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Contextualização
Quando falamos em currículo, normalmente o que nos vem à mente são teorias e pesquisas
que possibilitaram a formação de uma linha de pensamento e de trabalho pedagógico, embasado
em técnicas e métodos usualmente utilizados para facilitar a aprendizagem do aluno. Falar em
currículo na Educação Infantil causa estranheza em muitas pessoas, até mesmo da área da
educação.
Nosso objetivo é permitir que você desenvolva conceitos relativos à infância e a educação nesta
faixa etária, discutindo as bases teóricas para esta educação, contextualizando nesta unidade
de estudos a trajetória histórica da Educação Infantil, no que diz respeito ao atendimento pré-
escolar no Brasil.
Você já havia pensado nisso? Prepare-se para esta viagem.
Bons estudos a você!
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Conteúdo Teórico
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Unidade: História da Educação Infantil
Leia o que diz a LDB, na seção II, sobre a inclusão da Educação Infantil na Educação Básica::
Art. 29. A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade
o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico,
psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade.
Cabe ressaltar que, embora o artigo 29 destaque o atendimento da criança até seis anos, a
partir de 06 de fevereiro de 2006, a Lei 11.274 regulamentou o Ensino Fundamental de 9 anos,
com o ingresso das crianças com seis anos no 1º ano do Ensino Fundamental, o que nos deixa
na educação infantil com crianças até cinco anos.
Esta preocupação com a formação integral da criança, com o atendimento e desenvolvimento
físico, psicológico, intelectual e social, assim como a participação da família e da comunidade,
é muito recente. Nem sempre foi assim. Para que você entenda os fundamentos metodológicos
que nos orientam no trabalho neste nível de ensino atualmente, assim como as mudanças que
ocorreram nas políticas educacionais e nas práticas pedagógicas da educação infantil, é preciso
saber como tudo começou.
Podemos estabelecer uma linha do tempo desde as primeiras experiências de atendimento às
crianças até a criação das escolas municipais de educação infantil.
Embarque no trem da história e vamos viajar um pouquinho no tempo, para entender como
foi construída a história da Educação Infantil.
Criação/Objetivos
A História da Educação Infantil em nosso país apresenta muitos traços comuns com a da
Europa Ocidental, embora apresente características próprias, decorrentes de nossas condições
sociais, culturais, econômicas e políticas. O atendimento de crianças pequenas longe da mãe
em instituições como creches ou parques infantis, até meados do século XIX, basicamente não
existia no Brasil. No meio rural, onde residia a maior parte da população do país na época,
as mães de alguma forma conciliavam trabalho e cuidado dos filhos. As crianças órfãs ou
abandonadas, frutos em geral da exploração sexual da mulher negra e índia pelo senhor branco,
eram acolhidas pelas famílias de fazendeiros. Já na zona urbana, bebês abandonados por suas
mães, em geral filhos ilegítimos, por vezes de moças de famílias de algum prestígio social, eram
recolhidos nas “rodas de expostos” existentes em algumas cidades.
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Você já ouviu falar da roda dos expostos?
Explore
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Roda_dos_expostos
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Unidade: História da Educação Infantil
Nesse contexto, foram criados em 1875, no Rio de Janeiro, e em 1877, em São Paulo, os
primeiros jardins de infância, sem participação do governo, pois estavam sob os cuidados de
entidades privadas. Somente alguns anos depois, em torno de 1896, foram criados os primeiros
jardins de infância públicos, como o que ficava anexo à Escola Caetano de Campos em São
Paulo. O que se percebia, porém era uma mudança de foco no atendimento, pois tanto os
jardins de infância criados pela iniciativa privada como os criados pela iniciativa do governo
dirigiam seu atendimento para as crianças das camadas sociais mais afortunadas e não mais os
desfavorecidos. Este atendimento seguia o desenvolvimento de uma programação pedagógica
inspirada em Froebel, pedagogo alemão que teve grande influência no desenvolvimento da
educação infantil.
Explore
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Frederick-Froebel-Bardeen.jpeg
Enquanto isso, prevaleciam na educação pré-escolar posições que se arrastam até hoje: a de
realizar assistencialismo e a de promover uma educação compensatória aos mais desafortunados
socialmente. Pensar um ambiente promotor da Educação das crianças dos diferentes grupos
sociais era meta colocada com dificuldade.
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Mudanças no trabalho feminino
Os movimentos operários
No início do século XX, a absorção pelas fábricas da mão-de-obra de imigrantes europeus
que chegavam ao Brasil, em geral jovens e do sexo masculino, trabalhadores mais politizados
pelo contato com movimentos que ocorriam em diversos países, provocou uma diminuição
da participação da mulher no setor operário. Apesar disso, o problema da mulher operária
em relação a seus filhos pequenos começou a ser visto de forma nova, em consequência do
movimento operário surgido na década de 1920 e início dos anos 30. Os imigrantes procuravam,
nos sindicatos, organizar os demais operários para lutarem por seus direitos e protestarem contra
as condições precárias de trabalho e de vida a que se achavam submetidos: baixos salários,
longas jornadas de trabalho, ambiente insalubre, emprego de mão-de-obra infantil. Nesse clima,
muitas mulheres operárias também começam a se politizar e a exigir seus direitos, o que incluía
não só melhores condições de trabalho, mas também de vida. Isso levou-as a pleitear a criação
de locais para guarda e atendimento das crianças durante seu trabalho.
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Unidade: História da Educação Infantil
No Brasil, nas décadas de 1920 e 1930, alguns centros urbanos que se industrializavam não
dispunham de infraestrutura como saneamento básico, moradias etc. Esse fato aumentava o
perigo de constantes epidemias, o que exigia soluções para este e outros problemas. A creche
seria um dos paliativos defendidos por médicos preocupados com as condições de vida da
população operária, que, em geral, morava em ambientes insalubres.
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Nesse período de renovação do pensamento educacional, entre outros pontos, discutia-se a
Educação pré-escolar, apresentada como a base do sistema escolar. Alguns educadores brasileiros
de vanguarda, como Mário de Andrade, em São Paulo, propunham a disseminação de praças
de jogos nas cidades, à semelhança dos jardins de infância de Froebel, assim como ocorria em
vários locais da América Latina, como Havana, Buenos Aires, Montevidéu e Santiago. Tais
praças deram origem aos parques infantis criados em várias cidades brasileiras.
Nota-se o dualismo, a divisão de princípios com que a questão educacional era tratada no
país: o debate sobre a renovação pedagógica dirigiu-se mais aos jardins de infância - onde
estudavam preferencialmente as crianças socialmente privilegiadas - do que aos parques infantis
- onde as crianças de classes populares eram submetidas a propostas de trabalho educacional
que pouco tinham em comum com as ideias dos adeptos do escolanovismo.
Em nosso país, a década de 1940 foi marcada por iniciativas governamentais nas áreas de
saúde, previdência e assistência.
O governo Vargas (1930-1945), ao mesmo tempo que resguardava os interesses dos patrões,
reconhecia alguns direitos políticos dos trabalhadores por meio de legislações específicas, como
a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de 1943. Nesta foram apresentadas algumas
propostas sobre o atendimento dos filhos das trabalhadoras, porém somente com o objetivo de
facilitar a amamentação durante a jornada de trabalho.
A cultura desta época mostrava um pensamento geral de que a mãe continuava sendo a
dona do lar e deveria estar limitada ao ambiente doméstico. O atendimento fora da família aos
filhos que ainda não frequentassem o ensino primário era vinculado a preocupações médicas, e
não a metas de desenvolvimento pessoal.
As creches eram vistas como “mal necessário” e planejadas por entidades filantrópicas,
como instituição de saúde com rotinas de triagem, lactário, pessoal auxiliar de enfermagem,
cuja preocupação estava centrada em apresentar um ambiente físico higiênico, para promover
o aleitamento materno e combater a mortalidade infantil. Em sua maioria, estas entidades
passaram a receber ajuda governamental para desenvolver seu trabalho, além de donativos das
famílias mais ricas.
Assim, o trabalho com as crianças nas creches tinha caráter assistencial-custodial, voltado para
alimentar, cuidar da higiene e da segurança física das crianças. A Educação e o desenvolvimento
intelectual das crianças eram pouco valorizados.
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Unidade: História da Educação Infantil
Artigo 24 - As empresas que tenham a seu serviço mães de menores de sete anos
serão estimuladas a organizara manter, por iniciativa própria ou em cooperação com
os poderes públicos, instituições de Educação pré-primária.
Imperavam, contudo, soluções paliativas. No período dos governos militares, que se instalaram
no país a partir de 1964 até o início de 1985, as políticas adotadas em nível federal - por meio
de órgãos como a Legião Brasileira de Assistência e a Funabem - continuaram a acentuar a
ideia de creche, e mesmo de pré-escola, como equipamentos sociais de assistência à criança
carente. A política de ajuda governamental às entidades filantrópicas ou assistenciais continuou
a prevalecer. Foram incentivadas iniciativas comunitárias mediante a organização de programas
emergenciais de massa, de baixo custo. Eles eram desenvolvidos por pessoal leigo, voluntário e
por mães que cuidavam de turmas de mais de cem crianças em idade pré-escolar.
Por outro lado, as mudanças na Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), ocorridas em
1967, estabeleceram que as empresas deveriam organizar berçários para o atendimento aos
filhos das trabalhadoras. Isso abriu espaço para que outras entidades, que não a própria
empresa empregadora da mãe, realizassem a tarefa por meio de convênios. Contudo, o
poder público não cumpriu o papel de fiscal da oferta de berçários. Assim, as empresas
não instituíram creches e berçários suficientes, prejudicando o ingresso de mulheres, em
especial as de baixa renda, no mercado produtivo, ou mantendo alternativas improvisadas
de atendimento aos filhos das mães trabalhadoras.
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A década de 1970: educação compensatória, aumento de demanda e
redemocratização
Nesse período, muitos fatores contribuíram para que a creche e a pré-escola fossem novamente
defendidas por diversos segmentos sociais. Entre eles, a redução de espaços urbanos lúdicos,
como os quintais e as ruas, a preocupação com a segurança e, fundamentalmente, o crescimento
do operariado, os movimentos dos trabalhadores do campo por melhores condições de trabalho,
bem como a crescente incorporação de mulheres da classe média pelo mercado de trabalho.
