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ENSAIOS

MECÂNICOS

Aline Morais da Silveira


Ensaio de tração
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Definir os passos para execução do ensaio de tração.


„„ Elaborar o gráfico tensão-deformação de acordo com os resultados
do ensaio.
„„ Identificar as propriedades dos materiais de acordo com a leitura do
diagrama tensão-deformação.

Introdução
As propriedades mecânicas de um material determinam como ele irá se
comportar ao ser submetido a esforços mecânicos e essas propriedades
podem ser verificadas por meio de ensaios mecânicos. A escolha do
ensaio a ser realizado depende do tipo de esforços que o material irá
sofrer e de sua aplicação prática.
Neste capítulo, você vai estudar um dos mais importantes ensaios,
segundo Souza (1982): o ensaio de tração, que é estático e destrutivo.
Ao final, você vai saber definir os passos para a execução do ensaio de
tração; vai ser capaz de elaborar o diagrama tensão‑deformação a partir
dos resultados do ensaio e vai identificar, com base na leitura do diagrama
tensão-deformação, as propriedades do material e alguns tipos de fratura.

Execução do ensaio de tração


Conforme Garcia, Spim e Santos (2012), algumas das vantagens do ensaio
de tração são:

„„ facilidade de aplicação;
„„ flexibilidade do método (pode ser utilizado desde arames até blocos);
„„ amplitude das informações fornecidas;
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„„ aplicabilidade para praticamente todos os materiais de engenharia


(metais, polímeros, cerâmicos, compósitos, madeira, entre outros).

Para a correta execução do ensaio de tração, é necessário que sejam segui‑


das normas técnicas, com especificações do material e do método de ensaio.
Como exemplo, podemos citar a ABNT NBR ISO 6892‑1:2013, e a ASTM E
8M, entre outras.
No ensaio de tração, conforme esquema ilustrado na Figura 1, o corpo de
prova é submetido a uma força de tração uniaxial, promovendo o seu alonga‑
mento até a ruptura, a uma velocidade constante e em curto espaço de tempo.

Célula de carga

Amostra ou
corpo de
prova

Movimento
do travessão

Figura 1. Esquema ilustrativo do ensaio de tração.


Fonte: Smith e Hashemi (2012, p. 162).

O corpo de prova é uma amostra representativa do material que será anali‑


sado, com forma e dimensões especificadas em normas, como a ISO 377:2017.
Os corpos de prova normalmente são obtidos pela usinagem de uma amostra
do produto, por forjamento ou por fundição.
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Os corpos de prova retirados de placas, chapas ou lâminas geralmente têm


seção retangular com espessura igual à da peça original.
Para produtos com seção circular, seção irregular, produzidos por fundição
ou com espessura muito grande, são utilizados corpos de prova com seção
circular.
Conforme ilustrado na Figura 2, o corpo de prova possui duas cabeças
para fixação na máquina de ensaio e uma parte útil, que é onde são medidas
as propriedades mecânicas do material. Além disso, entre as cabeças e a
parte útil, há um raio de concordância, evitando a concentração de tensões e
garantindo que a ruptura ocorra na parte útil do corpo de prova.

Cabeça Parte útil

Raio de concordância

Figura 2. Corpo de prova para ensaio de tração.


Fonte: Souza (1982, p. 13).

Para que possam ser conhecidas as propriedades do material após o ensaio


de tração, é necessário medir o diâmetro da parte útil do corpo de prova em
dois pontos e calcular a média. Além disso, devem ser traçadas divisões de
forma superficial ao longo do comprimento útil do corpo de prova.
Antes do início do ensaio, a máquina deve ser preparada. A fim de mi‑
nimizar possíveis erros de leitura durante a execução, a máquina deve ser
aquecida, se necessário, testada e zerada. O corpo de prova deve ser fixado à
máquina pelas cabeças, de forma que o esforço seja aplicado o mais axialmente
possível, ou seja, ao longo do eixo longitudinal. A velocidade da realização
do ensaio deve obedecer às normas, respeitando a capacidade da máquina, a
fim de garantir a precisão dos resultados.
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A velocidade de aplicação da carga interfere na resistência e na ductilidade do material.


