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NEUROPSICOPEDAGOGIA CLÍNICA

E O NEUROPSICOPEDAGOGO
UNIDADE III
NEUROPSICOPEDAGOGIA CLÍNICA
Elaboração
Luciana Raposo dos Santos Fernandes

Produção
Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração
SUMÁRIO

UNIDADE III
NEUROPSICOPEDAGOGIA CLÍNICA............................................................................................................................................... 5

CAPÍTULO 1
EQUIPE MULTIDISCIPLINAR E INCLUSÃO ........................................................................................................................... 6

CAPÍTULO 2
O PROCESSO DE AVALIAÇÃO NA INCLUSÃO.................................................................................................................. 11

CAPÍTULO 3
ALINHANDO A QUESTÃO DAS FÉRIAS E A ÉTICA PROFISSIONAL.......................................................................... 24

REFERÊNCIAS................................................................................................................................................30
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NEUROPSICOPEDAGOGIA
CLÍNICA
UNIDADE III

Em neuropsicopedagogia clínica, quando uma equipe multidisciplinar faz uma avaliação,


principalmente em casos de inclusão, a análise dos dados é interpretada por vários
profissionais, cada qual com a respectiva visão de sua área. Dessa forma, a qualidade das
hipóteses levantadas é potencializada e, ao término desse processo, graças aos resultados
obtidos, as conclusões referentes ao diagnóstico tornam-se mais precisas. Tal aspecto é
primordial para qualquer indivíduo, inclusive com patologia, mas quando seu potencial
é explorado de forma certa, ele é capaz de surpreender até quem não espera nada dele.

Além desse tópico, abordaremos também a ética profissional, item imprescindível para
quem quer se firmar e ser reconhecido no mercado; e as férias do profissional, afinal
como todo trabalhador, ele tem seu direito garantido, embora dependa de estratégias para
alinhar seus dias de folga com os pacientes que atende que, por sua vez, apresentam dois
tipos: os que entendem essa necessidade; e os demais que estabelecem uma dependência
nociva com a terapia.

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CAPÍTULO 1
EQUIPE MULTIDISCIPLINAR E INCLUSÃO

Devido à variedade de transtornos, problemas, síndromes e patologias, com uma


sintomatologia que varia em um mesmo indivíduo ao longo de seu desenvolvimento,
a intervenção do neuropsicopedagogo clínico preconiza atenção multidisciplinar,
envolvendo profissionais de diversas áreas, tais como:

» fonoaudiologia;

» pedagogia;

» psicologia;

» terapia ocupacional;

» medicina;

» fisioterapia;

» psicomotricidade;

» nutrição;

» educador físico;

» musicoterapia;

» psicopedagogia, entre outros.

Figura 7. Se a intervenção do neuropsicopedagogo clínico preconiza atenção multidisciplinar, ela


também envolve profissionais de diversas.

Fonte: https://www.labtestingmatters.org/home-page/improving-diagnosis-in-medicine-introduction-overview/.

É importante ressaltar que, para que se obtenham avanços, as atividades devem ocorrer
de preferência no ambiente de aprendizagem estruturado. Por se tratar de atendimentos

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aos mais variados quadros, o acompanhamento se configura de uma forma ampla,


personalizada e intensiva, que exige a troca constante entre a equipe multidisciplinar,
que deve estar integrada e constantemente atualizada.

As perturbações características da maioria dos indivíduos requerem profissionais


especializados para o atendimento, que tenham dedicação e sensibilidade, pois a
incapacidade de desenvolver relações interpessoais é também um fator impeditivo para
adesão de muitos indivíduos às intervenções terapêuticas. O profissional tem, desse
modo, de ser um especialista, cativar a atenção bem como desenvolver um vínculo com
o seu atendido, com a família, com a escola (coordenação acadêmica, professores etc.).

Assim, devemos assinalar que o atendimento realizado pelo neuropsicopedagogo clínico


é uma demanda crescente e, quanto mais o profissional investir em conhecimento
para atender às necessidades de seus atendidos, maior eficácia terá o seu trabalho e o
desenvolvimento desses indivíduos.

O quadro geral e os avanços em cada uma das intervenções são apresentados aos
membros da equipe multidisciplinar, que têm por hábito fornecer relatórios e pareceres
com certa frequência, trocando informações pertinentes entre si para implementar a
maior eficiência no tratamento. O médico neuropediatra, por exemplo, ao suspeitar
de um diagnóstico, irá seguir seu protocolo. Em paralelo, ele já encaminha o paciente
a uma psicóloga para que ela inicie a observação comportamental; a psicóloga, por
sua vez, pode notar a necessidade de um psicomotricista, pois a criança é não verbal;
a partir daí, o psicomotricista encaminha ao neuropsicopedagogo para que ele avalie
o funcionamento cerebral. E, assim, vai se construindo uma rede multidisciplinar no
atendimento. Quando esse atendimento não é adequado ou é feito com profissionais
não especializados, o quadro não será revertido, e ainda corre-se o risco de haver
uma piora nos aspectos comportamentais, psicológicos e emocionais do atendido.
Dessa forma, todos que compõem a equipe precisam ter especialização e sempre se
manterem atualizados em relação às pesquisas e estudos do meio científico.

Os principais objetivos do tratamento são: diminuir os sintomas comportamentais; ajudar


no desenvolvimento de funções atrasadas, ou que sejam rudimentares ou ausentes, como
a linguagem; e desenvolver o máximo de autonomia possível. Além dos tratamentos, é
importante assinalar o benefício dos esportes para o desenvolvimento das habilidades
em indivíduos com questões cerebrais, como natação, ginástica olímpica, entre outros.
Ressaltamos que tais atividades devem ser indicadas sempre pelo médico ou fisioterapeuta
que compõe a equipe multidisciplinar.

Como vimos no decorrer da nossa disciplina, na atuação do neuropsicopedagogo são


levados em consideração a sintomatologia apresentada e o grau de comprometimento

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em cada uma das áreas: comunicação, interação social, comportamento repetitivo e


restrito. A atuação das neurociências engloba, então, uma infinidade de problemas. Isso
representa que não se encontram duas pessoas com a mesma síndrome, transtorno ou
dificuldade de aprendizagem que se desenvolvam da mesma forma. Os comportamentos
inadequados refletem apenas a manifestação dos sintomas da psicopatologia e o resultado
de fatores, tais como:

» falta de tratamento específico;

» abordagens inadequadas;

» dificuldades sensoriais;

» inabilidade de comunicação e interação;

» dificuldade de compreensão do mundo à sua volta, do outro e de si mesmo;

» outras dificuldades e limitações inerentes à síndrome.

A equipe multidisciplinar avaliará cada um dos comportamentos ou sintomas de


acordo com a área em que se encontram. Sendo assim, cada profissional irá emitir seu
parecer a respeito da situação que o indivíduo apresenta antes do início da intervenção.
Pode parecer algo cansativo para os pais ou responsáveis o acúmulo de terapias, muitas
vezes em locais diferentes e que preenchem a semana, mas sem continuidade, o tratamento
é ineficiente. Exatamente por isso o quadro de terapias deve ser estruturado para não
sobrecarregar o indivíduo com vários tratamentos ao dia. Mesmo porque ainda há a
escola, no caso de crianças e adolescentes – e não podemos nos esquecer da Educação
de Jovens e Adultos (EJA), pois adultos também devem continuar a estudar.

