Quais as diferenças de ação clínica dos venenos das serpentes encontradas
no país?
Anualmente ocorrem cerca de 20.000 acidentes ofídicos no Brasil, existindo cerca de
361 espécies de serpentes (SBH 2008), sendo que destas, 55 são peçonhentas. O veneno é uma mistura de várias toxinas, enzimas e peptídeos, os quais induzem atividades biológicas em suas vítimas. O diagnóstico do acidente ofídico depende do reconhecimento do animal causador do acidente, assim como da sintomatologia apresentada pelo paciente. São quatro grupos de serpentes que podem causar acidentes ofídicos no Brasil: ● Grupo I (Gêneros Bothrops, Bothriopsis e Bothrocophias; conhecidas popularmente como jararacas, caissaca, urutú-cruzeiro, jararacussu); ● Grupo II (Gênero Crotalus; conhecidas popularmente como cascavéis); ● Grupo III (Gênero Lachesis; conhecidas popularmente como surucucu-bico-de-jaca); ● Grupo IV (Gêneros Micrurus e Leptomicrurus; conhecidas popularmente como corais-verdadeiras).
Ação clínica (características dos acidentes):
1. GRUPO I (acidente botrópico): Responsáveis por cerca de 90% dos acidentes ofídicos. O veneno é proteolítico, tendo uma atividade inflamatória aguda, coagulante e hemorrágico. O paciente pode apresentar dor, sangramento e edema no local da picada podendo evoluir por todo o membro, hemorragias, equimose, abscesso, formação de bolhas e necrose. A hipotensão e o choque periférico são observados em acidentes graves e são devidos à liberação de mediadores vasoativos. Ocorre aumento do tempo de coagulação sanguínea. A vítima pode falecer devido insuficiência renal aguda. A vítima também poderá ter infecção secundária por bactérias que são encontradas na flora bucal da serpente. 2. GRUPO II (acidente crotálico): Grupo onde estão incluídas as cascavéis que apresentam a maior letalidade. O veneno é neurotóxico, miotóxico e coagulante. A vítima pode apresentar edema e dor discreta ou ausente, parestesia, ptose palpebral, diplopia, visão turva, urina avermelhada ou marrom, insuficiência respiratória aguda em casos graves, ocorre aumento do tempo de coagulação sanguínea, podendo falecer por insuficiência renal aguda. 3. GRUPO III (acidente laquético): A letalidade registrada para o acidente laquético é cerca de três vezes mais letal do que o botrópico e metade da letalidade do crotálico. O veneno tem atividade proteolítica (atividade inflamatória aguda), hemorrágica, coagulante e neurotóxica. A apresentação clínica é semelhante com a de casos causados por Jararacas, o paciente podendo apresentar dor, edema, equimose, formação de bolhas, gengivorragia e hematúria, podendo ter um quadro neurotóxico apresentado com bradicardia, hipotensão arterial, sudorese, vômitos, náuseas, cólicas abdominais e distúrbios digestivos (diarréia). Paciente pode falecer por insuficiência renal aguda. 4. GRUPO IV (acidente elapídico): Acidentes causados pelas cobras-corais. A principal atividade do veneno é neurotóxica. Paciente pode apresentar dor local, parestesia, ptose palpebral, diplopia, sialorréia, dificuldade de deglutição e mastigação, dispnéia. Casos graves podem evoluir para insuficiência respiratória. Além desses, existem acidentes (acidentes com colubrídeos) que geralmente são assintomáticos, causados por serpentes da família Colubridae. Em algumas regiões do país eles apresentam cerca de 20 a 40% dos casos atendidos nos hospitais. Algumas espécies conseguem inocular veneno em um ser humano e manifestar alguns sintomas na vítima, e, embora raros os acidentes graves, a importância desses acidentes está no fato da semelhança destes com acidentes botrópicos, o que pode resultar no uso indevido da soroterapia (tratamento). Por isso, o tratamento dessas vítimas deve ser sintomático, pacientes que evoluírem para dor e edema intensos podem ser tratados com analgésicos e/ou antiinflamatório não hormonal, sendo, também, necessária a profilaxia antitetânica.
REFERÊNCIAS
BERNARDE, Paulo Sérgio. Acidentes ofídicos. Apostila do Laboratório de herpetologia.
Centro Multidisciplinar, Campus Floresta, UFAC-AC. 2019.
AZEVEDO-MARQUES, Marisa M.; CUPO, Palmira; HERING, Sylvia Evelyn. Acidentes
por animais peçonhentos: serpentes peçonhentas. Medicina (Ribeirao Preto. Online), v. 36, n. 2/4, p. 480-489, 2003.