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Educação Infantil -

Currículo
Material Teórico
História da Educação Infantil

Responsável pelo Conteúdo:


Profa. Ms. Júlia de Cássia Pereira do Nascimento
Profa. Dra. Patricia Silvestre Leite

Revisão Textual:
Profa. Ms. Julia de Cassia Pereira do Nascimento
História da Educação Infantil

• Criação/Objetivos

• A educação dos pequenos no Brasil


republicano: proteger e assistir

• Mudanças no trabalho feminino

• Os movimentos operários

• A reação dos empresários

• Uma política pública assistencialista

·· Nesta primeira unidade, você vai conhecer o conceito de infância


e refletir sobre a trajetória histórica percorrida pela educação
infantil desde os primeiros registros de atendimento às crianças
até a maneira como é vista e desenvolvida atualmente.
·· Trataremos do estudo da evolução histórica das concepções de
criança, infância e educação infantil, tema muito importante
para sua formação, para que você desenvolva um trabalho de
qualidade, proporcionando situações reais de aprendizagem aos
seus alunos na educação infantil.
·· Estou certa de que esta disciplina trará muito crescimento e
satisfação a todos nós.

Para ter um bom desempenho em seus estudos, é preciso organização e disciplina.


A fim de alcançar uma aprendizagem significativa sobre o caminho percorrido pela educação
para que pudéssemos chegar à Educação Infantil oferecida, atualmente, nas escolas, utilize
nosso Ambiente Virtual de Aprendizagem, o Blackboard.

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Unidade: História da Educação Infantil

Contextualização

Quando falamos em currículo, normalmente o que nos vem à mente são teorias e pesquisas
que possibilitaram a formação de uma linha de pensamento e de trabalho pedagógico, embasado
em técnicas e métodos usualmente utilizados para facilitar a aprendizagem do aluno. Falar em
currículo na Educação Infantil causa estranheza em muitas pessoas, até mesmo da área da
educação.
Nosso objetivo é permitir que você desenvolva conceitos relativos à infância e a educação nesta
faixa etária, discutindo as bases teóricas para esta educação, contextualizando nesta unidade
de estudos a trajetória histórica da Educação Infantil, no que diz respeito ao atendimento pré-
escolar no Brasil.
Você já havia pensado nisso? Prepare-se para esta viagem.
Bons estudos a você!

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Conteúdo Teórico

Ao iniciarmos nossas reflexões sobre o


currículo na Educação Infantil, é importante que
você primeiramente reflita sobre esta educação,
focando na construção política, econômica e
social do processo educacional deste nível de
ensino, assim como na influência desta construção
no trabalho realizado hoje nas escolas. Falamos,
portanto naquilo que você precisa conhecer
sobre a Educação Infantil e sobre a maneira de
desenvolver seu trabalho junto às crianças que
fazem parte desta etapa da educação. Antes de
tudo, é preciso que você entenda a que estamos
nos referindo quando falamos em Educação
Infantil, qual idade está incluída desta educação.
O que é então, infância?
Segundo o dicionário Michaelis1 , infância é o “Período da vida, no ser humano, que vai
desde o nascimento até a adolescência; meninice”.
Com base nesta definição podemos delimitar o período da infância, entre o nascimento (zero
anos) até aproximadamente 10 ou 12 anos. Fazendo referência à educação, percebemos que
trabalhamos com a infância na Educação Infantil (0 a 5 anos) e nas séries iniciais da Educação
Básica (6 a 13 anos).
Encontramos também referência à palavra infância, como originária do termo “infans”, com
sentido de não fala. Esta referência leva-nos a refletir sobre o sentido dado à expressão “não-fala”:
• Não-fala no sentido dos primeiros meses de vida, quando o bebê não adquiriu a língua de
sua cultura? Se assim for, então tão logo a criança fale sairá da infância?
• Ou seria não-fala no sentido da crença cultural de que a fala da criança não conta? “Criança
aqui não tem voz, nem vez”., ou “Isso é coisa de criança, não deve ser levada a sério”.
Seja qual for o sentido atribuído a este termo, “não-fala”, é preciso muito cuidado ao utilizá-
lo. Isto porque você já deve ter observado que as crianças utilizam diferentes linguagens para se
comunicar, independente da cultura formal, da escrita ou fala, ou do conhecimento cultural etc.
Hoje, a Educação Infantil constitui-se na primeira etapa da educação básica e destina-se
ao atendimento de crianças de zero a cinco anos. A Lei nº 9394/96, Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDBN), garantiu às crianças de zero a seis anos o atendimento em
creches e pré-escolas, como um direito, inserindo definitivamente a educação infantil no sistema
educacional, como primeira etapa da educação básica, seguida do ensino fundamental e médio.

1 Moderno Dicionário da Língua Portuguesa – Disponível em http://michaelis.uol.com.br/

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Unidade: História da Educação Infantil

Leia o que diz a LDB, na seção II, sobre a inclusão da Educação Infantil na Educação Básica::
Art. 29. A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade
o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico,
psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade.

Art. 30. A educação infantil será oferecida em:

I - creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três anos de idade;

II - pré-escolas, para as crianças de quatro a seis anos de idade.

Art. 31. Na educação infantil a avaliação far-se-á mediante acompanhamento e


registro do seu desenvolvimento, sem o objetivo de promoção, mesmo para o acesso
ao ensino fundamental.

Cabe ressaltar que, embora o artigo 29 destaque o atendimento da criança até seis anos, a
partir de 06 de fevereiro de 2006, a Lei 11.274 regulamentou o Ensino Fundamental de 9 anos,
com o ingresso das crianças com seis anos no 1º ano do Ensino Fundamental, o que nos deixa
na educação infantil com crianças até cinco anos.
Esta preocupação com a formação integral da criança, com o atendimento e desenvolvimento
físico, psicológico, intelectual e social, assim como a participação da família e da comunidade,
é muito recente. Nem sempre foi assim. Para que você entenda os fundamentos metodológicos
que nos orientam no trabalho neste nível de ensino atualmente, assim como as mudanças que
ocorreram nas políticas educacionais e nas práticas pedagógicas da educação infantil, é preciso
saber como tudo começou.
Podemos estabelecer uma linha do tempo desde as primeiras experiências de atendimento às
crianças até a criação das escolas municipais de educação infantil.
Embarque no trem da história e vamos viajar um pouquinho no tempo, para entender como
foi construída a história da Educação Infantil.

Criação/Objetivos

A História da Educação Infantil em nosso país apresenta muitos traços comuns com a da
Europa Ocidental, embora apresente características próprias, decorrentes de nossas condições
sociais, culturais, econômicas e políticas. O atendimento de crianças pequenas longe da mãe
em instituições como creches ou parques infantis, até meados do século XIX, basicamente não
existia no Brasil. No meio rural, onde residia a maior parte da população do país na época,
as mães de alguma forma conciliavam trabalho e cuidado dos filhos. As crianças órfãs ou
abandonadas, frutos em geral da exploração sexual da mulher negra e índia pelo senhor branco,
eram acolhidas pelas famílias de fazendeiros. Já na zona urbana, bebês abandonados por suas
mães, em geral filhos ilegítimos, por vezes de moças de famílias de algum prestígio social, eram
recolhidos nas “rodas de expostos” existentes em algumas cidades.

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Você já ouviu falar da roda dos expostos?

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Acesse o link http://www.santacasasp.org.br/portal/site/quemsomos/museu/


arodadosexpostos para saber mais sobre como funcionava este recurso para as
mães ou famílias que não queriam ou não podiam cuidar de suas crianças.

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Roda_dos_expostos

No período que antecedeu a Proclamação da República, algumas iniciativas isoladas de


proteção à infância promoveram a criação de entidades de amparo, voltadas ao combate
da alta mortalidade infantil da época, o que na verdade, representava apenas uma solução
paliativa e não efetivamente uma preocupação com o atendimento das crianças. Nessa época
não se diferenciavam os objetivos de atendimento de creches, asilos e internatos, porque o
objetivo destas instituições era cuidar somente das crianças pobres.
O desejo de construir uma nação moderna, reflexo da ideologia liberal do final do século
XIX, favoreceu a assimilação, pelas elites políticas, de novos conceitos educacionais elaborados
na Europa, como a ideia de jardim da infância. Estes conceitos foram recebidos com entusiasmo
por alguns setores sociais e combatidos com veemência por outros.
Muitos políticos confundiam os jardins da infância com as salas de asilo francesas, que
eram instituições de mera guarda de crianças, vistas algumas vezes como promotoras de
uma precoce escolarização. Não se pensava à época em oferecer educação às crianças,
sendo os jardins de infância inclusive considerados prejudiciais à unidade familiar por tirar
desde cedo a criança de seu ambiente doméstico, sendo admitidos apenas no caso de
proteção aos filhos de mães trabalhadoras.
Nem todas as pessoas eram contra. Alguns políticos defendiam o jardim de infância por trazer
vantagens para o desenvolvimento infantil. Um deles foi o escritor e jurista Rui Barbosa, que
elaborou, em 1882, um projeto de reforma da instrução no país, no qual considerava o jardim
da infância como a primeira etapa do ensino primário, mostrando que o mesmo era diferente
das salas de asilo e escolas infantis.
O debate legislativo questionava que, se os jardins de infância tinham objetivos de caridade
e destinavam-se aos mais pobres, não deveriam ser mantidos pelo poder público, mas ficar
sob a caridade das famílias afortunadas. Essas ideias eram também definidas pelo Movimento
de Proteção à Infância, apoiado em uma visão assistencialista e preconceituosa em relação à
pobreza, e que defendia um atendimento caracterizado como uma dádiva aos menos favorecidos.

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Unidade: História da Educação Infantil

Nesse contexto, foram criados em 1875, no Rio de Janeiro, e em 1877, em São Paulo, os
primeiros jardins de infância, sem participação do governo, pois estavam sob os cuidados de
entidades privadas. Somente alguns anos depois, em torno de 1896, foram criados os primeiros
jardins de infância públicos, como o que ficava anexo à Escola Caetano de Campos em São
Paulo. O que se percebia, porém era uma mudança de foco no atendimento, pois tanto os
jardins de infância criados pela iniciativa privada como os criados pela iniciativa do governo
dirigiam seu atendimento para as crianças das camadas sociais mais afortunadas e não mais os
desfavorecidos. Este atendimento seguia o desenvolvimento de uma programação pedagógica
inspirada em Froebel, pedagogo alemão que teve grande influência no desenvolvimento da
educação infantil.

Explore

Acesse o link http://revistaescola.abril.com.br/educacao-infantil/4-a-6-anos/


formador-criancas-pequenas-422947.shtml para saber mais sobre Froebel e
o jardim da infância

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Frederick-Froebel-Bardeen.jpeg

Enquanto isso, prevaleciam na educação pré-escolar posições que se arrastam até hoje: a de
realizar assistencialismo e a de promover uma educação compensatória aos mais desafortunados
socialmente. Pensar um ambiente promotor da Educação das crianças dos diferentes grupos
sociais era meta colocada com dificuldade.

A educação dos pequenos no Brasil republicano: proteger e assistir

A Proclamação da República no país pelo Marechal Deodoro da Fonseca, apoiado por


facções sociais em um cenário de renovação ideológica, em 1889, criou novas condições para
o entendimento de questões sociais, embora estas, mais uma vez, continuassem a ser tratadas
conforme a camada social da população atendida. Enquanto em 1899 era criado, no Rio de
Janeiro, o Instituto de Proteção e Assistência à Infância para cuidar de crianças pobres, uma
série de escolas infantis e jardins de infância era criada pela iniciativa privada para atender
crianças socialmente privilegiadas, como, por exemplo, em Belo Horizonte, em 1908, e no Rio
de Janeiro, em 1909.
Em 1919, o governo instituiu o Departamento da Criança, que defendia a ideia de se fazer
uma assistência científica à infância. Começava a predominar um discurso médico de assistência
às crianças, que atribuía à família a culpa por eventuais doenças de seus filhos. O grande
investimento da área de Educação na época, no entanto, estava voltado para o ensino primário,
mas que atendia apenas uma parte da população em idade escolar.

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Mudanças no trabalho feminino

A estrutura familiar tradicional e as concepções e formas de cuidado das crianças pequenas,


enquanto isso, sofreram profundas modificações devido à intensificação da urbanização e da
industrialização em várias regiões do país no início do século XX. Nesse período, um grande
número de mulheres foi incorporado ao trabalho fabril. Porém, o problema do cuidado de
seus filhos enquanto elas trabalhavam foi desconsiderado pelas fábricas. Isto impossibilitava
as trabalhadoras de conciliar, no mesmo espaço, o trabalho remunerado e o cuidado com seus
filhos, como o faziam quando executavam trabalho na roça ou no lar.
Com isto, as próprias mães trataram de criar soluções emergenciais, ou buscando apoio em
seus núcleos familiares, ou contando com a ajuda de outras mulheres, que se propunham a
cuidar dos filhos das operárias em troca de dinheiro. As “criadeiras”, como essas mulheres eram
chamadas, ficaram conhecidas como “fazedoras de anjos”, dada a alta mortalidade das crianças
por elas atendidas em locais com precárias condições higiênicas e materiais.

Os movimentos operários
No início do século XX, a absorção pelas fábricas da mão-de-obra de imigrantes europeus
que chegavam ao Brasil, em geral jovens e do sexo masculino, trabalhadores mais politizados
pelo contato com movimentos que ocorriam em diversos países, provocou uma diminuição
da participação da mulher no setor operário. Apesar disso, o problema da mulher operária
em relação a seus filhos pequenos começou a ser visto de forma nova, em consequência do
movimento operário surgido na década de 1920 e início dos anos 30. Os imigrantes procuravam,
nos sindicatos, organizar os demais operários para lutarem por seus direitos e protestarem contra
as condições precárias de trabalho e de vida a que se achavam submetidos: baixos salários,
longas jornadas de trabalho, ambiente insalubre, emprego de mão-de-obra infantil. Nesse clima,
muitas mulheres operárias também começam a se politizar e a exigir seus direitos, o que incluía
não só melhores condições de trabalho, mas também de vida. Isso levou-as a pleitear a criação
de locais para guarda e atendimento das crianças durante seu trabalho.

A reação dos empresários


A reação dos empresários
Nesse mesmo período ocorreu um fato marcante na relação patrão-empregados. Na tentativa
de atrair e reter a força de trabalho, os empresários mudaram sua política de repressão direta
aos sindicatos, criando vilas operárias, clubes esportivos e também algumas creches e escolas
maternais para os filhos de operários, em cidades como Rio de Janeiro, São Paulo e várias outras
do interior de Minas Gerais, iniciativas que foram timidamente seguidas por outros empresários.

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Unidade: História da Educação Infantil

As creches e as demais instituições sociais criadas junto às fábricas, sendo de propriedade


das empresas, eram usadas por estas no ajuste das relações de trabalho. Alguns empresários
passaram a reconhecer que o fato de o filho da operária ser atendido em instituições mantidas
pelas fábricas trazia vantagens para a produção da mãe.
Apesar dos avanços conseguidos, tanto o discurso dos patrões como o próprio movimento
operário valorizavam um ideal de mulher voltada para o lar, o que contribuía para que as
poucas creches criadas continuassem a ser medidas paliativas para a questão da Educação
Infantil. Assim, a inserção da mulher no mercado de trabalho era contraditória, característica
própria do capitalismo, que exigia a mão-de-obra feminina, mas não lhe dava suporte.

Uma política pública assistencialista

As reivindicações operárias, dirigidas inicialmente aos donos de indústrias, foram, com o


tempo, canalizadas para o Estado e serviram como pressão para a criação de creches, escolas
maternais e parques infantis pelos órgãos governamentais. Tais instituições, no entanto, não
eram reconhecidas como um dever social, mas, sim, como um favor prestado ou um ato de
caridade de certas pessoas ou grupos. Um longo caminho ainda estava por ser percorrido.

As décadas de 1920 e 1930: o foco na saúde e a renovação educacional

No Brasil, nas décadas de 1920 e 1930, alguns centros urbanos que se industrializavam não
dispunham de infraestrutura como saneamento básico, moradias etc. Esse fato aumentava o
perigo de constantes epidemias, o que exigia soluções para este e outros problemas. A creche
seria um dos paliativos defendidos por médicos preocupados com as condições de vida da
população operária, que, em geral, morava em ambientes insalubres.

Algumas propostas sanitárias foram apresentadas, como, por exemplo, a discussão, no


Primeiro Congresso Brasileiro de Proteção à Infância, ocorrido em 1922 no Rio de Janeiro, de
temas como a educação moral e higiênica e o aprimoramento da raça, com ênfase no papel
da mulher como cuidadora. Paralelamente, em 1923, foi aprovada a primeira regulamentação
sobre o trabalho da mulher, que previa que estabelecimentos comerciais e industriais facilitassem
a amamentação durante a jornada de trabalho das empregadas e que fossem instaladas creches
e salas de amamentação próximas do ambiente de trabalho.

Ao lado da preocupação sanitarista em relação às creches, ocorriam no país muitos debates


para a transformação radical das escolas. E com eles era trazida a questão educacional para
o centro das discussões políticas nacionais, tal como ocorria com o Movimento da Escola
Nova, em 1932.

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Nesse período de renovação do pensamento educacional, entre outros pontos, discutia-se a
Educação pré-escolar, apresentada como a base do sistema escolar. Alguns educadores brasileiros
de vanguarda, como Mário de Andrade, em São Paulo, propunham a disseminação de praças
de jogos nas cidades, à semelhança dos jardins de infância de Froebel, assim como ocorria em
vários locais da América Latina, como Havana, Buenos Aires, Montevidéu e Santiago. Tais
praças deram origem aos parques infantis criados em várias cidades brasileiras.
Nota-se o dualismo, a divisão de princípios com que a questão educacional era tratada no
país: o debate sobre a renovação pedagógica dirigiu-se mais aos jardins de infância - onde
estudavam preferencialmente as crianças socialmente privilegiadas - do que aos parques infantis
- onde as crianças de classes populares eram submetidas a propostas de trabalho educacional
que pouco tinham em comum com as ideias dos adeptos do escolanovismo.

As décadas de 1940 e 1950

Em nosso país, a década de 1940 foi marcada por iniciativas governamentais nas áreas de
saúde, previdência e assistência.

O governo Vargas (1930-1945), ao mesmo tempo que resguardava os interesses dos patrões,
reconhecia alguns direitos políticos dos trabalhadores por meio de legislações específicas, como
a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de 1943. Nesta foram apresentadas algumas
propostas sobre o atendimento dos filhos das trabalhadoras, porém somente com o objetivo de
facilitar a amamentação durante a jornada de trabalho.

A cultura desta época mostrava um pensamento geral de que a mãe continuava sendo a
dona do lar e deveria estar limitada ao ambiente doméstico. O atendimento fora da família aos
filhos que ainda não frequentassem o ensino primário era vinculado a preocupações médicas, e
não a metas de desenvolvimento pessoal.

As creches eram vistas como “mal necessário” e planejadas por entidades filantrópicas,
como instituição de saúde com rotinas de triagem, lactário, pessoal auxiliar de enfermagem,
cuja preocupação estava centrada em apresentar um ambiente físico higiênico, para promover
o aleitamento materno e combater a mortalidade infantil. Em sua maioria, estas entidades
passaram a receber ajuda governamental para desenvolver seu trabalho, além de donativos das
famílias mais ricas.

Assim, o trabalho com as crianças nas creches tinha caráter assistencial-custodial, voltado para
alimentar, cuidar da higiene e da segurança física das crianças. A Educação e o desenvolvimento
intelectual das crianças eram pouco valorizados.

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Unidade: História da Educação Infantil

A década de 1960: a educação das crianças em idade pré-escolar no


sistema de ensino

Durante a segunda metade do século XX, o desenvolvimento da industrialização e da


urbanização no país levou a um novo aumento do ingresso da mulher no mercado de trabalho.
Com isso, não só operárias e empregadas domésticas, mas também trabalhadoras do comércio
e funcionárias públicas cada vez mais passaram a procurar creches e parques infantis que
atendessem crianças em período integral. No entanto, a grande maioria dessas instituições não
aprofundava a questão de como garantir a organização de um ambiente estimulante para o
desenvolvimento das crianças então atendidas.

O dinamismo do contexto sociopolítico-econômico do início da década de 1960 trouxe uma


mudança importante para a área: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n.°
4.024/61, aprovada em 1961, que incluiu as escolas maternais e os jardins de infância no
sistema de ensino.
Artigo 23 - A Educação pré-prímária destina-se aos menores até 7 anos, e será
ministrada em escolas maternais ou jardins de infância.

Artigo 24 - As empresas que tenham a seu serviço mães de menores de sete anos
serão estimuladas a organizara manter, por iniciativa própria ou em cooperação com
os poderes públicos, instituições de Educação pré-primária.

Imperavam, contudo, soluções paliativas. No período dos governos militares, que se instalaram
no país a partir de 1964 até o início de 1985, as políticas adotadas em nível federal - por meio
de órgãos como a Legião Brasileira de Assistência e a Funabem - continuaram a acentuar a
ideia de creche, e mesmo de pré-escola, como equipamentos sociais de assistência à criança
carente. A política de ajuda governamental às entidades filantrópicas ou assistenciais continuou
a prevalecer. Foram incentivadas iniciativas comunitárias mediante a organização de programas
emergenciais de massa, de baixo custo. Eles eram desenvolvidos por pessoal leigo, voluntário e
por mães que cuidavam de turmas de mais de cem crianças em idade pré-escolar.

Muitas entidades de atendimento à criança passaram a esboçar uma orientação mais


técnica para seu trabalho, dando ênfase a um trabalho de cunho “educativo sistematizado”
ou escolar nos parques infantis e nas escolas maternais. A ideia de compensar carências
orgânicas ampliou-se para a de suprir faltas culturais como garantia de diminuição do
fracasso escolar no ensino primário.

