas e temas a que se dedica.

Podem-se distinguir:

Objeto Real – aquele que de facto existe e de que raramente possuímos total
consciência.

Objeto Apreendido – aquele que é percecionado pelos nossos sentidos, sob a


forma de imagens, associadas a valores e a conceitos que possuímos. Este objeto
surge espontaneamente como real e garante-nos a transparência das coisas, ao
nível da linguagem e da compreensão.

Objeto Científico – é uma tradução específica, conceptual do real. É um objeto


que tem normas próprias de construção, variáveis de acordo com as diversas
ciências. É construído através de métodos e técnicas específicas. É diferente em
natureza do objeto real e em grau de complexidade do objeto apreendido.
Na Construção do Objeto de Estudo é importante traduzir os objetos apreendidos em
objetos científicos:
✓ Através do domínio do conhecimento científico produzido na mesma área ou áreas
semelhantes.
✓ Definir com precisão os conceitos com que trabalhamos: o que significam os
conceitos no âmbito da nossa investigação.
✓ Identificar os critérios e parâmetros utilizados para medir os conceitos com que
trabalhamos: de que fatores vamos fazer depender a nossa análise? Como vamos
perguntar o que queremos saber e precisamos de saber aos inquiridos?
✓ Ter sempre em conta estudos anteriormente elaborados na mesma área ou áreas
semelhantes

3. Necessidade de Instrumentos de Rutura com o senso-comum em Ciências Sociais


3.1. O senso-comum como obstáculo ao conhecimento científico

«O Homem não pode viver no meio de coisas sem fazer delas ideias, segundo as quais
regula o seu comportamento».

➢ Tais ideias são: «produto da experiência vulgar e têm antes de tudo como objetivo
pôr as nossas noções em harmonia com o mundo que nos rodeia, são formadas pela
prática e para ela (…). Uma representação pode ser capaz de desempenhar
utilmente este papel, sendo ao mesmo tempo teórica ou cientificamente falsa».

✓ O maior obstáculo à análise científica é a ilusão que temos de que a realidade é


transparente e familiar estando por trás de uma resistência profunda que provém
“da nossa ligação à crença de que os factos sociais são comandados por uma ordem
superior, metassocial” (Alain Touraine).

✓ A regra metodológica que Durkheim propôs, “explicar o social pelo social”, constitui-
se como uma das regras chave para superar os obstáculos do senso comum,
sobretudo se for entendida como a afirmação de que não existem elementos
metassociais que possam dar cientificamente conta dos fenómenos sociais.

Segundo Augusto Santos Silva (1987), existem 3 níveis a que podem ser colocados
obstáculos ao conhecimento científico-social:
➢ Senso comum, as ramificações mais imediatas e espontâneas sobre a realidade.

➢ As conceções mais elaboradas, que se enquadram em formações ideológico-


doutrinárias precisas (Exemplo: religiões, ideologias políticas, veganismo).

➢ As ramificações de umas e de outras no interior de disciplinas científicas


consolidadas (Exemplo: Teorias Marxista, Liberal).
Para clarificar estes três níveis, há 3 questões que, segundo Augusto Santos Silva, são
determinantes ao nível do senso-comum e que como tal, constituem obstáculos
importantes para a formação de conhecimento no âmbito das ciências sociais:

❖ As relações entre natureza e cultura – ou naturalismo


❖ As relações entre individuo e sociedade – ou individualismo
❖ As relações entre ‘nós’ e os ‘outros’ – ou etnocentrismo

3.2. Crítica de Algumas interpretações de senso-comum sobre a realidade

Explicar o social pelo social

Para explicar um determinado fenómeno social devemos apenas usar aspetos sociais,
tudo aquilo que não é social não entra nesta regra, no entanto, atualmente, sabe- se
que isso não é bem assim - problemas naturais, ambientais influenciam a organização
da sociedade, a forma como as pessoas se relacionam umas com as outras e com os
recursos naturais/ambiente.

Esta regra implica:

➢ Que a razão de ser dos factos sociais deve ser procurada (e explicada) em (e por)
outros factos sociais;
➢ Que não existe nenhuma ordem superior, metassocial, que permita dar conta, do
ponto de vista científico, dos fenómenos sociais;
➢ A permanente relativização das propriedades dos factos/fenómenos sociais e a
afirmação de que estes são sempre explicáveis através de sistemas lógicos de
relações entre aquelas propriedades.

Através desta regra, põe-se frequentemente em causa alguns dos mais enraizados
preconceitos e algumas características das ideologias mais correntes, decorrentes do
naturalismo, individualismo e etnocentrismo.
Segundo Augusto Santos Silva (1987) é porque reconhecemos que o trabalho científico
implica elementos de senso-comum e elementos ideológicos, que podemos afirmar
também que:

➢ é possível designá-los e reconhecê-los, assim como à sua influência na formação do


conhecimento científico;

➢ é possível pô-los à prova pela análise científica e, assim, exercer sobre eles, uma
permanente vigilância crítica;

➢ tais elementos são, eles próprios, transformados pela prática científica, que
condicionam.

Rutura do senso-comum

➢ Não constitui um trabalho realizado e em absoluto nas fases iniciais de qualquer


investigação científica, nem uma operação terminológica.
➢ Representa um processo contínuo e sempre inacabado.

