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Aos meus pais, Francisco José de Souza (in memoriam) e Hilda Monteiro Terra de Souza, e aos meus

irmãos, Maria Nazaré, Maria Cristina e Pérsio, por estarem sempre presentes na minha vida com muito
amor e por me darem todos os exemplos que usei na formação de meu caráter.

Aos meus filhos, Fernando e Lia, e aos meus netos, Giovana, Isadora e Fernando, e Maria Amélia e Antonio,
a quem dedico o mesmo amor e os mesmos exemplos que recebi de meus pais.

À minha esposa Marcelle, por estar presente na minha vida em todos os momentos, com amor, dedicação,
admiração e incondicional apoio.

E56 Endodontia passo a passo : evidências clínicas [recurso


eletrônico] / Organizador, Francisco José de Souza Filho. –
São Paulo : Artes Médicas, 2015.

Editado também como livro impresso em 2015.


ISBN 978-85-367-0250-6

1. Endodontia. I. Souza Filho, Francisco José de.

CDU 616.314.163

Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094

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Versão impressa
desta obra: 2015

2015

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© Editora Artes Médicas Ltda., 2015

Gerente editorial: Letícia Bispo de Lima


Colaboraram nesta edição:
Editora: Mirian Raquel Fachinetto Cunha
Capa: Paola Manica
Ilustrações: Ricardo Soares Corrêa da Silva e Luiz Gonçalves
Preparação de originais: Heloísa Stefan
Leitura final: Alda Rejane Barcelos Hansen
Editoração: Techbooks

NOTA
Assim como a medicina, a odontologia é uma ciência em constante evolução. À medida que no-
vas pesquisas e a própria experiência clínica ampliam o nosso conhecimento, são necessárias mo-
dificações na terapêutica, em que também se insere o uso de medicamentos. Os autores desta obra
consultaram as fontes consideradas confiáveis, num esforço para oferecer informações completas e,
geralmente, de acordo com os padrões aceitos à época da publicação. Entretanto, tendo em vista a
possibilidade de falha humana ou de alterações nas ciências, os leitores devem confirmar essas infor-
mações com outras fontes. Por exemplo, e em particular, os leitores são aconselhados a conferir a bula
completa de qualquer medicamento que pretendam administrar, para se certificar de que a informa-
ção contida neste livro está correta e de que não houve alteração na dose recomendada nem nas pre-
cauções e contraindicações para o seu uso. Essa recomendação é particularmente importante em re-
lação a medicamentos introduzidos recentemente no mercado farmacêutico ou raramente utilizados.

Reservados todos os direitos de publicação à


EDITORA ARTES MÉDICAS LTDA., uma empresa do GRUPO A EDUCAÇÃO S.A.
Editora Artes Médicas Ltda.
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e outros), sem permissão expressa da Editora.
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PRINTED IN BRAZIL

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Autores

Francisco José de Souza Filho


Cirurgião-dentista. Professor titular de Endodontia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba
da Universidade Estadual de Campinas (FOP/Unicamp). Especialista em Endodontia. Mestre em
Biologia e Patologia Oral pela Unicamp. Doutor em Endodontia pela Faculdade de Odontologia de
Bauru da Universidade de São Paulo (FOB/USP).

Adriana de Jesus Soares Professora colabo- Brenda P. F. A. Gomes Cirurgiã-dentista.


radora do Serviço de Traumatismos Dentários da Professora titular na área de Endodontia do De-
FOP/Unicamp. Pesquisadora colaboradora na área partamento de Odontologia Restauradora da
de Endodontia da FOP/Unicamp. Mestre e Douto- FOP/Unicamp. Especialista em Endodontia pela
ra em Endodontia pela FOP/Unicamp. Professor Faculdade de Odontologia da Universidade Federal
Livre Docente em Endodontia pela FOP/Unicamp. do Rio de Janeiro (FO/UFRJ). Mestre em Endodon-
tia pela FO/UFRJ. Doutora em Odontologia Res-
Alexandre A. Zaia Cirurgião-dentista es-
tauradora: Endodontia pela University Dental Hos-
pecialista em Endodontia. Professor associado
pital of Manchester, Inglaterra. Pós-Doutorado pelo
e responsável pela disciplina de Endodontia da
Departamento de Biologia Oral da Universidade
FOP/Unicamp. Pesquisador 1B pelo Conselho Na-
Estadual de Ohio, EUA. Professora Livre Docente
cional de Desenvolvimento Científico e Tecnológi-
em Endodontia pela Unicamp.
co (CNPq). Mestre e Doutor em Biologia e Pato-
logia Buco-Dental pela Unicamp. Pós-Doutorado Caio Caldeira Brant Sandy Graduado em
pela Universidade de Minnesota, EUA. Odontologia pela Universidade Federal de Mi-
Ana Carolina Rocha Lima Caiado Cirur- nas Gerais (UFMG). Membro pesquisador do
giã-dentista. Especialista em Endodontia pela grupo Evidence-Based Decisions Practice-Based
Faculdade de Odontologia da Universidade do Research Network da University of California, Los
Estado do Rio de Janeiro (FO/UERJ). Mestre e Angeles (UCLA), EUA.
Doutora em Clínica Odontológica: Endodontia
pela FOP/Unicamp.
Caio Cezar Randi Ferraz Professor associa-
do de Endodontia da FOP/Unicamp. Mestre em
Ana Paula Guerreiro Bentes Cirurgiã-dentis- Biologia e Patologia Buco-Dental pela Unicamp.
ta. Especialista em Pacientes com Necessidades Es- Doutor em Clínica Odontológica: Endodontia
peciais pela Faculdade São Leopoldo Mandic. Mes- pela Unicamp. Pós-Doutorado pela University
tre e Doutoranda em Odontologia: Farmacologia, of Texas Health Science Center at San Antonio,
Anestesiologia e Terapêutica da FOP/Unicamp. EUA.

Antônio Rubens Gonçalves Nunes Professor Eduardo Dias de Andrade Cirurgião-dentis-


do Curso de Especialização e Atualização em En- ta. Professor titular da área de Farmacologia, Anes-
dodontia na seção Piauí da Associação Brasileira tesiologia e Terapêutica da FOP/Unicamp. Mestre e
de Cirurgiões-Dentistas (ABCD-PI). Especialista Doutor em Odontologia pela Unicamp.
em Endodontia pela ABCD-PI. Mestrando em En-
dodontia da Faculdade São Leopoldo Mandic de Francesco Chiappelli PhD., Dr. Endo (h.c.).
São Paulo. Professor of Dentistry, UCLA, EUA.

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vi Autores

Francisco Carlos Groppo Cirurgião-den- Nilton Vivacqua Gomes Cirurgião-dentista.


tista. Professor titular da área de Farmacologia, Professor coordenador dos Cursos de Aperfeiçoa-
Anestesiologia e Terapêutica da FOP/Unicamp. mento, Especialização, Avançado e Imersão em En-
Mestre, Doutor e Professor Livre Docente em dodontia das Seções Ceará e Amapá da Associação
Farmacologia, Anestesiologia e Terapêutica pela Brasileira de Odontologia (ABO-CE e ABO-AP)
FOP/Unicamp. e da ABCD-PI. Professor convidado dos Cursos
de Aperfeiçoamento e Especialização do Instituto
José Flávio A. Almeida Cirurgião-dentista. Odontológico das Américas (IOA-SC). Professor
Professor adjunto do Departamento de Odonto- coordenador dos Cursos de Mestrado em Endo-
logia Restauradora da Unicamp. Especialista em dontia da Faculdade São Leopoldo Mandic de For-
Endodontia pela Universidade Estadual Paulista taleza. Especialista, Mestre e Doutor em Endodon-
“Júlio de Mesquita Filho” (Unesp). Mestre e Doutor tia pela Unicamp.
em Clínica Odontológica pela Unicamp. Pós-Dou-
torado pela University of Texas Health Science Oslei Paes de Almeida Cirurgião-dentista.
Center at San Antonio, EUA. Professor Livre Do- Professor titular da área de Patologia, do Depar-
cente pela Unicamp. tamento de Diagnóstico Oral da FOP/Unicamp.
Mestre e Doutor em Ciências: Biologia Celular e
José Ranali Professor titular da Área de Far- Tecidual pela USP. Pós-Doutorado pela University
macologia, Anestesiologia e Terapêutica da of London e pelo Brompton Hospital. Professor Li-
FOP/Unicamp. Mestre e Doutor em Odontologia: vre Docente pela Unicamp.
Farmacologia, Anestesiologia e Terapêutica pela
Unicamp. Professor Livre Docente em Farmaco- Patrick Baltieri Cirurgião-dentista. Especialis-
logia, Anestesiologia e Terapêutica pela Unicamp. ta em Endodontia pela FOP/Unicamp. Mestre em
Endodontia pela Faculdade São Leopoldo Mandic
Luiz Valdrighi Professor titular em Endodontia de Itapetininga.
da FOP/Unicamp (aposentado). Doutor em Pato-
logia Oral pela FOP/Unicamp. Professor Livre Do- Paula Sampaio de Mello Cirurgiã-dentista.
cente em Endodontia pela FOP/Unicamp. Mestre e Doutoranda em Farmacologia, Anestesio-
logia e Terapêutica da FOP/Unicamp.
Marcelle Louise Sposito Bourreau Cirur-
giã-dentista. Endodontista clínica no Instituto Rafael Rocha Pacheco Cirurgião-dentista.
Noble Odontologia de Curitiba. Especialista em Mestre em Materiais Dentários pela Unicamp.
Endodontia pela FOP/Unicamp. Mestre em Endo- Doutorando em Materiais Dentários da Unicamp.
dontia pela Faculdade de Odontologia São Leopol-
do Mandic. Xênia Maria Caldeira Brant Cirurgiã-den-
tista. Pesquisadora associada do grupo Eviden-
Maria Cristina Volpato Cirurgiã-dentista. ce-Based Decisions Practice-Based Research Ne-
Professora titular de Farmacologia, Anestesiologia twork da UCLA, EUA. Especialista e Mestre em
e Terapêutica da FOP/Unicamp. Mestre e Doutora Endodontia pela UFMG. PhD em Biologia Oral
em Ciências: Farmacologia pela FOP/Unicamp. pela UCLA.

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Agradecimentos

A todos que, direta e indiretamente, contribuíram com suas ideias, pesquisas, mate-
riais e estímulo para que este livro se tornasse realidade.
Aos meus mestres, Prof. Luiz Valdrighi e Prof. Oslei Paes de Almeida, a quem
devo os ensinamentos, conselhos e orientações científicas, desde os primeiros mo-
mentos na carreira acadêmica, os quais foram, sem sombra de dúvida, os maiores
incentivadores de todas as minhas realizações científicas.
Aos professores da disciplina de Endodontia da FOP/Unicamp, Prof. Luiz Val-
drighi e Prof. Oreste Benatti, pioneiros e responsáveis pela linha de pesquisa sobre a
ampliação do forame apical em dentes de cães, que me motivaram na continuação
das pesquisas e na leitura dos inúmeros trabalhos publicados na literatura que servi-
ram de suporte para as técnicas endodônticas propostas neste livro.
Aos professores Alexandre Augusto Zaia, Brenda Paula Figueiredo de Almeida
Gomes, Caio Cezar Randi Ferraz e José Flávio Affonso de Almeida, que acataram mi-
nhas propostas de mudanças e contribuíram com suas pesquisas para a implantação
das técnicas apresentadas neste livro nas clínicas de graduação e pós-graduação da
FOP/Unicamp.
A todos os meus alunos dos cursos de graduação, pós-graduação (mestrado e
doutorado), aperfeiçoamento, especialização e cursos avançados de Endodontia, que
diretamente participaram desta evolução e propiciaram a oportunidade de avaliar
os resultados dos tratamentos realizados nos pacientes, constatando o alto índice de
previsibilidade e sucesso.
Ao Prof. Roberto Nascimento Maciel, que, com sua experiência como autor de
vários livros didáticos, teve a paciência de ler e dar sugestões na forma e apresentação
deste livro.
Aos professores Patrick Baltieri e Marcelle Louise Sposito Bourreau, pela precio-
sa colaboração e gentileza de contribuir com as ilustrações radiográficas e fotográfi-
cas de casos clínicos controlados.
Ao Prof. Marcos Frozoni, Doutor em Endodontia pela FOP/Unicamp, por sua
criteriosa avaliação e pelas sugestões que enriqueceram este livro.
Grande parte de meu trabalho não poderia ter sido feita sem o apoio das
Dras. Danielle Louise Sposito Bourreau e Marcelle Louise Sposito Bourreau, res-
ponsáveis por comentários construtivos na elaboração deste livro.

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Apresentação

É inegável o extraordinário avanço experimentado pela Odontologia, mas, entre to-


das as suas áreas, a Endodontia, sem qualquer sombra de dúvida, foi a que passou
pelas mudanças mais significativas, sumamente vantajosas em suas consequências.
Sem nenhum exagero, na virada do século, a Endodontia mudou drasticamente de
feição graças à incorporação de inovações tecnológicas e de mudanças conceituais.
O que era uma aspiração sonhada se transformou em realidade. A instrumen-
tação manual com limas de aço inoxidável, padrão ISO, deu lugar à instrumentação
mecanizada com sistemas rotatórios contínuos e reciprocantes, com limas de NiTi
com design e taper (gradiente de conicidade do instrumento) sem o padrão ISO, acio-
nadas por motor com controle de velocidade e torque programados.
Paralelamente, a odontometria deixou de ser radiográfica e passou a ser realizada
eletronicamente, por meio de localizadores apicais, muito mais rápidos e precisos. O
tão comentado limite apical canal-dentina-cemento (CDC) para preparo e obtura-
ção dos canais passou a ser estendido até o forame apical, implicando promover sua
patência (passagem livre do instrumento através do forame apical) e sua ampliação.
Esse novo conceito prevê que o preparo dos canais seja feito em toda a sua extensão,
até o limite foraminal, com uma formatação mais cônica. Durante a instrumentação,
outra substância química auxiliar foi introduzida, a clorexidina a 2% na forma de gel,
com a vantagem de ser lubrificante, além de possuir forte ação antimicrobiana. A ob-
turação é feita com cones, também de conicidade maior (medium ou fine-medium),
geralmente únicos, pela técnica da Onda Contínua de Condensação (Schiller, modi-
ficada por Buchanan), com uso de termo-compactador System B.
O microscópio clínico, incorporado à clínica endodôntica no final da década de
90, é outra importante ferramenta auxiliar que trouxe a enorme vantagem de am-
pliar a visualização durante a realização dos procedimentos. Não menos importan-
te deve ser considerada a substituição da radiografia analógica pela digital, com as
vantagens de eliminar o gasto de tempo com o fastidioso processamento radiográ-
fico, reduzir a emissão de raios X e permitir o arquivamento da imagem em mídias
digitais, facilitando o acesso e o envio das imagens ao profissional indicador. Outro
procedimento muito realizado nos retratamentos endodônticos e hoje um meio que
diferencia os endodontistas é a remoção de retentores (pinos) intrarradiculares com
o emprego de saca-pino ou de vibrações ultrassônicas, emitidas simultaneamente
por dois aparelhos de ultrassom.
Diante dessas informações, não há muito o que refletir para a compreensão de
que a atualização tornou-se imprescindível. A incorporação dos recentes avanços
conquistados pela Endodontia oferece condições para enfrentar um mercado de ex-
trema competitividade profissional.
Num cenário assim desenhado, o competente Prof. Francisco José de Souza Fi-
lho, carinhosamente chamado de “professor Chico”, graças à ampla experiência clíni-
ca de endodontista e docente, qualificações únicas acumuladas com ousadia e perse-

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x Apresentação

verança, pressentiu que algo precisava ser feito e não se omitiu. Pleno desse espírito,
percebeu a necessidade premente de reciclar os endodontistas qualificados até o iní-
cio da última década e a falta de livros didáticos para atender essa nova realidade.
Por essas razões, atuou também no Orocentro de Itapetininga, São Paulo, com
um Curso Avançado para reciclagem de endodontistas, tendo tomado a iniciativa de
organizar o livro Endodontia passo a passo: evidências clínicas, que me incumbiu do
privilégio de apresentar.
Os primeiros capítulos trazem o conhecimento dos principais fundamentos bio-
lógicos, como os da patologia (o processo inflamatório como mecanismo de defesa e
de reparação) e da microbiologia, aplicados à Endodontia. Na segunda parte, encon-
tram-se os fundamentos dos procedimentos clínicos, da farmacologia (terapêutica
medicamentosa) e dos materiais dentários aplicados à Endodontia, mas, para melhor
testemunhar a preocupação em enfatizar o conteúdo clínico deste livro, nos demais
capítulos o leitor encontrará todas as atividades da prática endodôntica, descrita de
forma objetiva e passo a passo.
Assim, esta obra compõe-se de três capítulos de conhecimentos das áreas cor-
relatas, treze capítulos referentes aos fundamentos clínicos e dois capítulos com a
abordagem da prática clínica. Basta consultar, no sumário, a relação e a ordem pro-
gressiva dos capítulos para ter uma ideia clara da abrangência da abordagem clínica,
iniciando pelo diagnóstico e planejamento, depois pela execução de todos os tipos
de procedimentos clínicos que fazem parte do novo perfil do endodontista, em sua
ordem sequencial, finalizando com o capítulo que trata das avaliações dos resultados
dos tratamentos, tanto clínica (as primeiras três semanas) quanto radiográfica, de-
corrido, pelo menos, um ano após a sua conclusão.
Ao concluir essa apresentação, com o livro passando pelas últimas revisões, um
fato inesperado e extremamente triste aconteceu: o falecimento do organizador e au-
tor de vários capítulos, o já saudoso e querido professor Chico. Entrementes, temos a
certeza, de que lá de cima, sua luz continuará a refletir, para todos nós, a sua bonda-
de, serenidade e sabedoria, assim como o seu legado servirá como exemplo de vida e
determinação, com a simplicidade que lhe era peculiar, retratada no desenho, de pró-
prio punho, reproduzido nesta página. Nosso afetuoso adeus, professor Francisco!
Depois dessas considerações, só me resta dizer: este é o livro!

Luiz Valdrighi
Professor titular de Endodontia da FOP/Unicamp

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Prefácio

Atualmente, a ciência evolui a passos largos e novas tecnologias são desenvolvidas em


ciclos cada vez menores, forçando constantes revisões de conceitos e fundamentos
técnicos. As inúmeras vertentes científicas têm suporte na velocidade da informação
e pela aplicabilidade da máxima eficácia.
O conhecimento envolve paradigmas, e quebrar paradigmas tornou-se uma exi-
gência no mundo atual. Estamos na era da mudança. O sistema deve mudar, e as em-
presas dependem das mudanças para permanecerem no mercado. Os profissionais
precisam rever seus conceitos e criar novas formas de atuação.
Uma teoria só é admitida enquanto não surgem evidências capazes de questioná-
-la ou alternativas que possam substituí-la. Em geral, uma teoria substitui a outra
porque responde a questões a que a outra não responde, pela obtenção de resultados,
amplamente previsíveis, ou porque apresenta maiores benefícios e vantagens.
Dessa forma, este livro foi elaborado para quebrar paradigmas, desafiar velhos
conceitos, romper modelos e introduzir o novo, com novas formas de fazer. O prin-
cipal propósito é o de desenvolver um aprendizado simples e objetivo a partir dos
conceitos básicos que norteiam a Endodontia e, ao mesmo tempo, orientar, passo
a passo, todo o sequenciamento técnico dos procedimentos endodônticos, nas suas
diversidades biológicas e anatômicas, com o máximo de eficácia e segurança. Caso
contrário, vamos apenas continuar fazendo as mesmas coisas, com resultados muito
parecidos e já bem-conhecidos.
O conteúdo apresentado é baseado na experiência clínica do autor, somada à
análise consistente e sintética da literatura. A ideia foi elaborar um livro didático e
objetivo que ofereça aos estudantes e aos clínicos maior segurança para a realização
de tratamentos endodônticos diante da ampla diversidade da morfologia dental.
As técnicas propostas são fundamentadas em princípios biológicos, com ênfase
no conhecimento da etiopatogenia das lesões e no processo de reparação dos tecidos
periapicais. Esse enfoque é essencial, uma vez que o processo de reparo pós-trata-
mento endodôntico faz-se por meio da proliferação e da diferenciação de células do
tecido conjuntivo periodontal apical, após a eliminação dos fatores irritantes, seguida
pela obturação tridimensional do canal radicular.
O principal desafio é demonstrar que o sucesso do tratamento endodôntico pode
ser previsível, desde que os procedimentos clínicos tradicionais de limpeza, modela-
gem e obturação do canal sejam realizados com um elevado padrão de qualidade. É
preciso salientar que esses procedimentos não devem ficar restritos ao limite canal-
-dentina-cemento (CDC), mas atingir toda a extensão do canal radicular, incluindo
o forame apical, a fim de que os substratos orgânicos pulpares remanescentes sejam
devidamente eliminados. A ampliação intencional do diâmetro do forame apical du-
rante o preparo radicular elimina de maneira mais efetiva restos orgânicos, conta-

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xii Prefácio

minados ou não, ali localizados. Só assim o tecido conjuntivo periapical consegue


cumprir seu papel biológico reparador.
Para finalizar, a integração da Endodontia com a Odontologia restauradora me-
rece um adendo: os tratamentos devem ser concluídos com a impermeabilização ou
“blindagem” do acesso coronário. Esse procedimento restaurador tem por objetivo
impedir a microinfiltração de fluidos bucais contaminados e prevenir possíveis fratu-
ras da estrutura coronária remanescente, devendo ser realizado imediatamente pelo
próprio endodontista, com materiais restauradores adesivos definitivos.
Os parâmetros de êxito dos resultados são confirmados pelas avaliações prospec-
tivas dos tratamentos endodônticos, efetuadas cerca de um ano após a sua conclusão.
Boa leitura!
Francisco José de Souza Filho
Organizador

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Sumário

Parte I Fundamentação biológica dos tratamentos endodônticos


1 Etiopatogenia das alterações pulpares e periapicais . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21
ALEXANDRE A. ZAIA

2 Microbiologia aplicada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
BRENDA P. F. A. GOMES

3 Reparação apical e periapical . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31


OSLEI PAES DE ALMEIDA

Parte II Fundamentação dos procedimentos clínicos


4 Anamnese . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
EDUARDO DIAS DE ANDRADE

5 Diagnóstico em endodontia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43
LUIZ VALDRIGHI E FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

6 Morfologia dental aplicada ao preparo endodôntico . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59


FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

7 Classificação e planejamento do tratamento endodôntico . . . . . . . . . . . . . 73


LUIZ VALDRIGHI E FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

8 Abertura coronária . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80
FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

9 Anestesia em endodontia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85
MARIA CRISTINA VOLPATO, JOSÉ RANALI,
FRANCISCO CARLOS GROPPO E EDUARDO DIAS DE ANDRADE

10 Isolamento absoluto em endodontia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92


PATRICK BALTIERI

11 Substâncias químicas auxiliares e irrigação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99


MARCELLE LOUISE SPOSITO BOURREAU,
ANTÔNIO RUBENS GONÇALVES NUNES E FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

12 Limite apical, patência e ampliação do forame . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 112


FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

13 Restauração coronária e radicular em endodontia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121


FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO, RAFAEL ROCHA PACHECO
E ANA CAROLINA ROCHA LIMA CAIADO

14 Protocolos farmacológicos para procedimentos eletivos


e urgências endodônticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 141
EDUARDO DIAS DE ANDRADE, PAULA SAMPAIO DE MELLO
E ANA PAULA GUERREIRO BENTES

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xiv Sumário

15 Sistemas de instrumentação mecanizada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 149


NILTON VIVACQUA GOMES

16 Microscopia operatória em endodontia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 159


FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO E PATRICK BALTIERI

17 Tratamento de dentes com rizogênese incompleta:


revitalização ou apicificação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 166
ADRIANA DE JESUS SOARES, ALEXANDRE A. ZAIA, CAIO CEZAR RANDI
FERRAZ, JOSÉ FLÁVIO A. ALMEIDA E FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

18 Avaliação dos resultados dos tratamentos de canais radiculares . . . . . . . 175


LUIZ VALDRIGHI E PATRICK BALTIERI

Parte III Procedimentos clínicos para o preparo e a obturação de


canais radiculares com patência e ampliação do forame apical
19 Preparo de canais radiculares com patência
e ampliação do forame apical. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 181
FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

Parte IV Estudos longitudinais em saúde


20 A importância dos estudos longitudinais na saúde:
estrutura, modelos, forças e limitações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 201
FRANCESCO CHIAPPELLI, XÊNIA MARIA CALDEIRA BRANT
E CAIO CALDEIRA BRANT SANDY

Parte V Apresentação de casos clínicos com controles radiográficos


21 Casos clínicos realizados com a técnica da patência
e ampliação do forame apical. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 209
FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

Glossário de termos endodônticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 215

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Introdução

Já está estabelecido, por claras convenções, que o conhecimento teórico deve decor-
rer antes da experiência prática. Esse parâmetro caracteriza a grade curricular da
formação dos profissionais nas diversas áreas da saúde. O atributo prático-clínico é o
principal requisito para a inserção dos profissionais no mercado de trabalho. A práti-
ca é a ação que transporta o conhecimento para a execução clínica. Neste momento,
contudo, cabe considerar uma discussão sobre a estrutura do ensino e a capacitação
técnica dos alunos, tanto na graduação como na pós-graduação.
Reconhece-se que os recém-formados, em geral, têm muita dificuldade para
atuar clinicamente, mesmo em condições que exijam requisitos mínimos de conhe-
cimento e domínio técnico. É válido considerar, portanto, uma revisão dos concei-
tos correntes da educação profissional. Somar bons professores nas disciplinas de
formação teórica a professores das práticas aplicadas é uma condição importante a
ser discutida. A articulação entre a teoria e a prática é essencial, e apenas verdadeiros
professores podem transmitir a dimensão do ensino ao profissionalismo. Essa trans-
ferência tem como base uma curva progressiva de aprendizado: leva tempo para for-
mar um profissional, mas aquele que atingir esse patamar estará mais seguro e capa-
citado à sua prática e às exigências das transformações científicas, sociais e culturais.1
A Endodontia, assim como a maioria das áreas de intervenção clínica, além do
sólido conhecimento dos fundamentos da biologia, necessita de uma acurada capaci-
tação técnica e muita sensibilidade para suas aplicações.
Observações de profissionais experientes sugerem que, no processo de amadu-
recimento clínico, as principais falhas iatrogênicas estão frequentemente associadas
à incapacidade do profissional em formular planejamentos devido à falta de crité-
rios na seleção dos casos clínicos. Aspectos como negligência e desatenção também
costumam ser observados. Os treinamentos clínicos devem focar nos fundamentos
dessa capacitação, oferecendo programas coerentes com cada estágio em que o pro-
fissional se encontra, sempre de acordo com o seu grau de experiência. É razoável
aceitar o raciocínio de que a análise das muitas variáveis técnicas e clínicas que en-
volvem a Endodontia (dificuldade de isolamento absoluto, pouca abertura bucal,
falta de cooperação do paciente, certas condições de saúde geral, alterações ana-
tômicas, reabsorções radiculares ou fraturas, entre outras) resulta com frequência
em casos excepcionalmente complexos. A execução dos procedimentos exige um
progressivo treinamento psicomotor e uma longa curva de aprendizado, que vão
desde a manipulação de dentes extraídos até a execução de tratamentos complexos
em pacientes.
Diante dessas considerações, pode-se ter uma ideia das dificuldades encontradas
e da demanda de tempo necessário para alcançar a qualificação de um endodontista
com alto padrão de competência. Só há um caminho: participar de um programa de
ensino que contemple métodos pedagógicos, participativos, cujo conteúdo progra-

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16 Introdução

mático englobe o aprendizado cognitivo (conhecimento) amplo e pertinente, aliado


a um treinamento prático laboratorial (em dentes extraídos) e atendimento clínico
suficientes para executar, com consciência e tranquilidade, a Endodontia.

Critérios para ensino e aprendizado em Endodontia


O professor deve:
• estar cientificamente preparado para ensinar a teoria e amplamente embasado na
literatura científica;
• ser capaz de fazer demonstrações ao vivo, em laboratório, de todas as etapas do
tratamento em dentes extraídos;
• ser capaz de fazer demonstrações clínicas em pacientes;
• selecionar os casos clínicos quanto à sua complexidade de acordo com o grau de
experiência de seus alunos e monitorar cada etapa do tratamento.
Os alunos devem:
• assistir às aulas; registrar as informações importantes; inteirar-se das técnicas, ins-
trumentos e materiais; ler e discutir a literatura;
• assistir às demonstrações laboratoriais e clínicas e repetir os exercícios;
• planejar e executar os tratamentos clínicos monitorados pelo professor;
• ser gradativamente preparados, no decorrer do curso, para a execução de casos
clínicos de maior grau de complexidade.
O aprendizado passa pelas seguintes etapas de domínio cognitivo e psicomotor:
• Domínio cognitivo – nesta primeira etapa do aprendizado, o aluno ou profissional
toma conhecimento dos problemas ou técnicas por meio de:

aulas e conferências;

demonstrações clínicas ou laboratoriais;

acompanhamento da execução de tratamentos.
• Domínio psicomotor – nesta segunda etapa, o aluno ou profissional é treinado
para executar as tarefas clínicas e deve, idealmente, passar por um curso de aper-
feiçoamento para depois seguir para um curso de especialização:

Nos cursos de aperfeiçoamento, deve seguir a sequência de aprendizado:
- treinar as técnicas em laboratórios seguindo protocolos sob monitoramento;
- realizar tratamentos clínicos mais simples sob monitoramento;
- realizar tratamentos clínicos mais simples sem monitoramento.

Nos cursos de especialização, deve seguir esta sequência:
- realizar tratamentos de maior grau de complexidade sob monitoramento;
- realizar tratamentos de maior grau de complexidade sem monitoramento.

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Introdução 17

• Etapa da reorganização – é quando o profissional, gradativamente, ganha expe-


riência clínica e adquire a capacidade de se reorganizar à medida que surgem pro-
blemas inesperados durante a execução dos tratamentos, por exemplo:

o que fazer se o paciente sente-se mal durante o tratamento?

o que fazer para estancar uma hemorragia durante uma cirurgia?

como proceder, durante tratamento endodôntico, diante da fratura de um ins-
trumento ou de perfurações acidentais e outras ocorrências?

Para um especialista em Endodontia ganhar experiência clínica é preciso praticar, ou seja,


executar tratamentos endodônticos. Uma casuística clínica entre 30 e 50 tratamentos endo-
dônticos durante o mês é adequada para um bom desenvolvimento clínico.

Considerando os diversos aspectos apresentados nos parágrafos anteriores, pode


ser interessante estimular maiores discussões no que se refere ao ensino da Endodon-
tia, bem como desenvolver programas de aprendizado que sejam coerentes e pro-
gressivos. Os profissionais precisam estar atentos à sua realidade, às suas limitações
e às suas possibilidades. O treinamento para a formação de um endodontista deve
ser feito mediante uma sequência objetiva de estudos e atividades práticas que inclui
curso de aperfeiçoamento, curso de especialização, estágios ou residência clínica com
professores ou clínicos com probidade clínica comprovada.
O modelo é simples e lógico: “só pode ensinar quem faz, e só aprende quem pratica”.

REFERÊNCIA
1. Castro, CM. O muro de arrimo do “doutorzeco”. Rev Veja. 2013;46(18);27.

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PARTE I
FUNDAMENTAÇÃO BIOLÓGICA
DOS TRATAMENTOS
ENDODÔNTICOS

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1
Etiopatogenia das alterações
pulpares e periapicais
ALEXANDRE A. ZAIA

CONSIDERAÇÕES GERAIS
Um dos problemas que o profissional da área odontológica encontra na Endodontia
é a dificuldade em fechar um correto diagnóstico das alterações pulpares e peria-
picais. Diferentemente de outras especialidades da Odontologia, na Endodontia, o
profissional não tem uma visão direta das áreas comprometidas. O fato de não poder
visualizar diretamente as alterações que ocorrem nesses tecidos dificulta o entendi-
mento dos eventos que acontecem, desde a iniciação de um processo inflamatório,
sua evolução e sua correlação com os sintomas clínicos.
Apesar dessa dificuldade, é importante entender que o problema mais comum
que ocorre na polpa e no periápice é a inflamação, que não deve ser considerada uma
doença, mas um mecanismo de defesa do tecido conjuntivo contra microrganismos
e seus subprodutos que alcançam o tecido pulpar, em geral, por um processo de cá-
rie. Essa relação entre a inflamação pulpar e bactérias está bem definida desde que
Kakehashi e colaboradores1 mostraram, em ratos germ-free (livres de bactérias), que,
mesmo depois de a polpa dental ficar exposta na cavidade bucal, não ocorre necrose
pulpar.

A polpa dental é um tecido conjuntivo vascularizado; portanto, quando bactérias e/ou sub-
produtos atingem esse tecido, inicia-se um processo inflamatório de defesa na área afetada.
A inflamação é um processo sistêmico que pode acontecer em qualquer tecido vasculariza-
do do organismo como mecanismo de defesa, independentemente da localização.

O primeiro evento do processo inflamatório é uma resposta vascular, em que


capilares da região sofrem vasodilatação e aumento da permeabilidade, permitindo
uma saída maior de líquido e células inflamatórias (glóbulos brancos) que circulam

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22 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

nos vasos sanguíneos. O volume de líquido e células que saem dos vasos está dire-
tamente associado à quantidade e aos tipos de microrganismos envolvidos. Quanto
maior a quantidade e a virulência dos agentes irritantes, maior a resposta vascular e
a saída de líquidos e células. Isso acarreta um aumento de volume da região (edema).
Na polpa dental, a resposta inflamatória tem início quando bactérias ou seus
subprodutos a atingem a partir da permeabilidade dos túbulos dentinários. O com-
portamento da polpa frente às agressões difere do comportamento de outros tecidos
conjuntivos pelo fato de estar localizada no interior de um espaço com paredes duras
que impede a distensão do tecido quando ocorre o edema, gerando um aumento da
pressão na região. Essa pressão estimula as terminações nervosas e inicia um estímu-
lo doloroso. Quando o aumento de volume ocorre de forma rápida, a sensação dolo-
rosa pode se tornar intensa e espontânea. Portanto, a dor decorrente da inflamação é
a principal queixa que acomete o tecido pulpar e periapical e que leva o paciente ao
consultório em busca de tratamento.

EVOLUÇÃO DO PROCESSO INFLAMATÓRIO PULPAR


A sequência de cortes histológicos a seguir mostra a evolução da necrose a partir da
exposição pulpar feita em dentes de ratos.2
Na Figura 1.1, pode-se observar que, na porção mais coronária, o tecido pulpar
encontra-se necrosado. Na porção inferior da área de necrose, existe uma intensa
concentração de células inflamatórias (neutrófilos) na tentativa de barrar a dissemi-
nação das bactérias e toxinas e isolar os agentes agressores. Logo abaixo, pode-se ob-
servar o tecido pulpar vital com presença de vasos sanguíneos dilatados, o que pos-
sibilita a saída das células de defesa (glóbulos brancos do sangue), que se acumulam
na área onde existe a invasão bacteriana. Na região mais apical, é possível observar
um tecido pulpar com características praticamente normais, com poucos vasos san-
guíneos. Tais achados histológicos podem ser correlacionados com as características
clínicas da pulpite irreversível, ainda sem nenhum sintoma na percussão, uma vez
que resta uma porção de polpa vital no terço apical do canal. Portanto, o tratamento
endodôntico deve ser realizado sob anestesia local.
A Figura 1.2 mostra uma intensa resposta inflamatória no ligamento periodontal
apical com a presença de vasos dilatados e reabsorção óssea. Esse quadro histológico

Área de necrose

Área com intenso infiltrado


de neutrófilos

! FIGURA 1.1
O corte histológico mostra intenso infiltrado inflama-
tório com predomínio de neutrófilos (seta). Pode-se
observar que a inflamação evoluiu no sentido apical;
no entanto, um tecido pulpar ainda vital pode ser vis-
to no terço apical.

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Endodontia passo a passo 23

é compatível com pericementite. Nesse estágio, clinicamente, o dente já apresenta


dor à percussão. O tempo para que a inflamação periapical inicial (pericementite) se
transforme em abscesso não é possível de ser determinado devido a inúmeras variá-
veis que envolvem o processo.

Área periapical com intensa


proliferação vascular

FIGURA 1.2 !
Corte histológico mostrando a inflamação no liga-
mento periodontal apical com intensa proliferação
vascular e aumento do espaço periodontal.

A Figura 1.3 mostra um grande número de células inflamatórias (neutrófilos)


concentradas na embocadura do forame para evitar a disseminação de microrganis-
mos. O aumento de pressão na área periapical deve ser o principal fator de estímulo
para essas células iniciarem a reabsorção óssea, criando um espaço para a formação
de um tecido de defesa compatível com uma lesão periapical crônica (granuloma),
cuja função é impedir a disseminação de bactérias oriundas do canal radicular. O
granuloma é a área onde bactérias são destruídas pelo sistema de defesa. Se o canal
radicular não for tratado de forma eficiente, esse tecido de granulação persistirá na
área periapical.

Área com intensa


concentração de células
inflamatórias

Aumento do espaço e
inflamação periapical

" FIGURA 1.3


Corte histológico mostrando necrose total da polpa
dental e região periapical com reação inflamatória
característica de granuloma.

O estado inflamatório periapical pode variar, a qualquer momento, de crônico


para agudo ou vice-versa, dependendo do tipo e da quantidade de bactérias que al-
cançam esse tecido. Na Figura 1.4, pode-se observar, na região periapical, um intenso
infiltrado de neutrófilos e a presença de área de destruição tecidual sugestiva de for-
mação de abscesso.

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24 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Área com intensa


proliferação de
neutrófilos e espaços
caracterís!cos de
abscesso

FIGURA 1.4 !
Corte histológico mostrando área periapical de dente
com polpa necrosada com a presença de inflamação
periapical e áreas de microabscesso.

A Figura 1.5 mostra, radiograficamente, a área radiolúcida periapical sugestiva


de granuloma. É interessante notar a inflamação do ligamento periodontal associada
ao forame apical, canal de comunicação entre o sistema de canais radiculares e o
ligamento periodontal.
Nas outras áreas do ligamento periodontal não há inflamação, como se observa
na radiografia (existe a lâmina dura). Diante desse fato, é possível concluir que, para
o sucesso do tratamento endodôntico, são fundamentais a limpeza e o selamento
do forame apical, impedindo que bactérias e seus subprodutos possam alcançar o
ligamento periodontal. A completa remissão da inflamação e a formação de novo
trabeculado ósseo caracterizam o sucesso do tratamento endodôntico.

" FIGURA 1.5


Radiografia do dente 12 com área radiolúcida peria-
pical.

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Endodontia passo a passo 25

REFERÊNCIAS
1. Kakehashi S, Stanley HR, Fitzgerald RJ. The effects of sur- 2. Teixeira, FB. Análise comparativa do desenvolvimento de
gical exposure of dental pulps in germ-free and conven- lesões periapicais em ratos normais, xerostômicos e xerostô-
tional laboratory rats. Oral Surg Oral Med Oral Pathol. micos-imunossuprimidos [dissertação]. Faculdade de Odon-
1965;30:340-9. tologia, Universidade Estadual de Campinas; 1997.

LEITURAS RECOMENDADAS
Kumar V, Abbas AK, Fausto N. Robbins & Cotran: patologia: bases Nair PN. Pathogenesis of apical periodontitis and the cause of en-
patológicas das doenças. 7. ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 1999. dodontic failures. Crit Rev Oral Biol Med. 2004;15(6):348-81.
JOE Editorial Board. Periradicular lesions not of endodontic ori- Ricucci D, Siqueira JF. Biofims and apical periodontitis: study of
gin: an online study guide. J Endod. 2008;34(5 Suppl):e205-8. prevalence and association with clinical and histopathologic
JOE Editorial Board. Immunologic reactions and endodontics: an findings. J Endod. 2010;36:1277-88.
online study guide. J Endod. 2008;34(5 Suppl):e181-6. Trowbridge HO, Stevens BH. Microbiologic and pathologic aspects
Morse DR. Immunologic aspects of pulpal-periapical diseases: a of pulpal and periapical disease. Curr Opin Dent. 1992;2:85-
rewiew. Oral Surg Oral Med Oral Pathol. 1977;43(3):436-5. 92.

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2
Microbiologia aplicada
BRENDA P. F. A. GOMES

CONSIDERAÇÕES GERAIS
Em condições normais, o esmalte dental é a principal barreira natural que impede
que os microrganismos presentes na cavidade oral afetem a dentina e ingressem na
cavidade pulpar. A cárie dental é o principal fator de contaminação do canal radi-
cular, e os túbulos dentinários são as vias de acesso de toxinas e bactérias para a
cavidade pulpar.
Em princípio, após a necrose pulpar, nas infecções primárias, todas as espécies
de microrganismos existentes na cavidade oral podem colonizar o espaço pulpar,
mas alguns fatores interferem na seleção das espécies no interior dos canais ra-
diculares. A grande maioria dessa microbiota é composta por bactérias, embora
vírus, fungos, leveduras e archaea também possam ser encontrados nos canais ra-
diculares.

Os microrganismos no canal radicular com polpa necrosada encontram um ambiente apro-


priado para sua proliferação. Alguns fatores favorecem essa proliferação: ausência de célu-
las de defesa, temperatura ideal, nutrição, teor de oxigênio e CO2.

Com o decorrer do tempo e com a mudança ambiental, ocorre um equilíbrio,


uma seleção natural e simbiose das espécies bacterianas que se adaptam ao meio com
baixo potencial de oxidorredução, pH ácido e interações positivas e negativas entre
bactérias, entre outros fatores. Nesse microssistema, comunidades bacterianas vão
sendo formadas, favorecendo o estabelecimento de microrganismos facultativos no
terço coronário e médio do canal e de microrganismos anaeróbios estritos no terço
apical.

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Endodontia passo a passo 27

LOCAL DA INFECÇÃO
Com a necrose pulpar, a população microbiana, no início, fica suspensa no lúmen
do canal radicular (forma planctônica), com uma grande variedade de cocos, bacilos
e formas filamentosas. Nessa fase inicial, o forame apical é a via de acesso para que
bactérias e suas toxinas atinjam o periápice e estimulem uma resposta inflamatória
aguda no tecido conjuntivo periapical (pericementite).
Com o decorrer do tempo, as bactérias com capacidade de aderir nas paredes
do canal formam colônias (forma séssil), em biofilmes organizados, favorecendo o
estabelecimento de microrganismos facultativos no terço coronário e médio do canal
e de anaeróbios estritos no terço apical.
O fator tempo de contaminação é fundamental para que ocorram tais mudanças.
A multiplicação bacteriana na superfície da dentina (biofilme), por meio da divisão
celular, provoca o deslocamento dos microrganismos para o interior dos túbulos den-
tinários (Figuras 2.1 e 2.2), que ocupam esse espaço, numa profundidade que varia de
acordo com sua amplitude. Nos terços cervical e médio do canal radicular, podem ser
1 1
encontradas em até 300 µm da luz do canal e, no terço apical, cerca de 40 µ.

▲ FIGURA 2.1 ▲ FIGURA 2.2


Corte histológico mostrando a presença de bactérias Fotomicrografia de varredura mostrando bactérias
no interior dos túbulos dentinários (coloração Brown no interior dos túbulos dentinários.
& Brenn).

As colônias bacterianas organizadas em biofilme ocupam todas as paredes do ca-


nal até o forame apical. Nos dentes com lesão periapical, é evidente a ocupação dessa
região pelo biofilme bacteriano, responsável pela manutenção da inflamação crônica
na região (granulomas ou cistos).
Clinicamente, não importa se a necrose é recente ou se já houve tempo para
a formação de lesão periapical. O tratamento consiste na limpeza do substrato
orgânico e do biofilme das paredes do canal, istmos e reentrâncias, na modelagem
cônica do canal, sobretudo no terço apical, e no selamento tridimensional desse
espaço.

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28 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

INFECÇÃO PRIMÁRIA E SECUNDÁRIA


Embora didaticamente as infecções endodônticas sejam divididas em primárias ou se-
cundárias, a composição da microbiota do canal radicular nessas condições depende,
basicamente, das alterações ambientais e do tempo decorrido desde o início da infecção.
A infecção primária ocorre concomitantemente à necrose do tecido pulpar e
consiste em infecções polimicrobianas dominadas por bactérias anaeróbias gram-
-negativas e gram-positivas. A maioria dos autores concorda que a carga bacteriana
e sua diversidade são maiores no grupo da infecção primária, porém são facilmente
eliminadas pela adequada instrumentação dos canais radiculares, sobremaneira nos
períodos mais curtos desde a ocorrência da necrose pulpar. A presença de lesão pe-
riapical (Figura 2.3) indica que maior período de tempo decorreu desde a necrose
pulpar e, seguramente, nessa fase, o biofilme bacteriano apresenta-se mais organiza-
do e maduro e envolve as paredes do canal incluindo o forame apical.
A infecção secundária apresenta uma microbiota característica, que difere da-
quela encontrada normalmente nas infecções primárias, tanto quantitativa como
qualitativamente. As espécies predominantes de microrganismos são gram-positivos
(estritos ou facultativos), espécies que conseguem sobreviver à insuficiência de nu-
trientes e se adaptam a condições ambientais inóspitas, características de dentes que
já passaram por um tratamento endodôntico prévio malsucedido.

! FIGURA 2.3
Radiografia periapical do dente 15 com tratamento
endodôntico incompleto e lesão periapical.

INFECÇÕES EXTRARRADICULARES AGUDAS


As infecções extrarradiculares podem ser agudas ou crônicas e são originadas a partir
de uma infecção primária ou secundária do canal radicular. A forma mais comum das
infecções extrarradiculares agudas são os abscessos apicais. As comunidades micro-
bianas presentes nesses abscessos são complexas, com predomínio de microrganismos
anaeróbios (cerca de 90% dos isolados), principalmente de bacilos gram-negativos e
cocos gram-positivos. A presença concomitante de anaeróbios facultativos favorece o
desenvolvimento de quadros clínicos mais graves, pois esses microrganismos utilizam
o oxigênio, preparando o ecossistema para a instalação dos anaeróbios estritos.
Admite-se que microrganismos com elevada capacidade de invasão e agressão
tecidual, tais como as espiroquetas do grupo Treponema, estejam frequentemente as-
sociados a abscessos apicais agudos.
Desde que o tratamento endodôntico tenha sido executado de maneira adequa-
da, a infecção extrarradicular aguda passa a ser mediada pelos mecanismos naturais
de defesa do hospedeiro, normalmente facilitada pela drenagem do abscesso.

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Endodontia passo a passo 29

INFECÇÕES EXTRARRADICULARES BIOFILME


A formação de biofilme na superfície radicular externa ocorre em condições muito
especiais, em que existe sempre uma comunicação do ápice radicular com o meio da
cavidade oral através de fístula, lesão endopério ou comunicação por dentes abertos
para drenagem por longo período de tempo, trinca ou fratura ao longo da raiz.
O biofilme periapical é composto por diferentes tipos morfológicos de micror-
ganismos, que estão aderidos ao cemento/dentina que circunda o ápice. Os micror-
ganismos estão envoltos por uma camada de polissacarídeo que funciona como um
escudo e podem atingir 50 a 100 µm em espessura (Figura 2.4). São resistentes à ação
de antibióticos (cerca de 1.500 a 8.000 vezes) e grandes o suficiente para frustrar o
sistema imunológico. Dentre as espécies associadas à formação de biofilme extrarra-
dicular estão incluídas Actinomyces spp. e Propionibacterium spp.

! FIGURA 2.4
Corte histológico mostrando bactérias (biofil-
me bacteriano) na superfície da parede do ca-
nal radicular (coloração Brown & Brenn).

Os sinais e sintomas que indicam a presença de biofilme extrarradicular são fa-


cilmente detectados, uma vez que sempre existe a associação de uma lesão periapical
(radiográfica) com uma fístula que persiste, mesmo após um tratamento endodônti-
co bem-realizado. É interessante lembrar que, imediatamente após a instrumentação
e obturação do canal radicular, a fístula costuma desaparecer, porém surge novamen-
te decorrido algum período de tempo.
Apenas um pequeno número de casos de insucesso do tratamento ou retrata-
mento endodôntico se deve à presença do biofilme instalado na superfície externa,
com necessidade de intervenção cirúrgica.

