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Biologia Molecular e Celular 20-26

Santa Rita, desta é de vez


20-26

DUARTE RAFAEL FRANCISCA PINTO DIOGO SILVESTRE


MANUEL LEITE FILIPA CAZEIRO DÉBORA BATISTA
FREDERICO RIVERA

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Índice

T1 - Introdução à biologia molecular da célula 3

T2 - DNA Recombinante 7

T3 - Do gene à proteína 12

T4 - Replicação e recuperação do DNA 19

T5 - Cromatina, cromossomas e epigenética 24

T6 - Regulação da expressão genética 30

T7 - A evolução dos genes e dos genomas 40

T8 - Introdução à Imunologia 45

T9 - Tráfego intracelular das proteínas 75

T10 - Ciclo Celular e Cancro (I) 88

T11 - Ciclo Celular e Cancro (II) 97

T12 - Citoesqueleto 104

Seminário 1- Telómeros e telomerase 115

Seminário 2 - Imprinting e inativação do cromossoma X 118

Seminário 3 - Splicing 124

Seminário 4 - Mitocôndrias 129

Seminário 5 - Terapias génicas 132

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T1 - Introdução à biologia molecular da célula


A estrutura do DNA, dos cromossomas e das células

Célula e organelos celulares


Teoria celular:
A célula é a unidade básica, estrutural e funcional dos seres vivos;
Todas as células provêm de células pré-existentes;
A célula é a unidade de hereditariedade, reprodução e desenvolvimento dos seres vivos.

Seres procariontes: seres muito simples, unicelulares,


desprovidos de organelos e de membrana nuclear (não
têm núcleo!). Poderão ter uma cápsula, semelhante à
parede celular, que envolve a membrana celular.

Seres eucariontes: seres cujas células apresentam núcleo


individualizado, delimitado por uma membrana nuclear.
Podem ser unicelulares (como as leveduras) ou
pluricelulares. Há ainda diferenças relativamente a células eucarióticas animais ou
vegetais.

Constituintes da células eucarióticas:


❏ RE: síntese de lípidos, proteínas e de membrana plasmática;

❏ Núcleo: protege o genoma. Apresenta-se envolvido pelo invólucro nuclear, que possui
duas membranas, uma externa e uma interna, sendo a externa ligada ao RE;

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❏ Mitocôndria: Síntese de ATP – fosforilação oxidativa;

❏ Peroxissomas: Oxidação de moléculas tóxicas e


degradação de lípidos;

❏ Lisossomas: Degradação de componentes interiores


ou exteriores à célula a partir de enzimas hidrolíticas;

❏ CG: conjunto de cisternas que apresenta uma face


cis – face de entrada – adjacente ao RE e uma face
trans – face de saída – voltada para a membrana
plasmática. A face cis recebe proteínas em vesículas
de transporte, provenientes do RE, a trans liberta
vesículas de transporte com as proteínas para a
membrana plasmática ou para outro compartimento. Função: maturação de proteínas,
recebe proteínas e lípidos do RE, modifica-os e distribui-os por outros destinos na célula;
❏ Citosol: espaço entre os organelos, preenchido por água, iões, aminoácidos, precursores
de ácidos nucléicos, enzimas e proteínas;
❏ Cloroplastos: Presentes apenas nas células eucarióticas vegetais. É o local onde ocorre a
fotossíntese.
❏ Ribossomas: são as estruturas nas quais são produzidas as proteínas das células.
Encontram-se livres no citoplasma tanto nas células eucariontes como nas procariontes.
Nas eucariontes, eles também podem estar aderidos ao retículo endoplasmático rugoso.
Os ribossomas são ribozimas (moléculas de RNA com atividade catalítica, como as
enzimas) compostos por duas subunidades, 4 rRNAS diferentes e 80+ proteínas.

DNA: Carrega a informação hereditária da célula. Uma molécula de DNA é constituída por
2 cadeias de nucleótidos. Ao contrário do RNA, o DNA não aparenta ter qualquer tipo de
atividade catalítica.

Nucleótido: base azotada (A, T, C, G)+ grupo(s) fosfato + pentose. As duas cadeias
nucleotídicas juntam-se pelas bases através de pontes de hidrogénio. (G≡C; A=T)

As duas cadeias estão dispostas em hélice e ligadas pelas bases azotadas através
de pontes de hidrogénio (de forma antiparalela) enquanto que os nucleótidos de uma
cadeia estão ligados entre si por ligações fosfodiéster (mais estáveis e, por sua vez, mais fortes).

Para os nucleótidos do DNA, a pentose é uma desoxirribose, enquanto que o açúcar do


RNA é uma ribose. O que as diferencia é a presença ou ausência de um oxigénio na posição
carbono 2’ da pentose.

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As bases azotadas estão sempre voltadas para dentro da dupla hélice fazendo com que o
“esqueleto” seja formado pela pentose e pelo fosfato → implica que a molécula tenha uma carga
negativa e permite ainda que as bases (hidrofóbicas) fiquem protegidas.

As ligações fosfodiéster são estabelecidas entre o grupo fosfato (carbono 5’) e a pentose
(grupo hidroxilo do carbono 3’) → a polimerização do DNA (e do RNA) ocorre sempre no
sentido 5’ → 3’. Numa extremidade, fosfato e na extremidade oposta um hidroxilo, o que
confere à cadeia uma polaridade química.

Nucleosídeo: é um nucleótido sem o agrupamento fosfato. São produtos de hidrólise


química ou enzimática, ocorrem em quantidade muito diminuta na célula.

➔ Gene: unidade fundamental da hereditariedade. É um segmento de DNA que codifica


informação que leva à produção de uma proteína (ou polipéptido ou péptido) ou RNA não
codificante. Inclui regiões que antecedem e que sucedem a região codificante, bem como
sequência que não são traduzidas (intrões) que estão intercaladas com segmentos codificantes
(exões), que se mantêm na sequência de RNA maduro e poderão ser traduzidos. Existem, no ser
humano, cerca de 25.000 genes.

➔ Cromossomas: São constituídos tanto por proteínas (histonas e outras proteínas) como
por DNA. O complexo de histonas (H2A, H2B, H3 e H4) é responsável pela formação dos
nucleossomas, devido à sua carga positiva. As regiões que contêm genes expressos estão menos
compactadas.
◆ Heterocromatina: forma mais condensada da cromatina, geralmente associada
aos telómeros e centrossomas. Resulta de uma modificação sobretudo na cauda
da histona H3 que compacta genes que não são ou são menos expressos. A
condensação é promovida, por exemplo, por histona-desacetilases
(HDAC/HD/HAD) = desacetilação.
◆ Eucromatina: forma descondensada da cromatina. Permite uma maior
acessibilidade a proteínas e a fatores de transcrição. A descondensação é
promovida, por exemplo, por histona-acetiltransferases (HAT), que adicionam
grupos acetil a resíduos de lisina = acetilação.
Vamos abordar esta temática com maior detalhe ao longo desta sebenta.

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Cada cromossoma, aleatoriamente, ou simplesmente uma sequência de genes, pode


ser “pintado” com uma cor qualquer, usando-se moléculas de DNA combinadas com
um corante fluorescente. A esta técnica dá-se o nome de “Fish”.

➔ Genoma: Sequência nucleotídica completa presente nos 46


cromossomas, no caso do Homem, 22 pares de autossomas e 1 par de
heterossomas/cromossomas sexuais. É constituído por cerca de 3.2 x 109
nucleótidos (quando haplóide), sendo que apenas 1.5% a 2% da
cromatina é composta por exões e sequências reguladoras. É, portanto, a
totalidade do DNA (genes + sequências não codificantes, como os
transposões), e não apenas a soma de todos os genes.

Geralmente os organismos mais complexos apresentam um genoma maior. Mas atenção!


Nem sempre uma maior complexidade genómica corresponde a um ser mais complexo!

Proteínas recombinantes e terapia génica

➔ Fármacos convencionais: São feitos tendo por base a


ocorrência de reações químicas não envolvendo organismos biológicos
na sua formação (por exemplo, aspirina). São, normalmente, pequenas
moléculas.
➔ Fármacos biológicos: Para a sua formação é necessário recorrer
a células/organismos vivos (por exemplo, insulina [1º medicamento
biológico])
1. Proteínas recombinantes;
2. Terapias génicas;
3. Terapias celulares.
1. Proteína recombinante: é formada através da técnica de tecnologia
de DNA recombinante. Sucintamente:
O DNA que codifica determinada proteína vai ser inserido numa
bactéria ou célula eucariótica → a proteína vai ser expressa nessas
células → a proteína vai ser isolada e purificada e, por fim, usada para
fins terapêuticos
(Mais tarde iremos abordar esta temática com maior pormenor)

As proteínas recombinantes não podem ser


administradas por via oral. Porquê?

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T2 - DNA Recombinante
Existem genes que não codificam proteínas → como por exemplo os que codificam tRNA,
rRNA, e microRNA (presente no citoplasma), ou seja, RNA f uncionais. → Podemos definir
um gene como sendo uma sequência nucleotídica que contém a informação para a síntese de
uma proteína ou de um RNA funcional.

Sabendo que uma proteína corresponde apenas à tradução das sequências EXÓNICAS como é
que podemos utilizar as bactérias para a produção de proteínas recombinantes?
Temos 2 opções:
A. Proceder de forma inversa, ou seja, pegar na proteína e sequenciar o gene (exões) que lhe
deram origem através da utilização de cDNA, enzimas de restrição… ;
B. Utilizar vírus com genoma de RNA (retrovírus) que possuem transcriptase reversa.

Relembra que as células procarióticas NÃO POSSUEM INTRÕES → NÃO FAZEM


SPLICING → não podemos usar diretamente o DNA eucarionte na formação de proteínas
recombinantes, visto este conter intrões

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funciona de forma inversa à RNA polimerase,


formando DNA a partir de RNA

No processo B o que fazemos é transcriptase reversa + mRNA (que codifica a nossa proteína de
interesse) → origina um cDNA (DNA complementar) ao mRNA e depois uma segunda cadeia
de DNA complementar a este (logo, parecido ao mRNA original), formando uma dupla hélice
de DNA com a informação desejada → Temos que o incorporar num cromossoma da célula (ou
iria facilmente ser degradado)

Através da utilização de enzimas de restrição: As enzimas de restrição são


endonucleases1 - clivam as ligações fosfodiéster entre nucleótidos adjacentes em
sequências muito específicas a cada enzima. Estas são obtidas a partir de diferentes
estirpes bacterianas – é um dos seus mecanismos naturais contra a infeção viral - a estirpe
bacteriana é resistente às suas próprias enzimas de restrição devido à metilação do seu
próprio DNA nestas sequências de restrição.

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NOTA: As enzimas de restrição são endonucleases mas nem todas as endonucleases são enzimas
de restrição

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Então vamos unir o cDNA + DNA bacteriano - os plasmídeos (que funcionam como vetores):
moléculas de DNA circular com capacidade de se auto-replicar e que existem naturalmente
em bactérias, apesar de não fazerem parte do seu genoma principal. Contribuem com
propriedades como resistência a antibióticos (como a tetraciclina), produção de toxinas e
capacidade de transferência por conjugação. É de notar que a replicação de um plasmídeo
ocorre independentemente da replicação do cromossoma bacteriano e de modo muito mais
rápido. Têm uma origem de replicação para que possam ser replicados de forma
independente dos "cromossomas" bacterianos - previamente clivados com a MESMA
enzima de restrição Temos ainda de adicionar DNA ligases e nucleótidos livres bem
como ATP ⚡ para voltar a estabelecer as ligações fosfodiéster entre os nucleótidos.
Os plasmídeos podem ser de expressão ou de clonagem:
- Plasmídeos de expressão contêm um promotor a montante do local de policlonagem, o
que permite a ligação de RNA para haver a eventual produção da proteína desejada
- Plasmídeos de clonagem não contêm um promotor, e são apenas utilizadas para a
clonagem do segmento introduzido, no âmbito de clonagem molecular

Para colocarmos de volta os plasmídeos na bactéria temos que destabilizar a membrana


plasmática, visto que os plasmídeos e as membranas das bactérias se repelem num meio sem
alterações devido a ambos serem eletronegativos. Para esta desestabilização faz-se uma suspensão
fria de catiões de Cálcio (Ca2+), que irá provocar a abertura de poros na membrana das bactérias,
permitindo a entrada dos plasmídeos.

Mas como sabemos que os plasmídeos entraram nas bactérias?

Sabendo que alguns plasmídeos conferem propriedades de resistência a antibióticos, podemos


certificar-nos de que as bactérias incorporaram o plasmídeo modificado através da aplicação de
antibiótico a essas bactérias.

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Através da eletroforese de DNA (técnica que permite diferenciar moléculas


segundo o seu tamanho e carga - as moléculas mais pequenas deslocam-se mais
rapidamente já que por unidade de massa o DNA tem a mesma carga elétrica e
porque têm mais facilidade em deslocar-se pelo gel denso - pensa numa criança e
num adulto a tentarem passar por uma multidão, a criança tem mais facilidade por
ser mais pequena - entre outros2)

Após fazermos a lise da membrana da bactéria vamos ter toda uma mistura
de componentes celulares. Como vamos distinguir e isolar a nossa proteína de
interesse?

Através da técnica de Cromatografia de afinidade:


1º Vamos adicionar uma tag de aa. à proteína de forma a que esta adira às paredes
da matriz da coluna de afinidade (geralmente esta tag é de histidinas, que tem
afinidade ao níquel). Este níquel é colocado na matriz, que é o polímero utilizado para ajudar
a filtrar as proteínas, permitindo que a proteína de interesse fique agarrada. Uma boa forma
de visualizar isto é pensar no níquel como um isco específico à proteína de interesse.

2º Deixar todos os outros componentes serem filtrados, e só depois usar algo com ainda mais
afinidade ao isco (como o imidazol) para largar a proteína de interesse.

3º Após a filtragem adicionamos uma protease para separar a tag da proteína de interesse,
visto que a tag já cumpriu a sua função. Esta protease, que pode ser uma trombina (da cascata
de coagulação), vai cortar numa sequência específica chamada PRS (Protease Recognition
Sequence). Isto significa que a proteína precisa de ser codificada para conter uma PRS e uma
tag.

Para garantirmos que temos, de facto, a nossa proteína isolada e purificada, vamos agora
proceder a uma eletroforese de proteínas. Visto que, as proteínas não têm uma carga
uniformizada (e algumas nem negativa) temos de as cobrir com um detergente - SDS (dodecil
sulfato de sódio) - que confere às proteínas uma carga uniforme negativa.
Através dos valores padrões de bp da proteína de referência podemos garantir que isolámos a
proteína que pretendíamos.

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Fatores que influenciam a velocidade de migração: tamanho da molécula, carga elétrica da mesma, viscosidade do
meio, pH, temperatura e intensidade da corrente elétrica

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Recorda que numa eletroforese os compostos dirigem-se do polo negativo para o polo positivo.
É por isso que é importante que todos os compostos adquiram carga negativa.

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T3 - Do gene à proteína
Dogma central da Biologia Molecular: quando é necessária uma
proteína, a sequência de nucleótidos do DNA é copiada para
sequências de RNA que irão produzir, através dos ribossomas,
cadeias polipeptídicas que irão originar proteínas. Isto acontece em
todas as células.

A expressão genética é conjunto de processos que permitem à informação


que está contida numa sequência do DNA, a que chamamos gene, ser
transcrita e traduzida de modo a formar uma proteína.

TRANSCRIÇÃO

O primeiro passo da transcrição consiste na separação e des-espiralização de uma pequena


porção da dupla hélice de DNA.

ATENÇÃO: quando se constrói uma cadeia de nucleótidos estes são sempre adicionados à
extremidade 3’, pois só neste local há possibilidade de estabelecer uma ligação fosfodiéster.
Ou seja, a cadeia cresce sempre no sentido 5’ → 3’.

O segundo passo consiste no isolamento de uma das cadeias, nomeadamente a de 3’ → 5’, para
ser usada como molde à formação de uma cadeia de pré-mRNA.

A sequência de nucleótidos da cadeia de pré-mRNA será a mesma da cadeia de DNA que não foi
usada como molde (5’ → 3’).

CADEIA CODIFICANTE
(5’ - 3’)

Este processo ocorre devido à ação de uma grande enzima chamada RNA POLIMERASE.
A enzima liga-se à molécula de DNA, separa as duas cadeias, constrói uma cadeia de
pré-mRNA, de 5’ 3’, adicionando nucleótidos à medida que vai avançando na molécula.

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É necessário que as RNA polimerases reconheçam o início do gene, visto que nem todo o
DNA é gene. Para isso existe uma sequência de nucleótidos que indicam, à RNA polimerase, o
início de um gene… essa sequência chama-se promotor. O promotor não faz parte do gene, e a
RNA polimerase só começa a transcrever a seguir ao promotor (no nucleótido +1).
Para indicar o fim de um gene existe uma sequência de nucleótidos, localizada após o gene,
designada terminador, que também não faz parte do gene

IMPORTANTE: A posição do promotor em


relação ao gene vai alterar a cadeia que é de facto
lida. Podemos ter na mesma molécula de DNA
genes a ser lidos em cadeias diferentes (e,
portanto, em sentidos diferentes).

NOS PROCARIONTES

A RNA polimerase necessita de ajuda para identificar o promotor e, como tal, existem
ajudantes nesta mesma identificação designados fatores sigma. Estes encontram-se unidos à
RNA polimerase e reconhecem o promotor, sendo libertados no início da transcrição e voltando
a ligar-se no fim desta

Nas células procariotas o mRNA que está ser sintetizado (transcrição) pode, ainda antes de
acabar de ser formado, encontrar um ribossoma e começar a ser traduzido. Isto deve-se à falta
de compartimentação celular (não há núcleo)

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NAS CÉLULAS EUCARIOTAS

A síntese de pré-mRNA é feita por diferentes tipos de RNAs polimerases conforme o tipo
estruturas que o gene codifica.

● RNA polimerase I - maioria dos genes que codificam rRNAs (RNA ribossomal);
● RNA polimerase II - todos os genes que codificam proteínas + miRNA (micro RNA) +
genes de RNA não codificante;
● RNA polimerase III - genes que codificam tRNAs (RNA de transferência) + gene do
rRNA 5S + genes de pequenos RNAs (sRNAs)

A RNA polimerase necessita de ajuda para transcrever pois não consegue encontrar o
promotor e começar a transcrever sozinha, então, para a ajudar, existem os chamados fatores de
transcrição (TF).

pré-reconhecimento do promotor e “avisam” a RNA polimerase

O pré-reconhecimento é feito por interações eletrostáticas entre o fator de


transcrição e determinadas regiões da molécula de DNA. Uma sequência
importante nesta ligação FT → DNA é uma sequência TATA (TATA box)

Agarrada à RNA polimerase II existem proteínas (enzimas) que vão


alterar a estrutura do pré-mRNA formado por meio da transcrição. Isto
ocorre entre a transcrição e a tradução, visto já haver compartimentação
celular

O CAP

Molécula de guanosina metilada na posição 7 (m7g) colocada por


uma das enzimas agarradas à RNA polimerase II no pré-mRNA recém formado, na extremidade
5’ (a ‘cabeça’), logo no início da transcrição.

CAUDA DE POLI-A

Existe uma sequência no final do gene que vai “atrair” / “chamar” a enzima. Esta enzima,
que também se encontra agarrada à RNA polimerase II mas é diferente da enzima do cap, que
também vai cortar o pré-mRNA e adicionar uma cauda de adeninas à extremidade 3’, no fim
da transcrição.

Tanto o Cap como a cauda de poli-A conferem proteção contra a degradação enzimática.

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SPLICING (ver seminário 3)

Os genes eucariotas apresentam sequências de nucleótidos que não codificam nada, os


intrões, logo é necessário retirá-los deixando os exões.

Os intrões são retirados por meio de um processo designado splicing, transformando o


pré-mRNA → mRNA. Este ocorre após a transcrição (e durante, no caso dos primeiros intrões)

O processo de splicing

O spliceossoma é um conjunto de moléculas de RNA e proteínas que se assemelham ao


ribossoma e vão ser responsáveis por extrair os intrões (estes vão ser reciclados a seguir).

A porção central do spliceossoma consiste num agregado de


pequenos RNAs nucleares, snRNPs. Estes reconhecem
sequências de sítios de splicing pelo emparelhamento de bases
complementares entre os seus componentes de RNA e as
sequências no pré-mRNA, e também participam intimamente na
química do splicing.

Estabelecendo-se a complementaridade de bases, os RNAs vão


“chamar” outras subunidades do spliceossoma e vão dobrar o
intrão (formando um laço/‘lariat’) e retirá-lo, obtendo-se assim a
cadeia de mRNA.

No entanto, as cadeias de mRNA, por serem bastante


instáveis, não se encontram por si só no citoplasma, mas sim
associadas a proteínas: ligada ao cap, ligada à cauda de poli A e
ligada ao local de ligação de 2 exões (o complexo de junção de
exões, EJC).

O mRNA final necessita ter passado por estas três


modificações (cap de m7g na ponta 5’, splicing para cortar
todos os intrões e clivagem e colocação de cauda de 150-200
adeninas na ponta 3’) para poder ser exportado através dos
poros nucleares e alcançar os ribossomas no citosol.

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TRADUÇÃO

A tradução é o processo através do qual há síntese de proteínas a partir de mRNA.

Para se iniciar a tradução é necessário definir o quadro de leitura, ou seja o padrão de


agrupamento dos nucleótidos em grupos de 3.
Qualquer sequência de mRNA tem sempre 3 possíveis quadros de leitura.

A tradução tem a intervenção de um agregado macromolecular chamado ribossoma


(subunidade maior e menor), de tRNA com os aminoácidos e do mRNA.

O 1º passo da tradução é realizado pela subunidade menor do ribossoma. A subunidade


vai fazer o reconhecimento do quadro de leitura, associando-se a proteínas (fatores de iniciação
de tradução) e ao tRNA que transporta o aminoácido metionina, o tRNA de iniciação
(insere-se no local P do ribossoma). Este tRNA é diferente dos restantes tRNAs que
transportam metionina para o resto da proteína.

NOTA
Os tRNAs unem-se aos respetivos
aminoácidos através das aminoacil-tRNA
sintetases (existe uma para cada aminoácido) e
ligam-se ao ribossoma em três locais específicos
designados A (de Adição), P (de ligação
Peptídica) e E (de Exit)

A subunidade menor vai ligar-se às proteínas associadas ao cap e posteriormente irá


deslocar-se ao longo do mRNA até encontrar o codão da metionina (AUG) e o tRNA formar
pontes de hidrogénio (complementaridade) entre o AUG e o anticodão da sua constituição.

O 2º passo consiste na junção da subunidade maior do ribossoma.

O 3º passo corresponde ao deslocamento do ribossoma de 5’ → 3’.

O 4º passo compreende a junção dos tRNAs aos correspondentes codões, à medida que o
ribossoma percorre o mRNA.

Para finalizar, como 5º passo, o ribossoma encontra um codão de finalização (UAG, UAA
ou UGA), não se liga a um tRNA, mas sim a uma proteína (fator de terminação /release factor)
que provoca o desmantelamento do ribossoma e a libertação da proteína sintetizada.

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Possivelmente importante: A cicloheximida é um antibiótico


que interfere na tradução de um mRNA para proteína (síntese
proteica), ligando-se ao ribossoma e impedindo a associação de
mais tRNA.

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As regiões do mRNA localizadas antes do codão de iniciação e depois do codão de


finalização designam-se UTR (untranslated region). Temos portanto as UTRs 5’ e 3’, nas
respectivas extremidades da molécula de mRNA. Entre as duas UTRs temos as coding
sequences (CDS).

IMPORTANTE: uma única molécula de mRNA procariótica pode codificar várias


proteínas diferentes.

A concentração final de cada


proteína depende da velocidade de
cada etapa indicada. Mesmo após a
produção de um mRNA e da sua
proteína correspondente, as suas
concentrações podem ser reguladas
via degradação. Embora não
ilustradas, a atividade da proteína
pode também ser regulada por outras
modificações pós-traducionais ou
pela ligação de pequenas moléculas

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T4 - Replicação e recuperação do DNA


Animação

Replicação semi-conservativa: As 2 cadeias de uma molécula de DNA vão-se separar e cada


uma vai ser usada como molde para a síntese de uma nova cadeia. Assim, cada nova molécula de
DNA possui uma cadeia original e outra cadeia recém-sintetizada.

Ao longo do DNA existem sequências de nucleótidos específicas denominadas origem de


replicação, que são o local onde se juntam proteínas iniciadoras que vão auxiliar a DNA
polimerase (não conf undir com RNA polimerase) a ligar-se a este local para iniciar a replicação.
As DNA helicases são enzimas que ajudam no desenrolamento da dupla hélice do DNA.

NOTA: Todas as moléculas de DNA têm pelo menos


uma origem de replicação (plasmídeos é somente 1).

Ao nível de cada origem de replicação, a separação das cadeias vai progredir nos dois sentidos, o
que leva à adição de nucleótidos nos dois sentidos. O avanço desta separação é representado
pelas forquilhas de replicação (2 forquilhas por cada origem de replicação).

Quando as moléculas de DNA são longas são precisas várias origens de replicação. As novas
cadeias que se estão a sintetizar vão avançando até se fundirem com outras forquilhas de
replicação.

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Duas forquilhas de replicação


afastam-se de cada origem de
replicação em direções opostas.
Estes esquemas representam a
mesma porção de uma molécula
de DNA e como ela se poderia
parecer em diferentes momentos
durante a replicação. As linhas em
laranja representam as duas fitas
de DNA parental; as linhas
vermelhas representam as fitas de
DNA recém-sintetizadas.

A DNA polimerase é uma enzima fundamental para a replicação e é responsável pela adição de
nucleótidos à extremidade 3’ da cadeia molde. Esta enzima vai sintetizar uma nova cadeia
sempre no sentido 5’ → 3’.

Assim, as duas cadeias vão ser sintetizadas em sentidos opostos e a velocidades diferentes. As
leading strands vão ser as primeiras cadeias a ser sintetizadas começando na origem de
replicação em direção à forquilha (na imagem são a inferior do lado direito e superior do lado
esquerdo). As lagging strands vão ser sintetizadas em fragmentos descontínuos (fragmentos de
Okazaki) desde a forquilha de replicação em direção à origem (na imagem são as superiores do
lado direito e inferiores do lado esquerdo).

Em cada lado da forquilha, é necessário que a leading strand vá


separando as cadeias-mãe à medida que é transcrita, para que a
lagging strand correspondente possa começar a transcrever desse
lado. Isto vai acontecer em pedaços ao longo do tempo, daí a
formação da lagging strand ser feita em fragmentos (de Okazaki)

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Para a DNA polimerase poder começar a catalisar a adição de


nucleótidos precisa de se juntar a uma molécula com duas cadeias. Para
tal acontecer, a enzima primase vai usar a cadeia molde para juntar
nucleótidos de RNA de 5’ → 3’, formando um pequeno polímero,
um primer (iniciador de replicação). Assim, fica formada a cadeia
dupla à qual a DNA polimerase se pode ligar para iniciar o processo de
replicação.
NOTA: A primase é um tipo de RNA polimerase, logo o
primer é composto por RNA, sendo necessário substituí-lo
eventualmente por DNA.

A DNA polimerase avança ao longo da cadeia molde,


adicionando nucleótidos até atingir o próximo primer. Neste
local, uma nuclease (mais especificamente uma RNAse) vai ser
responsável pela degradação do primer e, de seguida a DNA
polimerase vai juntar nucleótidos de DNA correspondentes à
origem de replicação. Depois, a DNA ligase vai ligar as duas
cadeias.