Distinção de atos metodológicos e epistemológicos que permitem a rutura com o senso


comum e com as ideologias, no processo de produção do conhecimento científico:

❖ Rutura com as evidências do senso comum que possam constituir-se como


obstáculos ao processo científico;
❖ Construção do objeto de estudo e a determinação das teorias científicas que podem
explicá-lo;
❖ Verificação da validade dessas teorias, através do seu teste, ou seja, do seu
confronto com a observação empírica.

A própria atitude científica e a sua capacidade problematizadora são os


instrumentos fundamentais da rutura com o senso comum e as ideologias.
Sistematizando esses instrumentos:

Relativização dos fenómenos sociais- ao demonstrar que os fenómenos sociais não


podem ser imputados a qualquer entidade absoluta ou explicados através de
propriedades universais e só podem ser explicados num determinado tempo e
espaço e nos contextos históricos e sociais em que se produzem (Exemplo: o social
deve ser explicado pelo social);

Relacionação dos factos- Os factos sociais só podem ser explicados por sistemas de
relações entre eles e não de forma isolada;

Análise científica das conceções de senso comum- a pesquisa científica pode tornar
as conceções de senso-comum e as formulações ideológicas em objeto de análise
(Exemplo: pode submetê-los aos seus próprios mecanismos de controlo).

--------//-------

II. A Unidade do Social e a Pluralidade das Ciências Sociais

1. Formação e desenvolvimento histórico das ciências sociais – breve apontamento

Há Unidade quanto ao objeto de estudo genérico das Ciências Sociais - A Realidade


Social, mas existe Diversidade quanto aos modos de abordagem e às explicações
teóricas de cada uma das disciplinas que integram as ciências sociais.

Disciplina B

Disciplina A Disciplina C

Realidade Social

Disciplina F
Disciplina “n”
Disciplina E

Realidade é só uma e, por isso, podemos dizer que a realidade social também é uma.
Os contributos mais relevantes para a formação de noção de sociedade e para a sua
análise partiram de autores como:

❖ Montesquieu - procurou compreender os regimes políticos relacionando-os com


as totalidades sociais em que surgiam e insistindo sempre na interdependência
dos factos humanos. Propôs ainda a formulação de leis científicas para
compreender os regimes políticos.

❖ Adam Ferguson - estabeleceu princípios que se tornaram essenciais para o


desenvolvimento social:
➢ no estudo dos grupos reside a forma mais correta de abordar a realidade
social, porque os comportamentos individuais são socialmente
determinados/condicionados;

➢ a análise dos comportamentos sociais e dos grupos sociais deve integrar a


observação empírica.

Em termos de método, poderemos dizer que as ciências sociais nasceram sob a égide
metodológica das ciências naturais e exatas. Este modelo de racionalidade científica
parecia, à luz da história da ciência, ser o único capaz de dar origem ao conhecimento
científico. É um modelo racional, que se baseava na tentativa de estabelecer
generalizações e leis, sustentadas nas sequências e regularidades manifestadas pelos
fenómenos observados e submetidos a experiências.

Em meados do século XIX, mais precisamente em 1839, Auguste Comte escreveu e


publicou a obra intitulada Cours de Philosophie Positive, em que aplicava justamente o
método positivista ao estudo dos fenómenos sociais. Auguste Comte é também
considerado o pai da Sociologia ou como o próprio dizia de uma espécie de física social.

Nos finais do século XIX, em 1895, Émile Durkheim escreve as Regras do Método
Sociológico. Nesta obra referia a necessidade de analisar os factos sociais como coisas,
reforçando o princípio de exterioridade e constrangimento dos factos sociais
relativamente ao indivíduo. Nesta obra foram lançadas as primeiras regras
metodológicas da sociologia, como o princípio já nosso conhecido – explicar o social pelo
social.

No início do século XX, Max Weber alarga a perspetiva sociológica à análise da interação
social e do sentido da ação social, refletindo sobre essa perspetiva tendo em
consideração também a economia e a história. Max Weber propunha igualmente um
método de análise do social, mais compreensivo, contrariando e abandonando a
perspetiva positivista na análise dos fenómenos sociais.
2. A diferenciação teórica das ciências sociais

Fenómenos Sociais Totais (Marcel Mauss)


São fenómenos que, seja na sua estrutura própria, seja nas suas relações e
determinações, possuem implicações simultaneamente em vários níveis da realidade
social e em diferentes dimensões dessa mesma realidade. Sendo suscetíveis de
interessar a várias ciências sociais.

Esta definição permite estabelecer dois princípios:


➢ Qualquer fenómeno é sempre complexo e pluridimensional e pode ser apreendido
através de ângulos distintos e perspetivas diversas;

➢ Todo o comportamento social remete para uma totalidade.

As ciências sociais distinguem-se entre si, basicamente porque (não se distinguem pela
realidade ser diferente, mas por se centrarem em partes diferentes da mesma
realidade):
❖ Possuem fins/objetivos diversos;
❖ A natureza dos problemas estudados por cada uma é diferente;
❖ Os critérios de delimitação desses problemas são diferentes;
❖ As matrizes teórico-explicativas são também diversas;
❖ Possuem métodos e técnicas de abordar a realidade que são também diferentes e,
logicamente, adaptados aos problemas estudados por cada uma delas.

3. O leque das Ciências Sociais


III. A lógica da investigação científica em ciências sociais: da Teoria à
Investigação Empírica

1. Problemática teórica, problemas e meios de investigação

Teorias: sistemas de conceitos e relações entre conceitos que, por se referenciarem


mais ou menos diretamente aos objetos e processos reais, podem ser designados
como substantivos. Em sentido lato, designa a matriz de conhecimentos que são
produzidos e validados e a que se pode recorrer no âmbito de uma dada disciplina
científica. Já em sentido restrito, remete-nos para subconjuntos de conhecimentos
que são produzidos no âmbito de uma disciplina científica.

