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ATENÇÃO FARMACÊUTICA NA HIPERTENSÃO

ARTERIAL EM UMA FARMÁCIA DE


DOURADOS, MATO GROSSO DO SUL
ROGÉRIO DIAS RENOVATO1
MARCELLY DE FREITAS TRINDADE2
1. Farmacêutico, Mestre em Engenharia de Produção, Docente da Universidade Estadual de Mato
Grosso do Su l– Dourados (MS), Rua Hilda Bergo Duarte, 296 - CEP 79806, Dourados (MS).
2. Bolsista de Iniciação Científica da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. Autor responsável e-
mail: rrenovato@uol.com.br

1. INTRODUÇÃO A Atenção Farmacêutica foi aplicada a pacientes hi-


pertensos assistidos em uma farmácia do Município de Dou-
A Hipertensão Arterial é uma doença crônica que rados (MS). Neste trabalho, empregou-se a Metodologia
apresenta elevado custo médico-social, pois é um dos mais Dáder (Faus et al, 2000) como instrumento do seguimento
importantes fatores de risco para o desenvolvimento de farmacoterapêutico dos pacientes em Atenção Farmacêuti-
doenças cardiovasculares. Em 1998, foram registrados 930 ca. A avaliação da adesão ao tratamento e a verificação do
mil óbitos, sendo que 27% foram ocasionados por desor- nível de conhecimento sobre os medicamentos foram ins-
dens cardiovasculares (IV Diretrizes Brasileiras de Hiper- trumentos também aplicados para obter mais dados e pro-
tensão Arterial, 2002). por estratégias em Atenção Farmacêutica.
A participação do farmacêutico na equipe multiprofis-
sional tem sido consolidada, e a sua proximidade da comuni- 2. MÉTODOS
dade reforça a implementação de projetos no combate à hiper-
tensão, tendo como local de realização a própria farmácia e a 2.1 Metodologia Dáder
aplicação de uma nova prática: a Atenção Farmacêutica. (EU- Doze pacientes foram acompanhados, conforme a
ROPHARM Fórum/CINDI, 2000, OPS/OMS, 2002). Metodologia Dáder. Os critérios de inclusão da pesquisa
A Atenção Farmacêutica é uma prática que tem como foram: pacientes com diagnóstico de Hipertensão Arterial
principal finalidade melhorar a qualidade de vida do pacien- Sistêmica e Desordens Cardiovasculares que faziam uso de
te que faz uso de medicamentos. Otimizar o tratamento far- medicamentos, há, pelo menos, um ano, e eram assistidos
macológico e prevenir problemas relacionados ao uso de por uma farmácia, na cidade de Dourados. Para o acompa-
medicamentos sãos uns dos objetivos da Atenção Farma- nhamento farmacoterapêutico, foi empregada a Metodolo-
cêutica. gia Dáder em todas as suas etapas (tabela 1).
Em Atenção Farmacêutica, o paciente é o principal A amostra foi do tipo intencional. As visitas foram
foco, e não a doença. Cipolle et al (1998) relatam que são os agendadas por contato telefônico ou pessoalmente, desen-
pacientes que têm doses e não o medicamento. Estabelecer volvidas em suas residências ou em uma sala de atendimen-
uma relação terapêutica entre o profissional de saúde e o to privado na farmácia. Solicitou-se a autorização de cada
paciente compromete o acompanhamento farmacoterapêu- paciente, e os objetivos e outros esclarecimentos necessá-
tico centrado no paciente. rios foram entregues a cada um em um impresso informati-

