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Notícias Brasil Internacional Econo

Uma criança morre de


fome a cada dez
segundos?
Ruth Alexander
Da BBC News

18 junho 2013

Um número alto de crianças desnutridas morre,


mas não apenas de fome

O uso de um chamativo slogan em uma


campanha de ONGs na Grã-Bretanha para
destacar a gravidade da situação vivida por
crianças com desnutrição ─ o de que uma
criança morre de fome a cada dez segundos ─
gerou críticas por parte do próprio Programa
de Alimentação da ONU (WFP, na sigla em
inglês).

O slogan foi adotado pela campanha Enough


Food for Everyone If no dia 6 de junho,
atualizando outro que vinha sendo usado, o de
uma morte a cada 15 segundos. A campanha
visa pressionar os líderes do G8, que estão
reunidos na Irlanda do Norte, a adotar medidas
para combater o problema.

A organização diz que o slogan ajuda as pessoas


entenderem o problema e o "humanizam". Por
sua vez, o WFP, órgão que procura justamente
combater a fome no mundo, argumenta que os
números podem ser enganadores e podem
causar confusão.

Mas qual é a verdade por trás do slogan? E será


que o debate se justifica?

Frase 'acessível'

Estatísticas a respeito de mortes causadas pela


fome em curtos períodos de tempo são usadas
há anos.

Esta última é baseada em uma fonte de respeito,


a publicação científica The Lancet, um veículo
de fama internacional que, recentemente,
publicou um relatório afirmando que mais de 3
milhões de crianças morreram de subnutrição
em 2011.

Para conseguir a estatística para o slogan, os


responsáveis pela campanha da If dividiram o
número de segundos em um ano inteiro pelo
total de mortes, três milhões.

E, de acordo com o porta-voz da campanha, Jack


Lundie, esta operação aproxima mais as pessoas
da questão."Números grandes são difíceis de
visualizar, especialmente quando você fala de
milhões", afirma.

"Também queremos nos concentrar no


indivíduo, e estas expressões ajudam a
humanizar o problema."

"Então precisamos de uma frase curta, acessível


que, em um período curto de tempo vai
transmitir o impacto emocional do problema
que estamos tratando, mas também dará um
sentido de proporção e urgência que vai
precipitar algum tipo de ação", acrescentou.

Mudança de rumo

Para o WFP, por outro lado, "existe uma


tentação real de usar este tipo de estatística
pois elas realmente conseguem chegar às
manchetes, você não pode ignorar isto pois é
uma imagem horrível", disse Jane Howard,
representante do WFP.

Mas, de acordo com ela, estes números são um


pouco "enganadores".

O próprio WFP costumava alegar que uma


crianças morria de fome a cada seis segundos,
mas parou de usar esta frase por volta de 2008.

Os números podem
mudar de ano para ano,
de acordo com Howard, Podcast
tudo depende da
pesquisa mais recente, e
"fica muito confuso, pois
os números antigos
acabam ficando na
internet".

E, mais importante, de
Brasil Partido
acordo com a
representante do WFP, João Fellet tenta
entender como
"a ciência está dizendo
brasileiros
algo muito diferente, na
chegaram ao grau
verdade". atual de divisão.
Episódios
"Com certeza existem
circunstâncias extremas,
nas quais crianças
morrem de fome, e lembro da fome recente em
algumas partes da Somália. Mas a verdade é que
a grande maioria daqueles números sobre os
quuais estamos falando se referem a crianças
que, por não terem tido a nutrição correta no
começo da vida, são muito, muito suscetíveis a
doenças infecciosas, como sarampo", afirmou
Howard.

"Uma criança que teve uma boa nutrição


simplesmente vai superar (as doenças), mas, no
caso de uma criança muito frágil e com um
sistema imunológico comprometido, (a doença)
ameaçará sua vida", acrescentou.

E o fato de uma nutrição deficiente ser


identificada como causa subjacente de morte
significa que também há uma contagem dupla.
Quando se ouve que uma criança morre a cada
poucos segundos devido a doenças relacionadas
à água não tratada ou devido à pobreza, por
exemplo, algumas destas crianças vão ser as
mesmas que estariam morrendo a cada poucos
segundos de fome.

Complexidade

A maioria das mortes relacionadas a problemas


de nutrição ocorrem em países que não estão
sofrendo com conflitos ou fome, segundo o
professor Robert Black, da Escola de Saúde
Pública Johns Hopkins Bloomberg, nos Estados
Unidos.

"Estes não são os países mais pobres do mundo.


São países como a Índia ou a Nigéria ou muitos
outros países na Ásia ou África que realmente
poderiam se sair melhor, que têm os recursos
para alimentar as crianças", afirmou.

"Certamente os mais pobres têm os maiores


problemas com subnutrição, mas mesmo assim
há comida o suficiente para alimentar as
crianças. A dificuldade é alcançar uma dieta de
qualidade, uma dieta que é dominada por
cereais ou amido não será uma dieta com a
qualidade necessária para os dois primeiros anos
de vida", disse.

Foi Black que calculou que 3 milhões de crianças


morreram em decorrência da subnutrição em
2011, divulgando o número na The Lancet. Ele
afirma que, na maioria dos casos, o problema
pode ser resolvido por meio da educação.

Maioria das mortes por problemas de nutrição não


ocorre em países em conflito

Por exemplo, ele explica que um quarto das


mortes pode ser atribuido a uma amamentação
não adequada, com muitas famílias não
percebendo que até os seis meses de idade os
bebês precisam exclusivamente de leite
materno, e esta alimentação os protege de
comida contaminada.

Então, tudo indica que os fatos são mais


complicados do que o slogan. Mas, de acordo
com Jack Lundie, porta-voz da If, é preciso
simplificar para conseguir a atenção das
pessoas.

Lundie admite que pode ser que as pessoas não


consigam toda a informação sobre o problema
com o slogan mais chamativo das mortes em
poucos segundos, mas ele não acredita que
"seria realista" esperar algo assim apenas com
um slogan.

"Em termos que criar uma conversa na qual as


pessoas podem ser informadas, você primeiro
precisa conseguir a atenção delas, a atenção
emocional. As pessoas são muito ocupadas
então você precisa uma compreensão
instantânea para iniciar uma conversa", disse.

A subnutrição é um problema grave, e as 3


milhões de crianças que teriam morrido por esta
causa em 2011 representam quase metade de
todas as mortes infantis. Mas há sinais de
avanços.

"Há uma queda no número excessivo de mortes,


não muito grande, mas é um avanço desde a
última vez que estudamos isto (em 2008), e a
atenção dada a estas questões de nutrição em
países de baixa renda e de renda média,
realmente aumentou muito nos últimos cinco
anos", disse Black.

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