A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional formulada em 1971 Lei n.° 5.692/71
trouxe novos elementos para a área do ensino ao declarar: “Os sistemas velarão para que as
crianças de idade inferior a 7 anos recebam Educa-ção em escolas maternais, jardins de infância
ou instituições equivalentes”.(art.19,§2º)
Alguns estudos realizados nos Estados Unidos e na Europa trouxeram novas concepções
pedagógicas que sustentavam que as crianças das camadas sociais pobres sofriam de “privação
cultural” e, assim, justificavam seu fracasso escolar. A partir disso, no Brasil passaram a ser
realizados debates vigorosos em defesa do atendimento pré-escolar público, o qual, em virtude
de receber uma clientela pobre, poderia remediar as carências dessas crianças. Uma vez que
fossem atendidas em creches, parques infantis e pré-escolas, conseguiriam superar as condições
desprivilegiadas em que viviam, ainda que não fossem alteradas as estruturas e razões sociais
que geravam esses problemas.
Por outro lado, cada vez um número maior de mulheres das camadas médias da população
entravam no mercado de trabalho, o que levou a um crescimento significativo de creches
e pré-escolas, principalmente as de redes particulares. Estas instituições respondiam ao
desejo dessas mães, tendo em vista que ofereciam aprimoramento intelectual a seus filhos e
as liberavam para o mercado de trabalho. Nelas era mantido um padrão educativo voltado
para os aspectos cognitivos, emocionais e sociais da criança pequena, com destaque à
criatividade e à sociabilidade.
Você deve estar percebendo que estes fatores trouxeram alterações na forma como a
Educação pré-escolar e o atendimento em creches eram efetivados. A consequência foi um
aumento de creches, de classes pré-primárias e de jardins de infância no país, bem como foram
sendo modificadas algumas representações sobre Educação Infantil. Também foi valorizado o
atendimento fora da família a crianças de idade cada vez menor.
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Unidade: História da Educação Infantil
Em parques que atendiam filhos de operários e em creches que cuidavam das crianças de
famílias de baixa renda permaneciam discursos compensatórios ou assistencialistas. Já nos
jardins de infância, onde eram educadas as crianças de classe média, eram adotadas propostas
de desenvolvimento afetivo e cognitivo. A superação desta desigualdade de acesso aos benefícios
da Educação da criança pequena continuava uma tarefa difícil.
Na segunda metade da década de 70, a luta de movimentos operários e feministas pela
redemocratização do país e pelo combate às desigualdades sociais levou o regime militar a adotar
medidas para ampliar o acesso da população pobre à escola (pré, primeiro e segundo graus) e
sua permanência nela, para garantir os aprendizados básicos. Enquanto isso, nos grandes centros
urbanos, a reivindicação por creches e pré-escolas por parte de amplas parcelas da população
de mães, que precisavam trabalhar fora do lar pela subsistência da família, intensificou-se e
adquiriu novos sentidos. Tais movimentos substituíram a histórica postura de aceitação do
paternalismo estatal ou empresarial por uma visão da creche e da pré-escola como um direito
do trabalhador e um dever do Estado. Isso criou novas formas de pressão sobre o poder público,
que, naqueles centros, ampliou o número de creches por ele diretamente mantidas e geridas e
o número de convênios de atendimento feito com entidades sem fins lucrativos.
Na década de 1980, o aumento de procura por pré-escola por parte da população continuou a
intensificar-se, pressionando os órgãos governamentais. Com o término do período de governos
militares, em 1985, novas políticas de Educação passaram a admitir a ideia de que as creches
não diziam respeito apenas à mulher ou à família, mas também ao Estado e às empresas.
Diversos discursos políticos apresentavam a Educação pré-escolar como instrumento de preparo
para a escolarização obrigatória, por influência de concepções expressas pelas camadas médias
da população. E cada vez mais as camadas de baixa renda apoiavam essa ideia.
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Ao mesmo tempo, os educadores envolveram-se em discussões e questionamenos
políticos sobre o atendimento às crianças, pois os mesmos acreditavam que o trabalho
realizado em creches e pré-escolas poderia efetivamente contribuir para promover a luta
contra desigualdades sociais.
Ainda assim havia insuficiência de vagas em creches. Diante disso, o poder público incentivou
outras iniciativas de atendimento à criança pequena. Foram implementados programas
assistenciais de baixo custo, estruturados com auxílio de recursos comunitários, tal como ocorria
em muitos países do chamado Terceiro Mundo. Eles eram realizados por “mães-crecheiras”
ou “lares vicinais”, “creches domiciliares” ou “creches lares”. Essas formas de atendimento,
que havia muito a comunidade carente já utilizava, constituíam alternativas emergenciais e
inadequadas, devido à precariedade com que geralmente eram realizadas.
Redemocratização e crescimento
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Unidade: História da Educação Infantil
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Em Síntese
Pela leitura realizada, você pôde perceber e analisar como era oferecida a educação aos pequenos no
Brasil, cujo objetivo inicial era proteger e assistir. Conheceu o movimento de inserção das mulheres
no mercado de trabalho, o que pedia locais para deixarem seus filhos, muito combatidas pelos
empresários. Passamos a partir da década de 20 por políticas assistencialistas, que focavam na
saúde das crianças, sua inserção no sistema de ensino com uma educação compensatória, chegando
à democratização do país, com um aumento de procura de vagas para as crianças das mulheres
trabalhadoras. O discurso pedagógico para esta faixa etária é intensificado, porém a expansão de
atendimento ainda é insuficiente para a procura.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96 - foi muito importante para a
educação infantil, fazendo com que os profissionais envolvidos com este nível de ensino reivindicassem
mais verbas e mais programas de formação profissional para os professores da Educação Infantil.
Mesmo com todo envolvimento e comprometimento, ainda há muito a se realizar na superação
de políticas assistencialistas e em uma transformação de práticas didáticas em creches e pré-
escolas. É necessário trilhar coletivamente uma nova trajetória para aperfeiçoá-las por meio da
formação continuada.
Com estas reflexões você chegou aos nossos dias, ao trabalho realizado hoje na educação
infantil, enxergando nossa realidade com conhecimento dos caminhos trilhados para chegarmos
até aqui. Assim, você poderá entender um pouco mais sobre os fundamentos metodológicos da
educação infantil.
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Unidade: História da Educação Infantil
Material Complementar
Para aprofundar seu conhecimento sobre o tema desta unidade, seguem sugestões de
leituras complementares:
Explore
Navegue pelo livro e procure pontos de interesse para sua aprendizagem. O capítulo 1 é especialmente
interessante, pois a autora trata dos assuntos discutidos nesta unidade.
2) Leia o artigo sobre John Dewey e a escola nova, movimento que influenciou o crescimento em
defesa da educação e consequentemente da educação infantil.
http://revistaescola.abril.com.br/historia/pratica-pedagogica/john-dewey-428136.shtml
3) OLIVEIRA, Zilma Ramos de. Educação infantil: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez,
2002 (Coleção Docência em Formação)
Leia especialmente o capítulo V deste livro, intitulado: “Os primeiros passos da história da educação
infantil no Brasil”.
Embora não esteja disponível na biblioteca virtual, pode ser encontrado nas bibliotecas das
universidades ou livrarias.
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UNIDADE Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil
Concepção de Currículo
Todas as pessoas envolvidas com educação sejam docentes, alunos, governantes
ou profissionais, embora por diferentes objetivos ou motivações, preocupam-se com
a maneira como a educação de crianças e jovens está acontecendo, uma vez que se
desenvolverá, por meio dela, o projeto de formação da sociedade. Espera-se que a
educação dê conta da formação integral dos alunos. Essas reflexões acabam refletindo
na busca de teorias que enfocam as questões curriculares, ou seja, com o currículo
trabalhado nas escolas.
Figura 1
Fonte: Getty Images
Se você pesquisar o significado desta palavra, encontrará, entre outros, que currículo
– do latim, curriculum – significa percurso, carreira, curso, ato de correr. Seu signi-
ficado, porém, abrange não somente o ato de correr, mas também o modo, a forma
de fazê-lo (a pé, de carro, a cavalo etc.), o local (estrada, pista, rua, hipódromo etc.) e
o que ocorre no curso ou percurso efetuado.
Moreira (1999) mostra que se encontram registros, ao longo dos tempos, de signi-
ficados diferentes para o termo currículo. A maioria diz respeito a currículo como “con-
teúdos” ou “experiências de aprendizagem”. Alguns registros mostram o currículo ligado
à ideia de plano, objetivos educacionais ou texto e mais recentemente como avaliação.
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Seguindo o significado literal da palavra currículo,
[...] pode-se dizer que este pode ser definido como o percurso que leva à
aquisição de conhecimentos que possam fazer do indivíduo submetido a
ele um profissional que domina sua área e está apto a exercer funções na
mesma. (MOREIRA; SILVA, 2000)
Tratando-se de um percurso, você deve ter percebido que pode se tratar de algo
parado e fixo, porém, flexível e contínuo, que direcione as atividades envolvidas nesse
percurso para o objetivo da educação, que é a aprendizagem e o crescimento dos alunos.
A maneira como a educação formal se apresenta teve diversas mudanças ao longo do tempo.
De perspectivas mais rígidas até modelos mais dinâmicos, a educação se apresentou se
diversas maneiras e gerou diferentes percepções sobre sua estruturação.
Saiba mais sobre o tema lendo a matéria “Percurso formativo: entre o tradicional e o
disruptivo”, disponível no link: https://bit.ly/374su3J
O currículo não pode, portanto, ser estático deve estar sempre em construção,
uma vez que deve acompanhar as mudanças e necessidades de cada aluno, de cada
escola. Não se pode pensar em elaborar um currículo, determinando o que, quando
e como ensinar sem pensar no “para quem” e “onde”, elementos importantíssimos
na determinação da organização curricular.
