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CONCEITOS FUNDAMENTAIS
HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO NA INFÂNCIA
No período medieval a criança era valorizada apenas sob o ponto de vista de que ela existia para
a conservação dos bens e continuidade do agregado familiar, tendo que trabalhar desde cedo,
aprender os afazeres domésticos e valores humanos mediante a aquisição de conhecimento e
experiências práticas. O mundo das crianças concentrava-se em torno das mulheres no ambiente
doméstico. Não havia distinção entre crianças e adultos, usavam os mesmos tipos de trajes e de
linguagem, não existia um sentimento em especial aos mais novos, sendo esses a todo momento
forçados a ingressar o mais rápido possível na lógica de vida adulta. As pessoas eram instruídas
da mesma forma, independentemente da faixa etária, frequentavam a mesma sala de aula e
recebiam o mesmo ensinamento. O conceito de criança passa a se modificar com a Revolução
Industrial, com o Iluminismo e a constituição de Estados Laicos, porém somente as crianças da
elite passaram a receber cuidados e atenção em função da idade.
Ao longo do século XIX, a criança passou a receber mais atenção dos adultos em relação a
procedimentos educativos, sendo entendida como sujeito de necessidades, objeto de
expectativas e cuidados de preparação para o ingresso e sucesso no mundo dos adultos, o que
tornou a escola instrumento para tal. No entanto a escola não era uma instituição acessível a
muitos, pois o Estado priorizava a formação da elite. A criança pobre, nesse contexto, era
merecedora de piedade e, no Brasil, o atendimento às crianças de 0 a 6 anos se deu no final do
século XIX. Na zona rural, onde vivia a maior parte da população, as famílias de fazendeiros
assumiam o cuidado das crianças abandonadas, geralmente fruto da exploração sexual da
mulher negra e índia pelo senhor branco. Na área urbana, bebês abandonados, por vezes filhos
de moças pertencentes a famílias de prestígio social, eram recolhidos na roda dos expostos.
Essa situação modifica-se com a migração para a zona urbana; as cidades crescem, observam-se
iniciativas isoladas de proteção à infância a fim de combater as altas taxas de mortalidade
infantil, criando entidades de amparo. Nesse contexto, a abolição da escravatura trouxe
problemas, pois qual seria o destino dos filhos de escravos que, na maioria das vezes, eram
abandonados? Isso implicaria a criação de creches, asilos e internatos destinados a cuidar das
crianças pobres. Nesse sentido, a Educação Infantil evidencia em seu histórico a necessidade
como propulsora de seu surgimento, a saber, atender crianças que muitas vezes eram exploradas
ou abandonadas, e não o direito universal à educação.
Nessa época, as mudanças nas relações de trabalho vinham em função das transformações
sociais e da produção capitalista. Os operários exigiam condições menos precárias no trabalho,
jornada de oito horas diárias, salário, entre outros. Em razão das pressões desses e dos
sindicatos, alguns empresários começaram a dar benefícios aos seus empregados, sendo um
deles a creche no interior da fábrica. A recomendação da criação de creches junto às indústrias
ocorria com frequência nos congressos que abordavam a assistência à infância.
O movimento de luta por creches cresceu e se desenvolveu durante os anos 1970 e ao longo da
década de 1980, iniciado em São Paulo e, progressivamente, em outros estados brasileiros.
Surgiram também movimentos em torno da defesa dos direitos da criança na Constituinte de
1988, tal como abordaremos a seguir. Esses movimentos são resultado da crescente pressão das
mulheres trabalhadoras e das orientações feministas, muitas vezes ligadas às organizações
partidárias de esquerda, questionando os papéis dos homens e das mulheres na sociedade e,
também, o lugar da infância.
Desde a Constituição de 1988, definiu-se legalmente que os pais, a sociedade e o poder público
devem respeitar e garantir os direitos das crianças. É dever da família, da sociedade e do Estado
assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-las a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência e opressão. Dessas definições decorre que
creches e pré-escolas são direitos tanto das crianças quanto de seus pais, sendo instituições de
caráter educacional, e não simplesmente assistencial.