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vo. As visitas ocorreram, no período de 27 de julho de 2002 freqüência, quando o paciente citava o intervalo entre as
a 14 de dezembro de 2002. Foram realizadas quatro visitas doses (por exemplo, de oito em oito horas) ou o número de
domiciliares para cada paciente, sendo em média uma visita, vezes, por dia (por exemplo, três vezes por dia). Quanto ao
por mês. item reações adversas, foram consideradas como corretas
Em cada visita, foi realizada a verificação da pressão as respostas em que o paciente citava apenas uma reação
arterial, da freqüência cardíaca, da freqüência respiratória, e adversa. Durante a coleta de dados, o termo reação adversa
o paciente foi inquirido sobre seus problemas de saúde e foi substituído pelo termo efeito colateral, pois este termo é
medicamentos utilizados. Esses dados foram coletados, atra- mais facilmente compreendido pelo paciente, apesar de o
vés de um instrumento de acompanhamento. A última visita termo reação adversa ser mais adequado.
não foi realizada em três pacientes por motivo de ausência, Os seguinte dados foram coletados de dez dos 12
e apenas um paciente recebeu duas visitas, pois nos dias pacientes integrantes da pesquisa, durante a terceira visita,
marcados encontrava-se ausente em decorrência de viagem. no período de dois de novembro a 23 de novembro de 2002.
Um escore foi desenvolvido, sendo atribuídos dois pontos
Tabela 1. Etapas da Metodologia Dáder para para cada item correto. O conhecimento sobre os medica-
acompanhamento farmacoterapêutico dos pacientes mentos foi classificado em três níveis: A) nível bom, o qual
com Hipertensão e Desordens Cardiovasculares. dá condições para o paciente usar o medicamento de forma
segura em qualquer circunstância; B) nível regular, o qual
Metodologia Dáder dá condições para o paciente usar o medicamento de forma
1. Primeira Visita segura em condições ideais sem nenhum tipo de intercor-
rência, durante o tratamento; C) nível insuficiente, o qual
2. Análise da Situação
não dá condições para o paciente utilizar o medicamento
3. Fase de Estudo com segurança.
4. Avaliação Global e Suspeitas de Problemas Relacio- Paciente com menos de seis pontos apresenta o ní-
nados a Medicamentos (PRMs) vel de conhecimento insuficiente. De seis a oito pontos, o
5. Segunda Visita paciente apresenta o nível regular. Com dez pontos, o paci-
ente tem o nível de conhecimento bom.

2.2 Verificação do conhecimento sobre medicamentos 2.3 Método para avaliar a adesão à
terapêutica medicamentosa.
O objetivo deste procedimento foi mensurar o nível
de conhecimento sobre os medicamentos utilizados pelos Um dos resultados mensuráveis da Atenção Farma-
pacientes. O instrumento para coleta de dados foi adaptado cêutica é o aumento da adesão ao tratamento farmacológi-
do trabalho de Silva et al (2000), sendo empregados os se- co. O conceito de adesão ao tratamento deste trabalho foi
guintes itens: nome do medicamento, dose, freqüência, in- extraído de Gonçalves et al (1999), que ressalta a perspecti-
dicação terapêutica e reação adversa. Em nosso trabalho, va do paciente como um ser capaz de uma decisão mais
excluímos os itens duração do tratamento e precaução pre- consciente e responsável por seu tratamento.
sentes no trabalho citado acima, pois os medicamentos utili- O paciente tem autonomia e habilidade para aceitar ou
zados pelos pacientes são de uso contínuo, e o termo precau- não as recomendações médicas, porém isto não significa au-
ção pode ser facilmente confundido com reação adversa. sência de responsabilidade, mas, sim, tornar o paciente o pro-
Foi realizado o inquérito para cada medicamento to- vedor e participante ativo do seu processo de cura. A adesão
mado pelo paciente. Os dados relativos à indicação tera- ao tratamento não deve se limitar à ideologia biomédica, onde
pêutica foram confrontados com as informações das mono- o paciente é visto como um cumpridor de recomendações.
grafias dos medicamentos de Zanini et al (1998) e United Nas doenças crônicas, como a Hipertensão, o indivíduo des-
States Pharmacopoeia Drug Information (2000). Para o item prende parte de sua vida no papel de paciente.
nome do medicamento foi considerada como resposta cor- O método utilizado para mensurar a adesão ao trata-
reta, quando o paciente citava o nome genérico ou comerci- mento foi o método de Morisky et al (1986), que desenvol-
al, não sinalizando dúvida ou confusão. veu uma escala para quantificar a adesão utilizando questi-
Para o item indicação terapêutica, as respostas ava- onários. A escala é composta de quatro perguntas que vi-
liadas como corretas correspondiam ao fato do paciente sam determinar se o insucesso no seguimento do tratamen-
citar o órgão do aparelho ou sistema do organismo em que to se deveu a: esquecimento, desleixo, ocorrência de melho-
o medicamento atua ou onde se situa o sistema tratado, ra do estado geral do paciente ou por reações adversas
independente das diferenças na terminologia utilizadas. provocadas pelos medicamentos.
Quanto à dose, foram julgadas corretas as respostas quan- As perguntas são elaboradas de tal forma que minimi-
do o paciente se referia à mesma quantidade em unidades zem o viés das respostas predominantemente positivas.(figura
de medida (mg, g, ml) ou de forma farmacêutica (comprimi- 2). O nível de aderência ao tratamento é considerado elevado
dos, cápsulas). quando o número de respostas sim é zero. Nível mediano
Foram aceitas como corretas as respostas quanto à correlaciona-se a uma ou duas respostas sim. O nível baixo