Por outro lado, as mudanças na Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), ocorridas em
1967, estabeleceram que as empresas deveriam organizar berçários para o atendimento aos
filhos das trabalhadoras. Isso abriu espaço para que outras entidades, que não a própria
empresa empregadora da mãe, realizassem a tarefa por meio de convênios. Contudo, o
poder público não cumpriu o papel de fiscal da oferta de berçários. Assim, as empresas
não instituíram creches e berçários suficientes, prejudicando o ingresso de mulheres, em
especial as de baixa renda, no mercado produtivo, ou mantendo alternativas improvisadas
de atendimento aos filhos das mães trabalhadoras.

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A década de 1970: educação compensatória, aumento de demanda e
redemocratização

Nesse período, muitos fatores contribuíram para que a creche e a pré-escola fossem novamente
defendidas por diversos segmentos sociais. Entre eles, a redução de espaços urbanos lúdicos,
como os quintais e as ruas, a preocupação com a segurança e, fundamentalmente, o crescimento
do operariado, os movimentos dos trabalhadores do campo por melhores condições de trabalho,
bem como a crescente incorporação de mulheres da classe média pelo mercado de trabalho.

A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional formulada em 1971 Lei n.° 5.692/71
trouxe novos elementos para a área do ensino ao declarar: “Os sistemas velarão para que as
crianças de idade inferior a 7 anos recebam Educa-ção em escolas maternais, jardins de infância
ou instituições equivalentes”.(art.19,§2º)

Alguns estudos realizados nos Estados Unidos e na Europa trouxeram novas concepções
pedagógicas que sustentavam que as crianças das camadas sociais pobres sofriam de “privação
cultural” e, assim, justificavam seu fracasso escolar. A partir disso, no Brasil passaram a ser
realizados debates vigorosos em defesa do atendimento pré-escolar público, o qual, em virtude
de receber uma clientela pobre, poderia remediar as carências dessas crianças. Uma vez que
fossem atendidas em creches, parques infantis e pré-escolas, conseguiriam superar as condições
desprivilegiadas em que viviam, ainda que não fossem alteradas as estruturas e razões sociais
que geravam esses problemas.

Sob o nome de educação compensatória, foram elaboradas propostas de trabalho, para


a população de baixa renda em creches e pré-escolas, que inseriam estimulação precoce e
preparo para a alfabetização. No entanto, mantinham-se as práticas educativas geradas por uma
visão assistencialista da educação em geral e do ensino em particular.

Por outro lado, cada vez um número maior de mulheres das camadas médias da população
entravam no mercado de trabalho, o que levou a um crescimento significativo de creches
e pré-escolas, principalmente as de redes particulares. Estas instituições respondiam ao
desejo dessas mães, tendo em vista que ofereciam aprimoramento intelectual a seus filhos e
as liberavam para o mercado de trabalho. Nelas era mantido um padrão educativo voltado
para os aspectos cognitivos, emocionais e sociais da criança pequena, com destaque à
criatividade e à sociabilidade.

Você deve estar percebendo que estes fatores trouxeram alterações na forma como a
Educação pré-escolar e o atendimento em creches eram efetivados. A consequência foi um
aumento de creches, de classes pré-primárias e de jardins de infância no país, bem como foram
sendo modificadas algumas representações sobre Educação Infantil. Também foi valorizado o
atendimento fora da família a crianças de idade cada vez menor.

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Unidade: História da Educação Infantil

Em parques que atendiam filhos de operários e em creches que cuidavam das crianças de
famílias de baixa renda permaneciam discursos compensatórios ou assistencialistas. Já nos
jardins de infância, onde eram educadas as crianças de classe média, eram adotadas propostas
de desenvolvimento afetivo e cognitivo. A superação desta desigualdade de acesso aos benefícios
da Educação da criança pequena continuava uma tarefa difícil.
Na segunda metade da década de 70, a luta de movimentos operários e feministas pela
redemocratização do país e pelo combate às desigualdades sociais levou o regime militar a adotar
medidas para ampliar o acesso da população pobre à escola (pré, primeiro e segundo graus) e
sua permanência nela, para garantir os aprendizados básicos. Enquanto isso, nos grandes centros
urbanos, a reivindicação por creches e pré-escolas por parte de amplas parcelas da população
de mães, que precisavam trabalhar fora do lar pela subsistência da família, intensificou-se e
adquiriu novos sentidos. Tais movimentos substituíram a histórica postura de aceitação do
paternalismo estatal ou empresarial por uma visão da creche e da pré-escola como um direito
do trabalhador e um dever do Estado. Isso criou novas formas de pressão sobre o poder público,
que, naqueles centros, ampliou o número de creches por ele diretamente mantidas e geridas e
o número de convênios de atendimento feito com entidades sem fins lucrativos.

Apesar da resistência dos setores envolvidos em efetivar novas práticas educativas, em


socializar as vantagens observadas em certas formas de trabalho pedagógico - já que essas
mudanças acarretavam investimentos financeiros e, principalmente, de formação de pessoal -
cresceu o número de crianças pequenas atendidas em creches e pré-escolas.

A década de 1980: Discurso pedagógico e a expansão do atendimento

Na década de 1980, o aumento de procura por pré-escola por parte da população continuou a
intensificar-se, pressionando os órgãos governamentais. Com o término do período de governos
militares, em 1985, novas políticas de Educação passaram a admitir a ideia de que as creches
não diziam respeito apenas à mulher ou à família, mas também ao Estado e às empresas.
Diversos discursos políticos apresentavam a Educação pré-escolar como instrumento de preparo
para a escolarização obrigatória, por influência de concepções expressas pelas camadas médias
da população. E cada vez mais as camadas de baixa renda apoiavam essa ideia.

Estes fatores sociais, aliados a discussões de pesquisadores em Psicologia e Educação sobre


a importância dos primeiros anos de vida no desenvolvimento da criança, propiciaram algumas
mudanças no trabalho então proposto pelos discursos oficiais. Com isso, eram valorizadas
atividades pedagógicas mais sistematizadas, embora a preocupação com medidas de combate
à desnutrição continuasse a existir.

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Ao mesmo tempo, os educadores envolveram-se em discussões e questionamenos
políticos sobre o atendimento às crianças, pois os mesmos acreditavam que o trabalho
realizado em creches e pré-escolas poderia efetivamente contribuir para promover a luta
contra desigualdades sociais.

As negociações ocorridas no período que antecedeu a elaboração da Constituição de 1988,


intensificaram a discussão do atendimento ao filho do trabalhador. Isso resultou em aumento
das creches mantidas por empresas industriais, comerciais e por órgãos públicos para os filhos
de seus funcionários. Além disso, algumas empresas começaram a conceder ajuda de custo às
funcionárias com filhos pequenos, para pagarem creches particulares de sua livre escolha.

Ainda assim havia insuficiência de vagas em creches. Diante disso, o poder público incentivou
outras iniciativas de atendimento à criança pequena. Foram implementados programas
assistenciais de baixo custo, estruturados com auxílio de recursos comunitários, tal como ocorria
em muitos países do chamado Terceiro Mundo. Eles eram realizados por “mães-crecheiras”
ou “lares vicinais”, “creches domiciliares” ou “creches lares”. Essas formas de atendimento,
que havia muito a comunidade carente já utilizava, constituíam alternativas emergenciais e
inadequadas, devido à precariedade com que geralmente eram realizadas.

A partir de iniciativas da própria população, houve também aumento de creches comunitárias,


que recebiam verbas públicas para atendimento de crianças de famílias de baixa renda. Às vezes,
eram instituições desvinculadas do apoio governamental e geridas pelos próprios usuários, em
geral população de classe média. Algumas dessas experiências conseguiram concretizar um
trabalho pedagógico consistente e direcionado ao resgate da cultura popular das comunidades.

Redemocratização e crescimento

Nesse mesmo período, a década de 80, os parques infantis e outras modalidades de


instituições educativas públicas foram abandonando a educação informal das crianças em idade
de escolarização regular básica. Abriam suas vagas apenas para o atendimento daquelas em
idade pré-escolar. Expandiram-se as escolas municipais de Educação Infantil, que abrangiam o
trabalho anteriormente feito em parques infantis e jardins de infância, e também as classes pré-
primárias em escolas de Ensino Fundamental.

No início da década de 1980, muitos questionamentos eram feitos pelos técnicos e


professores em relação aos programas de cunho compensatório e à abordagem da privação
cultural nas pré-escolas. Tais programas definiam as crianças por suas carências ou dificuldades
em relação ao padrão das camadas médias exigido nas escolas. Elas eram consideradas por
terem vocabulário diferente, dificuldade de comunicação, relacionamento, controle, orientação
espacial, discriminação visual e auditiva, má condição física, autoimagem negativa, desatenção,
apatia e irritabilidade.

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Unidade: História da Educação Infantil

Para superar os problemas apontados, as propostas compensatórias defendiam uma detalhada


programação de atividades. Contudo, acumulavam-se evidências de que as crianças das classes
populares não estavam sendo efetivamente beneficiadas por esses programas. As pré-escolas
continuaram limitadas a práticas recreativas e assistenciais em virtude da falta de oportunidades
reais para seus professores absorverem as programações propostas.

A discussão das funções da creche e da pré-escola foi retomada e novas programações


pedagógicas foram elaboradas. Eram as que buscavam romper com concepções de creche e de
pré-escola como instituições meramente assistencialistas e/ou compensatórias, propondo uma
função pedagógica que enfatizava o desenvolvimento linguístico e cognitivo das crianças.
No período de redemocratização do país, após o período militar, pressões de movimentos
feministas e de movimentos sociais de lutas por creches possibilitaram a conquista, na Constituição
de 1988, do reconhecimento da Educação em creches e pré-escolas como um direito da criança
e um dever do Estado a ser cumprido nos sistemas de ensino.

O dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia de:

IV - atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade (...)


(BRASIL, Constituição Federal, art, 208, 1998).

Também a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990, concretizou


conquistas em relação aos direitos de crianças declarados na Constituição.

Artigo 53. A criança e o adolescente têm o direito à Educação, visando ao


pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e
qualificação para o trabalho.

Artigo 54. É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente: (...)

IV - atendimento em creche e pré-escola às crianças de O (zero) a 6 (seis) anos


de idade. (...)

Na área de Educação Infantil, houve expansão do número de pré-escolas, e em menor escala,


de creches, e alguma melhoria do nível de formação de seus docentes, muitas vezes já incluídos
em quadros de magistério.
O debate em torno de uma lei que desse nova orientação à Educação Nacional na Câmara
de Deputados e no Senado Federal impulsionou diferentes setores educacionais na defesa de
um novo modelo de Educação Infantil. Foram particularmente estimulados as universidades e
instituições de pesquisa, sindicatos de educadores e organizações não-governamentais.
Esse contexto preparou um ambiente para a aprovação da nova Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (Lei n.° 9.394/96), que designou a Educação Infantil como etapa inicial da
Educação Básica, e que já estudamos no início deste módulo.

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Em Síntese
Pela leitura realizada, você pôde perceber e analisar como era oferecida a educação aos pequenos no
Brasil, cujo objetivo inicial era proteger e assistir. Conheceu o movimento de inserção das mulheres
no mercado de trabalho, o que pedia locais para deixarem seus filhos, muito combatidas pelos
empresários. Passamos a partir da década de 20 por políticas assistencialistas, que focavam na
saúde das crianças, sua inserção no sistema de ensino com uma educação compensatória, chegando
à democratização do país, com um aumento de procura de vagas para as crianças das mulheres
trabalhadoras. O discurso pedagógico para esta faixa etária é intensificado, porém a expansão de
atendimento ainda é insuficiente para a procura.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96 - foi muito importante para a
educação infantil, fazendo com que os profissionais envolvidos com este nível de ensino reivindicassem
mais verbas e mais programas de formação profissional para os professores da Educação Infantil.
Mesmo com todo envolvimento e comprometimento, ainda há muito a se realizar na superação
de políticas assistencialistas e em uma transformação de práticas didáticas em creches e pré-
escolas. É necessário trilhar coletivamente uma nova trajetória para aperfeiçoá-las por meio da
formação continuada.
Com estas reflexões você chegou aos nossos dias, ao trabalho realizado hoje na educação
infantil, enxergando nossa realidade com conhecimento dos caminhos trilhados para chegarmos
até aqui. Assim, você poderá entender um pouco mais sobre os fundamentos metodológicos da
educação infantil.

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Unidade: História da Educação Infantil

Material Complementar

Para aprofundar seu conhecimento sobre o tema desta unidade, seguem sugestões de
leituras complementares:

Explore

1) CARTAXO, Simone Regina Manosso. Pressupostos da Educação Infantil. Curitiba: Ibpex,


2011. Série Fundamentos da Educação. Disponível em
https://cruzeirodosul.bv3.digitalpages.com.br/users/sign_in

Navegue pelo livro e procure pontos de interesse para sua aprendizagem. O capítulo 1 é especialmente
interessante, pois a autora trata dos assuntos discutidos nesta unidade.

2) Leia o artigo sobre John Dewey e a escola nova, movimento que influenciou o crescimento em
defesa da educação e consequentemente da educação infantil.

http://revistaescola.abril.com.br/historia/pratica-pedagogica/john-dewey-428136.shtml

3) OLIVEIRA, Zilma Ramos de. Educação infantil: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez,
2002 (Coleção Docência em Formação)
Leia especialmente o capítulo V deste livro, intitulado: “Os primeiros passos da história da educação
infantil no Brasil”.
Embora não esteja disponível na biblioteca virtual, pode ser encontrado nas bibliotecas das
universidades ou livrarias.

20
Referências

BASSEDAS, Eulália . Aprender e Ensinar na Educação Infantil. Porto Alegre: Artmed, 1999.
GADOTTI, Moacir. História das Ideias Pedagógicas. São Paulo: Ática, 2001.
KRAMER, Sônia. A política do pré-escolar no Brasil: a arte do disfarce. São Paulo: Cortez, 2001.
OLIVEIRA, Zilma; FERREIRA, Clotilde; MELLO, Ana Vitória Telma. Creches: Crianças, Faz de
conta & Cia. Rio de Janeiro, Editora Vozes, 1992.
ROSSETTI-FERREIRA,Maria Clotilde et al, org. Os Fazeres na Educação infantil. São Paulo:
Cortez, 2001.
Secretaria Municipal de Educação de São Paulo: ADI Magistério – série Rotas de
Aprendizagem. 2002.

21
Unidade: História da Educação Infantil

Anotações

22
www.cruzeirodosulvirtual.com.br
Campus Liberdade
Rua Galvão Bueno, 868
CEP 01506-000
São Paulo SP Brasil
Tel: (55 11) 3385-3000
Educação Infantil: Currículo
Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil

Responsável pelo Conteúdo:


Prof.ª Dr.ª Márcia Pereira Cabral

Revisão Textual:
Prof.ª Dr.ª Luciene Oliveira da Costa Granadeiro
Currículo e Atendimento
Educacional na Educação Infantil

• Concepção de Currículo;
• Currículo na Educação Infantil;
• Os Alunos da Educação Infantil;
• Interações Pessoais;
• Interações Educador-Criança;
• Interações Criança-Criança;
• Interações com a Família;
• Áreas da Criança na Educação Infantil.


OBJETIVOS

DE APRENDIZADO
• Abordar a concepção de currículo na Educação Infantil;
• Conhecer os perfis de alunos da Educação Infantil;
• Aprender sobre as diferentes interações entre educador-criança-família.
UNIDADE Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil

Concepção de Currículo
Todas as pessoas envolvidas com educação sejam docentes, alunos, governantes
ou profissionais, embora por diferentes objetivos ou motivações, preocupam-se com
a maneira como a educação de crianças e jovens está acontecendo, uma vez que se
desenvolverá, por meio dela, o projeto de formação da sociedade. Espera-se que a
educação dê conta da formação integral dos alunos. Essas reflexões acabam refletindo
na busca de teorias que enfocam as questões curriculares, ou seja, com o currículo
trabalhado nas escolas.

Figura 1
Fonte: Getty Images

Você sabe o que é currículo?

Se você pesquisar o significado desta palavra, encontrará, entre outros, que currículo
– do latim, curriculum – significa percurso, carreira, curso, ato de correr. Seu signi-
ficado, porém, abrange não somente o ato de correr, mas também o modo, a forma
de fazê-lo (a pé, de carro, a cavalo etc.), o local (estrada, pista, rua, hipódromo etc.) e
o que ocorre no curso ou percurso efetuado.

O que esse percurso tem a ver com a educação?

Moreira (1999) mostra que se encontram registros, ao longo dos tempos, de signi-
ficados diferentes para o termo currículo. A maioria diz respeito a currículo como “con-
teúdos” ou “experiências de aprendizagem”. Alguns registros mostram o currículo ligado
à ideia de plano, objetivos educacionais ou texto e mais recentemente como avaliação.

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Seguindo o significado literal da palavra currículo,
[...] pode-se dizer que este pode ser definido como o percurso que leva à
aquisição de conhecimentos que possam fazer do indivíduo submetido a
ele um profissional que domina sua área e está apto a exercer funções na
mesma. (MOREIRA; SILVA, 2000)

Tratando-se de um percurso, você deve ter percebido que pode se tratar de algo
parado e fixo, porém, flexível e contínuo, que direcione as atividades envolvidas nesse
percurso para o objetivo da educação, que é a aprendizagem e o crescimento dos alunos.

A maneira como a educação formal se apresenta teve diversas mudanças ao longo do tempo.
De perspectivas mais rígidas até modelos mais dinâmicos, a educação se apresentou se
diversas maneiras e gerou diferentes percepções sobre sua estruturação.
Saiba mais sobre o tema lendo a matéria “Percurso formativo: entre o tradicional e o
disruptivo”, disponível no link: https://bit.ly/374su3J

O processo de organização curricular deve abranger conhecimentos teóricos e a


prática educativa, ou seja, a maneira como esses conhecimentos serão trabalhados
em sala de aula, considerando-se a relevância desses conteúdos para a vida do aluno,
assim como “por que” e “como” trabalhá-los (MOREIRA, 1999).

Quais conteúdos são relevantes para a aprendizagem do aluno e a maneira como


esse conteúdo será disponibilizado e trabalhado são escolhas que farão a diferença
no alcance da aprendizagem.

O currículo não pode, portanto, ser estático deve estar sempre em construção,
uma vez que deve acompanhar as mudanças e necessidades de cada aluno, de cada
escola. Não se pode pensar em elaborar um currículo, determinando o que, quando
e como ensinar sem pensar no “para quem” e “onde”, elementos importantíssimos
na determinação da organização curricular.

Todos os envolvidos no processo de organização curricular vivem em uma socie-


dade onde o conhecimento, as tecnologias, relações sociais e políticas influenciam
suas escolhas, trabalho, estudos, enfim, suas vidas.

Assim, o currículo não deve se configurar como um meio neutro de transmitir


uma série de conteúdos, conhecimentos ou informações a um aluno passivo. Deve
reconhecer o processo de busca e aquisição do conhecimento, ensinando os alunos
que aprender não é armazenar resultados, mas sim participar do processo que torna
possível a aprendizagem.

Você deve estar pensando, então, que o currículo é muito mais abrangente em
termos de aprendizagem, devendo realmente se preocupar com a maneira como
serão organizadas as atividades, os conteúdos e conhecimentos, de forma que os
objetivos previstos em determinado curso possam ser alcançados.

Ao aprofundar os estudos sobre currículo, Masetto (2003) remete a três impor-


tantes conceitos:

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UNIDADE Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil

1. Currículo como um conjunto de disciplinas responsáveis pela transmissão


dos conhecimentos específicos para a formação profissional. As disciplinas
se sobrepõem e não interagem entre si. Cabe ao aluno tentar estabelecer
ligações disciplinares com o objetivo de sintetizar o conhecimento, alcançar
a aprendizagem e adquirir competência profissional;
2. Currículo oculto. Diz-se oculto porque não está previsto no currículo formal,
documentado. Surge de colocações e discussões apresentadas no local de
aprendizagem, referente a habilidades, valores e outros aspectos que apa-
recem e permitem que o professor trabalhe assuntos atuais e emergentes,
que não estão expressamente colocados nos currículos;
3. Currículo integrado. Currículo como um conjunto de conhecimentos, de
saberes, competências, habilidades, experiências, vivências e valores que
os alunos precisam adquirir e desenvolver, de maneira integrada e explícita,
mediante práticas e atividades de ensino e de situações de aprendizagem.
A noção de currículo apresentada dessa forma é muito mais abrangente
porque engloba a organização da aprendizagem na área cognitiva, e em
outros aspectos fundamentais da pessoa humana e do profissional: sabe-
res, competências, habilidades, valores, atitudes e ainda mais: ela mantém
a idéia de que as aprendizagens sejam adquiridas explicitamente, mediante
práticas e atividades planejadas intencionalmente para que aconteçam de
forma efetiva, e não apenas por acaso, ou quando der certo. (MASETTO,
2003, p. 67)

Você deve refletir sobre a questão do currículo como uma organização de dife-
rentes elementos que devem incluir disciplinas, conteúdos, atividades, pesquisas,
discussões, dinâmicas, técnicas, métodos e recursos, que permitam ao aluno alcan-
çar a aprendizagem. Deve ser rico e flexível nas oportunidades de aprendizagem
oferecidas aos alunos.

O conceito de currículo oculto é bastante interessante para reflexões acerca da educação e


da prática docente. Para refletir sobre esse tema em um contexto mais direcionado e es-
pecífico, confira o artigo “Prática dos professores frente ao currículo oculto: aula para
além do planejado no ensino da matemática”, de Rodrigo Branco e Lucia Ceccato de
Lima, disponível em: https://bit.ly/2BxVbdQ

Currículo na Educação Infantil


Depois de sua leitura sobre a concepção de currículo, você já sabe que não estamos
falando somente de conteúdos pré-estabelecidos a serem transmitidos ou ensinados
aos alunos, com base em técnicas e métodos usualmente utilizados para facilitar sua
aprendizagem. A idéia[sic] de currículo envolve a apresentação de conhecimentos e

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inclui um conjunto de experiências de aprendizagem que visam favorecer a assimilação
e a reconstrução desses conhecimentos (MOREIRA, 1999, p. 12).

