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Armazenando qualidade

Etapas de secagem e estocagem devem ser conduzidas com rigor para manter
características obtidas pelo açúcar na fase de fabricação
Divulgação/São Martinho

Fábrica de açúcar: usinas hoje são indústrias de alimentos

Não se produz mais açúcar como antigamente. O aumento das exigências dos clientes
nacionais e externos provocou a necessidade de grandes mudanças na fabricação nos
últimos 10 anos. Hoje a preocupação com a qualidade não termina quando o produto
está acabado. É preciso investir em recursos industriais para a manutenção do padrão
nas etapas posteriores, como secagem e armazenamento.

As exigências se intensificaram na última década devido ao aumento da participação


brasileira no mercado internacional e à necessidade de adequação das usinas ao
desenvolvimento dos programas de qualidade nas indústrias de alimentos e bebidas.

Até o início da década de 90, as especificações de qualidade eram definidas pelo extinto
Instituto de Açúcar e Álcool (IAA), ou seja, o Governo. Hoje quem faz essa
determinação são os compradores. “Com isso, o rigor em relação à qualidade é bem
maior”, frisa o pesquisador Cláudio Hartkopf Lopes, da Universidade Federal de São
Carlos.

Antes produzidos para refinarias ou exportação sem grandes exigências de qualidade, o


açúcar é fabricado atualmente com especificações pré-determinadas para cada
aplicação: doce, refrigerante ou consumo humano, por exemplo.

Essa é uma tendência mundial: as empresas exigem um insumo que atenda as suas
exigências por qualidade. Muitos clientes chegam a inspecionar a fábrica antes de
comprar o açúcar. “Por isso, as usinas têm que ter mais cuidado com limpeza, maior
controle automático, menos pessoas na fábrica e profissionais bem treinados”, aponta
Lopes.

A adaptação a essas exigências demanda alterações estruturais no processo, como a


troca de equipamentos antes confeccionados a base de aço-carbono por linhas e
equipamentos de aço inox, até controles automáticos totais da cadeia partindo da
matéria-prima até o final do processo na estocagem do produto.

Cada etapa de fabricação teve sua importância aumentada. “Considera-se que a partir da
cristalização o processo se torna mais crítico e sua proteção deve ser intensificada”,
afirma o diretor comercial do Grupo Crystalsev, Adilson Bernussi. A empresa produz
aproximadamente 2,5 milhões de toneladas de açúcar por safra e 40% desse volume
ficam no mercado interno.

Os processos de secagem e armazenagem se tornaram etapas fundamentais. Segundo


Bernussi, o produto produzido dentro dos melhores padrões só estará garantido se estas
duas etapas complementares seguirem os mesmos critérios adotados anteriormente.
“Problemas oriundos do descuido destas fases podem gerar o empedramento, por
exemplo, que é o principal problema de uma secagem descontrolada ou do descuido no
armazenamento”.
Divulgação/Santelisa Vale

Laboratório mede a qualidade do açúcar:


produto tem que atender às expectativas do
cliente

Secagem

Depois de sair da centrífuga, o açúcar é resfriado e peneirado. Embora a qualidade do produto não seja
estabelecida nesta etapa, o processo deve manter uma série de cuidados para conservar as características
obtidas nas fases anteriores.

Realizada simultaneamente ao resfriamento, a operação de secagem tem o objetivo de reduzir a umidade


do açúcar a níveis que permitam sua armazenagem por períodos mais ou menos longos, com condições
de preservação da qualidade para consumo como produto alimentício.
Um dos cuidados deve ser com o secador. Se mal operado ou sub-dimensionado, o equipamento tende a
piorar a qualidade do açúcar, além de provocar a degradação do produto no período de armazenagem – as
principais conseqüências são empedramento e o aumento de cor.

Para evitar esse tipo de problema, o secador tem que estar bem dimensionado e ser operado de acordo
com as aplicações para as quais foi projetado. Algumas usinas excedem a capacidade dos equipamentos
quando aumentam produção, porque o custo para compra de um novo é alto.

O engenheiro Helgo Ackermann, diretor da Iprosucar Consultoria, descreve que é possível adequar um
secador existente a uma capacidade aumentada, em, no máximo, 30%, pela alteração de alguns
parâmetros de processo, desde que observados os limites operacionais. A partir desse índice, segundo os
especialistas, a economia é falsa e dá início a prejuízos. “Se o secador estiver mal dimensionado, ele pode
danificar os cristais do açúcar. Tem consumidor que não aceita o produto dessa maneira”, aponta Lopes.