Alerta sobre as terapias alternativas controversas


Levando-se em conta a complexidade das demandas relacionadas ao funcionamento
cerebral, seu aspecto crônico, a cura, o custo dos tratamentos multidisciplinares indicados
e os resultados que podem ser demorados devido ao grau do transtorno e da presença
de comorbidades, o progresso só é alcançado com bons profissionais, paciência, adesão
ao tratamento e muita repetição.

Crianças são extremamente visuais e, em tempos de aplicativos (APPs), a tecnologia


dos tablets e smartphones é um instrumento válido para o desenvolvimento cognitivo,
a comunicação e a parte sensorial das crianças. A maioria das crianças tem grande
facilidade em lidar com a tecnologia. Há uma relação interessante de aplicativos que
podem e devem ser utilizados em momentos específicos da avaliação ou intervenção,
inclusive como um reforço positivo (R+).

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Por meio da colaboração entre os profissionais da equipe, da troca e alinhamento


de estratégias, o indivíduo será mais bem atendido em suas necessidades. Toda a
contextualização de caso deve seguir um plano que se altera a cada nova habilidade
adquirida, o que inclui a escola, que também desenvolve planos individuais para atender
a cada indivíduo mediante suas capacidades e competências.

Atualmente, as próprias crianças e adolescentes já usam smartphones ou tablets para


fazer pesquisas, assistir a vídeos em canais de YouTube e baixar aplicativos com os
mais diversos jogos. Isso mostra a plasticidade neuronal em ação e a ativação de áreas
cerebrais que, por sua vez, criam novas sinapses, tanto que estudos nesse sentido
já demonstraram benefícios no processo de escolarização, inclusive de estudantes
com mais comprometimentos. Portanto, os profissionais da educação, além de ter
uma visão mais realista, devido aos desafios que emergem a todo instante, devem
partir para tentativas constituídas nessa mesma via.

Etapas da avaliação multidisciplinar


Tal investigação, minuciosa e completa, que tem como foco as funções cognitivas,
sensoriais, motoras, emocionais, comportamentais, sociais, de aprendizagem e linguagem
do paciente criança, adolescente ou adulto, normalmente têm quatro etapas. Observe:

1. Entrevista completa – ela acontece na consulta inicial e é um dos momentos


mais importantes do tratamento, pois os profissionais da equipe multidisciplinar
avaliam e mapeiam as possíveis causas da dificuldade no aprendizado a partir
do histórico familiar, médico e social do paciente, para trocarem informações,
emitirem opinião e decidirem qual caminho tomar em relação aos posicionamentos
relevantes no processo de análise e também no atendimento personalizado. É por
isso que, no caso da criança e do adolescente, essa entrevista sempre é feita com
pais ou responsáveis.

2. Avaliação multidisciplinar – nessa etapa, são realizados testes padronizados,


com os quais é possível identificar quaisquer comprometimentos psicológicos.
Portanto, esse tipo de avaliação pode auxiliar tanto no diagnóstico quanto na
tomada de decisão da equipe multidisciplinar que, quando bem fundamentada,
poderá planejar o tratamento adequado para as características de cada paciente.
Para tanto, são realizadas várias sessões de análise com o paciente e, se for o
caso, com seus pais e profissionais da escola, neuropediatra, fonoaudiólogo,
psicólogo, neuropsicólogo, psicomotricista, entre outros, como seria o caso
de um oftalmologista para detectar se o paciente sofre de Distúrbios de
Aprendizagem Relacionados à Visão (DARV). Ao mesmo tempo, são realizados
exames de audiometria, impedanciometria, processamento auditivo, screening

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(rastreamento de processamento virtual) e outros mais específicos de acordo


com o caso avaliado.

3. Diagnóstico – quando os resultados das sessões e dos exames são obtidos,


cada profissional da equipe multidisciplinar, de acordo com sua área de atuação,
estabelece parâmetros, faz indicações fundamentadas e assertivas para o caso e
informa aos demais colegas. Depois que esse processo termina, teoricamente, a
equipe multidisciplinar como um todo analisa os dados anteriormente levantados
e inicia a troca saberes para descobrir quais caraterísticas têm uma expressão
comum em todos os contextos, no intento de possibilitar o diagnóstico e definir
as intervenções clínicas necessárias as várias especialidades.

4. Tratamento – refere-se a última etapa que, embora tenha como base o diagnóstico,
varia de caso para caso.

Adendo imprescindível
Note que a avaliação multidisciplinar é um processo intenso, dinâmico e, ao mesmo
tempo, complexo, pois envolve muitas pessoas, além do paciente, bem como a natureza
do que está sendo avaliado. Como todo esse trabalho resulta em um grande conjunto de
dados, provenientes de vários contextos clínicos e de diferentes métodos, ele exige uma
apuração refinada de acordo que se pretende avaliar. Consequentemente, se, por um
lado, esse tipo de avaliação demora bastante tempo (a ponto de chegar aos 180 dias);
por outro, como a análise dos dados é interpretada por vários profissionais, cada qual
com seu respectivo prisma, as várias compreensões obtidas potencializam a qualidade
das hipóteses levantadas que, por sua vez, fogem do simples sistema de exclusão na
construção do diagnóstico. Ao término desse processo, o mais sensato seria os membros
da equipe multidisciplinar debatem as hipóteses pertinentes e os resultados obtidos,
para chegar a conclusões mais precisas no intento de fechar o diagnóstico.

Na avaliação multidisciplinar, há uma conjugação de conhecimentos que otimiza


tanto a resposta a ser dada em um processo de intervenção terapêutico quanto os
melhores resultados.

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CAPÍTULO 2
O PROCESSO DE AVALIAÇÃO NA INCLUSÃO

Quando nos referimos ao processo de aprendizagem, estão implícitas todas as formas de


conhecimento, não devemos nos limitar aos conhecimentos acadêmicos, mas acrescentar
conhecimentos da rotina, o chamado Treino de Habilidades Sociais (THS), que abrange,
inclusive, as ações de afeto e sentimentos, valores e regras.

Desse modo, a inclusão requer autocompreensão e autorreflexão do papel do educador


sobre sua constituição ética como sujeito de valor para, então, juntos elaborarem e
trabalharem dentro de uma abordagem de ensino individualizada que contemple aspectos
imprescindíveis perante as peculiaridades do sujeito. Mesmo sendo uma criança, o fator
biológico não pode ser o determinante para o seu desenvolvimento. Devemos olhar
além da patologia e também para o que o indivíduo pode oferecer, inclusive quando
ninguém espera nada dele. Portanto, incluir é, entre outros fatores, inserir a pessoa
no contexto social de forma digna, respeitando suas características e os preceitos dos
direitos humanos da Constituição Federal.

A escola que conhecemos teve seu modelo firmado no Ocidente, no século XVI, quando
o ensino começou a expandir-se para um maior número de aprendentes. Para avaliar o
que esse alunado aprendeu, veio junto a avaliação, o exame, a medição do conhecimento,
gerada com o objetivo diferenciar os que aprendiam daqueles que não aprendiam.
Hoje, ainda vivemos esse modelo de função seletiva e, por consequência, excludente da
avaliação. Vista dessa forma, a avaliação tem o objetivo de normatizar quem aprende.
Os que estão acima ou abaixo da média são os diferentes. De novo, a diferença batendo
à porta. Porém, as provas não provam muito! É possível estudar sem aprender.
Na verdade, o ato de estudar não fundamenta a capacidade de aprendizagem. Tanto que
é possível decorar uma matéria, tirar uma excelente nota e não fixar o conhecimento.