ENDOTOXINAS
Algumas bactérias, principalmente as anaeróbias gram-negativas (i.e., Prevotella spp.,
Porphyromomas spp., Fusobacterium spp.), predominantes em infecções primárias, es-
tão envolvidas na manifestação clínica dos sinais e sintomas de origem endodôntica.
As bactérias gram-negativas possuem, em sua membrana externa, os lipopolissacarí-
deos (LPSs), ou endotoxinas, que são liberados durante a divisão celular ou lise celular.
As endotoxinas estão envolvidas na destruição tecidual de forma indireta, estimulando
a liberação de mediadores químicos por parte das células de defesa do hospedeiro,
podendo causar dor pela liberação de bradicinina. Na presença de sintomas clínicos
como dor, há maior concentração de bactérias anaeróbias gram-negativas.

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30 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

As bactérias gram-positivas (i.e., Enterococcus spp., Streptococcus spp., Acti-


nomyces spp.) possuem uma exotoxina, composta pelo ácido lipoteicoico, que tem
como característica principal a aderência. Apresentam uma camada mais espessa de
peptideoglicanos, o que confere maior resistência a esses microrganismos.
Nos canais assintomáticos, predominam bactérias gram-positivas. Quando as
gram-negativas estão em sinergismo com as gram-positivas, sua virulência é aumen-
tada e, consequentemente, a manifestação dolorosa é mais intensa.
É correto concluir que não há tratamento específico para combater as diferentes
espécies de microrganismos no interior do canal radicular. O tratamento, unicamen-
te, consiste em desorganizar a estrutura do biofilme por meio da instrumentação das
paredes do canal radicular, combater os microrganismos com substâncias químicas
auxiliares, remover do interior dos canais o substrato orgânico desorganizado pela
instrumentação mediante uma irrigação ativa e, por fim, obturar tridimensional-
mente o espaço do canal radicular com cimento endodôntico.

REFERÊNCIA
1. Love RM, Jenkinson HF. Invasion of dentinal tubules by oral
bacterias. Crit Rev Oral Biol Med. 2002;13(2):171-83.

LEITURAS RECOMENDADAS
Gomes BPFA. Microrganismos, quais são, onde estão, que danos Ricucci D, Siqueira JF. Biofilms and apical periodontitis: study of
causam? In: Cardoso RJA, Gonçalves EAN, organizadores. prevalence and association with clinical and histopathologic
[Anais] do 20º Congresso Internacional de Odontologia de findings. J Endod. 2010;36:1277-88.
São Paulo, Arte, Ciência e Técnica – Endodontia e Trauma. Siqueira JF Jr, Rôças IN. Exploiting molecular methods to explore
São Paulo: Artes Médicas; 2002a. p. 77-98. v. 2. endodontic infections: part 1: current molecular technologies
Gomes BPFA, Montagner F, Martinho F. Aspectos microbiológicos for microbiological diagnosis. J Endod. 2005a;31:411-23.
das infecções endodônticas: conceitos e aplicações. In: Kriger Siqueira JF Jr, Rôças IN. Exploiting molecular methods to explore
L, Moysés SJ, Moysés ST, organizadores. Microbiologia e imu- endodontic infections: part 2: redefining the endodontic mi-
nologia geral e odontológica. São Paulo: Artes Médicas; 2013. crobiota. J Endod. 2005b;31:488-98.
(Série ABENO: Odontologia Essencial). Sousa ELR. Análise microbiológica de canais radiculares asso-
Gomes BPFA, Pinheiro ET, Gadê-Neto CR, Sousa EL, Ferraz CC, ciados a abscessos periapicais e a suscetibilidade de bacté-
Zaia AA, et al. Microbiological examination of infected dental rias anaeróbias prevalentes frente a diversos antibióticos
root canals. Oral Microbiol Immunol. 2004;19:71-6. [tese]. Piracicaba: Faculdade de Odontologia de Piracicaba;
Marinho ACS, Martinho FC, Zaia AA, Ferraz CC, Gomes BP. 2003.
Influence of the apical enlargement size on the endoto- Vianna ME. Microbiologia e tratamento das infecções endodôn-
xin level reduction of dental root canals. J Appl Oral Sci. ticas [tese]. Piracicaba: Faculdade de Odontologia de Piraci-
2012;20(6):661-6. caba; 2006.
Pinheiro ET, Gomes BP, Ferraz CC, Sousa EL, Teixeira FB, Souza
Filho FJ. Microrganisms from canals of root-filled teeth with
periapical lesions. Int Endod J. 2003;36(4):267-75.

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3
Reparação apical e periapical
OSLEI PAES DE ALMEIDA

CONSIDERAÇÕES GERAIS
A reparação é o restabelecimento da normalidade de uma área tecidual destruída,
podendo ser semelhante à arquitetura original (regeneração) ou o simples preenchi-
mento por tecido fibroso (cicatrização). No seu sentido mais estrito, a regeneração
ocorre no ser humano apenas nas primeiras seis semanas de vida fetal, mas é aceito
que a regeneração também ocorra no período pós-natal e que dependa de fatores
locais como extensão da lesão e tecido envolvido. Talvez seja mais simples conside-
rar que, na maioria das vezes, a reparação envolva, simultaneamente, fenômenos de
regeneração e de cicatrização em proporções variáveis, e um dos dois termos é usado
quando há evidente predomínio de um desses processos.
O termo reparação parece ser mais adequado para tecido ósseo, polpa, periodon-
to e periápice. Para compreender melhor tal nomenclatura, deve-se recordar que os
principais conceitos de inflamação e reparação foram estabelecidos a partir de feridas
da pele e, posteriormente, extrapolados para outros órgãos – portanto, nem sempre
se aplicam perfeitamente.
Em tecidos formados por células com alta capacidade proliferativa (células lá-
beis), como epitélio de pele e mucosas, ou com boa capacidade de renovação celular
(células estáveis), como o fígado, a substituição das células lesadas ocorre sobretudo
por regeneração. Entretanto, mesmo nesses tecidos, se a destruição é contínua e ex-
tensa, a reorganização tecidual torna-se mais difícil, havendo preenchimento da área
por material fibroso, essencialmente colágeno, caracterizando a cicatrização. No fíga-
do, essa substituição por tecido fibroso é chamada de cirrose, comum em alcoólatras
ou portadores de hepatites B ou C crônicas. Por outro lado, nos tecidos sem capaci-
dade de substituição das células originais por novas (células permanentes), como as
fibras cardíacas ou os neurônios, a reparação é sempre feita por cicatrização.

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32 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

A cicatrização implica perda de função da área, como ocorre no coração, no cé-


rebro ou mesmo na pele, com a destruição de folículos pilosos, terminações nervosas
e glândulas sebáceas e sudoríparas. A cicatrização pode ser considerada um processo
mais simples que a regeneração, levando, às vezes, a sequelas indesejáveis. Há evidên-
cias de que essa formação rápida de tecido fibroso pode dificultar ou impedir a rege-
neração, que, biologicamente, é a maneira mais adequada de restaurar a arquitetura e
a função de uma área destruída. De modo geral, quanto menos intensa a inflamação e
a destruição tecidual, maiores as possibilidades de ocorrer regeneração, e vice-versa.
Como a inflamação, a reparação é um processo complexo, envolvendo células
que sofrem modificações genéticas e fenotípicas, com ativação de mecanismos in-
tra e intercelulares, que precisam funcionar de forma organizada para restabelecer a
função da área alterada. Quanto maior o conhecimento das interações célula-célula,
célula-matriz extracelular, da apoptose e da participação de moléculas como citoci-
nas e fatores de crescimento, maiores as possibilidades de regeneração/cicatrização.

INFLAMAÇÃO E REPARAÇÃO
Para exemplificar, resumidamente, a sequência de eventos da inflamação e reparação,
considere-se uma lesão causada por bactérias que penetraram no tecido conjunti-
vo da pele. Por meio da inflamação, o organismo procura primeiramente eliminar
o agente agressor. No começo, há aumento de permeabilidade vascular de peque-
nos vasos, mediada por substâncias vasoativas, sobretudo histamina, liberada por
mastócitos. O edema da área é resultado da saída de plasma e, posteriormente, de
leucócitos, predominando no início os neutrófilos, que vão fagocitar as bactérias. A
interação entre os elementos agressores e de defesa do organismo causa destruição
tecidual. Com a eliminação das bactérias, o tecido necrosado que restou precisa ser
também removido, e isso é feito principalmente pelos macrófagos. Dependendo da
extensão da lesão, pode ocorrer regeneração da área ou, mais provavelmente, predo-
mínio da cicatrização.
Na cicatrização, dependendo da extensão da área lesada, há maior ou menor pro-
liferação de novos vasos e também de fibroblastos, que, paulatinamente, vão substi-
tuindo as células inflamatórias e o tecido necrótico. Os fibroblastos começam a for-
mar matriz amorfa e fibrilas de colágeno que, de maneira gradativa, substituem os
vasos e fibroblastos, eliminados por apoptose. O tecido de transição entre a resposta
inflamatória e a cicatrização é chamado de tecido de granulação. Esse termo vem
de “grânulo”, visto que os vasos neoformados na pele ficam dispostos perpendicu-
larmente à superfície e, macroscopicamente, as alças formadas dos pequenos vasos
na região mais superficial assemelham-se a pequenos grãos avermelhados devido à
presença das hemácias do sangue. O termo “tecido de granulação” não deve ser con-
fundido com tecido ou reação granulomatosa, que se caracteriza pela presença de
granuloma nas inflamações crônicas.

A reparação na forma de cicatrização ou regeneração vai ocorrer quando o agente agres-


sor – bactérias ou tecido necrosado – é eliminado e a inflamação não é mais necessária. Se
o agente agressor não for eliminado, a inflamação, como mecanismo de defesa, persiste e
passa a ser chamada de crônica.

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Endodontia passo a passo 33

Como sabido, a inflamação aguda caracteriza-se, clinicamente, por edema e dor


e, histologicamente, por permeabilidade vascular e presença de neutrófilos. A crô-
nica, como o próprio nome diz, é de duração mais longa, menor sintoma clínico
e acúmulo de células mononucleares, como linfócitos, plasmócitos e macrófagos,
além de apresentar fenômenos proliferativos por meio dos fibroblastos. A maioria
das inflamações crônicas tem a participação dos fenômenos imunológicos, visto que
os agentes agressores, em geral, têm propriedades antigênicas. Na dependência do
agente agressor e de corpos estranhos, como partículas de sílica e fio de algodão, a
inflamação crônica se caracterizará pela formação de granulomas, cuja célula central
predominante é o macrófago e seus derivados, como as células gigantes multinuclea-
das. Portanto, a reação granulomatosa é bem distinta do tecido de granulação.
Por outro lado, o termo granuloma – usado para as lesões periapicais – não tem
o mesmo significado descrito antes para as inflamações granulomatosas. É uma in-
flamação crônica causada por bactérias presentes no canal radicular, com partici-
pação de fenômenos imunológicos, mas que, histologicamente, não tem formação
de granulomas. É mais uma vez uma extrapolação do significado original, visto que
também é uma inflamação crônica e, macroscopicamente ou mesmo radiografica-
mente, a lesão assemelha-se a um grânulo em torno do periápice, mas do ponto de
vista histopatológico corresponde a uma inflamação crônica inespecífica e não gra-
nulomatosa que, às vezes, é também chamada de específica, quando há possibilidade
de determinar o agente causal. Como ocorre no processo inflamatório de modo geral,
numa inflamação crônica a normalidade também será restabelecida apenas após a
eliminação do agente agressor e a reparação da área.

REPARAÇÃO DO PERIÁPICE
Considere-se agora alguns pontos da reparação do periápice, que basicamente se-
guem os princípios antes descritos. Os termos “regeneração” ou “cicatrização” não
são usados para o periápice por não representarem claramente um ou outro processo,
embora a função da área costume ser restabelecida. Além disso, há participação de
neoformação do tecido ósseo adjacente e, para osso, o termo mais aceito é simples-
mente reparação. O tecido ósseo tem boa capacidade de reparação, visto que também
é um tipo de tecido conjuntivo, porém calcificado.
Na doença periodontal, por exemplo, a perda óssea pode ser irreversível, mas
isso ocorre quando a destruição do osso alveolar é mais extensa, e talvez mais im-
portante quando envolve extremidade, semelhante à perda da ponta de um dedo. No
periápice, com a eliminação do agente agressor, no caso bactérias do canal radicular,
a inflamação diminui de modo gradativo, sendo substituída por fenômenos de reor-
ganização com formação de tecido de granulação, neoformação óssea e do ligamento
periodontal do periápice. A persistência da inflamação indica, muito provavelmente,
que bactérias ativas ainda estão presentes, mesmo quando o canal aparentemente está
bem obturado.
O ponto fundamental é a eliminação das bactérias e o preenchimento do espaço
do canal radicular por material que não seja lesivo aos tecidos vivos do periápice. É
razoável considerar que, mesmo após o tratamento adequado do canal, não se con-
siga a completa eliminação de bactérias, mas isso não costuma impedir a reparação
apical porque provavelmente a quantidade e a virulência das bactérias remanescentes

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34 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

são insuficientes para manter evidente resposta inflamatória e destruição tecidual.


De fato, se a inflamação for mínima, os aspectos radiográficos são compatíveis com
normalidade.
Antigamente, considerava-se que apenas os granulomas apicais regrediam após a
eliminação das bactérias, mas sabe-se que isso ocorre também com os cistos. Nos ca-
sos em que a lesão periapical persiste, a principal causa, como já citado, é a presença
de bactérias. Eventualmente, há a possibilidade de cistos grandes, bem-organizados,
com extensa área de destruição óssea não regredirem mesmo eliminando-se as bac-
térias e após cessada a inflamação.
É interessante que cistos de modo geral, no organismo humano, incluindo os da
boca, como os queratocistos e os cistos odontogênicos glandulares, cuja formação
não foi estimulada por fenômenos inflamatórios, não regridem espontaneamente;
pelo contrário, tendem a continuar crescendo, e o tratamento é cirúrgico. Também
há os cistos residuais, que podem persistir mesmo após a extração do dente e a con-
sequente eliminação das bactérias, com tendência a crescerem, precisando ser remo-
vidos cirurgicamente. Também, em raros casos, uma imagem radiolúcida persistente
na região periapical após o tratamento de canal pode ser compatível com uma ver-
dadeira área de cicatrização. Nesses casos, a neoformação óssea pode não ter sido
completa e parte da área é preenchida por tecido fibroso cicatricial, mantendo-se
uma área radiolúcida próxima ao periápice. Tal processo pode ser comparado ao de-
feito osteoporótico da mandíbula, quando, em vez de um trabeculado ósseo normal
compacto, há presença de grande quantidade de medula óssea pela não formação
adequada das trabéculas durante a reparação do alvéolo após extração dentária ou
outras intervenções cirúrgicas.
Ainda com relação às áreas radiolúcidas periapicais, devem ser consideradas ou-
tras patologias de origem não endodôntica, como displasia óssea focal e periapical,
lesão central de célula gigante e, mais raramente, metástases.
Em resumo, os princípios da reparação periapical e dos fenômenos inflamató-
rios envolvidos não diferem de outros tecidos do organismo, tendo obviamente suas
particularidades anatômicas. Fatores locais são importantes para determinar a ar-
quitetura final da reparação apical, como nos casos de apicectomia ou apicificação
em raízes incompletamente formadas. Na Odontologia, uma comparação didática
interessante pode ser feita entre os processos inflamatórios e de reparo do periápice e
do periodonto. As duas doenças são crônicas, causadas sobretudo por bactérias não
granulomatosas e com envolvimento ósseo, com uma diferença básica: a anatomia
das duas regiões.

REAÇÃO A CORPO ESTRANHO


O termo “reação a corpo estranho”, no sentido mais amplo, inclui o fundamento da
inflamação, aceitar o que é próprio (self) do organismo e reconhecer e rejeitar/elimi-
nar o que não faz parte dele, sejam elementos macroscópicos, microscópicos ou mo-
leculares. Quase todas as inflamações, exceto na sua fase de reconstrução/reparação,
são exemplos de reações contra substâncias/corpos estranhos. As características da
resposta inflamatória, como células envolvidas e intensidade, vão depender da quan-
tidade e da qualidade do agente agressor, do seu reconhecimento como non-self e da
necessidade de sua eliminação.

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Endodontia passo a passo 35

O elemento estranho pode ser de baixa agressividade, praticamente inerte, a


ponto de não ocasionar lesões teciduais e como consequência, não estimular uma
reação inflamatória de importância clínica. Não é raro optar por não retirar um pro-
jétil de arma de fogo alojado no crânio por estar em lugar de difícil acesso cirúrgico e
não ocasionar problemas clínicos. Como o material é praticamente inerte em termos
de agressividade tecidual e da capacidade de estimular uma reação inflamatória, o or-
ganismo simplesmente o isola por meio de uma cápsula fibrosa de espessura variável
e, assim, pode lá permanecer por toda a vida do indivíduo.
Bons exemplos dessa interação com o organismo são os materiais usados na me-
dicina estética, principalmente em mama, face e glúteos. A eventual reação inflama-
tória a esses corpos estranhos vai depender da sua qualidade e da boa aceitação pelo
organismo, ou seja, que eles não sejam agressivos e/ou não sejam reconhecidos como
estranhos. Os implantes dentários utilizados na Odontologia também são um bom
exemplo de corpo estranho em contato com o organismo. A osteointegração, basica-
mente, significa que o material do implante (titânio) não é agressivo ao organismo,
não é reconhecido como estranho, não estimula uma reação inflamatória e tem boa
capacidade de interação com os tecidos da região onde foi colocado.
O tratamento endodôntico tem como objetivo limpar e modelar o canal radicu-
lar, procedimentos esses que eliminam as bactérias e facilitam a sua obturação, em
geral realizada com guta-percha e cimentos. Como o objetivo maior é a eliminação
das bactérias e a manutenção do canal livre de contaminação, deve-se também con-
siderar que os materiais obturadores sejam biocompatíveis e não irritem o periápice,
evitando-se, assim, uma resposta inflamatória a substâncias liberadas ou em contato
direto com o conjuntivo periapical.
Está bem estabelecido que os materiais obturadores têm propriedades variáveis
quanto à sua agressividade ao tecido conjuntivo, e muitos são os estudos de biocom-
patibilidade.2 Estudos comparativos entre cimentos endodônticos mostraram que a
reação inflamatória foi mais evidente quando houve extravasamento do material para
o periápice.2 Entretanto, como os materiais usados atualmente têm boa compatibili-
dade tecidual e em grande parte são reabsorvíveis, o ponto fundamental para o su-
cesso do tratamento continua sendo a eliminação das bactérias. Com o uso de técnica
adequada e uma obturação bem-feita, os materiais obturadores não interferirão de
forma significativa no restabelecimento da normalidade morfológica e funcional do
periápice.
Sempre é desejável a ausência de substâncias estranhas no organismo e aqui se
inclui o periápice, mas isso não significa que partículas de material obturador no
periápice devam necessariamente ser removidas. Pode-se optar por uma obturação
que mantenha o material obturador intracanal ou que envolva extravasamento para o
periápice. Outra vez, o mais importante é que o canal radicular esteja bem obturado
e que as bactérias tenham sido eliminadas.
O amálgama é utilizado para ilustrar alguns pontos, embora ele seja usado ape-
nas em algumas intervenções endodônticas. É relativamente comum a mucosa bu-
cal estar impregnada por partículas de amálgama – o que se chama de “tatuagem
por amálgama”. Se o diagnóstico clínico for correto e o paciente preferir, não há ne-
cessidade de remoção cirúrgica, pois não lhe causará nenhuma situação clínica im-
portante. O paciente apenas continuará a ter uma pequena mancha escura na boca,

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36 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

que mesmo esteticamente, na maioria das vezes, não é relevante. Se a tatuagem por
amálgama for removida e examinada microscopicamente, os aspectos serão variados,
dependendo da quantidade, do tamanho e da qualidade das partículas de amálgama.
Na maioria das vezes, são vistas apenas pequenas partículas impregnando fibrilas de
colágeno, associadas a mínimas quantidades de células inflamatórias.
No outro extremo, em poucos casos, quando as partículas de amálgama são
grandes e irregulares, pode-se observar uma reação inflamatória a corpo estranho,
com presença de alguns macrófagos multinucleados. Mesmo nesses casos, se o mate-
rial não for removido cirurgicamente, não haverá consequências clínicas importan-
tes. Situação similar ocorre com a eventual presença de partículas de amálgama no
periápice, ou seja, materiais obturadores com melhor compatibilidade que o amálga-
ma e que são reabsorvíveis pelo organismo não causam interferências importantes no
restabelecimento da morfologia e fisiologia periapical.

REFERÊNCIAS
1. Gomes Filho JE, Gomes BP, Zaia AA, Ferraz CC, Souza Filho 2. Bernath M, Szabó J. Tissue reaction initiated by different sea-
FJ. Evaluation of the biocompatibility of root canal sealers using lers. Int Endod J. 2003;36:256-61.
subcutaneous implants. J Appl Oral Sci. 2007;15(3):186-94.

LEITURAS RECOMENDADAS
Consolaro A. Inflamação e reparação. Maringá: Maringá Dental Nair PNR. Apical periodontitis: a dynamic encounter between
Press; 2009. root canal infection and host response. Periodontol 2000.
Grzesilk WJ, Narayanan AS. Cementum and periodontal 1997;13:121-48.
wound healing and regeneration. Crit Rev Oral Biol Med. Nair PNR. Pathogenesis of apical periodontitis and the causes of
2002;13:474-84. endodontic failures. Crit Rev Oral Biol Med. 2004;15:348-81.
Lin LM, Ricucci D, Lin J, Rosenberg PA. Nonsurgical root canal Ricucci D, Lin LM, Spanberg L. Wound healing of apical tissues af-
therapy of large cyst-like inflammatory periapical lesions and ter root canal therapy: a long-term clinical, radiographic, and
inflammatory apical cysts. J Endond. 2009;35:607-15. histopathologic observation study. Oral Surg Oral Med Oral
Majno G, Joris I. Cells, tissues and disease: principles of general Pathol Oral Radiol Endod. 2009;108:609-21.
pathology. Hoboken: Blackwell Science; 1996.

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PARTE II
FUNDAMENTAÇÃO DOS
PROCEDIMENTOS CLÍNICOS

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4
Anamnese
EDUARDO DIAS DE ANDRADE

CONSIDERAÇÕES GERAIS
A anamnese (do grego ana = trazer de novo e mnesis = memória) é um pré-requisito
básico da consulta inicial por parte do endodontista. É quando são obtidas informa-
ções úteis que servirão não somente para o diagnóstico, mas também para se estabe-
lecer o perfil geral de saúde do paciente.
Quando houver relato de alguma intercorrência desagradável, ocorrida em trata-
mentos odontológicos anteriores, o problema deve ser cuidadosamente investigado.
Da mesma forma, indivíduos portadores de doenças sistêmicas devem ser questiona-
dos sobre o controle atual da doença e complicações recentes, como abordado mais
adiante neste mesmo capítulo. Na maioria das vezes, tais sujeitos utilizam medica-
mentos de uso contínuo, alguns deles com potencial de interagir com outros fárma-
cos comumente empregados na clínica odontológica, o que pode provocar reações
indesejáveis.1
Na anamnese também se identificam pacientes com história de alergia a mate-
riais ou substâncias com potencial alergênico, empregadas rotineiramente em Endo-
dontia (p. ex., látex, amido de milho modificado, hipoclorito de sódio, etc.), evitan-
do-se a exposição a esses agentes.2,3

O processo de anamnese, aliado ao exame físico extrabucal e à avaliação dos sinais vitais4
(pulso, pressão arterial sanguínea, frequência respiratória e temperatura), pode ser con-
cluído com a classificação do paciente de acordo com seu estado físico ou categorias de
risco médico.

Para isso, a American Society of Anesthesiologists emprega, já há algum tempo,


um sistema de classificação de pacientes com base no estado físico, no qual são distri-
buídos em seis categorias, denominadas de ASA I a ASA VI.5

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40 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Em 2008 foi proposta uma adaptação desse sistema ASA para a prática perio-
dontal, não com o objetivo de refletir a natureza de um procedimento cirúrgico ou
mesmo de avaliar o risco operatório. No entanto, os proponentes acreditam que esse
sistema pode mostrar se existe maior ou menor risco médico de um paciente em
função da anestesia local e da extensão do trauma cirúrgico.4 Tal classificação tal-
vez possa ser extrapolada para a Endodontia e outras especialidades da Odontologia,
principalmente nos casos em que o paciente apresenta um problema ou doença de
forma isolada (Quadro 4.1).
Na presença de múltiplas alterações sistêmicas, o cirurgião-dentista deve avaliar
o significado e o peso de cada uma para então enquadrar o paciente na categoria
ASA apropriada.5 Quando for incapaz de determinar o risco clínico de uma ou mais
doenças ou complicações, é recomendável entrar em contato com o médico que tra-
ta do paciente para uma simples troca de informações e discussão sobre possíveis
recomendações adicionais para o atendimento odontológico. Entretanto, a decisão
final de iniciar o tratamento odontológico ou postergá-lo é de responsabilidade do
cirurgião-dentista, pois é quem irá realizar o procedimento.6

Quadro 4.1 Classificação dos pacientes em função do estado físico, com as devidas adaptações para a clínica
odontológica
Categoria Descrição do perfil
ASA I Pacientes saudáveis que, de acordo com a história médica, não apresentam nenhuma anormalidade.
Mostram pouca ou nenhuma ansiedade, sendo capazes de tolerar muito bem o estresse ao tratamento
dental, com risco mínimo de complicações (desta categoria são excluídos pacientes muitos jovens ou muito
idosos).
ASA II Pacientes portadores de doença sistêmica moderada ou que apresentam menor tolerância que os pa-
cientes ASA I. São enquadrados nesta categoria:
• Pacientes extremamente ansiosos, com história de episódios de mal-estar ou desmaio (síncope) na clíni-
ca odontológica.
• Gestantes.
• Portadores de hipertensão arterial controlada com medicação.
• Diabéticos tipo II, controlados com dieta ou medicamentos.
• Portadores de distúrbios convulsivos, bem-controlados.
• Asmáticos, que ocasionalmente usam broncodilatador em aerossol.
• Pacientes com angina estável, assintomática, exceto em extremas condições de estresse.
• Pacientes com história de infarto do miocárdio, ocorrido há mais de seis meses, sem apresentar sinto-
mas.
Tais pacientes podem exigir certas modificações no plano de tratamento, de acordo com cada caso particu-
lar (p. ex., troca de informações com o médico, menor duração das sessões de atendimento, posicionamen-
to na cadeira odontológica, protocolo de sedação, etc.). Apesar da necessidade de certas precauções, os
pacientes ASA II apresentam risco mínimo para complicações durante o atendimento.
ASA III Pacientes portadores de doença sistêmica grave, com limitação de suas atividades. Antes de iniciar o
tratamento, é imprescindível a troca de informações com o médico que trata desses pacientes. Os procedi-
mentos eletivos não estão contraindicados, embora tais pacientes representem um maior risco durante o
atendimento. São exemplos de ASA III:
• Diabéticos tipo I (insulino-dependentes), com a doença controlada.
• Portadores de hipertensão arterial na faixa de 160 a 194 e 95 a 99 mmHg.
• Pacientes com história de episódios frequentes de angina de peito, com sintomas após exercícios leves.
• Portadores de insuficiência cardíaca congestiva, com edema de tornozelos.
• Pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica (p. ex., enfisema).
• Pacientes com episódios frequentes de convulsão ou crise asmática.
• Pacientes sob quimioterapia.
continua...

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Endodontia passo a passo 41

Quadro 4.1 Classificação dos pacientes em função do estado físico, com as devidas adaptações para a clínica
odontológica (Continuação)
Categoria Descrição do perfil
• Hemofílicos.
• Pacientes com história de infarto do miocárdio, ocorrido há mais de seis meses, mas ainda com sintomas
(p. ex., angina ou falta de ar).
ASA IV* Pacientes acometidos de doença sistêmica grave, que estão sob constante risco de morte, ou seja, apre-
sentam problemas médicos de grande importância para o planejamento do tratamento odontológico.
Quando possível, os procedimentos dentais eletivos devem ser postergados até que a condição médica
dos pacientes permita enquadrá-los na categoria ASA III. As urgências odontológicas, como dor e infecção,
devem ser tratadas da maneira mais conservadora que a situação permita. Quando houver indicação ine-
quívoca de uma exodontia ou pulpectomia, a intervenção deve ser efetuada em ambiente hospitalar, que
dispõe de unidade de emergência e supervisão médica adequada.
*São enquadrados na categoria ASA IV: pacientes com dor no peito ou falta de ar, quando estão sentados, sem atividade; incapa-
zes de andar ou subir escadas ou que acordam durante a noite com dor no peito ou falta de ar; história de infarto do miocárdio ou
acidente vascular encefálico, no período dos últimos seis meses, com pressão arterial maior que 200/100 mmHg; pacientes que
necessitam da administração suplementar de oxigênio de forma contínua.
Apenas a título de curiosidade, na categoria ASA V são classificados os pacientes em fase terminal, cuja expectativa de vida não
é maior do que 24 horas. Procedimentos odontológicos eletivos estão contraindicados e as urgências podem receber tratamento
paliativo, como no caso de dor.
Por fim, segundo a American Society of Anesthesiologists, na categoria ASA VI são enquadrados os pacientes com morte cerebral
declarada, cujos órgãos serão removidos com propósito de doação.
5
Modificado de Maloney & Weinberg.

ANAMNESE DIRIGIDA
Na consulta inicial, quando o paciente relata alguma doença de ordem sistêmica, a
anamnese deve ser dirigida ao problema, por meio de ao menos quatro perguntas
básicas.7

1. Como está o controle atual da sua doença?


Por meio dessa pergunta se obtêm informações sobre a adesão do paciente ao trata-
mento, mostrando se tem obedecido às recomendações médicas e comparecido regu-
larmente às consultas de retorno.

2. Você faz uso diário de algum medicamento?


O objetivo dessa questão é saber se o paciente faz uso de medicação de forma con-
tínua e especificar quais são esses medicamentos, para se evitar interações adversas
com fármacos empregados na clínica odontológica.
Como exemplo, o propranolol (empregado no controle da pressão arterial san-
guínea) pode interagir com a epinefrina (contida nas soluções anestésicas), podendo
causar um aumento brusco da pressão arterial em caso de superdosagem da solução
anestésica. Da mesma forma, deve-se evitar a prescrição de paracetamol e de alguns
anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) para pacientes fazendo uso contínuo de
varfarina, anticoagulante empregado na prevenção de fenômenos tromboembólicos,
pelo risco de aumentar a atividade da varfarina e predispor à hemorragia.

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42 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

3. Você passou por alguma complicação recente?


Talvez essa seja a mais importante das quatro perguntas. Na anamnese de um pa-
ciente que relata história de distúrbios convulsivos, é preciso saber quando ocorreu a
última crise, pois um episódio recente de convulsão pode indicar falta de controle da
doença. Num outro exemplo, pacientes acometidos de infarto do miocárdio devem
ser investigados quanto à ocorrência recente ou repetitiva de dores no peito, que po-
dem caracterizar uma nova obstrução das artérias coronárias.

4. Você tomou sua medicação hoje?


Não é raro um paciente hipertenso ou diabético deixar de tomar sua medicação res-
pectiva para o controle da pressão arterial ou da glicemia por ocasião das consultas
odontológicas. Portanto, tal pergunta deve ser considerada em toda sessão de atendi-
mento e não somente por ocasião da consulta inicial.

REFERÊNCIAS
1. Jolly DE. Evaluation of the medical history. Anesth Prog. 5. Maloney WJ, Weinberg MA. Implementation of the Ame-
1995;42:84-9. rican Society of Anesthesiologists Physical status clas-
2. Andrade ED, Ranali J, Volpato MC, Oliveira MM. Allergic reac- sification system in periodontal practice. J Periodontol.
tion after rubber dam placement. J Endod. 2000; 26(3):182-3. 2008;79(7):1124-6.
3. Hamann CP, Rodgers PA, Sullivan K. Management of den- 6. Andrade ED, Ranali J. Emergências médicas em odontologia.
tal patients with allergies to natural rubber latex. Gen Dent. 3. ed. São Paulo: Artes Médicas; 2011. p. 29-30.
2002;50(6):526-36. 7. Andrade ED. Terapêutica medicamentosa em odontologia. 3.
4. Mc Carthyy FM. Vital signs: the six-minute warnings. J Am ed. São Paulo: Artes Médicas; 2014. p. 3-9.
Dent Assoc. 1980;100(5):682-91.

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5
Diagnóstico em endodontia
LUIZ VALDRIGHI E FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

CONSIDERAÇÕES GERAIS
O assunto diagnóstico é vasto, por vezes um verdadeiro desafio, pois o domínio de
suas variáveis requer do profissional enorme dedicação. Qualquer procedimento clí-
nico, por mais simples que seja, deve ser fundamentado por critérios amplamente
amparados pelo conhecimento científico. Este capítulo descreve, de forma breve, um
protocolo de diagnóstico, direcionado especificamente à Endodontia e suas reper-
cussões clínicas. Os procedimentos semiológicos e o exame clínico são concentrados
objetivamente no dente, basicamente pela avaliação do histórico e pela aplicação dos
testes de estimulação e respostas. Embora excluídas deste capítulo, vale destacar a im-
portância da avaliação integral do sistema mastigatório, bem como a investigação de
condições sistêmicas primárias. A identificação de alguma dessas condições implica
a tomada dos cuidados pertinentes. Se necessário, o paciente deve obter a devida
autorização médica previamente aos procedimentos odontológicos.

DIAGNÓSTICO DENTAL
Para o diagnóstico dental de interesse aos tratamentos endodônticos, é imprescindí-
vel adotar uma abordagem sistemática e empregar métodos semiológicos direciona-
dos à avaliação das condições periodontais, pulpares, periapicais e do próprio dente.
O clínico, idealmente sustentado por uma visão integrada da restauração dentária
posterior ao tratamento do canal radicular, deve projetar o valor estratégico do den-
te, considerar riscos e benefícios em sua manutenção e decidir pela alternativa mais
apropriada para cada caso. Esse processo é realizado pelos seguintes meios:
• História da dor (anamnese)
• Exame clínico
• Exames radiográficos

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44 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

HISTÓRIA DA DOR
A história da dor caracteriza um dos aspectos mais importantes da formatação do
diagnóstico. A empatia do profissional, a condução de uma entrevista bem-elaborada
e a atenção em ouvir as respostas do paciente são passos fundamentais do processo
inicial da anamnese.

O direcionamento da entrevista parte sempre da mais objetiva das perguntas: o relato da


queixa principal ou a principal motivação da procura da atenção profissional.

Na Endodontia, os pacientes, em geral, apresentam a dor como a principal razão


para a consulta.
Dessa forma, uma abordagem clínica utiliza perguntas básicas e tem por obje-
tivo incluir ou excluir as dores de origem dental. Pode-se confundir principalmente
as pulpites com outras dores faciais, como neuralgias e algumas cefaleias primárias.
As odontalgias seguem um curso inflamatório, podendo ser latejantes, em pon-
tadas ou em choque, provocadas ou espontâneas, têm um quadro progressivo e em
sua maioria absoluta são de natureza aguda. A dor da neuralgia idiopática do trigê-
meo é em choque, paroxística, de curtíssima duração e normalmente provocada por
toque em uma zona-gatilho que pode ser na pele, na mucosa e até no próprio dente.
Como a dor é, principalmente, subjetiva, o diagnóstico depende da capacidade
do cirurgião-dentista de interpretar a descrição feita pelo paciente e suas reações me-
diante a aplicação de testes.
As questões básicas mais importantes são:
• Está com dor no momento?

A resposta positiva caracteriza a necessidade de atendimento de urgência.
• Consegue descrever o tipo de dor?

Dor provocada
- Quando provocada por estímulo térmico (gelo, jato de ar, doce), indica que
a origem é pulpar.
- Quando provocada por percussão com a ponta dos dedos ou cabo do espe-
lho, indica que a origem é periapical ou periodontal.
- Quando provocada pela palpação no fundo de sulco, indica a presença de
abscesso.

Dor espontânea
- A dor espontânea, contínua ou ocasional, não associada à dor pela percussão,
indica alteração pulpar irreversível (pulpite irreversível).
- A dor espontânea contínua moderada associada à dor intensa pela percussão
indica pericementite (em geral associada à necrose pulpar).
- A dor espontânea contínua e severa associada à dor intensa pela percussão
indica presença de abscesso (necrose pulpar).

Consegue identificar o local da dor?

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Endodontia passo a passo 45


Dor localizada: o paciente consegue indicar o local da dor – no dente ou na
mucosa (fundo de sulco).

Dor difusa ou irradiada: se a dor é difusa ou irradiada, é necessário investigar
sua origem:
- A dor espontânea difusa com sensação de peso nos seios da face e dores de
cabeça na região frontal sugerem sinusite.
- A dor espontânea irradiada com sensação de choques ou queimação na face
sugere problemas associados com neuralgia ou herpes-zóster.
- A dor pode ser de origem dental (pulpite irreversível), ainda não localizada,
exigindo sua confirmação por meio de testes e exames radiográficos.
- A anestesia local é extremamente útil para o alívio da dor e serve como teste
terapêutico para identificar a fonte.
• Está tomando algum medicamento para o problema atual?

Analgésico
- Quem prescreveu?
- Há quanto tempo está tomando?
- O analgésico consegue controlar a dor?
- Avaliar a necessidade de suspender, alterar ou continuar a medicação.

Antibiótico
- Quem prescreveu?
- Há quanto tempo está tomando?
- Avaliar a necessidade de suspender, alterar ou continuar a medicação.

Outros medicamentos
• Já passou por algum tipo de atendimento?

Verificar qual foi o procedimento realizado e se o problema foi resolvido par-
cialmente.

Verificar se houve, no procedimento realizado, algum tipo de iatrogenia (p. ex.,
perfurações, fratura de instrumento, entre outros).
• Tem algum problema de saúde?

Fazer a anamnese para saber do estado geral de saúde do paciente e a necessida-
de ou não de interagir com seu médico.
• Está tomando algum medicamento para problemas sistêmicos?

Verificar se os medicamentos utilizados pelo paciente podem interagir com ou-
tros a serem usados para o problema atual.

Os antibióticos não devem ser utilizados indiscriminadamente. Os antibióticos no trata-


mento de abscessos de origem dental só devem ser usados para dar suporte e proteção sistê-
mica em conjunto com o tratamento cirúrgico, que é a drenagem do abscesso. O antibiótico
não substitui a drenagem cirúrgica.

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46 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

EXAME CLÍNICO
O exame clínico, considerado um dos momentos mais determinantes de todo o pro-
cesso diagnóstico, exige dos profissionais uma significativa atenção no sentido de
realizar um cuidadoso sequenciamento dos procedimentos e uma interpretação se-
gura dos sinais e sintomas. A experiência se adquire com o número de casos atendi-
dos no decorrer do tempo.

Diagnóstico pulpar
Historicamente, uma série de testes foi preconizada para identificar a vitalidade ou
não dos dentes, entre os quais podem ser citados os testes elétricos, de cavidade e até
da anestesia. Contudo, com o passar do tempo, os testes que sobreviveram foram os
térmicos (calor e frio) aplicados na superfície vestibular dos dentes, sem o contato
com a gengiva, ressaltando que, entre eles, o teste pelo frio (Figuras 5.1 e 5.2) tem
merecido a preferência, por conta de sua praticidade (gelo ou spray congelante).

▲ FIGURA 5.1 ▲ FIGURA 5.2


Aplicação do teste de vitalidade pulpar com a bolinha Aplicação do teste térmico na face vestibular do den-
de algodão embebida com spray de CO2 (gelo) na su- te 11.
perfície vestibular do dente.

Dor ou sensibilidade?
Para evitar dúvidas na interpretação, é necessário observar a reação do paciente à
aplicação dos testes de vitalidade pulpar e de percussão, e não suas respostas verbais.

Teste de vitalidade com spray congelante (gelo seco)


A aplicação do spray congelante em uma bolinha de algodão na superfície vestibular
do dente estimula respostas:
• Polpa normal – provoca dor (resposta positiva) que desaparece imediatamente
com a remoção do estímulo.
• Pulpite reversível – provoca dor exacerbada (resposta positiva) que desaparece
imediatamente com a remoção do estímulo.
• Pulpite irreversível – provoca dor (exacerbada ou não) que persiste por alguns se-
gundos após a remoção do estímulo.

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Endodontia passo a passo 47

• Necrose pulpar – não provoca dor (resposta negativa), mas pode haver uma míni-
ma sensibilidade à percussão.

Com vistas a uma melhor interpretação, os testes devem ser feitos nos dentes análogos para
efeito comparativo. A intensidade da resposta é que define o grau de inflamação. A ausência
de resposta ao teste térmico indica necrose pulpar; no entanto, os procedimentos clínicos
devem ser feitos com anestesia local, pois no terço apical ainda podem existir terminações
nervosas viáveis, uma vez que são as últimas estruturas a serem degeneradas no processo
de necrose.

Diagnóstico periapical
A avaliação da dor e de sua intensidade tem um caráter subjetivo. Esperar uma res-
posta verbal do paciente para definir a intensidade da dor pode gerar erros de inter-
pretação, pois envolve diversos fatores, entre eles o diferente limiar de dor de cada
indivíduo.

Teste de percussão
O teste de percussão pode ser feito, inicialmente, com a ponta do dedo indicador ou
com o cabo do espelho clínico e serve para definir as alterações inflamatórias, agudas
ou crônicas, presentes no ligamento periodontal.
• Nos processos inflamatórios agudos (abscesso apical ou pericementite), o paciente
reage ao teste de percussão vertical ou horizontal afastando a cabeça devido à in-
tensidade da dor.
• Nos processos inflamatórios crônicos (granulomas, cistos ou inflamação periodon-
tal), o paciente não reage ao teste de percussão horizontal ou vertical; apenas res-
ponde que apresenta maior sensibilidade no dente.

Teste de palpação no fundo de sulco


A Figura 5.3 ilustra o teste de palpação no fundo de sulco, em que se pode diagnosti-
car abscesso subperiosteal.

! FIGURA 5.3
Teste de palpação no fundo de sulco para diagnóstico
de abscesso subperiosteal.

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48 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Diagnóstico diferencial entre abscesso periapical e pericementite


O diagnóstico diferencial dos processos agudos periapicais (pericementite e absces-
so) em sua fase inicial muitas vezes confunde o clínico, uma vez que os sintomas são
quase os mesmos –dor pelo teste de percussão, aumento da mobilidade do dente,
dor ao mastigar – e principalmente porque, na fase inicial do abscesso, em geral não
existem sinais clássicos de tumefações, edema ou celulite.
Portanto, para definir o diagnóstico entre pericementite e abscesso, é preciso ava-
liar, sobretudo, a intensidade da dor, como descrito a seguir:
• Na pericementite:

a dor é suportável e diminui com o ajuste oclusal e com o uso de analgésicos;

a dor só é severa com a oclusão ou mastigação;

não há dor à palpação nas proximidades do ápice dental.
• No abscesso:

a dor é espontânea, severa, contínua, pulsátil e ainda aumenta com a oclusão ou
mastigação;

a dor não cessa com analgésicos;

existe dor à palpação no fundo de sulco quando a localização da coleção puru-
lenta estiver na região subperiosteal ou submucosa;

no abscesso intraósseo não há dor à palpação no fundo de sulco, uma vez que a
coleção purulenta está localizada no interior do osso alveolar. Prevalece nesses
casos a dor espontânea e severa.

EXAME CLÍNICO INTRAORAL


Abscesso submucoso (Figura 5.4)

! FIGURA 5.4
O aumento de volume no fundo de sulco vesti-
bular caracteriza a presença de pus sob a mu-
cosa dessa área.

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Endodontia passo a passo 49

Abscesso periodontal (Figura 5.5)

FIGURA 5.5 !
A sondagem confirma a presença de bolsa pe-
riodontal e abscesso periodontal na região.

Fístula (Figuras 5.6 e 5.7)

▲ FIGURA 5.6 ▲ FIGURA 5.7


Fístula associada a infecção do segundo pré- Rastreamento da fístula com cone de guta-
-molar superior. -percha.

EXAME CLÍNICO EXTRAORAL


Abscesso extraoral submandibular (Figura 5.8)

FIGURA 5.8 !
O aumento de volume na região submandibu-
lar indica a localização extraoral do abscesso
de origem dental. Note a área avermelhada
indicando que a coleção purulenta encontra-se
localizada na região subcutânea.

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50 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Abscesso subperiosteal e celulite (Figura 5.9)

! FIGURA 5.9
A celulite no lábio superior decorrente de ne-
crose pulpar e abscesso no dente 21 indica a
necessidade de intervenção imediata para
drenagem da coleção purulenta. O edema (ce-
lulite) é o sinal indicativo da patogenicidade
dos microrganismos envolvidos e da reação do
organismo na tentativa de impedir a dissemi-
nação do processo infeccioso.

EXAME RADIOGRÁFICO
Em Endodontia, as imagens radiográficas dos dentes e tecidos de suporte são funda-
mentais para as decisões e avaliações nas fases pré, trans e pós-tratamento, incluindo
o acompanhamento, as avaliações de resultados e a proservação a longo prazo.

As radiografias periapicais iniciais são utilizadas para complementar informações associa-


das à anatomia dentoalveolar do dente a ser tratado. As imagens radiográficas informam o
comprimento aparente do dente (CAD), a localização e posição do dente no arco, a adapta-
ção e o contorno de restaurações, a presença e localização de cáries e sua relativa profundi-
dade com a câmara pulpar, o grau de curvatura da raiz, a presença e localização de corpos
estranhos no canal radicular, as reabsorções radiculares, o grau de calcificação dos canais,
as variações anatômicas, a presença e o tamanho das lesões periapicais e as condições pe-
riodontais.

Roteiro para interpretação das imagens radiográficas


1. Observar se a coroa dental está íntegra, destruída ou restaurada.
2. Verificar se a câmara pulpar é ampla ou atrésica ou se contém ou não nódulos
pulpares.
3. Examinar as entradas dos canais radiculares para verificar se estão acessíveis ou
obstruídas por calcificações.
4. Observar o local da curvatura radicular (terço cervical, médio ou apical).
5. Observar a primeira curvatura do canal, no terço cervical, para verificar se é
acentuada ou suave.
6. Considerar o grau de curvatura radicular (moderado ou severo).
7. Analisar o grau de amplitude dos canais radiculares (amplos, atrésicos ou calci-
ficados).

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Endodontia passo a passo 51

8. Verificar o número de raízes ou canais extras.


9. Observar a presença de materiais ou instrumentos no interior dos canais.
10. Avaliar o periodonto lateral (íntegro ou com perda óssea horizontal ou vertical).
11. Observar a continuidade da lâmina dura periapical (normal, espessada ou com a
presença de imagem radiopaca ou radiolúcida).
12. Verificar se existem reabsorções radiculares (externa ou interna).
13. Observar a normalidade da anatomia dental.

IMAGENS RADIOGRÁFICAS
As Figuras 5.10 a 5.22, a seguir, trazem várias radiografias ilustrativas.

▲ FIGURA 5.10 ▲ FIGURA 5.11


Radiografia periapical mostrando cárie mesial no Área radiolúcida na altura da câmara pulpar e pre-
dente 47, com comprometimento da câmara pulpar. sença de lesão na furca.

▲ FIGURA 5.12 ▲ FIGURA 5.13


Nódulos de calcificação na câmara pulpar do dente 48. Condição do suporte periodontal na região de pré-
-molares e molares superiores.

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52 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

▲ FIGURA 5.14 ▲ FIGURA 5.15


Grau da curvatura radicular no terço apical do dente 45. Lesão periapical no incisivo lateral superior.

▲ FIGURA 5.16 ▲ FIGURA 5.17


Reabsorção radicular no dente 45. Área radiolúcida na região periapical do dente 12.

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Endodontia passo a passo 53

▲ FIGURA 5.18 ▲ FIGURA 5.19


Fratura radicular no dente 46. Reabsorção radicular externa no dente 11.

▲ FIGURA 5.21
▲ FIGURA 5.20 Fratura radicular no dente 22 com deslocamento da
Área de reabsorção radicular interna no dente 11. prótese.

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54 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

! FIGURA 5.22
Área radiopaca na região periapical do dente 36 (ce-
mentoma).