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refere-se quando o paciente responde com três ou quatro res- 2.4.4 Hipertensão Controlada – segundo as IV Di-
postas afirmativas. Os dados foram coletados em nove dos 12 retrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial, é considera-
pacientes, no dia 14 de dezembro de 2002. da hipertensão controlada mediante tratamento medica-
mentoso ou não, quando os níveis pressóricos são infe-
Tabela 2. Perguntas para avaliar a aderência riores a 140/90 mm de Hg.
ao tratamento segundo Morisky et al (1986). 2.4.5 Idoso – A Organização Mundial da Saúde
• Pergunta 1 – Você já se esqueceu de tomar seu (OMS) considera idoso o indivíduo com 65 anos ou mais.
medicamento? Sim ou não No entanto, para alguns autores brasileiros, admite-se
• Pergunta 2 –Mesmo lembrando, você já deixou de que este ponto de corte ocorra aos 60 anos, em função
tomar seu medicamento? Sim ou não de que a expectativa de vida, no Brasil, ainda não atin-
giu níveis altos como a dos países desenvolvidos (Ve-
• Pergunta 3 – Você alguma vez parou de tomar seu
ras, 1994). Portanto, neste trabalho será tido por idoso
medicamento, quando se sente bem? Sim ou não
aquele que tiver mais de 60 anos.
• Pergunta 4 – Você alguma vez parou de tomar seu
medcamento, quando não sentiu se bem? Sim ou não
3. RESULTADOS

2.4 Algumas definições e parâmetros importantes 3.1 Seguimento farmacoterapêutico


conforme a Metodologia Dáder
Com o intuito de delimitar criteriosamente os parâ-
metros apresentados neste trabalho, bem como as defini-
Dos 12 pacientes diagnosticados com Hiperten-
ções empregadas, a seguir estão descritas aquelas que são
relevantes. são Arterial Sistêmica e Desordens Cardiovasculares,
2.4.1 Problemas Relacionados a Medicamentos – pro- dez são do sexo feminino e dois do sexo masculino.
blema de saúde vinculado à farmacoterapia, e que interfere A idade média dos pacientes foi de 71 anos. Dez
ou pode interferir com os resultados de saúde esperados no pacientes estão aposentados, um recebe auxílio da Pre-
paciente (Consenso, 1999) vidência Social e outro não apresenta.
2.4.2 Classificação dos Problemas Relacionados a
Medicamentos (PRMs), conforme o Consenso de Granada Tabela 4. Classificação Diagnóstica conforme
(tabela 3) (Consenso, 1999) – Os PRMs são classificados IV Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial
em três categorias:necessidade, efetividade e segurança. (adultos com mais de 18 anos de idade)
2.4.3 Classificação Diagnóstica da Hipertensão Arteri-
al Sistêmica – a presente classificação foi extraída das IV Dire- PAD PAS
trizes Brasileiras de Hipertensão Arterial que atualizou o III Classificação
(mm Hg) (mm Hg)
Consenso Brasileiro de Hipertensão Arterial de 1998 (quadro
2) (IV Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial, 2002) < 80 < 120 Ótima