Figura 8. A inclusão requer do educador autocompreensão e autorreflexão perante as


peculiaridades do aluno.

Fonte: https://www.readingrockets.org/article/3-big-misconceptions-about-inclusion.

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O esperado para pessoas tanto neurotípicas quanto neuroatípicas é que haja a aprendizagem
e que esta se expanda: plasticidade cerebral! Quanto mais o indivíduo aprende, maior
o número de sinapses de qualidade, maior sua inserção no convívio social e maior o
domínio de habilidades necessárias.

A verdadeira função da avaliação, da prova, do exame e do teste, é garantir o sucesso


do processo educacional, assinalando os conteúdos que foram adquiridos e aqueles que
não foram. Como foi aprendido? Quais os entraves ao aprendizado? Qual a incerteza
na resposta? Desse modo, o professor/educador deve encarar a prática avaliativa como
uma ferramenta de feedback (retorno) sobre a forma como ensinou, como transmitiu
o conhecimento e como ele atingiu o seu aprendente.Ou seja, é sair totalmente da zona
de conforto, é pensar fora da caixa, é expor-se.

Muitos talvez não queiram isso. Daí as ansiedades, as incertezas, os receios do docente:
“eu posso demonstrar falhas?” Ora, como já dizia Paulo Freire, somos eternos aprendentes:
“Não existem medos na hora de doar seu conhecimento e de ter um retorno sobre como
os alunos compreendem ou não, aquilo que lhes é passado”.

Nesse movimento de reformulação, o processo de escolarização de pessoas com deficiência


tem produzido mudanças nas políticas públicas para que as salas de aula de ensino
regular representem o locus de aprendizagem e a produção de conhecimento para todos
os alunos. O ambiente escolar passou – ou teve que ser levado – a abranger os diferentes
modos de aprender, tornando-se fundamental.

A escolarização de crianças com neurodiversidade foi um campo marcado pelos diferentes


modos de compreender essas crianças, seu desenvolvimento e possibilidades educativas
perante cada abordagem. Historicamente, sabemos que a responsabilidade em escolarizar
as crianças neuroatípicas era destinada a instituições voltadas para a educação especial.

O atendimento a pessoas com deficiência nessas instituições baseava-se no modelo


clínico médico no qual o trabalho educativo estava centrado na deficiência do aluno,
visando corrigir ou amenizar os déficits, cristalizando a imagem da criança estranha ao
seu diagnóstico e determinando a incapacidade de aprender e se desenvolver.

O movimento de inclusão, a partir da segunda metade da década de 1980, favoreceu a


instituição de políticas que garantissem o acesso universal à educação. Assim, o acesso
de pessoas com deficiência à escola regular passou a ser garantido por meio de leis e
documentos no âmbito nacional, estadual e municipal.

Um tema de alta relevância para a neuropsicopedagogia é o surgimento do movimento


de inclusão, no cenário mundial e como ela tem sido trabalhada no contexto do nosso
país. Existem muitos desafios e caminhos a trilhar, mas o desenvolvimento do trabalho

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cotidiano com pessoas com alguma deficiência ou dificuldade de aprendizagem em salas


de aula do ensino regular é um fator essencial que precisa estar fundamentado em bases
sólidas, tanto teóricas quanto práticas. Só assim o diferente será integrado na sociedade
que o cerca. Note que o aluno aprende, com deficiência ou não, pois a aprendizagem é
característica do ser humano.

Ao analisamos o processo da educação na história universal, podemos observar evidências


de teorias e práticas segregadoras nas áreas sociais, culturais e pedagógicas, de modo que
a pedagogia da exclusão faz parte da história humana. É consenso o fato de que pessoas
com deficiência têm sido excluídas e segregadas de espaços comuns, principalmente na
área educacional. A proposta de educação inclusiva surge com o objetivo de reescrever
mais uma vez a história, rompendo com o quadro da exclusão e contribuindo para a
igualdade de oportunidade para todos.

Hoje, no Brasil, já se nota uma conscientização crescente nas áreas de políticas


públicas, médicas e pedagógicas sobre os aspectos educacionais e do aprendizado do
aluno neuroatípico. Nesse sentido, o suposto viés colaborativo facilita a superação
das desigualdades, diminuindo a exclusão dentro e fora da escola, e contribuiu com
o desenvolvimento do potencial, elevando a qualidade de vida. Nota-se, então, que o
desenvolvimento humano é caracterizado pela atividade mediada. A inserção da/na
cultura é um processo de dupla mediação (dos signos e do outro), que impulsiona o
desenvolvimento infantil.

A sociologia da infância
Ela concebe essa fase da vida como múltipla, pois, em uma mesma sociedade, existem
infâncias diversas. O modo como essas infâncias são produzidas está diretamente ligado
às relações sociais estabelecidas nas relações com o outro. A criança, ao internalizar
as formas de ação estabelecidas socialmente, para se relacionar com os objetos e com
os outros, as toma como suas em uma apropriação (ou leitura), o que transforma seus
processos biológicos, constituindo seu funcionamento interno. Desse modo, a criança
passa a dominar e utilizar os instrumentos e a linguagem de forma mais independente,
tornando-se capaz de regular seu comportamento e ação. Portanto, a participação do
outro no desenvolvimento infantil está diretamente relacionada com a interação e
realização de ações conjuntas com a criança, favorecendo (ou não) seu contato com a
coletividade do meio social.

Em condições concretas da vida, a posição social e o lugar da criança com autismo são,
muitas vezes, atravessados pela impossibilidade de participar de atividades tipicamente
infantis. Os comprometimentos nas áreas de interação social e linguagem fazem com

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que o processo de significação pelo contato com o outro seja marcado por desconforto
no processo interativo. Sendo assim, vários objetivos são alcançados na educação de
crianças com deficiência. Um deles é ensinar comportamentos que as crianças de
desenvolvimento normal aprendem por meio da interação com outras pessoas.

Linguagem, capacidade adaptativa


e responsabilidade social
Esses são alguns dos objetivos traçados e desenvolvidos com as crianças com
desenvolvimento deficitário e/ou atípico e que não fazem parte de um programa de
educação para crianças normais. Há aproximadamente duas décadas, a educação especial
vem alterando seu modelo de atuação com a ideia da educação inclusiva. As leis, os
avanços das pesquisas das ciências pedagógicas, da psicologia e a luta de várias áreas da
sociedade por direitos iguais proporcionaram modificações na educação especial, como
o princípio de mudança de paradigmas do modelo médico para o modelo educacional.

Para o aluno com dificuldade de aprendizagem e déficit de desenvolvimento, inicialmente,


o que importa não é tanto a capacidade acadêmica, mas a aquisição de habilidades
sociais e a autonomia. A atribuição do educador é a de promover e dispor de condições
educativas em um ambiente estruturado para que, assim, a pessoa autista não se torne
incapaz de realizar tarefas simples do cotidiano. Há, portanto, a necessidade de aprender
diversas atividades que ampliarão seu repertório de execução de tarefas, para tornar-se
mais independente ao longo de sua vida.

Desse modo, as atividades são escolhidas em razão de sua utilidade para a vida social.
Escovar os dentes, tomar banho, arrumar a cama, escolher roupas de acordo com o clima,
tomar banho, utilizar o banheiro, fazer suas refeições, vestir-se, são apenas algumas
das atividades que a criança precisa aprender ao longo do desenvolvimento. Mas, para
muitas delas, isso tudo pode representar um imenso desafio.