Quanto maior a velocidade, maior será a resistência e menor será a ductilidade. É
importante sempre seguir a velocidade especificada na norma de referência.

Durante o ensaio de tração, a carga (força) aplicada ao corpo de prova é


medida pela célula de carga, enquanto a deformação é obtida por um exten‑
sômetro acoplado ao corpo de prova. O ensaio é finalizado quando ocorre a
ruptura do corpo de prova. Na Figura 3 são apresentados corpos de prova em
três fases do ensaio de tração: (a) antes do ensaio, (b) durante o ensaio, já com
deformação e (c) após a ruptura.

P’

Figura 3. Corpo de prova para ensaio de tração: (a) antes do en-


saio, (b) durante o ensaio, já com deformação e (c) após a ruptura.
Fonte: Adaptada de Beer et al. (2015, p. 349-350).
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No link a seguir, você pode assistir a um vídeo que mostra a execução de um ensaio
de tração em aço carbono.

https://goo.gl/isGVqk

Podem ocorrer incertezas nos ensaios de tração, provenientes dos pa‑


râmetros metrológicos, como dimensões do corpo de prova, classificação
da máquina de ensaio e extensômetro, entre outros, ou dos parâmetros
de material e ensaio, como preparação do corpo de prova, velocidade e
temperatura, etc.

Diagrama tensão-deformação
Souza (1982) define tensão como a resistência interna de um corpo a uma
força externa aplicada sobre ele, por unidade de área, enquanto deformação é
definida como a variação de uma dimensão, por unidade da mesma dimensão,
quando o corpo é submetido a um esforço.
Durante o ensaio de tração, a força aplicada é convertida em tensão, cau‑
sando uma deformação no corpo de prova, o que possibilita a criação de um
gráfico da tensão (σ) em função da deformação (ε), também chamado de
diagrama tensão-deformação, conforme mostra a Figura 4.
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σ
C

B
A

ε
Figura 4. Diagrama tensão-deformação.
Fonte: Garcia, Spim e Santos (2012, p. 67).

A tensão σ é definida pela Equação 1:


P
σ= (1)
A0

Onde P é a força de tração, ou seja, a carga instantânea aplicada na direção


perpendicular à seção reta do corpo de prova, e A0 é a área da seção transversal
da parte útil do corpo de prova antes da aplicação da carga. A unidade de
tensão definida pelo SI (Sistema Internacional) é N/m2 (Newton por metro
quadrado), que equivale a Pa (Pascal).
Já a deformação ε, que é a variação dimensional do corpo de prova, é
definida pela Equação 2:
Li – L0 ∆L
ε= L0 = L0 (2)

Onde Li é o comprimento instantâneo e L0 é o comprimento inicial da


parte útil do corpo de prova, antes da aplicação da carga. A deformação é
adimensional (m/m) e normalmente apresentada em forma percentual (mul‑
tiplicada por 100).
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Deformação elástica e Lei de Hooke


Grande parte dos materiais metálicos, quando submetidos a uma baixa tensão
de tração, apresentam uma relação de proporcionalidade entre a tensão aplicada
e a deformação observada. Esta relação é conhecida como Lei de Hooke,
representada pela Equação 3:
σ P L0
E = ε = A ∆L (3)
0

Onde E é a constante de proporcionalidade, também chamada de módulo de


elasticidade ou módulo de Young, geralmente expresso em GPa (gigapascal).
Durante a deformação elástica, os átomos se afastam de suas posições
originais com a aplicação da carga, mas retornam às posições originais quando
cessa a aplicação da carga.
A Lei de Hooke é válida até o ponto de tensão conhecido como limite de
proporcionalidade ou limite elástico (ponto A da Figura 4). É a maior tensão
que o material consegue suportar sem que ocorra deformação permanente.
Teoricamente o limite elástico e o limite de proporcionalidade podem ser
diferentes mas, na prática, são de difícil determinação e se confundem, pois
o desvio de linearidade é gradual e não há um ponto bem determinado para
cada um desses limites.
Quanto maior for E, maior é a resistência do material à deformação elástica,
ou seja, mais rígido é o material.
O módulo de elasticidade é uma das propriedades mais constante dos
metais, pois depende das forças de ligação entre os átomos. Mesmo assim,
pode ser levemente afetado por tratamentos térmicos, pela adição de elementos
de liga ou por trabalho a frio que altere a estrutura metálica. O módulo de
elasticidade é inversamente proporcional à temperatura, ou seja, quanto maior
a temperatura, menor será E.