Tabela 3. Classificação dos PRMs <85 <130 Normal


conforme o Consenso de Granada
85-89 130-139 Limítrofe
NECESSIDADE
PRM 1 O paciente não toma os medicamentos de 90-99 140-159 Hipertensão Leve (estágio 1)
que necessita
100-109 160-179 Hipertensão moderada (estágio 2)
PRM 2 O paciente toma medicamento que não
necessita >110 >180 Hipertensão grave (estágio 3)
EFETIVIDADE
<90 >140 Hipertensão Sistólica Isolada
PRM 3 O paciente toma um medicamento, que
estando indicado para sua situação, está
mal selecionado Nenhuma fonte de renda. Quanto ao nível de es-
PRM 4 O paciente toma uma dose inferior do colaridade, sete apresentam ensino fundamental incom-
medicamento indicado para sua situação pleto, dois com ensino médio incompleto e três são anal-
SEGURANÇA fabetos.
Os problemas de saúde relatados, durante a pri-
PRM 5 O paciente toma dose superior do medica-
meira visita foi de 5,08 para cada paciente (n=12). Os
mento indicado para sua situação
problemas de saúde relatados pelos pacientes na pri-
PRM 6 O paciente toma um medicamento que meira visita foram categorizados de acordo com os siste-
provoca uma reação adversa mas do corpo humano conforme Tabela 5.