Métodos/Estratégias de Investigação: conjuntos de procedimentos no âmbito de


uma dada disciplina científica. Compete-lhe a seleção das técnicas por referência ao
objeto de estudo e à teoria que o enquadra. Também lhe compete o controlo das
condições úteis de exercício/aplicação das técnicas, tendo por objetivo a obtenção
dos resultados e a relacionação desses resultados na perspetiva da obtenção do
resultado final. A cada pesquisa científica corresponde a sua própria estratégia que,
evidentemente, se inscreve no método mais geral de cada disciplina científica.

Técnicas de Investigação: conjuntos de procedimentos operatórios que se destinam


a produzir resultados. As técnicas disponíveis no âmbito das ciências sociais são
diversas:

O formato que cada uma destas técnicas assume em cada investigação científica está
extremamente dependente das hipóteses colocadas e dos conceitos (variáveis e
indicadores) que as integram. Estes conceitos desdobram-se em variáveis e em
indicadores. Quando, como acontece na maior parte das investigações científicas, é
necessário proceder ao teste empírico (i.e. ao confronto com a realidade, à recolha da
informação, para o teste das hipóteses) há necessidade de construir indicadores (ou
índices). Estes são igualmente conceitos, mas possuem menor complexidade e menor
abstração e por isso mesmo mostram-se mais capazes de abordar operacionalmente a
complexidade e a diversidade do fenómeno em análise.

2.1. Da linguagem teórica operacionalização dos conceitos

Procedimento metodológico (o processo de investigação científica não tem de seguir


exatamente a ordem descrita):

Etapa Preliminar- a preparação da investigação:


❖ A ideia da pesquisa;

❖ Os objetivos da pesquisa;

❖ A construção do objeto de estudo;

❖ A delimitação do objeto de estudo (estabelecimento de critérios que delimitam a


investigação/definição da população-alvo do estudo);

❖ A definição de hipóteses de investigação;

❖ A tradução das hipóteses em indicadores- a operacionalização dos conceitos;

❖ A construção da amostra.

Etapa Intermédia- a recolha da informação:


❖ A preparação do instrumento de recolha de informação;

❖ O trabalho de campo- a aplicação do instrumento de recolha de informação à


população-alvo ou amostra.

Etapa Final- a análise e apresentação dos resultados:


❖ Interpretação e análise da informação recolhida;

❖ Os efeitos da investigação.
Hipóteses

O estabelecimento de hipóteses é um dos mais importantes passos da investigação


científica, sendo estas, conclusões esperadas da pesquisa, uma antecipação das
conclusões que podem ser ou não validadas no final da investigação.

As hipóteses são sempre colocadas como afirmações, nas quais existe sempre a questão
a que queremos responder e a respetiva resposta.

Contém assim:
O que queremos explicar (a questão);
O que pensamos que explica o que queremos explicar (a resposta).

Assim, numa hipótese existe sempre uma relação entre o problema que queremos
investigar e a possível solução.

Operacionalização dos conceitos

A operacionalização dos conceitos constitui um passo muitíssimo importante para a


construção de técnicas de recolha e análise de dados, antecedendo o teste das hipóteses
através da observação empírica.

Operacionalizar significa transformar os conceitos no sentido de com eles ser possível


trabalhar na recolha e análise de informação, ou seja, tornar os conceitos trabalháveis.
Sendo, então, decompor os conceitos teóricos abstratos em variáveis e indicadores, no
sentido de encontrar o melhor modo de medir as dimensões do nosso problema para
testar as hipóteses de investigação através da observação empírica.

Conceitos
Noções formais e lógicas acerca dos fenómenos que analisam, aquilo em que as teorias
assentam e que, permite construí-las e consolidá-las.

Variáveis
Noções logicamente construídas para estabelecer a diversidade interna dos conceitos
e que podem ser empiricamente observadas e medidas. As variáveis são as dimensões
empíricas dos conceitos e podem possuir vários valores ou indicadores.

Indicadores
Noções utilizadas para designar e distinguir diferenças dentro das variáveis.
✓ Os conceitos, as variáveis e os indicadores podem ser independentes ou
dependentes, consoante o papel explicativo que têm na hipótese ou hipóteses de
trabalho e, consequentemente, na investigação.

➢ Independentes: são aqueles que explicam o fenómeno que estamos a analisar;


➢ Dependentes: são os que se pretendem explicar.

2.1.2. Tipos de Variáveis

Variáveis
“Variável é um conceito operacional e classificatório que, através da partição de um
conjunto teoricamente relevante assume vários valores” Almeida e Pinto (1981).

Podemos distinguir:

➢ Variáveis Dicotómicas: correspondem apenas dois valores (Exemplo: sexo- feminino


ou masculino).
➢ Variáveis Contínuas: podem assumir uma infinidade de valores (Exemplo: idade).
➢ Variáveis Classificatórias: situam-se entre o primeiro caso e o segundo, ou seja,
assumem mais de dois valores mas sempre um número finito e não muito elevado.

→ Nos questionários temos variáveis classificatórias (perguntas fechadas) enquanto que


nas entrevistas temos variáveis contínuas (perguntas abertas).

→ Se colocar a variável idade em intervalo, esta deixará de ser contínua e passará a


classificatória.