Deformação plástica
No limite da zona elástica ocorre a zona plástica, em que tensão e a deformação
não são mais relacionadas proporcionalmente, ou seja, os átomos não retornam
às suas posições originais quando cessa a aplicação da carga, causando uma
deformação permanente ou residual.
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No início da deformação plástica ocorre o escoamento (ponto B da Figura 4),


caracterizado por uma deformação permanente sem que haja um aumento da
carga. Posteriormente ocorre o encruamento (ponto C da Figura 4), que é
o endurecimento por deformação a frio, até que ocorra a ruptura (ponto D
da Figura 4).

A interrupção de um ensaio de tração só pode ocorrer durante a deformação elástica.


Caso contrário, as propriedades obtidas após a continuação do ensaio serão afetadas
pelo encruamento do material.

Identificando propriedades do material a partir


do diagrama tensão-deformação
A partir do ensaio de tração é possível identificar algumas propriedades do
material. Entre elas, destacamos:

„„ resiliência e tenacidade;
„„ ductilidade;
„„ limite de escoamento;
„„ limite de resistência;
„„ limite de ruptura;
„„ estricção.

Resiliência e tenacidade
Resiliência é a capacidade que o material tem de absorver energia durante
a deformação elástica e liberá‑la quando descarregado. Já tenacidade é a
capacidade de absorver energia durante a deformação plástica. A tenacidade
tem grande importância no projeto de peças que devem sofrer tensões acima
do limite de escoamento sem fraturar, como molas, engrenagens, correntes,
eixos, etc.
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Ductilidade
Ductilidade é a capacidade que o material tem se deformar plasticamente até
a ruptura. Pelo gráfico tensão-deformação é possível avaliar a ductilidade do
material, pois quanto maior a zona plástica (maior a deformação), mais dúctil
é o material, e quanto menor a zona plástica, mais frágil é o material.
Quanto mais dúctil for o material, menos uniforme será a distribuição da
deformação ao longo do corpo de prova.

A adição de elementos de liga, aplicação de tratamentos térmicos, condições de


fabricação do corpo de prova, tamanho do grão e temperatura de execução podem
afetar o ensaio de tração, alterando a resistência e a ductilidade do material.

Limite de escoamento
Limite de escoamento (σe) é a tensão atingida durante o escoamento, dado
pela Equação 4:
P
σe = A e (4)
0

Onde Pe é a carga de escoamento. O limite de escoamento tem maior


importância na especificação de materiais dúcteis em que deva ser evitada a
deformação plástica. Além disso, o limite de escoamento pode ser associado
a impurezas existentes no metal, pois um metal 100% puro não apresenta
escoamento.
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Limite de resistência
Limite de resistência (σr) é a tensão máxima suportada pelo material, dado
pela Equação 5:
P
σr = A r (5)
0

Onde Pr é a carga máxima atingida durante o ensaio. O limite de resistência


tem grande importância na especificação de materiais frágeis.

Limite de ruptura
O limite de ruptura (σf ), dado pela Equação 6, é a tensão de ruptura do
material.
Pf
σf = A (6)
0

Onde Pf é a carga de ruptura. O limite de ruptura é inferior ao limite de


resistência, pois ocorre uma redução na área da seção transversal devido a
estricção do corpo de prova. Normalmente esta propriedade não é informada,
por não caracterizar o material e também por ser difícil determiná-la com
precisão.
Quanto mais frágil for o material, mais próximos serão o limite de ruptura
e o de resistência.

Estricção
A estricção (φ), dada em forma percentual, é a diminuição da seção transversal
do corpo de prova após a ruptura, determinada pela Equação 7:
A0 – A
φ= A0 · 100 (7)

Onde A é a área da seção final estrita. A estricção é uma forma de medir


a ductilidade, pois quanto maior seu resultado, mais dúctil é o material.
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Fraturas dos corpos de prova


De forma geral, as fraturas podem ser classificadas em frágil ou dúctil, sendo
muito tênue o limite de separação dessas duas fraturas. Um esquema para a
classificação das fraturas é apresentado na Figura 5.