A DNA polimerase é tão precisa, que produz somente cerca de


um erro a cada 10⁷ pares de nucleótidos que ela copia.

A leading strand vai ser sintetizada continuamente e vai


“empurrar” a forquilha de replicação para permitir a adição de
primers na lagging strand que se sintetiza de forma
descontínua. A partir de cada primer, a DNA polimerase
catalisa fragmentos de DNA até atingir o primer anterior.

Os cromossomas das células eucarióticas são moléculas lineares, logo vão possuir duas pontas designadas por
telómeros. Como os cromossomas de células procarióticas são circulares não vão possuir telómeros. (Seminário 2)

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Biologia Molecular e Celular 20-26

A telomerase é uma enzima que vai sintetizar nucleótidos de DNA complementares ao primer e
vai prolongar os telómeros com cópias da mesma sequência de nucleótidos.
Estas sequências não vão ter muita importância a nível de transcrição e tradução pois, cada vez
que a célula se divide vão-se perder fragmentos destas pontas que estão lá para serem perdidos
(em alternativa a perderem genes funcionais).

A enzima DNA polimerase é extremamente eficaz na


verificação de erros:

1º A enzima monitora cuidadosamente o emparelhamento de


bases entre o nucleótido a ser incorporado e a fita molde
quando a correspondência for correta a DNA polimerase irá
catalisar a reação de adição do nucleótido.

2º Quando a DNA polimerase comete um raro engano e


adiciona um nucleótido errado, ela pode corrigir o erro por
meio de uma atividade denominada autocorreção
(proofreading) que ocorre durante a síntese de DNA. Antes
que a enzima adicione o nucleótido seguinte a uma fita de
DNA em crescimento, ela verifica se o nucleótido previamente
adicionado emparelha corretamente com a fita molde. A RNA
polimerase não consegue fazer proofreading

➔ Os raros erros no processo de cópia que escapam ao proofreading são corrigidos pelas
proteínas de reparo do mau emparelhamento, que aumentam a precisão da replicação do
DNA para um erro a cada 10⁹ nucleótidos copiados. - Sistema de reparação de
nucleótidos mal emparelhados (mismatch repair).

➔ Os processos de replicação e reparo do DNA altamente precisos desempenham um


papel-chave na proteção contra o crescimento descontrolado de células somáticas,
conhecido como cancro.

22
Biologia Molecular e Celular 20-26

O sistema de nucleótidos mal emparelhados (mismatch repair) consiste num grupo de


proteínas que verifica constantemente a distância entre nucleótidos e, quando detetam um
emparelhamento errado, corrigem-no. Mutações germinais nos genes deste sistema aumentam a
probabilidade do desenvolvimento de Carcinoma do Cólon e Reto Hereditário não associado
a Polipose (CCRHNP) ou Síndrome de Lynch.

Os dímeros de timina são uma das consequências mais


frequentes da exposição à radiação UV. Esta lesão no DNA
consiste na formação de ligações covalentes entre duas timinas
adjacentes. Para corrigir estes dímeros, existe um sistema de
reparação denominado reparação por excisão de nucleótidos
que vai remover os nucleótidos danificados e substituí-los pelos
corretos. Uma falência neste sistema vai causar manchas na pele,
maior sensibilidade à exposição solar e maior risco de
desenvolvimento de cancro de pele.

Quando a DNA helicase está a desenrolar a dupla hélice, vão-se


formar forças de torção que podem levar à quebra das ligações
fosfodiéster numa ou em ambas as cadeias. Isto pode ser uma
fonte de mutação devido à perda de nucleótidos.
Existem dois sistemas para reparar estas quebras.
● A recombinação não homóloga, onde uma DNA ligase
junta imediatamente as duas extremidades com a
probabilidade de ter havido uma perda de nucleótidos.
● A recombinação homóloga, onde a molécula de DNA quebrada usa a molécula de DNA
irmã como molde para, com a DNA polimerase, reparar a quebra.

As proteínas BRCA1 e BRCA2 são essenciais para a reparação do DNA por recombinação
homóloga. Mutações na linha germinal nos genes BRCA1 e BRCA2 aumentam muito o risco
de desenvolvimento de cancro de mama e ovário.

23
Biologia Molecular e Celular 20-26

T5 - Cromatina, cromossomas e epigenética


Cromatina: DNA + Histonas + proteínas
cromossómicas não histonas
O nucléolo é muito denso porque possui cromatina; é o
local, no núcleo, onde regiões de diferentes
cromossomas que contêm genes para o rRNA se
encontram.

As proteínas que se ligam ao DNA para formar cromossomas eucarióticos são divididas em dois
grupos:
1. Proteínas Histonas – presentes em enormes quantidades (mais de 60 milhões de diferentes
tipos de moléculas)
2. Proteínas Não Histonas

Heterocromatina → Cromatina muito concentrada (aparece com cor negra no microscópio


eletrónico)

Cromossomas:
➔ Na fase mitótica a cromatina está no seu estado mais condensado, formando os
cromossomas;
➔ Na fase interfásica a cromatina está no seu estado menos condensado.

Cariótipo: Conjunto dos 46 cromossomas da célula humana dispostos de forma ordenada.


Podemos concluir da sua análise que: 1- Os cromossomas têm tamanhos diferentes; 2-Através do
chromosome painting podemos localizar alterações cromossómicas.

Translocação recíproca → é uma anomalia cromossómica causada pelo rearranjo de partes


entre cromossomas não-homólogos. Um gene de fusão pode ser criado quando a translocação se
une a outros dois genes separados, algo comum no cancro. Ou seja, é como se fosse o
crossing-over, mas de cromossomas numéricos diferentes.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Nucleossoma: DNA associado a um octâmero de


histonas [(H2A, H2B, H3 e H4) x2]. Existe
também a histona H1 “linker” que serve para
“prender” o fio de DNA às histonas
anteriormente referidas e, junto com o linker
DNA, aproximar os nucleossomas, condensando
ainda mais a cromatina. As histonas formam o
núcleo do nucleossoma.
Estas histonas são constituídas maioritariamente
por arginina e lisina, o que lhes confere uma carga
positiva. O facto de terem carga positiva ajuda-as
a terem uma ligação forte ao esqueleto açúcar-fosfato de carga negativa do DNA, o que explica o
porquê das histonas se poderem ligar a qualquer sequência de DNA.

Cada histona do núcleo de um nucleossoma possui uma longa cauda, um terminal


N-aminoácido. Estas caudas prolongam-se para fora do nucleossoma ficando assim sujeitas a
vários tipos de modificações químicas covalentes que controlam muitos aspetos da estrutura da
cromatina.

25
Biologia Molecular e Celular 20-26

Complexo de remodelação da cromatina: Estes complexos utilizam a energia derivada da


hidrólise do ATP para libertar o DNA do nucleossoma e “empurrá-lo” ao longo dos octâmeros
de histonas expondo, desse modo, o DNA. É responsável por condensar e descondensar a
cromatina (é como se fosse um sistema de roldanas).
Este processo está inativo durante a mitose, o que ajuda os cromossomas mitóticos a manter a
sua estrutura extremamente condensada.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Outra maneira de alterar a estrutura da cromatina baseia-se na modificação química reversível


das histonas. As caudas das 4 histonas centrais estão sujeitas a modificações covalentes. Por
exemplo, grupos acetil, fosfato ou metil podem ser adicionados ou removidos do nucleossoma
por enzimas que residem no núcleo – nucleases.
Aqui fica mais evidente a importância das caudas-N-terminais, dado que estas se encontram parcialmente fora do
cromossoma permitem a atuação das enzimas responsáveis por aquelas modificações químicas.

Nota que específicas combinações de modificações na cauda das histonas, juntamente com as
proteínas que se ligam a elas, podem ter vários significados para a célula. Por exemplo, um
padrão pode indicar que um específico segmento de cromatina foi recentemente replicado
enquanto que outro padrão indica que os genes daquele segmento de cromatina devem ser
expressos.

❏ A lisina é um a.a com carga positiva, sendo responsável por estabelecer ligações eletrostáticas
com o DNA (que tem carga negativa) → Compactação da cromatina → uma enzima vai ser
responsável por, por exemplo ACETILAR (Histona Acetiltransferase, HAT)→ as cargas
positivas da lisina são removidas, adquirindo carga negativa → passa a repelir-se do DNA →
levando à descompactação da cromatina → vai promover a aderência de fatores de
transcrição ou da RNA polimerase. A Histona Desacetilase, HAD/HDAC, vai fazer o
oposto: remove os grupos acetil da histona, levando à sua compactação, impedindo a
transcrição.

❏ A METILAÇÃO da lisina (sobretudo da lisina 9’ da cauda N-terminal de H3), por outro


lado, tem como função sinalizar o recrutamento das proteínas que, posteriormente, terão
funções específicas como, por exemplo:
❏ Silenciamento de genes;
❏ Formação de heterocromatina.
Nota que estes processos são induzíveis, isto é, se houver, por exemplo, metilação na cauda de
uma histona, esta vai espalhar-se ao longo da heterocromatina, até encontrar uma barreira na
sequência do DNA.
Isto acaba por ser muito vantajoso quando queremos silenciar grandes porções de genes...MAS
também pode ser muito perigoso pois deixaríamos de ter genes para transcrever. Assim, é
necessário que haja este sinal ou região que sirva como “travão” daquela alteração.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Acetilação → green light, go Metilação → red light, STOP

Este é o caso da alteração que ocorre no gene que codifica a 𝛃-globina que se localiza perto de
heterocromatina. Em alguns casos, vai haver o silenciamento deste gene conduzindo a uma
grave anemia.

Como se inicia o processo da transcrição de um gene?


Inicialmente, o complexo de remodelagem da cromatina terá de associar ao promotor - TATA
BOX → São chamados mais fatores para participarem na transcrição, entre os quais fatores que
alterem a estrutura da cromatina - como, por exemplo, 1- Remodeladores da cromatina
dependentes de ATP (expõem a TATA BOX) 2-enzimas modificadoras de histonas (enzima
acetil-transferase) responsável pela acetilação das lisina das caudas N-terminais → culmina no
início da transcrição

Outra grande importância da heterocromatina é o conceito de memória/identidade celular:

1. Positive feedback loops: temos um gene + sinal → o gene começa a ser


transcrito. O produto dessa transcrição vai ser um fator de transcrição que vai
regular a própria transcrição (pensar no conceito da cobra a morder o rabo)

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Biologia Molecular e Celular 20-26

2. Metilação do DNA A enzima DNA metil-transferase vai ser responsável por adicionar
um grupo CH3 (metil) ao carbono 5’ da citosina.
ATENÇÃO: Não ocorre em todas as citosinas. Ocorre
apenas em citosinas que são sucedidas por guanina -
Chamam-se CpG dinucleótidos - onde é que os
podemos encontrar?
➔ Ilhas CpG (80% dos promotores dos genes)
➔ Regiões intergénicas (DNA não codificante)
➔ Elementos repetitivos
Ilhas CpG metiladas → Não ocorre transcrição
Ilhas CpG não metiladas → Ocorre transcrição

P.S: A metilação da CpG é sempre


SIMÉTRICA para permitir que
aquando da replicação cada
molécula de DNA herde uma cópia
do DNA metilado

3. Modificação das histonas - quando a célula replica o seu genoma, cada hélice do DNA
da célula-filha recebe apenas metade das histonas parentais. Com essas histonas vêm
também as modificações covalentes nas suas caudas que revelam o estado que a
cromatina se encontrava naquela zona particular do cromossoma parental. Portanto,
cada cromossoma-filho irá inicialmente conter uma mistura de dois tipos de
nucleossomas:
Aqueles que contêm as histonas modificadas herdadas a partir do cromossoma
parental
Aqueles que contêm novas histonas sintetizadas, que ainda não foram modificadas
Neste ponto, as proteínas (metiltransferase de manutenção?) que reconhecem as histonas
modificadas podem se ligar às histonas-parentais e induzir depois as mesmas
modificações nas histonas-virgens, restabelecendo assim o padrão da estrutura da
cromatina encontrada no progenitor.

29
Biologia Molecular e Celular 20-26

T6 - Regulação da expressão genética

O organismo de um ser tem de ser visto como um corpo.

O corpo de um ser pluricelular é constituído por uma série de estruturas e funções celulares,
que são determinadas pela expressão genética com formação de diferentes proteínas. A
formação de diferentes proteínas confere características diferentes a diferentes células.

Inicialmente… a diferenciação celular a partir de um ovo, ao longo do desenvolvimento


embrionário, era vista e associada a uma perda de genes, perdurando aqueles necessários ao
funcionamento daquela célula. Contudo, rapidamente se provou que esta teoria era ERRADA.

Provado a partir de experiência com pele de rãs (uma célula da pele da rã,
embora já diferenciada, conseguiu levar à formação total de um girino quando o seu núcleo foi
injetado num ovo de rã cujo núcleo tinha sido previamente destruído)

PODEMOS ASSIM AFIRMAR


TODAS AS CÉLULAS DO ORGANISMO POSSUEM O MESMO GENOMA, MAS OS
GENES EXPRESSOS EM CADA TIPO DE CÉLULAS VARIAM

A construção de um organismo multicelular com funções diversas assenta num processo


que é: REGULAÇÃO DA EXPRESSÃO GENÉTICA

Ao longo destas etapas há mecanismos de regulação e controle.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

TRANSCRIÇÃO

O promotor presente na cadeia de DNA não tem a capacidade de regular e controlar a


transcrição, pois apenas atua como forma de sinalizar o início da transcrição para a RNA
polimerase. Então têm de existir outros fatores que vão ajudar a RNA polimerase a encontrar
o promotor e a começar a transcrever ou impedir a RNA polimerase de encontrar o promotor
e de começar a transcrever.
Fatores Proteínas

Têm a função de reconhecer determinadas sequências do DNA


designadas SEQUÊNCIAS REGULADORAS.
Cada proteína reguladora de transcrição reconhece uma sequência específica.

NOS PROCARIONTES

Nas bactérias existem famílias de genes que partilham o mesmo promotor, sendo transcritos
pelo mesmo RNA polimerase. Esta família de genes participa nas mesmas reações sendo todos
precisos para o mesmo tipo de reação/ocasião.

TRIPTOFANO

Quando a bactéria tem triptofano no


meio, os reguladores irão agir no sentido de
não transcrever estes genes (que levam à
biossíntese de triptofano) de modo a não
haver desperdício de recursos e energia.

Quando não há triptofano no meio, a bactéria irá regular a transcrição no sentido de a ativar
e sintetizar triptofano. A bactéria quer ajustar a produção de triptofano e para isso precisa de
moléculas de triptofano

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Com triptofano no meio, este tem a capacidade de se ligar às enzimas reguladoras da


transcrição dos genes do triptofano.

Ligação do triptofano à proteína inativadora/repressora da transcrição

Modificação conformacional da proteína reguladora

Encaixe na sequência reguladora

Impedimento da ligação da RNA polimerase ao promotor

Sem o triptofano no meio é impossível que este se ligue à proteína reguladora.

Não há ligação do triptofano à proteína repressora, tornando-a inativa

A proteína não se liga à sequência reguladora

Não há proteína no promotor

Ligação da RNA polimerase ao promotor, havendo transcrição

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Biologia Molecular e Celular 20-26

LACTOSE E GLICOSE

A bactéria necessita de "açúcares", nomeadamente glicose para sobreviver e conseguir


realizar as suas funções vitais. Contudo, nem sempre é possível encontrar glicose no meio, mas
na presença de lactose este problema pode ser resolvido, através da clivagem da lactose em
glícidos mais simples.

Regulação dos genes necessários para a utilização da lactose pelas


bactérias em função da presença de glicose e lactose no meio

Quando não temos glicose e temos lactose no meio… a transcrição dos genes para a síntese
de enzimas que clivam a lactose é feita e implica os seguintes passos:

1. Ligação da lactose à proteína repressora da transcrição, não havendo ligação desta à


região reguladora
2. Aumento de um sinalizador da falta de glicose no meio designado AMP cíclico
3. Ligação do AMP cíclico à proteína ativadora da transcrição (CAP)
4. Ligação da proteína reguladora à sequência reguladora
5. Início da transcrição dos genes: por estimulação da proteína ativadora e por falta de
impedimento da proteína repressora

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Biologia Molecular e Celular 20-26

NOS EUCARIOTAS

ATIVADORA

SINAL → PROTEÍNA

REPRESSORA/INATIVADORA

As sequências reguladoras (enhancers), às quais se irão ligar as proteínas reguladoras, podem


encontrar-se bastante distantes do promotor (TATA BOX), no entanto a conformação espacial
do DNA permite o contacto entre o promotor e a proteína reguladora, que se encontra na
sequência reguladora.
O contacto destas zonas é entre a proteína reguladora e as proteínas articuladas à RNA
polimerase.

A forma como o DNA se dobra não pode ser aleatória pois estas conformações irão
influenciar que determinada sequência reguladora atue sobre determinado gene.
Para realizar este papel existem proteínas que regulam as dobras do DNA.
Uma proteína reguladora pode regular a transcrição de vários genes desde que a
sequência reguladora à qual se liga esteja associada a vários genes.

CORTISOL

Quando o cortisol entra numa célula irá ligar-se a uma proteína - recetor de cortisol - que
terá capacidade de se ligar a uma sequência reguladora caso se encontre ativo (ligado ao cortisol)

Todos os genes associados a esta sequência irão ser ativados quando o cortisol entra na
célula.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

A capacidade de ativar e inativar muitos genes diferentes, usando um número limitado de


reguladores da transcrição, não é útil apenas na regulação do dia a dia da função celular. Ela é
também um dos meios pelos quais as células eucariotas se diferenciam em tipos particulares de
células durante o desenvolvimento embrionário.

Um caso importante de realçar no que toca aos reguladores de transcrição é que estes
permitem que uma célula diferenciada se possa converter diretamente noutra (um processo
chamado transdiferenciação).

Exemplo:

Outra funcionalidade dos reguladores de transcrição que merece grande destaque é a


capacidade de induzirem a reversibilidade da diferenciação de algumas células, passando estas
de um estado diferenciado para um estado de células-tronco pluripotentes (a isto chama-se
desdiferenciação).

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Biologia Molecular e Celular 20-26

As células pluripotentes são células não diferenciadas que têm a capacidade de dar origem a
todos os tipos de células especializadas do organismo, muito semelhantes às células-tronco
embrionárias. (Células ES)

Usando um conjunto definido de reguladores da transcrição, fibroblastos de ratinho em


cultura têm sido programados para se tornarem células-tronco pluripotentes induzidas (iPS) –
células que parecem e se comportam como células ES pluripotentes derivadas de embriões. O
método foi rapidamente adaptado para se produzir células iPS de uma grande variedade de tipos
celulares especializados, incluindo células retiradas de seres humanos, utilizando fatores
reguladores como o Oct4, Sox2 e Klf4. Tais células iPS humanas podem, então, ser destinadas a
gerar uma população de células diferenciadas para uso no estudo ou tratamento de doenças.

TRADUÇÃO

A regulação do processo de tradução passa pela regulação do tempo de vida dos mRNAs
quando chegam ao citosol.
O tempo de vida de um mRNA é ditado pela existência de sequências nucleotídicas
específicas, localizadas nas regiões não traduzidas. Essas sequências muitas vezes contêm sítios de
ligação para proteínas que estão envolvidas na degradação do RNA.

REGULAÇÃO DA TRADUÇÃO

Cada mRNA possui sequências que ajudam a controlar a frequência e a eficiência de sua
tradução em proteína. Essas sequências controlam a iniciação da tradução. Embora os detalhes
difiram entre eucariotos e bactérias, a estratégia geral é similar para ambos.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

BACTÉRIAS

As moléculas de mRNA bacteriano possuem uma sequência (o RBS, Ribosomal Binding


Site, também chamado de Sequência de Shine-Dalgarno), à qual se irá ligar o ribossoma, atrás do
codão AUG onde a tradução se inicia. Essa sequência de ligação forma pares de base com o RNA
na subunidade ribossómica menor, posicionando corretamente o codão AUG no ribossoma.
Visto que essa interação é necessária para uma iniciação de uma tradução eficiente, ela torna-se
um alvo ideal para o controle da tradução. Ao bloquear, ou expor, a sequência de ligação ao
ribossoma, a bactéria pode inibir, ou promover, a tradução de um mRNA, respetivamente.

EUCARIOTAS

As moléculas de mRNA eucariota possuem uma sequência (a sequência de Kozak) que


auxilia a direcionar o ribossoma para o primeiro AUG, o codão onde a tradução se irá iniciar.
Proteínas repressoras eucarióticas podem inibir a início da tradução pela ligação a sequências
nucleotídicas específicas na região não traduzida do mRNA, impedindo assim o ribossoma de
encontrar o primeiro codão AUG. Quando as condições se modificam, a célula pode inativar o
repressor para iniciar a tradução do mRNA.

REGULAÇÃO DA DEGRADAÇÃO DO mRNA

Como já é do conhecimento geral, nem todos os genes codificam proteínas, podendo muitas
vezes codificar RNA funcional que não irá dar origem a uma proteína, ou seja, nem sempre o
passo final da expressão genética é a formação de proteínas.

Os RNAs que podem ser formados aquando da transcrição de porções de DNA são:
snRNA; tRNA; rRNA; miRNA; siRNAs; longos RNA não codificantes.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

A degradação do mRNA como forma de regulação da tradução é um processo que tem


interferência de 3 dos RNAs acima mencionados, nomeadamente: miRNA, siRNA, longo
RNA não codificante.

miRNA
Os miRNAs são moléculas que controlam a expressão genética pela complementaridade
de bases com mRNAs específicos, reduzindo a sua estabilidade e a sua tradução em proteína.

1. Sintetizado no núcleo, onde se dobra sobre si próprio, formando pontes de hidrogénio


2. Transportado para o citoplasma
3. Processamento especial (miRNA maduro e funcional)
4. Associação ao complexo RISC (complexo de silenciamento induzido - RNA-induced
silencing complex)

NOTA - o complexo RISC patrulha o citoplasma em busca de mRNAs que sejam


complementares à molécula de miRNA ligada.

5. Complementaridade com as bases de uma cadeia de mRNA encontrado


6. Degradação do mRNA por uma nuclease do RISC
7. Libertação do complexo RISC

NOTA - um único miRNA – como parte do complexo RISC – pode eliminar uma
molécula de mRNA atrás de outra, bloqueando de maneira eficiente a produção da
proteína codificada por estas moléculas de mRNA.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

siRNA

Existe um sistema de eliminação de moléculas de RNA


“estranhas”, em particular RNAs de cadeia dupla, designado
interferência de RNA (iRNA). Este sistema serve como um
sistema imunitário para estas células contra certos vírus

1. RNAs estranhos de cadeia dupla são clivados em


pequenos fragmentos (pequenos RNAs de interferência -
siRNAs) por uma proteína chamada DICER
2. Associação dos siRNAs ao RISC
3. O complexo RISC desfaz-se de uma das cadeias do siRNA
4. Associa-se à outra cadeia e usa-a para encontrar moléculas
de RNA complementar

Caso outro vírus igual tente infetar esta célula, este complexo
RISC irá reconhecer através do siRNA, ligando-se por
complementaridade e degradando o RNA viral/estranho.

LONGOS RNAs NÃO CODIFICANTES (seminário nº2)

Um dos longos RNAs não codificadores mais bem entendidos é o Xist. Essa enorme
molécula de RNA, com 17.000 nucleótidos de comprimento, é um interveniente f undamental
na inativação do cromossoma X – processo pelo qual um dos dois cromossomas X, nas células
de fêmeas de mamíferos, está permanentemente silenciado.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

T7 - A evolução dos genes e dos genomas

A estabilidade do DNA na transmissão de informação genética entre gerações é


essencial para a manutenção de uma espécie, mas a variabilidade genética é a base da
evolução. Ao considerarmos um longo espaço de tempo (milhões de anos), a variabilidade
genética entre indivíduos leva ao aparecimento de novas espécies. Num curto espaço de tempo
(algumas gerações), a estabilidade do DNA é mais notória e existe a variabilidade
interindividual. Esta variabilidade interindividual faz com que indivíduos da mesma espécie
sejam diferentes entre si, mas também está na origem de doenças genéticas.

A variabilidade genética é algo inerente à vida pois, cada vez que existe uma replicação do
genoma, vão existir erros que causam variação na sequência do DNA.

Exemplo:

Uma estirpe de E. Coli sofreu uma mutação no gene His, o que impede estas bactérias de
fazer a síntese de histidina (essencial para a sua sobrevivência). Assim, esta estirpe foi colocada
durante alguns dias num meio de cultura rico em histidina, onde se replicaram várias vezes.
Depois, as descendentes destas bactérias foram colocadas numa caixa de Petri sem histidina.

Verificou-se que apenas um número reduzido de bactérias sobreviveu a este meio de


cultura. Isto deve-se ao facto de estas terem sofrido outra mutação no gene His que as
possibilitou fazer a síntese de histidina. Esta mutação ocorreu aleatoriamente enquanto as
bactérias se estavam a replicar no meio de cultura inicial. Quando a estirpe foi introduzida no
meio sem histidina, criou-se uma pressão seletiva onde apenas as bactérias com a nova
mutação sobreviveram e replicaram.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Na natureza estão sempre a ocorrer mutações esporádicas e aleatórias. Os indivíduos com


estas mutações vão ser sujeitos a uma pressão seletiva do meio ambiente. Uma de três situações
pode ocorrer:

· A mutação é favorável e o indivíduo vai-se adaptar melhor ao meio ambiente.


Consequentemente, a mutação vai ter uma prevalência alta nos sobreviventes.

· A mutação provoca uma menor capacidade de sobrevivência do indivíduo, sendo


a sua prevalência baixa na população.

· A mutação não influencia a sobrevivência do indivíduo, por isso mantém-se na


população com uma frequência média.

Temos uma grande conservação global do nosso genoma, mas existem sempre pequenas
diferenças sistemáticas que nos distinguem a todos.

Quando comparamos o genoma de indivíduos diferentes, reparamos que existem locais (SNP-
single nucleotide polymorphisms) na mesma zona do DNA com diferentes pares de bases.

Uma variante genética pode ser patogénica ou não. As SNP não são variantes patogénicas, são
polimorfismos responsáveis pela variabilidade interindividual. É frequente usar o termo
mutação para designar uma variante patogénica.

A comparação de genomas entre indivíduos do mundo inteiro revela informação de como os


humanos evoluíram e se espalharam pelo planeta.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Esta variabilidade genética tem consequências


para a medicina. A ancestralidade dos indivíduos
pode influenciar a maneira como reagem a certos
fármacos. A mesma dose de um determinado
medicamento pode ter efeitos completamente
diferentes em indivíduos com ancestralidades
distintas. A área que estuda estes fatores é a
farmacogenética.

Exemplos relevantes:

Tiopurinas são fármacos usados no


tratamento de leucemia e podem causar reações adversas muito graves em portadores de
variantes no gene TPMT, que metaboliza o fármaco.

O anti-retroviral abacavir, destinado a doentes portadores de HIV, causam reações de


hipersensibilidade potencialmente fatais em portadores de variantes no gene do sistema imune
HLA-B, cuja frequência varia dependendo da ancestralidade (3% populações Africanas, 5%
Caucasianos, 20% Indianos)

As principais causas da variação genética são:

· Erros durante a replicação do DNA

· Alterações químicas espontâneas do DNA

· Alterações químicas do DNA induzidas por exposição ao ambiente

As consequências de uma variação genética dependem da sua localização no genoma.

Pode ocorrer uma variação dentro da


região codificante do gene. Esta variação pode
originar uma alteração na função da proteína
codificada por este gene e provocar uma doença
ou originar características diferentes no indivíduo.