Piletti nos mostra que nos últimos anos, a ideia de currículo se tornou mais rica
e abrangente:
A tendência, nas décadas recentes, tem sido de usar o termo currículo
num sentido mais amplo, para referir-se à vida e a todo o programa da
escola, inclusive às atividades extraclasses. Aliás, as atividades extraclas-
ses são muito importantes para a formação da personalidade da criança.
Elas enriquecem o plano escolar e, consequentemente, a personalidade da
criança. Além disso, são uma importante fonte de motivação. (PILETTI,
2000, p. 52)

Você deve estar se perguntando por que estudar currículo para desenvolver seu
trabalho na Educação Infantil. Realmente, falar em Currículo em Educação Infantil
causa estranheza em muitas pessoas, até mesmo da área da educação. Mas, como
primeira etapa da educação básica, destinada ao atendimento de crianças de zero
a cinco anos e definitivamente inserida no sistema educacional brasileiro, é preciso
proporcionar à criança dessa faixa etária o bem-estar físico, afetivo-social e intelec-
tual, por meio de atividades lúdicas que criem oportunidades de desenvolvimento, a
fim de estimular a curiosidade, a espontaneidade e a harmonia. Todas essas ativida-
des contribuem para a sua integração no triângulo família – escola – comunidade, e
serão desenvolvidas a partir do currículo adotado.

Ao pensar na educação de nossas crianças, nós, professores, devemos ter em


mente que currículo é tudo que acontece na vida de uma criança, na vida de seus
pais e na nossa vida.
[...] Consiste em experiências, por meio das quais as crianças alcançam
a auto-realização[sic] e, ao mesmo tempo, aprendem a contribuir para a
construção de melhores comunidades e de um melhor futuro. (RAGAN
in PILETTI, 2000, p. 52).

Tudo aquilo que o aluno vive e vê pode-se constituir em currículo: conteúdos,


conhecimento científico, cultura, acontecimentos, conhecimentos gerais, meio am-
biente, saúde, música etc.
Atualmente currículo é tudo que acontece na vida de uma criança, na
vida de seus pais e professor. Tudo que cerca o aluno, em todas as horas
do dia, constitui matéria para o currículo. (REIS in PILETTI, p. 52)

Na Educação Infantil, não podemos pensar ou agir de forma diferente. Indepen-


dente da idade de nossos alunos, devemos ter em mente que os mesmos precisam
ser educados em sua totalidade, aprendendo conteúdos, ampliando suas habilidades,
desenvolvendo atitudes e valores, além de estarem equilibrados emocionalmente.
Não podemos nos esquecer também de que, na educação infantil, o educar não
pode excluir o cuidar. Ambos andam juntos nesse nível de ensino.

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UNIDADE Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil

Assim pensando, mesmo nossa disciplina estando focada no trabalho com crianças
entre zero e cinco anos, como professor você deve ter uma postura que privilegie a
construção de um currículo que possa realmente auxiliar nossas crianças a aprender,
crescer, e a se desenvolver. Independentemente do nível de ensino ou da idade de
seus alunos, você deve não somente no que diz respeito a conteúdos, mas como seres
humanos, cidadãos prontos a levar para fora da escola as lições de vida que certamente
podemos vivenciar juntos.

Portanto, a postura do docente, a forma como ele vê seus alunos, como desenvolve
sua prática, como acredita ou não na educação como instrumento de crescimento e
transformação, vai influenciar na elaboração do currículo a ser trabalhado e na sua
prática pedagógica.

Figura 2
Fonte: Getty Images

O aluno não é somente um reprodutor do conhecimento, mas sim produtor e cons-


trutor de saberes. O que nossas crianças aprendem não deve ter impacto somente
no instante em que está estudando e abordando determinado assunto, mas deve ser
parte fundamental de construção de seu caráter e de seu futuro.

É sob esse ponto de vista, da participação da criança na própria aprendizagem e


de nossa responsabilidade, tanto nas oportunidades propiciadas para seu crescimento
quanto no exemplo que somos para essa criança, que você deve pensar o currículo.

O objetivo maior dessas reflexões é colaborar na construção de um currículo arti-


culado no atendimento educacional na Educação Infantil, discutindo as tendências
teóricas e pedagógicas para esse nível de ensino, pensando na formação da criança e
suas interações com pais, educadores e outras crianças.

Para isso, é preciso que você saiba quem são as crianças que recebemos nas es-
colas de educação infantil e como essas crianças aprendem.

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O vídeo “Currículo na Educação Infantil: definições legais” apresenta as definições jurí-
dicas e as possibilidades acerca do conceito de currículo. O vídeo faz parte do Programa do
Curso de Pedagogia Unesp/Univesp, integrante da disciplina de Educação Infantil, e está
disponível no YouTube pelo link https://youtu.be/xgWFOKF-4oQ

Os Alunos da Educação Infantil


Entender quem são nossas crianças é fundamental para que o trabalho com elas
realizado renda bons frutos. Importante também é saber como as crianças, indepen-
dente de etnia, religião, cultura ou nível socioeconômico, são vistas pela sociedade.
O contexto familiar também é muito importante para essa percepção.

Ao trabalhar com educação infantil, você vai perceber que as crianças vêm de dife-
rentes formações familiares, situações socioeconômicas, culturas ou regiões. Além disso,
são crianças que vivem em um mundo globalizado e, portanto, têm grande capacidade
de observação e de intervenção.

Ao entrarem na escola, as crianças já trazem conhecimentos adquiridos de sua


vivência na família, com os amiguinhos, na comunidade religiosa a qual pertence.
Ignorar este conhecimento prévio da criança é perder uma grande oportunidade de
enriquecer a elaboração do currículo.
[...] o desenvolvimento da criança é produto de instituições sociais e sis-
temas educacionais, como família, escola, igreja, que ajudam a construir seu
próprio pensamento e descobrir o significado da ação do outro e de sua pró-
pria ação. (VYGOTSKY, 1931, apud CARDOSO; OLIVEIRA, 2009, p. 2)

Por esses motivos, o trabalho com Educação Infantil pede atenção especial às
interações que se estabelecem envolvendo a criança, pois, a partir delas, pode-se
facilitar ou dificultar tanto a aprendizagem quanto o desenvolvimento dos pequenos.

Interações Pessoais
A criança não é um corpo a ser mantido limpo sob uma cabeça a ser mantida ocu-
pada, como muito já se pensou. Ela é uma totalidade que integra aspectos físicos, afe-
tivos e cognitivos, que tomam sentido através da linguagem e da cultura. Suas relações
com outras pessoas, sejam pessoas adultas ou crianças, são oportunidades para que ela
se constitua como sujeito único, com uma forma toda particular de reagir às situações.
Uma educação que cuida da criança dá atenção constante a todos esses aspectos.

A Educação Infantil deve criar para cada criança múltiplas oportunidades para
que ela possa se expressar e respeitar os sentimentos, ideias, costumes e preferências
do outro. Deve garantir, ainda, que cada criança seja aceita com suas características

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UNIDADE Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil

físicas e morais. Uma educação cuidadosa seleciona experiências socialmente rele-


vantes de aprendizagem e propõe metas valiosas à construção de competências,
apoiando, assim, a formação de um autoconceito positivo do educando.

Nesse contexto, as relações afetivas das crianças apresentam-se como fatores


importantes em seu desenvolvimento e crescimento.

“Interagir com a criança é muito importante para o seu desenvolvimento”, diz pedia-
tra americana – Leia em: https://bit.ly/2Y1d0td

Interações Educador-Criança
Sabemos que as brincadeiras e os jogos infantis são fundamentais para o desen-
volvimento e a aprendizagem da criança. Eles são recursos privilegiados que devemos
garantir enquanto direitos da infância. Mas, neste processo, qual o papel do educador?

Para que a criança brinque e se envolva com a brincadeira, é fundamental que


ela se sinta emocionalmente bem na relação com quem a cerca, que, no contexto do
CEI, são os educadores e as outras crianças. Essa ideia indica que, para a criança,
suas relações sociais têm muita importância e devemos considerá-las com seriedade.

Quando compreendemos essa característica do desenvolvimento infantil, tornam-se


mais evidentes o papel e a função da interação enquanto um aspecto essencial para
que a criança se socialize, aprenda, cresça etc.

Figura 3
Fonte: Getty Images

Quando a criança brinca, é muito comum ouvirmos frases do tipo: “ela está
apenas brincando, não é sério!” Ou, no outro extremo: “por que você não brinca
disto? E agora daquilo outro?...”. Esses são exemplos de atitudes que não colocam
o educador como parceiro e interlocutor da criança: ou ele se afasta ou dita regras.
Mas qual será a medida?

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O primeiro passo é entendermos que a brincadeira é um ritual interativo (por
exemplo, quando o adulto se esconde atrás de um pano e diz: “achou!”) no qual
a função do educador é também garantir a expressão da criança, acolhendo suas
emoções e necessidades, permitindo, assim, que ela estruture seu pensamento.
Além disso, ele deve ser uma pessoa verdadeira, que se relaciona afetivamente
com a criança, criando condições para que ela questione, reflita etc. Dessa forma,
na convivência cotidiana, o educador pode ser uma pessoa que transmite seguran-
ça para a criança, acolhendo suas emoções. O educador deve ser capaz de ouvir
a criança, valorizando suas perguntas e produções, e de respeitar suas opiniões.
Agindo assim, ele se torna um parceiro com quem a criança pode contar na explo-
ração de um mundo grande, novo e muito interessante.

Leia “O papel do professor frente à questão do brincar para crianças de 04 (quatro) a


06 (seis) anos”, disponível em: https://bit.ly/308uYfW

A ação do educador como mediador da relação que as crianças estabelecem entre


si auxilia para que elas desenvolvam capacidades como tomadas de decisões, constru-
ção e apreensão de regras, cooperação, diálogo, solidariedade etc. Assim, o educador
favorece o desenvolvimento de sentimentos de justiça e atitudes de cuidado que a
criança passa a ter com ela própria e com as outras pessoas.

O educador, quando considera a criança como um ser ativo em seu processo de


desenvolvimento, faz a mediação entre ela e seu meio, podendo utilizar inúmeros
recursos como o próprio espaço físico do CEI, materiais, brinquedos, atividades
plásticas etc. Mas é fundamental o modo pelo qual o educador se relaciona com a
criança: como a observa, apoia, dá respostas, explica os acontecimentos e as regras,
questiona. Em outras palavras, o educador deve interagir com a criança, sendo um
facilitador, interventor, problematizador e propositor, levando em conta suas reações
e encorajando e incentivando seus modos de brincar e de compreender o mundo.
Assim, educador e crianças juntos poderão se transformar e descobrir diferentes
modos de se relacionar.

Quando o educador compartilha uma brincadeira ou jogo com a criança, ele pode
ajudá-la a enfrentar eventuais insucessos, estimular seu raciocínio, sua criatividade,
reflexão, autonomia etc. Isso quer dizer que, quando o educador tem intenção de
brincar junto com a criança, ele pode criar diversas situações que estimulem o seu
desenvolvimento, como a inteligência, a afetividade etc.

No filme “Sociedade dos Poetas Mortos”, o professor John Keating, interpretado por
Robin Willians, ingressa como docente em um colégio somente de garotos. Por meio da
criatividade, das artes e do pensamento crítico, ele usa abordagens diferenciadas para
captar a atenção e o interesse dos jovens para a educação. Confira o trailer do filme, dispo-
nível em: https://youtu.be/Oo9R1neW4lw

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UNIDADE Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil

Interações Criança-Criança
Como vimos, a interação entre o educador e a criança é fundamental para o de-
senvolvimento infantil. Mas... E as crianças desenvolvem-se a partir das interações
que estabelecem entre elas?

Quando a criança brinca com outra criança, ela age de maneira cooperativa, faz
imitações, disputa objetos, briga. Esses são momentos de intenso desenvolvimento:
os companheiros de mesma idade despertam interesse e possibilitam percepções so-
bre as diversidades (maneiras de lidar com as mais variadas situações, gênero, raça/
etnia etc.). Além disso, esse tipo de interação possibilita que a criança compartilhe
com outra criança suas dúvidas, expresse suas emoções e fale de suas descobertas,
tornando todas essas em situações de aprendizagem.

Esses momentos de interação podem ser estimulados quando o educador cria situ-
ações nas quais os grupos são privilegiados. Ou seja, propor às crianças explorações
em duplas ou trios, projetos em grupo de quatro ou mais crianças etc. Por exemplo,
desenvolver em grupo um teatro de fantoches permite à criança negociar o tema da
história, expressando suas emoções e desejos sem usar a agressividade. Quando isso
ocorre, a criança está aprendendo a elaborar planos coletivos, negociar, dividir e com-
partilhar. Ela desenvolve também o sentimento de pertencer a um determinado grupo.

Esse tipo de interação em grupo auxilia a criança a controlar seus impulsos, pois
ela deve apreender algumas regras, comportar-se de maneira cooperativa, tentar
compreender as outras crianças. Além disso, a criança se enriquece por comparti-
lhar diferentes experiências e situações: ela tem a oportunidade de expressão e de
contato com vivências distintas da sua própria.

Entenda melhor o assunto com o vídeo desenvolvido pela Universidade Federal do Oeste do
Pará “Interações e Brincadeiras: Eixos Norteadores da Educação Infantil”, disponível
em: https://youtu.be/nTrJmj7OWcM

Interações com a Família


Em nossa sociedade, a família tem sido o espaço privilegiado de socialização das
crianças. O bebê nasce em uma cultura e, particularmente, no seio de uma família,
que constitui seu primeiro meio de desenvolvimento. É esperado que ela busque
garantir a sobrevivência e o desenvolvimento dos filhos, prestando cuidados mate-
riais, afetivos e intelectuais necessários ao bem-estar infantil. Por meio dela, a criança
apreende noções de verdade, de beleza e ética, entre outros temas de sua cultura,
contribuindo para a reprodução do mundo social.

Cada família cria suas formas de lutar pela sobrevivência e, ao fazê-lo, estabelece
diferentes formas de organização, alterando os papéis e as funções de cada membro.

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Quando, por exemplo, a mulher começou a sair de casa para trabalhar, houve a
necessidade de criar alternativas extrafamiliares para o cuidado das crianças, como
a creche. A socialização e a transmissão dos temas relacionados à sua cultura passa-
ram a ser compartilhadas entre a família e a instituição de Educação Infantil.

O filme “Relações de Família”, de 2019, conta a história de um patriarca de uma família com
relações e situações problemáticas, interagindo e se conectando em meio às dificuldades,
ilustrando a maneira como conflitos e divergências fazem parte do contexto familiar. Confira
o trailler, disponível em: https://youtu.be/86M_R-02tlg

O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (1990, Artigo 53) – dispõe que a


família tem o direito de conhecer e de participar da elaboração da proposta pedagó-
gica das instituições educacionais que seus filhos frequentam.

A relação entre o CEI e as famílias é importante para ambos, dado que comparti-
lham a educação das crianças. Contudo, frequentemente, essa relação é atravessada
por muitas emoções, que vão da alegria à tristeza, da raiva à gratidão. Por isso, a
formação do professor de Educação Infantil deve discutir novas formas de diálogo e
de trabalho compartilhado com as famílias.

Abrir a unidade educacional à presença constante e à participação ativa da família


em seu cotidiano não é fácil! Ao frequentar o CEI, os pais passam a observar o que
acontece lá dentro e a fazer mais perguntas, a dar sugestões e a fazer pedidos que
nem sempre podemos atender. É, então, que aparecem as diferenças individuais,
uma vez que cada pai ou mãe requer um tipo de atenção diferente. Cada grupo
familiar pode ter uma história, uma bagagem cheia de diferentes valores, crenças e
formas de ver o mundo.

Tentar enquadrar as famílias em modelos rígidos, com base em um pretenso


“funcionamento ideal”, é correr o risco de considerar a existência de apenas uma
ou poucas formas possíveis de viver, de se relacionar e de experienciar o mundo.
Agindo assim, pode-se cometer o engano de considerar as famílias que se afastam de
um pretenso modelo ideal como sendo perigosas ao bom desenvolvimento psíquico e
moral das crianças, sem avaliar a dinâmica daquele contexto familiar em uma socie-
dade concreta.

Apesar de a legitimação do divórcio ter acontecido recentemente, a separação de


casais é uma prática que já vem ocorrendo de longa data e que tem se acentuado
cada vez mais. Hoje, não é difícil encontrarmos famílias nas quais tanto pai quanto
mãe já tiveram outras uniões conjugais e filhos.

Leia a matéria “Divórcio sem traumas: como conversar com a criança, de acordo com a idade”,
disponível em: https://glo.bo/2MqddAO

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UNIDADE Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil

Além das separações, assistimos atualmente a uma grande diversidade de formas


de organização familiar: famílias agregadas ou compostas por apenas um dos pais
morando com os filhos, avós que assumem o filho de sua filha adolescente e pessoas
solteiras ou casais homossexuais que adotam crianças. Essas novas configurações
familiares de pais e irmãos biológicos separados, padrastos e meios-irmãos vêm exi-
gindo constantes redefinições de valores e atitudes na família e na sociedade.

O ambiente escolar ao ser considerado, junto com a família, um local de socia-


lização, tem grande responsabilidade na forma como vai se posicionar diante dos
diferentes valores e atitudes, de ordem familiar e social.

As relações familiares, assim como as relações entre a escola e as famílias, são, em


geral, permeadas por conflitos e tensões inevitáveis, porém, promotores do desenvol-
vimento, pois é do conflito que resulta a inovação cultural.

Contudo, muitas vezes, ocorrem formas de violência que exigem do educador/


professor alguma atitude em defesa dos direitos da criança. Ao se constatar alguma
forma de violência dirigida à criança – física ou simbólica, ocorrida em casa ou na es-
cola, sejam espancamentos, castigos, humilhações, abuso sexual, abandono (desde
não lhe trocar fraldas por muitas horas até trancá-la no quarto ou deixá-la por longo
tempo vendo TV) –, é preciso consultar o ECA, discutir com os colegas e refletir
sobre qual deve ser a atitude mais adequada em benefício dessa criança.

Situações de insegurança e risco sociais – como pobreza, desemprego, violência,


uso de drogas, morte, doenças físicas e mentais – podem ser fatores de desagregação
que prejudicam a família no exercício de suas funções de apoio e de socialização,
tornando-se problemáticas à medida que as pessoas deixam de ter perspectivas para
compreender e superar esses conflitos.

A instituição de Educação Infantil, apesar de não substituir políticas de assistência


à família, deve pensar um trabalho com a família, pois cabe à creche ou pré-escola
oferecer um espaço onde ela possa ser acolhida para ampliar sua aprendizagem
sobre o que é ser cidadã, sendo respeitada em suas particularidades e apoiada, de
modo a repensar e a traçar formas mais produtivas de participação e, aos poucos,
transformar sua realidade.

Figura 4 – Participação familiar na educação é fundamental


Fonte: Getty Images

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Muitos professores de Educação Infantil assumem uma postura autoritária,
cobrando das famílias das crianças condutas que elas não podem adotar e de acre-
ditar que elas nada têm a contribuir para o trabalho da instituição só faz aumentar
os conflitos, os desentendimentos, as mágoas recíprocas. Com essa postura, eles
perdem valiosas oportunidades de entender a realidade dos pais e a das crianças,
ao mesmo tempo em que os familiares são prejudicados com relação a entender os
propósitos educativos da escola, bem como as possibilidades e limitações pessoais,
materiais ou institucionais nele presentes.

Nas relações entre a família e a escola, as aproximações explicitam conflitos e reque-


rem negociações que considerem os sentimentos que vão surgindo. Para resolver os
conflitos, é necessário buscar, no diálogo, uma definição cada vez mais clara do papel
e das funções de cada parte. Dito assim, parece fácil desenhá-la, mas não é.

Para promover maior diálogo com as famílias, é necessário “desacomodar” nossos


sistemas de crenças e valores. Isso exige disponibilidade para ouvir sem julgamentos
prévios e, ao mesmo tempo, um exercício de objetividade para explicar o trabalho
que é feito.

Não podemos nos esquecer de que o homem é passional. Amor, ódio, carinho,
rejeição, aceitação são sentimentos que temos para com nossos filhos, irmãos, marido,
esposa e também para com as crianças, colegas de trabalho e famílias. Devemos, por-
tanto, saber lidar com essas emoções. Sem isso, brigaríamos todos os dias e teríamos,
em seguida, de pedir desculpas ou continuar brigando durante toda a vida!

Para conquistar um ambiente mais tranquilo e harmonioso junto às famílias,


podemos, além das festas tradicionais e reuniões, criar alguns eventos para incen-
tivar a participação dos pais: quando possível, organizar um café da manhã no pátio
em comemoração à chegada da primavera; um sarau; uma feirinha de exposição das
produções das crianças; um teatrinho rápido, encenado por pais e educadores juntos
num final de tarde.

Ao prepararmos uma reunião, é importante encontrar meios de fazer com que


os pais se sintam bem recebidos. Quando os chamamos para apontar o que devem
ou não devem fazer, eles acabam deixando de comparecer, a menos que sejam obri-
gados. É mais interessante quando os chamamos para informar a respeito do projeto
pedagógico ou para debater um tema específico. Nessas ocasiões, aqueles que esti-
verem mais motivados e interessados, certamente, mudarão de postura em relação
à escola e a seus profissionais.

Podemos investigar, entre os familiares, aqueles que têm habilidades especiais,


como saber tocar um instrumento, ser um bom contador de histórias, saber lidar com
marcenaria e com pintura, ter dotes culinários, jardinagem etc. e convidá-los para ir
à escola desenvolver essas atividades com as crianças. Essa é uma forma de partici-
pação que contribui para que a família passe a conhecer um pouco mais o cotidiano
escolar, principalmente, para que as crianças participem da integração entre suas
famílias e sua escola.

