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Curso básico de teologia

Apresentação

A Escola Teológica Koinonia da Igreja Batista Getsêmani tem


como objetivos: o aprimoramento dos conhecimentos teológicos e de prática
ministerial de membros que exerçam atividades nas igrejas; e o incentivo, a
formação e o direcionamento de novos líderes e obreiros.

Através de um programa equilibrado, o curso estimula o aluno a buscar e


desenvolver seus dons ministeriais, visando não apenas o intelecto, mas a
atuação de Cristo em sua vida.

Baseado na perspectiva teológica da Convenção Batista nacional, o


currículo é voltado para a realidade da igreja evangélica brasileira
contemporânea, e abrange todas as área de atuação ministerial. O aluno estará
capacitado para atuar de maneia relevante no cenário específico em que
vivemos.

O curso é indicado para: pastores que queiram aperfeiçoar seus


conhecimentos teológicos; lideres de departamento, professores de escola
bíblica, líderes de grupos pequenos, diáconos, obreiros e todo cristão que
deseja conhecer mais a Bíblia, aprofundar seu relacionamento com Deus e
compreender seu papel na Igreja de Jesus.

Pr. Jorge Linhares


Presidente da Igreja Batista Getsêmani

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 1


Curso básico de teologia

Sumário
HERMENÊUTICA.................................................................................................................. 03
Introdução à hermenêutica.................................................................................................................................... 03
O quê têm gerado interpretações erradas............................................................................................................. 06
Breve história da interpretação da Bíblia.............................................................................................................. 07
Princípios gerais de interpretação bíblica............................................................................................................... 11
Regras de interpretação da Bíblia........................................................................................................................... 12
Aplicação das regras de interpretação................................................................................................................... 23

HOMILÉTICA.......................................................................................................................... 26
1ª parte: Noções gerais de homilética.................................................................................................................. 27
2ª parte: O Pregador............................................................................................................................................. 33
3ª parte: O Sermão................................................................................................................................................ 36

EVANGELHOS......................................................................................................................... 51
Mateus: o Messias chegou!.................................................................................................................................... 51
Marcos: o Filho de Deus: servo de todos.............................................................................................................. 55
Lucas: Salvador para todas as pessoas.................................................................................................................. 57
João: vida eterna por meio do seu nome............................................................................................................... 61

ATOS: os primeiros dias da igreja primitiva............................................................................. 64

TEOLOGIA PRÓPRIA: a doutrina do ser de Deus............................................................ 68


O estudo da doutrina........................................................................................................................................... 69
A Bíblia, fonte da doutrina cristã......................................................................................................................... 70
A existência de Deus.............................................................................................................................................. 72
Os nomes de Deus................................................................................................................................................. 75
A definição de Deus............................................................................................................................................... 78
Os atributos de Deus............................................................................................................................................. 82
A natureza de Deus................................................................................................................................................ 81

ANTROPOLOGIA: a doutrina do homem........................................................................... 92


Origem do homem................................................................................................................................................ 92
Teorias sobre a origem do homem....................................................................................................................... 92
A criação divina do homem.................................................................................................................................. 93
A natureza humana............................................................................................................................................... 94

HAMARTIOLOGIA: a doutrina do pecado e suas consequências..................................... 101

HISTÓRIA DA IGREJA: percurso histórico da Igreja de Cristo triunfante..................... 107

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HERMENÊUTICA

Para que cheguemos a um sentido mais


interpretação exato do texto, precisamos usar as ferramentas
corretas de interpretação 3. Assim, o curso tem
bíblica como propósito apresentar aos alunos as regras
fundamentais de interpretação da Bíblia, para
que, através delas, eles possam encontrar o sentido
correto de uma passagem das Escrituras, visando
Introdução aplicá-la na sua vida e também compartilhá-la com
os outros. 4

A Bíblia é o livro mais lido e o mais INTRODUÇÃO À HERMENÊUTICA


estudado em todo o mundo. Nela encontramos
histórias, poesias, provérbios, parábolas, profecias e “Procura apresentar-te a Deus aprovado,
como obreiro que não tem de que se
outros gêneros literários. Algumas partes são fáceis envergonhar, que maneja bem a palavra da
de entender, outras exigem mais pesquisas para verdade”. 2 Tm 2.15.

saber o real significado da passagem. Infelizmente,


Certa vez John Owen, afirmou o seguinte:
por negligenciar a importância da pesquisa, muitas
“Um princípio claro do Cristianismo é que a oração
pessoas a interpretam erroneamente.
constante e fervorosa pela assistência do Espírito é
um meio indispensável para se obter o
Não somos os primeiros a ler a Bíblia.
Milhões de pessoas a leram antes de nós. conhecimento da mente de Deus revelada na
Também não somos os primeiros a buscar o
Escritura, e que sem oração, os demais meios
sentido fiel da mensagem bíblica. Vários
métodos de leitura foram surgindo ao longo (métodos) de nada nos valerão”. 5
dos tempos. Temos muito a aprender desses
nossos irmãos e irmãs na fé que vieram antes Primeiramente, é necessário definir alguns
de nós. É importante que aprendamos com os
conceitos:6
acertos e falhas do passado. Seria uma atitude
muito orgulhosa e mentirosa dizer: “Agora é
2 STEIN, Robert H. Guia básico para a interpretação da bíblia. 4a
que estamos lendo a Bíblia de maneira fiel”.
ed. Rio de Janeiro: CPAD. 2002. p.50.
Se hoje lemos a Bíblia de uma certa maneira,
3 ANGUS, Joseph, História, doutrina e interpretação da bíblia. Vol.
é porque muitos outros a leram antes de nós.
Somos uma pequena parcela desse grande e 1, 1951, RJ. p.345.
longo processo 1. 4 FERREIRA, Júlio Andrade Ferreira. Bíblia – enigma da literatura.
São Paulo: LPC, 1985. p. 192.
5 LOPES, Augusto Nicodemos. A bíblia e seus interpretes. SP:
Editora Cultura Cristã, 2004. p.176.
1 MOSCONI, Luis. Para uma leitura fiel da bíblia. São Paulo: 6 ALVES, Roberto. Exegese: a arte de interpretar a bíblia. Rio de
Loyola. 1996. p. 87. Janeiro: Alfalit, 2000. p. 154.

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1) O que é Teologia prática • A aplicação da verdade: O viver e o pensar são


2) O que é Hermenêutica inseparáveis. Existe uma herança intelectual na
3) O que é Exegese Palavra de Deus, mas existe também uma
4) O que é Homilética herança espiritual. Doutrina sem dever, é uma
árvore sem frutos. Dever sem doutrina é uma
árvore sem raízes.
• A proclamação da verdade: Se o evangelho não
inspira pensamento e a nossa teologia não
inspira pregação, não existe cristianismo nem
uma coisa nem outra.

A NATUREZA DA TEOLOGIA

1.a) O que é Teologia? Num certo sentido da palavra, é uma


ciência, um estudo de Deus e de seu mundo.
O vocábulo TEOLOGIA, vem de duas Ciência é um arranjo sistemático de fatos
palavras gregas: comprovados. A teologia é uma ciência, porque

Qeo,j (Deus) e consiste de fatos relacionados à Deus e as coisas de


Deus, apresentadas de uma maneira lógica e
lo,goj (palavra) ordenada.

Pensar, raciocinar a respeito de Deus 7. A teologia estuda aquilo de que a religião é

Existem muitas pessoas que não gostam de a realidade. A religião é a vida de Deus, vida em

estudar Teologia, de pensar teologicamente, pois que tornam parte ativa o intelecto, a vontade e as

acham-na sem interesse, sem utilidades ou sem afeições. A vida religiosa envolve o homem em todo

valor espiritual e prático. o seu ser, e os fatos apurados das suas experiências

É necessário notar porém, que a Teologia com Deus, no transcurso da vida, constituem a sua

traz um desafio ao coração, a mente e a consciência teologia.

do cristão. É saudável, interessante e prática. Sã O homem é um ser que reflete, que pensa

doutrina traz saúde espiritual. 8 sobre as suas experiências. A teologia é, portanto,

A teologia busca 9: coisa necessária e natural.

• A classificação da verdade: O teólogo acata


todos os fatos à respeito de Deus e do mundo 1.b) O que é Hermenêutica?

em que vivemos, sintetiza e estuda os fatos de


uma maneira sistemática e ordenada. À matéria que ensina sobre interpretação
bíblica, é dado o nome de HERMENÊUTICA, uma
7 MCGRATH, Alister E. Teologia sistemática, histórica e filosófica. palavra grega, que por sua vez se deriva do verbo
São Paulo: Shedd, 2005. p.175
8 GRENZ, Stanley J.; OLSON,Roger E. Quem precisa de teologia? hermeneuo, significando: arte de Interpretação do
SP: Vida, 2002. p.55. sentido das palavras; interpretação dos textos
9 ANGUS, Joseph, História, doutrina e interpretação da bíblia. Vol.
1, 1951, RJ. p.345. sagrados; arte de interpretar leis.

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Hermenêutica 10 é a ciência a arte de ou estudante da Bíblia.


interpretação; é ciência porque determina
regras e princípios seguros e imutáveis; e é A relação entre a escrita e palavra e o
arte porque estabelece regras práticas. Faz
evento, seu significado é o centro do problema
parte da Teologia Exegética, as outras
ciências da interpretação são a crítica textual hermenêutico. Mas esta relação em si mostra–se
e a exegese (aplicação dos princípios e regras
estabelecidos pela hermenêutica juntamente somente através de uma série de interpretações.
com a crítica textual 11. Essas interpretações constituem a história do
problema da hermenêutica e até mesmo da história
Segundo registra a história, Platão, o
do próprio cristianismo, a medida em que o
famoso filósofo da Grécia antiga, foi o primeiro a
cristianismo é dependente de suas leituras
empregar a palavra ‘hermenêutica’ como um termo
sucessivas da Escritura e sua capacidade de
técnico. Desde aí, a palavra sugere a arte de
converter novamente esta Escritura em palavra
interpretar escritos antigos e atuais, sejam de
viva. Certas características, que podemos chamar
ordem espiritual ou das ciências do direito. Para
de situação hermenêutica do cristianismo, sequer
este fim existe a Hermenêutica, com um sentido
foram percebidas até o momento. Esses traços
mais geral.
sumiram, o que faz o prolema da hermenêutica um
O objetivo principal da interpretação
prolema moderno. 12
bíblica, é descobrir o sentido correto do texto na
época em que ele foi escrito, com vistas à 1.c) O que é Exegese ?
aplicação correta.
Qualquer leitor ou estudante da Bíblia, já Exegese é uma palavra que também vem da
se defrontou com interpretações equivocadas das língua grega traduzida para o português como
Escrituras. Dependendo do nível de conhecimento conduzir para fora, puxar de dentro para fora.
bíblico, conseguiu detectá-las, ou então tudo Portanto, exegese é o processo de descobrir
passou desapercebido. Quando há identificação de e conduzir para fora a mensagem do texto. É deixar
erros por parte do leitor, é bastante positivo saber o texto falar por si próprio e buscar aquilo que ele
que este terá como se defender das possíveis quer dizer. 13
heresias ou enganos, no entanto se não houver tal De acordo com Roy B. Zuck 14, a exegese
identificação, é preocupante a situação deste leitor pode ser definida como a verificação do sentido do
texto bíblico dentro de seus contextos históricos e
10 SOBRINHO, Antonieto Grangeiro. Hermenêutica bíblica. Rio de
Janeiro: CPAD, 1981. p10. literário.
11 CRÍTICAS : Expressão usada para designar o estudo que envolve
qualquer coisas fora da bíblia; longe de assumir qualquer sentido d) O que é Homilética
negativo que a expressão possa ter.
A CRÍTICA DA BÍBLIA se divide em Crítica textual ou
Baixa Crítica, e, Crítica literária ou Alta Crítica, que é a que ora
Homilética é a ciência (princípios) e a arte
fazemos uso:
a) CRÍTICA TEXTUAL: é a arte-ciência que tenta restaurar (tarefa) de transmitir o significado e a importância
o texto original de um documento (autógrafo) tanto quanto
possível.
12 RICOEUR, Paul. Ensaios sobre a interpretação bíblica. São
b) CRÍTICA LITERÁRIA: É a arte-ciência que estuda a
Paulo: Novo Século, 2004. p45.
formação da tradição oral classificando-se as fovrmas literárias,
13 MOSCONI, Luis. Para uma leitrura fiel da bíblia. São Paulo:
procurando-se determinar a ocasião em que foram os escritos
Loyola. 1996. p.108.
formulados, as possíveis influências desta ocasião e os
14 ZUCK, Roy B. A interpretação bíblica. SP: Vida Nova, 2005. p.
conceitos que neles se refletem. [ OLIVEIRA, Neemias de.
Introdução ao estudo da Bíblia. (Texto não publicado)]. 21.

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do texto bíblico sob forma de pregação. 15 Ora, os irmãos de Beréia conferiam nas Escrituras
A hermenêutica não se ocupará da Exegese, se era aquilo mesmo que eles haviam dito, e nem
nem da Homilética. Seu foco está colocado sobre por isso deixaram de ouvir de bom grado a Palavra
as formas (princípios) de se interpretar a Bíblia 16. do Senhor transmitida por eles.
Como não existe teologia sem compreensão da
Bíblia, não existe compreensão da Bíblia sem uso b) Influência de programas e livros evangélicos.
de métodos, princípios ou regras, o que torna a Se por um lado somos privilegiados de
hermenêutica uma matéria de suma importância. termos vários programas de rádio e de televisão, e
dezenas de editoras evangélicas. Temos no entanto
o desafio de sabermos selecionar bem o que
ouvimos ou lemos. Infelizmente nem todos que
fazem uso da mídia falada ou escrita são de fato
comprometidos com a Palavra de Deus, ou tiveram
a oportunidade de receberem um ensino embasado
nas Escrituras, e acabam sendo reprodutores de
visões distorcidas do Reino de Deus, e de sua
O QUÊ TEM GERADO INTERPRETAÇÕES
mensagem 18.
ERRADAS?

c) Colocação da experiência pessoal acima das


a) Aceitação de uma explicação sem investigações.
Escrituras.
Há alguns crentes que em sua imaturidade,
Vivemos em uma sociedade que preza muito a
acatam todos os ensinos que ouve, partindo apenas
praticidade, e em decorrência disto tende-se muito
do pressuposto de que o interlocutor é alguém
a imitar ou tomar por referência a experiência dos
‘muito espiritual’, ou que não se deve por em xeque
outros. No entanto, é preciso lembrar que mesmo
a autoridade do homem de Deus. 17
sendo um no corpo de Cristo, somos indivíduos, e
Mas, a Bíblia deixa claro os benefícios de
que como tal somos diferentes um dos outros e
confrontar àquilo que é ensinado ou pregado com o
consequentemente temos experiências diferentes.
que as Escrituras dizem. At 17.11,12 diz:
A experiência cristã não padronizada. Deus não se
Ora, estes foram mais nobres do que os que
estavam em Tessalônica, porque de bom grado restringe a moldes para fazer as coisas, Ele é
receberam a palavra, examinando cada dia
nas Escrituras se estas coisas eram assim. De soberano, opera como quer. Em outras palavras,
sorte que creram muitos deles, e também
nem sempre a experiência dos outros, por mais
mulheres gregas da classe nobre, e não poucos
varões. Os irmãos de Beréia haviam ouvido o bonita que seja, poderá ser a minha.
evangelho através de Paulo e Silas, v.10

Quem de nós hoje, ao ouvir o apóstolo do d) Falta de conhecimento do contexto histórico-


gentios, Paulo, ousaria a questionar seus ensinos? cultural.
Há um abismo histórico-cultural, geográfico
15 Ibid.
(espaço) e lingüístico enorme entre o período em
16 CONCEIÇÃO, Adaylton de. Introdução ao estudo da exegese

bíblica. RJ: CPAD, 1985. p. 22.


18 CARSON, D. A. A exegese e suas falácias. SP: Vida Nova, 1992.
17 BEEK, Joel. Sola scriptura. São Paulo: ECC, 2000. p. 89. p. 134.

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que a Bíblia foi escrita e os dias hodiernos 19


. A a verdade. Jo 16.13.
maior parte dos leitores da Bíblia vive a milhares de
quilômetros de distância dos países onde se deram g) Falta de investimentos em livros de pesquisas.
os fatos Bíblicos, o que os deixa em bastante Dizem que o brasileiro não gosta de ler. Se
desvantagem. Também, é de se lembrar que uma comparado aos países do primeiro mundo pode-se
lacuna temporal nos separa dos autores e dos até dizer que seja verdade. Talvez isso seja pelo
primeiros leitores da Bíblia. 20
Como se não fato de que os livros ainda estejam acima da
bastasse, os costumes e as línguas da época nos capacidade econômica da população em geral. Mas
distancia do contexto que as Escrituras foram se pensarmos mais especificamente nos
escritas. Então, o não conhecimento disto evangélicos, concluiremos que há uma oferta muito
compromete em muito uma boa interpretação do grande livros, e em alguns casos bastante acessíveis
texto bíblico. 21
em termos de preço, e que mesmo assim estamos
abaixo da média ideal de leitura. Verifica-se
e) Falta de conhecimento e aplicação de regras de também uma predileção por livros devocionais, em
interpretação. detrimento de livros de estudos, análise e
Mediante os fatos anteriormente expostos, interpretação bíblica, o que é de se preocupar.
parece ser impossível interpretar as Escrituras Talvez seja a hora de mudarmos essa
corretamente. Mas,não é verdade. Por isso, ao mentalidade no meio cristão, para termos uma
longo dos tempos estudiosos, teólogos, amantes da geração futura que se deleite em ler e estudar de
Palavra de Deus se dedicaram a empreender meios modo bereiano as Escrituras Sagradas.
de se entender e interpretar as Escrituras, e o
resultado disto se chama Hermenêutica Sacra. 22
BREVE HISTÓRIA DA INTERPRETAÇÃO DA
f) Falta de conhecimento da revelação progressiva BÍBLIA 23
de Deus.
Outro grande empecilho ao entendimento Desde o início da igreja desenvolveram-se
adequado das Escrituras, é não perceber ou negar a duas heranças:
manifestação de Deus na história, no sentido de – (a) uma que sustenta que o significado das
estar se revelando de forma progressiva e contínua. Escrituras se encontra apenas em seu sentido
Por toda a Bíblia se percebe o quanto Deus se primário, histórico e
ocupou em se manifestar para que o homem – (b) outra que entende que o significado
pudesse conhecê-lo. E, a maior prova disto, é o fato definitivo das Escrituras está em seu sentido
Dele ter enviado o Espírito Santo como guia a toda pleno ou completo.
Dessa distinção desenvolveram-se alguns
19 STENDEBACH, Franz J. Como ler a bíblia. São Paulo: Paulinas,
modelos e combinações de modelos para a
1983. p. 67.
20 BLANKENBAKER, Frances. Quero entender a bíblia. Rio de interpretação da Bíblia na igreja primitiva.
Janeiro: CPAD, 1999. p. 192.
21 MAINVILLE, Odette. A bíblia à luz da história. São Paulo:
Paulinas, 1999. p.131.
22 Vademecum para o estudo da bíblia. São Paulo: Paulinas, 2000. p. 23 DOCKERY, David S. Manual bíblico vida nova. São Paulo:
156. Vida Nova, 2001. p. 129-131.

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A igreja primitiva interpretação alegórica. A inovação da


interpretação alegórica desenvolveu-se nesse
Os pais apostólicos no século II contexto. A interpretação alegórica pressupõe que
acompanharam o pensamento dos apóstolos. A a Bíblia diz mais do que indicam suas palavras
manifestação de falsos ensinos (em particular o textuais. Os dois grandes representantes da escola
gnosticismo) e os desafios à ortodoxia criaram de Alexandria foram Clemente (150-215 d. C.) e
tumulto a interpretação. Para provar a unidade das Orígenes (185-254 d. C.).
Escrituras e sua mensagem, estudiosos como O sentido literal, porém, não era
Irineu (c. 140-202 d.C.) e Tertuliano (c. 155-225 mensagem principal da Bíblia para os
d.C.) desenvolveram estruturas teológicas. Essas alexandrinos. Orígenes, em particular, considerava
estruturas serviram como diretrizes de fé na igreja. absurdo que a Bíblia, inspirada por Deus, não
Aprender a ler a Bíblia pelos olhos dos pudesse ser interpretada de maneira espiritual.
cristãos de um tempo e lugar diferentes
revela provavelmente o efeito distorcível de Dessa suposição, seguiu-se a abordagem
nossas próprias lentes culturais, históricas,
hermenêutica tríplice de Orígenes. Ele sustentava
lingüísticas, filosóficas e, sim, até mesmo as
teológicas. Isto não é afirmar que os pais não que a Bíblia possuía três sentidos diferentes, mas
tiveram sua própria perspectiva distorcida e
seus pontos obscuros. Deve-se argumentar, complementares: (a) um sentido literal ou físico,
porém, que não chegaremos à perspectiva e (2) um sentido alegórico ou espiritual e (3) um
claridade a respeito de nossas próprias forças
e fraquezas, se nos recusarmos a olhar ao sentido tropológico ou moral. Mas por vezes os
longo da história da Igreja e despojamos-nos,
nós mesmos, dos dons do Espírito Santo, alexandrinos desconsideravam o sentido literal e
quando nos recusamos a nos movermos além encontravam numerosas mensagens espirituais
da zona de conforto de nossas próprias
idéias. 24 numa única passagem, criando assim toda uma
escala de interpretações alegóricas.25 A
Mantendo a ênfase cristológica do primeiro
interpretação alexandrina era basicamente prática.
século, a regra de fé esboçava as crenças teológicas
A obra desses intérpretes alegóricos é
que encontravam seu centro no Senhor encarnado.
compreendida apenas quando se percebe isso.
As vezes, porém, a interpretação das Escrituras por
Os sucessores de Orígenes foram
intermédio dessa estrutura teológica forçava o
questionados pela escola de Antioquia, que dava
texto bíblico a se adaptar a um conjunto
ênfase à interpretação literal e histórica. Entre os
preconcebido de convicções teológicas.
mais destacados intérpretes da escola de Antioquia
Essa abordagem resultou salvaguarda para
estavam João Crisóstomo (347-407 d. C.) e Teodoro
a mensagem da igreja, mas reduziu a possibilidade
de mopsuéstia (c. 350-428 d. C.). Eles entendiam a
de os intérpretes serem criativos como indivíduos.
inspiração bíblica como uma ativação
Ela também tendia a divorciar o texto bíblico de
momentânea da percepção e compreensão dos
seu contexto literário ou histórico.
autores, em que a atividade intelectual permanecia
A interpretação bíblica alcançou novos
sob controle em nível consciente. 26
Os intérpretes
níveis com o surgimento da escola de Alexandria
de Antioquia concentravam-se nos alvos e nas
no século III, com o desenvolvimento da
25 BERKHOF, Louis, Princípios de interpretação bíblica. São
Paulo: Cultura cristã. 2004. p. 76.
24 HALL, Christopher A. Lendo as escrituras com os pais da igreja. 26 BLANKENBAKER, Frances. Quero entender a bíblia. Rio de
Viçosa-MG: Ultimato. 2003. p. 39. Janeiro: CPAD, 1999. p.98.

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motivações dos escritores bíblicos, no uso que Será proveitoso identificar as metodologias
faziam das palavras e em seus métodos. Eles da igreja primitiva com os seguintes modelos ou
acreditavam que o sentido literal e histórico da pontos de apoio:
Bíblia era primordial e as aplicações morais eram a) o modelo “pietista” ou “funcional,” dos pais
dele extraídos. apostólicos;
A exegese madura de Teodoro e b) o modelo “dogmático” ou “autorizado,” dos
Crisóstomo, ainda que literal, não era um apologistas;
literalismo cru nem rígido que não reconhecia c) o modelo “alegórico” ou “orientado para o
figuras de linguagem no texto bíblico. Dando leitor,” dos alexandrinos;
continuidade aos costumes anteriores de Jesus e da d) o modelo “histórico-literal” ou “orientado para o
igreja primitiva, os mestres de Antioquia liam as autor,” dos antioquenos e
Escrituras de maneira cristológica, pela aplicação e) o modelo ”canônico” ou “orientado para o texto,”
da interpretação tipológica. de Agostinho e Teodoreto. 28
Quando a igreja entrou no século V,
desenvolveu-se uma abordagem eclética e A Idade Média e a Reforma
27
multifacetada de interpretação , que às vezes
destacava o literal e histórico, e às vezes, o Da época de Agostinho, a igreja, seguindo a
alegórico, mas sempre o teológico. Agostinho liderança de João Cassiano (que morreu em cerca
(354-430 d.C.) e Jerônimo (c. 341-420 d.C.) defini- de 433), abraçou a teoria do sentido quádruplo das
ram os rumos desse período. O texto bíblico era Escrituras:
interpretado em seu contexto mais amplo, 1) O sentido literal era o que podia nutrir as
compreendido como o cânon da Bíblia. virtudes da fé, esperança e amor. Quando não o
O cânon estabelecia parâmetros para fazia, o intérprete podia apelar às três virtudes
validar tanto a interpretação tipológica como complementares, em que cada sentido equivalia a
alegórica, de modo que o significado histórico uma das virtudes.
permanecesse básico, ainda que o sentido espiritual 2) O sentido alegórico referia-se à igreja e à
mais profundo não fosse desconsiderado. Não sua fé, àquilo em que ela devia crer.
predominavam nem as práticas alegóricas de 3) O sentido tropológico ou moral referia-
Alexandria, nem as ênfases históricas de Antioquia. se aos indivíduos e ao que eles deviam fazer,
Emergiu um equilíbrio influenciado por interesses correspondendo ao amor.
pastorais e teológicos. A Bíblia era vista da 4) O sentido anagógico indicava a
perspectiva da fé, produzindo interpretações que expectativa da igreja, correspondendo à esperança.
davam ênfase à edificação da igreja, ao amor ao Por exemplo, a cidade de Jerusalém, em todas as
próximo e, principalmente, ao conhecimento de referências na Bíblia, era compreendida
Deus e amor por ele. literalmente como uma cidade judaica,
alegoricamente como a igreja de Jesus Cristo,
tropologicamente como as almas de homens e

27 PESTANA, Álvaro César. Do texto à paráfrase. São Paulo: 28 DOCKERY, David S. Hermenêutica contemporânea à luz da
Editora Vida cristã. 1992. p.126. igreja primitiva. SP: Vida, 2005. p. 153.

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mulheres e anagogicamente como a cidade não resultaram apenas na ênfase cada vez
maior no sentido literal (sensus literalis).
celestial. O sentido quádruplo caracterizou a Lutero continuou a usar amplamente o
método alegórico. Sua reforma, porém,
interpretação na Idade Média.
trouxe mais do que uma modificação do
Martinho Lutero (1483-1546), o grande método exegético. Ela deu início à libertação
da Escritura do cativeiro babilônico da Igreja
reformador, começou empregando o método sob o predomínio da doutrina eclesiástica,
magistério, tradição e harmonização
alegórico, mas depois afirmou tê-lo abandonado.
alegórica. Também a reação da ortodoxia
Foi Erasmo (1466-1536), mais que Lutero, posterior – bem como de toda neo-ortodoxia
– somente conseguiu frear ou encobrir essa
quem redescobriu a primazia do sentido literal. tendência, mas jamais conseguiu detê-la. Se a
João Calvino (1509-1564), o maior Escritura é norma normativa, então a
interpretação se torna a principal tarefa
intérprete da Reforma, desenvolveu a ênfase no teológica. 29
A era atual tem geralmente se mantido em
método histórico-gramatical como base para o
uma das três direções; a abordagem reformada, a
desenvolvimento da mensagem espiritual a partir
pietista ou histórico-crítico.
da Bíblia. A ênfase de Lutero num sentido mais
pleno localizado no significado cristológico das
A era atual
Escrituras ligava os reformadores a Jesus, aos
apóstolos e à igreja primitiva.
A era atual testemunhou o surgimento e o
Geralmente se acredita que os sucessores
desenvolvimento de várias abordagens críticas das
dos reformadores encolheram a liberdade de
Escrituras.
interpretação empregada por Lutero e Calvino.
A interpretação existencial tem sido
Apesar de ser uma declaração genérico e super-
amplamente cultivada no século XX,
simplificada, é verdade que eles conduziram sua
principalmente sob a influência de Rudolf Karl
exposição da Bíblia ao longo de novas fronteiras
Bultmann (1884-1976). Essa abordagem declarava
teológicas. Essa nova forma resultou numa
que os intérpretes deviam projetar-se na
interpretação autorizada e dogmatizada. Quase
experiência do autor para revivê-la.
simultaneamente, o pensamento iluminista
A “Nova Hermenêutica” desenvolveu-se da
começou a se desenvolver.
abordagem existencial. Eles consideravam a
Esse movimento rejeitava as abordagens
interpretação como a criação de um “evento
autorizadas e dogmáticas, resultando em duas
lingüístico” em que a linguagem autêntica da Bíblia
reações: (a) um novo pietismo associado a Philipp
confronta leitores contemporâneos, desafiando-os
Jakob Spener (1635-1705) e August Herman
à decisão e à fé.
Franke (1663-1727) e (b) um método histórico-
Foi Deus quem nos deu a capacidade de
crítico que destacava a importância da raciocinar e de analisar logicamente as coisas.
interpretação teológica da Bíblia. Entretanto, o racionalismo esqueceu-se de
que a razão do homem está corrompida pelo
Inicialmente, também Lutero ainda se pecado. A simples análise racional não pode
encontrava no âmbito da tradicional doutrina trazer o verdadeiro conhecimento de Deus ao
eclesiástica do sentido quádruplo da homem. “O homem natural não entende as
Escritura e estava convencido da legitimidade coisas do Espírito de Deus” (1 Co 2.14). É
e necessidade da alegorese. Seu rápido somente com a assistência do Espírito,
abandono do método escolástico, bem como trazendo cativo todo pensamento à
sua compreensão totalmente nova da tarefa
da teologia e da essência da Igreja como
comunidade que vive da palavra anunciada, 29 GUNNEWEG, Antonius H. Hermenêutica do AT. São Leopoldo-
RS: Sinodal, 2003. p. 46.

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Curso básico de teologia

obediência de Cristo (2 Co 10.5), que Observe o quadro abaixo. Ele apresenta os


podemos apropriadamente entender as coisas
de Deus. três elementos constitutivos do processo de
A exegese racionalista predominou por
interpretação: o autor, o texto que ele produziu, e o
muitos anos na Igreja. Mas seu predomínio
começou a ser quebrado quando dos próprios leitor. No período da Reforma, o autor era o foco da
intérpretes racionalistas perceberam as
limitações do método histórico-crítico. Aí, hermenêutica, que julgava encontrar na sua
entramos no período chamado de pós- intenção a chave para a compreensão do texto.
moderno.
Essa fase da história da interpretação cristã No período moderno, o foco deslocou-se
das Escrituras nos ensina muitas lições
preciosas. Desejamos destacar apenas uma, para o texto, sua formação e sua história, que
que consideramos muito importante. Os seriam descobertos pelos métodos críticos.
intérpretes racionalistas tentaram interpretar
a Bíblia deixando de lado o pressuposto da Na pós modernidade, o foco move-se para
sua inspiração e divindade, defendendo uma
abordagem “neutra”. Insistiram que o método o leitor, rejeitando-se a intenção autoral e o
histórico-crítico era ‘científico’. Entretanto, a processo de formação do texto. O sentido
História demonstrou que não houve essa
“neutralidade” e que o método não era tão encontra-se, agora, na interação do leitor com o
científico assim. Os pesquisadores se
aproximavam da Bíblia já com o pressuposto texto.
de que o sobrenatural não invade a História
e, portanto, já descartando a priori os relatos
miraculosos da Bíblia. Tiraram o pressuposto
da fé e adotaram o da incredulidade.
Em termos práticos, nenhum de nós pode ler
a Bíblia sem a influência do que cremos. A 31
O Deslocamento do Sentido
própria Bíblia exige de nós que creiamos nela
para podermos chegar ao conhecimento de A hermenêutica canônica deve estar atenta
Deus. O importante é que tenhamos os
pressupostos corretos em nossa leitura. E para não reduzir as ênfases distintas dentro do
esses pressupostos são aqueles exigidos pela
própria Palavra de Deus: que reconheçamos cânon em favor de harmonizações superficiais.
seu caráter divino e humildemente creiamos
no que ela nos afirma. 30
PRINCÍPIOS GERAIS DE INTERPRETAÇÃO DA
Além da hermenêutica existencial, entre os BÍBLIA
interesses recentes estão as abordagens lingüística,
literária, estruturalista e sociológica. A Bíblia foi clara, e não complicada, para os
Essas abordagens tendem a destacar o leitores originais. Mas, somos separados do
contexto histórico de um texto e a vida em seu contexto deles por vários séculos, pela cultura, pela
ambiente original. São mais frutíferas as língua e pela história. Sem princípios para nos
abordagens hermenêuticas da “história da orientar nessa tarefa, podemos ficar perdidos no
interpretação” e da hermenêutica canônica. caminho de volta para o significado original do
A primeira vê o texto bíblico pela ótica da texto. Por isso, é necessário conhecer bem os
atividade salvadora de Deus e encontra-se no auge princípios de interpretação da Bíblia.
em Cristo. Revelação é o processo pelo qual Deus
A Segunda interpreta o texto bíblico de desvenda aos homens o seu caráter e o seu plano
acordo com o cânon bíblico com um todo. eterno. Deus se revelou de uma maneira
progressiva e diversificada, isto é, na medida do
tempo Ele foi se revelando aos homens o seu
30 LOPES, Augusto Nicodemos. A bíblia e seus interpretes. SP:
Editora cultura cristã, 2004. p. 195. 31 Ibid. p. 201.

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caráter, sua glória, seu poder e a sua vontade. Assim, devemos saber que durante a
Podemos dividir a revelação em revelação história, Deus foi se revelando, e acrescentando
geral e especial. mais revelações. Na época da igreja primitiva em
1. Revelação geral é a revelação não Atos, eles não tinha o Novo Testamento, não
proposicional que Deus faz às pessoas, através de tinham tanta revelação como temos hoje.
várias manifestações, mediante as quais elas vêm a Na época do Velho Testamento, eles não
saber que Ele existe. imaginavam a igreja, a união de judeus e gentios.
Essa revelação se dá através do Assim, não podemos olhar para os personagens do
testemunho interno. Deus colocou no homem a Antigo Testamento como se eles estivessem vivido
crença na existência de um ser divino superior ao a era da igreja. Também devemos tomar cuidado
próprio homem. Mesmo que essa crença seja para não jogar o Velho Testamento no Novo.
abafada, a consciência e o raciocínio humano Alguns textos bíblicos são explicados na
reforça a necessidade de um Criador poderoso. própria seqüência do relato, como no caso da
Gênesis. 1.26; Atos 17.29; Romanos 2.14-15. parábola do semeador (Marcos 4.1-20) e nas
A revelação geral também se dá através do revelações no livro de Daniel.
testemunho externo. Muitos textos do Velho Testamento,
quando analisados à luz do Novo Testamento,
a) Através da criação e preservação da natureza. passamos a entender o que o autor estava querendo
Salmo 19.1-6; Romanos 1.18-21; Atos 14.17; Cl 1.17; Jó transmitir.
38.1 a 39.30 Muitas pessoas têm experiências com Deus
b) Através da história da humanidade e dos hebreus. e injetam a experiência em algum texto bíblico. Os
(Teofanias, milagres, testemunhos pessoais, exemplos mais comuns são: Cura de enfermidades,
sonhos, visões, etc) conversão, provações livramentos etc.
A revelação geral apresenta os atributos
invisíveis de Deus. Ela não é suficiente para a REGRAS DE INTERPRETAÇÃO DA BÍBLIA
salvação. Ela alerta ao homem quanto à sua
necessidade de crer em Deus e serve também para Regra um: A Bíblia é a autoridade suprema em
condenar o homem caso ele rejeite essa revelação. questões de religião, fé e doutrina.
2. A revelação especial é o auto-
descobrimento de Deus por vários meios e para Quando se trata das questões de religião, fé
várias pessoas na história fazendo com que elas e doutrina o cristão se submete, consciente ou
entendam e creiam na mensagem salvadora, inconscientemente, a uma das seguintes
recebendo assim uma nova vida. Essa revelação autoridades, acatando-a como autoridade última: a
surge da seguinte maneira: tradição, a razão, ou as Escrituras.
a. Através da atuação do Espírito Santo – João 16.8 e A posição oficial e histórica da Igreja
13 Católica romana tem sido a de fazer da tradição o
b. Através da fé em Jesus Cristo – Filipenses 2.5-9 guia e juiz em tais assuntos.
c. Através da Bíblia – 2 Pedro 1.21 Já no protestantismo, boa parte
centralizou-se no racionalismo. Liberalismo e

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modernismo são termos cunhados para descrever mesma. Não se deve acrescentar ou subtrair nada.
esta abordagem. É a razão que decide o que é Compare Escritura com Escritura. Normalmente
fundamental para a fé em Deus. aplica-se esta regra às grandes verdades da Bíblia, e
O cristão fiel considera a Bíblia como o seu não a versículos específicos.
supremo tribunal de recursos. Segundo a Bíblia, Satanás foi o primeiro
Henrichsen 32
, apresenta três maneiras intérprete da Palavra de Deus. Quanto a isto, diz o
pelas quais a autoridade das Escrituras se texto sagrado:
expressam: Gn 3.1-5 (ARC) ” Ora, a serpente era mais
astuta que todas as alimárias do campo que o
1. Uma pessoa age como quem tem SENHOR Deus tinha feito. E esta disse à
mulher: É assim que Deus disse: Não comereis
autoridade, e a passagem explica se o ato é
de toda árvore do jardim? E disse a mulher à
aprovado ou reprovado. Por exemplo, no Jardim do serpente: Do fruto das árvores do jardim
comeremos, mas, do fruto da árvore que está
Éden “a serpente disse à mulher: ‘é certo que não no meio do jardim, disse Deus: Não comereis
dele, nem nele tocareis, para que não morrais.
morrereis’” Gn 3.4. Você sabe que isso está errado
Então, a serpente disse à mulher: Certamente
porque Adão e Eva de fato morreram. O rei Davi não morrereis. Porque Deus sabe que, no dia
em que dele comerdes, se abrirão os vossos
queria construir um templo para Deus, assim Natã olhos, e sereis como Deus, sabendo o bem e o
lhe disse: “Vai, faze tudo quanto está no teu mal.”

coração; porque o Senhor é contigo” 2 Sm 7.3. Natã Antes Deus dissera: “De toda árvore do
falou em tom de autoridade a Davi o que este devia jardim comerás livremente, mas da árvore do
fazer, mas lemos que este conselho foi errado e que conhecimento do bem e do mal não comerás; porque
Deus não queria que Davi edificasse o templo (v.4- no dia em que dela comeres, certamente morrerás”
17).[...] 2. Uma pessoa age com atitude de Note que Satanás não negou que Deus dissera essas
autoridade e a passagem não mostra aprovação nem palavras. Em vez disso, torceu-as, dando a elas um
reprovação. Neste caso, a ação precisa ser julgada sentido que não tinham. Esse tipo de erro dá-se por
com base naquilo que o restante da Bíblia ensina omissão ou por acréscimo.
sobre o assunto.[...] 3. Deus ou um dos Seus
representantes declara a mente e a vontade de Deus. Regra três: A fé salvadora e o Espírito Santo são
Muitas vezes isto vem na forma de mandamentos. imprescindíveis para a compreensão e
Toda a Escritura tem autoridade, mas há partes que interpretação da Bíblia.
você não tem de seguir. Todavia, precisa ter o
cuidado de não usar uma lógica fantasiosa para O cristão dedicado não poucas vezes, fica
evitar fazer o que sabe que é a vontade de Deus perplexo diante do fato de que o homem natural
para você. [...] Para o cristão, a Bíblia tem e sempre não apenas rejeita a Palavra de Deus, mas até
terá autoridade. zomba dela, como coisa de menor importância,
quando o crente a aceita alegremente e de bom
Regra dois: A Bíblia é a melhor intérprete de si grado.
mesma. Face a isto, muitas vezes o crente indaga:
Ao estudar a Bíblia, deixe-a falar por si “Por que o pecador rejeita a vontade de Deus, tão
claramente expressa através das Escrituras? “
32 HENRICHSEN, Walter A., Princípios de interpretação da bíblia.
SP: Mundo cristão. 1986. p. 45. Respondendo a esta pergunta, disse Jesus: “Porque

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o coração deste povo está endurecido, de mau grado Quando inspirou os escritores da Bíblia,
ouviram com os seus ouvidos, e fecharam os seus Deus tinha em mente fazer dela um livro prático e
olhos; para não suceder que vejam com os olhos, aplicável à nossa vida cotidiana. As próprias
ouçam com os ouvidos, entendam com o coração e Escrituras afirmam que esse é o propósito por ela
sejam por mim curados.” Dizendo porque isto visado:
acontece, escreve o apóstolo Paulo que “o deus 2 Pe 1.20, 21 sabendo primeiramente isto: que
deste século cegou os entendimentos dos nenhuma profecia da Escritura é de particular
interpretação; porque a profecia nunca foi
incrédulos.” produzida por vontade de homem algum,
mas os homens santos de Deus falaram
O crente, no entanto, lê uma mensagem
inspirados pelo Espírito Santo.
das Escrituras, e sua verdade se torna muito clara
2 Tm 3.16, 17 Toda Escritura divinamente
para ele. inspirada é proveitosa para ensinar, para
redargüir, para corrigir, para instruir em
justiça, para que o homem de Deus seja
Regra quatro: Deve-se interpretar a experiência perfeito e perfeitamente instruído para toda
boa obra.
pessoal à luz das Escrituras e não as Escrituras
à luz da experiência pessoal. Regra seis: Os exemplos bíblicos só tem
autoridade prática quando amparados por
A Bíblia Sagrada é um livro de causas e uma ordem que os faça mandamento universal.
efeitos, por isto, é de se esperar que aqueles que a
lêem tenham as suas vidas mudadas para melhor, - Ao ler a Bíblia, fica evidente que ninguém
também tenham experiências pessoais reais de tal está obrigado a seguir o exemplo de cada pessoa
forma, que dêem prova de comunhão com Deus e que protagoniza os acontecimentos nela
de amor para com o próximo. encontrados.
A experiência pessoal se constitui na Por exemplo: o fato de Noé haver plantado
evidência daquilo que Deus fez por nós, por isso uma vinha e ter se embriagado com o vinho do seu
não pode e nem deve ser desprezada; porém, no fruto, não indica que se deve fazer o mesmo. Gn
momento de determinar o que é mais importante, 9.20 e 21.
se a experiência ou as Escrituras, para efeito de O fato de Jesus ter mandado dizer a
interpretação bem sucedida da Bíblia, as Escrituras Herodes: “Ide dizer a essa raposa que hoje e amanhã
são superiores à experiência pessoal. Deste modo, expulso demônios e curo enfermos, e no terceiro dia
as Escrituras não podem estar sujeitas à terminarei”, (Lc 13.32) não nos autoriza a mandar
interpretação da experiência pessoal; pelo portadores com recados de afronta às autoridades.
contrário, a experiência pessoal é que deve
submeter-se à interpretação ortodoxa e ao juizo da Regra sete: Todo cristão tem o direito e a
Escrituras. responsabilidade de interpretar as Escrituras
segundo princípios universais aceitos pela
Regra cinco: O propósito principal das ortodoxia bíblica
Escrituras é mudar nossas vidas e não
multiplicar nossos conhecimentos. O estudo desta regra de interpretação das
Escrituras nos leva o pensamento aos dias

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anteriores aos dias anteriores à Reforma Regra oito: Apesar da importância da história
Protestante do Século XVI. Era uma época quando da Igreja, ela não chega a ser decisiva na fiel
a Bíblia ainda não estava traduzida para as línguas interpretação das Escrituras.
dos povos, quando apenas os clérigos da Igreja
Romana eram indicados para interpretá-la. Muitas doutrinas consideradas essenciais
Contra essa pretensão monopolizadora do pelos evangélicos são apenas implícitas nas
clero da Igreja Romana do seu tempo, se insurgiu Escrituras. Devemos à História da Igreja o fato de
Martinho Lutero, dizendo: que tais questões tenham sido resolvidas e
“se é certo o artigo na nossa fé ‘creio na Igreja explicadas para a posteridade. Graças à História da
Cristã’ etão o papa não pode estar certo
sozinho; do contrário deveríamos dizer: ‘creio Igreja, sabemos que no Séc. II a Igreja lidava
no papa de Roma’ e reduzir a Igreja Cristã a
especialmente com a apologética e as idéias
um único homem, o que é uma heresia
diabólica e condenável . Além disto somos fundamentais do cristianismo; nos Séc. III e IV, com
todos sacerdotes, como já disse, todos temos
uma fé, um Evangelho um sacramento; como a doutrina de Deus; no começo do Séc. V, com o
então não teríamos o poder de discernir e homem e o pecado; desde o Séc. V até o VII, com a
julgar o que é certo ou errado em matéria de
fé?” 33 pessoa de Cristo; nos Séc. XI a XVI, com a expiação;
Ao contrário daqueles tempos, hoje existe
e no Séc. XVI, com a aplicação da redenção, a
grande quantidade de diferentes traduções e
justificação, etc.
paráfrases da Escritura ao alcance de todos,
Portanto, é lendo a História da igreja que
tornando mais fácil o acesso à Bíblia para quem
descobrimos como os crentes do passado se deram
saiba e queira lê-la. 34
ao penoso trabalho de sondagem e interpretação
33 BETHENSSON W. H. Documentos da igreja Cristã. Sào das Escrituras, defendendo a integridade da
Paulo: ASTE, 1996. p. 212.
34 AS REVISÕES DE ALMEIDA:
doutrina cristã.
ARC - ALMEIDA REVISTA E CORRIGIDA, de 1944. No entanto, a Bíblia é o árbitro final em
revisada em 1995.
ARA - ALMEIDA REVISTA E ATUALIZADA, todas as questões pertinentes a fé e a conduta.
publicada em 1958. Em 1993 a SBB lançou a 2a. Edição.
R - REVISADA, conhecida como “de Acordo com os
Melhores Textos em Hebraico e Grego”, pub. em 1967.
C - CONTEMPORÂNEA, lançada em 1990, pela Editora
Vida.
ACF - ALMEIDA CORRIGIDA, FIEL, 1995, SBTB,
Sociedade Bíblica Trinitariana do Brasil. Bíblica, Lisboa, Portugal.
BÍBLIA SAGRADA, Círculo do Livro, 1982, tradução e
OUTRAS VERSÕES: VERSÕES PROTESTANTES: comentários coord. por Ludovico Gamus.
TB – TRAD. BRASILEIRA, de 1917. LEB - EDIÇÕES LOYOLA, 1983, prepara pela Liga de
BLH - LINGUAGEM DE HOJE, lançada no Brasil pela Estudos Bíblicos.
SBB em 1988. BF - BÍBLIA FÁCIL, 1984, Tradução de Frei Paulo
NVI - NOVA VERSÃO INTERNACIONAL, lançada no Avelino de Assis, editada pelo CBC.
Brasil em 1993, pela SBI. EP - EDIÇÃO PASTORAL, 1990, Edições Paulinas.
BÍBLIA COM AJUDAS ADICIONAIS, traduzidas das
Línguas originais, Alfalit Brasil, em 1998. VERSÕES ECUMÊNICAS:
NTLH - NOVA TRADUÇÃO NA LINGUAGEM DE JER - BÍBLIA DE JERUSALÉM, 1982, Paulinas.
HOJE, SSB, 2000. TEB - TRADUÇÃO ECUMÊNICA BRASILEIRA, 1995.

VERSÕES CATÓLICAS: FIG - ANTÔNIO PEREIRA DE AS PARÁFRASES:


FIGUEIREDO, 1821, SBBE. CH - CARTAS PARA HOJE, 1972, só as Epístolas, Ed.
MS - MATOS SOARES, 1957, preparada pelo CBC, Vida Nova.
publicada pela Ed. Ave Maria Ltda. BV - BÍBLIA VIVA, 1981, publicada pela Editora Mundo
VERSÃO DOS PADRES CAPUCHINOS, 1968, Difusora Cristão. Tradução da “The living Bible”.

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PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO GRAMATICAL ATENÇÃO: Isso é nítido, por exemplo, na


advertência de Paulo, “Acautelai-vos dos
AS FIGURAS DE LINGUAGEM DA BÍBLIA cães...”(Fp3.2), ou na afirmação de Tiago, “...a
língua é fogo...” (Tg 3.6).

c) AS FIGURAS DE LINGUAGEM TORNAM OS


CONCEITOS ABSTRATOS OU INTELECTUAIS
MAIS CONCRETOS: A frase “... por baixo de ti
estende os braços eternos” (Dt 3.27)
certamente transmite uma idéia mais concreta
do que a afirmação: O Senhor cuidará de ti e te
sustentará.

d) AS FIGURAS DE LINGUAGEM FICAM MAIS


BEM REGISTRADAS NA MEMÓRIA: A
afirmação de Oséias “Como vaca rebelde se
Alguém definiu as figuras de linguagem da
rebelou Israel...”(Os 4.l6) é mais fácil de
seguinte forma: “Uma figura é meramente uma
lembrar do que se ele tivesse escrito: “Israel é
palavra ou frase colocada de forma diferente de seu
extremamente teimoso”. Os escribas e os
emprego ou sentido original simples”.
fariseus dificilmente esqueceriam as palavras
de Jesus: “...sois semelhantes aos sepulcros
FIGURA DE LINGUAGEM: São todos os
caiados, que por fora se mostram belos, mas
modos de falar e escrever que, fugindo as regras
interiormente estão cheios de ossos de mortes,
comuns da gramática, dão mais beleza, mais graça,
e de toda imundícia”(Mt 23.27).
mais força, mais gravidade à expressão.

e) AS FIGURAS DE LINGUAGEM SINTETIZAM


POR QUE SE UTILIZAM FIGURAS DE
UMA IDÉIA: A famosa metáfora “o Senhor é o
LINGUAGEM? 35, 36
meu Pastor ” (Sl 23.1) transmite com brevidade
mutuas idéias sobre o relacionamento do
a) AS FIGURAS DE LINGUAGEM
Senhor com os seus.
ACRESCENTAM COR E VIDA : “O SENHOR é
a minha rocha” (Sl 18.2) é uma forma colorida e
f) AS FIGURAS DE LINGUAGEM ESTIMULAM A
viva de dizer que eu posso depender do
REFLEXÃO: Seu brilho leva o leitor a parar e
Senhor, pois Ele é forte e inabalável.
pensar. Quando lê Sl 52.8 - “quanto a mim,
porém, sou como a oliveira verdejante, na casa
b) AS FIGURAS DE LINGUAGEM CHAMAM A
de Deus...” - o leitor é desafiado a meditar nas
semelhanças que esse símile induz na mente.
35 BULLINGER, E. W. Diccionário de figuras de dicción usadas en
la bíblia. CLIE, Spaña, p. 2114-2123
36 EKDALL, Elizabeth Muriel. Versões da bíblia. São Paulo: Mundo
cristão, 1993. p. 112.

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ausente ou imaginária com se estivesse presente.


ALGUNS TIPOS DE FIGURAS DE LINGUAGEM Ex.: Sl 114.3,5, Mq 1.2, Sl 6.8.

FIGURAS DE LINGUAGEM QUE ENCERRAM 10. Eufemismo. Consiste na substituição de uma


SUBSTITUIÇÃO
expressão desagradável ou injuriosa por outra
inócua ou suave. Ex.:At 7.60; l Ts 4.13-15.
1. Metonímia. A metonímia consiste em substituir
uma palavra por outra. Ex.: Jr l8.l8, At ll.23, l Co
FIGURAS DE LINGUAGEM QUE ENCERRAM
10.21, Os 1.2, Mt 3.5, Mc 3.25, Hb 13.4.
OMISSÃO OU SUPRESSÃO

2. Sinédoque. É a substituição da parte pelo todo, 11. Elipse. É a omissão de uma palavra ou palavras
ou do todo pela parte. Ex.:Lc. 2.1,(ARC), Pv l.l6, Rm cuja falta deixa incompleta a estrutura gramatical.
l.l6, Jr 25.29, Rm l6.4. Às vezes uma adjetivo ligado a um substantivo vem
substituir ambos. Ex.:1 Co l5.5, 2 Tm 4.l8.
3. Merisma: É uma tipo de sinédoque em que a
totalidade ou o todo é substituído por duas partes 12. Zeugma. Consiste na associação de dois
contrastantes ou opostas. Ex.:Sl 139.2 substantivos a um mesmo verbo, quando pela
lógica o verbo só pede um substantivo. Ex.:Lc l.64.
4. Hendíade. Consiste na substituição de um único
conceito por dois termos coordenados(ligados por 13. Reticência. É uma interrupção repentina do
‘e’) em que um dos elementos define o outro. Ex.: discurso, como se o orador não tivesse podido
Fp 2.17, At 1.25 terminá-lo. Ex.: Ef 3.1,2, Lc l9.42.

5. Personificação. Quando ações humanas são 14. Pergunta retórica. É aquela pergunta que exige
atribuídas a objetos inanimados, a conceitos ou a resposta, seu objetivo é forçar o leitor a respondê-la
animais. Ex.: Is 55.12; 35.l, Rm 6.9, l Co 15.55 mentalmente e avaliar suas implicações. Ex.:Gn
l8.l4, Jr 32.27, Rm 8.31, Mt 26.55,Lc 11.11,12.
6. Antropomorfismo. Consiste na atribuição de
qualidades ou ações humanas a Deus.Ex.: Sl.8.3; FIGURAS DE LINGUAGEM QUE ENCERRAM
EXAGERO OU ATENUAÇÃO
31.2, 2 Cr l6.9.

15. Hipérbole. É uma afirmação exagerada em que se


7. Antropopatia. Atribui emoções humanas a Deus.
diz mais do que o significado literal com o objetivo
Ex.: Zc 8.2
de ênfase.Ex.:Dt l.28, Sl 6.6, Sl ll9.36, Mq 6.7, l Sm
l8.7.16. Litotes, Consiste numa frase suavizada ou
8.Zoomorfismo. Atribui características animais a
negativa para expressar uma afirmação. Ex.:At
Deus (ou a outros).Ex.: Sl 91.4, Jó l6.9.
21.39., Nm 13.33, At 12.18.
17. Ironia. É uma forma de ridicularizar
9. Apóstrofe. Consiste numa referência direta a um
indiretamente sob a forma de elogio. Ex.:2 Sm 6.20,
objeto como e fosse uma pessoa, ou a uma pessoa
1 Rs l8.27, Jó l2.2, Mc 7.9.

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Curso básico de teologia

verdade principal. Forçar cada detalhe do texto


CONSIDERAÇÕES SOBRE OS GÊNEROS dentro de algum esquema fantástico de significado
LITERÁRIOS37 é abusar do texto e do propósito original do autor.

4.2a) - INTERPRETAÇÃO DE UMA NARRATIVA INTERPRETAÇÃO DE PARÁBOLA

Geralmente se reconhece o fato de que Os perigos na interpretação: alegorização,


uma parábola foi contada para apresentar uma espiritualização.

37 GREEN, Joe B. How can I inderstand the bible. Michigan – É desta forma que um estudioso brilhante
EUA: Academie books,1985. p. 112.

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Curso básico de teologia

como foi Agostinho, ofereceu a seguinte A poesia hebraica difere da nossa, por que
interpretação da parábola do bom samaritano, Lc não depende de rima ou ritmo. O fator principal é
10.25-37: seu paralelismo de pensamento. As idéias de uma
Certo homem descia de Jerusalém para Jericó – linha se equilibram com as da seguinte. O
Adão Jerusalém – a cidade celestial de paz, da
qual Adão Caiu paralelismo sinonímico ocorre quando o
Jericó – a lua, assim significa a mortalidade de
pensamento da primeira linha está de acordo com
Adão
salteadores – o Diabo e seus anjos lhe o da segunda ( Jó 9.11). O paralelismo antitético
roubaram – a saber: a sua imortalidade
lhe causaram ferimentos – ao persuadi–lo ocorre quando o pensamento da segunda linha
pecar contrasta com o da primeira (Jó 16.4,5). O
deixando-o semimorto, como homem vivo,
mas que morreu espiritualmente; está paralelismo sintético é o arranjo que faz a segunda
semimorto, portanto
O sacerdote e o levita – o sacerdócio e linha melhorar ou completar o pensamento da
ministério do Antigo Testamento primeira. (Jó 11.18)
O samaritano – diz–se que significa
Guardador; logo a referência é ao próprio
cristo
pensou–lhe os ferimentos – significa restringir Identificar as figuras de linguagem
o constrangimento ao pecado
óleo – o consolo da boa esperança
vinho – a exortação para trabalhar com um Estudar o contexto histórico do Salmo e ler
espírito fervoroso
animal – a carne da encarnação de Cristo a introdução do mesmo.
hospedaria – a igreja Descobrir a idéia central do Salmo e
dia seguinte – depois da ressurreição
dois denários – a promessa desta vida e do expressar esta idéia numa afirmação concisa e
porvir
hospedeiro – Paulo.38 clara.

Apesar do colorido dessa interpretação por INTERPRETAÇÃO DE PROVÉRBIOS.


Agostinho, podemos ter a certeza de que não era
isso o que Jesus queria dizer quando proferiu a Reconhecer as particularidades do gênero
parábola do Bom Samaritano. Afinal de contas, o literário de Provérbios.
contexto claramente exige uma compreensão de
relacionamentos humanos (“Quem é o meu Determinar se o princípio que está sendo
próximo?”), e não os relacionamentos divino ensinado, é uma promessa ou um princípio
humano; e não há motivo para pensar que Jesus iria geral que admite exceções.
predizer a existência e ação da Igreja e de Paulo de
forma tão complexa. 39 Correlacionar o princípio com outros
textos e exemplos bíblicos, especialmente
INTERPRETAÇÃO DE POESIA. Requisitos amarrando o princípio com alguma verdade do
básicos: N.T., se for possível.