No caso de haver uma variação numa


sequência reguladora, a expressão do gene pode
ficar alterada e ter consequências para o
funcionamento da célula.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Durante o processo da divisão celular por vezes uma célula dá origem a uma célula filha
com o dobro da quantidade de DNA normal, não havendo segregação de cromossomas,
formando uma célula diplóide. A isto dá-se o nome de duplicação de genes. Na maioria das
vezes, este fenómeno acontece apenas em certos fragmentos do DNA. Assim, a célula vai conter
o gene original e uma cópia deste gene onde podem ocorrem variações genéticas neutras,
positivas ou negativas.

Exemplo: Os primeiros organismos que possuíam hemoglobina


apenas tinham uma cadeia polipeptídica que se ligava ao oxigénio.
Com o passar do tempo, houve então uma duplicação do gene que
codifica a globina (⍺ e ꞵ) e novas duplicações deram origem a
variantes beta globina.

O genoma humano não é apenas constituído por genes, aliás, a


maior parte do DNA é formado por sequências intergénicas e intrões.
Os exões constituem 2% do total do genoma humano, os intrões
20%, as sequências reguladoras e sequências não codificantes 25%, as
sequências repetitivas 50% dos quais 40% são as sequências móveis.
Estas últimas, deslocam-se no genoma, de cromossoma em
cromossoma, replicando-se como se fossem um vírus.

O movimento das sequências móveis (ou transposões) ocorre com pouca frequência, de
modo a garantir a estabilidade do DNA. Existem vários modos de transposição destes
elementos móveis:

1. Cut and paste transposition- O transposão desloca-se de um cromossoma para outro,


mantendo a quantidade de DNA total

43
Biologia Molecular e Celular 20-26

2. Replicative transposition- O transposão vai-se replicar e a sua cópia vai-se integrar


noutro cromossoma, o que vai aumentar a quantidade de DNA total.

3. Um retrotransposão é transcrito a RNA. Depois uma


transcriptase reversa transforma o RNA em cDNA e este vai
ser inserido noutro local do genoma.

Estes elemento móveis podem estar na origem de doenças pois, se se


moverem ou para um gene ou para uma sequência reguladora, vão
alterar a função de um gene.

Outra variante genética que ocorre no genoma humano é a


translocação entre cromossomas diferentes. Este processo,
conhecido como recombinação homóloga ou crossing-over,
ocorre durante a meiose e consiste na troca de porções do DNA
entre cromossomas homólogos. Estas recombinações são
perfeitamente normais e equilibradas e acontecem
fisiologicamente. No entanto, podem ocorrer recombinações
entre cromossomas não homólogos, o que pode alterar a
expressão génica e, por isso, está na origem de doenças.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

T8 - Introdução à Imunologia
A imunologia estuda o sistema imunitário e a forma como este protege o organismo em
diferentes casos de invasão física, química ou biológica.

O sistema imunitário é constituído por órgãos e estruturas especializadas que cooperam entre si
e com as restantes partes do corpo de modo a controlar e destruir os agentes agressores. Além
disto, o sistema imunitário é ainda responsável pela destruição de células envelhecidas, anormais
ou mutantes (cancerosas) do próprio organismo. Constituição do sistema imunitário:

➔ Vasos linfáticos;
➔ Células efetoras (leucócitos, macrófagos e plasmócitos);
➔ Órgãos linfóides primários (Timo e a Medula Óssea - produção e maturação de leucócitos);
➔ Órgãos linfóides secundários (Baço, Adenóides, Amígdalas, Apêndice e Gânglios linfáticos).

Hematopoiese - a origem das células do sistema imunitário

As células estaminais hematopoiéticas (HSCs) dão origem a todas as linhagens de células do


sangue, incluindo as células do sistema imunitário. Assim, as células do nosso sistema imunitário
formam-se a partir da Hematopoiese, um processo de “commitment” e “differentiation” de
células estaminais hematopoiéticas localizadas ou na medula óssea (após o nascimento) ou no
fígado fetal (antes do nascimento).

Em primeiro lugar, serão abordados os princípios


e processos comuns ao desenvolvimento de
linfócitos B e T e, de seguida, aprofundaremos os
processos mais particulares aos linfócitos B e aos
linfócitos T.

Resposta imunitária - os tipos de imunidade

As linhas de defesa do organismo são diversificadas, fornecendo dois tipos de imunidade: a


imunidade inata e a imunidade adaptativa. A imunidade inata encontra-se presente em todos os
organismos e constitui uma imunidade não específica. A imunidade adaptativa só existe nos
vertebrados, resulta de um processo evolutivo e está dependente de células de defesa específicas
que reconhecem e eliminam o agente estranho específico.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

A imunidade adaptativa divide-se ainda em imunidade humoral (mediada por anticorpos) e em


imunidade celular (mediada por células). A primeira recorre-se dos linfócitos B e é mediada
pelos humores, isto é, pelos fluidos em circulação (os linfócitos B secretam anticorpos, que se vão
ligar a outras proteínas também elas em circulação - interação proteína-proteína). A segunda
recorre-se dos linfócitos T, que atuam contra outras células (reconhecem células cancerígenas
ou infetadas por vírus e tentam destruí-las - interação célula-célula).

Na globalidade, os intervenientes de todos


os tipos de imunidade acabam por se
relacionar intimamente, cooperando na
missão comum de neutralização e
destruição do agente patogénico.

Especificidade linfocitária - os recetores de antigénio enquanto VMRs

Como vimos, os linfócitos participam na imunidade adaptativa e, portanto, são células que
apresentam uma grande especificidade. Esta especificidade linfocitária tem por base o facto de
estas células apresentarem à superfície da sua membrana um conjunto de recetores de antigénios
cuja conformação é única, isto é, cada linfócito tem um recetor característico e distinto do
dos restantes.

As moléculas que compõem estes recetores são proteínas e são consideradas moléculas de região
variável (VMR), isto porque são constituídas por dois domínios cada, um domínio constante e
um domínio variável.

Por um lado, a região constante é constituída por uma sequência de aminoácidos bem definida
que tende a ser muito semelhante entre recetores de antigénios do mesmo tipo (BCR para as
células B e TCR para as células T). Esta região determina, no caso do BCR, por exemplo, a classe
a que pertence a imunoglobulina (IgA, IgD, IgE, IgG, IgM).

Por outro lado, a região variável localiza-se na porção terminal mais afastada da membrana do
linfócito, sendo constituída por uma sequência de aminoácidos que difere da dos restantes
linfócitos. A sequência de aminoácidos da região variável constitui os sítios de ligação e confere
12
a tão elevada especificidade característica da VMR, que podem ter até 10 sequências

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diferentes. Apenas o recetor que contenha uma determinada sequência de aminoácidos na região
variável pode reconhecer e ligar-se a determinado antigénio, formando um complexo
recetor-antigénio.

VMR - particularidades dos recetores BCR e TCR

Os recetores BCR e TCR são os recetores de antigénios dos linfócitos B e T, respetivamente.


Estes recetores são considerados heterodímeros que resultam do emparelhamento de duas
cadeias poli-peptídicas diferentes.
No caso dos recetores TCR, estes são constituídos por duas cadeias e podemos ter o
emparelhamento de cadeias α + β ou γ + δ, sendo o segundo caso mais raro. Este encontra-se
na membrana celular, sendo estabilizado na membrana celular por uma ligação dissulfito
(ligação covalente de dois resíduos de cisteína).

No caso dos recetores BCR, estes são constituídos por quatro cadeias, mas continuam a ser
considerados heterodímeros, pois estas cadeias são iguais duas a duas, pelo que temos o
emparelhamento de uma cadeia pesada (mais longa) e uma cadeia leve (mais curta) de cada lado.
Apenas existe uma possível cadeia pesada, existindo para esta duas possíveis cadeias leves, as
cadeias 𝜅 e λ. Estas apresentam-se unidas por ligações dissulfito.

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Enquanto que os recetores TCR apenas apresentam um local de ligação, o facto de os recetores
BCR serem constituídos por quatro cadeias e apresentarem um conformação em Y faz com que
estes apresentem dois locais de ligação ao antigénio. Além disso, o recetor TCR verifica-se
sempre acoplado à superfície do linfócito T, ao passo que o linfócito B, após ativado (por
reconhecimento de um organismo estranho) secreta anticorpos (formas solúveis do BCR).

Paradoxo de Landsteiner

Landsteiner lançou a questão “a que é que o sistema imunitário é capaz de reagir?” e,


testando, verificou que o organismo era capaz de produzir anticorpos contra qualquer tipo de
microorganismo que o infetasse.

● O sistema imunitário dos vertebrados identifica moléculas pela sua “forma”


(especificidade);
● Como em outros sistemas biológicos a identificação molecular faz-se por
complementaridade entre os componentes do sistema, no caso, entre as VRM e as
“moléculas-alvo”;
● A diversidade é aleatória e não finalista - não é dirigida para nenhuma infeção, antigénio
ou microorganismo, mas sim para tudo.

O nosso organismo é capaz de produzir VMR com afinidade para qualquer antigénio,
12
apresentando uma diversidade na ordem de 10 . Dizemos, portanto, que o potencial de
produção de anticorpos é praticamente ilimitado, pelo que ainda que após uma infeção não
fiquemos logo bem, há sempre uma resposta imunitária, ainda que esta possa não ser
completamente eficaz.

“Como é que um organismo finito e limitado consegue reconhecer qualquer molécula?”

Como sabemos, as VMR são proteínas codificadas e portanto, tendo por base o
Dogma Central da Biologia, são codificadas através do genoma, por genes
presentes no DNA. Contudo, sabe-se que o nosso genoma é muito finito,
5 12
apresentando cerca de 25 mil genes (menos de 10 ). Assim, como fazer 10
VMR diferentes a partir de um genoma tão finito?

A resposta ao paradoxo criado por Landsteiner foi descoberta mais tarde por Susumu Tonegawa,
merecedor de um prémio nobel, ao descrever o processo gerador desta enorme variabilidade, a
recombinação somática (recombinação aleatória de segmentos génicos em loci específicos, num
processo de “corte e costura” até se obter um gene funcional e distinto de indivíduo para
indivíduo).

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Vantagem evolutiva do Paradoxo de Landsteiner

Como descrito no paradoxo de Landsteiner, o nosso organismo recorre-se a uma “diversidade


não finalista como solução do desconhecido”, ou seja, como não pode prever o que o vai infetar
no futuro, recorre-se à diversidade e tenta cobrir o máximo de possibilidades.

O Sistema Imunitário é Darwinista

À luz da evolução, o sistema imunitário origina a maior diversidade possível e faz a seleção, a
cada infeção, dos anticorpos necessários para a resposta imunitária. O sistema imunitário tem
12
por propósito ser o mais diverso possível, conseguindo produzir VMR com até 10
combinações distintas. Após gerada toda esta diversidade, procede-se a uma seleção clonal
acoplada a uma proliferação clonal.

No caso das células B e T, cada vez que somos infetados por um determinado microorganismo,
tem lugar um enorme processo seletivo dos clones específicos para o agente em questão, isto,
acoplado à expansão dos clones que forem selecionados.

Processo de seleção

Os clones de linfócitos maturam ao nível dos órgãos linfóides primários. Estes clones, após
maturação, entram para os tecidos linfóides, verificando-se que cada um é único e tem uma
afinidade característica para determinadas moléculas. Estes linfócitos são sujeitos a um processo
de seleção que envolve específicos "checkpoints" que vão moldar o repertório de linfócitos B e T
final.

Destacam-se dois checkpoints onde o desenvolvimento celular é testado e o processo de


maturação procede unicamente se a etapa anterior do processo for concluída com êxito. No
primeiro checkpoint, verifica-se se a produção da primeira cadeia que compõe o recetor do
antigénio teve êxito. No segundo checkpoint, analisa-se a completa e correta montagem do
recetor de antigénio.

Durante o desenvolvimento linfocitário, as células B e T apresentam pré-recetores antigénicos,


designados pré-BCR, em células B, e pré-TCR, em células T. Estes pré-recetores são estruturas
sinalizadoras que contêm apenas uma das duas cadeias polipeptídicas presente em recetores
completos e enviam um conjunto de sinais ao linfócito em desenvolvimento que são necessários à
sua sobrevivência, proliferação e maturação. Apenas um em cada três rearranjos do recetor
está “in frame” (de acordo com o quadro de leitura) e, por isso, é capaz de gerar uma proteína de
recetor completa e correta. Deste modo, células que façam rearranjos “out of frame” ao nível dos
loci que codificam as cadeias do BCR ou do TCR, não expressam pré-recetor antigénico e,
portanto, não recebem os sinais necessários à sua sobrevivência, ingressando em apoptose.

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Por sua vez, os linfócitos que ultrapassem este primeiro checkpoint com sucesso, prosseguem e
iniciam um processo de rearranjo e expressão dos genes que codificam a segunda cadeia dos BCR
ou TCR e expressão do recetor antigénico completo enquanto ainda imaturos. Neste ponto,
células que expressem recetores úteis, isto é, que reconhecem células do complexo maior de
histocompatibilidade (MHC), devem ser preservadas e prosseguir na maturação - seleção
positiva. Ao passo que as que expressem recetores que reconheçam fortemente as próprias
estruturas (auto-reativas) devem ser imediatamente eliminadas ou induzidas a alterar os loci que
codificam os recetores antigénicos - seleção negativa.
* Note-se: sistema imunitário é capaz de reconhecer o que pertence e o que é estranho ao
organismo, já que cada indivíduo é geneticamente único e, por isso, bioquimicamente único.
Assim, os genes característicos de um indivíduo permitem a formação de proteínas e
glicoproteínas características desse indivíduo que funcionam como marcadores dessa célula
(marcadores celulares), logo, desse indivíduo.

No processo de reconhecimento devemos ter em conta as proteínas codificadas pelo complexo


maior de histocompatibilidade (MHC), presente em todas as células. As proteínas codificadas
pelo complexo maior de histocompatibilidade (MHC), grupo de genes localizado no
cromossoma 6, consistem em duas cadeias polipeptídicas ligadas à superfície da membrana
celular que constituem uma espécie de marcador celular, atuando quer no
auto-reconhecimento quer no processo de apresentação de antigénios estranhos (invasores) a um
tipo específico de células, os linfócitos T.

DIVERSIDADE LINFOCITÁRIA - BASES GENÉTICAS E MECANISMOS


Ao contrário de todos os genes, os genes que codificam os recetores de antigénios (BCR e TCR)
dos linfócitos não são herdados por cópias dos nossos pais, isto é, não herdamos genes “feitos”,
mas sim fragmentos que cada célula precursora de linfócito B ou T reorganiza à sua “forma”.

Basicamente, existe um conjunto de fragmentos contidos em loci específicos que não estão
organizados como um gene “normal” com promotores e enhancers e, portanto, não é
imediatamente funcional, requer sim, um processo de recombinação com “corte e costura" que,
no final, gere um gene funcional, viabilizando a sua expressão.

Organização na Germline dos genes que codificam os recetores BCR e TCR

Os genes que codificam os diversos recetores de antigénios presentes na membrana dos linfócitos
B e T são “ativados” por recombinação de loci específicos do genoma de linfócitos individuais
durante o seu processo de maturação. Estes loci iniciais são inertes e constituem a linha germinal
(germline).

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Esta germline é constituída, basicamente, por fragmentos génicos que podem ser divididos em
três zonas: variable (V), diversity (D) e joining (J). Um novo exão é rearranjado para cada gene
codificador de BCR ou TCR que se pretende formar pela fusão aleatória de um fragmento de
cada uma destas zonas. O exão V(D)J formado irá codificar o domínio variável da VMR em
questão.

Organização da Germline relativa aos recetores BCR

Três loci separados codificam todas as cadeias que podem entrar na constituição dos recetores
BCR, isto é, a cadeia pesada e as cadeias leves (𝑘 e λ), cada locus num determinado cromossoma.

Na extremidade 5’ do locus de cada gene que intervém na codificação de BCR existe um grupo
de segmentos V (variable). Distâncias variadas a 3’ destes, existe um grupo de segmentos J
(joining). Entre os segmentos V e J, existem, por vezes, segmentos adicionais, os segmentos D
(diversity). Nos grupos descritos, estes segmentos (ditos codificantes) estão separados por regiões
não codificantes.

Os segmentos génicos V, J e D (se presente) são reunidos para criar a sequência de codificação dos
domínios variáveis das cadeias de BCR.

Domínio variável da cadeia pesada (H) - fusão de segmentos V+D+J


Domínio variável da cadeia leve (L) 𝑘 e λ - fusão de segmentos V+J

A informação génica que codifica os domínios constantes (C) localiza-se a 3’ dos segmentos J.

Ao nível do BCR o processo de


rearranjo dá-se primeiro na cadeia
pesada e de seguida na cadeia leve. Na
cadeia leve primeiro faz-se o rearranjo
da cadeia 𝑘 e, apenas “if no success”
tenta-se o rearranjo da cadeia λ.

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Organização da Germline relativa aos recetores TCR


De um modo geral, cada locus TCR germinal encontra-se organizado de um modo muito similar
ao do BCR já descrito, com um grupo de diversos segmentos V a 5’, seguidos por segmentos D
(se presente), seguidos por segmentos J, todos eles a montante da porção génica que codifica o
domínio constante (C).

Os segmentos génicos V, J e D (se presente) são reunidos para criar a sequência de codificação dos
domínios variáveis das cadeias de TCR.

Domínios variáveis das cadeias β e δ- fusão de segmentos V+D+J


Domínios variáveis das cadeias α e γ - fusão de segmentos V+J

A informação génica que codifica os domínios constantes (C) localiza-se a 3’ dos segmentos J.

Ao nível do TCR o processo de rearranjo dá-se primeiro na cadeia ꞵ e, de seguida, na cadeia ⍺.

* Note-se: as informações genéticas que codificam a cadeia α e δ partilham o mesmo locus.

Recombinação Somática V(D)J - overview

A organização da linha germinal dos loci que codificam os recetores BCR e TCR descrita existe
em todo o tipo de células do corpo, contudo, esta não pode ser transcrita em mRNAs que
codifiquem recetores de antigenes funcionais. Os genes funcionais que codificam os recetores
BCR e TCR são gerados durante o desenvolvimento de linfócitos B e T, respetivamente, após a
recombinação do DNA que proporciona contiguidade dos segmentos
génicos codificantes.

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O processo de recombinação V(D)J ao nível de cada locus de cadeia de BCR ou de TCR envolve
o rearranjo de um segmento V, um segmento D (se presente) e um segmento J em cada linfócito,
de modo a formar um único exão V(D)J que codificará o domínio variável da cadeia
polipeptídica que entrará na conformação do recetor de antigene.

Cada rearranjo envolve um conjunto de passos:


➩ Primeiramente, a cromatina deve tornar-se acessível em específicas regiões do cromossoma, de
modo a permitir a sua interação com as enzimas que catalisam o processo de recombinação.
➩ De seguida, os segmentos génicos que se encontravam a uma distância cromossómica
considerável devem ser colocados próximos um do outro. Primeiro dá-se uma recombinação
entre os segmentos D e J e, de seguida, entre o segmento V e o complexo rearranjado DJ.
➩ A dupla cadeia é quebrada nas terminações destes dois segmentos, ocorrendo possível adição
ou remoção de nucleótidos (sequências P) nestas terminações, durante este processo.
➩ Após isto, as terminações processadas são unidas com adição aleatória de novos nucleótidos
(sequências N), de modo a gerar genes funcionais que podem ser eficientemente transcritos.
➩ As regiões correspondentes aos domínios constantes (C) encontram-se a jusante do exão
V(D)J rearranjado, separadas deste pelo intrão J-C da linha germinal. Este gene rearranjado é
transcrito para formar um transcrito primário de RNA.
➩ Este RNA primário é sujeito a um splicing que reúne o exão líder, o exão V(D)J e os exões da
região constante (C), formando um mRNA que pode ser traduzidos para formar uma das
cadeias do recetor do antigene.

* Note-se: a designação V(D)J, com o


“D” entre parênteses, tem por base o
facto que nem sempre existirem grupos
de segmentos D nos loci que codificam
algumas cadeias de recetores.

Como é que após a recombinação estas regiões passam a ser genes f uncionais?

Uma das consequências da recombinação V(D)J é que este


processo traz promotores localizados imediatamente a 5’ de
segmentos V para mais perto dos enhancers localizados a
jusante entre os intrões J-C. Estes enhancers maximizam a
atividade transcricional dos promotores e, portanto, são
importantes para a eficácia transcricional pós-recombinação.

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Sequências Sinalizadoras de Recombinação (RSSs)

As enzimas que catalisam a recombinação V(D)J reconhecem sequências particulares de DNA, as


chamadas sequências sinalizadoras de recombinação (RSSs), localizadas a 3’ de cada segmento
V, a 5’ de cada segmento J e de cada lado de cada segmento D.

As RSSs consistem consistem em sequências altamente conservadas de 7 nucleótidos


(heptâmero), geralmente CACAGTG, localizado adjacente à sequência codificante (segmento V,
D ou J) seguido por um espaçador de 12 ou 23 nucleótidos não conservados, seguido por uma
sequência conservada de 9 nucleótidos (nonâmero), geralmente ACAAAAACC.

Durante a recombinação V(D)J, as quebras da dupla cadeia são geradas entre o heptâmero da
região RSSs e o segmento codificante V, D ou J adjacente. Por exemplo, na recombinação V-J que
se dá ao nível da cadeia leve do BCR, as quebras têm lugar a 3’ do segmento V e a 5’ do segmento
J.

As terminações não codificantes que contêm os heptâmeros e o resto das regiões RSSs são
removidas sob a forma de círculo de excisão e as terminações codificantes são unidas.

* Note-se: o complexo enzimático RAG, que abordaremos adiante, tem ação que é direcionada
por estas sequências sinalizadoras de recombinação (RSSs, Recombination Signal Sequences).

Recombinação somática V(D)J - mecanismo molecular

O rearranjo dos genes que codificam os recetores BCR ou TCR representa uma evento
particular de recombinação não homóloga do DNA que é mediado pela ação coordenada de
diversas enzimas.

O processo de recombinação V(D)J pode ser dividido em quatros eventos distintos e


subsequentes:

Synapsis - as porções do cromossoma onde se localiza o gene que codifica o recetor de antigénio
(BCR ou TCR) é tornada acessível à maquinaria de recombinação somática. Consideram-se dois

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passos importantes para a acessibilidade. Em primeiro lugar, apenas RSSs


que estão localizadas em eucromatina aberta em um tipo específico de
célula serão expostas a enzimas de recombinação. Em segundo lugar,
dentro desse estado de eucromatina aberta, os segmentos génicos que estão
realmente a sofrer recombinação adquirem marcas de histona adicionais
(como a hipermetilação da lisina 4 na histona 3 - H3K4), modificação que
facilita o recrutamento de enzimas. Dois segmentos codificantes e os seus
RSSs adjacentes que adquiriram essas e outras marcas de histonas são
reunidos por um evento de loop cromossómico e mantidos lado a lado, em
posição.

Cleavage - são geradas quebras da dupla cadeia ao nível entre as RSSs e o


segmento codificante (V, D ou J) catalisadas por ação enzimática. Duas
proteínas codificadas por genes linfóide-específicos, designadas
Recombination-Activation Gene 1 e Recombination-Activation Gene 2
(RAG-1 e RAG-2) formam um complexo que contém duas moléculas de
cada proteína (conhecido como V(D)J recombinase), essencial para o
processo de recombinação. Ao nível deste complexo, apenas a proteína RAG-1 apresenta
atividade catalítica (funciona quase como uma enzima de restrição que reconhece a sequência
que reúne o heptâmero e o segmento codificante (V, D ou J) e efetua um corte na dupla cadeia).
A proteína RAG-2, por sua vez, liga-se a sítios H3K4 hipermetilados na cromatina e associa-se
com a RAG-1, ativando-a (sem esta ativação a RAG-1 não é capaz de cindir a dupla cadeia). A
RAG-1 faz então um corte (numa cadeia de DNA) entre a extremidade codificadora e o
heptâmero. O 3 ′ OH liberado da extremidade codificadora ataca uma ligação fosfodiéster na
outra fita de DNA, formando um hairpin covalente.

Hairpin opening and end processing: Após a quebra da dupla cadeia, os


hairpins formados devem ser abertos nas junções de codificação e os
nucleótidos (sequências P) podem ser adicionados ou removidos, segundo
um padrão de complementaridade, às extremidades dos hairpins clivados
de modo assimétrico pela enzima Artemis. Por sua vez, uma enzima
linfóide-específica, a Terminal Deoxynucleotidyl Transferase (TdT),
adiciona nucleótidos de DNA aleatórios (sequências N) aos términos de
segmentos onde vai ocorrer junção dos mesmos.

Joining: os términos codificantes são reunidos e ligados por um processo de reparação de


quebras da dupla cadeia comum a todas as células, o non homologous end joining, formando o
exão V(D)J.

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Geração de Diversidade

Como vimos, a enorme diversidade de


repertórios de células B e T é criada por
combinações aleatórias de segmentos génicos
da linha germinativa, unidos pela adição ou
deleção de sequências nas junções entre esses
segmentos. Assim, distinguem-se duas importantes fontes de diversidade:

Diversidade Combinatorial - diferentes combinações de segmentos génicos unidos por


recombinação V(D)J dão origem a recetores de antigenes distintos, isto é, com distintas regiões
variáveis e, portanto, distintas afinidades. (o mecanismo de recombinação somática permite-nos
6
produzir uma variedade de 10 moléculas diferentes, quer de BCR quer de TCR).

Diversidade Juncional - a maior contribuição para a diversidade de recetores de antigenes é feita


pela remoção ou adição de nucleótidos ao nível das junções de segmentos V e D, D e J ou V e J
aquando da sua junção.

P sequences - uma maneira pela qual isto pode ocorrer é se as endonucleases removerem os
nucleótidos da linha germinal nas extremidades dos segmentos de genes recombinantes. Além
disso, novos nucleótidos podem ser adicionados a este ponto. Basicamente, conforme
previamente descrito, os segmentos codificantes que são clivados pela RAG-1 formam hairpins
(laços em gancho) cujas extremidades são frequentemente clivadas assimetricamente pela enzima
Artemis de modo que uma fita de DNA seja mais longa que a outra. A fita mais curta deve ser
estendida por adição de nucleótidos complementares à fita mais longa antes da ligação dos dois
segmentos. A fita mais longa serve como um modelo para a adição de comprimentos curtos de
nucleótidos, chamados sequências P, por ubiquitous DNA repair enzymes .

N sequences - outro mecanismo de diversidade juncional é a adição aleatória de até 15


nucleótidos non-template-encoded (nucleótidos N) aos locais de junção V-D, V-J ou D-J. Esta
adição aleatória de novos nucleótidos é mediada pela enzima deoxinucleotidil transferase
terminal (TdT, terminal deoxynucleotidyl transferase).
* Note-se: A adição de nucleótidos P e nucleótidos N
introduz erros no quadro de leitura (frameshifts), que
teoricamente acabam por gerar codões de terminação
prematuros em duas de cada três junções (se o número total
de bases adicionado não for múltiplo de três). Em casos de
frameshifts, os genes recombinados não conseguem
produzir proteínas funcionais, contudo, este é o preço a
pagar pelo caos regulado necessário à diversidade gerada.

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Recombination-Activation Gene (RAG)

Como vimos, a recombinação somática V(D)J exige um processo de “corte e costura” do DNA.
Assim, os seres humanos possuem uma recombinase, a RAG, capaz de cortar o DNA em pontos
específicos (entre a sequência codificante e a região RSS).