Atualmente, é fundamental a implementação da imagem digital na prática clínica. As van-


tagens incluem o tempo, a manipulação, a qualidade e o armazenamento da imagem; a re-
dução da dose de radiação; a diminuição da poluição ambiental e a facilidade para a proser-
vação dos casos clínicos. Os relatórios dos tratamentos realizados, incluindo as radiografias
digitais, são práticos e facilmente encaminhados aos indicadores via e-mail.

O CAMINHO DA INFECÇÃO
Em termos histológicos, a correlação da inflamação pulpar e periapical com os sinais
e sintomas clínicos é de suma importância para a interpretação diagnóstica.
O caminho da infecção, desde a instalação do processo inflamatório pulpar até a dis-
seminação de bactérias através do forame apical, é exemplificado nas Figuras 5.23 a 5.30.

! FIGURA 5.23
Dente normal inserido no alvéolo. As respostas à
aplicação dos testes são:
• O spray congelante provoca dor, a qual desaparece
imediatamente com a remoção do estímulo.
• O teste de percussão é negativo.
• O diagnóstico é de polpa e tecidos periapicais nor-
mais.

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Endodontia passo a passo 55

Cárie

Pulpite

FIGURA 5.24 !
Dente com cárie. A polpa dental apresenta inflama-
ção, em geral assintomática, provocada por bacté-
rias e toxinas presentes na cárie dental, que se pro-
pagam através dos túbulos dentinários.
• A dor provocada com aplicação do spray conge-
lante é maior, porém desaparece, imediatamen-
te, após a remoção do estímulo (resposta posi-
tiva).
• O diagnóstico é de pulpite reversível.

Cárie

Microabscessos

" FIGURA 5.25


Progressão da cárie. A inflamação pulpar aumenta
com o passar do tempo, e ocorre a formação de mi-
croabscessos na polpa.
• A dor é espontânea.
• A aplicação do spray congelante provoca dor, que
não desaparece, imediatamente, após a remoção
do estímulo (resposta positiva).
• O teste de percussão é negativo.
• O diagnóstico é de pulpite irreversível.

Cárie
Necrose

FIGURA 5.26 !
Evolução da necrose pulpar que progride no senti-
do coroa-ápice.
• A aplicação do teste com spray congelante não
provoca dor (resposta negativa).
• O dente pode apresentar alguma sensibilidade à
percussão.
• O diagnóstico é de necrose pulpar.

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56 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Cárie

Necrose total
! FIGURA 5.27
Necrose pulpar total e início da inflamação no perio-
donto apical.
• A aplicação do teste com spray congelante não
provoca dor (resposta negativa).
• O teste de percussão provoca dor severa.
• O paciente relata sensação de “dente crescido”
(extrusão) e dor severa à mastigação.
Pericemen!te • Há dor espontânea e moderada, que diminui com
o uso de analgésicos.
• O diagnóstico é de necrose pulpar com pericemen-
tite.

Cárie

Necrose total
FIGURA 5.28 "
Formação de abscesso periapical (intraósseo pri-
mário).
• A aplicação do teste com spray congelante
não provoca dor (resposta negativa).
• A dor é espontânea, contínua, severa e não
cede com analgésicos.
• Há aumento da mobilidade dental.
• Não há dor à palpação no fundo de sulco por-
Abscesso
que a localização do pus é intraóssea. aplical
• Não há edema ou celulite.
• O diagnóstico é de abscesso intraósseo.

! FIGURA 5.29
Cárie Evolução do abscesso para a região subperiosteal.
Necrose total O aumento de volume da coleção purulenta ocorre
Abscesso rapidamente. As enzimas proteolíticas facilitam a
subperiosteal difusão do pus através das trabéculas ósseas com a
finalidade de expelir a coleção purulenta, que rompe
a cortical óssea e fica retida no periósteo.
• A aplicação do teste com spray congelante não
provoca dor (resposta negativa).
• A dor é espontânea, contínua, severa e não cede
com analgésicos.
• Há aumento da mobilidade dental.
• O paciente apresenta dor severa ao teste da palpa-
ção no fundo de sulco.
• Pode haver edema e celulite.
• O diagnóstico é de abscesso subperiosteal.

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Endodontia passo a passo 57

FIGURA 5.30 ! Cárie


Evolução do abscesso para a região submu-
cosa. Logo que o pus rompe o periósteo e Abscesso Necrose total
invade o tecido mucoso, ocorre uma intensa subperiosteal
manifestação de dor e inchaço no fundo de
sulco (flutuação).
• A aplicação do teste com spray congelante
não provoca dor (resposta negativa).
• A dor é espontânea, contínua, severa e não
cede com analgésicos.
• Há aumento da mobilidade dental.
• O paciente apresenta dor severa ao teste
da palpação no fundo de sulco.
• Há aumento de volume no fundo de sulco,
edema e celulite.
• O diagnóstico é de abscesso submucoso.

Abscesso fênix
Esse abscesso surge da agudização de um processo periapical crônico (área radiolú-
cida periapical) quando ocorre queda da resistência imunológica. Quando esse tipo
de abscesso ocorre na mandíbula, pode não haver tempo para que as enzimas proteo-
líticas destruam a cortical óssea e o pus fica contido no espaço intraósseo (abscesso
intraósseo). O atendimento de urgência envolve a medicação antibiótica associada à
drenagem cirúrgica com a perfuração da cortical óssea para a saída do pus. A tenta-
tiva de tratamento via canal radicular não resulta no alívio da dor pela dificuldade
da drenagem nos dentes inferiores. É comum que o paciente opte pela extração do
dente, tal a intensidade da dor.

PROGNÓSTICO DENTAL E PLANEJAMENTO


Extrair ou aproveitar?
Após ouvir a queixa do paciente, avaliar a situação socioeconômica e analisar clínica
e radiograficamente o caso, é necessário considerar as seguintes possibilidades:
1. Indicação de tratamento endodôntico em dentes com rizogênese completa:
• Dentes com polpa normal com finalidade protética ou restauradora.
• Dentes com muita sensibilidade a estímulos térmicos (condição limítrofe en-
tre a pulpite reversível e irreversível).
• Dentes com pulpite irreversível.
• Dentes com necrose pulpar.
• Dentes com lesões periapicais crônicas (com ou sem fístula).
• Dentes com insucesso de tratamento endodôntico anterior que apresentam
lesão periapical.

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58 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

• Dentes com tratamentos endodônticos insatisfatórios sem lesão periapical


mas que necessitam de tratamentos protéticos.
2. Indicação de tratamento endodôntico de dentes com rizogênese incompleta:
• Dentes com ápice aberto e presença de necrose pulpar:
Considerar a possibilidade de revitalização do canal radicular.

3. Consideração da possibilidade de extração e colocação de implantes nas seguin-


tes condições:
• Na presença de doença periodontal avançada com prognóstico duvidoso (le-
são de furca, perda óssea acentuada, pouca inserção do dente no osso alveo-
lar).
• Dentes com impossibilidade de restauração ou prótese (cárie subgengival in-
vadindo o espaço ósseo, dentes debilitados pela perda de estrutura, retrata-
mento endodôntico com pouca previsibilidade de sucesso).
• Valor estratégico do dente na arcada dental.
• Dentes com fratura radicular longitudinal.

LEITURAS RECOMENDADAS
Bender IB. Factors influencing radiographic appearance of bony Mattscheck D, Law AS, Nixdorf DR. Diagnosis of nonodontogenic
lesions. J Endod. 1982; 8(4):161-70. toothache. In: Hargreaves KM, Cohen S, Berman LH, editors.
Kaffe I, Gratt BM. Variations in the radiographic interpretation of Cohen’s pathways of the pulp. 10th ed. St. Louis: Mosby El-
the periapical dental region. J Endod. 1988;14(7):330-5. sevier; 2011.
Kim S. Neurovascular interactions in the dental pulp in health and Rickoff B, Trowbridge H, Baker J, Fuss Z, Bender IB. Effects
inflammation. J Endod. 1990;16:48-53. of thermal vitality tests on human dental pulp. J Endod.
Lado EA, Richmond AF, Marks RG. Reliability and validity of a 1988;14:482-5.
digital pulp tester as a test standard for measuring sensory Rickoff B, Trowbridge H. Effects of thermal vitality tests on human
perception. J Endod. 1988;14:352-6. dental pulp. J Endod. 1988;14:482-5.
Loeser JD, Treede RD. The Kyoto protocol of IASP basic pain ter- Sandler NA, Ziccardi V, Ochs M. Differential diagnosis of jaw pain
minology. Pain. 2008; 3:473-7. in the elderly. J Am Dent Assoc. 1995;126:1263-72.
Lopes MA, de Souza Filho FJ, Jorge Junior J, de Almeida OP. Her- Siqueira JTT, Ching LH. Neuralgia idiopática do trigêmeo:
pes zoster infection as a differential diagnosis of acute pulpi- diagnóstico diferencial com dor de origem dentária. JBA.
tes. J Endod. 1998;24(2):143-4. 2003;3(10):131-9.

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6
Morfologia dental aplicada ao
preparo endodôntico
FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

A Endodontia clínica vive hoje uma fase de previsibilidade de resultados. Na Endodontia clínica
ou se ganha ou se perde. Nos dias de hoje é possível, com os conceitos atuais, determinarmos para
que direção aponta o tratamento executado. Existem manobras necessárias e fundamentais que
levam o tratamento ao caminho do sucesso, a isso chamamos domínio da anatomia. Três pontos
são fundamentais para a previsibilidade do tratamento: 1) localização do canal, 2) negociação
do canal e 3) localização do forame. Essas manobras, aparentemente fáceis, não são executadas
em 100% dos casos. A omissão de uma dessas fases pode até, em alguns casos, não determinar o
insucesso do tratamento, mas a previsibilidade estará comprometida. O sucesso dessas manobras
está ligado diretamente ao grande duelo entre o endodontista e a anatomia. Mais uma vez vemos
a arte do clínico diante dessa difícil tarefa de driblar a anatomia.

Tauby Coutinho
Professor de Endodontia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).

CONSIDERAÇÕES GERAIS
O conhecimento da morfologia do sistema de canais radiculares é requisito essencial
para a prática endodôntica. Alguns autores afirmam, inclusive, que essa é a principal
condição para conduzir ao sucesso do tratamento. Vale destacar que, apesar do avan-
ço tecnológico aplicado às áreas médicas, no procedimento endodôntico, o alcance
dos resultados ideais ainda depende, essencialmente, da habilidade do profissional
em acessar a câmara pulpar, localizar os canais radiculares e eliminar as interferên-
cias anatômicas, que, ao longo do canal radicular, dificultam o acesso dos instrumen-
tos rumo ao forame apical.
Resumindo, o conhecimento da anatomia dos canais radiculares, associado ao
manejo clínico dos instrumentos, é fundamental para o seu acesso e para o seu tra-
tamento.

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60 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

A indústria metalúrgica e a Odontologia mantêm uma estreita história de parce-


ria e mútuo desenvolvimento, particularmente na Endodontia. Concorda-se que, em
parte, a fabricação dos instrumentos endodônticos tem acompanhado essa evolução.
Está disponível uma ampla variedade de instrumentos que se diferenciam em design,
secção transversal, características das hastes e lâminas, conicidade, ângulo de corte,
etc. Contudo, admite-se que, apesar de ser produzida com estratégias especiais, tal
gama de itens, em parte, evoluiu muito mais associada às demandas comerciais do
que propriamente a diversidades da morfologia dos canais radiculares. Estudos com
microscopia eletrônica de varredura têm demonstrado que ainda persistem defeitos
e distorções nos instrumentos, fatores que resultam muitas vezes em dificuldades e
restrições funcionais dos instrumentos no interior dos canais radiculares.
Dessa forma, a indústria, com base em pesquisas, trabalha permanentemente
com expectativas de criar novos instrumentos que possam acompanhar a anato-
mia dos canais com mais facilidade, maior eficiência e segurança. Enquanto isso
não ocorre, vale ressaltar uma interessante assertiva:

“A Endodontia deve ser ensinada da anatomia para os instrumentos, e não dos instrumen-
tos para a anatomia” (Souza Filho).

ESTUDO DA ANATOMIA DOS CANAIS RADICULARES


O domínio clínico do binômio morfologia-instrumentação não deve ser feito por
meio de livros ou imagens, mas sim por meio da anatomia real de dentes extraídos. O
ensino do tratamento endodôntico em manequins tem seu aspecto positivo em rela-
ção à simulação da ergonomia, ao posicionamento do profissional, ao isolamento ab-
soluto e à abertura de acesso, mas, infelizmente, mascara o que há de mais importante
no aprendizado, que é o conhecimento ou a visão real da completa anatomia dental.
Para aprender anatomia dental e dos canais radiculares, os dentes não devem
ser incluídos em blocos de resina ou gesso. É necessário manusear os dentes para
conhecer sua forma, número de raízes, achatamentos radiculares, variações de com-
primento, grau de curvaturas radiculares, forma e localização do forame apical. Em
seguida, é fundamental cortar dentes extraídos, tanto no sentido longitudinal como
no transversal, para conhecer as variações inerentes aos tipos radiculares, ovais ou
achatados. Os locais de istmos e reentrâncias nos canais achatados são detalhes que
não são revelados pelos métodos clássicos radiográficos e podem interferir, significa-
tivamente, na qualidade da limpeza e modelagem dos canais radiculares.
O conhecimento dessa anatomia real, somado às informações apresentadas pelas
imagens radiográficas periapicais, permite a formação de uma memória anatômica que,
embora virtual, é suficiente para dar ao clínico, no momento do tratamento, as informa-
ções morfológicas necessárias para o planejamento do tratamento endodôntico.
Os principais detalhes anatômicos de interesse para Endodontia são apresentados
a seguir:

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Endodontia passo a passo 61

COMPRIMENTO MÉDIO DOS DENTES (Tabela 6.1)


Tabela 6.1 Comprimento médio e número de canais
Dentes superiores Comprimento médio (mm) Número de canais
Incisivo central 22,5 1 (100%)
Incisivo lateral 22,0 1 (100%)
Canino 26,5 1 (100%)
o
1 pré-molar 20,6 1 (28%) e 2 (72%)
o
2 pré-molar 21,5 1 (53,7%) e 2 (46,3%)
o
1 molar 20,8 3 (30%) e 4 (70%)
o
2 molar 20,0 3 (30%) e 4 (70%)
Dentes inferiores Comprimento médio (mm) Número de canais
Incisivo central 20,7 1 (68%) e 2 (32%)
Incisivo lateral 20,1 1 (65,6%) e 2 (34,4%)
Canino 25,6 1 (94%) e 2 (6%)
o
1 pré-molar 21,6 1 (82%) e 2 (16%) 3 (2%)
o
2 pré-molar 22,3 1 (92%) e 2 (8%)
o
1 molar 21,0 2 (6,5%), 3 (32,4%) e 4 (21,1%)
o
2 molar 19,8 2 (23%), 3 (66,5%) e 4 (10,5%)
Fonte: adaptada de Cohen e Burns.1

Os canais radiculares longos são mais difíceis de instrumentar do que os curtos. O preparo
e a modelagem do terço apical dependem de instrumentos longos, normalmente as limas
manuais de 31 mm de comprimento.

DETALHES DA MORFOLOGIA CORONÁRIA DE INTERESSE PARA ABERTURA


DE ACESSO
Os detalhes mais importantes da superfície coronária que servem como referência
para as aberturas coronárias são as cristas marginais, a borda incisal e o cíngulo.

Dentes anteriores – incisivos e caninos (Figura 6.1)

! FIGURA 6.1
Face palatina do incisivo central mostrando com
detalhes as cristas marginais (setas azuis), o cín-
gulo (seta vermelha) e a borda incisal.

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62 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Pré-molar superior (Figura 6.2)

! FIGURA 6.2
Face oclusal do pré-molar superior mostrando
com detalhes as cristas marginais (setas azuis),
as vertentes de cúspides (setas vermelhas) e o
sulco central.

Pré-molar inferior (Figura 6.3)

FIGURA 6.3 "


Face oclusal do pré-molar inferior mostrando
com detalhes as cristas marginais (setas azuis), a
vertente da cúspide vestibular (seta vermelha),
o sulco central e a cúspide lingual.

Molar superior (Figura 6.4)

! FIGURA 6.4
Face oclusal do molar superior mostrando com deta-
lhes as cristas marginais (setas azuis), as vertentes das
cúspides vestibulares e palatinas (setas vermelhas) e
a ponte de esmalte (seta verde).

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Endodontia passo a passo 63

Molar inferior (Figura 6.5)

" FIGURA 6.5


Face oclusal do molar inferior mostrando com
detalhes as cristas marginais (setas azuis), as ver-
tentes das cúspides vestibulares e linguais (setas
vermelhas) e o sulco central (seta verde).

IMPORTÂNCIA DE ISTMOS E REENTRÂNCIAS NOS CANAIS ACHATADOS


Istmos e reentrâncias costumam ser encontrados nos terços cervical e médio dos
canais radiculares achatados. O conhecimento da localização dessas áreas é muito
importante devido à presença constante de restos pulpares, substratos orgânicos e
biofilme bacteriano (Figuras 6.6 e 6.7). A limpeza de tais áreas depende da ação me-
cânica dos instrumentos, principalmente dos rotatórios, que devem ser direcionados
para essas regiões a fim de cortar a dentina e remover os substratos orgânicos.

▲ FIGURA 6.6 ▲ FIGURA 6.7


Corte histológico mostrando restos pulpares na re- Corte transversal de raiz mesial de molar inferior
gião de reentrância do canal radicular. mostrando área de reentrância.

MORFOLOGIA DOS TERÇOS MÉDIO E APICAL DOS CANAIS RADICULARES DOS


DENTES SUPERIORES EM MICROTOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA
As microtomografias computadorizadas (micro TC) das Figuras 6.8 a 6.19 mostram
a forma do canal radicular em corte transversal da raiz, de diversos grupos dentais, a
5 e a 2 mm de distância do ápice radicular.

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64 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

▲ FIGURA 6.8 ▲ FIGURA 6.9


Incisivo central superior – 5 mm do ápice. Incisivo central superior – 2 mm do ápice.

▲ FIGURA 6.10 ▲ FIGURA 6.11


Incisivo lateral superior – 5 mm do ápice. Incisivo lateral superior – 2 mm do ápice.

▲ FIGURA 6.12 ▲ FIGURA 6.13


Canino superior – 5 mm do ápice. Canino superior – 2 mm do ápice.

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Endodontia passo a passo 65

▲ FIGURA 6.14 ▲ FIGURA 6.15


Primeiro pré-molar superior – 5 mm do ápice. Primeiro pré-molar superior – 2 mm do ápice.

▲ FIGURA 6.16 ▲ FIGURA 6.17


Segundo pré-molar superior – 5 mm do ápice. Segundo pré-molar superior – 1 mm do ápice com
dois forames circulares.

▲ FIGURA 6.18 ▲ FIGURA 6.19


Primeiro molar superior – 5 mm do ápice. Primeiro molar superior – 2 mm do ápice (os canais
são circulares).

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66 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

MORFOLOGIA DOS TERÇOS MÉDIO E APICAL DOS CANAIS RADICULARES DOS


DENTES INFERIORES EM MICROTOMOGRAFIAS
As microtomografias das Figuras 6.20 a 6.29 mostram a forma do canal radicular
em corte transversal da raiz, de diversos grupos dentais, a 5 e a 2 mm de distância do
ápice radicular.

▲ FIGURA 6.20 ▲ FIGURA 6.21


Incisivo inferior – 5 mm do ápice. Incisivo inferior – 2 mm do ápice.

▲ FIGURA 6.22 ▲ FIGURA 6.23


Canino inferior – 5 mm do ápice. Canino inferior – 2 mm do ápice.

▲ FIGURA 6.24 ▲ FIGURA 6.25


Primeiro pré-molar inferior – 5 mm do ápice. Primeiro pré-molar inferior – 2 mm do ápice com três
forames apicais.

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Endodontia passo a passo 67

▲ FIGURA 6.26 ▲ FIGURA 6.27


Segundo pré-molar inferior – 5 mm do ápice. Segundo pré-molar inferior – 2 mm do ápice com
dois forames apicais.

▲ FIGURA 6.28 ▲ FIGURA 6.29


Primeiro molar inferior – 5 mm do ápice. Primeiro molar inferior – 2 mm do ápice.

As microtomografias mostram que, em geral, os canais tornam-se mais circulares à medi-


da que o corte se aproxima do forame apical. Esses dados são importantes, uma vez que a
limpeza e a modelagem do terço apical podem ser feitas com maior previsibilidade se os
instrumentos puderem tocar todas as paredes do canal nessa região.

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68 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

CORTES LONGITUDINAIS E TRANSVERSAIS DE DENTES E RAÍZES


ACHATADAS (Figuras 6.30 e 6.31)

A B

▲ FIGURA 6.30
A) O corte transversal do primeiro pré-molar inferior no início do terço apical (5 mm) mostra o
canal achatado nessa região. B) O corte transversal a 2 mm do vértice radicular mostra o canal
radicular com formato circular nessa área apical.

A B

▲ FIGURA 6.31
A) O corte longitudinal mostra o canino inferior com a raiz e o canal radicular achatados em quase
toda a sua extensão. B) O corte transversal a 2 mm do vértice radicular mostra o canal radicular
com formato circular nessa área apical.

IMPORTÂNCIA DA PRIMEIRA CURVATURA DO CANAL RADICULAR


A primeira curvatura do canal radicular encontra-se mais acentuada na entrada dos
canais vestibulares dos molares superiores (Figura 6.32) e nos canais mesiais dos
molares inferiores (Figura 6.33). O ângulo dessa curvatura está diretamente rela-
cionado com a amplitude da câmara pulpar – quanto maior o grau de calcificação
da câmara pulpar, maior o ângulo da primeira curvatura do canal. Para reduzir o
ângulo dessa curvatura e facilitar o acesso dos instrumentos para o interior do canal
radicular, deve-se fazer um desgaste anticurvatura, em geral com auxílio de uma
broca de Largo, para remover a dentina circundante na entrada do canal radicular
(Figura 6.34).

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Endodontia passo a passo 69

A função desse desgaste é proporcionar um acesso mais retilíneo dos instrumen-


tos para o interior do canal radicular.

▲ FIGURA 6.32 ▲ FIGURA 6.33


Corte longitudinal da raiz mesiovestibular do molar Radiografia mostrando a primeira curvatura do canal
superior mostrando a primeira curvatura do canal do molar inferior.
(seta).

! FIGURA 6.34
A Posição da lima na primeira curvatura do canal,
cruzando a câmara pulpar. B Posição da lima após
o desgaste anticurvatura, num plano longitudinal
A B
em relação à primeira curvatura do canal.

ZONA DE RISCO E ZONA DE SEGURANÇA


Nas raízes achatadas (incisivos inferiores, raiz mesiovestibular dos molares superiores,
raiz mesial dos molares inferiores), devido ao maior estreitamento da raiz no sentido
mesiodistal e em função do menor perímetro do canal radicular em relação à superfície
externa da raiz, pode-se definir que a zona de risco é a superfície radicular relacionada à
região da furca. Durante o preparo da entrada do canal ou durante a preparação de es-
paço para pino intrarradicular, essa área apresenta maior risco de perfuração acidental.
O conhecimento desses detalhes anatômicos pode prevenir acidentes, uma vez que os
desgastes e as ampliações nessa região devem ser feitos no sentido anticurvatura, deno-
minada zona de segurança (Figura 6.35).

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70 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

! FIGURA 6.35
Corte transversal da raiz mesial de molar inferior
mostrando as zonas de risco (setas vermelhas) e
as zonas de segurança (setas azuis).

MORFOLOGIA DO FORAME APICAL


2
No importante estudo de Kuttler, realizado em cadáveres com idade entre 18 e 25
anos no grupo I e com idade de 55 anos ou mais no grupo II, foram analisados vários
aspectos da morfologia do forame apical sob magnificação (Figuras 6.36 e 6.37). Os
resultados do estudo levaram a diversas conclusões. Entre elas:
1. O centro do forame apical foi localizado no vértice radicular em 32% dos dentes
do grupo I e em 20% do grupo II.
2. Os forames tinham a saída lateral em relação ao centro do ápice radicular em
68% dos dentes do grupo I e em 80% do grupo II.
3. O diâmetro do forame apical em relação à sua abertura na superfície do cemento
radicular foi, em média, de 502 µ (correspondente a uma lima # 50) no grupo I e
681 µ (correspondente a uma lima # 60 ou # 70) no grupo II.
4. O menor diâmetro do canal localizou-se no limite cemento-dentina-canal
(CDC) em 53% dos dentes e, em média, foi de 306 µ no grupo I e de 274 µ no
grupo II (correspondente ao diâmetro de uma lima # 30).

Conclusão
• No ponto de maior constrição do canal radicular (limite CDC), a medida do fora-
me corresponde, em média, em pacientes adultos, ao diâmetro de um instrumento
tipo K # 30.
• É importante que o clínico conheça esses dados para entender que, para efetu-
ar uma limpeza adequada dos debris e biofilme bacteriano localizados no forame
apical, especialmente na área de maior constrição, é necessário realizar uma am-
pliação com instrumentos de diâmetro compatível com a média dos diâmetros
encontrados no trabalho de Kuttler.
• É possível concluir também que a lima de patência # 10, em função do diâmetro
fisiológico dos forames apicais, dificilmente promove uma limpeza adequada nes-
sa região.

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Endodontia passo a passo 71

▲ FIGURA 6.36 ▲ FIGURA 6.37


Fotomicrografia de varredura mostrando forame Forame apical.
apical.

PERMEABILIDADE DENTINÁRIA
A maior amplitude dos túbulos nos terços cervical e médio (Figuras 6.38 e 6.39) per-
mite uma maior ocupação microbiana, na razão de 300 µ.3 No terço apical, a menor
amplitude dos túbulos dentinários permite uma ocupação microbiana na razão de
40 µ (Figura 6.40). Além disso, na região dos polos vestibular e lingual, existem reen-
trâncias e maior possibilidade de permanência de restos orgânicos após a instrumen-
tação dos canais radiculares. Em vista disso, a instrumentação de canais radiculares
em canais achatados deve ser, sempre, dirigida para os polos.

▲ FIGURA 6.38 ▲ FIGURA 6.39


Microfotografia de varredura mostrando a permeabi- Fotomicrografia de varredura mostrando a permea-
lidade da dentina no terço cervical do canal. bilidade dentinária no terço médio do canal radicular.

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72 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

! FIGURA 6.40
Bactérias no interior dos túbulos dentinários.

REFERÊNCIAS
1. Cohen S, Burns RC. Caminhos da polpa. 2. ed. Rio de Janeiro: 3. Love RM, Jenkinson HF. Invasion of dentinal tubules by oral
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2. Kuttler Y. Microscopic investigation of root apexes. JADA.
1955;50:544-52.

LEITURAS RECOMENDADAS
al Shalabi RM, Omer OE, Glennon J, Jennings M, Claffey NM. Mauger MJ, Schindler WG, Walker WA. An evaluation of canal
Root canal anatomy of maxillary first and second permanent morphology at different levels of root resection in mandibular
molars. Int Endod J. 2000;33(5):405-14. incisors. J Endod. 1998;24:607-9.
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De Deus QD. Endodontia. 4. ed. Rio de Janeiro: Médica e Cien- da dentina [tese]. Piracicaba: Faculdade de Odontologia de
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J Endod. 1990;16:311-7.

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7
Classificação e planejamento
do tratamento endodôntico
LUIZ VALDRIGHI E FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

CONSIDERAÇÕES GERAIS
A Endodontia, assim como todas as áreas clínicas, depende não apenas do conheci-
mento básico teórico da biologia e dos fundamentos técnicos, mas da execução de
um difícil procedimento clínico que exige um treinamento psicomotor que vai desde
a manipulação de dentes extraídos em laboratório até a execução de tratamentos em
pacientes.

A curva de aprendizado para a formação de um endodontista é longa e depende de um


treinamento intensivo, que pode ser obtido em cursos de aperfeiçoamento, especialização,
estágios ou residências clínicas, com professores com probidade clínica comprovada.

COMO EVITAR FALHAS E IATROGENIAS


As principais falhas iatrogênicas que acontecem na Endodontia ocorrem devido à
falta de um planejamento clínico adequado, negligência ou desatenção durante o tra-
tamento e, principalmente, devido à falta de um critério para seleção dos casos clínicos
de acordo com o grau de experiência do dentista. Essa seleção depende de critérios que
devem ser observados na avaliação clínica e radiográfica.

Critérios radiográficos
Na radiografia periapical, podem ser observadas alterações relacionadas à anatomia,
à amplitude dos canais, ao grau de curvatura radicular e a outras condições patológi-
cas, como reabsorções radiculares ou fraturas, que podem dificultar ou contraindicar
os tratamentos endodônticos.

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74 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Critérios clínicos
Na avaliação clínica, devem ser consideradas as dificuldades técnicas relacionadas
aos tratamentos, que incluem retratamentos endodônticos, remoção de retentores
intrarradiculares, remoção de instrumentos fraturados no canal, tratamento de per-
furações radiculares, dificuldades no isolamento absoluto, dificuldades essas, entre
outras, que exigem um maior grau de experiência do operador.
Portanto, essa diversidade de variáveis que envolvem os tratamentos endodôn-
ticos determina uma progressiva complexidade para a execução do procedimento
clínico. Assim, é imprescindível que o profissional disponha de uma classificação de
referência que possa orientar seu planejamento em função de sua experiência clínica,
tendo como critérios a amplitude dos canais, o grau de curvatura radicular, as anor-
malidades anatômicas, as condições locais de posicionamento do dente na arcada e
as dificuldades de isolamento. Outros fatores associados ao paciente também devem
ser considerados e incluem pouca abertura bucal, falta de cooperação e algumas con-
dições de saúde que exijam cuidados especiais.

SELEÇÃO DE CASOS CLÍNICOS DE ACORDO COM A AMPLITUDE DOS CANAIS,


O GRAU DE CURVATURA RADICULAR, ANORMALIDADES ANATÔMICAS E AS
DIFICULDADES TÉCNICAS
(Classificação de Souza Filho e Valdrighi)
Classificação dos canais radiculares de acordo com o nível de dificuldade técnica
e previsibilidade:
• Classe I (iniciantes) (Figura 7.1)

Canais, amplos ou médios, retos ou com leve curvatura
• Classe II (iniciantes com alguma experiência clínica) (Figura 7.2)

Canais constritos retos e/ou com leve curvatura
• Classe III (especialistas) (Figuras 7.3 a 7.11)

Canais calcificados com ou sem curvatura

Canais com curvatura radicular acentuada

Dilacerações radiculares

Canais com dupla curvatura

Presença de canais extras

Reintervenções endodônticas

Presença de próteses ou retentores intrarradiculares

Perfurações radiculares ou na câmara pulpar

Instrumentos fraturados

Dificuldades no isolamento absoluto

Dificuldades na abertura bucal

Pacientes com alterações sistêmicas graves

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Endodontia passo a passo 75

• Classe IV (especialistas – categoria especial) (Figura 7.12)



Tratamento de dentes com traumatismo dentário (avulsões, luxações e fraturas
radiculares)

Tratamento de dentes com rizogênese incompleta
• Classe V (especialistas – categoria especial) (Figura 7.13)

Tratamento endodôntico de dentes com anomalias
- Dens in dens
- Fusão
- Geminação
- Taurodontismo

▲ FIGURA 7.1 ▲ FIGURA 7.2


Radiografia periapical mostrando as caracterís- Radiografia periapical mostrando as caracterís-
ticas de canais Classe I. ticas de canais Classe II.

▲ FIGURA 7.3 ▲ FIGURA 7.4


Curvatura radicular acentuada. Canal calcificado.

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76 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

▲ FIGURA 7.5
Pré-molar superior com trifurcação de raiz (ca- ▲ FIGURA 7.6
nal extra). Retratamento endodôntico.

▲ FIGURA 7.7 ▲ FIGURA 7.8


Presença de próteses ou retentores intrarradi- Perfurações radiculares ou na câmara pulpar.
culares.

▲ FIGURA 7.9 ▲ FIGURA 7.10


Instrumentos fraturados no canal. Perfurações radiculares.

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Endodontia passo a passo 77

▲ FIGURA 7.11 ▲ FIGURA 7.12


Dificuldades para o isolamento absoluto. Dentes com rizogênese incompleta.

" FIGURA 7.13


Dens in dens (dens invaginatus).

PROGNÓSTICO DENTAL E PLANEJAMENTO


Extrair ou aproveitar?
Conforme já mencionado no Capítulo 5, após ouvir a queixa do paciente, avaliar a
situação socioeconômica e analisar clínica e radiograficamente o caso, é necessário
considerar as seguintes possibilidades:
1. Indicação de tratamento endodôntico em dentes com rizogênese completa:
• Dentes com polpa normal com finalidade protética ou restauradora.
• Dentes com muita sensibilidade a estímulos térmicos (condição limítrofe en-
tre a pulpite reversível e irreversível).
• Dentes com pulpite irreversível.
• Dentes com necrose pulpar.

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78 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

• Dentes com lesões periapicais crônicas (com ou sem fístula).


• Dentes com insucesso do tratamento endodôntico anterior que apresentam
lesão periapical.
• Dentes com tratamentos endodônticos insatisfatórios sem lesão periapical,
mas que necessitam de tratamentos protéticos.
2. Indicação de tratamento endodôntico de dentes com rizogênese incompleta:
• Dentes com ápice aberto e presença de necrose pulpar:

Considerar a possibilidade de revitalização do canal radicular.
3. Consideração da possibilidade de extração e colocação de implantes nas seguin-
tes condições:
• Na presença de doença periodontal avançada com prognóstico duvidoso (lesão
de furca, perda óssea acentuada, pouca inserção do dente no osso alveolar).
• Dentes com impossibilidade de restauração ou prótese (cárie subgengival in-
vadindo o espaço ósseo, dentes debilitados pela perda de estrutura, retrata-
mento endodôntico com pouca previsibilidade de sucesso).
• Valor estratégico do dente na arcada dental.
• Dentes com fratura radicular longitudinal.

SEQUÊNCIA PARA O PLANEJAMENTO CLÍNICO


1. Avaliar a queixa principal do paciente.
2. Conhecer sua expectativa em relação ao tratamento:
a. Saber o que o paciente quer;
b. Saber o que espera do tratamento.
3. Avaliar a condição geral de saúde.
4. Avaliar sua motivação quanto à manutenção dos dentes:
a. Qualidade da higiene oral;
b. Preocupação e cuidado com o controle da doença periodontal;
c. Qualidade das restaurações e próteses;
d. Raízes residuais.
5. Avaliar a condição de saúde da mucosa bucal (presença de patologias).
6. Avaliar radiograficamente:
a. Fazer radiografias periapicais para complementar o diagnóstico;
b. Se necessário, fazer outras tomadas radiográficas em angulações horizontais
diferentes.
7. Avaliar oclusão, bruxismo e dor orofacial:
a. Incluir ou excluir origem dental;
b. Se a dor não é de origem dental, solicitar avaliação de especialista em dor
orofacial;

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Endodontia passo a passo 79

c. Se a dor é de origem dental:


i. Localizar o dente;
ii. Realizar testes de vitalidade pulpar e sensibilidade à percussão;
iii. Solicitar exames complementares (radiografias, tomografias, etc.).
8. Concluir o diagnóstico dental:
a. Pulpar (polpa normal, pulpite reversível, pulpite irreversível, necrose);
b. Periapical (normal, espessamento do ligamento periodontal, imagem radio-
lúcida periapical, imagem radiopaca periapical);
c. Periodontal (perda óssea horizontal, vertical, lesões de furca, lesões endopério).
9. Classificar o caso clínico de acordo com as dificuldades impostas pela morfolo-
gia ou pelas dificuldades técnicas para definir se ele se enquadra na experiência
do operador (clínico geral, iniciante ou especialista).
10. Considerar as possibilidades de recuperação do dente com:
a. Tratamento ou retratamento endodôntico;
b. Cirurgia parendodôntica;
c. Reabilitação coronária:
i. Direta;
ii. Com próteses.
11. Avaliar a relação custo/benefício:
a. Recuperação do dente ou necessidade de extração e substituição do dente
por implante.

LEITURAS RECOMENDADAS
Cleghorn BM, Christie WH, Dong CCS. Root and root canal mor- West JD. Endodontic predictability: restore or remove: how do I
phology of the human permanent maxillary first molar: a lite- choose? In: Cohen M, editor. Interdisciplinary treatment
rature review. J Endod. 2006;32:813-21. planning: principles, design, implementation. Chicago: Quin-
Marshall FJ. Planning endodontic treatment. Dent Clin North Am. tessence Publishing; 2008. p. 123-64.
1979;23(4):495-518. West JD. Endodontic update 2006. J Esthet Rest Dent. 2006;18:280-
300.

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8
Abertura coronária
FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

CONSIDERAÇÕES GERAIS
A cavidade de acesso endodôntico é um componente essencial da tríade endodôn-
tica (abertura coronária, preparo dos canais e obturação) em que se baseia toda a
preparação e subsequente obturação dos canais radiculares. É, provavelmente, a fase
mais esquecida da terapia endodôntica. O desconhecimento da anatomia coronária
dificulta e conduz a erros na abertura de acesso e resulta em uma grande frustração
para o clínico, uma vez que os resultados imediatos dificultam os procedimentos pos-
teriores de preparo e obturação.
A forma de contorno da abertura de acesso deve ser feita nos locais de melhor
acesso à câmara pulpar (p. ex., sulcos e depressões anatômicas da coroa dental). Não
existem aberturas de acesso conservadoras ou minimamente invasivas. A localização
do desenho da abertura deve respeitar as estruturas anatômicas mais nobres da ana-
tomia coronária. São as estruturas que dão resistência à coroa dental, como as cristas
marginais, as cúspides, a borda incisal e o cíngulo.
De qualquer modo, a abertura de acesso ao canal radicular deve dar um acesso
direto aos canais radiculares, de modo a não interferir com os procedimentos, fre-
quentemente difíceis, da instrumentação e da modelagem a serem executados.
O conhecimento mais amplo da anatomia oclusal, sua relação com os limites da
câmara pulpar e a posição dos canais radiculares podem ser visualizados em cortes
longitudinais dos dentes.
A seguir são dados alguns exemplos de como estudar a abertura de acesso em
cortes longitudinais de dentes.

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Endodontia passo a passo 81

LOCAL DE ACESSO CORONÁRIO EM DENTES ANTERIORES ÍNTEGROS


INCISIVOS E CANINOS (Figura 8.1)

A B C

▲ FIGURA 8.1
A) Demarcação dos pontos de referência preservando as cristas marginais, a borda incisal e o cín-
gulo. B) Corte longitudinal mostrando os limites da abertura de acesso entre o cíngulo e a borda
incisal. C) Face palatina do incisivo central superior mostrando os limites da abertura de acesso,
preservando as áreas nobres da anatomia coronária – cristas marginais, cíngulo e borda incisal.

LOCAL DE ACESSO CORONÁRIO NOS PRÉ MOLARES SUPERIORES (Figura 8.2)

A B

▲ FIGURA 8.2
A) Pontos de referência para a abertura de acesso nos pré-molares superiores preservando a ver-
tente da cúspide vestibular, a metade da cúspide palatina e as cristas marginais. B) Forma de con-
torno da cavidade de acesso.

LOCAL DE ACESSO CORONÁRIO NOS PRÉ MOLARES INFERIORES (Figura 8.3)

A B

▲ FIGURA 8.3
A) Face oclusal do pré-molar inferior. B) Local do acesso coronário na metade da vertente da cús-
pide vestibular estendendo-se até o sulco central, preservando integralmente a cúspide lingual e
as cristas marginais.

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82 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

LOCAL DE ACESSO NOS MOLARES SUPERIORES (Figura 8.4)

A B

▲ FIGURA 8.4
A) Perfurações na face oclusal para delimitar as áreas que serão preservadas na abertura de aces-
so. B) Forma de contorno da abertura coronária dos molares superiores.

LOCAL DE ACESSO NOS MOLARES INFERIORES (Figura 8.5)

A B

▲ FIGURA 8.5
A) Perfurações na face oclusal para delimitar as áreas que serão preservadas na abertura de aces-
so. B) Forma de contorno da abertura coronária dos molares inferiores.

• A abertura de acesso deve ser feita antes do isolamento absoluto, sobretudo em dentes
com giroversão ou inclinações, para não correr o risco de desvios ou perfurações iatro-
gênicas.
• Cáries, restaurações e próteses devem ser completamente removidas para iniciar a fase de
descontaminação coronária.
• As áreas nobres e de resistência do dente, como cíngulo, cristas marginais e área incisal,
devem ser preservadas.
• A abertura de acesso em dentes anteriores pode ser realizada na face vestibular para pre-
servar o cíngulo quando:

o dente estiver indicado para coroa total ou facetas;

existir cárie na face vestibular;

as cristas marginais estiverem comprometidas por cárie ou restaurações.

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Endodontia passo a passo 83

INSTRUMENTAL
• Pontas diamantadas esféricas para alta rotação números ½ e 1 (haste longa) para
demarcação dos pontos anatômicos na superfície oclusal ou lingual/palatina.
• Pontas diamantadas esféricas com haste longa para alta rotação números 1016,
1014 e 1012 para remoção do tecido cariado e restaurações e para realização dos
desgastes necessários no aprofundamento da cavidade de acesso.
• Ponta diamantada 3082 com ponta inativa para remoção do teto da câmara pulpar
(Figura 8.6).

REMOÇÃO DO TETO DA CÂMARA PULPAR

! FIGURA 8.6
Uso da ponta diamantada 3082 (KG Sorensen) para a
remoção do teto da cavidade pulpar.

ACESSO CORONÁRIO EM DENTES COM CALCIFICAÇÕES NA CÂMARA PULPAR


A câmara pulpar sofre modificações anatômicas fisiológicas e patológicas que ocor-
rem com a idade e são decorrentes de estímulos produzidos por cárie, atrição, abra-
são, doença periodontal e procedimentos restauradores. Como resposta aos agentes
agressores, a polpa dental estimula a formação de dentina reacional, que oblitera a
câmara pulpar e dificulta os procedimentos de localização da entrada dos canais ra-
diculares.
Nos dentes com calcificações na câmara pulpar, existem dificuldades para a lo-
calização das entradas dos canais radiculares, mas os princípios para a abertura de
acesso são os mesmos utilizados nos dentes com câmara pulpar normal. É necessário
demarcar os pontos coronários e fazer o desgaste da cavidade, aprofundando o pre-
paro regularmente, sempre na mesma proporção, até encontrar sinais indicativos da
proximidade do assoalho da câmara pulpar. Uma vez no assoalho da câmara pulpar,
é preciso identificar o “olho do canal” – uma área mais esbranquiçada que se destaca
no fundo da cavidade de acesso. Esses passos devem ser feitos com auxílio de micros-
cópio operatório.

Passos
1. Demarcar os pontos para delimitação da área de preparo da cavidade de acesso
de acordo com a morfologia coronária.

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84 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

2. Unir os pontos demarcados, criando sulcos que formam o desenho da cavidade


(forma de contorno).
3. Desgastar a “ilha de dentina” remanescente no centro da cavidade, aprofundan-
do-a regularmente, respeitando sempre os limites da forma de contorno.
4. Desgastar a dentina com broca esférica carbide HL (haste longa) # 4 ou # 5, acio-
nada em motor elétrico redutor na velocidade de 500 a 900 rpm, para identificar
o “olho do canal”.
5. Fazer um novo desgaste no centro dessa área com a broca esférica # 4 e observar
se a marca na dentina permanece no mesmo local (indício de que é o “olho do
canal”).
6. Fazer o isolamento absoluto.
7. Localizar o canal com sonda endodôntica (tipo Rhein), em seguida inserir uma
lima K # 10 e finalmente confirmar o acesso ao canal radicular, utilizando o lo-
calizador eletrônico.

ACESSO EM DENTES ANTERIORES COM CÁRIE E/OU RESTAURAÇÕES NA FACE


VESTIBULAR
Os dentes anteriores com cáries e/ou restaurações nas faces vestibulares ou indicados
para facetas estéticas podem ser acessados pela face vestibular, com o objetivo de pre-
servar o cíngulo e as cristas marginais (Figura 8.7). Esse acesso vestibular, após o tra-
tamento endodôntico, deve ser restaurado com material estético (resina composta) e
posteriormente encaminhado ao protesista para confecção da faceta ou coroa total.

A B C

▲ FIGURA 8.7
A) Canino superior com cárie ocupando toda a face vestibular. B) Acesso endodôntico feito pela
face vestibular após a remoção do tecido cariado. C) Posição da lima na entrada do canal radicular.

LEITURA RECOMENDADA
Cohen S, Burns RC. Caminhos da polpa. 2. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara-Koogan; 1982.

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9
Anestesia em endodontia
MARIA CRISTINA VOLPATO, JOSÉ RANALI,
FRANCISCO CARLOS GROPPO E EDUARDO DIAS DE ANDRADE

CONSIDERAÇÕES GERAIS
A anestesia local não costuma ser um procedimento complicado em Odontologia.
Entretanto, dentes com sintomatologia dolorosa, especialmente na mandíbula, po-
dem demandar um esforço considerável para se obter anestesia eficaz.
A obtenção de anestesia compatível para a realização do tratamento odontoló-
gico requer conhecimento do arsenal terapêutico disponível, bem como das técni-
cas mais apropriadas para cada situação. Com essa finalidade, segue-se uma breve
descrição das soluções anestésicas disponíveis para uso odontológico no Brasil e
das técnicas anestésicas mais adequadas para uso em Endodontia. Como este livro é
direcionado à Endodontia como especialidade, presume-se que haja conhecimento
prévio das noções básicas sobre os componentes da solução anestésica, assim como
das técnicas anestésicas mais utilizadas em Odontologia.

SOLUÇÕES ANESTÉSICAS

Atualmente estão disponíveis para uso odontológico, no Brasil, soluções à base de lidocaína,
mepivacaína, prilocaína, articaína (todas de duração intermediária) e bupivacaína (longa du-
ração), em variadas combinações com vasoconstritores adrenérgicos (epinefrina, norepinefri-
na, corbadrina e fenilefrina) ou em associação à felipressina, que é derivada da vasopressina.