Incluir a criança com déficit no desenvolvimento vai além de colocá-la em uma escola
regular, em uma sala regular. É preciso proporcionar a ela aprendizagens significativas,
investindo em suas potencialidades, o que a torna um ser que aprende, pensa, sente,
participa de um grupo social e se desenvolve com e a partir dele, com singularidade.

A atitude mundial pela educação inclusiva


Trata-se de uma ação política, cultural, social e pedagógica, originada em defesa do
direito de todos os alunos de estarem juntos, aprendendo e crescendo sem nenhum tipo
de discriminação. A década de 1990 impulsionou o tema da inclusão com o discurso em

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defesa da Escola para Todos, originário do evento relacionado ao assunto ocorrido


em Jomtien, Tailândia (1990), onde estiveram reunidos representantes da educação
dos países da América Latina e do Caribe. Decorrente dos compromissos firmados pelos
governos presentes, aconteceu a Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas
Especiais, em Salamanca, Espanha (1994), e o Fórum Consultivo Mundial: Educação
para Todos: o Compromisso de Dakar, Senegal (2000).

Propósitos da educação inclusiva


No Brasil, a inclusão foi implementada nas escolas com princípios condutores no sentido
de assegurar o direito de todas as crianças, jovens e adultos à educação independentemente
de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas, dentre outras.
Nesse contexto, a escola inclusiva deveria assegurar a igualdade entre os educandos
diferentes, garantindo-lhes o direito à diferença na igualdade de direito à educação,
embora não seja o que realmente aconteça na maioria dos estabelecimentos educacionais.

Em grande parte das produções acadêmicas brasileiras em educação do século XX, a


concepção de neurodiversidade se encontrava vinculada às noções de desvio e anormalidade.
Para estabelecer um novo olhar para a criança com déficit de desenvolvimento e/ou
deficiência, seria preciso romper com essas concepções, construindo um olhar voltado
para as possibilidades.

A abordagem histórico-cultural de Vygotsky está baseada na participação do outro


na construção do sujeito em sua relação com o mundo por meio da ação mediadora.
Portanto, nenhum ser humano deve ser privado de se relacionar com outras pessoas, com
o ambiente onde as relações interpessoais são privilegiadas – esse é o melhor método e
o mais adequado de interação –, quer essa pessoa tenha, quer não alguma deficiência.
Como ainda indica Vygotsky, a educação da criança deficiente precisa superar uma
prática educacional baseada no déficit, nas impossibilidades e nas limitações em relação
ao que ela não pode ou não consegue fazer sozinha.

Diante da perspectiva histórico-cultural, devemos situar a criança no meio social a partir


de como ela é significada e constituída pelo outro sem desconsiderar suas especificidades,
mas levando em consideração essa criança como um sujeito que pensa, deseja, sente
e representa o mundo de uma maneira peculiar, interagindo com ele de outra forma.

Será por meio do processo de interação entre a criança e seus interlocutores que ocorrerá
a aquisição da linguagem em si, desenvolvendo, desse modo, sua capacidade de simbolizar
o mundo que a cerca para o outro, conferindo sentido aos processos de interação social e
para si, na forma internalizada necessária ao desenvolvimento das funções psicológicas
superiores.

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Na abordagem histórico-cultural, o educando é um sujeito ativo em seu processo de


formação e desenvolvimento intelectual, social e afetivo. O professor vai intermediar
e favorecer a inter-relação do encontro/desencontro entre o sujeito, o aluno e o objeto
do seu conhecimento, que é o conteúdo escolar.

O ensino deve ser compreendido como uma intervenção repleta de intencionalidade,


voltada para os processos intelectuais, sociais e afetivos do aluno, visando à construção
do conhecimento por parte dele, sendo ele o centro do ensino, o sujeito ativo do processo.
Em relação ao autista, por exemplo, nada muda.

O processo de ensino-aprendizagem irá contemplar, necessariamente, uma criteriosa


relação entre mediação pedagógica, cotidiano e formação de conceitos. Todos esses
elementos irão favorecer a internalização do que está sendo vivenciado.

Educadores, professores e mediadores devem explorar a sensibilidade do diferente para


entender como o autista percebe o mundo que o rodeia, como assimila aquilo que lhe
é passado dentro do ambiente educacional, as formas de atingir esse aluno e despertar
seu interesse. O letramento, a alfabetização, a interpretação de textos são possíveis.
E para mais além, a graduação, a pós-graduação e PhD. Afinal, o diferente não é incapaz.

Devemos repensar os conceitos sobre os transtornos do funcionamento cerebral.


E esses conceitos mudam numa velocidade surpreendente. Costumamos comparar o
desenvolvimento de teorias sobre o funcionamento neural com uma esteira rolante
cujo ritmo aumenta a cada dia. Para caminhar nela, temos de buscar o subsídio
concreto. Portanto, para os profissionais que trabalham ou pretendem trabalhar
com neuropsicopedagogia, essa esteira são as pesquisas, enquanto que o ritmo dela
é a capacitação. Não somos obrigados a dominar tudo, dizem alguns. Porém, como
profissionais e, na maior parte das vezes, os únicos a quem os pais irão recorrer, temos
de estar o mais atualizados possível sobre a demanda que vamos atender.

O tema é vasto. Assemelha-se a um labirinto, mas é fascinante. Todos têm o direito de se


desenvolver plenamente. A visão de que autistas não são capazes é um preconceito e uma
negação de seu potencial, pois, por meio do acesso ao contato adequado com o outro e
de uma orientação pedagógica adequada, estruturada e organizada, o desenvolvimento
poderá ocorrer normalmente.

O educando é uma pessoa que deve ser respeitada em seus limites. Desse modo, a
linguagem adentra todas as áreas de seu desenvolvimento, guiando sua percepção sobre
todas as coisas e o mundo no qual está inserido.

Será por meio da linguagem que o aluno absorverá transformações em seu campo de
atenção, aprendendo a diferenciar um determinado objeto de outros existentes, bem
como desenvolver ferramentas internas para integrar essas informações.

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O documento Saberes e Práticas da Inclusão, do Ministério da Educação, reforça o


pensamento do Professor Luckesi sobre a necessidade de revermos as práticas avaliativas,
haja vista que continuam sendo tradicionais, normativas, padronizadas e classificatórias.
O documento ao se referir a alunos com alguma deficiência, afirma ainda que a avaliação
deve estar a serviço da criação de apoios ao progresso e ao sucesso de todos. Ou seja, a
avaliação deve ser uma continuação da prática pedagógica, e não uma função controladora
e excludente.

A avaliação como meio de diagnóstico


Com o viés de aprendizagem inclusiva e dialógica, a avaliação é uma ação objetiva para
compreender o comportamento do aprendente diante de instrumentos de ensino e
aprendizagem. Portanto, a avaliação não pode ser tratada apenas como um modo de
acompanhar o resultado. Ao contrário disso, deve ser um meio eficiente para o professor
seguir todos os caminhos percorridos na construção do conhecimento, pois, nesse caso,
a avaliação será um meio de verificar quais as habilidades e competências os alunos
conquistaram. Nesse âmbito, a avaliação serve como uma forma de compreensão
das dificuldades dos educandos e do estabelecimento de novas oportunidades de
conhecimento. Com esse pensamento sobre a avaliação, podemos abraçar todos os alunos
e suas dificuldades ou deficiências, conduzindo o processo educacional à realização da
verdadeira inclusão.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCVs) são referência para os ensinos fundamental


e médio de todo o país, pois abrem caminho quando trazem a possibilidade de avaliar o
aluno em sua particularidade, uma vez que o mesmo documento afirma que a avaliação das
aprendizagens só pode acontecer se forem relacionadas com as oportunidades oferecidas,
isto é, analisando a adequação das situações didáticas propostas aos conhecimentos
prévios dos alunos e aos desafios que eles têm condições de enfrentar. Considerando
as peculiaridades, cada aprendente pode alcançar habilidades necessárias à vida diária.
Assim, o ensino inclusivo faz-se a partir da consciência de pais, professores, mediadores
e profissionais que compõem a equipe multidisciplinar.

