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BROMATOLOGIA

Pryscila Gharib Nichelle


Introdução à bromatologia
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Identificar os princípios da bromatologia.


 Estabelecer a importância e a aplicabilidade da bromatologia.
 Construir os processos básicos que envolvem as análises dos alimentos.

Introdução
A bromatologia consiste no estudo dos alimentos. Mais especificamente,
é a ciência que estuda a composição química dos alimentos e as pro-
priedades físicas, toxicológicas e contaminantes, bem como avalia o valor
nutricional e calórico. Contudo, enfatiza os componentes centesimais,
presentes em maior quantidade nos alimentos, ou seja, em concentração
maior que 1%. Dessa forma, a bromatologia é um importante preditor
de qualidade e segurança dos alimentos.
Neste capítulo, você vai estudar sobre os princípios e a importância
da bromatologia, a diferença entre análise qualitativa e quantitativa e vai
entender os processos de análise química dos alimentos, bem como a
estatística aplicada à bromatologia.

Definições e princípios dentro da bromatologia


Bromatologia é a ciência que estuda a composição química dos alimentos
e a palavra tem origem grega: bromatos (alimento) e logia (estudo) (SILVA;
TASSI; PASCOAL, 2017).
Alimento é toda substância ou mistura de substâncias, no estado sólido,
líquido ou pastoso, destinadas a fornecer energia e elementos naturais para
a formação, o desenvolvimento e a manutenção do organismo. Os alimentos
podem estar nos estados natural, semi-industrializado ou industrializado
(SILVA; TASSI; PASCOAL, 2017).
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Princípios
Além de identificar a composição físico-química dos alimentos e seus valores
nutricionais, a bromatologia verifica se o alimento se encontra de acordo com
as legislações e se há presença de componentes que prejudiquem a saúde,
como adulterantes e aditivos prejudiciais. Isso viabiliza a tomada de decisão
e complementação de ações da Vigilância Sanitária no intuito de resolver
problemas de saúde pública (BOLZAN, 2013).
Com isso, existe atualmente uma conscientização geral atrelando a ali-
mentação de uma população com a frequência de determinadas doenças.
Estudos epidemiológicos mostram que existe uma correlação estatística entre
os recursos nutricionais disponíveis em determinadas regiões e a frequência
com que certas doenças se manifestam. O conhecimento dessas tendências
permite prevenir, minimizar seus danos e reeducar o povo quanto à sua ali-
mentação (SALINAS, 2002).
Outras faces da bromatologia dizem respeito à carga microbiológica e às
respectivas características, por exemplo, realizar contagem de coliformes
totais nos alimentos. Envolve também o estudo dos processos de produção
dos alimentos (SILVA; TASSI; PASCOAL, 2017).
Dentre os compostos químicos avaliados dos alimentos estão a água, os
carboidratos, as proteínas, os lipídios e os minerais. É também possível deter-
minar componentes mais individuais: metais, especialmente metais pesados
como chumbo e mercúrio, açúcares, como lactose, e aminoácidos específicos,
como lisina (BOLZAN, 2013).
Para tanto, a escolha da metodologia analítica é de fato imprescindível
para que os resultados das análises sejam fidedignos. Dessa forma, não basta
apenas um laboratório com equipamentos de ponta, deve-se haver concordância
entre o método e a análise desejada. Assim sendo, atualizações metodológicas
envolvidas na análise de alimentos são requeridas para acompanhar o avanço
tecnológico nessa área que vem crescendo significativamente, e é de especial
importância que estejam disponíveis em laboratórios de saúde pública (SILVA;
TASSI; PASCOAL, 2017).
Esses resultados são comumente utilizados pelas indústrias e outros órgãos
de interesse, sendo que verificar a eficiência dos processos, garantir a qualidade
e segurança dos alimentos e disponibilizar as informações nutricionais dos
alimentos para a população são os objetivos (CECCHI, 2007).
Dentro do contexto do estudo dos alimentos, existem dois tipos de análise
química: a qualitativa e a quantitativa. A primeira consiste em verificar a
presença ou ausência de certo componente, não levando em consideração a
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concentração dele na amostra. Sendo assim, os possíveis resultados serão:


positivo/negativo ou reagente/não reagente. Já na análise quantitativa, a con-
centração ou o teor do componente será determinado apresentando como
resultado um valor numérico quantificado por uma unidade de volume, de
massa ou de concentração (BOLZAN, 2013).
É importante mencionar que a bromatologia não envolve apenas uma área
de ensino, isto é, engloba diversas áreas de conhecimento, como, química,
botânica, bioquímica, biologia molecular, nutrição e zoologia. Portanto, é
válido que aqueles que desejarem estudar sobre a temática tenham a base
dessas ciências (BOLZAN, 2013).