A lidocaína foi a primeira das amidas a ser sintetizada e ainda é muito emprega-
da, tanto em procedimentos na área médica quanto odontológica. No Brasil, é a mais
usada em razão do seu tempo de ação satisfatório, quando associada a vasocons-
tritores, e ainda em função da possibilidade de utilização em um número maior de
pacientes para os quais outras soluções não seriam a primeira escolha, como crianças
e gestantes, por exemplo. Na forma de tubetes odontológicos, pode ser encontrada

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86 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

na concentração de 2%, associada à epinefrina, norepinefrina e fenilefrina. Também


é comercializada nessa concentração sem vasoconstritor, mas a duração da anestesia
pulpar é muito curta com essa formulação, o que restringe o uso odontológico.
No Brasil, a lidocaína está também disponível na concentração de 3% associa-
da à norepinefrina 1:50.000, mas não há vantagem no uso dessa formulação, pois a
lidocaína já é eficaz na concentração de 2%. O uso de concentrações maiores pode
aumentar a possibilidade de sobredosagem, especialmente em pacientes de baixa es-
tatura, com baixa massa corporal. Das formulações à base de lidocaína disponíveis
para uso odontológico no Brasil, a mais útil é a que combina lidocaína a 2% com
epinefrina, pois pode ser empregada em maior número de pacientes. A solução com
menor concentração de epinefrina (1:200.000) pode ser reservada para pacientes
com restrição de dose de vasoconstritor (como os que apresentam alteração cardio-
vascular compensada).
A mepivacaína apresenta menor potência vasodilatadora que a lidocaína e, quan-
do utilizada sem a adição de um vasoconstritor, apresenta duração de anestesia mais
prolongada. Entretanto, quando associada a vasoconstritor, não difere da lidocaína
em termos de eficácia anestésica para uso em Endodontia.1 No Brasil, foi comercia-
lizada na forma de tubetes durante parte da década de 1970, sendo posteriormente
reintroduzida na década de 1990. Hoje, a mepivacaína é comercializada no país na
concentração de 3% sem vasoconstritor e 2% associada à epinefrina 1:100.000 ou
norepinefrina 1:100.000, ou corbadrina 1:20.000.
A prilocaína é o anestésico com menor atividade vasodilatadora (50% menor que
a lidocaína), podendo ser associada a vasoconstritor não adrenérgico e com menor
potência, como é o caso da felipressina. No Brasil, a prilocaína está disponível para
uso odontológico na concentração de 3% associada à felipressina 0,03 UI/mL. O tem-
po de anestesia é equivalente ao das soluções à base de lidocaína.
Dos anestésicos de duração intermediária, a articaína é a que foi introduzida
mais recentemente para uso clínico. É utilizada em concentração maior que os de-
mais (4%) e apresenta estrutura química diferente, com um anel tiofênico em vez do
anel benzênico. Estas duas características, presença do anel tiofênico e maior concen-
tração, podem ser as responsáveis pela sua maior difusibilidade e, consequentemente,
maior eficácia em técnica infiltrativa na região posterior da mandíbula em compara-
ção à lidocaína.2,3
Além dessas características que a distinguem dos demais anestésicos do tipo
amida atualmente em uso em Odontologia, a articaína apresenta um grupo éster, que
lhe confere metabolização mais rápida, pois essa se inicia já no plasma sanguíneo.
Dessa forma, apresenta meia-vida plasmática menor que os demais anestésicos, em
torno de 44 minutos.4
Todavia, o uso de articaína não é recomendado em técnica de bloqueio, pois,
além de não apresentar vantagens em relação às soluções contendo lidocaína,5 foi
observado aumento da incidência de parestesia nesse tipo de técnica com soluções
anestésicas mais concentradas, como é o caso da prilocaína a 4% (essa última não é
comercializada no Brasil) e da articaína a 4%.6-13
A maior vantagem da articaína é observada em técnica infiltrativa vestibular na
região posterior da mandíbula, na qual apresenta eficácia anestésica similar ao blo-
queio do nervo alveolar inferior com solução de lidocaína ou da própria articaína.14,15

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Endodontia passo a passo 87

Entretanto, não existem diferenças significativas entre articaína e lidocaína na eficá-


cia anestésica em dentes maxilares com ou sem pulpite irreversível.16,17
Além dos anestésicos de duração intermediária, existe ainda, para uso odon-
tológico, a bupivacaína, que é comercializada na forma de tubetes na concentração
de 0,5% associada à epinefrina 1:200.000. Esse anestésico é especialmente indicado
quando há necessidade de um tempo de espera para dar início à drenagem de abs-
cessos dentários, com sinais locais de disseminação ou manifestações sistêmicas da
infecção, pela necessidade de se obter níveis plasmáticos adequados da dose inicial
de ataque do antibiótico. Como a bupivacaína proporciona tempo de anestesia pulpar
de 4,5 a 7 horas em molares e pré-molares, após bloqueio do nervo alveolar inferior,
o paciente pode aguardar o atendimento anestesiado, sem a necessidade de um novo
18,19
bloqueio.
O outro uso preconizado para a bupivacaína, com a finalidade de promover
maior tempo de anestesia de tecidos moles, permitindo menor utilização de analgési-
cos no período pós-operatório, tem sido questionado ultimamente. Foi demonstrado
que o emprego da bupivacaína (sem associação de anti-inflamatório previamente ao
procedimento cirúrgico), embora diminua a dor por cerca de 4 horas após a cirurgia,
pode aumentar a intensidade dela após 24 horas, se comparado ao observado em
pacientes que receberam bupivacaína como anestésico e rofecoxib antes da cirurgia,
ou que receberam lidocaína como anestésico, associada ou não ao uso prévio do anti-
-inflamatório.20 Essa maior intensidade de dor foi atribuída à liberação de prosta-
glandina E2 no local inflamado, um autacoide que causa hiperalgesia, provocada pela
própria bupivacaína. Dessa forma, quando esse anestésico for utilizado para controle
da dor pós-operatória, é necessária também a associação de um anti-inflamatório
para controle adequado da dor.21
Considerando os vasoconstritores de forma isolada, em pacientes saudáveis não
há restrição ou preferência por qualquer um dos disponíveis para uso odontológico,
respeitando suas doses máximas. No entanto, em pacientes portadores de altera-
ção cardiovascular controlada, deve-se dar preferência à epinefrina e à felipressina,
para as quais há evidências de segurança no uso.22-24 As doses máximas recomen-
dadas para esses pacientes são de 0,04 mg de epinefrina (equivalente a dois tubetes
[com 1,8 mL] contendo epinefrina na concentração de 1:100.000 ou quatro tubetes
contendo epinefrina 1:200.000) e 0,18 UI de felipressina (equivalente a três tubetes
contendo felipressina na concentração de 0,03 UI/mL).25-26 Pacientes com alteração
cardiovascular não controlada devem ser atendidos preferencialmente em ambiente
hospitalar.

TÉCNICAS ANESTÉSICAS NA MAXILA


Na maxila, quase 100% dos procedimentos que requerem anestesia podem ser rea-
lizados com uso de técnica infiltrativa na região vestibular (para anestesia da polpa
dental, periósteo/osso e gengiva vestibular) e na palatina (para anestesia da gengiva
dessa região). Contudo, técnicas de bloqueio podem ser mais adequadas quando se
deseja maior tempo de anestesia pulpar, ou ainda quando diversos dentes devem ser
tratados em sessão única. Todas as soluções anestésicas disponíveis para uso odonto-
lógico promovem anestesia adequada nessa região.

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88 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

TÉCNICAS ANESTÉSICAS NA MANDÍBULA


A anestesia dos incisivos mandibulares pode ser conseguida com alto grau de sucesso
(92%) administrando-se, por técnica infiltrativa, o conteúdo de meio tubete de so-
lução anestésica por vestibular e meio tubete na região lingual.27 Para o canino e os
pré-molares, pode ser utilizada a técnica mentoniana e, quando se deseja intervir na
região de molares, pode ser utilizada a técnica clássica de bloqueio do nervo alveolar
inferior, ou ainda a técnica de Gow-Gates, na qual o nervo mandibular é anestesiado
antes de se dividir nos seus ramos. Para pacientes com dificuldade em abrir a boca,
pode-se recorrer à técnica de Vazirani-Akinosi.
Quando o paciente apresenta abscesso na região onde deve ser introduzida a
agulha na técnica clássica de bloqueio dos nervos alveolar inferior e lingual, pode-se
recorrer à utilização da técnica extrabucal para bloqueio desses nervos.

ESCOLHA DA TÉCNICA E DA SOLUÇÃO ANESTÉSICA MAIS ADEQUADAS PARA


USO EM ENDODONTIA
Como já mencionado, a maior dificuldade para obtenção de anestesia eficaz ocorre
em dentes da região posterior da mandíbula, molares e pré-molares. Nesses casos,
sempre fica a dúvida se a técnica de bloqueio deve ou não ser repetida quando não
se obtém sucesso.
Embora a observação de anestesia do lábio inferior não forneça indicação pre-
cisa quanto à eficácia ou não do bloqueio do nervo alveolar inferior, é certo que, na
ausência de anestesia nesse local, há falha na anestesia, ou seja, a solução anestésica
deve ter sido injetada longe do nervo alveolar inferior. Nesse caso, deve-se avaliar
adequadamente a anatomia do paciente e refazer a anestesia (o próprio bloqueio do
nervo alveolar inferior, ou uma técnica de bloqueio mais alta, como é o caso da téc-
nica de Gow-Gates, na qual a agulha atinge o colo do côndilo da mandíbula). Para
bloqueios, pode-se utilizar solução de lidocaína, mepivacaína ou bupivacaína asso-
ciada à epinefrina, ou ainda prilocaína associada à felipressina. Conforme comen-
tado, deve-se evitar a articaína nesse tipo de técnica pelo maior risco de indução de
parestesia.
Muitas vezes o paciente acusa anestesia do lábio inferior e até mesmo dos den-
tes inferiores, mas ainda apresenta sensibilidade no dente com comprometimento
endodôntico, não permitindo o tratamento. Nesses casos não há vantagem em se
fazer um novo bloqueio, pois a literatura mostra que o uso de volume maior (dois
tubetes) não aumenta de forma clinicamente aceitável a taxa de sucesso da anes-
tesia.16, 28, 29 Como alternativa, pode-se utilizar a técnica infiltrativa vestibular com
solução de articaína a 4% com epinefrina 1:100.000, o que aumenta a taxa de su-
16, 30
cesso da anestesia. Caso o paciente tenha alteração cardiovascular compensada,
pode-se utilizar solução de articaína a 4% com menor concentração de epinefrina
(1:200.000).
Se, após essa complementação, o dente continuar apresentando sensibilidade, a
técnica intraligamentar é outra opção viável, caso ainda não tenha sido exposta a câ-
mara pulpar. Nesse caso, é importante que a agulha seja colocada entre o cemento e o
osso para que a anestesia seja eficaz. O volume de injeção é de aproximadamente 0,2

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Endodontia passo a passo 89

mL, sendo o anestésico injetado sob pressão. Em dentes multirradiculares, a injeção


deve ser realizada em cada uma das raízes. Nesse tipo de técnica não parece haver
diferença entre soluções quanto à eficácia, conforme observado na comparação entre
articaína e lidocaína.31
Na persistência da sensibilidade do dente que impossibilite o tratamento, há
ainda duas alternativas. Caso a câmara pulpar ou os canais radiculares já tenham
sido expostos, pode ser realizada a técnica intrapulpar, que consiste na introdução
da agulha na câmara ou em cada canal radicular (ou em um canal específico, no qual
ainda haja sensibilidade à introdução do instrumento endodôntico) na profundidade
máxima possível, seguindo-se a injeção do líquido anestésico sob pressão. A injeção
sob pressão é fundamental para o sucesso da técnica.32 Embora seja bastante eficaz,
essa técnica é muito dolorosa.
Ainda como alternativa, se houver persistência da sensibilidade dentária, espe-
cialmente quando não se conseguiu o acesso à câmara pulpar, pode-se empregar a
técnica intraóssea. Embora essa técnica tenha nascido na década de 1930, a partir de
1990 teve um ressurgimento em função da criação de dispositivos específicos que fa-
cilitam sua realização. Apesar de não ser uma técnica complexa, exige treinamento e
atenção quanto à anatomia das raízes a fim de evitar a trepanação delas. Quando uti-
lizada em casos de falha de outras técnicas, pode promover taxas de sucesso que va-
riam de 68 a 100%, com mepivacaína a 3%, lidocaína a 2% com epinefrina 1:100.000
ou 1:80.000 e articaína a 4% com epinefrina 1:100.000, em volumes variando de 0,45
a 1,8 mL (de um quarto a um tubete anestésico).33-39
A técnica intraóssea também pode ser usada como técnica principal, sendo re-
latadas taxas de sucesso de 87% com uso de um tubete de lidocaína a 2% com epine-
frina 1:100.00040 e de 93,1% e 96,8%, respectivamente, com o uso de meio tubete de
articaína a 4% com epinefrina 1:200.000 e 1:100.000.41 A técnica consiste em perfurar
a cortical óssea e injetar de meio a um tubete do anestésico na porção medular do
osso. A perfuração deve ser feita 2 a 4 mm em direção apical à intersecção de duas
linhas (horizontal, passando pela margem gengival dos dentes, e vertical, passando
pelo centro da papila interdental). Geralmente se faz a perfuração na região distal do
dente-alvo, a não ser que o espaço seja insuficiente entre as raízes ou em função da
presença do forame mentoniano. A injeção deve ser muito lenta (dois minutos para
injeção de meio tubete) para minimizar o efeito do vasoconstritor sobre o sistema
cardiovascular; deve-se advertir o paciente sobre a possibilidade de ocorrência de
taquicardia transitória (palpitação).
A Figura 9.1 mostra o fluxograma das possibilidades de escolha de técnicas para
a anestesia de dentes com pulpite irreversível com sintomatologia dolorosa.
Na tentativa de se obter anestesia eficaz e melhor controle da dor em dentes com
sintomatologia dolorosa, têm sido propostas associações de soluções anestésicas lo-
cais e anti-inflamatórios e analgésicos de ação central, entre outras. Entretanto, os re-
sultados até o momento são conflitantes42-50 e ainda não há suporte teórico adequado
para essa prática.

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90 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Dente posterior na mandíbula com pulpite irreversível e sintomatologia dolorosa

Bloqueio do NAI

Sucesso Insucesso Insucesso


(sem anestesia de lábio) (dente sensível, lábio anestesiado)

Outro bloqueio: Infiltração ves!bular


• NAI ou Insucesso (com ar!caína 4% com epinefrina)
• Gow-Gates
Sucesso Insucesso

Sucesso
Intraligamentar
Sucesso Insucesso

Intrapulpar Intraóssea
Sucesso Sucesso Insucesso

Repe!r Intraóssea

▲ FIGURA 9.1
Fluxograma de escolha de técnica anestésica para anestesia de dentes com pulpite irreversível.

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Endodontia passo a passo 91

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10
Isolamento absoluto
em endodontia
PATRICK BALTIERI

CONSIDERAÇÕES GERAIS
A necessidade de trabalhar em campo livre de umidade e contaminação é impera-
tiva para o sucesso da terapia endodôntica. Para isso, se faz necessária a adequada
instalação do isolamento absoluto. Esse dispositivo foi proposto pelo dentista nova-
-iorquino Sanford Christie Barnum, em 1864, para a confecção de restaurações den-
tárias por meio da condensação de ouro coesivo, que exigia um campo de trabalho
livre de umidade. Com o desenvolvimento da odontologia, a colocação de um lençol
de borracha ao redor dos dentes teve sua real importância demonstrada, tornando-
-se indispensável em praticamente todos os procedimentos odontológicos, sobretudo
para as restaurações adesivas e a Endodontia.

O isolamento absoluto bem-instalado torna os procedimentos endodônticos mais convenien-


tes para o endodontista e confortáveis para o paciente, apresentando os seguintes benefícios:
• Facilita e aumenta a eficiência do procedimento clínico.
• Protege o paciente contra a deglutição ou aspiração acidental de instrumentos, fragmen-
tos dentais, restaurações e substâncias cáusticas usadas durante a Endodontia.
• Minimiza a exposição da equipe odontológica à contaminação cruzada decorrente dos ae-
rossóis no consultório odontológico, que podem conter diversos agentes infectocontagiosos,
como os vírus da hepatite ou da imunodeficiência adquirida (HIV), entre outros patógenos.
• Melhora a visibilidade pelo afastamento e pela proteção dos tecidos moles (bochecha, lá-
bio e língua), que podem ser feridos pela ação de brocas ou instrumentos endodônticos.
• Impede a recontaminação do campo operatório pelos microrganismos orais.
• Evita a infiltração de saliva, propiciando campo operatório seco.
• Evita o embaçamento do espelho pelo vapor proveniente da respiração.
• Previne infiltração de sangue e/ou exsudato gengival.
• Torna o trabalho mais cômodo, limpo e rápido.
• Evita ações de ordem médico-legal.

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Endodontia passo a passo 93

Frente a esses benefícios, o dique de borracha deve ser utilizado em praticamente


todos os procedimentos odontológicos, não existindo contraindicações para sua insta-
lação. Entretanto, diversos levantamentos relatam a baixa prevalência de uso de tal dis-
positivo entre os cirurgiões-dentistas. Segundo Palmer e colaboradores,1 apenas 30,3%
dos dentistas realizavam o isolamento em todos os procedimentos endodônticos.
Diversos problemas podem decorrer da não utilização do isolamento absolu-
to, sendo os mais graves aqueles que envolvem a deglutição ou a aspiração de ins-
trumentos, como limas endodônticas, brocas, etc., ocasionando complicações que
colocam a vida do paciente em risco e exigem atendimento médico imediato para
sua resolução. Transtornos como queimaduras em pele e mucosa por substâncias
cáusticas, como o hipoclorito de sódio usado durante a terapia endodôntica, também
podem ser evitados com a correta instalação do dique de borracha. Dessa forma, a
não utilização do dique de borracha pode transformar, a qualquer momento, um pro-
cedimento odontológico de rotina numa emergência médica de final imprevisível.
A utilização do isolamento absoluto pode ficar comprometida e exigir modifica-
ções em algumas condições apresentadas por uma pequena parcela de pacientes. As
condições que demandam maior atenção por parte do profissional são os quadros de
reações alérgicas ao látex do lençol de borracha e os quadros de fobia, comuns em pa-
cientes com alto nível de estresse e ansiedade. Dependendo da intensidade da reação
de hipersensibilidade, a consequência pode ser um leve rubor na pele, o desenvolvi-
mento de dermatite de contato ou mesmo reações anafiláticas em casos mais graves,
que exigem pronto atendimento médico.
Normalmente, os pacientes alérgicos ao látex são cientes de sua condição e, no mo-
mento da anamnese, informam o fato ao cirurgião-dentista. No entanto, a hipersensibi-
lidade ao látex não pode ser uma justificativa para a não utilização do isolamento abso-
luto, pois existem alternativas que podem ser empregadas para superar esse problema.
Nessas condições, o cirurgião-dentista deve solicitar informações detalhadas ao médico
responsável sobre o quadro clínico do paciente, além de substituir todos os materiais
que possuem látex em sua composição, utilizando substitutos de vinil, silicone, etc.

MATERIAL E INSTRUMENTOS

! FIGURA 10.1
Organização da mesa clínica com os ma-
teriais e instrumentais para o isolamento
absoluto.

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94 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Os materiais e instrumentais necessários (Figura 10.1) para a correta instalação


do isolamento absoluto incluem:
• Aspirador de saliva
• Espátula para inserção de resina número 1
• Curetas periodontais ou ponta de ultrassom para remoção de cálculo supragen-
gival
• Pinça porta-grampo tipo Ivory
• Alicate perfurador de lençol de borracha tipo Ainsworth
• Arco tipo Ostby
• Lençol de borracha
• Grampos para isolamento absoluto números 210, 211, 212, 206, 207, 208, 209, 200,
201, 202, 205, W8A, 14, 14A, entre outros
• Ponta diamantada FG 2200 e 3200
• Fio dental
• Cianoacrilato na forma líquida (p. ex., Super Bonder®)
• Monômero de resina acrílica
• Barreira gengival (p. ex., TopDam®)
• Gel de clorexidina a 2% (Endogel®)
• Haste flexível (Cotonetes®)
• Cureta periodontal (Cureta McCall 13/14)

PASSOS
A instalação do isolamento absoluto deve seguir um protocolo passo a passo, possi-
bilitando que seja realizado com eficiência e durabilidade até o final da terapia endo-
dôntica. Esse protocolo é descrito a seguir.
O preparo inicial envolve procedimentos que visam preparar o dente e a região
para a instalação do isolamento absoluto (destacam-se os procedimentos das Figuras
10.2 a 10.13).

▲ FIGURA 10.2 ▲ FIGURA 10.3


Remoção de cálculo supragengival. Remoção de tecido cariado, de esmalte sem
suporte, de arestas cortantes e de restaura-
ções coronárias.

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Endodontia passo a passo 95

▲ FIGURA 10.4 ▲ FIGURA 10.5


Verificação do ponto de contato com fio dental Escolha e instalação do grampo.
e restabelecimento do espaço interproximal.

▲ FIGURA 10.6 ▲ FIGURA 10.7


Passagem do lençol de borracha pelo grampo Invaginação do lençol de borracha no sulco
posicionado. gengival com auxílio da espátula de inserção
de resina e fio dental.

▲ FIGURA 10.8 ▲ FIGURA 10.9


Aplicação do cianoacrilato com auxílio da espá- Aplicação de uma camada de barreira gengival
tula # 1, seguida da aplicação de algumas gotas para estabilizar o conjunto durante todo o tra-
de monômero de resina composta para acele- tamento endodôntico.
rar a polimerização do cianoacrilato (cuidado
com os olhos do paciente).

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96 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

▲ FIGURA 10.10 ▲ FIGURA 10.11


Descontaminação do campo operatório isola- Ao final do tratamento endodôntico e sela-
do mediante aplicação do gel de clorexidina mento da cavidade de acesso com materiais
a 2%. adesivos, realiza-se a remoção do isolamento
absoluto, da barreira gengival e do cianoacrila-
to com auxílio de uma cureta periodontal.

▲ FIGURA 10.12 ▲ FIGURA 10.13


Verificação da completa remoção de quaisquer Acabamento e polimento do selamento coro-
restos de materiais do espaço subgengival. nário com materiais adesivos.

SUPERANDO DIFICULDADES
Algumas situações clínicas requerem adaptações para promover o adequado isola-
mento absoluto do dente a ser tratado endodonticamente, destacando-se:
• Dentes com extensa destruição coronária.
• Confecção de núcleo de preenchimento com resina composta.
• Isolamento à distância em dentes traumatizados (Figura 10.14), com aparelho or-
todôntico ou pilares de prótese fixa.
• Cirurgia de aumento de coroa clínica ou gengivectomia com bisturi elétrico (Figu-
ras 10.15 a 10.17).

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Endodontia passo a passo 97

• Dentes com morfologia coronária desfavorável/expulsiva:


Utilização de grampos especiais com mordentes inclinados para o colo.

Confecção de retenção com resina composta nas faces lingual ou vestibular.


Sulco nas faces vestibular ou lingual.


Colocação do grampo sobre a gengiva.


▲ FIGURA 10.14 ▲ FIGURA 10.15


Isolamento à distância para tratamentos de Remoção da gengiva com auxílio de eletrocau-
dentes com traumatismo. tério ou gengivoplastia com bisturi.

" FIGURA 10.16


Isolamento absoluto após remoção da gengiva.

A B

▲ FIGURA 10.17
A) Isolamento absoluto após remoção da gengiva com eletrocautério e proteção do tecido com
Coltosol. B) Reconstrução de uma muralha para manter um perfeito isolamento.

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98 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

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11
Substâncias químicas
auxiliares e irrigação
MARCELLE LOUISE SPOSITO BOURREAU,
ANTÔNIO RUBENS GONÇALVES NUNES E FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

CONSIDERAÇÕES GERAIS
As substâncias químicas auxiliares e a irrigação dos canais radiculares têm sido uma
importante área de interesse na Endodontia, e as razões para isso são claras: o suces-
so no tratamento endodôntico é baseado na erradicação de bactérias do sistema de
canais radiculares. Apesar da longa tradição em pesquisa na irrigação, ainda existem
muitos desafios a serem superados, e não há nenhuma substância química que, sozi-
nha, seja capaz de garantir um sistema de canais radiculares completamente livre de
bactérias, sobremaneira nas proximidades do forame apical, área mais diretamente
envolvida na iniciação e na manutenção da inflamação apical.
O desafio da Endodontia está relacionado não apenas com a dificuldade de lim-
par essa parte do canal por meio da instrumentação e da irrigação, mas sobretudo
com a segurança, uma vez que, com as novas diretrizes já consolidadas da Endodon-
tia (que preconiza a patência e limpeza do forame apical), o risco de extravasamento
de substâncias químicas agressivas para o periápice é maior, podendo causar proces-
sos inflamatórios indesejáveis naquela região.
Essa discussão conceitual apresenta significativa relevância, visto que o hipo-
clorito de sódio, em variadas concentrações, tem sido usado, há muitos anos, como
substância irrigadora no tratamento de canais radiculares. Sua utilização, apesar da
alta toxicidade, ainda hoje prevalece devido à falsa ideia de apresentar ação solvente
de restos pulpares em istmos e reentrâncias no interior do canal radicular. Apesar da
excelente ação antimicrobiana, em altas concentrações seu uso representa um alto
risco de provocar acidentes de repercussões importantes em caso de extravasamento
para o periápice – a literatura apresenta inúmeros relatos desse tipo de acidente.
Dessa forma, o papel das substâncias químicas auxiliares deve ser rediscutido na
Endodontia.

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100 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

SUBSTÂNCIA QUÍMICA AUXILIAR E SUBSTÂNCIA IRRIGADORA


É importante definir os papéis da substância química auxiliar e da substância irri-
gadora durante o preparo e a instrumentação dos canais radiculares. Não existem
razões para reunir em uma só substância química as funções de lubrificação, descon-
taminação e lavagem do canal radicular.
Uma substância química auxiliar deve ter não somente uma efetiva ação bacte-
ricida para eliminar microrganismos e controlar a infecção do canal radicular, mas,
principalmente, uma efetiva ação lubrificante. Essa ação é de suma importância por-
que facilita a ação de corte dos instrumentos durante a instrumentação (torna mais
fácil o deslizamento das lâminas durante o corte da dentina), além de preservar os
instrumentos e evitar o aquecimento e o estresse causado pelo excesso de atrito.
Já a substância irrigadora tem o objetivo específico de auxiliar na remoção dos
detritos esparsos no canal radicular resultantes da ação dos instrumentos nas paredes
do canal. A irrigação dos canais radiculares pode ser feita com auxílio de seringa
e agulha com calibre compatível com o diâmetro do canal radicular ou mediante
vibração ultrassônica, ativa ou passiva. De qualquer modo, a substância irrigadora
deve ser biocompatível e inerte para evitar danos aos tecidos periapicais durante o
extravasamento através do forame apical.

ESCOLHA DA SUBSTÂNCIA QUÍMICA AUXILIAR: HIPOCLORITO DE SÓDIO OU


CLOREXIDINA?
Propriedades do hipoclorito de sódio
O hipoclorito de sódio (NaOCl) é a substância química mais usada na Endodontia,
principalmente pela sua ação antimicrobiana e capacidade de dissolução de tecido
orgânico. Costuma ser utilizada simultaneamente como substância química auxiliar
e agente de irrigação em diferentes concentrações: líquido de Dakin (0,5%), solução
de Milton (1%), solução de Labarraque (2,5%) e soda clorada (5,25%). A literatura,
em geral, refere que a ação antimicrobiana mais efetiva ocorre nas concentrações
mais altas da substância, mas também há relatos de que essas concentrações apresen-
tam os maiores níveis de toxicidade.
Assim, ainda permanecem controvérsias sobre a real capacidade de dissolução
tecidual nas áreas de istmos e reentrâncias. As dúvidas incluem o tempo de contato
da substância com os tecidos e a concentração e o volume utilizados nessa etapa do
tratamento. Essa deficiente capacidade solvente pode ser avaliada em publicações
científicas que demonstram restos teciduais em istmos e reentrâncias em canais irri-
1
gados com hipoclorito de sódio em altas concentrações.
Restos pulpares, necróticos ou não, devem ser removidos mecanicamente do in-
terior dos canais radiculares por meio da instrumentação de istmos e reentrâncias e,
principalmente, pela irrigação ativa com soro fisiológico (solução biocompatível),
que pode ser feita com seringas e agulhas de calibre adequado, sob pressão, ou com
aparelhos ultrassônicos.
Não existe substância capaz de dissolver restos de tecido pulpar em istmos, re-
entrâncias e canais laterais. Trabalhos publicados na literatura comprovam tal ine-
ficiência.2 Para que uma substância química tenha ação solvente, é necessário um
volume constante no interior dos canais, tempo para que a ação solvente se realize e

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Endodontia passo a passo 101

concentração adequada da solução química. No tratamento de canal radicular, essas


condições não podem ser reproduzidas.
O hipoclorito tem uma ação de microdissolução tecidual dentro do conduto
agindo apenas em nível molecular sobre microscópicos restos necróticos e pulpa-
res, exatamente como faz com o colágeno da parede dentinária. O fato de remover
restos pulpares ou necróticos de maneira tão microscópica deixa intacta a grande
maioria de restos pulpares ou necróticos que são vistos em polos e istmos de cortes
histológicos após o preparo com altas concentrações de hipoclorito, sendo, portanto,
uma ação de dissolução tecidual irrelevante para o sucesso da terapia endodôntica
(Figuras 11.1 e 11.2).

▲ FIGURA 11.1 ▲ FIGURA 11.2


Área de istmo contendo restos de tecido pul- Maior aumento da Figura 11.1 mostrando que
par em canais instrumentados com hipoclorito a substância química foi incapaz de dissolver o
de sódio a 5,25%. tecido pulpar.
Fonte: Freire.3 Fonte: Freire.3

Vantagens
• Excelente ação antimicrobiana.

Desvantagens
• Alta toxicidade e risco de acidentes pela injeção da solução no periápice, resultan-
do em severas reações inflamatórias (principal desvantagem).
• Instabilidade de armazenamento (prejudica a identificação da concentração da
substância durante o uso).
• Propriedade irritante para a pele e mucosa (o uso diário em pacientes pode ser
arriscado pela proximidade com que se trabalha durante o procedimento clínico).
• Possibilidade de descolorir ou manchar roupas.
• Cheiro muito forte e desagradável.
• Possibilidade de remover o carbono do dique de borracha (por vezes pode provo-
car até a ruptura do dique durante o procedimento).
• Propriedade corrosiva aos instrumentos.
• Baixa atividade lubrificante.

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102 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Propriedades do gel de clorexidina a 2%


Propriedade reológica e tixotrópica dos géis
A escolha da clorexidina a 2% na forma de gel como substância química auxiliar
apresenta inúmeras vantagens que vão muito além da excelente atividade antimicro-
biana. O gel apresenta capacidade lubrificante e evita o estresse por atrito do instru-
mento nas paredes do canal, facilita o corte da dentina e reduz o desgaste e a perda
de efetividade do corte de suas lâminas. Além disso, os géis apresentam escoamento
e comportamento pseudoplásticos e são amplamente estudados na área de reologia
de materiais.
A reologia pode ser definida como a ciência que estuda o escoamento da ma-
téria. O termo reologia vem do grego rheo (fluxo) e logos (ciência) e foi sugerido
por Bingham e Crawford para descrever as deformações de sólidos e a fluidez de
líquidos.4,5
Além da pseudoplastia referida, todos os géis apresentam caráter tixotrópico, ou
seja, tornam-se mais fluidos quando submetidos a uma ação de carga (p. ex., ação dos
instrumentos rotatórios), e recuperam a viscosidade no momento em que se encerra
essa ação. Nas formulações de uso tópico, por exemplo, nos xampus, cremes e tintas,
a ação tixotrópica é bastante almejada, pois elas se deformam durante a aplicação, ou
seja, tornam-se mais fluidas, facilitando o espalhamento, e recuperam a viscosidade
inicial no momento que se encerra a aplicação.
No canal radicular, o gel de clorexidina torna-se mais fluido quando submetido
a uma carga de cisalhamento (instrumento rotatório). A ação tixotrópica do gel é a
propriedade que permite, durante a instrumentação, manter em suspensão as partí-
culas de dentina e debris, que se encadeiam umas às outras, formando uma matriz
mais rígida.
Essa propriedade tixotrópica pode ser nitidamente observada durante a instru-
mentação do canal radicular com o gel de clorexidina, sobretudo quando se utili-
zam instrumentos rotatórios ou reciprocantes. Após a retirada da força cisalhante,
o sistema volta à sua conformação original, recuperando novamente a viscosidade
aparente inicial, aprisionando as partículas de dentina liberadas das paredes do canal,
que podem ser removidas mediante um efetivo fluxo de irrigação. Esse fenômeno foi
observado por Ferraz e colaboradores,6 que perceberam em microscopia eletrônica
de varredura (MEV) uma menor formação de smear layer nas paredes dentinárias
quando instrumentadas com gel de clorexidina.

Substantividade ou ação residual


Devido às suas propriedades catiônicas (carga positiva), a clorexidina pode se ligar a
superfícies e substratos aniônicos (carga negativa), como a hidroxiapatita da denti-
na, e ser liberada em níveis terapêuticos após a sua remoção – fenômeno conhecido
como substantividade ou ação residual.7,8 Trabalhos mostram que a substantividade
pode permanecer 48 horas,9 72 horas, quatro semanas10 e até 12 semanas11 depois da
instrumentação.
Essa propriedade é perfeitamente adequada para a Endodontia porque, mesmo
após a finalização da instrumentação e obturação dos canais radiculares, as molé-

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Endodontia passo a passo 103

culas de clorexidina aderidas na dentina mantêm as propriedades antimicrobianas


por um período maior. A interação da dentina com a clorexidina depende do nú-
mero de moléculas disponíveis na solução. Em baixas concentrações (até 0,01%), há
poucas moléculas de clorexidina – elas apenas modificam as propriedades físicas e
químicas das superfícies dentais e reduzem a colonização bacteriana. Em altas con-
centrações, o excesso de clorexidina pode ser rapidamente liberado para o ambiente
circundante.12

Ação nos túbulos dentinários


A efetividade antibacteriana da clorexidina e sua substantividade foram observadas
numa profundidade de 500 µm nos túbulos dentinários.13,14 Essa constatação é rele-
vante comparativamente, já que outros trabalhos microbiológicos demonstraram que
os microrganismos penetram, em geral, de 300 a 450 µm.15

Efeito modulador da dentina


A clorexidina é significativamente inibida pela albumina presente nos exsudatos in-
flamatórios e nas células microbianas mortas16 e, portanto, precisa ser renovada vá-
rias vezes durante o preparo químico mecânico. Por outro lado, a hidroxiapatita não
tem nenhum efeito inibitório na atividade antimicrobiana da clorexidina e, desde que
ocorra a sua adsorção, a ação antimicrobiana continua, compensando uma possível
inibição inicial pelo exsudato inflamatório.

ADESÃO DENTINÁRIA
A utilização de substâncias químicas na Endodontia durante o preparo químico-
-mecânico pode modificar a estrutura da dentina, sobretudo o colágeno, o que
contribui consideravelmente para alterar as propriedades mecânicas dessa estru-
tura, conforme demonstraram Moreira e colaboradores.17 Esse estudo avaliou o
efeito de diferentes substâncias químicas auxiliares (Figura 11.3) durante o tra-
tamento endodôntico em paredes do canal radicular mediante implementação
de microscopia de luz polarizada (MLP) e microscopia eletrônica de varredura
(MEV).
A integridade da estrutura dentinária é importante durante a fase de hibridi-
zação dos sistemas adesivos. Substâncias que provocam a dissolução do colágeno
comprometem a força de adesão entre o sistema adesivo e a estrutura dental e, con-
sequentemente, colocam em risco a qualidade e durabilidade de restaurações diretas
e cimentações de pinos.18
Para a adesão dentinária, é importante que a substância química não interfira no
substrato dentinário (colágeno da matriz orgânica da dentina). É descrito na literatu-
ra que o NaOCl provoca alteração do colágeno, o que prejudica a adesão. Por outro
lado, a clorexidina preserva a estrutura dentinária, o colágeno e a hidroxiapatita, já
que é um agente antioxidante.17

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104 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

A B C

D E F

▲ FIGURA 11.3
Birrefringência dos grupos. A) Grupo-controle – cloreto de sódio a 0,9%. B) Hipoclorito de sódio a
5,25% + ácido etilenodiaminotetracético (EDTA) a 17%. C) Gel de clorexidina a 2%. D) Hipoclorito
de sódio a 5,25%. E) EDTA a 17%. E) Gel de clorexidina a 2% + EDTA a 17%.
Fonte: Moreira e colaboradores.17

DISSOLUÇÃO DE TECIDO PULPAR


A clorexidina não dissolve tecido pulpar. O tecido pulpar localizado em istmos e
reentrâncias deve ser removido mediante instrumentação, uma vez que estão loca-
lizados, principalmente, nos terços cervical e médio das raízes e canais achatados
(Figuras 11.4 a 11.7).

▲ FIGURA 11.4 ▲ FIGURA 11.5


A) Área de reentrância em canal achatado Maior aumento da Figura 11.4.
mostrando o tecido pulpar preservado após Fonte: Freire.3
instrumentação com gel de clorexidina a 2%.

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Endodontia passo a passo 105

Persistência de sangramento no interior do canal

Depois da realização da patência e da ampliação do forame apical, pode ocorrer um pequeno


sangramento, que deve cessar imediatamente após a irrigação com soro fisiológico. O sangra-
mento do ligamento periapical não é persistente, pois assim que o tecido conjuntivo é atingi-
do pelo instrumento endodôntico ocorre a formação do coágulo. Em geral, um sangramento
consistente ocorre devido a restos pulpares no interior do canal radicular. Essa é mais uma
qualidade do gel de clorexidina, pois o sangramento no canal somente vai cessar após a remo-
ção de todo o tecido pulpar. Por outro lado, o hipoclorito de sódio cessa o sangramento, mas
não remove o tecido pulpar que fica impregnado nas áreas de reentrâncias do canal radicular.

▲ FIGURA 11.6 ▲ FIGURA 11.7


Canal circular no terço apical mostrando o teci- Canal apical circular sem a presença de tecido
do pulpar antes da instrumentação. pulpar após a instrumentação.
Fonte: Freire.3 Fonte: Freire.3

APLICAÇÕES DA CLOREXIDINA COMO MEDICAÇÃO INTRACANAL


O tratamento endodôntico é uma microcirurgia que deve ser realizada, se possível,
em sessão única, sendo indiferente o estado pulpar (vital ou necrose) ou a presença
de lesão periapical crônica. Tecnicamente, desde que se obtenha a secagem dos canais
radiculares, esses podem ser obturados na mesma sessão. No entanto, por motivos
exclusivamente associados a dificuldades técnicas, complexidades anatômicas ou
problemas sistêmicos dos pacientes, o tratamento de canal radicular pode ser rea-
lizado em duas ou mais sessões. O índice de sucesso, a curto ou longo prazo, é igual.
Devido às propriedades mencionadas antes e pela facilidade de sua aplicação
e remoção do interior dos canais, a clorexidina na forma de gel pode ser utilizada
como medicação intracanal entre as sessões de tratamento em períodos curtos (uma
ou duas semanas).
Nos períodos mais longos, é mais apropriado usar a associação gel de clorexidina
+ Ca(OH)2 (pó) para promover uma barreira física, obturando o espaço do canal ra-
dicular com o objetivo de prevenir ou retardar um novo crescimento bacteriano.19-21

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106 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Essa medicação mostrou, in vitro, capacidade de difusão na dentina radicular e


inibição do crescimento bacteriano14 e, por essa razão, pode permanecer no interior
dos canais radiculares por um período de tempo maior. A Figura 11.8 mostra o resul-
tado da pesquisa in vitro realizada em dentes humanos unirradiculares, instrumenta-
dos, esterilizados e selados com as medicações testadas em seu interior.

1 1

A B ! FIGURA 11.8
2 Halos de inibição de crescimento para Ente-
2 rococcus faecalis produzidos pelas diferentes
medicações intracanal, quando o cemento ra-
dicular foi removido ou não. A) Hidróxido de
cálcio + soro fisiológico: 1 – sem raspagem, 2 –
1 com raspagem. B) Hidróxido de cálcio + gel de
1
clorexidina a 2%: 1 – com raspagem, 2 – sem
C D raspagem. C) Gel de clorexidina a 2%: 1 – sem
2 2 raspagem, 2 – com raspagem. D) Hidróxido de
cálcio + óxido de zinco + gel de clorexidina a
2%: 1 – sem raspagem, 2 – com raspagem.

Essa pesquisa conclui que o gel de clorexidina a 2% e suas associações com hi-
dróxido de cálcio e óxido de zinco demonstraram rápida capacidade de difusão na
dentina radicular, ocasionando inibição de crescimento bacteriano na placa Agar.22

Outras vantagens do gel de clorexidina


• Amplo espectro antimicrobiano.
• Solubilidade em água quando preparado com gel à base de Natrozol, que é ampla-
mente utilizado na fabricação de xampus e sabonetes.23
• Mínima toxicidade para os tecidos periapicais – essa é considerada uma das prin-
cipais razões para a utilização da clorexidina como substância química auxiliar.24
• O produto tixotrópico tende a ter maior vida de prateleira (shelf-life), pois, durante
o armazenamento, ele apresenta viscosidade constante, o que dificulta a separação
dos constituintes da formulação.25
• A estabilidade química é maior entre pH 5 e 8 quando armazenado à temperatura
ambiente em embalagem capaz de proteger da luz.
• Inexistência de reações alérgicas e resistência bacteriana.
A adsorção da clorexidina pela dentina facilita a absorção do adesivo pelos tú-
bulos dentinários26 e, além disso, estudos mostraram que a substância melhora a
longevidade da adesão pela inibição de metaloproteinases, enzimas que degradam o
colágeno da camada híbrida. Tais substâncias, que estão contidas na dentina, tornam
a camada híbrida mais estável, melhorando a força de adesão.27-31

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Endodontia passo a passo 107

ASSOCIAÇÃO DO HIPOCLORITO DE SÓDIO COM A CLOREXIDINA


A associação de NaOCl e clorexidina durante o tratamento endodôntico não é re-
comendada, pois provoca uma reação química imediata que resulta na formação de
um precipitado denso e de coloração acastanhada que pode comprometer a estética
dentária e a permeabilidade dentinária. O componente final dessa reação química
produz uma camada superficial em toda a dentina do canal radicular com aspecto
de uma smear layer química (Figuras 11.9 e 11.10), reduzindo o número de túbu-
los dentinários patentes e afetando a formação da camada híbrida necessária para
a adesão nas restaurações e cimentação de pinos de fibra de vidro, além de deixar
um filme residual nas paredes do canal, aumentando o risco de microinfiltração
coronária.21, 32

! FIGURA 11.9
A) Canal radicular preenchido
com gel de clorexidina a 2%. B)
Formação de smear layer química
após a mistura do hipoclorito de
A B
sódio com clorexidina.

! FIGURA 11.10
Fotomicrografia de varredura mostrando a formação
de um filme residual nas paredes do canal radicular
após a mistura do NaOCl com clorexidina.

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108 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

PARACLOROANILINA
A paracloroanilina (PCA) é registrada no CAS (Chemical Abstracts Service) sob o
número 106-47-8, não é encontrada normalmente na natureza, mas, em razão da
atividade industrial, pode ser detectada no solo, no ar e nos rios. Estudos para o
monitoramento dos níveis de PCA em rios e solos foram conduzidos nas décadas de
1980 e 1990 em vários países da Europa, como Finlândia, Alemanha e Itália, detec-
tando concentrações que variavam de 0,007 a 0,06 ppm. Não há dados para avaliar a
exposição à PCA e outros resíduos em cosméticos e produtos farmacêuticos, mas o
teor permitido nessas formulações deve ficar no máximo em 3 ppm.
33
Abed realizou estudo com o objetivo de avaliar as propriedades físico-químicas
do gluconato de clorexidina a 0,12% na forma de bochecho por um ano e verificou
que não houve alteração significativa no teor de PCA durante o período e que a con-
centração de PCA ficou sempre abaixo do limite estabelecido de 3 ppm.
A meia-vida de um fármaco é determinada pelo tempo necessário para que
ocorra a degradação de 5 a 10% do substrato da substância. A PCA é um produto
que se forma com a degradação da clorexidina. A otimização do prazo de validade
para uma formulação de clorexidina depende da combinação de fatores como resis-
tência da formulação, condições de armazenamento, otimização do pH, controle de
temperatura ou refrigeração. O mais importante é minimizar a concentração inicial
de PCA a partir de uma solução a granel durante a preparação da formulação. Vários
absorventes para remoção de PCA têm sido utilizados com sucesso, uma vez que
conseguem remover até 100% de PCA e praticamente não diminuem a concentração
do componente farmacêutico ativo.
Estudos realizados por Gonçalves (dissertação em andamento) mostraram que
quando a clorexidina é aquecida à temperatura acima de 120oC ocorre sua degrada-
ção, com a precipitação de PCA. Nesse estudos, realizados com o objetivo de avaliar
a degradação da clorexidina, foram testados vários produtos contendo clorexidina,
sendo encontrado um teor de PCA que variou de 0 a 8,56 ppm (a legislação permite
até 3 ppm). Amostras do gel de clorexidina Endogel® (Essencial Pharma – Itapetinin-
ga, Brasil) foram analisadas e não apresentaram PCA na sua formulação, não haven-
do consequentemente formação do precipitado mesmo após a degradação térmica.

IRRIGAÇÃO: SORO FISIOLÓGICO


A irrigação é um dos passos mais importantes para auxiliar na limpeza e remoção
dos detritos produzidos durante a instrumentação de canais radiculares. Dispositivos
de irrigação diferentes estão disponíveis para melhorar a distribuição e o fluxo de
irrigante no canal radicular. A irrigação com seringa e agulha é o mais comum e facil-
mente acessível para o clínico, mas sua eficácia é questionável, sobretudo na limpeza
do entulho no terço apical. A irrigação ultrassônica passiva, exigindo a substituição
do irrigante, mostra melhor eficácia no desbridamento.
Independentemente do dispositivo utilizado, a irrigação deve ser ativa e com vo-
lume suficiente para fazer com que o fluxo e refluxo da solução irrigadora promovam
essa limpeza. O ideal é que as soluções irrigantes sejam atóxicas, dado o risco de que
o vazamento da solução através do forame apical aumente quando se faz a ampliação
do forame.

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Endodontia passo a passo 109

O soro fisiológico é o agente de irrigação ideal, uma vez que pode ser usado com
total segurança, mesmo quando passa através do forame apical, o que ocorre com
frequência quando tal forame é ampliado.
O corpo do canal devidamente ampliado possibilitará a inserção completa da
agulha no interior do canal radicular (agulha de 20 mm de comprimento x 5,5 mm de
diâmetro). É importante que a ponta da agulha fique a cerca de 4 a 5 mm do forame
apical.
A posição da agulha e a pressão no êmbolo da seringa fazem com que o soro
fisiológico ultrapasse o forame apical e efetue uma irrigação na região periapical.
Isso proporciona uma limpeza adicional no periápice, diminuindo a concentração
de substâncias químicas liberadas durante o preparo, e auxilia na remoção de debris
liberados na região durante a instrumentação.
Nas Figuras 11.11 e 11.12 (sequência de radiografias antes e durante o tratamen-
to endodôntico), pode-se observar a irrigação feita com uma solução de iodo não
iônico como contraste e a área periapical marcada pelo contraste que ultrapassou o
forame apical durante a irrigação.

! FIGURA 11.11
Radiografia periapical inicial mostrando a área
periapical normal antes do tratamento endo-
dôntico.

A B

▲ FIGURA 11.12
A) Radiografia periapical mostrando área radiopaca decorrente do extravasamento da solução irri-
gadora (soro fisiológico) com contraste (iodo não iônico) utilizada como solução irrigante (seta). B)
Na radiografia com contraste colorido, nota-se que a substância contrastante ultrapassa o forame
apical (seta).

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110 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

POSICIONAMENTO DA AGULHA DE IRRIGAÇÃO


Para uma efetiva irrigação do canal radicular, pode-se utilizar a agulha 20 x 5 , com
bisel, na profundidade de 16 mm no interior do canal radicular. Nessa posição, a
força da irrigação levará a substância irrigadora (soro fisiológico) sob pressão para a
área apical, promovendo uma melhor limpeza na região (Figura 11.13).

! FIGURA 11.13
Irrigação do canal com agulha 20 x 5½ (20 x 5,5
mm). Note que a agulha de irrigação está inse-
rida no canal radicular. Essa agulha é ideal para
uma completa limpeza e irrigação dos canais
radiculares.

PASSOS PARA UTILIZAÇÃO DA SUBSTÂNCIA QUÍMICA AUXILIAR E DA


IRRIGAÇÃO
• A clorexidina em gel deve ser colocada em seringa descartável de 3 mL e agulha 20
x 5½ (5,5 mm).
• Preencher o canal radicular e a câmara pulpar com o gel e em seguida iniciar a
instrumentação.
• Observar que, ao instrumentar, o gel (incolor) fica com aspecto leitoso devido à
incorporação de restos de dentina.
• Fazer a irrigação dos canais radiculares com soro fisiológico ou água destilada em
seringas plásticas descartáveis de 5 mL ou com aparelho de ultrassom.
• Quando realizada com seringas e agulhas adequadas, a irrigação deve ser feita sob
pressão para que o líquido ultrapasse o forame apical e promova uma irrigação no
periápice.
• Usar agulha com bisel para facilitar o refluxo da solução irrigadora.
• Ampliar o corpo do canal de tal forma que a agulha penetre até a proximidade do
terço apical (4 a 5 mm apical).

