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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE CIÊNCIAS JURIDICAS


FACULDADE DE DIREITO

Agenilson Jonatan Corrêa dos Santos1

RESUMO2

VILLEY, Michel. A filosofia jurídica de Guilherme Ockham. In: VILLEY, Michel. A


formação do pensamento jurídico moderno. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
cap. 3, p. 221-288.

Michel Villey foi professor, filósofo e historiador, dedicado ao estudo da lei


francesa, nasceu em Caen na França em 04 de abril de 1914, falecendo em 1988.
Foi professor associado na Universidade de Estrasburgo no curso de direito, e
posteriormente passou a lecionar na Universidade de Paris em 1961. Suas
habilidades de ensino, suas qualidades como um historiador de Direito e Direito
Romano, permitiu-lhe reviver na França a filosofia da lei, e exercer uma grande
influência sobre o pensamento jurídico francês. Michel Villey publicou a obra “A
Formação do Pensamento Jurídico Moderno” que teve ampla repercussão,
chamando a atenção principalmente pela inspiração nas obras de Aristóteles, São
Tomás de Aquino e Guilherme de Ockham.
O capítulo ora aqui resumido, tem como objetivo explanar, segundo a visão
de Villey, as contribuições de Guilherme de Ockham para a filosofia jurídica, desde a
difusão do nominalismo, perpassando pelo positivismo jurídico até o direito subjetivo.
Segundo Villey, Ockham ganhou fama por ter inaugurado a via moderna da
filosofia por meio do nominalismo, esta concepção filosófica não foi necessariamente
um ineditismo de Ockham, pois ela data desde o século XI e XII com Roscelino ou
Aberlado ao esclarecer a obra de Porfírio, mas foi sua obra que ganhou destaque,
sendo a mais relevante da história. Villey relata a importância de compreender a
história da filosofia do direito, a partir do confronto do realismo de são Tomas, e para
isto, traz a querela dos universais, pois ela apresenta a linha divisora entre o direito
natural clássico (realismo) e do positivismo jurídico. Ockham apresenta a distinção
entre as coisas e os signos: as palavras (como os termos universais) são apenas
signos das coisas, e por meio do raciocino chega-se à conclusão que as coisas só