Pela necessidade de compreensão conceitual e relacional, a escola deve reconhecer


os inúmeros desafios que terá de enfrentar, no sentido de se apropriar de situações
diversas do seu alunado, tendo em vista a pluralidade cultural que o compõe, além da
multiplicidade e diversidade neurológica daqueles que a frequentam. Nesse sentido,
cabe à escola acompanhar e observar a vivência escolar na diversidade, reconhecer
e oferecer o exercício das relações entre as pessoas que vivem e transitam no espaço
escolar, tendo em vista ser esse o local de múltiplas relações sociais. Percebemos isso
diante das recomendações para que seja priorizado um currículo adequado à promoção

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da cidadania, no qual a diversidade conquiste e garanta espaço e significado especiais,


mantendo o aluno na conveniência democrática e no aprendizado entre diferentes
grupos e comunidades.

Inclusão vem do latim includere, que significa fazer parte de ou participar de. Assim, falar
em inclusão escolar é falar do educando que está na escola, participando daquilo que
o sistema educacional oferece e interagindo, contribuindo com seu potencial para os
projetos e programas desenvolvidos nesse espaço. Apesar disso, ainda vivemos um
tempo de mudanças em que os antigos paradigmas estão sendo quebrados e a educação
escolar tenta passar por uma reinterpretação na busca de caminhos para a inclusão.

Avaliação inclusiva
A avaliação tradicional, além de antiquada para o século XXI, não é um método inclusivo,
principalmente porque ela não está associada com a atenção diversificada nem com
a adaptação do currículo às diferenças características e necessidades educativas de
cada aluno. Se a prova do aluno é sobre matemática, por exemplo, o professor deve se
concentrar em avaliar a capacidade matemática dele. Porém, a leitura dos enunciados das
questões pode ser um desafio muito grande para o aluno com necessidades específicas.
Logo, a leitura e a interpretação pode não ser o objetivo final da avaliação, a não ser,
é claro, que seja uma avaliação de interpretação de textos. Portanto, se queremos ter
uma avaliação inclusiva, devemos apresentar ao aluno a menor porção possível de
conteúdo, mas com o máximo de significado para ele. Como? Eliminando todos os
obstáculos em relação às necessidades específicas desse aluno. Observe os exemplos
seguintes:

» Aluno com deficiência intelectual – se ele possuir algum déficit cognitivo, o


ideal é diminuir o nível de abstração, utilizando, por exemplo, ilustrações e objetos
concretos ao invés de texto. No caso das formas geométricas, por exemplo, oferecer
os objetos concretos para o aluno associá-los às respectivas palavras. Dessa forma,
além de diminuir os obstáculos impostos pela interpretação e abstração, torna
possível focar apenas no conteúdo que se quer avaliar.

» Aluno com deficiência visual – a melhor opção é diminuir a quantidade de


informação que deve ser processada, no intento de obter uma resposta em partes.
Uma pergunta maior, por exemplo, pode ser dividida em três menores. Mesmo
quando o aluno lê em Braille, também deveria haver um leitor ao seu lado, para
comunicar o enunciado da questão de português, matemática, história, entre
outros, quando necessário. Somente quando a prova for de leitura de Braille, o
leitor é dispensável.

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neuropsicopedagogia clínicA | UNIDADE III

» Aluno surdo – normalmente, os surdos se comunicam pela LIBRAS, mas,


caso a prova não seja de língua portuguesa, é um direito deles ter um intérprete
de linguagem de sinais para auxiliá-los em todas as questões. Além disso, vale a
mesma dica de diminuir o tamanho das perguntas, fazendo indagações menores,
processo que serve não somente para LIBRAS, mas para o Braille e a comunicação
alternativa.

Ajuda total, leve ou sem ajuda


Embora seja possível instigar o aluno com deficiência a responder corretamente as
atividades e avaliações, no caso dos autistas, vamos recorrer ao método ABA (terapia
comportamental centrada no treinamento de condutas, que pode ser feita em casa ou
por terapeutas e funciona com a determinação de um desafio e de seu cumprimento
a partir da ajuda total, leve ou sem ajuda, seguido de um reforço) para exemplificar
os níveis de ajuda em uma avaliação inclusiva. Em sala de aula, é aceitável entregar
a prova sem ajuda, tentar uma ajuda leve em algum momento ou ainda a ajuda total,
desde que qualquer ajuda dada seja documentada com a avaliação, para que essa mesma
avaliação possa ser repetida, se necessário, com menos ajuda posteriormente, após uma
complementação pedagógica do conteúdo que deve ser aprendido.

Note que, no começo de qualquer aprendizagem, o conteúdo não será bem compreendido.
Portanto, ele precisa ser revisto por várias vezes para não ser esquecido. Se isso não foi
feito antes da avaliação, fica difícil para qualquer aluno, principalmente para os que
apresentam dificuldades. Além disso, também é preciso considerar que a avaliação
é um processo complexo que mexe com a autoestima das pessoas, já que influencia e
altera a percepção da autoimagem delas, o que repercute no decurso da aprendizagem,
ao aumentar tanto a responsabilidade quanto a necessidade de um trabalho afetivo,
o que implica a criação de vínculos, a empatia e a confiança, aspectos que devem ser
aprendidos pelo aluno e que ampliam as chances de êxito na esfera educativa. Portanto,
no caso dos alunos com necessidades especiais, o ideal é aplicar uma avaliação para cada
conteúdo, depois de repeti-lo e exercitá-lo por várias vezes.

Ensino colaborativo e ensino cooperativo


Ambos os termos são utilizados pela literatura estrangeira para definir a parceria entre
professores da educação especial e da regular. O ensino colaborativo mostrou-se um
poderoso instrumento para facilitar parcerias promissoras entre escolas especiais e
regulares, entre professores, diretores, professores especialistas, mediadores, enfim,
toda a equipe escolar, que deve negociar papéis e responsabilidades.

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UNIDADE III | neuropsicopedagogia clínicA

Um estudo brasileiro realizado por Capellini (2001) mostra a importância da colaboração


e da cooperação entre a educação especial e a regular, além de sinalizar a importância
de o professor também estar inserido na equipe multiprofissional. Dessa forma, a
inclusão aumenta as chances de o aluno ter seus direitos respeitados e contribui com o
aproveitamento no processo ensino-aprendizagem.

