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Métodos de Alfabetização:
Princípios e transformações

Textos selecionados por Nathália Luiz de Freitas

Licenciatura em Pedagogia

35

4 Multiletramento
2.1
Métodos de alfabetização:
delimitação de procedimentos
e considerações para uma
prática eficaz

Alessandra Gotuzo Sebra e Natália Martins Dias

Licenciatura em Pedagogia

SEBRA, Alessandra Gotuzo; DIAS, Natália Martins. Métodos de alfabetização:


delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz. Rev.
Psicopedag. [online]. 2011, v.28, n.87, pp. 306-320. Disponível em:
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-
84862011000300011. Acesso em: mar. 2022

Para além da escrita e da leitura: as possibilidades de aprendizagem com o Multiletramento 5


Sebra AGde
ARTIGO & revisão
Dias NM

Métodos de alfabetização: delimitação


de procedimentos e considerações
para uma prática eficaz
Alessandra Gotuzo Sebra; Natália Martins Dias

RESUMO – O artigo apresenta os métodos de alfabetização mais difundidos


no país, delimitando-os em função de seus três aspectos fundamentais, a saber:
a) ponto de partida e encaminhamento da alfabetização, delimitando os métodos
analíticos e sintéticos; b) unidade mínima de análise na relação entre fala e
escrita, delimitando os métodos global, silábico e fônico; e c) tipo de estimulação
envolvida, distinguindo os métodos multissensorial e tradicional. É apresentado
breve histórico sobre os métodos de alfabetização e, em maiores detalhes, são
descritos os métodos fônico e global. O método fônico tem como objetivo prin­­­
cipal ensinar as correspondências grafofonêmicas e desenvolver habilidades
metafonológicas, fomentado as habilidades de decodificação e codificação. Já
o método global pressupõe que a aprendizagem da linguagem escrita ocorra
pela identificação visual da palavra, focando diretamente as associações entre
as palavras e seus significados. No Brasil, o método global é o mais enfatizado
nas universidades e o mais utilizado nas salas de aula. Além disso, no país, a
concepção construtivista tem exercido grande influência sobre as práticas em
alfabetização. No entanto, pesquisas nacionais e internacionais têm questionado
a efetividade do método global e das concepções construtivistas e revelado o
método fônico como o mais eficaz na alfabetização regular e, ao lado do método
multissensorial, na intervenção com crianças com dificuldades em leitura e
escrita. Recentemente, algumas iniciativas acadêmicas e de setores do governo
têm revelado uma possível aproximação entre as práticas educacionais e tais
evidências científicas. Essa confluência ‘educação-ciência’ poderá beneficiar
grandemente as práticas na educação fundamental do país.

UNITERMOS: Alfabetização. Aprendizagem. Linguagem. Leitura.

Alessandra Gotuzo Sebra – Psicóloga, Doutora e Pós- Correspondência


Doutorada em Psicologia pela Universidade de São Pau­­­ Alessandra Gotuzo Sebra
lo, Professora, pesquisadora e orientadora do Programa Av. Higienópolis, 846, apto 22 – São Paulo, SP, Brasil –
de Pós-graduação em Distúrbios do De­­­­­­­­­senvolvimento CEP 01238-000
da Universidade Presbiteriana Ma­­­­ckenzie, Bolsista E-mail: alessandragseabra@gmail.com
de Produtividade CNPq - Uni­­­versidade Presbiteriana
Mackenzie, São Paulo, SP, Brasil.
Natália Martins Dias – Psicóloga, Mestre e Doutoranda
do Programa de Pós-graduação em Distúrbios do De­­­­­sen­­­
volvimento da Universidade Presbiteriana Ma­­­cken­­­zie,
Bolsista FAPESP. Professora convidada do curso de
Psi­­­copedagogia da UPM. Universidade Presbiteriana
Mackenzie, São Paulo, SP, Brasil.