Identificar o tipo de Salmo Determinar os pontos de contato entre o


princípio e o nosso mundo e a nossa cultura, para
38 FEE, Gordon et all. Entendes o que lês? São Paulo: Vida Nova:
1984. p. 22. poder aplicar o texto em termos práticos e
39 OLIVEIRA, Raimundo Ferreira de. Como estudar e interpretar a
bíblia. 12a ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2005. p. 121. contextuais.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 19


Curso básico de teologia

As máximas de Provérbios não são PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO HISTÓRICA


promessas absolutas, mas princípios gerais
baseadas na observação cuidadosa da experiência 1) - O MUNDO DA BÍBLIA
humana.
Muitas das máximas proverbiais devem ser A importância do contexto e ambiente
reconhecidas como diretrizes gerais, não como
observações absolutas; não são promessas Às vezes abrimos um texto bíblico e
couraçadas. ficamos “boiando” quanto ao significado do texto.
Por que isso acontece? A resposta é simples: Os
INTERPRETAÇÃO DE PROFECIAS. textos foram produzidos a muitos anos atrás, num
idioma diferente do nosso, numa cultura diferente
A interpretação de profecias é uma tarefa da nossa e também numa região um pouco
árdua. Na Bíblia encontramos profecias que já se diferente da nossa.
cumpriram e muitas outras que irão se cumprir.
Para interpretarmos as profecias, precisamos da Por causa desse abismo, precisamos voltar
atuação do Espírito Santo. Além disso precisamos ao passado, numa tarefa árdua, e buscar, através de
pesquisar bem os comentários e também fazer pesquisa, o real significado que o autor estava
pesquisas sobre a profecia. No decorrer da história, querendo transmitir para os seus leitores originais.
muitos estudiosos já trabalharam em cima do
assunto e, mesmo assim, a escatologia atual a) Tempo
apresenta muitos seguimentos distintos.
A Bíblia começou a ser escrita há
A palavra escatologia vem do grego aproximadamente 1450 anos antes de Cristo.
eskatos + logia = O estudo das últimas coisas, dos Por volta do ano 400 a.C., foi escrito o
últimos acontecimentos. Há entre os cristãos, último livro do Velho Testamento – Malaquias. Já o
muitas opiniões diferentes em relação aos Novo Testamento teve o seu primeiro livro escrito
acontecimentos futuros. Elas dizem respeito por volta do ano de 45 e o último, perto do ano 90
principalmente com relação à tribulação e ao depois de Cristo. Sendo assim, o leitor da Bíblia
milênio. O presente estudo não tem como objetivo deve estar ciente de que se trata de um documento
descrever detalhadamente os diversos pontos de antigo, escrito em épocas específicas, com
vista, mas, simplesmente apresentar um quadro propósitos específicos e para grupos específicos.
panorâmico do futuro. É aconselhável aos alunos Não podemos deixar esse detalhe de lado.
que queiram se aprofundar no assunto, ler e
comparar vários livros que tratam do assunto.
Interprete uma palavra observando o
sentido que tinha no tempo do autor, verificando
sua relação com o contexto e com o restante do
livro.

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Curso básico de teologia

b) Idioma c) Cultura

A cultura é um conjunto de
Os escritos originais do Antigo Testamento
comportamentos, crenças, valores morais,
foram escritos em hebraico, e uma pequena parte
espirituais e materiais característicos de uma
em aramaico. Já o Novo Testamento foi escrito em
sociedade. Mesmo dentro do Brasil, encontramos
grego koiné. sendo que muitas palavras aparecem
comportamentos diferentes nas mais diversas
apenas uma vez na Bíblia, tornando o trabalho de
regiões. Nomes de alimentos e animais recebem
tradução muito árduo. A versão em português, feita
nomes diferentes, a maneira de se comunicar muda
por João Ferreira de Almeida já sofreu inúmeras
bastante. O mesmo acontece com a maneira de
alterações. Nos últimos anos a arqueologia tem
viver onde os hábitos mudam completamente de
descoberto manuscritos que têm colaborado no
uma região para outra. O mesmo encontramos na
trabalho de busca do texto original 40
. O bom
Bíblia. Além da questão do tempo, da questão dos
interprete é aquele que leva este detalhe em
idiomas, temos também levar em consideração as
consideração. Os comentários, muitos em
diversas culturas em que a história bíblica se deu.
português, nos apresentam estudos de palavras
Dada a existência de um abismo cultural
que, certamente, nos darão uma maior
entre nossa era e os tempos bíblicos - e como o
compreensão do sentido que o autor original
nosso objetivo na interpretação bíblica é descobrir
queria dar ao texto. Fazer uma interpretação
o sentido original das Escrituras - é imperativo que
baseada apenas na tradução da Bíblia em
nos familiarizemos com a cultura e os costumes de
português, sem nenhum outro critério de
então.
investigação, poderá resultar em uma verdadeira
Uma grande dificuldade dos leitores da
catástrofe teológica.
Bíblia é saber se as práticas de cada cultura devem
Hebraico V.T. Também chamado de
ser repetidas ainda hoje, ou se foram apenas
Judaico, Neemias 13.24, ou a língua de Canaã.
temporárias.
Aramaico - Daniel 2,4,7,8 - Esdras 4.8 -
No quadro abaixo, coloque P se o
6:18 - Jeremias 10.11. Era a língua falada pelos povos
mandamento for permanente e T se for
ao norte e nordeste de Canaã, da Síria até o alto
temporário, ou seja, somente para a época em que
Eufrates.
foi escrito.
Grego N.T. - Alexandre dominou o mundo
com o império Grego-Macedônico, e levou o grego 01 Cumprimentar uns aos outros com
ósculo santo – Rm 16.16
Koiné, “comum”, que passou a ser falado em 2/3 do
02 Lavar os pés uns dos outros – Jo 13.14
mundo da época.
03 Proibir as mulheres de falar na igreja – 1
Co 14.34
40 Não existem mais os escritos originais da Bíblia, tanto do Velho 04 Cantar salmos, hinos e cânticos
como do Novo Testamento. O que temos hoje são cópias, umas mais espirituais – Cl 3.16
antigas e outra bem mais recentes. As traduções que possuímos são,
05 Celebrar a ceia do Senhor – 1 Co 1.24
em termos gerais, fiéis ao texto original. Elas foram feitas por
homens capazes, que possuíam muito conhecimento dos idiomas 06 Ungir os enfermos com óleo – Tg 5.14
grego e hebraico. A cada dia a arqueologia vai descobrindo
07 Abster-se de relações sexuais ilícitas – At
manuscritos que vão lançando luzes sobre algumas partes dos textos
duvidosos. Com isso, e com as revisões nas edições, o texto em
15.29
português está ficando cada vez mais fiel aos originais.

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Curso básico de teologia

08 Ser circundado – At 15.5 b) As palavras têm, quase sempre, mais

09 Levantar as mãos ao orar – 1 Tm 2.8 que um significado.

10 Dizer amém ao final das orações – 1 Co Exemplos: Casa, pegar, peça, passo, amor etc.
14.16 c) As palavras são convenções que podem
11 Lançar sortes para ocupação dos cargos variar geograficamente e cronologicamente. Por
da igreja – At 1.26
isso, é necessário dar atenção ao contexto, para a
12 Deve haver sete diáconos na igreja – At
6.3 autoria e para a situação histórica em que a palavra
13 Falar em línguas e profetizar – 1 Co 14.5 aparece.
14 Tomar ceia num único cálice – Mc 14.23
15 Os homens não devem usar cabelo O VALOR DO ESTUDO DE UM VOCÁBULO
comprido – 1 Co 11.14

Ajuda a definir e esclarecer um campo


semântico, o que torna mais fácil e honesta a
d) Geografia bíblica
aplicação de determinado sentido num contexto
qualquer. É também uma fonte de ilustrações.
O estudo da geografia de uma determinada
região, irá ajudar em muito o estudante da Bíblia. A
Princípio para o estudo de vocábulos
região onde foi realizada a história bíblica, também
conhecida como crescente fértil, é marcada de
1. Ele deve ser histórico. Uma palavra
contrastes e muita beleza. Nela temos desertos,
pode assumir vários significados no decorrer da
vales, montes, rios e mares. Parte da história foi no
história da língua. Por isso, o estudante precisa
deserto, numa região seca. Outra parte foi realizada
conhecer os possíveis significados da palavra.
nos montes e vales. Cada lugar servia de inspiração
Mateus 5:18 Porque em verdade vos digo: até que o
para o escritor, que usava as características da
céu e a terra passem, nem um i ou um til jamais
região para enriquecer aquilo que estava querendo
passará da Lei, até que tudo se cumpra..33
dizer. O estudante da Bíblia precisa ter estes mapas
2. Ele deve ser contextual. Uma vez
em mãos, em forma de quadros ou transparências
descobertos os possíveis significados de uma
para enriquecer o que está sendo ministrado.
palavra, o propósito do estudo de vocábulos é
determinar o sentido real daquela palavra num
2) O ESTUDO DE VOCÁBULO
determinado contexto, tal como usada por um
determinado escritor numa ocasião específica.
a) As palavras são os ossos com que se
forma o esqueleto sintático de uma passagem.
A preparação para o estudo de vocábulo
Assim, o estudante não pode entender
precisamente uma frase se não entender o sentido
Numa passagem bíblica todas as palavras
de cada palavra. Elas são convenções utilizadas por
são importantes, pois é através delas que se forma a
um grupo de indivíduos para descrever conceitos
mensagem. Mas algumas delas são cruciais na
mentais.
busca de um entendimento do texto. Algumas
palavras, devidamente definidas, abrem ao

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Curso básico de teologia

observador uma melhor compreensão do texto. aos nossos contemporâneos do que o Novo
Testamento.
PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO TEOLÓGICA c) Avaliar a extensão do conhecimento teológico
disponível ás pessoas daquele tempo. Que
Regra um: Para compreender a Bíblia conhecimento prévio haviam elas recebido? (Nos
teologicamente, devemos antes verificar as livros que tratam de hermenêutica, ás vezes este
regras gerais de interpretação, bem como as conhecimento prévio é mencionado como
gramaticais e históricas. “analogia da Escritura”.) Bons textos de teologia
bíblica podem revelar-se muito úteis a este
Regra dois: Para entender a Bíblia respeito.
teologicamente, devemos considerar o AT e o d) Determinar o significado que a passagem
NT como uma unidade. possuía para seus primitivos destinatários á luz do
conhecimento que tinham.
Regra três: Quando duas doutrinas bíblicas e) Descobrir o conhecimento complementar acerca
parecem contraditórias, devemos aceitar deste ponto que hoje temos disponível em virtude
ambas como verdadeiras,até posterior de revelação posterior.(Nos livros de hermenêutica,
confirmação em outra unidade. ás vezes este ponto é mencionado como a “analogia
da fé”).
APLICAÇÃO DAS REGRAS DE INTERPRETAÇÃO
TEOLÓGICA
BIBLIOTECA DO ESTUDANTE (INTÉRPRETE)
DA BÍBLIA
Os passos dessa analise são:

Tipos de livros recomendados 41


a) Determinar seu próprio ponto de vista da
natureza do relacionamento de Deus como o 1. O estudante deve ter acesso aos textos nas
homem. A coleta de provas, a estruturação das línguas originais da Bíblia. Texto hebraico-
perguntas, e a compreensão de determinados aramaico do Velho Testamento e texto grego para o
textos apresentados neste capitulo são, sem duvida Novo Testamento. Além de ter os textos deve se
alguma, tendenciosos pelas concepções que o autor esforçar por aprender o máximo destas línguas que
possui de uma visão bíblica da historia da salvação. puder. Caso contrário poderá ser acusado, com
A conclusão deste passo é por demais importante certa justiça, de estar interpretando um livro que
para adotar a de outrem sem que o próprio leitor não sabe ler.
considere cuidadosamente e em espírito de oração 2. Várias traduções ou versões da Bíblia são
a evidência. outro elemento essencial na boa biblioteca de
b) Descobrir as implicações deste ponto de vista estudos bíblicos. Procure ter as melhores em
para a passagem que está sendo estudada. Por português. Se tiver fluência em outras línguas,
exemplo, uma posição sobre a natureza da relação utilize também boas versões nesses idiomas.
de Deus com o homem, basicamente descontinua,
41 BOST, Bryan Jay; PESTANA, Álvaro César. Do texto à
verá o Antigo Testamento como menos pertinente
paráfrase. SP: EVC, 1992. p. 111.

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Curso básico de teologia

3. Gramáticas das línguas originais e da língua doutrinas “cristãs”.


portuguesa. Para exegese as primeiras são muito 15. Livros de hermenêutica.
mais importantes que a Segunda. As gramáticas vão 16. Livros sobre comunicação. Aqui estão
ajudar a elucidar o sentido dos textos. São obras de incluídos livros de pedagogia, homilética, redação e
difícil consulta, geralmente, mas trazem muitos psicologia.
benefícios. Ressalvando-se as gramáticas que fazem 17. Livros de teologia bíblica. Deve-se observar no
afirmações doutrinárias e teológicas ao invés de entanto o fato de que esses livros podem ser
permanecerem simples gramáticas. dogmáticos demais ou liberais ao extremo.
4. Concordâncias bíblicas. Eis a rainha da
biblioteca do estudante. É melhor ter várias, nas
CONCLUSÃO
línguas originais e exaustivas, ou seja, aquelas que
Quando vamos estudar uma passagem das
possuem todas as citações de um palavra no texto
Escrituras, não podemos fazer interpretações sem
bíblico.
nenhum critério, pelo contrário, as regras de
5. Sinopses são ferramentas muito úteis para o
interpretação precisam ser colocadas em prática. O
estudo de textos paralelos. Geralmente
ideal é que essas regras sejam memorizadas e
encontramos com facilidade as sinopses dos
exercitadas diariamente nas narrativas, nas poesias,
evangelhos. Pode haver também dos livros e textos
provérbios e profecias.
do Velho Testamento e das Epístolas do Novo. O
É notório que, inicialmente, a observação
estudante não deve desprezar este tipo de obra.
dos princípios acima poderá parecer um pouco
6. Não podem faltar os léxicos, ou seja, dicionários
complicada. Alguns, vendo a grandeza da tarefa,
das línguas originais em que a Bíblia foi escrita.
poderão até pensar em desistir. Quero incentivá-los
7. Dicionários Bíblicos. Podem ser de vários
a perseverarem. Deus recompensa nosso esforço de
tipos.
buscarmos entender melhor a sua Palavra.
8. Dicionários da língua portuguesa. Eles não
Alguém certa vez disse que isso assemelha-
são autoridades para definir o sentido das palavras
se a andar de bicicleta. Nas primeiras vezes que
na Bíblia, mas indicam como a palavra é usada na
tentamos tivemos dificuldades. Alguém nos
atualidade.
empurrava e, mesmo com rodinhas, levávamos uns
9. Comentários bíblicos, se usadas de modo certo
bons tombos! Com o tempo, porém, fomos
são ótimas ferramentas de estudo.
adquirindo confiança e coordenação. Começamos a
10. Os livros de introdução bíblica, pois abordam
pedalar com firmeza e ganhamos equilíbrio. Não
o estudo amplo de um determinado livro da bíblia.
precisamos mais de quem nos empurrasse. Depois,
11. Livros que estudam o cenário da época
foram retiradas as rodinhas, e hoje passeamos
bíblica.
prazeirosamente com nossas bicicletas. Sentamos
12. Atlas bíblicos, livros de geografia bíblica,
no selim, e nem notamos que estamos tendo de
livros de história bíblica e livros de
coordenar um monte de movimentos ao mesmo
arqueologia.
tempo. O mesmo ocorre com a hermenêutica.
13. Livros sobre crítica textual e sobre a história
Depois de certo tempo, adquiriremos o hábito de
da Bíblia e suas traduções.
caminhar seguindo a trilha destas regrinhas, e
14. Livros sobre a história da igreja e das

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Curso básico de teologia

exploraremos as ruas do Antigo e Novo DYCK, Elmer (Org.). Ouvindo a Deus: uma abordagem
multidisciplinar da leitura bíblica. São Paulo: Shedd,
Testamentos. Faremos isso prazerosamente, sem 2001. 223p.
tantas dificuldades. Aqui, é claro, termina a
FEE, Gordon et all. Entendes o que lês? São Paulo: Vida
similaridade com o treinamento na bicicleta. No Nova: 1984.

caso da interpretação bíblica, jamais poderemos FERREIRA, Júlio Andrade Ferreira. Bíblia – enigma da
literatura. São Paulo: LPC, 1985. p. 192.
dispensar a ajuda de nosso treinador: o Espírito
Santo. Ele sempre estará conosco neste caminho, e GRENZ, Stanley J.; OLSON,Roger E. Quem precisa de
teologia? SP: Vida, 2002. 159p.
nosso destino será a terra da boa doutrina, de onde
poderemos encontrar ao Senhor Jesus Cristo, e GUNNEWEG, Antonius H. Hermenêutica do Antigo
Testamento. São Leopoldo-RS: Sinodal, 2003. 251p.
desfrutar por ele do gostoso fruto da árvore da vida.
HALL, Christopher A. Lendo as escrituras com os pais
A Deus toda honra e toda glória. da igreja. Viçosa-MG: Ultimato. 2003. 207p.

HENRICHSEN, Walter A. Princípios de interpretação


da bíblia. 2a ed. São Paulo: Mundo cristão. 1986. 72p.

L Onde ler mais! LEVIE, Jean. A bíblia mensagem de Deus em palavras


humanas. São Paulo: Paulinas, 1963. 264p.
ALVES, Roberto. Exegese: a arte de interpretar a bíblia.
LOPES, Augusto Nicodemos. A bíblia e seus
Rio de Janeiro: Alfalit, 2000. 204p.
interpretes: uma breve história da interpretação. São
Paulo: Editora cultura cristã, 2004. 287p.
ANGUS, Joseph. História, doutrina e interpretação da
bíblia. Vol. 1, 1951, RJ. p.345.
LUND, E. Hermenêutica. São Paulo: Vida, 1986. 126p.
BAZAGLIA, Primeiros passos com a bíblia. 2a Ed. São
MAGGI, Alberto. Como ler o evangelho sem perder a
Paulo: Paulus. 2004. 39p.
fé. São Paulo: Loyola,1999. 143p.
BEEK, Joel. Sola scriptura. São Paulo: ECC, 2000. 219p.
MAINVILLE, Odette. A bíblia à luz da história: guia de
exegese histórico-crítica. São Paulo:
BERKHOF, Louis, Princípios de interpretação bíblica.
Paulinas, 1999. 159p.
2a ed. São Paulo: Editora cultura cristã. 2004. 140p.
MOSCONI, Luis. Para uma leitura fiel da bíblia. São
BLANKENBAKER, Frances. Quero entender a bíblia.
Paulo: Loyola. 1996. 231p.
Rio de Janeiro: CPAD, 1999. 367p.
OLIVEIRA, Raimundo Ferreira de. Como estudar e
BOST, Bryan Jay; PESTANA, Álvaro César. Do texto à
interpretar a bíblia. 12a ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2005.
paráfrase: como estudar a bíblia. São Paulo: Editora
151p.
Vida cristã. 1992. 116p.
PAROSCHI, Wilson. Crítica textual do Novo
BRUGGEN, Jakob Van. Para ler a bíblia. São Paulo:
Testamento. São Paulo: Vida Nova. 2004. 248p.
Editora cultura cristã. 1998. 191p.
RICOEUR, Paul. Ensaios sobre a interpretação
BUZZETTI, Carlo. 4 x 1 Um único trecho bíblico e
bíblica. São Paulo: Novo Século, 2004. 184p.
vários “fazeres”: guia prático de hermenêutica e
pastoral bíblica. São Paulo: Paulinas, 1997. 298p.
SOBRINHO, Antonieto Grangeiro. Hermenêutica
bíblica. Rio de Janeiro: CPAD, 1981.95p.
CARSON, D. A. A exegese e suas falácias: perigos na
interpretação da bíblia. São Paulo: Vida Nova, 1992. 144p.
STEIN, Robert H. Guia básico para a interpretação da
bíblia. 4a ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2002. 224p.
COMFORT, Philp Wesley. A origem da bíblia. Rio de
Janeiro: CPAD, 1998. 440p.
STUART, Douglas; FEE Gordon. Entendes o que lês?
São Paulo: Vida Nova. 330p.
CONCEIÇÃO, Adaylton de. Introdução ao estudo da
exegese bíblica. Rio de Janeiro: CPAD. 1985. 112p.
ZUCK, Roy B. A interpretação bíblica: meios de
descobrir a verdade bíblica. São Paulo: Vida
DOCKERY, David S. Hermenêutica contemporânea à
Nova, 2005. 356p.
luz da igreja primitiva. São Paulo: Vida, 2005. 301p.

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Curso básico de teologia

técnica e algo mais. Esse algo mais é o milagre do


Espírito Santo.
Aos quarenta anos de idade, Moisés

HOMILÉTICA conhecia todas as técnicas dos mais variados ramos


do conhecimento humano. Anos depois, quando
Deus o desafiou a tornar-se pregador, o erudito
Moisés respondeu: "Ah! Senhor! Eu nunca fui
eloqüente..." (Êx 4.10). Faltava a Moisés algo mais: o
como preparar e pregar milagre! Foi esse milagre que Deus lhe ofereceu
quando disse: "Vai, pois, agora, e eu serei com a tua
sermões bíblicos boca, e te ensinarei o que hás de falar" (4.12).
Mesmo com relutância, Moisés aceitou o milagre e
tornou-se pregador e líder.
Ao contemplar a santidade de Deus, Isaías
sentiu-se um inútil pecador e exclamou: "Ai de
Introdução:
mim... porque sou homem de lábios impuros" (Is
6.5). Ele sentiu que seus lábios impuros o
A pregação bíblica é um milagre duplo. O
desqualificavam para qualquer contato com a
primeiro milagre é Deus usar um homem
Divindade, principalmente para ser-lhe um porta-
imperfeito, pecador e cheio de defeitos para
voz. Faltava a Isaías um milagre. Finalmente, um
transmitir a perfeita e infalível Palavra de Deus.
anjo tocou-lhe os lábios com a brasa viva do altar
Trata-se de um Ser perfeito usando um ser
de Deus, e, só após esse milagre, Isaías sentiu-se em
imperfeito como seu porta-voz. Só um milagre
condições de ser um porta-voz de Deus e aceitou o
pode tornar isso possível. O segundo milagre é
desafio: "Eis-me aqui, envia-me a mim" (6.8). Da
Deus fazer com que os ouvintes aceitem o porta-
mesma forma, o pregador de hoje também é
voz imperfeito, escutem a mensagem por
homem de impuros lábios, mas que, tocado pela
intermédio do pecador e finalmente sejam
brasa viva do altar, pode tornar-se um porta-voz de
transformados por essa mensagem. Esse é o grande
Deus e ser usado no milagre da pregação.
milagre da pregação!42
Por incrível que pareça, é essa mistura do
Ao iniciar um estudo sobre como fazer
humano com o divino que dá poder à pregação.
uma boa pregação, algo deve ser dito: as técnicas
Segundo BROOKS (1989)43, a pregação é a
são indispensáveis, até porque é senso comum em
"apresentação da verdade através da
diversos autores considerados especialistas no
assunto e são também pela experiência de personalidade", e foi Deus quem escolheu essa
pregadores bem-sucedidos. Contudo, uma coisa combinação da verdade perfeita com a
precisa ficar muito clara: todas as técnicas reunidas personalidade imperfeita para dar poder à
e colocadas em prática não fazem de alguém um pregação. Em outras palavras, o pregador usa as
pregador. Para ser um bom pregador é preciso ter características de sua personalidade, como

42 MARINHO, Robson Moura. A arte de pregar: a comunicação na 43 BROOKS, Phillips. The joy of preaching. Grand Rapids: Kregel
homilética. SP: Vida Nova, 2004. p.15 Publications, 1989. p.165.

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Curso básico de teologia

conhecimento, habilidade, voz, pensamento, e a aplicar a avançada estilística. Não se pode ignorar o
sua vida para transmitir a verdade divina, e essa perigo de substituir a pregação do evangelho pelas
união do divino com o humano tem o poder de disciplinas seculares e de adaptar a pregação do
alcançar outros seres humanos e transformá-los. evangelho às demandas do secularismo. A relação
Isto é pregação: um poderoso milagre de entre a homilética e as ciências modernas é de
Deus, o infinito fluindo por via finita, o perfeito caráter secundário e horizontal; pois as Escrituras
chegando até nós por meio do imperfeito, a Sagradas são a fonte primária, a revelação vertical,
santidade sendo transmitida através de pecadores, o fundamento básico de toda a homilética
e isso tem o poder de transformar outros evangélica.
pecadores. Por isso, o apóstolo Paulo escreveu aos
Coríntios:
Com essa visão da pregação como um
Eu, irmãos, quando fui ter convosco,
milagre de Deus, passemos a considerar os anunciando-vos o testemunho de Deus, não o
elementos técnicos e estratégicos que Deus deseja fiz com ostentação de linguagem, ou de
sabedoria. Porque decidi nada saber entre
utilizar nessa mistura do humano com o divino, ou vós, senão a Jesus Cristo, e este crucificado. E
foi em fraqueza, temor e grande tremor que
seja, os recursos da personalidade para transmitir a eu estive entre vós. A minha palavra e a
verdade. minha pregação não consistiram em
linguagem persuasiva de sabedoria, mas em
demonstração do Espírito e de poder, para
que a vossa fé não se apoiasse em sabedoria
humana; e sim, no poder de Deus (1 Co 2.1-5).
Parte 1
NOÇÕES GERAIS DE HOMILÉTICA

Como disciplina teológica, a homilética


pertence à teologia prática. As disciplinas que mais
se aproximam da homilética são a hermenêutica e a
exegese. Enquanto a hermenêutica interpreta um
O DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA
texto bíblico à luz de seu contexto; a exegese expõe
HOMILÉTICA
um texto bíblico à luz da teologia bíblica; e a
homilética comunica um texto bíblico à luz da
O modelo predominante no período
pregação bíblica.
profético era a palavra vinda diretamente do
Assim, a homilética depende amplamente
Senhor ("assim diz o Senhor") que os profetas
da hermenêutica e da exegese. Homilética sem
anunciavam e ilustravam em suas próprias vidas:
hermenêutica bíblica é trombeta de som incerto (1
Co 14.8) e homilética sem exegese bíblica é a mera • nomes dos filhos (Is 7.3, 8.3);
• cinto (Jr 13.1-11);
comunicação de uma mensagem humanista e • o vaso do oleiro (Jr 18.1-17);
morta. • a botija quebrada (Jr 19.1-15);
• a morte da mulher de Ezequiel (Ez 24.15-
A homilética deve valer-se dos recursos da
27).
retórica (assim como da eloqüência), utilizar os Após o exílio, desenvolveu-se a homilia
meios e métodos da comunicação moderna e primitiva, em que passagens das Escrituras

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 27


Curso básico de teologia

Sagradas eram lidas em público ou nas sinagogas A Idade Média não foi além de Agostinho,
(Ne 8.1-18). mas produziu coletâneas famosas de sermões,
Por volta de 500-300 a. C., os gregos atualmente publicadas em forma de livros
Sócrates, Platão e Aristóteles desenvolveram a devocionais. (A homilética era quase a única forma
retórica, aperfeiçoada pelos romanos na forma da de oratória conhecida.) O maior pregador latino da
oratória (principalmente Cícero, em cerca de 106-43 Idade Média foi Bernardo de Claraval (1090-1153).
a. C.). Graças a Carlos Magno (768-814), a pregação era
Jesus, no entanto, pregou o evangelho do feita na língua do povo e não exclusivamente em
reino de Deus com simplicidade, utilizando latim.
principalmente parábolas (Mt 13.34s.; Mc 4.10-12, 33, A grande inovação da Reforma Protestante foi
34) e aplicando textos do Antigo Testamento à Sua tornar a Bíblia o centro da pregação. Os discursos
própria vida (Lc 4.16-22). éticos e litúrgicos foram substituídos pela pregação
Uma análise do livro de Atos revela cinco evangélica das grandes verdades bíblicas, versículo
elementos básicos comuns às mensagens por versículo. Martinho Lutero (1483-1546) e João
apostólicas: Calvino (1509-1564) expuseram quase todos os
• o Messias prometido no Antigo livros da Bíblia em forma de comentários que,
Testamento;
ainda hoje, possuem vasta aceitação acadêmica e
• a morte expiatória de Jesus Cristo;
• Sua ressurreição pelo poder do Espírito espiritual. Os líderes da Reforma Protestante deram
Santo; à pregação um novo conteúdo (a graça divina em
• a gloriosa volta de Cristo;
• e o apelo ao ouvinte para que se Jesus Cristo), um novo fundamento (a Bíblia
arrependesse e cresse no evangelho. Sagrada) e um novo alvo - a fé viva.

A maioria dos cristãos antigos, portanto,


Enquanto Lutero enfatizava o conteúdo da
seguiu o exemplo da sinagoga, lendo e explicando
pregação do evangelho (a justificação pela fé),
de modo simples e popular as Escrituras do Antigo
Filipe Melanchthon (1497-1560) ressaltava o
e Novo Testamento. Não se percebe muito esforço
método e a forma da pregação. Como humanista
em estruturar um esboço homilético ou um tema
convertido, Melanchthon escreveu, em 1519, a
organizador. A homilia cristã apenas (segue a
primeira retórica evangélica, seguida de duas
ordem natural do texto da Escritura e visa
publicações homiléticas, em 1528 e 1535,
meramente ressaltar, mediante a elaboração e
respectivamente. Melanchthon sugeriu enfatizar a
aplicação, as sucessivas partes da passagem como
unidade, um centro organizador, um pensamento
esta se apresenta). 44
principal para o texto a ser pregado. A pregação
As primeiras teorias homiléticas
evangélica deveria incluir: introdução, tema,
encontram-se nos escritos de Crisóstomo (345-
disposição, exposição do texto e conclusão.
407), o mais famoso pregador da igreja primitiva. A
primeira homilética foi escrita por Agostinho,
OS PROBLEMAS DA HOMILÉTICA
(354-430) em De Doctrina Christiana.

A palavra de Deus afirma que "a fé vem pela


44 KOLLER, C. W. Pregação Expositiva sem Anotações. São Paulo:
Mundo Cristão, 1984), p. 21. pregação e a pregação pela palavra de Cristo" (Rm

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10.17). Como é possível, então, que surjam • Falta de prioridade da mensagem no culto.
50
dificuldades quando esta palavra é proclamada?
• Falta de um bom planejamento ministerial.
O problema não está na palavra em si, porque 51

“a palavra de Deus é viva e eficaz, e mais cortante Há vários outros motivos que resultam em
do que qualquer espada de dois gumes, e penetra problemas para a homilética. Além das dificuldades
até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e já mencionadas, devemos lembrar que a pregação
medulas, e apta para discernir os pensamentos e vem sendo desvalorizada pela secularização que
propósitos do coração" (Hb 4.12). atinge nossas igrejas. Muitas famílias preferem
O problema não está na Palavra de Deus, mas assistir ao "Fantástico", em vez de ouvir uma
em sua proclamação, quando feita por pregadores mensagem simplesmente exortativa e moralista. Há
que não admitem suas imperfeições homiléticas também a questão da grande diversidade de igrejas
pessoais! Atualmente, as dificuldades mais comuns e pregadores evangélicos, o que facilita à família
da pregação bíblica encontram-se nas seguintes recém-chegada optar entre o pregador eloqüente e
áreas: popular e a igreja com status. Além disso, o estresse

• Falta de preparo adequado do pregador.45 do dia-a-dia faz com que, mesmo no domingo, não
• Falta de unidade corporal na prédica. 46
haja mais o sossego necessário para reflexões
• Falta de vivência real do pregador na fé espirituais profundas.
cristã. 47
• Falta de aplicação prática às necessidades
existentes na igreja. 48 AS CARACTERÍSTICAS DA HOMILÉTICA
• Falta de equilíbrio na seleção dos textos
bíblicos. 49
Koller 52
apresenta o conceito bíblico de

45 Na maioria das vezes, a pregação pobre tem sua raiz na falta de pregação como (aquele processo único pelo qual
estudo do pregador. Muitos julgam ter condições de preparar uma Deus, mediante Seu mensageiro escolhido, Se
mensagem em menos de seis horas, sem o árduo trabalho exegético e
estilístico. introduz na família humana e coloca pessoas
46 Os ouvintes do sermão dominical perdem o interesse pelo recado
do pastor quando este apresenta uma mensagem que consiste numa evangélicos pregados no Brasil baseiam-se no Novo Testamento e,
mera junção de versículos bíblicos, às vezes até desconexos, pulando em geral, limitam-se a textos evangelísticos. Prega-se a verdade, mas
de um livro para outro, sem unidade interior, sem um tema não toda a verdade! O alvo do apóstolo Paulo era pregar "o
organizador. A falta de unidade corporal na prédica leva o ouvinte a evangelho das insondáveis riquezas de Cristo" (Ef 3.8). É bom
depreciar até a mais correta exposição da Palavra de Deus. lembrar que os apóstolos, e com eles a primeira geração da igreja
47 O pior que pode acontecer ao pregador do evangelho é proclamar primitiva, utilizavam quase sempre o Antigo Testamento. Eles
as verdades libertadoras de Cristo e, ao mesmo tempo, levar uma vida baseavam suas mensagens naqueles 39 livros, que constituem mais
arraigada no pecado e em total desobediência aos princípios da de dois terços de nossa Bíblia atual.
Palavra de Deus. Por isso, Paulo escreveu: "... esmurro o meu corpo, 50 A característica principal de um culto evangélico é a pregação da
e o reduzo à escravidão, para que, tendo pregado a outros, não palavra de Deus. Números especiais bem ensaiados, testemunhos
venha eu mesmo a ser desqualificado" (1 Co 9.27). Em outras autênticos, avisos, tudo isso é útil e necessário, desde que em seu
ocasiões, o pregador talvez esteja vivendo em santificação, mas, devido lugar. Devemos zelar para que nossos cultos não se tornem
ainda assim, quando suas mensagens são apresentadas de forma festivais de música popular ou reuniões para avisos, mas, sim,
muito teórica, empregando termos técnicos, latinos e gregos que o encontros com Deus em Sua palavra! Lutero era muito enfático em
povo comum não entende, elas se tornam enfadonhas. No fim do afirmar que, onde se prega a palavra de Deus e são ministrados o
culto, o rebanho admite que seu pastor falou bem e bonito, mas se batismo e a ceia, é ali que se encontra a verdadeira igreja.
queixará de não ter entendido nada. 51O pregador tem de planejar sua pregação com antecipação.
48 Muitas mensagens são boas em si mesmas, mas se tornam pobres Aqueles que não planejam sua pregação, geralmente cedem à
na prática, na edificação do povo de Deus. Constituem verdadeiros tentação do plágio. O bom pregador deve fazer um planejamento
castelos doutrinários, mas não mostram como colocar em prática, de anual, incluindo mensagens para os dias especiais (Natal, Páscoa,
maneira viável, o ensino da Palavra de Deus. aniversário da igreja etc.). Dessa forma, ele alimentará a seu rebanho
49 A maior parte das Escrituras foi praticamente abandonada na com uma dieta sadia e balanceada.
pregação eficiente do evangelho. Mais de 95% dos sermões 52 op. cit., Koller p. 9.

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perante Si, face a face). Em sua tese, Koller refere-se Nenhuma outra religião jamais tornara a
reunião freqüente e regular de massas
ao mensageiro (vocação, caráter, função) e à humanas para ouvir instrução religiosa e
exortação uma parte integrante do culto
mensagem (conteúdo, poder, objetivo). Na
divino". Para o seminarista e futuro pregador
realidade, porém, as características da homilética do evangelho, "a homilética constitui a coroa
da preparação ministerial" porque para ela
evangélica não devem restringir-se somente aos convergem todas as matérias teológicas, a fim
de originar, vivificar, caracterizar, renovar e
pólos mensageiro - mensagem. Três elementos, no
perpetuar o cristianismo autêntico. Além de
mínimo, participam da prédica: o pregador, o(s) importante, a homilética é também nobre,
"porque se interessa exclusiva-mente pelo
ouvinte(s) e Deus. bem das almas", que são objeto do amor
Podemos representá-los por meio de um infinito, da graça remidora e do poder
renovador de Jesus Cristo. 54
triângulo, cujos vértices simbolizam o autor, o
Durante o COMIBAM 87 (Congresso
comunicador e o receptor:
Missionário Ibero-Americano), o líder evangélico
Deus
René Zapata (El Salvador) disse :
pregador ouvinte
Bíblia "A pregação é o principal meio de difusão do
cristianismo, mais poderosa do que a página
Neste triângulo, o pregador dirige-se a Deus, na escrita, mais efetiva do que a visitação e o
aconselhamento, mais importante do que as
preparação e na proclamação da mensagem, e ao cerimônias religiosas. É uma necessidade
sobrenatural, convence a mente, aviva a
ouvinte, sua comunidade evangélica. O ouvinte imaginação, move os sentimentos,
recebe a mensagem da Palavra de Deus através da impulsiona poderosamente a vontade. Mas,
depende do poder do Espírito Santo. É um
comunicação pelo pregador ou por sua própria instrumento divino; não é resultado da
sabedoria humana, não descansa na
leitura. Deus, por Sua vez, é autor, inspirador e eloqüência, não é escrava da homilética". 55
ouvinte da Sua Palavra. Entretanto, é bom lembrar
A homilética é importante devido a seu
que o triângulo só se completa com um núcleo: este
conteúdo (a proclamação do evangelho como
âmago é a palavra do Cristo crucificado (1 Co 2.2).
característica fundamental do cristianismo
Para, nós, os evangélicos, Cristo é o centro
autêntico), seu lugar central na preparação do
da Bíblia. Lutero ensinou enfaticamente:
ministro evangélico e seu objeto (o bem-estar do
A Escritura deve ser entendida a favor de
Cristo, não contra Ele; sim, se não se refere homem, criado por Deus).
a Ele não é verdadeira Escritura ... Tire-se
Cristo da Bíblia, e que mais se encontrará
nela? 53 A NATUREZA DA HOMILÉTICA

A IMPORTÂNCIA DA HOMILÉTICA
É a teoria e prática da pregação do
evangelho de nosso bendito Senhor Jesus Cristo,
A igreja viva de nosso Senhor Jesus Cristo
que revela o poder e a justiça de Deus para todo
origina-se, vive e é perpetuada pela Palavra de Deus
homem que nEle crê (Rm 1.16).
(Rm 10.17). Pregar o evangelho significa despertar,
Os termos pregação e pregar vêm do latim
confirmar, estimular, consolidar e aperfeiçoar a fé
praedicare, que significa (proclamar). O Novo
(Ef 4.11ss.). Por essa razão, a prédica é a
Testamento emprega quatro verbos para
característica marcante do cristianismo.
54 Nobre, A. Manual do Pregador. São Paulo: Casa Editora
53 HAGGLUND, Bengt. História da Teologia. 7a Ed. Porto Alegre: Presbiteriana, 1955. p. 7.
Concórdia, 2003, p. 187. 55 Revista Ultimato nº 192, Viçosa-MG, fevereiro de 1988, p. 7.

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exemplificar a natureza da pregação: Quem evangeliza transmite boas novas, uma


mensagem de alegria. Assim se caracteriza a
1. khru,ssw - ((kerysso), ‘anunciar’, ‘proclamar em natureza da prédica evangélica. O pregador do
voz alta’, ‘tornar conhecido’ (61 ocorrências no evangelho é o portador de boas novas, de uma
Novo Testamento). Está relacionado com o arauto mensagem de salvação e alegria. Ele anuncia estas
(kh/rux) kérix, ou "o que é comissionado pelo seu boas novas de salvação ao homem corrompido por
soberano... para anunciar em alta voz alguma seu pecado (Is 52.7; Rm 10.15). O conteúdo do
notícia, para assim torná-la conhecida". 56 evangelho é a salvação realizada por Jesus Cristo
Assim, pregar o evangelho significa fazer o (Lc 2.10; At 8.35; 17.18; Gl 1.16; Ef 3.8; Rm 1.16; 1 Co
serviço e cumprir a missão de um arauto. João 15.1ss.), e seu alcance é o mundo inteiro. O
Batista era o arauto de Deus. Para sua atividade, os evangelho não deve limitar-se a uma classe
evangelhos sinópticos empregam o termo kerysso: especial. Ele é para todos. Todos têm direito de
Mt 3.1; Mc 1.4; Lc 3.3. Jesus, por Sua vez, era arauto ouvir a mensagem de Jesus Cristo (At 5.42; 11.20; 1
de Seu Pai: Mt 4.17, 23; 11.1; e os doze discípulos, Co 1.17; 9.16). 57
Paulo e Timóteo, arautos de Jesus: Mt 10.7, 27; Mc
16.15; Lc 24.47; At 10.42; Rm 10.8; 1 Co 1.23; 15.11; 2 Co 3. martu,rion - (martyrion), testemunhar,
4.5; Gl 2.2; 1 Ts 2.9; 1 Tm 3.16; 2 Tm 4.2. testificar, ser testemunha. O testemunho de Jesus
Estas referências bíblicas mostram que a Cristo é outra característica autêntica da prédica
natureza da pregação consiste em quatro evangélica. Jesus convidou seus discípulos para
características principais: serem Suas testemunhas do poder do Espírito
a. um arauto fala e age em nome do seu Santo (Lc 24.48; At 1.8). Neste sentido, os apóstolos
senhor. O arauto é o porta-voz de seu compreenderam e executaram seu ministério (At
mestre. É isto que dá à sua palavra 2.32; 3.15; 5.32; 10.39; 13.31; 22.15; 23.11; 1 Jo 1.2; 4.14).
legitimidade, credibilidade e autenticidade; A testemunha qualifica-se através da
b. a proclamação do arauto já é determinada. comprovação de sua experiência. Isto lhe dá
Ele deve tornar conhecidas a vontade e a credibilidade, convicção e liberdade no
palavra de seu senhor. O não-cumprimento cumprimento de sua missão. O evangelista diz: (...
desta missão desclassifica-o de sua função e nós temos crido e conhecido que tu és o Santo de
e responsabilidade; Deus) (Jo 6.69). Isto significa que somente aquele
c. o teor principal da mensagem do arauto que experimentou pessoalmente o poder salvador e
bíblico é o anúncio do reino de Deus: Mt transformador de Cristo, por meio da fé em Sua
4.17-23; 9.35; 10.7; 24.14; Lc 8.1; 9.2; e pessoa e obra, é qualificado para ser testemunha
d. o receptor da mensagem do arauto bíblico é evangélica. Por isso, a testemunha do Novo
o mundo inteiro: Mt 24.14; 26.13; Mc 16.15; Testamento testifica para outras pessoas aquilo que
Lc 24.47; Cl 1.23; 1 Tm 3.16. apropriou pela fé. (E o que de minha parte ouviste,
através de muitas testemunhas, isso mesmo
2. eu.aggelizomai - (euangelizomai), evangelizar. transmite a homens fiéis e também idôneos para

56 Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento.


3a Ed., vol. III. São Paulo: Vida Nova, 1985. p. 739. 57 Op cit. NDITNT, vol. II, p. 612.

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Curso básico de teologia

instruir a outros) (2 Tm 2.2). 58 salvação, transparecer a revelação e o plano de


Deus para o mundo, a igreja e o incrédulo (At 2.42;
4. dida.skein - (didaskein), ensinar. Encontramos 20.20s.; 1Tm 3.2b,4.13; 2Tm 2.24). Note bem que o
este verbo 95 vezes no Novo Testamento. Seu alvo do ensino apostólico não é a cognição nem
significado é sempre ensinar ou instruir. simplesmente o conhecimento intelectual, mas o
O Novo Testamento apresenta-nos Jesus conhecimento prático, salvador e transformador de
como um grande educador: Quando Jesus acabou vidas, para que sejam santificadas e preparadas a
de proferir estas palavras [o Sermão do Monte], fim de produzirem as boas obras que o Senhor
estavam as multidões maravilhadas da sua dispôs de antemão para que andassem nelas (1Co
doutrina; porque ele as ensinava como quem tem 1.5; Ef 2.10; 2Ts 2.15; 2Jo 9).
autoridade, e não como os escribas (Mt 7.28, 29). É
o testemunho unânime de todos os escritores O ALVO DA HOMILÉTICA
sinópticos, que sem dúvida coincide com a
realidade histórica, que Jesus 'ensinava' Qual o alvo da mensagem evangélica?
publicamente: Podemos ficar satisfeitos com a mera preparação e
• nas sinagogas (Mt 9.35; 13.54; Mc 6.2; 1.21), apresentação da prédica? Quais os objetivos de

• no templo (Mc 12.35; Lc 21.37; Mt 26.55 ; Mc tanto esforço na preparação, estruturação,

14.49; cf. Jo 18.20) meditação e, finalmente, pregação do sermão?

• ou ao ar livre (Mt 5.2; Mc 6.34; Lc 5.3). Para Hawkins 61, "o objetivo da homilética é

Somente Lucas 4.16ss. dá detalhes acerca auxiliar na elaboração de temas que apresentem em

da forma externa de Seu ensino, ficava em pé para forma atraente uma mensagem da Palavra de Deus,

ler um trecho dos profetas, depois se sentava para com tal eficiência que os ouvintes compreendam o

fazer a exposição, sendo este o costume judaico e que devem fazer e sejam movidos para fazê-lo".

rabínico normal (cf. Lc 5.3; Mc 9.35; Mt 5.2). Jesus Em geral, podemos dizer que o objetivo da

recebeu Seu ensino diretamente de Seu Pai (Jo mensagem evangélica é a conversão, nutrição,

7.16s.).59 comunhão, motivação e santificação para a vida

Os apóstolos também reconheceram a cristã.

importância do ensino para as igrejas recém- O alvo primário de toda e qualquer

fundadas (At 2.42; 5.28). O alvo do ensino mensagem bíblica é a salvação de pecadores

apostólico era firmar os cristãos em sua fé, prepará- perdidos (Rm 1.16). "Em toda pregação, Deus

los para o serviço e aperfeiçoá-los para a vinda do procura primariamente, mediante Seu mensageiro,

Senhor Jesus Cristo (Ef 4.11ss.). Os apóstolos trazer o homem para a comunhão Consigo". 62

reconheciam o ensino como charisma 60 do Espírito É por meio da mensagem anunciada,

Santo (Rm 12.6s.; 1 Pe 4.11). ouvida e crida que os homens são salvos da

Concluímos, portanto, que a natureza da perdição, da escravidão do pecado e da morte (Rm

mensagem evangélica é explicar a história da 10.10,17; Jo 8.34-36). Isso vale tanto para os povos

58 Op cit. NDITNT, vol. I, p. 500. 61 HAWKINS, T. Homilética Prática. Rio de Janeiro: JUERP, 1978
59 Op cit NDITNT, vol. II, p.44. p. 13-14.
60 carisma, ou dom. 62 C. W. Koller, op. cit., p. 14.

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Curso básico de teologia

que já a ouviram e creram no evangelho quanto


para os povos pagãos. O desejo de Deus é de que Parte 2 –
(todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno
O PREGADOR
conhecimento da verdade) (1 Tm 2.4). Toda
pregação do evangelho, portanto, deve incluir
nitidamente a oferta da salvação. A prédica Pregador é alguém que recebe a mensagem

evangélica também não pode silenciar quanto à de Deus e a entrega aos homens. É o que trata com

situação e ao destino dos perdidos (Jo 3.18, 36; Ap Deus os interesses dos homens; e, com os homens,

22.15). Ao mesmo tempo, a pregação bíblica os interesses de Deus. O pregador não é um

anuncia com convicção a necessidade de entregador de recados. A pregação é tarefa

reconhecer, confessar e deixar todo e qualquer tipo primordial da Igreja e, por conseguinte, dos que

de pecado e de idolatria, convertendo-se ao Deus exercem o ministério da Palavra. Num certo

vivo e verdadeiro (Pv 28.13; Rm 10.10; 1 Ts 1.9s.). sentido, todo crente é um pregador do Evangelho,

A pregação do evangelho, porém, não se dá pelo dever de testemunhar de Cristo, mas nem

por satisfeita em apenas chamar à comunhão viva todos são ministrantes da Palavra.

com o Senhor Jesus Cristo. Após a conversão, a Quem prega deve conhecer a Deus e amá-

ênfase deve estar sobre as coisas que acompanham lo de forma absoluta. Isto provê a realidade em sua

a salvação (Hb 6.9). Nutrição, motivação, vida e deixa claro que a sua proclamação é sincera.

doutrinamento, perfeição, edificação, consolidação, Um pregador deve pregar a conversão, isto é, a

consagração e santificação devem complementar a mudança de vida dos que o ouvem. Porém, isto não

pregação evangelístico-missionária (Cl 1.28; 2.6s., Ef pode ocorrer a menos que ele mesmo seja

3.17; 4.11ss., 1 Co 3.11). Isto deve acontecer individual convertido. Pois casa mensagem é, na realidades,

e eclesiasticamente (Rm 15.2; 1 Co 14.3s.; Ef 2.21; 1 Pe um testemunho de vinda aos pés de Cristo.

2.5s.; 1 Co 3.9). Como indivíduo, o cristão precisa


ser aconselhado (At 20.20ss.; Jo 21.15-17; 2 Tm 4.2). 1 – REQUESITOS BÁSICOS PARA O PREGADOR

Este processo de edificação e consolidação seria


Existem certos pregadores que parecem ter
impossível sem o doutrinamento (Ef 4.14; Cl 1.11).
sido claramente separados dos demais como
O terceiro alvo da pregação evangélica visa
mensageiros de Deus. Eles prendem os ouvintes e
a ação diaconal de cada membro do corpo de Jesus
estabelecem um contato direto com eles que os
Cristo (Ef 4.11ss.; 1 Ts 1.9; Tt 3.8). Faz parte da
outros não conseguem alcançar. Isto é, geralmente,
mensagem neo-testamentária que o cristão
devido ao seu senso profundo do fardo, que leva o
envolva-se no serviço de Deus (1 Co 9.13; 2 Co 5.15;
auditório a sentir a proximidade que existe entre o
Gl 2.20). A verdadeira mensagem evangélica
pregador e Deus, Esta íntima comunhão com Deus
estimula o cristão para as diversas possibilidades
torna-se um ímã que liga o pregador e ouvinte.
ministeriais, sociais e diaconais (At 20.28; 1 Pe 5.2;
Portanto, há os dons espirituais que se
4.10; Rm 12.4-8). Resumimos este parágrafo sobre o
requerem, mas há também os dons naturais. O
alvo da homilética com a convicção paulina de
dom da palavra não é necessariamente eloqüência,
jamais deixar de anunciar "todo o desígnio de
mas a capacidade de falar de modo que as outras
Deus" (At 20.27)

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 33


Curso básico de teologia

pessoas ouçam e compreendam. Os dons venha eu mesmo a ser desqualificado, 1 Co 9.27.


intelectuais são necessários para o ensino das Neste texto, o apóstolo Paulo prevê o perigo de
doutrina da Igreja; Porém, o pregador deve tornar moeda falsa na circulação sagrada, falso
sobretudo reconhecer a necessidade desesperada intermediário das sublimes realidades e guia
daqueles que ouvem o Evangelho e ter a confiança indigno para as insondáveis riquezas de Cristo.
de que a pregação é um instrumento que Deus usa Todos nós sabemos que, se o diabo conseguir
para salva as pessoas e construir Sua Igreja. derrubar o líder, poderá facilmente destruir todo o
rebanho. Neste campo, há várias ciladas malignas
1. ALGUMAS QUALIDADES DO BOM PREGADOR usadas por satanás.

Se o alvo do pregador for levar seus


2.1 ALGUNS PERIGOS FREQUENTES
ouvintes a detestar o mal, apegando-se ao bem (Rm
a) Orgulho, Tg 3.2
12.9), ele não descobrirá arma mais eficiente em seu
b) Auto-piedade.
arsenal do que o seu próprio caráter. Além do apelo
c) Desarmonia entre sua conduta e sua
ético mediante o qual o seu caráter reforça os seus
mensagem.
sermões, suas boas qualidades também
d) Sucesso.
estabelecem o exemplo certo para a congregação.
e) Amor ao dinheiro.
Então o pregador precisa ser:
f) Relaxamento.
a) Piedoso, 1 Tm 4.7-8.
g) Desprezo pelo ministério.
b) Sincero.
h) Plágio
c) Humilde.
A recomendação Paulina é, orai sem cessar
d) Manso.
(1 Tm 5.17). Cabe ao pregador então monitorar o
e) Consciente dos seus dons naturais.
seu coração constantemente, para que este não
f) Sensível às necessidades das pessoas.
venha se ensoberbecer.
g) Cheio do Espírito Santo.
h) Autêntico.
3 – COMO FALAR E LER EM PÚBLICO
i) Alguém que goste de ler e escrever.

A IMPORTÂNCIA DE O PREGADOR LER E Pregar bem é falar bem. É um processo

PESQUISAR complexo que exige romper barreiras como a


timidez, o medo, a inexperiência e outras. Os
O pregador deve formar o hábito de grandes pregadores da história souberam usar,
estudar e aproveitar todo o seu tempo livre para eficazmente a voz e os recursos naturais,
instruir-se, lendo, diariamente. A boa leitura intelectuais e retóricos.
constitui fonte inesgotável de boas ilustrações e a) Fale de tal maneira que todos os ouvintes
argumentações para os seus sermões. possam entender até a última palavra dita.
b) Use somente palavras que os ouvintes
2 – AMEAÇA AOS PREGADORES
compreendam.
Mas esmurro o meu corpo e o reduzo à
c) Utilize, da melhor maneira possível, todos
escravidão para que tendo pregado a outros, não
os recursos físicos (gesticulação, expressão

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 34


Curso básico de teologia

facial, olhar, respiração) e intelectuais nossos dias.


(raciocínio, recurso de linguagem) quando 1. Extensão do Sermão. O Sermão deve ser curto ou
estiver falando. longo? Como decidir entre os dois? Observe a
d) Dirija o olhar para todos os ouvintes, fisionomia dos ouvintes, se eles aparentam cansaço
individualmente. e apatia é bom caminhar para a conclusão. O que é
e) Mantenha sempre a cabeça erguida. melhor? - Um sermão curto sem conteúdo, ou um
f) Se o público estiver assentado por mais de sermão longo com profundidade bíblica? Nenhum
quarenta e cinco minutos antes da dos dois. Observe o auditório!
mensagem, crie uma maneira de faze-los 2. Ilustrações. As ilustrações jocosas, alegres e
levantar antes de você começar a pregar. descontraídas cabem melhor no início do sermão.
g) Quanto à forma de ler, o ideal é que não Seja mais solene ao concluir. Use preferivelmente
seja monótona mas atraente, interpretando ilustrações verdadeiras, colhidas na experiência do
a passagem à medida que se vai lendo, dia-a-dia.
respeitando a pontuação etc. 3. Dicção Correta. Comer os "s" finais e introduzir
sons vocálicos refletem pouca cultura e
4 – ALGUMAS DICAS AOS PREGADORES desprestígio à língua portuguesa. Exemplos: Jesus,
não Jesuis. Fomos, não fômu. ... e muitos outros.
O propósito desta breve lista de sugestões 4. Tom de Voz. Com sua voz o pregador denuncia
homiléticas não é minimizar, sintetizar ou sua convicção. Gritar e esmurrar o púlpito não
banalizar o estudo sério acerca da atuação do convencem, nem escondem o caráter do pregador.
pregador no púlpito. O uso do púlpito e a postura Module a voz. Fale alto, baixo, rápido,
do pregador diante dos ouvintes merecem estudo vagarosamente. Voz monótona dá sono!
aprofundado tanto sob o prisma da autoridade 5. Anúncio do Texto Bíblico. Ao enunciar o
espiritual de quem anuncia a Palavra, quanto dos texto bíblico seja claro quanto ao livro e preciso na
aspectos que envolvem a comunicação verbal e referência. Aguarde até que o auditório tenha
gestual modernas. Não pense, portanto, que em localizado o texto.
cumprindo as "dicas" o sucesso será imediato. Elas 6. Aplicação Prática. Seja prático nas aplicações. O
servirão mais para identificar deficiências do que que é melhor dizer? - "Levemos Jesus ao mundo"
superá-las. Por esta razão, ao reconhecer vícios no (genérico), ou "Ao chegar em sua casa hoje, pegue
seu desempenho como pregador procure ajuda o telefone, ligue para sua mãe que não é crente e
imediatamente, antes que os maus hábitos sejam diga-lhe: mamãe eu amo você e Jesus a ama
incorporados a sua personalidade pública. E a um também..."
pregador desprestigiado, sobra-lhe somente um 7. Esboço do Sermão. Decore o esboço do sermão.
lugarzinho obscuro entre os de terceira linha. Cada vez que o pregador deixa de "olhar no olho"
dos ouvintes, parcela deles se desliga. Mantenha os
É possível mudar; melhorar é um desafio
ouvintes plugados!
diário. Esforço pessoal, vontade de servir melhor ao
8. Gestos. Os gestos do pregador reforçam os
Senhor e ao Seu povo, são alicerces que sustentam
verbos. Gesticulação sem propósito denuncia o
os bons propósitos do pregador evangélico sério em
nervosismo do pregador, e não causa bom efeito

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 35


Curso básico de teologia

nos ouvintes. no sermão, repetidamente, reflete pobreza de


9. O Uso do Microfone. O microfone é um amigo exegese bíblica e falta de vocabulário.
do pregador! Não dê pancada nele antes de usá-lo. 17. Desculpas. Ao pregador não cabe o pedir
No caso de dificuldades em conviver com ele, faça desculpas pelo conteúdo da mensagem que foi, ou
um curso e aprenda a usar o recurso. será apresentada. Desculpar-se não é bom nem
10. Autenticidade. Pregue, de preferência, os seus antes, nem depois do sermão. A falsa humildade
sermões. Pregue sermões de outros pregadores, revela verdadeiro desleixo.
quando desejar. Ao fazê-lo, diga a fonte. Não é feio 18 Tiques. O pregador, nervoso, repete o mesmo
omitir, é desonesto! Alguém descobrirá o plágio e gesto. Leva a mão ao nó da gravata, pigarreia,
você cairá em descrédito. arruma os óculos no rosto... Todo o gesto repetido
11. Apelo. Apele sem apelação. Diga claramente o desperta a atenção do ouvinte e desvia-o do
que você pretende que o ouvinte faça em reação ao sermão. Controle-se. Observe-se a si mesmo! Antes
sermão recém apresentado. No caso de não haver que os adolescentes façam piadas de você!
manifestações, não ameace o auditório com "pragas 19. Dirigindo-se a todos. Há templos com galeria, e
infernais". em muitos templos outros o coral fica postado na
12. Expressão Facial. Mantenha uma fisionomia plataforma atrás do pregador Temos assim uma
tranqüila. Não é preciso sorrir sempre... O dificuldade para o contato visual! Não raro o
auditório vê o sermão no semblante do pregador, mensageiro se esquece destes dois segmentos do
antes de ouvi-lo através de sua voz. auditório, e em nenhum momento se quer dirige-
13. Movimentação. Caminhar na plataforma é um lhes o olhar. Você não fará assim! Vire-se suave e
bom exercício para o pregador e uma excelente cortesmente, e fale aos coristas. Olhe para o alto e
maneira de arremessar o auditório para fora do demonstre que você reconhece a presença, e
sermão. Procure aquietar-se! Evite os excessos! agradece a atenção dos presentes apinhados na
14. Clareza. Ao ler o texto básico do sermão, galeria.
respeite a pontuação e enfatize os termos que serão
explicados e aplicados durante a mensagem. Parte III
15. Emoção. O pregador pode chorar. Há ocasiões
em que isto é inevitável durante o sermão. É O SERMÃO
espontâneo e natural, não mero artifício de
comunicação. Mas, se o chorar se tornar um hábito I – AS PARTES DO SERMÃO
do pregador é preciso averiguar a real origem dessa
emoção, e sugere-se ao pregador que procure ajuda 1.1 - A ESTRUTURA DO SERMÃO
com profissional especializado.
16. Chavões. A grande massa evangélica produz A estrutura do sermão merece nossa
a sua própria gíria. Chavões circulam no meio do atenção, nosso esforço laborioso e a devida
povo como "axioma teológico". Cabe ao pregador preparação paciente para causar um "impacto
fugir dessas expressões inócuas, tais como: "Amém, imediato sobre os ouvintes" 63.
irmãos!" - "Uma bênção... Uma Maravilha!", "O
63 D. Martin Lloyd-Jones, Op. cit. em BRAGA, J. Como preparar
toque de Deus", “ é tremendo!” e outras . Usá-las mensagens bíblicas. SP: Vida, 1993.