No entanto, a efetivação dessas funções depende de várias condições, dentre elas, as concepções
que orientam as práticas dos trabalhadores no dia a dia das instituições. É preciso ter claro o que
é colocado por diretrizes curriculares e combater preconceitos em relação ao cuidar na
Educação Infantil, que é tido muitas vezes como inferior ao educar, como sendo função de
quem não possui formação para exercer a docência e metodologias de antecipação da
escolaridade. A Educação Infantil decididamente não pode ser encarada pela ótica do
assistencialismo, isto é, a ideia de um local para que crianças permaneçam quando suas famílias
não podem estar com elas, tampouco pelo anseio de prepará-las para o Ensino Fundamental.
Orientação de estudo: leiam, estudem e observem que, em todos os textos, as ações de cuidar e
educar são discutidas. Sendo assim, tenham em mente as bases teóricas que sustentam essas
discussões.
O BRINQUEDO E A BRINCADEIRA
Até o Renascimento não existia um sentimento de infância, as crianças eram consideradas como
apêndices do universo feminino. Adultos e crianças compartilhavam os mesmos espaços e
atividades. Não havia uma concepção específica além das diferenças biológicas. A
institucionalização da infância ocorreu com o início da modernidade e foi realizada, como
afirma Manuel Jacinto Sarmento, por meio da conjugação de vários fatores. Um desses, a ser
destacado, refere-se à criação de instâncias públicas de socialização, seguido pela transformação
do modelo de família para um formato nuclear, da formação de um conjunto de saberes
normativos e, completando, a administração simbólica da infância por meio de regras e
instituições.
Todos esses fatores se desenvolveram e passaram por grandes transformações. A escola, que
não nascera inicialmente para as crianças, tornou-se espaço privilegiado de sociabilidade infantil
e de preparação para o novo mundo que surgia. A família foi perpassada por mudanças
profundas que alteraram o lugar da criança, retirando-a da periferia e levando-a para o centro de
suas preocupações e daquelas concernentes à Sociologia da Infância, com o advento dos estudos
sobre as culturas próprias das crianças.
A questão fundamental trazida por Sarmento no estudo das culturas da infância é a interpretação
da sua autonomia em relação aos adultos. As crianças realizam processos de significação e
estabelecem modos de monitorização da ação que são específicos e genuínos. O “mundo da
fantasia” das crianças constitui o modo de construção de significado pelas crianças. Essas
formas culturais nascem e se desenvolvem em modos específicos de comunicação
intrageracional e intergeracional. Sem prejuízo da análise dos fatores psicológicos e das
dimensões cognitivas e desenvolvimentais que presidem a formação do pensamento das
crianças, as culturas da infância possuem, primeiramente, dimensões relacionais, constituem-se
nas interações de pares e das crianças com os adultos, estruturando-se nessas relações formas e
conteúdos representacionais distintos.
As culturas da infância exprimem a cultura social em que se inserem, mas fazem-no de modo
distinto das culturas adultas, ao mesmo tempo em que veiculam formas especificamente infantis
de inteligibilidade, representação e simbolização do mundo. Há uma “universalidade” das
culturas infantis que ultrapassa consideravelmente os limites da inserção cultural local de cada
criança.
Nesse cenário, cabe ao professor ser sensível a uma configuração de família em rede que
proponha outro olhar sobre a mesma, contrariando a ideia de organização em núcleo. O conceito
de família em rede perpassa o ideário de família como existência da possibilidade de buscar
outras definições que, não se antecipando à sua própria realidade, permitam pensar como a
família se constrói, como constrói a noção de si mesma; sendo uma construção, como se dá na
cultura e, consequentemente, pelos sujeitos envolvidos em trama de relações.
Nesse sentido, algo que não deve ser desconsiderado são as discussões sobre gênero dentro de
uma cultura que celebra a diversidade como direito humano. Afinal, a inscrição do gênero nos
corpos é um processo decorrente do contexto de determinada cultura, sendo elemento
constitutivo de relações sociais com base nas diferenças que podem ser ressignificadas e
implicar certa subordinação de um gênero a outro porque nascemos biologicamente macho ou
fêmea, mas nos tornamos masculinos ou femininos nas relações sociais que ocorrem no interior
de redes de poder.