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UNIDADE Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil

Áreas da Criança na Educação Infantil


Além de considerar o contexto geral da infância na educação infantil, é preciso
entender que essa etapa do desenvolvimento também não é homogênea. Em cada
idade, são desenvolvidas habilidades e potencialidades que se desenvolvem à medida
que a criança aprende novas atividades, noções e conceitos.

O que uma criança sabe fazer em determinado momento de sua vida depende
de variados fatores. Uma criança é capaz de começar a falar, por exemplo, por
imitação de sons. Ou pode ter sido estimulada a estabelecer algumas relações com
a pessoa que cuida dela, desenvolvendo o interesse em se comunicar, aguçando a
vontade de entender e fazer-se entendida.

Você já deve ter observado que, de um modo geral, as crianças apresentam está-
gios de desenvolvimento que são determinados por conhecimentos e habilidades
inerentes à sua faixa etária e, normalmente, comuns a todas as crianças da mesma
idade. Esses estágios representam avanços na qualidade daquilo que as crianças têm
possibilidade de realizar antes ou depois dessa mudança, representando a passagem
para outra etapa de desenvolvimento.

Os estágios são universais, ou seja, todos os seres humanos passam pelos mesmos
estágios, ainda que não necessariamente na mesma idade.

O biólogo Jean Piaget observou que as crianças passam por estágios de desenvol-
vimento que permitem que avancem no conhecimento e ação.

Dica de artigo: “Da Ação à Compreensão: Um Passeio pela Teoria de Piaget”, disponível
em: https://bit.ly/3gTqi3B

Mesmo assim, as crianças não são iguais. Os momentos em que ocorrem os saltos
qualitativos podem ser diferentes, conforme as crianças e os grupos culturais aos quais
pertencem. Daí a importância de percebermos e entendermos o contexto no qual as
crianças se desenvolvem. Os meios ricos em estímulos e afeto proporcionam uma evo-
lução mais rápida no desenvolvimento das capacidades do que contextos menos ricos
em estímulos ou afetividade.

Existem, portanto, traços gerais da evolução da criança na etapa da educação


infantil. Podemos dividir o desenvolvimento infantil em três grandes áreas:
• Área motora: relaciona-se com o desenvolvimento dos movimentos do corpo
humano, tanto em sua globalidade como dos segmentos corporais. Nas crianças,
destacamos o equilíbrio, o andar, falar, correr, pular, a coordenação motora etc.;
• Área cognitiva: refere-se à capacidade de compreender o mundo e de atuar
nele, em diferentes idades, por meio da linguagem ou da resolução de situações-
-problema que são apresentadas às crianças. É preciso que você lembre que, na

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faixa etária da educação infantil, a criança tem grande capacidade de criação e
comunicação, fazendo uso de diferentes linguagens: verbal, gestual, artística, do
faz-de-conta etc.;
• Área afetiva: engloba o desenvolvimento do equilíbrio pessoal, que faz com que
a criança se sinta bem consigo mesma; da relação interpessoal, que auxilia no
confronto com situações e pessoas novas; e da atuação e inserção social, que
permite à criança estabelecer relações cada vez mais alheias, distanciadas, bem
como atuar no mundo que a rodeia.

Apresentar etapas ou estágios de desenvolvimento divididos dessa forma é muito


útil como um recurso de estudo e para que você entenda as diferentes áreas de desen-
volvimento das crianças, porém, sabemos que o desenvolvimento é global e existem
constantes relações entre as capacidades desenvolvidas, inclusive entre as áreas. Além
disso, as crianças diferem entre si, o que faz com que crianças de uma mesma idade
estejam em diferentes graus de desenvolvimento.

Entender de que maneira os estágios do desenvolvimento afetam o aprendizado


é fundamental no contexto do currículo escolar. Igualmente importante é entender
quais são as formas de aprendizado – brincadeiras e interações, por exemplo – já
que elas influenciam diretamente as metodologias e premissas que devem ser con-
sideradas no planejamento. Esses desdobramentos do aprendizado serão abordados
na próxima unidade.

Em Síntese
Nesta unidade, você aprendeu que elaborar um currículo no trabalho com a Educação
Infantil não é algo estranho, mas necessário. Para isso, é preciso que o professor saiba
como integrar o conhecimento que se espera que a criança adquira com situações coti-
dianas, com a vivência da criança e suas expectativas.
Além disso, você viu como as relações interpessoais são importantes para a criança, que
aprende e cresce a partir dessas relações. Também verificamos que professor e escola
devem estabelecer relações de parceria com a família, para que a criança tenha o senti-
mento de pertencimento aos dois grupos: familiar e escolar.
A partir do seu conhecimento sobre currículo e do entendimento da importância das rela-
ções estabelecidas entre você e as crianças e seus pais, respeito às relações entre as próprias
crianças, você poderá desenvolver um rico trabalho junto às crianças na Educação Infantil.

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UNIDADE Currículo e Atendimento Educacional na Educação Infantil

Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

 Sites
Começo da Vida
https://bit.ly/3cBZukV

 Leitura
Currículo, Culturas e Contextos Integrados à Formação de Educadores
https://bit.ly/2XXVYwd
Um Estudo Reflexivo sobre o Currículo na Educação Infantil
https://bit.ly/3eQphro
O Interacionismo Social e a Investigaçao da Brincadeira Infantil: Uma Análise Teoricometodológica
https://bit.ly/36ZEqnr

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Referências
BASSEDAS, E. et al. Aprender e Ensinar na Educação Infantil. Artmed, 1999.

CARDOSO, I.; OLIVEIRA, J. S. Prática da atividade de Vygostky. 2009. Dispo-


nível em: <http://estagiocewk.pbworks.com/f/jacqueline+e+inomis.pdf>.

MASETTO, M. T. Didática: a aula como centro. São Paulo: FTD, 1997.

MASETTO, M. T. Competência Pedagógica do professor universitário. São Paulo:


Summus, 2003.

MOREIRA, A. F. B.; CANDAU, V. M. Indagações sobre currículo. Caderno Cur-


rículo, Conhecimento e Cultura. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de
Educação Básica, 2007.

MOREIRA, A. F. B. Currículo: Questões atuais. Campinas, SP: Papirus, 1997.

MOREIRA, A. F.; SILVA, T. T. (orgs). Currículo, Cultura e Sociedade. 2000.

PILETTI, C. Didática Geral. São Paulo: Ática, 2000.

SÃO PAULO. Secretaria Municipal de Educação de. Organização do Trabalho


Pedagógico. Módulo 2. São Paulo: SME/DOT, 2002.

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Educação Infantil: Currículo
Desenvolvimento e Aprendizagem
da Criança na Educação Infantil

Responsável pelo Conteúdo:


Prof.ª Dr.ª Márcia Pereira Cabral

Revisão Textual:
Prof.ª Dr.ª Luciene Oliveira da Costa Granadeiro
Desenvolvimento e Aprendizagem
da Criança na Educação Infantil

• Introdução;
• Formas de Aprendizagem e a Educação Infantil;
• Reflexos Jurídicos dos Conceitos Teóricos;
• Educação Infantil na Contemporaneidade.


OBJETIVOS

DE APRENDIZADO
• Abordar as formas de aprendizagem na edução infantil, através da ludicidade;
• Conhecer a experiência com os objetos e com as situações;
• Entender como gamificar a aprendizagem através de prêmios no aprendizado;
• Aprender sobre os reflexos jurídicos dos conceitos teóricos, tais como a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação.
UNIDADE Desenvolvimento e Aprendizagem da Criança na Educação Infantil

Introdução
Durante muito tempo, a Educação Infantil foi direcionada ao atendimento de
crianças que necessitavam de assistência enquanto suas mães trabalhavam fora. Esse
caráter assistencialista da Educação Infantil privilegiava o cuidado com a criança
como principal objetivo das instituições. Até hoje, alguns professores entendem que
seu papel junto às crianças é mantê-las limpas, alimentadas e saudáveis, com grande
destaque para o “cuidar”.

Figura 1 – Centro de Educação Infantil (CEI) de Campinas, creche fundada da década de 1940
Fonte: campinas.sp.gov.br

Porém, a partir de 1996, com a LDB nº 9394, a Educação Infantil foi inserida no
sistema educacional como a primeira etapa da educação básica. Portanto, somente
cuidar não mais atende aos objetivos legais propostos; é preciso educar. Foi a pri-
meira vez que as creches foram consideradas espaços de aprendizagem e formação
infantil em sentido educacional.

Tornou-se necessário superar a concepção assistencialista que ainda predomina


na Educação Infantil, atendendo aos aspectos legais, mas, principalmente, revendo a
concepção que se tem de infância, a postura do professor que atua nesta faixa etária
e até mesmo as responsabilidades da sociedade perante essas crianças.

Estamos falando em cuidar e educar na Educação Infantil. Mas há diferença entre


essas duas ações?

Cuidar: significa “zelar pelo bem-estar ou pela saúde de; tratar da saúde de; sustentar;
­empregar a atenção; ter desvelo por” (MICHAELLIS).

De um modo geral, podemos entender cuidar como atenção e desvelo direciona-


do ao bem-estar e saúde de alguém. Na Educação Infantil, podemos perceber que o
“cuidar” é imprescindível e exige também conhecimentos e estratégias que possam
explorar a potencialidade pedagógica desse cuidar.

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O cuidado precisa considerar, principalmente, as necessidades das crian-
ças que quando observadas, ouvidas e respeitadas, podem dar pistas im-
portantes sobre a qualidade do que estão recebendo. Para se atingir os
objetivos dos cuidados com a preservação da vida e com o desenvolvi-
mento das capacidades humanas, é necessário que as atitudes e proce-
dimentos estejam baseados em conhecimentos específicos sobre desen-
volvimento biológico, emocional, e intelectual das crianças, levando em
conta diferentes realidades socioculturais. (BRASIL, 1998, p. 25)

O cuidar remete-nos, portanto, ao auxílio dado às crianças em seus primeiros passos


e atividades, com referência tanto ao aspecto biológico quanto ao aspecto afetivo e
emocional. Toda criança necessita de cuidados referentes à alimentação e asseio, mas
precisa, também, sentir-se segura, encontrar apoio e incentivo na figura do professor.
Além disso, cabe ao professor conhecer as necessidades que cada criança tem,
observando, ouvindo e respeitando cada uma delas, para que a própria criança também
possa identificá-las, auxiliando o atendimento.

Já educar significa proporcionar às crianças momentos em que suas capacidades


e habilidades possam ser desenvolvidas. Encontramos sua definição no RCNEI –
Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil:
Educar significa, portanto, propiciar situações de cuidados, brincadeiras
e aprendizagens orientadas de forma integrada e que possam contribuir
para o desenvolvimento das capacidades infantis de relação interpessoa­l e
de ser e estar com os outros em uma atitude básica de aceitação, respeito­,
confiança, e o acesso, pelas crianças aos conhecimentos mais amplos da
realidade social e cultural. (BRASIL, 1998, p. 24)

É claro que crianças pequenas necessitam de cuidados essenciais, como higiene,


alimentação, segurança, mas, em contrapartida, interagem com o mundo e as outras
pessoas, participam de experiências que as levam a descobrimentos. Ao propiciar
o desenvolvimento desses dois momentos importantes à criança, o professor estará
trabalhando a educação.

Como você pode perceber, o professor de Educação Infantil deve ser capaz de
entender que o cuidar e o educar não se separam e também de manter o equilíbrio
entre esses dois processos no atendimento das crianças. Deve pensar apoiado em
uma concepção integral da criança, visando ao desenvolvimento cognitivo, afetivo,
emocional, físico e social.

Para tanto, é preciso saber como as crianças aprendem e o que pode auxiliá-las
a crescer e evoluir.

Entenda os processos educacionais que estão envolvidos no processo de cuidar e de que


maneira essa relação acontece no vídeo “Cuidar, Educar e Brincar”, do Instituto Advento e
disponível em: https://youtu.be/s71QaTgNdiw

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UNIDADE Desenvolvimento e Aprendizagem da Criança na Educação Infantil

Formas de Aprendizagem
e a Educação Infantil
A forma como as crianças desenvolvem a aprendizagem, seja em relação a com-
portamentos, habilidades, hábitos seja quanto aos conhecimentos, pode ocorrer de
diferentes maneiras. Depende também da forma como essa criança é apresentada ao
objeto de aprendizagem ou estimulada a realizar esta ou aquela tarefa. Entender de
que maneira isso acontece é fundamental para compreender na prática os elementos
abordados acima sobre o desenvolvimento infantil.

Segundo Palácios (1991 In BASSEDAS, 1999), existem diferentes caminhos ou


maneiras de aprender que podem ser estudados para orientar nosso trabalho com as
crianças na Educação Infantil: a aprendizagem através da experiência com os objetos;
a aprendizagem através da experiência em determinadas situações; a aprendizagem
através do prêmio e do castigo; a aprendizagem por imitação; e a aprendizagem pela
formação de “andaimes” por parte da pessoa adulta ou outra pessoa mais capaz.

Vamos entender cada uma dessas formas de aprender da criança?

O TedX “Novas formas de aprender e ensinar”, com os palestrantes João Pedro Magnani
e Pedro Lu, versa sobre a questão das possibilidades de aprendizagem e da maneira como
isso pode ser explorado. Disponível em: https://youtu.be/IOMmdBpTKqc

Ludicidade
A ideia de que a educação infantil pode começar antes da fase de alfabetização
trouxe consigo reflexões acerca de outros aspectos da infância. A primeira delas é
a de que a aprendizagem vai muito além dos conteúdos teóricos que são ensinados
formalmente nos quadros-negros; aprende-se a cada momento e as ferramentas que
materializam essa realidade são muitas e diversas.

O desenvolvimento infantil está muito atrelado ao desenvolvimento de novas habi-


lidades e de percepções sobre o mundo em que está inserido. Espera-se, por exem-
plo, que as crianças sejam capazes de pular corda e de esperar na fila até chegar a
sua vez. Embora pareça corriqueira, essa atividade indica que a criança já desenvol-
veu suas capacidades motoras a ponto de conseguir executar a ideia prática da brin-
cadeira (pular a corda sem pisar nela, no caso), ao mesmo tempo em que entende o
conjunto sistemático de regras para conseguir seguir as normas proposta.

É nesse sentido que se observa a necessidade de considerar a importância de


elementos lúdicos na educação infantil. A ludicidade diz respeito ao que é feito com
a função de divertir, de representar a realidade e de expressar ideias e sentimentos.
Nas palavras de Leal e D’Ávila (2013, p. 43):

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Lúdico vem do latim ludus que, de acordo com Huizinga: “abrange os
jogos infantis, a recreação, as competições, as representações litúrgicas
e teatrais, e os jogos de azar” (HUIZINGA, 2004, p. 41). Acrescenta
que os jogos têm um profundo cunho estético, uma intensa e fascinante
­capacidade de excitar. Lúdico deriva também do radical latino In lusio
que quer dizer ilusão, em jogo. Talvez essa característica explique a ideia
de simulacro que reside por detrás do conceito.

Ou seja, a ludicidade é importante para desenvolver capacidades cognitivas e


funções psicológicas nas crianças. Nesse sentido, as contribuições do psicólogo e
expoente da educação Lev Semyonovich Vygotsky são essenciais, pois permitem
entender de que maneira essas capacidades são desenvolvidas. O pensador russo foi
um dos primeiros a considerar como as práticas de interação e condições de vida
influenciam na aprendizagem e no desenvolvimento infantil.

Vygotsky (1998) inicia seu pensamento na ideia de que o ser humano possui fun-
ções psicológicas de processamento de informações e acontecimentos e que elas
podem ser divididas em duas categorias: elementares ou superiores. Ações reflexas
e instintivas – como olhar em direção à fonte de um barulho, por exemplo – são
elementares, pois são mais básicas e naturais, sendo compartilhadas por animais e
garantidas por natureza aos seres vivos; estão atreladas à sobrevivência. Já as funções
superiores são típicas da convivência social do homem, sendo construídas à medida
que cada pessoa interage, aprende e pensa enquanto indivíduo inserido na sociedade.

Note que as funções superiores são desenvolvimentos psíquicos que não nascem
com a criança, mas desenvolvem-se por meio de suas vivências, experiências e in-
terações. É nesse sentido que nasce a Teoria Histórico-cultural do Desenvolvimento
Humano de Vygotsky, na qual o pensador considera que o desenvolvimento das
funções superiores só acontece no processo de vivência e interação.

O autor considera ainda que cultura é todo o produto da vida social do indivíduo.
A partir dessa vivência e do desenvolvimento das funções superiores, as próprias
funções elementares incorporam-se culturalmente. Ou seja, o ser humano desenvol-
ve-se a ponto de ressignificar as funções naturais dentro de sua realidade, efetuando
a passagem da ordem da natureza à ordem da cultura (SIRGADO, 2000).

Embasado nesse pensamento, Vygotsky entende a escola como espaço inicial


para esse desenvolvimento e considera as interações ali existentes essenciais para
a aprendizagem e desenvolvimento infantil. Para o autor, “é no brinquedo que a
criança aprende a agir numa esfera cognitiva ao invés de uma esfera visual externa,
dependendo das motivações e tendências internas e não dos incentivos fornecidos
pelos objetos externos” (VYGOTSKY, 1998, p. 100-101).

O programa “Nós da Educação”, do canal EducaPlay, aborda as teorias de Vygotsky com uma
entrevista com a professora Zoia Prestes. Disponível em: https://youtu.be/i6NQ1S_SDUw

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UNIDADE Desenvolvimento e Aprendizagem da Criança na Educação Infantil

O desenvolvimento infantil também foi alvo dos estudos de Jean Piaget, educador
e pensador suíço. O autor (1973) considera que as crianças passam por etapas de
desenvolvimento com potencialidades específicas, fundamentais para seu desenvol-
vimento pleno. São elas:
• Sensório-motor (0 a 2 anos): criança em fase de exploração de seu meio;
linguagem ainda limitada e não há função semiótica (criação de referenciais
mentais de significado);
• Pré-operatório (2 a 7 anos): desenvolvimento da linguagem, da capacidade
semiótica e do entendimento de modelos;
• Operações concretas (7 a 11 ou 12 anos): capacidade de interiorizar ações e
conceitos, realizando atividades desenvolvidas em pensamento próprio, coorde-
nação de ações e capacidade de entender pontos de vista externos;
• Operações formais (11 ou 12 anos em diante): capacidade de pensamento
estrutural, no qual se desenvolvem ideias, noções, valores e questionamentos de
modelos tradicionais.

As definições piagetianas são essenciais para a educação infantil, já que descre-


vem de maneira bastante clara aquilo que pode e deve ser desenvolvido em cada
etapa. Ou seja, nota-se de maneira sistematizada que as crianças estão sempre em
desenvolvimento e que as capacidades obtidas ao longo de suas vivências são essen-
ciais também para o desenvolvimento futuro. Trata-se de um processo de desenvolvi-
mento, no qual cada experimentação gera um crescimento cognitivo para a criança.

Quer entender melhor sobre os estágios de desenvolvimento infantil abordados por P­ iaget?
O artigo “O Desenvolvimento da Criança nos Primeiros Anos de Vida”, de Durlei de
­Carvalho Cavicchia, é uma boa leitura sobre o tema. Disponível em: https://bit.ly/2A17gI1

A Experiência com os Objetos


O conhecimento infantil processa-se e inicia-se com uma exploração dos objetos.
É na ação direta sobre determinado objeto que a criança desenvolve o conhecimento.

Durante os dois primeiros anos de vida, a criança realiza exploração e experimen-


tação constantes com objetos, o que lhe proporciona um conhecimento do mundo que
a envolve: as características dos objetos (os que têm gosto, os que fazem ruído, os que
são proibidos, pela mãe, de serem tocados, os que se movem, os que rolam...), as rela-
ções que podem ser estabelecidas entre os objetos e as situações (se movo isto, posso
ver o que está em cima; se peço água, conseguirei que meu pai venha me ver etc.).

A criança passa de simples esquemas de ação para condutas mais complexas, por
meio de processos que, conforme você leu, Piaget denomina assimilação (aplicação
do mesmo esquema a diferentes objetos e situações) e acomodação (pequenas mu-
danças que a criança introduz nos esquemas para adaptar-se a situações diferentes).

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A criança pequena, que se encontra na etapa sensório-motora, faz uma aprendiza-
gem do mundo que a envolve e aprende a resolver as situações com as quais convive
à medida que vai colocando em prática esquemas cada vez mais complexos para
indagar e intervir na realidade.

Figura 2
Fonte: Getty Images

A atividade com objetos é muito importante para a criança durante toda a in-
fância. Mas você vai perceber que, a partir do momento em que a criança se torna
capaz de se comunicar pela linguagem, haverá mudanças no tipo de atividade que a
ela fará para conhecer o mundo: ela passará a fazer operações mentais não visíveis,
utilizando a linguagem como instrumento de pensamento. De qualquer modo, o
contato com os objetos e a experiência que a criança tem através do jogo individual,
em grupo ou com uma pessoa adulta são situações de aprendizagem básicas durante
todo o período que poderíamos considerar como etapa da educação infantil.

É por isso que precisamos pensar em atividades que proporcionem situações de


jogo, experiência e manipulação de objetos diversos, bem como na realização de
experiências adequadas ao nível de compreensão das crianças dessa faixa etária.