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Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz

INTRODUÇÃO ser apresentadas inicialmente as letras, os sons


Esse artigo tem como objetivo apresentar das letras ou as sílabas. Tal apresentação pode
alguns conceitos sobre os diferentes métodos ocorrer conforme uma ordem específica ou sem
de alfabetização. Não caracteriza uma revisão uma sequência previamente determinada. Após
sistemática e não pretende aprofundar histori- a introdução das unidades mínimas, ensina-se
camente o tema, mas é uma reflexão motivada a sua síntese em unidades maiores, formando
pela observação de desconhecimento, por parte sílabas, palavras, frases e, finalmente, textos.
de profissionais da área, com relação aos distin- Nos métodos analíticos, ao contrário, as unida-
tos métodos de alfabetização, seus princípios e des apresentadas inicialmente são unidades de
procedimentos de aplicação, o que tem limitado significado, sejam elas palavras, frases ou textos.
a possibilidade de aplicação de diferentes méto- Assim, os métodos analíticos partem de unidades
dos para alunos com diferentes características, maiores, sem um foco primário sobre as unidades
prejudicando, dessa forma, a otimização do po­­­ menores (do todo para a parte).
tencial de cada indivíduo. A unidade mínima de análise na relação en-
tre fala e escrita refere-se à menor unidade cuja
MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO: DEFI- relação com a fala é explicitamente apresentada.
NINDO CONCEITOS Ou seja, refere-se a qual segmento da fala é
Atualmente, há uma confusão bastante gran­­de “oralizado” ou “verbalizado” pelo professor. Por
em relação às diferentes características dos mé­­­ exemplo, pode-se apresentar uma palavra escrita
todos de alfabetização. Nesse sentido, devem-se e dizer o correspondente falado daquela palavra
distinguir três aspectos fundamentais de tais (ou seja, ler a palavra). Em um nível mais seg-
métodos: mentado, podem-se apresentar sílabas escritas e
1) Qual é o ponto de partida e o encaminha- dizer o correspondente falado daquelas sílabas
mento da alfabetização? Aqui se faz a dis- (ou seja, ler a sílaba). Finalmente, podem-se
tinção entre métodos analíticos e sintéticos; apresentar as letras e dizer o seu correspondente
2) Qual é a unidade mínima de análise na falado (ou seja, ler os fonemas correspondentes
relação entre fala e escrita? Aqui se distin- às letras). Dessa forma, em relação à unidade
gue entre método global, método silábico mínima de análise na relação entre fala e escri-
e método fônico; ta, há os métodos global (unidade mínima é a
3) Qual é o tipo de estimulação envolvida? palavra), silábico (unidade mínima é a sílaba) e
Aqui se distinguem o método multissen- fônico ou fonético (unidade mínima é o fonema).
sorial e o tradicional. Em relação ao terceiro critério, o tipo de es­­­
Essas três distinções encontram-se represen- timulação envolvida, distinguem-se o método
tadas na Figura 1 e são descritas mais detalha- multissensorial e o método tradicional. Tais mé-
damente a seguir. todos diferenciam-se em relação às modalidades
O ponto de partida e o encaminhamento da sensoriais engajadas, ativa e intencionalmente,
alfabetização referem-se a qual é a unidade ini- no processo de alfabetização. No método tradi-
cialmente apresentada durante a alfabetização, cional, a linguagem escrita é ensinada principal-
dentre a parte ou o todo (unidade de significa- mente usando a visão (o aluno vê o item escrito)
do). Há duas possibilidades: método analítico e a audição (o aluno ouve seu correspondente
e método sintético. Nos métodos sintéticos, são oral). No método multissensorial, há um enga-
usados procedimentos que partem de unida- jamento muito maior e mais explícito de outras
des menores para chegar a unidades maiores modalidades sensoriais, como a tátil (o aluno
(da parte para o todo). Ou seja, as unidades sente uma letra desenhada com um material de
ensinadas são menores que as unidades de textura específica, por exemplo), a cinestésica (o
significado da língua em questão. Logo, podem aluno movimenta-se sobre uma letra desenhada

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Ponto de Unidade de Modalidades


partida análise sensoriais
(escrita-fala) envolvidas

analítico
palavra
(todo – parte) multissensorial

sílaba
sintético
(parte – todo) tradicional
fonema

Figura 1 – Três aspectos fundamentais dos métodos de alfabetização: ponto de partida, unidade de análise na relação entre
escrita e fala e modalidades sensoriais envolvidas.