Você deve estar pensando, então, que o currículo é muito mais abrangente em
termos de aprendizagem, devendo realmente se preocupar com a maneira como
serão organizadas as atividades, os conteúdos e conhecimentos, de forma que os
objetivos previstos em determinado curso possam ser alcançados.
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UNIDADE Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil
Você deve refletir sobre a questão do currículo como uma organização de dife-
rentes elementos que devem incluir disciplinas, conteúdos, atividades, pesquisas,
discussões, dinâmicas, técnicas, métodos e recursos, que permitam ao aluno alcan-
çar a aprendizagem. Deve ser rico e flexível nas oportunidades de aprendizagem
oferecidas aos alunos.
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inclui um conjunto de experiências de aprendizagem que visam favorecer a assimilação
e a reconstrução desses conhecimentos (MOREIRA, 1999, p. 12).
Piletti nos mostra que nos últimos anos, a ideia de currículo se tornou mais rica
e abrangente:
A tendência, nas décadas recentes, tem sido de usar o termo currículo
num sentido mais amplo, para referir-se à vida e a todo o programa da
escola, inclusive às atividades extraclasses. Aliás, as atividades extraclas-
ses são muito importantes para a formação da personalidade da criança.
Elas enriquecem o plano escolar e, consequentemente, a personalidade da
criança. Além disso, são uma importante fonte de motivação. (PILETTI,
2000, p. 52)
Você deve estar se perguntando por que estudar currículo para desenvolver seu
trabalho na Educação Infantil. Realmente, falar em Currículo em Educação Infantil
causa estranheza em muitas pessoas, até mesmo da área da educação. Mas, como
primeira etapa da educação básica, destinada ao atendimento de crianças de zero
a cinco anos e definitivamente inserida no sistema educacional brasileiro, é preciso
proporcionar à criança dessa faixa etária o bem-estar físico, afetivo-social e intelec-
tual, por meio de atividades lúdicas que criem oportunidades de desenvolvimento, a
fim de estimular a curiosidade, a espontaneidade e a harmonia. Todas essas ativida-
des contribuem para a sua integração no triângulo família – escola – comunidade, e
serão desenvolvidas a partir do currículo adotado.
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UNIDADE Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil
Assim pensando, mesmo nossa disciplina estando focada no trabalho com crianças
entre zero e cinco anos, como professor você deve ter uma postura que privilegie a
construção de um currículo que possa realmente auxiliar nossas crianças a aprender,
crescer, e a se desenvolver. Independentemente do nível de ensino ou da idade de
seus alunos, você deve não somente no que diz respeito a conteúdos, mas como seres
humanos, cidadãos prontos a levar para fora da escola as lições de vida que certamente
podemos vivenciar juntos.
Portanto, a postura do docente, a forma como ele vê seus alunos, como desenvolve
sua prática, como acredita ou não na educação como instrumento de crescimento e
transformação, vai influenciar na elaboração do currículo a ser trabalhado e na sua
prática pedagógica.
Figura 2
Fonte: Getty Images
Para isso, é preciso que você saiba quem são as crianças que recebemos nas es-
colas de educação infantil e como essas crianças aprendem.
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O vídeo “Currículo na Educação Infantil: definições legais” apresenta as definições jurí-
dicas e as possibilidades acerca do conceito de currículo. O vídeo faz parte do Programa do
Curso de Pedagogia Unesp/Univesp, integrante da disciplina de Educação Infantil, e está
disponível no YouTube pelo link https://youtu.be/xgWFOKF-4oQ
Ao trabalhar com educação infantil, você vai perceber que as crianças vêm de dife-
rentes formações familiares, situações socioeconômicas, culturas ou regiões. Além disso,
são crianças que vivem em um mundo globalizado e, portanto, têm grande capacidade
de observação e de intervenção.
Por esses motivos, o trabalho com Educação Infantil pede atenção especial às
interações que se estabelecem envolvendo a criança, pois, a partir delas, pode-se
facilitar ou dificultar tanto a aprendizagem quanto o desenvolvimento dos pequenos.
Interações Pessoais
A criança não é um corpo a ser mantido limpo sob uma cabeça a ser mantida ocu-
pada, como muito já se pensou. Ela é uma totalidade que integra aspectos físicos, afe-
tivos e cognitivos, que tomam sentido através da linguagem e da cultura. Suas relações
com outras pessoas, sejam pessoas adultas ou crianças, são oportunidades para que ela
se constitua como sujeito único, com uma forma toda particular de reagir às situações.
Uma educação que cuida da criança dá atenção constante a todos esses aspectos.
A Educação Infantil deve criar para cada criança múltiplas oportunidades para
que ela possa se expressar e respeitar os sentimentos, ideias, costumes e preferências
do outro. Deve garantir, ainda, que cada criança seja aceita com suas características
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UNIDADE Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil
“Interagir com a criança é muito importante para o seu desenvolvimento”, diz pedia-
tra americana – Leia em: https://bit.ly/2Y1d0td
Interações Educador-Criança
Sabemos que as brincadeiras e os jogos infantis são fundamentais para o desen-
volvimento e a aprendizagem da criança. Eles são recursos privilegiados que devemos
garantir enquanto direitos da infância. Mas, neste processo, qual o papel do educador?
Figura 3
Fonte: Getty Images
Quando a criança brinca, é muito comum ouvirmos frases do tipo: “ela está
apenas brincando, não é sério!” Ou, no outro extremo: “por que você não brinca
disto? E agora daquilo outro?...”. Esses são exemplos de atitudes que não colocam
o educador como parceiro e interlocutor da criança: ou ele se afasta ou dita regras.
Mas qual será a medida?
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O primeiro passo é entendermos que a brincadeira é um ritual interativo (por
exemplo, quando o adulto se esconde atrás de um pano e diz: “achou!”) no qual
a função do educador é também garantir a expressão da criança, acolhendo suas
emoções e necessidades, permitindo, assim, que ela estruture seu pensamento.
Além disso, ele deve ser uma pessoa verdadeira, que se relaciona afetivamente
com a criança, criando condições para que ela questione, reflita etc. Dessa forma,
na convivência cotidiana, o educador pode ser uma pessoa que transmite seguran-
ça para a criança, acolhendo suas emoções. O educador deve ser capaz de ouvir
a criança, valorizando suas perguntas e produções, e de respeitar suas opiniões.
Agindo assim, ele se torna um parceiro com quem a criança pode contar na explo-
ração de um mundo grande, novo e muito interessante.
Quando o educador compartilha uma brincadeira ou jogo com a criança, ele pode
ajudá-la a enfrentar eventuais insucessos, estimular seu raciocínio, sua criatividade,
reflexão, autonomia etc. Isso quer dizer que, quando o educador tem intenção de
brincar junto com a criança, ele pode criar diversas situações que estimulem o seu
desenvolvimento, como a inteligência, a afetividade etc.
No filme “Sociedade dos Poetas Mortos”, o professor John Keating, interpretado por
Robin Willians, ingressa como docente em um colégio somente de garotos. Por meio da
criatividade, das artes e do pensamento crítico, ele usa abordagens diferenciadas para
captar a atenção e o interesse dos jovens para a educação. Confira o trailer do filme, dispo-
nível em: https://youtu.be/Oo9R1neW4lw
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UNIDADE Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil
Interações Criança-Criança
Como vimos, a interação entre o educador e a criança é fundamental para o de-
senvolvimento infantil. Mas... E as crianças desenvolvem-se a partir das interações
que estabelecem entre elas?
Quando a criança brinca com outra criança, ela age de maneira cooperativa, faz
imitações, disputa objetos, briga. Esses são momentos de intenso desenvolvimento:
os companheiros de mesma idade despertam interesse e possibilitam percepções so-
bre as diversidades (maneiras de lidar com as mais variadas situações, gênero, raça/
etnia etc.). Além disso, esse tipo de interação possibilita que a criança compartilhe
com outra criança suas dúvidas, expresse suas emoções e fale de suas descobertas,
tornando todas essas em situações de aprendizagem.
Esses momentos de interação podem ser estimulados quando o educador cria situ-
ações nas quais os grupos são privilegiados. Ou seja, propor às crianças explorações
em duplas ou trios, projetos em grupo de quatro ou mais crianças etc. Por exemplo,
desenvolver em grupo um teatro de fantoches permite à criança negociar o tema da
história, expressando suas emoções e desejos sem usar a agressividade. Quando isso
ocorre, a criança está aprendendo a elaborar planos coletivos, negociar, dividir e com-
partilhar. Ela desenvolve também o sentimento de pertencer a um determinado grupo.
Esse tipo de interação em grupo auxilia a criança a controlar seus impulsos, pois
ela deve apreender algumas regras, comportar-se de maneira cooperativa, tentar
compreender as outras crianças. Além disso, a criança se enriquece por comparti-
lhar diferentes experiências e situações: ela tem a oportunidade de expressão e de
contato com vivências distintas da sua própria.
Entenda melhor o assunto com o vídeo desenvolvido pela Universidade Federal do Oeste do
Pará “Interações e Brincadeiras: Eixos Norteadores da Educação Infantil”, disponível
em: https://youtu.be/nTrJmj7OWcM
Cada família cria suas formas de lutar pela sobrevivência e, ao fazê-lo, estabelece
diferentes formas de organização, alterando os papéis e as funções de cada membro.
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Quando, por exemplo, a mulher começou a sair de casa para trabalhar, houve a
necessidade de criar alternativas extrafamiliares para o cuidado das crianças, como
a creche. A socialização e a transmissão dos temas relacionados à sua cultura passa-
ram a ser compartilhadas entre a família e a instituição de Educação Infantil.
O filme “Relações de Família”, de 2019, conta a história de um patriarca de uma família com
relações e situações problemáticas, interagindo e se conectando em meio às dificuldades,
ilustrando a maneira como conflitos e divergências fazem parte do contexto familiar. Confira
o trailler, disponível em: https://youtu.be/86M_R-02tlg
A relação entre o CEI e as famílias é importante para ambos, dado que comparti-
lham a educação das crianças. Contudo, frequentemente, essa relação é atravessada
por muitas emoções, que vão da alegria à tristeza, da raiva à gratidão. Por isso, a
formação do professor de Educação Infantil deve discutir novas formas de diálogo e
de trabalho compartilhado com as famílias.