Já ouvir falar em Annie Sullivan? A professora ganhou notoriedade após trabalhar com
Helen Keller, uma criança surda e cega. A educação aconteceu por meio do tato e da explo-
ração de objetos táteis. A descoberta desse modo de aprendizagem e o desenvolvimento da
menina são retratados no filme “O milagre de Anne Sulivan”, de 1962.
Veja o trailer, disponível em: https://youtu.be/bedqZxHX6QA

A Experiência com as Situações


Além das experiências com os objetos, as crianças da Educação Infantil vivem
experiências que se relacionam com as situações cotidianas. Com isso, elas já
conseguem pensar e antecipar o que esperam que aconteça, o que é natural para
determinada situação na qual ela está envolvida, imaginar a continuação de uma

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UNIDADE Desenvolvimento e Aprendizagem da Criança na Educação Infantil

cena etc. Todas as situações que envolvem a rotina de sua vida, como acordar, vestir-
se, tomar café, brincar no parque, almoçar, passear, jantar, ou mesmo ações menos
rotineiras, como ir ao cinema, ao restaurante, viajar, servem para que a criança
estabeleça uma lógica em suas ações uma vez que as situações se apresentam sempre
de forma parecida.
Através de tais situações, a criança aprende a identificar os objetos que
são previsíveis de encontrarem-se em determinados lugares (é estranho
encontrar uma escova de dentes na cozinha) , a maneira como as coisas
estão habitualmente situadas no espaço (as cadeiras encostadas ou abai-
xo da mesa, os quadros na parede) e também a sucessão temporal de
determinadas situações (primeiro tira-se as fraldas sujas: depois, limpa-se
o bumbum; depois se põe fraldas limpas e começa-se a vestir a criança;
ou, para passear, primeiro se põe o casaco, em seguida o gorro/boné
e, finalmente, pega-se o carrinho em que vai a criança, abre-se a porta,
etc.). (BASSEDAS, 1999, p. 26-27)

Essas experiências também auxiliam a criança a perceber o que lhe é permitido


fazer em uma situação ou em outra, quais são as expectativas em relação ao seu
comportamento em determinadas situações, o que ela deve evitar. Para isso, é pre-
ciso que a criança se sinta segura, a fim de que sua participação nas situações habi-
tuais da vida leve à aprendizagem de coisas importantes e não sirva somente como
exercício de hábitos, mas sim contribua para o desenvolvimento de conceitos que
levarão ao crescimento e conhecimento de si mesmas e do mundo que as envolve.

A escola tem um papel fundamental na socialização das crianças e, portanto, no contexto


da aprendizagem com situações. Sobre esse tema, confira o artigo “Crianças na educação
infantil: a escola como lugar de experiência social”, disponível em: https://bit.ly/309jlFy

Os Prêmios e os Castigos
Você já deve ter presenciado crianças sendo premiadas (um sorriso, um abraço,
um presente, um comentário elogioso etc.), ou castigadas (indiferença, uma cara bra-
va, algumas palavras com tom de aborrecimento etc.) por alguma conduta. Muitas
vezes, tais prêmios ou castigos são utilizados para mostrar à criança quando suas
condutas são aceitas ou não, entendendo quais limites lhes são impostos ou cedidos.
Na escola, é comum percebermos desentendimentos entre professores e alunos,
entre pais e filhos, pois as crianças testam os limites dados pelos adultos, tentando
fazer o que normalmente não é permitido.

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Figura 3
Fonte: Getty Images

Bassedas (1999) destaca que os prêmios e castigos são ferramentas úteis para
trabalhar situações de aprendizagem das normas de conduta. Porém, é preciso que
haja coerência e bom senso no estabelecimento de normas pelo adulto, evitando
também ser inflexível na negociação dos limites, uma vez que isso ensina a criança
a não negociar e ser também inflexível, tornando-se incapaz de compreender que
pode haver diferentes soluções para determinadas situações.

O mais importante é que se evitem os castigos que influem de maneira negativa


na autoestima e na segurança da criança. Não se devem utilizar castigos que ridicula-
rizem a criança perante os outros ou utilizar a retirada de afeto como castigo. Ambas
as situações fazem a criança sentir-se insegura e causam-lhe sofrimento.

Tirinha de Chico Bento satirizando as punições. Disponível em: https://bit.ly/2zAerXA

A Imitação
Você vai perceber, na etapa da educação infantil, que as crianças aprendem imitan-
do o que veem e vivem com as pessoas que estão ao seu lado. O pai, a mãe, os educa-
dores, os professores, coleguinhas são importantes para a criança e servem de modelo
para suas ações. Expressões, modo de agir, atitudes e comportamentos são imitados.

Isso não é de todo ruim, uma vez que as experiências vividas e a imitação de
situações ou pessoas darão chance à criança de demonstrar o que está sentindo ou
de representar situações vividas, tanto boas quanto ruins, mostrando ao adulto como
se sente.
Assim, através da imitação, as crianças podem aprender com as pessoas
que para elas são modelos a controlar e a representar situações vividas,
bem como vivê-las. (BASSEDAS, 1999, p.28)

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UNIDADE Desenvolvimento e Aprendizagem da Criança na Educação Infantil

Reflexos Jurídicos dos Conceitos Teóricos


Os desenvolvimentos acerca da educação e das formas de aprendizagem foram,
aos poucos, sendo incorporadas em esferas de discussão pública e institucional. Isso
significa que as concepções acadêmicas se juntaram às percepções e contribuições
de pais, profissionais da educação, alunos e pessoas de outras profissões para com-
por um volume de conhecimento que mescla teoria e prática.

Por que isso é importante? Porque é somente a discussão transversal de temas tão
relevantes quanto à educação que permite avanços concretos na realidade prática.
É preciso juntar os avanços referenciais e teóricos com os elementos, limitações e
possibilidades da educação escolar para criar modelos e ferramentas aplicáveis em
toda a sociedade.

Figura 4
Fonte: Getty Images

É nesse sentido que surge a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB).


Promulgada em 1961, a legislação trouxe consigo noções de igualdade no direito
à educação, garantia de acesso a todos e a descrição de quais seriam as obrigações
do Estado sobre a educação. A aprovação se deu 13 anos após a apresentação
do primeiro projeto à Câmara, o que mostra o longo caminho percorrido para
esse acontecimento.

A segunda versão da lei foi aprovada em 1971, em contexto de ditadura militar.


O que se observou, então, foi praticamente a manutenção da estrutura anterior com
a desobrigação dos investimentos públicos mínimos na educação. Ou seja, o legado
da ditadura na LDB teve consequências diretas nos cortes de verbas e no aumento
da desigualdade de acesso.

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De acordo com Saviani (p. 299, 2008):
Em consequência da exclusão do princípio da vinculação orçamen-
tária, o governo federal foi reduzindo progressivamente os recursos
Cad76_04ARTIGOS.pmd 1/4/2009, 09:58 298 Cad. Cedes, Campi-
nas, vol. 28, n. 76, p. 291-312, set./dez. 2008 299 Disponível em Der-
meval Saviani aplicados na educação: “desceu de 7,60% (em 1970), para
4,31% (em 1975), recuperando-se um pouco em 1978, com 5, 20%”
(Vieira, 1983, p. 215). Assim, liberado da imposição constitucional, o in-
vestimento em educação por parte do MEC chegou a aproximadamente
um terço do mínimo fixado pela Constituição de 1946 e confirmado pela
LDB de 1961.

Em 1996, foi promulgada a versão atualizada da lei, vigente até os dias de hoje.
Ela incorpora as correntes teóricas e as vivências que discutimos até agora e iremos
explorar mais as suas definições no próximo capítulo.

Educação Infantil na Contemporaneidade


As considerações observadas ao longo do capítulo, que perpassam desde a ne-
cessidade da ludicidade na educação infantil e as formas de aprendizagem até os
reflexos dessas visões sobre a legislação de educação, são essenciais para entender o
contexto atual. Percebe-se que a necessidade de documentos referenciais escolares,
que considerem teóricos da educação juntamente com o contexto brasileiro, foi se
mostrando cada vez mais concreta e relevante.

É esse contexto de dinamismo e multiplicidade que a LDB se junta às Diretrizes


Curriculares para Educação Infantil e aos Referenciais Curriculares Nacionais para
Educação Infantil (RCNEI), que estudaremos no próximo capítulo.

Em Síntese
Você já sabe a importância do currículo para a Educação Infantil; sabe como as crianças
dessa faixa etária aprendem, quais são suas fontes de conhecimento. Seja qual for a
fonte de conhecimento destacada na aprendizagem da criança, é preciso atenção aos
materiais didáticos utilizados, aos objetos e brinquedos, às condições do ambiente físico
e aos recursos humanos disponíveis, pois, juntos, esses elementos constituem-se com-
ponentes fundamentais para a elaboração de um currículo rico, com conteúdos, ativida-
des, conceitos, habilidades e competências necessários à aprendizagem, e que levarão
ao desenvolvimento de uma Educação Infantil de qualidade.
Em resumo, até aqui vimos que, quando escolhemos uma concepção de cuidado e edu-
cação integrada com a família, é necessário considerar várias dimensões do relaciona-

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17
UNIDADE Desenvolvimento e Aprendizagem da Criança na Educação Infantil

mento e desenvolvimento humanos. Já discutimos, também, que a tarefa dos professo-


res de Educação Infantil e da equipe pedagógica é providenciar, prover bem-estar para
a criança, evitando contágios de emoções negativas e promovendo alegria, cooperação,
curiosidade etc.
Vimos que, para educar em ambientes coletivos, é necessário planejar nossas ações para
aproximar as famílias do ambiente escolar e organizar essas aproximações no cotidiano.
A tarefa de planejar é complexa, não é mesmo? Precisamos organizar ambientes, dis-
cutir coletivamente os projetos, envolver as famílias, considerar a capacidade e as ha-
bilidades de cada faixa etária, considerar as estações do ano, entre outras providências.
Depois de tudo planejado e vendo que as crianças estão brincando, comendo, pulando,
investigando, perguntando, aprendendo, cuidando, educando, ficamos muito satisfei-
tos. Isso porque, quando a gente gosta, é claro que a gente cuida!

18
Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

 Vídeos
Documentário “Um, Dois, Três, Brincando”
https://youtu.be/0Oc4eFg8lHQ

 Leitura
Da Ação à Compreensão: um Passeio pela Teoria de Piaget
https://bit.ly/2z4agmp
Crianças na Educação Infantil: a Escola como lugar de Experiência Social
https://bit.ly/309jlFy
Processo de Criação das Primeiras Creches Brasileiras e seu Impacto
sobre a Educação Infantil de Zero a Três Anos
https://bit.ly/2U8Nzoq

19
19
UNIDADE Desenvolvimento e Aprendizagem da Criança na Educação Infantil

Referências
BASSEDAS, E. et al. Aprender e Ensinar na Educação Infantil. Artmed, 1999.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.


Referencial curricular nacional para a educação infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998.
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/rcnei_vol1.pdf>.

BRASIL. Relatório de análise de propostas curriculares de ensino fundamental


e ensino médio. Brasília, DF: MEC, 2010. Disponível em: <http://portal.mec.gov.
br/index.php?option=com_content&view=article&id=13868:relatorios-programa-
-curriculo-em-movimento&catid=195:seb-educacaobasica&Itemid=936>.

LEAL, L. A. B.; D’ÁVILA, C. M. A ludicidade como princípio formativo. Interfaces


Científicas, Educação, Aracaju, v. 1, n. 2, p. 41-52, fev. 2013. Disponível em: <http://
www.uece.br/endipe2014/ebooks/livro3/67%20A%20LUDICIDADE%20NA%20
PR%C3%81TICA%20PEDAG%C3%93GICA%20DO%20PROFESSOR%20DE%20
M%C3%9ASICA.pdf>.

MASETTO, M. T. Didática: a aula como centro. São Paulo: FTD, 1997.

_______. Competência Pedagógica do professor universitário. São Paulo: Sum-


mus, 2003.

MOREIRA, A. F. B.; CANDAU, V. M. MEC, SEB. Indagações sobre currículo.


Caderno Currículo, Conhecimento e Cultura. Brasília: Ministério da Educação, Se-
cretaria de Educação Básica, 2007.

_______. Currículo: Questões atuais. Campinas, SP: Papirus, 1997.

MOREIRA, A. F.; SILVA, T. T. (orgs.). Currículo, Cultura e Sociedade. 2000.

PIAGET, J. Para onde vai a educação? Rio de Janeiro: Livraria José Olympo.
Editora/Unesco, 1973.

PILETTI, C. Didática Geral. São Paulo: Ática, 2000.

SAVIANI, D. História das ideias pedagógicas no Brasil. Campinas SP: Autores


associados, 2007.

_________. O legado educacional do regime militar. Cad. Cedes, Campinas,


vol. 28, n. 76, p. 291-312, set./dez. 2008. Disponível em: <http://www.cedes.
unicamp.br>.

SIRGADO, A. P. O social e o cultural na obra de Vigotski. Educ. Soc. [online].


2000, vol.21, n.71, pp.45-78. ISSN 1678-4626. Disponível em: <https://doi.
org/10.1590/S0101-73302000000200003>.

Vygotsky, L. (1998). A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes.

20
Educação Infantil: Currículo – un4 - pag 1

Educação Infantil: Currículo


Unidade 4
Referenciais Legais para a
Organização Curricular da
Educação Infantil

• Introdução;
• LDB em Vigor;
• Tipos de Educação;
• Educação Infantil;
• Modificações da LDB – Lei Federal nº 10.639 de 2003;
• Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil (RCNEI);
• Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica (DCNEI).

OBJETIVOS DE APRENDIZADO
• Refletir sobre as orientações da LDB, do RCNEI e principalmente das DCN em relação à
organização da Educação Infantil;
• Analisar a importância das diretrizes curriculares no que se refere aos direcionamentos
para o processo de ensino-aprendizagem na Educação Infantil;
• Refletir sobre as orientações da LDB, do RCNEI e das DCN em relação à organização da
Educação Infantil.
Educação Infantil: Currículo – un4 - pag 2

Introdução
Para trabalhar com Educação Infantil é imprescindível preparo e consciência para
respeitar a legislação vigente, como já abordamos no capítulo anterior. Também é
preciso acolher as crianças e conhecê-las, ampliar o atendimento e melhorar a qua-
lidade do serviço prestado à educação.
Para que esse trabalho possa ser realizado de forma a atender às necessidades de
aprendizagem das crianças, alguns documentos são essenciais para a sistematização
das áreas que devem ser trabalhadas: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB),
os Referenciais Curriculares Nacionais para Educação Infantil (RCNEI) e as Diretrizes
Curriculares Nacionais da Educação Básica (DCN).
Estudaremos cada um desses documentos a seguir.

LDB em Vigor
Como vimos em unidades anteriores, a Lei de Diretrizes e Bases, criada no regime
ditatorial, permaneceu em vigor até 1996, quando o então presidente Fernando
Henrique Cardoso promulgou a nova versão. A LDB 9394/96 reafirma o direito à
educação gratuita a todos e estabelece as responsabilidades das instâncias federais,
estaduais e municipais.

A Educação Infantil insere-se na educação básica, que é dividida em três etapas:


• Educação Infantil: creches (de 0 a 3 anos) e pré-escolas (de 4 e 5 anos):

» Creches: gratuita, mas não obrigatória;


» Pré-escolas: gratuitas e obrigatórias;
» de responsabilidade municipal;
• Ensino Fundamental: anos iniciais (do 1º ao 5º ano) e anos finais (do 6º ao 9º ano):
» obrigatório e gratuito;
» deve ser gradativamente de responsabilidade municipal;
» na prática, municípios costumam se responsabilizar pelos anos iniciais, e
estados pelos finais;
• Ensino Médio: o antigo 2º grau (do 1º ao 3º ano), profissionalizante ou não:
» responsabilidade estadual.

Tipos de Educação
Outro ponto importante da LDB é a determinação dos tipos de educação. São elas:
• Educação Especial: atende alunos com necessidades especiais (deficiências e
superdotação, por exemplo), preferencialmente na rede regular de ensino;
Educação Infantil: Currículo – un4 - pag 3

• Educação a distância: atende alunos por meio de ferramentas de telecomunicação;


• Educação Profissional e Tecnológica: forma, atualiza e prepara os alunos
para conhecimentos tecnológicos e práticos de determinada profissão;
• Educação de Jovens e Adultos: atende alunos que não frequentaram ou con-
cluíram o ensino regular no período adequado;
• Educação Indígena: atende alunos de comunidades indígenas, adequando-se à
cultura e língua de cada uma.

Figura 1
Fonte: Getty Images

Educação Infantil
A seção II da LDB 9394/96 descreve especificamente a educação infantil:
Art. 29. A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem
como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de
idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, comple-
tando a ação da família e da comunidade.

Art. 30. A educação infantil será oferecida em:

I – creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três anos de idade;

II – pré-escolas, para crianças de quatro a seis anos de idade.

Art. 31. Na educação infantil a avaliação far-se-á mediante acompanha-


mento e registro do seu desenvolvimento, sem o objetivo de promoção,
mesmo para o acesso ao ensino fundamental.
Educação Infantil: Currículo – un 4 - pág 4

Modificações da LDB –
Lei Federal nº 10.639 de 2003
A lei nº 10.639 foi um importante marco educacional no que tange o respeito e
a valorização da cultura e da igualdade. Isso porque a sua promulgação garantiu o
ensino da cultura e da história africana e indígena nas escolas.

Dos mais de 200 milhões de brasileiros, quase 20 milhões são negros e quase 90
milhões são pardos, de acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística). Isso significa que mais da metade da população tem descendência afri-
cana ou indígena e o reconhecimento disso em nível jurídico e escolar é fundamental
para a evolução da educação como um agente modificador e social.

Confira o vídeo “A obrigatoriedade do estudo da história e cultura afro-brasileira e


indígena”, da TV Brasil. Disponível em: https://youtu.be/_QE6ppxk0vQ

O que são os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN)?


Com o intuito de orientar os professores na rotina escolar, o Ministério da Educação elaborou
pela primeira vez em 1997 os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Eles descrevem os
conteúdos que devem ser idealmente trabalhados em cada série do ensino fundamental e
médio, abrangendo tanto o ensino público quanto privado.
Os PCN buscam ter uma descrição dos conteúdos, mas ainda assim possuem modelos bas-
tante incisivos sobre o currículo. Sendo assim, eles devem ser apropriado pelos educadores
como ideal normativo, ainda que trazido para a realidade de cada instituição de ensino,
professor e alunos, para gerar o melhor resultado possível.
Essa perspectiva fez com que muitos teóricos e profissionais da educação apresentassem
críticas aos PCN, apontando a maneira como a natureza diferenciada de cada contexto
requer currículos próprios.
Note que não se pretende diminuir a importância dos PCN na educação brasileira, já
que foram relevantes no contexto de sua criação. As críticas sobre sua aplicação giram,
geralmente, no fato de que apresentam planos curriculares rígidos e foram elaborados
sem discussões, ou seja, sem a consideração de profissionais da educação e da sociedade.
Além disso, críticos mais recentes corroboram a necessidade de diretrizes mais dinâmicas
quando se considera as modificações acontecidas na sociedade nas últimas décadas.

O programa Papo de Educador, do Teleduc, aborda as diferenças entre DCN, PCN e BNCC.
Confirao vídeo “Diferenças entre BNCC, PCN e Diretrizes Curriculares”.
Disponível em: https://youtu.be/T1ztHC8f2Os

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11
Educação Infantil: Currículo – un 4 - pág 5

Referencial Curricular Nacional


para Educação Infantil (RCNEI)
O RCN integra a série de documentos dos Parâmetros Curriculares Nacionais ela-
borados pelo Ministério da Educação. Foi criado na década de 1990, com o objetivo
de apontar metas de qualidade no trabalho desenvolvido nas creches e pré-escolas.
Além disso, dá subsídios para que possamos incorporar atividades educativas aos
cuidados essenciais das crianças e suas brincadeiras, e, com isso, contribuindo para
o desenvolvimento integral das identidades das crianças, propiciando crescimento
como cidadãos cujo direito à infância é legalmente reconhecido.

Desta forma, o RCNEI está organizado por idade – de zero a três e de quatro a seis
anos – com objetivos, conteúdos e orientações didáticas, diretamente ligados às faixas
etárias, e não especificamente pela denominação “creche” e “pré-escola”. Além da
organização por idades, o RCNEI organiza-se por âmbitos e eixos educacionais.

Ao trazer orientações sobre o desenvolvimento na Educação Infantil, o Referencial


Curricular Nacional para a Educação Infantil apresenta o brincar, a identidade e o meio
como determinantes nas interações humanas, com indicação das bases que asseguram
a construção de uma proposta pedagógica para cada faixa etária.

De acordo com Rossetti-Ferreira (2001, p. 191), como o próprio nome diz, ele é
apenas um referencial, pois cada município e cada instituição deverão elaborar a sua
proposta pedagógica de acordo com as características da sua realidade. Assim, res-
peitando o que está colocado no artigo da LDB sobre os princípios e fins da educação
nacional, temos que o ensino será ministrado (e aí também se incluem as creches e
pré-escolas) com base na autonomia institucional e no pluralismo de ideias e concep-
ções pedagógicas.

O Referencial Curricular Nacional é um documento oficial do MEC – Ministério


da Educação, e foi elaborado em três volumes:
• Volume 1: leva o título “Introdução” e traz as concepções de creches e pré-
escolas no Brasil, de criança, educação, instituição e do profissional que atua
nessa faixa etária. Destaca-se a importância da participação coletiva na cons-
trução do projeto educativo, por professores, profissionais e técnicos envolvidos
com a Educação Infantil, num processo de gestão democrática. Além disso, a
criança é entendida como um ser social, único e historicamente situado, que
possui características particulares e diferenças específicas, sendo capaz de
pensar, opinar, concordar ou não, construir seu conhecimento;
• Volume 2: faz referência ao âmbito da “Formação Pessoal e Social”, que está
ligado às vivências e experiências que vão beneficiar a construção do indivíduo e
seu desenvolvimento. Aborda processos de fusão e diferenciação, construção de
vínculos e expressão da sexualidade. Destaca as maneiras que a criança se utiliza
para aprender, como imitação, brincar, oposição, linguagem e apropriação da

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Educação Infantil: Currículo – un 4 - pág 6

imagem corporal. São também destacados os objetivos que se espera alcançar


de acordo com cada faixa etária, assim como os conteúdos que devem ser desen-
volvidos, com as orientações didáticas para o professor, para que os objetivos
possam ser alcançados;
• Volume 3: com o tema “Conhecimento de Mundo” , são apresentados seis docu-
mentos sobre a construção de diferentes linguagens, assim como as relações
estabelecidas com os objetos do conhecimento: Movimento, Música, Artes Visuais,
Linguagem Oral e Escrita, Natureza e Sociedade e Matemática.