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Curso básico de teologia

Na estrutura do sermão, estudamos os depois de feita a exegese, depois de o esboço ter


princípios da elaboração formal ou esquematização sido elaborado. A definição do título exige tempo e
do sermão. Nossa atenção volta-se para o título, a bastante reflexão:
introdução, as proposições, o esboço • O título é claro e compreensível?
propriamente dito, as discussões e ilustrações, as • É pertinente ao texto bíblico?
• Relaciona-se com o esboço?
aplicações e, finalmente, para a conclusão do • É bem específico ou parece mais um
sermão. assunto geral?
• Ele contém alguma contradição?
Exemplo da estrutura de um esboço • Escandaliza os ouvintes, por ser fantástico,
extravagante, rude ou irreverente?
• É controvertido? Chama a atenção do
TÍTULO auditório?

Texto: O título pode ser expresso como uma


afirmação, interrogação, exclamação ou até como
INTRODUÇÃO uma citação ou parte de um versículo.

T e s e:
1.1.2 - Introdução: a "introdução é o processo pelo
qual o pregador procura preparar a mente dos
ASSUNTO
1° argumento ouvintes e prender-lhes o interesse na mensagem
2° argumento
que vai proclamar". 64
Os objetivos principais da
3° argumento
4° argumento introdução são conquistar a atenção do auditório e
despertar seu interesse pelo tema da pregação.
Conclusão Uma boa introdução, preparada e memorizada, dá
ao pregador segurança, tranqüilidade, firmeza e
Apelo
liberdade na pregação.

Vejamos:
1.1.3 - Proposição: a proposição bíblica é a
apresentação, explicação e desenvolvimento das
1.1.1 - Título: o título da mensagem especifica, o
grandes idéias doutrinárias, éticas e espirituais das
assunto sobre o qual o pregador irá falar. Exemplo,
Sagradas Escrituras, de maneira simples e
você prepara uma mensagem baseada em João 15.1-
convincente, que estimule o ouvinte a aceitá-las e
8. O assunto é a videira verdadeira, mas o título da
aplicá-las em sua vida.
mensagem será mais específico, ou seja, "a vida
Exemplos:
frutífera do cristão" ou "como o cristão pode ter
• O homem natural não entende nada das
uma vida frutífera". coisas de Deus.
• Todo homem nasce pecador.
A definição do título é um dos últimos
• Somos salvos inteiramente pelos méritos
itens a serem elaborados na mensagem. Não é de Cristo.
aconselhável escolher primeiro o título da • A leitura bíblica é um meio que Deus usa
para levar o homem à maturidade cristã.
mensagem e depois definir o texto, a não ser que • A verdadeira adoração é uma questão de
seu sermão seja tópico. É mais fácil definir o título
64 BRAGA, op. cit., p. 91.

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espírito e verdade. garantias momentos reações


• Cristo libertou-nos das trevas e generalizações motivos realidades
transportou-nos para Seu reino. habilidades necessidades recusas
• O louvor a Deus liberta-nos dos interesses hábitos negações reflexões
pessoais. ideais nomes remédios
• A vivência diária na santificação comprova idéias notas requerimentos
a veracidade e sinceridade da fé salvadora. ídolos objeções reservas
A proposição é o resultado do árduo trabalho julgamentos perigos tipos
justificação períodos tópicos
exegético e da meditação bíblica. As proposições juiz permutas totalidades
desenvolvem-se à medida que analisamos o texto lealdade pontos transigências
leis possibilidades lições
bíblico. Às vezes, uma proposição amadurece, práticas urgências males
cresce, modifica-se e torna-se mais específica com o problemas vantagens manifestações
processos verdades marcas
avanço do trabalho exegético. Na meditação bíblica profecias virtudes zelo
individual, as proposições (verdades generalizadas
e eternas da Bíblia) recebem uma dimensão A 'Palavra Chave' geralmente envolve o uso

espiritual, pessoal, atual e estimulante, que ajuda o de um 'Verbo transicional', que é sempre um verbo

ouvinte a abraçar a fé e a crescer na santificação. O 'transitivo', que requer um objeto, ou um verbo

desenvolvimento da proposição ocorre também emparelhado com uma preposição que requer um

com o passar do tempo. Por isso, recomenda-se objeto. Num ou noutro caso, o objeto é a 'Palavra

iniciar a preparação da mensagem dominical já na Chave'. Os seguintes 'Verbos transicionais' são

segunda-feira. A vivência diária, as visitas pastorais, colocados em combinações naturais com 'Palavras

a reflexão, a pesquisa exegética e as informações do Chaves', para demonstrar o seu uso normal. 65

dia-a-dia ajudam no aprimoramento das 'Este texto levanta... questões'


'O Senhor faz... promessa'
proposições, de maneira que se tornem castelos 'O apóstolo comunica... débitos'
concretos da verdade divina no século XX, capazes 'O profeta fala de... razões'
'A situação clama por... respostas'
de transformar a vida do pregador e de sua 'A fidelidade leva a... satisfações"'
congregação, pois emanam do realismo bíblico e da
exegese aplicada a nossos dias. 1.1.4 - Esboço: a elaboração de um bom esboço é

As palavras-chave de um texto bíblico ajudam- uma arte em si. Todavia, os princípios para o

nos a chegar às proposições. A seguinte série de esquema de um bom esboço são de caráter técnico,

possíveis palavras-chave não tem limites, e estas podendo ser estudados e apropriados por qualquer

servem apenas como assuntos: aluno de homilética dedicado.

abordagens compensações dons A preparação sistemática e refletida de um


abusos compromissos doutrinas esboço simples, prático e convincente exige tempo,
acontecimentos compulsão dúvidas
barreiras descobrimentos expressões flexibilidade mental e conhecimento psicológico e
bênçãos descobertas benefícios gramatical por parte do pregador. O esboço surge
desejos facetas caminhos
desinteresse falhas por meio do estudo exegético. Muitas vezes, ele é
características detalhes fardos extraído do próprio texto bíblico.
causas deveres fases
forças meios provas O esboço é composto das seções principais de
formas melhoramentos providências uma mensagem ordenada, dos pontos de destaque
fracassos mentiras
ganhos modos razões
65 KOLLER, op. cit., pp. 51-52

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da prédica, que formam os passos lógicos de seu principais do sermão. Outra vantagem é que o
desenvolvimento. Ele pode ser composto dos ouvinte lembra-se com mais facilidade das
argumentos fundamentais, das respostas básicas ou afirmações-chave do texto bíblico, as quais
das exclamações centrais do sermão. serviram como base para a mensagem. Em muitos
Não é indispensável que cada esboço tenha três casos, o esboço do pregador consegue ser tão
pontos principais, embora, na prática, isso muitas simples, claro e convincente que o ouvinte ainda se
vezes corresponda à realidade. O esboço pode ser recorda da prédica após dez anos, quando relê a
composto de apenas dois pontos ou até de oito ou passagem bíblica. Portanto, um bom esboço tem
nove aspectos principais. O bom senso do seu valor didático e espiritual, levando o cristão a
pregador, assim como o nível médio dos ouvintes, crescer em sua fé.
determinam os pontos do esboço. Não é Entretanto, quais são os princípios que
recomendável ter 19 tópicos num só esboço, nem devemos aplicar para fazermos um esboço
apresentar seis subesboços no esboço principal do ordenado?
sermão. As subdivisões do esboço-chave da Em primeiro lugar, ele deve corresponder ao
mensagem não devem constituir um novo esboço tema. Não adianta escolher o tema "a videira
central. Isso apenas confunde o auditório. verdadeira" e, no esboço, referir-se ao significado, à
Sugerimos, portanto, um esboço principal necessidade, à urgência, aos métodos e aos
composto de dois a cinco pontos, como regra resultados do arrependimento. O esboço deve
básica. Se você tiver mais do que isto, será melhor corresponder ao tema, assim como os frutos
subdividir o tema e apresentá-lo em duas correspondem à árvore. Conseqüentemente, o
mensagens. esboço emana do tema, assim como o tema emana
A elaboração de um bom esboço não é uma do texto bíblico que fundamenta o sermão.
regra homilética, um dever do pregador, mas uma Em segundo lugar, o esboço deve corresponder
ajuda homilética para apresentar um sermão também ao texto bíblico. Em muitos casos, o
ordenado. Um esboço bem ordenado e harmônico próprio texto bíblico oferece um esboço natural
ajuda o pregador a obter clareza de idéias. Através para o sermão.
do esboço, os tópicos principais da mensagem são Em terceiro lugar, os pontos individuais do
colocados em ordem lógica e conseqüente. O esboço devem ser totalmente distintos, pois cada
esboço bem preparado ajuda também o pregador a argumento é uma parte integrante de toda a
obter unidade de pensamento. É muito fácil os estrutura do sermão. Não adianta repetir no
pensamentos do pregador saírem da linha, terceiro ponto, com palavras semelhantes, o que já
incompatibilizarem-se mutuamente ou até se foi esclarecido no primeiro. A repetição ou
repetirem. semelhança de pensamentos, afirmações,
Finalmente, o esboço previamente estruturado interrogações, exclamações ou argumentos no
e anotado no manuscrito ajuda o pregador a esboço é o erro mais comum dos pregadores
lembrar-se do conteúdo do sermão, de maneira que iniciantes.
ele se torna mais independente de suas anotações. Em quarto lugar, o esboço precisa ser ordenado
A grande vantagem de um esboço bem patente seqüencial e progressivamente. Seqüencialmente, a
para a congregação é que ele esclarece os pontos fim de mostrar coerência lógica de pensamento, e

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progressivamente, por motivos retóricos e três pontos, por exemplo, você empregaria três
psicológicos. Deixe o argumento mais importante, palavras principais que terminam com: são, ação,
o ponto alto, para o final da mensagem, visando ável, o, a, ismo, tude, ar, er, ir ou dade.
garantir que o auditório o acompanhe através de
toda a prédica. Exemplos:
Em quinto lugar, o esboço tem de apresentar 1) Texto: João 19.17-18
coerência lógica. O esboço ordenado não se Título: O LUGAR CHAMADO CALVÁRIO
contradiz, não complica, não deixa dúvidas; pelo Esboço: 1. Era lugar de crucificação.
contrário, elimina dúvidas. 2. Era lugar de separação.
Em sexto lugar, o esboço deve ser elaborado 3. Era lugar de exaltação.
harmonicamente. Use três afirmações, três
exclamações ou três interrogações, mas nunca 2) Texto: 1 Timóteo 2.4
misture uma afirmação com uma interrogação ou Título: "A VISÃO DE DEUS"
uma exclamação com uma pergunta. Esboço: 1. É uma visão da humanidade.
Em sétimo lugar, o esboço também deve estar 2. É uma visão da eternidade.
gramaticalmente correto e coerente. Comece 3. É uma visão da verdade.
quatro vezes com o artigo masculino ou com o
feminino; ou três vezes com os verbos principais, 1.1.5 - Discussão: "as divisões principais e as
com substantivos, i. e., sempre na mesma ordem subdivisões não passam do esqueleto do sermão, e
gramatical. Seus pontos encontram-se todos no servem para indicar as linhas de pensamento a
presente, no passado ou no futuro. Nunca misture serem seguidas ao apresentá-lo. A discussão é o
os tempos! Agostinho já ensinava: "Distingue descobrimento das idéias contidas nas divisões". 66
tempora et concordabis Scriptura." A elaboração e redação do sermão (latim:
Em oitavo lugar, cada ponto do esboço deve elocutio) merece diligência, exatidão e tempo do
conter uma só idéia; do contrário, confundiremos o pregador. Um tema interessante e um bom esboço
ouvinte. Cada ponto também deve esclarecer não são suficientes para garantir um fluxo
completamente seu tópico único. Não é agradável de pensamentos na mensagem. A questão
recomendável iniciar uma idéia nova sem ter do estilo é negligenciada por muitos pregadores e,
exposto a anterior claramente. por isso, a mensagem torna-se enfadonha,
Em nono lugar, o bom esboço emprega o complexa e desordenada. O estilo fraco do
menor número possível de pontos. O excesso de pregador é capaz de destruir suas melhores idéias.
pontos comprova a super-elaboração da prédica e Os aspectos a seguir ajudam a melhorar as
não ajuda o auditório a lembrar-se dos discussões da prédica. A boa prédica é
pensamentos-chaves do texto bíblico. caracterizada pela unidade de pensamento vista em
Em décimo lugar, é dever moral do pregador todas suas discussões.
não elaborar um esboço ambíguo ou escandaloso. O tema, o esboço, as subdivisões, o
Finalmente, recomenda-se também que o descobrimento, as ilustrações e os exemplos
esboço seja rítmico. Com isto, referimo-nos à refletem a unidade de pensamento do pregador.
rítmica gramatical das palavras. Num esboço de 66 BRAGA, op. cit., p. 144.

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Suas idéias não se desviam para nenhum lugar. paulistano.


Parece que o pregador tem um assunto só, apesar Aquilo que nós pregamos deve
de seu esboço de três pontos. As frases devem ser corresponder à verdade e tão-somente à verdade.
breves e claras. Orações longas e complexas, Pregamos a Palavra de Deus, que é a verdade (Jo
geralmente demonstram pouco preparo e falta de 17.17). Não é lícito apresentar histórias infundadas,
estilo. Depois de ter escrito a mensagem pela imaginárias e exageradas. A verdade não fantasia,
primeira vez, faça uma revisão total e só trabalhe não busca sensações, mas testemunha com
no estilo. Encurte as frases, subdivida-as. Indague simplicidade e sinceridade. A verdade não precisa
se todos entenderão suas idéias, se as expressões ser colorida ou superlativada.
que você usou são claras. 1.1.6 - Ilustrações: o significado do termo ilustrar é
A sintaxe, as palavras, o linguajar e o estilo tornar claro, iluminar, esclarecer mediante um
têm de ser simples. O bom professor ou orador é exemplo. A "ilustração é o meio pelo qual se lança
aquele que é capaz de explicar as coisas mais luz sobre um sermão através de um exemplo. É a
difíceis com simplicidade. Isso não significa que o apresentação de uma cena, ou a descrição de uma
pregador não possa empregar uma palavra técnica pessoa ou incidente, com o fim de iluminar o
ou estrangeira, visto que estes termos podem ser conteúdo de uma mensagem, ajudando o ouvinte a
traduzidos ou aportuguesados de forma simples. O compreender as verdades que o pregador
estilo de Jesus Cristo e o dos maiores pregadores proclama". 67
(Spurgeon, Billy Graham, Luis Palau) comprovam Existem formas variadas de ilustração. Ela
que a simplicidade é a arte suprema da homilética. pode ser: pessoal, é usada uma experiência pessoal
A vitalidade e a variedade são de para ilustrar um princípio bíblico; histórica, quando
importância fundamental para o descobrimento de se emprega um incidente histórico para
idéias. O pregador dinâmico é aquele que varia o exemplificar uma verdade bíblica; literária, quando
estilo, o ritmo, o tom e os gestos. Quem fica um escritor é citado para ilustrar uma verdade
eternamente esbravejando faz com que o ouvinte moral; técnica, quando se explica um processo
feche os ouvidos. A mensagem melancólica faz com técnico, industrial ou agrícola; científica, quando se
que a congregação caia em sono profundo. O refere a assuntos biológicos, químicos ou
palhaço só faz o auditório rir. A vitalidade e a psicológicos; analógica, metafórica, alegórica ou
variedade têm de ser equilibradas, não ofensivas ou parabólica, quando são empregadas figuras de
agressivas, mas agradáveis e convidativas. A boa retórica.
retórica está na vitalidade do pregador e na O bom uso da ilustração desperta o
variedade de seu estilo. Lembre-se de que interesse, enriquece, convence, comove, desafia,
vitalidade não é sinônimo de gritaria. estimula o ouvinte, valoriza e vivifica o sermão,
É de grande ajuda para os ouvintes o fato além de relaxar o pregador. É bom lembrar que a
de o pregador falar a língua do povo. Quando nos ilustração nunca substitui o argumento bíblico
referimos à popularidade, não estamos pensando fundamentado na Palavra de Deus. A ilustração
no pregador, mas em sua comunicação. O tem apenas uma função psicológica e didática, para
sertanejo, por exemplo, usa expressões e conceitos tornar mais claro aquilo que o texto revela.
totalmente desconhecidos do amazonense ou do 67 BRAGA, op. cit., p. 171.

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Recomendações práticas para o bom uso de auditório é a que fica gravada na memória.
ilustrações:
1. Pregue a Palavra e não ilustrações. II – TIPOS DE SERMÕES
2. Use no máximo duas ou três ilustrações por
sermão. A CLASSIFICAÇÃO DOS SERMÕES
3. Empregue ilustrações patentes e verídicas.
4. Comente as ilustrações com simplicidade e Tradicionalmente, os sermões são
naturalidade, sem exagero e sem espírito crítico, classificados quanto TIPO e quanto a sua
lembrando-se de que os exemplos bíblicos são as FINALIDADE:
melhores ilustrações.
Quanto ao tipo, os sermões podem ser:
1.1.7 - Aplicações: já explicamos detalhadamente a a) sermão temático (também chamado de sermão
aplicação do texto do sermão: a necessidade, as de tópico), cujos argumentos resultam do tema,
possibilidades e as formas de aplicação. Enquanto a independentemente do texto;
ilustração esclarece e ilumina a verdade bíblica, na b) sermão textual, cujos argumentos principais
aplicação, o ouvinte é confrontado direta e são tirados do texto bíblico;
pessoalmente com o ensino da Bíblia. Através da c) sermão expositivo, cujos argumentos giram em
aplicação, ele é convidado à reflexão, ao torno da exposição exegética completa do trecho
posicionamento, à mudança pessoal diante das bíblico em pauta.
afirmações das Sagradas Escrituras. Quanto ao objetivo ou finalidade, o sermão
pode ser:
1.1.8 - Conclusão: a boa mensagem merece a) pastoral;
cuidados especiais em sua conclusão. Esta não é o - exortativo;
mero fim, o ponto final da prédica. É o ponto - doutrinário;
culminante, o que fala mais diretamente ao - de avivamento;
- devocional;
ouvinte. Numa mensagem evangelística, é marcada
- inspirativo;
pelo convite à salvação. Mas seria um crime - consolador;
espiritual apenas lançar formalmente o convite sem b) evangelístico,

explicá-lo, sem mostrar como aceitá-lo. Lembre-se c) ocasional:


- nupciais,
de que, no apelo, dirigimo-nos à vontade, à
- natalícios,
consciência e aos sentimentos do ouvinte. O apelo - cívicos,
não deve ser forçado ou prolongado, mas simples, - fúnebres,
discreto e não ofensivo. Outra maneira de concluir - festivo (formaturas,
aniversários,
a mensagem, principalmente quando o conteúdo inaugurações,
for didático, é fazer uma breve recapitulação. Ao comemorações etc

usar este método, o pregador deve ter cuidado para


1 - O SERMÃO TEMÁTICO (TÓPICO)
não usar mais do que cinco minutos. Seja como for
sua conclusão (evangelística ou didática), a última
É aquele cuja divisão é extraída do tema. Em
imagem ou impressão que o pregador deixa para o

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Curso básico de teologia

outras palavras, divide-se o tema, não o texto de INTRODUÇÃO: As dádivas são muito apreciadas
onde o tema é tirado. por todos os homens. Esta apreciação chega ao
ponto de existirem casas comerciais que exploram a
Vantagens do sermão temático: venda de artigos específicos para presentes. De fato,
1. É o de divisão mais fácil. De fato, é o mais a vida social perderia muito de seu encanto se os
simples. É mais fácil dividir um tema do que um amigos e parentes não se presenteassem. Os homens
texto, visto que este é mais complexo. aprenderam ou herdaram isso de Deus. Deus é o
2. É o de lógica mais fácil. O sermão temático é o autor das dádivas. "Toda boa dádiva e todo dom
que mais se presta à observação da ordem e da perfeito é lá do alto, descendo do Pai das luzes, em
harmonia das partes. quem não pode existir variação ou sombra de
3. Conserva melhor a unidade. A proporção entre o mudança" (Tg 1.17). E, entre as dádivas que vêm de
primeiro e o último ponto e a relação de harmonia Deus, há uma que é suprema, a qual muitos ainda
entre estes e o tema constituem o segredo de sua não quiseram receber, embora lhes seja diariamente
unidade. Assim, é mais fácil ser mantido até o fim. oferecida.
4. Presta-se melhor à discussão de temas morais,
evangelísticos e ocasionais. DIVISÃO:
5. Adapta-se melhor à arte da oratória.
I. Em que consiste esta dádiva
Desvantagens desse tipo de sermão:
1. Exige muito controle do pregador para evitar 1. Não consiste apenas em valores materiais ou
nas ricas e abundantes coisas criadas por Deus e
divagações ou generalidades vazias e inexpressivas.
colocadas à disposição do homem:
2. Requer um estilo mais apurado e formal do que a) os animais que lhe servem de alimento,
aumentam suas posses ou ajudam no trabalho;
os outros tipos.
b) os rios, lagos, mares e florestas, de onde extrai a
3. Exige mais imaginação e vigor intelectual, visto substância, o conforto e os recursos para viver;
c) os minerais (minérios e pedras preciosas), com os
que se presta mais ao uso de símiles, metáforas e
quais se enriquece e obtém matéria-prima.
analogias.
Todas estas coisas são dádivas
4. Exige mais cultura geral e teológica, já que não
de Deus, mas não são dádivas supremas.
está limitado à análise do texto. 2. Consiste, na verdade, em uma pessoa: Jesus
Cristo, Seu Filho Unigênito.
5. Exige mais conhecimentos da lógica e da
dialética, pois tende a discussões apologéticas. II. O valor desta dádiva
6. Há o perigo de desprezar o uso abundante das
1. Não há outra maior do que ela, visto que se
Escrituras. trata do Filho de Deus.
a) Quem dá um Filho que ama, dá o melhor
que possui.
Exemplo de sermão temático ou tópico: b) Quem dá um Filho que ama, dá a própria
vida.
2. Não há outra melhor do que ela, visto que
TEMA: A DÁDIVA SUPREMA DE DEUS Deus deu o melhor que possuía no céu e na terra.
1. Não há outra melhor do que ela, visto que
Jesus encerra as perfeições divinas e
TEXTO: João 3.16 humanas.
2.

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declarações originais do texto, tais como se


III. A finalidade desta dádiva
encontram na Bíblia. Em conseqüência, as
1. Toda dádiva tem uma finalidade: subdivisões devem ser constituídas
a. agradar;
preferencialmente da citação de textos.
b. honrar;
c. beneficiar; O sermão textual analítico baseia-se em
d. provar o grau de amor ou
perguntas feitas ao texto, tais como:
amizade;
e. demonstrar gratidão; • Onde?
f. retribuir favores recebidos; • Que?
• Quem?
2. A dádiva de Deus aos homens, contudo, tem • Por que?
um propósito supremo: • Para que?
As respostas são dadas pelas declarações ou
a. visa demonstrar Seu grande amor pelos
homens. "Deus amou o mundo..."; "mas frases de que o texto é constituído. Neste caso, os
Deus prova o seu próprio amor para pontos principais expressam-se em forma
conosco, pelo fato de ter Cristo morrido por
nós, sendo nós ainda pecadores"; interrogativa.
b. visa revelar Sua misericórdia e santo No sermão textual por inferência, as
propósito aos homens, "para que não
pereçam"; orações textuais são reduzidas a uma expressão
c. visa, finalmente, enriquecer os homens com sintética ou palavra que encerra o conteúdo, sendo,
a posse do tesouro mais precioso da vida a
salvação "para que tenham a vida eterna". portanto, a essência da frase ou declaração. Esta
modalidade presta-se à análise de textos que não
IV. A quem é oferecida esta dádiva
podem ser divididos naturalmente.
1. A quem os homens costumam oferecer seus
presentes preciosos:
a. aos melhores amigos; Vantagens do sermão textual:
b. aos homens mais dignos; 1. É profundamente bíblico.
c. aos parentes mais queridos.
2. Deus, porém, oferece Sua dádiva suprema: 2. Exige do pregador um conhecimento profundo
a. não aos melhores homens do mundo "se das Escrituras.
vós, sendo maus...";
b. não aos justos "não há justo, nem um 3. Obriga o pregador a estudar constantemente a
só; "... não vim chamar os justos..." Bíblia.
c. mas aos pecadores perdidos "mas
chamar os pecadores ao 4. É o que mais se presta à doutrinação dos cristãos.
arrependimento"; "porque o Filho do 5. É o que mais se adapta ao pregador de cultura
Homem veio buscar e salvar o perdido";
pois "fiel é a palavra"; e "todos pecaram mediana, mas com vasto conhecimento das
e carecem da glória de Deus". Escrituras e de certos tratados teológicos.
6. É muito apreciado pelo povo.

2 - O SERMÃO TEXTUAL
Exemplo de sermão textual:

É o sermão cuja divisão baseia-se no texto.


TEMA: O PRIVILÉGIO DIVINO DOS CRISTÃOS
Neste caso, divide-se o texto e não o tema. Há três
modalidades de sermão textual. TEXTO:1 Pedro 2.9-10

O sermão textual natural ou puro é aquele INTRODUÇÃO: O crente em Jesus Cristo é um ser
cujas divisões são feitas de acordo com as privilegiado por Deus. Talvez não seja honrado pelo

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 44


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mundo, mas, seja quem for, é sempre honrado por Deus os argumentos principais à partir da
Deus, que o cobre de privilégios divinos e celestiais.
interpretação bíblica ou exposição completa de um
Eis aqui alguns desses privilégios, entre muitos:
trecho mais ou menos extenso. O Dr. KOLLER,
I. A raça eleita
famoso professor de homilética, define o sermão
1. Eleitos ou escolhidos não segundo nossas expositivo com estes dois argumentos: 68
obras, mas conforme o propósito e a graça de Deus 2
(1) O 'Sermão Expositivo' consiste da
Tm 1.9.
2. Eleitos segundo a presciência de Deus para a 'Exposição' mais aplicação e persuasão
vida eterna 1 Pe 1.2; Mt 25.34,46.
(argumentação e exortação). Uma
3. Eleitos para testemunhar as grandezas de
Deus 1 Pe 2.9. 'exposição' torna-se um sermão, e o mestre
4. Eleitos para serem segundo a imagem de Jesus
torna-se pregador, no ponto em que é feita
Rm 8.29.
uma aplicação ao ouvinte, com vistas a
II. O sacerdócio real
alguma forma de resposta, em termos de fé
1. Como sacerdotes, podem se aproximar de ou entrega.
Deus por meio de Jesus Cristo Hb 4.14-16.
(2) O 'Sermão Expositivo' extrai os seus
2. São sacerdotes para oferecerem eles mesmos
sacrifícios espirituais a Deus 1 Pe 2.5. principais pontos, ou o subtítulo
3. Os cristãos, como sacerdotes de Deus, têm
dominante de cada ponto principal, do
como sumo sacerdote Jesus Cristo Hb 4.14-15.
particular parágrafo ou capítulo do livro da
III. A nação santa
Bíblia de que trata".
1. Os cristãos são santos porque alcançaram O sermão expositivo, define BRAGA, é
misericórdia mediante Jesus Cristo 1 Pe 2.10.
aquela mensagem "em que uma porção mais ou
2. Os cristãos são santos porque foram
separados do mundo e do pecado para a glória de menos extensa da Escritura é interpretada em
Deus, bem como para Seu serviço Tt 2.14.
relação a um tema ou assunto. A maior parte do
3. Os cristãos são santos porque participam da
natureza de Deus 1 Pe 1.15-16. material deste tipo de sermão provém diretamente
da passagem, e o esboço consiste em uma série de
IV. O povo adquirido
idéias progressivas que giram em torno de uma
1. Cristo resgatou-nos e adquiriu-nos para Si,
idéia principal". 69
pagando por nós o preço de nossa redenção At 20.28.
2. Cristo resgatou-nos da maldição e da morte
para termos vida eterna e sermos Sua herança Ef
Características do sermão expositivo:
1.18.
3. Cristo adquiriu-nos não com prata e ouro,
mas com o preço do sangue imaculado 1 Pe 1.18.
1. Unidade. Não é um mero comentário de textos
4. Os cristãos são propriedade de Deus, são Seu
povo, e não pertencem mais ao mundo 1 Pe 2.20. bíblicos e, sim, uma análise pormenorizada e lógica
do texto sagrado.
CONCLUSÃO: Se temos tais privilégios e honras,
vivamos para Deus e, dentro de nossas forças e com 2. Presta-se melhor à exposição contínua de um
Sua graça, realizemos Sua vontade e Seu propósito
livro bíblico inteiro ou de uma doutrina.
no mundo; anunciemos as virtudes dAquele que "nos
chamou das trevas para Sua luz", do nada para Sua 3. É de grande valor para o desenvolvimento do
glória, da morte para a salvação, da terra para o céu.
poder espiritual e da cultura teológica do pregador e
de sua congregação.
3 – O SERMÃO EXPOSITIVO:
O sermão expositivo tira da Palavra de 68 KOLLER, op. cit., p. 17.
69 BRAGA, op. cit., p. 47.

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Curso básico de teologia

4. Inclina-se mais à interpretação natural das coisas do reino de Deus. "Senhor, não te importas de
que minha irmã me deixe servir só?"
Escrituras do que à alegórica.
5. É o método mais difícil, apreciado pelos que se 5. Desse modo, os cristãos que andam
assoberbados de serviços e negócios não dispõem de
dedicam à leitura e ao estudo diário e constante da
tempo:
Bíblia.
- para falar com o Senhor em oração;
- para ler Sua Palavra e nela meditar;
Exemplo de sermão expositivo: - para dar testemunho do poder salvador de Jesus;
- para ir à igreja ou tomar parte das atividades
eclesiásticas.
TEMA: DOIS TIPOS DE CRISTÃOS
II. Cristãos que se preocupam mais com o aspecto
TEXTO: Lucas 10.38-42 espiritual da vida cristã do que com o material v. 42.

INTRODUÇÃO: Todos os cristãos são discípulos de 1. Maria sabia que era seu dever ajudar a irmã
Jesus, sendo salvos por Sua divina graça; mas nem no serviço doméstico; entretanto, sentia que maior
todos são iguais. De fato, estudando as atitudes das era o dever de ouvir e aprender de Jesus aquilo que
duas discípulas de Betânia, Marta e Maria, a quem o ninguém poderia ensinar melhor do que Ele.
Senhor amava e em cuja casa gostava de estar, 2. Os serviços domésticos, sempre ela os poderia
descobrimos nelas dois tipos de cristão. Vejamos, fazer, mas ouvir a Palavra da vida dos lábios de Jesus
pois, em face do texto, quais são esses tipos. era raro. Por esse motivo, não queria perder tal
oportunidade. Assim deve proceder todo cristão.
I. Cristãos mais preocupados com o aspecto 3. Não há prejuízo, mas somente lucro em
material da vida cristã do que com o espiritual v. 40. pararmos um pouco as atividades materiais ou
1. Marta, não obstante ter sido uma boa crente, nossos negócios a fim de nos dedicarmos ao serviço
representa esse tipo de cristão. e interesses do reino de Deus.
2. Notemos que Marta provavelmente estava 4. Os cristãos que submetem seus interesses aos
preparando uma refeição para o Senhor e Seus de Jesus sempre:
discípulos v. 38. - são espirituais;
3. Ou, talvez, após oferecer a refeição, tenha se - são fervorosos;
dedicado a outros trabalhos domésticos, aos quais - não têm preocupações obsessivas de ordem
deu mais importância do que ao aprendizado dos material;
mistérios do reino de Deus, aos pés de Jesus v. 42. - são confiantes na providência e no amor de Deus;
4. Essa atitude arrastou Marta como também - têm paz e tranqüilidade de espírito;
acontece com qualquer cristão aos seguintes - têm satisfação e prazer em ser cristãos;
estados: - escolhem a melhor parte, que jamais lhes será
• Viver preocupado "te preocupas com muitas tirada, e crescem "na graça e no conhecimento de
cousas". Queremos fazer diversos negócios Jesus".
ao mesmo tempo e preocupamo-nos com a
possibilidade do prejuízo ou do fracasso. CONCLUSÃO: A que tipo pertencemos nós? Se do
• Viver ansioso "Marta, estás ansiosa". A tipo de Maria, somos bem-aventurados. Entretanto,
ansiedade é fruto de alguma preocupação de não nos devemos orgulhar disso, mas persistir
ordem material ou moral, a falta de humildemente no mesmo caminho. Se, porém,
confiança na providência de Deus. Ela pode somos do tipo de Marta, atendamos às advertências
gerar graves distúrbios físicos com carinhosas do Senhor e mudemos de rumo para
conseqüências fatais. nossa felicidade e para a glória de Seu nome.
• Viver perturbado "Marta, andas
perturbada". O cristão que coloca os valores A APRESENTAÇÃO DO SERMÃO
materiais em primeiro plano em sua vida
não pode deixar de ter perturbações, porque
quase sempre confia mais em sua própria Existem três métodos típicos de
habilidade do que no Senhor, para
solucionar seus problemas. apresentação do sermão: a leitura do sermão, a
memorização parcial da mensagem e a pregação
Censurar os cristãos mais espirituais ou chamá-
los de fanáticos, porque preocupam-se mais com as sem anotações.

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Curso básico de teologia

a) Leitura - É muito comum nos meios políticos 1. O pregador fica preso à leitura e pode perder o
apresentar um discurso sob forma de peça literária contato com o auditório, não observando com
(numa assembléia, na Câmara, no Senado, em segurança suas reações.
solenidades públicas, quando o presidente fala em 2. O pregador fica prejudicado na arte da
cadeia nacional de televisão e rádio, nos fóruns, nos gesticulação, fator importante para enfatizar as
comícios políticos etc.). palavras e manter presa a atenção do auditório.
3. O sermão pode se tornar monótono e de tom
Vantagens da leitura do sermão:
acadêmico.
4. Cansa muito o pregador.
1. Demonstra a habilidade do pregador para
5. Exige muito tempo para ser escrito.
escrever ou redigir. Isto é importante, porque o
6. Tira a espontaneidade, o contato pessoal e a
pregador pode tornar-se escritor ou jornalista e
vivacidade.
estará capacitado a enfrentar polêmicas na
7. Restringe a liberdade mental do pregador de
imprensa.
reformular, adaptar e improvisar na hora.
2. Habilita o pregador a ter e desenvolver um estilo
8. Não é simpático ao povo; o pregador perde o
sempre correto, perfeito e atraente, visto que se
crédito intelectual e o prestígio.
empregam as palavras com bastante cuidado e
9. Nem todo pregador sabe ler de maneira que
segurança.
impressione e atraia.
3. Aprimora o conhecimento preciso da língua
portuguesa. O pregador pode consultar um
b) Memorização parcial - Na memorização
dicionário e uma gramática antes do discurso.
parcial, a mensagem é escrita, memorizada,
4. A argumentação é distribuída em ordem mais
parcialmente decorada (introdução, frases
lógica e mais convincente.
importantes e conclusão) e parcialmente recitada.
5. Os componentes do sermão são também
distribuídos em ordem lógica e proporcional.
Vantagens da memorização parcial do sermão:
6. Conserva melhor a unidade do sermão.
7. Evita que o pregador vá para o púlpito nervoso e
1. Possui as mesmas vantagens já estudadas no
preocupado com o que tem a dizer.
método anterior.
8. Exige menos tempo para dizer o que tem de ser
2. Possui ainda a vantagem de exercitar e
dito.
desenvolver a memória.
9. Podem-se citar mais textos bíblicos e com maior
3. Deixa o pregador livre para gesticular e estar em
precisão.
contato direto com seu auditório.
10. O sermão pode ser reproduzido a qualquer
4. Parece mais natural.
tempo, sem prejuízo de um só pensamento, ou
5. Impressiona mais e produz melhores efeitos.
publicado em qualquer ocasião.
11. Fixa a mente do pregador no texto ou tópico-
Desvantagens da memorização parcial do
base.
sermão:

Desvantagens da leitura do sermão:


1. O pregador pode esquecer uma palavra ou frase,

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Curso básico de teologia

o que põe em risco todo o sermão, em virtude da 1. O pregador gasta menos tempo no preparo
perturbação emocional que isso produz no literário do sermão.
pregador e da má impressão que causa no 2. O pregador habitua-se a pensar logicamente.
auditório. 3. O pregador habitua-se a pensar rapidamente.
2. Pode levar o orador a generalizar e a fazer 4. Os textos ficam livres.
dissertações vagas no desenvolver do discurso. 5. O contato psicológico entre o pregador e o
3. O estilo não será tão apurado e elegante como o auditório não sofre solução de continuidade.
dos sermões escritos. 6. Dá oportunidade ao pregador de usar ao máximo
4. O pregador pode perder o hábito de escrever os recursos naturais de sua imaginação e de sua
bem, visto que tem facilidade para falar livremente. oratória.
5. O sermão não pode ser reproduzido com os 7. O pregador fica livre para expandir seu
mesmos pensamentos, idéias, imagens e figuras de temperamento entusiasta e ardoroso, podendo
retórica da ocasião anterior. tornar-se vibrante, eloqüente e impressionante.
8. O pregador pode dispor de mais tempo no
c) Pregação sem anotações (de enunciação livre) preparo das partes essenciais dos sermões.
- Pregar sem manuscrito nenhum é a arte mais 9. O pregador fica livre para aproveitar a
sublime e difícil da homilética. Poucos pregadores iluminação e o auxílio do Espírito, bem como para
dominaram essa arte. O famoso orador Cícero (106- utilizar idéias, palavras e ilustrações que ocorram
43 a. C.), que cativou a capital do Império Romano no momento.
com sua eloqüente oratória, declarou: 10. Este era o método usado por Jesus e Seus
apóstolos.
"Na alocução, em seguida à voz e à
11. É o método mais popular e consagrado na
eficácia, vem a fisionomia; e esta é
dominada pelos olhos. O poder de história da oratória sacra.
expressão do olhar humano é tão
grande que, de certa maneira, ele
determina a expressão do Desvantagens do sermão sem anotações:
semblante todo". 70

A pregação espontânea, lembra nos 1. Nem todos os pregadores têm condições de


BLACKWOOD, foi o método de Jesus, dos profetas memorizar toda a mensagem. Isto depende muito
e apóstolos, que pregavam "de coração para coração da capacidade mnemônica do orador.
e olho para olho". 71
C. H. Spurgeon (1834-1892), o 2. O pregador investe muito tempo na
rei dos pregadores, e G. C. Morgan (1863-1942), o memorização total de sua mensagem, a não ser que
maior expositor bíblico do século XX, pregavam fale de improviso.
desse modo. 3. Num caso de falha da memória, o improviso pode
tomar conta do sermão.
Vantagens da prédica sem anotações: 4. O pregador não pode citar tantos trechos das
Escrituras, a não ser que os decore.
5. A possibilidade de gafes aumenta.
70 Citado em BROADUS, J. A. On The Preparation and Delivery of
Sermons.New Iork: Biblical House, 1944. p. 350. 6. O nível de ansiedade e nervosismo antes do
71BLACKWOOD, A. W. A Preparação de Sermões. Rio de Janeiro:
ASTE/JUERP, 1981) p. 206. sermão pode ser maior.

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Curso básico de teologia

Somos seguidores d'Aquele que disse: 'Devo


trabalhar"'. 72
Preparo exigido para a prédica de enunciação
livre:
d. A memorização do sermão. A forma de

1. O pregador deve exercitar-se em pensar com apresentação determina a intensidade da

precisão, rapidez e lógica, de maneira que seus memorização. Todavia, deve-se evitar a fala

pensamentos sejam claros, simples e de fácil improvisada (sem estrutura, totalmente espontânea

compreensão. e livre) e escravizada (completamente presa ao

2. Deve cuidar do aperfeiçoamento de sua manuscrito). A maioria dos pastores usa notas,

linguagem e estilo, ora enriquecendo seu evitando desta maneira investir horas na

vocabulário, ora lendo autores clássicos. memorização total do sermão e diminuindo a

3. Ao planejar o sermão, deve fazê-lo em ordem tensão nervosa no púlpito:

lógica e bem concatenada, de modo a facilitar o


desenvolvimento harmônico e fluente do 1. O manuscrito da prédica ajuda na

pensamento. memorização parcial. Principalmente a introdução,

4. Deve evitar levar notas escritas para o púlpito, as transições básicas, o esquema do sermão, as

além do esboço do sermão. frases de destaque e a conclusão devem ser

5. Se possível, é mais conveniente memorizar o cuidadosamente memorizados.

esboço, a fim de não ficar escravo das notas e poder 2. O sublinhar das frases fundamentais com

falar com maior liberdade de ação. cores diferentes também ajuda na memorização.

6. Não deve esquecer o cuidado com a saúde, a fim 3. A memorização em voz baixa, talvez no

de ter força e boa disposição física para pregar. escritório, é outra ajuda.

7. No preparo do esboço, o pregador deve pedir 4. Retirar-se 15 minutos antes da entrega da

sempre o auxílio e a iluminação do Espírito Santo, prédica, para rever a mensagem, é um método

tanto no arranjo técnico do sermão quanto na muito comum entre os pregadores.

própria pregação. 5. Levantar-se cedo, no domingo de manhã, e


reler toda a mensagem outra vez é um recurso

Embora recomendemos ao pregador que muito usado por pregadores.

seja o mais livre possível em suas pregações e que 6. Certos pregadores apresentam sua prédica

tenha o contato visual mais íntimo possível com o primeiro para a esposa.

ouvinte, lembramo-nos do velho bispo Edwin H. 7. Sabe-se de alguns pregadores que pregam em

Hughes que, aos 76 anos de idade, comentou o voz alta na igreja diante de bancos vazios, ou no

pecado mais comum dos pregadores, escrevendo: gabinete pastoral, como forma de memorização.
8. Escrever toda a mensagem primeiro e depois

"Espontaneidade... Esta tentação surge memorizar várias vezes as partes principais parece
quando chegamos à meia-idade... É
ser o método mais prático.
devastação que assola ao meio-dia ... O
hábito de escrever não é apenas mestre que
dirige a indústria, é guarda contra o
desleixo... Tremo ao recordar que quase
sucumbi... Se somos desleixados em nossa 72 HUGHES, E. H. I was made a minister. NY e Nashiville, 1943,
preparação, não somos criaturas decentes. pp. 311-314.

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Curso básico de teologia

L
e .A apresentação pública do sermão. Uma boa
apresentação não compensa uma prédica regular, Onde ler mais!
mas uma apresentação pública fraca diminui o
testemunho e o brilho da boa prédica. Portanto, ACIOLI, Daniel Sales. Do púlpito a palavra de Deus.
1999. Edição do autor.
uma boa apresentação pública da prédica é idônea
e indispensável à nossa vocação ministerial. BARTH, Karl. A proclamação do evangelho:
homilética. 3a Ed. São Paulo: Novo Século, 2004. 68p.

CABRAL, Elienai. O pregador eficaz. Rio de Janeiro:


1. A primeira regra da boa apresentação é uma
CPAD, 1981. 156p.
cuidadosa memorização da mensagem. O ouvinte
CARVALHO, Dirce de. Homilia: a questão da linguagem
não quer assistir a um discurso lido, ele quer ouvir na comunicação oral. 2a Ed. São Paulo: Paulinas, 1996.
344p.
uma mensagem!
2. Nosso falar deve ser agradável, claro e CRANE, James D. Manual para pregadores leigos. 6a
Ed. Rio de Janeiro: JUERP, 1986. 94p.
dinâmico, sem teatralidade, brincadeiras,
DANTAS, Anísio Batista. Como preparar sermões:
monotonia e gritaria, mas antes ter naturalidade e
dominando a arte de expor a Palavra de Deus. 2a Ed. Rio
ser simpático com o auditório. de Janeiro: CPAD, 1995. 128p.

3. Nossa apresentação é total, isto é, envolve GOMES, Geziel Nunes. Prega a palavra. 6a Ed. Rio de
Janeiro: CPAD, 1991. 93p.
gestos, atitudes e aparência. Somos embaixadores
de Cristo com todo nosso ser. Então, todo nosso KEY. Jerry Stanley. José da Silva, um pregador leigo:
seus problemas, suas dúvidas, suas experiências, suas
ser, e não apenas o falar, deve fazer transparecer a vitórias. 7a Ed. Rio de Janeiro: JUERP, 1988.110p.
majestade, a glória e a sinceridade divinas, porque a
KNOX, John. A integridade da pregação. São Paulo:
Palavra de Deus nos promete: "Quem vos der ASTE, s. d. 94p.

ouvidos, ouve-me a mim..." (Lc 10.16). JOWETT, John Henry. O pregador sua vida e obra. São
Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1969. 158p.

CONCLUSÃO MARINHO, Robson Moura. A arte de pregar: a


comunicação na homilética. São Paulo: Vida Nova,
2004.192.
Com esta apostila e as aulas em sala de
MOHANA, João. Como ser um bom pregador. 3a Ed.
aula, em momento algum, se teve a pretensão de São Paulo: Loyola, 1993. 78p.

esgotar um assunto de tão grande relevância. Mas REIS, Romeu Ritter dos. O púlpito evangélico. São
se ao final deste estudo, tivermos despertado o Paulo: Casa Editora Presbiteriana. s.d. 164p.

gosto dos alunos pela matéria, e ao mesmo tempo ROBINSON, Haddon W. (Ed.). Como aplicar os
princípios da pregação bíblica. Rio de Janeiro: CPAD,
aguçado a vontade de se estudar homilética com 2001. 272p.
mais afinco, nos damos por satisfeitos.
SALVIANO, Nelson. A arte de pregar: como
compartilhar sua fé através da pregação. Belo Horizonte:
edição do autor, 1999. 160p.
Deus tinha apenas um Filho,
e fez Dele um pregador! SILVA, Plínio Moreira da. A arte de pregar o
evangelho.4a Ed. São Paulo: ELEVA, 1986. 120p.

SILVA. Severino Pedro da. Homilética: o pregador e o


sermão. Rio de Janeiro: CPAD, 1992. 112p.

ZIBORDI, Ciro Sanches. Erros que os pregadores


devem evitar. 2a ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2005. 159p.

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Curso básico de teologia

f) As parábolas do reino de Jesus (13.1-53)


g) Reações aos ensinamentos e às
parábolas de Jesus (13.54-16.20)

MATEUS 3. O ministério privado de Jesus na Galiléia


(16.21-18.35)
a) Os ensinamentos sobre a sua missão
(16.21-17.27)

O Messias chegou! b) Os ensinamentos sobre as relações entre


os seguidores de Jesus (18.1-35)
4. O ministério de Jesus na Judéia (19.1-25.46)
a) Os ensinamentos no caminho para
O livro de Mateus foi o Evangelho mais
Jerusalém (19.1-20.34)
citado pelos escritores cristãos nos primeiros
b) A prisão e o julgamento (26.47-27.26)
séculos depois de Cristo e acabou sendo colocado
c) A crucificação (27.27-56)
como o primeiro dos quatro Evangelhos na ordem
d) O sepultamento e a ressurreição de
em que aparecem no Novo Testamento.
Jesus (27.57-28.20) 73
É impressionante a ênfase que o livro dá
aos costumes e ensinamentos dos judeus.
Destacando-se a lista dos antepassados do Senhor
Jesus, que traça a sua descendência desde Abraão,
incluindo Davi como o rei mais importante de
O Tema

Mateus foi escrito para judeus, visando a


todos os reis de Israel. Assim começa a história de
responder às suas indagações sobre Jesus de
Jesus, o Senhor e Rei, isto é, o Messias que Deus
Nazaré, que alegava ser o Messias de Israel. Seria
havia prometido enviar ao povo de Israel.
ele de fato o Messias predito no Antigo

4 Estrutura do livro
Testamento? Se era, porque não estabeleceu o
reino prometido? Esse reino será estabelecido
algum dia? Qual o propósito de Deus para este
1. Nascimento e a preparação de Jesus (1.1-4.16)
ínterim? Assim, neste Evangelho, Jesus é
a) O nascimento e a infância (1.1-2.23)
frequentemente chamado de Filho de Davi e é
b) a preparação para o ministério (3.1-4.16)
apresentado como aquele que cumpre as profecias
2. O ministério público na Galiléia (4.17-16.20)
messiânicas do Antigo testamento; o reino 74
dos
a) Começo do ministério público (4.17-25)
céus 75
é o assunto central de boa parte de Seu
b) Os ensinamentos de Jesus sobre o
ensino aqui registrado 76.
discipulado, (5.1-7.29)
c) A autoridade de Jesus se manifesta 73 ELWELL, 2002, p. 79-80.
(8.1-9.34) 74 A palavra “reino” aparece mais de 55 vezes em Mateus, pois este
é o Evangelho do Rei.
d) O ministério do discípulos (9.35-11.1) 75 A expressão “reino dos céus” aparece 35 vezes aqui e não figura
em nenhum outro dos evangelhos. Das 15 parábolas registradas em
e) O ministério de Jesus é alvo de várias
Mateus, só três não começam com a expressão “O reino dos céus é
reações (11.2-12.50) semelhante a ...”
76 BER, 1994, p. 1181.

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Curso básico de teologia

U
voz”: “Voz do que clama no deserto: Preparai o

Conteúdo do livro caminho do SENHOR; endireitarei no ermo vereda a


nosso Deus” (Is 40.3). Essa “voz”, que aparece aqui

1. Nascimento e a preparação de Jesus (1.1-4.16) sem nome, seria o arauto de Jesus Cristo. Teria
duas funções: a de voz e a de mensageiro.
Mateus é o evangelho do Messias, o
Fazendo jus ao seu nome, João o Batista
Ungido de Deus. O propósito principal neste livro é
batizou Jesus (Mt 3.13-17), vindo em seguida, O
mostrar que o Jesus de Nazaré é o Messias predito,
Espírito Santo sobre Jesus.
o Libertador, de quem Moisés e os profetas
escreveram: “...cujas origens são desde os tempos
2. O ministério público na Galiléia (4.17-16.20)
antigos, desde os dias da eternidade” (Mq 5.2 ARC).
Jesus nasceu em Belém da Judéia (Mq 5.2; O Senhor Jesus deixa sua vida pessoal e
Mt 2.1), nos dias do rei Herodes. A época e local são particular e ingressa em seu ministério público.
definidos historicamente, o que não deixa margem Mas, já começa com uma crise. Foi levado ao
para contestação por parte de críticos e de deserto a para enfrentar o primeiro grande conflito
incrédulos. do seu ministério público.
Devido ao fato de o evangelho de Mateus Satanás ofereceu-lhe um atalho para
ser direcionado aos judeus e consequentemente alcançar o reino universal que ele viria ganhar por
por apresentar o Senhor como Rei, Mateus meio do caminho longo e doloroso da cruz, mas
apresenta a genealogia 77
de Jesus. Mateus traça a Cristo veio primeiro para ser Salvador e, então
linhagem de Jesus até Abraão e Davi a fim de Senhor. Jesus, porém, saiu vitorioso.
mostrar que ele era judeu descendente de da Todo o reino precisa ter leis e padrões para
linhagem real de Davi. Daí talvez porque só Mateus governar seus súditos. O reino dos céus não
relate a visita dos magos do Oriente que vieram constitui exceção. Jesus declarou ter vindo não para
para adorar o Rei dos judeus (Mt 2.1-12). destruir a lei, mas para cumpri-la. Jesus disse que
A visita dos magos acabou desencadeando toda reforma que inicia de fora para dentro está
uma perseguição ao recém-nascido Jesus e então começando do lado errado. Cristo inicia do interior
sua família foge para o Egito para que ele não seja para o exterior. Do elevado de um monte, Jesus
morto, e só retornam quando tomaram pregou o sermão que contém as leis do seu reino
conhecimento de que Herodes, o perseguidor havia (Mt 5-7). Leia esses três capítulos e recorde o mais
morrido (Mt 2.13-23). maravilhoso de seus discursos. Está repleto de
Eis que surge um profeta! João Batista (3.1- ensinamentos. Cristo mostra que o pecado não
12). Assim como o Senhor Jesus ele também foi consiste apenas no ato cometido, mas também no
predito no Antigo Testamento. O profeta Isaías, ao motivo que o provocou (v. Mt 5.21,22,27,28).
falar da vinda do Messias, o Servo Jeová, menciona Ninguém pode esperar perdão se não perdoa (Mt
um personagem conhecido simplesmente como “a 6.12,14,15).
O Senhor Jesus define a natureza e os
77 GENEALOGIA: é o estudo da origem das pessoas e das famílias.
limites do reino, as condições de entrada, suas leis,
Há duas genealogias de Cristo: uma em Mt 1.1-17, e a outra em Lc
3.23-38. Não são iguais, e a razão é que cada uma delas traça a seus privilégio e recompensas. O Sermão do Monte
ascendência de Cristo com um propósito diferente.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 52


Curso básico de teologia

estabelece a constituição do reino. Repetidamente A seguir o ministério de Jesus é alvo de


o Rei diz “Eu, porém, voz digo”. Isso revela a várias reações (11.2-12.50).
autoridade de Jesus em relação À Lei de Moisés. No bloco seguinte temos uma série de
Observe o efeito sobre o povo: parábolas (13.1-52):
E aconteceu que, concluindo Jesus este * O semeador
discurso, a multidão se admirou da sua
doutrina; Porquanto os ensinava como * O trigo e o joio
tendo autoridade; e não como os escribas
* O grão de mostarda
(Mt 7.28, 29).
* O fermento
Jesus não apenas ensinou, mas também
* O tesouro escondido
realizou muitos milagres. Há 11 surpreendentes
* A pérola valiosa
relatos de milagres em Mt 8 e 9:
* A rede
1) A cura de um leproso, 8.1-4.
* Pai de família
2) A cura do criado de um centurião, 8.5-13
Por fim (16.21-18-35) Jesus encontra-se com
3) A cura da sogra de Pedro, 8.15, 15.
seus discípulos em Cesaréia de Filipe,
4) Expulsão de demônios e curas de muitas
aparentemente com o propósito de ter uma
enfermidades, 8.16, 17.
entrevista particular com eles, na qual lhes
5) Jesus acalma a tempestade, 8.23-27.
revelaria uma grande verdade (16). Jesus anunciou
6) A cura de dois endemoninhados, 8.28-34
que o reino seria tirado dos judeus e dado a outra
7) A cura do paralítico, 9.1-8.
nação. “Portanto, vos digo o reino de Deus vos será
8) A cura da mulher enferma, 9.19-22.
tirado e será entregue a um povo que lhe produza
9) A ressurreição da filha de Jairo, 9.23-26.
os respectivos frutos” (21.43).
10) A cura de dois cegos, 9.27.31.
Só o evangelho de Mateus menciona a
11) A cura de um mudo endemoninhado,
palavra “igreja”. Rejeitado o reino, há uma
9.32-34.
mudança nos ensinos de Jesus. Ele começa a falar
sobre a igreja, em vez de no reino (16.18). Com a
E assim como sua pregação causava
confissão de Pedro, pela primeira vez, a profética
admiração, da mesma forma os seus milagres
sombra da cruz projetou-se no caminho dos
também. Em Mt 12.23 termos: “E toda a multidão se
discípulos. Daí por diante, Jesus começou a erguer
admirava e diz: É este, porventura o Filho de Davi?”
o pano que encobria o futuro e a mostrar-lhes as
Mas a sua pregação e seus milagres não apenas
coisas que iriam acontecer.
causaram admiração mas também sistemática


oposição. Os escribas, com seu espírito crítico,
entram em cena agora e passam a julgar com Formas literárias
hostilidade os atos de Jesus (Mt 9.3).
Mateus, a exemplo de outros evangelhos, é
Jesus não só pregou, mas também reuniu
mais bem descrito como uma biografia teológica.
outros ao seu redor. Ele separou alguns para serem
Praticamente nenhum detalhe do livro tem apenas
mais próximos dele: os discípulos. Em Mt 10.1-42 e
interesse histórico. Mateus estava tentando
11.1, temos o nome dos discípulos, bem como
transmitir aos seus leitores sua maneira de
advertências e instruções aos seus discípulos.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 53


Curso básico de teologia

entender o cristianismo. Motivação teológica, a Ele o seu lugar legítimo, o de Rei da nossa vida.
porém, não exclui a confiabilidade histórica. A Por Jesus ter sido enviado por Deus,
historiografia antiga valorizava sempre a exatidão e podemos confiar-lhe nossa vida. Reconhecê-lo
também a ideologia. como salvador e Senhor e entregar-nos a Ele vale
Como o evangelho de Mateus é mais do que tudo o que temos, porque Ele é o
interpretado segundo as convenções literárias da nosso Messias. A única maneira de entrar no Reino
época, que na maioria das vezes, não fazem de Deus é pela fé – crendo em Cristo, para que Ele
questão dos padrões modernos de narrativa, nos salve do pecado e mude nossa vida. Devemos
podemos presumir sem dificuldades que seus praticar agora as obras pertinentes a s seu Reino e
relatos são confiáveis em termos históricos. estar preparados para a volta de nosso Senhor.
Todavia, a razão para serem incluídos é quase O ensinamentos de Jesus nos mostram
sempre teológica. 78
como devemos preparar-nos para seu Reino terno,

G
tendo atitudes corretas no presente, pois assim
como Ele viveu o que ensinou, nós também
Propósito e teologia
devemos praticar aquilo que pregamos.