REMOÇÃO DA SMEAR LAYER: EDTA A 17%


O EDTA-T a 17% é o ácido etilenodiaminotetracético, que apresenta propriedades
como ação quelante (se liga a íons cálcio e fosfato da parte inorgânica da smear layer),
capacidade de remoção de matéria inorgânica e orgânica, aumento da permeabilidade
dentinária e abertura dos túbulos dentinários, além de fazer a associação do tergentol
na solução (tensoativo aniônico), que melhora ainda mais as propriedades do EDTA.
Devido à sua ação quelante e diante da possibilidade de entrar em contato com
a clorexidina, sua interação foi estudada. Verificou-se a formação de um precipitado
branco oriundo da neutralização eletrostática da clorexidina, formando sais. A PCA
não foi encontrada.34

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Endodontia passo a passo 111

REFERÊNCIAS
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LEITURAS RECOMENDADAS
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12
Limite apical, patência
e ampliação do forame
FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

CONSIDERAÇÕES GERAIS
O conceito de que o preparo e a obturação do canal radicular devam ser realizados no
limite cemento-dentina-canal (CDC) é corrente. Esse princípio, apresentado e aceito
como referência no início da década de 1930,1 tem sido consensual, sendo pratica-
mente estabelecido como uma referência clínica clássica, ainda que tenha sido consa-
grado por razões morfológicas, visto que não existe uma descontinuidade estrutural
entre o tecido conjuntivo pulpar e o tecido conjuntivo periapical.
Entretanto, de acordo com a evolução dos estudos, esse conceito tem sido per-
manentemente controverso, afinal, o limite de preparo e obturação dos canais radi-
culares restritos ao limite CDC (1 mm aquém do forame) como tradicionalmente
concebido implica uma imediata questão: como garantir a limpeza do restante do
canal apical contendo restos de tecido infectado?
Vale raciocinar que, se as alterações periapicais estão associadas à presença de
microrganismos e tecido necrótico no interior dos canais radiculares e nas proximi-
dades do forame apical, não existem razões histológicas, fisiológicas ou patológicas
para que o processo da limpeza e remoção se limite a um ponto no interior do canal,
na medida em que o seu término se localiza no forame apical.
As primeiras proposições contrárias ao limite apical aquém do forame foram
publicadas por Schilder2 e Butler.3 Esses autores preconizaram, para os dentes com
necrose pulpar, a patência, o desbridamento do forame apical e a obturação tridi-
mensional dos canais radiculares e acessórios, incluindo o forame. O sequencia-
mento técnico segue com o completo preenchimento dos demais espaços internos
com cimento obturador, bem como o extravasamento do material para o espaço
periapical.
Contudo, essas publicações não resultaram em impacto científico suficiente para
promover mudanças na prática clínica endodôntica. As mudanças tiveram início

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Endodontia passo a passo 113

apenas a partir de Buchanan,4 que retomou a linha dos estudos de Schilder, introdu-
zindo a prática da patência do forame apical e do preenchimento tridimensional do
canal radicular com cimento.

PATÊNCIA E AMPLIAÇÃO DO FORAME APICAL


Schilder, em 1974, considerou a limpeza e a modelagem do sistema de canais radicu-
lares como bases para o sucesso do tratamento endodôntico.5 O autor relatou que os
conceitos de preparo dos canais radiculares permaneceram empíricos com o passar
do tempo, ignorando conceitos físicos e biológicos necessários para o reparo, além de
ignorarem a verdadeira anatomia dental e a natureza química dos materiais obtura-
dores, e propôs maneiras de melhorar a limpeza e modelagem do sistema de canais
radiculares baseadas nesses conceitos, como manter a região apical limpa com o uso
de uma lima de patência (Figura12.1).

! FIGURA 12.1
Lima # 10 fazendo a patência do forame apical em
dente com raiz achatada.

A resposta inflamatória periapical aos agentes microbianos oriundos do canal


radicular é inespecífica e faz parte do processo biológico de reparação e defesa, in-
dependentemente do local em que se instale o agente agressor. Na região periapical,
o processo inflamatório provoca destruição nos tecidos periapicais e reabsorção do
osso alveolar e do cemento radicular, criando um espaço ocupado por um tecido
de granulação. Esse tecido é responsável pela organização da defesa contra a dis-
seminação bacteriana, com intenção reparadora, desde que se eliminem os agentes
agressores. É preciso ficar claro que a reparação desse tecido de granulação ocorre
naturalmente, com a eliminação do foco da infecção e com o devido selamento do
forame apical por um material obturador que apresente boa qualidade seladora e
compatibilidade biológica com os tecidos periapicais.
Clinicamente, para a elaboração de estratégias de tratamento, o conhecimento
desse mecanismo biológico é fundamental. Ou o tecido necrótico e as bactérias são
removidos mecanicamente ou devem ficar expostos ao sistema de fagocitose do or-
ganismo. Dentro do canal radicular, incluindo o canal cementário e o forame apical, é
pouco provável que ocorra a fagocitose de microrganismos pela presença do biofilme
bacteriano e ausência de vascularização. Portanto, o desbridamento do forame api-
cal, conforme descrito na literatura por Butler, é essencial para que a área do forame
seja devidamente limpa pela ação mecânica dos instrumentos. Para que tal limpeza

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114 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

ocorra, o forame apical deve ser alargado, sinalizando a importância da ampliação e


modelagem (Figura 12.2).

! FIGURA 12.2
Ampliação do forame apical com lima # 35.

AMPLIAÇÃO DO FORAME APICAL


As características do reparo periapical após a ampliação do forame em dentes de cães
com polpa vital foram estudadas por Benatti e colaboradores.6 Cento e trinta e qua-
tro canais radiculares foram sobreinstrumentados 2 mm além do forame apical com
limas # 40, 60 e 80 e obturados 1 a 3 mm aquém do ápice radiográfico. Os animais
foram sacrificados em 3, 7, 30 e 120 dias após o tratamento endodôntico, e os dentes
foram processados para análise histológica. Os resultados mostraram a proliferação
do tecido conjuntivo periodontal em direção aos canais radiculares e as alterações
morfológicas da maturação desse tecido ao longo do tempo. O alargamento do fo-
rame apical permitiu invaginação do tecido conjuntivo em direção aos canais radi-
culares e formação de uma camada espessa de cemento na porção apical dos canais
radiculares.
Souza Filho e colaboradores,7 em 1987, estudaram a influência do diâmetro do
forame apical e a intensidade da contaminação do canal no reparo tecidual periapical
em dentes necrosados de cães. Trinta e dois canais radiculares de pré-molares inferio-
res foram expostos a contaminação, e o desenvolvimento de uma inflamação apical
ocorreu em um período de 45 dias. Os canais foram sobreinstrumentados 2 mm além
do forame apical com lima # 60 e foram subobturados 2 a 3 mm aquém do ápice ra-
diográfico. Em 90 dias após o tratamento endodôntico, houve cura e invaginação de
tecido conjuntivo em direção ao canal em 67,8% dos casos.
Os resultados histopatológicos mostraram que o processo de reparação tem iní-
cio imediatamente após a organização do coágulo sanguíneo, que sofre proliferações
e diferenciações celulares até a completa reparação dos tecidos lesionados.
Nessa mesma linha de pesquisa, Souza Filho e colaboradores7 verificaram que,
em dentes com necrose pulpar e lesão periapical, o procedimento de ampliação do
forame não somente auxiliou na descontaminação da região, mas também diminuiu
a contaminação do canal radicular na região do forame e favoreceu a reparação dos
tecidos periapicais. Esses achados, também confirmados por Borlina e colaborado-
res,8 mostraram que a ampliação do forame apical contribuiu para melhorar a limpe-
za e reduzir a contaminação do canal radicular na área apical.

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Endodontia passo a passo 115

Quando o tratamento endodôntico com ampliação foraminal é realizado em


dentes com polpa vital e o canal é obturado aquém do forame apical (2 a 3 mm),
ocorre, invariavelmente, uma neoformação de tecido conjuntivo ocupando a área li-
vre na porção apical do canal. Esse tecido neoformado, com o passar do tempo, sofre
diferenciação, tornando-se um tecido de constituição fibrosa, com característica de
normalidade e que, em contato com a dentina das paredes internas do canal radicu-
lar, deposita um tecido cementoide, que se desenvolve em camadas e tende a formar
um selamento biológico apical.
Esse comportamento do tecido periapical, após a sobreinstrumentação, demons-
tra que não existe nenhum problema quanto à reparação periapical após a remoção
do coto periodontal e a ampliação do forame apical.
Por outro lado, quando o preparo do canal radicular é feito 1 mm aquém do
forame apical, preservando o coto periodontal, independentemente da substância
química utilizada no preparo, inicia-se uma reação inflamatória que promove a fa-
gocitose do tecido pulpar dilacerado pelos instrumentos. Essa reação inflamatória,
certamente, perdura por um tempo muito maior do que aquela que ocorre a partir
do coágulo apical. Na ausência de microrganismos, a organização do coágulo ocorre
num período relativamente curto, como mostram as Figuras 12.3 e 12.4.

! FIGURA 12.3
A) Corte histológico mostrando a for-
mação de tecido conjuntivo no interior
do canal radicular. B) Maior aumento da
figura anterior mostrando o tecido inva-
ginado no canal com características de
A B
normalidade.

FIGURA 12.4 "


A) Terço apical de dente de cão, 120 dias
após a ampliação do forame apical, mos-
trando as características de normalidade
do tecido invaginado para o interior do
canal radicular. B) Maior aumento da fi-
gura anterior, mostrando a formação de
A B
cemento nas paredes internas do canal.

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116 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Quando a obturação ficar, intencionalmente, aquém do limite apical, ocorrerá a


revascularização ou invaginação do tecido periodontal apical para o interior do ca-
nal, assim como a neoformação de tecido cementoide nas paredes do canal radicular.
Essa propriedade inerente do tecido conjuntivo de crescer para espaços vazios livres
de bactérias pode ser aplicada nos dentes com rizogênese incompleta, nos tratamen-
tos denominados revascularização ou na revitalização do canal radicular.

Ampliação do forame apical e sangramento no interior do canal

Após realizar a patência e a ampliação do forame apical, pode ocorrer um pequeno sangra-
mento, que deve cessar imediatamente após a irrigação com soro fisiológico. O sangramen-
to do ligamento periapical não é persistente, pois assim que o tecido conjuntivo é atingido
pelo instrumento endodôntico ocorre a formação de coágulo. Em geral, um sangramento
consistente ocorre devido a restos pulpares no interior do canal radicular.

AMPLIAÇÃO DO FORAME APICAL E DOR PÓS OPERATÓRIA


Com o propósito de avaliar a dor após os procedimentos de ampliação do forame
apical, propusemo-nos a investigar esse assunto, inicialmente nas dissertações de
mestrado de Alexandra Camelo9 e Thais Natsuco Sonoda11 e na pesquisa clínica de
Marcelle Louise Sposito Bourreau.10 Do ponto de vista clínico, os resultados mos-
traram que os tratamentos endodônticos realizados em sessão única com patência
e ampliação do forame apical, independentemente da substância química auxiliar
utilizada, apresentaram mínima incidência de dor pós-operatória. Os resumos dessas
pesquisas são apresentados a seguir.

Avaliação da sintomatologia pós-operatória em tratamentos


endodônticos realizados com patência e ampliação foraminal,
comparando duas substâncias químicas auxiliares
(Dissertação de mestrado de Alexandra Magalhães Camelo;9 orientador, Francisco
José de Souza Filho)

Resumo
O objetivo desse trabalho foi avaliar, in vivo, a sintomatologia pós-operatória de tra-
tamentos e retratamentos endodônticos realizados em sessão única, submetidos à pa-
tência e ampliação do forame apical utilizando duas substâncias químicas auxiliares,
hipoclorito de sódio e gel de clorexidina, durante o preparo e a modelagem.

Métodos
Foram realizadas 300 intervenções, por um único operador especialista em Endo-
dontia, divididas em três grupos de acordo com a substância química utilizada: gru-
po 1 – gel de clorexidina a 2% e soro fisiológico; grupo 2 – hipoclorito de sódio a
5,25%; grupo 3 – hipoclorito de sódio a 5,25% e soro fisiológico. A avaliação da sinto-

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Endodontia passo a passo 117

matologia pós-operatória foi feita 24 horas após a realização do atendimento, tendo


sido utilizado um escore para classificar a dor quanto à sua intensidade: sem dor (não
houve necessidade de medicação analgésica); com dor – moderada (houve necessi-
dade de uma ou duas doses de medicação analgésica) ou intensa (houve necessidade
de reintervenção, que incluiu procedimento de urgência).

Resultados
Os resultados mostraram que 92% (276/300) dos pacientes não tiveram dor ou não
necessitaram de medicação analgésica; 8% (24/300) tiveram dor, sendo que 7,3%
(22/300) apresentaram dor moderada e necessitaram de uma ou duas doses de me-
dicação analgésica e apenas 0,7% (2/300) apresentaram dor intensa com necessidade
de reintervenção.

Conclusão
O tratamento endodôntico com patência e ampliação do forame apical realizado em
sessão única, independentemente da substância química auxiliar utilizada durante o
tratamento, apresenta baixa incidência de dor pós-operatória.

Avaliação prospectiva da sintomatologia clínica pós-operatória de


tratamentos endodônticos realizados em sessão única com patência e
ampliação do forame apical
11
(Dissertação de mestrado de Thais Sonoda, orientador Francisco José de Souza Filho)

Resumo
Esse estudo clínico prospectivo randomizado avaliou a intensidade e ocorrência
da dor pós-operatória de tratamentos endodônticos com patência e ampliação fo-
raminal, realizados em sessão única, independentemente da condição pulpar e pe-
riapical.

Métodos
Foram analisados 232 dentes de 179 pacientes, encaminhados para o Orocentro (Ita-
petininga, São Paulo, Brasil) para tratamento endodôntico, no período de outubro
de 2008 a agosto de 2010. Após 24 horas, a intensidade da dor pós-operatória foi
registrada por meio de uma escala verbal, assim classificada: nenhum desconforto;
desconforto (sem necessidade de medicação analgésica); dor moderada (uma ou
duas doses de medicação analgésica); dor severa (uma ou duas doses de medicação
ineficaz no alívio da dor, exigindo reintervenção). A ocorrência ou não de dor foi
definida pelo uso ou não de medicação analgésica após o tratamento endodôntico.

Resultados
Os resultados mostraram que 93,5% (217/232) dos pacientes não apresentaram dor
pós-operatória e 6,5% (15/232) relataram dor; desses, 5,2% (12/232) tiveram dor mo-
derada e 1,3% (3/232), dor severa.

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118 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Conclusão
O tratamento endodôntico com patência e ampliação foraminal, realizado em sessão
única, independentemente da condição pulpar e periapical, apresentou baixa ocor-
rência de dor pós-operatória.

Avaliação dos sintomas pós-operatórios de tratamentos endodônticos


realizados com desbridamento, alargamento e obturação do forame
apical
(Artigo submetido à Revista da Associação Paulista de Cirurgiões Dentistas [APCD])

Resumo
Esse estudo clínico prospectivo randomizado analisou a influência de duas substân-
cias químicas auxiliares diferentes na dor pós-operatória de 301 tratamentos endo-
dônticos concluídos em uma sessão, com o alargamento do forame apical e sobreob-
turados. Foram utilizados como substâncias químicas auxiliares o gel de clorexidina
a 2% (n = 145) e o hipoclorito de sódio a 5,25% (n = 156). A incidência de dor e
desconforto pós-operatórios foi avaliada em 24 horas e foi expressa em porcentagem.
O teste exato de Fischer e o teste de Qui Quadrado para tendências e para dados
não paramétricos foram usados para comparar a variação da dor pós-operatória.
Os fatores analisados foram dor presente, substância química auxiliar, estado pul-
par, faixa etária e número de canais radiculares, e os resultados mostraram que a
dor prévia presente exerceu influência significante na dor pós-operatória (p < 0,001).
Após 24 horas, 93,7% (282/301) dos dentes não apresentaram nenhum sintoma, e
6,3% (19/301) apresentaram dor pós-operatória de qualquer intensidade e fizeram
uso de uma ou duas doses de medicação. Desses, apenas 0,66% (2/301) apresentaram
flare-up e retornaram para nova avaliação. Não houve influência das diferentes subs-
tâncias químicas auxiliares na dor pós-operatória.

As Figuras 12.5 e 12.6 ilustram, respectivamente, a presença de debris aderidos


nas paredes do forame apical e fotomicrografias de limas anatômicas posicionadas no
forame apical, com a forma final do forame após a ampliação.

! FIGURA 12.5
Presença de debris aderidos nas paredes do forame
apical (setas).

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Endodontia passo a passo 119

A B

C D

▲ FIGURA 12.6
A) Forame apical não preparado. B) Patência do forame apical com a lima # 15. C) Lima anatômica
final posicionada no forame. D) Forma final do forame apical após a ampliação (fotomicrografias
cedidas por Thiago Farias Rocha Lima – Rev Assoc Paul Cir Dent 2012;66(3):200-5).

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120 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

LEITURAS RECOMENDADAS
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13
Restauração coronária e
radicular em endodontia
FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO, RAFAEL ROCHA PACHECO
E ANA CAROLINA ROCHA LIMA CAIADO

CONSIDERAÇÕES GERAIS
A restauração de dentes sem vitalidade é um dos maiores desafios para o dentista,
pois requer conhecimento conjunto de Endodontia, Periodontia e Dentística. O clí-
nico deve escolher uma técnica reabilitadora de acordo com a quantidade de tecido
dentário saudável remanescente, além de considerar os desafios funcionais e estéticos
da restauração. Antes mesmo da realização do tratamento endodôntico, é importante
prever os passos clínicos restauradores necessários para que o dente possa novamente
ser colocado em função. Uma restauração coronária bem-realizada pode significati-
vamente aumentar a taxa de sobrevivência de um dente endodonticamente tratado.1,2
A resistência de um dente é diretamente proporcional à quantidade de tecido
dentário saudável remanescente.3,4 É a inter-relação estrutural e física entre um tecido
duro (esmalte) e um mais resiliente (dentina) que proporciona à estrutura dental a
habilidade de absorver e dissipar as tensões provenientes da ação fisiológica da mas-
tigação e da variação térmica a que o dente é submetido durante toda a vida.5 Quando
essa relação é perdida, é preciso devolver a resistência da estrutura dentária usando
materiais que possam, biomecanicamente, substituir os tecidos dentários perdidos.
Em dentes que apresentam coroa intacta ou apenas uma pequena perda de es-
trutura, como dentes tratados endodonticamente por motivos protéticos ou trauma,
a reconstrução pode ser realizada usando sistemas adesivos e resinas compostas em
técnicas diretas.6 Por outro lado, dentes que perderam muito tecido devido a cáries
extensas, fraturas, canais excessivamente ampliados ou dentes com ápices ainda aber-
tos necessitam de pinos intrarradiculares para reter a futura restauração coronária e
aumentar a resistência à fratura.7
Ligas metálicas foram tradicionalmente usadas como materiais de escolha para
a fabricação de pinos intrarradiculares fundidos ou pré-fabricados. Porém, devido

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122 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

à crescente demanda por restaurações estéticas, tornou-se frequente o uso de pinos


fabricados em cerâmicas à base de zircônia. O fator limitante de pinos fabricados
com ligas metálicas ou cerâmicas é o alto módulo de elasticidade (alta rigidez) desses
materiais que difere da dentina radicular. O resultado do uso de materiais com pro-
priedades biomecânicas diferentes é a geração de tensões na região apical do pino,
que costumam levar à fratura da raiz.8
Materiais rígidos vêm sendo gradualmente substituídos pela resina composta e
pinos de fibra de vidro, que, além de apresentarem estética favorável, possuem um
módulo de elasticidade mais próximo ao da dentina (fibra de vidro = 17,5 a 21,6,
dentina = 14 a 18,6 GPa). O resultado é uma redução do risco de fraturas radiculares,
uma alta resistência ao impacto, absorção de choques e alta resistência à fadiga.9,10
A técnica de confecção de pinos de fibra de vidro permite que sejam preparados
imediatamente após o tratamento endodôntico, propiciando selamento no momento
mais oportuno para evitar uma recontaminação dos canais radiculares.11 O uso de
técnicas adesivas para criar um conjunto com composições homogêneas (pino-com-
pósito-dentina) também permite uma abordagem mais conservadora utilizando pi-
nos de fibra de vidro com diâmetro mais próximo ao espaço do conduto radicular.
Estudos retrospectivos e prospectivos relacionados ao uso de pinos de fibra de
vidro para reabilitar dentes endodonticamente tratados revelam resultados positivos,
mas o deslocamento dos pinos continua sendo a principal falha desse tipo de restau-
ração.

Os fatores que levam a falhas na união entre o pino cimentado e a dentina do canal radicu-
lar são principalmente:
• A dificuldade da luz em atingir as áreas profundas do canal.12
• A morfologia e a composição do substrato radicular.13
• A contração da resina composta à base de metacrilato durante a polimerização, que gera
tensões na interface dentina/restauração.
• A geometria desfavorável do canal radicular (alto fator C).14
• A dificuldade técnica do emprego de sistemas adesivos e cimentos resinosos dentro do
canal radicular.

Logo, a técnica adesiva selecionada para cimentar o pino de fibra de vidro requer
uma série de passos criteriosos que devem ser respaldados pelo conhecimento das
dificuldades clínicas e o domínio dos materiais a serem empregados.

MATERIAIS E TÉCNICAS ADESIVAS EMPREGADOS PARA CIMENTAÇÃO DO


PINO DE FIBRA DE VIDRO
Sistemas adesivos
Terminado o preparo do espaço intrarradicular, o objetivo é selecionar um sistema
adesivo e cimento resinoso compatíveis com a união ao tecido dentinário do canal
radicular e ao pino de fibra de vidro.
Os sistemas adesivos comercialmente disponíveis combinam três ou dois passos
para a utilização da técnica úmida (etch-and-rinse) e dois ou apenas um passo (todos-

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Endodontia passo a passo 123

-em-um) para a forma autocondicionante. Mais recentemente, foram introduzidos


no mercado os adesivos denominados universais, que podem ser aplicados usando
tanto a técnica úmida quanto a autocondicionante.

Técnica úmida
A técnica úmida, independentemente do número de passos, requer o uso do ácido
fosfórico por 15 a 20 segundos (no caso da dentina radicular) para desmineralizar
a hidroxiapatita que envolve as fibras colágenas. É nesse momento que se encontra
a primeira dificuldade clínica da técnica, já que o uso prolongado do ácido pode
resultar em uma desmineralização excessiva da dentina e na impossibilidade de
o adesivo penetrar no substrato e envolver as fibras colágenas expostas durante o
tempo clínico empregado. Essa camada de dentina desmineralizada com colágeno
exposto é mais suscetível a degradação. Por esse motivo, o ácido deve ser lavado no
tempo previsto com uso abundante de água. Isso leva à segunda dificuldade clínica
da técnica: secar adequadamente o substrato. No caso de canais radiculares, esse
problema é agravado, já que todas as soluções empregadas tendem a se acumular
na região apical do canal. O uso de pontas de papel absorvente auxilia na remoção
desses excessos, porém a dentina não deve ser ressecada, pois isso significaria o co-
lapso das fibras colágenas que, por sua vez, prejudicaria a infiltração do adesivo a ser
empregado futuramente.
O segundo passo é a aplicação do primer que contém monômeros hidrófilos e
solventes que melhoram a capacidade de umedecimento da superfície das fibras colá-
genas expostas. Nos adesivos de três passos, a aplicação do primer corresponde a um
passo independente que é seguido pela aplicação do adesivo, ou seja, uma resina de
baixa viscosidade. O primer nos sistemas de três passos corresponde à função hidró-
fila do material e, portanto, confere compatibilidade do adesivo à dentina radicular.
O adesivo é a porção mais hidrófoba dos sistemas de três passos, é composto por
monômeros mais viscosos e não contém solventes orgânicos.
É necessário ressaltar que o tipo de solvente presente em qualquer adesivo deve
determinar a umidade que a dentina precisa apresentar antes da aplicação.15 No caso
de adesivos que contêm água na composição, a dentina deve ser mantida ligeiramen-
te mais seca. Mesmo que a remoção de água tenha sido excessiva e haja o colapso de
fibras colágenas em alguns pontos, a água presente no adesivo se encarregará de reex-
pandir as fibrilas. Já nos sistemas que não apresentam água na composição, é preciso
manter a superfície visivelmente úmida. O solvente anidro presente nesses sistemas
(em geral a acetona) não é capaz de reexpandir a dentina colapsada.
Outra forma de apresentação mais simplificada dos sistemas de técnica úmida é
a combinação de primer e adesivo em um único frasco. Nessa versão, os componentes
do primer hidrofílico foram misturados com os monômeros resinosos hidrofóbicos
do adesivo. Assim, após a colocação do ácido, é aplicada uma solução única que fun-
ciona simultaneamente como agente de formação da camada híbrida e ligação com
o material restaurador. A Figura 13.1 mostra exemplos de adesivos que empregam a
técnica úmida usando três e dois passos.

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124 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Técnica úmida

Três passos Dois passos


Ácido
Ácido
Primer
Primer e
Adesivo
Adesivo

▲ FIGURA 13.1
Adesivos que empregam a técnica úmida. A técnica úmida pode apre-
sentar três passos (aplicação do ácido + primer + adesivo) ou dois pas-
sos ( ácido + primer/adesivo).

Técnica autocondicionante
Os sistemas autocondicionantes (Figura 13.2) não requerem a aplicação isolada de
um ácido para produzir porosidades no substrato. De maneira geral, a formulação
desses adesivos inclui monômeros resinosos ácidos que simultaneamente desminera-
lizam e infiltram os tecidos dentais. Uma vez que os próprios monômeros ácidos in-
filtram o substrato, não há necessidade de lavá-los após a aplicação. Isso é vantajoso,
pois a umidade do substrato já não se torna um fator determinante para a obtenção
de uma boa união, deixando a técnica menos suscetível a falhas.16,17
O desempenho do adesivo autocondicionante está relacionado à classe do adesi-
vo, que é determinada pelo seu pH (supersuave: pH > 2,5; suave: pH = 2; intermediá-
rio: pH 1 a 2 e forte: pH < 1) e, sobretudo, pela composição e, mais especificamente,
pelo monômero funcional incluído na formulação do adesivo.18
Apesar de os sistemas autocondicionantes já serem apresentados como adesivos
simplificados, os fabricantes continuam buscando formas de facilitar ainda mais as
etapas clínicas. Introduzidos mais recentemente no mercado, encontram-se os ade-
sivos de “passo único” (Figura 13.3). A solução desenvolvida é aplicada diretamente
sobre a dentina e desempenha a função de desmineralização, infiltração e posterior
ligação ao material restaurador.
Os adesivos de passo único podem ser subdivididos em adesivos de um ou dois
componentes. Os adesivos de dois componentes separam os componentes ativos, tal
como o monômero funcional da água, para aumentar a vida útil do adesivo. Ainda
assim, é necessário misturar os componentes no momento da aplicação. Apenas os
adesivos de um componente e de um passo combinam o passo de condicionamento,
aplicação do primer e aplicação do adesivo em um único tempo clínico sem a neces-
sidade de misturar componentes.

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Endodontia passo a passo 125

Técnica autocondicionante
Dois passos
Primer ácido
Adesivo: parte
hidrófoba

! FIGURA 13.2
Primers autocondicionantes
Adesivos autocondicionantes de dois passos.

Técnica autocondicionante
Um passo
Primer
ácido e
adesivo

FIGURA 13.3 " Adesivos autocondicionantes


Adesivos autocondicionantes de um passo.

Adesivos universais
Recentemente, uma nova categoria denominada adesivos universais (ou multimodo)
foi lançada no mercado. Trata-se de fórmulas de frasco único que podem ser aplica-
das clinicamente usando tanto a técnica convencional quanto a autocondicionante.
Na teoria, a vantagem para o clínico é a praticidade de utilizar apenas um único ade-
sivo para qualquer indicação de restauração direta. Alguns exemplos encontrados
no mercado são o Scotchbond Universal (3M ESPE), o All-Bond Universal (Bisco) e
o G-bond Plus (GC). No momento, existem poucos estudos referentes a esses novos
adesivos em esmalte e dentina coronária.19 Novos estudos devem ser realizados, prin-
cipalmente usando a dentina radicular como substrato, antes de empregá-los para a
cimentação de pinos de fibra de vidro.

Cimentos resinosos
Cimentos resinosos são resinas compostas com um menor volume de partículas inor-
gânicas comparadas às resinas compostas restauradoras. A matriz orgânica desses
materiais contém monômeros de bis-GMA, UDMA e TEGDMA. A parte inorgânica,

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126 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

que compreende entre 20 e 50% em volume, é composta por partículas vítreas. Esse
menor volume proporciona uma menor viscosidade, que possibilita o escoamento
desse material entre a superfície da restauração e a superfície do adesivo unido aos
tecidos dentários.
Os cimentos resinosos disponíveis no mercado apresentam diferentes mecanis-
mos de reação de polimerização, podendo ser quimicamente ativados, fotoativados
ou dualmente ativados (químico e físico). No caso da cimentação de pinos intrarra-
diculares, a fotoativação do cimento resinoso é parcial. Logo, nessa condição é con-
veniente optar por cimentos que iniciam a polimerização de forma química e física
(cimentos resinosos duais).

Incompatibilidades entre sistemas adesivos e cimentos resinosos


No caso dos sistemas de três passos de técnica úmida (ácido + primer + adesivo) e dos
sistemas autocondicionantes de dois passos (primer ácido + adesivo), a última cama-
da de monômero deixada sobre a superfície da dentina é proveniente do adesivo, que
é composto principalmente por monômeros hidrófobos. Assim, essa camada mais
hidrófoba é a que entra em contato com o cimento resinoso. Por outro lado, nos siste-
mas adesivos de dois passos da técnica úmida (ácido + primer/adesivo) e de um passo
da técnica autocondicionante, a última camada do adesivo que entra em contato com
o cimento é formada por monômeros ácidos hidrófilos. Quando o monômero ácido
presente nessa camada reagir com a amina terciária (ativador) do cimento resinoso
quimicamente ativado ou dual, haverá a formação de um sal (reação ácido-base). O
resultado será a inativação da polimerização química do cimento.20
Portanto, durante a seleção do adesivo e cimento, é importante optar por com-
binações compatíveis, como o uso de sistemas adesivos em que a última camada em-
pregada é principalmente composta por monômeros hidrófobos e pouco ácidos.

Escolha do sistema adesivo


A escolha do sistema adesivo e do cimento resinoso deve ser embasada não somente
no conhecimento técnico e científico do dentista, mas também na simplicidade da
técnica. Considerando a dificuldade clínica da aplicação de sistemas adesivos dentro
de canais radiculares, a técnica adesiva autocondicionante apresenta mais vantagens
para a cimentação de pinos de fibra de vidro desde que a última camada do adesivo
seja composta de monômeros hidrófobos (técnica autocondicionante de dois passos),
para que não haja incompatibilidade com o cimento resinoso.

Cimentos autoadesivos: uma solução simples e eficiente para cimentação


intrarradicular
Contrariamente à complexidade técnica dos sistemas adesivos que são tradicional-
mente combinados aos cimentos resinosos, foram introduzidos no mercado cimen-
tos autoadesivos de dupla ativação. O objetivo desses cimentos é produzir união
com uma simples aplicação, eliminando qualquer tipo de preparo prévio do substra-
to. Uma técnica tão simples é de particular interesse quando se considera o desafio
que é realizar uma técnica adesiva dentro de canais radiculares. Apesar de ser um

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Endodontia passo a passo 127

material relativamente recente no mercado odontológico, estudos revelam resulta-


dos promissores em relação à integridade marginal21 e à resistência de união com a
dentina radicular e coronária.22 Devido à sua simplicidade técnica e por evitar aci-
dentes, como a incompatibilidade entre cimentos e adesivos, o cimento autoadesivo
de dupla ativação é o material de escolha para a técnica do pino anatômico descrita
neste capítulo.

PREPARO DO SUBSTRATO DENTINÁRIO ANTES DA CIMENTACÃO DO PINO


Avaliação do remanescente dentário
Antes mesmo de iniciar o tratamento endodôntico, é fundamental a avaliação clí-
nica e radiográfica do remanescente dentário. A remoção completa de restaurações
antigas e de tecido cariado deve ser realizada para visualizar a quantidade de tecido
dentário remanescente. O uso de microscópio operatório possibilita uma remoção
mais conservadora do tecido cariado e a visualização de pequenas trincas e fraturas
que possam passar despercebidas, como mostra a Figura 13.4.

! FIGURA 13.4
Usando um microscópio operatório, é possível
observar uma discreta linha de fratura (seta
azul) no assoalho do molar superior após a
completa remoção de uma restauração de
amálgama.

O uso de sonda periodontal é também necessário para o diagnóstico de linhas


de fratura subgengivais que podem não ser vistas pelo microscópio ou pela imagem
radiográfica. É indispensável que o clínico avalie ainda a saúde dos tecidos de suporte
e a necessidade de cirurgias periodontais. A avaliação radiográfica antes e depois do
tratamento endodôntico permite a visualização da anatomia radicular e do espaço
disponível para a confecção do futuro pino.

Preparo do canal e escolha do pino


O preparo do canal deve respeitar a anatomia original do canal. Para a remoção
mecânica do material obturador, são utilizadas brocas como Gates-Glidden, brocas
de Largo ou brocas especificamente desenvolvidas para a confecção de pinos de
fibra de vidro. Graças ao uso de materiais que podem produzir união ao dente e
que apresentam módulo de elasticidade próximo ao da dentina, a profundidade do
preparo para o pino de fibra de vidro não precisa ultrapassar a proporção 1:1 (pino/
núcleo).23
É fundamental a remoção da dentina superficial do canal radicular e da câmara
pulpar. Tal preparo não tem apenas o objetivo de remover pequenas retenções para

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128 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

facilitar a inserção do pino, mas também remover a dentina alterada por soluções
irrigadoras e restos de material obturador presentes dentro do canal radicular após
o tratamento endodôntico. Soluções de hipoclorito de sódio,24-25 clorexidina24-26 e ci-
mentos endodônticos com eugenol27 na composição foram associados a queda de
valores de resistência de união.
Todo o procedimento deve ser realizado sob isolamento absoluto a fim de evitar
a recontaminação do canal.

ESCOLHA DA TÉCNICA ADESIVA E DE CIMENTAÇÃO DO PINO


Os procedimentos que envolvem a cimentação de pinos pré-fabricados devem ser
realizados, se possível, na mesma sessão do tratamento endodôntico, e pelo próprio
endodontista, com o principal objetivo de prevenir a recontaminação dos sistemas de
canais radiculares.
O procedimento em si é altamente previsível, desde que seja realizado com au-
xílio de microscópio operatório para verificar a limpeza completa da dentina intrar-
radicular e deixar um substrato adequado para a instalação do pino. Esse cuidado é
essencial para evitar o deslocamento do pino de fibra de vidro, como mostra a Figu-
ra 13.5.

! FIGURA 13.5
Deslocamento do pino de fibra de vidro devido
à falha adesiva e limpeza inadequada do subs-
trato dentinário. Note a presença de resíduos
de cimento obturador do canal radicular na su-
perfície do pino intrarradicular (seta azul).

REQUISITOS BÁSICOS PARA A CONFECÇÃO DE PROCEDIMENTOS


RESTAURADORES COM PINOS DE FIBRA DE VIDRO
O cirurgião-dentista deve utilizar o microscópio operatório para visualizar o interior
do canal radicular e realizar uma limpeza adequada das paredes do espaço para o
pino (qualidade do substrato dentinário):
• A estrutura dentária remanescente deve estar hígida, livre de cárie ou tecido amo-
lecido e completamente limpa para ficar livre de resíduos de material obturador.
• A presença de remanescente coronário é um requisito importante, mas os pinos
de fibra de vidro podem ser utilizados com sucesso em dentes sem remanescente
coronário.
• O cirurgião-dentista deve conhecer bem as propriedades dos materiais, o tipo de
cimento resinoso e a técnica de cimentação a serem utilizados.

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Endodontia passo a passo 129

• Deve-se verificar o tipo de oclusão dos dentes (bruxismo e forças de corte tipo
cisalhamento podem provocar o deslocamento do pino ou a fratura da raiz).
• O diâmetro e a profundidade do espaço devem possibilitar uma efetiva fotopoli-
merização da camada adesiva para que a hibridização da dentina e o reforço da
estrutura radicular com resina composta sejam realizados com qualidade.

INDICAÇÕES E VANTAGENS DA INSTALAÇÃO DE PINOS DE FIBRA DE VIDRO


• Proteção coronária imediata após a conclusão do tratamento de canal.
• Pinos fabricados com ligas metálicas ou cerâmicas apresentam módulo de elastici-
dade (alta rigidez) muito superior ao da dentina e, pelo fato de gerarem tensões na
região apical do pino, frequentemente levam à fratura da raiz.
• Pinos de fibra de vidro apresentam estética favorável e possuem um módulo de
elasticidade mais próximo ao da dentina (fibra de vidro = 17,5 a 21,6, dentina= 14
a 18,6 GPa), reduzindo o risco de fraturas radiculares.
• Diminuição do número de etapas laboratoriais.
• Possibilidade de concluir o tratamento em uma única sessão.
• Nas raízes debilitadas e sem estrutura coronária remanescente, a instalação de
pinos, tanto metálicos quanto de fibra de vidro, apresenta menor previsibilidade
de sucesso, embora os pinos de fibra de vidro tenham menor risco de fratura
radicular.
• Existem indicações apropriadas que devem ser levadas em conta, especialmente
quando o paciente não tiver recurso econômico para alternativas como próteses
fixas ou implantes.

ESCOLHA DA TÉCNICA: PINO CONVENCIONAL, PINO ANATÔMICO OU


REFORÇO RADICULAR
A presente seção deste capítulo apresenta o passo-a-passo de três técnicas para a con-
fecção de pinos. A escolha de cada técnica pelo dentista deve ser baseada na quanti-
dade de tecido dentário remanescente.

Técnicas para confecção de pinos:


• Técnica convencional (dentes com canais pouco ampliados)
• Técnica do pino anatômico (dentes com canais amplos e raízes preservadas)
• Técnica do reforço radicular (dentes com canais amplos e raízes fragilizadas)

Técnica convencional (dentes com canais pouco ampliados)


Em dentes com canais radiculares conservados (pouco alargados), pode-se reali-
zar o espaço para o pino de forma mais conservadora, seguindo a técnica do pino
convencional. Uma vez feito o preparo do espaço para o pino, realiza-se a limpeza

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130 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

da cavidade, com auxílio de microscópio clínico, para visualizar as áreas impregna-


das com material obturador do canal radicular. Após o preparo do espaço, faz-se a
seleção do pino que melhor se ajusta ao espaço do canal. Algumas marcas comer-
ciais de pinos pré-fabricados disponíveis atualmente no mercado disponibilizam,
em seus sistemas, brocas específicas para preparo do remanescente radicular que
permitem melhor adaptação dos respectivos pinos às paredes do conduto. Os pinos
devem ser limpos com o auxílio de ácido fosfórico a 37%, lavados e secos, seguidos
de aplicação de duas camadas de silano. Em preparos conservadores, a escolha do
cimento a ser utilizado é essencial, uma vez que a hibridização da dentina depen-
de fundamentalmente da realização de uma adequada técnica adesiva. Os proce-
dimentos adesivos são dificultados pelo reduzido diâmetro dos canais, tornando
cada passo da técnica mais crítico, sobretudo no que diz respeito à fotoativação
dos materiais adesivos no interior dos condutos, que é altamente reduzida devido
à perda de energia.
Contrariamente à complexidade técnica dos sistemas adesivos tradicionalmente
combinados aos cimentos resinosos, foram introduzidos no mercado os cimentos
denominados autoadesivos, que eliminam os passos de hibridização da dentina ra-
dicular, de dupla ativação, cujo objetivo é produzir união direta com a dentina com
uma simples aplicação, sendo uma boa opção para contornar as dificuldades técnicas
de tratamento para esse tipo de canal mais conservado.

Técnica do pino anatômico (dentes com canais amplos


e raízes preservadas)
Clinicamente, é comum que se encontrem canais excessivamente alargados e com
grande perda de estrutura. Nessas situações, a dimensão transversal do canal radicu-
lar difere muito do diâmetro do pino, e o procedimento de cimentação resulta em um
grande volume de cimento entre o pino pré-fabricado e a parede do canal radicular.
Quando se combinam a geometria desfavorável do canal radicular (alto fator C) e o
grande volume de cimento resinoso que contrai durante a polimerização, o resultado
é uma alta geração de tensões na interface dente/restauração que pode levar à falha
da união.
Para contrabalançar as limitações da técnica convencional de polimerização em
canais amplos, foi sugerida a confecção de um pino anatomicamente modelado vi-
sando compensar qualquer desadaptação entre o pino de fibra e as paredes do canal
radicular.28 Para isso, o pino de fibra de vidro é tratado de maneira que em seguida
receba uma camada de resina composta. O conjunto não polimerizado é levado ao
conduto (previamente isolado com gel hidrossolúvel) e posicionado de forma que, ao
ser inserido, modele suas paredes, apresentando maior adaptação às paredes do ca-
nal. A fotoativação inicia-se dentro do canal (por poucos segundos), sendo o conjun-
to removido do canal para que possa ser fotoativado por todas as direções durante 40
segundos em face. O resultado é um pino confeccionado de acordo com a anatomia
do canal radicular, permitindo uma menor linha de cimentação e reduzindo, assim, a
indução de tensões e falhas na interface.

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Endodontia passo a passo 131

Sequência passo a passo da técnica do pino anatômico


Preparo do substrato radicular
No caso de canais radiculares amplos com a raiz preservada (p. ex., incisivos centrais
superiores), está indicada a técnica do pino anatômico.
1. O preparo do espaço para o pino deve ser feito com auxílio de microscópio ope-
ratório com uma boa iluminação. Atenção para linhas de fratura ou perfurações
radiculares.
2. Utilizam-se brocas esféricas carbides de baixa rotação, em motor elétrico na ve-
locidade de 500 a 1.000 rpm para limpar a superfície da dentina radicular (man-
ter a expulsividade no preparo do conduto).
3. O canal deve ser irrigado com soro fisiológico para remover resíduos. Em segui-
da, pontas de papel absorventes devem ser usadas para secar o canal.

Seleção e preparo do pino de fibra de vidro


1. O pino de fibra de vidro selecionado deve ser aquele que melhor se adapta às
paredes do canal.
2. A limpeza do pino de fibra de vidro pode ser feita utilizando ácido fosfórico a
37% por 15 a 20 segundos.
3. O ácido deve ser removido do pino com jatos de água por 15 a 20 segundos. Jatos
de ar livre de óleo devem ser utilizados para secar o pino.
4. Com o pino de fibra de vidro seco, deve-se aplicar, com auxílio de pincel descar-
tável (do tipo microbrush), duas camadas de silano, com uma adequada secagem
entre as camadas. Uma fina camada de adesivo (monômero hidrófobo – p. ex.,
Bond – Scotch Bond Multipurpose – 3M ESPE) pode ser aplicada no pino usan-
do um pincel do tipo microbrush para permitir um melhor molhamento da resi-
na sobre o pino. O adesivo deve ser polimerizado por 40 segundos em diferentes
posições ao redor do pino.
5. Um incremento de resina composta não polimerizada deve ser aplicado ao redor
de toda a superfície do pino de fibra que entrará em contato com as paredes do
canal radicular.

Confecção do pino anatômico


1. Previamente à modelagem do pino de fibra de vidro, o canal radicular deve ser
isolado utilizando um gel hidrossolúvel.
2. O pino de fibra de vidro envolvido pela resina composta não polimerizada deve
ser inserido lentamente dentro do canal radicular até alcançar o final do preparo.
3. Uma rápida fotoativação (de cerca de 3 segundos) deve ser realizada na emboca-
dura do canal.
4. Em seguida, o conjunto “pino de fibra de vidro + resina composta” deve ser re-
movido de dentro do canal seguido de uma fotoativação por toda a extensão da

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132 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

resina composta por um tempo de exposição prolongado (aproximadamente 40


segundos em cada face) para permitir uma adequada polimerização da resina
composta envolvendo o pino.
5. O remanescente do pino que não fará parte do preparo coronário pode ser remo-
vido antes da cimentação do pino modelado com resina (pino anatômico), assim
como a porção coronária do núcleo de preenchimento pode ser construída e
preparada antes mesmo da cimentação do conjunto.
6. Deve-se aplicar ácido fosfórico a 37% por 10 segundos, no conjunto, para remo-
ção de contaminantes, e o pino deve ser lavado por 10 segundos e seco, previa-
mente aos procedimentos de cimentação.

Cimentação do pino anatômico utilizando um cimento resinoso convencional


(sistema adesivo de condicionamento total)
1. O conduto deve ser lavado para remoção do gel hidrossolúvel.
2. Para condicionamento da dentina, aplica-se o ácido fosfórico a 37% por 10 se-
gundos, e o conduto deve ser lavado com água corrente por 10 segundos e seco
utilizando pontas de papel absorvente.
3. O ativador químico do sistema adesivo deve ser aplicado com auxílio de pincel
descartável (do tipo microbrush) por toda a extensão do canal previamente ao
primer, para permitir a polimerização química do sistema adesivo (p. ex., Ati-
vador, passo 1.5 do sistema adesivo Scotchbond Multipurpose – 3M ESPE), e
aplica-se levemente um jato de ar por 10 segundos.
4. Em seguida, aplica-se o primer do sistema adesivo, também com auxílio de mi-
crobrush, seguido de leve jato de ar por 10 segundos (p. ex., Primer, passo 2 do
sistema adesivo Scotchbond Multipurpose – 3M ESPE).
5. Alguns sistemas adesivos apresentam, também, um passo adicional chamado
de Catalisador (aplicado no canal antes da inserção do cimento resinoso), que
permite maior grau de conversão dos monômeros resinosos presentes tanto no
sistema adesivo quanto no cimento resinoso, e também deve ser aplicado com
auxílio de microbrush, seguido de leve jato de ar por 10 segundos (p. ex., Catali-
sador, passo 2.5 do sistema adesivo Scotchbond Multipurpose – 3M ESPE).
6. O cimento resinoso convencional (p. ex., RelyX ARC – 3M ESPE) deve ser ma-
nipulado e inserido dentro do canal com auxílio do sistema da seringa Centrix®
para evitar a incorporação de bolhas.
7. O cimento pode ser aplicado, também, sobre a superfície do pino.
8. O pino anatômico deve ser inserido dentro do canal, em um movimento firme e
único (o pino deve ser inserido especificamente no mesmo local em que foi mo-
delado), com aplicação de pressão digital por cerca de 1 minuto (não remover a
pressão até o início da fotoativação do cimento resinoso).
9. O excesso de cimento deve ser removido, seguido de fotoativação por, pelo me-
nos, 40 segundos em cada face do remanescente.

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Endodontia passo a passo 133

Cimentação do pino anatômico utilizando um cimento resinoso


autocondicionante (sistema adesivo autocondicionante)
1. O conduto deve ser lavado para remoção do gel hidrossolúvel e seco utilizando
pontas de papel absorvente e jatos de ar livres de óleo.
2. O ativador químico do sistema adesivo deve ser misturado com auxílio de mi-
crobrush ao primer do sistema adesivo em um “casulo plástico” fornecido pelo
fabricante, e a mistura deve ser aplicada por toda a extensão do canal ativa-
mente (p. ex., ED Primer A e ED Primer B do sistema adesivo presente no
kit do cimento resinoso Panavia F 2.0 – Kuraray), com leve jato de ar por 10
segundos.
3. O cimento resinoso autocondicionante (p. ex., Panavia F 2.0 – Kuraray) deve ser
manipulado e inserido dentro do canal com auxílio do sistema da seringa Cen-
trix® para evitar a incorporação de bolhas.
4. O cimento pode ser aplicado, também, sobre a superfície do pino.
5. O pino anatômico deve ser inserido dentro do canal, em um movimento firme e
único (o pino deve ser inserido especificamente no mesmo local em que foi mo-
delado), com aplicação de pressão digital por cerca de 1 minuto (não remover a
pressão até o início da fotoativação do cimento resinoso).
6. O excesso de cimento deve ser removido, seguido de fotoativação por, pelo me-
nos, 40 segundos em cada face do remanescente.

Cimentação do pino anatômico utilizando um cimento resinoso autoadesivo (sem


aplicação de sistema adesivo)
1. O conduto deve ser lavado para remoção do gel hidrossolúvel e seco utilizando
pontas de papel absorvente.
2. O cimento autoadesivo (RelyX U200 – 3M ESPE) deve ser manipulado e inse-
rido dentro do canal com auxílio do sistema da seringa Centrix® para evitar a
incorporação de bolhas.
3. O cimento pode ser aplicado, também, sobre a superfície do pino.
4. O pino anatômico deve ser inserido dentro do canal, em um movimento firme e
único (o pino deve ser inserido especificamente no mesmo local em que foi mo-
delado), com aplicação de pressão digital por cerca de 1 minuto (não remover a
pressão até o início da fotoativação do cimento resinoso).
5. O excesso de cimento deve ser removido, seguido de fotoativação por, pelo me-
nos, 40 segundos em cada face do remanescente.

Técnica do reforço radicular (dentes com canais amplos e raízes


fragilizadas)*
Como alternativa à técnica do pino anatômico para canais amplos ou debilitados, a
técnica do reforço radicular se mostra uma excelente opção, visto que a amplitude

* Proposta por Souza Filho.