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Tabela 5. Morbidades relatadas pelos pacientes prego dos anti-hipertensivos estão os diuréticos (34,48% -
com Hipertensão Arterial Sistêmica e Doenças 10/29), Inibidores da enzima conversora de angiotensina
Cardiovasculares durante o acompanhamento (24,14% - 7/29), antagonistas do cálcio (20,69% - 6/29), beta-
farmacoterapêutico na Primeira Visita bloqueadores (17,24% - 5/29) e antagonistas de angiotensi-
na (3,45% - 1/29). A monoterapia para a hipertensão foi ve-
Morbidades Frequencia Percentagem rificada em dois pacientes, sendo a droga utilizada perten-
Cardiovascular 24 39,3 cente ao grupo dos Inibidores da Enzima Conversora de
Endócrino 7 11,5 Angiotensina (IECA). Os demais pacientes fazem uso de
Gastrintestinal 3 4,9 associações.
Os resultados dos valores pressóricos dos paciente
Músculo-esquelético 12 19,7
na primeira visita e sua classificação conforme as IV Diretri-
Neurológico 5 8,2 zes Brasileiras de Hipertensão Arterial (2002)foram: dois pa-
Óculo-motor 5 8,2 cientes eram considerados Limítrofe, dois com hipertensão
Respiratório 2 3,3 leve (estágio I), cinco com hipertensão moderada (estágio
Tegumentar 1 1,6 II), três com hipertensão grave (estágio III). Em contrapar-
Urogenital 2 3,3 tida, na última e quarta visita, um paciente foi classificado
como limítrofe, quatro com hipertensão leve , cinco com
Total 61 100,0
hipertensão moderada e dois pacientes com hipertensão
Os problemas de saúde relatados pelos pacientes na grave.
quarta visita também foram categorizados. No entanto, não A média de PRMs por pacientes foi de 3,5 (n=12), os
constam dos dados atualizados de três pacientes que esta- quais foram classificadas conforme o Consenso de Granada
vam ausentes, no momento da visita (tabela 6). (Consenso, 1999) (Tabela 3). 42 PRMs detectados 30 (71,43%)
aparecem classificados como manifestados.
Tabela 6. Morbidades relatadas pelos pacientes Em relação às intervenções farmacêuticas foram rea-
com Hipertensão Arterial Sistêmica e Doenças lizadas 47 com uma média de 3,9 intervenções para cada
Cardiovasculares, durante o acompanhamento paciente. Das intervenções farmacêuticas, 14 (29,79%) rela-
farmacoterapêutico na quarta visita cionadas com a aderência ao tratamento, 28 intervenções
(59,56%) sobre educação e orientação das patologias apre-
Morbidades Frequencia Percentagem sentadas pelos pacientes, 2 (4,26%) orientação sobre poso-
Cardiovascular 18 33,3 logia e 1 (2,13%) orientação sobre a interrupção da utiliza-
Endócrino 5 9,3 ção de medicamentos sem prescrição médica e 2 (4,26%)
Gastrintestinal 2 3,6 orientações sobre dieta alimentar.
Músculo-esquelético 13 24,0
Tabela 7. PRMs detectados na primeira visita
Neurológico 4 7,4
Óculo-motor 5 9,3 Não
PRM Manifestado Total %
Respiratório 5 9,3 Manifestado
Tegumentar 1 1,9 1 5 0 5 11,90
Urogenital 1 1,9 2 1 0 1 2,38
3 18 2 20 47,62
Total 54 100,0
4 1 0 1 2,38
5 0 0 0 0
O número de problemas de saúde relatados, na últi- 6 5 10 15 35,72
ma e quarta visita, foi de 6,00 problemas por paciente (n=9).
30 12 42 100,0
Os problemas de saúde do sistema acompanhamento.
O número de medicamentos utilizados pelos pacien-
tes na primeira visita foi de 4,92 medicamentos por paciente 3.2 Verificação do Conhecimento sobre Medicamentos
(n=12) e, na última visita, a média foi de 5,78 medicamentos
por paciente (n=9). Os dados foram coletados de dez dos 12 pacientes,
Os medicamentos mais utilizados pelos pacientes, sendo oito do sexo feminino e dois do sexo masculino. A
de acordo com a primeira visita são os do sistema cardio- média de idade foi de 77 anos. A verificação do conheci-
vascular (38 – 64,41%). Os medicamentos anti-diabéticos mento sobre medicamentos foi realizada para todos os me-
utilizados foram 8 (13,56%), e no grupo de Outros, o total de dicamentos utilizados pelo paciente. A média de medica-
13 (22,03%) . mentos por paciente foi de cinco. Na tabela 8, estão os re-
Na categoria dos medicamentos do sistema cardio- sultados sobre a concordância entre a resposta do paciente
vascular, os medicamentos anti-hipertensivos representa- e a indicação terapêutica em relação ao nome do medica-
ram 76,32% (29/38). Em ordem decrescente quanto ao em- mento, dose, freqüência, indicação e reação.