A escola, por sua vez, é a instituição responsável pela socialização do saber sistematizado, ou
seja, do conhecimento elaborado e da cultura erudita. De acordo com Saviani (2005), a escola se
relaciona com a ciência, não com o senso comum, e existe para proporcionar a aquisição de
instrumentos que possibilitam o acesso ao saber elaborado (ciência) e aos rudimentos (bases)
desse saber. A contribuição da escola para o desenvolvimento do sujeito é específica à aquisição
do saber culturalmente organizado e às áreas distintas de conhecimento. No que diz respeito à
família, “um dos seus papéis principais é a socialização da criança, isto é, sua inclusão no
mundo cultural mediante o ensino da língua materna, dos símbolos e regras de convivência em
grupo, englobando a educação geral e parte da formal, em colaboração com a escola”
(POLONIA; DESSEN, 2005, p. 304 apud OLIVEIRA; MARINHO ARAUJO, 2010).
Escola e família têm suas especificidades e complementariedades. Embora não se possa supô-
las como instituições completamente independentes, não se pode perder de vista suas fronteiras
institucionais, ou seja, o domínio do objeto que as sustenta como instituições. Esses dois
sistemas têm objetivos distintos, mas que se interpenetram, uma vez que “compartilham a tarefa
de preparar as crianças e os jovens para a inserção crítica, participativa e produtiva na
sociedade” (REALI; TANCREDI, 2005, p. 240 apud OLIVEIRA; MARINHO ARAUJO,
2010). A divergência entre escola e família está na tarefa de ensinar, sendo que a primeira tem a
função de favorecer a aprendizagem dos conhecimentos construídos socialmente em
determinado momento histórico, de ampliar as possibilidades de convivência social e, ainda,
legitimar uma ordem social, enquanto a segunda tem a tarefa de promover a socialização das
crianças, incluindo o aprendizado de padrões comportamentais, atitudes e valores aceitos pela
sociedade.
Orientações de estudo: prestem atenção ao conceito de criança trazido pelos textos, à questão
da Pedagogia da Infância, às competências das famílias e à relação escola-pais-sociedade.
Nas DCNEI (2010) e no Parecer nº 7/2010, que trata das Diretrizes Curriculares Nacionais
Gerais para a Educação Básica, o cuidado e a educação são destacados como fundamentais para
a formação humana, pois “educar exige cuidar” e o cuidado refere-se ao “acolhimento das
crianças, jovens e adultos”. De acordo com essas diretrizes, é importante assegurar “a educação
em sua integralidade, entendendo o cuidado como algo indissociável ao processo educativo”
(BRASIL, 2010, p. 19). A indicação é de que “cuidar e educar inicia-se na Educação Infantil;
são ações destinadas a crianças a partir de zero ano, que devem ser estendidas ao Ensino
Fundamental, Médio e posteriores” (PARECER, 2010, p. 12).
Dessa forma, dediquem-se à leitura dos textos-base. O texto 1, “Professoras de educação infantil
e saber docente”, tem por finalidade relacionar os estudos sobre saber docente com o campo da
Educação Infantil. Primeiramente identifica os profissionais que atuam em creches e pré-escolas
e as exigências legais estabelecidas recentemente, que indicam um novo perfil profissional.
Além disso, discute o saber docente como uma categoria de análise da prática e de
conhecimentos dos professores de crianças de 0 a 6 anos, buscando contextualizar a perspectiva
docente na Educação Infantil. Por fim, afirma a importância de se investigar o saber prático das
professoras desse segmento educacional, bem como de se repensar as propostas de formação
continuada para as professoras, a fim de que proporcionem espaços para reflexão sobre a
própria prática.
Orientações de estudo: assista aos vídeos e leia as seções aprofundando o tema, pois esses
materiais completam e complementam os conteúdos dos textos-base, enriquecendo os seus
saberes e conhecimentos.
[1]A BNCC atual não invalida os documentos e leis que já estão postos, portanto, as diretrizes
educacionais anteriores a Base continuam valendo. Assim, a BNCC propõe um conjunto de
orientações às equipes pedagógicas para a elaboração dos currículos.