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134 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

do canal favorece o preparo ideal do substrato (limpeza e qualificação da dentina) e


também permite uma área para fotoativação direta do adesivo, possibilitando a for-
mação de uma camada híbrida adequada em toda a extensão do preparo radicular. O
preparo e a qualificação do substrato dentinário são fundamentais para que a camada
híbrida seja realizada com perfeição, uma vez que desempenha papel importante na
retenção do pino no canal radicular.

Sequência passo a passo da técnica do reforço radicular


Primeira etapa
Preparo da camada híbrida e reconstrução radicular
1. O preparo do substrato para o pino deve ser feito com auxílio de microscópio
operatório com uma boa iluminação.
2. Deve-se manter abertura e profundidade suficientes para uma adequada quali-
ficação da dentina e para que a hibridização possa ser feita com total capacidade
de fotoativação do sistema adesivo.
3. A limpeza e o aprofundamento do espaço para o pino devem ser realizados com
broca esférica carbide de haste longa # 5 ou # 6 (Komet ou similar) na profundi-
dade de 8 a 12 mm, de acordo com o tamanho da raiz e da inserção óssea, sem
necessidade de mais de dois terços da raiz como nos preparativos para os pinos
de metal.
4. O preparo deve ser realizado com auxílio de motor elétrico na velocidade de
900 a 1.000 rpm, para remover a camada de dentina modificada por substâncias
químicas utilizadas durante o tratamento endodôntico e ampliar o diâmetro do
canal para que a fotoativação do material seja adequada.
5. A dentina deve ser lavada cuidadosamente com auxílio de soro fisiológico e pin-
cel do tipo microbrush.
6. O conduto deve ser irrigado com soro fisiológico, e as paredes dentinárias de-
vem ser condicionadas com ácido fosfórico a 37% por 10 segundos.
7. O ácido deve ser removido com copiosa irrigação dentro do canal, aspirando-se
o excesso de água com cânula de aspiração, seguido de secagem com cones de
papel absorvente.
8. O sistema adesivo escolhido (de preferência um sistema com ativador químico)
deve ser aplicado de acordo com as instruções do fabricante.
9. Remove-se o excesso com cânula de aspiração seguido de um leve jato de ar para
eliminar componentes voláteis.
10. Realiza-se a fotoativação por 40 segundos.
11. Em pequenas porções, a resina flow é inserida no interior do canal e adaptada
com o auxílio de uma sonda lisa, de modo que todas as paredes fiquem reco-
bertas.

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Endodontia passo a passo 135

12. Repete-se a fotoativação por 40 segundos.


13. Aplicam-se novas camadas de resina flow, mantendo sempre um espaço central
para orientar o direcionamento da broca na repreparação do novo espaço para o
pino sobre a resina flow.

Segunda etapa
Repreparo do espaço para o pino sobre a resina flow
1. Selecionar uma broca esférica de baixa rotação HL # 4 (para o pino # 2 ou # 3)
para o repreparo do espaço para o pino sobre a camada de resina flow.
2. Gradativamente, com motor elétrico em 500 rpm, a broca HL # 4 deve ser apro-
fundada, seguindo o espaço deixado no centro para a orientação da direção do
preparo, respeitando a profundidade preestabelecida.
3. Selecionar o diâmetro do pino compatível com a broca esférica escolhida para o
preparo.
4. O pino deve ser testado no espaço e verificado novamente quanto à adaptação e
profundidade antes da cimentação.
5. Uma limpeza final do canal com ácido fosfórico e microbrush, para remover de-
tritos produzidos durante o repreparo do espaço, deve ser realizada.
6. Lavar copiosamente o canal com água ou soro fisiológico.
7. Secar adequadamente o espaço do canal com jatos de ar.

Terceira etapa
Preparo e tratamento da superfície do pino de fibra de vidro
1. Testar o pino no canal e observar sua profundidade e justeza no canal.
2. Fazer a limpeza do pino com ácido fosfórico por 15 segundos.
3. Lavar, secar e aplicar o silano em duas camadas sobre o pino.
4. Aplicar o bond do sistema adesivo (Scotchbond Multipurpose –3M ESPE) sobre
o pino.
5. Fotoativar por 40 segundos em todas as faces.

Quarta etapa
Cimentação do pino de fibra de vidro
1. Utilizar o cimento resinoso RelyX ARC (3M ESPE), que é compatível com a
resina flow das paredes do canal.
2. Irrigar copiosamente o canal com água ou soro fisiológico.
3. Secar com jatos de ar.
4. Preparar o cimento e levar ao canal com auxílio de seringa Centrix®.
5. O pino deve ser inserido no canal, em um movimento firme e único, com aplica-
ção de pressão digital por cerca de 1 minuto (não remover a pressão até o início
da fotoativação do cimento resinoso).

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136 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

6. O excesso de cimento deve ser removido com auxílio de um pincel tipo micro-
brush, seguido de fotoativação por, pelo menos, 40 segundos em cada face do
remanescente.
7. Reconstruir o núcleo com resina composta.
8. Fazer o preparo do núcleo.
9. Confeccionar uma coroa provisória.
As Figuras 13.6 a 13.12 ilustram a sequência passo a passo da reconstrução radi-
cular em canais debilitados.

A B C

▲ FIGURA 13.6
A) Canal radicular após a obturação endodôntica em raiz debilitada. B Preparo do espaço do canal
com broca esférica # 6. C) Espaço do canal preparado com a broca esférica # 6.

A B C
▲ FIGURA 13.7
A) Limpeza do espaço preparado no canal radicular com auxílio de microbrush e soro fisiológico. B)
Aplicação do adesivo nas paredes do canal. C) Fotopolimerização por 40 segundos.

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Endodontia passo a passo 137

A B C

▲ FIGURA 13.8
A) Inserção de pequena porção de resina flow na entrada do canal. B Distribuição da resina flow
com auxílio de sonda endodôntica lisa, revestindo as paredes dentinárias (o revestimento deve
ser feito em camadas até que as paredes do canal sejam reconstruídas). C O repreparo do espaço
para o pino deve ser feito sobre a resina flow, com broca esférica # 4, em motor elétrico, na velo-
cidade de 500 a 900 rpm, seguindo a direção de um espaço mantido no centro da reconstrução.

A B C

▲ FIGURA 13.9
A) Espaço do pino preparado sobre a camada de resina flow. B Teste do pino no interior do espaço
preparado. C Pino cimentado no canal radicular.

" FIGURA 13.10


A) Preenchimento do núcleo com
resina composta. B) Núcleo pre-
parado com o término do preparo
A B em dentina.

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138 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

A B

C D

E F

G H

▲ FIGURA 13.11
Sequência da instalação de pino no espaço intrarradicular. A) Canal preparado após limpeza e
remoção da dentina alterada. B-C) Colocação da resina flow nas paredes internas do canal pela
técnica do reforço radicular. D) Fotopolimerização direta com dispositivo para polimerizar a re-
sina no interior do canal radicular. E-G) Repreparo do espaço para o pino sobre a resina flow.
H) Pino de fibra de vidro cimentado no canal radicular pronto para a confecção do núcleo de
resina composta.

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Endodontia passo a passo 139

A B C

▲ FIGURA 13.12
A) Radiografia inicial. B) Radiografia final do tratamento endodôntico e colocação de pino de fibra
de vidro. C) Radiografia de controle após nove meses.

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14
Protocolos farmacológicos
para procedimentos eletivos
e urgências endodônticas
EDUARDO DIAS DE ANDRADE, PAULA SAMPAIO DE MELLO
E ANA PAULA GUERREIRO BENTES

CONSIDERAÇÕES GERAIS
Nos dias de hoje, o tratamento endodôntico realizado por meio de técnicas conven-
cionais tem uma taxa de sucesso em torno de 90 a 95% dos casos, em função das téc-
nicas de preparo e obturação, da incorporação de avanços tecnológicos já consolida-
dos e do grau de experiência do profissional. De forma simplista, a terapia consiste na
descontaminação e modelagem do sistema de canais radiculares, seu preenchimento
com um material obturador, seguido de um período de acompanhamento clínico que
finda com o processo de reparo da lesão. Os 5 a 10% dos casos de insucesso endodôn-
tico podem ainda ser resolvidos com o auxílio de cirurgias perirradiculares.

Na prática da Endodontia, há dois tipos de procedimentos: os eletivos, em pacientes assin-


tomáticos, que permitem o pré-agendamento das consultas, e as urgências, quando invaria-
velmente os pacientes são sintomáticos, exigindo pronto atendimento.

Independentemente do tipo de procedimento, a maior preocupação dos endo-


dontistas diz respeito à dor inflamatória, sintoma quase sempre presente nas situa-
ções de urgência, como pulpites, pericementites e abscessos.
Todavia, durante o preparo químico-mecânico do sistema de canais radiculares,
mesmo em pacientes previamente assintomáticos, fatores irritantes, como bactérias e
seus produtos, tecido necrosado, soluções irrigadoras ou substâncias contidas nos “cura-
tivos de demora”, podem ser, inadvertidamente, forçadas além do ápice para os tecidos
periapicais. Essa agressão pode ser suficiente para deflagrar uma resposta inflamatória
local, com presença de dor (e até mesmo edema) de diferentes graus ou magnitudes.
Outra preocupação dos endodontistas diz respeito às infecções bacterianas. Infeliz-
mente, muitos profissionais ainda supervalorizam o papel dos antibióticos, em detri-
mento dos procedimentos de descontaminação do local, ou seja, a remoção da causa.

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142 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Antibiótico pode ser definido como uma substância que possui a capacidade de
interagir com microrganismos que causam infecções, matando-os ou inibindo sua
reprodução, permitindo ao sistema imunológico combatê-los com maior eficácia.
Assim, fica fácil entender que o sistema imunológico do hospedeiro é o grande res-
ponsável pela cura das infecções, sendo atribuído aos antibióticos apenas um papel
auxiliar ou complementar à intervenção clínica.
Por fim, para completar a tríade, o endodontista não pode negligenciar o cha-
mado estresse cirúrgico, pois é sabido que muitos pacientes são muito ansiosos ou
temerosos, a ponto de não suportarem o tratamento endodôntico sem um adequado
condicionamento psicológico e emocional, às vezes complementado pelo uso de fár-
macos ansiolíticos.
Feita essa introdução, no presente capítulo são apresentados os protocolos far-
macológicos para procedimentos eletivos e situações de urgência em Endodontia,
sugeridos pela área de Farmacologia, Anestesiologia e Terapêutica da Faculdade de
Odontologia de Piracicaba-Unicamp.

PROCEDIMENTOS ELETIVOS PACIENTES PREVIAMENTE ASSINTOMÁTICOS


Tratamentos endodônticos favoráveis
Estão incluídos dentes permanentes com polpa viva ou necrosada, cuja anatomia não
ofereça dificuldades para a instrumentação.
Nesses casos, a expectativa em relação ao período pós-operatório é de que o pa-
ciente pode acusar apenas certo desconforto ou, quando muito, dor de intensidade
leve, prevenida e controlada pelo uso exclusivo de um analgésico, como mostra o
Quadro 14.1.

Quadro 14.1 Protocolo farmacológico para o controle da dor em tratamentos endodônticos


favoráveis
Primeira opção: dipirona sódica – 500 mg a 1 g.*
Fármacos alternativos: ibuprofeno 200 mg ou paracetamol 750 mg.
Posologia: administrar a primeira dose ao final do atendimento, antes de cessarem os efeitos da anestesia
local. Prescrever as doses de manutenção, com intervalos de 4 horas para a dipirona e de 6 horas para o ibu-
profeno ou paracetamol, durante o período restante do dia do atendimento.
*No caso de se prescrever a solução oral “gotas” de dipirona sódica, é importante lembrar que 20 gotas equivalem a
aproximadamente 500 mg e 40 gotas à dose-teto de 1 g.
Fonte: Andrade e Souza Filho.1

Tratamentos endodônticos de maior complexidade


Aqui se enquadram os retratamentos endodônticos, ou mesmo determinados trata-
mentos de dentes permanentes cuja instrumentação apical é dificultada pela presen-
ça de atresias, curvaturas radiculares, nódulos pulpares ou calcificações.
Recomenda-se a administração de um corticosteroide de ação prolongada, via
oral, antes do estímulo lesivo,2 seguida da prescrição de medicação analgésica de su-
porte, pelo período de 24 a 48 horas pós-operatórias, com dipirona sódica ou ibupro-
feno (Quadro 14.2).

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Endodontia passo a passo 143

Quadro 14.2 Analgesia perioperatória sugerida para tratamentos endodônticos desfavoráveis


ou retratamentos endodônticos
Pré-operatório: dexametasona 4 mg (1 comp.) ou betametasona 4 mg (2 comp. de 2 mg).
Dose única, cerca de 30 a 45 minutos antes do atendimento.
Pós-operatório: dipirona sódica – 500 mg a 1 g, a cada 4 horas, por 24 a 48 horas, ou ibuprofeno 200 mg, a
cada 6 horas, por 24 a 48 horas.
Fonte: Andrade e Souza Filho.1

A justificativa para esse protocolo, denominado analgesia perioperatória, é de


que os mediadores inflamatórios devem manter-se inibidos por um período de tem-
po mais prolongado, pois a sensibilização central pode não ser prevenida se o trata-
3
mento for interrompido durante a fase aguda da inflamação.
Antes do tratamento ou retratamento endodôntico de elementos assintomáticos,
muitas vezes o endodontista pode não achar necessário o uso de um corticosteroide
como medicação pré-operatória. Entretanto, ao final do procedimento, pode mudar
de ideia, em função da complexidade do procedimento, que não foi prevista, espe-
cialmente em molares.
Nesses casos, na região apical do dente envolvido (que ainda se encontra aneste-
siada), basta fazer uma infiltração submucosa de 1 mL da solução injetável de fosfato
dissódico de dexametasona (2 mg/mL), ou 0,5 a 1 mL da solução injetável de fosfato
dissódico de betametasona (4 mg/mL). Para isso, deve-se empregar uma seringa de 1
mL (100 unidades) e agulha 13 x 4,5, as mesmas usadas para a aplicação de insulina
(Figura 14.1).

1. 2. 3.

! FIGURA 14.1
Analgesia preventiva por meio de
injeção submucosa de betameta-
sona, feita ao término da instru-
Seringa Dexametasona Infiltração mentação, na região periapical
100 U = 1 mL ou betametasona submucosa do dente envolvido.

Aqui, a opção é pela analgesia preventiva, ou seja, a introdução de um regime


analgésico após o estímulo lesivo (no caso, a instrumentação), porém antes do início
da sensação dolorosa. Essa simples conduta pode evitar ou minimizar a dor e o des-
conforto pós-operatórios após a cessação dos efeitos da anestesia local.1,4
Como alternativa ao uso parenteral da betametasona, nessa mesma situação,
pode-se lançar mão do cetorolaco de trometamina 10 mg, via sublingual, logo após o
término da instrumentação endodôntica.

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144 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Cirurgias perirradiculares
Em razão dos avanços científicos e tecnológicos da implantodontia, as cirurgias pe-
rirradiculares têm perdido espaço como alternativa terapêutica no caso de insucesso
de tratamentos ou retratamentos endodônticos, se analisada a inter-relação risco/
custo/benefício.
No planejamento de uma cirurgia perirradicular, além de se preocupar com a
dor e o edema pós-operatórios, o endodontista deve considerar um protocolo para o
controle da ansiedade e do medo por parte do paciente, que podem interferir nega-
tivamente no curso da intervenção ou até mesmo inviabilizá-la. Por fim, o operador
precisa se preocupar com a possibilidade de uma possível infecção da ferida cirúrgica.
Quanto a esse último aspecto, e provavelmente por insegurança, nota-se que mui-
tos cirurgiões prescrevem antibióticos pelo período de até 10 dias para “prevenir” a
infecção do local operado em pacientes imunocompetentes. Deve-se enfatizar que não
há base científica para esse tipo de conduta, considerada desnecessária e inadequada.
Se o profissional optar pela profilaxia antibiótica, o regime de dose única pré-opera-
tória (p. ex., amoxicilina 1 g, 1 hora antes) é o mais indicado.5 Em geral, as doses pro-
filáticas pós-operatórias não trazem benefícios ao paciente, pois os antibióticos não
conseguem penetrar e desorganizar o biofilme bacteriano formado no local da ferida.6
Portanto, é cada vez mais consensual que, se as medidas de assepsia e antissepsia
forem seguidas à risca, a profilaxia antibiótica não é indicada nessas situações, a me-
nos que o sistema imune do paciente esteja comprometido ou apresente condições
de risco para infecções à distância.7 Além disso, é estimado que 6 a 7% dos pacientes
medicados com antibióticos experimentam algum tipo de reação adversa, fato que
deve ser considerado quando da avaliação do risco/benefício de seu emprego.8
Com base nessas necessidades e considerações, o Quadro 14.3 traz a sugestão de
um protocolo farmacológico para as cirurgias perirradiculares.

Quadro 14.3 Protocolo farmacológico para cirurgias perirradiculares


Medicação e cuidados pré-operatórios: midazolam 7,5 mg – 1 comprimido e dexametasona 4 mg – 1 com-
primido.
Administrar, na chegada ao consultório, 30 minutos antes do início dos procedimentos de antissepsia local.
Previamente à anestesia local, pedir que o paciente bocheche vigorosamente com 15 mL de uma solução
aquosa de digluconato de clorexidina a 0,12%, por 1 minuto.
Medicação e cuidados pós-operatórios: dipirona (500 mg a 1 g) ou ibuprofeno 200 mg ou paracetamol
750 mg.
Tomar a primeira dose ao final dos efeitos da anestesia local, repetindo o procedimento a cada 4 horas (dipi-
rona) ou 6 horas (ibuprofeno ou paracetamol), nas primeiras 24 a 48 horas pós-operatórias.
Prescrever solução aquosa de digluconato de clorexidina a 0,12%, com a orientação de bochechar com 15
mL da solução, por 1 minuto, a cada 12 horas, pelo período de 5 a 7 dias.

URGÊNCIAS ENDODÔNTICAS PACIENTES PREVIAMENTE SINTOMÁTICOS


As condições pulpares e periapicais que requerem tratamento endodôntico de ur-
gência são as pulpites irreversíveis e as necroses com ou sem envolvimento periapical
(pericementites e abscessos apicais agudos).

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Endodontia passo a passo 145

Pulpites irreversíveis
No tratamento das pulpites irreversíveis, a conduta mais importante é o alívio da
dor, em geral espontânea, por meio da remoção da causa (“tirar a dor com as mãos”,
como se falava antigamente). Portanto, a anestesia local é um importante passo do
tratamento. Os critérios de escolha da solução anestésica e a descrição das técnicas
anestésicas complementares são apresentados no Capítulo 9.
Após os procedimentos endodônticos para a remoção da causa (pulpotomia ou
pulpectomia), basta prescrever um analgésico para controle da dor residual, quando
ainda presente, conforme o protocolo a seguir:

Dipirona sódica – 500 mg a 1 g ou ibuprofeno 200 mg ou paracetamol 750 mg.


Deve-se administrar a primeira dose ao final do procedimento e prescrever doses de manu-
tenção com intervalos de 4 horas (dipirona) ou 6 horas (ibuprofeno ou paracetamol), caso
a dor ainda persista, pelo período máximo de 24 horas.

Em casos raros, pode haver necessidade da prescrição de um anti-inflamatório.


Opta-se então por 1 comprimido de betametasona 2 mg, via oral, ou 1 comprimido
de cetorolaco de trometamina 10 mg, via sublingual.
Após 24 horas, deve-se obter informações do paciente com relação à remissão
dos sintomas. Caso a dor ainda não tenha sido controlada, agendar nova consulta
para avaliar a necessidade de outra intervenção clínica, objetivando a complementa-
ção do tratamento endodôntico.

Necroses pulpares sem envolvimento periapical


Embora o dente envolvido não responda a estímulos como frio, calor ou teste elétri-
co, ele ainda pode conter tecido vital inflamado na porção apical do canal radicular.
Por essa razão e para o maior conforto do paciente na colocação do isolamento abso-
luto, a anestesia local deve sempre ser realizada no tratamento de dentes com polpas
necrosadas.
Após o preparo do sistema de canais radiculares (parcial ou total), finalizado
com a colocação de um curativo de demora ou obturação final, basta prescrever um
analgésico, de acordo com o protocolo a seguir:

Dipirona sódica – 500 mg a 1 g ou ibuprofeno 200 mg ou paracetamol 750 mg.


Deve-se administrar a primeira dose ao final do procedimento e prescrever doses de manu-
tenção com intervalos de 4 horas (dipirona) ou 6 horas (ibuprofeno ou paracetamol), caso
a dor ainda persista, pelo período máximo de 24 horas.

Após 24 horas, deve-se obter informações do paciente com relação à presença de


dor ou de flare-up (dor intensa acompanhada de edema da face), complicação que é
cada vez mais rara quando o tratamento endodôntico é feito por especialistas (1,5 a
2% dos casos).9,10

Souza_14.indd 145 17/09/14 08:05


146 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Periodontites apicais agudas (pericementites) sem envolvimento


pulpar (p. ex., por trauma oclusal)
O tratamento consiste no ajuste da oclusão do elemento envolvido e na prescrição de
um analgésico (dipirona, ibuprofeno ou paracetamol, seguindo o mesmo protocolo
descrito para as pulpites). Além disso, deve-se orientar o paciente quanto aos cuida-
dos com a mastigação.

Periodontites apicais agudas (pericementites) com envolvimento


pulpar (necrose)
O paciente chega ao consultório com a boca entreaberta e relata a sensação de dente
“crescido” (extrusão dental). Pode não acusar dor espontânea, mas essa se manifesta
ao mínimo toque do dente antagonista, quanto mais pela percussão vertical. O pro-
tocolo farmacológico está contido no Quadro 14.4, entendendo-se que a causa será
removida (principal conduta), além da orientação dos cuidados com a mastigação.

Quadro 14.4 Protocolo farmacológico para as periodontites apicais agudas com envolvimento
pulpar
Administrar 4 mg de dexametasona ou betametasona, por via oral, na chegada do paciente ao consultório.
Anestesia local: se for empregada a técnica infiltrativa, intraóssea ou intraligamentar, optar pela solução de
articaína a 4% com epinefrina 1:100.000 ou 1:200.000, por sua melhor difusibilidade óssea.*
Medicação pós-operatória: dipirona sódica – 500 mg a 1 g ou paracetamol 750 mg ou ibuprofeno 200 mg.
*Nos bloqueios regionais na mandíbula, pode-se considerar o uso de um tubete da solução de lidocaína a 2% com
epinefrina 1:100.000 e um segundo tubete de uma solução de bupivacaína a 0,5% com epinefrina 1:200.000. Com
isso, além da maior duração da anestesia, reduz-se o consumo de analgésico no período pós-operatório.

Após 24 horas, deve-se obter informações do paciente com relação à remis-


são ou exacerbação dos sintomas. Nesse último caso, reavaliar o quadro, decidindo
por nova intervenção clínica e/ou prescrição de um anti-inflamatório não esteroide
(p. ex., cetorolaco de trometamina 10 mg sublingual).

Abscessos apicais agudos


A dor observada nos abscessos apicais agudos é atribuída à queda do pH na região
inflamada e à pressão mecânica exercida pelo exsudato purulento, que estimulam
diretamente as terminações nervosas livres do local. Paralelamente, os nociceptores
são sensibilizados pela liberação de mediadores químicos pró-inflamatórios, como
histamina, bradicinina, prostaglandinas e leucotrienos.
A descontaminação do local, por meio da incisão cirúrgica dos tecidos moles, com
auxílio de um bisturi, é o melhor tratamento para aliviar a dor dos abscessos de origem
endodôntica. Numa segunda etapa, deve-se proceder à descontaminação parcial do
sistema de canais radiculares (terço médio e cervical), onde se encontra o maior “reser-
vatório” de bactérias. Com isso, consegue-se também alterar o pH do meio.
Os anti-inflamatórios praticamente não contribuem para o controle da dor de-
corrente dos abscessos de origem endodôntica. Para o controle da dor residual, de-
corrente da incisão cirúrgica, basta empregar um analgésico como a dipirona ou o
paracetamol, desde que a intervenção local tenha sido bem conduzida.

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Endodontia passo a passo 147

Por ocasião da drenagem de abscessos, deve-se considerar um protocolo de se-


dação mínima, obtida pela administração de midazolam 7,5 mg, via oral, que promo-
ve um rápido início de ação. Essa conduta tem por objetivo tornar o paciente mais
cooperativo aos procedimentos de drenagem, permitindo que o profissional trabalhe
com mais rapidez e menos estresse.

O midazolam deve estar disponível no consultório. Enquanto se aguarda o efeito desse


ansiolítico e a obtenção de níveis plasmáticos do antibiótico (quando indicado), deve-se
providenciar o instrumental e materiais necessários para os procedimentos de drenagem
cirúrgica do abscesso.

Uso de antibióticos como terapia complementar


No caso dos abscessos apicais agudos localizados, na ausência de sinais de dissemi-
nação local ou manifestações sistêmicas do processo infeccioso, o uso de antibióticos
não é recomendado, bastando que se proceda à descontaminação do local (drenagem
cirúrgica da coleção purulenta, curetagem das fístulas e esvaziamento do sistema de
canais radiculares).1
Exceções a essa regra dizem respeito aos pacientes portadores de doenças sistêmi-
cas que induzem alterações metabólicas ou imunossupressão, como ocorre no diabetes,
na doença renal crônica e no lúpus eritematoso sistêmico, entre outras patologias.1
Ao contrário, alguns abscessos apicais agudos podem apresentar sinais de dis-
seminação local (celulite, linfadenite, limitação da abertura bucal) e manifestações
sistêmicas do quadro infeccioso (febre, taquicardia, falta de apetite, mal-estar geral).
Isso indica ao profissional que os sistemas de defesa do paciente não estão conseguin-
do, por si só, controlar a infecção e, portanto, o uso de antibióticos é imprescindível.1
O Quadro 14.5 traz os protocolos antimicrobianos indicados no tratamento de
abscessos apicais agudos com sinais de disseminação, em fase inicial e avançada, com
base na história do problema (anamnese) e no exame físico.

Quadro 14.5 Regimes antimicrobianos complementares indicados no tratamento das infecções


endodônticas, com as dosagens para adultos
Indicação Antibiótico Dose*
Abscessos apicais Amoxicilina 500 mg a cada 8 horas
em fase inicial
Pacientes com história de Claritromicina 500 mg a cada 12 horas
alergia às penicilinas ou ou
azitromicina 500 mg a cada 24 horas
Infecções disseminadas Amoxicilina 500 mg a cada 8 horas
(presença de celulite) + +
metronidazol 250 mg a cada 8 horas
Quando não se obtém Amoxicilina
resposta ao tratamento com associada com 500 mg a cada 8 horas
amoxicilina + metronidazol clavulanato K
Pacientes com história de Clindamicina 300 mg a cada 8 horas
alergia às penicilinas
*O tratamento deve ser iniciado com uma dose de ataque, em geral o dobro das doses de manutenção (p. ex., amo-
xicilina: dose de ataque = 1 g).
Fonte: Mascali e colaboradores.11

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148 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Complicações dos abscessos de origem endodôntica


Nos casos de disseminação do processo infeccioso para os espaços teciduais adja-
centes, com a presença de trismo, linfadenite, febre, taquicardia, mal-estar geral e
outras manifestações sistêmicas da infecção, os pacientes devem ser encaminhados
a especialistas, que em geral cuidam da internação hospitalar, para tratamento ci-
rúrgico sob anestesia geral, complementado por antibioticoterapia específica por via
intravenosa e outras medidas de suporte.
Recomenda-se, portanto, que o endodontista, frente às infecções bacterianas bu-
cais disseminadas, não prescreva antibióticos ou anti-inflamatórios na expectativa de
que este procedimento, por si só, vá resolver o problema.
As infecções bucais com sinais de disseminação podem evoluir e acarretar sérias
complicações à distância como abscessos orbitais ou endoftalmite purulenta,11-13 exi-
gindo cuidados imediatos de um cirurgião bucomaxilofacial e outros especialistas da
área médica, em ambiente hospitalar.

REFERÊNCIAS
1. Andrade ED, Souza-Filho FJ. Protocolos farmacológicos em 7. Tong DC, Rothwell BR. Antibiotic prophylaxis in dentistry:
endodontia. In: Andrade ED. Terapêutica Medicamentosa em a review and practice recommendations. J Am Dent Assoc.
Odontologia. 3. ed. São Paulo: Artes Médicas; 2006, p.169-78. 2000;131:366-74.
2. Pochapski MT, Santos FA, Andrade ED, Sydney GB. Effect 8. Alanis A, Weintein AJ. Adverse reactions associated with the
of pretreatment dexamethasone on postendodontic pain. use of oral penicillins and cephalosporins. Med Clin North
Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod. Am. 1983;67:113.
2009;108(5):790-5. 9. Imura N, Zuolo ML. Factors associated with endodontic fla-
3. Møiniche S, Kehlet H, Dahl JB. A qualitative and quantitative re-ups: a prospective study. Int Endod J. 1995;28(5):261-5.
systematic review of preemptive analgesia for postoperative 10. Alves VO. Endodontic flare-ups: a prospective study. Oral
pain relief: the role of timing of analgesia. Anesthesiology Surg Oral Med Oral Pathol. 2010;110(5):68-72.
2002 Mar;96(3):725-41. 11. Mascali R, Berguiga M, Delhoum S, Le Loir M, Cochener
4. Pinheiro, MLP. Infiltração submucosa intrabucal de beta- B, Grambelle J, et al. Endogenous bacterial endophthal-
metasona na prevenção ou controle da dor em endodontia. mitis related to dental abscess: case report. J Fr Ophtalmol.
[tese]. Piracicaba: Faculdade de Odontologia de Piracicaba- 2012;35(1):35-9.
-Unicamp; 2005. 12. Antunes AA, de Santana Santos T, de Carvalho RW, Avelar
5. Peterson LJ. Antibiotic prophylaxis against wound infections RL, Pereira CU, Pereira JC. Brain abscess of odontogenic ori-
in oral and maxillofacial surgery. J Oral Maxillofac Surg. gin. J Craniofac Surg. 2011;22(6):2363-5.
1990;48:617-20. 13. Li X, Tronstad L, Olsen I. Brain abscesses caused by oral in-
6. Groppo FC, Del Fiol FS, Andrade ED. Profilaxia e tratamento fection. Endod Dent Traumatol. 1999;15(3):95-101.
das infecções bacterianas. In: Andrade ED. Terapêutica medi-
camentosa em odontologia. 2. ed. São Paulo: Artes Médicas;
2006. p. 61-93.

LEITURA RECOMENDADA
Andrade ED, Bentes APG, Brito, FC. Antibióticos em endodontia:
uso profilático e curativo. In: Endodontia: uma visão contem-
porânea/Rui Hizatugu, Eduardo Fregnani, organizadores. São
Paulo: Santos; 2012. p. 151-60.

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15
Sistemas de instrumentação
mecanizada
NILTON VIVACQUA GOMES

CONSIDERAÇÕES GERAIS
Toda técnica empregada para executar um determinado procedimento precisa ser exaus-
tivamente treinada antes de sua utilização e, independentemente das variações, deve ser
sempre baseada em importantes princípios para que se alcance o sucesso esperado.
A escolha de um instrumento ou equipamento deve atender de forma eficiente
a demanda de cada caso, além de ser de fácil utilização e ter baixo custo, se possível.
A exploração e ampliação prévia dos condutos com limas especiais, tipo VDW
C-Pilot (recomendadas ao invés da tipo K convencional), bem como das emboca-
duras, com a LA Axxess (SybronEndo), por exemplo, facilita muito o processo de
instrumentação e também estende a vida útil das limas.
Uma fase muito importante é a irrigação, que deve ser feita a cada troca de lima
ou a cada duas limas, dependendo do desgaste dentinário provocado. Isso deve ser
feito de maneira abundante, antes do próximo instrumento, lembrando que os mes-
mos devem ter suas espiras limpas antes da reutilização, caso ela seja necessária.

PRINCÍPIOS BÁSICOS DE PRÉ ALARGAMENTO E AMPLIAÇÃO DOS TERÇOS


CERVICAL E MÉDIO
Os sistemas de instrumentação mecanizada trouxeram uma importante inovação para
a Endodontia. Os Orifice Openers ou Orifice Shapers (OS) permitem a ampliação dos
terços cervical e médio sem o auxílio das brocas de Gates-Glidden. Os OS normalmen-
te possuem pontas de # 25 a # 40 e conicidades de 0.08 a 0.12 mm/mm. Cada sistema
tem seus OS próprios, com suas características peculiares, porém todos podem ser
usados com as duas primeiras cinemáticas de instrumentação descritas mais adiante.
A sua utilização é mais rápida e deixa o preparo mais centrado e regular, o que os
diferencia das brocas de Gates, que são difíceis de usar e desgastam exageradamente a
estrutura dental, podendo ocasionar perfurações laterais. Os OS, por serem calibro-

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150 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

sos, apenas são indicados para as porções retas dos condutos, evitando assim fraturas
e desvios, por isso têm grande durabilidade. Exigem, em geral, velocidades e torques
mais altos que os outros instrumentos e maior pressão durante o seu uso, bem como
um tempo prolongado para o pincelamento.

CINEMÁTICAS DE INSTRUMENTAÇÃO MECANIZADA

• Cinemática 1 para penetração (bicada): nesse movimento, visa-se apenas ao avanço da


lima, utilizando-se movimentos curtos de ida e volta, sempre com a ida lenta e a volta rápida
(1 segundo no total).
• Cinemática 2 para ampliação lateral (anticurvatura): movimento aplicado em porções
já preparadas com a cinemática 1 ou 3, que visa ao alargamento cervical e médio dos con-
dutos. Insere-se o instrumento passivamente; em seguida, o pincelamento lento é feito
com pressão em uma das paredes durante o retorno. Essa cinemática é usada apenas, ou
preferencialmente, com os OS.
• Cinemática 3 para movimento reciprocante (vaivém): este é utilizado para quaisquer
limas acionadas com cinemática reciprocante. Nele, o movimento de vaivém é lento e
longo, tanto na penetração, quanto na retirada do instrumento (2 segundos no total).

SISTEMAS DE INSTRUMENTAÇÃO ROTATÓRIA


K3 (XF) RS6 (SybronEndo)
A sequência RS6 (Rotatória com Segurança em 6 Instrumentos) (Figura 15.1) foi
desenvolvida pelo autor com base em cálculos físico-matemáticos, com o objetivo de
reduzir ao máximo a fratura desses instrumentos durante o preparo dos canais radi-
culares, aumentando assim a sua reutilização com segurança e diminuindo o custo
total do tratamento. A sequência proposta foi desenhada considerando-se o princípio
da torção, um dos métodos mais importantes de falha dos instrumentos. Ao detectar
o ponto de torção mais provável de fratura em um instrumento, pode-se alterar a
ordem e a penetração das limas para minimizar esse risco, bem como a configuração
do motor. Porém, essas alterações de segurança deixam a sequência mais lenta.
Graças às características de grande resistência à torção, dado o formato de sua
secção transversal em tripla hélice com planos radiais à exceção dos OS, que possuem
secção de retângulo modificado, os instrumentos K3 da SybronEndo foram escolhi-
dos para compor essa sequência. Como essas características não coexistem com gran-
de flexibilidade das limas, sobretudo em numerações maiores, o seu uso fica limitado
às curvaturas de, no máximo, 35° de angulação. Portanto, se não existirem curvaturas
importantes, é possível reutilizar com segurança esses instrumentos em até 60 con-
dutos, desde que não haja deformação das espiras, situação em que as limas devem
ser descartadas, independentemente da contagem de utilizações. Esse kit foi original-
mente montado com as limas K3, mas com a sua descontinuada produção, ele passou
a ser montado com as limas K3 XF (descritas adiante), agregando maior flexibilidade.

Sequência de uso de acordo com a recomendação do autor


• Exploração com limas manuais tipo K # 15, 2 a 3 mm aquém do comprimento
aparente do dente (CAD).

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Endodontia passo a passo 151

• K3 30/.06 – 250 rpm e torque 0,8 N.cm. Movimentos de bicada até o início da curva-
tura. Não é necessária em condutos com amplitude moderada, podendo ser usada ao
final da sequência apical, no comprimento real de trabalho (CRT) de condutos retos.
• K3 25/.10 (OS) – 350 rpm e torque 2 N.cm. Movimentos de bicada e pincelamento
anticurvatura até o início da curvatura. Seguir com a odontometria.
• K3 15/.04 – 250 rpm e torque 0,5 a 0,8 N.cm. Movimentos de bicada até o CRT.
Apenas em condutos onde a lima manual # 15 teve dificuldade de penetração.
• K3 15/.06, 20/.06 e 25/.06 – 250 rpm e torque 0,8 a 1,2 N.cm. Usadas em sequência,
todas com movimentos de bicada até o CRT. Caso alguma lima não alcance o CRT,
retornar com o OS em maior profundidade, seguida de pincelamento anticurvatura,
e/ou, em casos mais constritos, utilizar brocas de Gates 4, 3 e 2, coroa-ápice até o iní-
cio do terço apical para reduzir o toque dentinário nas limas apicais de conicidade .06.
• Se necessário, utilize limas extras com conicidade 0,04 para maior ampliação apical.

! FIGURA 15.1
Sequência RS6 desenvolvida pelo autor e
produzida com K3.

ProDesign S (Easy)
Designada para compor uma sequência curta e eficiente, a ProDesign S da Easy Equi-
pamentos é uma evolução bastante clara da já conhecida ProDesign Original, passan-
do de sete instrumentos para apenas quatro (Figura 15.2). A principal diferença entre
as duas é que a ProDesign S possui dois OS, que são responsáveis por grande parte da
ampliação, instrumentando os condutos até 3 ou 4 mm aquém do CRT. Isso permite
uma menor quantidade de instrumentos para ampliação apical.
Em sua versão mais nova, os instrumentos possuem um tratamento térmico da
liga metálica, o que provoca a deposição de óxido de titânio na superfície da lima, con-
ferindo-lhes maior flexibilidade pela perda da memória elástica. O instrumento branco
tem secção transversal em forma de S, o amarelo e azul, em forma de tripla hélice, e o
vermelho, em forma de quadri-hélice. A longevidade desses instrumentos alcança de
20 a 30 condutos, desde que não envolvam curvaturas acentuadas (45° no máximo).

Sequência de uso de acordo com a recomendação do autor e do fabricante


• Pode-se iniciar o uso desse sistema com uma das duas opções abaixo:

Opção 1 – Exploração com limas manuais tipo K # 10 até o terço médio, seguida
da ProDesign S Vermelha (descrita adiante), em vaivém, para obtenção direta

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152 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

do CRT (é importante conhecer a odontometria). Este passo reduz a vida útil


dessa lima em relação às outras. Caso ela não alcance o CRT, utilize a opção 2.

Opção 2 – Exploração com limas manuais tipo K # 15, 2 a 3 mm aquém do CAD.
• Após a escolha de uma das opções anteriores, continue com a sequência descrita
a seguir:

ProDesign S branca (OS 30/.10) – 500 a 900 rpm e torque 3 N.cm. Movimentos
de bicada e pincelamento anticurvatura apenas na parte reta do conduto.

ProDesign S amarela (OS 25/.08) – 500 a 900 rpm e torque 2 N.cm. Movimentos
de bicada e pincelamento anticurvatura 2 a 3 mm mais profundamente que a lima
anterior. Pode adentrar curvaturas não acentuadas. Seguir com a odontometria.

ProDesign S vermelha “Gisele” (25/.01) – 350 rpm e torque 0,5 a 1 N.cm. Mo-
vimentos de vaivém até ultrapassar o CRT. Este passo deve ser omitido no caso
da escolha da opção 1 como passo inicial. Caso esta não alcance o CRT, obter
patência com limas manuais ou com MRA (apenas no motor Easy SI e lima
15/.05) e depois voltar a utilizar a lima vermelha no CRT.

ProDesign S azul (20/.06) – 350 rpm e torque 1 N.cm. Movimentos de bicada
até o CRT. Caso este instrumento não alcance o CRT, retornar com o OS amare-
lo em maior profundidade, seguido de pincelamento.
• Para maior ampliação, utilizar as limas extras (30 a 40/.05).

! FIGURA 15.2
Sequência ProDesign S.

SISTEMAS COM MOVIMENTOS RECIPROCANTES


Reciproc (VDW)
Inaugurando uma categoria totalmente inovadora de instrumentação mecanizada,
o sistema Reciproc modificou a maneira de se compreender o preparo acionado a
motor. Enquanto todos os sistemas existentes rotacionavam os instrumentos para a
direita, o Reciproc inovou com o movimento chamado reciprocante (que significa
alternar). Essa nova cinemática só pode ser alcançada por alguns poucos motores no
mercado. No caso do Reciproc (Figura 15.3), os motores VDW Silver e Gold possibi-
litam esse feito, como também a cinemática rotatória para instrumentos convencio-
nais. Esse movimento consiste em uma oscilação assimétrica para a direita e para a
esquerda, sendo que a rotação para a esquerda (150° anti-horário) é 120° maior que

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Endodontia passo a passo 153

aquela no sentido inverso (30° horário), resultando em uma volta completa para a
esquerda a cada três ciclos de oscilação. Tal movimento é feito na velocidade de 10
ciclos de oscilação por segundo, gerando uma velocidade final de 200 rpm.
O movimento oscilatório simétrico, no qual a oscilação é igual para ambos os
lados, já existe há muitos anos e é utilizado com limas manuais, porém nunca foi
largamente utilizado para a instrumentação completa dos canais radiculares. Com
o movimento nomeado reciprocante, possibilitou-se a instrumentação de um con-
duto com somente alguns poucos passos ou, em algumas situações, com apenas um
instrumento. Esse movimento foi desenvolvido, propositalmente, para rotacionar o
instrumento à esquerda, diferente de todos os instrumentos no mercado, que têm
as suas espiras usinadas para a direita. Isso obviamente impede o uso de quaisquer
instrumentos além daqueles designados a essa cinemática.
O sistema é composto por apenas três instrumentos, todos com secção trans-
versal em formato de S. Esses instrumentos são fabricados a partir de uma liga de
níquel-titânio com tratamento especial, denominada M-Wire. Essa liga apresenta
flexibilidade maior quando comparada à liga convencional. A lima vermelha (R25)
possui ponta # 25 e conicidade de 0.08 nos três primeiros milímetros. A lima preta
(R40) possui ponta # 40 e conicidade de 0.06, também nos três primeiros milímetros.
Da mesma forma, a lima amarela (R50) possui ponta # 50 e conicidade de 0.05. Em
todos os três instrumentos, a conicidade diminui do quarto ao décimo sexto milíme-
tro, assumindo uma conicidade média de 0.04 nessa porção.
A técnica original Reciproc, preconizada pelo fabricante, é bem simples e consis-
te na escolha e no uso de apenas um desses três tamanhos de limas, logo após o aces-
so às embocaduras. A R25 pode ser utilizada em 10 a 15 condutos aproximadamente
(considerando curvaturas leves), apesar de a recomendação ser de uso único. A R40
e a R50 possuem longevidade bem menor.

Sequência de uso de acordo com a recomendação do fabricante


• Exploração passiva com uma lima manual # 10 ou # 20 ou # 30. O instrumento
que penetrar passivamente até as proximidades do CAD determinará qual lima
Reciproc será utilizada. Para a lima manual # 10, seleciona-se a R25; para a lima
manual # 20, a R40 e para a lima manual # 30, a R50. Selecionada a Reciproc,
configura-se o motor para o movimento Reciprocating Reciproc.
• Inserir a lima escolhida com movimentos de vaivém no sentido apical (3 a 5 repe-
tições ou até a resistência). Pode-se executar também o movimento anticurvatura,
apesar de não possuir a mesma eficiência do mesmo quando em cinemática rotatória.
• Retirar a lima e limpar as espiras, fazer uma irrigação copiosa, seguida de explora-
ção com limas manuais. Seguir com a odontometria.
• Repetir os movimentos dos dois itens anteriores, até alcançar o CRT. A lima será
usada duas vezes nos casos mais fáceis e até quatro vezes nos mais difíceis, sempre
intercalando com irrigação e patência.
• Pode-se mesclar o sistema Reciproc utilizando previamente limas OS de outras
marcas para ampliação dos terços cervical e médio, deixando assim apenas o terço
apical para seleção e uso do Reciproc. Isso permite melhor formatação e menos
desgaste dos instrumentos, aumentando a segurança e o número de usos possíveis.
Se necessário, deve-se ampliar o terço apical com instrumentos mais calibrosos.

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154 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

! FIGURA 15.3
Sequência Reciproc VDW.

ProDesign Duo Híbrido (Easy)


Com uma alteração na programação do motor Easy Endo SI, em resposta aos sistemas
reciprocantes, a ProDesign S ganhou um protocolo totalmente inovador de uso, permi-
tindo ainda a rotação à direita, o MRA (Movimento Rotatório Alternado para ganho de
patência), e agora também o movimento reciprocante anti-horário à esquerda (para uso
dos sistemas Reciproc e Wave One). Um quarto movimento foi incluído nessa última e
importante atualização de firmware: o movimento reciprocante à direita (sentido horá-
rio). Essa inversão de sentido permite utilizar qualquer instrumento rotatório usinado
ou torcido para a direita com a cinemática reciprocante, expandindo muito as possibili-
dades. É claro que apenas alguns intrumentos funcionam bem nesse tipo de cinemática.
Dessa forma, surgiu o Sistema ProDesign Duo Híbrido (Figura 15.4), em que o
Sistema ProDesign S é utilizado tanto na cinemática rotatória quanto na reciprocan-
te. É claro que a longevidade, nessa nova proposta, fica reduzida à metade em relação
ao protocolo original, compensada pelo aumento da rapidez no preparo. Com essa
modificação, a sequência de quatro limas que era usada na ordem branca e amarela,
nos terços cervical e médio, e vermelha e azul, no terço apical, sofreu alteração, con-
forme descrito a seguir.

Sequência de uso de acordo com a recomendação do fabricante


• Exploração com limas manuais tipo K # 10, nos terços cervical e médio.
• ProDesign S vermelha “Gisele” (25/.01) – 350 rpm e torque 1 N.cm. Movimentos
de vaivém para execução da exploração e patência (deve-se conhecer a odontome-
tria). Caso não se alcance o CRT, siga para o próximo passo.
• A seguir, selecione apenas uma das outras três limas da sequência: branca (30/.10)
para condutos amplos e retos, amarela (25/.08) para condutos médios e com pouca
curvatura, e azul (20/.06) para condutos constritos ou curvos.
• A lima selecionada é utilizada em movimento rotatório com bicada e pincelamento
anticurvatura até o terço médio ou início da curvatura, com configurações de fábri-
ca de 950 rpm e 4 N.cm. Seguir com a odontometria, caso ainda não o tenha feito.
• Caso não tenha alcançado o CRT no passo 2, a lima “Gisele” vermelha agora é
reutilizada até o CRT, após patência manual ou com MRA (apenas no motor Easy
SI), se necessário.

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Endodontia passo a passo 155

• Alterando para o movimento reciprocante à direita, a mesma lima selecionada no


terceiro tópico é utilizada em movimentos de vaivém até o CRT.
• No último passo, a mesma lima é novamente usada, agora em movimento rotató-
rio e de pincelamento no CRT, para refinamento do preparo. As configurações de
fábrica são de 600 rpm e 1,5 N.cm.
• Para maior ampliação, utilizar as limas extras (30 a 40/.05).

! FIGURA 15.4
Sequência ProDesign Duo Hí-
brido (Easy).

SISTEMAS ROTATÓRIOS E RECIPROCANTES PARA CONDUTOS


COM CURVATURAS
K3 XF RCS (Axis/SybronEndo)
Os instrumentos K3 XF (Figura 15.5) são uma combinação da resistência dos instru-
mentos K3 originais com a mesma secção em tripla hélice com planos radiais, unidas
ao tratamento térmico de estabilização da fase “R” dos instrumentos Twisted File
(TF), da mesma marca, resultando em limas mais flexíveis quando comparadas às
K3 convencionais, porém menos flexíveis e mais resistentes que as TFs. Ou seja, são
limas portadoras de características intermediárias em relação às outras duas.
A K3 XF pode ser utilizada para compor uma sequência inteiramente nova desti-
nada a condutos com curvaturas moderadas a severas, denominada pelo autor de se-
quência RCS (rotatória para curvatura em segurança), utilizada em, no máximo 65° de
angulação, possui longevidade de cerca de 15 condutos. As limas devem sempre ser des-
cartadas em caso de deformação das espiras, independentemente da contagem de usos.