Deste modo, a inclusão é uma das possibilidades de apoio à família e à inserção do


indivíduo com autismo no ambiente escolar, com a oportunidade de desenvolver
habilidades acadêmicas e inserir-se na comunidade. Não é à toa que os cursos de formação
de professores deveriam incorporar conhecimentos que contemplem o entendimento
dos quadros psicopatológicos, afinal, a escola faz parte da equipe multidisciplinar que
atenderá ao paciente, apesar de nem sempre isso acontecer conforme dita a teoria.
Portanto, devemos ressaltar a importância da consultoria com um psicólogo da abordagem
cognitivo-comportamental (TCC) para que as técnicas específicas sejam empregadas no
ensino de pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD), pois ela pode
oferecer um suporte com base na avaliação comportamental, consultoria comportamental
e treinamento. A consultoria comportamental, por exemplo, abrange quatro estágios:

1. identificação do problema;

2. análise do problema;

3. implementação do plano;

4. evolução do problema.

Tabela 6. Estratégias de ensino.

1 Devem ser estruturadas e baseadas nos conhecimentos desenvolvidos pelas modificações de conduta.
2 Devem ser evolutivas e adaptadas às características pessoais dos alunos.
3 Devem ser funcionais e com uma definição explícita de sistemas para a generalização.
4 Devem envolver a família e a comunidade.
5 Devem ser intensivas e precoces.
Fonte: Acervo pessoal.

Na fase final de planejar as estratégias de ensino para alunos com déficit de desenvolvimento,
é fundamental conhecer o processo de aprendizagem sem erros, pois esse método
apresenta maior eficácia que a aprendizagem por tentativa e erro.

Tabela 7. Normas de aprendizagem sem erro.

1 Assegurar a motivação.
2 Apresentar as tarefas somente quando a criança atende e de forma clara.

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neuropsicopedagogia clínicA | UNIDADE III

Apresentar tarefas cujos requisitos já foram adquiridos antes e que se adaptaram


3
tanto no nível evolutivo quanto na capacidade da criança.
4 Empregar procedimentos de apoio.
5 Proporcionar reforçadores contingentes, imediatos e potentes.
Fonte: Acervo pessoal.

O planejamento do processo educativo é bastante amplo e deve passar pela abrangência


curricular, tendo como base os diferentes níveis em que os alunos se encontram.
Para que isso ocorra no processo educativo, o professor deve responder a algumas
perguntas a fim de que possa contemplar a diversidade:

1. O que ensinar?

2. Quando ensinar?

3. Como ensinar?

4. O que, como e quando avaliar?

O aprendizado e o desenvolvimento são processos que se relacionam desde o início da


vida da criança, contudo, a aprendizagem escolar difere da aprendizagem espontânea
e cotidiana, não apenas pela sistematicidade, mas também pelo que ela produz de
novo no repertório de desenvolvimento infantil. É notório que os alunos chegam à
sala de aula trazendo consigo uma série de conceitos sobre o mundo físico e social,
que servem de base para a aquisição de novos conhecimentos estabelecidos no
currículo escolar. Mas o professor deve estar preparado para individualizar o aluno,
identificar possíveis distúrbios no processo de aprendizagem, enfocando aspectos
orgânicos, afetivos e pedagógicos, durante o processo. Para que essa etapa ocorra
de forma bem-sucedida, ele precisa contar com o apoio do orientador educacional,
cujo saber mais elaborado na área da aprendizagem pode fornecer subsídios para a
ação didática.

A inclusão requer do professor muito empenho, mas as parcerias auxiliam-no, para


que a inclusão não seja alvo de temor. Contudo, ele ainda deve rever crenças, postura e
perceber-se como um ser incompleto – como somos todos nós –, sem que isso o diminua
a estar aberto para a relação dialética entre a teoria e a prática.

Consequentemente, o docente necessita ver-se como o outro na mediação pedagógica,


para reforçar as potencialidades do seu educando com autismo, de modo que se possibilite
a ele uma vivência significativa da linguagem. Sendo assim, o professor, em sua relação
com a pessoa com autismo, pode e deve auxiliá-la a realizar atividades que ainda não
faz sozinha, investindo para que futuramente possa vir a realizá-las de forma autônoma.

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UNIDADE III | neuropsicopedagogia clínicA

Ao pensarmos em nossos atendidos e em como criar zonas de desenvolvimento, temos


de ser realistas sempre, pois haverá conflitos nessas relações de complementariedade
entre o eu e o outro. Não há, por exemplo, como prever quando os avanços vão se
concretizar, pois o desenvolvimento não se consolida no momento da atividade realizada
e as respostas não são imediatas, necessitando de um maior investimento do adulto
que irá administrar as frustrações e as resistências. Para tanto, é preciso estar em
sintonia e atento às pistas e aos indícios de mudanças que ocorrem no desenvolvimento,
que se efetivam de modo não linear e não progressivo, mas que evidenciam otimismo
para o futuro.

Segundo Vygotsky (1984), “nós nos tornamos nós mesmos através dos outros”. O
encontro entre professores e alunos com autismo precisa ser potencializado para que a
relação estabelecida possibilite tanto o desenvolvimento da criança quanto a mudança
no docente. Note que o trabalho pedagógico não é produzido única e exclusivamente
pelo professor que ensina e nem apenas pelo aluno que aprende. O ensinar e o aprender
são produzidos na relação entre os alunos e o professor. Um trabalho se constitui em
relação ao outro.

Essa constituição mútua entre o que ensina e aquele que aprende, ou o investir nas
possibilidades de desenvolvimento, implica uma aposta no fazer pedagógico dos
professores como facilitadores de um processo intencional, sistemático e planejado
que irá ampliar as oportunidades de interação do aluno com o mundo. Portanto, para
que o aprendente saia de seu universo pessoal de existência de forma equilibrada, sem
o egocentrismo característico da infância, é necessária uma instituição que o socialize, o
prepare para conviver em uma sociedade em que o coletivo se sobrepõe ao eu. Assim, a
escola ganha uma dimensão macro na vida do indivíduo, pois será no espaço educacional
que o comportamental, até mais que o cognitivo, será trabalhado. É na escola ainda que
se desenvolve o senso crítico, a observação e o reconhecimento do outro em todas as
suas dimensões.

Para tanto, a Constituição Federal ratifica a importância do acesso à educação formal


como um dever do Estado para que todos possam ter acesso à escola, cujo compromisso
primordial e insubstituível é o de introduzir o aluno, independentemente de sua condição
neurológica, no mundo social, cultural e científico. Consequentemente, algumas questões
devem ser consideradas para evitar a falha na comunicação com o atendido:

» Enquadramento: ao se fazer a anamnese, já é colocado o serviço que deve


ser oferecido. Alguns profissionais chegam a redigir um texto para que o cliente
leia, tome ciência e assine, no intento de evitar aquela história de “eu não sabia
disso”. Além dos valores, no enquadre deve entrar as reposições de sessões, desde
que com atestado médico, por exemplo; o uso de Whatsapp em uma situação de

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neuropsicopedagogia clínicA | UNIDADE III

emergência; além de explicações sobre atrasos que não serão compensados; entre
outros detalhes que devem ficar claros desde o inicio.

» Tempo: a duração das sessões.

» Abordagem: explicar sobre a linha psicológica que será adotada.

A questão da divulgação dos serviços profissionais deve ser pensada também. Hoje a
rede social cumpre bem esse papel e ajuda o profissional a falar sobre sua área e temas
que aborda. No entanto, o marketing deve ser honesto e ético. Somos profissionais
especializados, com um registro no Conselho, atendemos em tal horário e o endereço é
tal. É assim que se inicia. Nossos primeiros passos ocorrem dessa forma. Por fim, ainda
cabe ao profissional se questionar se o consultório é para satisfazer uma questão de ego
ou para atender a um fluxo de pacientes.