O artigo “O pedagogo-professor na educação infantil: desafios na relação teoria e


prática do cuidar e educar” é uma boa pedida para quem quer saber mais sobre o tema.
Disponível em: https://bit.ly/2MtICCq

Diretrizes Curriculares Nacionais


da Educação Básica (DCNEI)
As DCN são originadas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996
e têm como objetivos fornecer os fundamentos que devem reger a educação básica
no país e tornar o ambiente escolar mais adaptado aos processos de desenvolvimento
infantil. Elas devem orientar o planejamento curricular de cada escola, fornecendo
todo o suporte necessário para a execucão dessa tarefa.

Um ponto muito importante é saber diferenciar as DCN dos PCN (Parâmetros


Curriculares Nacionais). As diretrizes compõem um documento previsto em lei, que
descreve instruções normativas para a educação básica. Os PCN, por sua vez, são
tópicos por matéria e disciplina que deveriam ser trabalhados em cada série do ensino
escolar; não tendo previsão legal.

A primeira versão da DCNEI foi publicada em 2009, por meio da Resolução nº 5,


de 17 de dezembro de 2009, que fixa as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil.

Objetivo da DCNEI
A DCNEI de 2009 tem como objetivo:
1.1 Esta norma tem por objetivo estabelecer as Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil a serem observadas na organização
de propostas pedagógicas na educação infantil.

1.2 As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil arti-


culam-se às Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica e re-
únem princípios, fundamentos e procedimentos definidos pela Câmara

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Educação Infantil: Currículo – un 4 - pág 7

de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, para orientar as


políticas públicas e a elaboração, planejamento, execução e avaliação de
propostas pedagógicas e curriculares de Educação Infantil.

1.3 Além das exigências dessas diretrizes, devem também ser observadas
a legislação estadual e municipal atinentes ao assunto, bem como as nor-
mas do respectivo sistema. (BRASIL, 2009, p. 11)

Definições
A DCNEI também foi relevante na medida em que trouxe definições fundamentais
para a educação infantil e que são norteadoras de seu ensino. São elas:
• Educação infantil: etapa inicial da educação básica, para crianças de 0 a 5 anos,
oferecida em creches ou pré-escolas. As instituições podem ser públicas ou pri-
vadas, mas é dever do Estado garantir educação pública a todos os interessados.
Pode ter jornada parcial ou integral;
• Criança: a criança é vista na DCNEI como um indivíduo histórico e de direitos.
É a pessoa que constrói sua identidade pessoal ou coletiva através de suas inte-
rações e vivências;
• Currículo: “conjunto de práticas que buscam articular as experiências e os sabe-
res das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural,
artístico, ambiental, científico e tecnológico, de modo a promover o desenvol-
vimento integral de crianças de 0 a 5 anos de idade” (BRASIL, 2009, p. 12);
• Proposta Pedagógica: a DCNEI traz o conceito de proposta pedagógica como
orientadora das ações da instituição, contendo as metas de aprendizagem e de-
senvolvimento. Também conhecida como projeto político pedagógico, é feita de
forma coletiva (direção, professores e comunidade). Sobre esse conceito,
Art. 8. A proposta pedagógica das instituições de Educação Infantil deve
ter como objetivo garantir à criança acesso a processos de apropriação,
renovação e articulação de conhecimentos e aprendizagens de diferentes
linguagens, assim como o direito à proteção, à saúde, à liberdade, à con-
fiança, ao respeito, à dignidade, à brincadeira, à convivência e à interação
com outras crianças.

Um documento lançado em 2016, pelo Ministério da Educação, traz atualizações


sobre a questão da Educação Infantil em uma perspectiva normativa. O texto traz
uma seção entitulada Revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Edu-
cação Infantil, que atualiza o conteúdo publicado na versão anterior do documento.
Esse é o trecho da DCN que mais nos chama atenção para os objetivos dessa unidade
e entraremos em detalhes sobre seu conteúdo a seguir.

A identidade do Atendimento na Educação Infantil


A legislação brasileira firma a educação infantil como um direito da criança e
como um dever do Estado em provê-la. Ou seja, reconhece seu papel enquanto etapa

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Educação Infantil: Currículo – un 4 - pág 8

formadora do desenvolvimento da criança e entende que todos devem ter acesso a


esse ensino em modalidade gratuita.

É interessante ressaltar que as instituições de modalidade assistencial a pais tra-


balhadores, como as que funcionam em período noturno, podem existir, mas não
simbolizam uma necessidade educacional e sim social.
Contudo, esse tipo de atendimento, que responde a uma demanda legí-
tima da população, enquadra-se no âmbito de “políticas para a Infância”,
devendo ser financiado, orientado e supervisionado por outras áreas,
como assistência social, saúde, cultura, esportes, proteção social.
(BRASIL, 2016, p. 84)

A Função Sociopolítica e Pedagógica da Educação Infantil


A DCN destaca que a Educação Infantil tem o papel de atuar no desenvolvimento
do educando, em aspecto formacional e social, contribuindo para sua construção
enquanto cidadão e indivíduo político em sua sociedade.

O documento destaca ainda o paradigma do desenvolvimento integral com a


família, que aponta para a maneira como as vivências e aprendizagens da criança
nessa idade são importantes para sua formação. Do ponto de vista institucional, é
destacado o papel do Estado em suprir as desigualdades sociais de seus alunos para
garantir uma formação igualitária a todos.

Segundo as DCNEI, para que isso aconteça, efetivamente, as instituições de ensino


devem ter propostas pedagógicas que o permitam:
I – oferecendo condições e recursos para que as crianças usufruam seus
direitos civis, humanos e sociais;

II – assumindo a responsabilidade de compartilhar e complementar a edu-


cação e cuidado das crianças com as famílias;

III – possibilitando tanto a convivência entre crianças e entre adultos e crian-


ças quanto a ampliação de saberes e conhecimentos de diferentes naturezas;

IV – promovendo a igualdade de oportunidades educacionais entre as


crianças de diferentes classes sociais no que se refere ao acesso a bens
culturais e às possibilidades de vivência da infância;

V – construindo novas formas de sociabilidade e de subjetividade compro-


metidas com a ludicidade, a democracia, a sustentabilidade do planeta e com
o rompimento de relações de dominação etária, socioeconômica, étnico-
racial, de gênero, regional, linguística e religiosa. (BRASIL, 2009, p. 18)

Tirinha Mafalda, disponível em: https://bit.ly/3cfZ8Au

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Educação Infantil: Currículo – un 4 - pág 9

A Visão de Criança: O Sujeito do Processo de Educação


As DCN são importantes ao considerar o papel da criança como um sujeito da
educação, e não como um passivo dela. Ela considera ainda que o aluno está inse-
rido em seu contexto familiar, social e institucional e que todos esses aspectos são
importantes para sua formação.
O conhecimento científico hoje disponível autoriza a visão de que desde o
nascimento a criança busca atribuir significado a sua experiência e nesse
processo volta-se para conhecer o mundo material e social, ampliando
gradativamente o campo de sua curiosidade e inquietações, mediada pelas
orientações, materiais, espaços e tempos que organizam as situações de
aprendizagem e pelas explicações e significados a que ela tem acesso.
(BRASIL, 2016, p. 07)

O trecho destaca a maneira como todos esses elementos estão interligados na


educação infantil e, portanto, devem ser considerados. De acordo com a DCN, são
as interações que desenvolvem aspectos integrados do desenvolvimento, como a
motricidade, a linguagem, o pensamento, a afetividade e a sociabilidade.

Nesse ponto, as brincadeiras ganham papel de destaque, pois representam oportuni-


dades de lidar com o desconhecido e com o novo dentro do contexto vivido pela criança.

A documento ressalta ainda a necessidade de entender que cada criança tem seu
tempo e que isso deve ser respeitado em todas as esferas de sua formação.

Tirinha Armandinho, disponível em: https://bit.ly/3dbfHih

Princípios Básicos para a Educação Infantil


Assim como no texto de 2009, a DCN de 2016 traz os seguintes princípios básicos
para a educação infantil:
• Princípios éticos: valorização da autonomia, da responsabilidade, da solidarie-
dade e do respeito ao bem comum, ao meio ambiente e às diferentes culturas,
identidades e singularidades;
• Princípios políticos: dos direitos de cidadania, do exercício da criticidade e do
respeito à ordem democrática;
• Princípios estéticos: valorização da sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e
da diversidade de manifestações artísticas e culturais (BRASIL, 2016, p. 88-89).

Objetivos e Condições para a Organização Curricular


A revisão trazida na DCN reforça a educação infantil enquanto direito da criança e,
por esse motivo, torna-se dever do Estado oferecê-la adequadamente e com igualdade

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Educação Infantil: Currículo – un 4 - pág 10

a todos os indivíduos. Deve-se ter o ensino à luz dos direitos humanos e prever a
proteção e a provisão de suas necessidades, assim como os direitos fundamentais de
participação social e cultural.
Com base nesse paradigma, a proposta pedagógica das instituições de
Educação Infantil deve ter como objetivo principal promover o desenvol-
vimento integral das crianças de zero a cinco anos de idade garantindo a
cada uma delas o acesso a processos de construção de conhecimentos e a
aprendizagem de diferentes linguagens, assim como o direito à proteção,
à saúde, à liberdade, ao respeito, à dignidade, à brincadeira, à convivência
e interação com outras crianças. Daí decorrem algumas condições para a
organização curricular. (BRASIL, 2016, p. 13)

Logo, destaca-se a natureza integral que a educação infantil deve ter, que se esta-
belece como o primeiro objetivo e condição da educação infantil.

A DCN estabelece como segundo item que “o combate ao racismo e às discrimina-


ções de gênero, socioeconômicas, étnico-raciais e religiosas deve ser objeto de cons-
tante reflexão e intervenção no cotidiano da Educação Infantil” (p. 89). Destacam-se
ainda o reconhecimento das múltiplas formas de cultura e respeito às contribuições
da família e da comunidade (item 3), atenção ao desrespeito à dignidade da criança na
execução da proposta escolar (item 4) e o cumprimento, por parte do Estado, às suas
obrigações para a garantia da educação de qualidade e em sua integralidade (item 5).

Parceria com as Famílias na Educação Infantil


Como já mencionamos, a família é a primeira esfera de interação da criança.
Cabe aos educadores entender o papel que a família e cada um de seus membros
tem para a vida da criança, considerando que eles próprios também são indivíduos do
mundo e, portanto, também em processo constante de transformação e significação.

Assim, é preciso acolher e valorizar os pontos positivos de cada vivência, trabalhando


de forma integrada. Da mesma maneira, identificações de possíveis problemas no
núcleo familiar – como violência ou negligência – devem ser observadas e discutidas,
caso se manifestem.

Organização das Experiências de Aprendizagem


Já percebemos que as formas de aprender e perceber o mundo são muitas. Além
disso, o contexto de dinamicidade e alto fluxo informacional que vivemos hoje em dia
acrescenta ainda mais dados e vivências a esse cenário. Portanto, organizar aquilo
que foi aprendido é uma habilidade desafiadora para ser desenvolvida em crianças.

Assim, é preciso que a criança saiba organizar seu material e orientar-se pela
escola, por exemplo, para apropriar-se dos conceitos que adquire para resolver situ-
ações cotidianas. Também é importante que seja percebido que as coisas aprendidas

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Educação Infantil: Currículo – un 4 - pág 11

não são verdades imutáveis, mas sim saberes apropriados para sua idade, sendo
assim dinâmicos e provisórios.

Acompanhamento e Continuidade
A infância é um período de grandes mudanças e a educação deve contribuir nes-
sas etapas. Por isso, as instituições devem planejar e efetivar o acolhimento às crian-
ças ingressas; observar e mediar relações das crianças entre si e com adultos; efetuar
um planejamento escolar transversal com os setores da escola ou creche; e contribuir
em articulações com o Ensino Fundamental para facilitar a transição de seus alunos.

Educação Indígena e no Campo


A educação de crianças indígenas e do campo é preconizada nos parágrafos 2 e 3
do artigo 8 da DCN:
§ 2º. Garantida a autonomia dos povos indígenas na escolha dos modos
de educação de suas crianças de 0 a 5 anos de idade, as propostas peda-
gógicas para os povos que optarem pela Educação Infantil devem:

I – proporcionar uma relação viva com os conhecimentos, crenças, valores,


concepções de mundo e as memórias de seu povo;

II – reafirmar a identidade étnica e a língua materna como elementos de


constituição das crianças;

III – dar continuidade à educação tradicional oferecida na família e articular-se


às práticas socioculturais de educação e cuidado coletivos da comunidade;

IV – adequar calendário, agrupamentos etários e organização de tempos, ati-


vidades e ambientes de modo a atender as demandas de cada povo indígena.

§ 3º. As propostas pedagógicas da Educação Infantil das crianças filhas


de agricultores familiares, extrativistas, pescadores artesanais, ribeirinhos,
assentados e acampados da reforma agrária, quilombolas, caiçaras, povos
da floresta, devem:

I – reconhecer os modos próprios de vida no campo como fundamentais para


a constituição da identidade das crianças moradoras em territórios rurais;

II – ter vinculação inerente à realidade dessas populações, suas culturas,


tradições e identidades, assim como a práticas ambientalmente sustentáveis;

III – flexibilizar, se necessário, calendário, rotinas e atividades respeitando


as diferenças quanto à atividade econômica dessas populações;

IV – valorizar e evidenciar os saberes e o papel dessas populações na pro-


dução de conhecimentos sobre o mundo e sobre o ambiente natural;

V – prever a oferta de brinquedos e equipamentos que respeitem as carac-


terísticas ambientais e socioculturais da comunidade.

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Educação Infantil: Currículo – un 4 - pág 12

Brincadeiras
As brincadeiras, em seu potencial lúdico e de aprendizagem, ganham destaque na
DCN. Confira o que diz a lei:
Art. 9. As práticas pedagógicas que compõem a proposta curricular da
Educação Infantil devem ter como eixos norteadores as interações e a
brincadeira, garantindo experiências que:

I – promovam o conhecimento de si e do mundo por meio da ampliação


de experiências sensoriais, expressivas, corporais que possibilitem movi-
mentação ampla, expressão da individualidade e respeito pelos ritmos e
desejos da criança;

II – favoreçam a imersão das crianças nas diferentes linguagens e o pro-


gressivo domínio por elas de vários gêneros e formas de expressão: gestual,
verbal, plástica, dramática e musical;

III – possibilitem às crianças experiências de narrativas, de apreciação


e interação com a linguagem oral e escrita, e convívio com diferentes
suportes e gêneros textuais orais e escritos;

IV – recriem, em contextos significativos para as crianças, relações quan-


titativas, medidas, formas e orientações espaço-temporais;

V – ampliem a confiança e a participação das crianças nas atividades


individuais e coletivas;

VI – possibilitem situações de aprendizagem mediadas para a elaboração


da autonomia das crianças nas ações de cuidado pessoal, auto-organização,
saúde e bem-estar;

VII – possibilitem vivências éticas e estéticas com outras crianças e grupos


culturais, que alarguem seus padrões de referência e de identidades no
diálogo e reconhecimento da diversidade;

VIII – incentivem a curiosidade, a exploração, o encantamento, o ques-


tionamento, a indagação e o conhecimento das crianças em relação ao
mundo físico e social, ao tempo e à natureza;

IX – promovam o relacionamento e a interação das crianças com diversi-


ficadas manifestações de música, artes plásticas e gráficas, cinema, foto-
grafia, dança, teatro, poesia e literatura;

X – promovam a interação, o cuidado, a preservação e o conhecimento


da biodiversidade e da sustentabilidade da vida na Terra, assim como o
não desperdício dos recursos naturais;

XI – propiciem a interação e o conhecimento pelas crianças das manifes-


tações e tradições culturais brasileiras;

XII – possibilitem a utilização de gravadores, projetores, computa-


dores, máquinas fotográficas, e outros recursos tecnológicos e midiáticos.
(BRASIL, 2009)

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Educação Infantil: Currículo – un 4 - pág 13

Avaliação
A avaliação na educação infantil tem um papel fundamental para entender o su-
cesso das metodologias analisadas e o desempenho dos alunos. Por isso, o tema será
abordado com profundidade na próxima Unidade.

Em Síntese
Nesta unidade, você conheceu as disposições da LDB, os Referenciais Curriculares Nacionais
para a Educação Infantil – RCNEI e as Diretrizes Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI).
Pudemos entender que a criança deve ser vista como construtora de sua identidade a partir
de diferentes particularidades expressas no meio em que vive. Assim, a escola e o pro-
fessor devem planejar ações educativas que possam efetivamente auxiliar o processo
de construção da identidade e da autonomia desta criança, pensando em sua interação
com o ambiente, a cultura e a sociedade.
Além disso, a revolução informacional causada pela internet e pelos demais avanços tec-
nológicos trouxeram à tona múltiplas formas de obtenção de conteúdo e conhecimento.
Ou seja, simplesmente trabalhar tópicos e temas não é mais o ponto único da educação;
desenvolver habilidades de interpretação e pensamento crítico, por exemplo, passam a
ser igualmente importantes.
Grande parte da população brasileira tem acesso à internet. Isso significa que as crianças
têm ao seu dispor uma quantidade enorme de informações e, desse modo, elas precisam
saber pesquisá-las e interpretá-las de maneira correta.
Entender como a ciência é construída e que nenhum saber nasce pronto – correntes
teóricas dialogam e, por vezes, se contradizem. A educação do século XXI, nesse sentido,
visa não somente a informação, mas sim o desenvolvimento de competências que per-
mitam aos alunos entender, viver e produzir conhecimento nesse novo cenário.

Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:
Livros
Educação Infantil: Fundamentos e Métodos
OLIVEIRA, Z. R. de. Educação Infantil: fundamentos e métodos. São Paulo:
Cortez, 2002.

Leitura
Noção de Criança e Infância: Diálogos, Reflexões, Interlocuções
CASTRO, M. G. B. de. Noção de criança e infância: diálogos, reflexões,
interlocuções. Universidade Federal Fluminense, Niterói/RJ.
https://bit.ly/30cNKms
O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil no Contexto das Reformas
CERISARA, A. B. O referencial curricular nacional para a educação infantil no 13
contexto das reformas. Educação & Sociedade, Campinas, v. 23, n. 80, p. 326- 11
Educação Infantil: Currículo – un 4 - pág 14

345, set. 2002.


https://bit.ly/3cv2gZq
O Cuidar, o Educar e o Brincar na Organização do Trabalho Pedagógico na Educação Infantil
MORENO, G. L; PASCHOAL, J. D.; OLIVEIRA, M. R. F. O cuidar, o educar e
o brincar na organização do trabalho pedagógico na educação infantil. 2016.
https://bit.ly/2BwpPUJ
A Legislação, as Políticas Nacionais de Atendimento na Instituição de Educação Infantil no Brasil e o Desafio
de Cuidar e Educar a Criança de O a 5 Anos
GUIMARÃES, C. M.; GARMS, G. M.Z. A legislação, as políticas nacionais de
atendimento na instituição de educação infantil no Brasil e o desafio de cuidar e
educar a criança de o a 5 anos. Cadernos de Educação da Infância, Lisboa,
n. 94, p. 49 – 59, set/dez 2011.

Referências
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.
Referencial curricular nacional para a educação infantil. Brasília: MEC/SEF,
1998. V.1 e 2.

. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº. 11.274/2006.


Brasília, 2006

. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretrizes


curriculares nacionais para a educação infantil /Secretaria de Educação Básica.
Brasília: MEC, SEB, 2016.

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Educação Infantil: Currículo
BNCC e Educação Infantil

Responsável pelo Conteúdo:


Prof.ª Dr.ª Márcia Pereira Cabral

Revisão Textual:
Prof.ª Me. Sandra Regina Fonseca Moreira
BNCC e Educação Infantil

• Introdução;
• Como Funciona a BNCC?
• A Educação Infantil na Base Nacional Comum Curricular;
• A Educação Infantil no Contexto da Educação Básica;
• Os Campos de Experiências;
• Os Objetivos de Aprendizagem e Desenvolvimento para a Educação Infantil;
• A Transição da Educação Infantil para o Ensino Fundamental.


OBJETIVO

DE APRENDIZADO
• Elucidar os direcionamentos curriculares da BNCC no que se refere à Educação Infantil e dis-
cutir os direitos de aprendizagem e os campos de experiência apresentados no documento,
bem como os novos rumos para a Educação Infantil no Brasil.
UNIDADE BNCC e Educação Infantil

Introdução
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento criado pelo
­Ministério da Educação (MEC) que deve, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDB, Lei nº 9.394/1996), nortear os currículos escolares
das redes de ensino de todo o país. A primeira versão da BNCC foi publicada em
2015 – ou seja, nove anos desde a promulgação da LDB, que regulamenta uma base
­nacional para a educação comum, e a finalização desse documento.

Por que isso aconteceu? Ao longo desse tempo, foram realizados estudos, semi-
nários e eventos sobre educação que versavam sobre a necessidade de bases comuns
para a educação. Em 2010, a Conferência Nacional de Educação (CONAE) contou
com a presença de especialistas para debater a Educação Básica e criou um docu-
mento que reiterou a necessidade da Base Nacional Comum Curricular, como inte-
grante de um Plano Nacional de Educação. A segunda edição do seminário, em 2014,
destacou a importância de uma mobilização para a criação efetiva do documento.