Na realidade a RAG integra um complexo enzimático constituído por 4


moléculas, duas de RAG-1 e duas de RAG-2. Neste complexo, apenas a
RAG-1 tem atividade catalítica. A RAG-2, por sua vez, liga-se a sítios
H3K4 hipermetilados na cromatina e associa-se com a RAG-1, ativando-a.

● As RAG são enzimas linfóide-específicas (encontradas apenas nos linfócitos T e B). Nas
outras células o locus que codifica a RAG encontra-se completamente fechado sobre si
mesmo em heterocromatina, inacessível e sem qualquer expressão.
● A expressão da RAG é modulada muito controladamente, até mesmo nos linfócitos B e
T, pois apenas é expressa em específicas fases de maturação, durante a formação dos
recetores. Uma vez o recetor formado, ao atingir a membrana, começa a emitir um
conjunto de sinais para o núcleo que indicam que este está funcional e, a partir daí, a
expressão da RAG cessa.
● Antes da ação da RAG, não existem genes f uncionais, isto porque não há uma
estrutura organizada com promotor, enhancer e sequência sinal que indique o destino da
proteína.
● A RAG-1 e a RAG-2 são interdependentes, sem uma destas a recombinação somática
fica comprometida e, portanto, o desenvolvimento linfocitário torna-se inviável, não se
formando linfócitos maduros.

Terminal deoxynucleotidyl transferase (TdT)


A TdT tem por função inserir nucleótidos aleatoriamente entre os fragmentos recombinados
durante a recombinação V(D)J.

● A TdT é uma enzima linfóide-específica expressa exclusivamente em linhagens de


linfócitos, durante estados específicos de desenvolvimento linfocitário.

● A TdT adiciona nucleótidos aleatórios entre términos de DNA, adicionando geralmente


múltiplos de 3 (caso contrário é comprometido o quadro de leitura). Pode adicionar até
um máximo de 15 nucleótidos, podendo gerar até 5 novos aminoácidos com eles.

● Em média a TdT adiciona 6 nucleótidos, gerando 2 novos aminoácidos com eles.

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Linfócitos B

Linfócitos B - overview

Os linfócitos B participam na imunidade adaptativa, sendo responsáveis pela chamada


imunidade humoral, mediada pelos humores, isto é, pelos fluidos em circulação.

Estas células, quando maduras, expressam na superfície da sua membrana um recetor proteico
VMR, o BCR, que é específico deste tipo de linfócitos e, portanto, não é encontrado em mais
nenhum tipo de células do nosso organismo.

A molécula de BCR é um recetor de superfície constituído por duas


cadeias pesadas (H), mais longas e iguais entre si, e por duas cadeias
leves (L), mais curtas e iguais entre si. Estas cadeias organizam-se numa
estrutura em forma de “Y” que apresenta um domínio constante (em
maior interação com a membrana celular) e um domínio variável (mais
exposto, responsável pelo reconhecimento de antigénios através de dois
locais de ligação).

Os linfócitos B derivam de células estaminais hematopoiéticas (HSCs) por processos de


diferenciação que têm lugar na medula óssea. Após maturados, os linfócitos B abandonam a
medula óssea e distribuem-se por todo o organismo (em particular, migram para os órgãos
linfóides secundários, como o baço ou os nódulos linfáticos). Nesta fase mais posterior, o
linfócito B pode entrar em circulação e reconhecer um antigénio, sendo ativado e tornando-se
num plasmócito produtor de anticorpos.

Os anticorpos consistem numa forma solúvel dos recetores BCR específicos do linfócito B
ativado e encontram-se agrupados em diversas classes (IgM, IgG, …), caracterizadas pelo domínio
constante que o constitui. Estes anticorpos têm a capacidade de intervir nas mais diversas
nuances químicas, apresentando funções muito variadas.

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Desenvolvimento de Linfócitos B

“Como é que um precursor linfóide comum se torna num linfócito B?”

No nosso organismo existe um esquema base de diferenciação celular, no qual uma célula se
compromete a uma determinada linhagem celular e ocorre um conjunto de alterações ao nível da
expressão génica de uma célula que altere o seu perfil de expressão génico, passando a haver
proteínas que são expressam em detrimento de outras que deixam de o ser. Estas alterações
moleculares repercutem-se num novo fenótipo.

O desenvolvimento de linfócitos B partilha este esquema base, recebendo a informação do


exterior através de recetores (funcionais caso realizem transdução de sinal) e, por cascatas de
sinalização mediadas por cinases, permite que a nível nuclear exista uma repercussão nos fatores
de transcrição, ativando ou reprimindo a transcrição de diferentes genes.

Maturação da linhagem B - o papel do Pax5

Tal como ocorre em outros processos biológicos, há um fator de transcrição, dito maestro
(Master Transcription Factor), que vai dirigir o processo permitindo que um determinado
precursor linfóide comum (CLP), se expressar aquele fator de transcrição, se torne num linfócito
B.

⇩ Este fator de transcrição é o Pax5, sendo, portanto, crítico na formação de linfócitos B.

“Indivíduos que tenham mutações no gene que codifica o Pax5 e que, portanto, não tenham um
Pax5 funcional, não têm linfócitos B”. Isto deve-se ao fato de, entre as variadas funções do Pax5,
haver três funções principais a salientar:
1. O Pax5 é um repressor / “silenciador” de genes que especifiquem linhagens celulares
alternativas (em particular de genes que caracterizem a linhagem das células T - que
apresentam um conjunto distinto de fatores de transcrição que dirigem a sua
diferenciação);
2. O Pax5 ativa o conjunto de genes que especificam a linhagem de células B;
3. O Pax5 intervém no controle da organização da cromatina tornando-a acessível ao
processo de recombinação somática V(D)J, atuando sobretudo ao nível da cadeia pesada
(H), pois, sendo o seu locus maior, esta estará mais sujeito a estes eventos (fortemente
regulados pelo mecanismo de formação de TAD [Topologically Associated Domains]).

59
Biologia Molecular e Celular 20-26

* Note-se: os TAD são organizados pela extrusão de loops de cromatina (na formação dos quais
se destaca o papel da molécula de coesina). Estes eventos de loop favorecidos pelo Pax5 são
necessários para a ocorrência de recombinação somática V(D)J, com junção de fragmentos
distanciados e que por rearranjo vão formar um gene funcional.

Fases de maturação medular

A formação de células B processa-se através de várias fases:

HSC / CLP → Pró-B → Pré-B → B-Cell → Mature B-Cell

As diferentes fases de maturação medular dos linfócitos B refletem diferentes fases do processo
de recombinação somática V(D)J ao nível dos loci génicos correspondentes às cadeias pesada (H)
e leve (L) que constituem o recetor de superfície BCR.

HSC (Hematopoietic Stem Cell) / CLP (Common Lymphoid Progenitor)

Os linfócitos B desenvolvem-se a partir de precursores comprometidos ao nível do fígado fetal e,


após o nascimento, a partir da medula óssea.

Estes precursores (HSC/CLP) apresentam os loci que codificam as proteínas correspondentes às


cadeias pesada (H) e leve (L) do recetor de superfície BCR, sob a forma de “Germline”, isto é,
ainda sem ter tido início o processo de recombinação somática V(D)J. Deste modo, não expressar
BCR.

A partir daqui temos o “commitment” para a linhagem B, ou seja, estes precursores


multipotentes vão se especializar na linhagem B.

60
Biologia Molecular e Celular 20-26

Pró-B (Protótipo de Célula B)

As proteínas RAG-1 e RAG-2 são expressas pela primeira vez neste estágio, e a primeira
recombinação somática ocorre ao nível dos genes que codificam a cadeia pesada (H). Esta
recombinação reúne um segmento de gene D e um J, com deleção do DNA intersegmentos.

Nesta fase, verifica-se apenas o início do rearranjo do DNA, não havendo ainda nenhuma
proteína derivada dos rearranjos, pois estes não estão completos, e por isso não há um gene
funcional.

Pré-B (Precursor de Célula B)

Após o evento de recombinação D-J, um dos muitos segmentos génicos V é reunido à unidade
DJ, originando um exão VDJ rearranjado. O gene da cadeia pesada rearranjado é transcrito para
produzir um transcrito primário que inclui o exão VDJ rearranjado e os exões Cμ. Este RNA
nuclear sofre splicing dando-se a remoção de intrões a união de exões. Este mRNA é traduzido e
dá origem à proteína que constitui a cadeia pesada (H) do BCR.

Como sabemos, a recombinação V(D)J é um processo de caos regulado sujeito à ocorrência de


erros, portanto, existe um interesse biológico em controlar potenciais falhas. Assim, no ciclo
celular, existem “checkpoints” que testam processos de maior interesse, impedindo a formação
de células disfuncionais que iriam consumir os recursos das demais.

Nesta fase a célula expressa a cadeia pesada (H) do recetor BCR, mas não expressa a cadeia leve
(L), assim, ocorre aqui um “checkpoint” que visa testar a funcionalidade da cadeia pesada
produzida. Para tal esta cadeia é expressa na membrana sob a forma de recetor pré-B.

Recetor Pré-B
A cadeia pesada por si só é instável e não pode ser expressa na superfície da membrana. Assim,
for- ma-se um complexo de cadeia pesada (H), cadeias leves substitutas e proteínas transdutoras
de sinal que, no seu conjunto, constituem o recetor pré-antigénio da linhagem B (recetor pré-B).

Basicamente a cadeia pesada (H) associa-se às proteínas λ5 e Vpre-B,


também chamadas de cadeias leves substitutas (porque muito
semelhantes, mas apresentam-se invariantes e, portanto, idênticas em
todas as células pré-B). Estes associam-se, por sua vez, às moléculas de
sinalização para formar um recetor pré-B.

Apenas se os passos precedentes tiverem êxito é que o recetor pré-B será capaz de iniciar uma
cascata de sinalização que permitirá a manutenção da sobrevivência da célula (por favorecimento
da progressão no ciclo celular, ativação de genes anti-apoptóticos, etc…), dando continuidade à
maturação, sendo favorecido o início do rearranjo da cadeia leve (L).

61
Biologia Molecular e Celular 20-26

Contudo, caso a cadeia pesada seja disf uncional, a célula não irá receber o conjunto de sinais
que necessita para sobreviver e acabará por ingressar numa morte celular programada
(apoptose).

Checkpoint ultrapassado com sucesso e progressão no ciclo celular

No final desta fase, caso o “checkpoint” tenha sido ultrapassado com sucesso, as enzimas RAG-1
e RAG-2 voltam a ser expressas e é iniciado o rearranjo do gene que codifica a cadeia leve (L),
dando-se união de um segmento V e um segmento J. Neste ponto, a cadeia pesada (H) não é
mais expressa na membrana, encontrando-se ao nível do citoplasma.

B-Cell (Linfócitos B)

Immature B-Cells

O rearranjo da cadeia leve (L) está completo e dá-se a sua expressão, dando-se a montagem das
cadeias pesada (H) e leve (L) do BCR que passa a estar expresso na membrana. Neste ponto as
células são sujeitas a um segundo “checkpoint” que vai verificar quer a correta e funcional
montagem dos recetores quer a existência de células B autorreativas que vai eliminar num
processo de seleção negativa ou promover a reedição do seu genoma.

Mature B-Cell

As células B imaturas que não são fortemente autorreativas deixam a medula óssea e completam
a sua maturação nos órgãos linfóides periféricos (baço, gânglios linfáticos, etc…). Nestes órgãos
vão-se diferenciar dando origem a subpopulações de células B com determinadas características.

Sum-up do desenvolvimento de linfócitos B

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Outras Modificações Genómicas

Fora da medula óssea encontram-se os linfócitos B maduros, prontos a ser ativados, isto é,
prontos a reconhecer e interagir com um antigénio que lhes seja específico que levará à
transdução de sinais de proliferação e produção de anticorpos. Focando a nossa atenção sobre
estes linfócitos, existem ainda duas modificações genómicas que interessa conhecer:

- Hipermutação Somática;
- Mudança de Classe.

Activated-Induced Deaminase (AID)

Ambos os processos acima referidos são catalisados pela enzima Activation-Induced


Deaminase (AID), uma deaminase (enzima que catalisa a remoção de grupos amina) cuja
expressão, tal como o nome indica, é induzida pela ativação de linfócitos B maduros.

A AID é uma enzima específica da linhagem de células B, não sendo expressa nos demais
linfócitos. Esta enzima catalisa uma reação de desaminação onde, basicamente, atua ao nível do
DNA, promovendo a desaminação de nucleósidos de Citidina (C) em Uridina (U). Como no
DNA o Uracilo não codifica, é introduzida uma “quebra” na cadeia de DNA que, ao ser
reparada pelo sistema de reparação do DNA, leva à substituição do nucleósido Uradina (U) por
uma Timidina (T).

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Hipermutação Somática

Em células B maduras e ativadas (dados por terminados os processos de recombinação V(D)J)


ocorrem modificações genómicas adicionais que aumentam ainda mais a diversidade da região
variável, num processo de hipermutação somática.

Este processo de hipermutação tem por objetivo evolutivo aumentar a diversidade dos recetores
de antigénio por introdução de pequenas alterações e, assim, aumentar a probabilidade de gerar
recetores com uma maior afinidade para com o antigénio em questão (maturação da afinidade).

A hipermutação somática consiste na ocorrência de mutações de nucleótidos isolados, na


sequência genómica que codifica a região variável das cadeias do recetor das células B.
Basicamente, se uma célula B interage eficazmente com um determinado antigénio, após esta
interação com ativação do linfócito, é ativado o mecanismo enzimático mediado pela AID que
irá gerar uma diversificação destas dos genes das suas células-filhas por acumulação de mutações.

Após este processo de acúmulo de mutações têm lugar fenómenos de seleção, onde células B que
tenham ganho uma melhoria ao nível da afinidade rector-antigénio serão positivamente
selecionadas, em detrimento das que terão diminuído essa afinidade, que serão negativamente
selecionadas.

Mudança de Classe

Existem vários tipos de anticorpos, agrupados em classes consoante a sua estrutura e função.
Esta é determinada pelo domínio constante que é expresso pelo anticorpo. Nos genes
responsáveis pela codificação das cadeias do recetor BCR, as zonas constantes apresentam “várias
opções” que codificam as várias classes de anticorpo.

A que aparece primeiro em termos de organização génica é que codifica a classe IgM, pois esta
zona constante encontra-se imediatamente a jusante dos fragmentos V(D)J nos loci das cadeias.
Assim, por defeito, se não ocorrer um evento designado mudança de classe, todos os anticorpos
gerados serão da família IgM, pois irão produzir a primeira cadeia constante disponível a
jusante.

Neste processo intervém a enzima AID que atua nas várias “zonas de Switch” (Sμ, Sẟ, etc…)
localizadas a montante de cada região que especifica a classe de anticorpo, pois estas são ricas em
Citidinas (C) que a AID irá desaminar, o que levará a uma mudança de classe/isotipo.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Linfócitos T

Os linfócitos T participam também na imunidade adaptativa, sendo responsáveis pela chamada


imunidade celular, mediada por células (na qual ocorre uma interação célula a célula).

Estes linfócitos, quando maduros, expressam na superfície da sua membrana um recetor


proteico VMR, o TCR, que define este tipo de linfócitos, não sendo encontrado em mais
nenhum tipo de células do organismo.

A molécula de TCR é um recetor de superfície constituído por duas


cadeias emparelhadas, as quais podem ser cadeia ⍺ + cadeia ꞵ ou
cadeia 𝛾 + cadeia ẟ. Consoante o tipo de cadeias teremos um
TCR⍺ꞵ (mais comum, constituindo 95% dos casos) ou TCR𝛾ẟ
(mais raro, constituindo 5% dos casos). Neste semestre iremos
focar-nos essencialmente nos linfócitos que expressam TCR⍺ꞵ.

Os linfócitos T também derivam de células estaminais hematopoiéticas (HSCs) por processos de


diferenciação celular que, contrariamente aos linfócitos B, não têm lugar na medula óssea, mas
sim no Timo (órgão esbranquiçado localizado ântero-superiormente ao coração).

O timo encontra-se dividido em córtex


(constituído por células epiteliais corticais e
timócitos) e em medula (constituída por células
epiteliais medulares e células dendríticas).
Destaca-se a importância do epitélio tímico que
constitui uma densa rede de sinais fundamentais
para o desenvolvimento das células T (a partir
dos timócitos, células de origem
hematopoiética).

A linhagem de células T, além do TCR, é a única a expressar um outro recetor importante, o


CDR (que pode ser de dois tipos CD8+ e/ou CD4+) e, consoante o tipo de CDR que o linfócito
T expresse no final do seu desenvolvimento, assim será classificado como citotóxico (expressa
unicamente CD8+) ou como auxiliar (expressa unicamente CD4+).

Os linfócitos T citotóxicos (TC) libertam substâncias que causam a morte de células infetadas
com patógenos ou células tumorais.

Os linfócitos T auxiliares (TH) podem ativar a imunidade humoral, ou seja, os linfócitos B,


através da libertação de citocinas (TH2), ou estimular macrófagos para efetuarem a fagocitose
(TH1).

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Desenvolvimento de Linfócitos T
O papel do Timo na Maturação de Células T
O Timo tem por objetivo produzir linfócitos dotados de TCR funcional e, por isso, capazes de
reconhecer antigénios e montar uma imunidade celular. Os linfócitos T originam-se a partir de
precursores oriundos do fígado fetal e, após o nascimento, da medula óssea que se implantam no
timo. Estes precursores são células multipotentes que penetram neste órgão através do seu
endotélio (na junção córtico-medular), a qual alcançam pela corrente sanguínea.

Ao penetrarem neste órgão, estas células tomam a designação de timócitos. Os timócitos


desenvolvem-se no córtex tímico, migrando pelas regiões que compõem este córtex. O
microambiente tímico proporciona o conjunto de estímulos necessários à proliferação e
maturação dos timócitos. Um dos estímulos mais importantes é a secreção de Interleucina-7
(IL-7) pelas células estromais.

A interleucina-7 (IL-7) é uma citocina que estimula o crescimento e maturação de linfócitos B


e de linfócitos T, sendo secretada por células estromais, quer ao nível da medula óssea quer ao
nível do timo. No timo, a interleucina-7 secretada é o primeiro grande sinal que o epitélio
tímico dá e que é detetado por recetores localizados à superfície da membrana dos timócitos
mais imaturos. A receção deste sinal requer a presença de recetores de interleucina-7 (IL-7R)
que gerem uma cascata de sinalização intracelular que ativará os fenómenos de maturação destes
timócitos.

Fases de maturação tímica das células T


Durante a maturação dos linfócitos T, existe uma ordem precisa na qual os genes de TCR são
rearranjados e os recetores TCR, CD4 + e CD8 + são expressos.

● HSC/CLP → Pró-T → Pré-T → T-Cell → Mature T-Cell


● DN (double-negative) → DP (double-positive) → SP (single-positive)

Ambas as sucessões ocorrem em simultâneo, contudo, a primeira diz respeito ao estado de


rearranjo e expressão do TCR, enquanto que a segunda tem por base a expressão de CD4 + e/ou
CD8 +.

66
Biologia Molecular e Celular 20-26

DN (Double-Negative Thymocytes)

Os timócitos corticais mais imaturos, acabados de chegar da medula óssea, apresentam os genes
que codificam as cadeias ⍺ e ꞵ o TCR em “Germline”, isto é, na sua configuração não
rearranjada, não expressando TCR, CD4 +
ou CD8 +. Estes timócitos serão chamados de
duplos-negativos até que expressem os co-recetores CD4 + e/ou CD8 +.
Até estes timócitos expressarem CD4 +
e CD8 +
têm que atravessar duas etapas de
desenvolvimento, a fase Pró-T (a qual completam enquanto células duplas-negativas) e a fase
Pré-T (a qual iniciam e acabam por completar enquanto células duplas-positivas).

Pró-T (Protótipo de Célula T)

As proteínas RAG-1 e RAG-2 são expressas pela primeira vez neste estágio, pois são necessárias à
expressão do TCR⍺ꞵ. Assim, tem lugar a primeira recombinação V(D)J, ao nível dos genes
que codificam a cadeia ꞵ de TCR (primeiro a recombinar).

Os genes que codificam esta cadeia apresentam segmentos V, D e J, assim, esta recombinação
reúne um segmento de gene D e um J, com deleção do DNA intersegmentos.

Nesta fase, verifica-se apenas o início do rearranjo do DNA, não havendo ainda nenhuma
proteína derivada dos rearranjos, pois estes não estão completos, e por isso não há um gene
funcional. A fusão de segmentos D-J é o ponto de transição entre esta fase e a fase Pré-T.

Pré-T (Precursor de Célula T)

Após o evento de recombinação D-J, um dos vários segmentos génicos V é reunido à unidade
DJ, originando um exão VDJ rearranjado. Obtém-se assim um gene que origina um transcrito
primário de TCRꞵ. Este transcrito contém o exão VDJ e os exões Cꞵ, bem como os intrões entre
estes. Este RNA nuclear sofre splicing e o mRNA obtido é traduzido e dá origem ao TCRꞵ.

Tal como aconteceu ao nível dos linfócitos B, a recombinação V(D)J do TCR é também regulada
por “checkpoints”. O primeiro “checkpoint” tem lugar após a recombinação da cadeia ꞵ e visa
testar a sua funcionalidade em termos de quadro de leitura, estabilidade e capacidade de
sinalização.

Recetor Pré-T Para tal, do mesmo modo que verificámos para as células B, a
estratégia de testagem passa pela montagem de um recetor pré-T. Como a cadeia ꞵ
isolada é instável, esta é associada a uma “cadeia substituta” (tal como acontecia nas
células B), designada pT⍺ (pré-TCR-⍺, uma proteína invariável, produto de um
gene que não rearranja e, portanto, igual para todas as células T). Apenas se os
passos precedentes tiverem êxito é que o recetor pré-T será capaz de iniciar uma
cascata de sinalização que permitirá a manutenção da sobrevivência da célula.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

DP (Double-Positive Thymocytes)

Após os timócitos em desenvolvimento ultrapassarem com sucesso o “checkpoint” do pré-TCR,


ainda num estágio de célula pré-T, o timócito passa a expressar simultaneamente os recetores
CD4 + e CD8 +, deixando de ser DN (duplo-negativo) para ser DP (duplo-positivo).

A expressão a proteína pT⍺ é inibida, bem como a montagem do recetor pré-T. O TCRꞵ não
está mais na membrana, encontrando-se no citoplasma. O timócito expressa uma segunda vaga
de proteínas RAG-1 e RAG-2 e tem lugar a segunda recombinação, ao nível dos genes que
codificam a cadeia ⍺ de TCR (segunda a recombinar).

Como o locus da cadeia de TCR⍺ não apresenta segmentos D, mas somente segmentos V e J, o
rearranjo que tem lugar nesta fase consiste apenas na união de um segmento V e um segmento J.
Dá-se a expressão do TCR⍺ e ocorre a montagem do recetor TCR⍺ꞵ que é expresso na
membrana juntamente com complexos sinalizadores. (o TCR⍺ tem 100x mais afinidade do que
o pT⍺)

Termina assim a fase pré-T tendo lugar fenómenos de seleção, um segundo “checkpoint”.

ou SP (Single-Positive Thymocytes)

Assim, quando os timócitos duplos-positivos (DP) expressam pela primeira vez um TCR⍺ꞵ,
este recetor interage com péptidos próprios (self-peptides) apresentados por complexos maiores
de histocompatibilidade (MHCs) sobretudo de células do epitélio tímico. O produto desta
interação será determinado pela força gerada pelo encontro entre o TCRs e o auto-antigénio (no
MHC).

Assim, vão resultar três tipos de interação:

Seleção Negativa dos Timócitos

Por um lado, timócitos cujos recetores reconheçam os complexos péptido-MHC no timo e


apresentem uma afinidade demasiado baixa (low avidity) não conseguiram sobreviver,
acabando por morrer “por negligência” isto é, a sua afinidade para antigénios é tão baixa que não
serão capazes de gerar sinais suficientes para a manutenção da sua sobrevivência (morrendo por
falta de estímulo).
Por outro lado, timócitos cujos recetores reconheçam os complexos péptido-MHC no timo e
apresentem uma afinidade demasiado alta (high avidity) são induzidos a um processo de morte
celular programada (apoptose), pois são linfócitos potencialmente “autorreativos” que poderiam
acabar por desencadear uma resposta autoimune.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Seleção Positiva dos Timócitos Por sua vez, timócitos cujos recetores reconheçam os complexos
péptido-MHC no timo e apresentem uma afinidade intermédia (medium avidity) sofrem uma
seleção positiva e prosseguem a transição de células duplas-positivas para células positivas
simples (SP).

Neste processo de transição importa conhecer as duas classes de MHC existentes:

MHC classe I - os péptidos apresentados são derivados de proteínas citosólicas (dispersas no


meio intracelular). Estas proteínas podem ser: proteínas normais; antigénios produzidos por
células anormais (tumorais) ou proteínas sintetizadas pela ocorrência de uma infeção viral .

MHC classe II - os péptidos apresentados são derivados de proteínas extracelulares: Estas


proteínas podem ser: resultado de fagocitose de bactérias e patógenos, sem que a célula tenha
sido infetada.

Basicamente, durante este processo, se o TCR dos timócitos selecionados positivamente


reconhece péptidos apresentados pelo MHC classe I, esse timócito irá passar a expressar apenas o
co-recetor CD8 +
(passando a designar-se timócito positivo simples CD8 + CD4 −). Ao invés, se
o seu TCR tiver, por sua vez, uma maior afinidade pelo MHC classe II, esse timócito irá passar a
expressar apenas o co-recetor CD4 +
(passando a designar-se timócito positivo simples CD4 +

CD8 −).

Mnemónica:
O produto dá sempre 8!
MHC I - CD8 + (1 × 8 = 8)
MHC II - CD4 + (2 × 4 = 8)

Estes timócitos tomam agora a designação de linfócitos T imaturos, os quais vão abandonar o
timo e distribuir-se pelos órgãos linfóides periféricos onde se vão tornar maduros após a ativação.
Neste processo, os linfócitos CD8+ vão originar linfócitos T citotóxicos (que detetam e matam
células portadoras de antigénios, como células infetadas por vírus, bactérias ou células
cancerosas), ao passo que, os os linfócitos CD4+ vão originar linfócitos T auxiliares (que vão
auxiliar macrófagos e neutrófilos a exercer a sua função fagocítica e, por outro lado, vão
promover a secreção de anticorpos por parte das células B, contra os patógenos em questão).

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Identificação de populações de timócitos - Técnica de citometria de fluxo

A citometria de fluxo é uma técnica utilizada para contar, examinar e classificar partículas
microscópicas suspensas em meio líquido em fluxo.

Um feixe de luz monocromática (normalmente laser) é direcionado a um


meio líquido em fluxo. Cada partícula suspensa, ao passar pelo feixe de luz,
dispersa a luz de uma forma característica, e os corantes químicos
fluorescentes (fluorocromos) da partícula ou acoplados a anticorpos
específicos juntos às partículas, podem ser excitados e emitir luz com
comprimentos de onda característicos. As combinações de luz são captadas
por detetores que ao analisarem as flutuações de brilho conseguem obter
diversas informações sobre a estrutura física e química de cada partícula
individual.

Esta técnica é útil na imunologia para a identificação de populações de timócitos. Para tal, são
utilizados anticorpos fluorescentes que se ligam a marcadores celulares, isto é, a proteínas que
estão à superfície da célula e, para o efeito pretendido, permitem a sua identificação (através de
uma divisão dos resultados obtidos em quadrantes).

Cada quadrante corresponde a uma fase de maturação dos timócitos


(DN, DP, SP8 ou SP4). As setas representam que as células do
quadrante inferior-esquerdo dão origem às células do quadrante
superior-direito que, por sua vez, ou dão origem às células do
quadrante superior-esquerdo ou às células do quadrante
inferior-direita. Isto no decorrer da maturação.