➢ Variáveis qualitativas (as mais frequentemente usadas nas ciências sociais) – as que
não têm um conteúdo numérico.

➢ Variáveis quantitativas - aquelas que se traduzem em números.

~
2.1.3. Construção de variáveis e escalas de medida

Escala Nominal (Variáveis do tipo qualitativo- variáveis dicotómicas classificatórias)


Existem variáveis que se limitam a estabelecer uma categorização de um dado objeto
sem que se pretenda efetuar operações aritméticas sobre os valores atribuídos aos
indicadores que essa variável pode assumir (Exemplo: sexo, estado civil). Nestas
variáveis os números atribuídos aos valores constituem meros sucedâneos das
designações verbais desses valores, situando-se, pois, ao nível mais elementar da
medida. Não se estabelece qualquer tipo de relação entre elas.

Os valores assumidos pela variável são exclusivos e não relacionados.


Esta escala tem como propriedades formais a simetria (A=B então B=A ou se A≠B então
B≠A) e a transitividade (A=B e B=C então A=C ou se A≠B e B≠C então A≠C).

Escala Ordinal (Variáveis do tipo qualitativo- variáveis classificatórias)


Mantém-se a caraterística da escala nominal (exigência básica de qualquer
procedimento de classificação- construção de categorias/indicadores exaustivos e
mutuamente exclusivos) acrescida a outra caraterística- a ordenação.

Neste caso, os números não têm de ser apenas diferentes, para nos permitir distinguir
os valores assumidos pela variável, eles têm de ser também maiores ou menores,
consoante a posição relativa que ocupam (Exemplo: nível de concordância com a
despenalização das drogas leves em Portugal).

Não permite que se comparem diferenças de concordância em termos aritméticos.

As propriedades formais desta escala são a transitividade e a anti-simetria.


Escala de Intervalo e Escala de Proporções (Variáveis do tipo quantitativo-
variáveis contínuas)

Uma Escala de Intervalo implica tanto a ordenação dos valores assumidos por uma dada
variável como também informação acerca da grandeza das diferenças entre esses
valores (Exemplo: Temperatura). Nesta escala o ponto zero é convencional e arbitrário.

A Escala de Proporções distingue-se da anterior porque exige a existência de um zero


absoluto (Exemplo: Rendimento do Agregado).

2.2. A Observação em Ciências Sociais como relação Social

O problema da validade da medida decorre de vários aspetos:

➢ Dos fatores relacionados com os aspetos sobre os quais as ciências sociais se


debruçam (a sua complexidade que torna muito difícil a delimitação do campo em
que se trabalha e ainda o caráter dinâmico da realidade social);

➢ Fatores relacionados com as teorias disponíveis para explicar os fenómenos que se


analisam. As teorias são frequentemente generalistas, são insuficientes em
conceitos de nível operacional.

➢ Fatores relacionados com os procedimentos técnicos utilizáveis (dificuldade que


advém da insuficiente possibilidade de repetição das medidas e da ausência de
instrumentos estandardizados de medida)→ Problema da fidelidade da medida:
serão fiéis e confiáveis as observações realizadas por observadores diversos sobre
os mesmos objetos, se essas observações forem concordantes.
A questão da objetividade está estreitamente associada ao facto de que toda a
observação realizada no âmbito das ciências sociais é antes de tudo uma relação social.

➢ Por um lado, os cientistas sociais são indivíduos que vivem num determinado
contexto social, que observam outros indivíduos do mesmo ou de outro(s)
contexto(s) social(ais). Isto significa, portanto, que qualquer relação que se
estabeleça entre o cientista-observador e o observado é sempre uma relação social.
Como em qualquer relação social, o observador possui frequentemente expectativas
quanto ao observado e este também as possui relativamente ao observador ou à
pesquisa que este representa.

➢ O observado adota com frequência várias atitudes que podem interferir no processo
de observação: por exemplo, pode querer impressionar o observador (dando a
resposta que julga ir mais ao encontro da opinião da do investigador); pode querer
ainda tirar partido da situação (dando um tipo de resposta que não revela a sua
opinião, mas que vá de encontro ao proveito que pensa poder tirar da investigação);
pode ainda não se querer revelar a um estranho fornecendo, assim, respostas
radicalmente diferentes da sua opinião ou situação, etc.
Pelo simples enunciar destes entraves à observação parece óbvio que algumas vezes
esses entraves podem comprometer a validade e a fiabilidade das investigações
científicas, dado que impedem a medida da realidade social.

IV. Métodos e técnicas em ciências sociais: o problema da recolha da


informação

1. Proposta de Classificação dos Métodos e das técnicas

Classificação dos Métodos das Ciências Sociais

Experimental
Importado das ciências exatas e naturais, com aplicabilidade restrita nas ciências
sociais (consiste em realizar experiências, deve-se repetir por vários momentos da
observação).

De Medida (o mais utilizado, associa-se o inquérito por questionário)


Implica a observação, por meio de questões diretas e/ou indiretas, de populações
relativamente vastas, com o objetivo de obter respostas suscetíveis de serem manejadas
mediante uma análise quantitativa. Este método impõe o recurso a técnicas de
amostragem, uma vez que implica análises extensivas a populações de grandes
dimensões. As características principais deste método são a extensividade, a rigidez
(incluímos as perguntas e as alternativas de resposta) e a quantificação (possibilidade
de quantificar a informação recolhida).
De Casos (mais utilizado, inquéritos por entrevista)
Também designado por análise intensiva. Consiste no exame intensivo (e não
extensivo), tanto em amplitude como em profundidade, utilizando todas as técnicas
disponíveis de uma amostra particular, selecionada de acordo com determinado
objetivo, de um fenómeno social, organizando os dados de forma a preservar o carácter
unitário da amostra. Tudo isto com a finalidade de obter uma ampla compreensão do
fenómeno na sua totalidade. As características principais deste método são a
intensidade, a flexibilidade e a medida qualitativa.