Divulgação/Santelisa Vale

Produção de açúcar: insumo é fabricado com


especificações pré-determinadas para cada
aplicação

Armazenamento

Mesmo que corretamente realizada, a secagem ainda não representa o fim do cuidado
com a qualidade do açúcar. Durante o período de estocagem ou de manipulação, o
açúcar pode sofrer grandes transformações em suas características físicas e químicas.
“Além de empedrar, o açúcar pode amarelar, quebrar, incorporar material estranho. A
principal perda de qualidade será na cor’, define o pesquisador Cláudio Lopes.

Segundo o pesquisador, todo açúcar, mesmo aqueles produzidos com a melhor


qualidade, sofre um acréscimo de cor ao longo da armazenagem. Essa elevação da
coloração passa a se tornar um problema quando ocorre em grande intensidade num
curto espaço de tempo.
“Assim, para um açúcar ter sua cor elevada de 120 para 130 UI no espaço de tempo de
seis meses é perfeitamente aceitável, mas a elevação de 120 para 180 UI (acréscimo de
50%) no mesmo período configuraria um problema”.

Os causadores tanto da cor do açúcar, como de seu escurecimento durante a


armazenagem, são impurezas coloridas ou compostas, denominados precursores que
podem reagir quimicamente resultando em compostos coloridos.

Para evitar o problema, o processo é complexo e a preocupação deve começar na


escolha da variedade da cana . Os compostos que geram a cor do açúcar ou que são
potencialmente geradores de cor são, em sua maioria, originários da cana-de-açúcar,
sendo os principais os polifenóis e os aminoácidos, cuja eliminação no tratamento do
caldo é apenas parcial.

Os polifenóis são compostos presentes no colmo da cana. A presença de aminoácidos


influencia tanto na geração de cor como de um escurecimento do açúcar durante a sua
armazenagem.

Mas, as causas das principais transformações que o açúcar pode sofrer durante a
armazenagem são as de natureza puramente físicas, que podem resultar no seu
empedramento, e de caráter químico, características causadoras de escurecimento.

Segundo Lopes, as principais mudanças físicas que o açúcar pode ter na armazenagem
estão relacionados à higroscopicidade, que é a propriedade de interagir hidricamente
com a atmosfera que o envolve, perdendo e ganhando umidade.

Já o escurecimento ocorre porque os compostos precursores de cor que participam da


composição do açúcar reagem quimicamente. Mas a mera presença dos reagentes
(polifenóis ou aminoácidos) não significa necessariamente que o produto sofrerá um
aumento significativo em sua cor ao longo de semanas ou meses de armazenagem.

Para que o escurecimento ocorra é necessário que existam condições favoráveis às


reações. “É necessária além da presença dos reagentes, a participação de um solvente
(água) que é o meio onde as reações químicas podem ocorrer”, explica Lopes.

O controle da temperatura é também preponderante porque influencia algumas reações


de escurecimento. Para que a armazenagem possa ser realmente segura, os especialistas
recomendam temperatura inferior a 35oC . “Açúcar armazenado quente significa uma
grande probabilidade de ocorrer uma elevação de sua cor”, garante Lopes.

Também deve-se ter cuidado com a umidade, considerada um fator prejudicial à


armazenagem do açúcar - além de tornar o produto susceptível a empedrar, ela serve de
meio para que ocorram reações de escurecimento. “A exposição do açúcar a uma
atmosfera acima de 50 % pode resultar na absorção de umidade pelo produto, sendo que
esta água poderá atuar como meio onde as reações de escurecimento podem ocorrer”,
esclarece o pesquisador.

Por isso, o armazém de açúcar deve apresentar condições também de hermeticidade


para que as oscilações da umidade relativa e temperatura da atmosfera não afetem o
produto armazenado.
Lopes recomenda que o prédio não tenha luz natural e seja hermético. As pilhas devem
respeitar altura do local para não causar problema de compactação. “Em geral, no
armazenamento devem ser considerados cuidados na adequação estrutural como pisos,
pé-direito e telhado na instalação, cuidados no manejo interno, inibindo a presença de
vetores e protegendo as embalagens, mantendo-as limpas”, completa Bernussi.

Divulgação/São Martinho

Cuidado na estocagem: o açúcar pode sofrer grandes


transformações em suas características físicas e químicas nesta fase
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