Imunodeficiências Importantes

Severe Combined Immunodeficiency (SCID) - doenças genéticas caracterizadas por um


desenvolvimento perturbado de linfócitos B e T funcionais, causadas por mutações genéticas
diversas e que apresentam distintas manifestações clínicas.

Síndrome de Omenn

O síndrome de Omenn é um SCID autossómica recessiva. Entre outras causas, este síndrome
está associado a mutações nos genes que codificam as enzimas recombinantes (RAG-1 e RAG-2).

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Biologia Molecular e Celular 20-26

A ausência ou a perda de funcionalidade de RAG-1 e/ou de RAG-2 compromete a globalidade


do complexo enzimático RAG (constituído por quatro moléculas, duas de RAG-1 e duas de
RAG-2). Este complexo tem um papel fulcral na recombinação V(D)J, pelo que na falta de RAG
esta não ocorre. Como os loci que codificam as cadeias dos recetores BCR e TCR não
apresentam genes funcionais na “germline”, na falta de RAG não se forma BCR nem TCR
funcional e, portanto, verifica-se uma ausência quase total de linfócitos B e T.

Indicador clínico: sem células B e poucas células T; RAG com atividade reduzida
Diagnóstico: sequenciação do gene que codifica a RAG (Missense Mutation da RAG-1).

No nosso planeta a ausência de RAG é, portanto, rapidamente fatal dada a enorme diversidade
de agentes microbianos a que estamos expostos. Posto isto esta patologia requer tratamento
imediato, que pode ser realizado através de um transplante de medula. Um transplante de
medula óssea permite transferir células estaminais hematopoiéticas que vão repovoar a medula
óssea. As células estaminais transferidas do dador terão a enzima RAG funcional.

Caso Clínico:
Lactente com um mês de idade, filho de primos direitos (casamento
consanguíneo), peso normal, tem irritação com vermelhidão cutânea e
conjuntivite com pus. Pus abundante. A análise microbiológica do pus
revelou infeção por Staphylococcus aureus e Candida albicans. A análise
sanguínea revelou uma ausência total de células B e quase total de células
T.

Foi efetuado um teste de atividade enzimática da RAG e verificou-se uma atividade muito
menor do que a verificada no controlo experimental (RAG de um indivíduo normal).

X-Linked Severe Combined Immunodeficiency (X-Linked SCID)

A X-Linked SCID é uma doença recessiva ligada ao cromossoma X (afeta principalmente


indivíduos do sexo masculino) causada por mutações no gene que codifica o recetor de
Interleucina-7 (IL-7R).

Como vimos, a IL-7 é uma citocina (fator de crescimento) secretado pelo epitélio tímico
essencial ao desenvolvimento e sobrevivência das células T. Nesta imunodeficiência a IL-7 é

71
Biologia Molecular e Celular 20-26

funcional e secretada normalmente. Contudo, existe uma mutação ao nível do gene que codifica
o seu recetor (IL-7R), o que o torna disfuncional e, portanto, incapaz de reconhecer a IL-7 e
iniciar uma transdução do seu sinal.

- Esta doença é geralmente detetada após infeções recorrentes e ativas por doenças oportunistas.

Indicador Clínico: ausência de linfócitos T e presença de linfócitos B normal.

Terapia: Transplante de medula óssea (de um dador saudável e compatível).

Agammaglobulinemia

Como sabemos, após o rearranjo do gene que codifica a cadeia pesada (H) do BCR, na fase Pré-B
tem lugar um “checkpoint” que visa testar a funcionalidade desta cadeia, através da montagem
de um recetor pré-BCR. Este “ checkpoint” é ultrapassado caso o recetor consiga realizar uma
transdução de sinal que, através de um conjunto de fosforilações mediadas por cinases, atinjam o
núcleo e moldem a sua resposta.

Na agammaglobulinemia ocorre a mutação nos genes que codificam uma importante enzima
cinase, a BTK signalling (B-cell tyrosine kinase). A BTK é uma enzima cinase sem a qual o
pré-BCR não sinaliza para o núcleo. Devido à mutação a cinase BTK está disfuncional, logo, o
recetor pré-BCR não sinaliza e as células B em desenvolvimento não induzem a expressão do
conjunto de genes que permitirá a sua continuidade no ciclo celular, ingressando numa morte
celular por falta de estímulo e, portanto, não se originam células B maduras.

A agammaglobulinemia é uma doença ligada ao cromossoma X, portanto, as mulheres podem


ser portadoras da doença, mas apenas os homens podem ser doentes, pois trata-se de uma doença
que não costuma permanecer em silência e, para uma mulher ser doente teria que ter um pai
doente.

Indicador Clínico: níveis muito baixos de todas as classes de anticorpos (IgM, IgG, IgA, etc...)
no sangue (ausência de células B). Contudo, verifica-se presença normal de células T.

Terapia: Transplante de medula óssea (de um dador saudável e compatível).

Hyper IgM Syndrome (Human AID deficiency)

O síndrome de hiper IgM é uma doença genética autossómica recessiva que resulta de mutação
de genes que codificam a enzima AID (Activation-Induced Deaminase). Como sabemos, esta
enzima é específica da linhagem de células B, sendo apenas expressa após a ativação de células
maduras, por uma interação favorável com um antigénio específico. A AID catalisa a
desaminação de citidina (C) em timidina (T) ao nível do DNA, intervindo em dois processos

72
Biologia Molecular e Celular 20-26

importantes: a hipermutação somática e a mudança de classe de Igs. Assim, estes dois eventos
ficam comprometidos pela sua ausência caracterizada por esta doença.

Na ausência de mudança de classe, os anticorpos produzidos mantém a sua classe original


(IgM), primeira cadeia constante a jusante do segmento V(D)J recombinado.

Indicador Clínico: níveis muito elevados de IgM e muito baixos das restantes classes de
anticorpos.

Diagnóstico: Sequenciação do gene que codifica a enzima AID.

Conceitos úteis para Imunologia


Wings apart-like protein homolog (Wapl)

A proteína Wapl é codificada pelo gene WAPAL e constitui um regulador antagonista da


coesina (que medeia, entre outros, a formação de loops de DNA - essenciais à atividade da
RAG).

* Antagonista - composto que se liga a um determinado recetor sem o ativar, impedindo que
outros componentes lá se liguem e o ativem.

A expressão do gene WAPAL é regulada pelo Pax5. Na presença de Pax5 verifica-se a inibição da
transcrição dos genes WAPAL e, portanto, uma diminuição da concentração intracelular de
Wapl. Por sua vez, na ausência de Pax5 o gene WAPAL é transcrito e a Wapl é expressa.

A presença de Wapl faz com que a coesina não consiga estabelecer ligações e, consequentemente,
tenha uma maior dificuldade em exercer o seu papel na formação de loops de DNA. Na presença
de Wapl verifica-se formação de um elevado número de loops, mas com comprimentos
reduzidos. Por sua vez, na ausência de Wapl, forma-se um menor número de loops, mas de maior
comprimento. A diversidade de recombinação V(D)J mediada pela RAG verifica-se muito
superior para a presença de Pax5 e consequente ausência de Walp.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

AutoImmune REgulator (AIRE)

O regulador autoimune (AIRE) é uma proteína codificada pelo gene AIRE, expresso na
medula tímica. Trata-se de um fator de transcrição que causa a transcrição de uma ampla seleção
de genes específicos de órgãos periféricos (levando à expressão em níveis baixos de proteínas
apenas expressas noutros órgãos periféricos - criando uma "auto-sombra imunológica").

O AIRE, quando ativo, encontra-se associado ao sirt1 e DNA PK, ativando um sistema Top2a
que induz quebras na cadeia de DNA. A reparação destas quebras exige a abertura da
heterocromatina em eucromatina. Nestes momentos de abertura, a AIRE possibilita que a
RNA polimerase entre em contacto com os segmentos génicos, promovendo a sua transcrição.

Ao induzir a expressão destas proteínas de órgãos periféricos, a AIRE permite que o timo
promova uma seleção negativa de linfócitos T que reajam autorreativamente às proteínas
produzidas (self-antigens), regulando, deste modo, fenómenos autoimunes.

NOTCH - É um sistema de sinalização celular altamente conservado e especializado. O Notch é


um recetor que após ativado é clivado e translocado para o núcleo influenciando a transcrição.
As células epiteliais do timo apresentam muitos ligandos do Notch e o seu papel é “silenciar” a
transcrição de Pax (fator de transcrição associado às células B) ao nível dos timócitos. Na
ausência de Notch o timo iria produzir células B.

Forkhead box protein N1 (FOXN1)

A proteína FOXN1, codificada pelo gene FOXN1, desempenha um papel importante para o
desenvolvimento da pele, cabelo, unhas e sistema imunitário. A proteína FOXN1 ajuda a
orientar a formação dos folículos capilares, desempenhando um papel crucial na formação do
timo.

⤷ Síndrome de diGeorge

Caso Clínico:
3 Meses de Idade - Alopecia total (ausência de pelos) e Adenite (inflamação dos gânglios
linfáticos, provocada após vacinação BCG).
4 Meses de Idade - Falhas respiratórias graves (bactérias da BCG), Atimia (ausência de Timo) e
Linfopenia T (níveis de linfócitos T muito reduzidos)

Diagnóstico: SCID - Síndrome de diGeorge. Neste caso terá ocorrido uma mutação no gene
FOXN1 que codifica a proteína FOXN1, essencial à diferenciação das células do epitélio tímico.
Esta criança apresentava uma mutação com perda de sentido, devido ao aparecimento de um
codão STOP prematuro (não expressando sequer FOXN1).
Tratamento: a criança apresenta uma medula óssea com células normais, não apresentando
apenas Timo. Assim, a solução passará por um transplante de timo.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

T9 - Tráfego intracelular das proteínas

Células delimitadas pela membrana plasmática que faz a interface entre


o interior da célula e o exterior. No citoplasma temos citosol e
organitos delimitados por membranas. Os organitos que temos são:
núcleo, mitocôndrias, retículo endoplasmático rugoso (associado a
ribossomas), retículo endoplasmático liso (responsável pela síntese de
lípidos), aparelho de Golgi, lisossomas, peroxissoma (onde há reações
oxidativas que destoxificam), vesículas.

Cada organito tem uma função diferente e estas funções


estão relacionadas com o conteúdo em proteínas. Todas
as proteínas são fabricadas por ribossomas localizados no
citosol, mas depois deslocam-se para diferentes destinos.
Existem vários tipos de transporte para as proteínas:
A. através dos poros nucleares → núcleo
B. através das membranas dos organelos →
atravessa a membrana diretamente
C. através de vesículas → retículo endoplasmático

A. Transporte para o núcleo

O núcleo é delimitado por uma dupla membrana que entra em contacto com o
retículo endoplasmático (há semelhança entre as membranas destes dois organelos e há também
continuidade física).
Entre a membrana interna do invólucro e a cromatina há uma estrutura constituída por
filamentos intermédia (lâmina nuclear - emaranhado de filamentos). As membranas do
invólucro são interrompidas em determinados pontos por poros nucleares. Os poros nucleares
são preenchidos por material (não são espaço vazio) - são constituídos por um emaranhado
proteico (fibrilhas proteicas) do qual se destacam filamentos quer para o meio intranuclear quer
para o meio do citosol.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Sabe-se que todas as proteínas das nossas células


são sintetizadas no citosol e:
➔ No interior do núcleo são necessárias
todas as enzimas e proteínas relacionadas com a
replicação, a reparação, a transcrição e o
processamento. Todas essas proteínas são
importadas e têm que atravessar os poros
nucleares ao entrarem no núcleo. Por sua vez, do
núcleo saem os mRNAs (após certificar que o
capping, splicing e poliadenilação funcionaram
corretamente) e os rRNAs, entre outros. Durante
esse processo, os RNAs estão associados a
proteínas.

Controlo nos poros nucleares

Existe uma molécula (sinal de localização nuclear) que funciona como uma espécie de
passaporte.
Sinal de Localização Nuclear → sinal que marca determinada proteína para ser localizada no
interior do núcleo. Este sinal (sequência de aminoácidos na proteína) é reconhecido através de
um sistema de leitura que consiste numa proteína (recetor de importação nuclear).
Existem uma série de proteínas no nosso citosol capazes de reconhecer o sinal de localização
nuclear, isto é, o mesmo recetor é capaz de reconhecer diferentes proteínas desde que elas
tragam o mesmo sinal.
➔ A proteína a ser transportada e o recetor
entram em contacto com as fibrilas do poro, e
estas permitem a sua passagem ao
organizarem-se. Quando uma proteína tenta
passar sem este formato com o recetor, as
fibrilas continuam emaranhadas, impedindo a
sua passagem.
Após isto, o recetor dissocia-se do complexo e é
reciclado, saindo do núcleo para reconhecer
outros sinais e trazer outras proteínas para o
interior do núcleo. Este transporte consome
GTP, formando GDP.

76
Biologia Molecular e Celular 20-26

B. Transporte para mitocôndrias e outros organitos

Nas membranas existem proteínas translocadoras transmembranares que funcionam como


canais de passagem e permitem que as proteínas do exterior atravessem as membranas. Como as
membranas são bicamadas fosfolipídicas (criam um meio hidrofóbico) e a maioria das proteínas
não são exclusivamente hidrofóbicas, estas não a conseguem atravessar.
Os canais criam um meio hidrofílico, permitindo a passagem das proteínas.

As mitocôndrias têm duas


membranas, tanto na membrana
interna quanto na membrana externa
existem proteínas que funcionam
como canais de translocação.

Especificidade

A especificidade neste caso é dada por uma sequência de aminoácidos distintos → sinal que é
reconhecido por um recetor. [mecanismo igual ao do núcleo]
Existe novamente uma sequência de aminoácidos que f unciona como o sinal, (localizada na
extremidade N - amina?), do que deve ir para o interior da mitocôndria.
➔ Este sinal vai ser reconhecido por um recetor que se relaciona com a proteína
transmembranar (canal).
➔ O recetor, ao entrar em contacto com o sinal, encaixa-se a ele e é promovida uma
alteração na conformação do canal.
➔ O canal abre-se e a proteína atravessa-o, atravessando a membrana para o interior da
mitocôndria

Existem diferentes sequências de sinais


e diferentes recetores dessas sequências
consoante o que é pretendido.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

C. Transporte para o Retículo Endoplasmático Rugoso

Relembra-se que todas as proteínas são sintetizadas no citosol;


➔ Os mRNAs saem do núcleo pelos poros nucleares e chegam ao citosol;
➔ Aqui vai começar a ser traduzido por ribossomas que se vêm ligar a ele (Fig 15-13);

Pode acontecer que o mRNA seja integralmente traduzido no citosol e apenas após estarem
completamente formadas serão transportadas para o organito de destino.

No caso do Retículo Endoplasmático há uma “exceção”, o mRNA está no citosol, começa a ser
traduzido no citosol, mas há uma particularidade nas proteínas que vão para o interior do RER,
pois os primeiros aminoácidos que são traduzidos a partir do mRNA vão ser a sequência que
serve como sinal de transporte (neste caso, muito hidrofóbico) para o interior do retículo.

Esta sequência é imediatamente reconhecida por um recetor no


citosol (SRP, signal-recognition particle), recetor este que
trava a síntese proteica até esta ser transportada para o
retículo. Esta combinação de ribossoma + mRNA + proteína
cuja tradução foi interrompida com o sinal + SRP vai
deslocar-se até o RER, onde o SRP é reconhecido por um outro
recetor (o recetor de SRP), que se localiza perto de um canal de
translocação, que permite a entrada de proteínas hidrofílicas através das membranas
hidrofóbicas. O contacto entre o SRP e o seu recetor leva à abertura do canal próximo,
permitindo a retoma da tradução da proteína dentro do RER.
Esta tradução agora é acoplada e vai enviar a proteína para o interior do lúmen do RER. Por
isso é que se observam ribossomas a cobrir a membrana do RER.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Quando a proteína termina de ser sintetizada (fim da tradução), uma peptidase (enzima que
cliva ligações entre aminoácidos, neste caso específico a signal peptidase) vai clivar a ligação entre
o sinal (que permanece associado à membrana fosfolipídica) e o resto da cadeia peptídica
(extremidade C - carboxílica), que fica no lúmen do retículo porque se soltou da cadeia inicial
(extremidade N - amina).

Como se pode observar na imagem, a sequência de aminoácidos que serviu de sinal fixa-se na
região mais periférica do canal transmembranar, próxima à bicamada fosfolipídica. Podemos,
portanto, desde já inferir que estes aminoácidos que constituem esta sequência de sinal terão
cadeias laterais hidrofóbicas, que lhes permite relacionar-se com estas regiões.

As proteínas transmembranares têm sequências de aminoácidos hidrofóbicos que têm uma


enorme tendência em relacionar-se aos fosfolípidos da membrana.

Exceções:

É importante entendermos que este processo não é linear para todas as proteínas. Vejamos
então o caso das proteínas transmembranares:
➔ A sua síntese ocorre exatamente do mesmo modo, contudo, acontece que além da
sequência sinal (hidrofóbica), esta proteína terá ao longo da sua composição uma outra
sequência de aminoácidos hidrofóbicos.
Assim, durante a síntese, estas
sequências têm uma tendência em
fixar-se na membrana de fosfolípidos,
o que faz com que a proteína fique
retida na membrana por interações
hidrofóbicas.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

➔ Além disto, acontece ainda que há proteínas que têm várias sequências
hidrofóbicas ao longo da totalidade da cadeia polipeptídica para além do sinal.
Neste caso a proteína vai sendo sintetizada e cada vez que aparece uma sequência
hidrofóbica dá-se a retenção desta sequência junto aos fosfolípidos. Assim, a
proteína faz “voltas” para o interior e para o exterior da membrana do retículo.

Portanto, quando uma proteína tem o sinal que a leva para o RER, esta pode ter dois
destinos: ou entra completamente para o lúmen do retículo, o que significa que nesta proteína a
única sequência hidrofóbica era o sinal; ou a proteína fica transmembranar, por apresentar
uma ou mais sequências hidrofóbicas, além do sinal.

Ambas estas proteínas, à medida que são sintetizadas no lúmen do retículo adquirem outra
propriedade - vão adquirir uma modificação que consiste na adição de grupos açúcar. É assim
que vão nascer as glicoproteínas.

Glicoproteínas → conjugados de aminoácidos + polímero de açúcares que são adicionados às


proteínas quando elas estão a ser sintetizadas dentro do retículo endoplasmático. Na membrana
há um lípido especial - dolicol - ao qual está associado um conjunto de açúcares de forma
covalente. Este oligossacarídeo liga-se à cadeia polipeptídica que está a ser sintetizada sempre que
aparece uma determinada sequência que contém um aminoácido de Asparagina (Asn).
Assim, se existir este “sinal com Asparagina” a proteína em síntese vai receber o oligossacarídeo,
através da oligosaccharyl transferase.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

O oligossacarídeo tem sempre a mesma composição: 2 N-acetilglucosaminas (GlcNAc), 9


manoses e 3 glicoses. Assim, o que vai permitir variar o tipo de glicoproteínas formadas terá por
base o número de oligossacarídeos presentes (que tem por base o número de “sinais de
Asparagina” presentes na sequência peptídica).

Saída do RER - Ida para o Complexo de Golgi

No Aparelho de Golgi as proteínas vão ser sujeitas a uma série de enzimas que vão
modificar o oligossacarídeo inicial. O que é que determina que uma proteína tenha determinada
configuração de açúcares e outra proteína tenha outra configuração?
➔ Isto tem por base a conformação tridimensional (os resíduos expostos à superfície da
proteína vão ser acessíveis a enzimas que estão no aparelho de Golgi, o que vai permitir
colocar uns e retirar outros) → Por exemplo, se os açúcares estiverem no interior da
proteína, as enzimas deixam de lhes ter acesso e a modificação não ocorre.

Nas membranas do RER estão-se sempre a libertar vesículas. Assim, estas vesículas
transportam as proteínas sintetizadas no retículo, mantendo as suas posições relativas (a
membrana das vesículas transportará as proteínas transmembranares, ao passo que no interior
da vesícula estão as proteínas solúveis que estavam no lúmen do RER). Estas vesículas vão se
fundir com o aparelho de Golgi, mais uma vez mantendo as posições relativas das proteínas:
➔ membrana do aparelho → transmembranares;
➔ interior do aparelho → as proteínas do lúmen do RER.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Aparelho de Golgi
➔ Formado por um conjunto de cisternas;
➔ Apresenta uma direcionalidade de transporte (o aparelho de Golgi tem uma zona que
está mais próxima do RER → vai receber as vesículas do RER;
➔ O transporte entre cisternas dá-se por vesículas que se soltam de uma cisterna mais
próxima do RER e se fundem à cisterna seguinte;
➔ As proteínas vão sendo “maturadas” ocorrendo a modificação dos seus resíduos, entre
outras;
➔ Chegando ao final do aparelho de Golgi as proteínas são transportadas em vesículas (ou
para zonas da célula onde são necessárias, ou para o meio extracelular).

Destino das vesículas


À saída do Aparelho de Golgi temos duas opções:
➔ vesículas que vão para a membrana plasmática e levam à secreção ou exocitose dos seus
conteúdos (esta via é a mais comum);
◆ via não regulada ou via constitutiva (está sempre a ocorrer): As proteínas são
agrupadas em vesículas, fundem-se à membrana e são enviadas para o exterior;

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Biologia Molecular e Celular 20-26

◆ Via da secreção regulada (só acontece em determinadas circunstâncias/quando


é necessário): faz com que as vesículas exocíticas tenham um sinal e estas apenas
se fundem com a membrana quando chega o sinal vindo do exterior. A vesícula
fica transitoriamente retida do citosol e, no momento em que chega o sinal, faz a
secreção. Isto ocorre, por exemplo, nas células do pâncreas exócrino.
➔ vesículas que se vão fundir com endossomas, formando lisossomas.

Atuação da Endocitose
Além das vesículas de exocitose, do complexo de Golgi resultam proteínas que vão
formar lisossomas. Existe um conjunto de vesículas que a célula forma englobando materiais do
meio extracelular, num processo denominado endocitose - os endossomas. Estas vesículas
fundem-se com um certo tipo de vesículas provenientes do Aparelho de Golgi, formando
endossomas tardios que dão origem aos lisossomas. As vesículas têm mecanismos de sinalização,
o que lhes permite ter uma movimentação muito específica.

Sinalização das Vesículas:


Estes mecanismos de sinalização são mediados quer por proteínas transmembranares quer por
proteínas associadas à face exterior da bicamada fosfolipídica. Na face exterior das vesículas
existem proteínas Rab (GTPases monoméricas), que se ligam às proteínas tethering presentes
na membrana do alvo (cada organito e vesícula têm uma combinação específica de Rab e
tethering protein, para não haver enganos). Após isto, proteínas transmembranares das vesículas
(as v-SNAREs) e do alvo (as t-SNAREs) vão-se ligar, ancorando a vesícula e catalisando a fusão
membranar.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

NOTA: Na exocitose as proteínas do interior da vesícula são secretadas para o meio


extracelular, ao passo que as proteínas transmembranares, presentes na membrana da vesícula de
exocitose, ficam a constituir a membrana plasmática.

Complexo de Golgi - Vias de Secreção

A maior parte das vesículas que se soltam no Complexo de Golgi vão para a via da secreção.
Assim, a natureza criou mecanismos de seleção.

Mecanismo de seleção das proteínas que vão para os lisossomas (se não houver estes
mecanismos as proteínas vão automaticamente para as vias de secreção).
➔ As enzimas que vão para o lisossoma (essencialmente enzimas digestivas) têm um sinal
para ir para o lisossoma. Este sinal é à base de açúcares. Basicamente, as proteínas no
RER recebem um conjunto de açúcares e à medida que esses açúcares são modificados no
Golgi vão adquirir um conjunto específico de açúcares. No caso das proteínas que se
destinam ao lisossomas, estas vão sofrer a ação de uma enzima, a fosfotransferase, que vai
adicionar um resíduo (N-acetilglucosamina + grupo fosfato) a uma manose e depois
vai fazer com que este fosfato fique adicionado somente à manose, sendo removida a
N-acetilglucosamina, ficando a Manose fosforilada na posição 6 (manose-6-fosfato).

Qual vai ser o recetor desta manose? Como é que as


proteínas se concentram no local de formação da
vesícula?

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Analisando a composição das vesículas…


➔ O brotamento de vesículas é promovido pela formação de uma camada de revestimento
proteico. A clatrina é uma proteína cuja conformação tridimensional pode estar
distendida na membrana, ou pode entrelaçar, ao entrelaçar, cria a força necessária ao
brotamento desta membrana, levando à formação de vesículas.
➔ A clatrina liga-se a um recetor transmembranar cargo através de uma proteína
adaptadora, a adaptina. Estes recetores cargo reconhecem moléculas cargo como, por
exemplo, a manose-6-fosfato. Existem várias moléculas cargo diferentes, logo vários
recetores cargo diferentes, que se ligam a adaptinas diferentes.

Nota: Existe um outro tipo de vesícula com uma camada proteica distinta na superfície citosólica (coated vesicles)
para além das vesículas cobertas por clatrina: as COP-coated vesicles, cobertas pela coat protein (COP), que fazem o
transporte de moléculas entre o retículo endoplasmático e o complexo de Golgi ou entre as diferentes parte do
complexo de Golgi.

➔ Quando as clatrinas estão ligadas a recetores que não estão ligados a proteínas com
manose-6-fosfato, as clatrinas estão afastadas.
➔ Quando as proteínas com manose-6-fosfato se associam ao recetor, este estimula as
clatrinas a unir-se através das proteínas adaptadoras, formando uma força que promove o
brotamento vesicular com ajuda de outras proteínas como a dinamina (que forma um
anel no estreitamento das vesículas via hidrólise de GTP). Assim, forma-se uma vesícula
cheia de recetores ligados a proteínas com manose-6-fosfato, o que está na base da
concentração de proteínas específicas para o lisossoma no local de brotamento vesicular.

Existe uma constante chegada de vesículas exocíticas à membrana plasmática. Se o


fenómeno não fosse compensado, a membrana estaria sempre a aumentar de tamanho. As células
mantêm o tamanho da sua membrana aproximadamente constante. Tal facto é possível devido
ao fenómeno antagónico/compensatório, onde se formam vesículas a partir da membrana
plasmática (endocitose).

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Endocitose
Na endocitose, várias vesículas de captação extracelular formadas pela membrana celular
fundem-se entre si formando um endossoma. O endossoma funde-se com o lisossoma e as
enzimas do lisossoma vão digerir o conteúdo endocitado. Portanto, tudo o que é captado vai
acabar por ser depositado num lisossoma ou digerido e reaproveitado pela célula, para o seu
metabolismo.

➔ Algumas substâncias são captadas de forma passiva, outras são importantes para
o metabolismo celular. Assim, temos mecanismos de endocitose
passiva/pinocitose (não específica) e mecanismos de endocitose mediada por
recetores (usam recetores como mecanismo de concentração de determinadas
moléculas a ser incorporadas). Exemplo: O colesterol é uma molécula
endocitada por um mecanismo mediado por recetores. Quando o colesterol
(geralmente de origem da dieta) entra nas células aciona um mecanismo que
trava a bio-síntese de mais colesterol por parte das células, impedindo uma
acumulação deste.