Jesus é revelado como o Rei dos reis. Seu A ressurreição de Jesus demonstra a vida

nascimento miraculoso, sua vida, seus poderosa que só Ele tem a oferecer-nos, pois nem

ensinamentos, milagres e seu triunfo sobre a morte mesmo a morte pôde impedir seus plano de vida

revelam a verdadeira identidade dEle. eterna para nós. Aqueles que crêem em Jesus

Jesus é o Messias, aquele que os judeus podem esperar por uma ressurreição como a dEle.

esperavam, para libertá-los da opressão romana. Nossa tarefa é divulgar sua história a toda a

Contudo, tragicamente, não o reconheceram humanidade, para que todos possam compartilhar

quando veio, porque seu Reino não era exatamente a sua vitória.79

como imaginavam. O verdadeiro propósito do

L
Libertador ungido de Deus era morrer por todas as
pessoas para libertá-las da opressão do pecado. Onde ler mais!
Jesus veio à terra para dar início a seu JENSEN, Irving L. Mateus: estudo bíblico. São Paulo: Mundo
Cristão, 1984. 111 p. (Série Mundo Cristão).
Reino, que será totalmente estabelecido por
TASKER, R. V. G. Mateus: introdução e comentário. São
ocasião da sua volta. Este governo será constituído Paulo: Vida Nova, 1991, 176 p. (Série Cultura Bíblica).

por todos aqueles que seguiram fielmente Jesus.

✐ Anotações
- Mensagem para hoje
____________________________________________
____________________________________________
Jesus não pode ser comparado a qualquer ____________________________________________
outra pessoa. Ele é o Governador supremo do ____________________________________________
tempo cronológico e da eternidade, do céu e da ____________________________________________
terra, dos seres humanos e dos anjos. Devemos dar ____________________________________________
78 DOCKERY, 2001, p.579. 79 BAP, 2004, p. 1209-1210.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 54


Curso básico de teologia

(8.27-15.47)
a) a viagem a Jerusalém, (.8.27-15.47)
b) Jesus enfrenta Jerusalém (11.1-13.37)
c) Jerusalém se opõe a Jesus (14.1-15.47)

MARCOS 4. O epílogo inacabado (16.1-8)80

O Tema

O primeiro propósito de Marcos é


O Filho de Deus, apresentar por escrito o testemunho dos apóstolos
a respeito dos fatos da vida, morte e ressurreição de
servo de todos
Jesus. Marcos não pretende escrever uma biografia
completa ou mesmo um relato completo do
O Evangelho de Marcos começa dizendo ministério público de Jesus. O registro histórico é
que o assunto do livro é a boa notícia a respeito de simplificado adaptando-se à estrutura básica da
Jesus Cristo, isto é, o Evangelho, anúncio de o proclamação do Evangelho: o início do ministério
tempo de Deus trazer salvação para a humanidade de Jesus com João Batista, o ministério público de
chegou. Jesus na Galiléia e nas regiões circunvizinhanças; e
sua jornada final a Jerusalém para o sacrifício na

4 Estrutura do livro
cruz. Segundo o Evangelho de João, Jesus fez pelo
menos cinco visitas a Jerusalém. Mateus e Lucas
registram mais dos ensinamentos de Jesus do que
1. Prólogo temático: O evangelho de Jesus
Marcos, mas o objetivo de Marcos é diferente.
Cristo, Filho de Deus (1.1-15)
Usando detalhes históricos, apresenta uma
a) início do evangelho (1.1)
narrativa ampla do que os apóstolos pregavam a
b) a pregação de João Batista (1.2-8)
respeito da cruz de Cristo (At 1.21-22; 2.22-24; 1 Co
c) a tentação de Jesus no deserto (1.12,13)
2.2)81
d) o início da proclamação de Jesus (1.14,15)
2. Jesus invade o deserto e a cidade com as
boas-novas (1.16-8.26)
a) o ministério inaugural de Jesus na
U Conteúdo do livro

Galiléia (1.16-3.6) Marcos não fala dos primeiros trinta anos

b) o ministério itinerante (3.7-6.29) da vida de Jesus, mas esses anos todos foram

c) Jesus e retira para o deserto além da necessários à sua preparação humana para a obra

Galiléia (6.30-7.23) que teria de realizar. Esse evangelho começa com

d) a missão dos gentios (7.24-8.10) João Batista preparando o povo para a vinda do

d) questões relativas a sinais e visões Messias (1.2). João e Jesus encontraram-se. Ele logo

(8.11-26) reconheceu que esse Homem não precisava

3. Jesus invade a cidade hostil de Jerusalém 80 ELWELL, 2002, p. 90.


81 BEG, 1999, 1145.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 55


Curso básico de teologia

submeter-se ao batismo de arrependimento que último conflito com autoridades judaicas e de seu
pregava (Mt 3.14). Após ser batizado “o Espírito o triunfo sobre os líderes religiosos, 11.27-12.44. Jesus
impeliu para o deserto” (Mc 1.12). A seguir do procurou persuadir os judeus como Messias.
capítulo 1.14 ao 8.30 temos um registro ininterrupto Depois que Jesus respondeu a todos eles, lemos: “E
de ações de Jesus, tanto em palavras quanto através já ninguém mais ousava a interrogá-lo”, 12.34.
de milagres: Antes de Jesus ir para a cruz, revela o
* demônios expulsos, 1.21-28 futuro aos conturbados discípulos em seu discurso
* a febre repreendida, 1.29-31 no monte das Oliveiras (cap. 13).
* várias doenças curadas, 1.32-34 A trama os principais sacerdotes para
* leprosos purificados, 1.40-45 apanhá-lo astuciosamente e o matarem e a unção
* um paralítico anda, 2.1-12 do seu corpo para a sepultura abrem o cap. 14. Em
* a cura da mão ressequida seguida, vem a história sempre triste da traição por
* multidões curadas, 3.6-12 parte de um dos discípulos (14.10,11); a celebração
* a tempestade apaziguada, 4.35-41 da Páscoa e a instituição da ceia do Senhor estão
* um endemoninhado liberto, 5.1-15 comprimidas em 25 breves versículos.
* fluxo de sangue estancado, 5.21-34 Acrescentado o insulto à injúria, lemos a negação
* a filha de Jairo ressuscitada, 5.35-43 de Pedro (14.26-31, 66-71).
* cinco mil alimentados, 6.32-44 Depois que o Servo deu a vida em resgate
* Jesus anda por sobre as águas, 6.45-51 por muitos, ressuscitou dos mortos. Vem em
* todos os que o tocam são curados, 6.53-56 seguida a Grande Comissão (16.15), também
* surdos e mudos ouvem e falam, 7.31-37 registrada em Mateus 28.19, 20. Finalmente, foi
* quatro mil são alimentados, 8.1-9 recebido no céu para sentar-se à destra de Deus,
* o cego curado, 8.22-26 16.19.

A sequência de atos e palavras de Jesus, na


descrição de Marcos, é seguida pela declaração ✍ Formas literárias
petrina a respeito de quem era o Cristo (8.29). Após Antes de Marcos, os primeiros cristãos
a declaração de Pedro, Marcos revela o modo pelo transmitiam oralmente a história de Jesus,
qual o Servo deveria ser recebido: “era necessário contando histórias isoladas, pequenas coleções de
que o Filho do homem sofresse muitas coisas” declarações de Jesus e narrativas mais longas, como
(8.31). E segue-se um relato dos acontecimentos a da paixão. Marcos foi provavelmente o primeiro
seguintes: cristão a escrever um evangelho, não uma mera
* Jesus seria rejeitado pelos anciãos, pelos biografia, mas um estudo extenso do significado da
principais sacerdotes e pelos escribas, 8.31 vida e da ressurreição de Jesus para os crentes. A
* Seria entregue por traição,9.31 maioria dos estudiosos pensa que Mateus e Lucas,
* Seria morto pelos romanos, 10.32-45 que escreveram entre dez e vinte anos mais,
* Iria ressuscitar no terceiro dia, 9.31 basearam seus evangelhos no de Marcos.82
Depois do ministério público de Cristo, Uma particularidade de Marcos é o seu
descrito em Mc 10.46-11.26, lemos a respeito de seu 82 Mateus incorporou mais ou menos 90% de Marcos.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 56


Curso básico de teologia

estilo rápido de aventura (“imediatamente” é usado de pregar o evangelho da salvação.


seis vezes, e “logo”, trinta e uma vezes). Também
destaca-se seu uso de linguagem sem floreios (“viu
os céus 'rasgarem-se'”, 1.10; “ o Espírito o impeliu
para o deserto, 1.12”). A ênfase que ele dá a
- Mensagem para hoje

humanidade de Jesus, também é bastante singular, Quando o Senhor Jesus ressuscitou dos
1.41; 3.5; 4.38; 6.6; 11.12; 14.33) e sua ênfase na mortos, provou que é Deus, pode perdoar os
dificuldade em ser discípulo.83 pecados e tem o poder para mudar nossa vida.

G
Confiando em seu perdão, podemos iniciar uma
nova vida ao seu lado, e o fizermos nosso guia. Por
Propósito e teologia
causa do exemplo de Jesus, também devemos estar
Somente Jesus Cristo é o Filho de Deus. No dispostos a servir a Deus e a nossos semelhantes. A
livro de Marcos, a divindade de Jesus é verdadeira grandeza do Reino de Cristo pode ser
demonstrada por meio de seu poder, que o fez vista no serviço e no sacrifício que Ele realizou. A
vencer as enfermidades, o Diabo e morte. Embora ambição e o amor ao poder ou à posição não devem
tivesse o poder para reinar na terra, Ele preferiu ser as nossas motivações; devemos fazer a obra de
obedecer ao Pai e morrer por nós. Deus por amor a Ele.
Jesus cumpriu as profecias do Antigo Quando mais nos convencermos de que
Testamento ao vir à terra como Messias. Ele não Jesus é Deus, mais o seu poder e amor se tornarão
veio como um rei conquistador, mas como um evidentes para nós. As poderosas obrade Jesus nos
servo. Ajudeou as pessoas, curando-as e falando- mostram que Ele é capaz de salvar quaisquer
lhes a respeito de Deus. Além disso, ao dar sua vida pessoas, a despeito do passado delas. Seus milagres
em sacrifício para apagar nossos pecados, realizou e seu perdão trazem a cura e o completo bem-estar,
o maior serviço em prol da humanidade. Seus transformando a vida daqueles que nEle confiam.84
milagres foram mais enfatizados do que os seus
sermões, a fim de demonstrar que Ele é um homem
de poder e ação, não apenas de palavras. Jesus fez
milagres para convencer as pessoas sobre quem
L Onde ler mais!

realmente era e para confirmar aos seus discípulos HENDRIKSEN, William. Exposição do Evangelho de Marcos.
São Paulo: Cultura Cristã, 2003, 880 p. (Comentário do Novo
suas verdadeira identidade: Deus. Testamento).

Primeiro Jesus pregou sua mensagem aos JENSEN, Irving L. Marcos: estudo bíblico. São Paulo: Mundo
Cristão, 1984. 118 p. (Série Mundo Cristão).
judeus. Mas, quando os líderes judaicos se lhe
MULHOLLAND, Dewey M. Marcos: introdução e
opuseram, jesus também se dirigiu ao mundo comentário. São Paulo: Vida Nova, 2005, 240 p. (Série Cultura
Bíblica, v. 2).
gentílico, pregando as Boas Novas do Reino e
curando. Soldados romanos, sírios e outros gentios
ouviram o evangelho. Muitos creram e seguiram-
no. A mensagem final de Jesus aos seus discípulos
os desafiou a dirigirem-se ao mundo inteiro, a fim

83 DOCKERY, 2001, p.605. 84 BAP, 2004, p. 1285.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 57


Curso básico de teologia

c) boas novas para os pobres (6.12-8.3)


d) revelação e obediência (8.4.-21)
e) a revelação da identidade de Jesus (8.22-
9-50)

LUCAS 4. Da Galiléia a jerusalém: o discipulado (9.51-


19.27).

a) começa a viagem (13.22-17.10)


Salvador para b) a viagem continua (13.22-17.10)
c) a última parte da viagem (17.1-19.27)
todas as pessoas 4. Chegada ao destino: morte e ressurreição em
Jerusalém (19.28-24.53).

O livro de Lucas foi escrito para os gregos. a) entrada em Jerusalém (19.28-48)

Além de Judeu e do romano, o grego também b) Aumenta a controvérsia entre Jesus e os

estava se preparando para a vinda de Cristo. Era líderes (20.1-21.4)

diferente dos dois outros em muitos aspectos. c) o discípulo apocalítico (21.5-38)

Possuía cultura mais ampla, amava o belo, a d) os acontecimentos da páscoa (22.1-38)

retórica e a filosofia. Lucas, grego culto, era o e) a prisão e o julgamento (22.39-23.25)

homem ideal para essa tarefa, e apresenta Jesus f) a crucificação e o enterro (23.26-56a)

como o ideal da perfeita varonilidade. g) a ressurreição: o cumprimento das


Escrituras (23.56b-24.53)85

4 Estrutura do livro
O Tema
1. Prólogo: um relato confiável da história da
salvação (1.1-4). O principal de interesse de Lucas é pela

2. A preparação para o ministério de Jesus (1.5- história do que Deus realizou em Jesus para trazer
4.13). a salvação aos pecadores. Lucas deixa claro que esta
a) a previsão de dois nascimentos (1.5-56)
salvação está disponível aos pecadores e uma
b)o nascimento de dois meninos (1.57-2.52)
grande preocupação pelas pessoas de má
c) o ministério de João Batista: preparação
reputação, negligenciadas na religião
para o Senhor (3.1-20)
contemporânea, mas que podiam encontrar a paz
d) Jesus: no poder do Espírito Santo para o
na salvação de Deus. Lucas registra várias profecias
ministério (3.21-4.13)
do sofrimento e da morte de Cristo e dedica muito
espaço a isso. Também se faz presente no livro de
3. Jesus proclama a Salvação na Galiléia no
poder do Espírito (4.14-9.50). Lucas o pensamento de que o reino de Deus virá
com poder nos tempos finais está certamente
a) proclamação das boas novas na Galiléia presenta na sua (12.35-48; 17.22-37; 21.25-36).86
(4.14-5.16)
b) conflito com os fariseus (5.17-6.11) 85 ELWELL, 2002, p. 100.
86 BEG, 1999, p. 1179.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 58


Curso básico de teologia

U
* A ressurreição da filha de Jairo, 8.49-56

Conteúdo do livro * A missão dos doze, 9.1-10


* A confissão de Pedro, 9.10-17
* A transfiguração, 9.27-36
O início do livro é significativo. Lucas
* A cura do jovem possesso, 9.37-43
começa com uma história, que tem data e local:
Jesus vai para Judéia, e lá:
“Nos dias do rei Herodes, rei da Judéia, houve um
* Envia os setenta, 10.1-24
sacerdote...” Assim fica-se sabendo das
* Fala do Bom Samaritano, 10.25-37
circunstâncias que cercaram o nascimento e a
* Encontra Maria e Marta, 10.38-42
infância do santo Filho de Deus e do que for
* Ensina os discípulos a orarem, 11.1-13
enviado com seu precursor. O nascimento de João
* Denuncia os fariseus, 12.1-12
Batista (1.57-80), o cântico dos anjos aos pastores
* Prega sobre a avareza, 12.13-59;
(2.8-20), a circuncisão (2.21), a presentação no
arrependimento, 13.1-9; o reino de Deus 13.18-30,
templo (2.22-38) e a história do menino aos 12 anos
hospitalidade, 14.1-24; renúncia, 14.25-35; parábolas
(2.41-52).
sobre os perdidos, 15.1-32, a administrador infiel,
Apareceu João Batista “pregando batismo
16.1-30.
de arrependimento para remissão de pecados” 3.3.
Então veio Jesus para ser batizado, com cerca de
Na sequência tem se a descrição da jornada
trinta anos de idade, 3.23. A genealogia de Jesus é
de Jesus em direção a Jerusalém 16.31-19.27.
dada em conjunção com seu batismo e não com eu
Chegando em Jerusalém, temos os relatos
nascimento, 3.23-38.
de:
Segue-se ao seu batismo, a tentação, 4.1-13.
* Entrada triunfal, 19.28-38.
Assim como Jesus foi cheio do Espírito ao ser
* Autoridade Jesus posta à prova, 19.28-38
batizado (3.22), ele foi levado para ser tentado no
* A última páscoa, 22.1-38
deserto (4.1), no mesmo poder ele regressa para a
* A traição, 22.39-53
Galiléia (4.14), e então temos um profícuo
* Julgamento pelo Sumo Sacerdote, 2.54-71
ministério:
* Perante Pilatos, 23.1-26
* Em Nazaré, onde morava, 4.16-30
* A crucificação, 23.27-49
* Em Cafarnaum, 4.31-44
* O sepultamento, 23.50-56
* O chamado de Pedro, Tiago e João, 5.1-11
* A ressurreição, 24.1-48
* O confronto com os Fariseus, 6.1-11
* A ascensão, 24.49-53. Já não é um Cristo
* A escolha dos doze, 6.12-16
local, limitado a Jerusalém, mas um Cristo
* A instrução aos discípulos, 6.17-49
universal. Ele podia dizer aos discípulos que se
* Os milagres, 7.1-17
lamentavam, pensando que não mais o teriam
* Discursos, 7.18-50
consigo: “Eis que eu estou convosco todos os dias”.
* Parábolas, 8.4-21
* O mar acalmado, 8.22-25
A lista não é completa, mas dá uma vista
* A cura de um endemoninhado, 8.26-40
geral da vida ativa do Filho do Homem na terra.
* A mulher curada, 8.41-48

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 59


Curso básico de teologia

em 7.18-35 e 11.14-23.87

✍ Formas literárias
G Propósito e teologia
Lucas é um evangelho, uma obra literária
que só se encontra na Bíblia. O relato flui como Lucas descreveu como o Filho de Deus
uma narrativa. Ele é mais que uma biografia, entrou na História. Jesus viveu de forma exemplar,
porque seleciona seu material e tem uma foi Homem perfeito. Depois de um ministério
mensagem teológica a transmitir. É história, mas perfeito. Ele se entregou como sacrifício perfeito
história seletiva. Não dá detalhe algum da infância pelos nossos pecados, para que pudéssemos ser
de Jesus. Passa-se diretamente do nascimento para salvos. Ele estava profundamente interessado nas
o seu ministério, com exceção de um incidente pessoas e nos relacionamentos interpessoais.
quando ele tinha doze anos de idade e da breve Mostrou uma calorosa preocupação com seus
interposição do ministério de João Batista. Um seguidores e amigos, fossem homens, mulheres ou
evangelho é uma explanação teológica e pastoral da crianças.
importância e do impacto da vida, morte e Como o Homem perfeito, Jesus mostrou
ressurreição de Jesus. Portanto, os personagens, o uma compaixão sublime pelos pobres, desprezados,
cenário e as mudanças de tempo e lugar, atitude e feridos e pecadores. Ninguém foi rejeitado ou
sequência de eventos fazem parte do relato do ignorado por Ele.
ministério de Jesus. O Espírito Santo estava presente no
Todos os evangelhos contam a sua maneira nascimento, no batismo, no ministério e na
os fatos que cercam Jesus, e às vezes não os ressurreição de Jesus. Como um exemplo perfeito
apresentam em sua ordem histórica ou cronológica para nos, Jesus viveu na dependência do Espírito.
mas seguindo seus objetivos temáticos. Um sinopse
mostra facilmente essas redisposições (compare Mc
6.1-6 com Lucas 4.1-13), ou a ordem das tenções em
Mt 4.1-11 com Lc 4.1-13). A narrativa de Lucas é
- Mensagem para hoje
dominada por dois cenários: a reunião dos Jesus é o nosso Líder e Salvador perfeito.
discípulos na Galiléia (4.14-9.50) e a viagem para Ele oferece perdão a todos aqueles que o aceitam
Jerusalém. Durante a viagem, a rejeição aumenta, e como Senhor de sua vida e crêem que aquilo que
Jesus prepara s discípulos para a sua partida (9.51- Ele diz é a verdade. Lucas forneceu detalhes, a fim
19.44). Aí podemos encontrar os elementos centrais de que possamos crer na confiabilidade da história
no evangelho de Lucas. da vida de Jesus. Podemos crer com certeza que
Lucas também tem muitos relatos de Jesus é Deus!
milagres e muitas parábolas. Estas enfatizam o O amor de Jesus pelas pessoas é uma boa
pode e o ensino de Jesus. Lucas tem mais parábolas nova a todos. Sua mensagem é para todas as
que qualquer outro evangelho. A maioria trata ou pessoas, de todas as nações. Casa um de nós tem
do plano de Deus ou da vida do discípulo. A uma oportunidade de responder a Ele com a nossa
explicação dos seus milagres e do significado está fé. Jesus é mais que um bom Mestre, Ele se importa
87 DOCKERY, 2001, p.625.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 60


Curso básico de teologia

com conosco! Por causa do seu profundo amor por


nós, Ele pode satisfazer nossas necessidades. O
Espírito Santo foi enviado para confirma a
autoridade de Jesus. Foi dado para capacitar as

JOÃO
pessoas a viverem para Cristo. Pela fé, podemos ter
a presença e o poder do Espírito Santo que habita
em cada um de nós; podemos testemunhar sobre
Cristo e servir a Deus.88
vida eterna
L Onde ler mais!
MORRIS, Leon L. Lucas: introdução e comentário. São Paulo:
por intermédio
Vida Nova, 200, 330 p. (Série Cultura Bíblica, v. 3).
do seu nome
✐ Anotações
O livro de João foi escrito para provar que
____________________________________________ Jesus era o Cristo, o Messias, o Ungido de Deus
____________________________________________ prometido (para os judeus) e o Filho de Deus (para
____________________________________________ os gentios); tinha em mira levar seus leitores a crer
____________________________________________ nele a fim que, crendo, tivessem vida em seu nome
____________________________________________ (20.31).
____________________________________________
____________________________________________
_________________________________________________
4 Estrutura do livro

_________________________________________________ 1. Prólogo (1.1-18)

_________________________________________________ 2. o livro dos sinais (1.19-12.50)

_________________________________________________ a) o testemunho de João (1.19-51)


b) Jesus e as instituições (2.1-4.54)
_________________________________________________
c) Jesus e as festas judaicas (5.1-10.42)
_________________________________________________
d) o prenúncio da morte e da ressurreição
_________________________________________________
(11.1-12.50)
_________________________________________________
3. o livro da glória (13.1-20.31)
_________________________________________________ a) a ceia da Páscoa (13.1-30)
_________________________________________________ b) o discurso de despedida (13.31-17.26)

_________________________________________________ c) a paixão (18.1-19.42)

_________________________________________________
d) a ressurreição (20.1-29)
e) conclusão (20.30,31)
_________________________________________________
4. epílogo (21.1-25)
_________________________________________________
a) o milagre dos 153 peixes (21.1.-14)
b) Jesus e Pedro (21.15-23)
88 BAP, 2004, p. 1337.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 61


Curso básico de teologia

U
c) apêndice (21.24,25)89

O
Conteúdo do livro
Tema João inicia seu registro com Jesus Cristo
antes da encarnação, 1.1-18. Quando João Batista
A interação de Jesus com aqueles que não o
entra em cena, começa o grande drama do
receberam embora fossem “seus” (1.11) é um
evangelho de João (1.19). Uma delegação de
enfoque importante do ministério público (cap. 1-
sacerdotes e levitas foi enviada a João para
12). Jesus aparece frequentemente em Jerusalém
perguntar quem ele dizia ser. Disse-lhes que não
por ocasião das festas judaicas. Estas festas têm
era o Messias; nem mesmo Elias ou qualquer outro
especial importância por causa do modo como
profeta de que Moisés falara, mas simplesmente “a
Jesus relaciona a sua própria obra com o que elas
voz do que clama no deserto: Endireitai o caminho
significam (7.37-39). Apesar deste ministério, sua
do Senhor”.
nação não o recebeu, um fato que João explica
Os discípulos de Jesus convenceram-se da
como resultado do pecado humano. Jesus é
sua divindade no primeiro milagre que realizou ao
rejeitado não porque ele é um estranho, mas
transformar água em vinho. Ele falou e aconteceu,
porque as pessoas amam mais as trevas que a luz.
2.1.
O Evangelho de João faz uso de contrastes
Ao contrário dos demais evangelistas, João
bem marcados: luz e trevas (1.4-9), amor e ódio
narra o início do ministério de Jesus em Jerusalém,
(15.17,18), de cima e de baixo (8.23), vida e morte
2.13-22. É lá que que Jesus ensinou a Nicodemos
(6.57,58), verdade e falsidade (8.32-47). outros
sobre a vida eterna, 3.1-21. Em seguida Jesus revelou
traços distintivos aparecem no tema da má
a uma mulher a verdade de sua obra messiânica
compreensão (2.21; 6.51-58), no uso de duplo
(4.1-30). Já na Galiléia , Jesus cura o filho de um
sentido (3.14; 6.62) e no papel dos ditos “Eu sou”
oficial do rei, bem como o leva a confessá-lo como
(6.35).
Senhor, 4.46-54.
João destaca de vários modos a realidade
O milagre da alimentação de 5 mil pessoas
do pecado, mas especialmente pela ênfase na nossa
foi encenada. Jesus era o próprio pão do céu.
total dependência de Deus para a salvação. Assim
Queria mostrar-lhes que ele podia dar satisfação e
como nosso nascimento físico não foi o resultado
alegria a todos os que confiassem nele, 6.35.
de nosso próprio esforço ou desejo, também nosso
O povo fica dividido por causa de Jesus,
nascimento espiritual não depende de nós, mas da
7.40-44, a incredulidade gera nos incrédulos
vontade de Deus e no poder de seu Espírito.
hostilidade, mas nos verdadeiros seguidores a fé
Homens e mulheres pecadores são incapazes de
crescia.
chegar a salvação em Jesus Cristo se não forem
A cura do cego (9.35-41) levou jesus a
atraídos pelo Pai (6.44). Mas quando vêm a Jesus,
revelar-se a ele. Quando o expulsaram por ter
eles têm a “vida eterna” e não entram em juízo”
confessado Cristo, Jesus pronunciou um grande
(5.24); pertencem ao Pai, e ele não os deixará
discurso sobre o bom pastor (101.-42).
morrer (10.27-29).90
A ressurreição de Lázaro é o último “sinal”
89 ELWELL, 2002, p. 110. do evangelho de João. Os outros evangelhos
90 BEG, 1999, 1226.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 62


Curso básico de teologia

registram o caso da filha de Jairo e do filho da transliteração do grego euangellion, que


viúva de Naim, mas aqui Lázaro já estava morto literalmente significa “boas notícias”. Com
havia quatro dias (11.1-46). referência aos quatro evangelhos no Novo
João 11 termina com os principais Testamento, o que temos é uma narrativa das boas
sacerdotes e os fariseus planejando tirar a vida do novas de Jesus Cristo.
Senhor Jesus. Esta cena termina com a entrada João fez uso de muitas figuras da poesia
triunfal de Jesus em Jerusalém. Seu ministério hebraica, com destaque para o paralelismo. O
público havia chegado ao fim. evangelho não contém parábolas, como Mateus,
A cena que se segue é conhecida como Marcos e Lucas, mas apresenta muitas alegorias
“Semana da paixão”. Aqui as multidões são usadas por Jesus em seu ministério de ensino.91
deixadas para trás e têm-se a última semana na
terra, antes da crucificação, cap. 13-17. No domingo
- a entrada triunfal em Jerusalém; na segunda - a
G Propósito e teologia

purificação do templo; na terça os conflitos no


João nos mostra que jesus é único como
templo. À noite o discurso no Monte das Oliveiras.
Filho especial do altíssimo, Ele é o próprio Deus
Na quinta – preparação para a Páscoa. À noite – a
encarnado. Por ser plenamente Deus, jesus é capaz
última ceia com os discípulos.
de revelar-nos o Pai de modo claro e correto.
Os cap. 18 e 19 tratam do sofrimento e
Por ser Deus, Jesus vive para sempre. Antes
morte do Senhor. Jesus chegara ao momento
de o mundo existir, vivia com Deus e reinará para
culminante da sua vida na terra. Não era uma crise,
sempre com Ele. No Evangelho de joão, jesus é
mas um clímax. O breve intervalo entre a negação
revelado com poder e grandeza mesmo antes de
de Pedro e a subida de Jesus ao Gólgota foi cheio de
sua ressurreição.
incidentes.
João registrou oito sinais específicos ou
Os dois capítulos finais do Evangelho de
milagres que provam a natureza do poder e do
João tratam da vitória do Senhor sobre a morte e de
amor de Jesus. Vemos seu poder sobre todas as
como ele aparece aos seus discípulos dissipando-
coisas criadas e seu amor por todas as pessoas.
lhes todas dúvidas e dando a Grande Comissão de
Estes sinais nos encorajam a crer nEle.
levar o evangelho ao mundo todo, 20.21.
Jesus disse aos seus discípulos que o
O grande ápice do evangelho de João é a
Espírito Santo viria depois que Ele fosse para o céu.
afirmação de o Senhor Jesus não apenas era cheio
Então, o Espírito habitaria, guiaria, aconselharia e
do Espírito, como também partilhou desse Espírito
confortaria aqueles que seguissem Jesus. Por
com os seus discípulos: “recebei o Espírito Santo”,
intermédio do Espírito Santo, a presença e o poder
20.23.
de Cristo são multiplicados na vida de todos


aqueles que crêem em Jesus.

Formas literárias No terceiro dia após a sua morte, Jesus


ressuscitou. Isso foi verificado por seus discípulos e
O gênero literário do evangelho de João é
por muitas testemunhas oculares. Esta realidade
exatamente este – um evangelho. O que é um
evangelho? A palavra em português é uma 91 DOCKERY, 2001, p.643.

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Curso básico de teologia

transformou os discípulos de desertores e


aterrorizados em líderes dinâmicos da nova Igreja.
A ressurreição é o fundamento da fé cristã.

ATOS
- Mensagem para hoje

Por Jesus ser o Filho de Deus, podemos


confiar perfeitamente no que diz. Confiando nEle,
podemos ter uma mente aberta para entender a os primeiros dias
mensagem de Deus e cumprir o seu propósito em
nossa vida. da igreja primitiva
Jesus nos oferece vida eterna. Somos
convidados a começar a viver um relacionamento
pessoal e terno com Ele agora. Embora Atos começa onde o Evangelho de Lucas
envelheçamos e morramos, confiando em Jesus, termina: O Senhor Jesus Cristo era o centro das
pode-se ter uma nova vida que durará para sempre. atenções. Lc 24.51 relata que várias semanas após a
A fé é ativa, viva, é a confiança contínua sua ressurreição, Jesus subiu ao céu. Atos começa
em Jesus como Deus. Quando cremos em sua vida, com uma revelação adicional sobre o que Jesus
em suas palavras, em sua morte e ressurreição, disse e fez antes de sua partida física da terra
somo purificados do pecado e recebemos pode para

4
segui-lo. Mas devemos corresponder a Ele com fé.
Por intermédio do Espírito Santo, somos
Estrutura do livro
atraídos a Deus pela fé. Devemos conhecer o
Espírito para entender tudo o que Jesus ensinou. 1. O testemunho inicial de Cristo em Jerusalém

Experimentaremos o amor e direção de Jesus à e arredores (1.1-7.60)

medida que permitirmos que o Espírito Santo a) introdução e instruções (1.1-8)

realize a sua obra em nós. b) a ascensão (1.9-11)

Podemos ser transformados, como os c) a escolha do substituto de Judas (1.12-26)

discípulos foram, e ter a confiança de que o nosso d) Pentecostes: surgimento da Igreja (2.1-

corpo um dia ressuscitará para que vivamos 47)

eternamente com Cristo. O mesmo poder que e) o primeiro confronto da Igreja com os

ressuscitou a Cristo pode capacitar-nos a segui-lo a líderes religiosos (3.1-4.35)

cada dia.92 f) Ananias e Safira: um caso de disciplina


(4.36-5.16)

L Onde ler mais! g) o segundo confronto da Igreja com os


líderes religiosos (5.17-42)
BRUCE, F. F. João: introdução e comentário. São Paulo: Vida
Nova, 2000, 355 p. (Série Cultura Bíblica, v. 4). h) os sete servos (6.1-7)
i) Estevão: confronto final com o Judaísmo
92 BAP, 2004, p. 1411.

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Curso básico de teologia

(6.8-7.60)
2. o testemunho inicial de Cristo na Judéia e
Samaria (8.1-12.25) U Conteúdo do livro
a) Saulo, o perseguidor e Filipe o
evangelista (8.1-40) Os discípulos passaram quarenta dias

b) a conversão de Saulo, (9.1-31) maravilhosos com o Senhor Jesus, depois de

c) o ministério de Pedro na Judéia (9.32- ressurreto e antes da sua ascensão. Estavam

11.18) realmente ansiosos por ouvir suas últimas palavras

d) a igreja da Antioquia: Barnabé (11.19-30) de instrução. Ele falava das coisas do reino de Deus;

e) a libertação miraculosa de Pedro (12.1- nessa ocasião determinou-lhes que não se

25) ausentassem de Jerusalém, mas esperassem a

3. o testemunho de Cristo até os confins da promessa do Pai (1.4).

terra (13.1-28.31) Os primeiros 11 versículos do capítulo 1

a) a primeira viagem missionária de Paulo servem de introdução para o resto do livro.

(13.1-14.28) * A Grande Comissão, 1.6-8

b) o Concílio de Jerusalém (15.1-35) * A Ascensão, 1.29, 11

c) a segunda viagem missionária de Paulo * A volta de Cristo, 1.10, 11

(15.36-18.22) Os discípulos ainda não estavam satisfeitos

d) a terceira viagem de Paulo (18.23-21.15) quanto à época em que Cristo iria estabelecer seu

e) a prisão de Paulo em Jerusalém e o reino na terra. Ainda esperavam um reino que lhes

cárcere em Cesaréia (21.15-26.32) desse independência política e os colocasse em

f) A viagem de Paulo a Roma (27.1-28.10) posição de liderança no mundo (1.6). Qual foi a

g) o ministério de Paulo em Roma (28.11- resposta de Jesus (1.7)? Um dia, Jesus os levou para

31)93 Betânia e, erguendo as mãos, os abençoou (Lc


24.50). Disse-lhes que o poder eles não seria

O
político, mas espiritual (1.8).

Tema Com a ascensão, nosso Senhor


desapareceu, mas permaneceu com eles de modo
Levando em conta as orientadoras palavras mais real. Depois de lhes ter falado suas últimas
de Jesus em At 1.8 (“e sereis minas testemunhas palavras (1.8), foi arrebatado, e uma nuvem o
tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e encobriu dos olhos deles.
Samaria e até os confins da terra”) o livro “Esses Jesus [...] virá do modo como o
desenvolve-se da seguinte forma: os capítulos 1 a 12 vistes subir” (1.11). Cristo ordenou-lhes que
relatam a expansão do evangelho dentro e além de esperassem pela promessa. Seria natural que
Jerusalém, Judéia e Samaria. Os capítulos 13 a 28 tivessem fugido do lugar em que seu Senhor havia
relatam o testemunho de Cristo pela Igreja sido crucificado e voltassem para a Galiléia. Mas a
Primitiva à medida que atingiu “os confins da terra” ordem era para que permanecessem na cidade por
durante as primeiras décadas. ser o centro de maior influência.
A igreja nasceu no dia de Pentecoste (2.1-
93 ELWELL, 2002, p. 213, 224, 238-239.

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Curso básico de teologia

13). O Pentecoste era uma das festas mais O quadro da igreja nesse momento era de
populares, e Jerusalém estava repleta de peregrinos união (4.32), havia espontaneidade quanto a
de toda parte. Cinquenta dias havia passado desde distribuição de bens, no entanto tal comunhão
a crucificação. A partir dessa data, o Pentecoste não estava sujeita a abuso e engano (5.1-11).
seria mais uma festa judaica, mas o raiar de um Através dos apóstolos muitos milagres são
novo dia, o dia do nascimento da igreja de Cristo. feitos (5.12-16), mas a contínua oposição resulta-
O Espírito Santo pousou sobre os lhes em prisões (5.17-42).
discípulos (2.1-3). Eles foram cheios do Espírito Com a multiplicação dos criam,
Santo e, assim, estavam capacitados para um avolumam-se os problemas internos entre o povo e
serviço especial. Não só foram capacitados para isto exigiu a instituição de sete auxiliares, os
pregar com poder, mas para falar nas diferentes diáconos (6.1-7). Estes tinham por ofício servir às
línguas representadas naquele dia em Jerusalém mesas e a pregação e a oração. Dentre eles
(2.2-4). destacaram-se Estevão e Filipe.
Devido a mal interpretação de algumas A oposição concentrou-se em Estevão, o
pessoas que não entenderam o que estava que resultou em sua morte. Veja as experiências
acontecendo, pois zombavam (2.13-15), Pedro se registras nos capítulos 6 e 7.
defende contra essa falsa acusação (2.15-31). At 8-12 reflete uma ligeira mudança de
A primeira igreja de Jerusalém foi perspectiva. Os primeiros capítulos enfatizam mais
organizada com 3 mil membros e o conteúdo e o impacto da mensagem pregada. At
“Enquanto isso, acrescentava-lhes o Senhor, 8-12 continua esse foco, mas também se interessa
dia a dia, os que iam sendo salvos” (2.47)
em uma série de pessoas individualmente. A fim de
O cap. 3 inicia junto à porta do templo tornar mais forte a reação da Igreja Primitiva ao
chamada Formosa. Pedro havia curado um coxo de mandato de Jesus (“sereis minhas testemunhas,
nascença que era colocado diariamente naquele tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e
lugar para pedir esmolas. O milagres atraiu a Samaria...”), esses capítulos retratam habilmente o
atenção dos líderes judeus e resultou na primeira impacto do evangelho sobre diversas vidas em
oposição à igreja. particular. Geralmente, o impacto envolve a
Ao juntar-se uma multidão ao redor do aceitação de Cristo. Em alguns casos, envolve
coxo curado tão milagrosamente, Pedro aproveitou repreensão e também julgamento pela
a oportunidade para pregar seu segundo sermão. desobediência a Cristo. Em todos os casos, esse
As palavras de Pedro e João foram tão poderosas trecho de Atos mostra o conhecimento pessoal de
que um total de 5 mil pessoas aceitassem a Cristo. Deus e o interesse na vida de todas as pessoas,
Os líderes religiosos da época revoltaram- fossem judeus (como Jesus e os que estavam em
se porque os apóstolos ensinavam ao povo que esse sua volta) ou gentios.
Jesus a que eles haviam crucificado ressuscitara dos Algumas dessas pessoas são personagens
mortos e iria voltar (4.2). Pedro e João foram secundários n escopo geral da formação da Igreja
presos, e levados perante ao Sinédrio foi lhes Primitiva. Outras são fundamentais. Todos são
ordenado que não mais pregassem. Não tendo o afetados pelo mesmo evangelho.
que lhes castigar (4.21) eles os soltaram. Dos que creram:

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Curso básico de teologia

* Filipe 8.5-13, 26-40 ele finalmente visitou Jerusalém. Com a ajuda de


* O eunuco etíope (8.26-40) Barnabé, foi recebido ali, pelo menos, por alguns
* Ananias (9.10-19) dos crentes, embora muitos deles naturalmente
* Enéias (9.33-35) desconfiassem. Estaria ele sendo sincero em se
* Tabita (9.36-42) voltar para Jesus Cristo (9.26)? Ou será que estaria
* Simão, o curtidor (9.43; 10.6, 17, 32) fingindo que seguia a Cristo como uma forma de
* Cornélio (10.1-11.18) reunir informações para utilizar contra os crentes
* Barnabé (11.22-30) mais tarde? Quando alguns judeus em Jerusalém
* Ágabo (11.28) tentaram matá-lo, Saulo escapou com a ajuda de
* Tiago, irmão de João (12.2) outros crentes para Cesaréia, na região costeira.
Dos que não creram: Depois, ele navegou para o norte, rumo à sua terra
* Simão, o mágico (8.9-25) natal, a cidade Tarso. Atos registra que depois
* Herodes Agripa I (12.1-23) disto, as igrejas de Judéia, Samaria e Galiléia
Personagens principais: desfrutara, de um período de relativa calma e
* João (8.14-25) crescimento.
* Pedro (8.14-25; 9.32-43; 10.1-11.18; 12.3-18) Em terceiro lugar, At 1.25-30, Saulo é
* Saulo (8.1-3; 9.1-31; 11.25-30; 12.25) recrutado por Barnabé para encargos pastorais na
inexperiente igreja de Antioquia. Em parte, devido
Atos 8-12 oferece quatro rápidas visões de aos esforços e dons de Saulo, ensinaram o
Saulo (mais tarde chamado Paulo). Primeiramente, evangelho a uma “numerosa multidão” (11.26).
ele comandou o apedrejamento de Estevão e Quando Ágabo profetizou uma fome, os crentes de
instigou uma cruel perseguição contra o judeus que Antioquia decidiram fazer uma coleta para os
aceitaram Jesus como o Messias (8.1-3). judeus cristãos na Judéia. Saulo juntamente com
Em segundo lugar, embora ainda estivesse Barnabé, foi selecionado para levar uma substancial
envolvido nas ações contra os seguidores de Jesus, oferta em dinheiro (11.30). Essa seria a segunda
Saulo foi confrontado por alguém que supunha visita de Saulo, após a sua conversão, a Jerusalém.
estar morto: Jesus. At 9.1-31 é um dos três relatos, Em quarto lugar, em At 12.25, Barnabé e
cada um deles ligeiramente diferente, dessa Saulo cumpriram a sua missão. Voltaram a
experiência, que aconteceu na estrada entre Antioquia trazendo consigo uma pessoa chamada
Jerusalém e Damasco (At 22.4-16; 26.9-18). Depois João Marcos.
de três dias de jejum, Saulo recebeu o Espírito de At 13-28 descreve três viagens missionárias
Jesus, cujos seguidores ele havia perseguido (At separadas, sendo cada uma delas responsável por
9.17, 18). Ele declarava publicamente suas novas e levar o Evangelho a novas regiões. Esses capítulos
espantosas convicções nas sinagogas de Damasco, resumem o debate teológico sobre o que fazer com
contando seu caso com tal vigor que um complô foi os estrangeiros (não-judeus ou gentios) na igreja.
formado para matá-lo (9.23). Ele conseguiu fugir Também registram a prisão de Paulo causada
para a Arábia por algum tempo antes de voltar para principalmente por causa de sua mensagem de que
Damasco (Gl 1.17). os gentios também eram bem-vindos na família de
Cerca de três anos depois de sua conversão, Deus pela fé. Muitos judeus zelosos se opuseram a

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 67


Curso básico de teologia

essa mensagem e trabalharam para silenciar Paulo.


Atos termina com a história de como a antiga meta
de Paulo de pregar o evangelho na grande cidade
Roma foi finalmente atingida.
A

✍ Formas literárias
DOUTRINA
O autor faz um relato sobre o cristianismo
primitivo. Ele não idealiza a situação, e tampouco
conta tudo o que aconteceu. Nem mesmo todos os
DE DEUS
eventos importantes importantes são tratados. Ele
escolhe o que é importante para ele, para alcançar
CONTEÚDO:
o seu objetivo, e omite, pelo mesmo motivo, o que
lhe parece prescindível. O que é importante para os
seus objetivos ele detalha; e repete o que gostaria I – O ESTUDO DA DOUTRINA
II – A BÍBLIA, FONTE DA DOUTRINA CRISTÃ
de ressaltar de maneira especial. Assim, as notícias III – A EXISTÊNCIA DE DEUS
sobre a igreja primitiva são um tanto resumidas.94 IV – OS NOMES DE DEUS
V – A DEFINIÇÃO DE DEUS
VI – OS ATRIBUTOS (QUALIDADES) DE DEUS

L Onde ler mais!


BRUCE, F. F. Pedro, Estevão, Tiago e João: estudos do
VII – A NATUREZA DE DEUS

cristianismo não- paulino. São Paulo: Shedd, 2005. 142p.

MARSHALL, I. Howard. Atos: introdução e comentário. São


Paulo: Vida Nova, 2005, 397 p. (Série Cultura Bíblica, v. 5). Considerações preliminares:

✐ Anotações
O dicionário Webster define teologia da
seguinte maneira:

____________________________________________
Teologia é o estudo de Deus e das relações entre
____________________________________________
Deus e o universo; o estudo das doutrinas religiosas
____________________________________________
e questões de divindade;uma forma específica ou um
____________________________________________
sistema de estudo.
____________________________________________
____________________________________________
O vocábulo TEOLOGIA, vem de duas
____________________________________________ palavras gregas:
_________________________________________________

_________________________________________________
Qeo,j (Deus) e
_________________________________________________ lo,goj (palavra).
_________________________________________________ Pensar, raciocinar a respeito de Deus95.

94 HÖSTER, 1996, 67. 95 Num certo sentido da palavra, é uma ciência, um estudo de Deus e

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 68


Curso básico de teologia

Estudo de Deus 96. Existem muitas O termo teologia significa basicamente


pessoas que não gostam de estudar
discursar a respeito de Deus. Mas falar de Deus
Teologia, de pensar teologicamente, pois
acham-na sem interesse, sem utilidades levanta a questão:
ou sem valor espiritual e prático.
Por isso a palavra ‘teologia’ é usada em
referência ao estudo disciplinado de Deus, de sua
É necessário notar porém, que a Teologia
natureza, de seus atributos e de seu
traz um desafio ao coração, a mente e a consciência
relacionamento com o universo e as pessoas.
do cristão. Sã doutrina traz saúde espiritual.
A teologia busca: Como saber se que
o que estou
dizendo a respeito A teologia
1) A classificação da verdade: O teólogo acata todos de Deus é verdade?
cristã
os fatos à respeito de Deus e do mundo em que fundamenta-se na crença de que Deus se revela
vivemos, sintetiza e estuda os fatos de uma maneira na natureza, na história e nos negócios humanos. O
sistemática e ordenada. Deus que se revelou dessas formas é aquele que fala
2) A aplicação da verdade: O viver e o pensar são na Bíblia e se fez homem em Jesus Cristo. A
inseparáveis. Existe uma herança intelectual na teologia cristã tenta compreender o que Deus nos
Palavra de Deus, mas existe também uma herança revelou e o que essa revelação significa.
espiritual. Doutrina sem dever, é uma árvore sem
frutos. Dever sem doutrina é uma árvore sem
raízes. I – O ESTUDO DA DOUTRINA DE DEUS

3) A proclamação da verdade: Se o evangelho não


inspira pensamento e a nossa teologia não inspira “ O meu ensino não é meu, e, sim daquele que
me enviou, se alguém quiser fazer a vontade
pregação, não existe cristianismo nem uma coisa dele, conhecerá a respeito da doutrina, se ela é
de Deus ou se falo se eu falo por mim mesmo”
nem outra. Jo 7.16,17.
4) A teologia estuda aquilo de que a religião é a
realidade. A religião é a vida de Deus, vida em que O Senhor Jesus, quando terminou de
tornam parte ativa o intelecto, a vontade e as pregar o sermão da montanha, “estavam as
afeições. A vida religiosa envolve o homem em todo multidões maravilhadas; porque ele as ensinava
o seu ser, e os fatos apurados das suas experiências como quem tem autoridade...” (Mt 7.28,29).
com Deus, no transcurso da vida, constituem a sua Também ele exortou os seus discípulos a que se
teologia. guardassem do fermento, ou seja, da doutrina
O homem é um ser que reflete, que pensa errônea dos fariseus (Mt 7.28,29). É notório que,
sobre as suas experiências. A teologia é, portanto, nestes casos, a palavra doutrina significa
coisa necessária e natural. ‘ensinamento’, mas vê-se que o que está sendo
ensinado é o que se crê e o que se pratica na vida.
de seu mundo. Ciência é um arranjo sistemático de fatos O que o homem crê, diz Wiley 97, também
comprovados. A teologia é uma ciência, porque consiste de fatos
relacionados à Deus e as coisas de Deus, apresentadas de uma se relaciona diretamente com a influência exercida
maneira lógica e ordenada. sobre outros. Por isso Paulo aconselhou a Timóteo,
96 A teologia cristã não se fundamenta sobre especulações à respeito
dele, mas assume a tarefa de compreender e interpretar a revelação
que ele fez de si mesmo. 97 WILEY, H. Orton. Introdução à teologia cristã. p. 18.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 69


Curso básico de teologia

numa passagem conhecida: Procura apresentar-te a da Bíblia em termos gerais.


Deus, aprovado, como obreiro que não tem de que A Bíblia é com freqüência chamada
se envergonhar, que maneja bem a palavra da “palavra de Deus” ou “palavra escrita”, é o registro
verdade. 2 Tm 2.15. Advertiu-o também dizendo: divinamente inspirado da natureza e da obra
Medita nestas coisas, e nelas sê diligente, para que redentora de Cristo. É desta revelação98 de Deus,
o teu progresso seja a todos manifesto. Tem como no-la dá a Bíblia, que vamos aqui estudar.
cuidado de ti mesmo e da doutrina. Continua Logo, revelação é a manifestação que Deus faz de si
nestes deveres; porque, fazendo assim, salvarás mesmo e a compreensão, parcial embora, da
tanto a ti mesmo como aos teus ouvintes. 1 Tm mesma manifestação por parte dos homens. Na
4.15-16. Esta é a obrigação de leigos e ministros. revelação Deus faz-se conhecido dos homens na
Aconselha-se a todo o cristão a estar sempre sua personalidade e nas suas relações.
preparados para responder a todo aquele que vos Revelar é informar, e isto é justamente o
pedir razão da esperança que há em vós, 1 Pe 3.15. que Deus tem feito. A revelação não tem por fim
Há pelo menos duas razões centrais para se simplesmente informar o homem a cerca de Deus,
estudar a doutrina: mas também descobrir Deus ao homem99.
a)o estudo da doutrina fortalece a fé cristão contra Temos duas expressões do AT que
os ataques e dúvidas, porque ele compreende, destacam a natureza da Revelação de Deus:
assim, o plano de Deus em sua totalidade; LEI (Torah), Is 1.10 = instrução, ou direção divina.
b) o estudo da doutrina é necessário para a PALAVRA (Debbhar), Mq 4.2.
propagação eficiente do evangelho.
Estes dois termos são usados na Bíblia para
II – A BÍBLIA, FONTE DA DOUTRINA CRISTÃ
descrever o conteúdo da revelação divina como um
todo. A Lei, é a instrução divina para o seu povo. O
Qual o lugar A fé cristã ensina
corpo de instruções autoritativas que Deus deu aos
da Bíblia?
ser possível conhecer
homens. A Palavra de Deus é tudo aquilo que Deus
a Deus por meio de Jesus Cristo. Porque Jesus
tem a dizer para o homem.
ressuscitou dos mortos e está vivo para sempre. Por
98 O TERMO “REVELAÇÃO”, INCLUI TODOS OS MEIOS ATRAVÉS DOS QUAIS DEUS
meio do Espírito Santo, ele está presente na vida PODE FAZER-SE CONHECIDO AOS SERES HUMANOS:

dos que confiam nele e o seguem. Por isso talvez - A PRÓPRIA NATUREZA PODE SERVIR COMO CANAL ATRAVÉS DO QUAL NOS

CHEGA A REVELAÇÃO. DIZ O SALMISTA: ‘OS CÉUS PROCLAMAM A GLÓRIA DE


seja a princípio surpreendente que esta fé deva dar DEUS, E O FIRMAMENTO AS OBRAS DE SUAS MÃOS’, SL 19.1.
- A RAZÃO E A INTUIÇÃO, SÃO OUTROS MEIOS PELOS QUAIS PODE VIR À MENTE
suprema importância a um livro, compilação de
HUMANA A VERDADE ACERCA DE DEUS.

documentos todos escritos no mundo antigo, cerca - Sem dúvida, a revelação sumamente perfeita de Deus é concedida
no caráter e na personalidade de seu Filho Unigênito, conhecido no
de 2 a 3 mil anos atrás. Se podemos conhecer o prólogo do Evangelho de João como o LOGOS ou VERBO.
Deus vivo hoje, por que deveríamos incomodar-nos Também, a revelação é um conjunto de verdade
apreendidas ou conhecidas, compreendendo a fé cristã,
com documentos antigos? Mas o fato é que os historicamente registrada nas páginas da Escritura. A palavra
REVELAR vem de três fontes: - Revelo, lat.,- Gala (h), heb.,-
cristão dão, e sempre deram importância central à
Apocalipto, grego. Todos estes termos significam a mesma coisa,
Bíblia. Por quê? “desvendar alguma coisa escondida até aquele momento”.
99 Sócrates, o sábio grego, afirmou que sem uma revelação especial
Não há, naturalmente, nenhuma da parte de Deus, homem nada podia descobrir acerca Dele. Cristo é
necessidade de justificar a importância da leitura esta Revelação, e a Bíblia é o único livro que fala Dele com
autoridade divina absoluta.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 70


Curso básico de teologia

Em teologia, o termo Revelação é restrito se nas palavras de Paulo em Ef 1.16-19. Não


ao ato divino, quando Deus comunica algo que o podemos subestimar o problema do pecado, que é
homem não teria descoberto de outro modo. Não a raiz de toda a falta de compreensão entre Deus e
existe nada mais certo do que o fato de que Deus já o homem.
falou com o homem.
A Revelação que a Bíblia nos apresenta de Há vários modos de Deus de se revelar:
Deus, é uma revelação sobrenatural. Deus
interveio, segundo ela, no percurso da história, Revelação através da natureza (geral, natural).
para salvar os homens, que, se não fosse esta Diz a Bíblia: “Os céus proclamam a glória de Deus e
intervenção, estariam irremediavelmente perdidos. o firmamento anunciam as obras de Suas mãos”, Sl
Assim sendo, REVELAÇÃO é a 19.6. Da mesma maneira o apostolo Paulo em Rm
comunicação das verdade que não podem ser 1.19-23, fala da revelação através da natureza,
descobertas de nenhuma outra maneira, a não ser mesmo com seu valor limitado.
que sejam transmitidas por Deus. Revelação divina através da providência.
Para o conhecimento de Deus, a Bíblia é Providência, é a execução o Programa Divino
indispensável por duas razões: através dos tempos. Deus se revelou através de
Seus atos na história do mundo. Dt 30.1-10, Deus
a) A transcendência e soberania de Deus. É fala do Seu plano para o povo de Israel. Dn 2.31-45 e
impossível conhecer a Deus, se Ele não Se revela a 9.24-27, fala a respeito dos grandes impérios deste
si mesmo a nós. Deus não é um objeto, que mundo e planos e propósitos para os mesmos. O
podemos estudar para satisfazer a nossa Senhor Jesus, em Mt 23.37-25.46, fala dos últimos
curiosidade; se pudéssemos fazer isso, Ele não seria tempos. O Apocalipse, nos leva até a consumação
Deus. O fato é que Deus está tão longe de nós, em deste mundo como está. O fato é que os propósitos
Seu modo de Ser, que o homem não pode vê-lo, de Deus vão de eternidade a Eternidade, e são
nem ler seus pensamentos. perfeitos, e na medida que vemos o desenvolver do
Leia Jo 11.7; Is 45.15; Jo 1.18 e 1 Tm 6.6. Se o mundo, vemos o desenvolvimento do plano divino,
homem tem tanta dificuldade em descobrir o que o com a gradual implantação do reino de Deus entre
outro ser humano está pensando, como vai os homens. A doutrina da Providência Divina, tem
descobrir algo a respeito daquele que habita nas os seus problemas, e terá, enquanto o pecado e o
alturas? Qual seria a resposta que você daria a sofrimento existirem. Para discernir a atuação de
pergunta feita por Zofar em Jó 11.7? Deus na História do mundo, é necessário
b) A pecaminosidade do homem. O problema discernimento espiritual, que o regenerado tem.
principal, é que o pecado cegou o seu Revelação divina através dos milagres. O
entendimento, e ele não compreende as coisas de caráter sobrenatural do milagre manifesta o poder
Deus, 1 Co 2.14. A sabedoria deste mundo não ajuda de Deus, e seu propósito muitas vezes. É
ninguém a chegar ao conhecimento de Deus. 1 Co importante observar que Deus manifestou-se
1.18-29, especialmente o v. 21. É importante notar através de milagres, particularmente em épocas de
que é sempre Deus quem toma a iniciativa e revela crise na história de Israel. Os milagres feitos pelo
a Sua vontade para o homem. Esta idéia encontra- Senhor Jesus, serviram para provar que Ele é Deus

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manifesto em carne, Mt 11.2-6. A revelação divina através das Sagradas


Revelação divina através da encarnação de Escrituras ainda se subdivide em cinco aspectos:
Cristo. Através da encarnação de seu Filho Jesus 1)Teofania,
Cristo. Deus revelou-se a si mesmo. Ele é Deus 2)Sonho,
manifesto em carne, 1 Tm 3.16. Quando Pedro 3)Anjos,
falou: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”, o 4)Urim e Tumim, e
Senhor Jesus respondeu: ‘não foi a carne ou o 5)Profecia.
sangue e quem to revelou, mas o Pai que está nos
III – A EXISTÊNCIA DE DEUS
céus’, Mt 16.16,17.
Revelação divina através das Escrituras 100. Deus
“ No princípio... Deus...” Gn 1.1
se revelou de muitas maneira no passado e todos os
“...é necessário que aquele que se
outros modos de revelação, dependem da aproxima de Deus creia que ele existe...”
interpretação divina dentro das Sagradas Hb 1.6

Escrituras. A natureza e a Providência, só podem


ser compreendidas quando colocadas em seu A Bíblia não se preocupa em provar a

contexto dentro da Palavra de Deus. Milagres são existência ou não de Deus. Ela apresenta Deus,

uma revelação de Deus para aqueles que assistiram, como o Criador auto-revelador agindo como

porém, o registro deles na Bíblia, aumenta o seu redentor. Os 66 livros do Antigo e Novo

valor, para todos quanto estudam o seu Testamento encontram sua unidade nesse tema

testemunho nas páginas sagradas. comum. Os livros históricos da Bíblia contam como

O que Deus disse diretamente aos homens, Deus está realizando um grande plano para a

poderia ter sido esquecido ou pervertido com salvação de uma imensa comunidade internacional

facilidade, porém, tem sido conservado em todas a que o Novo Testamento chama de igreja.

sua pureza o registro divino. Da mesma maneira, a Como sabemos que Deus existe? A resposta

Encarnação, a Vida, a Morte e Ressurreição de pode ser dada em duas partes: primeira, todas as

Cristo, tem valor infinito, porém Deus tem pessoas têm uma intuição íntima de Deus.

prometido uma benção para todo aquele que crê no Segunda, cremos nas provas encontradas nas

registro que Ele tem concernente ao Seu Filho, 1 Jo Escrituras e na natureza.