Observações:
→ Não se distinguiu entre técnicas de recolha de dados e técnicas de tratamento dos
mesmos;

→ Não se autonomizam as técnicas estatístico-matemáticas, que são instrumentos


utilizados em todas as investigações e integram certos momentos da maior parte das
técnicas disponíveis nas ciências sociais, quer ao nível da recolha, quer ao nível do
tratamento de dados; por essa razão, não surgem, igualmente, no esquema de técnicas
de amostragem.
Técnicas de Amostragem

Na maior parte das investigações nem sempre é possível inquirir ou observar toda a
população que seria interessante para o nosso estudo, por razões várias, desde a
escassez de recursos humanos e financeiros até à escassez de tempo. Por estas razões
se recorre, com frequência, a amostras retiradas da população global que nos interessa
observar.

Podemos definir Amostra como: uma fatia, representativa, sempre que possível, da
população que constitui o alvo do nosso estudo.

Procedimentos de constituição da amostra:

Amostragem Probabilística ou Aleatória: garante que cada um dos elementos tem uma
possibilidade conhecida e não nula de ser integrado e representado na amostra
(Exemplo: cada elemento de uma dada população tem a mesma probabilidade estatística de vir
a ser incluído na amostra).
Este tipo de amostragem garante a representatividade estatística da população,
implicando que exista um conhecimento prévio da população a inquirir em termos das
caraterísticas que se consideram relevantes para a investigação.

Amostragem Não Probabilística: não se garante que todos os elementos de uma dada
população tenham uma probabilidade conhecida e não nula de serem integrados na
amostra (nem todos os elementos da população têm a mesma probabilidade estatística
de serem representados na amostra).

As amostras construídas a partir das técnicas de amostragem do primeiro tipo são as


únicas que garantem a representatividade estatística da população, implicando que
exista um conhecimento prévio da população a inquirir em termos das características
que se considerem relevantes para a investigação.
Amostra Simples ou Elementar: Neste caso, a seleção dos indivíduos componentes
da amostra realiza-se através de uma e só uma operação. Pressupõe-se que a
população-alvo seja homogénea relativamente às características que interessam à
investigação.

Há duas formas de construir uma amostra simples ou elementar:

1. Tiragem à sorte: por exemplo, quando todos os elementos da população estão


identificados por um número. Representando cada um deles num papel que se pode
introduzir num saco ou recorrendo a uma tabela de números aleatórios, é possível
selecionar aleatoriamente o conjunto de elementos constitutivos da amostra

2. Tiragem sistemática: se os elementos se encontrarem classificados segundo uma


ordem, indiferente quanto Às características pertinentes para a observação, pode
proceder-se de um modo mais simples: tirar por exemplo da lista todos os elementos
que tenham um dado número (todos os com o nº 2 ou 3 ou 1, por exemplo).

Amostra Estratificada: Envolve em geral mais do que uma operação. No caso da nossa
população-alvo ser muito pouco homogénea, deve proceder-se a uma decomposição
prévia da mesma em estratos homogéneos (a obtenção destes estratos pode ser
baseada num único critério, por exemplo a idade dos indivíduos ou numa combinação
de 2 ou mais critérios). A amostra total será constituída pelo conjunto das subamostras
relativas a cada um dos estratos construídos e obtidas através do método aplicável para
as amostras simples (as anteriormente descritas). Importa observar que no caso de os
estratos terem uma dimensão suficiente, as dimensões da amostra em cada estrato
poderão ser idênticas. Contudo, é sempre preferível fazer depender a dimensão da
amostra do grau de homogeneidade do estrato, i.e., quanto menor este for, mais ampla
deverá ser a amostra para que se possa compensar a dispersão e a heterogeneidade.

Amostra por cachos: As amostras por cachos não são constituídas, como as anteriores,
por unidades individuais, mas sim por conjuntos (cachos), sendo que cada um dos
indivíduos que integram cada cacho ou conjunto serão incluídos na amostra. A seleção
faz-se relativamente aos conjuntos (por exemplo, quarteirões de uma cidade, bairros,
ruas, sectores de uma empresa, famílias, etc.) e não ao nível dos indivíduos. Para esta
amostra, quando estão envolvidos conjuntos territoriais é frequente utilizarem-se cartas
ou fotografias aéreas, sobre as quais se delimitam os cachos.
Amostra com vários graus: como a própria designação indica, utilizam-se
sucessivamente vários procedimentos da amostragem probabilística.

Amostra Acidental: Apenas são considerados na amostra casos acidentalmente


surgidos. (Frequente nas sondagens de rua. Pouco utilizada nas ciências sociais)

Amostra intencional: O pressuposto básico de uma amostra intencional é o de que


com uma boa intuição e uma estratégia adequada será possível selecionar os elementos
que devem ser incluídos na amostra. As amostras intencionais têm sido utilizadas por
exemplo, para tentar prever resultados eleitorais. As sondagens eleitorais são realizadas
com frequência através da seleção em cada distrito do país de um certo número de
concelhos que, em eleições anteriores, se tenham aproximado muito dos resultados
globais do distrito. Nesses concelhos inquirem-se os eleitores para conhecer as
respetivas intenções de voto e espera-se que os concelhos ainda sejam típicos em
ralação aos respetivos distritos, o que nem sempre se verifica. Trata-se de uma técnica
pouco utilizada nas ciências sociais.