Em 2015, a realização do I Seminário Interinstitucional para elaboração da Base


reuniu envolvidos no processo de criação e contribuiu para a instituição da Portaria
n. 592, de 17 de junho de 2015, que instituiu a Comissão de Especialistas para a
Elaboração de Proposta da BNCC. Foi assim que surgiu a primeira versão do docu-
mento, em setembro daquele ano. Em seguida, o conteúdo foi discutido em escolas de
todo o país e, após esse processo, foi divulgada a segunda versão, em maio de 2016.

Esse também foi o ano em que cada estado do país participou de seminários
­realizados pelo Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e pela União
Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) para debater a segunda
versão da BNCC. Assim, a BNCC foi enviada pelo MEC ao Conselho Nacional de
Educação (CNE) e homologada naquele mesmo ano. A homologação representou o
momento em que foi iniciada a capacitação dos professores para a BNCC e criados
os mecanismos de suporte para a implantação de novos currículos. Em 22 de de-
zembro de 2017, o CNE apresentou a RESOLUÇÃO CNE/CP n. 2, que estabelece
e orienta a implantação da Base Nacional Comum Curricular. Em 2018, foi entregue
a terceira e final versão do documento. Ainda naquele ano, foi criado o Programa de
Apoio à Implementação da Base Nacional Comum Curricular (ProBNCC).

Assim, é possível perceber que a BNCC foi fruto de um esforço comum, reali-
zado na intenção de promover a criação de um documento que efetivamente fosse
interessante para professores e alunos no processo de aprendizagem. Por meio das
bases para a educação, é possível entender aquilo que o aluno precisa trabalhar e
desenvolver de acordo com seus contextos e vivências para compreender o mundo
que o cerca.

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Figura 1 – Capa da BNCC, de 2018
Fonte: basenacionalcomum.mec.gov.br

Como Funciona a BNCC?


A BNCC tem como grande diferencial ser um documento que estabelece quais
são as aprendizagens básicas que o aluno deve ter. Ela estrutura esse conhecimento
na forma de competências. O conceito de competência é essencial no contexto da
BNCC, a saber:
Na BNCC, competência é definida como a mobilização de conhecimen-
tos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas e so-
cioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas complexas da
vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho.
(BRASIL, 2018, p. 08)

O que a BNCC defende, dessa maneira, é a educação integral dos alunos, permi-
tindo que eles se desenvolvam enquanto sujeitos conscientes e ativos do mundo e de
sua própria realidade.
Nesse contexto, a BNCC afirma, de maneira explícita, o seu compromisso
com a educação integral. Reconhece, assim, que a Educação Básica deve
visar à formação e ao desenvolvimento humano global, o que implica
compreender a complexidade e a não linearidade desse desenvolvimento,
rompendo com visões reducionistas que privilegiam ou a dimensão
intelectual (cognitiva) ou a dimensão afetiva. Significa, ainda, assumir uma
visão plural, singular e integral da criança, do adolescente, do jovem e do
adulto – considerando-os como sujeitos de aprendizagem – e promover uma
educação voltada ao seu acolhimento, reconhecimento e desenvolvimento
pleno, nas suas singularidades e diversidades. Além disso, a escola, como

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UNIDADE BNCC e Educação Infantil

espaço de aprendizagem e de democracia inclusiva, deve se fortalecer na


prática coercitiva de não discriminação, não preconceito e respeito às
diferenças e diversidades. (BRASIL, 2018, p. 14)

A BNCC materializa essa necessidade em dez competências gerais da Educação


Básica, que se aplicam à Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio e
atendem aos termos descritos na LDB.

Para facilitar a compreensão da BNCC, no contexto da Educação Infantil, que abor-


daremos a seguir, trazemos aqui as dez competências da BNCC na íntegra (BRASIL,
2018, p. 09 e 10):
Competências Gerais da Educação Básica
1. Valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente construídos sobre o
mundo físico, social, cultural e digital para entender e explicar a realidade,
continuar aprendendo e colaborar para a construção de uma sociedade justa,
democrática e inclusiva;
2. Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências,
incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e a criativi-
dade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver
problemas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimen-
tos das diferentes áreas;
3. Valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais, das locais às mun-
diais, e também participar de práticas diversificadas da produção artístico-cultural;
4. Utilizar diferentes linguagens – verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e
escrita), corporal, visual, sonora e digital –, bem como conhecimentos das lin-
guagens artística, matemática e científica, para se expressar e partilhar infor-
mações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos e produzir
sentidos que levem ao entendimento mútuo;
5. Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunica-
ção de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais
(incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações,
produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria
na vida pessoal e coletiva;
6. Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais e apropriar-se de conhe-
cimentos e experiências que lhe possibilitem entender as relações próprias do
mundo do trabalho e fazer escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu
projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade;
7. Argumentar com base em fatos, dados e informações confiáveis, para formular,
negociar e defender ideias, pontos de vista e decisões comuns que respeitem
e promovam os direitos humanos, a consciência socioambiental e o consumo
responsável em âmbito local, regional e global, com posicionamento ético em
relação ao cuidado de si mesmo, dos outros e do planeta;
8. Conhecer-se, apreciar-se e cuidar de sua saúde física e emocional, compreen-
dendo-se na diversidade humana e reconhecendo suas emoções e as dos ou-
tros, com autocrítica e capacidade para lidar com elas;

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9. Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação, fazen-
do-se respeitar e promovendo o respeito ao outro e aos direitos humanos, com
acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais,
seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos de
qualquer natureza;
10. Agir pessoal e coletivamente com autonomia, responsabilidade, flexibilidade,
resiliência e determinação, tomando decisões com base em princípios éticos,
democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários.

Assista ao vídeo “As Competências Gerais da BNCC”, que explica detalhadamente cada
uma das competências descritas acima. Disponível em: https://youtu.be/-wtxWfCI6gk

A Educação Infantil na
Base Nacional Comum Curricular
A BNCC considera, em seu texto, o contexto apresentando na disciplina sobre a
Educação Infantil, que foi vista durante muito tempo como uma etapa do ensino vol-
tada para o assistencialismo e para o cuidado de crianças de famílias trabalhadoras.
É somente a partir da LDB, em 1996, que ela passa a ser parte da educação formal
e, em 2006, é fixada como a etapa que atende crianças entre zero e cinco anos.

De acordo com a Emenda Constitucional nº 59/2009, a Educação Infantil é obri-


gatória entre quatro e cinco anos. Assim, a LDB de 2013 incluiu essa obrigatorieda-
de em seu conteúdo.

O Ministério da Educação apresentou a BNCC a toda a população em 2017, em um vídeo


educativo disponibilizado em seu canal no YouTube e amplamente divulgado. O vídeo expli-
ca resumidamente do que trata o documento e qual seu papel para a educação brasileira.
Disponível em: https://youtu.be/g2_9XIE18NA

A Educação Infantil no
Contexto da Educação Básica
A Educação Infantil é o primeiro contato do aluno com a escola e representa o
início do afastamento formal entre a criança e a família. Dessa maneira, a BNCC vin-
cula os processos de educar e cuidar, entendendo ambos como parte fundamental
do processo de aprendizagem.

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UNIDADE BNCC e Educação Infantil

Nesse sentido, as instituições de ensino de Educação Infantil, sejam elas escolas


ou creches, devem acolher a criança e entender seu contexto externo, família e
comunidade. As vivências e conhecimentos prévios devem ser utilizados nas práticas
pedagógicas, ampliando o processo de conhecimento da criança, ao invés de
desconsiderá-lo. A BNCC destaca ainda esse papel na educação de bebês e crianças
bem pequenas, quando a aprendizagem considera muito aspectos como a socialização,
a autonomia e a comunicação.

A BNCC também considera e cita em seu texto elementos apresentados na DCNEI


(Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil), estudadas em unidade ante-
rior, trazendo a necessidade das brincadeiras e interações para a Educação Infantil.
A interação durante o brincar caracteriza o cotidiano da infância, trazen-
do consigo muitas aprendizagens e potenciais para o desenvolvimento
integral das crianças. Ao observar as interações e a brincadeira entre as
crianças, e delas com os adultos, é possível identificar, por exemplo, a
expressão dos afetos, a mediação das frustrações, a resolução de conflitos
e a regulação das emoções. (BRASIL, 2018, p. 37)

Note que a BNCC ressalta a importância da interação como um momento de


aprendizagem. Perceba ainda que a expressão das emoções e o processo de lidar
com elas são considerados como parte dessa aprendizagem, corroborando a premis-
sa da BNCC de promover uma educação ampla e que permita o desenvolvimento
do aluno.

Figura 2
Fonte: Getty Images

Essa perspectiva nos leva a pensar na estruturação da Educação Infantil de acordo


com a BNCC e em seu papel que vai além da construção de conhecimentos formais.
A aceitação de que a educação tem um papel de formar o aluno enquanto indivíduo
social, cidadão e crítico, faz com que seja possível a elaboração de um ponto essen-
cial da BNCC: os direitos de aprendizagem e desenvolvimento na Educação Infantil.

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Direitos de aprendizagem e
desenvolvimento na Educação Infantil
Considerando a forma como a EI ocorre, em escolas ou creches, e as com-
petências gerais apresentadas, a BNCC estabelece que são necessárias algumas
condições para que tudo isso possa acontecer na prática. Essas condições são fun-
damentais e, portanto, constituem direitos do aluno para sua aprendizagem e de-
senvolvimento na Educação Infantil. São eles: conviver, brincar, participar, explorar,
expressar, conhecer-se.

Direitos de aprendizagem e desenvolvimento

Brincar Conviver Participar Explorar Expressar Conhecer-se

Figura 3 – Os direitos de aprendizagem e desenvolvimento

Falaremos brevemente sobre cada um desses direitos:


• Conviver: interação com outras crianças e adultos, respeitando suas diferenças
e culturas;
• Brincar: participar cotidianamente de brincadeiras, com diferentes crianças e
educadores, em ambientes e tempos variados, desenvolvendo cultura, conheci-
mento, imaginação, criatividade, emoções e capacidades de expressão;
• Participar: estar envolvida no planejamento da gestão e das atividades escolares;
• Explorar: “movimentos, gestos, sons, formas, texturas, cores, palavras, emo-
ções, transformações, relacionamentos, histórias, objetos, elementos da natu-
reza, na escola e fora dela, ampliando seus saberes sobre a cultura, em suas
diversas modalidades: as artes, a escrita, a ciência e a tecnologia” (BRASIL,
2018, p. 38);
• Expressar: agir e expressar-se socialmente como um indivíduo diante de suas
emoções, pensamentos e opiniões, com uso de diversas linguagens;
• Conhecer-se: entender suas ideias e emoções, construindo sua identidade (in-
dividual, social e cultural), criar laços de pertencimento e imagem positiva de
si mesmo.

Os direitos estão alinhados com as competências da BNCC e refletem a preocu-


pação com a integralidade da educação.

Tudo isso se reflete no conceito de intencionalidade criativa apresentado na


BNCC. Ele se refere à maneira como o educador deve conduzir atividades que per-
mitam o desenvolvimento dos direitos acima, organizando e propondo experiências
adequadas a esse cenário. Para isso, é preciso pensar no contexto de cada criança e
do grupo – ou seja, desenvolver habilidades individuais ao mesmo tempo em que toda
a turma consegue desempenhar o que foi proposto e desenvolver-se coletivamente.

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UNIDADE BNCC e Educação Infantil

O artigo “Intencionalidade da ação educativa na educação Infantil: a importância da


organização do tempo e do Espaço das atividades” aborda o tema da intencionalidade
criativa e destaca exemplos dessa ação no contexto da educação infantil.
Disponível em: https://bit.ly/3dDI1dd

Os Campos de Experiências
Considerando as competências que devem ser desenvolvidas na educação, as po-
tencialidades da criança e os direitos da educação infantil, a BNCC descreve os cam-
pos de experiências que devem ser trabalhados nessa etapa da educação. Os campos
estão apresentados na figura abaixo.

Campos de Experiências

Escuta, fala, Espaços, tempos,


O eu, o outro Corpo, gestos Traços, sons,
pensamento e quantidades, relações
e o nós e movimentos cores e formas
imaginação e transformações

Figura 4 – Os campos de experiências da BNCC para a educação infantil

Os campos são descritos pela própria BNCC como um arranjo curricular para
permitir a adequação de tudo o que deve ser desenvolvido nas práticas pedagógicas.
Confira abaixo o que cada um desses campos representa:
• O eu, o outro e o nós: as crianças devem ter conhecimento de suas próprias
emoções e ideias, ao mesmo tempo em que aprendem e se desenvolvem em
suas relações e interações com outras pessoas e com outros grupos. A EI cor-
responde às primeiras interações da criança e, portanto, é o momento em que
são criadas as primeiras percepções e conceitos sobre a sociedade e seus indi-
víduos, assim como as estruturas que organizam tudo isso. É preciso, por isso,
criar oportunidades para que as crianças tenham contato e vejam o máximo
possível de diversidade e variações, para que entendam a pluralidade do mundo
que as cerca;
• Corpo, gestos e movimentos: explorar o mundo, os objetos, seus corpos e
movimentos é fundamental para que a criança desenvolva a percepção expres-
siva das coisas, entendendo seu universo social e cultural. Além disso, é preciso­
desenvolver a atenção para a corporeidade, tomando consciência de suas poten-
cialidades e limites, e também se expressando ativamente por meio do corpo.
É papel da instituição de ensino criar oportunidades para que a criança desen-
volva esse aspecto lúdico em sua aprendizagem e formação;

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• Traços, sons, cores e formas: a criança deve conviver e experimentar formas
variadas de expressão artística – música, pintura, dança – para entender como
elas funcionam e de que maneira refletem ações, sentimentos e ideias humanas.
Assim, elas são capazes de desenvolver senso estético e crítico acerca do mundo
e de si mesmas, melhorando suas capacidades de expressão e compreensão;
• Escuta, fala, pensamento e imaginação: falar e ouvir são habilidades funda-
mentais para o desenvolvimento infantil. Por isso, é preciso que a EI crie opor-
tunidades para esse desenvolvimento, valorizando o envolvimento da criança
com a cultura oral. A oralidade é uma das mais significativas maneiras de
expressar pensamento e imaginação, habilidades que são desenvolvidas em
atividades como contação de histórias e debates em grupo, por exemplo. A ex-
periência com a escrita também começa na Educação Infantil. Nesse momento,
é hora de despertar o interesse para essa habilidade e permitir o contato com
rabiscos e esboços, assim como as primeiras letras, palavras e com a escrita
espontânea, que são não convencionais, mas que já expressam uma certa com-
preensão da escrita;
• Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações: as crianças já
estão inseridas em espaços (casa ou escola, rua ou interior), tempos (dia e noite),
quantidades (pouco ou muito) e outras relações. É na EI que o entendimento
sobre isso deve ser trabalhado e desenvolvido, permitindo que a criança entenda
essas relações de maneira mais formal e que seja capaz de assimilar semelhan-
ças e transformações nesse cenário quando for necessário.

Os Objetivos de Aprendizagem e
Desenvolvimento para a Educação Infantil
Após apresentar os itens acima, a BNCC sistematiza todos os objetivos de apren-
dizagem que o desenvolvimento da Educação Infantil deve trazer. Esses objetivos são
sistematizados de acordo com os campos de experiência e com três faixas etárias:
bebês (zero a 1 ano e 6 meses), crianças bem pequenas (1 ano e 7 meses a 3 anos
e 11 meses) e crianças pequenas (4 anos a 5 anos e 11 meses).

A BNCC destaca ainda que cada criança tem seu ritmo e, por isso, as separações
etárias devem ser consideradas em cada contexto particular.

Os objetivos estão descritos das páginas 45 a 52 do documento original da BNCC e podem


ser conferidos na íntegra no site oficial: https://bit.ly/3cD9fQ7

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UNIDADE BNCC e Educação Infantil

A Transição da Educação Infantil


para o Ensino Fundamental
O momento de transição entre a EI e o Ensino Fundamental deve ser trabalhado
com atenção e cautela pelos profissionais de educação. A mudança deve ser con-
duzida de modo que garanta a integração dos conhecimentos e a continuidade da
aprendizagem, respeitando as relações individuais com o conhecimento e a maneira
como cada etapa lida com esse contexto.

Estratégias de acolhimento e adaptação devem ser consideradas para os alunos


e para os professores, já que é estabelecida uma via de duas mãos nesse período de
transição – os alunos que mudam de etapa educacional e os docentes que os rece-
bem nesse novo momento.

Assim, relatórios, portfólios e documentos são essenciais, pois permitem que os


professores que irão receber os alunos tenham uma ideia do panorama que os con-
duziu até aquele período. Conversas, debates e visitas entre os professores da EI e
do Ensino Fundamental também podem cimentar essa compreensão e ampliar a
percepção sobre os alunos que estão migrando de etapa.

Para estabelecer o equilíbrio entre essas mudanças, é preciso adaptar gradual-


mente as práticas e processos, considerando aquilo que o aluno já aprendeu. Essa
bagagem, contudo, é um elemento norteador ao professor, já que os conhecimentos
serão aprofundados no Ensino Fundamental.

A BNCC fornece uma síntese das aprendizagens da EI, que é, portanto, “elemen-
to balizador e indicativo de objetivos a serem explorados em todo o segmento da
Educação Infantil [...] e não como condição ou pré-requisito para o acesso ao Ensino
Fundamental” (BRASIL, 2018, p. 53).

Confira abaixo a síntese das aprendizagens, extraída da BNCC (BRASIL, 2018,


p. 54-55).

Tabela 1
Respeitar e expressar sentimentos e emoções. Atuar em grupo e demonstrar
interesse em construir novas relações, respeitando a diversidade e solida-
O eu, o outro e o nós rizando-se com os outros. Conhecer e respeitar regras de convívio social,
manifestando respeito pelo outro.
Reconhecer a importância de ações e situações do cotidiano que contribuem
para o cuidado de sua saúde e a manutenção de ambientes saudáveis. Apre-
Corpo, gestos sentar autonomia nas práticas de higiene, alimentação, vestir-se e no cuida-
e movimentos do com seu bem-estar, valorizando o próprio corpo. Utilizar o corpo inten-
cionalmente (com criatividade, controle e adequação) como instrumento de
interação com o outro e com o meio. Coordenar suas habilidades manuais.
Discriminar os diferentes tipos de sons e ritmos e interagir com a música,
Traços, sons, cores percebendo-a como forma de expressão individual e coletiva. Expressar-se
por meio das artes visuais, utilizando diferentes materiais. Relacionar-se
e formas com o outro empregando gestos, palavras, brincadeiras, jogos, imitações,
observações e expressão corporal.

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Expressar ideias, desejos e sentimentos em distintas situações de interação,
por diferentes meios. Argumentar e relatar fatos oralmente, em sequência
Escuta, fala, temporal e causal, organizando e adequando sua fala ao contexto em que é
pensamento produzida. Ouvir, compreender, contar, recontar e criar narrativas. Conhe-
e imaginação cer diferentes gêneros e portadores textuais, demonstrando compreensão
da função social da escrita e reconhecendo a leitura como fonte de prazer
e informação.
Identificar, nomear adequadamente e comparar as propriedades dos obje-
tos, estabelecendo relações entre eles. Interagir com o meio ambiente e com
fenômenos naturais ou artificiais, demonstrando curiosidade e cuidado com
Espaços, tempos, relação a eles. Utilizar vocabulário relativo às noções de grandeza (maior,
quantidades, menor, igual etc.), espaço (dentro e fora) e medidas (comprido, curto, gros-
so, fino) como meio de comunicação de suas experiências. Utilizar unidades
relações de medida (dia e noite; dias, semanas, meses e ano) e noções de tempo (pre-
e transformações sente, passado e futuro; antes, agora e depois), para responder a necessida-
des e questões do cotidiano. Identificar e registrar quantidades por meio de
diferentes formas de representação (contagens, desenhos, símbolos, escrita
de números, organização de gráficos básicos etc.) (BRASIL, 2018, p. 54-55).

Em Síntese
A BNCC representa um imenso avanço na questão curricular da educação brasileira, já que
é um documento de escrita colaborativa entre Estado, especialistas e comunidade. Os de-
bates em ambiente escolar também permitiram o aperfeiçoamento do documento e sua
consequente adaptação aos contextos, potencialidades e limitações do cenário brasileiro.
A formação integral é um dos pontos chaves da BNCC. Ao considerar o aluno como sujeito
pessoal, social e político, ela elenca tudo o que é preciso para que isso se desenvolva na
escola e se integre com seus conceitos pessoais. O desenvolvimento das competências
reflete essa ideia, já que permite uma amplitude de práticas pedagógicas e curriculares
para colocar isso em prática da maneira como for mais apropriada para cada contexto,
aluno e instituição de ensino.

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UNIDADE BNCC e Educação Infantil

Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

 Vídeos
Desafios da Educação: BNCC – Base Nacional Comum Curricular
https://youtu.be/bVTeB5y7Qwg

 Leitura
Guia Educação Integral na Alfabetização
https://bit.ly/2Mu0Pjg
E-book Educação Socioemocional Brasileira
https://bit.ly/3781oZM
Um Fio, um Retalho, uma Colcha: Práticas de Gestores Inovadores
https://bit.ly/2AE32pI

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Referências
BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2018. Disponível em:
<http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_
site.pdf>.

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.


Referencial curricular nacional para a educação infantil / Ministério da Educação
e do Desporto, Secretaria de Educação Fundamental – Brasília: MEC/SEF, 1998. V. 3.
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/volume3.pdf>.

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Educação Infantil: Currículo
Avaliação na Educação Infantil

Responsável pelo Conteúdo:


Prof.ª Dr.ª Márcia Pereira Cabral

Revisão Textual:
Prof.ª Me. Sandra Regina Fonseca Moreira
Avaliação na Educação Infantil

• Introdução;
• Refletindo sobre Avaliação;
• Momentos de Avaliação na Educação Infantil;
• Avaliação no Âmbito da Educação Infantil;
• Contexto Normativo Brasileiro;
• BNCC e Avaliação na Educação Infantil.