Sequência de uso de acordo com a recomendação do autor


• Exploração com limas manuais tipo K # 15, 2 a 3 mm aquém do CAD.
• K3 XF 25/0.08 – 350 rpm e torque 2 N.cm. Movimentos de bicada e pincelamento
anticurvatura até o início da curvatura. Seguir com a odontometria.
• K3 XF 15/.04 – 250 rpm e torque 0,4 a 0,8 N.cm. Movimentos suaves, rápidos e
curtos de bicada até o CRT. Não forçar apicalmente.
• K3 XF 20/.04, 25/.04 e 30/.04 (em sequência) – 250 rpm e torque 0,8 a 1 N.cm.
Movimentos suaves, rápidos e curtos de bicada até o CRT. Não forçar apicalmente.
O uso das três limas dependerá da curvatura apical.

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156 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

• K3 XF 20/.06 – 250 rpm e torque 1 N.cm. Movimentos suaves, rápidos e curtos de


bicada até sentir resistência. Esse instrumento é utilizado como opção para melhor
formatação do terço médio, porém, dependendo da curvatura e da anatomia do con-
duto, ele pode não alcançar o CRT. Nesse caso, não se deve forçá-lo apicalmente.

! FIGURA 15.5
Sequência K3 XF RCS (Axis/ SybronEndo).

TF Adaptive (SybronEndo)
O TF Adaptive (Figura 15.6), acionado pelo motor Elements, é o mais recente sistema
de instrumentação lançado no mercado e veio para, mais uma vez, inovar o campo
da instrumentação mecanizada, pois introduz um novo movimento no preparo dos
canais radiculares. Diferente dos outros sistemas, este é composto por dois tipos de
movimentos que se alternam automaticamente ao longo do uso das limas. Em uma
primeira fase, este realiza rotação não contínua para a direita (sentido horário) de
600° (o que equivale a uma volta e mais dois terços de volta), seguido de uma rápida
parada, depois outros 600° e assim consecutivamente. Esse ciclo se repete até que
o instrumento necessite de maior torque. Quando isso acontece, o próprio motor
Elements automaticamente modifica o movimento, passando a desenvolver uma
segunda fase, com movimento reciprocante, também para a direita. Nessa segunda
fase, a angulação é de 370° (pouco mais de uma volta), seguido de 50° (em torno de
um oitavo de volta) no sentido inverso (anti-horário), e então mais 370° no sentido
horário, e assim consecutivamente. Reduzindo a necessidade de torque pela remoção
da pressão no instrumento, o movimento volta à fase 1. Esse ciclo pode se alternar
automaticamente durante todo o preparo. Não há configurações personalizáveis para
esse movimento misto (TF Adaptive), e a velocidade e o torque de cada fase são fixa-
dos na programação do fabricante. A rotação média gira em torno de 500 rpm. Claro
que o motor também possibilita o uso de programações rotatórias convencionais.
Novos instrumentos TF foram lançados para esse novo movimento, em dois kits
com três limas cada. O terceiro instrumento é opcional e pode ser usado para amplia-
ção apical extra. A utilização é muito rápida e versátil, podendo ser utilizado em pra-
ticamente quaisquer curvaturas, mas a durabilidade é pequena, apresentando torção
das espiras após alguns poucos condutos, dependendo da lima.
O kit Small (Condutos constritos) possui as limas 20/.04, 25/.06 e 35/.04. O kit
Medium Large (Condutos médios e amplos) contém as limas 25/.08, 35/.06 e 50/.04.
Ambos são identificados e usados nas cores verde, amarelo e vermelho, respectiva-
mente, sendo que cada lima deve ser inserida até o CRT, todas sob a mesma progra-

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Endodontia passo a passo 157

mação TF Adaptive. O kit Small é identificado por um anel colorido e o Medium


Large por dois anéis coloridos.

Sequência de uso de acordo com a recomendação do fabricante


• Exploração com limas manuais tipo K # 15 até o CRT (deve-se conhecer a odonto-
metria). Escolha do kit.
• Lima verde (20/.04, kit Small ou 25/.08, kit Medium Large) – introduzir com leve
pressão apical até promover resistência, utilizando movimentos de bicada (cine-
mática fase 1) ou vaivém (cinemática fase 2).
• Fazer limpeza das espiras, irrigação copiosa e exploração com lima # 15.
• Retornar com a lima verde até alcançar o CRT, caso não se tenha alcançado no
primeiro uso.
• Repetir os três passos anteriores com a lima amarela (25/.06, kit Small ou 35/.06,
kit Medium Large).
• Em caso de necessidade, repetir os mesmos passos com a lima vermelha (35/.04,
kit Small ou 50/.04, kit Medium Large), para maior alargamento apical.
• Outra opção interessante para o uso com o movimento Adaptive é o conceito de
lima única, já demonstrado por outros sistemas. Nesse caso, pode-se utilizar o ins-
trumento TF (ou de outra marca) 25/.06 ou 25/.08, por exemplo, e executar os
quatro primeiros passos descritos na sequência acima. O instrumento escolhido
deve preferencialmente possuir arestas de corte bem-afiadas e apresentar boa fle-
xibilidade, como por exemplo, a encontrada em limas com tratamento especial.

▲ FIGURA 15.6
Sequência TF Adaptive (SybronEndo).

LEITURAS RECOMENDADAS
Arias A, Perez-Higueras JJ, de la Macorra JC. Differences in Cyclic endodontic instruments. Oral Sur Oral Med Oral Pathol Oral
Fatigue Resistance at Apical and Coronal Levels of Reciproc Radiol Endod. 2006;101:675-80.
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16
Microscopia operatória
em endodontia
FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO E PATRICK BALTIERI

CONSIDERAÇÕES GERAIS
A introdução do microscópio operatório na Endodontia modificou os protocolos
clínicos até então utilizados. É considerado uma ferramenta essencial, e seu uso é
uma condição sine qua non para que os resultados dos tratamentos sejam previsíveis
em sucesso e longevidade.
As primeiras publicações sugerindo o uso de microscópio operatório na Endo-
dontia foram de Selden,1,2 que descreveu o papel do microscópio operatório na Endo-
dontia e o uso do microscópio em canais radiculares calcificados.
Em 1992, Gary Carr publicou um importante trabalho no Journal of the Califor-
nia Dental Association, em que descreveu, com muitos detalhes, as inúmeras aplica-
ções do microscópio operatório na Endodontia.3 A partir dessa publicação, houve
um importante avanço no uso da microscopia operatória na Odontologia, especial-
mente nas áreas da Endodontia e da Periodontia.
No Brasil, a Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Unicamp foi pioneira na
criação do primeiro Centro de Ensino de Microscopia Operatória (CEMO) em 1995.
A partir daí, muitos centros de ensino foram equipados para o ensino da microsco-
pia operatória no País, mas ainda é preciso refletir sobre a importância do ensino da
microscopia na Endodontia.
A excepcional casuística dos resultados alcançados com o seu uso pode ser ex-
plicada pelo amplo benefício do operador em visualizar claramente o campo opera-
tório – condição que no passado dependia significativamente de sensibilidade tátil,
experiência, imaginação e perseverança, quesitos regidos pelo binômio iluminação/
ampliação, cuja intensidade e qualidade não podem ser comparadas aos métodos
atuais. O uso do microscópio não transformará um bom dentista em um dentista
brilhante, mas fará com que ambos se tornem melhores, pois poderão enxergar
melhor.

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160 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Segundo John West,4 o benefício alcançado é simples de analisar – o microscópio


permite ao clínico ver melhor, sentir melhor e pensar melhor, definindo um nível de
precisão e uma potencial excelência nos procedimentos clínicos.
Dessa forma, hoje, diante da ampla experiência clínica com o uso do micros-
cópio operatório para minimizar os obstáculos impostos por iluminação deficiente,
tamanho da câmara pulpar, dificuldade de visualização do assoalho da câmara pulpar
e de istmos e reentrâncias nas paredes dos canais, dificuldade de avaliar a limpeza das
paredes do canal após a instrumentação, entre tantos outros impostos pela anatomia
dental, entende-se que o especialista na área de Endodontia necessita do microscópio
operatório não apenas como opção, mas como ferramenta indispensável no trata-
mento endodôntico.
A pergunta que se faz é esta: por que continuar “enxergando com os dedos”?
O microscópio operatório (Figura 16.1) é um equipamento simples, de fácil ma-
nuseio, mas que depende de um treinamento e de uma curva de aprendizado longa,
que deve ir muito além dos treinamentos feitos com microscópios de bancadas.

O uso clínico do microscópio requer o ensino prático com atendimento de pacientes. Di-
ferentemente do microscópio de bancada, os pacientes se movimentam, o posicionamento
ergonômico é mais difícil e requer uma boa dose de persistência e paciência, mas todas as
dificuldades podem ser superadas com tranquilidade desde que algumas orientações sejam
seguidas:
• Entender o funcionamento de todas as partes que compõem o microscópio: estativa, bra-
ços articulados, cabeça óptica, lentes binoculares, lente objetiva, iluminação e fonte de luz.
• Treinar o ajuste da distância interpupilar nas lentes binoculares.
• Treinar o ajuste do foco primário pela aproximação da lente objetiva ao foco (dente do
paciente).
• Treinar o ajuste da dioptria (correção possível nas lentes binoculares para ajustar o foco
para cada olho e corrigir as deficiências visuais).
• Empenhar-se em estabelecer o hábito de utilizar o microscópio durante a execução de
quaisquer procedimentos clínicos.
• No início, executar procedimentos mais simples e não invasivos.
• Selecionar os diversos acessórios que podem ser acoplados a esse equipamento para do-
cumentação de casos clínicos, dentre eles divisor de luz; dupla íris; adaptador para câme-
ra fotográfica ou câmera de vídeo; binocular carona; conjunto de espelhos e conjunto de
afastadores labiais, entre outros.

! FIGURA 16.1
Tratamento com auxílio do microscópio
operatório.

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Endodontia passo a passo 161

A grande vantagem do microscópio operatório é a possibilidade de usar diferen-


tes magnificações num mesmo equipamento, o que não acontece com as lupas, que
possuem uma única magnificação em cada dispositivo. Dessa forma, o cirurgião-
-dentista que deseja empregar o microscópio durante todos os procedimentos clíni-
cos deve utilizar todas as magnificações disponíveis em seu equipamento. O Quadro
16.1 apresenta algumas sugestões para utilização de cada grupo de magnificação com
suas características.

Quadro 16.1 Uso das magnificações


Magnificação Aplicação
3x ou 5x Exame clínico, visualização da linha de sorriso, anestesia, isolamento absoluto, incisão e
rebatimento de tecidos moles, entre outras aplicações.
Maior campo visual e profundidade de imagem.
8x Remoção de restaurações e tecido cariado, acesso coronário, preparo e obturação dos
canais radiculares, selamento coronário, instalação de retentor intrarradicular, selamento
de perfurações, osteotomia, apicectomia, retropreparo e retro-obturação, entre outras
aplicações.
Magnificação em que a maioria das decisões clínicas são tomadas.
12,5x ou19x Diagnóstico de trincas, localização de canais, remoção de instrumentos fraturados, inspe-
ção do ápice radicular após a apicectomia e retropreparo, entre outras aplicações.
Menor campo visual e profundidade de imagem.
Requer maior intensidade de luz.

Algumas aplicações do microscópio cirúrgico no tratamento endodôntico con-


vencional são mostradas nas Figuras 16.2 a 16.9.

A B

C D

▲ FIGURA 16.2
Identificação da dentina normal e calcificação na entrada dos canais radiculares observando-se,
principalmente, a diferença de cor mais escura da dentina do assoalho da câmara pulpar em con-
traste com a dentina terciária, mais clara.

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162 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

A B

▲ FIGURA 16.3
Identificação de canais extras localizados no assoalho da câmara pulpar de canais de molares.

A B

C D

▲ FIGURA 16.4
Identificação e limpeza de tecido pulpar nas áreas de istmos e reentrâncias.

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Endodontia passo a passo 163

A B

C D

▲ FIGURA 16.5
Selamento de perfurações acidentais localizadas no assoalho da câmara pulpar ou da raiz.

A B

C D

▲ FIGURA 16.6
Visualização de instrumentos fraturados no interior do canal radicular.

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164 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

A B

C D

▲ FIGURA 16.7
Tratamento endodôntico em dentes com anatomia incomum.

▲ FIGURA 16.8
Visualização de trincas no assoalho da câmara pulpar.

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Endodontia passo a passo 165

A B

▲ FIGURA 16.9
Qualificação dentinária anterior à restauração coronária após o tratamento endodôntico.

REFERÊNCIAS
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LITERATURA RECOMENDADA
Carr GB, Murgel CA. The use of the operating microscope in en- Murgel CAF, Gondim Junior E, Souza Filho FJ. Microscópio cirúr-
dodontics. Dent Clin North Am. 2010;54(2):191-214. gico: a busca da excelência na clínica odontológica. Rev Assoc
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17
Tratamento de dentes
com rizogênese incompleta:
revitalização ou apicificação
ADRIANA DE JESUS SOARES, ALEXANDRE A. ZAIA, CAIO CEZAR RANDI FERRAZ,
JOSÉ FLÁVIO A. ALMEIDA E FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

CONSIDERAÇÕES GERAIS ACERCA DA REVITALIZAÇÃO REVASCULARIZAÇÃO


O sucesso do tratamento de dentes necrosados com ápice aberto tem sido um desafio
na Endodontia devido à dificuldade na obtenção da limpeza adequada e na obturação
do canal radicular. O desenvolvimento das paredes do canal é interrompido após a
necrose pulpar, e a estrutura da raiz permanece fina e frágil, o que a torna suscetível a
fraturas.
Historicamente, o tratamento de escolha para o dente imaturo com necrose pul-
par consiste em sucessivas trocas de hidróxido de cálcio, as quais induzem a formação
de uma barreira de tecido duro apical. Essa abordagem costuma ser bem-sucedida,
embora possua algumas desvantagens, tais como as várias sessões de tratamento, que
possibilitam a recontaminação do canal durante o longo período de tratamento. Além
disso, as paredes do canal permanecem frágeis, o que aumenta o risco de fratura.
Recentemente, uma nova possibilidade para o tratamento, a revitalização ou re-
vascularização do canal radicular, tem sido recomendada. Essa pode ser uma alter-
nativa promissora para casos de dentes imaturos com necrose pulpar. No cenário de
hoje, profissionais da área médica e odontológica enfrentam uma tarefa hercúlea ao
tratar situações médicas desconcertantes como falência de órgãos ou perda de tecido.
Existem diferentes estratégias para substituí-los, porém o ideal é a substituição pelo
mesmo tecido natural a partir de células-tronco. Em odontologia, a investigação em
células-tronco ainda está atrasada em comparação com a área médica, mas, ainda
assim, muito progresso tem sido alcançado nos últimos anos. As células-tronco têm
proporcionado resultados interessantes, como a regeneração do complexo dentino-
-pulpar e a regeneração periodontal, mas o resultado é que ainda há muito a ser pes-
quisado antes de sua aplicação clínica tornar-se uma realidade.
Basicamente, a revitalização pulpar utiliza a capacidade inerente de proliferação
de células do tecido conjuntivo para preencher os espaços vazios no corpo. Essa pro-

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Endodontia passo a passo 167

priedade, estudada pela primeira vez por Selye1 para analisar o crescimento de tecido
no interior dos tubos vazios implantados, subcutaneamente, em ratos e coelhos, foi
confirmada pelos estudos de Benatti e colaboradores2 e Souza Filho e colaboradores3
realizados em dentes de cães com vitalidade pulpar, os quais mostraram que, após a
ampliação do forame apical com limas tipo K # 25 a # 80, ocorreu a invaginação do
tecido periodontal apical para o interior do canal radicular. Estudos posteriores mos-
traram que os tecidos formados no espaço radicular de dentes imaturos com necrose
e lesão apical são tecidos semelhantes aos do ligamento periodontal.4-6
De acordo com Kling e colaboradores,7 esse crescimento de tecido está direta-
mente relacionado com o diâmetro do forame e o comprimento do espaço intrarra-
dicular. Segundo Torneck,8 a proliferação de tecido para o interior de tubos depende
do diâmetro e do comprimento dos tubos.
Um detalhe importante observado nesses estudos foi a neoformação contínua de
um material, tal como o cemento radicular, formado em camadas (lamelas) nas pare-
des do canal, proporcionando um estreitamento da sua luz e aumento da resistência
da raiz. Melcher9 ponderou sobre a capacidade reparadora das células do ligamento
periodontal. São células mesenquimais indiferenciadas (células-tronco adultas) com
capacidade de se diferenciar em certos tipos celulares, tais como cementoblastos, os-
teoblastos ou fibroblastos. É possível que a neoformação de cemento no interior do
canal radicular se deva à diferenciação dessas células mesenquimais indiferenciadas
em cementoblastos, que exercem o papel biológico de recobrir a dentina radicular.10

REVITALIZAÇÃO REVASCULARIZAÇÃO
O preparo do canal radicular para a revitalização consiste na instrumentação mecâni-
ca, que deve ser feita, delicadamente, com limas manuais tipo K associadas a uma subs-
tância química auxiliar que apresente excelente propriedade antimicrobiana e baixa
toxicidade. Utiliza-se para isso o gel de clorexidina a 2% (Endogel® – Essencial Pharma,
Itapetininga, Brasil). A irrigação do canal radicular deve ser feita abundantemente com
soro fisiológico para remover o material necrosado do interior do canal radicular.
O tratamento, que requer um treinamento clínico adequado do operador, pode
ser concluído em uma sessão, de acordo com as condições clínicas apresentadas. Se
necessário, uma segunda sessão pode ser realizada e, nesse caso, um preenchimento
do canal com hidróxido de cálcio (pó) condensado no interior do canal, com auxílio
de calcadores manuais, deve permanecer por uma ou duas semanas, com o objetivo
de ocupar o espaço do canal radicular e prevenir o crescimento bacteriano.

Sequência passo a passo para o procedimento em sessão única


• Fazer uma radiografia periapical inicial para o planejamento do caso.
• Realizar anestesia local infiltrativa.
• Preparar a cavidade de acesso coronário.
• Fazer o isolamento com dique de borracha.
• Preencher o canal com gel de clorexidina a 2% e fazer uma descontaminação pro-
gressiva do canal radicular com limas tipo K da segunda série (45-80).
• Fazer uma copiosa irrigação com solução salina para remover detritos e restos ne-
cróticos da polpa.

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168 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

• Renovar a substância química auxiliar.


• Fazer a odontometria (tendo como referência o comprimento aparente do dente –
CAD – obtido com a radiografia inicial).
• Instrumentar suavemente as paredes do canal radicular para remover debris e bio-
filme bacteriano e irrigar copiosamente o canal com solução salina para remover
detritos e restos necróticos da polpa.
• Aspirar o conteúdo do canal com uma ponta Capilary Tip Ultradent (evitar pontas
de papel).
• Transpassar o forame apical cerca de 2 a 3 mm com lima tipo K # 70 ou # 80 para
estimular a formação de um coágulo.
• Se conseguir que o coágulo preencha o canal radicular, fazer uma barreira com
hidróxido de cálcio PA (pó), levado ao canal com um porta-amálgama (plástico),
e aguardar até a formação de uma barreira para amparar o MTA (agregado de tri-
óxido mineral), que é o material utilizado para promover o selamento coronário.
• Preparar o MTA numa consistência fluida.
• Levar o MTA ao canal com auxílio de uma sonda lisa e colocar sobre a base de
hidróxido de cálcio.
• Secar com um jato suave e contínuo de ar para que ocorra uma rápida evaporação
do excesso de líquido.
• Completar a barreira de MTA com novas camadas até o limite de 2 mm abaixo da
junção amelocementária (para evitar o escurecimento da coroa).
• Se não conseguir a formação de coágulo no interior do canal, deixar o espaço vazio
apical de 10 a 12 mm para induzir o crescimento de tecido conjuntivo do ligamen-
to periodontal a partir do coágulo apical.

A invaginação do tecido conjuntivo periapical ocorre com ou sem o preenchimento do


canal com coágulo, pois a ocupação do espaço vazio é uma capacidade inerente do teci-
do conjuntivo. As células mesenquimais indiferenciadas do tecido invaginado, em contato
com a parede dentinária, sintetizam e secretam um tecido tipo cementoide que se forma
em camadas e, gradativamente, promove um fechamento do espaço e reforça a estrutura
do canal radicular.

Sequência passo a passo para o procedimento em duas sessões


Primeira sessão
Caso se opte pela realização dos procedimentos em duas sessões, é necessário fazer o
preenchimento do canal radicular com um material temporário que ocupe o espaço
vazio, apresente propriedade antimicrobiana e seja de fácil colocação e remoção do
interior do canal. O material de escolha é o hidróxido de cálcio PA. A medicação deve
permanecer no interior do canal radicular por 3 a 14 dias. O acesso coronário precisa
ser selado com material restaurador adesivo.

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Endodontia passo a passo 169

Segunda sessão
• Fazer a anestesia infiltrativa.
• Remover a restauração coronária.
• Fazer o isolamento absoluto com dique de borracha.
• Irrigar copiosamente o canal radicular com soro fisiológico para remover o hidró-
xido de cálcio.
• Estimular a formação do coágulo no periápice ultrapassando uma lima manual
tipo K # 70 ou # 80.
• Se conseguir o preenchimento do canal com coágulo, realizar os passos para for-
mação da barreira cervical com MTA.
• Se não conseguir o preenchimento do canal com coágulo, preencher o canal com
hidróxido de cálcio PA (pó) e fazer a base para colocação do MTA no terço cervi-
cal, deixando um espaço intrarradicular de 10 a 12 mm para que ocorra a invagi-
nação de tecido conjuntivo do periodonto apical (Figuras 17.1 a 17.3).
• Colocar uma barreira de Coltosol sobre o MTA e realizar os procedimentos res-
tauradores.

A B C

▲ FIGURA 17.1
A) Dente com necrose pulpar e ápice aberto. B) Instrumentação do canal radicular 2 mm além do
forame para provocar um coágulo na região apical. C) Formação do coágulo apical e blindagem
coronária com MTA e Coltosol e resina composta.

" FIGURA 17.2


A) Invaginação de tecido conjuntivo do
ligamento periodontal para o espaço
vazio deixado no interior do canal ra-
dicular. B) Neoformação de material
cementoide (tipo cemento) nas paredes
A B do canal radicular.

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170 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

! FIGURA 17.3
A) Dente com rizogênese
incompleta após limpeza e
descontaminação do canal
radicular. B) Canal preen-
chido pelo tecido conjuntivo
oriundo do ligamento perio-
A B
dontal apical.

As Figuras 17.4 e 17.5 mostram ilustrações histopatológicas de revascularização,


e as Figuras 17.6 e 17.7 mostram casos clínicos de revascularização.

FIGURA 17.4 "


A) Corte histológico de dentes
de cão, mostrando o tecido con-
juntivo periodontal no interior,
do canal radicular. B) Maior au-
mento da figura anterior mos-
trando a deposição de cemento
celular nas paredes do canal
radicular.
Fonte: Marion.11 A B

! FIGURA 17.5
A) Corte histológico da região apical de dente de cão, mos-
trando a invaginação de tecido conjuntivo do periodonto api-
cal para o interior do canal radicular (revitalização do canal).
Fonte: Marion.11

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Endodontia passo a passo 171

FIGURA 17.6 !
A) Radiografia após a finalização dos
procedimentos de revascularização
em dente com necrose e lesão peria-
pical em que se observa a barreira de
MTA e a instalação de pino de fibra
de vidro – procedimentos realizados
em sessão única. B) Radiografia de
controle após oito meses, mostran-
do a diminuição da área radiolúcida
A B
periapical.

" FIGURA 17.7


A) Revascularização do dente 21.
A B
B) Controle após um ano.

CONSIDERAÇÕES GERAIS ACERCA DA APICIFICAÇÃO


A apicificação é um tratamento para dentes com ápice aberto, que visa ao selamento
do forame apical por meio da neoformação de um tecido mineralizado induzido pela
ação de uma medicação à base de hidróxido de cálcio usada para preencher o canal
radicular. A abordagem tradicional para o tratamento de apicificação tem sido ques-
tionada. O tratamento exige inúmeras trocas de curativo e não atinge os resultados
clínicos desejados porque as raízes permanecem finas e curtas e costumam apresen-
tar risco de fratura.
Atualmente, a apicificação está mais indicada para dentes que sofreram trauma-
tismo dental severo, do tipo intrusão ou avulsão, e apresentam risco de reabsorções
radiculares por substituição. Nesses dentes, a manutenção de uma obturação do ca-
nal com material obturador à base de hidróxido de cálcio favorece o processo de
12
reparação. O protocolo de obturação investigado por Soares mostrou-se eficaz no
tratamento de dentes traumatizados, tanto naqueles com formação radicular comple-
ta quanto nos casos de rizogênese incompleta.
Os procedimentos de preparo e descontaminação do canal radicular são os mes-
mos utilizados para os procedimentos de revascularização e consistem na instrumen-

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172 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

tação suave do canal radicular com instrumentos manuais # 70 ou # 80, empregando


como substância química auxiliar o gel de clorexidina a 2% e como agente de irriga-
ção, o soro fisiológico.
O canal radicular deve ser obturado com material obturador provisório que con-
siste em uma pasta à base de gel de clorexidina, óxido de zinco (pó) e hidróxido de
cálcio PA (pó). A pasta deve ser vigorosamente espatulada até que se consiga uma
consistência firme, para ser introduzida no canal radicular e condensada com calca-
dores manuais até seu completo preenchimento.
O acesso coronário deve ser restaurado, imediatamente, com resina composta,
após o selamento do canal radicular. Essa obturação pode ser mantida definitivamen-
te no canal radicular.
O controle deve ser feito mediante exame clínico e radiográfico em 6 e 12 meses,
período suficiente para a formação de uma base cementária na região apical, forman-
do um selamento biológico.
A vantagem da técnica é que o tratamento pode ser realizado em sessão única,
sem a clássica troca de curativos normalmente utilizada no tratamento de apicificação.
A desvantagem em relação à revascularização é que as paredes do canal radicular
continuarão finas e frágeis.

PROCEDIMENTO DE APICIFICAÇÃO EM SESSÃO ÚNICA*


Material obturador temporário
A pasta obturadora foi desenvolvida e testada na pesquisa de Soares13 em dentes trau-
matizados submetidos a um protocolo de medicação intracanal, sem trocas periódi-
cas. Após a instrumentação e descontaminação, os canais radiculares foram preen-
chidos com a pasta composta pela associação de hidróxido de cálcio, óxido de zinco
e gel de clorexidina a 2%. A pasta foi preparada em uma consistência adequada para
ser compactada no interior do canal. O acesso coronário foi restaurado com resina
composta, e os pacientes foram acompanhados pelo período de um ano com resul-
tados importantes, retardando e até impedindo o desenvolvimento de processos de
reabsorção radicular.

Pasta obturadora provisória à base de hidróxido de cálcio (PA), óxido de


zinco (pó) e clorexidina (gel)
Componentes
• Hidróxido de cálcio (pó) – 1 parte
• Óxido de zinco (pó) – 2 partes
• Gel de clorexidina a 2% (o suficiente para conseguir uma pasta com consistência
firme)

Preparação
• Misturar os componentes vigorosamente numa placa de vidro até obter uma con-
sistência firme (semelhante ao Coltosol).

* Técnica proposta por Souza Filho e Soares.

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Endodontia passo a passo 173

Indicações para apicificação


• Presença de reabsorções radiculares após traumatismo dental em dentes com ápice
incompleto.
• Dentes reimplantados após avulsão traumática ou intrusão.

Sequência clínica para apicificação


• Anestesia.
• Abertura de acesso coronário.
• Isolamento absoluto.
• Descontaminação inicial com gel de clorexidina a 2%.
• Instrumentação suave das paredes do canal para remover detritos e restos pulpares.
• Irrigação vigorosa com soro fisiológico.
• Aspiração do conteúdo do canal com Capilary Tip (Ultradent).
• Inserção no canal radicular do material obturador temporário, em pequenas por-
ções, com o auxílio de condensadores manuais, com o diâmetro apropriado de
acordo com a amplitude do canal.
• Compressão do material no canal radicular até o completo selamento.
• Verificação da qualidade da vedação do canal com radiografia periapical.
• Selamento da porção cervical do canal (2 a 3 mm abaixo da junção amelocemen-
tária) com Coltosol.
• Restauração com resina composta do acesso coronário.
• Controle clínico nas primeiras 48 horas.
• Acompanhamento clínico e radiográfico depois de 30, 90, 180 e 360 dias.

Durante o período de controle, se não houver reabsorção do material obturador temporá-


rio, não é necessária a troca da obturação por materiais definitivos.

A Figura 17.8 mostra ilustrações histopatológicas de apicificação, e a Figura 17.9


traz um caso clínico de apicificação.

! FIGURA 17.8
A) Corte histológico de periápice de dente de cão,
mostrando a formação de tecido mineralizado no
ápice radicular após o período experimental de seis
meses. B) Maior aumento da figura anterior, mos-
trando o selamento apical do canal radicular com
cemento neoformado.
Fonte: Marion.11 A B

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174 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

FIGURA 17.9 !
A) Radiografia mostrando o dente 22 com
ápice aberto e lesão periapical. B) Radiogra-
fia final após a obturação do canal radicular
com a pasta SFS. A B

REFERÊNCIAS
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2. Benatti O, Valdrighi L, Biral RR, Pupo J. A histological study 10. Lovelace TW, Henry MA, Hargreaves KM, Diogenes A. Eva-
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LEITURAS RECOMENDADAS
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18
Avaliação dos resultados
dos tratamentos de
canais radiculares
LUIZ VALDRIGHI E PATRICK BALTIERI

CONSIDERAÇÕES GERAIS
Em qualquer setor da saúde, o controle dos resultados clínicos é um valioso instrumen-
to de avaliação das estratégias utilizadas, além de permitir o arquivamento de dados
fundamentais para a evolução de diversos níveis de estudos. O trabalho de avaliar e
tabular resultados clínicos segue diretrizes estabelecidas de acordo com as áreas especí-
ficas – em Endodontia os critérios normativos para a detecção do sucesso e do insucesso
no tratamento são baseados em aspectos clínicos, radiográficos e histológicos.
Em geral, pressupõe-se que as decisões clínicas sejam fundamentadas no rigor do
processo diagnóstico e na prática de procedimentos embasados por critérios técnicos
claramente estabelecidos. Nos tratamentos de canais radiculares, vale salientar que o
cumprimento de tais premissas permite assegurar uma previsibilidade de sucesso em
torno de 95%. Por outro lado, o modelo convencional de avaliação de sucesso de qual-
quer tratamento tem como referência o clássico “ausência de sinais e sintomas”. Dessa
forma, é aceito que, em Endodontia, o sucesso dos tratamentos tem como parâmetro a
ausência de doença nas regiões perirradicular e periapical, conforto e normalidade fun-
cional do dente tratado e avaliação clínica e radiográfica com controle mínimo de um
ano. O processo de avaliação dessas condições é chamado de proservação* – a proserva-
ção clínica e radiográfica dos tratamentos realizados faz parte da rotina da Endodontia.

FOLLOW UP
O follow-up deve ser realizado por exame clínico-radiográfico em média um ano
após a realização do tratamento. O modelo de avaliação utiliza as imagens radiográfi-
cas iniciais (de diagnóstico) e as imagens da conclusão do tratamento – essas são ana-

* O termo proservação tem sido empregado em linguagem médica com o sentido de seguimento, acompanhamento.
Corresponde à expressão inglesa follow-up.

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176 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

lisadas comparativamente com as radiografias obtidas no momento da proservação.


Vale enfatizar que as radiografias devem ser tomadas com o mesmo enquadramento
e a mesma angulagem e processadas corretamente.
Alguns fatores externos ao tratamento endodôntico em si, mas que podem in-
fluenciar ou interferir no resultado final dos tratamentos, devem ser cuidadosamente
avaliados – esses fatores podem estar associados a uma significativa incidência de
insucessos clínicos. Destacam-se, entre outros, os traumatismos oclusais derivados
de prematuridades associadas a episódios de bruxismo. As consequências incluem
microfraturas, mobilidades, etc.
Cabe ainda mencionar que a queixa de dor no dente ou na área do dente pode
estar associada a outras fontes próximas ou à distância. Vale enfatizar que a cavidade
oral, bem como todos os seus componentes, apresentam uma complexa rede neural e
que as diversas aferências trigeminais produzem dores referidas em todo o seu terri-
tório. O profissional deve estar atento e apto a realizar testes diferenciais para exclu-
são ou inclusão das fontes pulpares – na rotina clínica, o exemplo mais frequente são
as sinusopatias que costumam referir sintomatologia para os dentes.

EXAME RADIOGRÁFICO
As lesões periapicais costumam ser os achados mais frequentes no follow-up – as
radiografias convencionais, em função de alguns fatores, como maior facilidade de
aquisição e baixo custo, têm sido consideradas suficientes para as necessidades dos
profissionais da prática endodôntica. Entretanto, os modernos estudos de imageo-
logia convergem sistematicamente para o uso das imagens digitais, claramente um
método mais apurado para definir reparos ou presença de lesões periapicais.
É preciso considerar que a tecnologia digital é uma nova fronteira alcançada pela
radiologia odontológica. Método seguro, de alta eficácia e de fácil execução, o sistema
oferece uma gama de benefícios, como a diminuição da dose de exposição, a elimina-
ção do processamento e a possibilidade de manipulação das imagens. A correção do
contraste e brilho e a verificação de densidade óptica são alternativas viáveis com a
aplicação de softwares específicos para o tratamento de imagens. O uso de subtração
radiográfica digital possibilita o estudo e acompanhamento da evolução das lesões
ósseas a partir de imagens digitais obtidas de forma padronizada em diferentes pe-
ríodos de tempo.

Vantagens da radiografia digital


• Possibilidade de manipulação da imagem para que as informações nela contidas tornem-
-se mais facilmente detectáveis.
• Facilidade para mensurações e cálculos a respeito de dimensões e variações de densida-
de.
• Eliminação da necessidade de câmara escura e do processamento químico, a segunda
maior causa de repetição de radiografias convencionais.
• Redução de até 80% da dose de radiação utilizada para obtenção da imagem.
• Agilização dos processos de arquivamento, comparações, obtenção de cópias e transmis-
são da imagem à distância.
• A imagem aparece instantaneamente na tela do computador.

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Endodontia passo a passo 177

Além dessas considerações, as referências para julgar o sucesso do tratamento


baseadas na interpretação do exame radiográfico devem contemplar as seguintes ob-
servações:
• Continuidade da lâmina dura alveolar em toda a extensão do contorno radicular.
• Espessura uniforme da imagem radiolúcida do espaço do ligamento periodontal
menor que 1 mm.
• Desaparecimento da imagem radiolúcida de lesões periapicais crônicas preexisten-
tes ao tratamento, substituída pela reposição da arquitetura do trabeculado ósseo
(radiopaco).
• Ausência de reabsorção óssea e/ou radicular.
Em complementação ao exame radiográfico, deve-se, clinicamente, atentar para
alguns dados que podem ser considerados como referências indicativas de insucesso
dos tratamentos, a saber:
• Presença de dor e/ou edema.
• Continuidade ou aparecimento de fístula.
• Perda de função: o paciente não usa mais o dente na mastigação.
• Imagem de radiolucência periapical igual ou maior do que a imagem prévia.
• Aparecimento de radiolucência periapical pós-tratamento endodôntico.

TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA
No contexto da expectativa clínico-científica da Endodontia, cada vez mais centrada
no rigor da precisão, vale mencionar o frequente aperfeiçoamento do processo das
imagens – a tecnologia associada ao aprofundamento do conhecimento científico
disponibilizou para o uso odontológico as imagens tridimensionais.
A tomografia computadorizada (TC) oferece imagens com alto padrão de defi-
nição, sem sobreposições, e elimina as distorções geométricas e volumétricas dos re-
paros anatômicos investigados. Contudo, aspectos como o deslocamento do paciente
para centros radiológicos que oferecem os serviços e sobretudo fatores econômicos
limitam de maneira significativa a sua utilização na rotina da clínica. Dessa forma, a
sua indicação pode ser considerada mais seletiva, por vezes diante de casos excepcio-
nalmente complexos, relacionada às tomadas de decisão diagnóstica ou terapêutica.
Observa-se que essa modalidade de imagem, em função dos vários fatores já mencio-
nados, tem sido mais usada em estudos do que no dia-a-dia clínico.

CAUSAS DO INSUCESSO
Alguns aspectos importantes devem ser considerados ao analisar os percentuais de
sucesso ou insucesso das avaliações relatadas na literatura, atinando para a época, as
técnicas empregadas, os critérios de avaliação e o nível de capacitação do operador, a
fim de dar validade a parâmetros comparativos. Nesse contexto, deve ser ressaltado
que, com o passar do tempo, foi se consolidando uma inquestionável correlação entre
insucesso e falta de qualidade dos tratamentos de canais radiculares.

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178 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

Vale dizer que a principal causa dos insucessos dos tratamentos endodônticos
não são as bactérias – como equivocadamente e com frequência é mencionado na
introdução dos trabalhos de interesse microbiológico –, mas sim os tratamentos de
baixa qualidade. Assim, por dedução lógica, a principal causa dos insucessos dos tra-
tamentos de canais radiculares deve ser atribuída ao responsável por sua execução.

LITERATURA RECOMENDADA
American Association of Endodontics. Quality assurance guideli- Magura ME, Kafrawy HA, Brown CE Jr, Newton CW. Saliva coro-
nes. Chicago: AAE; 1987. p.1-27. nal microleakage in obturated root canals. A in vitro study. J
Bender IB, Seltzer S, Saltinolf W. Endodontic success-a reappraisal Endod. 1991;17:324-31.
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PARTE III
PROCEDIMENTOS CLÍNICOS
PARA O PREPARO E A
OBTURAÇÃO DE CANAIS
RADICULARES COM
PATÊNCIA E AMPLIAÇÃO DO
FORAME APICAL

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19
Preparo de canais radiculares
com patência e ampliação
do forame apical
FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

CONSIDERAÇÕES GERAIS
Desde o início da Endodontia moderna, tem havido inúmeros conceitos, estratégias
e técnicas para o preparo de canais radiculares. Ao longo das décadas, uma impres-
sionante variedade de instrumentos e técnicas padronizadas vieram para negociar e
modelar os canais radiculares. Independentemente dos métodos utilizados, os obje-
tivos e a preparação mecânica foram descritos de forma brilhante há quase 40 anos
pelo Dr. Herbert Schilder.1,2 Autores e clínicos concordam sobre a importância da
preparação e limpeza completa do conteúdo do canal radicular e sua influência sobre
o sucesso clínico do tratamento e sua resposta biológica. A despeito dessa concordân-
cia, há várias abordagens para o preparo de canais radiculares.
A preparação adequada do canal radicular, em toda a sua extensão, requer um
planejamento específico, cuja diretriz parte da avaliação, em profundidade, da radio-
grafia pré-operatória. Embora cada canal tenha sua específica morfologia e variações
quanto à amplitude e ao grau de achatamento, curvatura radicular e dificuldades téc-
nicas, há um critério comum, para todos os dentes, que deve ser avaliado: para que
o tratamento tenha sucesso, é fundamental que os instrumentos façam a patência e a
limpeza (ampliação) do forame apical.
Aos iniciantes e jovens especialistas, recomenda-se essa técnica que, se seguida
passo a passo, evitará iatrogenias, desvios, degraus e fraturas de instrumentos e con-
duzirá o clínico com segurança ao sucesso do tratamento endodôntico. Os especia-
listas em Endodontia que já possuem habilidade e ampla casuística clínica, desde que
consigam a patência, podem variar essa sequência passo a passo.
O preparo dos canais radiculares deve ser executado em duas etapas: a primeira
fase envolve a ampliação do corpo do canal; a segunda fase, a modelagem do ter-
ço apical. O que determina a sequência do preparo é a anatomia radicular. Embora
exista uma grande variedade de instrumentos, manuais ou automatizados, os canais

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182 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

devem ser preparados da anatomia para os instrumentos e não dos instrumentos


para a anatomia.
Assim, nos canais de amplitude média ou amplos (classe I), o preparo da pri-
meira fase pode ser feito com instrumentos rotatórios que possuam bom poder de
corte, para efetuar a limpeza e descontaminação de istmos e reentrâncias do corpo do
canal. O instrumento recomendado é o rotatório Hero 20.06 (Hero 642, MicroMega®,
Besançon, França) com motor VDW (VDW®, Munique, Alemanha) na velocidade de
900 rpm. Para complementar a ampliação, são recomendadas as brocas de Gates-Gli-
dden (Dentsply-Maillefer®, Suíça) no sentido coroa-ápice, numa sequência decres-
cente da # 5 até # 2 até o limite de 16 mm coronários. Cada broca deve penetrar cerca
de 1 mm no interior do canal radicular. Essa ampliação visa proporcionar uma irri-
gação mais efetiva e facilitar a ação dos instrumentos na modelagem do terço apical.
Nos canais constritos (classes II e III), o acesso ao canal radicular deve ser fei-
to com instrumentos manuais. Os instrumentos rotatórios podem ficar presos na
dentina e sofrer fratura por torção. Nesses casos, é fundamental fazer a patência do
canal radicular e do forame apical antes da utilização dos instrumentos rotatórios ou
reciprocantes. Os instrumentos mais finos (08 ou # 10), usados com suavidade, são
apropriados para “negociar a anatomia do canal radicular” e conseguir a patência do
forame apical. Esse preparo inicial visa à formação de um leito no canal radicular
(Glidepath) para que os instrumentos rotatórios trabalhem com suavidade e com
a ponta livre. Após a patência com a lima # 10, é importante ampliar o forame com
a lima # 15. Dessa forma, transforma-se um canal atrésico (classe II ou III) em um
canal de amplitude média (classe I).

SEQUÊNCIA PASSO A PASSO


Passo 1 – anamnese
• Estabelecer o perfil de saúde do paciente.
• Verificar a pressão arterial antes do atendimento.
• Conferir se o paciente faz uso de medicações de uso contínuo e suas interações
com fármacos comumente empregados na clínica odontológica.
• Verificar se o paciente apresenta problemas sistêmicos (hipertensão, diabetes, pro-
blema cardíaco, renal, etc.).

Passo 2 – avaliação endodôntica


A avaliação endodôntica compreende o exame clínico extra e intraoral, o exame da
radiografia inicial e os testes clínicos para determinar a origem da dor e a conclusão
do diagnóstico.

Exame clínico extra e intraoral


• Observar se existem assimetrias ou tumefações na face.
• Verificar a cor e a normalidade da mucosa nos lábios, nas bochechas e no palato.
• Verificar o dorso e as bordas laterais da língua.
• Examinar o fundo de sulco e verificar se há aumento de volume ou fístula.

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Endodontia passo a passo 183

• Observar se existem lesões brancas ou ulceradas na mucosa oral.


• Examinar os dentes e identificar cáries, fraturas, alteração de cor, abrasão, etc.
• Identificar problemas periodontais.
• Identificar problemas oclusais (bruxismo, contato prematuro).

Testes para o diagnóstico pulpar e periapical (sinais e sintomas)


• Verificar qual o estímulo que provoca a dor: percussão (problemas periapicais) ou
aplicação de testes térmicos (problemas pulpares).
• Verificar se a dor é localizada ou difusa.
• Certificar-se de que a dor é contínua ou ocasional.
• Avaliar a magnitude e a duração da dor.
• Diferenciar o diagnóstico entre problema odontogênico e não odontogênico (dor
orofacial).

Exame radiográfico inicial e planejamento do caso clínico


• Fazer uma profunda análise da radiografia inicial para identificar alterações ana-
tômicas, lesões periapicais, grau de curvatura radicular, amplitude dos canais radi-
culares, presença de reabsorções radiculares, fraturas, etc.
• Seguir uma sequência de análise iniciando pela coroa, canais, periápice e perio-
donto.
• Determinar o comprimento aparente do dente (CAD).
• Classificar o tratamento de acordo com a dificuldade do caso clínico (classes I, II,
III, IV, V, VI e VII).

Passo 3 – anestesia
• Tranquilizar o paciente quanto à anestesia.
• Selecionar a técnica mais adequada.
• Selecionar a solução anestésica indicada para o caso.
• Observar a dosagem máxima para segurança.
• Fazer a anestesia tópica na mucosa.
• Aquecer levemente o tubete anestésico (chama de lamparina) para evitar o “cho-
que térmico” da solução anestésica com a temperatura normal do corpo.
• Fazer a punção da mucosa com o bisel da agulha voltado para o osso.
• Verificar se houve refluxo de sangue no interior do tubete pela penetração da agu-
lha em vaso sanguíneo.
• Injetar lentamente a solução anestésica.

Passo 4 – adequação da região


• Remover os cálculos supragengivais com instrumentos manuais ou com ultrassom
(em consulta prévia ou na própria).

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184 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

• Remover as áreas de hiperplasia gengival com auxílio de eletrocautério ou lâminas


de bisturi.
• Fazer o aumento de coroa clínica se houver indicação específica.
• Pedir que o paciente faça bochecho com clorexidina a 0,12%.

Passo 5 – descontaminação coronária: remoção de cáries e restaurações


• Remover completamente a dentina cariada e todo o remanescente de restaurações
com auxílio de pontas diamantadas esféricas de alta rotação de haste longa 1012,
1014 ou 1016 (KG Sorensen).
• Fazer a adequação dos espaços interproximais removendo contatos deteriorados
com uma ponta diamantada de ponta fina 2200 (KG Sorensen) para facilitar o
isolamento absoluto com dique de borracha.

Passo 6 – acesso e remoção do teto da câmara pulpar


• Demarcar os pontos de referência para a abertura de acesso coronário, preservan-
do as áreas de resistência da estrutura dental.
• Remover a dentina dentro dos limites determinados e, assim que houver uma co-
municação com a cavidade pulpar, remover o teto da câmara com a ponta diaman-
tada 3082 (KG Sorensen) e fazer a forma de contorno adequada para a abertura de
acesso.

Passo 7 – isolamento absoluto


• O isolamento absoluto deve ser feito após a abertura de acesso coronário.
• Selecionar e experimentar o grampo mais adequado para o dente.
• Preferencialmente, fazer a adaptação do grampo e depois colocar o lençol de bor-
racha.
• Finalizar o isolamento absoluto com os procedimentos de vedamento com ciano-
crilato e barreira gengival.

O isolamento absoluto é a marca registrada da qualidade do endodontista. O isolamento


absoluto do dente deve ser feito com qualidade, observando sempre o enquadramento do
dique e a invaginação da borracha pelos espaços interproximais e com os vedamentos ne-
cessários para manutenção do dique de borracha, sem infiltração de saliva, até o final do
tratamento.

Passo 8 – localização e preparo da entrada dos canais


• Após o isolamento absoluto, fazer o acabamento adequado da abertura de acesso
e as formas de conveniência necessárias para dar um acesso mais livre aos instru-
mentos para o interior dos canais radiculares.
• Preencher a câmara pulpar com gel de clorexidina a 2% por 1 minuto para iniciar
a descontaminação química da câmara pulpar.

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Endodontia passo a passo 185

• Aspirar o excesso da substância química auxiliar com cânula aspiradora.


• Explorar a anatomia do assoalho da câmara pulpar com sonda endodôntica de
ponta fina (ponta de Rhein) para localizar as entradas dos canais radiculares.
• Nos canais e nas câmaras pulpares constritas, remover o colar de dentina que en-
volve a entrada dos canais radiculares com auxílio de broca esférica HL # 4 (Ko-
met) para baixa rotação, acionada em motor elétrico na velocidade de 500 rpm.
• Esse desgaste superficial permite a visualização do “olho do canal”, uma área mais
esbranquiçada que pode ser vista principalmente com auxílio de microscópio (su-
gestão do Prof. Tauby Coutinho – Endodontia da UERJ).
• Em canais amplos e médios, a remoção do colar de dentina pode ser feita com
broca de Largo # 2 (Dentsply), inicialmente com movimentos de bicadas para
o interior do canal seguidos de movimento suave de pressão na parede anticur-
vatura.
• Esse desgaste anticurvatura tem a finalidade de reduzir ou minimizar a primeira
curvatura do canal (Figura 19.1).