1
Acadêmico do curso de Direito Discente do curso de bacharelado em Direito da Universidade Federal do Pará.
2
Resumo apresentado à disciplina história do pensamento jurídico, sob orientação do profº Dr. Ricardo Dib Taxi.
podem por definição, simples, isoladas separadas, se é ser único e distinto. Homem
e animal não são coisas nem seres, o que há é Pedro, há somente em Pedro, e não
há outras coisas, palavra (genéricas) em que exista Pedro, Pedro é a única coisa
que existe em si. é esta lógica que defende Ockham em seu nominalismo, onde só
existem os indivíduos, os universais são apenas signos, termos de linguagem, que
desempenham na lógica a função de conotação.
Villey argumenta que muitos historiadores se mostram céticos na relação
entre a filosofia de Ockham e o positivismo jurídico, em razão deste ser considerado
um produto do século XIX, e, portanto, não teria relação com a idade média,
entretanto, considerando que o positivismo jurídico é a doutrina de exalta o direito
positivo a ponto de pretender edificar sobre a lei, e apenas sobre a lei, o conjunto da
ordem jurídica, e é nesse sentido, que o positivismo jurídico é produto do
nominalismo. Ockham reconhece como fontes de direito, formulas de leis,
expressões de vontades individuais, e não mais a ordem da natureza.
Ao perpassar pelas obras de Ockham, Villey destaca a obra Breviloquium e a
considera jurídica por natureza, apesar de que alguns a considerarem política. Nela
é retratada uma importante questão do direito público medieval, o da partilha dos
poderes entre as duas autoridades soberanas, o imperador e o papa. Para tanto,
Ockham surpreende pelo seu aspecto positivista, contrastando com o método do
direito natural, comum da época. A obra atem-se ao direito positivo, apresentando
dois tipos: as leis divinas e as leis humanas, sendo que o primeiro evidentemente
ocupa boa parte de sua fundamentação. Admite apenas a interpretação literal, não
acrescentando nada além da letra do texto, apresentando uma interpretação longa,
minuciosas dos textos da Sagrada Escritura, assim como, também o faz para as Leis
Romanas, a qual toma como referência de leis humanas, tendo o direito romano
como legislativo.
Outro tema essencial dos sistemas jurídicos moderno, mais fundamental que
o próprio positivismo jurídico, é o direito subjetivo, a qual, para Villey procede do
nominalismo Ockhaminiano. Ele explica que o direito subjetivo é o que aplica a
rubrica do jurídico (a força normativa do direito), a uma faculdade do sujeito, a um de
seus poderes, como por exemplo, o direito subjetivo de propriedade, sendo o poder
de usar, de desfrutar, de dispor da coisa, atribuído ao proprietário, ele mesmo
reconhecido, garantido, sancionado juridicamente, como resultado da associação da
ideia de direito e poder. Entretanto, Guilherme contrapõe este conceito, ao
confrontar com a filosofia clássica do direito natural de Aristóteles, relata que a
função do jurista não é a de servir o individuo, à satisfação de seus desejos, à
proclamação de seus poderes, seu papel é ser o “sacerdote da justiça”, buscando
realizar o justo, a harmonia, o equilíbrio entre as coisas ou as pessoas.
Na busca por um melhor entendimento acerca do direito subjetivo, diante das
contrariedades acima relatadas, Villey faz uma discussão histórica sobre tal
conceituação. Acredita que seja errônea a ideia que o direito da Europa moderna
deriva da estrutura subjetivista do direito romano e suas concepções da propriedade
absoluta (direito de desfrutar e abusar da coisa de modo absoluto), assim como, de
toda rede dos direitos subjetivos, como o direito a crédito, direitos de servidão,
direitos reias ou direitos pessoais. Esta confusão repousa no entendimento entre os
romanistas e o verdadeiro direito romano. Os romanistas são os juristas cultos da
Europa, que mantiveram por muito tempo o costume de falar latim, e a apesar dos
manuais de direito romano, tratarem de direito real e direito pessoal, isso não implica
necessariamente que estas expressões sejam romanas. Os romanos reconheciam
sim, a ideia dos poderes individuais, mas tais poderes não se configuravam na
qualidade de jurídicos, não eram reconhecidos como poderes de direito. Em Roma,
esses poderes, eram considerados extrajudiciais, como liberdades individuais.
A concepção individualista de Ockham fica ainda mais clara quando da sua
oposição ao Papa João XXII, que combateu o voto de pobreza praticado pelos
franciscanos, pretendendo forçá-los a se tornarem proprietários. Para o Papa, seria
juridicamente impossível a utilização dos bens pelos franciscanos sem que
houvesse um direito de propriedade. Tal situação seria ainda mais clara quando um
franciscano estivesse diante de bens consumíveis, sendo impossível separar uso e
propriedade nestes casos. Ockham, ousando discordar da interpretação papal,
entendia de forma diferente a relação entre direito e coisa. Para ele, o direito seria
um poder do indivíduo que se projetaria sobre a coisa, poder esse renunciado pelos
franciscanos, que, contudo, não renunciariam ao uso de fato sobre os referidos
bens.
Para Villey a doutrina de Ockham vai ao encontro do que denominamos o
“ponto de vista particular”, mostrando uma tendência dos particulares de se
desprender dos gargalos do direito natural objetivo, exercendo sem impedimentos as
suas atividades, e que encontrará seu prolongamento pela no liberalismo moderno.
Contra a moral clássica de ordem natural, Ockham elabora a tese de que existe uma
gama de atos moralmente “indiferentes”, isto é, que o indivíduo não é obrigado
racionalmente a cumprir, mas que cumpre por amor, e nisso consiste a virtude cristã,
transportando para o terreno do direito modos de pensar construídos no terreno da
vida espiritual.
Ao final, Villey acredita que o o direito subjetivo é a palavra-mor do direito
moderno, assim como, o direito natural é a palavra-mor da ciência jurídica romana.

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