Amostra por quotas: Através da utilização desta técnica de construção de amostras,


procura-se atingir objetivos idênticos aos da amostragem probabilística, ou seja,
construir uma amostra que seja um modelo reduzido e fiel da população-alvo da
investigação. O ponto de partida para a construção da amostra por quotas é, no entanto,
oposto ao da amostragem probabilística: em vez de se tomar como base o conjunto de
indivíduos que constituem a nossa população-alvo, começa-se por estabelecer um
inventário das proporções estatísticas correspondentes à combinação dos vários
critérios a ser utilizados (por exemplo, sexo, idade, profissão, etc.). Para que na amostra
sejam salvaguardadas as proporções reais de ocorrência daqueles critérios na
população-alvo, estabelecesse para cada inquiridor/observador, uma quota indicando
relativamente a cada critério o número de indivíduos a inquirir/observar. Sendo assim,
a amostra final deverá apresentar uma estrutura muito semelhante à da população-
alvo.
Amostra bola de neve: Trata-se de uma técnica de construção de amostras pouco
utilizada. Consiste em partir de um número restrito de pessoas que possuem as
características que interessam à investigação e ir acrescentando outras, por indicação
das precedentes, até ao número final pretendido.

Problemas da Amostragem
Enviesamentos Introduzidos no Momento de construção da Amostra
(amostragem probabilística ou aleatória)
Quando não temos uma lista exaustiva da população-alvo, podemos tomar como
aproximação uma base de dados que cubra apenas uma parte da população visada
(Exemplo: Cadernos Eleitorais). Mas utilizando este tipo de lista há uma parte da
população que é excluída, à partida.
Quando selecionamos aleatoriamente as pessoas ou unidades a inquirir, geralmente
não temos em conta que, por razões diversas, os indivíduos poderão não querer
participar na investigação ou poderão estar ausentes da sua residência. Existirá,
portanto, uma descoincidência ou um desvio entre as pessoas que deveriam ter sido
inquiridas e aquelas que o serão efetivamente.

Enviesamentos Introduzidos no momento de recolha da informação junto dos


indivíduos selecionados para a amostra (amostragem probabilística ou
aleatória)

As ausências – Quando pretendemos inquirir uma determinada pessoa, ela poderá


estar ausente da sua casa por várias razões. Se o inquiridor passar à pessoa seguinte,
com base no argumento de que aquela pessoa foi escolhida à sorte, então no final é
muito provável que tenhamos uma amostra constituída por pessoas que saem pouco de
casa. É igualmente provável que essas pessoas possuam características muito diferentes
daquelas que saem mais de casa e, consequentemente, teremos uma amostra
enviesada.

Para evitar estes enviesamentos, os inquiridores poderão tomar certas precauções:

Evitar fazer os inquéritos/recolher os dados nos meses tradicionais de férias;


Distribuir o trabalho de aplicação das técnicas de recolha de informação por
vários períodos do dia/noite e ao fim-de-semana;
Tentar realizar um primeiro contacto (por telefone ou pessoalmente) com as
pessoas a inquirir.
As recusas- à exceção dos Recenseamentos da População, realizados pelo Instituto
Nacional de Estatística, ninguém em Portugal pode ser obrigado a responder a um
inquérito ou a participar numa dada investigação.

Tipos de recusa mais frequentes, segundo Ghiglione e Matalon (1992):

Recusa em responder a qualquer tipo de inquérito/entrevista...;


Recusa em responder a inquéritos/entrevistas específicos, pela temática que
aborda.

O primeiro caso trata-se de uma recusa global, havendo categorias mais frequentes de
não-respondentes:

❖ Trabalhadores por conta própria (dizem que estão sempre muito ocupados e
com atividades e horários mal definidos);
❖ Pessoas idosas (maior receio de desconhecidos e, também, têm uma atitude de
descomprometimentos e de retraimento face ao mundo o que as leva a
desvalorizar as suas próprias opiniões e a não querer participar);
❖ Algumas mulheres casadas (referem que não pode participar sem a concordância
do marido ou que ele saberá melhor responder);
❖ Certos meios sociogeográficos (maior resistência à resposta de
inquéritos/entrevistas- os da cidade recusam com maior frequência do que os
da aldeia).

Para tentar reduzir as probabilidades de recusa, o inquiridor poderá:

Ter carta de apresentação;


Pedir a alguém influente junto da população-alvo que interceda junto da mesma.

Por outro lado, os enviesamentos introduzidos pelas recusas em responder por parte de
certas pessoas/unidades poderão ser corrigidos com a seleção aleatória de outras
pessoas/unidades, com caraterísticas idênticas.

Enviesamentos da amostragem não probabilística (por quotas)


Nas amostras por quotas os riscos de enviesamento são maiores e mais importantes do
que nos casos anteriores, desde logo porque são menos visíveis e mais difíceis de
controlar, sobretudo porque o inquiridor não dispõe de uma listagem de pessoas e das
suas características. Isto significa que não se poderá substituir facilmente uma pessoa
que esteja ausente ou se recuse a responder por outra pessoa com características
semelhantes.
A juntar a estes enviesamentos, temos que ter em conta outros, mais específicos
da amostra por quotas:

➢ Os que decorrem do modo como o inquiridor seleciona as pessoas que vai abordar;
➢ Os que decorrem do risco do inquiridor só selecionar pessoas conhecidas ou aquelas
que lhe pareçam mais amigáveis.