O que vem por endocitose pode ser:


➔ Pinocitose - incorporação em vesículas que não estão associadas em recetores (via
constitutiva);
➔ Endocitose mediada por recetores;
➔ Fagocitose - incorporação de materiais maiores (células, bactérias…)

Autofagia - Mecanismo pelo qual a célula digere moléculas e organelos próprios, por estes
estarem danificados ou obsoletos. A célula engloba estas moléculas em autofagossomas que ao se
fundirem com o lisossoma vão ser digeridos e os seus componentes são reciclados para voltarem
a ser usados no metabolismo celular.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Doenças Lisossomais & seu Tratamento

Doença de Gaucher
➔ aumento de volume do abdómen
(hepatoesplenomegalia).
➔ pela palpação verificamos um grande aumento
de volume do Fígado (hepatomegalia);
➔ grande aumento de volume do Baço
(esplenomegalia).

Uma criança que nasça com a Doença de Gaucher nasce com


uma mutação no gene que codifica a enzima Glucocerebrosidase. Esta é uma enzima presente
nos lisossomas essencial para clivar/reciclar um dos componentes das membranas, os
glicolípidos.
Glicocerebrosídeo (fosfolípido + açúcar) - Glicocerebrosidase ➞ Glicose + Ceramida

Ciclo de vida de um glóbulo vermelho:


➔ Tempo médio de via → 120 dias
➔ Por segundo são destruídos 2,5 Milhões de Glóbulos Vermelhos (0,00001%)
➔ 90% são removidos por macrófagos do fígado, baço e gânglios linfáticos
➔ 10% hemolisam em circulação
Qual a relação entre o mau f uncionamento do lisossoma e um aumento de volume do fígado e do
baço?
O baço é como um labirinto de capilares sanguíneos. Se o glóbulo vermelho for jovem, a sua
membrana adapta-se facilmente às curvas do labirinto e passa facilmente, pelo que o macrófago não
tem tempo de o apanhar. Ao invés, os glóbulos vermelhos obsoletos/velhos já perderam essa
flexibilidade e têm particular dificuldade em atravessar estas curvas, assim, o macrófago apanha-os e
digere-os. O Fígado apresenta mecanismos equiparados, em menor proporção.

Nos doentes com Gaucher, como não há glucocerebrosidase para degradar o


Glicocerebrosídeo, os lisossomas vão acumulando bocados de membrana no seu interior. Os
lisossomas do macrófago vão ficando cada vez maiores e é desencadeada uma reação inflamatória que
conduz ao aumento exacerbado do volume do fígado e do baço. Esta reação não é capaz de resolver o
problema, pelo que o não tratamento eficaz desta situação acabará por culminar com morte.
Diagnóstico: Teste genético
Tratamento: Terapia de Substituição Enzimática (o defeito genético continua lá - ausência
de Glucocerebrosidase funcional), contudo vamos administrar ao doente Glucocerebrosidase funcional,
produzida pelo mecanismo de proteínas recombinantes. Essa glucocerebrosidase vai conseguir atingir o
lisossoma (através da via natural de endocitose) e vai repor a capacidade para digerir membranas. A
Glucocerebrosidase recombinante vai possuir um sinal que vai ser reconhecido pelos recetores associados
a endocitose mediada por recetores na membrana das células.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

T10 - Ciclo Celular e Cancro (I)


Fases do Ciclo Celular (resumido)
● Interfase
○ Fase G1
■ Fase de crescimento após ocorrer a divisão celular.
○ Fase S
■ Onde ocorre a duplicação do material genético.
■ É aqui que as quebras das duas cadeias de DNA ocorrem com mais
frequência
○ Fase G2
■ Nova fase de crescimento e pausa.
● Fase M
○ Mitose
■ Divisão do núcleo em 2
○ Citocinese
■ Divisão de toda a célula em 2

Pontos de controlo do Ciclo Celular


O processo de divisão celular, especialmente em eucariontes pluricelulares, é muito controlado,
apenas ocorrendo se se verificarem condições muito específicas. Vejam que células a
dividirem-se sem controlo é a base do cancro. Vamos ter então vários pontos de controlo ao
longo do ciclo celular:

● Antes de entrar na fase S


○ É aqui que a célula escolhe se se deve dividir ou não.
○ Em eucariontes unicelulares, a decisão depende apenas de se há condições no
meio para sustentar duas células.
○ Em pluricelulares, é bastante mais complicado do que isso, porque não queremos
cancro. Dado isso, a célula apenas se vai dividir se for preciso substituir uma
célula que morreu ou se o organismo tiver em crescimento.
■ Vamos ver mais à frente que vamos ter substâncias designadas fatores de
crescimento que sinalizam à célula que se deve dividir.
● Antes de entrar em mitose
○ DNA foi todo replicado?, Há lesões no DNA?, Se sim, foram reparadas?
■ Respostas negativas a essas questões daria origem a células filhas com
genomas com mutações, o que provavelmente seria mau (poderia levar a
cancro)

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Biologia Molecular e Celular 20-26

● Durante a mitose
○ Garante que cromossomas estão bem inseridos nos microtúbulos, para impedir
aneuploidias (alterações no número de cromossomas das células filhas)

Relação da Diferenciação Celular com o Ciclo Celular

Células terminalmente diferenciadas nunca se dividem! Saíram por completo do ciclo


● Portanto, a maior parte das células do corpo nunca se dividem!
● Vamos ter uma categoria específica de células cuja única função é dividirem-se para
substituírem células diferenciadas danificadas ou velhas: as células estaminais.
○ Note-se que no entanto o organismo adulto não tem capacidade de regenerar
certos tipos de células, por exemplo os neurónios ou as células do músculo
cardíaco (tanto quanto se sabe e em termos gerais). Ou seja, nestes casos, não
temos células estaminais capazes de gerar estes tipos de células terminalmente
diferenciadas.
● Células estaminais vão se dividir assimetricamente: uma das filhas vai se manter como
célula estaminal, a outra vai se diferenciar.
○ Célula que segue a via da diferenciação pode em alguns casos ainda dividir-se
algumas vezes, sendo então designadas células precursoras. Estas mantêm
capacidade de se dividir mas já estão algo diferenciadas (não totalmente, quando
atinge diferenciação terminal perde a capacidade de se dividir)

Exemplos
● Epitélio do intestino
○ Vamos ter na parede do intestino umas
cristas, designadas criptas. Com a
passagem dos alimentos, algumas células
vão ser arrastadas, pelo que temos de as
repor.

○ Temos então células estaminais na base da


cripta (se se localizassem no topo, também
poderiam ser arrastadas). A cripta vai
então funcionar como uma pilha de
células, em que vão aparecendo células
novas na base (por divisão das células estaminais) e em que as do topo vão morrendo ao
serem arrastadas.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

○ “Curiosidade”: a quimioterapia causa vários problemas ao nível do trato digestivo


(náuseas, vómitos, obstipação, etc.) porque são tecidos onde as células estão muito
suscetíveis a dano pelo que precisam de estar sempre a ser repostas, o que não vai
acontecer se o doente está a tomar medicação que bloqueia a divisão celular (que é
exatamente o que acontece na quimioterapia).
● Pele
○ Vamos ter várias camadas de células, com as células estaminais na base. Similarmente ao
que acontece no intestino, as células surgem na base por divisão das células estaminais e
vão ascendendo à medida que aparecem novas células por baixo delas e que as células
mais superficiais vão morrendo e descamando.
● Sangue
○ Temos vários tipos de células, todas elas com tempos de vida bastante curtos e todas
descendentes de células hematopoiéticas, localizadas na medula óssea.

Tempo entre duas divisões das células estaminais vai ser diferente conforme o tecido:
● Embrião: 30 minutos (muito rápido)
○ Como o organismo está em intenso crescimento, é preciso que células estaminais
estejam constantemente a dividir-se.
● Intestino: 12 horas; Epiderme: 1 a 2 dias (em recém-nascidos); Fígado: 1 a 2 anos;
Neurónios e músculo cardíaco: ∞ (não se dividem mais)
○ Nos tecidos do organismo adulto, o tempo entre divisões vai depender do tempo
de vida das células terminalmente diferenciadas do tecido.

Como é controlada a proliferação celular?

Células humanas estão programadas para apenas se dividirem na presença de sinais


específicos. Queremos que as células estaminais apenas se dividam se de facto for estritamente
necessário, logo precisamos de ter formas de sinalizar essa necessidade.

Exemplo: Ferida na pele (que causa uma pequena hemorragia)


● Vão haver células destruídas, que precisam de ser substituídas. Para tal, precisamos de
alguma forma sinalizar às células estaminais que se precisam de dividir para repor as
células perdidas.
● Mas primeiro, como é que estancamos a hemorragia?
○ Temos no sangue uma proteína designada fibrinogénio que quando contacta com
uma superfície estranha (ou seja, uma superfície que não é a parede de um vaso

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Biologia Molecular e Celular 20-26

sanguíneo) vai-se converter em fibrina criando uma rede que ajuda a criar um
coágulo estancando a hemorragia.
■ Curiosidade: daí termos de adicionar um anticoagulante se quisermos guardar
sangue num tubo de vidro. Anticoagulante inativa o fibrinogénio impedindo
que o sangue coagule. Sem ele, ao entrar em contacto com o vidro o
fibrinogénio seria ativado.
○ Após a ativação do fibrinogénio, vão-se desencadear vários processos, da chamada
cascata de coagulação.
● Mas o que é que isto tudo tem a ver com o que estamos a estudar?
○ Pensou-se que o sinal que leva à proliferação celular poderia ser emitido como
resultado da coagulação do sangue. Fez-se então a seguinte experiência:
■ Verificamos que fibroblastos da pele (células estaminais) num meio de cultura
com todos os nutrientes necessários nunca se dividem.
■ Adicionamos a esse meio de cultura soro de sangue coagulado (soro é o
líquido que fica no topo após centrifugarmos o sangue).
■ Verificamos que após a adição do soro os fibroblastos dividem-se.
○ Conclui-se então que sinal químico que sinaliza aos fibroblastos que se devem
dividir é emitido como resultado do processo de coagulação, ficando assim
presente no soro do sangue coagulado.
○ Acabou por se concluir que este sinal é uma proteína designada Platelet Derived
Growth Factor (PDGF). É emitido pelas plaquetas durante o processo de
coagulação.
● O PDGF é apenas um exemplo de toda uma classe de sinais designados Fatores de
Crescimento, que vão sinalizar às células estaminais que se devem dividir. Mas como é
que se dá esta sinalização exatamente, ao nível da célula estaminal?
○ Células estaminais vão ter na membrana da célula recetores transmembranares
próprios para determinados fatores de crescimento.
■ Note-se que as células estaminais vão apenas ter recetores para alguns fatores
de crescimento, havendo então uma especificidade entre cada fator e o tipo de
célula cuja proliferação ele vai estimular. Veja-se que não faria sentido o PDGF
estimular a proliferação de células intestinais.
○ Estes recetores vão ser do tipo RTK (Recetores Tirosina-Cinase). Têm duas
partes: uma extracelular onde se vai ligar o sinal e uma intracelular que consegue
fosforilar resíduos de tirosina.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

○ Quando se liga ao recetor um sinal, vai-se desencadear uma série de


acontecimentos:
■ Primeiro, a parte intracelular do recetor vai-se autofosforilar. Ou seja, ligam-se
grupos fosfato aos resíduos tirosina desta parte do recetor.
■ Depois, devido à autofosforilação do recetor, outras proteínas presentes no
citosol vão se ligar a este, sendo também fosforiladas e passando a estar ativas.
■ Estas proteínas por sua vez vão fosforilar outras proteínas, ativando-as, e assim
por diante. Isto vai desencadear vários outros processos.
■ No meio de toda esta cascata de fosforilações, vamos ter a fosforilação de uma
proteína especialmente importante: a proteína Ras. Note-se no entanto que
esta é apenas uma de muitas outras proteínas que são ativadas.
■ RAS vai ser uma cinase que vai ela
própria fosforilar outras cinases
que fosforilam outras cinases e
assim por diante.
■ Da cadeia de fosforilações
desencadeada pela Ras vai resultar
a ativação de reguladores de
transcrição, que vão estimular a
transcrição de certos genes, como
vamos ver a seguir.
○ Portanto, resumindo, quando uma
célula estaminal recebe um sinal de
crescimento, vamos ter uma cascata de
fosforilações, na qual está envolvida
uma cinase particularmente
importante designada Ras. No final da cascata, vamos ter a ativação de
reguladores de transcrição.
○ Entre os reguladores de transcrição ativados, vamos ter reguladores para o genes
de proteínas designadas ciclinas: vão ter este nome porque as suas concentrações
na célula vão variar ciclicamente ao longo do ciclo celular.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

○ Cada tipo de ciclina vai ter como parceira uma outra proteína designada CdK
(Cyclin-dependent Kinase ou Cinase dependente da Ciclina), que como o seu
nome indica são enzimas que vão fosforilar outras proteínas e que apenas
conseguem atuar quando acopladas à sua ciclina.

○ Complexo Ciclina S-CdK


■ Vai estimular a entrada em fase S da célula. Ou seja, estimula a replicação do
DNA.
■ Faz isto fosforilando proteínas que cobrem as origens de replicação do DNA
(pontos do DNA onde se inicia a sua replicação).
■ Esta fosforilação leva a que essas proteínas se soltem do DNA, expondo as
origens de replicação.

○ Complexo Ciclina M-CdK


■ Todas as alterações que acontecem durante a
mitose estão dependentes de alterações
químicas dos componentes das estruturas
envolvidas.
■ Estas alterações são sobretudo fosforilações
feitas pelo complexo Ciclina M-CdK.
■ Proteínas que dão estrutura à cromatina, à
lâmina nuclear, ao invólucro, etc. vão ser
todas fosforiladas levando a que os vários
componentes destas estruturas se
desagreguem, tipo peças de lego.
■ Após a mitose, a Ciclina M-CdK vai ser degradada no proteassoma (ver
abaixo). Em resultado disto, as ‘peças de lego’ acabam por perder os grupos
fosfato voltando a agregar-se.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

■ Atenção que não vamos ter nenhum mecanismo que ativamente remova estes
grupos fosfato: simplesmente acontece que os grupos ‘vão saindo’ e como já
não temos Ciclina M-CdK não são repostos.

Proteassoma
● Como é que a Ciclina M-CdK é degradada? Vai ser degradada por proteases - enzimas
que clivam as ligações peptídicas separando os vários aminoácidos que compõem a
proteína.
● Atenção que não podemos ter proteases à solta no citosol, pois se assim fosse todas as
proteínas do citosol seriam degradadas indiscriminadamente, o que seria incompatível
com a vida. De qualquer forma, dá jeito degradar certas proteínas, como vimos para o
exemplo da Ciclina M-CdK.
● Para resolver este dilema, temos um mecanismo que permite degradar proteínas
específicas:
○ Primeiro, proteínas a destruir são marcadas com ubiquitina (diz-se que se dá
‘ubiquitinação’). A ubiquitina é simplesmente um pequeno péptido.
○ Depois, temos no citosol uma estrutura chamada proteassoma. Tem a forma de
um cilindro oco, com duas aberturas nas extremidades. No interior, vai ter
proteases. Apenas entram no proteassoma proteínas marcadas com ubiquitina.
○ Portanto, resumindo, proteínas que tenham de ser degradadas (como as ciclinas)
são marcadas com ubiquitina, o que leva a que entrem no proteassoma, onde são
degradadas.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Resumo de como é ativada a divisão celular:


● Em células com recetor para um fator de crescimento (exemplo: fibroblastos e PDGF),
vamos ter a ativação de uma cascata de fosforilações quando o fator de crescimento se liga
ao recetor.
● Temos 3 grupos principais de proteínas que são ativadas por resultado da cascata de
fosforilações:
○ Reguladores de transcrição: provoca alterações na expressão génica
○ Enzimas metabólicas: alterações nos metabolismos para preparar a célula para a
divisão
○ Citoesqueleto: Vão haver alterações no citoesqueleto (ver aula sobre
citoesqueleto)

3 reguladores de transcrição particularmente importantes - myc, fos, jun

● Regulação do ciclo celular é bastante redundante: ou seja, temos várias vias que fazem
exatamente a mesma coisa. Isto para garantir que se uma falhar processos continuam a
dar-se normalmente, impedindo cancro. Para se formar um cancro, é preciso mesmo uma
completa catástrofe em que vários mecanismos deixam de funcionar.
● Acontece que a transcrição do gene da Ciclina S não é ativada diretamente pela cascata
de fosforilações resultante da chegada do fator de crescimento. Temos primeiro a
ativação de uns genes que vão por sua vez ativar este.
● Estes genes são o myc, o fos e o jun. Estes genes só são ativados (ou seja, só são transcritos)
ao chegar o fator de crescimento, e vão estimular a ativação de outros genes, entre eles o
gene da ciclina

Travão da divisão celular - Proteína Rb

● Curiosidade: O nome vem do facto de ter sido primeiro


descoberta ao estudar um tipo de cancro designado
retinoblastoma (rb).
● Como assim ‘trava’ a divisão celular? Vai-se ligar a
reguladores de transcrição que são necessários para a
entrada na fase S.
● Portanto, enquanto está ligado a estes reguladores, a
célula não entra na fase S.
● O que acontece então é que a Ciclina S-CdK vai
fosforilar a Rb levando a que esta liberte os reguladores de transcrição, permitindo assim
a entrada na fase S.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Como é que é se impede a divisão celular quando há lesões do DNA? - p53 e p21

● Resumidamente, temos a proteína p53 que é ativada quando é detectada uma lesão e que
vai impedir progressão do ciclo celular.
● Primeiro, temos sensores de lesão que percorrem o
DNA à procura de alterações. Quando é encontrada
uma, dá-se um sinal de alarme que faz duas coisas:
○ Ativa maquinaria para reparar a lesão.
○ Dá-se a estabilização e ativação da p53.
■ O que é isto quer dizer? Temos a
ativação de cinases que vão fosforilá-la,
ativando-a e impedindo que ela seja
degradada no proteassoma (temos
enzimas que a marcariam com
ubiquitina para ser degradada no
proteassoma, mas que não o
conseguem fazer com ela fosforilada).
■ p53 vai ativar a transcrição do gene
p21, que vai inibir o complexo Ciclina-CdK (mais especificamente, a
G1/S-Cdk e S-Cdk), impedindo assim que o ciclo celular continue com a
lesão no DNA.

Classificação de genes cuja alteração pode contribuir para a formação de tumores

● Oncogenes - Ganho de função contribui para cancro


○ Pode sofrer mutações que levam a um ganho de função contribuindo para o
aparecimento do cancro. Basta mutação num alelo (dominante)
○ Exemplo 1 - Ras
■ Pode sofrer mutação levando a que a proteína Ras esteja sempre ativa e
não apenas quando ativada numa cascata de fosforilação resultante da
chegada de um fator de crescimento.
○ Exemplo 2 - myc, fos, jun
■ Podem haver mutações que levam a que estes genes estejam sempre ativos,
não apenas na presença de fator de crescimento.
● Genes supressores de tumores - Perda de função contribui para cancro
○ Ao sofrerem mutações que levam a que deixem de estar ativos, contribuem para
formação do cancro. Necessárias mutações em ambos os alelos (recessivo)
○ Exemplos: genes das proteínas Rb, p53, p21, BRCA1, BRCA2 e APC.

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T11 - Ciclo Celular e Cancro (II)

➔ Como distinguir células saudáveis de células cancerosas em cultura num laboratório?


Células normais não proliferam a não ser que recebam sinais para proliferar!

Células saudáveis Células cancerosas

Têm tendência a permanecer afastadas: Agregam-se: lack of contact inhibition


exhibit contact inhibition, isto é não
invadem o espaço de células adjacentes

Necessitam de fatores de crescimento São capazes de se dividir na ausência de


para proliferar (PDGF) fatores de crescimento (as vias de
ativação estão constitutivamente ativas)

➔ Uma mutação que origina uma mutação na proteína Ras é suficiente para induzir a
proliferação de células cancerosas?

A resposta é NÃO: um cancro só surge quando há uma grande acumulação de mutações


dado que o nosso organismo possui uma grande quantidade de sistemas de reparação
redundantes.
No entanto, uma mutação desta proteína é o suficiente para alterar o controlo da
proliferação celular → mesmo em ⬇ [fatores de crescimento] células com a Ras
mutada proliferam.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Os recetores tirosina-cinase ativam Ras. Uma proteína adaptadora liga-se a uma


fosfotirosina específica no recetor ativado. O adaptador recruta um Ras-GEF (fator de
troca do nucleótido guanina) que estimula Ras a trocar seu GDP por GTP. A Ras
ativada estimula então várias vias de sinalização.

Recorda que a proteína Ras apenas é ativada se receber fatores de crescimento!

Os tumores desenvolvem-se por ciclos repetidos de


mutações, proliferação e seleção natural. O resultado final é
um tumor completamente maligno.

Célula sofre mutação que aumenta sua capacidade


proliferativa, ou de sobrevivência, ou ambas

Torna-se um clone dominante no tumor.


A proliferação → progressão do tumor, aumentando o
tamanho da população de células com risco de sofrerem
mutações adicionais.

Alguns cancros possuem múltiplos clones malignos, cada um


com seu próprio conjunto de mutações, além de uma série de
mutações comuns que refletem a origem do tumor a partir de
uma célula mutante fundadora.

Diversos tipos de eventos genéticos podem eliminar a


atividade de um gene supressor de tumor. As duas
cópias do gene devem ser perdidas para que sua
f unção seja eliminada. (A) Célula na qual a cópia do
gene supressor materno é inativada devido a uma
mutação de perda-de-função. (B) A mesma célula onde a
cópia paterna do gene foi inativada de diversas formas.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Relembra: Os genes que são críticos para o cancro são classificados como
proto-oncogenes ou genes supressores de tumor conforme a mutação perigosa seja
dominante ou recessiva.
(A) Os oncogenes atuam de forma dominante: uma mutação de ganho de função em
uma única cópia do proto-oncogene pode fazer a célula transformar-se em uma célula
cancerosa.
B) Mutações de perda de função em genes supressores de tumor geralmente atuam de
maneira recessiva: a função de ambas as cópias do gene deve ser perdida para levar uma
célula a tornar-se cancerosa.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Por exemplo, as proteínas codificadas pelos genes myc, fos e jun ativam a transcrição de
outros genes tais como a ciclina S (contribuem para a duplicação cromossómica -através
da ativação da DNA polimerase - permanecendo transcritas desde o final de G1 até a
anáfase)

Para transformar uma célula saudável numa cancerosa basta haver 3 alterações
simultâneas (que têm de ocorrer por esta ordem específica):
1. SV40 - codifica oncoproteínas responsáveis pela inativação do pRB e p53
2. Gene que codifica a TERT (proteína do core da telomerase - a maior parte dos
cancros ativa a telomerase)
3. Mutação no oncogene Ras (para este estar sempre ativo)

Nota:
➔ p53: Regulador da transcrição que controla a resposta celular ao dano de DNA,
impedindo a célula de entrar na fase S até que o dano tenha sido reparado, ou induzindo
a célula a cometer apoptose se o dano for muito extenso; mutações no gene que codifica
esta proteína são encontradas em vários cancros humanos
➔ pRB (retinoblastoma protein): encontra-se disfuncional em muitos cancros. É um
supressor de células cancerosas

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Esteróides → derivados do colesterol (são hidrofóbicos). São sinalizadores químicos associados


à regulação da proliferação celular e, por isso, à proliferação de células cancerosas. Exemplo:

Cancro da mama → dependentes de estrogénios


Cancro da próstata → dependente de testosterona

Muitos tratamentos passam pela inibição da sinalização por parte destas hormonas.

Moléculas de sinalização extracelular ligam-se a recetores de


superfície celular ou a recetores ou enzimas intracelulares.
(A) A maioria das moléculas de sinalização extracelular são
grandes e hidrofílicas e, por isso, são incapazes de atravessar a
membrana plasmática. Elas ligam-se aos recetores de superfície
celular, os quais geram uma ou mais moléculas de sinalização
intracelular na célula-alvo. Desempenham várias f unções.

(B) Algumas moléculas de sinalização extracelular pequenas e


hidrofóbicas, ao contrário, difundem-se pela membrana
plasmática da célula-alvo e ativam enzimas ou se ligam a
recetores intracelulares – no citosol ou no núcleo (conforme
mostrado aqui) – e regulam a transcrição gênica ou outras
funções. Ex.: esteróides. Têm como função somente alterar a
expressão genética.

Caso privadas dos sinais de sobrevivência adequados, a maioria


das células sofre uma espécie de suicídio conhecido como
morte celular programada ou apoptose .

Apoptose ≠ Necrose
Ao contrário da apoptose a necrose é a morte celular acidental
(não programada) o que acontece é que a sua membrana
rebenta espalhando o seu conteúdo sobre outras células.
Sabendo que no interior da célula existem enzimas hidrolíticas
fica fácil perceber que isto irá provocar uma agressão ao nível
das outras células.
Já a apoptose caracteriza-se por ser um fenómeno que ocorre
exclusivamente no interior da célula não afetando, por isso,
outras células.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Durante a apoptose vai haver uma inversão dos lípidos da membrana (os que estavam
dentro passam para fora e vice-versa) → As células fagocíticas detetam este sinal →
fagocitam a célula → apoptose

As proteínas adaptadoras vão se unir às


procaspases, ativando-as em proteínas
caspase iniciadoras - que vão, por sua vez,
ativar as proteínas caspase executoras (são
proteases) → que vão ser responsáveis pela
apoptose

Assim que as proteínas caspases executoras


forem ativas não há retorno.

Bax e Bak são membros promotores de morte da família Bcl2 de proteínas intracelulares
que podem desencadear a apoptose por libertação de citocromo C a partir das mitocôndrias.
Quando as proteínas Bak ou Bax são ativadas por um estímulo apoptótico, elas agregam-se na
membrana mitocondrial externa, levando à liberação de citocromo C. Este é libertado no citosol
do espaço intermembranar da mitocôndria . Ocorre a ligação de citocromo C a uma proteína
adaptadora, formando um complexo de sete braços. Esse complexo então recruta sete moléculas
de uma pró-caspase iniciadora específica (pró-caspase-9) para formar uma estrutura
denominada apoptossoma. As proteínas pró-caspase-9 tornam-se ativadas no apoptossomo e
então ativam as pró-caspases executoras no citosol, provocando uma cascata de caspases e
apoptose.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Fatores de sobrevivência muitas vezes suprimem a apoptose


pela regulação dos membros da família Bcl2. Neste caso, o fator
de sobrevivência liga-se a recetores da superfície celular que
ativam uma via de sinalização intracelular, a qual, por sua vez,
ativa um regulador da transcrição no citosol. Essa proteína se
move para o núcleo, onde ativa o gene que codifica Bcl2, uma
proteína que inibe a apoptose, inibindo a Bax e a Bak ( → o
citocromo c não é libertado).

Os fatores de sobrevivência à semelhança dos fatores de


crescimento são moléculas sinalizadoras que NÃO atravessam
a membrana.

Os recetores de morte ativados iniciam uma via de sinalização intracelular que leva à
apoptose. O ligante Fas na superfície de um linfócito killer ativa os recetores Fas na
célula-alvo. Isso aciona a associação de um conjunto de proteínas intracelulares em um complexo
de sinalização indutor da morte (DISC- death-inducing signaling complex), que inclui uma
pró-caspase iniciadora específica. As pró-caspases clivam e ativam-se umas às outras, e as caspases
ativas resultantes então ativam as pró-caspases executoras no citosol, levando a uma cascata
proteolítica de caspases e apoptose.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

T12 - Citoesqueleto

O citoplasma de uma célula eucariótica é sustentado e organizado pelo citoesqueleto,


uma estrutura filamentosa proteica, que funciona como o esqueleto das células. Este é composto
por três tipos de filamentos: os filamentos de actina/microfilamentos (7nm de diâmetro), os
filamentos intermédios (10nm) e os microtúbulos (25 nm).