A B

▲ FIGURA 19.1
A) Radiografia inicial mostrando a primeira curvatura do canal na raiz mesial do molar inferior. B)
Radiografia mostrando o tratamento endodôntico realizado e o alívio realizado pelos instrumentos
no sentido do desgaste anticurvatura.
Fonte: Radiografias gentilmente cedidas pela Dra. Marcelle Louise Sposito Bourreau.

Passo 9 – preparo e modelagem de canais radiculares em canais de


amplitude média ou amplos
Primeira fase – descontaminação progressiva e preparo do corpo do canal
• Fazer uma radiografia inicial e a medida do CAD.
• Preencher a câmara pulpar com gel de clorexidina a 2%.
• Explorar os 16 mm iniciais do canal radicular (terço cervical e médio) com limas
tipo K manuais (# 10 e # 15) (Hi-5, Miltex®, NY, EUA) para definir sua amplitude.
• Se as limas # 10 ou # 15 penetrarem com folga nos 16 mm iniciais do canal radi-
cular, fazer a instrumentação com instrumento rotatório Hero 20.06 (Hero 642,
MicroMega®, Besançon, França). O design desse instrumento é apropriado para

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as regiões de istmos e reentrâncias, comuns em canais achatados, localizados nos


terços cervical e médio dos canais radiculares.
• O primeiro movimento com a Hero 20/.06 deve ser de bicada, de milímetro a mi-
límetro, até atingir a profundidade de 16 a 17 mm (deve-se prestar muita atenção
na radiografia inicial para observar o CAD ou a presença de interferências anatô-
micas).
• Irrigar copiosamente o canal radicular com 5 mL de soro fisiológico para facilitar
a remoção dos debris.
• O segundo movimento com a Hero 20/.06 é de instrumentação de encontro às
paredes do canal, nas áreas de istmos e reentrâncias (sobretudo nos polos de canais
achatados) (Figura 19.2).
• Irrigar copiosamente o canal radicular com 5 mL de soro fisiológico para facilitar
a remoção dos debris.
• Fazer uma ampliação do corpo do canal com brocas de Gates-Glidden (Dentsply-
-Maillefer®, Suíça), na sequência coroa-ápice, # 5, # 4, # 3 e # 2, em motor elétrico
na velocidade de 900 rpm.
• Colocar a broca de Gates na entrada do canal radicular e ajustar o stop de borracha
a 1 a 2 mm do ponto de referência oclusal (Figura 19.3).
• Acionar o motor e pressionar o contra-ângulo em direção apical para efetuar o
corte da dentina.
• O corte da dentina é feito com apenas um movimento de pressão apical.
• Remover a broca do canal radicular e fazer copiosa irrigação com soro fisiológico,
renovando a substância química auxiliar.

Segunda fase – modelagem do terço apical (deve ser feita após a patência do
forame apical)
• Fazer o cateterismo progressivo da porção remanescente com lima manual # 10
(Hi-5, Miltex) até uma estimativa de comprimento baseada no comprimento mé-
dio do dente e no aparente medido na radiografia inicial. Quando atingir as pro-
ximidades do comprimento estimado, monitorar o avanço com localizador apical
até fazer a patência do forame apical.
• Fazer a odontometria (medida do comprimento real do canal – CRC).
• Ampliar o diâmetro do forame apical com a lima # 15 e em seguida com a lima #
20, em movimentos de limagem (vaivém) com amplitude de 2 mm, ultrapassando
o forame apical.
• Em seguida, fazer a modelagem do terço apical utilizando instrumentos rotató-
rios ou reciprocantes, de acordo com as especificações dos fabricantes, conforme
orientação no Capítulo 15:

Rotatórios: K3 RS6, Easy ProDesign S, MTWO VDW.

Reciprocantes: Reciproc VDW OU ProDesign Duo Híbrido Easy.
• Prosseguir para os procedimentos pré-obturadores no passo 12.

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Endodontia passo a passo 187

• A sequência para o uso dos diferentes instrumentos rotatórios encontra-se no Capítulo 15.
• Os principais objetivos da ampliação do corpo do canal são facilitar a irrigação do terço
apical e promover melhores condições para a modelagem e obturação desse terço.
• Não esquecer que os instrumento rotatórios e reciprocantes têm vida útil e devem ser
substituídos sistematicamente, a fim de prevenir a ocorrência de fraturas.
• Os instrumentos manuais trabalham com a ponta.
• Os instrumentos rotatórios trabalham com a ponta livre.

! FIGURA 19.2
Corte longitudinal em pré-molar inferior, mos-
trando o grau de achatamento do canal radi-
cular e o direcionamento do instrumento Hero
20/.06 de encontro à parede vestibular do
canal.

FIGURA 19.3 "


Broca de Gates no preparo do corpo do canal.
Note que o stop de borracha está ajustado
a 1 mm da referência marcada na superfície
oclusal.

Passo 10 – preparo e modelagem de canais radiculares em canais


constritos (Classe II)
Primeira fase – acesso ao forame apical (técnica da ampliação anatômica
progressiva – AAP)
• Preencher a câmara pulpar com gel de clorexidina a 2%.
• Inserir uma lima tipo K # 8 ou # 10 (Hi-5, Miltex®, NY, EUA) no canal radicular até
que ela toque a parede do canal e prenda-se suavemente na dentina.
• A inserção da lima no canal deve ser feita delicadamente, num movimento rápido,
com um giro de cerca de ¼ de volta no sentido horário, igual ao lançamento de um
dardo no alvo.

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• “Movimento de dardo”: o instrumento deve ser arremessado, suavemente, para o


interior do canal para que fique preso na dentina (a pressão no instrumento pode
formar um degrau ou uma obstrução do canal).
• Liberar o instrumento da dentina com um movimento único de tração.
• Não retirar o instrumento do canal; apenas liberá-lo da dentina e repetir o movi-
mento de inserção e tração por duas ou três vezes.
• Ao liberar o instrumento, não fazer movimentos oscilatórios – pode ocorrer fra-
tura.
• Para dar amplitude e conicidade ao corpo do canal radicular, fazer uma AAP com
a sequência de limas # 8, # 10, # 15, # 20 e # 25, todas inseridas com o mesmo mo-
vimento de “lançamento de dardo”.
• Ao completar a série, retornar sempre com a lima # 8 ou # 10, com os mesmos
movimentos de “lançamento de dardo”, para avançar gradativamente em dire-
ção apical (a série step-back anatômica libera o corpo do instrumento da parede
do canal e permite o avanço gradativo dos instrumentos mais finos em direção
apical).
• A passagem de um instrumento para outro deve ser de uma forma suave e sem
pressão apical.
• Quando o instrumento estiver próximo do forame apical, tomar como referência
a medida do CAD na radiografia inicial e transpassar o forame apical (patência)
com a lima # 10 usando os mesmos movimentos de “lançamento de dardo”.
• Agora que o instrumento está próximo do forame, não corre o risco de “flam-
bagem”, e uma pressão maior no sentido apical pode ser feita para conseguir a
patência.
• Ao conseguir a patência, fazer movimentos de vaivém, sem remover o instrumento
do forame, até conseguir demarcar bem a trajetória do canal e do forame apical.
• Ampliar o diâmetro do forame apical com a lima # 15 (lima anatômica inicial –
LAI).
• Fazer a odontometria com localizador eletrônico (Novapex, Forum Engineering
Technologies®, Israel) e determinar o comprimento real do canal no ponto zero do
localizador (CRC).
• Definir o comprimento de trabalho (CT) a 1 mm além do CRC.
• Irrigar copiosamente o canal radicular com 5 mL de soro fisiológico e renovar a
substância química auxiliar.
• Ao finalizar esta primeira fase, houve a transformação de um canal classe II ou III
(constritos) em um canal classe I.
• Prosseguir o preparo retornando ao passo 9 no primeiro movimento com as bro-
cas Hero 20/.06.
A Figura 19.4 mostra a sequência da AAP.

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Endodontia passo a passo 189

Patência
# 10 # 15 # 20 # 25 # 16

▲ FIGURA 19.4
Sequência da ampliação anatômica progressiva.

Passo 11 – procedimentos pré-obturadores (cuidados prévios para o


sucesso da obturação)
O principal objetivo desta fase é determinar o diâmetro final do forame apical após o
preparo e a ampliação com os instrumentos rotatórios ou reciprocantes. O conheci-
mento desse diâmetro é fundamental, pois não existe batente para ancorar o cone de
guta-percha, que será travado nas paredes do canal radicular na distância aproxima-
da de 2 mm aquém do CRC. Para conseguir esse travamento, é necessário saber qual
foi a lima anatômica final (LAF) que determinou o diâmetro final do forame apical.

Sequência para conferir o diâmetro final do forame


• Preencher o canal radicular com o gel de clorexidina.
• Transpassar o forame com uma lima manual, com diâmetro correspondente (TIP)
ao último instrumento que passou o forame apical, 1 mm além do CRC.
• Ajustar o stop no CT, colocar o instrumento no canal e fazer suave pressão apical
para verificar se o instrumento ultrapassa o forame apical ou fica contido no inte-
rior do canal.
• Se o instrumento ultrapassar o forame, retirá-lo do canal e inserir um instrumento
com o diâmetro imediatamente superior e verificar seu travamento.
• O diâmetro final do forame corresponderá ao diâmetro da lima que transpassar o
forame apical mais ajustado às paredes.
• Ao passar ajustado ao forame, conferir novamente o CRC com o localizador ele-
trônico.
• Existem agora duas medidas: o comprimento real do canal e o diâmetro do forame
apical.
• Para ajustar o cone de guta-percha medium, de taper .06 (Konne®, Belo Hori-
zonte, Brasil), para a obturação, utilizar a régua calibradora e fazer o corte da

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190 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

ponta do cone na perfuração correspondente ao diâmetro duas vezes superior


ao diâmetro da LAF (p. ex., se a LAF foi # 35, o diâmetro do cone de guta-percha
deve ser # 45).
• Fazer copiosa irrigação com soro fisiológico e preencher o canal com gel de clore-
xidina.
• Realizar a modelagem da ponta do cone de guta-percha preparado com uma se-
quência de batidas do cone de encontro ao canal, no sentido apical, até que se
perceba um ligeiro travamento do cone.
• Fazer uma radiografia da prova do cone para confirmar o limite apical de 2 mm
aquém do vértice radiográfico.
• Irrigar copiosamente o canal radicular com soro fisiológico para remover o gel de
clorexidina.
• Para finalizar a etapa de preparo para obturação, é necessário fazer a limpeza das
paredes do canal com EDTA a 17% (Fórmula&Ação, São Paulo, Brasil) para remo-
ver a camada de smear layer.
• Para que o EDTA tenha uma melhor ação, é necessário fazer uma agitação durante
10 segundos, com ultrassom ou com um cone de guta-percha calibrado no diâme-
tro da LAF.
• Remover o conteúdo de EDTA do canal com pontas de aspiração e repetir o pro-
cedimento três vezes.
• Fazer a irrigação final com soro fisiológico.
• Aspirar o conteúdo do canal com auxílio de uma cânula de silicone (Capillary
Tips, Ultradent®, EUA) e finalmente fazer a secagem do canal com uma ponta de
papel absorvente (Endopoints®, Brasil) calibrada no diâmetro da LAF.
• Prosseguir para a etapa da obturação do canal.
O Quadro 19.1 mostra como fazer a odontometria; o Quadro 19.2 ensina a fazer
o “movimento de dardo”.

Quadro 19.1 Como fazer a odontometria


• A odontometria deve ser feita com auxílio do localizador eletrônico.
• A posição do instrumento no interior do canal pode ser controlada por indicadores luminosos ou barras
digitais, localizadas no display do aparelho, ou pela alternância do som emitido pelo aparelho: bip lento
quando a ponta está no interior do canal; bip rápido quando a ponta está fora do canal; som contínuo
quando a ponta do instrumento está no forame apical.
• As medidas mostradas no display do localizador não determinam com precisão a posição do instrumento
no interior do canal, podendo ocorrer pequenas variações de acordo com constrições existentes na ana-
tomia apical.
• Quando a lima transpassa o forame, o aparelho define com 100% de precisão que a ponta do instrumento
está fora do canal radicular.
• Para certificar-se de que o instrumento está no forame apical (CRC), é necessário recuar lentamente o ins-
trumento que transpassou o forame até que o som emitido pelo localizador fique contínuo ou a marcação
no display mostre que a ponta do instrumento está no zero.
• Para se obter o comprimento de trabalho, é necessário acrescentar 1 mm no CRC.

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Endodontia passo a passo 191

Quadro 19.2 Como fazer o movimento de “lançamento de dardo”


• Colocar no canal radicular uma lima # 10, com pressão suave e ligeiro movimento de rotação (¼ de volta).
• O movimento de inserção do instrumento no canal pode ser comparado ao “arremesso de um dardo”.
• A pressão no instrumento deve ser suficiente para que ele fique preso na dentina, abrindo um pequeno
espaço no canal, sem o risco de formação de degrau.
• Fazer a remoção do instrumento com um movimento firme de tração para remover a dentina cortada
localizada em suas espiras.
• Evitar movimentos oscilatórios; apenas desprender o instrumento da dentina.
• Repetir o movimento de inserção da lima # 10, por duas ou três vezes, sem pressão apical, para ampliar
este segmento do canal.
• Em seguida, colocar a lima # 15 e repetir os movimentos de inserção e remoção do canal radicular.
• Repetir os movimentos com as limas # 20 e # 25 e terá sido executada a AAP deste segmento do canal
radicular.
• Fazer uma irrigação copiosa com soro fisiológico e renovar a substância química auxiliar (Endogel®).
• Em seguida, retornar com a lima # 10, inserindo-a no canal com o mesmo movimento de “lançamento de
dardo”.
• Com a ampliação anatômica, o corpo do instrumento fica liberado da parede do canal e passa a trabalhar
somente com sua ponta ativa, avançando no sentido apical.

Para a AAP, os instrumentos manuais finos (# 8 ou # 10) devem ser novos, não devendo ser
pré-curvados, pois a pressão suave na inserção do instrumento no canal precisa ser direcio-
nada para sua ponta, que avançará no sentido apical, com relativa facilidade.

Passo 12 – obturação dos canais radiculares


Técnica do cone modelado*
A técnica do cone modelado é uma modificação da técnica da compressão hidráulica
vertical proposta por De Deus,3 que consiste em uma termoplastificação da guta-
-percha que, após aquecida e sob pressão hidráulica vertical, será a propulsora do
cimento para os espaços livres do forame apical e de canais acessórios. O primeiro
corte da guta-percha é realizado na embocadura do canal radicular, seguido de com-
pressão hidráulica vertical com calcador fino (Konne®, Belo Horizonte, Brasil) por 10
segundos. Para complementar a propulsão do cimento, um segundo aquecimento da
guta-percha deve ser realizado, seguido de compressão hidráulica vertical (Figuras
19.5 a 19.9).
O objetivo da obturação é o preenchimento tridimensional do espaço intrarradi-
cular com um cimento obturador capaz de escoar pelas paredes do canal, ocupando
os espaços vazios, e, após sua presa, promover o selamento dos portais de saída do
canal radicular – forame apical e canais laterais.
O princípio da técnica é a adaptação de um cone único de guta-percha, modela-
do contra as paredes do canal radicular no terço apical, a uma distância de 2 ou 3 mm
do forame apical. A calibração do cone, para que se adapte às paredes do canal, deve
ser feita na régua calibradora. O diâmetro estabelecido para a ponta do cone deve ser
duas vezes superior ao diâmetro final do forame após sua ampliação.

* Proposta por Souza Filho.

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192 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

A modelagem do cone é executada a frio, e é fundamental, uma vez que o prepa-


ro com ampliação do forame apical é feito sem deixar batente ou degrau para sua an-
coragem, de tal modo que resista à plastificação e à compressão vertical e permaneça
no interior do canal radicular.
Para a obturação do canal radicular, pode ser utilizado o cimento obturador Pulp
Canal Sealer (EWT, Kerr®, EUA), preparado de acordo com a recomendação do fa-
bricante. O cimento deve ser inserido no canal radicular com auxílio do próprio cone
de guta-percha, até o seu completo preenchimento. Em seguida, o cone de guta-per-
cha é posicionado no local do travamento para a termoplastificação e compressão
hidráulica vertical.
Para a realização do backfill, o excesso de cimento deve ser removido do espaço
vazio do canal e totalmente preenchido com Coltosol (Vigodent®, Brasil), até a embo-
cadura dos canais na câmara pulpar. Em todos os casos, o acesso coronário é restau-
rado com resina composta ou cimentação de pino de fibra de vidro.

Sequência da modelagem do cone de guta-percha


• Determinar o diâmetro final do forame apical.
• Preparar o cone de guta-percha na régua calibradora no diâmetro duas vezes supe-
rior ao diâmetro final do forame preparado.
• Preencher o canal radicular com gel de clorexidina a 2%.
• Fazer a modelagem da ponta do cone de guta-percha com batidas contra as pare-
des do canal até obter um pequeno travamento.
• Fazer uma radiografia da prova do cone e verificar se o cone encontra-se na posi-
ção ideal (2 mm aquém do forame).

! FIGURA 19.5
Ajuste da LAF # 40.

FIGURA 19.6 "


Calibração do cone de guta-percha # 50.

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Endodontia passo a passo 193

! FIGURA 19.7
Radiografia do cone em posição 2 mm aquém
do vértice radiográfico.

FIGURA 19.8 "


Obturação do canal com compressão hidráulica
vertical.

! FIGURA 19.9
Radiografia da obturação do canal radicular e
extravasamento de cimento no forame apical.

Seleção do cimento obturador


O princípio da técnica segue os fundamentos propostos por Schilder,1 que preconiza
a obturação tridimensional do canal com o cimento endodôntico fechando os portais
de saída do sistema de canais radiculares. Para isso, a escolha do cimento obturador é
importante, sendo necessário conhecer suas propriedades físicas e biológicas.
Alguns critérios devem ser observados na escolha do cimento:
• Ter um tempo de trabalho compatível para que os procedimentos possam ser rea-
lizados com tranquilidade.
• Apresentar estabilidade dimensional.

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194 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

• Ser biocompatível.
• Apresentar bom escoamento.
• Apresentar radiopacidade.
Dentro desses critérios, são recomendados os seguintes cimentos obturadores:
Endomethasone (Septodont, França) (Figura 19.10)

! FIGURA 19.10
Embalagem do cimento Endomethasone
N Pó.

• Apresenta um tempo de trabalho excelente (ideal para os iniciantes na técnica).


• É biocompatível.
• Apresenta excelente estabilidade dimensional.
• É lentamente reabsorvido no periápice (acima de dois anos).
• A resposta pós-operatória é excelente quando extravasa (não provoca dor pós-
-operatória quando ocorre sobreobturação).
• Não apresenta bom escoamento, motivo pelo qual deve ser levado ao canal na pon-
ta de um cone de guta-percha e manipulado vigorosamente para que possa aderir
às paredes.
• A espatulação deve ser vigorosa, e o cimento estará pronto quando perder o brilho
(excesso de eugenol) e apresentar uma consistência mais resistente.
Pulp Canal Sealer EWT (Kerr®, EUA) (Figura 19.11)

FIGURA 19.11 "


Embalagem do cimento Pulp Canal Sealer EWT.

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Endodontia passo a passo 195

• Apresenta um tempo de trabalho suficiente para profissionais treinados.


• É biocompatível.
• Apresenta excelente estabilidade dimensional.
• A resposta pós-operatória, quando extravasa para o periápice, é excelente (não
provoca dor pós-operatória quando ocorre sobreobturação).
• É lentamente reabsorvido no periápice (acima de um ano).
• Apresenta excelente escoamento.
Sealapex (Dentsply-Maillefer®, Suíça) (Figura 19.12)

! FIGURA 19.12
Embalagem do cimento Sealapex.

• Apresenta bom tempo de trabalho.


• Quando extravasa para o periápice, apresenta sintoma doloroso nas primeiras
horas, que desaparece após 24 a 48 horas (exige uma medicação analgésica pós-
-operatória).
• A reabsorção no periápice é rápida (seis meses).

Sequência para obturação dos canais radiculares


• O canal radicular deve estar completamente seco.
• Levar uma pequena porção de cimento na ponta do cone de guta-percha e fazer
movimentos rápidos de agitação (vaivém) até que todas as paredes do canal fi-
quem completamente revestidas (é importante visualizar o cimento recobrindo as
paredes do canal).
• Em seguida, levar o cone de guta-percha até o ponto do travamento apical, lenta-
mente, para que as bolhas incorporadas no cimento sejam gradativamente elimi-
nadas.
• Cortar o cone na entrada do canal radicular com o aparelho termoplastificador ou
com condensador manual aquecido.
• A consistência do cimento é importante para que o cone empurre o cimento para
a porção apical, onde o selamento é fundamental.

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196 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

• Para impulsionar o cimento, fazer uma compressão vertical com condensador ma-
nual de ponta fina (frio) por 10 segundos sobre a guta-percha.
• Para retirar o condensador, fazer movimentos de rotação enquanto comprime o
cone em direção apical, com objetivo de abrir um espaço na guta-percha enquanto
ela resfria.
• Após a remoção do calcador frio, fazer um novo aquecimento da guta-percha e
repetir a compressão hidráulica vertical.
• Fazer uma radiografia de qualidade para conferir a compactação do material ob-
turador e conferir se houve extravasamento do cimento através do forame apical e
dos canais laterais.

• O cimento Endomethasone, por apresentar um tempo de presa mais longo, possibilita


novo aquecimento e nova compressão do cone de guta-percha para melhor compactação
da obturação.
• Os cimentos de presa rápida não permitem correções após a presa do material, motivo
pelo qual devem ser usados por dentistas mais experientes que podem dispensar a radio-
grafia de qualidade.
• Após a presa, o material obturador não pode mais ser compactado, pois pode despren-
der-se das paredes do canal e deixar áreas suscetíveis para infiltração.
• Para limpar a entrada dos canais, cortar o cone de guta-percha 2 a 3 mm abaixo da en-
trada do canal, remover o excesso de cimento e, em seguida, preencher esse espaço com
Coltosol (backfill).

Backfill com Coltosol (Figura 19.13)

! FIGURA 19.13
Embalagem do Coltosol.

• O backfill com Coltosol permite um selamento ideal na entrada dos canais radicu-
lares (Figura 19.14).
• Após a limpeza do excesso de cimento obturador, preparar um espaço na entrada
dos canais com uma broca de Gates # 4.
• Levar para a entrada do canal uma pequena porção de Coltosol e condensar o ma-
terial no interior do espaço livre.
• A compressão final deve ser feita com condensador maior até que o material fique
perfeitamente adaptado no interior do canal.
• Um vez feito o selamento da entrada dos canais, pode ser realizada a limpeza e
qualificação da dentina do assoalho da câmara pulpar com vistas à restauração
adesiva.

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Endodontia passo a passo 197

• Essa qualificação deve ser feita com brocas esféricas de baixa rotação # 6, em mo-
tor elétrico na rotação de 900 a 1.000 rpm.
• Durante o corte da dentina superficial alterada (por substância químicas, cimento
endodôntico, Eugenol), o auxiliar deve jogar jatos de ar para remover os detritos e
possibilitar a visualização da superfície do assoalho da câmara pulpar para que a
limpeza seja eficaz.
• Por fim, a dentina deve ser copiosamente lavada com soro fisiológico, com auxílio
de microbrush, seca com jatos de ar e em seguida preparada para hibridização.

! FIGURA 19.14
Selamento da entrada dos canais com Coltosol.

Passo 13 – procedimentos pré-restauradores


Considerações gerais
Após a obturação do canal radicular, é altamente recomendável que se faça a blinda-
gem da cavidade coronária com materiais restauradores definitivos (resinas fotopo-
limerizáveis).
Esse procedimento, se possível, deve ser feito pelo próprio endodontista para
promover uma impermeabilização ou a blindagem coronária, a fim de evitar mi-
croinfiltração bacteriana e para reforçar e proteger a estrutura coronária, já debilitada
pelo tratamento de canal.

Sequência clínica para restauração com resina composta


A qualificação do substrato dentinário para receber a restauração adesiva consiste na
remoção da dentina superficial, alterada pelas substâncias químicas utilizadas duran-
te o tratamento, e deve seguir os seguintes passos:
• Remover a dentina superficial da câmara pulpar com brocas esféricas HL # 4 ou
# 6, em motor elétrico de baixa rotação, na velocidade de 500 a 900 rpm.
• Lavar copiosamente a cavidade com água e secar com jatos de ar.
• Preferencialmente, utilizar o sistema adesivo de dois passos (Clearfil SE Bond –
Kuraray).
• Condicionar a superfície dentinária com primer ácido por 20 segundos.
• Aspirar o excesso com ponta de sugador ou com pontas de papel absorvente.
• Aplicar, à distância, um leve jato de ar para evaporar componentes voláteis.

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198 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

• Aplicar o bond com microbrush e remover o excesso com aspiração ou pontas de


papel absorventes.
• Fazer a fotoativação do material por 40 segundos.
• Aplicar uma camada fina de resina flow nas paredes da cavidade.
• Fazer a fotoativação do material por 40 segundos.
• Utilizar a técnica incremental para inserção da resina composta até completar o
preenchimento da cavidade.
• Ao final dos procedimentos restauradores, retirar o isolamento absoluto e remover
a cola aderida na superfície coronária.
• Ajustar a oclusão.
• Efetuar o acabamento e polimento do selamento coronário.
• Encaminhar o caso para o dentista indicador para a realização dos procedimentos
restauradores, definitivos diretos ou indiretos.

REFERÊNCIAS
.
1. Schilder H. Filling root canal in three dimensions. Dental 3. De Deus QD. Endodontia. 5. ed. Rio de Janeiro: Medsi; 1992.
Clin North Am. 1967:723-44.
2. Schilder H. Cleaning and shaping the root canal. Dent Clin
North AM. 1974;18:269-96.

LEITURAS RECOMENDADAS
Buchanan LS. Paradigms shifts in cleaning and shaping. CDA J. Hulsmann M, Schafer E. Apical patency: fact and fiction – a myth
1991;19(5): 23-32. or a must? A contribution to the discution. Endo (Lond Engl).
Butler NP. Apical debridement: a hypothesis and preliminary re- 2009;3(4):285-307.
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PARTE IV
ESTUDOS LONGITUDINAIS
EM SAÚDE

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A importância dos estudos
longitudinais na saúde:
estrutura, modelos,
forças e limitações
FRANCESCO CHIAPPELLI, XÊNIA MARIA CALDEIRA BRANT
E CAIO CALDEIRA BRANT SANDY

Para que os resultados obtidos a partir de uma decisão clínica possam ser avaliados,
faz-se necessário um acompanhamento clínico radiográfico por meio de protocolos
bem-definidos, com medições repetidas das mesmas variáveis no mesmo indivíduo
ao longo do tempo, isto é, um estudo longitudinal. Estudos longitudinais envolvem,
por definição, medições repetidas das mesmas variáveis no mesmo indivíduo ao lon-
go do tempo, sendo também chamados de estudos de medições repetidas.
Estudos longitudinais, realizados em uma grande população de pacientes, du-
rante um período de acompanhamento longo podem fornecer ao clínico não somen-
te condições de avaliar a eficácia da tomada de decisão clínica, como também rever
condutas que não se mostram satisfatórias.

Um estudo longitudinal é um estudo de pesquisa de correlação que envolve observações


dos mesmos pacientes por períodos de tempo longos. Essas observações são realizadas de
forma sistemática, permitindo avaliar alterações que possam surgir ao longo do tempo, for-
necendo informações sobre os fatores que podem influenciar a frequência de um resultado
e reunindo, dessa forma, resultados de representatividade.

A natureza da coleta de dados pode ser descritiva ou categórica. Os estudos des-


critivos são usados para descrever a incidência de certas doenças ou variáveis, em
que são realizadas medições contínuas (ou semicontínuas), como o comprimento do
canal de determinado dente em milímetros. Os categóricos são usados para analisar
as associações entre os fatores de risco ou a exposição e o próprio desfecho estudado,
por exemplo, o número de pacientes com restaurações defeituosas que precisam de
tratamento endodôntico.
Em geral, estudos longitudinais de dados categóricos podem se estender por lon-
gos períodos de tempo, medidos em meses ou anos. Projetos descritivos podem ter,

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similarmente, longas durações, bem como podem se estender por períodos curtos
de tempo, de minutos (ou mesmo mais curtos quando se mede, p. ex., a condução da
dor pelas terminações nervosas na pulpite). Essa é uma das razões por que estudos
longitudinais descritivos de medições contínuas são considerados estatisticamente
mais rigorosos do que estudos longitudinais de dados categóricos: eles dão ao pesqui-
sador uma força estatística maior – maior certeza de que o resultado observado é um
efeito verdadeiro, e não aleatório.
Conforme dito, estudos longitudinais exigem que a mesma variável seja medida
em intervalos repetidos no mesmo indivíduo. Assim, a verificação inicial da variável
corresponde a um valor basal antes do início da intervenção. Consequentemente,
uma abordagem simples para a análise dos dados envolve subtrair o valor basal de
cada observação subsequente, comparando os deltas (i.e., as variações) assim obti-
dos. Isso significa que uma abordagem estatisticamente válida da análise de estudos
longitudinais é simplesmente fazer a análise estatística sobre os valores corrigidos
pelo valor basal. Para ser mais claro, tal protocolo diz respeito e se aplica aos dados
obtidos de cada paciente em particular. Como consequência, é justo dizer que os
estudos longitudinais precisam da análise longitudinal dos dados, cujo centro da aná-
lise são os dados do paciente em particular; ou seja, em estudos longitudinais, cada
paciente serve como seu próprio controle.
Esse ponto, estatisticamente falando, é de suma importância porque significa
que, usando o jargão estatístico, cada paciente é seu próprio blocking factor, e que é
possível usar esse blocking factor para fracionar (i.e., reduzir) o erro aleatório. Isso é
crítico, de fato, porque se é preciso simplificar a interferência estatística ao máximo,
poder-se-ia dizer que todo teste estatístico busca descobrir se determinado sinal (i.e.,
resultado clínico) é ou não é maior que o ruído (i.e., que a variabilidade devida ao
acaso, que os efeitos aleatórios, que as medições aleatórias). Se o ruído puder ser
reduzido, então há melhores condições de observar o sinal, e o sinal observado será
mais provavelmente verdadeiro.
Essa afirmação, traduzida para a terminologia da estatística, fica assim: se o erro
aleatório é reduzido (i.e., fracionado), então o teste estatístico tem uma capacidade
maior de estabelecer se o resultado observado é verdadeiro. Em resumo, qualquer
protocolo, como a introdução de um blocking factor, é benéfico ao projeto de um es-
tudo porque fraciona o erro aleatório, aumentando, assim, a força da análise e o rigor
do projeto. É por essa razão que os estudos longitudinais são, em geral, projetos mais
rigorosos, com maior força estatística que projetos equivalentes de comparação ou
previsão que não se estendem ao longo do tempo.
Por outro lado, esse fato traz consigo as principais limitações dos estudos lon-
gitudinais: perda de dados, interrupções e conjuntos de dados incompletos. Os
estatísticos têm meios de contornar dados faltosos (p. ex., censura de dados, falsa
atribuição, ou interpolação, dependendo de padrões internos inerentes ao conjunto
de dados), interrupções (p. ex., análise da intenção de tratar) e conjuntos de dados
incompletos (p. ex., utilização de meios marginais, etc.). Juntas, essas limitações cos-
tumam ser reduzidas sob o termo genérico de eventos de medição irregularmente
distribuídos, o qual estatísticos recomendam ser utilizado analiticamente por meio
de um sofisticado modelo regressivo.
A questão aqui não é oferecer uma análise crítica dessas intervenções estatísti-
cas, mas explicitar que essas limitações representam um desafio à interferência es-

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Endodontia passo a passo 203

tatística e que, para cada manipulação estatística introduzida em uma análise para
contrabalancear essas limitações, há uma queda na força estatística. Isso é como dizer
que “sim, nós dispomos de meios para contornar alguns dos problemas inerentes aos
estudos longitudinais, mas eles têm seu preço, e esse preço é um enfraquecimento
progressivo do estudo como um todo”.
Além dos meios explicitados, é possível agregar os deltas de todos os pacientes
em um grupo ou clínica em determinado período de tempo e obter meios e desvios-
-padrão para os deltas dos pacientes em um grupo em certo período de tempo. Seria de
relativamente pouca importância se o tamanho da amostra não fosse mantido igual ao
longo de todos os momentos, similarmente a uma perda de dados ou interrupção. Da-
dos agregados também poderiam equilibrar, ao menos até certo ponto, erros correlatos
de medição. Isso significa que, ao usar dados agregados, pode-se tentar certificar-se de
que os conjuntos de dados serão tão completos e homogêneos (relativamente falan-
do) quanto possível – mas eles deixarão de consistir e de refletir dados individuais do
paciente e mostrarão, em vez disso, os padrões longitudinais de grupos de pacientes.
Assim, a análise dos dados individuais do paciente gera informação específica para
cada paciente individual, enquanto que a análise de dados agregados não representa
nenhum paciente especificamente, mas mostra uma imagem muito geral do grupo.
A força de um estudo longitudinal, como é o caso para todos os projetos usados
na pesquisa relacionada à saúde, é amplamente dependente do tamanho da amostra,
sobretudo quando se lida com análises de dados de grupos agregados. Apesar do uso
atualmente muito difundido de projetos longitudinais de medições repetidas, sabe-
-se surpreendentemente pouco sobre a determinação do tamanho da amostra para
estudos longitudinais. Essa lacuna de conhecimento é explicada, em parte, porque a
determinação do tamanho da amostra depende das especificidades do protocolo de
cada estudo longitudinal individual, e por causa de uma falta de robustez predomi-
nante nos dados faltosos em estudos longitudinais como um todo. Um novo software
de computador (p. ex., SuperMix) existe agora para modelos rotineiros de análise
longitudinal de dados.
Resumidamente, há duas famílias distintas de modelos para analisar estudos
longitudinais: a família do modelo regressivo misto de efeitos e a família do modelo
linear geral.
O modelo regressivo misto de efeitos pode ser aplicado a dados contínuos nor-
malmente distribuídos e não normalmente distribuídos, bem como a resultados ca-
tegóricos. É robusto quanto a dados faltosos e quanto a eventos de medição irregular-
mente distribuídos e é capaz de lidar com variáveis correlatas que sejam indiferentes
ao tempo ou não. Ele compreende os modelos mais gerais de probabilidade total para
a análise de estudos longitudinais que utilizam todos os dados disponíveis de cada
sujeito. Pode ser computacionalmente complexo, e inclui, de forma específica, os mo-
delos lineares tradicionais, o modelo não linear, o modelo de interceptação aleatória
(que considera efeitos específicos do indivíduo como efeitos aleatórios e indepen-
dentes de erros de medição) e o modelo aleatório de interceptação e tendência (que
tem o válido argumento de que a variabilidade aleatória [i.e., o erro aleatório] leva
ao crescimento, ao longo do tempo, de uma forma que obedece à tendência ligada
ao tempo que depende do fato de que nem todos os sujeitos mudam e respondem ao
tratamento na mesma proporção e na mesma medida, e que as medições em momen-
tos temporalmente próximos entre si tendem a ser mais intimamente correlatas [i.e.,

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204 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

mais homogêneas] que as medições mais amplamente dispersas ao longo do tempo


[i.e., efeito dispersão]).
De modo alternativo, os modelos lineares para analisar estudos longitudinais em
geral são computacionalmente mais fáceis que os métodos de probabilidade total indi-
cados. Eles podem ser generalizados para uma grande variedade de medições de resul-
tados com distribuições diversas, porém são mais restritos que os modelos de efeitos
mistos em suas suposições relativas a dados faltosos. Os modelos lineares em geral são
caracteristicamente menos eficientes que os modelos de probabilidade total para ofe-
recer estimativas de efeitos específicos do sujeito (p. ex., dentro das linhas de tendência
do sujeito) para ajudar a interpretar a variabilidade intersubjetiva em respostas longi-
tudinais, mas preveem com precisão respostas futuras de um dado sujeito ou conjunto
de sujeitos em um dado subgrupo ou agregação (p. ex., um hospital ou uma clínica).
Modelos lineares costumam ser adequados para a análise de resultados categóri-
cos (i.e., contagens) e podem ser usados também para medições contínuas. Por serem
baseados em estimativas de semiprobabilidade, deixando, como dito, a probabilidade
total dos dados não especificada, modelos lineares em geral são considerados mo-
delos marginais que simplesmente modelam a regressão de y em x e a dependência
interna ao sujeito e evitam a necessidade de distribuições multivarietais ao assumir
uma forma funcional simples para a distribuição funcional a cada ponto. Mais im-
portante é que eles se amparam na suposição de que dados faltosos são aleatórios
e assim podem ser substituídos por meios marginais dos dados observados, mes-
mo quando limitados por interrupção por parte do sujeito. Como consequência, em
modelos lineares em geral, erros-padrão costumam ser “inchados” para acomodar
a quantidade reduzida de informação independente produzida pela correlação das
observações repetidas ao longo do tempo e dentro de agregados. Esse acréscimo re-
lativo de variabilidade aleatória reduz a capacidade desses modelos como um todo,
se comparados com os modelos regressivos de probabilidade total de efeitos mistos.
Estudos longitudinais podem ser comparativos em sua natureza: por exemplo,
compare-se o cimento A com o B em 6, 12, 18 e 24 meses após o tratamento endo-
dôntico. Estudos longitudinais também podem ser previsões, como a identificação
das variáveis que melhor predizem o sucesso do tratamento endodôntico em 1, 3, 6
e 12 meses após a intervenção. Quando estudos longitudinais são conduzidos com
dados categóricos (p. ex., o número de pacientes cujos tratamentos endodônticos irão
falhar ao longo de 1, 2, 3, 4 e 5 anos), eles se configuram em análises de sobrevivência
de Kaplan-Meier ou Cox.
Estudos longitudinais podem ser estudos observacionais ou estudos clínicos do
tipo 1, 2, 3 ou 4, que podem ser, ou não, totalmente controlados ou randomizados
(como explicitado antes, é inerente ao projeto de medições repetidas o fato de que os
sujeitos funcionam como seu próprio controle; logo, um controle extrínseco total-
mente estruturado – i.e., um grupo-controle – não é essencial; além disso, por causa
do blocking factor inerente ao desenho do projeto, a randomização extrínseca não é
tão crítica quanto em projetos tradicionais). No caso de projetos longitudinais, como
em geral, há uma clara vantagem estatística em estruturar o estudo clínico como um
estudo clínico em grupo, porque o processo de agrupamento funciona similarmente
a um blocking factor em si e de si mesmo, gerando assim um fracionamento ainda
maior do erro aleatório, mas com as limitações recém-discutidas.

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Endodontia passo a passo 205

Tomadas em conjunto, essas observações revelam as razões oportunas e críticas


pelas quais os estudos longitudinais são cada vez mais considerados de escolha para as
pesquisas baseadas na prática clínica, apesar do custo e do tempo potenciais associados
à sua condução. Isso é especialmente verdadeiro no contexto do novo modelo contem-
porâneo de saúde translacional que é, acima de tudo, voltado para o paciente, focado
em efetividade, baseado em evidências e articulado sobre a obtenção e análise de dados
do paciente em particular, que é a própria essência dos estudos longitudinais.

LEITURAS RECOMENDADAS
Chiappelli F. Cluster Randomized Controlled Trials (CRCTs) in Mucke HAM. Adaptive clinical trials: innovations in trial design,
evidence-based dentistry. Dental Hypotheses. 2012;3:1-4. management, and analysis. Cambridge: Insight Pharma Re-
Cotton JW. Analyzing within-subjects experiments. Hillsdale: La- ports; 2007.
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Donner A, Klar N. Design and analysis of cluster randomization view. Canadian Studies in Population. 2001;28(2):169-85.
trials in health research. London: Arnold; 2000. Special Issue on Longitudinal Methodology
Eldridge S, Kerry S. A practical guide to cluster randomised trials Salehrabi R, Rotstein I. Endodontic treatment outcomes in a large
in health services research. London: Wiley; 2012. patient population in the USA: an epidemiological study. J
Enders CK. Applied missing data analysis. New York: Guildford; Endod. 2004;30(12):846-50.
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Freedman D S, Thornton A, Camburn D. Maintaining response ra- Cochrane Collaboration; 2011. Cap. 19.
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Freedman DS, Thornton A, Camburn D. Maintaining response rates Freeman T. Patient-centered medicine: transforming the cli-
in longitudinal studies. Sociol Method Res. 1980;9(1):87-98. nical method. Thousand Oaks: Sage; 1995.
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Biometrics. 1982; 38:963-74.

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PARTE V
APRESENTAÇÃO DE CASOS
CLÍNICOS COM CONTROLES
RADIOGRÁFICOS

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21
Casos clínicos realizados
com a técnica da patência e
ampliação do forame apical
FRANCISCO JOSÉ DE SOUZA FILHO

Pré-operatório Pós-operatório

6 meses 18 meses

▲ FIGURA 21.1
Sequência de caso clínico realizado com ampliação do forame apical e selamento apical com
cimento obturador. As radiografias na parte inferior mostram processo de reparo periapical aos
6 meses e 18 meses (cimento Pulp Canal Sealer).
Fonte: Cortesia do Dr. Patrick Baltieri.

" FIGURA 21.2


A) Radiografia inicial do dente 36 com
insucesso do tratamento endodôntico
e presença de lesão periapical. B) Ra-
diografia final após tratamento endo-
dôntico realizado com ampliação do
A B forame apical, mostrando o selamen-
to de canais acessórios com cimento
Pulp Canal Sealer.
Fonte: Cortesia da Dra. Marcelle Louise Spo-
sito Bourreau.

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210 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

A B C

▲ FIGURA 21.3
A) Radiografia inicial do dente 47 com insucesso do tratamento endodôntico. B) Radiografia final
do retratamento endodôntico. C) Controle após o período de 12 meses com a cura da lesão peria-
pical (cimento Pulp Canal Sealer).
Fonte: Cortesia da Dra. Marcelle Louise Sposito Bourreau.

A B C

▲ FIGURA 21.4
A) Radiografia inicial do dente 45 com lesão periapical. B) Radiografia final do retratamento endo-
dôntico com extravasamento de cimento no periodonto. C) Controle após o período de 12 meses
com desaparecimento da lesão periapical (cimento Pulp Canal Sealer).
Fonte: Cortesia da Dra. Marcelle Louise Sposito Bourreau.

A B C

▲ FIGURA 21.5
Radiografia inicial do dente 43 com lesão periapical. B) Radiografia final do tratamento endodôn-
tico com extravasamento de cimento através do forame apical e canal lateral. C) Radiografia de
controle após 12 meses com a cura da lesão periapical e a reabsorção do cimento extravasado
(cimento Pulp Canal Sealer).
Fonte: Cortesia da Dra. Marcelle Louise Sposito Bourreau.

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Endodontia passo a passo 211

A B C

▲ FIGURA 21.6
A) Radiografia inicial do dente 21 com lesão periapical. B) Radiografia final do retratamento en-
dodôntico com extravasamento de cimento em canal lateral. C) Radiografia de controle após 12
meses com reparo da lesão periapical e reabsorção do cimento extravasado (cimento Sealapex).
Fonte: Cortesia da Dra. Marcelle Louise Sposito Bourreau.

A B C

▲ FIGURA 21.7
A) Radiografia inicial do dente 12 com insucesso do tratamento endodôntico e lesão periapical. B)
Radiografia final do retratamento endodôntico com extravasamento de cimento em canal lateral.
C) Radiografia de controle após 12 meses com reparo da lesão periapical e reabsorção do cimento
apical (cimento Sealapex).
Fonte: Cortesia da Dra. Marcelle Louise Sposito Bourreau.

A B C

▲ FIGURA 21.8
A) Radiografia inicial do dente 36 com insucesso do tratamento endodôntico e lesão periapical. B) Ra-
diografia final do retratamento endodôntico com extravasamento de cimento no forame apical. C) Ra-
diografia de controle após 8 meses com reparo parcial da lesão periapical (cimento Pulp Canal Sealer).
Fonte: Cortesia da Dra. Marcelle Louise Sposito Bourreau.

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212 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

A B C

▲ FIGURA 21.9
A) Radiografia inicial do dente 45 com lesão periapical. B) Radiografia final do tratamento endo-
dôntico. C) Radiografia de controle após 1 ano (cimento Sealapex).
Fonte: Cortesia da Dra. Marcelle Louise Sposito Bourreau.

A B

C D

E F

▲ FIGURA 21.10
Sequência do tratamento endodôntico do dente 24, mostrando as radiografias inicial e final e
ilustrações clínicas do isolamento absoluto, da abertura de acesso, do preparo para restauração e
do caso finalizado.
Fonte: Cortesia do Dr. Patrick Baltieri.

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Endodontia passo a passo 213

A B

C D

E F

▲ FIGURA 21.11
Sequência de um caso de retratamento endodôntico do dente 35 (suporte de prótese fixa). As
radiografias inicial e final mostram o sucesso do acesso ao terço apical e a obturação endodôntica
final. As fotografias clínicas mostram as fases do retratamento com a remoção do retentor e a
instalação do pino de fibra de vidro.
Fonte: Cortesia do Dr. Patrick Baltieri.

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214 Francisco José de Souza Filho (Organizador)

A B

C D

▲ FIGURA 21.12
Sequência do tratamento do dente 36. As radiografias inicial e final mostram o perfeito selamento
do canal radicular. As fotografias clínicas mostram as etapas do tratamento até a limpeza e o pre-
paro da câmara pulpar para a restauração coronária.
Fonte: Cortesia do Dr. Patrick Baltieri.

A B

C D

▲ FIGURA 21.13
Tratamento endodôntico do dente 14 com três raízes e três canais.
Fonte: Cortesia do Dr. Patrick Baltieri.

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Glossário de termos
endodônticos

AAP AMPLIAÇÃO ANATÔMICA PROGRESSIVA


É a técnica de preparo do canal radicular para o acesso ao forame em canais atrésicos pela
ampliação gradativa da anatomia do canal por meio de um step back progressivo (# 10 – #
15 – # 20 – # 25), com o objetivo de liberar o corpo do instrumento do contato com as
paredes do canal, possibilitando o avanço apical com a ponta dos instrumentos manuais
mais finos.
ADSORÇÃO
É a ligação molecular que ocorre com a reação dos íons da clorexidina (carga positiva)
com os íons da hidroxiapatita ou com a parede celular das bactérias (carga negativa).
CAD
É a medida virtual tomada na radiografia inicial que determina o comprimento aparente
do dente.
CRC
É a medida exata que corresponde ao comprimento real do canal quando a ponta da
lima manual está localizada no forame apical. Para tomar essa medida, é necessário fazer
a patência do forame apical (a ponta da lima fora do canal dispara um bip rápido). Em
seguida, retornar o instrumento para o interior do canal até que dispare um som contínuo
(sem bip). Nessa altura, o instrumento está localizado no ponto mais extremo do canal,
no interior do forame apical, e determina o comprimento real do canal (CRC).
CT
É o comprimento de trabalho para a instrumentação do canal radicular a 1 mm além do
forame apical.
GLIDEPOWER FORÇA LEVE
É a denominação para a força suave aplicada ao instrumento manual na passagem de um
instrumento para outro durante a AAP.
LAF LIMA ANATÔMICA FINAL
É a lima manual que melhor se ajusta ao forame apical a 1 mm além do CRC, após o
término da ampliação do forame com instrumentos rotatórios ou reciprocantes. É a lima
equivalente ao diâmetro do forame preparado.
LAI LIMA ANATÔMICA INICIAL
É a lima que melhor se ajusta ao forame apical a 1 mm além do forame apical, imediata-
mente após a realização da patência.
LIMITE CDC
É o limite histológico que corresponde à união cemento-dentina-canal localizada aproxi-
madamente a 1 mm aquém do vértice radiográfico da raiz. Pode coincidir com a região
de maior estreitamento do canal no terço apical.

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216 Glossário de termos endodônticos

PATÊNCIA
Qualidade ou estado de estar desimpedido, desobstruído, permitindo livre passagem de
ar, fluidos, etc.
TAPER
É o aumento da conicidade do instrumento a partir de sua ponta. No padrão ISO, um
instrumento com taper 02 aumenta a conicidade em .02 mm a cada mm a partir de sua
ponta. Um instrumento com taper 06 aumenta .06 mm a cada mm a partir de sua ponta.
TIP
É a medida, em milímetros, da ponta dos instrumentos endodônticos. Na numeração
dos instrumentos manuais padrão, ISO significa que a ponta da lima # 15 tem a medida
0,15 mm.

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