Tanto no primeiro caso, como no segundo, estes riscos podem ser minimizados
se se forneceram ao inquiridor instruções rigorosas quanto às pessoas que devem ser
inquiridas.

Dimensão das Amostras

Só é possível calcular a dimensão da amostra no caso das amostras probabilísticas ou


aleatórias.

No caso das amostras não probabilísticas, aceita-se como razoável que a amostra seja
de 10% a 20% da população total, devendo as caraterísticas da população-alvo estarem
representadas, na mesma proporção, na amostra.
Quanto à dimensão da amostra para o caso das amostras probabilísticas ou aleatórias,
podemos começar por dizer que:

Essa dimensão se encontra dependente da dimensão da população-alvo. Assim, em


princípio, quanto maior for a população-alvo, maior terá de ser a amostra;

A dimensão da amostra também se encontra dependente do grau de


heterogeneidade da população-alvo: quanto mais heterogénea for a população-
alvo, maior terá de ser a dimensão da amostra. Se se tratar de uma população-alvo
muito homogénea, a dimensão da amostra poderá ser reduzida.

A forma mais frequente de calcular a dimensão da amostra é através do cálculo da


margem de erro da mesma relativamente à população-alvo. Os pressupostos deste
cálculo são os seguintes:

➢ Se a amostra fosse igual à população-alvo, a margem de erro da mesma seria zero e


o grau de confiança dos resultados seria, evidentemente, de 100%.

➢ Como, na maioria dos casos, não é possível inquirir toda a população-alvo, temos de
ter em conta que existe sempre uma margem de erro e que o nosso grau de
confiança nunca será igual a 100%. Habitualmente aceita-se como margem de erro
satisfatória os 0,05, o que significa que o grau de confiança aceitável será de 95%.
Existem várias formas de calcular a margem de erro e, simultaneamente, calcular a
dimensão da nossa amostra.

IV. Métodos e técnicas em ciências sociais: o problema da recolha da


informação

3.O inquérito por questionário


3.1. O planeamento
“Toda a ação de pesquisa se traduz no ato de perguntar” Virgínia Ferreira (1987)

Neste processo de questionar e obter respostas sobre uma dada realidade que
observamos, tudo o que é necessário saber é fazer as perguntas e saber ao mesmo
tempo identificar os elementos constituintes das respostas. O processo que envolve a
construção de perguntas e a obtenção de respostas é bastante complexo.
O Inquérito por Questionário pode ser considerado como um conjunto de perguntas
concretas, estandardizadas que permitem ao investigador estudar fenómenos sociais e
quantificar a informação recolhida de forma mais imediata. Permite assim, uma mais
rápida objetivação dos resultados e também uma mais rápida recolha de dados.

1. Planeamento do Inquérito por Questionário


a. Delimitação dos problemas a estudar (construção do objeto de estudo);
b. Objetivos do IQ (que tipo de informação se pretende obter);
c. Hipóteses teóricas e/ou práticas (de que fatores vamos fazer depender a nossa
análise);
d. Tradução das hipóteses em indicadores (processo de operacionalização dos
conceitos);
e. Delimitação da população a inquirir (construção da amostra)
2. Preparação do Inquérito por Questionário
a. Redação de um projeto de IQ;
b. Realização de um pré-teste;
c. Elaboração definitiva do IQ (com base nos resultados do pré-teste)

3. Aplicação do Inquérito por Questionário – Trabalho de campo


a. Seleção e formação dos inquiridores (administração indireta);
b. Envio ou entrega dos IQ (auto-administração)

4. Análise dos resultados da aplicação do Inquérito por Questionário


a. Codificação das respostas (pode também ser feita na fase 2);
b. Apuramento da informação recolhida;
c. Elaboração das conclusões – confronto dos resultados com as hipóteses e o
‘enquadramento teórico’

3.2. Preparação
As questões incluídas num IQ devem ser eficientes.
Uma questão eficiente pode ser definida por proporcionar o máximo de clarificação
possível das categorias acionadas pelos inquiridos, de modo a que possam ser
comparadas com as dos outros inquiridos e com as do próprio investigador.

Neste sentido, antes de formular em definitivo uma questão, temos de ter em atenção:

Se a questão vai efetivamente ao encontro do que pretendemos saber;

Se os inquiridos terão facilidade em compreender a questão e consequentemente


em lhe responder;

De que forma podem ser obtidas respostas a questões difíceis, ou seja, quais os
meios de que dispomos para obter essas respostas;

Se a linguagem utilizada é acessível a todos os inquiridos, independentemente da


sua formação escolar e de outras características;

Se a questão proporciona condições de resposta idênticas para todos os inquiridos.


Como o IQ se pretende um instrumento de recolha de informação, estandardizado e
objetivo, as questões incluídas nele são normalmente de tipo fechado, embora também
possam existir algumas questões de tipo aberto.

Questões fechadas são aquelas em que os inquiridos devem cingir a sua resposta às
alternativas propostas pelos investigadores no IQ e, deste modo, condicionam mais as
respostas dos entrevistados e perdemos alguma riqueza do discurso dos mesmos. Esta
é aliás a grande desvantagem destas questões. Por outro lado, estes tipos de questões
facilitam enormemente a anotação no ato de inquirição e facilitam o posterior
tratamento dos dados recolhidos, uma vez que proporcionam uma maior
comparabilidade dos dados, porque as categorias de resposta são comuns para todos
os indivíduos inquiridos.