OBJETIVOS

DE APRENDIZADO
• Apresentar os instrumentos de avaliação da Educação Infantil;
• Refletir sobre sua aplicabilidade prática, bem como o papel do professor nesse processo.
UNIDADE Avaliação na Educação Infantil

Introdução
Nesta unidade, vamos tratar da Avaliação na Educação Infantil (EI). Para que
possamos entender como ela se processa nesse nível de ensino, é preciso, primeiro,
entender o conceito de avaliação e o que os autores da área educacional pensam
sobre o tema.

Figura 1
Fonte: Getty Images

Como a EI foi vista durante muito tempo como uma etapa sem ligação com a
educação formal e com a aprendizagem efetiva, a avaliação nesse período era tida
como desnecessária. Mesmo após mudanças nas perspectivas da EI, muitas pessoas
ainda consideram a avaliação como um mecanismo de medição do conhecimento
formal na forma de provas e testes.

A avaliação, contudo, não pode ser restrita somente a essa interpretação. É pre-
ciso refletir sobre as necessidades do processo avaliativo, seus objetivos e potenciali-
dades, para partir então para o contexto da Educação Infantil e suas possibilidades.

Refletindo sobre Avaliação


Diversos autores discutem a questão da avaliação, trazendo, assim, diferentes defini-
ções para esse importante conceito na educação. Vejamos algumas dessas definições:
É um processo contínuo de pesquisas que visa interpretar os conheci-
mentos, habilidades e atitudes dos alunos, tendo em vista mudanças espe-
radas no comportamento, propostas nos objetivos, a fim de que haja
condições de decidir sobre alternativas do planejamento do trabalho do
professor e da escola como um todo. (PILETTI, 2010, p. 190)

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Avaliação é um processo de coleta e análise de dados, tendo em vista
verificar se os objetivos propostos foram atingidos. No âmbito escolar,
a avaliação se realiza em vários níveis: do processo ensino-aprendiza-
gem, do currículo, do funcionamento da escola como um todo. (HAYDT,
2004, p. 288)

Os procedimentos de avaliação são um precioso e imprescindível elemento


para conhecer o que o sistema educativo desde o estabelecimento de
políticas públicas até a realidade das classes pretende e obtém de seus
alunos. (KRASILCHIK, in: CASTRO, 2002, p. 165)

Podemos perceber que todos os autores citados remetem à avaliação como um


processo cuja finalidade é verificar se o objetivo do ensino, a aprendizagem, está
sendo alcançado.

Segundo Haydt (2004), a avaliação tem as seguintes funções:


• Diagnosticar: verificar o que o aluno já sabe e o que ainda não aprendeu, detec-
tando os conhecimentos prévios ou pré-requisitos para a aprendizagem. Realiza-
-se no início do período letivo ou de uma unidade de ensino. A autora relaciona
esta função à Avaliação Diagnóstica;
• Controlar: acompanhar o processo de aprendizagem do aluno, assim como o
ensino do professor, realizada ao longo do período letivo. Refere-se, segundo a
autora, à Avaliação formativa;
• Classificar: destinada à promoção dos alunos; classifica os alunos de acordo
com o nível de aproveitamento estabelecido e os resultados apresentados; rea-
lizada no final do período letivo ou de uma unidade de ensino. Denominada de
Avaliação Somativa pela autora, mas a que alguns teóricos chamam de Avali-
ação Classificatória.

O artigo “Avaliação da aprendizagem na perspectiva formativa e na classificatória”


abrange a questão apresentada por Haydt. Disponível em: https://bit.ly/3eY2cCT

Para Hoffmann (1993), a avaliação tem que ser significativa, permitindo intervenções
que favoreçam o relacionamento com os alunos e o diagnóstico da ocorrência ou não
da aprendizagem, numa mediação constante. Por isso, defende o conceito de Avaliação
Mediadora. A autora entende que avaliação é uma mediação que permite um diálogo
com os alunos, querendo saber o que sabem, o que pensam, o que já construíram, para
possibilitar o planejamento de ações que os tornem cada vez mais autônomos.

A avaliação tem o propósito de permitir que o professor conheça seus alunos, aper-
feiçoando o processo de ensino-aprendizagem para que seus objetivos possam ser alcan-
çados. Além disso, poderá diagnosticar prováveis dificuldades e promover seus alunos.

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UNIDADE Avaliação na Educação Infantil

Figura 2
Fonte: Getty Images

A forma de encarar e realizar a avaliação reflete a atitude e a postura do professor,


assim como suas relações com os alunos. Fica claro, desse modo, que a avaliação
não possui um conceito único, nem acontece somente em um momento pré-deter-
minado, pois é formada por diversas ações estabelecidas pelos professores, com o
intuito de diagnosticar as dificuldades de seus alunos, de procurar saná-las e também
de diagnosticar o que eles já aprenderam ou já sabem.

Momentos de Avaliação
na Educação Infantil
Bassedas (1999) propõe três diferentes momentos de avaliação na Educação
Infantil. Suas sugestões coincidem com os conceitos de avaliação defendidos por
Haydt (2004) e citados no início de nossos estudos. O primeiro momento é o que ela
chama de “Avaliação Inicial”. A avaliação inicial é realizada com o objetivo de saber
o que os alunos já sabem sobre o tema que será abordado, para que, desse modo, o
professor possa modificar ou ajustar as atividades, assim podendo adequá-las visando
à melhoria da aprendizagem e priorizando suas experiências fora da sala de aula.
A avaliação inicial compreende, desse modo, diversas funções: utiliza-se
para externar informações sobre o que os meninos e as meninas de uma
mesma turma sabem ou o que não sabem; é útil para planejar, programar
e apresentar melhor a atividade ou a unidade a ser trabalhada, além de
proporcionar às crianças a darem sentido ao que se faz na escola e envolve-
rem-se mais ativamente nas atividades da aula. (BASSEDAS, 1999, p. 175)

O segundo momento é a “Avaliação Formativa”. Essa avaliação é realizada de


maneira progressiva e paralela às diferentes atividades que se desenvolvem em sala

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de aula. Sua ferramenta principal é a observação, ou seja, durante as atividades, o
professor observa seus alunos e coleta informações sobre o que eles aprenderam,
em que tiveram dificuldades, possibilitando, assim, a adequação do planejamento de
acordo com as possibilidades de cada criança. Sobre a observação, a autora diz:
A observação não é entendida como passiva, mas de uma maneira ativa:
quando se está perguntando, ajudando-os, propondo coisas diferentes a
diferentes crianças e detectando, dessa maneira, a sua capacidade de rece-
ber ajuda, de aceitá-la e de aproveitá-la.

Esse tipo de observação participativa produz-se quando se ajuda uma me-


nina a acabar um quebra-cabeças; quando se diz a um menino que está
tentando fazer uma casa para observar um companheiro que também
tenta fazer uma; quando se vai verbalizando as partes do corpo a uma
criança que está fazendo o desenho de uma pessoa e em muitos outros
momentos, nos quais se tenta verificar o que os alunos são capazes de
fazer; quando são ajudados ou quando se faz uma atividade juntamente
com eles. (BASSEDAS, 1999, p. 176)

Desse modo, a avaliação deve se constituir em uma possibilidade de conhecer as


crianças e suas especificidades, através de uma observação e de uma escuta atenta;
deve ser vista como observação e reflexão do cotidiano/de todos os elementos que
compõem o trabalho pedagógico: gestão, práticas educativas, currículo, condições
materiais, espaços e tempos, e, por fim, deve ser vista como um registro de experi-
ências vividas pelas crianças.

Figura 3
Fonte: Getty Images

O terceiro e último momento é a “Avaliação Somativa”. Essa avaliação é realizada


no final do processo de ensino-aprendizagem e possibilita ao professor saber o que
definitivamente seus alunos aprenderam e, se for necessário, modificar a prática
educativa, visando à melhoria do desenvolvimento das crianças.

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UNIDADE Avaliação na Educação Infantil

[...] também possui, evidentemente, uma função reguladora, pois serve


para replanejar o processo de ensino que foi realizado. Pode, dessa ma-
neira, servir para modificar a unidade didática que se havia planejado,
quando se avalia que não foram atingidos os objetivos previstos; ou pode
alertar sobre a necessidade de retomar, em momentos posteriores, deter-
minados conteúdos trabalhados. (BASSEDAS, 1999, p. 177)

O artigo “Avaliação na educação infantil: desafios e perspectivas” abrange o tema dos


momentos avaliativos e considera o contexto amplo da avaliação na EI de forma prática.
Disponível em: https://bit.ly/3gTKfay

Avaliar abrange aquisição de conhecimentos decorrentes dos conteúdos curriculares,


de habilidades, competências, interesses, atitudes, hábitos e ajustamento pessoal e social.

É preciso frisar que alguns educadores renunciam às fichas por entenderem que
marcar “x” em determinados itens não constitui avaliação, mas sim o cumprimento
burocrático de algo que não leva à real visão da aprendizagem do aluno. Por isso,
é muito importante deixar claro que a simples anotação, nas fichas de avaliação, da
condição na qual a criança se encontra em termos de aprendizagem não constitui
uma avaliação.

Tirinha de Armadinho, satirizando as provas aplicadas na Educação Infantil. Disponível


em: https://bit.ly/2yITDfU

Avaliar pressupõe a obtenção de conhecimento para verificar se o processo está


ou não atingindo seus objetivos. Portanto, somente anotar e apresentar os resultados
aos envolvidos com a educação da criança não terá valor se não houver uma reflexão
por parte do professor, que fará com que haja mudanças naquilo que não está dando
certo e manutenção do que está contribuindo para o crescimento da criança, inclusive
com a utilização de diferentes práticas.

Avaliação no Âmbito da Educação Infantil


A avaliação deve servir, basicamente, para intervir, modificar e melhorar a nossa
prática, a evolução e a aprendizagem dos alunos. Assim sendo, é importante que
os alunos sejam avaliados em diferentes momentos e não em uma única e exclusiva
oportunidade, para que, desse modo, não ocorra o que chamamos de “rotulação”.
A avaliação é um elemento-chave através do qual dispomos de informa-
ções que servem para tomarmos decisões. Faz menos sentido pensar em
avaliação unicamente com a finalidade de emitir um juízo ou de credi-
tar, o que pode incorrer no perigo de rotular e de condicionar muito as

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possibilidades da criança. Ao contrário, devemos tentar proporcionar a
todos os alunos a possibilidade de viverem experiências de sucesso, para
que todas as crianças tenham vontade e confiança em aprender e crescer
com o seu grupo de companheiros. (BASSEDAS, 1999, p. 174)

A participação e o entendimento do aluno no próprio processo avaliativo são


muito importantes. É preciso que o aluno entenda que a avaliação não é algo ruim
ou que deve ser visto como uma “rotulação”. A criança deve compreender que o pro-
cesso de avaliação faz parte de sua aprendizagem, e o professor, por sua vez, precisa
proporcionar uma diversidade de situações de aprendizagem para poder avaliar o
aluno e aproveitar toda a experiência que a criança carrega com ela.

Para entender o caminho percorrido pela avaliação na EI brasileira, vale a pena


recorrer ao que consta no RCNEI, que aponta que a avaliação nessa etapa deve ser
processual e destinada a auxiliar o processo de aprendizagem e fortalecendo a auto-
estima das crianças. Nesse documento a avaliação é entendida como:
[...] um conjunto de ações que auxiliam o professor a refletir sobre as con-
dições de aprendizagem oferecidas e ajustar sua prática às necessidades
colocadas pelas crianças. [...] Tem como função acompanhar, orientar,
regular e redirecionar o processo educativo como um todo. (BRASIL,
1998, p. 59)

Considerando o período correspondente à infância, Bassedas (1999) destaca que, em


se tratando da Educação Infantil, ao se pensar na avaliação, deve-se entender que sua
finalidade deve ser a intervenção e a tomada de decisões relacionadas à educação, a fim
de que o professor possa observar o caminho percorrido pela criança, sua evolução e
progresso. Com isso, o professor poderá planejar suas ações para verificar a necessidade
de modificar situações, relações ou atividades desenvolvidas na sala de aula. Ele deve
compreender que a avaliação não irá puni-lo, mas sim ajudar em sua formação.

Tirinha Chico Bento, disponível em: https://bit.ly/36HweIh

Para Hoffmann (1996), apesar da determinação legal, alguns professores da Edu-


cação Infantil se esquecem da questão processual e utilizam a avaliação somente no
final do período letivo.
O modelo de avaliação classificatória se faz presente nas instituições de
educação infantil quando, para elas, avaliar é registrar ao final de um
semestre (periodicidade mais frequente na pré-escola) os “comportamentos
que a criança apresentou”, utilizando-se, para isso, de listagens uniformes
de comportamentos a serem classificados a partir de escalas comparativas.
(HOFFMANN, 1996, p. 12)

Essa perspectiva vai ao encontro do contexto brasileiro, em que a restrição da


visão avaliativa para as provas e testes acabar por invalidar, aos olhos de algumas

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UNIDADE Avaliação na Educação Infantil

pessoas, avaliações mais qualitativas. Observar o comportamento dos alunos com


base nas referências e bases estudadas nas unidades anteriores desta disciplina é,
assim, fundamental para colocar em prática a avaliação educacional na EI.

Assista ao vídeo “Como avaliar o desenvolvimento da criança na Educação Infantil”, de


Geraldo Peçanha de Almeida, que traz pontos importantes que devem ser observados na
criança durante a EI. Disponível em: https://youtu.be/_kZcqO2j2NY

Contexto Normativo Brasileiro


Dessa forma, pergunta-se: que tipo de avaliação deve ser desenvolvido na Educação
Infantil, de acordo com as normativas que regem a educação brasileira?

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9394/96, assim orienta


quanto à avaliação na Educação Infantil:
Art. 31. Na educação infantil a avaliação far-se-á mediante acompanha-
mento e registro do seu desenvolvimento, sem o objetivo de promoção,
mesmo para o acesso ao ensino fundamental. (BRASIL, 1996)

Entende-se, portanto que, na Educação Infantil, a avaliação deve se constituir em um


processo que auxilie a aprendizagem e fortaleça a autoestima das crianças. Com isso,
elas serão capazes de acompanhar seus próprios avanços e conquistas, assim como as
dificuldades encontradas em seu processo de aprendizagem.

Note que a LDB destaca que a avaliação se dá por meio do registro do desen-
volvimento do aluno. Não se trata, portanto, de medidas classificatórias dos alunos,
colocando notas ou parâmetros médios para avaliá-los. A ideia da avaliação no
contexto infantil é a de entender como o aluno se comporta diante do processo de
ensino-aprendizagem e verificar se ele está adaptado às propostas metodológicas
apresentadas, ou se é preciso pensar em possibilidades que permitam melhores
desenvolvimentos com ele. Da mesma maneira, uma visão geral da turma de alunos
também possibilita verificar se os eventuais déficits são de natureza pessoal ou geral.

A DCN (Diretrizes Curriculares Nacionais), de 2009, dispõe sobre a avaliação


educacional a Educação Infantil em seu artigo 10º.
Art. 10. As instituições de Educação Infantil devem criar procedimentos
para acompanhamento do trabalho pedagógico e para avaliação do desen-
volvimento das crianças, sem objetivo de seleção, promoção ou classifi-
cação, garantindo:

I – a observação crítica e criativa das atividades, das brincadeiras e intera-


ções das crianças no cotidiano;

II – utilização de múltiplos registros realizados por adultos e crianças (rela-


tórios, fotografias, desenhos, álbuns etc);

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III – a continuidade dos processos de aprendizagens por meio da criação
de estratégias adequadas aos diferentes momentos de transição vividos
pela criança (transição casa/instituição de Educação Infantil, transições
no interior da instituição, transição creche/pré-escola e transição pré-
-escola/Ensino Fundamental);

IV – documentação específica que permita às famílias conhecer o trabalho


da instituição junto às crianças e os processos de desenvolvimento e apren-
dizagem da criança na Educação Infantil;

V – a não retenção das crianças na Educação Infantil.

Em consonância com a LDB, a DCNEI afirma que a avaliação na Educação


Infantil deve ter sempre em mente o acompanhamento do desenvolvimento do aluno,
e não a sua classificação por notas. Ou seja, o objetivo é entender e aperfeiçoar a
aprendizagem em vez de categorizar o aluno.

Da mesma maneira, a avaliação na EI não visa reter o aluno nessa etapa do ensino.
É claro que obstáculos no desenvolvimento devem ser analisados como possíveis
entraves para o avanço rumo ao Ensino Fundamental, mas o objetivo não é barrar o
aluno, e sim transpor esse obstáculo. Como vimos, a avaliação deve ser contínua. Isso
significa, na prática, que possíveis pontos fracos dos alunos devem ser trabalhados e
considerados, mediante a criação ou adaptação das práticas pedagógicas, para que o
aluno tenha as oportunidades necessárias para seu desenvolvimento.

BNCC e Avaliação na Educação Infantil


Conforme vimos em unidade anterior, a BNCC trabalha as competências que
devem ser desenvolvidas ao longo da educação. Você deve ter percebido que a
BNCC coloca o aluno como sujeito de sua aprendizagem – ou seja, ele é ativo
no processo de construção do conhecimento. Da mesma maneira, ele deve ser
igualmente protagonista de sua avaliação e ser capaz de compreender o que isso
significa no contexto de sua formação.

A BNCC fundamenta-se em práticas reflexivas para professores e alunos. Sendo


assim, é preciso que ambos entendam os objetivos de suas atividades e o que se
espera que seja extraído dela.

Assista ao vídeo “Base nacional comum curricular e avaliação”, produzido pela Universi-
dade Federal do Espírito Santo, uma parceria entre o Centro de Educação (Laufes), a TV Ufes
e o Curso de Comunicação, fala sobre a BNCC no contexto avaliativo.
Disponível em: https://youtu.be/6VLAQpo1jxI

Por exemplo: uma atividade de teatro pode ser desenvolvida com objetivos lúdi-
cos, de exploração da imaginação e linguagem (atingindo o campo de experiências
da escuta, fala, pensamento e imaginação) e físicos, para desenvolver habilidades

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UNIDADE Avaliação na Educação Infantil

de dança e atuação (acionando o campo de experiências de corpo, gestos e movi-


mentos). Nesse caso, o professor deve observar se a criança consegue entender o
que é proposto na atividade e realizar as ações necessárias demonstrando desen-
volvimento ao longo dela. A criança pode, por exemplo, imaginar cenários e criar
coreografias, mas não conseguir entender seu momento de falar ou fazer as expres-
sões faciais adequadas. Dessa maneira, o educador deve observar o que precisa
ser desenvolvido e criar oportunidadespara que isso seja trabalhado em outros
momentos. As habilidades já conquistadas, por sua vez, podem ser desenvolvidas
e aprofundadas ainda mais em ocasiões futuras.

É preciso, porém, que o aluno entenda que é esperado que ele tente desenvolver
certos aspectos. No exemplo acima, é preciso estimular todos a fazer o que se espera
– muitos alunos podem até mesmo nunca ter tido o contato adequado com a atividade,
precisando de explicações mais detalhadas ou demonstrações – apontando para eles
possibilidades de ação.

Em Síntese
Nesta unidade, pudemos conhecer alguns aspectos relevantes da avaliação na Educação
Infantil. Vimos que o professor possui diferentes alternativas para observar e acompanhar o
desenvolvimento das crianças. Percebemos também a importância de registrar essas obser-
vações para podermos apresentá-las aos envolvidos com a educação da criança, a fim de
que todos possamos trabalhar por seu crescimento e desenvolvimento pleno.
Conforme se pode perceber, a avaliação na Educação Infantil depende da postura do pro-
fessor na construção de uma prática docente significativa, com base em pressupostos teó-
rico-metodológicos, na revisão de ensino e mediação na aprendizagem. Deve, no entanto,
seguir sempre a premissa do desenvolvimento de aluno enquanto sujeito de sua educação
e indivíduo em formação integral, conforme apresentado nos conteúdos normativos.
O desafio que se apresenta é que cada professor se comprometa com um ensino que
auxilie as crianças na construção de conhecimentos que, de fato, as ajudem a crescer e
avançar, cada vez mais, nos diferentes aspectos de seu desenvolvimento, utilizando a
avalia­ção na Educação Infantil como forma de promoção, crescimento e revisão de práti-
cas, e não de classificar os alunos como comumente vemos em muitas escolas.

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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Sites
Educação Infantil
Caderno de Práticas para Educação Infantil da BNCC.
https://bit.ly/3dxp3Fc
Spotify
Podcast “Eu aprendo errando”.
https://spoti.fi/2Y1TOvq

Leitura
Avaliação da Aprendizagem na Educação Infantil: Recurso para a Prática Pedagógica
https://bit.ly/2XAOMHn
5 Dicas para Trabalhar as Competências e Habilidades da BNCC
https://bit.ly/3eUWT7y

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UNIDADE Avaliação na Educação Infantil

Referências
BASSEDAS, E. et al. Aprender e ensinar na Educação Infantil. Porto Alegre:
Artmed, 1999.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394/96, de


20 de dezembro de 1996.

________. Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil. Brasília: MEC/


SEF, 1998.

________. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2018. Disponível em:
<http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versao
final_site.pdf>.

CASTRO, A. D. Ensinar a Ensinar: Didática Para a Escola Fundamental e Media.


São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002.

HAYDT, R. C. C. Avaliação do Processo Ensino-Aprendizagem. 6. ed. São Paulo:


Ática, 2004.

HOFFMANN, J. M. L. Avaliação na pré-escola: um olhar sensível e reflexivo sobre


a criança. Porto Alegre: Mediação, 1996.

________. Avaliação Mediadora: Uma Prática da Construção da Pré-escola a


Universidade. 17. ed. Porto Alegre: Mediação, 2000.

PILETTI, C. Didática Geral. 24 ed. São Paulo: Ática, 2010.

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