Todas as pessoas de qualquer lugar têm uma
5.9-12.
profunda intuição íntima de que Deus existe,
de que são criaturas de Deus e de que ele é
seu Criador. Paulo diz que mesmo os gentios
100 PROVAS DE A BÍBLIA É A PALAVRA DE DEUS: descrentes tinham “conhecimento de Deus”,
a) As grandes diferenças entre a Bíblia e os escritos dos homens mas não o honravam como Deus nem lhe
evidenciam que ela não é uma simples produção humana. eram gratos (Rm 1.21). Na vida do cristão essa
b) A revelação de coisas que homem, deixado a si mesmo, jamais íntima consciência de Deus se torna mais
podia ter descoberto dá evidência da origem sobre humana da Bíblia. forte e mais distinta. Além da consciência
c) A unidade maravilhosa da Bíblia confirma-a como uma revelação íntima de Deus, que dá claro testemunho do
divina. fato de que ele existe, encontramos claras
d) A exatidão da Bíblia em matérias científicas prova que ela não é evidências da sua existência nas Escrituras e
de origem humana. A Bíblia não foi dada para ensinar ciência na natureza.As provas de que Deus existe se
natural. Todavia, ela faz referência a matérias científicas, e de forma encontram, logicamente, disseminadas por
exatíssima. toda a Bíblia. De fato, a Bíblia sempre
e) A profecia cumprida testemunha ao fato que a Bíblia veio de Deus. pressupõe que Deus existe. Além das provas
f) O testemunho de Cristo prova a genuinidade da Bíblia como encontradas na existência dos seres
revelação de Deus.
humanos, há outra excelente evidência na

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Curso básico de teologia

natureza. Quem olha para o céu, de dia ou de 1. O argumento cosmológico considera o fato de
noite, vê o sol, a lua e as estrelas, o
firmamento e as nuvens, todos declarando que toda coisa conhecida do universo tem uma
continuamente pela sua existência, beleza e
Causa Primeira. Nada do que vemos é sua própria
grandeza que foi um Criador poderoso e
sábio quem os fez e os sustém na sua ordem. causa. Tudo em nossa experiência tem causas fora
101

de si mesmo e antes de si mesmo. Tais causas,


porém, não podem retroceder infinitamente. Pois,
III.1 – Argumentos a favor da existência de Deus:
se não houvesse uma Primeira Causa, que fosse a
sua própria causa e finalmente causa de todas as
A existência de
Deus pode ser outras coisas, todo o processo de causa e efeito não
provada? poderia ter começado. Portanto, presume-se uma
Há milhares de anos as pessoas têm
Causa Primeira, à qual damos o nome de Deus.
tentado provar que Deus existe.
Efeitos divinos me obrigam a crer numa
As “provas” tradicionais da existência de causa divina. É verdade, existe uma causa das
causas... Existe um ser infinito, comparado
Deus, arquitetadas por filósofos cristãos, e alguns com o qual você, general, não passa de um
átomo, comparado com o qual eu, Napoleão,
não cristãos, de várias épocas da história, são de com todo o meu gênio, nada sou realmente;
fato tentativas de analisar as evidências, puramente nada. Eu o percebo – Deus. Eu o
vejo, tenho necessidade dele, creio nele. Se
especialmente as evidências da natureza, de modos você não crê nele, pior para você. Mas, você,
general, crerá um dia em Deus. Posso perdoar
extremamente cuidadosos e logicamente precisos, muitas coisas, mas sinto horror diante de
a fim de convencer as pessoas de que não é racional alguém ateu e materialista...103

rejeitar a idéia de que Deus existe.


2. O argumento teleológico é na verdade uma
A maior parte das provas tradicionais da
subcategoria do argumento cosmológico. Como o
existência de Deus pode ser classificada em quatro
universo parece ter sido planejado com um
tipos importantes de argumento102:
propósito, deve necessariamente existir um Deus
101 GRUDEM, Wayne. Teologia sistemática. inteligente e determinado que o criou para
102 HORRELL, J. Scott. Teologia Sistemática. pg. 14. descreve estes
argumentos assim. 1. Cosmológico (cosmos - "mundo"). Todo
funcionar assim.
evento possui uma causa e tudo que existe é resultado de uma causa
principal e suficiente para criar o universo – i.é., Deus. Como disse J. 3. O argumento ontológico parte da idéia de
Locke(1632-1704). ‘Eu existo; mas nem sempre eu existi; qualquer Deus, definido como um ser “maior do que
coisa que começa a existir deve ter uma causa; a causa deve ser
suficiente; esta causa suficiente existe sem limitações; ela deve ser qualquer coisa que se possa imaginar”. Foi
Deus’. Veja Hebreus 3.4; Salmo 102; Platão, Leis X; Aristóteles,
primeiramente apresentado por Anselmo (1033-
Metafísica VIII; Aquino, Suma Teológica, 02, artigo 3. 2.
Teleológico(telos - "propósito, fim"). A organização do universo 1109).
aponta para um planejador(Rm 1.18-20), pois há coisas na natureza
que mostram propósito. W. Paley(1743-1805). ‘se alguém achasse
um relógio no campo, concluiria que o mesmo teria sido feito por um
relojoeiro. Até Voltaire e Kant se interessaram por este argumento. posteriori(indutivo), e ainda atrai os filósofos cristãos de hoje, como
Veja Sl 19.1-6; 139.14. 3. Antropológico(antropós - ‘homem’). Platinga. 5. Unidade-Diversidade. Há outros argumentos menos
Porque o homem é um ser moral e intelectual, ele deve ter um tradicionais, um deles é o argumento baseado na unidade e
Criador que também é moral e inteligente(At 17.29). Este argumento diversidade do universo (Dooyeweerd, Van Til). O trinitarianismo é a
tem muitas variações. a personalidade, sentimentos morais, única perspectiva adequada para explicar o lugar do homem no
consciência, instintos religiosos, raciocínio, dignidade humana, etc. Universo entre o determinismo e o caos, i.é., entre o mecanicismo
Confira Gn 1.26; Rm 1.18-20. 4. Ontológico(on - "ser existência"). absoluto do universo e a incoerência completa".
Anselmo propôs que cada homem possui o conceito de Ser Perfeito. 103 O Napoleão de Abbot, como citado por A. M. Baten em
Esta idéia inclui a necessidade da Sua existência, pois senão, não Philosophy of Life. Garden City, NY: Harper & Row Publishing
seria perfeito. O argumento é a priori(dedutivo) em vez de a Company, 1930, p. 381-390.

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Curso básico de teologia

4. O argumento moral parte do senso humano do que lhes não resplandeça a luz do evangelho da
certo e do errado, e da necessidade da imposição da glória de Cristo” (2Co 4.4).
justiça, e raciocina que deve necessariamente
existir um Deus que seja a fonte do certo e do III.2 – O conhecimento à respeito de Deus
errado e que vá algum dia impor a justiça a todas as
“ E a vida eterna é esta: que te conheçam a
pessoas. ti só por único Deus verdadeiro.” Jo 17.3.

Estes são, portanto, os dois pontos que eu “ A terra se encherá do conhecimento do


queria ressaltar. Primeiro, que os seres Senhor.” Is 11.9.
humanos, em toda a terra, têm esta idéia
curiosa de que devem comportar-se de certa
maneira, e não conseguem livrar-se dela. Se pretendemos conhecer a Deus, antes é
Segundo, eles na verdade não se comportam
deste modo. Eles conhecem a lei da natureza necessário que ele se revele a nós. Paulo diz que o
e a quebram. Esses dois fatos são a base de que podemos conhecer sobre Deus está claro às
todo pensamento claro a respeito de nós
mesmos e do universo em que vivemos.104 pessoas “porque Deus lhes manifestou” (Rm 1.19).

Como todos esses argumentos se baseiam


Pode ser Deus
em fatos sobre a criação que realmente são
conhecido?
verdadeiros, podemos dizer que todas essas provas
Quando falamos do conhecimento pessoal
(quando cuidadosamente formuladas) são, num
de Deus, que vem pela salvação, essa idéia fica
sentido objetivo, provas válidas porque avaliam
ainda mais explícita. Disse Jesus: “Ninguém
corretamente as evidências e ponderam com
conhece o Filho, senão o Pai; e ninguém conhece o
acerto, chegando a uma conclusão verdadeira: de
Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser
fato, o universo realmente tem Deus como causa,
revelar” (Mt 11.27).
realmente dá provas de um planejamento
Como Deus é infinito, e nós, finitos e
deliberado, Deus realmente existe como ser maior
limitados, jamais poderemos compreender
do que qualquer coisa que se possa imaginar e ele
plenamente e exaustivamente a Deus. Diz o salmo
realmente nos deu um senso do certo e do errado e
145: “Grande é o SENHOR e mui digno de ser louvado;
um senso de que seu juízo virá algum dia.
a sua grandeza é insondável” (Sl 145.3). Jamais
Mas noutro sentido, se “válido” significa
seremos capazes de medir ou conhecer plenamente
“capaz de conseguir que todos concordem, mesmo
o entendimento de Deus: é imenso demais para
aqueles que partem de falsos pressupostos”, então é
que o igualemos ou entendamos.
claro que nenhuma das provas é válida, pois
Assim, podemos conhecer algo do amor,
nenhuma delas é capaz de fazer que todos aqueles
do poder, da sabedoria, etc., de Deus. Mas jamais
que as ponderam acabem concordando. Finalmente,
poderemos conhecer completa ou exaustivamente
é preciso lembrar que neste mundo pecador Deus
o seu amor. Jamais poderemos conhecer
precisa possibilitar que nos convençamos, senão
exaustivamente o seu poder. Jamais poderemos
jamais creríamos nele. Lemos que “o deus deste
conhecer exaustivamente a sua sabedoria, etc.
século cegou o entendimento dos incrédulos, para
Essa doutrina da incompreensibilidade de
Deus tem muita aplicação positiva para nossa vida.
Significa que jamais seremos capazes de conhecer
104 LEWIS, Clive Staples. Mere Christianity. NY: Macmillan &
Co., 1952. p. 21.

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“demais” sobre Deus, pois jamais nos faltarão coisas ele fala conosco pela sua Palavra. Temos comunhão
para aprender sobre ele, e assim nunca nos com ele na sua presença, entoamos seus louvores e
cansaremos de nos deleitar com a descoberta de temos consciência de que ele pessoalmente habita
mais e mais coisas da sua excelência e da grandeza no meio de nós e dentro de nós para nos abençoar
das suas obras. (Jo 14.23). De fato, pode-se dizer que esse
Se desejássemos um dia nos igualar a Deus relacionamento pessoal com Deus Pai, com Deus
em conhecimento, ou se desejássemos encontrar Filho e com Deus Espírito Santo é a maior de todas
prazer no pecado do orgulho intelectual, o fato de as bênçãos da vida cristã.
que jamais cessaremos de crescer no conhecimento
de Deus seria para nós fator desencorajador — IV – OS NOMES DE DEUS
poderíamos sentir-nos frustrados pelo fato de Deus
se revelar um objeto de estudo que jamais Os dicionários em geral definem “nome”
poderemos dominar! Mas se nos deleitamos no fato como ‘aquilo pelo qual a pessoa ou coisa é
de que só Deus é Deus, de que ele é sempre conhecida’. Os hebreus consideravam os nomes
infinitamente maior do que nós, de que somos como uma revelação, encerrando algum atributo
criaturas dele, que lhe devemos culto e adoração, ou característica da pessoa nomeada. No antigo
então essa nos será uma idéia bastante Oriente o nome declarava a natureza e a função da
encorajadora. pessoa.
Embora não possamos conhecer Por exemplo, no nome “Adão” significa “da
exaustivamente a Deus, podemos conhecer coisas terra” ou “tirado da terra”; o seu nome revela a sua
verdadeiras sobre ele. De fato, tudo o que as origem.
Escrituras nos falam sobre Deus é verdadeiro. É Abraão significa “pai de uma multidão”.
verdade dizer que Deus é amor (1Jo 4.8), que Deus Jesus significa “o Senhor salva. ‘Conhecer o nome
é luz (1Jo 1.5), que Deus é espírito (Jo 4.24), que de Deus’ é, portanto, adorar a Deus e confiar em
Deus é justo ou reto (Rm 3.26) e assim por diante. Deus conforme ele se mostrou ser.
Podemos conhecer alguns pensamentos de Deus — As escrituras contêm vários nomes para
até muitos deles — com base na Bíblia, e quando os Deus, pois nem um só nome nem uma
conhecemos, como Davi, os consideramos multiplicidade de nomes podem revelar todos os
“preciosos” (Sl 139.17). seus atributos. Nós necessitamos saber o atributos
Ainda mais significativo é perceber que de Deus apenas no limite em que Ele se agrada em
conhecemos o próprio Deus, e não meramente fatos revelá-los, e aqueles que referem às relações que
sobre ele ou atos que ele executa. Aqui Deus diz temos com ele.
que a fonte da nossa alegria e da nossa noção de
importância deve vir não das nossas capacidades IV.1- Os nomes de Deus no Antigo Testamento:
ou posses, mas do fato de conhecê-lo.
O fato de conhecermos o próprio Deus é a) ~yhi_l{a/ - Elohim (pl.); Eloah (sing.).
demonstrado ainda pela percepção de que a Aparece mais de 2.500 vezes. Há sugestões de que
riqueza da vida cristã envolve um relacionamento esta palavra derivou de El. Outro ponto de vista é
pessoal com Deus. Falamos com Deus em oração, e

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Curso básico de teologia

que a palavra Elohim é o plural de Eloah. Essa é da revelação do seu nome. A tradução é "Todo-
uma maneira de intensificar a palavra Eloah com a Poderoso". Há uma dificuldade para estabelecer a
intenção de glorificar a Deus. A pluralidade da etimologia da palavra. É possível que seja derivado
palavra Elohim não significa nada em termos de de dois verbos. Sadar(destruir) e Sadu(montanha).
número como sendo Deus múltiplo. Não há uma Basicamente El Shaddai refere-se ao seu poder.
sugestão do ponto de vista do Antigo Testamento
que os judeus tinham a idéia de Trindade. Podemos
a.3) ~l'(A[ lae - El Olam, O Deus
dizer que a pluralidade significa a própria
eterno. O pensamento transmitido por este nome
divindade e majestade de Deus. A palavra Elohim é
não é só a duração eterna de Deus, mas também a
usada com outros significados também e mais uma
sua fidelidade eternidade eterna. Como registrado
vez é o contexto quem determinará sua função e
em Gênesis, Abraão chama Jeová de Deus Eterno,
tradução. Por exemplo em Êxodo 21.6 encontramos
que guarda suas alianças (Gn 21.33). O Salmista,
a palavra "dono"; já em Jó 1.6 temos a palavra
pensando em Deus como um refúgio eterno, disse
"servidores celestiais"; no Salmo 8.5 você encontra
“Senhor, tu tens sido o nosso refúgio, de geração em
a palavra "ser humano" e em Êxodo 18.11 temos a
geração.Antes que os montes nacessem e se
palavra "deuses".
formassem aterra e o mundo, de eternidade em
eternidade, tu é Deus”. Sl 90.1,2.
a.1) lae - El = Forma mais antiga usada
para outros deuses. Vem do verbo hebraico ser
a.4) !Ay*l.[, lae - El Elion = Vem do
forte, poderoso. Há que diga que o nome El
verbo Olah(subir) e significa o "Deus Altíssimo".
origina-se dos verbos ligar e alcançar. El é um Deus
Um dos tipos de sacrifícios é o olah que é realizado
que as pessoas alcançam. A palavra El quando se
sob a forma de fumaça que sobe. Deus que está nas
refere a Deus enfatiza o seu poder. Mas nem
alturas, que só pode ser encontrado nas alturas.
sempre ela é usada para referir-se a Deus(Salmo
Deus está muito acima dos homens. Esta
29.1). As vezes a palavra vem ligada a outras como
declaração demonstra, a separação entre Deus e o
no caso de "filhos de El" (Gênesis 6) e significa
ser humano que aqui é mais em termos de espaço
homens fortes, valentes ou anjos. Leia o Salmo
do que de santidade.
44.20 e veja que El é usada para referir-se a outros
deuses. No Salmo 118.50 encontramos uma
declaração. Registre e comente tal declaração. El "é
b) yn"doa] - Adon = Senhor, Adonai = "meu
uma palavra básica em várias línguas semíticas; no
Senhor". A palavra adonai não significa
Antigo Testamento geralmente aparece junto de
necessariamente Senhor Deus, pode significar. um
outros títulos e nomes". Uma importante
homem, um dono de escravos, um profeta ou até
orientação é que palavra El é um nome genérico
mesmo um esposo. A idéia de Adonai em termos
mais o contexto é que determina a sua tradução.
do seu significado quando utilizado em relação a
Deus, desenvolver a noção de autoridade e
a.2) yTi[.d;ÞAn al{ - El Shaddai = superioridade. Ao mesmo tempo(El Elion) o Deus
Êxodo 6.3 - Foi assim que Ele foi conhecido antes que mora nas alturas dos céus pode ser conhecido

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como(Adonai) meu Senhor. Leia o Salmo 23 e Senhor dos exércitos, Sl 24.10.


destaque algumas caraterísticas do relacionamento
c.7) hM'v'( Ÿhw"hy> - Jeová-Shammah, O
íntimo que o ser humano pode ter com o Senhor.
Senhor está alí, Ez 48.35.

d) ^ybi(a' (heb), ^ybi( (aramaico)


c) hw"hy> - IHWH = Javeh, Yahveh,

Yahweh. Os hebreus para não profanarem o nome Abba105 - Pai. No AT essa palavra tem que ser

de Deus o substituiram por adonai = meu Senhor. compreendida dentro do contexto cultural. Pode

Jeová é então o fruto da mistura de Adonai com ser usada também a outras pessoas que exercem

Javé, e Jeová surgiu em 1520 d.C. No verso 14 autoridade, que mandam; porém, não existe

encontramos IHWH = que permite duas somente esta conotação de autoridade, mas

possibilidades de tradução(o verbo hebraico no também de uma relação familiar (Jr 3.4), essa

perfeito ou no imperfeito) = "Ele será", "Ele foi". A palavra não tem a mesma expressão encontrada no

tradução "Eu Sou" que temos em nossas Bíblias Novo Testamento entre Deus e o homem no Antigo

reflete o pensamento grego implícito na LXX. O Testamento. Em termos de significado podemos

nome de Deus sendo baseado num verbo tem um entender a palavra Abba como: paternidade, honra,

aspecto dinâmico. "Como seu nome pessoal, autoridade.

Yahweh indica a presença particular de Deus em


seu relacionamento com os homens(Gênesis 2.4,7), IV.2- Os nomes de Deus no Novo Testamento:

e especialmente com o seu povo"


O Novo Testamento usa simplesmente os
equivalentes gregos para os nomes hebraicos do
c.1) ~yhil{a/ hw"hy> - Jeová-Eloim, O
Antigo Testamento. Os seguintes devem
Senhor é Deus, Gn 2.4.
particularmente ser notados:
c.2) ha,_r>yI hw"hy> - Jeová-Jiré, O Senhor

proverá,Gn 22.14.
a) qeo,j (Theos)- Deus. Jo 1.1. A palavra
c.3) ^a<)p.ro hw"hy> - Jeová-Rafá, O Senhor
grega theos, como elohim, pode significar “Deus, ou
é o que te sara, Ex 15.26.
“deuses”. Trata-se do termo comum para “Deus” no
c.4) ySi(nI hw"hy - Jeová-Nissí, O Senhor é a Novo Testamento.
minha bandeira, Ex 17.15

c.5) ~Al+v' hw"hy - Jeová-Shalom, O b) Path,r (Pater)- Pai. Mt 6.9. Rm 8.15.


Senhor é minha paz, Jz 6.24. Jesus usou esta palavra em sua oração no jardim do

c.6) y[iro÷hw"hy - Jeová-Raah, O Senhor é


105 HORRELL, J.S. Op. Cit. pg. 18. O Nome Pai = ABBA é uma
o meu pastor, Sl 23.1. palavra que indica respeito e intimidade e significa papai e não ocorre
muitas vezes no Antigo Testamento(Dt 32.6; 2 Sm 7.14; 1 Cr 17.13;
c.7) WnqE)d>ci hw"hy> - Jeová-Tsidkhenu, O 22.10; 28.6; Sl 68.5; 89.26; Is 63.16; 64.8; Jr 3.4,19; 31.19; Ml 1.6;
2.10. "A infreqüência mostra a preocupação de Israel em distinguir o
Senhor é a nossa justiça, Ex 23.6. Deus de Israel dos deuses tidos como progenitores pelos pagãos".
Com o Novo Testamento, através de Jesus, a expressão aparece 170
c.7) tAa+b'c. hw"hy> - Jeová-Tsebaoth, O vezes e tornou-se o que mais indica a aliança entre Deus e seu
povo(Mt 6.14; 11.25; Lc 11.2).

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Curso básico de teologia

Getsêmani. Que privilégio podermos invocar o STRONG, Deus é Espírito infinito e perfeito,
em Quem todas as coisas tem origem,
Onipotente como nosso Pai celestial, pela obra sustento e fim106.
redentora de Jesus Cristo.
HODGE, Deus é Espírito inteligente, pessoal,
infinito, eterno, imutável em Seu ser,
sabedoria, poder, santidade e em todas as
1. Ku,rioj (Kurios)- Senhor. Essa perfeições consistentes com Seu ser107 .

palavra aparece pelo menos 175 vezes no CLARKE, Deus é um Espírito pessoal, perfeito
em bondade, que impelido por amor santo,
Novo Testamento. E equivale a palavra cria, sustenta e ordena todas as coisas108.
Adonai no Velho Testamento.
EBRARD, A fonte eterna de tudo que é
2. temporal.

V – A DEFINIÇÃO DE DEUS HOWE, Um ser necessário, eterno, não


criado, independente, que tem poder, vida,
“ Quem é semelhante a Mim?” Jr 49.19. sabedoria, bondade e qualquer outra coisa
excelente que se possa imaginar, na mais alta
“ A quem, pois,me comparareis, para que perfeição, nEle e por Ele mesmo.
Eu lhe seja igual? Diz o Santo”. Is 40.25
MARTENSEN, declara: Deus é um Espírito.
“ A quem me comparareis para que Eu lhe Sendo Espírito, Ele se revela em primeiro lugar
seja igual? E que coisa semelhante como “o Senhor”, porém não apenas “o Senhor
comigo? ” Is 46.5 que Se mantém distinto e separado do
mundo”, mas “Amor” eterno que reconcilia o
mundo Consigo mesmo109.
É preciso dizer, de uma vez, que é
impossível definir ou explicar a essência ou o ser de
Deus. Não podemos colocá-lo nos limites de uma VI.2 – Alguns credos antigos
definição.
Não há nada semelhante e maior com que O propósito de mencionar os primeiros
possamos compará-lO nem pedem nossas mentes credos a Igreja Cristã não é falar a favor nem contra
finitas abrangê-lO. Todavia, Deus se revelou e o o uso dos credos.
que Ele revelou conhecemos; a mente pede que, em Seria difícil provar que a Bíblia autoriza a
um estudo sobre Ele, ponhamos em ordem o que composição de credos mas é igualmente impossível
serve de definição. provar que os proíba; o credo somente não deve
Se pela palavra ”definir” queremos dizer suplantar a Bíblia, seja na Igreja, seja na vida do
“limitar”, é claro que não podemos definir a Deus. crente.
Mas, podemos mencionar os característicos que No entanto, deve-se deixar claro, aqui, que
distinguem o seu ser e, deste modo, formular um ao mencionar os credos, se tem como propósito
definição de Deus. demonstrar como os primeiros cristãos
interpretavam a Bíblia; como definiam a Deus; e
VI.1 – Algumas definições sobre Deus
106 STRONG, Augustus Hopkins. Teologia sistemática. Vol. 1. São
Paulo, Hagnos, 2003. p. 134.
Há muitas definições teológicas concisas e 107 HODGE, Charles. Teologia sistemática. São Paulo: Hagnos,
2001. p.342
boas, embora os autores confessem que não
108 CLARK, David S. Compêndio de teologia sistemática. 2a ed. São
pretendem que elas sejam completas. Vejamos: Paulo: CEP, 1998. p. 68-128.
109 MARTERSEN, Christian Dogmatics. Edinburg: T. and T.
Clark, 1866. p. 73.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 78


Curso básico de teologia

quando as heresias investiam contra a verdade em verdadeiro Deus, gerado, não criado, de uma só

um dos seu aspectos, os cristãos não inventavam substância com o Pai, pelo qual todas as coisas
foram feitas; o qual, por nós homens e por nossa
novas idéias, mas buscavam a melhor maneira de
salvação, desceu dos céus, foi feito carne pelo
utilizar os ensinamentos bíblicos, com relação à
Espírito Santo e da Virgem Maria, e tornou-se
nova necessidade que havia surgido.
homem, e foi crucificado por nós sob Pôncio
Por outro lado, é bom observar, que os
Pilatos, e padeceu e foi sepultado e ressuscitou ao
cristãos primitivos não dispunham da Bíblia como terceiro dia, conforme as Escrituras, e subiu aos
nós a temos hoje. É praticamente impossível céus e assentou-se à direita do Pai, e de novo há
encontrar uma casa de algum cristão que não tenha de vir com glória para julgar os vivos e os mortos,
um exemplar da Bíblia. Logo, é de se pensar, que e o seu reino não terá fim. E no Espírito Santo,

este seja capaz de defender a sua fé em caso de Senhor e Vivificador, que procede do Pai e do

possíveis ataques heréticos. Filho,3 que com o Pai e o Filho conjuntamente é


adorado e glorificado, que falou através dos

VI.2.A) - O CREDO APOSTÓLICO profetas. E na Igreja una, santa, católica e


apostólica. Confessamos um só batismo para
Creio em Deus Pai Todo-Poderoso, Criador do
remissão dos pecados. Esperamos a ressurreição
céu e da terra. E em Jesus Cristo, seu Filho
dos mortos e a vida do século vindouro. Amém.
unigênito, nosso Senhor; concebido pelo Espírito
Santo e nascido da Virgem Maria; que padeceu
No ano 325 depois de Cristo, na cidade de
sob Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e
Nicéia, na Bitínia, foi celebrado o primeiro concílio
sepultado, e ao terceiro dia ressurgiu dos mortos;
que subiu ao céu e assentou-se à direita do Pai para estudar como enfrentar as heresias do

Todo-Poderoso, de onde há de vir para julgar os arianismo e do semiarianismo111.


vivos e os mortos. Creio no Espírito Santo, na
santa igreja católica, na comunhão dos santos,
VI.2.C) - O CREDO ATANASIANO

na remissão de pecados, na ressurreição da carne Todo que for salvo: antes de todas as coisas é
e na vida eterna. Amém. necessário que se apegue à fé católica; Tal fé, se
não guardada plena e imaculada, sem dúvida
Não se pode afirmar que este credo tenha trará perdição eterna. E a fé católica é esta: Que
sido escrito pelo apóstolos, mas, sim, que contêm nós adoramos um Deus em Trindade, e Trindade

um resumo dos ensinamentos dos apóstolos. É uma na Unidade; Sem confundir as pessoas, sem

combinação de várias “confissões batismais” de dividir a Substância. Porque há uma Pessoa do


Pai, outra do Filho, e outra do Espírito Santo.
importantes igrejas ocidentais.
Mas a divindade do Pai, do Filho, e do Espírito

VI.2.B) - O CREDO NICENO110 Santo é uma só: a glória igual, a majestade,


coeterna. Como o Pai é, tal é o Filho, e tal é o
Cremos em um só Deus, Pai, Todo-Poderoso,
Espírito Santo. O Pai incriado, o Filho incriado, e
Criador de todas as coisas, visíveis e invisíveis. E
o Espírito Santo incriado. O Pai incompreensível,
em um só Senhor Jesus Cristo, o unigênito Filho
o Filho incompreensível, e o Espírito Santo
de Deus, gerado pelo Pai antes de todos os
séculos, Luz da Luz, verdadeiro Deus de 111 ARIANISMO. Heresia que negava a divindade do Senhor Jesus
Cristo, não O considerando uma pessoa apenas humana, mas
110 GONZALEZ, Justo L. A era dos gigantes. Uma História considerando-O uma criação anterior à existência do mundo, isto é,
ilustrada do Cristianismo, vol 2 São Paulo: Vida Nova, 1989. p.97. uma espécie de semideus.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 79


Curso básico de teologia

incompreensível. O Pai eterno, o Filho eterno, e o homem, também Deus e homem são um Cristo;
Espírito Santo eterno. No entanto não são três Que padeceu para a nossa salvação, desceu ao
eternos mas um eterno. Porque também não há inferno, ressuscitou dentre os mortos ao terceiro
três incriados nem três incompreensíveis, mas dia; Subiu aos céus e está assentado à direita do
um incriado e um incompreensível. Assim do Pai, Deus, Todo-Poderoso; De onde virá julgar os
mesmo modo o Pai é Todo-Poderoso, o Filho, vivos e os mortos. Em cuja vinda todos os
Todo-Poderoso, e o Espírito, Todo-Poderoso. No homens ressuscitarão em corpo; E prestarão
entanto não são três Todo-Poderosos, mas um contas de suas obras. E os que fizeram o bem irão
Todo-Poderoso. Assim o Pai é Deus, o Filho é para a vida eterna, e os que fizeram o mal, para o
Deus, e o Espírito Santo é Deus; No entanto não fogo eterno. Esta é a fé católica: quem nela não
são três Deuses, mas um Deus. Também somos crer fielmente não pode ser salvo.
proibidos pela religião católica de dizer: Há três
Deuses, ou há três Senhores. O Pai não é feito de Não se sabe com certeza a origem deste
coisa alguma, nem criado nem gerado. O Filho é credo, pois alguns crêem que surgiu no Norte da
do Pai somente; não feito, nem criado, mas
África durante o século VI e que seu nome se deve
gerado. O Espírito Santo é do Pai e do Filho; não
ao fato de que Atanásio, bispo de Alexandria,
foi feito, nem criado, nem gerado, mas deles
também continuou lutando contra o Arianismo. É
procede. Assim, há um Pai, e não três Pais; um
bom lembrar que a palavra católica usada não quer
Filho, e não três Filhos; um Espírito Santo, e não
três Espíritos Santos. E nesta Trindade nenhum
dizer romana, mas universal.

deles é antes ou depois do outro; nenhum é maior


VI.2.D) - O CREDO DE CALCEDÔNIA112 (451 D. C.)
ou menor do que outro. Mas as três pessoas são
co-eternas e co-iguais. De modo que em todas as Fiéis aos santos Pais, todos nós, perfeitamente
coisas, como dito acima: a unidade na Trindade e unânimes, ensinamos que se deve confessar um
a Trindade na unidade deve ser adorada. Aquele, só e mesmo Filho, nosso Senhor Jesus Cristo,
portanto, que for salvo deve assim pensar sobre a perfeito quanto à divindade, e perfeito quanto à
Trindade. Além disso é necessário à eterna humanidade; verdadeiramente Deus e
salvação que, corretamente, se creia também na verdadeiramente homem, constando de alma
encarnação de nosso Senhor Jesus Cristo. Porque racional e de corpo, consubstancial com o Pai,
a fé correta é que creiamos e confessemos que segundo a divindade, e consubstancial a nós,
nosso Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, é Deus segundo a humanidade; em tudo semelhante a
e homem. Deus, da substância do Pai, gerado nós, excetuando o pecado; gerado segundo a
antes dos séculos; e homem da substância de sua divindade pelo Pai antes de todos os séculos, e
mãe, nascido no mundo. Deus perfeito e homem nestes últimos dias, segundo a humanidade, por
perfeito, de alma racional e subsistindo em carne nós e para nossa salvação, nascido da Virgem
humana. Igual ao Pai quanto à divindade, e Maria, mãe de Deus; um e só mesmo Cristo,
inferior ao Pai quanto à humanidade. Que, Filho, Senhor, Unigênito, que se deve confessar,
embora seja Deus e homem, não é, porém, dois, em duas naturezas, inconfundíveis, imutáveis,
mas um Cristo. Um, não pela conversão da indivisíveis, inseparáveis; a distinção de
divindade em carne, mas levando da humanidade naturezas de modo algum é anulada pela união,
a Deus. Inteiramente um, não pela confusão da antes é preservada a propriedade de cada
substância, mas pela unidade da pessoa. Porque natureza, concorrendo para formar uma só
assim como a alma racional e a carne são um
112 H. Betterson Documentos da Igreja Cristã 1967.pg.86

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Curso básico de teologia

pessoa e em uma subsistência; não separado nem Jo 1.18 Ninguém jamais viu a Deus; o Deus
unigênito, que está no seio do Pai, é quem o
dividido em duas pessoas, mas um só e o mesmo
revelou.
Filho, o Unigênito, Verbo de Deus, o Senhor Jesus Mt 28.20...E eis que estou convosco todos os
dias até à consumação do século.
Cristo, conforme os profetas desde o princípio
Mt 18.20 Porque, onde estiverem dois ou três
acerca dele testemunharam, e o mesmo Senhor reunidos em meu nome, ali estou no meio
deles.
Jesus nos ensinou, e o Credo dos santos Pais nos
Hb 13.5 Seja a vossa vida sem avareza.
transmitiu. Contentai-vos com as coisas que tendes;
porque ele tem dito: De maneira alguma te
deixarei, nunca jamais te abandonarei.
VI – A NATUREZA DE DEUS Jo 3.5 Respondeu Jesus: Em verdade, em
verdade te digo: quem não nascer da água e
do Espírito não pode entrar no reino de Deus.
O estudo da natureza de Deus dever ser
VI.2 – Deus é perfeito
abordado com humildade e reverência. Ora, quem
pode definir a natureza e essência do Deus infinito? Jesus disse aos seus discípulos: Portanto,

Não só os seus caminhos são “inescrutáveis” Rm sede vós perfeitos como perfeito é o vosso Pai

11.33, como também sua natureza e seu ser celeste, Mt 5.48. É quase impossível pensar no

ultrapassa nossa compreensão. Todavia Deus nos criador, que é ao mesmo tempo justo e amoroso,

revelou o necessário de sua natureza essencial para santo e misericordioso, juiz eterno e pai do Senhor

podermos servi-lo e adorá-lo. É especialmente Jesus Cristo, com sendo outra coisa além de

importante entender a natureza de Deus, como perfeito. As Escrituras afirmam isto, declarando-o

revelada na Bíblia, pois inúmeros conceitos de como perfeito.

divindade são sustentados por aqueles que rejeitam


o Deus das Escrituras. A Bíblia não nos dá uma VI.3 – Deus é pessoal

definição única e abrangente de Deus; se “os céus, e


até os céu dos céus, não de podem contar” 1 Rs Um ser pessoal é alguém que tem

8.27, como pode uma frase ou um parágrafo de consciência de si mesmo, que possui intelecto,

palavras humanas definir o seu ser? sentimentos e vontade. Nos dias de hoje, alguns

Várias declarações sobre Deus na Escritura superficialmente crêem num Deus impessoal, algo

definem diversos aspectos de sua natureza, tais como um princípio de vida que pode ser chamado

como “Deus é espírito” Jo 4.24, “Deus é luz” 1 Jo 1.5; “natureza”. Tal Deus não responde orações, nem se

“Deus é amor” 1 Jo 4.8 e “Deus é fogo consumidor” desagrada com os atos indignos: ele é apenas o

Hb 12.29. Vejamos alguns aspectos da natureza próprio universo, inclusive as suas leis. Um “deus”

divina: assim impessoal não pode confrontar nosso


egoísmo, mas também não nos pode ajudar quando

VI.1 – Deus é Espírito. nossos problemas são maiores do que podemos


resolver sozinhos.

A declaração de que Deus é Espírito O Deus das Sagradas Escrituras, é um Deus

significa que ele não pode ficar limitado a um pessoal, transcendente, que se mantém, à parte do

corpo físico, nem as dimensões de espaço e tempo. universo como seu Criador; mas, ao mesmo tempo,

Ele é um Deus invisível e eterno: é um Deus imanente que habita dentro da sua
criação, preservando e cuidando dela como um Pai

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Curso básico de teologia

Celestial. humanos. Isso torna nos possível entendermos


como ele é. Mas as qualidades que Deus partilha
VI.4 – Deus é único conosco não são exatamente como as nossas, pois
as nossas palavras não são satisfatórias para
A Lei de Deus, dada no Sinai, começa com expressar sua perfeição.
a declaração: “ouve, Israel, o Senhor nosso Deus é o Deus quer, e nós queremos; Deus ama, e
único Senhor” Dt 6.4. Nada é mais condenado na nós amamos; Deus odeia, e nós odiamos. Mas a
Escritura do que a adoração de inúmeros outros vontade de Deus, o amor de deus e o ódio de Deus
deuses, Dt 6.14; 1 Rs 18.21-40, Is 44.6,Jo 17.3 e 1 Ts não são exatamente como os nossos. Em cada caso,
1.9. devemos tentar detectar em que sentido as
qualidades de Deus são como as nossas e em que
sentido diferem.
VII – AS QUALIDADES OU ATRIBUTOS DE DEUS Quando falamos em qualidades ou
atributos estamos falando sobre o caráter de Deus.
A
A medida que estudamos, percebemos que não
pergunta não é
Deus
existe!Mas podemos dizer ao mesmo tempo tudo o que a
simplesmente como ele é? Bíblia nos ensina sobre o caráter dele.
acadêmica,
Usando um termo mais técnico, podemos
porque, se o que pensamos a respeito de Deus está
dizer que em tudo o que as Escrituras dizem a
basicamente errado, podemos estar adorando um
respeito de Deus usa-se linguagem antropomórfica
Deus falso, um ídolo. E o que nós adoramos é que
— ou seja, linguagem que fala de Deus em termos
nos dá forma. Temos a tendência de assumir um
humanos. Cada descrição de cada uma das
pouco do caráter daquilo que adoramos – dinheiro,
qualidades divinas deve ser compreendida à luz de
prazer, sucesso, Deus ou qualquer outra coisa. Por
tudo o mais que as Escrituras nos dizem sobre
isso, se adoramos a Deus, temos de pensar nele
Deus. Se não nos lembrarmos disso,
como ele é. Caso contrário, a imagem falsa que
inevitavelmente compreenderemos erradamente o
adoramos vai distorcer nossas motivações e
caráter de Deus.
prejudicar nossa personalidade.
É preciso lembrar que, embora tudo o que
Então como Deus é? Quais são as suas
as Escrituras nos dizem sobre Deus seja verdadeiro,
qualidades (atributos)113 principais?. Há qualidades
não é exaustivo. Deus tem muitos nomes porque
de Deus que são (incomunicáveis) exclusivas114 dele.
conhecemos muitas descrições verdadeiras de suas
Muitas das características de Deus são partilhadas
qualidades com base nas Escrituras; mas Deus não
(comunicáveis)115 até certo ponto com os seres
tem nome nenhum, pois jamais poderemos
113 QUALIDADES, os teólogos sistemáticos (Grudem, Berkhof, descrever ou compreender a plenitude do seu
Thiessen, Hodge, Strong, Bancroft, Chafer et al) utilizam se da
palavra ATRIBUTOS para se referirem as ‘qualidades’ de Deus. caráter.
114 INCOMUNICÁVEIS (palavra adotada pela maioria dos
teólogos) para expressar aquelas qualidades de Deus que são únicas e
EXCLUSIVAS dele.
115 COMUNICÁVEIS, (palavra adotada pela maioria dos teólogos)
preferimos adotar o termo PARTILHADAS, por entendermos ser de
melhor compreensão.

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Curso básico de teologia

VII.1) AS QUALIDADES ESCLUSIVAS DE DEUS: Evidências nas Escrituras: no salmo 102,


encontramos um contraste entre coisas que
As qualidades exclusivas ou atributos podemos julgar permanentes, como a terra ou os
incomunicáveis de Deus são talvez os mais fáceis de céus, de um lado, e Deus, do outro. Deus existia
compreender antes da criação dos céus e da terra e existirá muito
Em que depois da destruição dessas coisas. Deus faz mudar
aspectos Deus
é diferente de o universo, mas, contrastando com essa mudança,
nós?
ele é “o mesmo”.
equivocadamente, talvez porque representam
aspectos do caráter divino menos familiares à nossa
Será que Deus às vezes muda de idéia? Se, porém,
experiência. A primeira parte define o atributo em
falamos que Deus é imutável nos seus propósitos,
discussão, e a segunda procura evitar a
surpreendemo-nos intrigados diante de passagens
compreensão equivocada do atributo, expondo um
bíblicas em que Deus diz que julgaria o seu povo,
aspecto de equilíbrio ou contrário associado a esse
mas depois, por causa de orações ou do
atributo. A imutabilidade de Deus, por exemplo, é
arrependimento do povo (ou ambas as coisas),
definida assim: “Deus é imutável no seu ser, nas
acaba-se apiedando e não condena como dissera
suas perfeições, nos seus propósitos e nas suas
que o faria.
promessas; porém, Deus age, e age de modos
diversos diante de situações diferentes”. A segunda
A questão da impassibilidade de Deus. Às vezes,
metade da definição procura evitar a idéia de que
discutindo os atributos divinos, os teólogos falam
imutabilidade significa incapacidade total de ação.
noutro atributo, a saber, a impassibilidade de Deus.
Alguns de fato entendem assim a imutabilidade,
Esse atributo, se verdadeiro, significaria que Deus
mas tal compreensão é incompatível com a
não tem paixões nem emoções, mas é “impassível”,
apresentação bíblica da imutabilidade de Deus.
não sujeito a paixões.
1. Independência. Deus não precisa de
nós nem do restante da criação para nada; porém,
O desafio da teologia do processo. A imutabilidade
tanto nós quanto o restante da criação podemos
de Deus tem sido negada freqüentemente nos
glorificá-lo e dar-lhe alegria. Esse atributo de Deus
últimos anos pelos defensores da teologia do
é às vezes chamado existência autônoma ou
processo, uma posição teológica que afirma que o
aseidade (das palavras latinas a se, que significam
processo e a mudança são aspectos essenciais da
“de si mesmo”). Deus é absolutamente
existência genuína, e que portanto, Deus também
independente e auto-suficiente.
deve necessariamente mudar com o tempo, como
2. Imutabilidade. Deus é imutável no seu ser, nas
qualquer outra coisa que existe.
suas perfeições, nos seus propósitos e nas suas
promessas; porém, Deus age e sente emoções, e age
Deus é ao mesmo tempo infinito e pessoal. Nossa
e sente de modos diversos diante de situações
discussão da teologia do processo ilustra uma
diferentes. Esse atributo de Deus é também
diferença comum entre o cristianismo bíblico e
chamado inalterabilidade.
todos os outros sistemas teológicos. No
ensinamento da Bíblia, Deus é ao mesmo tempo

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Curso básico de teologia

infinito e pessoal: ele é infinito porque não está


sujeito a nenhuma das limitações da humanidade, c) Deus percebe todo o tempo com igual realismo.
ou da criação em geral. É bem maior do que É em certo sentido mais fácil para nós
qualquer coisa que tenha feito, bem maior do que compreender que Deus percebe todo o tempo com
qualquer coisa que exista. igual realismo. Lemos em Salmos 90.4: “Pois mil
anos, aos teus olhos, são como o dia de ontem que
A importância da imutabilidade de Deus. De início se foi e como a vigília da noite”.
pode não parecer muito importante para nós
afirmar a imutabilidade de Deus. A idéia é tão d) Deus percebe os acontecimentos no tempo e age
abstrata que talvez não percebamos imediatamente no tempo. Todavia, dito isso, para evitar uma
a sua importância. Mas a importância dessa compreensão equivocada é preciso completar a
doutrina ficaria mais clara se parássemos um definição da eternidade de Deus: “... ele, porém,
instante para imaginar o que aconteceria se Deus percebe os acontecimentos no tempo e age no
pudesse mudar. tempo”. Paulo escreve: “... vindo, porém, a
plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho,
3. Eternidade. A eternidade de Deus pode nascido de mulher, nascido sob a lei, para resgatar
ser definida assim: Deus não tem princípio nem fim os que estavam sob a lei” (Gl 4.4-5).
nem sucessão de momentos no seu próprio ser, e
percebe todo o tempo com igual realismo; ele, e) Sempre existiremos no tempo. Será que algum
porém, percebe os acontecimentos no tempo e age dia participaremos da eternidade de Deus?
no tempo. Especificamente, no novo céu e na nova terra que
Às vezes essa doutrina é chamada doutrina hão de vir, será que o tempo ainda existirá? Alguns
da infinitude de Deus com respeito ao tempo. Ser supõem que não. E lemos nas Escrituras: “A cidade
“infinito” é ser “ilimitado”, e a doutrina ensina que não precisa nem do sol, nem da lua, para lhe darem
o tempo não impõe limites a Deus. claridade, pois a glória de Deus a iluminou, e o
Cordeiro é a sua lâmpada [...] porque, nela, não
a) Deus é eterno no seu próprio ser. O fato de Deus haverá noite” (Ap 21.23, 25; cf. 22.5).
não ter princípio nem fim está explícito em Salmos 4. Onipresença. Assim como Deus é ilimitado
90.2: “Antes que os montes nascessem e se ou infinito com respeito ao tempo, também é
formassem a terra e o mundo, de eternidade a ilimitado com respeito ao espaço. Essa
eternidade, tu és Deus”. Do mesmo modo, em Jó característica da natureza de Deus é chamada
36.26, Eliú diz sobre Deus: “... o número dos seus onipresença divina (o prefixo latino o[m]ni-
anos não se pode calcular”. significa “tudo”). A onipresença de Deus pode ser
assim definida: Deus não tem tamanho nem
b) A eternidade de Deus é também afirmada por dimensões espaciais e está presente em cada ponto
passagens que abordam o fato de que Deus sempre do espaço com todo o seu ser; ele, porém, age de
é ou existe. “Eu sou o Alfa e o Ômega, diz o Senhor modos diversos em lugares diferentes.
Deus, aquele que é, que era e que há de vir, o Todo-
poderoso” (Ap 1.8; cf. 4.8). a) Deus está presente em todo lugar. Há, porém,

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 84


Curso básico de teologia

determinadas passagens que falam da presença de partes”. Mas como a palavra simples hoje tem o
Deus em toda parte do espaço. Lemos em Jeremias: sentido mais comum de “fácil de compreender” e
“Acaso, sou Deus apenas de perto, diz o SENHOR, e “simplório ou insensato”, é mais proveitoso agora
não também de longe? Ocultar-se-ia alguém em falar da “unidade” de Deus em vez da sua
esconderijos, de modo que eu não o veja? — diz o “simplicidade”.
SENHOR; porventura, não encho eu os céus e a terra?
— diz o SENHOR” (Jr 23.23-24). Deus aqui repreende VII.1a) Como reagir a essas qualidades exclusivas de
os profetas que pensam que suas palavras ou Deus?
pensamentos ficam ocultos de Deus. Ele está em
Deus tem qualidades
todo lugar e enche o céu e a terra. que lhe são
exclusivas. Quais?
Nosso
b) Deus não tem dimensões espaciais. Embora para
problema com as qualidades que só pertencem a
nós pareça necessário dizer que todo o ser de Deus
Deus é que nossa experiência humana do que são
está presente em toda parte do espaço, ou em cada
as “pessoas” e os “relacionamentos pessoais”
ponto do espaço, é também necessário dizer que
acontece totalmente dentro dos limites do tempo,
Deus não pode ser contido por espaço nenhum, por
do espaço, do conhecimento e do poder. Mas em
maior que seja. Salomão diz na sua oração a Deus:
Deus estamos lidando com uma pessoa que está
“Mas, de fato, habitaria Deus na terra? Eis que os
além dessas limitações. Compreensivelmente, não
céus e até o céu dos céus não te podem conter,
sabemos exatamente como resolver essas questões.
quanto menos esta casa que eu edifiquei” (1Rs
Não temos informações suficientes. Mas há
8.27).
diversas coisas úteis que os cristãos podem fazer
quando tentam pensar a respeito do caráter de
c) Deus pode estar presente para punir, sustentar
Deus.
ou abençoar. A idéia da onipresença de Deus às
vezes perturba as pessoas, que se perguntam como
a) Precisamos admitir ignorância. Só podemos
Deus pode estar presente, por exemplo, no inferno.
conhecer o que Deus revela de si mesmo. Afirmar
De fato, não é o inferno o oposto da presença de
que sabemos mais a respeito de Deus do que ele
Deus, ou a ausência de Deus? A dificuldade pode
tem revelado é sinal não de conhecimento, mas de
ser resolvida pela percepção de que Deus está
arrogância. Na realidade, se soubéssemos tudo o
presente de modos diversos em lugares diferentes,
que há para ser conhecido a respeito de Deus,
ou de que Deus age diferentemente em locais
teríamos de atravessar aquelas barreiras que fazem
distintos da sua criação.
de nós criaturas. Resumindo, teríamos de ser Deus.
5. Unidade. A unidade de Deus pode ser definida
desta forma: Deus não está dividido em partes;
b) Também devemos adorar. Longe de ser uma
porém percebemos atributos diversos de Deus
desculpa para a preguiça mental, a adoração é
enfatizados em momentos diferentes. Esse atributo
apenas uma reação adequada para com Deus que
de Deus é também denominado simplicidade
nos criou e que, apesar de nossa persistente
divina, empregando simples no sentido menos
rebeldia e indiferença, ainda assim se deleita em se
comum de “não complexo” ou “não composto de

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 85


Curso básico de teologia

revelar. Tal Deus vai levar-nos à profunda Escrituras é que “Deus é espírito” (Jo 4.24). Essa
adoração, a pensar nele em larga escala e a respeito afirmação é feita por Jesus no contexto de uma
das pessoas em pequena escala – exatamente o discussão com a samaritana ao lado da fonte.
padrão oposto da atitude predominante em nosso Assim, não devemos pensar que Deus tem
mundo secular. tamanho ou dimensões, mesmo que infinitas.

c) É importante colocar os problemas na 2. Invisibilidade. Ligado à espiritualidade de


perspectiva correta. Talvez não consigamos captar Deus está o fato de que Deus é invisível. Porém
totalmente os detalhes de como Deus se revela, também precisamos falar das formas visíveis nas
acima do tempo, e interage com as pessoas dentro quais Deus se manifesta. A invisibilidade de Deus
do tempo. pode ser definida assim: dizer que Deus tem como
d) Acima de tudo, precisamos examinar com as atributo a invisibilidade é dizer que a essência
qualidades de Deus operam na prática na Bíblia. integral de Deus, todo o seu ser espiritual, jamais
Isso vai evitar que utilizemos nossos poderá ser vista por nós, embora Deus se revele a
conhecimentos de maneira errada. nós por meio de coisas visíveis, criadas.

VII.2.b) As qualidades mentais de Deus:


VII.2) AS QUALIDADES QUE DEUS PARTILHA
COM AS PESSOAS:
3. Conhecimento (onisciência). O conhecimento
Em que aspectos de Deus pode ser definido assim: Deus conhece
Deus é como nós A lista das
plenamente a si mesmo e todas as coisas reais e
no seu ser e nas qualidades
qualidades possíveis num ato simples e eterno.
mentais e dada aqui
morais?
na
A definição dada acima explica a
categoria “comunicáveis” nada tem de incomum,
onisciência com mais detalhes. Diz primeiro que
mas compreender a definição de cada atributo é
Deus conhece plenamente a si mesmo. Trata-se de
mais importante do que ser capaz de classificá-los
um fato espantoso, pois o próprio ser divino é
exatamente da maneira apresentada nesta apostila.
infinito ou ilimitado.

Esta seção divide os atributos


4. Sabedoria. Dizer que Deus tem sabedoria
“comunicáveis” de Deus em cinco categorias
significa dizer que ele sempre escolhe as melhores
principais, sendo os atributos relacionados dentro
metas e os melhores meios para alcançar essas
de cada categoria.
metas. Essa definição vai além da idéia de que Deus
Desta forma os atributos descrevem o ser de Deus
conhece todas as coisas, e especifica que as
são:
decisões divinas quanto ao que fará são sempre
VII.2.a) As qualidades que descrevem o ser de
sábias, ou seja, sempre trazem os melhores
Deus:
resultados (do ponto de vista absoluto de Deus), e
1. Espiritualidade. As pessoas muitas vezes se
trazem esses resultados pelos melhores meios
perguntam do que Deus é feito. A resposta das

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 86


Curso básico de teologia

possíveis.
João nos diz que “Deus é amor” (1Jo 4.8).
5. Veracidade (e fidelidade). A veracidade divina Temos sinais de que esse atributo de Deus já existia
implica que ele é o Deus verdadeiro, e que todo o antes da criação entre os membros da Trindade.
seu conhecimento e todas as suas palavras são ao Jesus fala ao Pai da “glória que me conferiste,
mesmo tempo verdadeiros e o parâmetro definitivo porque me amaste antes da fundação do mundo” (Jo
da verdade. 17.24), indicando assim que o Pai já amava e
honrava o Filho desde a eternidade. E continua até
O termo fidedignidade, que significa hoje, pois lemos: “O Pai ama ao Filho, e todas as
“veracidade” ou “confiabilidade”, é às vezes usado coisas tem confiado às suas mãos” (Jo 3.35).
como sinônimo da veracidade divina.
8. Misericórdia, graça, paciência. A misericórdia, a
VII.2.c) As qualidades morais de Deus. paciência e a graça divinas podem ser tidas como
três atributos separados ou como aspectos
6. Bondade. A bondade de Deus implica que ele é particulares da bondade de Deus. As definições
o parâmetro definitivo do que é bom, e que tudo o dadas aqui apresentam esses atributos como casos
que Deus é e faz é digno de aprovação. especiais da bondade de Deus quando empregada
em benefício de categorias específicas de pessoas.
Nessa definição, vemos uma situação
semelhante à que encontramos na definição de * A misericórdia de Deus é a bondade divina para
Deus como o Deus verdadeiro. Aqui, “bom” pode com os angustiados e aflitos.
ser interpretado como “digno de aprovação”, mas * A graça de Deus é a bondade divina para com os
ainda falta responder à seguinte pergunta: que só merecem castigo.
aprovação de quem? Em certo sentido, podemos * A paciência de Deus é a bondade divina no sustar
dizer que qualquer coisa que seja verdadeiramente a punição daqueles que persistem no pecado por
boa deve ser digna da nossa aprovação. Mas num determinado tempo.
sentido mais absoluto, não somos livres para
decidir por contra própria o que é digno de 9. Santidade. Dizer que Deus tem como atributo a
aprovação e o que não o é. Em última análise, santidade é dizer que ele é separado do pecado e
portanto, o ser e os atos de Deus são perfeitamente dedica-se a buscar a sua própria honra. Essa
dignos da sua própria aprovação. definição contém ao mesmo tempo uma qualidade
relacional (separação de) e uma qualidade moral (a
7. Amor. Dizer que Deus tem o amor como separação é do pecado ou do mal, e a dedicação é
atributo é dizer que ele se doa eternamente aos em prol da própria honra ou glória de Deus). A
outros. Essa definição interpreta o amor como uma idéia de santidade, abarcando tanto a separação do
doação de si mesmo em benefício dos outros. Esse mal quanto a dedicação de Deus à sua própria
atributo de Deus mostra que faz parte da sua glória, encontra-se em várias passagens do Antigo
natureza doar-se a fim de distribuir bênçãos ou o Testamento.
bem aos outros.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 87


Curso básico de teologia

10. Paz (ou ordem). Em 1Coríntios 14.33, Paulo diz:


“Deus não é de confusão, e sim de paz”. Embora 13. Ira. Talvez nos surpreenda perceber que a Bíblia
“paz” e “ordem” não sejam tradicionalmente fala com muita freqüência da ira de Deus. Porém,
classificadas como atributos divinos, Paulo aqui se Deus ama tudo o que é certo e bom, e tudo o
sugere outra qualidade que poderíamos conceber que se conforma ao seu caráter moral, então não
como atributo distinto de Deus. Paulo diz que os deve admirar que ele odeie tudo o que se opõe ao
atos de Deus se caracterizam pela “paz” e não pela seu caráter moral. A ira de Deus diante do pecado
“desordem” (gr. akatastasia, palavra que significa está portanto intimamente associada à santidade e
“desordem, confusão, inquietude”). à justiça de Deus. A ira de Deus pode ser definida
assim: dizer que a ira é atributo de Deus é dizer que
11. Retidão, justiça. Em português as palavras ele odeia intensamente todo o pecado.
retidão e justiça são duas palavras distintas, mas
tanto no Antigo Testamento hebraico quanto no VIi2.d) As qualidades de propósito Deus, e de
suas decisões:
Novo Testamento grego, só há uma palavra por trás
desses dois termos. (No Antigo Testamento, esses
termos traduzem principalmente as várias formas
14. Vontade. A vontade de Deus é o atributo por
da palavra tsedek e, no Novo Testamento, as várias
meio do qual ele aprova e decide executar todo ato
formas da palavra dikaios). Portanto,
necessário para a existência e para a atividade de si
consideraremos que esses dois termos designam
mesmo e de toda a criação.
um único atributo divino.