no chão, por exemplo), e a fonoarticulatória (o contrário, remete a uma discussão antiga e


aluno, de forma intencional, atenta aos movi- constitui uma das maiores disputas no campo
mentos e posições de lábios e língua necessários da pedagogia e da educação1. Historicamente,
para pronunciar determinado som). Assim, o o uso e a transição entre diferentes métodos de
mé­­­­todo multissensorial tenta, intencionalmen- alfabetização têm sido marcados por períodos de
te, apresentar a linguagem escrita, tendo como insatisfação e resistência, delimitando conflitos e
input outras modalidades não usadas no método disputas, quase sempre ideológicas, entre defen-
tradicional, como o tato e a cinestesia. sores de antigas e novas concepções2. A Figura
Tendo sido apresentados esses três critérios 2 apresenta esquematicamente uma linha do
possíveis para classificação dos métodos de tempo sobre disputas e práticas em alfabetização
alfabetização, pode-se prever que há diferentes no Estado de São Paulo. O esquema foi ampla-
combinações possíveis dos critérios. Pode haver, mente baseado e sintetiza a revisão histórica e
por exemplo, um método analítico que tenha teórica de Mortatti2, porém é complementado
co­­­mo unidade mínima o fonema e que seja mul­­ por outras referências3-12.
tissensorial. Nesse caso, o ensino parte do texto Nos primeiros séculos de ensino de leitura
como unidade inicial de apresentação ao aluno, e escrita, havia um predomínio de instruções
ensina explicitamente a relação entre os fonemas denominadas sintéticas, conforme descrição
da fala e as letras da escrita, e engaja ativamente anterior. O método mais usado era o método
diversas modalidades sensoriais. alfabético, iniciado com o ensino das letras e
Dessa forma, diferentes combinações dos seus nomes13.
critérios são possíveis. As combinações mais O método fônico, que propõe o ensino siste-
comuns, usadas ao longo da história da educação mático e explícito das correspondências entre
formal, são descritas a seguir. letras e sons, nasceu provavelmente no século
XVI, com educadores alemães. Esta proposta à
MÉTODOS DE ALFABETIZAÇÃO: BREVE alfabetização ensina, como parte fundamental
HISTÓRICO da sua prática, as correspondências grafofonê-
Identificar qual das várias formas de alfabe­ micas, ou seja, entre as letras e seus sons. Por
tização é a mais eficaz não é algo recente; ao sua vez, o método global nasceu provavelmente

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Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz

Alfabetização ganha destaque


• Antes de 1889: ensino leitura/escrita – transmissão assistemática em casa ou ‘aulas régias’;
• 1889: Proclamação da República. Inicia-se a universalização da escola.
• A partir de 1889: prática organizada nas escolas.
Até final do império – métodos sintáticos (alfabético e silábico);
1880 – Método João de Deus – ‘Palavração’.
Funda-se nova tradição: ensino da leitura envolve questão do método.
Disputa entre defensores de novos (Método João de Deus) e antigos métodos (sintéticos)

Reforma da instrução pública (base da reforma eram os métodos de ensino).


• Entra em uso o Método Analítico.
• Disseminação para outros estados e utilização obrigatória nas escolas paulistas (reclamações
devido à lentidão de resultados).
Método Analítico – influência da pedagogia norte-americana – “criança apreende o mundo
de forma sincrética”.
• Adaptação do ensino à nova concepção de criança.
• Ensino começa do TODO para as partes constituintes (TODO = palavra/sentença/história)

• Cartilhas – ‘palavração’ e ‘sentenciação’.


• 1910 – termo ‘alfabetização’ começa a ser utilizado.
• Disputa: entre analítico x sintético (silabação) e entre diferentes modos de processuação do
analítico.
• Nova tradição: como ensinar a partir da definição das habilidades visuais, auditivas e motoras
da criança a quem se ensina.

Autonomia didática (Reforma Sampaio Dória).


• Novas urgências políticas e sociais aumentam a resistência dos professores ao uso do Método
Analítico. Há maior busca por novas soluções para os problemas de ensino.
• Começam a ser utilizados os Métodos mistos.
• Disputas entre defensores dos métodos analítico e sintético diminuem; há, porém, relativi-
zação sobre importância do método influenciada pela publicação do livro ‘Testes ABC para
verificação da maturidade necessária ao aprendizado da leitura e escrita’, em 1934.

• Cartilhas métodos mistos (Caminho Suave em 1948-1990)


• ‘Período preparatório’ (exercícios de discriminação visomotora, auditivomotora, posição
corpo e membros, coordenação motora grossa e fina, etc).
• Método se subordina ao nível de maturidade da criança.
• Nova tradição: foco sobre maturidade da criança.

Figura 2 – Linha do tempo: práticas em alfabetização no Estado de SP (baseado em Mortatti2) e questões atuais em nível
nacional.