Leia a matéria “Divórcio sem traumas: como conversar com a criança, de acordo com a idade”,
disponível em: https://glo.bo/2MqddAO
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UNIDADE Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil
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Muitos professores de Educação Infantil assumem uma postura autoritária,
cobrando das famílias das crianças condutas que elas não podem adotar e de acre-
ditar que elas nada têm a contribuir para o trabalho da instituição só faz aumentar
os conflitos, os desentendimentos, as mágoas recíprocas. Com essa postura, eles
perdem valiosas oportunidades de entender a realidade dos pais e a das crianças,
ao mesmo tempo em que os familiares são prejudicados com relação a entender os
propósitos educativos da escola, bem como as possibilidades e limitações pessoais,
materiais ou institucionais nele presentes.
Não podemos nos esquecer de que o homem é passional. Amor, ódio, carinho,
rejeição, aceitação são sentimentos que temos para com nossos filhos, irmãos, marido,
esposa e também para com as crianças, colegas de trabalho e famílias. Devemos, por-
tanto, saber lidar com essas emoções. Sem isso, brigaríamos todos os dias e teríamos,
em seguida, de pedir desculpas ou continuar brigando durante toda a vida!
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UNIDADE Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil
O que uma criança sabe fazer em determinado momento de sua vida depende
de variados fatores. Uma criança é capaz de começar a falar, por exemplo, por
imitação de sons. Ou pode ter sido estimulada a estabelecer algumas relações com
a pessoa que cuida dela, desenvolvendo o interesse em se comunicar, aguçando a
vontade de entender e fazer-se entendida.
Você já deve ter observado que, de um modo geral, as crianças apresentam está-
gios de desenvolvimento que são determinados por conhecimentos e habilidades
inerentes à sua faixa etária e, normalmente, comuns a todas as crianças da mesma
idade. Esses estágios representam avanços na qualidade daquilo que as crianças têm
possibilidade de realizar antes ou depois dessa mudança, representando a passagem
para outra etapa de desenvolvimento.
Os estágios são universais, ou seja, todos os seres humanos passam pelos mesmos
estágios, ainda que não necessariamente na mesma idade.
O biólogo Jean Piaget observou que as crianças passam por estágios de desenvol-
vimento que permitem que avancem no conhecimento e ação.
Dica de artigo: “Da Ação à Compreensão: Um Passeio pela Teoria de Piaget”, disponível
em: https://bit.ly/3gTqi3B
Mesmo assim, as crianças não são iguais. Os momentos em que ocorrem os saltos
qualitativos podem ser diferentes, conforme as crianças e os grupos culturais aos quais
pertencem. Daí a importância de percebermos e entendermos o contexto no qual as
crianças se desenvolvem. Os meios ricos em estímulos e afeto proporcionam uma evo-
lução mais rápida no desenvolvimento das capacidades do que contextos menos ricos
em estímulos ou afetividade.
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faixa etária da educação infantil, a criança tem grande capacidade de criação e
comunicação, fazendo uso de diferentes linguagens: verbal, gestual, artística, do
faz-de-conta etc.;
• Área afetiva: engloba o desenvolvimento do equilíbrio pessoal, que faz com que
a criança se sinta bem consigo mesma; da relação interpessoal, que auxilia no
confronto com situações e pessoas novas; e da atuação e inserção social, que
permite à criança estabelecer relações cada vez mais alheias, distanciadas, bem
como atuar no mundo que a rodeia.
Em Síntese
Nesta unidade, você aprendeu que elaborar um currículo no trabalho com a Educação
Infantil não é algo estranho, mas necessário. Para isso, é preciso que o professor saiba
como integrar o conhecimento que se espera que a criança adquira com situações coti-
dianas, com a vivência da criança e suas expectativas.
Além disso, você viu como as relações interpessoais são importantes para a criança, que
aprende e cresce a partir dessas relações. Também verificamos que professor e escola
devem estabelecer relações de parceria com a família, para que a criança tenha o senti-
mento de pertencimento aos dois grupos: familiar e escolar.
A partir do seu conhecimento sobre currículo e do entendimento da importância das rela-
ções estabelecidas entre você e as crianças e seus pais, respeito às relações entre as próprias
crianças, você poderá desenvolver um rico trabalho junto às crianças na Educação Infantil.
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UNIDADE Desenvolvimento e Aprendizagem da Criança na Educação Infantil
Introdução
Durante muito tempo, a Educação Infantil foi direcionada ao atendimento de
crianças que necessitavam de assistência enquanto suas mães trabalhavam fora. Esse
caráter assistencialista da Educação Infantil privilegiava o cuidado com a criança
como principal objetivo das instituições. Até hoje, alguns professores entendem que
seu papel junto às crianças é mantê-las limpas, alimentadas e saudáveis, com grande
destaque para o “cuidar”.
Figura 1 – Centro de Educação Infantil (CEI) de Campinas, creche fundada da década de 1940
Fonte: campinas.sp.gov.br
Porém, a partir de 1996, com a LDB nº 9394, a Educação Infantil foi inserida no
sistema educacional como a primeira etapa da educação básica. Portanto, somente
cuidar não mais atende aos objetivos legais propostos; é preciso educar. Foi a pri-
meira vez que as creches foram consideradas espaços de aprendizagem e formação
infantil em sentido educacional.
Cuidar: significa “zelar pelo bem-estar ou pela saúde de; tratar da saúde de; sustentar;
empregar a atenção; ter desvelo por” (MICHAELLIS).
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O cuidado precisa considerar, principalmente, as necessidades das crian-
ças que quando observadas, ouvidas e respeitadas, podem dar pistas im-
portantes sobre a qualidade do que estão recebendo. Para se atingir os
objetivos dos cuidados com a preservação da vida e com o desenvolvi-
mento das capacidades humanas, é necessário que as atitudes e proce-
dimentos estejam baseados em conhecimentos específicos sobre desen-
volvimento biológico, emocional, e intelectual das crianças, levando em
conta diferentes realidades socioculturais. (BRASIL, 1998, p. 25)
Como você pode perceber, o professor de Educação Infantil deve ser capaz de
entender que o cuidar e o educar não se separam e também de manter o equilíbrio
entre esses dois processos no atendimento das crianças. Deve pensar apoiado em
uma concepção integral da criança, visando ao desenvolvimento cognitivo, afetivo,
emocional, físico e social.
Para tanto, é preciso saber como as crianças aprendem e o que pode auxiliá-las
a crescer e evoluir.
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UNIDADE Desenvolvimento e Aprendizagem da Criança na Educação Infantil
Formas de Aprendizagem
e a Educação Infantil
A forma como as crianças desenvolvem a aprendizagem, seja em relação a com-
portamentos, habilidades, hábitos seja quanto aos conhecimentos, pode ocorrer de
diferentes maneiras. Depende também da forma como essa criança é apresentada ao
objeto de aprendizagem ou estimulada a realizar esta ou aquela tarefa. Entender de
que maneira isso acontece é fundamental para compreender na prática os elementos
abordados acima sobre o desenvolvimento infantil.
O TedX “Novas formas de aprender e ensinar”, com os palestrantes João Pedro Magnani
e Pedro Lu, versa sobre a questão das possibilidades de aprendizagem e da maneira como
isso pode ser explorado. Disponível em: https://youtu.be/IOMmdBpTKqc
Ludicidade
A ideia de que a educação infantil pode começar antes da fase de alfabetização
trouxe consigo reflexões acerca de outros aspectos da infância. A primeira delas é
a de que a aprendizagem vai muito além dos conteúdos teóricos que são ensinados
formalmente nos quadros-negros; aprende-se a cada momento e as ferramentas que
materializam essa realidade são muitas e diversas.
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Lúdico vem do latim ludus que, de acordo com Huizinga: “abrange os
jogos infantis, a recreação, as competições, as representações litúrgicas
e teatrais, e os jogos de azar” (HUIZINGA, 2004, p. 41). Acrescenta
que os jogos têm um profundo cunho estético, uma intensa e fascinante
capacidade de excitar. Lúdico deriva também do radical latino In lusio
que quer dizer ilusão, em jogo. Talvez essa característica explique a ideia
de simulacro que reside por detrás do conceito.
Vygotsky (1998) inicia seu pensamento na ideia de que o ser humano possui fun-
ções psicológicas de processamento de informações e acontecimentos e que elas
podem ser divididas em duas categorias: elementares ou superiores. Ações reflexas
e instintivas – como olhar em direção à fonte de um barulho, por exemplo – são
elementares, pois são mais básicas e naturais, sendo compartilhadas por animais e
garantidas por natureza aos seres vivos; estão atreladas à sobrevivência. Já as funções
superiores são típicas da convivência social do homem, sendo construídas à medida
que cada pessoa interage, aprende e pensa enquanto indivíduo inserido na sociedade.
Note que as funções superiores são desenvolvimentos psíquicos que não nascem
com a criança, mas desenvolvem-se por meio de suas vivências, experiências e in-
terações. É nesse sentido que nasce a Teoria Histórico-cultural do Desenvolvimento
Humano de Vygotsky, na qual o pensador considera que o desenvolvimento das
funções superiores só acontece no processo de vivência e interação.
O autor considera ainda que cultura é todo o produto da vida social do indivíduo.
A partir dessa vivência e do desenvolvimento das funções superiores, as próprias
funções elementares incorporam-se culturalmente. Ou seja, o ser humano desenvol-
ve-se a ponto de ressignificar as funções naturais dentro de sua realidade, efetuando
a passagem da ordem da natureza à ordem da cultura (SIRGADO, 2000).