Questões abertas são aquelas em que o inquirido pode responder em total liberdade.
Não lhe são fornecidas a priori alternativas de resposta. Este tipo de questão apresenta
mais desvantagens que o anterior, no que se refere ao tratamento das respostas e às
possibilidades de comparação. Tem como vantagem principal o facto de o discurso
do inquirido não estar condicionado.

Temos ainda um tipo de questões que podemos designar como semi-abertas ou semi-
fechadas. Estas questões são aquelas em que o inquirido escolhe uma das categorias de
resposta propostas pelo investigador, mas tem de completar a resposta com o seu
próprio discurso. Temos ainda de ter em conta num IQ as questões de escolha múltipla
(Exemplo: aquelas em que o inquirido pode escolher mais do que uma das opções de
resposta apresentadas). Estas questões são sempre de tipo fechado e podem ser
simples ou de hierarquização.

O Inquérito por Questionário apresenta duas partes distintas:

❖ Questões de caraterização/identificação dos inquiridos: procuram caracterizar os


inquiridos quanto às variáveis que se consideram importantes para a situação em
estudo, geralmente para as variáveis independentes. São normalmente variáveis
de natureza mais objetiva cuja resposta se prende com a situação de facto e não
com a opinião dos indivíduos inquiridos (Exemplo: sexo, idade, escolaridade,
estado civil, profissão, etc.).
❖ Questões de investigação: circunscrevem-se às situações que se desejam conhecer
e explicar. Testam as hipóteses de que se parte na investigação. São normalmente
as variáveis a explicar, ou dependentes, que têm uma natureza mais subjetiva
(Exemplo: as opiniões dos inquiridos face a..., asatitudes, as posições, as definições
pessoais, etc).
Para além destas, os Inquéritos por Questionário também incluem questões de
comprovação ou consistência, que são questões de investigação, mas que servem para
garantir que não há erros no IQ que possam ser imputados às questões, ao inquiridor
ou à própria condução da pesquisa.

Em primeiro lugar, os Inquéritos por Questionário podem ser aplicados por:

Autoadministração: é o próprio inquirido que preenche o questionário.


Administração Indireta: é o caso mais frequente, o inquiridor coloca as questões ao
inquirido e anota as suas respostas.

Fatores que interferem na relação do IQ, no momento da inquirição:

➢ Timidez, que impede a recusa;


➢ Interesse cientifíco;
➢ Desejo de ter um contacto fora do comum no seu quotidiano;
➢ Desejo de expressar a sua opinião;
➢ Orgulho de participar num estudo que, eventualmente, aparecerá nos jornais.

Ao aceitar participar na situação do inquérito, os indivíduos poderão desenvolver


determinadas expectativas e ter determinado objetivos, cujos principais são:

➢ Manter boas relações com o inquiridor (Exemplo: não entrar em conflito);


➢ Dar uma imagem favorável de si próprio para obter a aprovação do inquiridor ou
para impressionar positivamente a instituição a que ele pertence;
➢ Dar uma imagem de conformidade e de normalidade de si mesmo (Exemplo: o
inquirido tem a preocupação de parecer em conformidade com a norma, dando as
respostas que, socialmente, lhe parecem ser as mais corretas e normais). Este aspeto
muitas vezes está também relacionado com uma necessidade de defesa contra a
utilização abusiva ou indiscreta das informações que fornece;
➢ Alcançar um determinado objetivo exterior ao âmbito do IQ. Frequentemente, os
inquiridos utilizam as suas respostas como meio de resolver uma determinada
situação (tentando, por exemplo, enegrecê-la), com esperança de que as
autoridades tomem as medidas que pretende.
1. Quais as caraterísticas da Ciência? Porque difere das outras formas de
conhecimento?
O conhecimento científico é a única forma relativamente isenta de abordar a realidade,
sendo este permanentemente provisório e passível de teste. É o que mais se aproxima
da interpretação da realidade uma vez que utiliza critérios para a analisar, utilizando
teorias, métodos e técnicas de investigação. Para além disto, apenas se constitui como
ciência se tiver um objeto de estudo específico.
A ciência carateriza-se por ser geral- utiliza factos para testar teorias e teorias para fazer
previsões-, empírica- testa teorias através da observação da realidade pela
experimentação- , cumulativa- avança através de ruturas do conhecimento anterior- e
racional - apoia-se na razão, na objetividade e no rigor-.
Quanto aos outros tipos de interpretação da realidade, sendo eles, a religião, o senso-
comum e as ideologias, estas diferem da ciência uma vez que, não são abordagens
isentas, não estão sustentadas por métodos e técnicas porque não têm subjacente a
preocupação de analisar objetivamente a realidade.

2. Quais os obstáculos que se impõem à ciência?


O maior obstáculo que se põe à ciência é a ilusão que temos de que a realidade é
transparente e familiar. Segundo Augusto Santos Silva existem 3 níveis de obstáculos
que se podem impor à ciência, sendo eles o senso comum (ramificações imediatas e
espontâneas), as formações ideológicas-doutrinárias (conceções mais elaboradas) e as
ramificações de umas e de outras.
Quanto ao senso-comum, Augusto Santos Silva destaca 3 obstáculos: o naturalismo, o
individualismo e o etnocentrismo. Sendo essencial e necessária a rutura entre o
conhecimento científico e o senso-comum.

Você também pode gostar