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• Prática e tradição anterior é questionada.


• Introduz-se no Brasil a concepção construtivista (1986).
• Nova teoria se apresenta como ‘revolução conceitual’ (não como método!), há abandono
das práticas tradicionais e questiona-se a utilidade das cartilhas.
• Esforços de “convencimento” dos alfabetizadores pelas autoridades educacionais e imposição
do construtivismo.
• Disputas entre defensores métodos tradicionais (mistos), defensores das cartilhas e do nível
de maturidade versus construtivistas.

• Problema do fracasso escolar passa a ser pensado em termos de políticas públicas (não se
pode mais discutir método?)
• Processo de aprendizagem é compreendido de acordo com a psicogênese da língua escrita36.

• Institucionalização em nível nacional do construtivismo - PCN’s publicados pelo MEC em


1997.
• Tradição: desmetodização e ênfase no aprendiz, a criança elabora hipóteses e constrói seu
conhecimento.
• Porém, não há total desmetodização. Os PCN’s brasileiros apresentam o método Global ou
Ideovisual (que se caracteriza como um método analítico).
• “... Ilusório consenso de que a aprendizagem independe do ensino”2 (pág.11).
• Questionamentos e dúvidas decorrentes da ausência de uma “didática construtivista”.

• Dados PISA 2000; 2003, 2006, 20098-11 - Estudantes brasileiros desempenham-se abaixo da
média internacional. Resultados da avaliação de Leitura:
• 2000 – último lugar! 32ª posição de 32 países;
• 2003 – 38ª posição dentre 41 países;
• 2006 – 49ª posição dentre 56 países;
• 2009 – 53ª posição dentre 65 países;
• Reportagem publicada na Folha de São Paulo em 2003 – Fernando Capovilla: “O Brasil é
recordista mundial de incompetência de leitura”.
• Avaliações nacionais - SAEB - declínio de desempenho nas avaliações sucessivas de 1995 a
2005.

Uma luz no fim do Túnel?


Pesquisas na área da Psicologia Cognitiva apontam superioridade do método fônico sobre o
método global.
• As evidências científicas acerca dos métodos de alfabetização começam a ser consideradas
na Pedagogia: Convergência Ciência-Educação?
• Relatório Novos Caminhos da Alfabetização5,7;
• Relatório do MEC6 – A Criança de 6 anos na Educação de 9 anos – traz referência ao treino da
consciência fonológica.
• Em 2011 ocorre em São Paulo o Seminário Internacional de Alfabetização na Perspectiva da
Psicologia Cognitiva.

Continuação da Figura 2 – Linha do tempo: práticas em alfabetização no Estado de SP (baseado em Mortatti2) e questões
atuais em nível nacional.