O programa “Nós da Educação”, do canal EducaPlay, aborda as teorias de Vygotsky com uma
entrevista com a professora Zoia Prestes. Disponível em: https://youtu.be/i6NQ1S_SDUw
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UNIDADE Desenvolvimento e Aprendizagem da Criança na Educação Infantil
O desenvolvimento infantil também foi alvo dos estudos de Jean Piaget, educador
e pensador suíço. O autor (1973) considera que as crianças passam por etapas de
desenvolvimento com potencialidades específicas, fundamentais para seu desenvol-
vimento pleno. São elas:
• Sensório-motor (0 a 2 anos): criança em fase de exploração de seu meio;
linguagem ainda limitada e não há função semiótica (criação de referenciais
mentais de significado);
• Pré-operatório (2 a 7 anos): desenvolvimento da linguagem, da capacidade
semiótica e do entendimento de modelos;
• Operações concretas (7 a 11 ou 12 anos): capacidade de interiorizar ações e
conceitos, realizando atividades desenvolvidas em pensamento próprio, coorde-
nação de ações e capacidade de entender pontos de vista externos;
• Operações formais (11 ou 12 anos em diante): capacidade de pensamento
estrutural, no qual se desenvolvem ideias, noções, valores e questionamentos de
modelos tradicionais.
Quer entender melhor sobre os estágios de desenvolvimento infantil abordados por P iaget?
O artigo “O Desenvolvimento da Criança nos Primeiros Anos de Vida”, de Durlei de
Carvalho Cavicchia, é uma boa leitura sobre o tema. Disponível em: https://bit.ly/2A17gI1
A criança passa de simples esquemas de ação para condutas mais complexas, por
meio de processos que, conforme você leu, Piaget denomina assimilação (aplicação
do mesmo esquema a diferentes objetos e situações) e acomodação (pequenas mu-
danças que a criança introduz nos esquemas para adaptar-se a situações diferentes).
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A criança pequena, que se encontra na etapa sensório-motora, faz uma aprendiza-
gem do mundo que a envolve e aprende a resolver as situações com as quais convive
à medida que vai colocando em prática esquemas cada vez mais complexos para
indagar e intervir na realidade.
Figura 2
Fonte: Getty Images
A atividade com objetos é muito importante para a criança durante toda a in-
fância. Mas você vai perceber que, a partir do momento em que a criança se torna
capaz de se comunicar pela linguagem, haverá mudanças no tipo de atividade que a
ela fará para conhecer o mundo: ela passará a fazer operações mentais não visíveis,
utilizando a linguagem como instrumento de pensamento. De qualquer modo, o
contato com os objetos e a experiência que a criança tem através do jogo individual,
em grupo ou com uma pessoa adulta são situações de aprendizagem básicas durante
todo o período que poderíamos considerar como etapa da educação infantil.
Já ouvir falar em Annie Sullivan? A professora ganhou notoriedade após trabalhar com
Helen Keller, uma criança surda e cega. A educação aconteceu por meio do tato e da explo-
ração de objetos táteis. A descoberta desse modo de aprendizagem e o desenvolvimento da
menina são retratados no filme “O milagre de Anne Sulivan”, de 1962.
Veja o trailer, disponível em: https://youtu.be/bedqZxHX6QA
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UNIDADE Desenvolvimento e Aprendizagem da Criança na Educação Infantil
cena etc. Todas as situações que envolvem a rotina de sua vida, como acordar, vestir-
se, tomar café, brincar no parque, almoçar, passear, jantar, ou mesmo ações menos
rotineiras, como ir ao cinema, ao restaurante, viajar, servem para que a criança
estabeleça uma lógica em suas ações uma vez que as situações se apresentam sempre
de forma parecida.
Através de tais situações, a criança aprende a identificar os objetos que
são previsíveis de encontrarem-se em determinados lugares (é estranho
encontrar uma escova de dentes na cozinha) , a maneira como as coisas
estão habitualmente situadas no espaço (as cadeiras encostadas ou abai-
xo da mesa, os quadros na parede) e também a sucessão temporal de
determinadas situações (primeiro tira-se as fraldas sujas: depois, limpa-se
o bumbum; depois se põe fraldas limpas e começa-se a vestir a criança;
ou, para passear, primeiro se põe o casaco, em seguida o gorro/boné
e, finalmente, pega-se o carrinho em que vai a criança, abre-se a porta,
etc.). (BASSEDAS, 1999, p. 26-27)
Os Prêmios e os Castigos
Você já deve ter presenciado crianças sendo premiadas (um sorriso, um abraço,
um presente, um comentário elogioso etc.), ou castigadas (indiferença, uma cara bra-
va, algumas palavras com tom de aborrecimento etc.) por alguma conduta. Muitas
vezes, tais prêmios ou castigos são utilizados para mostrar à criança quando suas
condutas são aceitas ou não, entendendo quais limites lhes são impostos ou cedidos.
Na escola, é comum percebermos desentendimentos entre professores e alunos,
entre pais e filhos, pois as crianças testam os limites dados pelos adultos, tentando
fazer o que normalmente não é permitido.
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Figura 3
Fonte: Getty Images
Bassedas (1999) destaca que os prêmios e castigos são ferramentas úteis para
trabalhar situações de aprendizagem das normas de conduta. Porém, é preciso que
haja coerência e bom senso no estabelecimento de normas pelo adulto, evitando
também ser inflexível na negociação dos limites, uma vez que isso ensina a criança
a não negociar e ser também inflexível, tornando-se incapaz de compreender que
pode haver diferentes soluções para determinadas situações.
A Imitação
Você vai perceber, na etapa da educação infantil, que as crianças aprendem imitan-
do o que veem e vivem com as pessoas que estão ao seu lado. O pai, a mãe, os educa-
dores, os professores, coleguinhas são importantes para a criança e servem de modelo
para suas ações. Expressões, modo de agir, atitudes e comportamentos são imitados.
Isso não é de todo ruim, uma vez que as experiências vividas e a imitação de
situações ou pessoas darão chance à criança de demonstrar o que está sentindo ou
de representar situações vividas, tanto boas quanto ruins, mostrando ao adulto como
se sente.
Assim, através da imitação, as crianças podem aprender com as pessoas
que para elas são modelos a controlar e a representar situações vividas,
bem como vivê-las. (BASSEDAS, 1999, p.28)
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UNIDADE Desenvolvimento e Aprendizagem da Criança na Educação Infantil
Por que isso é importante? Porque é somente a discussão transversal de temas tão
relevantes quanto à educação que permite avanços concretos na realidade prática.
É preciso juntar os avanços referenciais e teóricos com os elementos, limitações e
possibilidades da educação escolar para criar modelos e ferramentas aplicáveis em
toda a sociedade.
Figura 4
Fonte: Getty Images
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De acordo com Saviani (p. 299, 2008):
Em consequência da exclusão do princípio da vinculação orçamen-
tária, o governo federal foi reduzindo progressivamente os recursos
Cad76_04ARTIGOS.pmd 1/4/2009, 09:58 298 Cad. Cedes, Campi-
nas, vol. 28, n. 76, p. 291-312, set./dez. 2008 299 Disponível em Der-
meval Saviani aplicados na educação: “desceu de 7,60% (em 1970), para
4,31% (em 1975), recuperando-se um pouco em 1978, com 5, 20%”
(Vieira, 1983, p. 215). Assim, liberado da imposição constitucional, o in-
vestimento em educação por parte do MEC chegou a aproximadamente
um terço do mínimo fixado pela Constituição de 1946 e confirmado pela
LDB de 1961.
Em 1996, foi promulgada a versão atualizada da lei, vigente até os dias de hoje.
Ela incorpora as correntes teóricas e as vivências que discutimos até agora e iremos
explorar mais as suas definições no próximo capítulo.
Em Síntese
Você já sabe a importância do currículo para a Educação Infantil; sabe como as crianças
dessa faixa etária aprendem, quais são suas fontes de conhecimento. Seja qual for a
fonte de conhecimento destacada na aprendizagem da criança, é preciso atenção aos
materiais didáticos utilizados, aos objetos e brinquedos, às condições do ambiente físico
e aos recursos humanos disponíveis, pois, juntos, esses elementos constituem-se com-
ponentes fundamentais para a elaboração de um currículo rico, com conteúdos, ativida-
des, conceitos, habilidades e competências necessários à aprendizagem, e que levarão
ao desenvolvimento de uma Educação Infantil de qualidade.
Em resumo, até aqui vimos que, quando escolhemos uma concepção de cuidado e edu-
cação integrada com a família, é necessário considerar várias dimensões do relaciona-
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UNIDADE Desenvolvimento e Aprendizagem da Criança na Educação Infantil
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UNIDADE Referenciais Legais para a Organização
Curricular da Educação Infantil
Introdução
Para trabalhar com Educação Infantil é imprescindível preparo e consciência para
respeitar a legislação vigente, como já abordamos no capítulo anterior. Também é
preciso acolher as crianças e conhecê-las, ampliar o atendimento e melhorar a qua-
lidade do serviço prestado à educação.
Para que esse trabalho possa ser realizado de forma a atender às necessidades de
aprendizagem das crianças, alguns documentos são essenciais para a sistematização
das áreas que devem ser trabalhadas: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB),
os Referenciais Curriculares Nacionais para Educação Infantil (RCNEI) e as Diretrizes
Curriculares Nacionais da Educação Básica (DCN).
Estudaremos cada um desses documentos a seguir.
LDB em Vigor
Como vimos em unidades anteriores, a Lei de Diretrizes e Bases, criada no regime
ditatorial, permaneceu em vigor até 1996, quando o então presidente Fernando
Henrique Cardoso promulgou a nova versão. A LDB 9394/96 reafirma o direito à
educação gratuita a todos e estabelece as responsabilidades das instâncias federais,
estaduais e municipais.
Tipos de Educação
Outro ponto importante da LDB é a determinação dos tipos de educação. São elas:
• Educação Especial: atende alunos com necessidades especiais (deficiências e
superdotação, por exemplo), preferencialmente na rede regular de ensino;
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• Educação a distância: atende alunos por meio de ferramentas de telecomunicação;
• Educação Profissional e Tecnológica: forma, atualiza e prepara os alunos
para conhecimentos tecnológicos e práticos de determinada profissão;
• Educação de Jovens e Adultos: atende alunos que não frequentaram ou con-
cluíram o ensino regular no período adequado;
• Educação Indígena: atende alunos de comunidades indígenas, adequando-se à
cultura e língua de cada uma.