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Tabela 8. Concordância entre a resposta 1993 a 1998, em Navarra, Espanha, onde os IECA represen-
do paciente e a indicação terapêutica tam 42% dos medicamentos empregados no tratamento da
Hipertensão (Martinez & Pascual, 1999).
Informação Freqüência - Percentagem Neste trabalho, o emprego da monoterapia foi restri-
Nome do medicamento 22 – 17,32 to a apenas dois pacientes, o que comprova a tendência de
Dose 15 - 11,81 se utilizar cada vez mais associações medicamentosas.
Akashi et al (1998) e Mion Jrmet et al (2001) confirmam a
Freqüência 44 – 34,65
tendência de se empregar as associações: IECA + diurético
Indicação terapêutica 43 – 33,86 e beta-bloqueador + diurético. As associações medicamen-
Reação adversa 3 – 2,36 tosas neste trabalho confirmam a presença predominante
dos diuréticos em quase todas associações, com exceção
Oito pacientes apresentaram nível insuficiente e dois de uma. Mas não se observa uma prescrição fixa em relação
pacientes têm nível bom sobre o conhecimento de medica- às associações e, sim, uma gama de varias combinações,
mentos. que estão vinculadas principalmente à experiência pessoal
do médico com o fármaco, as características do paciente e a
3.3 Avaliação da adesão à terapêutica eficácia das drogas (Mion Jr et al, 2001).
A média de PRMs apresentou um decréscimo em
Os dados foram coletados em nove dos 12 pacien- relação ao trabalho de Renovato (2002). Mas esse número
tes, sendo oito mulheres e um homem. A média de idade foi foi superior ao relatado por Garção e Cabrita (2002), onde
de 79 anos. foram detectados 34 PRMs para uma amostra de 41 indiví-
Nenhum paciente apresentou o nível elevado de ade- duos, o que resulta numa média de 0,82 PRMs por paciente.
rência ao tratamento. O nível mediano, que corresponde a Rossinholi et al (2002) verificaram que 70% dos pacientes
uma ou duas respostas afirmativas, foi encontrado no total com idade superior a 59 anos, ou seja 12 pacientes, apresen-
da amostra, os nove pacientes entrevistados. tavam PRM, enquanto que o grupo com faixa etária inferior
a 59 anos apenas 40% tiveram algum PRM detectado. A
4. DISCUSSÃO polifarmácia ou uso de muitos medicamentos é a principal
causa do número elevado de PRMs em idosos e devida-
4.1 Seguimento farmacoterapêutico mente comprovado neste estudo.
conforme a Metodologia Dáder Os PRMs 3 e 6 foram os mais detectados, coincidin-
do com os achados do trabalho de Renovato (2002). Rossi-
Em relação aos problemas de saúde, as morbidades nholi et al identificaram predominantemente em seus paci-
relatadas pelos pacientes não sofreram modificações se entes os problemas de efetividade (PRM 3 e 4). Em Garção e
comparadas ao trabalho de Renovato (2002), predominan- Cabrita (2002), os problemas de segurança foram mais iden-
do desordens do sistema cardiovascular e em seguida do tificados, seguidos pelos problemas de efetividade.
ssitema músculo-esquelético. A eficácia do tratamento anti-hipertensivo em ido-
O número de medicamentos por paciente foi de 4,92, sos foi um dos pontos de considerável reflexão levantadas
na primeira visita, o que comprovou aumento na média de neste trabalho. Cerca de 48% dos PRMs detectados refe-
medicamentos em relação ao resultado de Renovato (2002). rem-se à não eficácia do medicamento, sendo do tipo não
Rossinholi et al (2002) relatou que a média de medicamentos quantitativo. Mas o que seria um tratamento eficaz para um
em pacientes com mais de 59 anos foi de cinco medicamen- paciente idoso. Com exceção de um paciente, todos os de-
tos por pessoa. Ao término do projeto, a média parece mais mais apresentam níveis pressóricos acima de 140 /90 mmHg,
elevada, no entanto o número de pacientes visitados foi mesmo tomando medicamentos. Portanto, uma das saídas
menor, impossibilitando uma comparação mais criteriosa. seria aumentar a dose do medicamento, ou acrescentar mais
Os anti-ipertensivos mais utilizados pelos pacientes um medicamento ou trocar o medicamento.
deste estudo foram em ordem decrescente: diuréticos, inibi- No entanto, sabe-se que os parâmetros farmacoci-
dores da enzima conversora de angiotensina (IECA), anta- néticos de um idoso são diferentes de um indivíduo adulto.
gonistas de cálcio, beta-bloqueadores e antagonistas de Seu processo de biotransformação e excreção são mais len-
angiotensina. No trabalho de Garção e Cabrita (2002), os tos e, portanto, se a dose do medicamento fosse aumenta-
IECA são os mais utilizados, seguidos dos diuréticos. Akashi da, provavelmente a concentração plasmática do fármaco
et al (1998) encontrou resultados parecidos, onde os diuré- também aumentaria, e atingiria níveis tóxicos. Ou pelo me-
ticos foram os mais empregados, em seguida metildopa e nos, a incidência de reações adversas seria maior.
IECA. Psaty et al (2002) em um estudo com duração de 10 Outra possibilidade seria adicionar fármacos com me-
anos, comprovou que o uso de diuréticos e beta-bloquea- canismos de ação diferentes, que juntos teriam um efeito
dores têm diminuído, enquanto que agentes anti-hiperten- maior em regularizar a pressão arterial. Essa prática tem sido
sivos mais novos, como os IECA e antagonistas de cálcio, bastante adotada, pois apresenta resultados satisfatórios e
têm aumentado. O mesmo foi observado em um estudo que retarda, muitas vezes, processos que podem evoluir para
avaliou o consumo de anti-hipertensivos, no período de quadros mais graves, como a hipertrofia ventricular que pode