Figura 5. Representação esquemática de fratura: (a) frágil, (b) muito dúctil e (c) dúctil.
Fonte: Souza (1982, p. 69).

Metais muito duros, como aço temperado e ferro fundido cinzento, apre‑
sentam deformação plástica pequena ou nula, fazendo com que a estricção seja
mínima e que, após a ruptura, as duas partes do corpo de prova apresentem
aparência granular e brilhante (Figura 5a), caracterizando uma fratura frágil.
Já metais muito dúcteis, como chumbo e ouro, apresentam grande defor‑
mação plástica, o que faz com que, após a ruptura, as duas partes do corpo
de prova sejam separadas apenas por um ponto (Figura 5b), caracterizando
uma fratura dúctil. A fratura dúctil é caracterizada por uma zona fibrosa no
centro do corpo de prova. Quanto menos dúctil for o metal, menor será a zona
fibrosa. Quando esta zona fibrosa é nula a fratura pode ser considerada frágil.
Segundo Chiaverini (1986), a análise da fratura, além de verificar se o
comportamento do material é dúctil ou frágil, permite observar a presença
de falhas originadas durante a fabricação.
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1. Sabemos que a Lei de Hooke c) Letra C.


somente será válida até um d) Letra D.
determinado ponto de tensão. Esse e) Nenhuma das alternativas.
ponto é determinado como: 4. A equação a seguir indica a
a) limite de proporcionalidade. intensidade da força interna atuante
b) limite de resistência à tração. sobre a área que passará por uma
c) módulo de elasticidade. análise. De acordo com o que
d) escoamento. aprendemos neste capítulo, indique
e) fase plástica. a alternativa que traduz o que esta
2. O processo que ocorre fórmula nos permite calcular.
no início da deformação F
plástica chamamos de: T=
S
a) escoamento.
b) fase elástica. a) Deformação.
c) tenacidade. b) Módulo de elasticidade.
d) módulo de elasticidade. c) Tensão.
e) tensão de ruptura. d) Lei de Hooke.
3. Analise o diagrama tensão- e) Tenacidade.
-deformação abaixo e 5. Com base no que aprendemos
assinale qual letra representa neste capítulo, indique a
a região de escoamento. alternativa incorreta.
a) O módulo de elasticidade é
T
diretamente relacionado às
C
forças de ligações interatômicas.
D b) O tamanho do grão influencia os
B resultados do ensaio de tração.
A
c) A composição química da liga
não influencia nos resultados
do ensaio de tração.
d) Corpo de prova circular é um
modelo de corpo de prova
utilizado no ensaio de tração.
Є
e) Ductilidade é um dado obtido
a) Letra A. por meio do ensaio de tração.
b) Letra B.
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BEER, F. P. et al. Mecânica dos materiais. 7. ed. Porto Alegre: AMGH, 2015. 856 p.
CHIAVERINI, V. Tecnologia mecânica. 2. ed. São Paulo: McGraw-Hill, 1986. 3 v.
GARCIA, A.; SPIM, J. A.; SANTOS, C. A. Ensaios dos materiais. 2. ed. Rio de Janeiro: LTC,
2012. 384 p.
SMITH, W. F.; HASHEMI, J. Fundamentos de engenharia e ciência dos materiais. 5. ed.
Porto Alegre: AMGH, 2012. 734 p.
SOUZA, S. A. Ensaios mecânicos de materiais metálicos: fundamentos teóricos e práticos.
5. ed. São Paulo: Edgard Blücher, 1982. 286 p.

Leituras recomendadas
AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS. ASTM E8/E8M-11: standard test
methods for tension testing of metallic materials. West Conshohocken, 2011.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 6892-1: materiais metá-
licos: ensaio de tração: parte 1: método de ensaio à temperatura ambiente. Rio de
Janeiro, 2013.
INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION. ISO 377: steel and steel
products: location and preparation of samples and test pieces for mechanical testing.
Geneva, 2013.

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