Figura 1
Fonte: Getty Images
Educação Infantil
A seção II da LDB 9394/96 descreve especificamente a educação infantil:
Art. 29. A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem
como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de
idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, comple-
tando a ação da família e da comunidade.
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UNIDADE Referenciais Legais para a Organização
Curricular da Educação Infantil
Modificações da LDB –
Lei Federal nº 10.639 de 2003
A lei nº 10.639 foi um importante marco educacional no que tange o respeito e
a valorização da cultura e da igualdade. Isso porque a sua promulgação garantiu o
ensino da cultura e da história africana e indígena nas escolas.
Dos mais de 200 milhões de brasileiros, quase 20 milhões são negros e quase 90
milhões são pardos, de acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística). Isso significa que mais da metade da população tem descendência afri-
cana ou indígena e o reconhecimento disso em nível jurídico e escolar é fundamental
para a evolução da educação como um agente modificador e social.
O programa Papo de Educador, do Teleduc, aborda as diferenças entre DCN, PCN e BNCC.
Confirao vídeo “Diferenças entre BNCC, PCN e Diretrizes Curriculares”.
Disponível em: https://youtu.be/T1ztHC8f2Os
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Referencial Curricular Nacional
para Educação Infantil (RCNEI)
O RCN integra a série de documentos dos Parâmetros Curriculares Nacionais ela-
borados pelo Ministério da Educação. Foi criado na década de 1990, com o objetivo
de apontar metas de qualidade no trabalho desenvolvido nas creches e pré-escolas.
Além disso, dá subsídios para que possamos incorporar atividades educativas aos
cuidados essenciais das crianças e suas brincadeiras, e, com isso, contribuindo para
o desenvolvimento integral das identidades das crianças, propiciando crescimento
como cidadãos cujo direito à infância é legalmente reconhecido.
Desta forma, o RCNEI está organizado por idade – de zero a três e de quatro a seis
anos – com objetivos, conteúdos e orientações didáticas, diretamente ligados às faixas
etárias, e não especificamente pela denominação “creche” e “pré-escola”. Além da
organização por idades, o RCNEI organiza-se por âmbitos e eixos educacionais.
De acordo com Rossetti-Ferreira (2001, p. 191), como o próprio nome diz, ele é
apenas um referencial, pois cada município e cada instituição deverão elaborar a sua
proposta pedagógica de acordo com as características da sua realidade. Assim, res-
peitando o que está colocado no artigo da LDB sobre os princípios e fins da educação
nacional, temos que o ensino será ministrado (e aí também se incluem as creches e
pré-escolas) com base na autonomia institucional e no pluralismo de ideias e concep-
ções pedagógicas.
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UNIDADE Referenciais Legais para a Organização
Curricular da Educação Infantil
Objetivo da DCNEI
A DCNEI de 2009 tem como objetivo:
1.1 Esta norma tem por objetivo estabelecer as Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil a serem observadas na organização
de propostas pedagógicas na educação infantil.
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de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, para orientar as
políticas públicas e a elaboração, planejamento, execução e avaliação de
propostas pedagógicas e curriculares de Educação Infantil.
1.3 Além das exigências dessas diretrizes, devem também ser observadas
a legislação estadual e municipal atinentes ao assunto, bem como as nor-
mas do respectivo sistema. (BRASIL, 2009, p. 11)
Definições
A DCNEI também foi relevante na medida em que trouxe definições fundamentais
para a educação infantil e que são norteadoras de seu ensino. São elas:
• Educação infantil: etapa inicial da educação básica, para crianças de 0 a 5 anos,
oferecida em creches ou pré-escolas. As instituições podem ser públicas ou pri-
vadas, mas é dever do Estado garantir educação pública a todos os interessados.
Pode ter jornada parcial ou integral;
• Criança: a criança é vista na DCNEI como um indivíduo histórico e de direitos.
É a pessoa que constrói sua identidade pessoal ou coletiva através de suas inte-
rações e vivências;
• Currículo: “conjunto de práticas que buscam articular as experiências e os sabe-
res das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural,
artístico, ambiental, científico e tecnológico, de modo a promover o desenvol-
vimento integral de crianças de 0 a 5 anos de idade” (BRASIL, 2009, p. 12);
• Proposta Pedagógica: a DCNEI traz o conceito de proposta pedagógica como
orientadora das ações da instituição, contendo as metas de aprendizagem e de-
senvolvimento. Também conhecida como projeto político pedagógico, é feita de
forma coletiva (direção, professores e comunidade). Sobre esse conceito,
Art. 8. A proposta pedagógica das instituições de Educação Infantil deve
ter como objetivo garantir à criança acesso a processos de apropriação,
renovação e articulação de conhecimentos e aprendizagens de diferentes
linguagens, assim como o direito à proteção, à saúde, à liberdade, à con-
fiança, ao respeito, à dignidade, à brincadeira, à convivência e à interação
com outras crianças.
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UNIDADE Referenciais Legais para a Organização
Curricular da Educação Infantil
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A Visão de Criança: O Sujeito do Processo de Educação
As DCN são importantes ao considerar o papel da criança como um sujeito da
educação, e não como um passivo dela. Ela considera ainda que o aluno está inse-
rido em seu contexto familiar, social e institucional e que todos esses aspectos são
importantes para sua formação.
O conhecimento científico hoje disponível autoriza a visão de que desde o
nascimento a criança busca atribuir significado a sua experiência e nesse
processo volta-se para conhecer o mundo material e social, ampliando
gradativamente o campo de sua curiosidade e inquietações, mediada pelas
orientações, materiais, espaços e tempos que organizam as situações de
aprendizagem e pelas explicações e significados a que ela tem acesso.
(BRASIL, 2016, p. 07)
A documento ressalta ainda a necessidade de entender que cada criança tem seu
tempo e que isso deve ser respeitado em todas as esferas de sua formação.
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UNIDADE Referenciais Legais para a Organização
Curricular da Educação Infantil
a todos os indivíduos. Deve-se ter o ensino à luz dos direitos humanos e prever a
proteção e a provisão de suas necessidades, assim como os direitos fundamentais de
participação social e cultural.
Com base nesse paradigma, a proposta pedagógica das instituições de
Educação Infantil deve ter como objetivo principal promover o desenvol-
vimento integral das crianças de zero a cinco anos de idade garantindo a
cada uma delas o acesso a processos de construção de conhecimentos e a
aprendizagem de diferentes linguagens, assim como o direito à proteção,
à saúde, à liberdade, ao respeito, à dignidade, à brincadeira, à convivência
e interação com outras crianças. Daí decorrem algumas condições para a
organização curricular. (BRASIL, 2016, p. 13)
Logo, destaca-se a natureza integral que a educação infantil deve ter, que se esta-
belece como o primeiro objetivo e condição da educação infantil.
Assim, é preciso que a criança saiba organizar seu material e orientar-se pela
escola, por exemplo, para apropriar-se dos conceitos que adquire para resolver situ-
ações cotidianas. Também é importante que seja percebido que as coisas aprendidas
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não são verdades imutáveis, mas sim saberes apropriados para sua idade, sendo
assim dinâmicos e provisórios.
Acompanhamento e Continuidade
A infância é um período de grandes mudanças e a educação deve contribuir nes-
sas etapas. Por isso, as instituições devem planejar e efetivar o acolhimento às crian-
ças ingressas; observar e mediar relações das crianças entre si e com adultos; efetuar
um planejamento escolar transversal com os setores da escola ou creche; e contribuir
em articulações com o Ensino Fundamental para facilitar a transição de seus alunos.
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UNIDADE Referenciais Legais para a Organização
Curricular da Educação Infantil
Brincadeiras
As brincadeiras, em seu potencial lúdico e de aprendizagem, ganham destaque na
DCN. Confira o que diz a lei:
Art. 9. As práticas pedagógicas que compõem a proposta curricular da
Educação Infantil devem ter como eixos norteadores as interações e a
brincadeira, garantindo experiências que:
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Avaliação
A avaliação na educação infantil tem um papel fundamental para entender o su-
cesso das metodologias analisadas e o desempenho dos alunos. Por isso, o tema será
abordado com profundidade na próxima Unidade.
Em Síntese
Nesta unidade, você conheceu as disposições da LDB, os Referenciais Curriculares Nacionais
para a Educação Infantil – RCNEI e as Diretrizes Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI).
Pudemos entender que a criança deve ser vista como construtora de sua identidade a partir
de diferentes particularidades expressas no meio em que vive. Assim, a escola e o pro-
fessor devem planejar ações educativas que possam efetivamente auxiliar o processo
de construção da identidade e da autonomia desta criança, pensando em sua interação
com o ambiente, a cultura e a sociedade.
Além disso, a revolução informacional causada pela internet e pelos demais avanços tec-
nológicos trouxeram à tona múltiplas formas de obtenção de conteúdo e conhecimento.
Ou seja, simplesmente trabalhar tópicos e temas não é mais o ponto único da educação;
desenvolver habilidades de interpretação e pensamento crítico, por exemplo, passam a
ser igualmente importantes.
Grande parte da população brasileira tem acesso à internet. Isso significa que as crianças
têm ao seu dispor uma quantidade enorme de informações e, desse modo, elas precisam
saber pesquisá-las e interpretá-las de maneira correta.
Entender como a ciência é construída e que nenhum saber nasce pronto – correntes
teóricas dialogam e, por vezes, se contradizem. A educação do século XXI, nesse sentido,
visa não somente a informação, mas sim o desenvolvimento de competências que per-
mitam aos alunos entender, viver e produzir conhecimento nesse novo cenário.
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UNIDADE BNCC e Educação Infantil
Introdução
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento criado pelo
Ministério da Educação (MEC) que deve, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDB, Lei nº 9.394/1996), nortear os currículos escolares
das redes de ensino de todo o país. A primeira versão da BNCC foi publicada em
2015 – ou seja, nove anos desde a promulgação da LDB, que regulamenta uma base
nacional para a educação comum, e a finalização desse documento.