Importância e aplicabilidade da bromatologia


Veja algumas especificações sobre a importância da bromatologia:

 Conhecer a composição da matéria-prima e do produto acabado.


 Segurança no consumo de alimentos.
 Determinar o padrão de identidade e qualidade dos alimentos.
 Controlar e garantir a qualidade da matéria-prima e do produto.
 Desenvolver novos produtos e padrões de qualidade.
 Conhecer os efeitos do processamento e da estocagem na qualidade
do produto.
 Estabelecer a composição nutricional nos rótulos.
 Obter dados para o planejamento dietético.
 Gerar banco de dados e validação de processo — criação de tabelas de
composição de alimentos (SILVA; TASSI; PASCOAL, 2017).

Como podemos ver, a análise de alimentos atua em diversos segmentos


dentro do controle de qualidade e todo o processo de fabricação e estocagem
dos alimentos. Além dessas importâncias, a determinação de alguns compo-
nentes individuais de alimentos por grupos de pessoas pode ser de grande
valia e estão descritos no Quadro 1 a seguir.
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Quadro 1. Importância dos componentes dos alimentos

Componente
Importância
do alimento

Açúcares As pessoas acometidas pelo diabetes devem


restringir a ingestão de açúcares.

Lipídios Alguns grupos específicos da população (por


exemplo, aqueles com elevada colesterolemia)
devem restringir a ingestão de gorduras.

Metais pesados Presentes como contaminantes nos alimentos, por


serem extremamente tóxicos, devem ser evitados.

Lactose Pessoas que sofrem de “intolerância à lactose” devem


evitar a ingestão de alimentos que contenham lactose.

Fenilalanina Pessoas que sofrem da doença genética chamada


fenilcetonúria devem restringir seu consumo durante
os primeiros anos de vida (a critério médico).

Lisina É considerado um aminoácido essencial, que pode sofrer


alterações químicas, por reações de escurecimento,
tornando-se nutricionalmente indisponível.

Fonte: Adaptado de Bolzan (2013).

Assim sendo, o controle de doenças metabólicas hoje é possível graças


aos recursos de que dispomos pelos avanços na bromatologia e na tecnologia
de alimentos.
Já a aplicação de análises de alimentos abrange basicamente três grandes
áreas: a indústria, as universidades e os institutos de pesquisa e os órgãos
governamentais (SILVA; TASSI; PASCOAL, 2017).
Nas indústrias ocorre o controle rígido de qualidade, desde o recebimento
da matéria-prima até a distribuição do produto final, sendo que este deve estar
em conformidade antes mesmo de ser comercializado, visando também à vida
de prateleira dos alimentos (CECCHI, 2007; SILVA; TASSI; PASCOAL, 2017).
Ademais, frequentemente é realizado investimento em pesquisas de novos
produtos e/ou no aprimoramento de produtos pelas indústrias. Assim sendo,
são necessárias novas análises acima nessas etapas (CECCHI, 2007; SILVA;
TASSI; PASCOAL, 2017).
Os processos analíticos nas universidades e institutos de pesquisa en-
volvem pesquisas de novos produtos e de novas metodologias, prestação de
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serviços e controle de qualidade de produtos já existentes (CECCHI, 2007;


SILVA; TASSI; PASCOAL, 2017).
Já nos órgãos governamentais a utilização se dá por fiscalização, registro e
controle de qualidade na produção dos produtos alimentícios, bem como padro-
nização de novos produtos (CECCHI, 2007; SILVA; TASSI; PASCOAL, 2017).

Classificação da análise de alimentos


A análise de alimentos pode ser classificada em três categorias:

1. Controle de qualidade de rotina: é utilizado para checar a matéria-


-prima e controlar o processamento e o produto acabado na indústria.
2. Fiscalização: é utilizada para verificar o cumprimento da legislação.
São utilizados métodos analíticos precisos e exatos, preferencialmente
oficiais. É realizada fiscalização, por exemplo, para verificar se ali-
mentos que dizem ser diet ou light realmente o são, verificar adição de
soda cáustica e água oxigenada no leite e verificar se o teor calórico
dos alimentos condiz com o que está no rótulo.
3. Pesquisa: utilizada para desenvolver ou adaptar métodos analíticos de
forma que sejam mais precisos, sensíveis, rápidos, simples e de baixo
custo na determinação de certo componente do alimento (FELTES et
al., 2016; BOLZAN, 2013).