Essa definição indica que a vontade de


12. Zelo. Tem o significado de estar alguém
Deus tem que ver com a decisão e com a aprovação
profundamente comprometido com a busca da
das coisas que Deus é e faz. Envolve as escolhas
honra ou do bem-estar de outrem ou de si mesmo.
divinas do que fazer e do que não fazer.
Diz Paulo aos coríntios: “Zelo por vós com zelo de
Deus” (2Co 11.2). Aqui o sentido é “empenhado na
A vontade de Deus em geral. As Escrituras
proteção e na vigília”.
freqüentemente indicam a vontade de Deus como
razão definitiva ou absoluta para qualquer coisa
As Escrituras apresentam-nos um Deus
que acontece. Paulo se refere a Deus como aquele
zeloso, nesse sentido do termo. Ele contínua e
“que faz todas as coisas conforme o conselho da sua
sinceramente busca proteger a sua própria honra.
vontade” (Ef 1.11).
Ordena que seu povo não se prostre perante ídolos,
nem os sirva, dizendo: “... porque eu sou o SENHOR,
b. Distinções nos aspectos da vontade de Deus:
teu Deus, Deus zeloso” (Êx 20.5).
vontade necessária e vontade livre. Algumas
distinções já traçadas no passado podem-nos
ajudar a compreender diversos aspectos da vontade
de Deus. Assim como podemos querer ou escolher
algo com anseio ou relutância, com alegria ou

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 88


Curso básico de teologia

arrependimento, em segredo ou publicamente, decisões de Deus, a onipotência divina refere-se ao


também Deus, na infinita grandeza da sua seu próprio poder de fazer o que decidir fazer.
personalidade, é capaz de querer coisas diferentes
de modos diversos.
VII.2.e) As qualidades de síntese:

Vontade secreta e vontade revelada. Outra 17. Perfeição. A perfeição é o atributo divino que
distinção proveitosa aplicada aos diferentes permite que Deus possua com excelência
aspectos da vontade divina é a que se faz entre a absolutamente todas as qualidades e não careça de
vontade secreta e a vontade revelada de Deus. nenhum aspecto dessas qualidades que lhe seja
Mesmo na nossa experiência sabemos que somos desejável.
capazes de desejar algumas coisas secretamente, e
só mais tarde revelar essa vontade aos outros. Às É difícil decidir se isso deve ser tido como
vezes contamos aos outros antes que a coisa atributo isolado ou simplesmente incluído na
desejada surja ou aconteça; noutras vezes descrição dos outros. Algumas passagens dizem
revelamos o segredo só quando o acontecimento que Deus é “perfeito” ou “completo”. Diz-nos Jesus:
desejado já ocorreu. “Portanto, sede vós perfeitos como perfeito é o
vosso Pai celeste” (Mt 5.48).
15. Liberdade. A liberdade de Deus é o atributo por
meio do qual ele faz o que lhe apraz. Essa definição 18. Bem-aventurança. Ser “bem-aventurado” ou
implica que nada em toda a criação pode impedir “bendito” é ser feliz num sentido bastante pleno e
que Deus execute a sua vontade. magnífico. Freqüentemente as Escrituras falam da
Esse atributo de Deus está portanto bem-aventurança das pessoas que andam nos
intimamente associado à sua vontade e ao seu caminhos de Deus. Em 1Timóteo, porém, Paulo
poder. Mas esse aspecto da liberdade concentra-se denomina a Deus “bendito e único Soberano” (1Tm
no fato de Deus não se ver cerceado por nada que 6.15) e fala do “evangelho da glória do Deus
lhe seja exterior e de ser ele livre para fazer o que bendito” (1Tm 1.11). Em ambos os casos a palavra
desejar. Não há pessoa ou força que possa ditar a não é eulogêtos (muitas vezes traduzida como
Deus o que fazer. Ele não está debaixo de nenhuma “bendito”), mas makarios (que significa “feliz”).
autoridade nem de nenhuma limitação exterior.
19. Beleza. A beleza é o atributo divino por meio do
16. Onipotência (poder, soberania). A qual Deus se revela a soma de todas as qualidades
onipotência é o atributo de Deus que lhe permite desejáveis. Esse atributo divino está implícito em
fazer tudo o que for da sua santa vontade. A palavra vários dos atributos anteriores e é especialmente
onipotência vem de dois termos latinos, omni, associado à perfeição de Deus. Porém, a perfeição
“todo”, e potens, “poderoso”, significando portanto de Deus foi definida de uma forma que mostra que
“todo-poderoso”. ele não carece de nada que lhe seria desejável.

Enquanto a liberdade de Deus se refere ao Este atributo, a beleza, se define de uma maneira
fato de não haver constrangimentos exteriores às positiva, para mostrar que Deus de fato possui

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Curso básico de teologia

todas as qualidades desejáveis: “perfeição” significa irar com o pecado e os pecadores. Se fosse
que Deus não carece de nada desejável; “beleza” indiferente, estaria negando a sua santidade.
significa que Deus tem tudo o que é desejável. São
VIII – AS OBRAS DE DEUS
duas formas diferentes de declarar a mesma
verdade.
VIII.1 - Propósito divino.

20. Glória. Num dos seus sentidos a palavra glória


“Este é o conselho que foi determinado sobre
significa simplesmente “honra” ou “reputação toda esta terra; e esta é a mão que está
estendida sobre todas as nações. Porque o
excelente”. Esse é o significado do termo em Isaías SENHOR dos Exércitos o determinou; quem
pois o invalidará? E a sua mão estendida está;
43.7, em que Deus fala dos seus filhos, “que criei
quem, pois, a fará voltar atrás? “ Is 14.26,27.
para minha glória”, ou em Romanos 3.23, que diz
“nele, digo, em quem também fomos feitos
que “todos pecaram e carecem da glória de Deus”. herança, havendo sido predestinados
conforme o propósito daquele que faz todas as
Noutro sentido, a “glória” de Deus significa a clara
coisas, segundo o conselho da sua vontade”,
luz que circunda a presença de Deus. Como Deus é Ef. 1.11

espírito, e não energia nem matéria, essa luz visível


Parece claro pelo ensino da Escritura que
não faz parte do ser divino, mas é algo criado.
todos os eventos das nações e indivíduos são
Podemos defini-la assim: a glória de Deus é o brilho
conhecidos por Deus deste o início, sendo levados
criado que circunda a revelação do próprio Deus.
em conta em seu plano e propósito. Isto não
significa que Deus produz e é responsável por
VII.3) - O que torna essas qualidades diferentes das
todos os atos e eventos, mas que eles fazem parte
nossas em Deus?
do seu propósito no sentido de operar todas as
coisas para a sua glória suprema:”... anuncio o fim
Em Deus elas são perfeitas e irrestritas,
desde o princípio e, desde a antiguidade, as coisas
totalmente isentas de pecado. Deus é perfeitamente
que ainda não sucederam; que digo: o meu conselho
bom. Tudo que ele é e tudo que ele faz e diz é bom;
será firme, e farei toda a minha vontade ... porque
ele não pode ser outra coisa senão bom. Deus é
assim o disse, e assim acontecerá; eu o determinei e
amoroso, de tal maneira que a Bíblia ousa dizer que
também o farei. Is 46.10,11.
Deus é amor. Seu amor, diferente do nosso, nunca
falha. Seu perdão é muito mais notável que o
O propósito predominante de Deus nos
nosso. Quando perdoamos lembramos que
assuntos da humanidade é expresso por Paulo
também pecamos; mas, quando Deus perdoa, ele o
em seu sermão aos atenienses: ”... Pois ele (Deus)
faz a despeito do fato de ser sempre a parte ferida,
mesmo é quem a todos dá vida, respiração e tudo
e nunca pecou.
mais; de um só fez toda a raça humana para habitar
sobre toda a face da terra, havendo fixado os tempos
A Bíblia diz que Deus sente ira contra todo
previamente estabelecidos e os limites da sua
o pecado e todos os pecadores (somos por natureza
habitação... “ At 17.25,26. Este propósito divino
“filhos da ira”). Mas, diferindo muito da nossa, ela
“previamente estabelecido”, porém, não priva os
não resulta de ressentimento pessoal. É parte
homens de sua escolha nem de sua
necessária de sua justiça. Ele não pode deixar de se

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 90


Curso básico de teologia

responsabilidade pessoal: “porquanto”, como Paulo


HODGE, Charles. Teologia sistemática. São Paulo: Hagnos,
continua dizendo, “estabeleceu um dia em que há 2001. 1711p.
de julgar com justiça por meio de um varão que
destinou...” v.31. HORTON, Stanley (Org.). Teologia sistemática: uma
perspectiva pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2005. 808p.

O grande milagre da profecia bíblica KEELEY, Robin (Org.). Fundamentos da teologia cristã. São
Paulo: Vida, 2000. 344p.
demonstra duas coisas:

LACY, G.H. Introduccion a La Teologia Sistemática. El Paso


– Texas – CBP. p.161-162
1) que Deus é onisciente e conhece todas
as coisas desde o princípio, e MACGRATH, Alister E. Teologia sistemática, histórica e
filosófica: uma introdução à teologia sistemática. São Paulo:
Shedd, 2005. 659p.

2) que Ele tem um plano e propósito, o


STRONG, Augustus Hopkins. Teologia sistemática. Vol. 1. São
qual, em seu poder e sabedoria Paulo, Hagnos, 2003. 680p.
executará para a sua glória e para a
redenção da humanidade. THIESSEN, Henry Clarence. Palestras em teologia
sistemática. São Paulo: IBR, 1987. 375p.

TORREY, R. A. (Org.). Os fundamentos: a famosa coletânea de

L
textos das verdades bíblicas fundamentais. São Paulo: Hagnos,
2005. p. 241-249.
Onde ler mais!
TURNER, Donald D. A doutrina de Deus. São Paulo: IBB, 1956.
121p.
BANCROFT, E. H. Teologia elementar: doutrinária e
conservadora. São Paulo: EBR, 2001. 378p.
WILEY, H. Orton; CULBERTSON, Paul T. Introdução à
BERKHOF, Louis. Teologia sistemática. São Paulo: Cultura teologia cristã. São Paulo: 1990. 516p.
cristã, 2001. 720p.

CHAFER, Lewis Sperry. Teologia sistemática. São Paulo: IBR,


1986. 617p.

CLARK, David S. Compêndio de teologia sistemática. 2a ed.


São Paulo: CEP, 1998. p. 68-128.
✐ Anotações
DAGG, John L. Manual de teologia. 2a ed. São Paulo: FIEL, ____________________________________________
1998. 300p.
____________________________________________
DUFFIELD, Guy P.; CLEAVE, Nathaniel M. Van. Fundamentos ____________________________________________
da teologia pentecostal. Vol. 1. São Paulo: GRF, 1991. p. 61-115.
____________________________________________

ERICKSON, Millard J. Introdução à teologia sistemática. São ____________________________________________


Paulo: Vida Nova, 1997. 540p.
____________________________________________
____________________________________________
GRUDEM, Wayne. Teologia sistemática. São Paulo: Vida
Nova, 1999. 1046p. _________________________________________________

_________________________________________________
HODGE, Archibald Alexander. Esboços de teologia. São Paulo:
PES, 2001.
_________________________________________________

LANGSTON, A. B. Esboço em teologia sistemática. 7a ed. Rio _________________________________________________


de Janeiro: JUERP, 1983. 305p.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 91


Curso básico de teologia

1 – ORIGEM

A – TEORIAS – Dentre outras destacamos as

ANTROPOLOGIA
seguintes:

“O homem é preexistente”. Teria ele


existido noutro planeta antes de habitar a
terra. Todavia, até onde se conhece, não há
documentos que comprovam tal suposição.

“O homem é uma emanação de Deus”.


a doutrina Seria admitir que, “in Toutum” ele viera de
Deus, inclusive a parte orgânica. Daí se vê
que isto é um absurdo, pois que, Deus é
do homem espírito e a matéria é corrupta. Aceitá-lo seria
admitir que Deus também esteja sujeito ‘a
corrupção.

“O homem é produto de geração


espontânea”. Todas as tentativas para
Conteúdo sustentar tal asserção resultaram em fracasso.

“O homem é resultante da evolução”. O


próprio Darwin, o pai da evolução, cria que
1 – ORIGEM Deus criara a primeira forma de vida, em
2 – TEORIAS número muito reduzido e que todos os
gêneros e espécies procederam desse ponto
3 – A CRIAÇÃO DIVINA DO HOMEM de partida. Ver D.S. Clark – T. Sist. Pág. 64.

4- EVIDENCIAS QUANTO À CRIAÇÃO DIVINA


NOTA: A teoria de Darwin é a que tomou maior
5 – NATUREZA
ressonância nos meios acadêmicos, razão porque
6 – OS DICÓTOMOS
alistamos algumas objeções razoáveis.
7 - OS TRICÓTOMO
8 -QUESTÃO INTERCAMBIÁVEL
a) A origem e a natureza das espécies
9 -COMENTÁRIOS
permanecem num mistério absoluto,
afirmam o professor Bateson. (Citado
D.S.Clark – idem)
b) A ciência apresenta enormes lacunas
Introdução
entre as diferentes espécies
genéticas(números de cromossomos,
Depois do estudo sobre Deus, julgamos
etc).
apropriado passar ao estudo da pessoa humana.
c) A esterilidade dos híbridos é um fato
Além do homem ser o objetivo de todo o processo
por demais convincente com a
redentivo, o próprio redentor fez-se humano e
transmutação das espécies.
historicamente manifestou-se depois da criação do
d) A arqueologia tem demonstrado que
homem. O termo “Antropologia” vem das duas
povos antigos como os egípcios eram
palavras gregas: antropos = nome e logos = estudo.
portadores de mitos, segredos
científicos, em pé de igualdade com a

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 92


Curso básico de teologia

atualidade científica. Onde está a Júnior – Teologia do Antigo Testamento, pág. 76.
evolução? Notamos aqui parte de sua exegese. “Porque assim
e) Existe grade abismo entre os reinos da diz o Senhor que criou (Barah) os céus, o único
natureza e muita superioridade entre Deus que formou (Yasar) a terra. que a fez (Asah) e
um e outro. Os instintos dos a estabeleceu (Kûn): que não a fez (Barah) para ser
irracionais permanecem os mesmos da um caos, mas o formou (Yasar) para ser habitada:
idade da pedra. Eu Sou o Senhor e não há outro”. Is.45:18. O que se
f) Se é verdadeira a teoria da evolução, pode verificar é um paralelismo muito interessante
como não encontramos provas atuais? ‘a mente mais analítica.
g) Se o cruzamento inteligente não pôde Para Bancroft a formação do homem
jamais produzir uma única espécie seguiu este processo, a saber:
nova (variedade é outra cousa), que
probabilidade existe de o acaso cego ou
1. 1 O homem veio a existência por um
a seleção natural tenha podido fazê-lo?
ato criador, Gn 1:27
h) Se é que podemos pensar em termos
2. O homem recebeu um organismo
de evolução das espécies, é certo que o
físico por um ato de formação Gn 2:7; Ec 12:7
“homem progrediu do arado ao trator,
da jangada ao transatlântico, da 3. O homem foi feito ser pessoal e vivo

caverna ao arranha-céu, porém, os por uma final Gn 2:7; Zc 12:1. Teologia

pássaros continuam fazendo seus Elementar, pág. 207.

ninhos hoje como quando foram Resumindo, vamos considerar as


criados”. Bancrofti – Teologia referências de Gn 1:26-30 como de ordem geral, e as
Elementar, pág. 207. de Gn 2:4-7, 21 e 22 como específicas consoante ‘a
formação do homem, incluindo também a mulher.
E ainda raciocina Clark, “se a matéria
morta tivesse criado a sua própria vida e se o C – EVIDENCIAR QUANTO À CRIAÇÃO DIVINA
átomo tivesse achado a sua própria
Os itens abaixo relacionados por A. H.
consciência, então o milagre certamente seria
Strong constituem também os esteios obre os quais
maior que aquele que a Bíblia apresenta”.
se apóia doutrina da unidade da raça humana.

B – A CRIAÇÃO DIVINA DO HOMEM


a) PROVAS BÍBLICAS – “Macho e fêmea
Não obstante o que a ciência possa dizer
os criou”. Gn 1:27; “E de um só fez toda a geração
contra ou a favor, a criação ou formação do ser
dos homens” At 17:26; “Por um só homem entrou o
humano é fundamentalmente uma questão de fé.
pecado no mundo, e pelo pecado, a morte; assim a
Hb 11:3. Existe uma discussão quanto ao significado
morte passou a todos os homens, por isso que
dos verbos usados no Cap, 1 de Gn, concernente a
todos pecaram”. Rm 5:12.
este tópico. Para maior expansão do assunto,
recomendamos o comentário de Walter Kaiser
b) LINGUAGEM – “A grande semelhança

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Curso básico de teologia

das raízes nas línguas primitivas indica unidade de Concernente à constituição do homem
linguagem nos primeiros dias da raça humana. existem duas correntes teológicas de maior
Cerca de 170 raízes servem para ligar os vários importância. Ambas tomam por base declarações
grupos de línguas asiáticas, e destas, cerca de 50 bíblicas e lançam mão de figuras para assegurarem
ainda podem achar-se em todas elas; quer dizer, suas convicções teológicas.
nas línguas acadianas, egípcias, arianas, semíticas e
mongólicas”. Conder, citado por D.S. Clark –
A – OS DICÓTOMOS
Teologia Sistemática pág. 174.

Designação vem dos termos gregos ( Dixa


c) HISTÓRIA – “Tão remota quanto a
= dois e temnw = parte). Para os dicótomos, o
história das nações e tribos em ambos os
homem é constituído de duas partes: O corpo
hemisférios possa ser traçada, a evidência aponta
então seria a agência e o espírito ou alma, o agente.
par a origem e ancestral comum na Ásia Central. As
A.B. Langston ilustra isso como segue: “O homem é
nações européias reconhecem terem vindo de
como a casa de dois andares o primeiro representa
ondas migratórias sucessivas da Ásia. Etnologistas
o corpo, e o segundo, que representa a parte
modernos, em geral, concordam que as raças
espiritual do homem, existe uma janela que dá para
indígenas da América derivam-se de fontes
o mundo ambiente (isto seria o aspecto inferior da
mongólicas na Ásia Ocidental, tanto pela Polinésia
alma), e uma clarabóia que dá parte o céu (seria o
como pelo caminho das Ilhas Auletas”. S. Theology,
lado superior da alma) que se volta para Deus e
pág. 476.
para as cousas celestiais”. Ver esboço de T.
Sistemática, pág. 129.
d) UM SÓ SANGUE – A experiência vem Prossegue ele: “Geralmente, quando os
demonstrando que o ser humano é o mesmo em escritores sagrados faziam uso dos termos espírito
sua constituição genética. Casamentos entre e alma, tratavam de uma só cousa em diferentes
americanos e japoneses não constituem problemas relações. Empregavam o termo espírito quando
à procriação. Os tipos raciais mais divergentes são faziam referência à relação da vida do homem para
uniformes neste particular. com Deus; e a alma quando faziam referência à
ralação da vida do homem com as cousas terrenas”

e) NATUREZA – O composto mental, (Idem) August H. Strong defende esta oposição da

moral e espiritual é idêntico em todos os homens. seguinte maneira:

2 – NATUREZA a) O uso intercambiável dos termos alma e


espírito em passagem como estas Gn 48:1; Jr
12:10; IRs 17:21; Sl 42:6; Mt 10:28; 20:27; 27:5;
“Então formou o Senhor Deus ao homem
Tf 2:26 e Ap 6:9.
do pó da terra (Adamah) e lhe soprou nas narinas o
b) Tanto pneuma como pscha são
fôlego de vida (Nishmat Hayim/Ruach) e o homem
utilizados para a criação bruta, Ec 3:21; Ap 16:3; Jr
passou a ser alma vivente (Nephash) Gn 2:7.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 94


Curso básico de teologia

9;9 e Hb 10:38 Isso fica mais claro quando consideramos as

c) Psche é atribuída a Jeová: Am 6:8; Is 42:1; diversa acepções contidos no vocábulo alma.

d) Os mortos desincorporados são


chamados Pschai: Ap 6:9; 20:4; a) PESSOA – Ex 1:5; Is 38: 17; Ez 18:20; Mt

e) Os exercícios religiosos mais elevados 11:29; Rm 13:1; Ap 18:13; 20:4; Lc 12:19-23.

são atribuídos à Psche: Mc 12:30; Lc 1:46; Hb b) VIDA – (Princípio animador) – Gn 9:5;


6:18-19; Tg 1:21; Mt 10:28.

f) O perder está Psche é perder tudo: Mc c) EMOÇÕES – Intelecto, sentimentos,


8:36,37; propensões – Lc 4:46.

g) A menção do corpo e da alma ou espírito


juntos constituem o homem por inteiro: Mc QUESTÃO INTERCAMBIÁVEL
20:28; I Cor 5:3; III Jo 2.

Nem sempre o termo espírito fica bem


B – OS TRICÓTOMOS traduzido por alma e vice-versa, por causa das
diversas acepções. Por exemplo, no V.T. Ec 12:7,

A terminologia também oriunda dos onde se lê que “O espírito volte para Deus que o

termos gregos (Trixa = tresse temnw = parte). Não deu”, não há como trocar espírito (Ruch) por alma

menos acirrada é a argumentação dos tricótomos. (Nephesh); no N.T. Lc 12:19, onde está escrito:

Para eles o homem é formado de três partes “...alma, tens em depósito muitos bens para muitos

distintas. O espírito que é o elemento mais nobre, a anos descansa, come e bebe e regala-te”. Também

alma que é a parte intermediária, e o corpo esta não é possível substituir alma por espírito, não faz

porção material, concreta. A questão toda reside na sentido.

conceituação que venha ser espírito e alma. I Ts A propósito, A. R. Crabtres ensina o


5:23 e Hb 4:12 são os textos básicos em que se seguinte: “Em muitos textos do V. T. (Ec 3:18-21; Is
fundamentam os tricótomos. 26:9; Jó 7:11, etc) o vocábulo (Nephesh) é o
equivalente de (Ruach) Conf. T. Bíblica do T. pág.
119 e seg.
TERMOS ORIGINAIS – Notemos os
vocábulos referente a cada parte:
COMENTÁRIOS

PORTUGUÊS HEBRAICO
Espírito Ruach O binômio “juntas e medulas” citado em

Alma Nephesh Hb 4:12 como figura de diferenciação entre alma e


Corpo Bazar (carne) espírito é pertinente a partir de observação de que
juntas e medulas saoa duas partes inclusive de
Embora os homens utilizem o termo textura diferente: Juntas de osso e medula de massa
espírito sem a devida distinção, na Bíblia, ele pastosa. Qualquer cirurgia na região da espinha é
sempre diz respeito a parte mais elevada o homem. sempre melindrosa. De igual modo a separação

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 95


Curso básico de teologia

entre a alma e o espírito é tão delicada que só a (Ef 6:6; Fl 1:27; I Cor 3:23) e um indica emoção (I Ts
Palavra de Deus é tipo como instrumento apto. 5:23), os outros dois são usous pessoais (Rm 2:9;

Para Nee Tosheng. “Assim que o sopro de 13:1). O apóstolo usa o termo Pneuma quando se

vida que se tornou o espírito do homem, tomou refere aos dos adjetivos Psychkos e Pneumátikos,

contato com o corpo, a alma foi produzida. As distinguem a natureza humna separa da graça e

escrituras, portanto, chamam o homem de ‘Alma personalidade total do homem, e a palavra

vivente’....desse modo o homem foi criado Pneuma em acepção humana para aquela parte do

predominantemente como alma vivente” (Spiritual homem que sobrevive à morte”. (Parapsicologia e

Man, pág. 23). Continua ele: Através do corpo Psicocopatologia, pág. 29).

temos consciência do mundo ambiente, através da


alma, temos consciência do si-mesmo, e por meio CONCLUSÃO
do espírito temos consciência de Deus....Deus
habita em nosso espírito, nosso ego habita em
Para Pearlman “ambas as opiniões são
nossa alma, enquanto os sentidos residem no
corretas quando bem compreendidas. O espírito e
corpo. Pelo seu espírito, o homem mantém
a alma representam os dois lados da substância não
intercurso com o mundo espiritual, através do seu
física do homem... embora distintos, o espírito e a
corpo o homem está em contato como o mundo
alma são inseparáveis, são entrosados um no outro.
exterior sensitivo, afetando-o e sendo afetado por
Por estarem tão interligados, as palavras ‘espírito’ e
ele. A alma encontra-se entre esses dois mundos e
‘alma’ muitas vezes se confundem (Ec 12:7; Ap 6:9),
pertence aos dois. Ela se relaciona ao mundo
de maneira que um trecho a substância espiritual
espírito e ao material por meio do corpo... O
do homem se descreve como alma (Mt 10:28) e em
espírito não pode agir diretamente sobre o corpo;
outro como espírito (Tg 2:26)”. (Conhecendo as
precisa de um intermediário; e este intermediário é
doutrinas da Bíblia, pág. 72).
a alma produzida pelo contato do espírito com o
corpo”. (Idem pág. 26 e 27).
III – IMAGEM E SEMELHANÇA
Se é razoável o argumento supracitado,
notemos mais esta argumentação “Examinando I
Cor 15:44, verificamos que a alma e o espírito são Uma vez criados todas as criaturas, diz o
claramente distintos. Semeia-se corpo natural texto (Gn. 1.25): “E viu Deus que isso era bom”.
(Soma psychkon), ressuscita corpo espiritual (Soma Todavia, após a formação do homem. “Viu Deus
pneumatikon). Dizer portanto que não existe tudo que fizera e eis que era muito bom” (1.31). O
diferença entre alma e espírito é o mesmo que advérbio ‘muito’ encarece a importância da criação
afirmar, não haver diferença entre corpo natural e do homem não apenas pelo fato de ser dotado de
corpo espiritual”. espírito, mas por haver sido criado imagem e

PSYCHE, segundo Ronald Scott Bruno, é semelhança de Deus. “Ao contemplar a beleza da

usado por Paulo 12 vezes. Em 06 casos indica vida criação e compará-la com os recursos conferidos ao

(Rm 11:3; 16:4; I Cor 15:45; II Cor 1:23; Fl 2:30; I Ts homem, o escritor dos salmos exclama: “Fizeste por

2:8). Dentre os 4 usos psíquicos, 03 indicam desejo um pouco menor do que Deus e de glória e de

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Curso básico de teologia

honra o coroaste” (8.5). religiosa. A natureza religiosa estabelece um

1- O HOMEM E OS IRRACIONAIS (A.H. ponto de profundo contraste entre o homem e

Strong S. Theology, 457). o animal. Alguém já disse que o homem e o


animal é um ser incuravelmente religioso. E
a) “Os brutos são conscientes, mas o
isto é verdade, porque onde quer que o
homem é auto-consciente. Um pouco jamais diz:
encontramos, haveremos de achar também as
sou porco. Se fizesse deixaria de ser porco.”
manifestações de sua natureza religiosa... É
“Nenhum animal jamais pronunciou EU, e
interessante notar que ainda não houve em
a razão é que eles não tem consciência própria”.
tempo algum, um irracional que erigisse um
(A.B. Langston, Esboço de T.S. 131).
templo ou altar em nome da religião...”
b) “Os brutos tem apenas percepção, ao
(Strong, idem).
passo que o homem conceitos. Os brutos lembram-
Nota: Depois de comentar Gn. 2.7 e Zc.
se de coisas, mas não pensam. Somente o homem
12.1, Strong afirma: “A alma é reconhecida como
tem poder de abstração.
distinta em natureza do corpo e de uma dignidade
“Se um animal pensa numa cor, será uma
e valor muito daqueles de qualquer organismo
cor identificada com algum objeto. O homem
material. Na verdade há um espírito no homem e o
porém, tem a capacidade de pensar não só na cor
sopro do Todo Poderoso o faz entendido.” Jô. 32.8
independente de qualquer objeto colorido, como
Pág. 4, idem.
também em outras cousas abstratas, tais como
l) O fator intensidade e vastidão da vida
ódio, amor, prazer, etc”. (Langston).
distingue os irracionais dos seres humanos. De
g) “Os brutos não julgam, não podem
um modo geral, ao sois anos de idade os
comparar cousa com cousa”.
animais já exercem todas as funções de adulto,
h) “Os brutos não possuem raciocínio inclusive a reprodução. Ao passo que nesta
nenhum sentido de que isso segue aquilo, idade os seres humanos ainda se encontram na
acompanhado do sentimento de que a primeira infância, e até os oitenta ainda
seqüência é necessária.” continua a descobrir novidades à sua vida.
i) Os brutos não possuem idéias gerais m) A questão da escolha de um alvo para
ou intuições, como de espaço, tempo, a vida é outro aspecto que diferencia os
substancia, causa, direito...Nenhum animal faz irracionais dos homens. Enquanto os
ferramentas, usa roupas, prepara (cozinha) irracionais não podem pensar em termos de
alimentos. futuro, tudo o que fazem é para satisfação de
j) “Os brutos possuem determinação, instintos imediatos. Os homens alimentam-se,
mas autodeterminação não. Não existe estudam, preparam-se para hoje e o amanhã.
nenhuma liberdade de escolha, nenhuma n) No tocante as atividades, também
formação consciente de um propósito e estabelecem-se profundas diferenças entre os
nenhum movimento próprio rumo a um brutos e os seres humanos. Os irracionais mais
determinado fim.” inteligentes podem construir barragens como
k) “Os brutos não possuem natureza os castores ou brincar com seus companheiros

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 97


Curso básico de teologia

e filhotes. Todavia jamais poderão transmitir que é capaz de emitir juízo sobre diversas questões.
suas imaginações em termo de escrita, 3. O homem se assemelha com Deus
escultura, pintura ou servirem-se dos avanços porque possui natureza emocional. É capaz de
da informática. sentir. E quando ama, no melhor sentido, isso
acontece como um reflexo do seu criador.

IMAGEM E SEMELHANÇA 4. O homem foi feito imagem e


semelhança de Deus porque possui vontade. Sem
duvidas este é o patrimônio de maior valor para o
Em que consiste, pois a imagem e
homem. E quão difícil é para o homem abrir mão
semelhança do homem com Deus?
da sua vontade, mesmo que seja para dar lugar à
De um modo geral os estudiosos acham
vontade de Deus! Strong desenvolve a questão da
que dois termos constituem uma espécie de
vontade da maneira magistral às pág. 505-551 de S.
redundância, são sinônimos. Uma minoria,
Theology.
entretanto, pensa que a semelhança é algo
5. O homem se parece com Deus por ser
diferente da imagem. Vejamos logo seus
uma criatura livre. Livre até para decidir se comeria
argumentos quanto a imagem no pensamento
ou não da árvore do conhecimento do bem e do
destes últimos.
mal. Por ser livre, pode exercer sua própria
vontade.
a) IMAGEM- “Essencialmente, Deus é
6. O homem é semelhante a Deus no
espírito (Jo. 4.24) é invisível, mas Deus tem uma
exercício do domínio sobre as demais criaturas.
forma pela qual se manifesta ao olho humano (Is.
7. O homem assemelha-se com Deus pela
6.1; At. 7.56; Fl. 2.5). Em Thayer’s Greek-Englis
posse da imortalidade. E.Y. Mullins desenvolve este
Lexicon do N.T. na palavra traduzida por forma
ponto de maneira incomparável. Acompanhemo-lo.
encontrada em Fl. 2.5, ele insiste muito nesta
diferenciação. O homem parece ter sido criado não a) A imortalidade é uma inferência

apenas na semelhança intelectual e moral, mas necessária, partindo-se de uma criação que implica

também na semelhança visível de Deus. São Lc. em progresso;

3.22; 9.29.” R.A Torre. What the Bible Teaches. b) A imortalidade do homem é uma noção
praticamente universal.

b) IMAGEM E SEMELHANÇA- A maioria c) A imortalidade é algo que a própria

que concorda trata-se de termos sinônimos, experiência da morte deixa subentendida. Todos

convêm nos seguintes aspectos: sabem que o homem é mais do que o corpo que
volta ao pó.
1. O homem reflete Deus por causa da
posse de uma natureza racional; ele é capaz de d) A imortalidade é requerida por causa

pensar, de refletir e depois de tomar decisão. das desigualdades e erros da vida presente.

2. O homem se parece com Deus por causa


da sua natureza moral; possui consciência, intuição
moral que descrimina entre o certo e o errado; pelo

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Curso básico de teologia

PROPAGAÇÃO DO HOMEM (ORIGEM DA


ALMA) 1. A existência de traços característicos
hereditários em nossa constituição mental

A questão aqui não é quanto aos aspectos e moral;

físicos e genéticos. Toda a discussão gira em torno 2. Explica satisfatoriamente a transmissão da


da transmissão do fator espiritual. Há pelo menos natureza pecaminosa de Adão e toda
três pontos de vista distintos quanto ao modo de posteridade;
encarar esta questão, Vejamos cada um: 3. Explica melhor a universalidade o pecado;
a) PREEXISTENCIALISTA – Segundo esta 4. Respaldo escriturístico. Jô 1.13; 3.6; Rm 1.3;
teoria as almas já existem antes da criação do 5.12; Ef 2.3.
corpo. Uma fez formado o corpo, Deus apenas
acrescenta-lhe a alma. Tal crença não encontra
Esta teoria era sustentada por Tertuliano e
respaldo bíblico.
implicitamente por Agostinho. Nos tempos
Esse modo de considerar foi sustentado
modernos pela igreja Luterana.
por Platão, Philo e Orígenes no passado e mais
recentemente por Kant e Julius Mullar na
NOTA: No contraste com o criacionismo,
Alemanha e por Eward Beecher na América.
o traducionismo questiona:
(Strong, pág. 488).
O que vem de Deus não pode ter pecado; e
Platão assim advoga para explicar que a
se a alma se torna pecadora pelo contato com a
alma possuía idéias que não derivavam dos
carne, será então a sede do mal?
sentidos; Philo para justificar o aprisionamento da
alma no corpo, e Orígenes, para justificar a c) Criacionismo – De acordo com esta

disparidade de condições em que o homem vem ao ensino, apenas a parte biológica e emocional

mundo. descende do homem, mas alma /espírito vem de


Deus. A parte espiritual é criação de Deus e ocorre
OBJEÇÕES: Não é apenas totalmente
no momento da concepção. Os adeptos desta teoria
isenta de suporte das Escrituras como também
tomam os seguintes textos para fundamentar o seu
contradiz a concepção mosaica da criação do
ponto de vista. Nm 16.22 “ O Deus dos espíritos de
homem como imagem e semelhança de Deus e a
toda carne...” Ec 12.7; Is 57.16; Zc 12.1.
descrição de Paulo a respeito de todo mal e morte
na raça humana como resultado do pecado de No passado, este argumento foi sustentado

Adão . Gn 1.27; Rm 5.12. Se a alma nesse estado por Aristóteles, Jerônimo e Pelágio; e mais

preexistente era cônscia e pessoal, é inexplicável modernamente, pelos católicos e teólogos

que não tenhamos nenhuma recordação de tal reformados. Para eles a alma de cada ser humano

preexistência ( Stheology- Strong pág. 490) era criada e a ele reunida no instante da
concepção, do nascimento ou em algum momento
b) Traducionismo – Conforme este ponto
entre esses dois acontecimentos.
de vista, os pais transmitem aos filhos não
somente parte biológica e emocional, mas também “O Criacionismo que se liga a Tricotomia

a parte espiritual. E assim justificam: diria, porém que a alma animal ( Pysche) é

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 99


Curso básico de teologia

propagada junto ao corpo, ao passo que a parte HODGE, Archibald Alexander. Esboços de teologia. São Paulo:
PES, 2001.
mais nobre do homem ( Pneuma) é em cada caso,
criada diretamente por Deus....” Strong LANGSTON, A. B. Esboço em teologia sistemática. 7a ed. Rio
de Janeiro: JUERP, 1983. 305p.
Systhematic Theology, pág. 491.

HODGE, Charles. Teologia sistemática. São Paulo: Hagnos,


2001. 1711p.
Objeções
HORTON, Stanley (Org.). Teologia sistemática: uma
perspectiva pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2005. 808p.
a) Observe-se que estas passagens podem ser
entendidas como sendo significando tanto criação KEELEY, Robin (Org.). Fundamentos da teologia cristã. São
Paulo: Vida, 2000. 344p.
imediata como imediata.

b) Se a alma humana de Cristo procedesse da LACY, G.H. Introduccion a La Teologia Sistemática. El Paso
– Texas – CBP. p.161-162
espécie humana, por ventura não participaria de
MACGRATH, Alister E. Teologia sistemática, histórica e
nossa comum pecaminosidade? ( A este filosófica: uma introdução à teologia sistemática. São Paulo:
Shedd, 2005. 659p.
argumento, defende-se afirmando que Cristo é um
caso a parte).
STRONG, Augustus Hopkins. Teologia sistemática. Vol. 1. São
Paulo, Hagnos, 2003. 680p.
c) Nenhuma daquelas passagens proíbe-nos de
supormos que Deus opera por meio dessas mesmas
THIESSEN, Henry Clarence. Palestras em teologia
leis naturais para produzir a alma. Strong pág.492. sistemática. São Paulo: IBR, 1987. 375p.

TORREY, R. A. (Org.). Os fundamentos: a famosa coletânea de

L Onde ler mais!


textos das verdades bíblicas fundamentais. São Paulo: Hagnos,
2005. p. 241-249.

TURNER, Donald D. A doutrina de Deus. São Paulo: IBB, 1956.


BANCROFT, E. H. Teologia elementar: doutrinária e 121p.
conservadora. São Paulo: EBR, 2001. 378p.

BERKHOF, Louis. Teologia sistemática. São Paulo: Cultura WILEY, H. Orton; CULBERTSON, Paul T. Introdução à
cristã, 2001. 720p. teologia cristã. São Paulo: 1990. 516p.

CHAFER, Lewis Sperry. Teologia sistemática. São Paulo: IBR,


1986. 617p.

CLARK, David S. Compêndio de teologia sistemática. 2a ed.


São Paulo: CEP, 1998. p. 68-128.
✐ Anotações
____________________________________________
DAGG, John L. Manual de teologia. 2a ed. São Paulo: FIEL,
1998. 300p. ____________________________________________
____________________________________________
DUFFIELD, Guy P.; CLEAVE, Nathaniel M. Van. Fundamentos
da teologia pentecostal. Vol. 1. São Paulo: GRF, 1991. p. 61-115. ____________________________________________
____________________________________________
ERICKSON, Millard J. Introdução à teologia sistemática. São
Paulo: Vida Nova, 1997. 540p.
____________________________________________
____________________________________________
GRUDEM, Wayne. Teologia sistemática. São Paulo: Vida _________________________________________________
Nova, 1999. 1046p.
_________________________________________________

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 100


Curso básico de teologia

mas simplesmente a ausência do bem. Nega que o


pecado tenha existência real e afirma que é apenas
um “erro da mente mortal”.

HAMARTIOLOGIA 5. Evolução. Essa teoria considera o pecado como


herança animalista primitiva do homem.

II - A origem do pecado

doutrina O problema do mal que há no mundo


sempre foi considerado um dos mais profundos

do pecado problemas da filosofia e da Teologia. É um


problema que se impõe naturalmente à atenção do
homem, visto que o poder do mal é forte e
I – O FATO DO PECADO
universal, é uma doença sempre presente na vida
II -A ORIGEM DO PECADO
em todas as manifestações desta, e é matéria da
III – A NATUREZA DO PECADO
experiência diária na vida de todos os homens.
IV – AS CONSEQUÊNCIAS DO PECADO

Outros, porém estão convictos, de que o


I – O fato do pecado mal teve uma origem voluntária isto é , que se
originou na livre escolha do homem, quer na
Não há necessidade de discutir a questão existência atual, quer numa existência anterior.
da realidade do pecado; a história e o Estes acham se bem mais perto da verdade revelada
conhecimento de nossa natureza interior oferecem na Palavra de Deus.
abundante testemunho desse fato. Muitas teorias,
porém, apareceram para negar, interpretar mal ou Dados bíblicos a respeito da origem do pecado.
atenuar a natureza do pecado.
1. Ateísmo. Ao negar a Deus, nega também o Na escritura , o mal moral existente no

pecado, porque estritamente falando, todo pecado mundo, transparece claramente no pecado isto é,

é contra Deus, e se não há Deus, não há pecado. como transgressão da lei de Deus.

2. Determinismo. Essa teoria que afirma ser o


livre-arbítrio uma ilusão, e não uma realidade. O 1 - Não se pode considerar Deus como o seu

homem é simplesmente escravo das circunstâncias. Autor.

3. Hedonismo. É a teoria que sustenta que o


melhor ou mais proveitoso que existe na vida éa O decreto eterno de Deus evidentemente

conquista do prazer e a fuga da dor; de modo que a deu a certeza da entrada do pecado no mundo, mas

primeira pergunta que se faz não é: “isso é não se pode interpretar isso de modo que faça de

correto?”, mas “trará prazer?”. Deus a causa do pecado no sentido de ser Ele o seu

4. Ciência cristã. Essa seita nega a realidade do autor responsável. Esta idéia é claramente excluída

pecado. Declara que o pecado não é algo positivo, pela Escritura. Longe de Deus o praticar ele a

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 101


Curso básico de teologia

perversidade e do Todo-poderoso o cometer primeiro pecado, comendo do fruto proibido . Mas


injustiça (Jó 34.10). Ele é o Santo Deus .(Is 6.3), e a coisa não parou aí, pois com esse primeiro pecado
absolutamente não há injustiça nele. (Dt 32.4); (Sl Adão passou a ser escravo do pecado. Esse pecado
92.16). Ele não pode ser tentado pelo mal e ele trouxe consigo corrupção permanente, corrupção
próprio não tenta a ninguém, (Tg 1.13) . que dada a solidariedade da raça humana, teria
efeito não somente sobre Adão, mas também sobre
Quando criou o homem, criou-o bom e à todos os seus descendentes. Como resultado da
sua imagem. Ele positivamente odeia o pecado, (Dt queda, o pai da raça só pode transmitir uma
25.16 , Sl 5.4 , 11.5 , Zc 8.17 , Lc 16.15) e em Cristo fez natureza depravada aos que lhe sucederam. Dessa
provisão para libertar do pecado do homem. fonte não santa o pecado fluí numa corrente
impura passando para todas as gerações de homens
2- O pecado se originou no mundo angélico. corrompendo tudo e todos com que entra em
contato. É exatamente esse estado de coisas que
A Bíblia nos ensina que na tentativa de torna tão pertinente a pergunta de Jó: “Quem da
investigar a origem do pecado devemos retornar à imundície poderá tirar cousa pura?” ninguém! (Jó
queda do homem, na descrição de Gn 3 e fixar a 14.4).
atenção em algo que sucedeu no mundo angélico. Mas ainda isso não é tudo: Adão pecou não
somente como pai da raça humana, mas também
Deus criou um grande número de anjos, e como chefe representativo de todos os seus
estes eram todos bons, quando saíram das mãos do descendentes , e , portanto, a culpa do seu pecado é
seu Criador (Gn 1.31). Mas ocorreu uma queda no posta na conta deles, pelo que todos são passíveis
mundo angélico, queda na qual legiões de anjos se de punição e morte. É primariamente nesse sentido
apartaram de Deus. A ocasião exata dessa queda que o pecado de Adão é o pecado de todos. É o que
não é indicada, mas em Jo 8.44, Jesus fala do diabo Paulo ensina em Rm 5.12:
como assassino desde o princípio e em 1 Jo 3.8 ) diz Portanto, assim como por um só homem
entrou o pecado no mundo e pelo pecado a
João que o Diabo peca desde o princípio. morte, assim também a morte passou a todos
os homens,porque todos pecaram.

3 - A origem do pecado na raça humana. Deus adjudica a todos os homens a


condição de pecadores, culpados em Adão,
Com respeito à origem do pecado na exatamente como adjudica a todos os crentes a
história da humanidade a Bíblia ensina que ele teve condição de justos em Jesus Cristo. É o que Paulo
início com a transgressão de Adão no paraíso e quer dizer, quando afirma:
portanto com um ato perfeitamente voluntário da “Pois assim como por uma só ofensa veio o
juízo sobre todos os homens para condenação,
parte do homem. assim também por um só ato de justiça veio a
graça sobre todos os homens para a
justificação que dá vida. Porque,como pela
O tentador veio do mundo dos espíritos desobediência de um só homem muitos se
tornaram pecadores, assim também por meio
com a sugestão de que o homem, colocando-se em da obediência de um só, muitos se tornarão
oposição a Deus, poderia tornar-se semelhante a justos. Rm 5.18,19.

Deus. Adão se rendeu à tentação e cometeu o

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Curso básico de teologia

II - A natureza do primeiro pecado ou da queda A escritura dá a entender claramente que a


do homem. serpente foi apenas um instrumento de Satanás , e
que Satanás foi o real tentador que agiu na
1 - Seu caráter Formal: serpente e por meio dela, como posteriormente
agiu em homens e em porcos (Jo 8.44, Rm 16.20, 2
Pode-se dizer que numa perspectiva Co 11.3, Ap 12.9).
puramente formal, o primeiro pecado do homem
consistiu em comer ele dá arvore do conhecimento A serpente foi um instrumento próprio

do bem e do mal. Quer dizer que não seria para Satanás pois ele é a personificação do pecado ,

pecaminoso, se Deus não tivesse dito: “Da árvore e a serpente simboliza o pecado (a) em sua

do conhecimento do bem e do mal não comerás...” natureza astuta e enganosa e (b) em sua picada

A ordem dada por Deus para não se comer venenosa com a qual mata o homem.

do fruto da árvore serviu simplesmente ao


III - A idéia Bíblica do pecado
propósito de por à prova a obediência do homem.
Foi um teste de pura obediência desde que Deus de
O pecado é o resultado de uma escolha
modo nenhum procurou justificar ou explicar a
livre, porém má, do homem.
proibição.

Este é o ensino claro da Palavra de Deus,


2- Seu caráter essencial e material: (Gn 3.1-6), (Is 48.8), (Rm 1.18-32), (1 Jo 3.4). O
homem está do lado certo ou do lado errado (Mt
O primeiro pecado do homem foi um 10. 32,33, 12.30, Lc 11.23, Tg 2.10). A escritura vê o
pecado típico, isto é , um pecado no qual a essência pecado em relação a Deus e sua lei, quer como lei
real do pecado se revela claramente. A essência escrita nas tábuas do coração, quer como dada por
desse pecado está no fato de que Adão se colocou meio de Moisés, (Rm 1.32 , 2.12-14, 4.15, Tg 2.9 , 1 Jo
em oposição a Deus, recusou-se a sujeitar a sua 3.4). Embora muitos neguem que o pecado inclui
vontade à vontade de Deus de modo que Deus culpa, essa negação não se harmoniza com o fato
determinasse o curso da sua vida, e tentou de que o pecado é ameaçado com castigo e de fato
ativamente tomar a coisa toda das mãos de Deus e o recebe, e evidentemente contradiz claras
determinar ele próprio o futuro. Naturalmente afirmações da Escritura, ( Mt 6.12, Rm 3.19, 5.18, Ef
podem distinguir-se diferentes elementos do seu 2.3). Por corrupção entende-se a corrosiva
primeiro pecado. No intelecto, revelou-se como contaminação inerente, a que todo pecador está
incredulidade e orgulho; na vontade como o desejo sujeito. É uma realidade na vida de todos os
de ser como Deus, e nos sentimentos como uma indivíduos. É inconcebível sem a culpa, embora a
ímpia satisfação ao comer do fruto proibido. culpa, como incluída numa relação penal seja
concebível sem a corrupção imediata. Mas é
sempre seguida pela corrupção. Todo aquele que é
O primeiro pecado ou a queda como
culpado em Adão, também nasce com uma
ocasionada pela tentação.
natureza corrupta, em consequência. Ensina-se
claramente a doutrina da corrupção do pecado em

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 103


Curso básico de teologia

passagens como, ( Jó 14.4, Jr 17.9, Mt 7. 15-20, Rm Rm 2.14, Fp 3.6, 1 Co 1.30, pois esta pode ser a
8.5-8, Ef 4.17-19). O pecado não reside nalguma justiça civil, cerimonial ou pactual, a justiça da lei
faldada da alma, mas no coração que na psicologia ou a justiça que há em Cristo Jesus.
da Escritura é o órgão central da alma , onde estão
as saídas da vida. ( Pv 4.23, Jr 17.9, Mt 15.19,20 , Lc V - O Pecado na Vida da Raça Humana

6.45 , Hb 3.12). A questão sobre se os pensamentos


A - Pecado Original
e os sentimentos do homem natural, chamado
carne na Escritura, devam ser considerados como
O estado e condição de pecado em que os
constituindo pecado, poder-se-ia responder
homens nascem é designado na Teologia pelo
indicando passagens como as seguintes: Mt 5.22,28
nome de peccatum originale, literalmente
; Rm 7.7 ; Gl5.17,24 e outras. Em conclusão pode-se
traduzido por pecado original.
dizer definir o pecado como falta de conformidade
com a lei moral de Deus, em ato, disposição ou Chama-se Pecado Original: (1) porque é derivado
estado. Há inequívocas declarações como a da raiz original da raça humana (2) porque está
Escritura que indicam a pecaminosidade universal presente na vida de todo e qualquer indivíduo,
do homem como nas seguintes passagens: 1 Rs desde a hora do seu nascimento e, portanto, não
8.46, Sl 143.2, Pv 20.9, Ec 7.20, Rm 3.1-12, 19, 20,23, pode ser considerado como resultado de imitação e
Gl 3.22, Tg 3.2, 1 Jo 1.8,10. Várias passagens da (3) porque é a raiz interna de todos os pecados
Escritura ensinam que o pecado é herança do concretizados que corrompem a vida do homem.
homem desde a hora do seu nascimento e,
portanto, está presente na natureza humana tão B - Os dois elementos do pecado original

cedo que não há possibilidade de ser considerado


1 - A culpa original: A palavra culpa expressa a
como resultado de imitação Sl 51.5, Jó 14. 4, Jo 3.6.
relação que há entre o pecado e a justiça, ou, como
Em Ef 2.3 diz o Apóstolo Paulo que os efésios eram
o colocam os teólogos mais antigos, e a penalidade
filhos da ira por natureza, indica uma coisa inata e
da lei. Quem é culpado está numa relação penal
original em distinção daquilo que é adquirido.
com a lei. Podemos falar da culpa em dois sentidos,
Então, o pecado é uma coisa original, daquela,
a saber, como reatus culpae (réu convicto) e como
participam todos os homens e que os faz culpados
reatus poenae (réu passível de condenação). O
diante de Deus. Além disso de acordo com a
sentido habitual, porém, em que falamos de culpa
Escritura, a morte sobrevém mesmo aos que nunca
na teologia, é o de reatus poenae. Com isto se quer
exerceram uma escolha pessoal e consciente Rm
dizer merecimento de punição, ou obrigação de
5.12-14. Finalmente a escritura ensina também que
prestar satisfação à justiça de Deus pela violação da
todos os homens se acham sob condenação e
lei, feita por determinação pessoal. Isso é
portanto necessitam da redenção que há em Cristo
evidenciado pelo fato de que, como a Bíblia ensina,
Jesus, nunca se declarava que as crianças
a morte, como castigo do pecado, passou de Adão a
constituem exceção a essa regra, conforme as
todos os seus descendentes: Rm 5.12-19, Ef 2.3, 1 Co
passagens recém-citadas e também Jo 3.35, 1 Jo 5.12,
15.22.
não contradizem isto as passagens que atribuem
certa justiça ao homem como Mt 9.12, 13, At 10.35,

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 104


Curso básico de teologia

C - Depravação Total múltiplo. Os pecados fatuais podem ser interiores,


como no caso de uma dúvida consciente e
Em vista do seu caráter impregnante, a particular, ou de um mau desígnio, sediado na
corrupção herdada toma o nome de depravação mente ou de uma cobiça consciente e particular, ou
total; muitas vezes esta frase é mal compreendida, de um mau desígnio sediado na mente, ou de uma
e portanto requer cuidadosa discriminação. Esta cobiça consciente e particular do coração, mas
depravação total é negada pelos pelagianos, pelos também podem ser exteriores, como a fraude, o
socinianos e pelos arminianos do século dezessete, furto, o adultério, o assassínio etc. Enquanto que a
mas é ensinada claramente na Escritura. Jo 5.42, existência do pecado original tem-se defrontado
Rm 7.18,23, 8.7, Ef 4.18, 2Tm 3. 2-4,Tt 1.15, Hb 3.12. com a sua negação amplamente generalizada a
presença do pecado fatual na vida do homem
V - O Pecado Fatual
geralmente é admitida. Contudo, isso não quer
dizer que as pessoas sempre tiveram consciência
Os católicos Romanos menosprezaram a
igualmente profunda de pecado. Afirmações como
idéia do pecado original e, depois, desenvolveram
de Paulo em Gl 5.21 e de passagens de texto
doutrinas como a da purificação do pecado original
comprovam os pecados fatuais . (Nm 15.29-31, Gl 6.1
(se bem que não só desse) pelo batismo e pela
, Ef 4.18, 1 Tm 1.13 , 5.24, Mt10;15, Lc 12.47 , 48 ; 23.34
graça suficiente, pelo que fica muito obscurecida a
, Jo 19.11, At 17.30 , Rm 1.32 ;2.12 , 1 Tm 1.13,15,16).
sua gravidade. A ênfase é dada clara e
completamente aos pecados atuais. Os pelagianos,
VI - O Pecado Imperdoável
os socinianos, os teólogos modernistas- e, por
estranho que pareça - também a Teologia da Crise, Diversas passagens da escritura falam de
só reconhecem os pecados atuais. Deve-se dizer, um pecado que não pode ser perdoado, após o qual
porém , que esta teologia fala do pecado é impossível a mudança do coração e pelo qual não
igualmente no singular e no plural, isto é, ela é necessário orar. É geralmente conhecido como
reconhece a solidariedade no pecado, não pecado ou blasfêmia contra o Espírito Santo. O
reconhecida por alguns dos outros. A teologia Salvador fala explicitamente dele em Mt 12.31,32 e
reformada (calvinista) sempre reconheceu passagens paralelas, e em geral se pensa que Hb
devidamente o pecado original e sua relação com 6.4-6, 10.26,27 e 1 Jo 5.16,também se referem a esse
os pecados atuais. Quando falamos do pecado pecado.
fatual ou peccatum actuale, empregamos a palavra
fatual ou factuale num sentido compreensivo. A VII - A Punição do Pecado
expressão pecados fatuais não indica apenas as
ações externas praticadas por meio do corpo, mas O pecado é coisa muito séria, e é levado a

também todos os pensamentos e violações sério por Deus, embora os homens muitas vezes o

conscientes que decorrem do pecado original. São tratem ligeiramente. Não é somente uma

os pecados individuais expressos em atos transgressão da lei de Deus, é também um ataque

diversamente da natureza e inclinação herdada. O ao grande Legislador, uma revolta contra Deus. É

pecado original é somente um, o pecado fatual é uma infração da inviolável justiça de Deus, que é o
fundamento do seu trono, Sl 97.2, e uma afronta à

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 105


Curso básico de teologia

imaculada santidade de Deus, que requer que 14.23;


sejamos santos em toda a nossa maneira de * Acepção de Pessoas, Tg 2.9;
punição numa palavra de fundamental significação, * Blasfêmia contra o Espírito Santo, Mc
diz Ele: Eu sou o Senhor teu Deus, Deus Zeloso, 3.29.
que visito a iniquidade dos pais nos filhos até à
terceira, à quarta geração daqueles que me
aborrecem... Êx 20.5. A Bíblia atesta L Onde ler mais!
abundantemente o fato de que Deus pune o
BANCROFT, E. H. Teologia elementar: doutrinária e
pecado, nesta vida e na vida por vir. A Bíblia fala de conservadora. São Paulo: EBR, 2001. 378p.
penalidades que em nenhum sentido são resultados
BERKHOF, Louis. Teologia sistemática. São Paulo: Cultura
ou consequências naturais do pecado, por exemplo cristã, 2001. 720p.

em Êx.32.33, Lv 26.21, Nm 15;3 , 1 Cr 10.13, Sl 11.6, CHAFER, Lewis Sperry. Teologia sistemática. São Paulo: IBR,
1986. 617p.
75.8, Is 1.24,28, Mt 3.10, 24.51. Todas estas passagens
CLARK, David S. Compêndio de teologia sistemática. 2a ed.
falam de uma punição do pecado por um ato Direto
São Paulo: CEP, 1998. p. 68-128.
de Deus. A palavra punição, vem do termo latino
poena, significando punição, expiação ou pena. A DAGG, John L. Manual de teologia. 2a ed. São Paulo: FIEL,
1998. 300p.
Bíblia nos ensina, por um lado, que Deus ama e
castiga o seu povo, Jó 5.17, Sl 6.1, 94.12, 118.18, Pv ERICKSON, Millard J. Introdução à teologia sistemática. São
Paulo: Vida Nova, 1997. 540p.
3.11, Is 26.16, Hb12.5-8, Ap 3.19, e, por outro lado,
que ele aborrece e pune os que praticam o mal, Sl GRUDEM, Wayne. Teologia sistemática. São Paulo: Vida
Nova, 1999. 1046p.
5.5, 7.11, Na 1.2, Rm 1.18; 2.5,6, 2Ts 1.6, Hb 10.26,27.

HODGE, Archibald Alexander. Esboços de teologia. São Paulo:


VIII - Morte Espiritual PES, 2001.

O pecado separa de Deus o homem, e isso LANGSTON, A. B. Esboço em teologia sistemática. 7a ed. Rio
de Janeiro: JUERP, 1983. 305p.
quer dizer morte, pois é só na comunhão com o
Deus vivo que o homem pode viver de verdade. A HODGE, Charles. Teologia sistemática. São Paulo: Hagnos,
2001. 1711p.
morte entrou no mundo por meio do pecado, Rm
5.120, e que o salário do pecado é a morte, Rm 6.23. HORTON, Stanley (Org.). Teologia sistemática: uma
perspectiva pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2005. 808p.
A penalidade do pecado certamente inclui a morte
física , mas inclui muito mais que isso.
LACY, G.H. Introduccion a La Teologia Sistemática. El Paso
– Texas – CBP. p.161-162

IX - Considerações Bíblicas sobre o Pecado.


MACGRATH, Alister E. Teologia sistemática, histórica e
filosófica: uma introdução à teologia sistemática. São Paulo:
A teologia Bíblica nos apresenta as Shedd, 2005. 659p.

seguintes definições para o Pecado:


STRONG, Augustus Hopkins. Teologia sistemática. Vol. 1. São
* Transgressão da Lei: I Jo 3.4; Paulo, Hagnos, 2003. 680p.
* Desobediência, Jr 3.25;
THIESSEN, Henry Clarence. Palestras em teologia
* Rebeldia, 1 Sm 15.23;
sistemática. São Paulo: IBR, 1987. 375p.
* Dúvida e tudo o que não provém da fé, Rm

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 106


Curso básico de teologia

Os estudos que se seguem fazem uma


abordagem separada de cada fato histórico.