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culminar em insuficiência cardíaca. Mas, por outro lado, são diferentes, como a média de idade (57 anos) e número
sempre existe a possibilidade de que, ao se adicionar mais de medicamentos indicados (2,4 por pessoa). O nível de
um fármaco, o quadro de interações medicamentosas torna- escolaridade apresentou similaridade. Bernsten et al (2001)
se mais complexo, e as reações adversas são mais inciden- e Toledo et al (2001) relatam em suas metodologias o parâ-
tes, conforme comprovam os problemas de segurança iden- metro conhecimento dos medicamentos, no entanto não de-
tificados. claram como foram realizadas e, portanto, a comparação aos
Em um estudo de intervenção, realizado com idosos nosso resultados não foi possível.
não-institucionalizados, na Índia e Bangladesh, apenas 10% O nível insuficiente e o desconhecimento de menos
de todos os hipertensos apresentavam o quadro pressórico de 50% em todos os itens são preocupantes e requer estra-
controlado (WHO, 2001). O nível de normalização da hiper- tégias com o intuito de amenizar o deficit sobre o nível de
tensão com tratamento não é diferente desse estudo, como informação dos medicamentos cronicamente utilizados por
no Canadá, que apresenta 16% dos hipertensos com níveis esses pacientes.
pressóricos normais, Estados Unidos, 24%, Bélgica, 15,5% O nível de escolaridade, o processo de envelheci-
e Itália, 28% (Martinez & Pascual, 1999). Em outro estudo, mento e o número de medicamentos por paciente interferem
este realizado, no Brasil, chegou-se ao seguinte número: ape- negativamente quanto ao uso seguro dos medicamentos,
nas um terço dos 60% de pacientes que tomavam medicação requerendo muitas vezes o auxílio de terceiros, e configu-
anti-hipertensiva apresentava hipertensão controlada. rando em dependência. A adesão ao tratamento e a obten-
Mas neste trabalho foi considerado como hiperten- ção de uma hipertensão controlada são mais difíceis quan-
são controlada níveis pressóricos menores ou iguais que do o paciente desconhece itens fundamentais sobre o seu
160/90mmHg (Piccini & Victora, 1997). Portanto, se se apli- tratamento.
car as recomendações das IV Diretrizes Brasileiras de Hiper-
tensão Arterial, esse número seria mais reduzido ainda. 4.3 Avaliação da adesão à terapêutica
Mesmo diante do quadro configurado acima e dos
questionamentos levantados, o objetivo é claramente al- Os resultados de adesão à terapêutica mostram que
cançar os níveis pressóricos normais, pois segundo as IV os indivíduos integrantes desse estudo apresentam média
Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial, a redução di- adesão ao tratamento medicamentoso. Outro estudo (Pinto
minui drasticamente a mortalidade e morbidades relaciona- & Gondin, 2002) que empregou a mesma metodologia, veri-
das á hipertensão. ficou 42% de alta adesão, mas não relata a faixa etária do
A educação em saúde é parte integrante do proces- grupo pesquisado.
so de Atenção Farmacêutica, como afirma a proposta do A partir desses dados, é possível levantar alguns
Consenso Brasileiro de Atenção Farmacêutica. É importan- questionamentos. Os pacientes pesquisados têm conheci-
te ressaltar que o consenso obtido considera a promoção mento de sua doença, relatam ser cumpridores do tratamen-
da saúde, incluindo a educação em saúde, como compo- to, no entanto algumas características podem interferir para
nente do conceito de Atenção Farmacêutica, o que consti- a sua adesão.
tui um diferencial marcante em relação ao conceito adotado O deficit cognitivo interfere negativamente, pois o
em outros países (Consenso, 2002). esquecimento relatado por alguns pacientes dificulta a ade-
Dessa forma, as intervenções educativas foram prio- são e principalmente os níveis pressóricos não são reduzi-
ritárias na continuidade deste projeto. O maior enfoque em dos. O nível de conhecimento sobre os medicamentos con-
nossas visitas foi transmitir conhecimento sobre sua doen- juntamente com o nível de escolaridade e a polifarmácia
ça, orientar sobre o uso racional de medicamentos, sugerir constituem obstáculos para a tomada de medicamentos e a
dietas alimentares, quando necessário, e cuidados gerais prática de medidas não farmacológicas.
em relação à sua saúde. Foram preparados três folhetos Dessa forma, a Atenção Farmacêutica é o instrumen-
informativos. Um sobre Hipertensão, com o título “Viva a to eficaz para não só otimizar o tratamento farmacológico,
Hipertensão sem problemas”. O outro se refere ao Diabetes mas incentivar o paciente, respeitando sua individualidade
e tem o título de “Conhecendo o Diabetes”. O terceiro é a superar as dificuldades impostas pelo envelhecimento e
mais específico ainda, pois traz orientações sobre os cuida- co-morbidades, como o diabetes.
dos do pé diabético, visto que cinco dos 12 pacientes são
diabéticos. As orientações sobre dietas alimentares tam- 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
bém foram realizadas, sendo que duas de forma escrita.
A Atenção Farmacêutica em Hipertensão Arterial é
4.2 Verificação do conhecimento sobre medicamentos uma prática totalmente possível e capaz de produzir inúme-
ros resultados positivos, tanto para o paciente, como para o
Comparando com os resultados de Silva et al (2000), farmacêutico, que vê a possibilidade de exercer com mais
o nível de informação que garante o uso racional e seguro clareza sua função social. Nesse estudo que deu continui-
de medicamentos foi bem abaixo. No trabalho citado acima, dade a outra pesquisa (Renovato, 2002), muito mais dados
57% dos pacientes apresentaram nível regular, 34%, nível foram coletados. Diante desses dados, é possível desen-
bom e 9%, nível insuficiente. No entanto, algumas variáveis volver estratégias mais eficazes para garantir ao paciente