O citoesqueleto é importante devido a ter várias funções vitais em situações fisiológicas normais:
1. Dita a forma e influencia a estrutura das células (logo determina as suas f unções)
2. Importante na organização dos organelos dentro da célula
3. Permite movimentos intracelulares (como com o movimento dos cromossomas)
4. Confere mobilidade (e.x: espermatozóides)

No entanto, o citoesqueleto também desempenha funções em situações patológicas,


como no caso do cancro: as células necessitam adquirir certas características, como a capacidade
de invadir outros tecidos ou de sofrer transições epitélio-mesênquima/mesênquima-epitélio
(dado mais a fundo no próximo semestre a Biologia do Desenvolvimento), através do
citoesqueleto.

Filamentos de Actina ou Microfilamentos (7 nm)

• Os filamentos de actina são polímeros helicoidais de monómeros de actina globular. Estes são
mais flexíveis do que os microtúbulos e são frequentemente encontrados em feixes ou redes. São
vitais para (aumentar a área de) absorção (A), permitir atividade contrátil intracelular (B),
migração celular (C) e divisão celular (D).

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Os microfilamentos são compostos por dois protofilamentos de actina, sendo cada


protofilamento uma série de monómeros de actina empilhados. Os dois protofilamentos
juntam-se, sofrendo uma torção a cada 37 nm, formando um microfilamento propriamente dito.
A actina é polar, com uma extremidade mais (+) ou extremidade barbada de crescimento
rápido e uma extremidade menos (-) ou extremidade pontiaguda de crescimento lento. Devido
a isto, os microfilamentos são também polares.

Os monómeros de actina soltos encontram-se associados a ATP no seu estado ‘normal’. É neste
estado que se acoplam a um protofilamento na sua extremidade mais (+). No entanto, ao longo
do tempo, o ATP é hidrolisado e passa a ser ADP, e os monómeros de actina ligados a ADP não
conseguem manter-se ligados entre si, visto serem instáveis, levando a despolimerização do
microfilamento. Isto significa que a formação e destruição dos microfilamentos funciona como
se fosse uma passadeira rolante, em que uma ponta (a mais) está sempre a crescer devido a
receber mais monómeros de actina com ATP e uma ponta (a menos) está sempre a separar-se
devido aos seus monómeros estarem agora associados a ADP.

No entanto, a actina tem uma grande quantidade de proteínas acessórias que permitem
estabilizar o citoesqueleto, conferindo diferentes propriedades:
● Proteínas cap - impedem que a actina se polimerize, ligando-se à extremidade +,
estabilizando o seu crescimento. (ex.: tropomodulina)
● Complexos Arp - Permitem a ramificação do citoesqueleto (importante na formação dos
lamelipódia)
● Forminas - formação linear dos filopódia
● Gelsolinas (na presença de cálcio) – ligam-se aos monómeros em diferentes pontos do
microfilamento rompendo as interações com o monómero adjacente, em sentido à
extremidade positiva, ou seja, fragmenta a actina e forma um capuz que impede a
polimerização

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Biologia Molecular e Celular 20-26

● Proteínas sequestradoras – ligam-se aos monómeros livres e modulam a sua afinidade


com os microfilamentos, aumentado ou diminuindo a velocidade de polimerização. (ex:
timosina)
● Proteínas de ligação – Promovem a ligação entre microfilamentos (ex: fimbrina)
● Proteínas motoras: Miosinas – Utilizam os Microfilamentos como trilhos, provocando o
deslocamento de outros microfilamentos ou de organelos (ex: sarcómeros – importantes
para a célula se contrair). A miosina movimenta-se sempre para a extremidade +

Os microfilamentos encontram-se em todas as células e em qualquer parte destas, mas


apresentam uma particular concentração na sua periferia (junto à membrana citoplasmática), ou
seja, no córtex celular. Isto é vital, visto que a actina tanto dá a forma à célula como lhe permite
movimentar-se dentro do corpo.

• As miosinas são proteínas motoras que utilizam


a energia da hidrólise de ATP para se mover ao
longo dos filamentos de actina. Em células não
musculares, a miosina-I pode transportar organelas
ou vesículas ao longo das trilhas de filamentos de
actina, e a miosina-II pode fazer os filamentos de
actina adjacentes deslizarem uns sobre os outros
nos feixes contráteis.

A miosina-I é a mais simples das miosinas. (A) A


miosina-I possui uma cabeça globular única que se
liga a um filamento de actina, e uma cauda que se
liga a outra molécula ou organelo na célula. (B) Este arranjo permite que o domínio da cabeça
mova uma vesícula em relação a um filamento de actina, que neste caso está ancorado à
membrana plasmática. (C) A miosina-I também pode ligar-se a um filamento de actina no córtex
celular, o que resulta, em última
análise, na modificação da forma
da membrana plasmática.
Observe que o grupo da cabeça
sempre se movimenta em direção
à extremidade mais (+) do
filamento de actina.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

• Em células do músculo esquelético, arranjos repetidos e sobrepostos de filamentos de actina e


miosina-II formam miofibrilas altamente ordenadas, que contraem quando esses filamentos
deslizam uns sobre os outros.
A contração de uma célula muscular é causada por um encurtamento simultâneo de todos os
sarcómeros da célula.

Moléculas de miosina-II podem associar-se umas com as outras para a formação de filamentos de
miosina. (A) Uma molécula de miosina-II contém duas cadeias pesadas idênticas, cada uma com
uma cabeça globular e uma cauda estendida. (Além disso, ela contém duas cadeias leves ligadas a
cada uma das cabeças, mas estas não estão representadas aqui.) As caudas das duas cadeias
pesadas produzem uma cauda única super torcida. (B) As caudas super torcidas das moléculas de
miosina-II associam-se para formar um filamento de miosina bipolar, no qual as cabeças
projetam-se da região central em sentidos opostos. A porção lisa na região central dos filamentos
é composta unicamente pelas caudas.
Os músculos contraem-se por um mecanismo de deslizamento de filamentos. (A) Os filamentos
de miosina e actina de um sarcómero sobrepõem-se com a mesma polaridade relativa em ambos
os lados de uma linha mediana. Lembre-se de que os filamentos de actina estão ancorados por
suas extremidades mais (+) ao disco Z e os filamentos de miosina são bipolares. (B) Durante a
contração, os filamentos de actina e miosina deslizam uns sobre os outros sem que eles próprios
sofram encurtamento. O movimento de deslizamento é conduzido pela caminhada das cabeças
de miosina rumo à extremidade mais (+) dos filamentos de actina adjacentes

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Biologia Molecular e Celular 20-26

• A contração muscular é iniciada por um súbito aumento de Ca²⁺ citosólico, que sinaliza para
as miofibrilas via proteínas de ligação ao Ca²⁺ associadas aos filamentos de actina.

Actina na formação do anel contráctil (Mitose): O encurtamento dos


filamentos e contração do anel, depende de interações da actina com
moléculas de miosina.

Resumo dos microfilamentos:

Filamentos intermédios (10 nm)

Os filamentos intermédios são polímeros estáveis,


semelhantes a cordas, rígidos e difíceis de desagregar
construídos a partir de subunidades proteicas fibrosas em
⍺-hélice, que dão resistência mecânica às células.
São compostos por monómeros que têm uma cabeça
N-terminal ou amínica (NH2) e uma cauda globular
C-terminal ou carboxílica (COOH), unidos por uma parte
central bastante alongada.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Dois destes monómeros vão-se juntar de forma paralela, alinhando as caudas e cabeças,
formando um dímero torcido. Dois dímeros vão-se agora juntar de forma antiparalela,
alinhando as cabeças de um dímero com as caudas do outro, formando um tetrâmero, também
este torcido. Finalmente, oito tetrâmetros vão-se alinhar lado a lado, sofrendo uma grande
torção, formando um longo filamento que parece uma corda resistente e difícil de desagregar
(em contraste com os microfilamentos). Apesar dos monómeros e dímeros serem polares, os
tetrâmeros e os filamentos intermédios são apolares. Devido a isto, não existem proteínas
motoras neles porque uma proteína não se consegue orientar neles.

Existem vários tipos de filamentos intermédios, variando consoante o tipo de célula e a


localização do filamento na célula. Alguns filamentos intermédios estão distribuídos por todo o
citoplasma, como as queratinas (de tipo I ou II,
dependendo se forem acídicas ou básicas),
encontradas nas células epiteliais; as vimentinas
(tipo III), encontradas nas células do tecido
conjuntivas, nas musculares e nas células da glia; e
os neurofilamentos (tipo IV), encontrados nos
neurónios; outros formam a lâmina nuclear que
sustenta e fortalece o envelope nuclear (tipo V).
Nota: existe um tipo VI encontrado em células
musculares e estaminais.

Devido a serem muito rígidos, difíceis de desagregar e se organizarem como uma rede por todo o
citoplasma, os filamentos intermédios apresentam uma enorme força de tensão, o que lhes
permite resistir a um grande stress mecânico. São os filamentos intermédios que permitem às
células da pele ou da bexiga esticarem-se frequentemente sem haver rutura, mantendo a sua
estrutura original.

Isto significa que células sem filamentos intermédios, quando sujeitas a stress mecânico,
rompem-se, levando a uma série de patologias. O tipo de patologia depende do tipo de filamento
intermédio afetado.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Por exemplo, existem 25 genes que codificam queratinas ácidas e outros 25 que codificam
queratinas básicas. As queratinas encontram-se em diferentes conjugações e em diferentes
epitélios do corpo devido a terem características diferentes, logo mutações em diferentes
queratinas levam a patologias distintas.

Alguns exemplos:

Localização Queratina(s) Patologias quando há mutações

Estrato espinhoso e granuloso 1 e 10 Hiperceratose Epidermolítica

Estrato basal 5 e 14 Epidermólise bolhosa simples

Estrato córneo 9 Queratodermia palmoplantar epidermolítica

No entanto, os filamentos intermédios das lâminas nucleares também são muito importantes,
especialmente na dinâmica da divisão celular (quando ocorre fosforilação para haver destruição
da lâmina e desfosforilação da mesma para a sua reconstrução)

Problemas nas lâminas nucleares são conhecidas como laminopatias:


● Dermopatia restritiva
● Emery-Dreifuss distrofia muscular
● Progeria/Síndrome de Hutchinson-Gilford (envelhecimento 7x mais rápido que o
comum, pensa-se que devido a instabilidade nuclear durante a mitose)

Resumo dos filamentos intermédios:

110
Biologia Molecular e Celular 20-26

Microtúbulos (25 nm)

• Os microtúbulos são tubos rígidos e ocos, formados por dímeros


de tubulina globular. São estruturas polarizadas que contêm uma
extremidade ⍺/menos (-) de crescimento mais lento e uma
extremidade ꞵ/mais (+) de crescimento rápido.
NOTA: Apesar dos nomes das extremidades, estas não
apresentam cargas elétricas distintas.
São constituídos por uma molécula heterométrica com 2 tipos de
subunidades de tubulina – ⍺-tubulina e ꞵ-tubulina – o que causa
polaridade no microtúbulo. Os microtúbulos organizam-se numa
estrutura linear designada de protofilamento – são necessários 13
protofilamentos para formar 1 microtúbulo (cilindro oco).

Os microtúbulos têm várias funções, como:


1. Transporte intracelular, como por exemplo o transporte de
cargas por proteínas motoras – dineína e cinesina
2. Polaridade celular
3. Geração de força (formação do fuso acromático na mitose)
4. Movimento celular

• Os microtúbulos crescem a partir de centros organizadores de


microtúbulos (MTOCs), sendo o centrossoma o MTOC mais
importante, no qual as extremidades menos (-) permanecem
inseridas nuns anéis de tubulina especial chamada tubulina 𝛾
(gama). Cada microtúbulo cresce e diminui de forma
independente dos microtúbulos adjacentes. O arranjo de
microtúbulos ancorado num centrossoma está em constante
alteração, à medida que novos microtúbulos crescem (setas vermelhas) e microtúbulos antigos
sofrem encurtamento (setas azuis).

111
Biologia Molecular e Celular 20-26

•Vários microtúbulos exibem instabilidade dinâmica, alternando


rapidamente entre crescimento e encurtamento. O encurtamento é
promovido pela hidrólise do GTP que está fortemente ligado aos
dímeros de tubulina, reduzindo a afinidade dos dímeros com seus
vizinhos, e promovendo, portanto, a dissociação dos microtúbulos.

A hidrólise de GTP controla a instabilidade dinâmica dos


microtúbulos. (A) Dímeros de tubulina ligados a GTP (vermelho)
ligam-se mais fortemente uns aos outros do que dímeros de tubulina
ligados a GDP (verde-escuro). Portanto, as extremidades mais (+) dos
microtúbulos, com rápido crescimento, e que contêm dímeros de
tubulina com GTP ligado recém-adicionados, tendem crescer
continuamente. (B) De vez em quando, no entanto, sobretudo se o
crescimento dos microtúbulos for lento, os dímeros nesta capa
protetora de GTP vão hidrolisar o GTP em GDP antes que novos
dímeros ligados ao GTP sejam adicionados. A capa de GTP será,
então, perdida e, visto que os dímeros ligados ao GDP ligam-se menos
firmemente ao polímero, os protofilamentos “desfiam” na
extremidade mais (+) e os dímeros são libertados, provocando o
encurtamento do microtúbulo.

• Os microtúbulos podem ser estabilizados por proteínas localizadas


que capturam as extremidades mais (+), contribuindo assim para
posicionar os microtúbulos, vinculando-os a funções específicas.

O taxol é um medicamento utilizado para o cancro que estabiliza toda a tubulina livre. Devido a isto, não será
possível a formação de microtúbulos novos e como tal não se realizará a divisão celular, visto que os microtúbulos
não conseguirão puxar os cromossomas durante a mitose, impedindo a divisão celular. A colchicina e a
vinblastina juntam-se aos dímeros de tubulina, impedindo a sua polimerização (útil para bloquear na metafase).

Os microtúbulos são responsáveis por uma série de movimentos celulares tais como o
transporte de vesículas, organelos e separação dos cromossomas. Estes movimentos podem
realizar-se através de mecanismos de polimerização/despolimerização por si só, ou baseado na
ação de proteínas motoras chamadas de dineína e cinesina (forma de movimento celular +
comum)

112
Biologia Molecular e Celular 20-26

• As cinesinas e as dineínas são proteínas motoras associadas aos microtúbulos que usam a
energia da hidrólise de ATP para se movimentarem unidirecionalmente ao longo dos
microtúbulos. Elas transportam organelos específicas, vesículas e outros tipos de matéria para
localizações específicas na célula.
Dineínas: transportam carga no sentido da extremidade negativa
Cinesinas: transportam carga no sentido da extremidade positiva.
O movimento destas proteínas motoras implica o consumo de energia sob a forma de ATP via a
cabeça ou domínio motor das proteínas motoras. A cauda da proteína motora determina qual
carga a proteína transporta.

• Os cílios e os flagelos dos eucariontes contêm um feixe de microtúbulos estáveis. O seu


batimento ritmado é causado pela flexão dos microtúbulos, sendo tal flexão dirigida pela
proteína motora dineína ciliar. Nos espermatozoides, a dineína é a proteína motora mais
importante para o batimento do seu flagelo.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

A estrutura responsável pelos movimentos dos cílios e dos


flagelos chama-se axonema. Um axonema é constituído
por:
● 9 pares de microtúbulos periféricos + 2
microtúbulos centrais
● Pontes de nexina (azul)
● Filamentos radiais (castanho)
● Bainha interna (cinzento)
Estes últimos 3 são proteínas que ajudam a manter a
estrutura do axonema.

Os microtúbulos guiam o transporte de organelos, vesículas e macromoléculas ao


longo de uma célula nervosa, uma viagem que pode levar dias. Todos os
microtúbulos de um axónio apontam para a mesma direção, ou seja, com suas
extremidades positivas em direção ao terminal da célula nervosa. Os microtúbulos
orientados servem como pistas para o transporte direcional de materiais
sintetizados no corpo da célula, mas necessários nas telodendrites. Existe ao
mesmo tempo tanto tráfego em direção às telodendrites como na direção inversa,
ao corpo da célula. O tráfego para trás inclui mitocôndrias desgastadas e materiais
ingeridos pelos terminais do neurónio.

114
Biologia Molecular e Celular 20-26

Seminário 1- Telómeros e telomerase


Um telómero é a terminação dos cromossomas lineares em células eucarióticas (cada
cromatídeo tem 1). Tem como função selar os fins do cromossoma, o qual sem estes
“tampões” seria altamente instável. Os telómeros auxiliam ainda a célula a distinguir um
cromossoma natural/intacto de um cromossoma quebrado ou defeituoso.

Os telómeros baseiam-se em centenas de milhares de repetições da mesma sequência curta no


fim da cadeia do DNA (TTAGGG no caso dos humanos e mamíferos em geral).

Como têm extensões de fita simples que se assemelham ao DNA danificado, os telómeros
precisam de ser protegidos dos sistemas de reparação do DNA. Para isto temos, em algumas
espécies (incluindo humanos), os Loops. Os excedentes da fita simples (G-rich strand) ligam-se
a repetições complementares do DNA da fita dupla adjacente, formando os ditos loops (ou alças
protetoras).
➔ A G-rich strand é a que se prolonga mais → (TTAGGG)n
➔ A C-rich strand é a mais curta → (CCCTAA)n
Os T. loops ocorrem devido ao G-overhang (cauda da G-strand) e conferem estabilidade aos
telómeros, protegendo os cromossomas.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Shelterin
O complexo proteico que se relaciona aos
telómeros chama-se shelterin. Tem como
função proteger os telómeros (impedem os
mecanismos de reparação do DNA) e ainda
regular a ação da telomerase. É composto
por 6 proteínas: TRF 1, TRF 2, RAP 1,
TIN 2, TPP 1 e POT 1.

As TRF 1 e 2 são duas double-stranded DNA binding proteins. Quando disfuncionais, os


telómeros dos cromossomas fusam-se como observado na figura 1.

Efeito da posição dos telómeros → os telómeros suprimem a expressão dos genes próximos.

TERRA
Até recentemente, os telómeros eram considerados segmentos transcricionalmente silenciosos.
Porém, em 2007, foi demonstrado que os telómeros de mamíferos são transcritos em moléculas
de RNA constituídas por repetições teloméricas (TERRA, Telomeric repeat-containing RNA).

O TERRA é produzido pela ação da RNA polimerase II (RNAPII) a partir de vários loci
subteloméricos que estão localizados próximo das extremidades dos cromossomas e é constituído
por repetições da sequência UUAGGG, em número variável.

Várias técnicas têm sido aplicadas na determinação do comprimento dos


telómeros, nomeadamente, a técnica tradicional TRF (Terminal restriction
fragment) associada ao PCR (Polymerase chain reaction) e Q-FISH (Fluorescence
in situ hybridization).
A Q-FISH usa as propriedades de fluorescência do RNA para o estudo do
comprimento dos telómeros.

Telómeros - o fim do problema da replicação: Ao fim de cada


replicação perde-se uma porção de telómeros. Isto deve-se ao facto de
que quando os primers são removidos da cadeia complementar, a
DNA polimerase não consegue repor os espaços deixados em branco.

Critical short telomere - fenómeno que acontece quando os


telómeros já estão demasiado curtos para permitir divisões,
tornando-se disfuncionais → senescência celular (envelhecimento)

116
Biologia Molecular e Celular 20-26

Telomerase

➔ A telomerase é uma DNA polimerase RNA dependente


(produz DNA com base em RNA → reverse transcriptase
protein complex).
➔ Tem como função alongar os telómeros.
➔ A enzima liga-se a uma molécula de RNA que contém uma
sequência complementar à repetição do telómero. Quando a
extensão já tiver sido feita → replicação da fita complementar.
➔ Só é ativa em células germinativas.
➔ As subunidades mais importantes deste complexo são a TERT (reverse transcriptase) e a
Template containing RNA (TR) que se encontram no núcleo da telomerase.

A overexpression da telomerase está relacionada a fatores de anti-aging e rejuvenescimento. É


importante estudar o seu impacto porque pode induzir à formação de cancro (as células
cancerígenas expressam mais a telomerase que as normais).
Foi comprovado cientificamente que com a expressão da telomerase há um aumento do tempo
estimado de vida, desde que sejam administrados também inibidores de células cancerígenas.

Experiência → overexpression do TERT numa fase mais avançada da vida. Observou-se não só
um aumento do tempo estimado de vida, como também renovação de tecidos e uma melhoria
geral da saúde do indivíduo.

Por isto é que um dos alvos terapêuticos para a cura do cancro é a inibição da telomerase →
diminui a proliferação celular. No entanto, esta técnica tem os seus riscos. A inibição desta
enzima que existe também em algumas células somáticas (ex. linfocitárias e estaminais) pode
originar graves problemas ao organismo.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Seminário 2 - Imprinting e inativação do cromossoma X


Inativação do cromossoma X

Epigenética → Estudo dos fenómenos hereditários que não são explicados por alterações da
sequência do DNA (sequência de nucleótidos é igual mas a sua expressão é alterada)

Cromossoma X → tem cerca de 2300 genes Cromossoma Y → ronda os 500 genes

A inativação de um dos cromossomas X permite equalizar a dosagem genética entre indivíduos


XX e XY → Ocorre nos mamíferos: Só um dos X é que é expresso (no caso de XX)

Existe uma estrutura nos indivíduos XX que se encontra nas células somáticas - o corpo de
Barr- que se postulou ser o cromossoma X inativo (foi descoberto nos gatos do sexo feminino e
inicialmente pensava-se incorretamente que o corpo de Barr era exclusivo aos neurónios destes)

Existe uma região específica no cromossoma X que precisa de estar presente nas duas cópias,
numa célula, para que possa haver a inativação de um dos cromossomas X. Essa região específica
corresponde ao gene XIST (X inactive specific transcript):
➔ Cobre o cromossoma X que inativa;
➔ É o único gene expresso no cromossoma X inativo;
➔ Codifica um RNA não codificante (não sai do núcleo)

Cada célula diplóide tem de ser self-aware da sua diplóidia e do


número de cromossomas X ativos para que possa manter o seu
rácio de cromossoma X ativo (rácio X ativo:Autossomas = 0,5)

Autossomas → produzem uma proteína INIBIDORA do XIST


Cromossoma X → produz uma proteína que degrada esse inibidor - ANTI-INIBIDOR

Como no sexo masculino só existe um cromossoma X → existe uma diminuta do anti-inibidor


→ não é suficiente para degradar todo o inibidor → o inibidor consegue inibir o XIST → o
cromossoma X não é inativado (o único X do sexo masculino mantém-se ativo)

Hipótese de Mary Lyon (toda correta):


1. Corpo de Barr é um X inativo.
2. A inativação do cromossoma X é
aleatória: umas células inativam o X
paterno, outras o X materno.
3. A inativação deverá ocorrer no
desenvolvimento embrionário e, uma vez
estabelecido, é estavelmente mantido

118
Biologia Molecular e Celular 20-26

Caso particular: Caso a pessoa tenha uma mutação e tenha XXX então dois dos cromossomas X
terão de ser inativos, pois só deve haver um X ativo.

É de notar que o cromossoma X é o gene mais eucromático com zonas mais expostas que
permitem a sua leitura. O que vai acontecer é que o cromossoma X inativo vai-se tornar mais
heterocromático o que vai impossibilitar/dificultar a sua expressão, através da:
➔ Metilação dos promotores;
➔ Perdas de marcas de metilação.

Doenças heterozigóticas associadas: São raras, basta serem heterozigóticos para a doença se
manifestar (normalmente é fatal nos rapazes).
➔ Síndrome de Rett (mutações no MECP2 no cromossoma X);
➔ X frágil;
➔ Incontinência pigmenti.

Doenças homozigóticas associadas: Manifestação quase exclusiva no sexo masculino


➔ Hemofilia;
➔ Distrofia muscular;
➔ Daltonismo;
➔ Autismo.

Apesar de manifestarem o rácio correto do cromossoma X inativo, elas manifestam sintomas:


Síndrome de Klinefelter (XXY): X ativo X inativo Y
Síndrome do triplo X: XX inativo X ativo
Manifestam sintomas porque cerca de 15% dos genes escapam à inativação do X, a maior parte
(mas não só) encontrada na zona PAR (zona pseudo-autossomal), onde o X e Y emparelham
durante a meiose. Quais genes escapam depende também do tipo de célula.
Inativação do cromossoma X - animação

Imprinting

➔ Processo epigenético que conduz à expressão exclusiva de 1 de 2 alelos num autossoma;


➔ Afeta cerca de 150 genes (< 1% do genoma, mas muito importante na mesma);
➔ Expressão monoalélica determinada pela origem parental do alelo.

A descoberta do imprinting:
Experiências pioneiras em 1980 - investigadores criaram embriões por técnicas
sofisticadas, e com esta técnica conseguiram fazer para além de embriões normais com uma
contribuição maternal e uma paternal, embriões com contribuição totalmente materna

119
Biologia Molecular e Celular 20-26

(ginogenéticos ou bimaternais) e embriões com contribuição totalmente paterna


(androgenéticos ou bipaternais).
Chegaram à conclusão que tanto os embriões de contribuição total de apenas um alelo
não conseguem chegar ao fim do desenvolvimento. Além disso, o conjunto de fenótipos eram
totalmente opostos um ao outro. Havia uma muita má formação no fundo dos tecidos
embrionários. Ambos os genomas parentais não são equivalentes → ambos são necessários para
um desenvolvimento completo e normal.

Um investigador em Oxford estava a trabalhar com ratinhos que tinham translocações


cromossómicas muito peculiares, mas que permitiam gerar embriões que tinham dissomias
uniparentais para cromossomas particulares.

Dissomia uniparental → ocorre quando uma pessoa recebe duas cópias de um cromossoma ou
parte de um cromossoma de um dos progenitores e nenhuma cópia do outro.

A falta de equivalência dos genomas parentais é atribuída a partes específicas do genoma.


Estas são as regiões que têm genes de imprinting (IGF2 - cromossoma paterno; H19 -
cromossoma materno). Numa dissomia parental IGF2 deixa de estar expresso e o H19 está
expresso nos dois cromossomas.

Porquê que o imprinting existe?

O imprinting é exclusivo de mamíferos (desenvolvimento embrionário ocorre no corpo da


fêmea). Os genes regulados por imprinting têm um certo padrão:
❏ genes que promovem o crescimento → cromossomas paternos
❏ genes que restringem o crescimento → cromossomas maternos

120
Biologia Molecular e Celular 20-26

Exemplos:
DLK1 → gene que promove o crescimento (paterno)
GRB10 → gene que restringe o crescimento (materno)

Hipótese do conflito parental:


No ambiente em que os embriões são gerados, pode haver um conflito entre os interesses do pai
e da mãe.
“pai” → descendência forte e vigorosa, investe tudo naquela descendência.
“mãe” → vai tentar manter ao máximo recursos para as futuras gerações.

Mecanismos envolvidos no imprinting


Em 1993 houve um estudo que mostrou que mutantes para enzimas que causam a mutilação do
DNA (mecanismo epigenético) originam embriões que tinham o imprinting desregulado.
(confirmar)

Metilação do DNA → adição de um grupo metil à citosina, que no caso dos mamíferos
acontece quase exclusivamente no contexto do dinucleótido CG (só quando a citosina é seguida
por uma guanina na sequência é que é metilada).

A consequência mais elucidativa é que quando ocorre nos promotores dos genes (frequência de
CG é muito maior), quando há metilação → gene silenciado.

A metilação do DNA ocorre numa região muito específica e é sempre diferente entre os
cromossomas paterno e materno. Há sempre regiões que mostram metilação diferencial entre os
dois cromossomas.