Por que isso aconteceu? Ao longo desse tempo, foram realizados estudos, semi-
nários e eventos sobre educação que versavam sobre a necessidade de bases comuns
para a educação. Em 2010, a Conferência Nacional de Educação (CONAE) contou
com a presença de especialistas para debater a Educação Básica e criou um docu-
mento que reiterou a necessidade da Base Nacional Comum Curricular, como inte-
grante de um Plano Nacional de Educação. A segunda edição do seminário, em 2014,
destacou a importância de uma mobilização para a criação efetiva do documento.
Esse também foi o ano em que cada estado do país participou de seminários
realizados pelo Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e pela União
Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) para debater a segunda
versão da BNCC. Assim, a BNCC foi enviada pelo MEC ao Conselho Nacional de
Educação (CNE) e homologada naquele mesmo ano. A homologação representou o
momento em que foi iniciada a capacitação dos professores para a BNCC e criados
os mecanismos de suporte para a implantação de novos currículos. Em 22 de de-
zembro de 2017, o CNE apresentou a RESOLUÇÃO CNE/CP n. 2, que estabelece
e orienta a implantação da Base Nacional Comum Curricular. Em 2018, foi entregue
a terceira e final versão do documento. Ainda naquele ano, foi criado o Programa de
Apoio à Implementação da Base Nacional Comum Curricular (ProBNCC).
Assim, é possível perceber que a BNCC foi fruto de um esforço comum, reali-
zado na intenção de promover a criação de um documento que efetivamente fosse
interessante para professores e alunos no processo de aprendizagem. Por meio das
bases para a educação, é possível entender aquilo que o aluno precisa trabalhar e
desenvolver de acordo com seus contextos e vivências para compreender o mundo
que o cerca.
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Figura 1 – Capa da BNCC, de 2018
Fonte: basenacionalcomum.mec.gov.br
O que a BNCC defende, dessa maneira, é a educação integral dos alunos, permi-
tindo que eles se desenvolvam enquanto sujeitos conscientes e ativos do mundo e de
sua própria realidade.
Nesse contexto, a BNCC afirma, de maneira explícita, o seu compromisso
com a educação integral. Reconhece, assim, que a Educação Básica deve
visar à formação e ao desenvolvimento humano global, o que implica
compreender a complexidade e a não linearidade desse desenvolvimento,
rompendo com visões reducionistas que privilegiam ou a dimensão
intelectual (cognitiva) ou a dimensão afetiva. Significa, ainda, assumir uma
visão plural, singular e integral da criança, do adolescente, do jovem e do
adulto – considerando-os como sujeitos de aprendizagem – e promover uma
educação voltada ao seu acolhimento, reconhecimento e desenvolvimento
pleno, nas suas singularidades e diversidades. Além disso, a escola, como
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UNIDADE BNCC e Educação Infantil
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9. Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação, fazen-
do-se respeitar e promovendo o respeito ao outro e aos direitos humanos, com
acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais,
seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos de
qualquer natureza;
10. Agir pessoal e coletivamente com autonomia, responsabilidade, flexibilidade,
resiliência e determinação, tomando decisões com base em princípios éticos,
democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários.
Assista ao vídeo “As Competências Gerais da BNCC”, que explica detalhadamente cada
uma das competências descritas acima. Disponível em: https://youtu.be/-wtxWfCI6gk
A Educação Infantil na
Base Nacional Comum Curricular
A BNCC considera, em seu texto, o contexto apresentando na disciplina sobre a
Educação Infantil, que foi vista durante muito tempo como uma etapa do ensino vol-
tada para o assistencialismo e para o cuidado de crianças de famílias trabalhadoras.
É somente a partir da LDB, em 1996, que ela passa a ser parte da educação formal
e, em 2006, é fixada como a etapa que atende crianças entre zero e cinco anos.
A Educação Infantil no
Contexto da Educação Básica
A Educação Infantil é o primeiro contato do aluno com a escola e representa o
início do afastamento formal entre a criança e a família. Dessa maneira, a BNCC vin-
cula os processos de educar e cuidar, entendendo ambos como parte fundamental
do processo de aprendizagem.
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UNIDADE BNCC e Educação Infantil
Figura 2
Fonte: Getty Images
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Direitos de aprendizagem e
desenvolvimento na Educação Infantil
Considerando a forma como a EI ocorre, em escolas ou creches, e as com-
petências gerais apresentadas, a BNCC estabelece que são necessárias algumas
condições para que tudo isso possa acontecer na prática. Essas condições são fun-
damentais e, portanto, constituem direitos do aluno para sua aprendizagem e de-
senvolvimento na Educação Infantil. São eles: conviver, brincar, participar, explorar,
expressar, conhecer-se.
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UNIDADE BNCC e Educação Infantil
Os Campos de Experiências
Considerando as competências que devem ser desenvolvidas na educação, as po-
tencialidades da criança e os direitos da educação infantil, a BNCC descreve os cam-
pos de experiências que devem ser trabalhados nessa etapa da educação. Os campos
estão apresentados na figura abaixo.
Campos de Experiências
Os campos são descritos pela própria BNCC como um arranjo curricular para
permitir a adequação de tudo o que deve ser desenvolvido nas práticas pedagógicas.
Confira abaixo o que cada um desses campos representa:
• O eu, o outro e o nós: as crianças devem ter conhecimento de suas próprias
emoções e ideias, ao mesmo tempo em que aprendem e se desenvolvem em
suas relações e interações com outras pessoas e com outros grupos. A EI cor-
responde às primeiras interações da criança e, portanto, é o momento em que
são criadas as primeiras percepções e conceitos sobre a sociedade e seus indi-
víduos, assim como as estruturas que organizam tudo isso. É preciso, por isso,
criar oportunidades para que as crianças tenham contato e vejam o máximo
possível de diversidade e variações, para que entendam a pluralidade do mundo
que as cerca;
• Corpo, gestos e movimentos: explorar o mundo, os objetos, seus corpos e
movimentos é fundamental para que a criança desenvolva a percepção expres-
siva das coisas, entendendo seu universo social e cultural. Além disso, é preciso
desenvolver a atenção para a corporeidade, tomando consciência de suas poten-
cialidades e limites, e também se expressando ativamente por meio do corpo.
É papel da instituição de ensino criar oportunidades para que a criança desen-
volva esse aspecto lúdico em sua aprendizagem e formação;
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• Traços, sons, cores e formas: a criança deve conviver e experimentar formas
variadas de expressão artística – música, pintura, dança – para entender como
elas funcionam e de que maneira refletem ações, sentimentos e ideias humanas.
Assim, elas são capazes de desenvolver senso estético e crítico acerca do mundo
e de si mesmas, melhorando suas capacidades de expressão e compreensão;
• Escuta, fala, pensamento e imaginação: falar e ouvir são habilidades funda-
mentais para o desenvolvimento infantil. Por isso, é preciso que a EI crie opor-
tunidades para esse desenvolvimento, valorizando o envolvimento da criança
com a cultura oral. A oralidade é uma das mais significativas maneiras de
expressar pensamento e imaginação, habilidades que são desenvolvidas em
atividades como contação de histórias e debates em grupo, por exemplo. A ex-
periência com a escrita também começa na Educação Infantil. Nesse momento,
é hora de despertar o interesse para essa habilidade e permitir o contato com
rabiscos e esboços, assim como as primeiras letras, palavras e com a escrita
espontânea, que são não convencionais, mas que já expressam uma certa com-
preensão da escrita;
• Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações: as crianças já
estão inseridas em espaços (casa ou escola, rua ou interior), tempos (dia e noite),
quantidades (pouco ou muito) e outras relações. É na EI que o entendimento
sobre isso deve ser trabalhado e desenvolvido, permitindo que a criança entenda
essas relações de maneira mais formal e que seja capaz de assimilar semelhan-
ças e transformações nesse cenário quando for necessário.
Os Objetivos de Aprendizagem e
Desenvolvimento para a Educação Infantil
Após apresentar os itens acima, a BNCC sistematiza todos os objetivos de apren-
dizagem que o desenvolvimento da Educação Infantil deve trazer. Esses objetivos são
sistematizados de acordo com os campos de experiência e com três faixas etárias:
bebês (zero a 1 ano e 6 meses), crianças bem pequenas (1 ano e 7 meses a 3 anos
e 11 meses) e crianças pequenas (4 anos a 5 anos e 11 meses).
A BNCC destaca ainda que cada criança tem seu ritmo e, por isso, as separações
etárias devem ser consideradas em cada contexto particular.
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UNIDADE BNCC e Educação Infantil
A BNCC fornece uma síntese das aprendizagens da EI, que é, portanto, “elemen-
to balizador e indicativo de objetivos a serem explorados em todo o segmento da
Educação Infantil [...] e não como condição ou pré-requisito para o acesso ao Ensino
Fundamental” (BRASIL, 2018, p. 53).
Tabela 1
Respeitar e expressar sentimentos e emoções. Atuar em grupo e demonstrar
interesse em construir novas relações, respeitando a diversidade e solida-
O eu, o outro e o nós rizando-se com os outros. Conhecer e respeitar regras de convívio social,
manifestando respeito pelo outro.
Reconhecer a importância de ações e situações do cotidiano que contribuem
para o cuidado de sua saúde e a manutenção de ambientes saudáveis. Apre-
Corpo, gestos sentar autonomia nas práticas de higiene, alimentação, vestir-se e no cuida-
e movimentos do com seu bem-estar, valorizando o próprio corpo. Utilizar o corpo inten-
cionalmente (com criatividade, controle e adequação) como instrumento de
interação com o outro e com o meio. Coordenar suas habilidades manuais.
Discriminar os diferentes tipos de sons e ritmos e interagir com a música,
Traços, sons, cores percebendo-a como forma de expressão individual e coletiva. Expressar-se
por meio das artes visuais, utilizando diferentes materiais. Relacionar-se
e formas com o outro empregando gestos, palavras, brincadeiras, jogos, imitações,
observações e expressão corporal.
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Expressar ideias, desejos e sentimentos em distintas situações de interação,
por diferentes meios. Argumentar e relatar fatos oralmente, em sequência
Escuta, fala, temporal e causal, organizando e adequando sua fala ao contexto em que é
pensamento produzida. Ouvir, compreender, contar, recontar e criar narrativas. Conhe-
e imaginação cer diferentes gêneros e portadores textuais, demonstrando compreensão
da função social da escrita e reconhecendo a leitura como fonte de prazer
e informação.