De acordo com as fiscalizações, é possível identificar fraudes e adulterações


nos produtos alimentícios. Outros exemplos que normalmente são identificados
nas fiscalizações são: matéria-prima alterada ou impura; produtos coloridos
ou aromatizados sem autorização prévia e não constando a informação no
rótulo; data de fabricação alterada; conservação com substâncias proibidas;
entre outros (SILVA; TASSI; PASCOAL, 2017).

Por volta de 1820, já havia adulteração de alimentos, mas não como um fato relevante.
As adulterações intencionais começaram a ficar frequentes e sérias perto de 1920.
Nessa época, pressões regulatórias e métodos efetivos de detecção começaram a
reduzir a frequência das adulterações e melhoraram a segurança dos alimentos até
os nossos tempos.
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Estatística aplicada à bromatologia


Na análise bromatológica quantitativa, é imprescindível que os resultados sejam
expressos numericamente. Dessa forma, são necessários cálculos da média,
desvio padrão e “n”, útil para interpretação dos resultados finais (BOLZAN,
2013).
A média aritmética é a soma das determinações individuais do analito, o
qual é a substância da amostra que será alvo da análise química, realizada na
mesma amostra sob condições iguais, dividida pelo número de determinações.
Esse cálculo resultará no valor numérico central dos resultados.
O desvio padrão é calculado também a partir dos valores das várias de-
terminações individuais do analito, realizadas na mesma amostra sob as
mesmas condições. Ele indicará a variabilidade (dispersão) dos resultados
individuais em torno da média (aritmética) (SILVA; TASSI; PASCOAL, 2017;
BOLZAN, 2013).
O “n” representa o número de determinações individuais do analito realiza-
das na mesma amostra sob as mesmas condições. Normalmente, é necessário
grande número de repetições (determinações individuais) para obtenção de
resultados confiáveis (SILVA; TASSI; PASCOAL, 2017; BOLZAN, 2013).

Na determinação de açúcares redutores em sacarose em uma amostra de uvas cris-


talizadas, obteve-se o seguinte resultado:
 Açúcares redutores em sacarose = 23,44 ± 2,11 g% (m/m) × n = 5.
 Assim, o teor de açúcares redutores em sacarose na referida amostra foi de 23,44%
(média de cinco repetições) com desvio padrão (das cinco repetições) de 2,11 g%
(BOLZAN, 2013).

Constituintes dos alimentos


O conjunto de propriedades apresentadas por um alimento condiz com a
qualidade e a quantidade dos constituintes químicos presentes nele. Sabendo
disso, de modo geral, esses constituintes químicos dos alimentos podem ser
agrupados em duas categorias:
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1. Constituintes básicos ou nutritivos: nestes se enquadram a água, os


carboidratos, as gorduras, as proteínas, os minerais e as vitaminas.
2. Constituintes secundários: nestes se enquadram as enzimas, os ácidos
orgânicos, os compostos voláteis, os pigmentos, as pectinas, as subs-
tâncias aromáticas, etc. (COSTA et al., 2015, CECCHI, 2007).

