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O episódio Velho do Restelo é um fragmento de sequência, chamada de Partida das Naus, em

que se narra o embarque oficial dos navegantes, sendo o Velho pertencente ao povo
português que estava na praia durante essa partida. De acordo com Ivan Teixeira, sua fala é
um grito que reproduz o discurso presente na época daqueles que valorizam as tradições, que
veem no progresso um perigo à inocência do homem e vão contra ao espírito de rebeldia e de
invenção. O Velho do Restelo critica a ambição, a Fama, o comércio, o progresso e a guerra.
Em toda a obra de Os Lusíadas, tais acontecimentos grandiloquentes são aclamados e
venerados como orgulho do povo português, porém, a fala do Velho demonstra-se contrário a
isto, representando, de acordo com Antônio José Saraiva, uma contradição entre o louvor da
expansão para o Oriente e a censura do progresso e da expansão para o Oriente. O louvor
seria advindo de Camões como poeta oficial da corte e a censura viria de Camões como
humanista que julgava certa limitação da expansão somente até o norte da África. O episódio
Velho do Restelo, como epifonema, traz na fala exclamativa do Velho a acusação veemente da
cobiça por novas terras e a profecia sobre a guerra contra os mouros (Não tens junto contigo o
Ismaelita/ Com quem sempre terás guerras sobejas? / Não segue ele do Arábio a lei maldita /
Se tu pola de Cristo só pelejas? / Não tem cidades mil, terra infinita / Se terras e riqueza mais
desejas? / Não é ele por armas esforçado / Se queres por vitórias ser louvado?), tendo clara
relação com a Proposição da mesma obra, pois vai de contra a tudo o que o eu-lírico nos
cantará.

Nas duas passagens são mencionadas as guerras, as navegações, os povos mouros, as


conquistas de terras, o reconhecimento por tais conquistas, porém, com visões divergentes
entre elas. Enquanto na Proposição o eu-lírico cantará sobre: “As armas e os Barões
assinalados/ Que da Ocidental praia Lusitana/ Por mares nunca de antes navegados /
Passaram ainda além da Taprobana / Em perigos e guerras esforçados / Mais do que prometia
a força humana/ E entre gente remota edificaram/ Novo Reino, que tanto sublimaram”. Em O
Velho do Restelo temos em sua fala impetuosa: “Dura inquietação d'alma e da vida / Fonte de
desamparos e adultérios/ Sagaz consumidora conhecida/ De fazendas, de reinas e de impérios!
/ chamam-te ilustre, chamam-te subida/ Sendo digna de infames vitupérios / Chamam-te
Fama e Glória soberana / Nomes com quem se o povo néscio engana!” Ao passo que na
Proposição temos as conquistas, os navegantes e os povos conquistados cantados com louvor,
em O Velho do Restelo, a personagem critica tudo isso, tendo uma visão, como já dito antes,
contrária a essas inovações, sendo contrário ao ideário exposto na Proposição e em toda a
obra Os Lusíadas.

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