Identificar, nomear adequadamente e comparar as propriedades dos obje-
tos, estabelecendo relações entre eles. Interagir com o meio ambiente e com
fenômenos naturais ou artificiais, demonstrando curiosidade e cuidado com
Espaços, tempos, relação a eles. Utilizar vocabulário relativo às noções de grandeza (maior,
quantidades, menor, igual etc.), espaço (dentro e fora) e medidas (comprido, curto, gros-
so, fino) como meio de comunicação de suas experiências. Utilizar unidades
relações de medida (dia e noite; dias, semanas, meses e ano) e noções de tempo (pre-
e transformações sente, passado e futuro; antes, agora e depois), para responder a necessida-
des e questões do cotidiano. Identificar e registrar quantidades por meio de
diferentes formas de representação (contagens, desenhos, símbolos, escrita
de números, organização de gráficos básicos etc.) (BRASIL, 2018, p. 54-55).
Em Síntese
A BNCC representa um imenso avanço na questão curricular da educação brasileira, já que
é um documento de escrita colaborativa entre Estado, especialistas e comunidade. Os de-
bates em ambiente escolar também permitiram o aperfeiçoamento do documento e sua
consequente adaptação aos contextos, potencialidades e limitações do cenário brasileiro.
A formação integral é um dos pontos chaves da BNCC. Ao considerar o aluno como sujeito
pessoal, social e político, ela elenca tudo o que é preciso para que isso se desenvolva na
escola e se integre com seus conceitos pessoais. O desenvolvimento das competências
reflete essa ideia, já que permite uma amplitude de práticas pedagógicas e curriculares
para colocar isso em prática da maneira como for mais apropriada para cada contexto,
aluno e instituição de ensino.
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UNIDADE Avaliação na Educação Infantil
Introdução
Nesta unidade, vamos tratar da Avaliação na Educação Infantil (EI). Para que
possamos entender como ela se processa nesse nível de ensino, é preciso, primeiro,
entender o conceito de avaliação e o que os autores da área educacional pensam
sobre o tema.
Figura 1
Fonte: Getty Images
Como a EI foi vista durante muito tempo como uma etapa sem ligação com a
educação formal e com a aprendizagem efetiva, a avaliação nesse período era tida
como desnecessária. Mesmo após mudanças nas perspectivas da EI, muitas pessoas
ainda consideram a avaliação como um mecanismo de medição do conhecimento
formal na forma de provas e testes.
A avaliação, contudo, não pode ser restrita somente a essa interpretação. É pre-
ciso refletir sobre as necessidades do processo avaliativo, seus objetivos e potenciali-
dades, para partir então para o contexto da Educação Infantil e suas possibilidades.
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Avaliação é um processo de coleta e análise de dados, tendo em vista
verificar se os objetivos propostos foram atingidos. No âmbito escolar,
a avaliação se realiza em vários níveis: do processo ensino-aprendiza-
gem, do currículo, do funcionamento da escola como um todo. (HAYDT,
2004, p. 288)
Para Hoffmann (1993), a avaliação tem que ser significativa, permitindo intervenções
que favoreçam o relacionamento com os alunos e o diagnóstico da ocorrência ou não
da aprendizagem, numa mediação constante. Por isso, defende o conceito de Avaliação
Mediadora. A autora entende que avaliação é uma mediação que permite um diálogo
com os alunos, querendo saber o que sabem, o que pensam, o que já construíram, para
possibilitar o planejamento de ações que os tornem cada vez mais autônomos.
A avaliação tem o propósito de permitir que o professor conheça seus alunos, aper-
feiçoando o processo de ensino-aprendizagem para que seus objetivos possam ser alcan-
çados. Além disso, poderá diagnosticar prováveis dificuldades e promover seus alunos.
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UNIDADE Avaliação na Educação Infantil
Figura 2
Fonte: Getty Images
Momentos de Avaliação
na Educação Infantil
Bassedas (1999) propõe três diferentes momentos de avaliação na Educação
Infantil. Suas sugestões coincidem com os conceitos de avaliação defendidos por
Haydt (2004) e citados no início de nossos estudos. O primeiro momento é o que ela
chama de “Avaliação Inicial”. A avaliação inicial é realizada com o objetivo de saber
o que os alunos já sabem sobre o tema que será abordado, para que, desse modo, o
professor possa modificar ou ajustar as atividades, assim podendo adequá-las visando
à melhoria da aprendizagem e priorizando suas experiências fora da sala de aula.
A avaliação inicial compreende, desse modo, diversas funções: utiliza-se
para externar informações sobre o que os meninos e as meninas de uma
mesma turma sabem ou o que não sabem; é útil para planejar, programar
e apresentar melhor a atividade ou a unidade a ser trabalhada, além de
proporcionar às crianças a darem sentido ao que se faz na escola e envolve-
rem-se mais ativamente nas atividades da aula. (BASSEDAS, 1999, p. 175)
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de aula. Sua ferramenta principal é a observação, ou seja, durante as atividades, o
professor observa seus alunos e coleta informações sobre o que eles aprenderam,
em que tiveram dificuldades, possibilitando, assim, a adequação do planejamento de
acordo com as possibilidades de cada criança. Sobre a observação, a autora diz:
A observação não é entendida como passiva, mas de uma maneira ativa:
quando se está perguntando, ajudando-os, propondo coisas diferentes a
diferentes crianças e detectando, dessa maneira, a sua capacidade de rece-
ber ajuda, de aceitá-la e de aproveitá-la.
Figura 3
Fonte: Getty Images
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UNIDADE Avaliação na Educação Infantil
É preciso frisar que alguns educadores renunciam às fichas por entenderem que
marcar “x” em determinados itens não constitui avaliação, mas sim o cumprimento
burocrático de algo que não leva à real visão da aprendizagem do aluno. Por isso,
é muito importante deixar claro que a simples anotação, nas fichas de avaliação, da
condição na qual a criança se encontra em termos de aprendizagem não constitui
uma avaliação.
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possibilidades da criança. Ao contrário, devemos tentar proporcionar a
todos os alunos a possibilidade de viverem experiências de sucesso, para
que todas as crianças tenham vontade e confiança em aprender e crescer
com o seu grupo de companheiros. (BASSEDAS, 1999, p. 174)
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UNIDADE Avaliação na Educação Infantil
Note que a LDB destaca que a avaliação se dá por meio do registro do desen-
volvimento do aluno. Não se trata, portanto, de medidas classificatórias dos alunos,
colocando notas ou parâmetros médios para avaliá-los. A ideia da avaliação no
contexto infantil é a de entender como o aluno se comporta diante do processo de
ensino-aprendizagem e verificar se ele está adaptado às propostas metodológicas
apresentadas, ou se é preciso pensar em possibilidades que permitam melhores
desenvolvimentos com ele. Da mesma maneira, uma visão geral da turma de alunos
também possibilita verificar se os eventuais déficits são de natureza pessoal ou geral.
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III – a continuidade dos processos de aprendizagens por meio da criação
de estratégias adequadas aos diferentes momentos de transição vividos
pela criança (transição casa/instituição de Educação Infantil, transições
no interior da instituição, transição creche/pré-escola e transição pré-
-escola/Ensino Fundamental);
Da mesma maneira, a avaliação na EI não visa reter o aluno nessa etapa do ensino.
É claro que obstáculos no desenvolvimento devem ser analisados como possíveis
entraves para o avanço rumo ao Ensino Fundamental, mas o objetivo não é barrar o
aluno, e sim transpor esse obstáculo. Como vimos, a avaliação deve ser contínua. Isso
significa, na prática, que possíveis pontos fracos dos alunos devem ser trabalhados e
considerados, mediante a criação ou adaptação das práticas pedagógicas, para que o
aluno tenha as oportunidades necessárias para seu desenvolvimento.
Assista ao vídeo “Base nacional comum curricular e avaliação”, produzido pela Universi-
dade Federal do Espírito Santo, uma parceria entre o Centro de Educação (Laufes), a TV Ufes
e o Curso de Comunicação, fala sobre a BNCC no contexto avaliativo.
Disponível em: https://youtu.be/6VLAQpo1jxI
Por exemplo: uma atividade de teatro pode ser desenvolvida com objetivos lúdi-
cos, de exploração da imaginação e linguagem (atingindo o campo de experiências
da escuta, fala, pensamento e imaginação) e físicos, para desenvolver habilidades
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UNIDADE Avaliação na Educação Infantil
É preciso, porém, que o aluno entenda que é esperado que ele tente desenvolver
certos aspectos. No exemplo acima, é preciso estimular todos a fazer o que se espera
– muitos alunos podem até mesmo nunca ter tido o contato adequado com a atividade,
precisando de explicações mais detalhadas ou demonstrações – apontando para eles
possibilidades de ação.
Em Síntese
Nesta unidade, pudemos conhecer alguns aspectos relevantes da avaliação na Educação
Infantil. Vimos que o professor possui diferentes alternativas para observar e acompanhar o
desenvolvimento das crianças. Percebemos também a importância de registrar essas obser-
vações para podermos apresentá-las aos envolvidos com a educação da criança, a fim de
que todos possamos trabalhar por seu crescimento e desenvolvimento pleno.
Conforme se pode perceber, a avaliação na Educação Infantil depende da postura do pro-
fessor na construção de uma prática docente significativa, com base em pressupostos teó-
rico-metodológicos, na revisão de ensino e mediação na aprendizagem. Deve, no entanto,
seguir sempre a premissa do desenvolvimento de aluno enquanto sujeito de sua educação
e indivíduo em formação integral, conforme apresentado nos conteúdos normativos.
O desafio que se apresenta é que cada professor se comprometa com um ensino que
auxilie as crianças na construção de conhecimentos que, de fato, as ajudem a crescer e
avançar, cada vez mais, nos diferentes aspectos de seu desenvolvimento, utilizando a
avaliação na Educação Infantil como forma de promoção, crescimento e revisão de práti-
cas, e não de classificar os alunos como comumente vemos em muitas escolas.
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