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CAPÍTULO 3
ALINHANDO A QUESTÃO DAS FÉRIAS
E A ÉTICA PROFISSIONAL

Ao falar sobre ética, é interessante iniciar por moral. O que é moral? São costumes e
valores passados de geração a geração. Aprendemos, por exemplo, com nossos pais
a noção do certo e do errado. Questão bem profunda quando começamos a pensar
que esses valores estão ligados a vivências e a construções sociais e antropológicas.
Friedrich Nietzsche ([1887] 2013) em sua obra “Genealogia da moral” traz duas
aplicações para que a moral tenha se originado: a primeira por aquilo que é útil, ou
seja, as ações altruístas que foram louvadas e reputadas boas por aqueles a quem
eram úteis. Entretanto, a origem de tais ações acaba por ser esquecida, adquirindo
ações altruístas através do costume da linguagem, como se as coisas fossem boas em
si mesmas.

Já a segunda aplicação invoca uma fala da Genealogia da Moral de Nietzsche: não há


nada que seja bom em si mesmo. Dessa maneira, o filósofo faz um corte com a metafísica
e com o cristianismo. Além disso, ele defende que a moral deve nascer imparcialmente,
tanto que, à época dele, não havia a necessidade de se levar em consideração os valores
trazidos pela classe dos sacerdotes tampouco pela classe dos nobres.

Partindo daí, a ética começa a ser construída quando começamos a refletir sobre
esses costumes, crenças, valores e, assim, precisamos encontrar parâmetros para
aplicá-los em nosso cotidiano. Ética é vida. Ela não se estabelece apenas em uma
área, mas em todas as vertentes de nossa atuação como seres humanos que vivem em
sociedade.

Mas o que é a ética dentro da neuropsicopedagogia? Como não há um manual, com


tudo determinado e alinhado sobre como devemos agir, ela é ampla, um norte ou
um guia para determinadas situações que nos remete a atuação. Note que a questão
da ética é extremamente séria diante de pessoas fragilizadas, com suas demandas
pessoais. Há também a questão do sigilo, que pode ser quebrado somente em
determinadas situações. No entanto, em tempos de redes sociais, as questões estão
muito misturadas, e como a relação torna-se muitas vezes próxima demais, os papéis
não podem ser confundidos, pois o vínculo é terapêutico; e, no momento em que se
sente que esses limites estão desaparecendo, é hora de abordar essa questão com o
atendido e encaminhá-lo a outro profissional. Além disso, ser atendido nas redes
sociais dá margem a uma leitura de que o cliente agora é amigo, o que é altamente
prejudicial ao processo terapêutico.

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neuropsicopedagogia clínicA | UNIDADE III

Figura 9. Como todo e qualquer profissional, além de exercer a ética, o terapeuta também tem
direito a férias, e o paciente deve ser conscientizado desse fato.

Fonte: https://lifeandmind.com.au/uses-and-benefits-of-acceptance-and-commitment-therapy/.

O Código de Ética do Profissional Psicólogo (2005)


Com um total de 22 artigos, ele se pauta em alguns princípios, dentre os quais destacamos:

1. proteção aos direitos fundamentais do ser humano;

2. promoção da saúde e qualidade de vida da população;

3. responsabilidade social;

4. aprimoramento contínuo (nós psicólogos devemos sempre aprimorar nosso


conhecimento e a nossa técnica como ciência);

5. acesso à população acerca de informações da ciência psicológica;

6. posicionamento crítico em relação às nossas atitudes.

Note que ler o código é um exercício diário (tanto para recém-formados quanto para
os profissionais graduados há mais tempo), de proteção para profissionais. Ao mesmo
tempo, ele assegura maior proatividade na tomada de determinadas decisões.

Sobre as férias do terapeuta


Como todo e qualquer profissional, o terapeuta também precisa de férias. Mas para
não deixar o atendido sem apoio, ele deve pensar em um plano de contingência e avisar
com antecedência por quanto tempo vai se ausentar, preferencialmente durante as
sessões, para não despertar sensações de abandono, rejeição, insegurança, frustração e
até lembranças de traumas antigos – inclusive é possível criar um objeto de transição,

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UNIDADE III | neuropsicopedagogia clínicA

como um bilhete escrito ou gravações no YouTube, respectivamente com a letra e a voz


do terapeuta, ou até emprestar um bichinho de pelúcia da clínica para que o paciente
tenha uma lembrança do período compartilhado na terapia.

É essencial também criar uma lista com ferramentas e recursos psicológicos, além
de uma rede de amigos que possam oferecer apoio ao atendido, que deve praticar o
autocuidado, a compaixão e nutrir-se durante a ausência do terapeuta, usando técnicas
de relaxamento, sessões de meditação, afirmações positivas, caminhadas ou praticar
exercícios regularmente.

Dependendo do caso, o terapeuta ainda pode pesquisar ou sugerir tanto opções de terapia
em grupo quanto manutenção de um diário do progresso, para discutir na primeira sessão
após as férias. No entanto, se ele perceber que isso não é suficiente para o paciente,
deve indicar outro profissional para atendê-lo, caso seja necessário. Para tanto, cabe ao
terapeuta compartilhar o histórico do atendido e, em seguida, entrar em contato com
ele para informá-lo a quem deve recorrer. É extremamente importante que o paciente
saiba que, embora seu terapeuta esteja em férias, ele continuará sendo bem cuidado.

Note que, quando o paciente sempre espera ansiosamente o dia da terapia, e a ausência
do terapeuta (mesmo que breve) se torna um motivo para que ele entre em pânico ou
lhe cause um grande desconforto, o profissional deve rever alguns conceitos, pois algo
não está indo bem com o atendido, com o próprio terapeuta ou com a terapia em si.

Portanto, tal condição não implica um forte vínculo entre profissional e paciente, pois
quando o processo terapêutico é bem conduzido, ele não deve gerar dificuldades no caso
de alguma interrupção – se o paciente, por exemplo, desenvolve raiva ou agressividade,
certamente ele está mantendo uma relação patológica com o terapeuta que, por sua vez,
é denominada de dependência nociva da terapia. Consequentemente, quando a terapia
é interrompida, o que se espera é que o atendido sinta apenas um leve sentimento de
abandono, o que se explica pelo fato de o terapeuta exercer o papel de uma espécie de
ponte para auxiliá-lo. Nesse contexto, a interrupção é sempre útil para que o paciente
lembre que o terapeuta é um ser humano independente e com vida própria.

Casos em que o paciente reconhece a importância do terapeuta


» J., mulher de 30 anos, acostumada com duas sessões de terapia por semana há
mais de dois anos, diz que se sente tanto insegurança quanto saudade quando seu
atendimento é interrompido, devido à ausência temporária do terapeuta. Mas, ao
mesmo tempo, ela também acha bom que isso aconteça, porque seus sentimentos
indicam que a terapia está realmente funcionando e o contato com o terapeuta faz
parte da sua vida mental e emocional.

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neuropsicopedagogia clínicA | UNIDADE III

» T., homem de 44 anos, frequenta a terapia há três anos, diz que, nas férias do
terapeuta, sente muita falta dele, como sentiria de um amigo que está longe.
Porém, no caso do profissional, ele reconhece que se trata da única pessoa com
quem troca ideias sem medo de julgamento e que o fez refletir, a partir de novas
perspectivas, sobre a vida.

Em ambos os casos, a interrupção do processo terapêutico despertou nos pacientes o


reconhecimento e a valorização do terapeuta.