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no século XVII13. Segundo esse método, seria Estudos têm evidenciado resultados bastante
mais econômico ensinar a palavra como um todo animadores com o uso do método fônico. Por
às crianças, sem focalizar unidades menores. exemplo, Gersten et al.14 relataram benefícios de
Assim, era preconizado o ensino direto das asso­ longo prazo de um programa baseado em instru-
ciações entre as palavras e seus significados12. ções fônicas, o modelo de Instrução Direta. Tais
Apesar de diversos outros métodos de alfabe­ benefícios foram evidentes em termos de menor
tização terem surgido, um grande debate tem repetência ao longo das séries escolares e, até
ocorrido entre o método fônico, de um lado, e mesmo, de maior aceitação em faculdades. Estes
o método global, de outro lado. Tal debate tem resultados de longo prazo são explicados pelo
ocorrido já há algumas décadas internacional- fato de que o método fônico fornece às crianças
mente1 e, no Brasil, tem se intensificado nos habilidades e conhecimentos autogerativos de
últimos anos. Esses dois métodos, portanto, serão decodificação fonológica, o que é concebido por
descritos mais detalhadamente a seguir. Share15 como um mecanismo que possibilita o
autoensino. Assim, após dominar essa habili-
Método fônico dade básica de decodificação, o leitor possui
Esta proposta à alfabetização tem dois obje­ os pré-requisitos necessários para desenvolver
tivos principais: ensinar as correspondências suas habilidades de leitura, necessitando basi­
grafofonêmicas e desenvolver as habilidades camente da prática para alcançar fluência e
metafonológicas, ou seja, ensinar as correspon- automatismo.
dências entre as letras e seus sons, e estimular Alguns princípios derivados da abordagem
o desenvolvimento da consciência fonológica, de processamento de informação da Psicologia
que se refere à habilidade de manipular e refle- Cognitiva dão sustentação ao método fônico, e
tir sobre os sons da fala. Enquanto o ensino das são descritos a seguir:
correspondências grafofonêmicas é considerado • Não se sustenta a noção de que a lingua-
fundamental desde o início do método fônico, gem escrita apresenta uma continuidade
que provavelmente data do século XVI, como em relação a outras formas de representa-
anteriormente descrito, o desenvolvimento da ção, como o jogo simbólico e as imagens
consciência fonológica é mais recente, tem sido mentais, conforme proposto por outras
incentivado principalmente a partir do século XX. abor­­dagens, como a epistemologia gené-
Este método baseia-se na constatação expe- tica de Piaget16;
rimental de que as crianças com dificuldades na • Logo, um ensino específico deve ocorrer
alfabetização têm dificuldade em discriminar, para que a criança desenvolva as habi-
segmentar e manipular, de forma consciente, os lidades necessárias para dominar a lei-
sons da fala. Esta dificuldade, porém, pode ser tura e a escrita, incluindo atividades de
diminuída significativamente com a introdução consciência fonológica, como síntese e
de atividades explícitas e sistemáticas de cons- segmentação de fonemas, e o ensino dos
ciência fonológica, durante ou mesmo antes da sons das letras;
alfabetização. Quando associadas ao ensino das • Para o ensino dos sons das letras, pode-se
correspondências entre letras e sons, as instru- começar pelas vogais e pelas consoantes
ções de consciência fonológica têm efeito ainda cujos sons podem ser pronunciados iso-
maior sobre a aquisição de leitura e escrita. Além ladamente, como /f/, /j/, /l/, /m/, /n/, /s/, /v/,
de ser um procedimento bastante eficaz para a /x/, /z/17;
alfabetização de crianças disléxicas, o método • Deve haver um ensino dirigido das pala-
fô­­­nico também tem se mostrado o mais adequado vras: inicialmente devem ser ensinadas as
ao ensino regular de crianças sem distúrbios de palavras com ortografias regulares, poste-
leitura e escrita12. riormente com ortografias reguladas pela

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posição (mesa, em que o “s” intervocálico soma das informações contidas separadamente
soa como /z/) e somente então as palavras nos elementos menores. Tal pressuposto, prove-
com ortografias irregulares (por exemplo, niente de estudos basicamente de percepção, foi
flecha ou xale para irregularidade de aplicado à alfabetização, supondo que a forma
ch/x; jeito ou gente para irregularidade global das palavras forneceria dicas importantes
de g/j). Isto porque o ensino de palavras aos leitores iniciantes12. Para os defensores do
irregulares logo no início da alfabetização método global, o conhecimento das correspon-
pode confundir o aprendiz, impedindo-o de dências letra-som seria adquirido naturalmente
desenvolver consistentemente a noção de pelas crianças, após o reconhecimento total da
correspondência entre letras e sons13. So- palavra estar bem estabelecido.
mente após essa noção estar estruturada, Para além do nível da palavra, a maioria
as irregularidades devem ser introduzidas; dos métodos analíticos toma o contexto como
• Os exercícios de coordenação motora são absolutamente relevante para a leitura de uma
importantes. Eles auxiliam o aluno a ad- palavra. Assim, angariado nas concepções de
quirir as formas ortográficas das letras13. Ben Goodman e Frank Smith, em tais métodos
Isto permitirá, posteriormente, que o alu­­­no considera-se que a aprendizagem de leitura e
apresente uma caligrafia mais adequada escrita só pode ocorrer a partir de unidades que
e, principalmente, ajudará na consolida- sejam significativas à criança. Em geral, métodos
ção mental das formas das letras, o que globais ou ideovisuais partem de unidades como
permitirá a escrita mais automática e a palavras, textos, parágrafos, sentenças ou pala-
identificação mais fácil das letras durante vras-chave (como no método de Paulo Freire).
a leitura. É a partir destas unidades maiores e, portanto,
Assim, abordagens fônicas usualmente pro- significativas que, em um segundo momento,
põem o ensino explícito e sistemático, com grau o aprendiz chegaria a uma com­preensão das
crescente de dificuldade, das habilidades de unidades menores que compõem as palavras,
decodificação grafofonêmica e de codificação porém sem necessidade de instrução sistemática
fonografêmica, paralelamente ao trabalho para e explícita para isso.
desenvolvimento da consciência fonológica18. Em meados do século XX, em todo o mundo,
o método global difundiu-se amplamente nas
Método global escolas. Desde então, um dos maiores pesqui-
O método global ou ideovisual pressupõe que sadores sobre o método tem sido Goodman19,20.
a aprendizagem da linguagem escrita se dê pela O autor sustenta a visão de que as ideias do
identificação visual da palavra. Apesar de haver método global são progressistas e sensíveis às
outros métodos analíticos, como os métodos de necessidades das crianças e buscam desenvolver
‘palavração’ e ‘sentenciação’, o global ou ideo- a criatividade destas, permitindo a elas próprias
visual é o mais amplamente conhecido, desen- “descobrirem” os princípios subjacentes à leitura
volvido provavelmente no século XVII13. Como e à escrita. Além disso, as práticas do método glo-
anteriormente descrito, tal método pressupõe bal evitam a submissão das crianças a programas
que é mais econômico ensinar a palavra como estruturados e sistemáticos, como os programas
um todo ao aluno, sem focalizar unidades me- fônicos e seu ensino sistemático e explícito de
nores, sendo, portanto, ensinadas diretamente correspondências grafema-fonema.
as associações entre as palavras e seus signifi- Assim, o método global propõe o ensino das
cados. Tais ideias foram reforçadas pela Gestalt, associações entre palavras inteiras e seus signi-
que pressupõe que o todo é maior que a soma ficados (abordagem ideovisual), individualmente
das partes, ou seja, que a informação contida na ou em textos introduzidos desde o início12. Dentre
unidade total de significado é maior do que a os princípios de sua prática, podem-se elencar:

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• A leitura é compreendida como atribui- grandemente difundido e ele continuou sendo


ção de sentido e interação entre o leitor utilizado por anos em escolas em todo mundo1.
e texto; a leitura não deve ser focada na Tal discrepância entre a prática educacional na
decifração; alfabetização e as evidências oriundas de estu-
• A leitura é um “jogo de adivinhação psi- dos científicos foi apontada por diversos auto-
colinguística”21. As crianças devem ser res1,13,31, que destacavam, entre outros fatores, a
estimuladas a adivinhar o que está escrito falta de pesquisa experimental conduzida pelos
a partir de pistas contextuais; adeptos do método global e uma postura na qual
• A aprendizagem da leitura deve ocorrer imperava o dogmatismo, apesar do fracasso a
a partir de unidades maiores que sejam que eram fadados seus estudantes.
significativas para a criança (palavras, No Brasil, a história tendeu a se repetir e, nos
sentenças, textos), com incentivo à asso- cursos de formação, tanto na graduação quan-
ciação direta entre palavras e significados. to na pós-graduação, o método global ainda é
enfatizado como eficaz e moderno12. Com isso,
EVIDÊNCIAS DA SUPERIORIDADE DO anualmente, as escolas ganham novos educa-
MÉ­­­­TODO FÔNICO dores, pedagogos e psicopedagogos, que conti-
Como anteriormente descrito, no século XX, nuam a aplicar e difundir uma prática ineficaz,
o método global difundiu-se entre as escolas em em total contrassenso às pesquisas conduzidas
diversos países. Com seu amplo uso, começaram na área. E é, sobretudo, nas escolas públicas,
a ser conduzidos estudos questionando sua efi­­­ com seu maior contingente de crianças de nível
cácia. O primeiro grande ataque ao método global socioeconômico baixo, que esse fato é mais preo­
surgiu com o estudo de Flesch22, intitulado Why cupante, pois estas crianças, muitas vezes, não
Johnny can’t read? (Por que Johnny não pode possuem alternativas que possam suprir estas
ler?). Segundo o autor, o método global é mais falhas educacionais. Vale lembrar que o Censo
uma forma de treinamento animal do que método educacional de 2010 declarou que 87,3% dos
de alfabetização. Seu posicionamento é corrobo- estudantes brasileiros no ensino fundamental
rado por outros estudos de grande porte, como os estão matriculados na rede pública de ensino32.
de Chall23 e Bond & Dykstra24, que arguiam que os Ainda no âmbito nacional, na década de
programas de alfabetização baseados em instru- 1980, houve grande difusão das ideias de Emí-
ções fônicas eram superiores aos globais, levando lia Ferreiro que, até os dias de hoje, permeiam
a melhores desempenhos em reconhecimento de e influenciam as práticas de alfabetização em
palavras, escrita e vocabulário12. todo território brasileiro. Ferreiro baseou seus
Conforme alguns estudos apontam25-27, o tipo trabalhos na teoria piagetiana, investigando,
de instrução característica do método global sobre esta perspectiva, o processo de aquisição
não enfatiza o ensino explícito e sistemático da leitura pela criança33-36. De acordo com suas
dos princípios da língua escrita, tal como faz pesquisas e de modo conciso, a autora descreveu
o método fônico, de modo que nem todas as três períodos evolutivos ou de conceitualização
crianças conseguem apreender tais princípios. do escrito pela criança16,34. No primeiro nível
Essa dificuldade é ainda maior, fazendo ainda conceitual, começa a haver uma distinção entre
mais evidente a discrepância entre os métodos, o material gráfico icônico e o não-icônico. No
com clara inferioridade do global, no caso de se­­­gundo, a hipótese central formulada pela
crianças que apresentam risco de atraso de criança é que coisas diferentes devem ser lidas/
leitura e escrita ou aquelas com desvantagens escritas de formas diferentes; também surgem
socioculturais28-30. as noções de quantidade e diversidade de letras
Porém, apesar de evidências da inferioridade por palavra. E, no terceiro nível conceitual, sur-
e das desvantagens do método global, seu uso foi ge a tentativa de dar valor sonoro às letras que