I - A PRÉ-EXISTÊNCIA DA IGREJA
HISTÓRIA
A ) A origem da Igreja
DA IGREJA
A igreja de Cristo sempre existiu na mente
e coração do Pai, desde antes da fundação do
universo.
“Como também nos elegeu nele antes da
Introdução fundação do mundo, para que fôssemos
santos e irrepreensíveis diante dele” - Ef 1.4

“O qual, na verdade, em outro tempo foi


conhecido, ainda antes da fundação do
mundo, mas manifestado nestes últimos
A História da Igreja tem sido sempre, tempos por amor de vós” I Pe 1.20
desde o seu nascimento até o presente, a história
O plano de salvação estava traçado por
da graça de Deus para com o homem e revelada na
Deus desde o eterno passado. O sacrifício fora feito
história humana.
antes da fundação do universo, isto é, antes mesmo
de ser efetuado no calvário, o cordeiro já era
conhecido pelo Pai116 .
Antes de adentrarmos no estudo dos vinte
Em uma ordem lógica, podemos admitir
séculos em que a igreja Cristã tem estado em
que: Deus fundou a Igreja, Jesus Cristo formou a
atividade, veremos os grandes acontecimentos, os
Igreja e o Espírito Santo confirmou a Igreja. Assim,
quais servem como divisória, e cada um deles
o projeto no coração de Deus, a formação pelo
assinala o término e início de uma época.
ministério de Cristo e a confirmação, no dia de
Pentecostes, pelo poderoso derramamento do
Considerando cada um destes
Espírito Santo.
acontecimentos, sete ao todo, veremos que eles
indicam os grandes períodos da História da Igreja:
B ) A fundação da Igreja
I - A pré-existência da Igreja
II - A Igreja apostólica “E demonstrar a todos qual seja a dispensação
do mistério, que desde os séculos esteve oculto
III - As Perseguições Imperiais em Deus, que tudo criou por meio de Jesus
IV - A Igreja Imperial Cristo” - Ef 3.9

V - A Igreja medieval
A Igreja que antes era um mistério "oculta
VI - A Igreja Reformada
em Deus" fora revelada em Cristo, tornando-se o
VII - A Igreja atual
"segredo de Deus" conhecido aos homens. A

116 MACGRATH, 2005 , p. 475.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 107


Curso básico de teologia

expressão "oculto em Deus" indica que a igreja mundo.


esteve sempre na mente de Deus, e vindo a ser Características da Igreja primitiva
conhecida pelo ministério terreno de Jesus Cristo e
Naquele tempo uma Igreja Cristã era
o Espírito Santo.
comumente um pequeno grupo de crentes que
A Igreja de Deus, começou a
vivam numa grande comunidade pagã. Quase
formar e revelar-se no tempo, quando João Batista
todos eram pessoas pobres, alguns escravos,
disse: Eis o Cordeiro de Deus que tira o pecado do
embora houvesse cristãos nas classes mais altas,
mundo. Jo 1.36.
especialmente na igreja de Roma.
Em toda parte havia muita coisa que
C ) O nascimento da Igreja
distinguia um cristão dos vizinhos pagãos. Eles se
tratavam mutuamente por irmãos em Cristo, e
A Igreja de Cristo iniciou sua história com
realmente agiam como irmãos. Cuidavam
um movimento de âmbito mundial, no dia de
desveladamente dos órfãos, dos doentes, das
pentecostes117, cinqüenta dias após a ressurreição, e
viúvas, dos desamparados.
dez dias depois da ascensão do Senhor Jesus Cristo.
As coletas e a administração dos fundos de
Naquela manhã, enquanto os seguidores de Jesus,
caridade constituíram uma das partes mais
120 ao todo, estavam reunidos em oração, o
importantes da vida dessas igreja primitivas.
Espírito Santo, veio sobre eles.118
Dentro das Igreja todas as distinções foram
abolidas. Escravos e senhores foram nivelados. As
D ) A plenitude do tempo
mulheres alcançaram uma posição de honra e de
influência que jamais haviam conseguido em
Mas, vindo a plenitude dos tempos, Deus
enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido qualquer parte.
sob a lei – Gl 4.4
Além disso, a atitude dominante dos
cristãos era de contentamento e confiança
A "plenitude do tempo" não quer dizer
admiráveis. Regozijavam-se no amor de Deus, o
que o mundo estivesse pronto a se tornar cristão,
Pai; na comunhão com Cristo redivivo; no perdão
mas quer dizer que, nos desígnios de Deus, havia
dos pecados; na certeza da imortalidade. Assim
chegado o momento de enviar o seu filho ao
desconheciam a tristeza e o desespero que

117PENTECOSTE era a segunda grande festa sagrada do ano oprimiam a vida de muitos que os cercavam.
judaico. A primeira grande festa era a Páscoa. Cinquenta dias Essas características derivavam parte do
após esta, vinha a festa de Pentecoste, nome este derivado do gr.
Penteekostos (=quinquagésimo). Era também chamada Festa das seu vigor da constante expectação em que viviam
Colheitas, porque nela as primícias da sega de grãos eram
esses discípulos quanto a iminente vinda do
oferecidas a Deus (cf. Lv 23.17). Da mesma forma, o dia de
Pentecoste simboliza, para a igreja, o início da colheita de almas Senhor, em glória visível, para estabelecer seu reino
para Deus neste mundo. (Bíblia de Estudo Pentecostal, p. 1630)
118 O efeito desse acontecimento foi tríplice: (1) Iluminou a mente triunfante sobre a terra. A predominância dessa
dos discípulos, dando-lhes um novo conceito de Reino de Deus. esperança na Igreja apostólica nunca deve ser
(2) Compreenderam que o Reino não era um império político,
mas um reino espiritual, na pessoa de Jesus ressuscitado, que esquecida quando consideramos esse período
governava de modo invisível todos aqueles que o aceitavam pela
histórico da Igreja.
fé. (3) Aquela manifestação revigorou a todos, repartindo com
eles o fervor do Espírito e o poder de expressão que fazia de cada
testemunho um motivo de convicção naqueles que o ouviam.

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Curso básico de teologia

Seus líderes

II - A IGREJA APOSTÓLICA
A leitura dos seis primeiros capítulos do
livros de Atos dá a entender que durante esse
30-100 d.C. período o apóstolo Pedro era o líder da Igreja. Em

Desde a Ascensão de Cristo todas as ocasiões, era Pedro quem tomava a


até o final do século I iniciativa de pregar, de operar milagres e defender
a igreja nascente. Isso não significa que Pedro fosse

A Igreja teve seu início na cidade de papa ou dirigente oficial nomeado por Deus. Tudo

Jerusalém. Evidentemente, nos primeiros anos de acontecia como resultado da prontidão de Pero em

sua história, as atividades da Igreja limitaram-se decidir, de sua facilidade de expressão e de seu

àquela cidade e arredores. espírito de liderança. Contudo, ao lado de Pedro, o

Em todo o país, especialmente na província homem prático, encontramos João, o homem

setentrional da Galiléia, havia grupos de pessoas contemplativo e espiritual, que raramente falava,

que criam em Jesus como o Rei-Messias; no mas que desfrutava de grande estima por parte dos

entanto, não chegaram até nós dados ou crentes.

informações de nenhuma natureza que indiquem a


organização nem o reconhecimento de tais grupos Seu governo

como igreja.
As sedes gerais da Igreja daquela época Numa igreja comparativamente pequena

eram o Cenáculo, no monte Sião, e o Pórtico de em número, todos da mesma raça, todos

Salomão, no templo. obedientes à vontade do Senhor, todos na


comunhão do Espírito de Deus, pouco governo

Seus membros humano era necessário. Esse governo era


administrado pelos Doze, os quais atuavam como
Todos os membros da Igreja primitiva um só corpo, sendo Pedro apenas o porta-voz. Uma
eram judeus. Tanto quanto podemos perceber, frase que se lê em At 5.13 indica o alto conceito em
nenhum de seus membros, bem como nenhum dos que eram tidos os apóstolos, tanto crentes como
integrantes da companhia apostólica, a princípio pelo povo.
podia crer que os gentios fossem admitidos como
membros da Igreja. Quando muito, admitiam que o Suas doutrinas
mundo gentio se tornaria judeu, para depois aceitar
a Cristo. No início, a teologia da Igreja era simples.
Os judeus da época dividiam-se em três A doutrina sistemática foi desenvolvida mais tarde
classes: os hebreus, os judeus gregos ou helenistas, por meio de Paulo. Entretanto, pode-se encontrar
e os prosélitos, e as três estavam representadas na
11;6.9 eram descendentes dos judeus da dispersão, ou diáspora, isto é
igreja de Jerusalém.119
judeus cujo lar ou cujos antepassados estavam em terras estrangeiras.
Os prosélitos At 6.5 eram pessoas não descendentes de judeus, as
119 Os hebreus, At 6.1; 21.40, eram aqueles cujos antepassados quais renunciavam ao paganismo, aceitavam a lei judaica e passavam
haviam habitado a Palestina durante várias gerações; eram eles a a pertencer ao judaísmo, submetendo-se os homens ao rito da
verdadeira raça israelita. Os judeus gregos ou helenistas At 2.9- circuncisão.

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Curso básico de teologia

nos sermões de Pedro três pontos doutrinários crescimento foram:


considerados essenciais. O primeiro ponto, o - Perseveravam na doutrina dos apóstolos
maior, era o caráter messiânico de Jesus, isto é, que - Perseveravam na comunhão e partir do
Jesus de Nazaré era o Messias, o Cristo durante pão
tanto tempo esperado por Israel, que agora reinava - Perseveravam na oração
invisível do céu e ao qual todos os membros da - Possuíam temor
Igreja deveriam demonstrar lealdade pessoal, - Muitos sinais e maravilhas se faziam
reverência e obediência. - Muita alegria e sinceridade
Outra doutrina essencial era a ressurreição
de Jesus. Em outras palavras, que Jesus fora A Igreja primitiva era uma igreja poderosa
crucificado, ressuscitado dentre os mortos e agora na fé e no testemunho, pura em seu caráter, e
estava vivo, como cabeça da Igreja, para nunca abundante no amor. Entretanto, o seu defeito era a
mais morrer. falta de zelo missionário. Foi necessário o
A terceira das doutrinas cardinais, contidas surgimento de severa perseguição, para que se
nos discursos de Pedro, era a segunda vinda de decidisse a ir a outras regiões.
Jesus, Mt 24.36; 1 Ts 4.15-17. Isto é, o mesmo Jesus
foi levado ao céu no tempo determinado voltaria à
terra, par reinar com sua Igreja. Apesar de Jesus B ) A expansão da Igreja
haver declarado aos discípulos que nenhum da pregação de Estevão, 35 d.C.
ao Concílio de Jerusalém, c. 48 d.C.
homem, nem anjo algum, nem o próprio Filho,
sabia quando se daria a sua segunda vinda, era E disse-lhes: Ide por todo o mundo,
pregai o evangelho a toda criatura
geral a expectação de que esta poderia ocorrer em
Mc 16.15
pouco tempo, até mesmo naquela geração. Mas os que andavam dispersos
iam por toda a parte,
anunciando a palavra- At 8.4
A ) O crescimento da Igreja

da ascensão de Cristo, 30 d.C. Essa época da história da Igreja, apesar de


à pregação de Estevão, 35 d.C.
curta – com apenas quinze anos - , é de grande
E a multidão dos que criam no Senhor, importância. Nessa época, decidiu-se a
tanto homens como mulheres,
importantíssima questão: se o cristianismo deveria
crescia cada vez mais.- At 5.14
continuar como uma obscura seita judaica, ou se
E crescia a palavra de Deus,
deveria transformar-se em igreja cujas portas
e em Jerusalém se multiplicava muito
o número dos discípulos, e grande parte dos permanecessem para sempre abertas a todo
sacerdotes obedecia à fé. - At 6.7
mundo.
A arma usada pela igreja, através da qual a Quando se iniciou este período, a
igreja crescia demasiadamente, era o testemunho proclamação do evangelho estava limitada à cidade
de seus membros. Enquanto aumentava o número de Jerusalém e às aldeias próximas; os membros da
de membros aumenta o número de testemunhas, igreja eram todos israelitas por nascimento ou por
pois cada membro era um mensageiro de Cristo. adoção. Quando terminou, a Igreja já se havia
De acordo com At 2.41-47, os motivos desse estabelecido na Síria, na Ásia Menor e alcançara a

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Curso básico de teologia

Europa. Além disso, os cristãos, agora não eram de Tarso, cidade da costa da Ásia Menor, chamado
exclusivamente de nacionalidade judaica, mas Saulo. Esse jovem havia sido educado sob a
predominavam os gentios. O idioma usado na orientação o famoso mestre Gamaliel, sendo além
Palestina era o hebraico ou aramaico; contudo, em disso, conhecido e respeitado intérprete da lei
outras regiões bem mais povoadas, a língua usada judaica. Saulo participou do apedrejamento de
era o grego. Estevão e, logo a seguir, fez-se chefe de terrível e
obstinada perseguição contra os discípulos de
A pregação de Estêvão – At 6.1-4; 6.5; 6.11-14; 7.2- Cristo, prendendo e açoitando homens e mulheres.
53; 7.57-60. A igreja de jerusalém dissolveu-se nessa ocasião, e
seu membros dispersaram-se por vários lugares.
Na igreja de Jerusalém, surgiu uma queixa Entretanto, onde quer que chegassem, a Samaria
contra o critério adotado na distribuição de ou a damasco, ou mesmo à longínqua Antioquia
auxílios aos pobres, pois as famílias dos judeus da Síria, eles se constituam em regadores do
gregos ou helenistas prejudicadas. Os apóstolos evangelho e organizavam igrejas. Dessa forma, o
convocaram a igreja e propuseram a escolha de ódio feroz de Saulo era um fator favorável à
uma comissão de sete homens para cuidarem desse propagação do evangelho e da igreja.
serviço. Esse plano foi adotado, e os sete foram
escolhidos, figurando em primeiro lugar o nome de Filipe em Samaria, At 6.5; 8.5-13; 8.14-17; 8.40
Estevão, “homem cheio de fé e do Espírito Santo”.
Apesar de haver sido escolhido para um trabalho Na lista dos sete nomes escolhidos para
secular, rapidamente atraiu a atenção de todos administrarem a distribuição das doações aos
como pregador. Da acusação levantada contra ele, pobres, além de Estêvão, encontramos também a
quando foi preso pelas autoridades judaicas, e da Filipe, um dos doze apóstolos. Depois da morte de
sua mensagem de defesa, é evidente que Estevão Estevão, Filipe refugiu-se entre os samaritanos, um
proclamou Jesus Cristo como Salvador não povo miscigenado, que não era judeu nem gentio, e
somente para os judeus, mas também para os por isso mesmo desprezado pelos judeus. O fato
gentios. Parece que Estevão foi o primeiro membro significativo de Filipe começar a pregar o evangelho
da Igreja a ter visão do evangelho para o mundo aos samaritanos demonstra que ele se havia
inteiro, e esse ideal levou-o a tornar-se o primeiro libertado do preconceito dos judeus. Filipe
mártir cristão. estabeleceu uma igreja em Samaria, a qual foi
reconhecida pelos apóstolos Pedro e João. Foi essa
A perseguição realizada por Saulo, At 7.58; 22.3; a primeira igreja estabelecida fora dos círculos
8.3; 26.9-11; 11.19,20; 8.4 judaicos; contudo, não era exatamente uma igreja
composta de membros genuinamente gentios. Mais
Entre aqueles que ouviram a defesa de tarde encontramos Filipe pregando e organizando
Estêvão, e que se encolerizaram com suas sinceras, igrejas nas cidades costeiras de Gaza, Jope e
mas incompatíveis com a mentalidade judaica Cesaréia. Embora fossem considerada cidades
daqueles dias, estava um jovem de Tarso, cidade da gentias, todas possuíam densa população judaica.
costa da Ásia Menor, chamado Saulo. Esse jovem Nessas cidades, forçosamente, o evangelho teria de

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Curso básico de teologia

entrar em contato com o mundo pagão. Saulo, que fora o mais temido perseguidor do
evangelho, converteu-se em seu mais ardoroso
Pedro em Jope e Cesaréia, At 9.32-43; 10.9-16; defensor. Sua oposição fora dirigida especialmente
10.17-48 contra a doutrina que eliminava a barreira entre
judeus e gentios. Entretanto, quando se converteu,
Numa de suas viagens relacionadas com a Saulo adotou imediatamente os mesmos conceitos
inspeção da Igreja, Pedro chegou a Jope, cidade de Estevão e tornou-se ainda maior que este na
situada no litoral. Ali, Tabita, ou Dorcas, foi ação de fazer prosperar o movimento de uma igreja
ressuscitada. Nessa cidade, Pedro permaneceu universal, cuja portas estivessem abertas a todos os
algum tempo em companhia de outro Simão, o homens quer que fosse judeus, fossem gentios. Em
curtidor. O fato de Pedro, sendo judeu, toda a história do cristianismo, nenhuma
permanecer em companhia de um curtidor conversão a Cristo trouxe resultados tão
significa que ele se libertara das restritas regras dos importantes e fecundos pra o mundo inteiro como
costumes judaicos, pois todos os que tinham ofício a conversão de Saulo, o perseguidor, e, mais tarde,
de curtidor eram considerados “imundos” pela lei o apóstolo Paulo.
cerimonial. Foi em Jope que Pedro teve a visão do
que parecia ser um grande lençol que descia, no A igreja em Antioquia, At 11.19-29; 11.22,23;
qual havia todo tipo de animais, e foi-lhe dirigida 9.26,27; 11.25,26; 26.28; 1 Pe 4.16; At 11.27,30; 13.1
uma voz que dizia: “ Não chame impuro ao que
Deus purificou”. Nessa ocasião, chegaram a Jope Na perseguição iniciada com a morte de
mensageiros vindos de Cesaréia, que fica acerca de Estêvão, como já foi dito, a Igreja em Jerusalém
48 quilômetros ao norte, e pediam a Pedro que dispersou-se por toda parte. Alguns de seus
fosse instruir Cornélio, um oficial romano temente membros fugiram para damasco; outros foram para
a Deus. a Antioquia da Síria, distante cerca de 480km. Em
Pedro foi a Cesaréia sob a direção do Antioquia, os fugitivos frequentavam as sinagogas
Espírito, pregou o evangelho a Cornélio, e aos que judaicas e davam testemunho de Jesus como o
estavam em sua casa e os recebeu na Igreja Messias. Em todas as sinagogas havia um local
mediante o batismo. O Espírito de Deus, separado para os adoradores gentios; muitos deles
derramado como no dia de Pentecoste, testificou ouviram o evangelho em Antioquia e aceitaram a fé
sua aprovação divina. Dessa forma, foi divinamente em Cristo. Dessa forma, floresceu uma igreja em
sancionada a pregação do evangelho aos gentios e Antioquia, na qual judeus e gentios adoravam
sua aceitação na Igreja. juntamente e desfrutavam o mesmo privilégio.
Quando as notícias desses fatos chegaram a
A conversão de Saulo, At 9.1-22 Jerusalém, a igreja igreja ficou alarmada e enviou
um representante para examinar as relações dos
Nessa época, possivelmente um pouco judeus com os gentios.
antes de Pedro haver visitado Cesaréia, Saulo, o Felizmente, e para o bem de todos, a
perseguidor, foi surpreendido no caminho de escolha do representante recaiu sobre Barnabé,
Damasco por uma visão de Jesus ressuscitado. homem de idéias liberais, coração aberto e

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 112


Curso básico de teologia

generoso. Barnabé foi a Antioquia, observou as Os dois missionários levaram como auxiliar
condições e, em lugar de condenar a igreja local um homem mais jovem chamado João Marcos, o
por sua liberalidade, alegrou-se com essa qual os abandonou em meio à viagem. Eles
circunstância, endossou a atitude dos crentes dali e acolheram como principal campo de trabalho as
permaneceu em Antioquia, a fim de participar grandes cidades, visitando Salamina e Pafos, na ilha
daquele movimento. Anteriormente, Barnabé de Chipre; Antioquia e Icônio, na Pisídia; Listra e
viajou para Tarso, acerca de 160 km de distância, Derbe, na Licaônia.
trouxe Paulo com ele para Antioquia e o fez seu Sempre que lhes era posível, iniciavam o
companheiro na obra da evangelização. A igreja em trabalho de evangelização pregando nas sinagogas,
Antioquia, com esses esforços, elevou-se a tal pois nelas todos os judeus tinham o direito de falar;
proeminência que ali, pela primeira vez os tratando-se de um metre reputado como era Paulo,
seguidores de Cristo foram chamados “cristãos”, que havia cursado a famosa escola de Gamaliel, era
nome dado não pelos judeus mas pelos gregos, e sempre bem recebido.
somente três vezes mencionado no Novo Além disso, por meio das sinagogas, não só
Testamento. Os discípulos de Antioquia enviaram anunciavam o evangelho aos judeus, mas também
auxílio aos crentes pobres da Judéia, no tempo da aos gentios tementes ao Deus de Israel.
fome, e seus líderes foram figuras de destaque na Em Derbe, a última cidade visitada,
igreja primitiva. estavam bem próximo de Antioquia, onde haviam
iniciado a viagem. Em lugar de passarem pelas
A primeira viagem missionária, At 13 e 14 portas da Cilícia e regressarem a Antioquia,
tomaram a direção oeste e voltaram pelo caminho
Até então, os membros gentios da igreja que haviam percorrido, visitando novamente as
eram somente aqueles que espontaneamente a igrejas que organizaram em sua primeira viagem e
procuravam. Daí em diante, sob a direção do nomeando anciãos, de acordo com o costume
Espírito Santo e de acordo com os anciãos, os dois usado nas sinagogas. Em todas as viagens que o
líderes de maior destaque na igreja de Antioquia apóstolo Paulo fez mais tarte, o mesmo método de
foram enviados em missão evangelizadora a outras trabalho foi posto em prática.
terras, pregando tanto para judeus como para
gentios. Na história da primeira viagem O Concílio de Jerusalém, c. 48,(At 15)
missionária, nota-se certas características que se
tornaram típicas em todas as viagens posteriores de Em todas as sociedades ou comunidades
Paulo. Essa viagem foi realizada por dois organizadas, há sempre duas classes de pessoas: os
missionários. Inicialmente menciona-se “Barnabé e conservadores, olhando para o passado, e os
Saulo”, depois “Paulo e Barnabé”, e finalmente progressistas, olhando para o futuro. Assim
Paulo e seus companheiros, apontando Paulo como aconteceu naqueles dias. Os elementos ultrajudeus
líder espiritual. Em relação à mudança do nome de da igreja sustentavam que não podia haver salvação
Saulo, pode-se explicar da seguinte forma: era fora de Israel. Por essa, diziam, todos os discípulos
comum naqueles dias um judeu usar dois nomes; gentios deveriam ser circuncidados e observar a lei
um entre os israelitas e outros entre os gentios. judaica.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 113


Curso básico de teologia

Entretanto, os mestres progressistas,


encabeçados por Paulo e Barnabé, declaravam que Autoridades
o evangelho era para os judeus e para os gentios,
sobre a mesma base da fé em Cristo, sem levar em Para se tomar conhecimento do que
conta as leis judaicas. Surgiu, então, entre esses ocorreu durante os vinte anos seguintes aos
dois grupos uma controvérsia que ameaçou dividir Concílio de Jerusalém, depende-se do livro de Atos,
a Igreja. Finalmente, realizou-se um concílio em das epístolas paulinas e, talvez, do primeiro
Jerusalém para resolver o problema das condições versículo da primeira epístola de Pedro, que
dos membros gentios e estabelecer regras para a possivelmente se refere a países talvez visitados por
Igreja no futuro. ele. A essas fontes de informações, podem-se
Convém registrar que nesse concílio acrescentar algumas tradições do período imediato
estiveram representados não somente os apóstolos, à era apostólica, que parecem ser autênticas.
mas também os anciãos e toda a Igreja. Paulo e
Barnabé, Pedro e Tiago irmão do Senhor, Campo e membros
participaram dos debates. Chegou-se então, a esta
conclusão: a lei alcançava somente os judeus, e não O campo de atividades da Igreja alcançava
os gentios crente em Cristo. Com essa resolução, todo o império Romano, que incluía todas as
completou-se o período de transição de uma Igreja províncias nas margens do mar Mediterrâneo e
cristã judaica para um Igreja de todas as raças e alguns países além de suas fronteiras,
nações. O evangelho podia, agora, avançar em sua especialmente a leste. Nessa época, o número de
constante expansão. membros de origem gentia continuava a crescer
dentro da comunidade, enquanto o de judeus
diminuía. À medida que o evangelho ganhava
C ) A Igreja entre os gentios adeptos no mundo pagão, os judeus afastavam-se
dele, e crescia cada vez mais o seu ódio contra o

Do concílio de Jerusalém, c. 48 cristianismo. Em quase todos os lugares onde se


ao martírio de Paulo, 68 manifestaram perseguições contra os cristãos,
nesse período elas eram instigadas pelos judeus.
Por decisão do concílio realizado em
Jerusalém, a Igreja ficou com liberdade para iniciar Líderes: Paulo, Pedro e Tiago, Gl 2.9; Mc 6.3, Gl
uma obra de maior vulto, destinada a levar todas as 1.19, At 15.13-21
pessoas, de todas as raças e de todas as nações ao
reino de Jesus Cristo. Supunha-se que os judeus, Durante aqueles anos, três líderes
membros da igreja, continuassem observando a lei destacaram-se na Igreja. O mais conhecido foi
judaica, muito embora as regras fossem Paulo, o viajante incansável, o evangelista
interpretadas de forma ampla por alguns líderes, indômito, o implantador de igrejas e o eminente
com Paulo. Contudo, os gentios podiam pertencer teólogo. Depois de Paulo, aparece Pedro, cujo
à grei cristã mediante a fé em Cristo e uma vida nome apenas consta dos registros, embora tenha
justa, sem se submeterem às exigências da lei. sido reconhecido por Paulo como uma das

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 114


Curso básico de teologia

“colunas”. A tradição diz que Pedro esteve algum vai do ano 60 ao 100 AD, chamamos de "Era
tempo em Roma., dirigiu a igreja nessa cidade e, Sombria", em razão de as trevas da perseguição
por fim, morreu como marte no ano 67. O terceiro estarem sobre a igreja, e a falha de muitas
dos grandes nomes dessa época foi Tiago, irmão informações sobre este período.
mais moço do Senhor e líder da igreja de Jerusalém.
Tiago era fiel conservador os costumes judaicos. Perseguição sob Nero
Era reconhecido como líder dos judeus cristãos;
todavia, não se opunha a que o evangelho fosse Nero chegou ao poder em 54, todos os que
pregado aos gentios. A epístola de Tiago foi escrita se opunham à sua vontade, ou morriam ou
por ele. Tiago foi morto no templo, por volta do recebiam ordens de se suicidar.
ano 62. Assim, todos os três líderes do período, Assim estavam as coisas quando em 64 AD
dentre muitos outros menos proeminentes, aconteceu o incêndio em Roma. Diz-se que foi
perderam a vida como mártires da fé que Nero, quem ateou fogo à cidade, Contudo essa
abraçaram. acusação ainda é discutível. Entretanto a opinião
pública responsabilizou Nero por esse crime. Afim
Viagens missionárias de Paulo de escapar dessa responsabilidade, Nero apontou
os cristãos como culpados do incêndio de Roma, e
* Segunda viagem – visita à Europa
moveu contra eles tremenda perseguição. O fogo
At 15.36 a 18.22
* Terceira viagem – A igreja em Éfeso durou seis dias e sete noites e depois voltou a se
At 18.23 a 21.17; 16.1-3; Fp 2.19-22; acender em diversos lugares por mais três dias.
At 19.22; 20.4; 10.10; Ap 1.4,11; At 20.1,2; - Milhares de cristãos foram torturados e mortos.
20.6-12 e 20.17-36.
- Muitos serviram de iluminação para a cidade,
* Quarta viagem – Paulo é preso
amarrados em postes e ateado fogo.
At 27 e 28; 25.9.12; 27.2; 27.3,5,8;
28.7-11; 28.16; 28.17-28; 28.30,31 - Muito foram vestidos com peles de animais e
Fp 1.12-14; Fm 22; 2 Tm 4.20; jogados para os cães.
Tt 1.5 e 3.12. - Nesta época morreram :
- Pedro - Crucificado em 67
O registro desse período, conforme os 13 - Paulo - Decapitado em 68
últimos capítulos Atos, refere-se somente às - Tiago - Apedrejado depois de ser jogado do alto
atividades do Apóstolo Paulo. Entretanto, nesse do templo
período outros missionários dever tem estado em Além de matá-los fê-los servir de diversão para o
atividade, pois logo após o fim dessa época são público.
mencionados nomes de igrejas que Paulo jamais
visitou. A Perseguição sob Domiciano

Primeira perseguição imperial (Nero), 65-68 No ano 81 Domiciano sucedeu ao


d.C. imperador Tito que invadira destruíra Jerusalém no
ano 70. Com a destruição de Jerusalém Domiciano
A última geração do primeiro século, a que ordenou que todos os judeus deviam enviar à Roma

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 115


Curso básico de teologia

as ofertas anuais, que eram enviadas a Jerusalém, durante duzentos anos suprimir uma instituição
estes, por sua vez não obedeceram, o que tão reta, tão obediente à lei e tão necessária, como
desencadeou a segunda perseguição, não somente era o cristianismo. Podem-se apresentar várias
aos judeus mas também aos cristãos. causas para justificar o ódio dos imperadores ao
Durante esses dias milhares de cristão cristianismo.
foram mortos, especialmente em Roma e em toda a
Itália. Nesta época o apóstolo João, que vivia em
Éfeso, foi preso e exilado na ilha de Patmos, foi Os Motivos das perseguições
quando recebeu a revelação do Apocalipse.

III - AS PERSEGUIÇÕES IMPERIAIS 1. O Caráter inclusivo do paganismo e o caráter


exclusivo do cristianismo

O paganismo, em suas práticas, aceitava novas


(100 - 313 d.C)
formas e objetos de adoração que iam surgindo,
Este período vai da morte do Apóstolo João enquanto o cristianismo rejeitava qualquer forma
até o Edito de Constantino
ou objetos de adoração. Onde os deuses já se
O fato de maior destaque na História da contavam aos centos, talvez aos milhares, mais um
Igreja neste período foi, sem dúvida, as ou menos um não representava diferença.
perseguições realizadas pelos Imperadores
Romanos. Apesar de a perseguição não ter sido Quando os habitantes de uma cidade
contínua, repetia-se por vezes, durante anos desejavam desenvolver o comércio ou a imigração,
seguidos. Mesmo quando havia paz, a perseguição construíam templos aos deuses que adoravam em
podia começar a qualquer momento, e cada vez outros países ou cidades, a fim de que os habitantes
mais violenta. A perseguição ni século IV durou até desses países ou cidades fossem adorá-los. É por
o ano 313, quando o Edito de Constantino, o sessa razão que nas ruínas da cidade de Pompéia,
primeiro Imperador cristão, fez cessar todos os Itália, encontra-se um templo a Ísis, uma deusa
propósitos de destruir a Igreja. Surpreendente é o egípcia. Esse templo foi edificado para fomentar o
fato de se constatar que, durante esse período, comércio de Pompéia com o Egito, fazendo os
alguns dos melhores imperadores foram mais comerciantes egípcios se sentirem como em seu
ativos na perseguição ao cristianismo, ao passo que próprio país. Por outro lado, o cristianismo
os considerados piores imperadores eram brandos opunha-se a qualquer forma de adoração, pois
na oposição ou então, não perseguiam o somente admitia adoração ao verdadeiro Deus.
cristianismo.

Um imperador desejou pôr em Roma uma


Antes de apresentar a história, estátua de Cristo no Panteão, um edifício que existe
investiguemos alguns dos motivos que forçaram em Roma até hoje, e no qual eram postos todos os
um, governo, de um modo geral, justo e que deuses importantes. Os cristãos, porém, recusaram
procurava o bem-estar de seus cidadãos, a tentar a oferta com desprezo. Não desejavam que o seu

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 116


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Cristo fosse meramente conhecido como um deus costumes idólatras e não comerem alimentos
qualquer entre outros deuses. usados nas festas dos ídolos. Essa suposta relação
preservou os cristãos por algum tempo da
2. A adoração aos ídolos entrelaçada com a vida perseguição. Entretanto, após a destruição de
Jerusalém, no ano 70, o cristianismo ficou isolado,
Adoração aos ídolos estava entrelaçada com sem nenhuma lei que protegesse seguidores do
todos os aspectos da vida. As imagens eram ódio dos inimigos.
encontradas em todos os lares para serem
adoradas. Em todas as festividades, eram oferecidas 5. As reuniões secretas dos cristãos
libações aos deuses. As imagens eram adoradas em
todas as cerimônias cívicas ou províncias. Os As reuniões secretas dos
cristãos, é claro, não participavam dessas formas de cristãos despertaram suspeitas.
adoração. Por essa razão, o povo não dado a pensar Eles se reuniam antes do nascer
considerava-os insociáveis, taciturnos, ateus e do sol, ou então à noite, quase
aborrecedores de seus companheiros. Com sempre em cavernas ou nas
reputação tão desfavorável por parte do povo em catacumbas subterrâneas. A esse respeito,
geral, apenas um passo os separava da perseguição. circulavam falsos rumores de que entre eles
praticavam-se atos imorais e criminosos. Além
3. A adoração ao imperador (2 Ts 2.3,4; At 17.7) disso, o governo autocrático do império suspeitava
de todos os cultos e sociedades secretas, temendo
A adoração ao imperador era considerada propósito s desleais. A celebração da ceia do
prova de lealdade. Nos lugares mais visíveis de cada Senhor, da qual eram excluídos os estranhos, era,
cidade, havia uma estátua do imperador reinante. repetidas vezes, causa de acusações e de
A essa imagem, era oferecida incenso, como se perseguições.
oferecia aos deuses. Parece que numa das primeiras
epístolas de Paulo há uma referência cautelosa 6. A igualdade na Igreja cristã
contra essa forma de idolatria. Os cristãos
recusavam-se a prestar tal adoração, mesmo um O cristianismo considerava todos os homens
simples oferecimento de incenso sobre o altar. Pelo iguais. Não havia nenhuma distinção entre seus
fato de cantarem hinos e louvores e adorarem a membros, nem em suas reuniões. Um escravo
“outro Rei, um tal Jesus”, eram considerados, pelo podia ser eleito bispo na Igreja. Tudo isso eram
povo, desleais e conspiradores de uma revolução. coisas inaceitáveis para a mentalidade dos nobres,
para os filósofos e para as classes governamentais.
4. O reconhecimento do judaísmo Os cristãos eram considerados “niveladores da
sociedade”, portanto anarquistas, perturbadores da
A primeira geração dos cristãos era tida como ordem social. Por isso, eram tidos na conta de
relacionada com os judeus, e o judaísmo era inimigos do Estado.
reconhecido pelo governo como religião permitida,
apesar de os judeus viverem separados dos 7. Os interesses econômicos

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devorados pelas feras na arena. Os Imperadores


Não raro, os interesses econômicos também acima mencionados, foram considerados como os "
provocavam e excitavam o espírito de perseguição. bons imperadores ", nenhum cristão podia podia ser
Da mesma forma que o apóstolo Paulo, em Éfeso, preso sem culpa definida e comprovada. Contudo,
esteve em perigo de morte em razão de um motim quando se comprovava acusações e os cristãos se
incitado por Demétrio, o ourives, muitas vezes os recusavam a retratar-se, os governantes eram
governantes eram influenciados a perseguir os obrigados, a por em vigor a lei e ordenar a
cristãos por pessoas cujos interesses financeiros execução.
eram prejudicados pelo avanço da Igreja:
sacerdotes e demais servidores dos templos pagãos, Imperador Severo 193 a 211 AD - Mandava
os que negociavam com imagens, os escultores, os decapitar e lançar às feras. Iniciou uma terrível
arquitetos que construíam templos e todos os que perseguição que durou até à sua morte em 211 AD.
ganhavam a vida por meio da adoração pagã. Não Possuía uma natureza mórbida e melancólica; era
era coisa rara ouvir-se o populacho gritar “os muito rigoroso na execução da disciplina. Tão cruel
cristãos às feras, aos leões!”, quando seus negócios fora o espírito do imperador, que foi considerado
e sua arte estavam em perigo ou quando por muitos como o anticristo.
funcionários públicos ambiciosos desejavam
apoderar-se das propriedades de cristãos ricos. Imperador Décio 249 a 251 AD - Décio observava
com inveja o poder crescente dos cristãos, e
determinou reprimi-lo. Via as igrejas cheias
enquanto os templos pagãos desertos. Por
Os Perseguidores conseqüência, mandou que os cristãos tinham que
se apresentar ao Imperador para comunicar e
religião. Quem renunciava recebia um certificado,
Imperador Trajano 98 a 117 AD - Estabeleceu a que não renunciava era considerado criminoso e
Lei, que sendo cristão acusado de qualquer coisa e conduzidos às prisões e sujeitos às mais horrorosas
não negar fé, será castigado, não tendo acusação torturas.
estão livres. Mandava crucificar e lançar às feras.
Imperador Diocleciano 305 a 310 - A última, a
Imperador Adriano 117 a 138 AD - Morreu em mais sistemática e a mais terrível de todas as
agonia, gritando, " Quão desgraçado é procurar a perseguições deu-se neste governo. Em uma série
morte e não encontrar ". de editos determinou-se que :
a) Todos os exemplares da Bíblia fossem
Imperador Marco Aurélio 161 a 180 AD - Mandava queimados.
decapitar e lançar às feras. Apesar de possuir boas b) Todos os templos construídos em todo
qualidades como homem e governante justo, o império durante meio século, fossem
contudo foi acérrimo perseguidor dos cristãos. destruídos.
Opunha-se, pois, aos cristãos por considerá-los c) Todos os pertencentes as ordens
inovadores. Milhares foram decapitados e clericais fossem presos.

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d) Ninguém seria solto sem negar o As perseguições produziram uma igreja


Cristianismo. pura pois conservava afastados todos aqueles que
e) Pena de morte para quem não adorasse não eram sinceros em sua confissão de fé. Ninguém
aos deuses. Prendiam os cristãos se unia à igreja para obter lucros ou popularidade.
dentro dos templos e depois ateava Somente aqueles que estavam dispostos a ser fiéis
fogo. Consta que o imperador erigiu até a morte, se tornavam publicamente seguidores
um monumento com esta inscrição de Cristo.
"Em honra ao extermínio da
superstição cristã ". A Igreja multiplicava-se. Apesar das
perseguições ou talvez por causa delas, a igreja
Os Principais Mártires crescia com rapidez assombrosa. Ao findar-se o
período de perseguição, a igreja era
Inácio - Provável discípulo de João, bispo em suficientemente numerosa para constituir a
Antioquia, foi condenado no ano 107 AD por não instituição mais poderosa do império.
adorar a outros deuses. Foi morto como mártir,
lançado para as feras no anfiteatro romano, no ano Apesar de considerarmos as perseguições o
108 ou 110 enquanto o povo festejava. Ele estava fato mais importante da História da Igreja, no
disposto a ser martirizado, pois durante a viagem segundo e terceiro séculos, contudo, fatos
para Roma escreveu cartas às igrejas manifestando interessantes aconteceram neste período que
o desejo de não perder a honra de morrer por seu devem ser observados. Vejamos :
Senhor
Formação do Cânon do Novo Testamento
Policarpo - Bispo em Esmirna, na Ásia Menor,
morreu no ano 155. Ao ser levado perante o Os escritos do Novo Testamento foram
governador, e instado para abandonar a fé e negar concluídos pouco depois do início do século II.
o nome de Jesus, assim respondeu: " Oitenta e seis Entretanto, a formação do Novo Testamento com
anos o servi, e somente bens recebi durante todo o os livros que o compõem, como cânon ou regra de
tempo, Como poderia eu agora negar ao meu fé com autoridade divina, não foi imediata. Nem
Salvador ? Policarpo foi queimado vivo. todos os livros eram aceitos em todas igrejas como
escritos inspirados. Alguns deles, especialmente
Justino Mártir - Era um dos homens mais Hebreus, Tiago, a segunda epístola de Pedro e o
competente de sue tempo, e um dos principais Apocalipse, eram aceitos no Oriente, embora
defensores da fé. Seus livros, que ainda existem, tenham sido recusados durante muito tempo no
oferecem valiosas informações acerca da vida da Ocidente. Por outro lado, alguns livros que hoje
igreja nos meados do segundo século. Seu martírio não são aceitos como canônicos eram lidos no
deu-se em Roma, no ano 166. Oriente. Entre esses livros, estão os seguintes:
Epístola de Barnabé, Pastor de Hermas, Didaqué [ou
Os Efeitos Produzidos pelas Perseguições Ensino dos Doze Apóstolos] e o Apocalipse.

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Gradual e lentamente, os livros dos Novo ministros (se é que existiam, o que duvidoso) como
Testamento, da forma como hoje usamos, de todos os leigos. Entretanto, durante o período
conquistaram a proeminência de Escrituras da perseguição, seguramente depois do ano 150, os
inspiradas, ao passo que os outros livros foram concílios eram celebrados e as leis ditadas apenas
gradualmente postos de lado e rejeitados pelas pelos bispos.
igrejas. Os concílios que realizavam de quando em
quando não escolheram os livros para formar o A forma episcopal de governo dominava no
cânon. Apenas ratificaram a escolha já feita pelas âmbito universal. A história de então não explica as
igrejas. Não é possível determinar a data exata do causas que conduziram a essa mudança de
reconhecimento completo do Novo Testamento, tal organização; contudo não e difícil de descobri-las.
com usamos atualmente, mas sabe-se que não
aconteceu antes do ano 300. Qualquer pessoa que Causas da mudança
leia um Novo Testamento apócrifo e o compare
com o conteúdo do Novo Testamento canônico 1. Perda de autoridade apostólica
notará imediatamente a razão por que tais livros
foram recusados e não reconhecidos como A perda de autoridade apostólica
canônicos. contribuiu para que fossem realizadas eleições de
Desenvolvimento da organização eclesiástica novos líderes. Os primeiros líderes da Igreja, Pedro,
Paulo, Tiago, o irmão do Senhor, e João, o último
Em quanto viveram os primeiros apóstolos, dos apóstolos, haviam morrido sem deixar homens
a reverência geral a eles, como companheiros iguais a eles, com a mesma capacidade que
escolhidos por Cristo, primeiros líderes espirituais possuíam. Depois da morte dos apóstolos Pedro e
da Igreja e homens dotados de inspiração divina, Paulo, num período de cerca de cinquenta anos, a
dava-lhes o lugar indiscutível de dirigentes da história da Igreja tem suas páginas em branco. As
Igreja, até onde era necessário governá-la. realizações de homens como Timóteo, Tito e Apolo
são desconhecidas. Entretanto, na geração
Quando Lucas escreveu o livro de Atos, e seguinte, surgem novos nomes como bispos com
Paulo, as epístolas aos Filipenses e a Timóteo, os autoridade sobre várias dioceses.
títulos “bispo” e “ancião” (presbítero) eram dados
livremente àqueles que serviam às igrejas. 2. Crescimento da Igreja
Entretanto, sessenta anos depois, isto é, por volta
do ano 125, nota-se que os bispos governavam as O crescimento e a amplitude da Igreja foi a
igrejas em toda parte, e cada um mandava em sua causa da organização e da disciplina. Enquanto as
própria diocese, tendo presbíteros e diáconos sob igrejas estavam dentro dos limites que tornavam
suas ordens. possível receber a visita dos apóstolos, poucas
autoridades eram necessárias. Contudo, quando a
O concílio de Jerusalém, por volta do ano Igreja se expandiu para além dos limites do Império
50, era composto de “apóstolos e anciãos”, que Romano, chegando até as fronteiras da Índia,
expressavam a voz de toda a Igreja, tanto dos abarcando muitas nações e raças, então se julgou

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 120


Curso básico de teologia

necessária a autoridade de um dirigente para suas quais as comunidades cristãs se submetiam, por
diferentes visões. estarem acostumadas à mesma forma de governo
do estado. Convém notar que, durante todo o
3. Perseguições período que foi considerado até agora, nenhum
bispo reclamou para si a autoridade de bispo
A perseguição – um perigo comum – universal – autoridade sobre outros bispos - como
aproximou as igrejas uma das outras e exerceu mais tarde o fez o bispo de Roma.
influência para que ela se unissem e se
organizassem. Quando os poderes do Estado se
levantavam contra a Igreja, sentia-se, então, a O desenvolvimento da doutrina
necessidade de uma liderança eficiente. Apareciam,
pois, os líderes para a ocasião. Essa situação durou Outra característica que distingue esse
sete gerações e fez a forma de governo se período é sem dúvida, o desenvolvimento da
estabelecer em caráter definitivo. doutrina. Na era apostólica a fé era do coração,
uma entrega pessoal a vontade de Cristo.
4. Seitas e heresias Entretanto no período que agora focalizamos, a fé
gradativamente passara a ser mental, era uma fé do
A aparição de seitas e heresias na Igreja intelecto, fé que acreditava em um sistema rigoroso
impôs, também, necessidade de se estabelecerem e inflexível de doutrinas. O credo Apostólico, a
alguns artigos de fé e, com eles, algumas mais antiga e mais simples declaração da crença
autoridades para executá-los. Note-se como as cristã, foi escrito durante esse período.
controvérsias sobre elas suscitaram o imperativo
disciplinar para se impor aos hereges e manter a Nesta época surgiram três escolas
unidade da fé. teológicas. Uma em Alexandria, outra na Ásia
Menor e outra na África. Essas escolas foram
5. Analogia com o império estabelecidas para instruir aqueles que descendiam
de famílias pagãs e que haviam aceitado a fé cristã.
Ao inquirir-se por que foi adotada essa Entretanto, não tardou que tais escolas se
forma de governo, isto é, um governo hierárquico, transformassem em centros de investigação das
em lugar de um governo exercido por um doutrinas da Igreja. Grandes mestres ensinavam
ministério em condições de igualdade, descobre-se nestas escolas.
que, por analogia, o sistema de governo imperial
serviu de modelo usado no desenvolvimento da 1. Escola de Alexandria – Panteno, Clemente e
Igreja. O cristianismo não teve início numa Orígenes
república em que os cidadãos escolhiam os
governantes, mas surgiu num império governado A Escola de Alexandria foi fundada no ano
com autoritarismo. Por essa razão, quando se fez 180 por Panteno, que fora filósofo na escola dos
necessário algum governo para a Igreja surgiu a estóicos; como cristão, porém era fervoroso em
forma autocrática, isto é, o governo de bispos, aos espírito e eloquente no ensino oral. Apenas alguns

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 121


Curso básico de teologia

fragmentos de seus ensinos sobrevivem. Panteno trabalharam e por eles foram inspirados, serviram
foi sucedido por Clemente de Alexandria (que de inestimável fonte de informações originais
viveu em, aproximadamente, 150-215), e vários de acerca da Igreja, sua vida, suas doutrinas e suas
seus livros (a maioria defendendo o cristianismo relações com o mundo pagão que a cercava,
contra o paganismo) ainda existem. Entretanto, o durante os séculos de perseguição.
maior vulto da escola de Alexandria, o expositor
mais competente desse período, foi Orígenes (185- O aparecimento de Seitas e Heresias
254), que ensinou e escreveu sobre muitos temas,
demonstrando possuir profundo saber e poder Juntamente com o desenvolvimento da
intelectual. doutrina teológica, desenvolviam-se também as
seitas, ou como lhes chamavam, as heresias na
2. Escola da Ásia Menor – Irineu igreja cristã. Enquanto a Igreja era judaica em
virtude de seus membros, a até mesmo depois,
A escola da Ásia Menor não estava quando era orientada por homens do tipo judeu
localizada em determinado centro, mas consistia como Pedro e até mesmo Paulo, havia apenas uma
num grupo de mestres e escritores de teologia. Seu leve tendência para o pensamento abstrato e
mais expressivo representante foi Irineu, que especulativo. Entretanto, quando a Igreja em sua
“combinou o zelo de evangelista com habilidade maioria se compunha de gregos, especialmente de
de escritor consumado”. Nos últimos anos de sua gregos místicos e instáveis da Ásia Menor,
vida, mudou-se para a França, onde chegou a ser apareceram opiniões e teorias estranhas, de toda
bispo e, por volta do 200, morreu como mártir. sorte, as quais se desenvolveram rapidamente ali.

3. Escola do norte da África – Tertuliano e Os cristãos dos séculos II e III lutaram não
Cipriano só contra as perseguições do mundo pagão, mas
também contra as heresias e doutrinas
A escola do norte a África estava corrompidas dentro do próprio rebanho. Em
estabelecida na cidade de Cartago. Mediante um seguida, vamos considerar apenas algumas das
elevado número de escritores e teólogos mais importantes seitas desse período.
competentes, fez mais do que as outras em favor do
cristianismo, no sentido de dar forma ao 1. Os Gnósticos (do grego gnósis, “sabedoria”).
pensamento teológico da Europa. Os dois nomes Acreditavam que Deus Supremo é espírito absoluto
de maior expressão que passaram por essa escola e causa de todo bem, enquanto a matéria é
foram os do brilhante e fervoroso Tertuliano (160- completamente má criada por um ser inferior que é
220) e o do mais conservador porém hábil e Jeová. O propósito é então escapar deste corpo que
competente bispo Cipriano, o qual morreu como aprisiona o espírito. Afim de chegar a libertação, é
mártir na perseguição de Décio, no ano 258. necessário que venha um mensageiro do reino
espiritual: Cristo. Cristo portanto, não era matéria
Os escritos desses eruditos cristãos, e bem (corpo físico), possuía somente a natureza divina.
assim os de muitos outros que com eles

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 122


Curso básico de teologia

2. Os Ebionitas (do hebraico que significa "pobre") principais entre os pais da Igreja, aceitou as idéias
eram judeus-cristãos que insistiam na observância dos montanistas e escreveu em favor deles.
da lei e dos costumes judaicos. Rejeitavam as cartas
escritas por Paulo, porque nessas epístolas Paulo Acerca dessas seitas, consideradas heresias,
reconhecia os gentios convertidos como cristãos. a dificuldade em compreendê-las ou julgá-las está
Os ebionitas eram considerados como apostatas no fato de que (com exceção dos montanistas, e até
pelo judeus não cristãos, mas também não mesmo estes, até certo ponto) seus escritos
contavam com a simpatia dos cristãos gentios, os desapareceram. Para formar nossa opinião acerca
quais, depois do ano 70, constituíam a maioria na deles, dependemos exclusivamente daqueles que
Igreja. Os ebionitas foram reduzindo-se, contra eles escreveram, e eles foram,
gradualmente, no século II. provavelmente, prejudicados com isso.

3. Os Maniqueus, de origem persa, foram Suponhamos, por exemplo, que a


chamados por esse nome, em razão de seu denominação metodista desaparecesse, com todos
fundador ter o nome de Mani, o qual foi morto no os seus escritos, e que mil anos mais tarde
ano de 276, por ordem do governo persa. O ensino estudiosos procurassem conhecer seus ensinos
dos maniqueus dava ênfase a este fato: “O universo pesquisando os livros e panfletos combatendo John
compõe-se do reino das trevas e da luz, e ambos Wesley, publicados durante o século XVIII. Como
lutam pelo domínio do homem”. Rejeitavam a seriam erradas suas conclusões! Que versão
Jesus, porém criam em um "Cristo celestial". Eram distorcida do metodismo apresentariam!
rigorosos quanto à obediência ao ascetismo e
renunciavam ao casamento. Os maniqueus foram Situação da Igreja
perseguidos tanto por imperadores pagãos como
também pelos cristãos. Agostinho, o maior teólogo Vejamos a situação da Igreja durante os
da Igreja, era adepto do maniqueísmo antes de se séculos de perseguição, especialmente no seu
converter a Cristo. término, no ano 313.

4. Montanistas. Eram assim chamados por causa 1. Uma Igreja purificada


de Montano, seu fundador, quase não podem ser
incluídos entre as seitas heréticas, apesar de seus Um dos efeitos produzidos pelas provações
ensinos terem sido condenados pela Igreja. Os por que passaram os cristãos desse período foi uma
montanistas eram puritanos e exigiam que tudo Igreja purificada. As perseguições conservavam
voltasse à simplicidade dos primeiros cristãos. Eles afastados todos aqueles que não eram sinceros em
criam no sacerdócio de todos os verdadeiros sua confissão de fé. Ninguém se unia a uma
crentes, e não nos cargos do ministério. comunidade cristã para obter lucros ou
Observavam rígida disciplina na Igreja. popularidade. Os fracos e os de coração dobre
Consideravam os dons de profecia um privilégio abandonavam a Igreja. Somente os que estavam
dos discípulos e possuíam muitos profetas e disposta a ser fiéis até a morte tornavam-se
profetisas em seus quadros. Tertuliano, um dos publicamente seguidores de Cristo. A perseguição

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 123


Curso básico de teologia

cirandou a Igreja, separando o joio do trigo. findar o período de perseguição, a Igreja era
suficientemente numerosa para constituir a
2. O ensino unificado da Igreja instituição mais poderosa do império.

De modo geral, nessa época, o ensino da Gibbon, historiador dessa época, calculou
Igreja estava unificado. Tratava-se de uma que os cristãos, ao término da perseguição, eram
comunidade de muitos milhões de pessoas, pelo menos a décima parte da população. Muitos
espalhadas em muitos países, incluindo muitas escritores aceitaram as declarações de Gibbon.
raças e falando vários idiomas. Apesar de tudo isso, Contudo, faz algum tempo o assunto foi
tinham a mesma fé. As várias seitas surgiram, cuidadosamente investigado, e a conclusão a que
floresceram e pouco a pouco despareceram. os estudiosos chegaram foi esta: o número de
membros da Igreja e seus aderentes chegou a vários
As controvérsias revelaram a verdade, e até milhões sob o domínio de Roma. Uma das provas
mesmos alguns movimentos heréticos deixaram mais evidentes desse fato foi as catacumbas de
atrás de si algumas verdades que enriqueceram o Roma, túneis subterrâneos de vasta extensão, que
“depósito” da Igreja. Apesar da existência de seis e durante dois séculos foram os lugares de refúgio,
cismas, o cristianismo do Império Romano e dos reunião e sepultamento dos cristãos.
países vizinhos estava unido na doutrina, na
comunhão e no Espírito. As sepulturas dos cristãos nas catacumbas,
conforme demonstram as inscrições e símbolos
3. A organização da Igreja sobre elas, de acordo com cálculos de alguns,
sobem a milhões. Acrescentem-se a esses milhões
Era uma Igreja inteiramente organizada. Já muitos outros que não foram sepultados nas
descrevemos o sistema de organização na era catacumbas, e teremos, então uma idéia de quão
apostólica. No século III, a Igreja á estava dividida eleado era o número de cristãos em todo o império
em dioceses, controlando com mãos firmes as Romano.
rédeas de seu governo. A igreja era um exército
disciplinado, unido, sob uma liderança IV - A IGREJA IMPERIAL
competente. Dentro do império romano,
exteriormente organizado, mas interiormente em
decadência, havia outro “império” de vida Desde o Edito de Constantino, 313 AD
até à queda de Roma em 476 AD.
abundante e de poder sempre crescente, que era a
Igreja Cristã. A “vitória” do Cristianismo

4. O crescimento da Igreja No ano 305, quando Diocleciano abdicou o


trono imperial, a religião cristã era
A Igreja multiplicava-se. Apesar das terminantemente proibida, e aqueles que a
perseguições, ou talvez por causa delas, o professassem eram castigados com torturas e
cristianismo crescia com rapidez assombrosa. Ao

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 124


Curso básico de teologia

morte. Contra o cristianismo, estavam todos os conhece como "Labarum", e que consistia na
poderes do Estado. Entretanto, menos de oitenta superposição de duas letras gregas, X e P.
anos depois, em 380, o cristianismo foi reconhecido
como religião oficial do Império Romano, e um
imperador cristão exercia autoridade suprema, Em batalha travada sobre a ponte Mílvio,
cercado de uma corte constituída de cristãos Constantino venceu o exercito de Majêncio e este
professos. morreu afogado caindo nas águas do rio. Após este
vitoria Constantino fez aliança com Licínio e
Dessa forma, passaram os cristãos de um posteriormente com Maximino os outros dois
momento para o outro, das arenas romanas onde pretendentes a coroa.
tinham de enfrentar os leões, a ocupar lugares de Pouco tempo depois, em 313, Constantino
honra junto ao trono que governava o mundo! promulgou o famoso Edito de Tolerância, que
oficialmente pôs fim Às perseguições. Somente no
ano 323 foi que Constantino alcançou o posto
1. Constantino, o primeiro imperador cristão, supremo de imperador, e o Cristianismo foi então
312-337 favorecido.

Logo após a abdicação de Diocleciano, no O caráter de Constantino não era perfeito.


ano 305, quatro aspirantes à coroa estavam em Apesar de ser considerado justo, de um modo geral,
guerra. Os dois rivais mais poderosos eram ocasionalmente era cruel e tirano. Dizia-se que “a
Majêncio e Constantino, cujos exércitos se realidade do seu cristianismo era melhor do que a
enfrentaram na ponte Múvia sobre o Tibre, a 16 km sua qualidade”. Ele retardou o ato de seu batismo
de Rom, no ano 312. Majêncio representava a até a vésperas da morte, julgando que o ato do
perseguição aos cristãos, de natureza pagã. batismo lavava todos os pecados que cometera,
Constantino era favorável aos cristãos, apesar de idéia prevalecente entre os cristãos naquela época.
não se confessar como tal. Se Constantino não foi um grande cristão, sem
dúvida foi um grande político, pois teve a idéia de
unir-se ao movimento que dominaria o futuro de
Constantino seu império.
afirmou ter visto
no céu uma cruz
luminosa com os 2. Bons resultados para a Igreja
seguintes
dizeres: "In hoc
signo vinces” por
* Fim da perseguição
este sinal * Igrejas restauradas
vencerás. * Fim dos sacrifícios pagãos
* Doações às igrejas
Constantino ordenou que seus soldados
empregassem para a batalha o símbolo que se

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 125


Curso básico de teologia

a aparecer as imagens nas igrejas. Os primeiros


De repentina mudança das relações entre o
cristãos tinham horror a tudo que pudesse
Império Romano e a Igreja surgiram resultados de
conduzir à idolatria.
alcance mundial. Alguns úteis e outros danosos,
tanto para a Igreja como para o Estado. É fácil
Nessa época, a adoração pagã era tolerada,
verificar em que sentido a nova atitude do governo
embora houvessem cessado os sacrifícios oficiais. O
beneficiou a causa do cristianismo.
fato significativo de uma mudança tão rápida e
radical em costumes que estavam intimamente
Cessaram, as perseguições. Durante
ligados a todas as manifestações cívicas e sociais
duzentos anos antes, em nenhum momento os
prova que os costumes pagãos eram então mera
cristãos estiveram livres de perigos, acusações e
formalidade e não expressavam a crença das
mortes.
pessoas inteligentes.

Os templos das Igrejas foram restaurados e


Em muitos lugares os templos pagãos
novamente abertos em toda parte. No período
foram dedicados ao culto cristão. Esses fatos
apostólico, celebravam-se reuniões em casas
sucediam principalmente nas cidades, enquanto
particulares e em salões alugados. Mais tarde, nos
nos pequenos lugares a crença e adoração pagãs
períodos em que cessavam as perseguições,
perduraram durante gerações. A palavra “pagão”
construíam-se templos para as igrejas. Na última
originariamente significava “morador do campo”.
perseguição, durante o templo de Diocleciano,
Mais tarde, porém, passou a significar um idólatra,
alguns desses templos foram destruídos e
alguém que não praticava a verdadeira adoração.
confiscados pelas autoridades.