Para que a metilação do DNA nas regiões do imprinting seja passada de geração em geração
temos que cumprir o “ciclo do imprinting”:
➔ 1ª fase - deposição diferencial de metilação do DNA, que ocorre na linha
germinativa (cromossomas paterno e materno estão separados).
➔ 2ª fase - manutenção do imprinting nos tecidos somáticos. O imprinting
mantém-se durante toda a nossa vida.
➔ 3ª fase - especificação da linhagem germinativa. Nas células que dão origem à
linha germinativa masculina e feminina há uma perda total da metilação nas
regiões de imprinting → há uma limpeza para que seja adquirida de acordo com
o sexo da linha germinativa → para ser transmitida da mesma forma à próxima
geração.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Como é que o imprinting e a metilação conseguem regular a expressão monoalélica dos genes
submetidos a imprinting?
Estes genes normalmente localizam-se perto uns dos outros - regiões de imprinting → há uma
região reguladora do imprinting (ICR) onde há metilação diferencial dos cromossomas.
O estado de metilação é essencial e deve ser mantido.
Existem muitos genes submetidos a imprinting que codificam RNA não codificantes como o
XIST .

Que formas de regulação existem que explicam o imprinting nestas regiões?

Modelo de competição por regiões reguladoras comuns

→ Exemplificado pela região de imprinting IGF2 e H19. Existe um fator de transcrição


CTCF que se liga à região ICR apenas quando esta não está metilada. A ligação do CTCF é
determinada pelo estado de metilação do ICR.
Esta proteína forma uma barreira que não permite que estas regiões reguladoras
“enhancers” acedam ao gene IGF2 materno, este gene não tem contacto com a região reguladora
→ silenciado. Ao invés o H19 pode ser expresso porque tem acesso a essas regiões.
No cromossoma paterno o CTCF não se liga (metilado), a metilação chega ao gene H19
e desta forma as sequências reguladoras conseguem contactar o gene IGF2 e permitir a sua
expressão.
O CTCF é uma proteína muito importante para a regulação tridimensional do genoma,
permitindo a observação das diferenças do imprinting para os cromossomas femininos e
masculinos.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Modelo do RNA não codificante


Aplica-se em situações em que todos os genes que codificam proteínas estão num cromossoma e
no outro temos RNA não codificante (expresso exclusivamente num dos cromossomas porque o
seu promotor está metilado). Pensa-se que este RNA funciona de forma semelhante ao XIST,
conseguindo inativar genes na sua proximidade.

Doenças humanas envolvendo genes sujeitos a imprinting

A maior parte destas doenças são síndromes que afetam o desenvolvimento:


❏ Síndrome de Beckwith-Wiedemann → crescimento excessivo, certos órgãos são
maiores do que deviam.
❏ Síndrome de Silver-Russel → crianças nascem muito mais pequenas que o normal
❏ Síndrome de Prader-Willi → fenótipos cognitivos
❏ Síndrome de Angelman → fenótipos cognitivos

Síndrome de Angelman: desenvolvimento tardio, deficiência intelectual, quase ausência


total de discurso, epilepsia, ataxia e apresentam episódios frequentes de riso. Este síndrome pode
ser causado por várias causas, mas todas elas levam à perda de um gene UBE3A que está
exclusivamente expresso no cromossoma materno (neurónios).
Causas:
❏ deleção da região de imprinting 15-14-13 → 75%, toda esta região não está
presente.
❏ trissomia uniparental paterna → 5%
❏ mutações no próprio gene B3A
❏ defeitos na metilação do DNA / defeitos de imprinting no ICR

Consequências do imprinting na manifestação destas doenças


A mesma mutação em cromossomas diferentes dão origem a doenças diferentes.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Seminário 3 - Splicing
Processamento do pré-mRNA
● O que é?
○ Conjunto de todas as alterações que RNA sofre desde que é transcrito até chegar
ao citoplasma.
● Fases (resumidamente)
○ Capping: Adição do cap à extremidade 5’.
○ Splicing: Remoção dos intrões
○ Poliadenilação: Adição de uma cauda de adeninas na extremidade 3’.
○ Edição: (vamos falar no fim)
● Todas as fases acontecem intimamente ligadas ao processo de transcrição:
○ Cap é adicionado mal a extremidade 5’ surge solta fora da RNA polimerase,
○ É feito o splicing mal surgem os intrões
○ Processo de adição de poli-A é simultâneo à clivagem da extremidade 3’ do RNA
Portanto, a RNA polimerase funciona como o ‘pastor’ ou guia das enzimas responsáveis
por estes processos.

Evolução e vantagens do splicing


● De um ponto de vista evolutivo, o splicing é claramente bastante vantajoso, dado que:
○ Em procariontes, não há de todo processamento do RNA
○ Em leveduras: poucos genes têm intrões, os intrões são curtos
○ Mamíferos: quase todos os genes têm vários intrões, intrões mais longos
○ Humanos: são das espécies com mais e mais longos intrões.
● Mas qual é a vantagem dos intrões se eles vão simplesmente ser removidos?
○ Podemos fazer splicing alternativo.
○ Portanto, partindo do mesmo gene, podemos produzir várias proteínas,
conforme que sequências consideramos como intrões e como exões.
■ Temos 19.000 genes, mas temos muito mais proteínas.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Como é feito o splicing?


● Locais de splicing (‘Splice Site’, SS)
○ Pontos de separação entre intrão e exão.
○ Portanto, todos os intrões têm dois SS:
■ Um ao início em 5’
■ E outro no final em 3’
● Vamos ter certas sequências de nucleótidos que aparecem em todos os intrões, no
máximo ligeiramente alteradas (‘sequências conservadas’)
○ Na extremidade 5’, vamos ter sempre a mesma sequência (GURAGU, sendo que R
significa que tanto pode ser A ou G)
○ Mais junto à extremidade 3’, vamos ter várias sequências que aparecem em todos os
intrões (YYYYYYYYNCAG, sendo que Y tanto pode ser C ou U e N pode ser
qualquer nucleótido)

● Estas sequências vão ser detectadas ou por proteínas ou por snRNAs


○ snRNAs (small nuclear RNAs)
■ São moléculas de RNA algo similares aos
tRNAs, que possuem uma sequência
complementar à sequência que detectam
nos intrões.
■ Estão associados a proteínas, formando
snRNPs (RiboNucleoProteínas). Estas
designam-se U1, U2, etc., dado que os
snRNAs são muito ricos em uracilo.
■ As snRNPs + muitas outras proteínas
constituem o spliceossoma
● Na extremidade 5’:
○ Sequência conservada é detectada pela RNP
U1, que se liga lá

125
Biologia Molecular e Celular 20-26

● Na extremidade 3’:
○ Primeiro ligam-se proteínas às sequências conservadas próximas da extremidade
○ Depois, é recrutada uma RNP, a U2. Esta RNP vai também reconhecer o ponto
(A) onde se vai formar o laço
● Ficamos então com uma RNP em cada extremidade do intrão. Os snRNAs de cada uma
das RNPs vão se aproximar e ligar, formando assim um laço com o intrão e aproximando
as extremidades dos exões de cada lado.
○ A U6 substitui a U1, confirmando (via complementaridade de bases) se esta se
juntou ao início do entrão, como suposto
○ São então recrutadas outras 2 RNPs, a U4 e U5. Estas vão clivar as extremidades
do intrão (que será reciclado) e unir os exões.
○ Curiosidade: Então e a U3?
■ Descobriu-se entretanto que a U3 não está envolvida no splicing, mas sim no
processamento do RNA ribossomal.
■ Portanto, são 5 as RNPs que constituem o spliceossoma: a U1, U2, U4, U5 e a
U6.

Splicing alternativo
● É regulado por que fatores?
○ Tipo da célula: por exemplo, por alguma razão, podemos querer que a proteína
X tenha um domínio a mais nas células intestinais, pelo que nessas células a
sequência que codifica o tal domínio é reconhecida como um exão e não como
um intrão;
○ Condições do meio: conforme as circunstâncias, célula pode optar por fazer um
tipo de splicing ou outro
● Como é controlado?
○ Células vão produzir proteínas que vão tapar certos locais de splicing, impedindo
que o spliceossoma reconheça o local e faça splicing aí.

Splicing - Patologias e Nonsense Mediated Decay


● Podemos ter mutações que levam a alterações nos locais de splicing
○ Ou levam a que um local de splicing não seja reconhecido como tal.
○ Ou levam a que uma sequência seja erradamente reconhecida como um local de
splicing. Diz-se então que temos um local de splicing críptico.
● Que consequências teriam os erros de splicing?

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Biologia Molecular e Celular 20-26

○ Podem alterar o quadro de leitura: se a sequência que é erroneamente


adicionada/retirada ao mRNA tiver um tamanho que não é divisível por 3, então
o quadro de leitura é alterado.
○ Alteração do quadro de leitura leva quase de certeza ao aparecimento de um
codão STOP prematuro.
■ Uma sequência aleatória de nucleótidos não precisa de ser muito longa
para ter uma probabilidade bastante grande de conter um codão STOP.
Ao alterarmos o quadro de leitura, sequência de nucleótidos após a
alteração é essencialmente aleatória.
○ Portanto, erros de splicing podem levar à produção de mRNAs com codões
STOP prematuros e em que a sequência final é basicamente aleatória. As
proteínas codificadas por estes mRNAs teriam então um comportamento
imprevisível, que poderia ser prejudicial para a célula. Mais no geral, este é o caso
com todas as proteínas resultantes de mRNAs com codões STOP prematuros.
● Nonsense Mediated Decay (NMD) - Como impedimos a tradução de mRNAs com
codões STOP prematuros?
○ Sempre que se dá splicing e como tal são unidos dois exões, no local de junção é
colocado um complexo proteico designado EJC (Exon Junction Complex)
○ Dado isto, se, quando se der a tradução, o ribossoma encontrar um codão STOP
mas ainda tiver um EJC à frente, isto indica que se trata de um codão STOP
prematuro (não faz sentido ter todo um exão à frente que não vai ser lido de
todo. A única explicação é ser um codão STOP prematuro).
○ Portanto, quando o ribossoma encontra um codão STOP mas verifica que ainda
tem um EJC à frente, são recrutadas enzimas que vão digerir tanto o mRNA
defeituoso como a proteína criada até aí.

Poliadenilação
● O que é?
○ Adição de uma cauda de adeninas à extremidade 3’ do mRNA.
● Como funciona?
○ Temos proteínas que detectam certas sequências no RNA (PAS,
Poly-Adenylation Site, geralmente no UTR 3’) que marcam o local em que este
deve ser clivado.
○ Logo, quando esta sequência emerge da RNA polimerase, estas proteínas clivam
o mRNA e adicionam-lhe a cauda de poli-A.
● Poliadenilação alternativa:
○ Da mesma forma que temos splicing alternativo, podemos ter poliadenilação
alternativa. Ou seja, o mRNA pode ser clivado em locais diferentes.

127
Biologia Molecular e Celular 20-26

○ Que consequências tem isto?


■ Todos os locais onde o mRNA pode ser clivado situam-se após o codão
STOP, portanto na UTR 3’ (untranslated region). Portanto, aa
poliadenilação alternativa não tem impacto na proteína que acaba por ser
produzida, ao contrário do que acontece no splicing alternativo.
■ Mas altera o tamanho da UTR 3’.
■ Como nas UTRs se ligam microRNAs que vão regular a estabilidade
do mRNA (quão facilmente é digerido), a poliadenilação alternativa vai
afetar isto (pode retirar locais de ligação de microRNAs).
■ Também vai ter impacto no local da célula onde acaba o mRNA
(principalmente importante em células como neurónios, com várias
partes com necessidades diferentes, logo onde convém ter certos mRNAs
em sítios específicos [axónio vs dendrites, por exemplo]).

RNA editing
● Verificou-se recentemente que por vezes temos discrepâncias entre a sequência de DNA e
o mRNA resultante. Ou seja, há certas bases que mudam.
● Verificou-se então que temos certas enzimas que mudam algumas bases.
● Estas modificações são as mais comuns:
○ Citosina para Uracilo (C-to-U)
■ Isto pode ser usado para criar codões STOP.
● Nota: Se isto se der num exão que não seja o último, leva à
ativação do NMD. Se se der no último exão, simplesmente temos
a produção de uma proteína mais curta. Ambos os casos
acontecem (podemos ter edição com o propósito de ativar o
NMD e como tal impedir a produção da proteína)
■ Caso concreto: há uma certa proteína que sofre edição levando ao
surgimento de um codão STOP, sendo assim produzida uma proteína
mais curta. No fígado, não se dá a edição, pelo que é produzida uma
proteína mais longa, com outras funções.
○ Adenosina para Iosina (A-to-I)
■ Iosina é lida como uma Guanosina
■ É trocado um grupo amina por um grupo carbonilo

Em suma:
Splicing, poliadenilação e editing permitem aumentar a diversidade de proteínas no organismo,
que é essencial para o grau de complexidade que apresentamos.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Seminário 4 - Mitocôndrias
1 glicose → 2 piruvatos que podem ter 2 destinos: a fermentação (via anaeróbia - citosol) ou a
glicólise (via aeróbia - mitocôndria). A via aeróbia é muito mais eficaz na produção de ATP.

Membrana mitocondrial externa → constituída por mais lípidos e menos proteínas


Membrana mitocondrial interna → constituída por menos lípidos e mais proteínas

Ciclo de Krebs e glicólise → regulados pela mitocôndria (único organelo com 2 membranas) tem
origem provável em uma célula procarionte (Hipótese endossimbiótica)
Transporte de eletrões ocorre nas cristas mitocondriais: + cristas → + produção de energia
Ciclo de Krebs → matriz mitocondrial

A ATP-sintase é um
dispositivo de acoplamento
reversível. Tanto pode
sintetizar ATP por meio
de aproveitamento do
gradiente eletroquímico de
H⁺ como bombeá-lo
contra esse gradiente,
hidrolisando ATP para
evitar o despolarizamento
mitocondrial.

129
Biologia Molecular e Celular 20-26

Mitocôndria despolarizada → déficit de produção de energia ⚡


➔ Mitocôndria:
◆ Produção de ATP;
◆ Papel importante no desenvolvimento
embrionário;
◆ Produz radicais livres de Oxigénio;
◆ Indução da morte celular (citocromo C);
◆ Regula o [Ca²⁺] nas células

A mitocôndria tem características de um ser procarionte


multiplicando-se, por isso, por fissão → isto permite não
só duplicar o número de mitocôndrias mas também
remover porções danificadas.
Podem também unir-se por f usão → permite a mistura de
≠ mitocôndrias bem como a reparação recombinatória de
mtDNA .

Mitocôndria danificada (por falta de nutrientes ou induzida por danos mitocondriais) →


Sinalizada com ubiquitina → Mitofagia (autofagia da mitocôndria)

O ambiente mitocondrial é rico em ROS (reactive oxygen species), o que induz mutações no
mtDNA ao reagir com este.

Danos mitocondriais: têm repercussões em diferentes tecidos:


● Atraso no crescimento;
● Hipogliémia, hiperlactacidémia;
● Hipotonia generalizada;
● Cardiomiopatia;
● Epilepsia e declínio cognitivo;
● Infertilidade.

Órgãos com alta necessidade energética são particularmente afetados pela disf unção
mitocondrial

Muitas doenças neurodegenerativas têm por base a disfunção mitocondrial como, por
exemplo, Parkinson, Huntington, ALS e Esclerose múltipla.

130
Biologia Molecular e Celular 20-26

mtDNA É APENAS 1% de todo o genoma mitocondrial -99% provém do DNA nuclear


➔ Podemos ter várias cópias de mtDNA nas mitocôndrias → HETEROPLASMIA (é a
presença de uma mistura de mais do que um tipo de genoma mitocondrial. É um
fenómeno que ocorre por acumulação de erros durante a replicação e por danos causados
devido aos radicais livres do ambiente oxidativo)
➔ Origem exclusivamente MATERNA, por isso, permite identificar a linhagem materna
(mas não permite distinguir entre indivíduos diferentes da mesma linhagem materna);
➔ Não tem sistemas de reparação está compactado em cromatina (não está associado a
histonas);
➔ O seu DNA é circular (tem uma light chain e uma heavy chain) composto por 16 569
bp, dos quais 93% são codificantes e 7% são para controlo (replicação e trancrição)
➔ Não tem intrões, ou seja, todo o seu DNA é traduzido (37 genes que codificam 13
proteínas da cadeia respiratória (os complexos I, III, IV e V); 22 tRNAS e 2 rRNAs [12S
e 16S])
➔ É cerca de 10-17x mais provável ocorrer uma mutação no mtDNA

Existem 3 tipos de mutações no mtDNA:


● Mutações missense → afeta a atividade oxidativa da fosforilase
● Point mutation → ocorrem nos tRNA’s ou nos rRNA’s - problemas na síntese proteica
● Deleção e duplicação de moléculas de DNA

LHOS → Leber’s hereditary optic neuropathy


Perda indolor da visão central. afeta mais homens → devido à perda de produção de E. no tecido
ótico

MELAS → Mitochondrial Encephalomyopathy Lactic Acidosis


Epilepsia e stroke-like episodes

Enzyme Replacement Therapy - ERT → SIM! É possível substituir o genoma mitocondrial


em embriões que saibamos à priori que tenham mutações nas mitocôndrias.

É também possível:

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Seminário 5 - Terapias génicas

1983 → mapeamento do primeiro gene associado a doença (Huntington’s disease)

Mutações:
● Podem levar a uma perda de função da proteína (no caso de haver uma deleção de
grande parte do gene) → pode causar doença
A terapia génica de substituição passa por adicionar na célula uma cópia extra de
DNA com a sequência correta sendo posteriormente transcrito e traduzido pela
célula de forma normal.
Nota que não é alterado o genoma.
● Mutações que alteram o padrão de splicing que leva à destruição do mRNA

Terapia génica de substituição:


Pensou-se em utilizar vetores (1990) - os vírus - para introduzir a sequência de DNA das células

O primeiro caso de sucesso foi numa criança nos EUA que possuía uma doença autoimune de
imunodeficiência combinada severa.
A rapariga sofria de uma doença genética causada por deficiência da enzima adenosina
desaminase (ADA), indispensável para o desenvolvimento do sistema imune. Várias mutações no
gene que codifica a enzima provocam deficiência de ADA, o que resulta em degeneração das
células T do sistema imune e constitui uma das principais causas de síndrome de
imunodeficiência combinada severa (SCID).

Terapia ex vivo: modificação de células em cultura


Imunodeficiência:
Para a corrigirmos temos de corrigir as células estaminais hematopoiéticas - responsáveis pela
formação das células do sistema de resposta imune (linfócitos).

1. Aspiração da medula óssea do doente para retirarmos as


células hematopoiéticas do doente e as pormos num meio
de cultura
2. Inserimos o vírus, previamente geneticamente modificado
para possuir o gene (Transgene) - que impede também o
vírus de ser patogénico - contendo a informação para a
síntese da proteína em falta no doente.
3. Vamos transduzir as células do paciente (é o equivalente ao
infectar uma célula)

132
Biologia Molecular e Celular 20-26

4. O transgene entra então no genoma humano


Mas esta integração pode não ser pacífica levando, por exemplo, por vezes, à ativação de
oncogenes entre outros…

Modificação de células in vivo:

Cegueira (exemplo da TP1):


Neste caso, injeta-se diretamente o vírus, previamente geneticamente
modificado, na corrente sanguínea ou no olho (neste caso).

Consoante fazemos uma transdução de células que se dividam ou que


não se dividam usamos vetores diferentes:
● Quando precisamos de corrigir células em divisão → precisamos de um vetor viral capaz
de transduzir o transgene no genoma sendo, por isso as células humanas capazes de
manter essa informação
● Quando as células não se dividem usamos plasmídeos pois estes mantêm a informação
no interior da célula sem, no entanto, alterar o genoma humano.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Como é que esse DNA permanece dentro do núcleo (fora dos cromossomas)?

Permanecem sob a forma de Epissomas → híbrido de DNA humano e DNA viral


É preferível utilizar, sempre que possível, vírus que dêem origem a epissomas porque ao haver
transdução há sempre o perigo de ativar oncogenes, etc …
Inicialmente utilizaram-se os Adeno-vírus mas estes despoletavam uma resposta inflamatória
grave e posteriormente utilizaram-se os Adeno-associated-vírus (AAV) - existem cerca de 100
variantes e o que os diferencia são as proteínas da cápsula → alteram o tropismo dos vírus (a
‘afinidade’/interação do vírus com os recetores das células do corpo) - que são não patogénicos e
são pouco imunogénicos.

Certas partes dos AAV podem ser removidas mas uma das que é obrigatoriamente
necessárias manter são as extremidades - ITRs (inverted terminal repeats) - que
asseguram a replicação viral do vetor.

Geralmente, um palindroma é entendido como uma sequência de DNA de cadeia


dupla, que é lida da mesma forma quando as duas cadeias são lidas numa direção
definida. Formam-se estruturas cruciformes, apresentando zonas que podem emparelhar
por serem perfeitamente
idênticas, e quando isso se
verifica, adquirem forma de
alfinete, conferindo o aspecto
de uma cruz à molécula de
DNA na sua totalidade.

134
Biologia Molecular e Celular 20-26

No caso dos AVV é apenas uma fita única DNA combinada com o gene terapêutico. → estes
palíndromas permitem transformar uma cadeia simples numa dupla devido à formação de
pontes de hidrogénio.

Os AAV não têm a capacidade de ter um genoma muito grande, por isso precisamos de usar
cDNA para termos uma sequência mais curta (sem intrões). Nota que os AVV seriam capazes
de fazer o splicing, apenas usamos o cDNA pelo facto já referido.

Ao gene do vírus são ainda adicionados:


● Sequências reguladoras e promotores, para assegurar a expressão génica;
● Sequências intrónicas que permitem amplificar a expressão do cDNA;
● Um sinal de Poly-A (No RNA que está a ser transcrito há uma sequência específica (que
está antes e depois do local de clivagem) que vai levar à clivagem do RNA permitindo a
adição da cauda de Poly-A)

O cDNA é formado a partir do mRNA poliadenilado o que implica que o cDNA só vai ter uma
parte da sequência - a que está antes do local de clivagem- sendo, por isso,um sinal insuficiente
para a máquina de clivagem e poliadenilação saber onde tem de cortar. É por isso que temos de
acrescentar por engenharia genética um sinal de poliadenilação completo no cDNA humano

Atrofia Muscular Espinal:


- Doença rara
- Doença genética mais frequente de causa de mortalidade infantil
- Causada pela alteração do gene SMN1 (Survival of Motor Neurons) -a proteína
codificada é essencial para a sobrevivência dos neurónios motores

O que acaba por acontecer é que os músculos vão acabar por não serem
estimulados → levando à atrofia dos músculos

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Há uma deleção ou mutação com perda de


função do gene SMN1.
No nosso genoma há uma cópia do gene SMN -
o SMN2 que possui 11 nucleótidos diferentes
que não interferem na formação da proteína mas
fazem com que o exão 7 não seja incorporado no
mRNA na maior parte das vezes. Este mRNA
sem o exão 7 irá ser degradado via NMD, ou
seja, o SMN2 raramente leva à produção da
proteína.

Então a terapia associada ao tratamento desta doença passa


por modular a regulação do splicing forçando o
reconhecimento (inclusão) do exão 7 → tornando a
proteína funcional. Mas como fazem isso?
● Através de um oligonucleótido (cerca de 20
nucleótidos), modificado de modo a ser estável no
organismo, não pode ser degradado antes. Este
oligonucleótido tem uma sequência complementar
(antisense) do mRNA do SMN 2

● Este tratamento vai corrigir o mRNA do SMN 2 e,


por isso, não usamos vírus para incorporar esse
oligonucleótido na célula, pois não estamos a
introduzir informação nova.

● É através de vesículas endocíticas que estes


oligonucleótidos vão entrar na célula e quando chegam ao núcleo vão hibridar com o
mRNA do SMN 2 - interferindo com a ligação a um inibidor de splicing (atenção que
ele existe normalmente nas células) - A função do oligonucleótido é ligar-se a essa região
onde o inibidor se costuma ligar (Inibição (do inibidor) por competição):
○ Quando o oligonucleótido chega primeiro a essa região → o exão 7 vai ser
incorporado

NOTA: OS VÍRUS SÓ PODEM SER USADOS UMA VEZ NA TERAPIA GÉNICA -


pois o corpo fica “vacinado” contra ele e se usássemos o mesmo tipo de vírus outra vez
iríamos despoletar uma grande resposta imunogénica.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

Amiloidose por depósitos de transtirretina (TTR)

Gene TTR mutado → ganho de f unção da proteína mutada


A proteína em causa é, normalmente, solúvel. O que acontece com as pessoas que têm a
mutação é que a proteína tornou-se insolúvel formando depósitos - amiloides
(emaranhado de fibras proteicas)
Terapia de RNAi (interferência de RNA): mecanismo natural em muitas células para
defesa contra ácidos nucleicos externos (como de infeções virais), permite destruir o
mRNA alterado → ausência de agregados de transtirretina

Os siRNAs são produzidos a partir de RNAs


estranhos de fita dupla, no processo de
interferência de RNA.

Na primeira etapa do RNAi, os RNAs de fita


dupla estranhos, de um vírus ou de um elemento
geneticamente transponível, são clivados em
pequenos fragmentos (aproximadamente 22 pares
de nucleótidos) por uma nuclease chamada Dicer –
a mesma proteína usada para gerar o RNA
intermediário de fita dupla na produção de
miRNA. Os fragmentos de RNA de fita dupla
resultantes, chamados de pequenos RNAs de
interferência (siRNAs), associam-se aos mesmos
complexos RISC que carregam os miRNAs.
Os complexos RISC descarta uma das fitas do
siRNA de fita dupla e usa o RNA de fita simples
restante para identificar (por complementaridade)
e degradar moléculas de RNA estranho. Dessa
forma, a célula infectada utiliza o RNA estranho
contra ele mesmo.

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Biologia Molecular e Celular 20-26

CRISPR/ Cas9 genetic scissors - permitem induzir correção genética dentro do genoma
das nossas células. É um sistema imunitário existente naturalmente em bactérias que
atuam contra vírus, plasmídeos… É semelhante ao funcionamento das siRNA.
- Ganhou este ano o Prémio Nobel da Química pois pegaram neste mecanismo
e adaptaram-no à engenharia genética.
- O sistema CRISPR/Cas9 do tipo II é um mecanismo de defesa das bactérias e
Archaea contra elementos genéticos invasores como fagos e plasmídeos de DNA.
A memória imunitária surge após o DNA ser cortado em pequenos fragmentos e
incorporado no CRISPR locus, passando a designar-se por protoespaçador. O
locus é transcrito numa cadeia percursora de RNA não codificante (pre-crRNA),
As cadeias repetidas do pre-crRNA sofrem hibridação com um segundo RNA
não codificante, o trans-activating CRISPR RNA (tracrRNA), formando uma
cadeia dupla de RNA que é clivada e processada pela host factor ribonuclease
(RNase) III. A forma duplex de crRNA-tracrRNA associase com a nuclease Cas9
e forma um complexo responsável pelo reconhecimento e destruição do DNA
invasor in vitro e nas células procariotas. Esta estrutura formada, que possui o
crRNA com o espaçador, tem especificidade para uma sequência alvo, ligando-se
por complementaridade e arrastando consigo a nuclease Cas9. O seu domínio
HNH cliva a cadeia complementar e o domínio RuvC a cadeia não
complementar, provocando um duplo corte na dupla cadeia de DNA. Tal só
acontece caso a sequência alvo se encontre na região adjacente a uma pequena
sequência conhecida como protospacer adjacent motif (PAM)

Crispr-Cas9 - Animação

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