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não só melhoria da qualidade de vida, mas aprender a res- MARTINEZ, M.S & PASCUAL, C.A. Hipertensión Arterial:
peitar sua individualidade e compreender seu modo de en- Encuesta de actitudes em atención primaria y análisis
carar a vida. del consumo de antihipertensivos en Navarra (1993-
As intervenções educativas devem ser mais explora- 1998). Boletín de Información Farmacoterapéutica de
das, pois o compartilhar do conhecimento e das experiênci- Navarra, v. 7, n.3, 1999.
as, enriquece e fortalece a relação terapêutica. Não basta
MION JR, D. et al. Tratamento da Hipertensão Arterial –
apenas traçar diagnósticos e esquemas de tratamento, é
Respostas de Médicos brasileiros a um inquérito. Rev.
preciso aprofundar-se na essência do paciente com hiper-
Ass. Med. Brasil., v.47, n.3, p.249-254, 2001.
tensão, pois somente assim, será possível intervir com efe-
tividade e eficácia, e os resultados clínicos serão muito me- MORISKY, D.E et al. Concurrent and Predictive Validity of a
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onais de saúde serão fomentadas, construídas, descontru- so em /15/06/2003
ídas, com frustrações, derrotas, porém com novas possibili-
dades de vitórias. É preciso avançar! PICCINI, R.X. & VICTORA, C.G. How well is hipertension
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