Caso de dependência nociva da terapia

Até os 23 anos, A. era uma jovem bonita que se dizia livre para fazer as próprias escolhas.
Aparentemente feliz com os planos de casamento que fazia com o noivo, ela acabou
sufocando o moço ao depositar uma grande responsabilidade sobre sua vida nas mãos
dele. Ao perceber que o relacionamento que tinham não era saudável, ele rompeu o
compromisso e A., alegando um profundo sofrimento, começou a se sentir insegura e
carente em relação à opinião de outras pessoas. Para tomar qualquer decisão, ela sempre
precisava de aprovação para se sentir confortável.

Aconselhada por amigos, procurou ajuda terapêutica, mas, ao mesmo tempo, ela se
entusiasmou com a figura do profissional pouco experimente que, ao acolhê-la nas
sessões terapêuticas, a fez se lançar tanto na projeção quanto na transferência com
certo exagero. Embora ele fosse homossexual e tivesse um relacionamento, A. o via
como o homem perfeito, que poderia cercá-la de atenção. Em consequência, além de
frequentar as duas sessões semanais, o adicionou nas redes sociais e todo dia tinha algo
para conversar, em um claro sinal de dependência.

Demorou mais de dois meses, porém o profissional percebeu que a relação com a paciente
extrapolava os parâmetros necessários. Ele começou a se restringir na comunicação com
A., que insistia em se manter próxima a ele. Porém, quando o terapeuta avisou que iria
ficar um mês fora, ela lhe perguntou se ele iria acompanhado. O profissional prontamente
disse que sim e, sem dar maiores explicações, começou a apresentar alternativas para
que ela se cuidasse nesse breve intervalo de tempo. Em resposta, A. começou a chorar
e dizer que ele não se importava com ela. Alterando-se cada vez mais, ela começou a
gritar que não poderia ficar longe dele. Apesar da situação insustentável, com paciência
e profissionalismo, o terapeuta explicou que tinha vida pessoal tanto quanto ela, o que
não foi suficiente, pois a moça se revoltou ainda mais, a ponto de dizer que iria colocar
um fim a própria vida, porque estava cansada de sofrimentos.

Embora a percepção do profissional tenha sido a de um exagero característico do


dependente emocional, diante dessa condição, ele procurou um terapeuta conhecido e

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UNIDADE III | neuropsicopedagogia clínicA

explicou a situação, pedindo que assumisse o caso, porque ainda não podia dar alta nem
deixar A. sem apoio. Quando ela foi informada sobre a decisão que o terapeuta tomou, a
raiva veio à tona e, de forma grosseira, disse que não precisava mais dele nem de ajuda
de ninguém. Diante da recusa, o terapeuta saiu de férias e ela continuou insistindo em
manter o contato pelas redes sociais. Sem obter nenhum retorno, após ser excluída de
todas as redes, A. percebeu que estava sendo ignorada e nunca mais voltou no consultório
dele nem no do profissional indicado.

De certa forma, o que fica evidente nesse caso era que a dependência emocional de A.
havia se desenvolvido ainda na infância dela, devido aos pais que poderiam ter sido
orgulhosos, distantes demais ou tinham um funcionamento emocional disfuncional. Tais
assuntos nunca foram abordados nas sessões terapêuticas, mas, em um ambiente assim,
a criança sempre se esforça ao máximo para ter uma atenção positiva e a aprovação dos
pais, o que raramente acontece. Supondo que essa foi a situação vivida por A., é quase
certo que ela desenvolveu um falso ego e começou a propagar uma suposta liberdade que
nunca foi real, tanto que, ao passar uma pseudoimagem, ela conseguia se relacionar com
pessoas interessantes que, aos poucos, sentiram que apenas estavam sendo sugadas pelas
chantagens, mentiras e exigências da moça, cujo único propósito era ganhar aprovação
e se sentir querida, devido a baixa autoestima. Em consequência, elas se afastavam,
deixando A. mais insegura, com raiva e sentindo mais sozinha.

Aqui é conveniente notar que o dependente emocional tem tendência a não acreditar no
próprio potencial e nas suas ideias, o que transparece no dia a dia. Porém, na escola, na
faculdade, no ambiente familiar ou social e no trabalho, ele pode parecer excessivamente
autocrítico e, ao mesmo tempo, gentil demais com outras pessoas. Mas ele também
costuma ser muito emocional, tanto que reage de maneira desproporcional a situações
que poderiam ser contornadas com tranquilidade pela grande maioria dos indivíduos.
Além disso, frequentemente, ele passa a impressão nítida de que não mais conseguirá
viver caso seus relacionamentos cheguem ao fim, independentemente se são pessoais,
profissionais ou até terapêuticos. O caso de A. exemplifica bem essa situação. Portanto,
quem é dependente emocional ou convive com um deles deve procurar um psicólogo
assim que detectar tal situação, pois, conforme o transtorno evolui, o indivíduo afetado
tende a se tornar bastante agressivo, a ponto de destruir a qualidade de vida de todas
as pessoas ao seu redor e ainda criar outros transtornos.

“Amar ou depender? ” Muito se fala sobre o lado cor-de-rosa do amor, mas


poucos têm coragem de expor o lado sombrio de uma paixão, momento
em que, quando o que deveria gerar alegria e prazer, transforma-se em
uma fonte de sofrimento e dano à autoestima. Reconhecer o limite entre
o suposto amor e a dependência afetiva, entretanto, nem sempre é fácil.

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neuropsicopedagogia clínicA | UNIDADE III

Mas o psicólogo Walter Riso mostra os principais problemas atrelados ao apego


excessivo e ensina que a cura não só existe como está ao alcance de todos.
Especialista em terapia cognitiva, ele traduz conceitos científicos para uma linguagem
simples, clara e direta, fazendo do seu livro um guia para os primeiros passos em
direção a uma vida amorosa saudável, plena e feliz. Afinal, depender da pessoa que
se ama é uma maneira de se enterrar em vida, um ato de automutilação psicológica
em que o amor próprio, o autorrespeito e a essência individual são oferecidos
irracionalmente. Quando a dependência está presente, entregar-se, mais do que um
ato de carinho desinteressado e generoso, é uma forma de capitulação, uma rendição
conduzida pelo medo, com a finalidade de preservar as coisas boas que a relação
oferece. Se por um lado, sob o disfarce de amor romântico, a pessoa dependente
afetiva começa a sofrer uma despersonalização lenta e implacável até se transformar
em um anexo da pessoa amada, ou um simples apêndice dela, por outro, quando
a dependência é mútua, o enredo é funesto e tragicômico: “se um espirra, o outro
assua o nariz, ou numa descrição igualmente doentia, se um sente frio, o outro coloca
o casaco”, enfatiza o autor. Publicado pela Editora L&PM.

29
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Figura 6: https://shegzsablezs.blogspot.com/2019/11/sigmund-freud-and-unconscious-mental.html.

Figura 7: https://www.labtestingmatters.org/home-page/improving-diagnosis-in-medicine-introduction-
overview/.

Figura 8: https://www.readingrockets.org/article/3-big-misconceptions-about-inclusion.

Figura 9: https://lifeandmind.com.au/uses-and-benefits-of-acceptance-and-commitment-therapy/.

Figura 10: https://www.onbundock.com.au/news/educational-assessments.

Figura 11: https://turningpnt.org/.

Figura 12: https://vidapsychotherapy.com/couples-therapy/.

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