Em todo o império, os templos dos deuses


Todos os templos que ainda existiam
do paganismo eram mantidos pelo tesouro público,
quando constantino subiu ao poder foram
mas, com, a conversão de Constantino, passaram a
restaurados, e aqueles que tinham sido destruídos
ser concedido às Igrejas e ao clero cristão. Em
foram pagos pelas cidades em que estavam
pequena escala a princípio, mas logo depois de
localizados. A partir dessa época, os cristãos
maneira generalizada e de forma liberal, o dinheiro
desfrutaram de plena liberdade para edificar
público foi enriquecendo as igrejas, e os bispos, os
templos, que começaram a ser erguidos por toda
ministros e todos os funcionários do culto cristão
parte.
eram pagos pelo Estado. Era ima dádiva bem
Esses templos tinham a forma e tomavam o
recebida pela Igreja, porém de benefício duvidoso.
nome de “basílica”, ou seja, do salão da corte
romana, um retângulo dividido por filas de colunas,
Ao clero foram concedidos muitos
tendo na extremidade uma plataforma semicircular
privilégios, nem sempre facultados pela lei do
com assentos para os clérigos. O próprio
império, mas por costume, que pouco depois se
Constantino deu o exemplo mandando construir
transformava em lei. Os deveres cívicos
templos em Jerusalém, Belém e na nova capital,
obrigatórios para todos os cidadãos, não se exigiam
Constantinopla. Duas gerações depois, começaram
dos clérigos; estes estavam isentos de pagamento

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 126


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de impostos. Nas causas em que estivessem Constantino como distintivo de seu exército e foi
envolvidos, os clérigos eram julgados por cortes proibida como instrumento de morte.
eclesiásticas, e não civis. Os ministros da Igreja
logo formavam uma classe privilegiada, acima da O infanticídio foi reprimido. Na história de
lei do país. Tudo isso foi, também um bem Roma e suas províncias, era fato comum que
imediato que se transformou em prejuízo tanto qualquer criança que não fosse do agrado do pai
para o Estado, como com a Igreja. era asfixiada ou abandonada para que morresse.
Algumas pessoas dedicavam-se a recolher crianças
O primeiro dia da semana (domingo) foi abandonadas; criavam-nas e depois vendiam-nas
proclamado como dia de descanso e adoração, e a como escravos. A influência do cristianismo
observância em breve se generalizou em todo o imprimiu um sentido sagrado à vida humana, até
império No ano 321, Constantino proibiu o mesmo à das crianças, e fez o infanticídio ser
funcionamento das cortes e tribunais aos banido do império.
domingos, exceto nos casos de libertação de
escravos. Os soldados estavam isentos de exercícios Através de toda a história da república e do
militares aos domingos. Mas os jogos públicos Império Romano antes que o Cristianismo chegasse
continuaram a ser realizados nos domingos, o que a dominar, mais da metade da população era
o tornava mais um feriado que um dia santo. escrava, sem nenhuma proteção legal. Qualquer
senhor podia matar os escravos que possuía, se o
desejasse. Durante o domínio de um dos primeiros
3. Alguns bons resultado para o Estado imperadores, um rico cidadão romano foi
assassinado por um de seus escravos. Segundo a lei,
* Crucificação abolida
* Repressão do infanticídio como castigo, todos os 300 escravos daquele
* Influência no tratamento dos escravos cidadão foram mortos, sem levar em consideração
* Proibição dos duelos de gladiadores
o sexo, a idade, a culpa ou inocência. Entretanto, a
influência do cristianismo tornou mais humano o
Como se vê, do reconhecimento
tratamento dado aos escravos. Foram-lhes
do Cristianismo como religião preferida
outorgados direitos legais que antes não possuíam.
surgiram alguns bons resultados, tanto para o povo
Podiam, de acordo com a lei, acusar seu amo de
como para a igreja. O Espírito da nova religião foi
tratamento cruel, e a emancipação foi assim
incutido em muitas ordens decretadas por
sancionada e fomentada. Dessa forma, as condições
Constantino e seus sucessores imediatos.
dos escravos foram melhoradas, e a escravidão foi
gradativamente abolida.
A crucificação foi abolida. Note-se que a
crucificação era uma forma comum de castigo para
As lutas de gladiadores foram proibidas.
os criminosos, exceto para os cidadãos romanos, os
Essa lei posta em vigor na nova capital de
únicos que tinham direito a ser decapitados, se
Constantino, onde o hipódromo jamais foi
fossem condenados à morte. Contudo, a cruz,
contaminado por homens que se matavam uns aos
emblema sagrado para os cristãos, foi adotada por
outros para satisfazer o prazer mórbidos dos

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 127


Curso básico de teologia

espectadores. social e política. O nível moral do cristianismo no


poder era muito mais baixo do que aquele que
Contudo, os combates ainda continuaram distinguia os cristãos nos tempos de perseguição.
no anfiteatro romano até o ano 404, quando o Os cultos de adoração aumentaram em
monge Telêmaco invadiu a arena e tentou apartar esplendor, é certo, porém eram menos espirituais e
os gladiadores. O monge foi assassinado; menos sinceros do que no passado. Os costumes e
entretanto, desde então, cessou a matança de as cerimônias do paganismo foram pouco a pouco
homens como espetáculo público. infiltrando-se nos cultos de adoração. Algumas das
antigas festas pagãs foram aceitas na Igreja, porém
com outros nomes. Por volta do ano 405, as
4. Alguns maus resultados da vitória cristã
imagens dos santos e mártires começaram a
aparecer nos templos, como objetos de reverência,
adoração e culto. A adoração a Vênus e Diana foi
* Todos na Igreja
* Costumes pagãos introduzidos substituída pela adoração a Virgem Maria. As
na Igreja imagens dos mártires começaram a aparecer nos
templos, como objeto de reverência. A ceia do
Apesar de os triunfos do Cristianismo Senhor tornou-se um “sacrifício” em lugar de um
haverem proporcionado boas coisas ao povo, ato memorial da morte do Senhor. O “ancião”
contudo a sua aliança com o Estado, evoluiu de pregador a sacerdote.
inevitavelmente devia trazer, como de fato trouxe,
maus resultados para a igreja. Se o término da Como resultado da ascensão da Igreja ao
perseguição foi uma benção, a oficialização do poder, não se vêem, então, os ideais do
cristianismo como religião do Estado foi, não há cristianismo transformando o mundo; o que se vê é
dúvida, maldição. o mundo dominando a Igreja. A humildade e a
santidade da igreja primitiva foram substituídas
As Igrejas eram mantidas pelo Estado e pela ambição, pelo orgulho e pela arrogância de
seus ministros privilegiados, não pagavam seus membros. Na verdade, ainda havia alguns
impostos, os julgamentos eram especiais. cristãos de espírito puro, como Mônica, a mãe de
Agostinho, e bem assim ministros fiéis, como
Iniciou-se as perseguições aos pagãos, Jerônimo e João Crisóstomo. Entretanto, a onda de
ocorrendo assim muitas conversões falsas. mundanismo avançou e venceu muitos que se
diziam discípulos do humilde Senhor.
Todos queriam ser membros da Igreja e
quase todos eram aceitos. Tanto os bons como os Se tivesse sido permitido ao cristianismo
maus, os que buscavam a Deus e os hipócritas desenvolver-se normalmente sem o controle do
buscando vantagens, todos se apressavam em Estado, e se o Estado se tivesse mantido livre da
ingressar na comunhão. Homens mundanos, ditadura da Igreja, ambos teriam sido mais felizes.
ambiciosos e sem escrúpulos, todos desejavam No entanto, a Igreja e o Estado tornaram-se uma só
postos na Igreja, para, assim obterem influência entidade quando o cristianismo foi adotado como

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 128


Curso básico de teologia

religião do império, e dessa união não natural uma vez, fora cercada por exércitos estrangeiros.
surgiram males sem conta nas províncias orientais Mais tarde, também cercada por exércitos das
e ocidentais. No Oriente, o Estado dominava de tal províncias, que por várias vezes destronaram e
modo a Igreja que esta perdeu o poder que possuía. entronizaram imperadores. O sistema de governo
No Ocidente, como veremos adiante, a Igreja, organizado por Diocleciano e continuado por
pouco a pouco, usurpou o poder secular, e o Constantino não dava lugar a nenhuma parcela de
resultado não foi cristianismo, e sim o autoridade do senado romano. Os imperadores
estabelecimento de uma hierarquia mais ou menos possuíam agora poderes ilimitados, e Constantino
corrompida que dominava as nações da Europa, desejava uma capital sem os laços da tradição, uma
fazendo da Igreja uma máquina política. capital sob os auspícios da nova religião.

No ano 363 AD todos os governadores 2. Sua posição geográfica


professaram o Cristianismo e antes de findar o
quarto século o Cristianismo, foi virtualmente Constantino demonstrou grande sabedoria
estabelecido como religião do Império. ao escolher a nova capital. O local escolhido foi
Bizâncio, cidade grega, cuja existência contava
cerca de mil anos. Estava situada no ponto de
A Fundação de Constantinopla contato entre a Europa e a Ásia, onde os dois
continentes estão separados pelos dois estreitos; ao
norte, o de Bósforo, e ao sul o de Helesponto, que
Logo após haver sido o Cristianismo juntos, medem 96 km de comprimento, e em quase
elevado à religião do Império Romano, uma nova toda a extensão, menos de 1 km de largura, com
capital foi escolhida, construída e estabelecida exceção de alguns trechos em que alcançam 5 ou 6
como se da autoridade do império, fato que deu km. A situação dessa cidade estava tão bem
motivo a grandes acontecimentos tanto para a fortificada pela natureza que, durante mais de vinte
Igreja como para o Estado. e cinco séculos de história, raras vezes foi
conquistada por inimigos, ao passo que a sua rival,
1. A necessidade de uma nova capital. a cidade de Roma, várias vezes fora saqueada e
vencida. Em Bizâncio, Constantino estabeleceu a
O Imperador Constantino compreendeu capital e planejou a construção da grande cidade
que a cidade de Roma estava intimamente ligada à mundialmente conhecida durante muitos anos por
adoração pagã, cheia de templos e estátuas, e o Constantinopla, atualmente Istambul.
povo, inclinado à antiga forma de adoração; enfim,
uma cidade dominada pelas tradições do
paganismo. Além disso, a posição geográfica de 3. A capital e a Igreja
Roma, em meio a imensas planícies, deixava-a
exposta aos ataques dos inimigos.
Na nova capital, o imperador e o patriarca
No início da república, a cidade, mais de (esse foi o título que posteriormente recebeu o

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bispo de Constantinopla) viviam em harmonia. A Desde o governo de Teodósio, o mundo


Igreja era honrada e considerada, mas eclipsada romano foi dividido em oriental e ocidental,
pela autoridade do trono. Em razão da presença e separados pelo mar Adriático. O império do
do poder do imperador e da índole submissa e dócil Oriente era denominado grego, ao passo que o do
do povo, a Igreja, no Império romano do Oriente, Ocidente era chamado latino, em razão do idioma
tornou-se escrava do Estado, apesar de alguns que prevalecia em cada um deles. A divisão do
patriarcas, como João Crisóstomo, afirmarem sua império foi um presságio da futura divisão da
independência. Igreja.

4. A Igreja de Santa Sofia Supressão do paganismo

Na nova capital, não havia templos Um dos fatos mais notáveis da História foi
dedicados aos ídolos, mas não tardou para que se a rápida transformação de um vasto império, de
edificassem várias igrejas. A maior de todas ficou pagão que era, para cristão. Aparentemente, no
conhecida como a de Santa Sofia, “Sabedoria início do século IV, os antigos deuses estavam
Sagrada”. Foi edificada por ordem de Constantino. arraigados na reverência do mundo romano;
Algum tempo depois, foi destruída por um contudo, antes que se iniciasse o século IV, os
incêndio, mas reconstruída pelo imperador templos pagãos haviam sido abandonados à própria
Justiniano (em 537), com tanta magnificência que ruína ou, então, transformados em templos
sobrepujou todos os templos da época. Esse cristãos. Os sacrifícios e as libações haviam
templo, durante onze séculos, foi considerado a cessado, e, oficialmente, o Império Romano era
catedral do cristianismo, até o ano de 1453, quando cristão.
a cidade foi conquistada pelos turcos. Logo após, o
templo foi transformado em mesquita, até depois 1. A tolerância de Constantino
da Primeira Guerra Mundial.
Constantino era tolerante, tanto por
Divisão do Império Romano temperamento como motivos políticos, apesar de
ser enfático no reconhecimento da religião cristã.
Logo depois da fundação da nova capital, Não sancionava nenhum sacrifício as imagens que
deu-se a divisão do império. As fronteiras antes eram adoradas e determinou que cessassem
demasiado extensas, e o perigo de invasão dos as oferendas à estátua do imperador. Contudo,
bárbaros eram tão grande que um imperador favorecia tolerância para com todas as formas de
sozinho não podia defender seu vastíssimo religião e procurava a conversão gradativa do povo
território. Diocleciano havia inciado a divisão de ao cristianismo, mediante a evangelização, e não
autoridade em 305. Constantino também nomeou por decretos. Conservou alguns títulos pagãos do
imperadores aliados. Em 395, Teodósio completou imperador, como o de “Pontifex Maximus”, sumo
a separação. pontífice, título adotado por todos os papas desde
esse tempo. Também manteve as virgens, as

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Curso básico de teologia

vestais, em Roma.
Controvérsias e Concílios
2. A intolerância de seus sucessores

Entretanto, os sucessores de Constantino Logo que o longo conflito do cristianismo


mostraram-se intolerantes. A conversão dos pagãos com o paganismo terminou em vitória daquele,
crescia muito rapidamente, para o bem estar da surgiu uma nova luta, uma guerra no campo do
Igreja. Contudo, os primeiros imperadores cristãos pensamento, uma série de controvérsias dentro da
que sucederam Constantino procuraram acelerar Igreja acerca de doutrinas. Enquanto a Igreja lutava
ainda mais o movimento de conversões, mediante para sua própria sobrevivência contra a
uma série de leis drásticas e opressoras. Todas as perseguição, conservou-se unida, apesar dos
ofertas dadas aos templos pagãos ou aos seus rumores de dissensões doutrinárias. Entretanto,
sacerdotes foram confiscadas e quase todas quando a Igreja se viu a salvo e no poder, surgiram
transferidas para os templos cristãos. Os sacrifício e acalorados debates acerca de suas doutrinas, e tão
tiros de adoração pagãos foram proibidos, e a sua fortes mostravam-se que lhe abalavam os
prática era considerada ofensa punida por lei. Logo fundamentos. Durante esse período, surgiram três
após o reinado de Constantino, seu filho decretou a grandes controvérsias, além de outras de menor
pena de morte a todos os adoradores de ídolos e o importância. A fim de resolver essas questões,
confisco de suas propriedades. O paganismo, na convocavam-se concílios de toda a Igreja. Nesses
geração que antecedeu a sua extinção, teve alguns concílios, somente os bispos tinham o direito a
mártires; contudo, bem poucos em paralelo com os voto. Todos os demais clérigos e leigos deveriam
mártires do cristianismo, cuja perseguição durou submeter-se às decisões que aqueles tomassem.
dois séculos.
Muitos templos pagãos já tinham sido 1. Arianismo – A doutrina da trindade
dedicados ao cristianismo. Depois de alguns anos,
foi ordenado que aqueles que ainda restassem A Primeira Controvérsia apareceu por
fossem demolidos, a não ser se considerassem úteis causa da doutrina da Trindade, especialmente em
a adoração cristã. Um decreto proibia que se falasse relação ao Pai e ao Filho. O Presbítero Ário de
ou escrevesse contra a religião cristã, e Alexandria defendia a tese de que Jesus era
determinou-se que todos os livros contrários superior aos homens porém inferior ao Pai, não
fossem queimados. O resultado desse decreto foi admitia a existência eterna de Cristo. Seu principal
que o único conhecimento que temos das seitas opositor foi Atanásio também de Alexandria, que
heréticas ou anticristãs é obtido por meio de livros afirmava a unidade de cristo com o Pai e sua
escritos contra elas. A execução dessas leis divindade.
repressivas variava de intensidade nas diversas Constantino não teve êxito em resolver a
partes do império. Contudo, seu efeito extinguiu o questão por isso convocou o concílio de Nicéia em
paganismo no decorrer de três ou quatro gerações. 325 AD onde a doutrina de Ário foi condenada.

2. O apolinarianismo – a natureza de Cristo

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 131


Curso básico de teologia

O Desenvolvimento do poder na Igreja Romana


Posteriormente apareceu outro cisma
acerca da natureza de Cristo. Apolinário, Bispo em Roma reclamava para si autoridade
Laodicéia, declarou que a natureza divina tomou apostólica. A Igreja de Roma era a única que
lugar da natureza humana de Cristo; que Jesus, na declara poder mencionar o nome de dois apóstolos
terra, não era um homem, mas Deus em forma como fundadores, isto é, Pedro e Paulo. A
humana. Este Heresia foi condenada no Concílio de organização da Igreja de Roma e bem assim seus
Constantinopla em 381 AD. dirigentes defendiam fortemente estas afirmações.
Neste ponto há um contraste notável entre Roma e
3. O pelagianismo – O pecado e a salvação Constantinopla. Roma havia feito os imperadores,
ao passo que os imperadores fizeram
A única controvérsia prolongada desse Constantinopla.
período, surgida na igreja do Ocidente, foi a que
dizia respeito ao pecado e á salvação. Teve origem Além disso Roma apresentava um
com Pelágio, monge que foi da Bretanha para Cristianismo prático. Nenhuma outra igreja a
Roma, por volta do ano 410. Sua doutrina declarava sobrepujava no cuidado para com os pobres, não
que nós não herdamos as tendências pecaminosas somente com os seus membros , mas também entre
de Adão, mas que a alma faz a própria escolha, se os pagãos. Foi assim que em todo o ocidente o
para pecar, seja para viver retamente. Que a bispo de Roma, começou a ser considerado como
vontade humana é livre, e cada um é responsável autoridade principal de toda a igreja.
por suas decisões. Contra essa idéia, surgiu, então,
o maior intelecto da história do cristianismo, Foi dessa forma que o Concílio Calcedônia,
depois do apóstolo Paulo, o poderoso Agostinho, na Ásia Menor, no ano 451 AD, Roma ocupou o
que sustentava que Adão representava toda a raça primeiro lugar e Constantinopla o segundo lugar.
humana, que no pecado de Adão todos os homens
pecaram e são pecadores, e todo o gênero humano
é considerado culpado. Que o homem não pode O Cristianismo Vivo
aceitar a salvação unicamente por sua própria
escolha, mas somente pela vontade de Deus, o qual O Cristianismo dessa época decadente
é quem escolhe aqueles que devem ser salvos. A ainda era vivo e ativo. Devemos mencionar aqui
doutrina de Pelágio foi condena pelo Concílio de alguns bispos e dirigentes da igreja nesse período
Cartago, no ano 418, e a teologia de Agostinho que contribuíram para manter vivo o Cristianismo.
tornou-se regra ortodoxa da Igreja. Somente mais
tarde, nos tempos modernos, na Holanda, sob a Atanásio (296 - 373) Foi ativo defensor da fé no
orientação de Armínio (ano de 1600), e no século início do período. Ja vimos como ele se levantou e
XVIII, com John Wesley, é que a Igreja se afastou se destacou na controvérsia de Ário; foi escolhido
do sistema doutrinário agostiniano. bispo de Alexandria. Cinco vezes exilado por causa
da fé, mas lutou fielmente até o fim.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 132


Curso básico de teologia

Ambrósio (340 - 397) Foi eleito bispo enquanto O termo papa, significa simplesmente
ainda era leigo e nem mesmo batizado. Converteu- "papai", sendo, portanto, um termo de carinho e
se posteriormente, repreendeu o próprio imperador respeito, este termo era usado para qualquer bispo,
(Teodósio) por causa de um ato cruel e mais tarde sem importar se ele era de Roma. Como Roma era,
o próprio imperador o tratou com alta distinção. pelo menos de nome, a capital do Império, a igreja
Foi autor de vários livros. e o bispo desta cidade logo se viram em posição de
destaque.
João Crisóstomo (345 - 407) " Boca de ouro " em
razão de sua eloqüência inigualável, foi o maior Quando os bárbaros invadiram o Império,
pregador desse período. Chegou a ser bispo em a igreja de Roma começou a seguir um rumo bem
Constantinopla. Entretanto, sua fidelidade, zelo diferente Constantinopla. No Ocidente, o Império
reformador e coragem, não agradava à corte. Foi desapareceu, e a igreja veio a ser a guardiã do que
exilado e morreu no exílio. restava da velha civilização. Por isto, o papa,
chegou a ter grande prestígio e autoridade.
Jerônimo (340 - 420) Foi o mais erudito de todos. Porém, enquanto que no Oriente
Estudou literatura e oratória em Roma. De seus duvidava-se de sua autoridade, em Roma e
numerosos escritos, o que teve maior influência foi vizinhanças esta autoridade se estendia até além
a tradução da Bíblia para o latim, obra que ficou dos assuntos religiosos. Tudo isto nos mostra que
conhecida como Vulgata Latina, isto é, a Bíblia em em uma época em que a Europa estava em caos, o
linguagem comum, até hoje usada pela Igreja papado preencheu o vazio, proporcionando certa
católica Romana. estabilidade.
O período de crescimento do poder papal
Agostinho (354 - 430) O nome mais ilustre desse começou com o pontificado de Gregório I, o
período, bispo em Hipona na África. Escritor de Grande, e teve o apogeu no tempo de Gregório VII,
vários livros sobre o Cristianismo e sobre a própria mais conhecido por Hildebrando. Hildebrando
vida. Porém a fama e a influência de Agostinho reformou o clero que se havia corrompido, elevou
estão nos seus escritos sobre a teologia cristã, da as normas de moralidade de todo o clero, exigiu
qual ele foi o maior expositor, desde o tempo de celibato dos sacerdotes, libertou a igreja da
Paulo. influência do estado, pondo fim à nomeação de
papas pelos reis e imperadores. Hildebrando impôs
V - A IGREJA MEDIEVAL a supremacia da igreja sobre o Estado.

Origem e desenvolvimento do papado


476-1453 d.C.
A autoridade monárquica do papa, é fruto
Este período vai desde a queda de Roma
até a queda de Constantinopla de um longo processo. De um bispo igual aos
outros, o de Roma passa a ser o primeiro entre os
O progresso papal demais e finalmente cabeça incontestável da Igreja.
Vários papas de grande envergadura, dos quais

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 133


Curso básico de teologia

devemos citar: Inocêncio (402-417); Celestino (422- considerava bispo e até bispo dos bispos em coisas
432); Leão I (440-461); e Gregório I (590-604). formais e até doutrinárias. Sem sua permissão não
se pode reunir um sínodo.
1. Até Constantino – Os antigos autores católicos
insistem que a Igreja de Roma foi fundada por Roma surge como árbitro entre as igrejas.
Pedro e que deste tenha tido uma linha de papas, No conflito entre os arianos e Atanásio, este
vigários de Cristo, desde então. contribuiu para fortalecer Júlio por ter recorrido ao
bispo de Roma, pedindo que convocasse um
A lista dos primeiros bispos consta destes concílio. Esta e outras questões entre as igrejas do
nomes: Lino, Cleto ou Anacleto, Clemente (91-100), leste e da África foram exploradas pelos papas para
Evaristo, Alexandre(109-119), Sixto I (119-127), fortalecer suas próprias posições. Assim questões
Telesforo (127-138), Higino (139-142), Pio I (142-157), religiosas seriam resolvidas pelo "sumo-
Aniceto (157-168), Soter (168-177), Eleutero (177-193). pontífice"de religião e não pelos magistrados civis.
Estas datas são aproximadas e temos poucas
informações do seu pontificado. Siricius (354-398). Conseguiu que um concílio
realizado em Roma decretasse que nenhum bispo
Vitor (193--202). Parece ser o primeiro a procurar deve ser consagrado sem o conhecimento e
estabelecer a autoridade papal além das fronteira consentimento do bispo de Roma. Mesmo que seja
de sua igreja. Cipriano, Bispo em Cartago durante o um decreto falso, é muito antigo e exerceu grande
pontificado de Cornélio e Estevão, contribuiu influência.
bastante para fortalecer a autoridade do bispo de
Roma. Defendeu as reivindicações petrinas (Mt Inocêncio I (402-417). Demonstrou grande
16.18) sem entretanto colocar o papa sobre os ousadia em explorar as reivindicações de Roma,
demais bispos. exigindo submissão universal a sua autoridade.
Insistia que era a obrigação de todas as igrejas
Estevão (253-257). Procurou forçar as demais ocidentais se conformarem aos costumes de Roma.
igrejas a seguir o costume romano quanto ao
cálculo da data da páscoa. Um outro elemento que Celestino (422-432). Durante o exercício do seu
contribuiu para fortalecer a posição de Roma neste papado foi resolvido a mui agitada questão do
período foi a crescente prática das igrejas rurais ou direito de apelar a Roma decisões nas províncias.
de pequenas cidades serem relacionadas a alguma Celestino manipulou as questões de uma maneira
igreja em cidade grande ou incorporadas num que sempre saía ganhando o prestígio de Roma, até
sistema diocesano. Esta prática começou no II o ponto de dispensar os cânones de um concílio
século como resultado do sistema missionário das geral.
igrejas mães.
Leão I (440)-461). Homem humilde, insistia que
2. De Constantino a Gregório Magno - A era sucessor de Pedro e que não se pode infringir a
oficialização da Igreja trouxe em seu bojo rápido autoridade deste. Conseguiu do jovem e fraco
desenvolvimento hierárquico. Constantino se imperador Valentino III um edito em que este

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 134


Curso básico de teologia

reconhece a primazia da sé de Pedro e insiste que procurou firmar os direitos de supremacia do papa
ninguém pode agir sem a permissão desta sé. e de sua juridiçao suprema.

Gregório I (589-604). Possivelmente o maior papa Adrião II (867-872). Trabalhou principalmente à


deste período. filho de um senador, adotou o sombra a influencia atingida pelo seu antecessor.
costume monástico. Pretendia ser missionário aos
ingleses quando foi consagrado papa aos 49 anos João VIII (872-882). O maior problema durante o
de idade. Reclamou que Máximo foi eleito patriarca papado de Joao VIII foi a ameaça sarracena,
de Constantinopla no lugar de seu candidato e forçando-o a pedir ao novo imperador Carlos a sua
suspendeu todos os bispos que o consagraram sob proteção, mas Carlos e o papa aceitou o tratado
pena de anátema de Deus e do apóstolo Pedro. humilhante com os sarracenos.
Repreendeu o patriarca de Constantinopla por ter
assumido o título de bispo ecumênico. O período de 882 a 903 caracteriza-se pela
torpe degradação do poder papal. O poder papal
A coroação de Carlos Magno enfraqueceu-se notadamente. As eleições
pontificiais feitas nesse período são memoráveis
Abriu a história política e eclesiástica da pela torpeza que as acompanhou. O papa Formoso
Europa um novo período, no qual os dois poderes o subiu ao poder em 891 e, dois anos depois de
civil e o papal aparecem intimamente ligados, em sanguinolento pontificado, morreu, provavelmente
busca de ideal comum de poderio e domínio. envenenado.

Leão III (795-816). O período começa com Leão III Estevao VI, foi aprisionado e morto. E
assentado na cadeira pontificial. Foi ele quem depois foi eleito o Papa Marino, cujo pontificado
colocou Carlos Magno como imperador no ano durou apenas meses. João X, feito papa, procurou
800. abrogar os atos de Estevão, e de fato abrogou
muitos deles. Leão V, depois de um breve
Estevão IV (816-817). Este papa coroou o Rei Luiz pontificado, foi morto por seu próprio capelão seu
o Pio, em Roma ato que elevou ainda mais a sucessor, Mas ao assassino coube o mesmo fim
posiçao do papa. trágico, decorrido apenas oito meses.

Gregório IV (827-844). Foi nos dias desse papa que No período de 903 a 963 Com Sergio III,
apareceram falsos documentos a favor da começa a influência perniciosa de uma aventureira
prerrogativa papal. Gregório defendeu Roma contra de alta linhagem sobre o governo papal. De 936 a
os sarracenos. 956 o papado esteve sob inf1uência de Alberico que
nomeou quatro papas. Um filho do mesmo, sob o
Nicolau I (858-867). Ascendeu a cadeira papal nome de João XIII, assumiu o ofício papal sendo o
num momento de agitaçao e desordens, seu pontificado havido como um dos mais imorais
aproveitando-se dos documentos falsos a favor da e licenciosos. Este papa morreu assassinado.
absoluta soberania e irresponsabilidade do papado,

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Curso básico de teologia

Otão, O Grande, fez sentir a sua


interferência no papado em 983, com a convocação Declínio do poder papal
de um sínodo para depor o imoral João XIII e
substituí-lo por Leão VIII. Durante este período, Do século treze em diante começa o suave
até 1073, foram nomeados vário papas e os declínio do poder papal para o que concorreram
imperadores ficaram no direito de nomear e fatos e circunstâncias históricas diferentes.
controlá-los para evitar a dissolução completa do
clero. 1- Com o século XIII desapareceu completamente o
gosto pelas cruzadas.
Hildebrando (1073). Foi inquestionavel-
mente o maior estadista eclesiástico da Idade 2- A corrupção constante na corte de Roma, o
Media. Seu objetivo foi tornar um fato o domínio favoritismo e o mercantilismo que presidiam as
universal e absoluto do papado, e sua política decisões do Papa e da Curia, igualmente estimulava
subordinou-se completamente a este propósito. a dissidência.
Este papa tomou o nome de Gregório VII.
3- A imoralidade dominava o clero.

Concílio de Roma 1059 4- A cadeira papal era objeto de ambição mais


desenfreada.
1- A nomeação do papa pelos bispos cardeais
sancionada pelo clero cardeal e depois aprovada 5- A influência adquirida pelos franceses na Itália e
pelo clero inferior e os leigos. Sicília após queda dos imperadores germânicos foi
sobremodo prejudicial ao papado.
2- Nenhum oficial da igreja, sob pretexto algum,
podia aceitar benefício algum de qualquer leigo ou Bonifácio VII (1294-l303), subiu a cadeira
ser chamado a contar ou dar conta a jurisdição. pontífica no meio destas condições tão favoráveis
ao papado, mas sem se adaptar a elas conservou
3- Nenhum cristão podia assistir a missa rezada por aquele espírito de arrogância e mandonismo, muito
padre de quem se sabia ter concubina, apesar da característico de seus antecessores.
renhida oposição, Hildebrando executou a risco
esses decretos. No entanto a vitoria de Em 1305, foi eleito um francês, Clemente V,
Hildebrando, nunca foi completa e permanente. como papa. Este não foi a Roma, mas estabeleceu
sua corte Papal em Avignon e tornou se
Inocêncio III (1198-1216), aproveitou as subserviente de Felipe rei da frança. Aqui, ele e
prerrogativas papais firmando umas e alargando seus sucessores todos franceses serviram durante
outras. Foi durante seu papado que o poder papal, setenta anos. Tão notório se tornaram as condições
que evoluía gradativamente através dos séculos que os historiadores católicos estigmatizaram o
chegou ao auge. Ele foi o maior papa do século. período de cativeiro babilônico do papado.

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Em virtude da presença da corte papal de desmoralização em que a Igreja Romana se achava


Roma em Avignon, na França, a Europa conseguiu na véspera da reforma era um fato geralmente
muitas inimizades. O catolicismo dividiu-se, reconhecido.
ficando uma parte com a França e outra com a
Itália. Aparecem então dois papas um lançando As Cruzadas
maldições sobre o outro e cada qual julgando-se
legítimo chefe da cristandade. Um grande movimento da Idade Média,
sob a inspiração e mandado da igreja, foram as
Em 1408, houve uma conferência em Cruzadas, que se iniciaram no fim do século onze.
Livorno, entre representantes dos dois papas e um
ano depois reunia-se um concílio geral em Pisa. - A primeira cruzada foi anunciada pelo papa
Discutida largamente a questão, ambos os papas Urbano II, era composta de 275000 dos melhores
foram declarados heréticos e excomungados. O guerreiros, para combater os Sarracenos que
concílio elegeu então a Papa, o cardeal de Milão tinham invadido Jerusalém. Após grande batalha
que tomou o nome de Alexandre V. Jerusalém foi reconquistada. A

A questão não ficou resolvida, pois, três - A Segunda Cruzada foi convocada em virtude das
papas levantaram-se disputando a cadeira invasões dos Sarracenos às províncias adjacentes ao
pontificia, cada um formando em torno de si um reino de Jerusalém. Sob a influência de Luiz VII da
considerado número de admiradores. França e Conrado III da Alemanha, um grande
exército foi conduzido em socorro dos lugares
O pontificado de Nicolau V (l448-1455) foi reconhecido como santos. Enfrentara grandes
notável, tendo sido construído nesse tempo o dificuldades, mas obtiveram vitória.
Vaticano e a Basílica de São Pedro, considerados
como duas magnificas obras de arte. Talvez nesta - A terceira Cruzada foi dirigida por Ricardo I "
época tenha-se resolvido o problema dos três Coração de Leão", da Inglaterra e outros como;
papas. Frederico Barbarroxa, Filipe Augusto. Barbarroxa
Inocêncio VIII (l484-l492). para melhorar a fortuna morrerá afogado e Filipe desentendeu-se com
de seus filhos ilegítimos, pelejou contra Nápoles e Ricardo I e voltou para França. A coragem de
recebia tributo anual de Sultão, por manter seu Ricardo I, sozinho, não foi suficiente para conduzir
irmão e rival na prisão em vez de envia-lo como seu exército para Jerusalém. Contudo fez um
cabeça de um exercito contra os inimigos da acordo para que os cristãos tivessem direito a
cristandade. visitar o santo sepulcro.

Isto se deu numa época de ignorância, - A Quarta Cruzada foi um completo fracasso,
senão no período do renascimento literário e porque causou grande prejuízo a igreja cristã. Os
quando a Europa tinha entrado numa era de cruzados, se afastaram do propósito de conquistar
invenções e descobrimentos destinados a a Terra Santa e fizeram guerra a Constantinopla,
transformar a civilização. O estado de conquistaram-na e saquearam-na. Constantinopla

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ficou, posteriormente, a mercê dos inimigos. pântanos, lavrava os campos e ensinava ao povo
muitos ofícios úteis.
- Na Quinta Cruzada, Frederico II, conduziu um A Ordem dos Cistercienses - Surgiram em 1098,
exército até a Palestina e conseguiu um tratado no com objetivo de fortalecer a disciplina dos
qual as cidades de Jerusalém, Haifa, Belém e Beneditinos, que se relaxava. Seu nome deve-se a
Nazaré, eram cedidas aos cristãos. Porém 16 anos cidade francesa de Citeaux, fundada por São
depois a cidade de Jerusalém foi tomada pelos roberto. Deu ênfase às arte, arquitetura e
maometanos. especialmente à literatura, copiando e escrevendo
livros.
- A Sexta Cruzada foi empreendida por São Luiz. A Ordem dos Franciscanos - Fundada em 1209
Invadiu a Palestina através do egito, mas não por São Francisco de Assis. Tornou-se a mais
obteve êxito, foi derrotado pelos maometanos e numerosa de todas as ordens. Por causa da cor que
libertado por uma grande soma . usavam, tornaram-se conhecido como os "frades
cinzentos".
- A sétima Cruzada teve também a direção de São A Ordem dos Dominicanos - Ordem espanhola
Luiz juntamente com Eduardo I. A rota escolhida fundada por São Domingos, em 1215. Os
foi novamente a África, porém São Luiz morreu e Dominicanos e os Franciscanos diferenciavam-se
Eduardo I voltou para ocupar o trono na Inglaterra das outras ordens, pois eram pregadores, iam por
e a cruzada teve um fracasso total. Esta foi toda parte a fortalecer a fé dos crentes.
considerada a última Cruzada, porém houve outras No início, cada ordem monástica era um benefício
de menor vulto. para a sociedade. Vamos ver alguns bons
resultados.
O Desenvolvimento da vida Monástica 1. Os mosteiros davam hospedagem aos viajantes,
aos enfermos e aos pobres. Serviam de abrigo e
Este movimento desenvolveu-se proteção aos indefesos, principalmente às mulheres
grandemente na Idade Média entre homens e e crianças.
mulheres, com resultados bons e maus. Com o 2. Guardavam em suas bibliotecas muitas obras
crescimento dessas comunidades, tornava-se antigas da literatura clássica e cristã. Sem as obras
necessária alguma forma de organização, de modo escritas nos mosteiros, a Idade média teria passado
que nesse período surgiram quatro grandes ordens. em branco.
3. Os monges serviram como missionários na
A Ordem dos Beneditinos - Fundada por por São expansão do evangelho, até mesmo entre os
Bento em 529, em Monte Cassino. Essa ordem bárbaros.
tornou-se a maior de todas as ordens monásticas da Apesar dos bons resultados que emanaram do
Europa. Suas regras exigiam obediência ao superior sistema monástico, também houve péssimos
do mosteiro, a renúncia a todos os bens materiais, e resultados.
bem assim a castidade pessoal. 1. O monacato apresentava o celibato como a vida
mais elevada, o que é inatural e contrário às
Cortava bosques, secava e saneava Escrituras.

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2. Impôs a adoção da vida monástica a milhares de


pessoas das classes nobres da época. João Wyclif - Nascido em 1324, Recusava-se a
3. Os lares e as famílias foram, assim, constituídos reconhecer a autoridade do papa e opunha-se a ela.
não pelos melhores, mas pelos de ideais inferiores, Era contra a doutrina da transubstanciação,
já que os melhores, não participavam da família, considerando o pão e o vinho meros símbolos.
nem da vida social, nem da vida cívica nacional. Traduziu o Novo testamento para o Inglês e seus
4. O crescimento da riqueza dos mosteiros levou a seguidores foram exterminados por Henrique V.
indisciplina, ao luxo, à ociosidade e até a
imoralidade. João Huss - Nascido em 1369 foi um dos leitores de
No início do século dezesseis, os mosteiros estavam Wyclif, pregou as mesmas doutrinas, e
tão desmoralizados no conceito do povo, que foram especialmente proclamou a necessidade de se
suprimidos, e os que neles habitavam foram libertarem da autoridade papal. Foi excomungado
obrigados a trabalhar para se manterem. pelo papa, e então retirou para algum esconderijo
desconhecido. Ao fim de dois ano voltou a convite
Início da Reforma Religiosa da igreja para participar de um concílio católico-
romana de Constança, sob a proteção de um salvo-
Cinco grandes movimentos de reformas surgiram conduto. Entretanto, o acordo foi violado sob o
na igreja; contudo, o mundo não estava preparado pretexto de que "Não se deve ser fiel a hereges".
para recebê-los, de modo que foram reprimidos Assim João Huss foi condenado e queimado.
com sangrentas perseguições.
Jerônimo Savonarola - Nascido em 1452 foi
Os Albigenses - "Puritanos" surgiram em 1170 no monge Dominicano, em Florença. A grande
sul da França. Eles rejeitavam a autoridade da catedral enchia-se de multidões ansiosas, não só de
tradição, distribuíam o Novo Testamento e ouví-lo, mas também para obedecer aos seus
opunham-se às doutrinas romanas do purgatório, à ensinos. Pregava contra os male sociais,
adoração de imagens e às pretensões sacerdotais. O eclesiásticos e político de seu tempo. Foi preso,
papa Inocêncio III, promoveu uma grande condenado e enforcado e seu corpo queimado na
perseguição contra eles, e a seita foi dissolvida com praça de Florença em 1498.
o assassinato de quase toda a população da região.
A Queda de Constantinopla
Os Valdenses - Apareceram ao mesmo tempo, em
1170, com Pedro Valdo, que lia, explicava e A queda de Constantinopla, em 1453, foi
distribuía as Escrituras, as quais contrariavam os assinalada como linha divisória entre os tempos
costumes e as doutrinas dos católicos romanos. medievais e os tempos modernos. Província após
Foram cruelmente perseguidos e expulsos da província do império foi tomada, até ficar somente
França; apesar das perseguições, eles Constantinopla, que finalmente, em 1453, foi
permaneceram firmes, e atualmente constituem tomada pelos turcos sob as ordens de Maomé II. O
uma parte do pequeno grupo de protestante na templo foi transformado em mesquita.
Itália. Constantinopla tornou-se a capital do Império

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Turco e assim terminou também o período da interesse pela literatura, pelas artes e pela ciência,
Igreja Medieval. isto é, a transformação dos métodos e propósitos
medievais em métodos modernos.
Resumo da Apostasia
A maioria dos estudiosos italianos desse
Mencionaremos algumas das doutrinas que não período eram homens destituídos de vida religiosa;
tem apoio nas Escrituras Sagradas, e quando foram até os próprios papas dessa época destacavam-se
implantadas na igreja. mais por sua cultura do que pela fé. No norte dos
Alpes, na Alemanha, na Inglaterra, e na França o
Ano Doutrina
310 Reza pelos defuntos, movimento possuía sentimento religioso,
320 Uso de Velas, despertando novo interesse pelas Escrituras, pelas
375 Culto dos santos,
431 Culto à virgem Maria, línguas grega e hebraica, levando o povo a
503 Obrigatoriedade de se beijar os pés do papa, investigar os verdadeiros fundamentos da fé,
850 Uso da água benta,
993 Canonização dos Santo, independente dos dogmas de Roma. Por toda
1073 Celibato Sacerdotal, parte, de norte a sul, a Renascença solapava a igreja
1184 Instituição da Santa Inquisição,
1190 Venda de Indulgências, católica romana.
1200 Substituição do pão pela hóstia,
1215 Dogma da transubstanciação,
1229 Proibição da leitura Bíblica, A invenção da imprensa veio a ser um
1316 Instituição da reza à Ave Maria, arauto e aliado da Reforma que se aproximava. A
1546 Introdução dos livros apócrifos,
1870 Dogma da infalibilidade papal, imprensa possibilitou o uso comum das Escrituras,
1950 Ascenção de Maria e incentivou a tradução e a circulação da Bíblia em
todos os idiomas da Europa. As pessoas que liam a
VI - A IGREJA REFORMADA
Bíblia, prontamente se convenciam de que a igreja
papal estava muito distanciada do ideal do Novo
Testamento. Os novos ensinos dos Reformadores,
Desde a queda de Constantinopla, 1453 logo que eram escritos, também eram logo
até o fim da Guerra dos Trinta Anos, 1648
publicados em livros e folhetos, e circulavam aos
milhões em toda a Europa.
A Reforma na Alemanha

O patriotismo dos povos começou a


Neste período de duzentos anos, o grande manifestar-se, mostrando-se inconformados com a
acontecimento foi a Reforma; iniciada na autoridade estrangeira sobre suas próprias igrejas
Alemanha, e teve como resultado o nacionais; resistindo à nomeação de bispos, abades
estabelecimento de igrejas nacionais que não e dignitários da igreja feitas por um papa que vivia
prestavam obediência nem fidelidade a Roma. em um pais distante.
Anotemos algumas das forças que conduziram à
Reforma e ajudaram o seu progresso. Uma dessas Não se conformava, o povo, com a
forças foi, o movimento conhecido como contribuição do "óbolo de S. Pedro", para sustentar
Renascença, ou despertar da Europa para um novo o papa e para a construção de majestosos templos

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em Roma. Havia uma determinação de reduzir o afixou na porta da Catedral de Wittenberg um


poder dos concílios eclesiásticos, colocando o clero pergaminho que continha noventa e cinco teses ou
sob o poder das mesmas leis e tribunais que declarações, quase todas relacionadas com a venda
serviam para os leigos. de indulgências; porém em sua aplicação atacava a
autoridade do papa e do sacerdócio. Os dirigentes
Enquanto o espírito de reforma e de da igreja procuravam em vão restringir e lisonjear
independência despertava a Europa, a chama desse Martinho Lutero. Ele, porém, permaneceu firme, e
movimento começou a arder primeiramente na os ataques que lhe dirigiam, apenas serviram para
Alemanha, no eleitorado da Saxônia, sob a direção tornar mais resoluta sua oposição às doutrinas não
de Martinho Lutero, monge e professor da apoiadas nas Escrituras Sagradas.
Universidade de Wittenberg.
Após longas e prolongadas controvérsias e
O papa reinante, Leão X, em razão da a publicação de folhetos que tornaram conhecidas
necessidade de avultadas somas para terminar as as opiniões de Lutero em toda a Alemanha, seus
obras do templo de S. Pedro em Roma, permitiu ensinos foram formalmente condenados. Lutero foi
que um seu enviado, João Tetzel, percorresse a excomungado por uma bula do papa Leão X, no
Alemanha vendendo bulas, assinadas pelo papa, as mês de junho de 1520. Pediram então ao eleitor
quais, dizia, possuíam a virtude de conceder perdão Frederico da Saxônia que entregasse preso Lutero,
de todos os pecados, não só aos possuidores da a fim de ser julgado e castigado. Entretanto, em vez
bula, mas também aos amigos, mortos ou vivos, em de entregar Lutero, Frederico deu-lhe ampla
cujo nome fossem as bulas compradas, sem proteção, pois simpatizava com suas idéias.
necessidade de confissão, nem absolvição pelo Martinho Lutero recebeu a excomunhão como um
sacerdote. desafio, classificando-a de "bula execrável do
anticristo". No dia 10 de dezembro, Lutero queimou
Tetzel fazia esta indagação ao povo:
a bula, em reunião pública, à porta de Wittemberg,
tão depressa
o vosso dinheiro diante de uma assembléia de professores,
caia no cofre,
estudantes e do povo. Juntamente com a bula,
a alma de vossos amigos
subirá do purgatório Lutero queimou também cópias dos cânones ou
ao céu.
leis estabelecidas por autoridades romanas. Esse
ato constituiu a renúncia definitiva de Lutero à
Lutero, por sua vez, começou a pregar
igreja católica romana.
contra Tetzel e sua campanha de venda de
indulgências, denunciando como falso esse ensino.
Em 1521 Lutero foi citado a comparecer
ante a do Concílio Supremo do Reno. O novo
A data exata fixada pelos historiadores
imperador Carlos V concedeu um salvo-conduto a
como início da grande Reforma foi registrada como
Lutero, para comparecer a Worms. Apesar de
31 de outubro de 1517.
advertido por seus amigos de que poderia ter a
mesma sorte de João Huss, que nas mesmas
Na manhã desse dia, Martinho Lutero
circunstâncias, no Concílio de Constança, em 1415,

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Curso básico de teologia

apesar de possuir um salvo-conduto, foi morto por católicos, que tinham maioria, condenaram as
seus inimigos, Lutero respondeu-lhes: "irei a doutrinas de Lutero. Os príncipes resolveram
Worms ainda que me cerquem tantos demônios proibir qualquer ensino do luteranismo nos estados
quantas são as telhas dos telhados." em que dominassem os católicos. Ao mesmo tempo
determinaram que nos estados em que
Finalmente, no dia 17 de abril de 1521 governassem luteranos, os católicos poderiam
Lutero compareceu ao Concílio. Em resposta a um exercer livremente sua religião. Os príncipes
pedido de que se retratasse, e renegasse o que havia luteranos protestaram contra essa lei
escrito, após algumas considerações respondeu que desequilibrada e odiosa. Desde esse tempo ficaram
não podia retratar-se, a não ser que fosse conhecidos como protestantes, e as doutrinas que
desaprovado pelas Escrituras e pela razão, e defendiam também ficaram conhecidas como
terminou com estas palavras: "Aqui estou. Não religião protestante.
posso fazer outra coisa. Que Deus me ajude.
Amém." Instaram com o imperador Carlos para que A Contra-Reforma
prendesse Lutero, apresentando como razão, que a
fé não podia ser confiada a hereges. Contudo, Logo após haver-se iniciado o movimento
Lutero pôde deixar Worms em paz. da Reforma, um poderoso esforço foi também
iniciado pela igreja católica romana no sentido de
Enquanto viajava de regresso à sua cidade, recuperar o terreno perdido, para destruir a fé
Lutero foi cercado e levado por soldados do eleitor protestante e para enviar missões a países
Frederico para o castelo de Wartzburg. Ali estrangeiros. Esse movimento foi chamado Contra-
permaneceu durante um ano, enquanto as Reforma.
tempestades de guerra e revoltas rugiam no
império. Entretanto, durante esse tempo, Lutero Tentou-se fazer a reforma dentro da
não permaneceu ocioso; nesse período traduziu o própria igreja por via do Concílio de Trento,
Novo Testamento para a língua alemã, obra que convocado no ano de 1545 pelo papa Paulo III,
por si só o teria imortalizado, pois essa versão é principalmente com o objetivo de investigar os
considerada como o fundamento do idioma alemão motivos e pôr fim aos abusos que deram causa à
escrito. Isto aconteceu no ano de 1521. O Antigo Reforma.
Testamento só foi completado alguns anos mais
tarde. Ao regressar do castelo de Wartzburg a O Concílio era composto de todos os
Wittenberg, Lutero reassumiu a direção do bispos e abades da igreja, e durou quase vinte anos,
movimento a favor da igreja Reformada, durante os governos de quatro papas, de 1545 a
exatamente a tempo de salvá-la de excessos 1563. Todos esperavam que a separação entre
extravagantes. católicos e protestantes teria fim, e que a igreja
ficaria outra vez unida. Contudo, tal coisa não
Em 1529 a Dieta reuniu-se na cidade de sucedeu. Fizeram-se, porém, muitas reformas na
Espira, com o objetivo de reconciliar as partes em igreja católica e as doutrinas foram definitivamente
luta. Nessa reunião da Dieta os governadores estabelecidas. Os próprios protestantes admitem

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Curso básico de teologia

que depois do Concílio de Trento os papas se a fé protestante, usando para isso a espada.
conduziram com mais acerto do que os que
governaram antes do Concílio. O resultado dessa Na Espanha estabeleceu-se a Inquisição,
reunião pode ser considerado como uma reforma por meio da qual inumerável multidão sofreu
conservadora dentro da igreja católica romana. torturas e muitas pessoas foram queimadas vivas.

De ainda maior influência na Contra- Nos Países-Baixos o governo espanhol


Reforma foi a Ordem dos Jesuítas, fundada em 1534 determinou matar todos aqueles que fossem
pelo espanhol Inácio de Loyola. Era uma ordem suspeitos de heresias.
monástica caracterizada pela combinação da mais
severa disciplina, intensa lealdade à igreja e à Na França o espírito de perseguição
Ordem, profunda devoção religiosa, e um marcado alcançou o clímax na matança da noite de São
esforço para arrebanhar prosélitos. Seu principal Bartolomeu, 24 de agosto de 1572, e que se
objetivo era combater o movimento protestante, prolongou por várias semanas. Segundo o cálculo
tanto com métodos conhecidos como com formas de alguns historiadores, morreram de vinte a
secretas. Tornou-se tão poderosa a Ordem dos setenta mil pessoas.
Jesuítas, que teve contra ela a oposição mais severa,
até mesmo nos países católicos; foi suprimida em Essas perseguições nos países em que o
quase todos os países da Europa, e por decreto do governo não era protestante não só retardavam a
papa Clemente XIV, no ano de 1773, a Ordem dos marcha da Reforma, mas, em alguns países,
Jesuítas foi proibida de funcionar dentro da igreja. principalmente na Boêmia e na Espanha, a
Apesar desse fato, ela continuou a funcionar, extinguiram.
secretamente durante algum tempo, mais tarde
abertamente, e foi reconhecida pelo papa em 1814. Os esforços missionários da igreja católica
Hoje é uma das forças mais ativas para divulgar e romana devem ser reconhecidos, também, como
fortalecer a igreja católica romana em todo o uma das forças da Contra-Reforma. Esses esforços
mundo. eram dirigidos em sua maioria pelos jesuítas, e
tiveram como resultado a conversão das raças
A perseguição ativa foi outra arma nativas da América do Sul, do México e de grande
poderosa usada para impedir o crescente espírito parte do Canadá.
da Reforma.
Na Índia e países circunvizinhos
É Certo que os protestantes também estabeleceram-se missões por intermédio de
perseguiram, e até mataram, porém geralmente Francisco Xavier, um dos fundadores da sociedade
isso aconteceu por sentimentos políticos e não dos jesuítas. As missões católicas, nos países
religiosos. pagãos, iniciaram-se séculos antes das missões
protestantes e conquistaram grande número de
Entretanto, no continente europeu, todos membros e bem assim poder para a respectiva
os governos católicos preocupavam-se em extirpar igreja.

ESCOLA TEOLÓGICA KOINONIA 143


Curso básico de teologia

entre si: uma parte mais radical, era favorável à


Como resultado inevitável de interesses e forma presbiteriana; a outra parte desejava a
propósitos contrários dos estados da Reforma e independência de cada grupo local, conhecidos
católicos na Alemanha, iniciou-se então uma como "independentes" ou "congregacionais".
guerra no ano de 1618, isto é, um século depois da Apesar dessas diferenças, continuavam como
Reforma. Essa guerra envolveu quase todas as membros da igreja inglesa.
nações européias. Na história ela é conhecida como Na luta entre Carlos I e o Parlamento, os
a Guerra dos Trinta Anos. As rivalidades políticas e puritanos eram fortes defensores dos direitos
religiosas estavam ligadas a essa guerra. Ás vezes populares. No início o grupo presbiteriano
estados que professavam a mesma fé, apoiavam predominava. Por ordem do Parlamento, um
partidos contrários. A luta estendeu-se durante concílio de ministros reunido em Westminster, em
quase. uma geração, e toda a Alemanha sofreu ou 1643, preparou a "Confissão de Westminster" e os
seus efeitos terríveis. dois catecismos, considerados durante muito
Finalmente, em 1648, a guerra terminou, tempo como regra de fé por presbiterianos e
com a assinatura do tratado de paz de Westfália, congregacionais. Após a Revolução de 1688, os
que fixou os limites dos estados católicos e puritanos foram reconhecidos como dissidentes da
protestantes, que duram até hoje. igreja da Inglaterra e conseguiram o direito de
O período da Reforma pode ser organizarem-se independentemente.
considerado terminado nesse ponto. Do movimento iniciado pelos puritanos
surgiram três igrejas, a saber, a Presbiteriana, a
VII - A IGREJA ATUAL Congregacional, e a Batista.
Nos primeiros cinquenta anos do século
Nos últimos três séculos, nossa atenção
dezoito, as igrejas da Inglaterra, a oficial e a
dirigir-se-á especialmente para as igrejas que
dissidente, entraram em decadência. Os cultos
nasceram da Reforma. Pouco depois da Reforma
eram formalistas, dominados por uma crença
apareceram três grupos diferentes na igreja inglesa:
intelectual, mas sem poder moral sobre o povo. A
- Os elementos romanistas que procuravam
Inglaterra foi despertada dessa condição, por um
fazer amizade e nova união com Roma;
grupo de pregadores sinceros dirigidos pelos
- O anglicanismo, que estava satisfeito com
irmãos João e Carlos Wesley e Jorge Whitefield.
as reformas moderadas estabelecidas nos reinados
Dentre os três, Whitefield era o pregador mais
de Henrique VIII e da rainha Elisabete;
poderoso, que comovia os corações de milhares de
- E o grupo protestante radical que desejava
pessoas, tanto na Inglaterra como na América do
uma igreja igual às que se estabeleceram em
Norte. Carlos Wesley era o poeta sacro, cujos hinos
Genebra e Escócia. Este último grupo ficou
enriqueceram a coleção hinológica a partir de seu
conhecido, cerca do ano de 1654, como "os
tempo. João Wesley foi, sem dúvida alguma, o
puritanos", e opunha-se de modo firme ao sistema
indiscutível dirigente e estadista do movimento. Na
anglicano no governo de Elisabete, e por essa razão
idade de trinta e cinco anos, quando
muitos de seus dirigentes foram exilados.
desempenhava as funções de clérigo anglicano,
Os puritanos também estavam divididos
João Wesley encontrou a realidade da religião

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espiritual entre os morávios, um grupo dissidente cristã conseguiu tantos seguidores como João
da igreja Luterana. Wesley.
Em 1739 Wesley começou a pregar "o A Igreja da Inglaterra (Episcopal), foi a
testemunho do Espírito" como um conhecimento primeira religião protestante a estabelecer-se na
pessoal interior, e fundou sociedades daqueles que América do Norte, em 1607. A igreja, nos Estados
aceitavam seus ensinos. A princípio essas Unidos, tomou o nome oficial de Igreja Protestante
sociedades eram orientadas por dirigentes de Episcopal. A igreja Episcopal reconhece estas três
classes, porém mais tarde Wesley convocou um ordens no ministério: bispos, sacerdotes e
corpo de pregadores leigos para que levassem as diáconos, e aceita quase todos os trinta e nove
doutrinas e relatassem suas experiências em todos artigos da Igreja da Inglaterra, modificados para
os lugares, na Grã-Bretanha e nas colônias norte- serem adaptados à forma de governo norte-
americanas. Os seguidores de Wesley foram americano. Sua autoridade legislativa está
chamados "metodistas", e Wesley aceitou sem concentrada em uma convenção geral que se reúne
relutância esse nome. Na Inglaterra foram cada três anos. Trata-se de dois corpos, uma
conhecidos como "metodistas wesleyanos", e antes câmara de bispos e outra de delegados clérigos e
da morte de seu fundador, contavam-se aos leigos eleitos por convenções nas diferentes
milhares. dioceses.
Apesar de haver sofrido, durante muitos Uma das maiores igrejas existentes na
anos, violenta oposição da igreja de Inglaterra, sem América do Norte é a denominação Batista. Seus
que lhe permitissem usar o púlpito para pregar, princípios distintivos são dois: (1) Que o batismo
Wesley afirmava considerar-se membro da referida deve ser ministrado somente àqueles que
igreja; considerava o movimento que dirigia como confessam sua fé em Cristo; por conseguinte, as
uma sociedade não separada, mas dentro da igreja crianças não devem ser batizadas. (2) Que a única
da Inglaterra. Contudo após a revolução norte- forma bíblica do batismo é a imersão do corpo na
americana, em 1784, organizou os metodistas nos água, e não a aspersão ou derramamento.
Estados Unidos em igreja independente, de acordo Os batistas são congregacionais em seu
com o modelo episcopal, e colocou sistema de governo. Cada igreja local é
"superintendentes", título que preferiu ao de absolutamente independente de qualquer
"bispo". Nos Estados Unidos o nome "bispo" teve jurisdição externa, fixando suas próprias regras.
melhor aceitação e foi por isso adotado. Nesse Não possuem uma Confissão de Fé nem catecismo
tempo os metodistas na América eram cerca de algum para instruir jovens acerca de seus dogmas.
14.000. Surgiram os batistas pouco depois da Reforma, na
O movimento wesleyano despertou Suíça, e espalharam-se rapidamente no norte da
clérigos e dissidentes para um novo poder na vida Alemanha e na Holanda. No princípio foram
cristã. Também contribuiu para a formação de chamados anabatistas, porque batizavam
igrejas metodistas sob várias formas em muitos novamente aqueles que haviam sido batizados na
países. Na América do Norte, presentemente a infância. Na Inglaterra, a princípio, estavam unidos
igreja metodista conta com aproximadamente onze com os independentes ou congregacionais, mas
milhões de membros. Nenhum dirigente na igreja pouco a pouco tornaram-se um corpo

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Curso básico de teologia

independente. Com efeito, a igreja de Redford, da CRISTIANI, Monsenhor. Breve história das heresias. São
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