Essas substâncias são responsáveis pelas características nutritivas e/ou


sensoriais dos alimentos, atuando de modo diverso (BOLZAN, 2013).
A análise de alimentos envolve o desenvolvimento dos métodos de identifi-
cação e técnicas adequadas com qualidade para uso no laboratório de controle,
assegurando, assim, uniformidade do alimento processado e melhorias futuras
de produtos (BOLZAN, 2013).
Sendo assim, existe uma tendência crescente de utilização de critérios
subjetivos de sabor, aroma, textura, cor e outras qualidades. Desse modo,
métodos de análise sensorial em alimentos estão aprimorando a introdução e
o desenvolvimento de testes sensoriais estatísticos (avaliação de cerveja, vinho
e café por métodos sensoriais). Contudo, alguns atributos dos alimentos, como
cor e textura, podem ser medidos objetivamente, enquanto outros, como o
aroma, não podem ser medidos por métodos químicos ou físicos, dependendo
de métodos sensoriais (SALINAS, 2002; SILVA; TASSI; PASCOAL, 2017).
A composição química de componentes voláteis e não voláteis, os quais
são responsáveis pelo aroma dos alimentos, ainda é pouco conhecida, no en-
tanto, novos métodos de separação por cromatografia gasosa vêm sendo uma
perspectiva futura de se conhecer a química dos constituintes flavorizantes
de produtos lácteos, vegetais, frutas, carnes e peixes (CECCHI, 2007; SILVA;
TASSI; PASCOAL, 2017).
Por outro lado, carboidratos, gorduras, óleos e proteínas são determinados
por reações características de certos componentes comuns e, muitas vezes,
a reação usada não tem um ponto final definido e é complicada por outras
reações simultâneas e consecutivas (SOUZA et al., 2015; SILVA; TASSI;
PASCOAL, 2017; CECCHI, 2007).
Ademais, existem métodos adicionais, bioquímicos, físicos, bacterioló-
gicos e biológicos para interpretar os resultados de forma exata. Para isso,
é necessário conhecer os processos envolvidos. Para determinados tipos de
alimento, existem métodos desenvolvidos empiricamente e que são mais
precisos ou reprodutíveis do que exatos ou corretos. A reprodutibilidade
de métodos desenvolvidos empiricamente, adaptados sob certas condições,
tem grande influência nos resultados (SOUZA et al., 2015; SILVA; TASSI;
PASCOAL, 2017)
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Adiante, o preparo de amostras para análise envolve a separação e a con-


centração do constituinte a ser determinado e a remoção dos elementos in-
terferentes que são os maiores responsáveis pela limitação dos métodos. Há
a necessidade de equipamentos de laboratório específicos para essas análises
(BOLZAN, 2013).

Profissional analista
É importante que o analista avalie o que é geral e o que é particular para que
procedimentos desnecessários sejam evitados. Ressalta-se que análises de
alimentos necessitam de organização, entendimento, clareza e que haja gestão
de qualidade do laboratório. Além disso, é importante a limpeza do laboratório,
a atenção escrupulosa às técnicas e a precisão dos resultados (BOLZAN, 2013;
SILVA; TASSI; PASCOAL, 2017).
É importante levar em conta a perecibilidade do produto analisado e sua
suscetibilidade às transformações química, bem como às variações das pro-
priedades física. Portanto, bons analistas devem ter características particulares,
com temperamento calmo (BOLZAN, 2013).
Essas transformações mais acentuadas que ocorrem nos alimentos não
processados, animais e vegetais se devem às rápidas alterações nas atividades
enzimáticas presentes nos tecidos e à deterioração microbiana, o que acaba
dificultando algumas vezes a acurácia da análise (COSTA et al., 2015).
A ocorrência de erros durante as análises químicas/bromatológicas é ine-
rente ao processo analítico, ou seja, sempre ocorrerão erros durante a realização
dos procedimentos, mesmo sob as mais adequadas condições de trabalho e
treinamento, utilizando as técnicas mais robustas e os equipamentos mais
modernos calibrados sob os mais criteriosos procedimentos (BOLZAN, 2013).
Dentro dessa perspectiva, resta ao analista a tarefa de minimizar ao má-
ximo a ocorrência desses erros, para que eles não afetem significativamente
os resultados finais da análise da amostra (BOLZA, 2013).
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BOLZAN, R. C. Bromatologia. Frederico Westphalen, RS: UFSM, 2013. Disponível em:


<http://estudio01.proj.ufsm.br/cadernos/cafw/tecnico_agroindustria/bromatologia>.
Acesso em: 27 set. 2018.
CECCHI, H. M. Fundamentos teóricos e práticos em análise de alimentos. 2. ed. Campinas,
SP: UNICAMP, 2007.
COSTA, W. D. et al. Análise físico-química, bromatológica e antibacteriana dos frutos de
Tamarindus indica linn. Cadernos de Cultura e Ciência, ano 10, v. 14 n. 1, p. 86-95, set. 2015.
FELTES, M. M. C. et al. Procedimentos operacionais padronizados de bromatologia de
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SALINAS, R. D. Alimentos e nutrição: introdução a bromatologia. 3. ed. Porto Alegre:
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SILVA, C. O.; TASSI, E. M. M.; PASCOAL, G. B. Ciência dos alimentos: princípios de Broma-
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SOUZA, A. V. et al. Caracterização bromatológica de frutos e geleias de amora-preta.
Revista Brasileira de Fruticultura, v. 37, n. 1, p. 13-19, mar. 2015.

Leitura recomendada
INSTITUTO ADOLFO LUTZ. Métodos físico-químicos para análise de alimentos. 4. ed. São
Paulo: Instituto Adolfo Lutz, 2008.
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