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formam a palavra, ou seja, surge a noção de atividades do método fônico. Os professores são
fonetização da escrita. Inicialmente, a criança incentivados a desenvolver habilidades de rima,
elabora uma hipótese silábica, na qual a cada segmentação fonêmica e discriminação de sons
letra faz equivaler uma sílaba; posteriormente, e a ensinar as relações entre as letras e os sons.
compreende que a cada letra corresponde um É interessante observar que tais diretrizes são
som ou fonema, pautando sua leitura e sua pro- recomendadas em países de língua inglesa, cuja
dução escrita em uma hipótese alfabética. ortografia tem relações grafofonêmicas bastante
As ideias de Ferreiro originaram a concep- irregulares, com correspondências imprevisíveis
ção construtivista que se autoproclama uma entre letras e sons. Logo, se o método fônico é
revolução conceitual e não um novo método recomendado para o inglês (que é extremamente
de alfabetização. Tal concepção defende uma irregular), certamente ele é ainda muito mais
alfabetização contextualizada e, portanto, signi- eficaz no português, cujas relações entre letras
ficativa que deve dar-se por meio da transposição e sons são bem mais regulares e que, portanto,
didática das práticas sociais de leitura e escrita propicia maior sucesso na aplicação de regras
para o contexto da sala de aula. É por meio de de conversão grafofonêmicas39.
sua imersão às práticas sociais de leitura que a No contexto nacional, autores têm desenvol-
criança começa a se organizar para apreender o vido e testado programas fônicos com resultados
significado deste objeto. Pouco a pouco ela ela- bastante positivos. Tais procedimentos podem
bora hipóteses sobre o que a escrita representa. ser utilizados no contexto educacional ou clíni-
Neste processo, por meio da ação reflexiva da co12,40,41. Há também um programa computado-
criança, a consciência fonológica desenvolver- rizado que permite a aprendizagem de habilida-
-se-ia naturalmente, não sendo necessárias des importantes de uma forma bastante lúdica42.
práticas sistemáticas para sua estimulação. Na Vale lembrar que estudos têm evidenciado que
concepção construtivista, o aluno deve ser leva- as dificuldades em leitura e escrita se devem,
do a pensar sobre a escrita e, assim, construirá e em grande parte, a problemas de processamento
reelaborará seu próprio conhecimento36,37. fonológico, podendo estes ser atenuados e/ou
O construtivismo de Ferreiro é uma teoria solucionados com a incorporação de atividades
epis­­­temológica e não um método de alfabetiza- fônicas e metafonológicas em diferentes níveis
ção. Sua transposição para a sala de aula tem escolares43. Isto tem sido demonstrado em diver-
se mostrado problemática e pouco eficaz, e os sos estudos internacionais43-51 e nacionais12,41,53-58.
riscos que tal concepção sobre alfabetização Outro método também utilizado no trabalho
podem trazer podem ser verificados nos dados com crianças com dislexia ou com dificuldades
das avaliações nacionais e internacionais que de leitura e escrita é o chamado multissensorial39.
constatam o fracasso do alunado brasileiro na Este procedimento busca combinar diferentes
aprendizagem da leitura5,7-11. modalidades sensoriais no ensino da linguagem
escrita às crianças. Assim, ele facilita a leitura e
ALFABETIZAÇÃO DE CRIANÇAS COM a escrita ao estabelecer a conexão entre aspec-
DISLEXIA E PROBLEMAS DE LEITURA tos visuais (a forma ortográfica da letra ou da
E ESCRITA pa­­­lavra), aspectos auditivos (a forma fonológi-
Além da superioridade do método fônico ca), aspectos táteis e cinestésicos da grafia (os
na alfabetização em contexto regular, diversas movimentos necessários para escrever letras e
associações de dislexia em todo o mundo reco- palavras) e aspectos cinestésicos da articulação
mendam instruções fônicas para o ensino de (os movimentos e posições necessários para
indivíduos com dislexia. De fato, nas diretrizes pronunciar sons e palavras).
da British Dyslexia Association38 para o ensino de Maria Montessori foi uma das precursoras do
crianças disléxicas, é recomendada a inclusão de método multissensorial. Ela defendia a participa-

Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20

314
Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz

ção ativa da criança durante a aprendizagem e o • Visão: ênfase na forma visual de letras e
movimento era visto como um dos aspectos mais palavras, podendo usar cores e tamanhos
importantes da alfabetização. A criança devia, diferentes;
por exemplo, traçar a letra enquanto o professor • Cinestesia – traçado: ênfase no traçado da
dizia o som correspondente59. letra/palavra, por exemplo usando letras
Fernald e Keller60, outros proponentes do com setas desenhadas que indicam a di-
mé­­­todo multissensorial, também incentivavam reção do movimento correto para a grafia;
as crianças a pronunciar em voz alta os nomes • Tátil: ênfase na memória tátil da forma
das letras enquanto as escrevessem. Orton61 deu das letras/palavras, por exemplo usando
continuidade ao desenvolvimento de técnicas do texturas diferentes;
método multissensorial, mantendo a associação • Articulação: ênfase na memória articu­
tríplice visual, auditiva e cinestésica e, em 1925, latória das letras/palavras, de forma cons­­
Orton e Gillingham propuseram uma variação do ciente e intencional.
método multissensorial, em que inicialmente de- No Brasil, um procedimento multissensorial
vem ser ensinadas as correspondências entre as bastante difundido e adotado é o Fonovisuoarti-
letras e seus sons, aumentando as unidades pro- culatório, conhecido mais informalmente como
gressivamente para palavras e, somente depois, ‘Método das boquinhas’. Utiliza-se das estraté­
gias fônica (fonema/som), visual (grafema/
para frases39. Esse procedimento delimitava:
letra) e articulatória (articulema/Boquinhas) e é
• Apresentação de cada letra separadamen-
indicado tanto para a alfabetização de crianças
te, com seu nome e seu som;
quanto na reabilitação dos distúrbios da leitura
• Criança traça a letra enquanto diz seu
e escrita62-64.
no­­­me, inicialmente com o modelo visual
e, depois, sem ele;
• Apresentação das sílabas simples com sons CONSIDERAÇÕES FINAIS
regulares; O artigo apresentou e delimitou os méto-
• Combinação dessas sílabas para formar dos sintéticos e analíticos. Após, centrou-se
palavras; na discussão entre os métodos fônico e global,
• Introdução de palavras com correspondên­ apresentando, por fim, sugestões tanto para a
alfabetização quanto ao trabalho interventivo
cias irregulares;
com crianças com dislexia ou problemas de lei-
• Combinação de palavras em frases.
tura e escrita. Para tal atuação, os procedimentos
Cabe destacar que algumas variantes do mé-
fônico e multissensorial têm sido reconhecidos
todo multissensorial trabalham apenas com os
como os mais eficazes.
sons das letras, e não com seus nomes. A maioria
Pesquisas comparando os métodos de alfabe-
delas parte das unidades mínimas (no nível da
tização têm se concentrado principalmente nos
letra) para unidades mais complexas (nível da procedimentos fônico e global. Em geral, estas
palavra e, depois, da frase). Apesar de requerer investigações têm demonstrado a superiorida-
muito tempo de intervenção, o método multis- de do fônico, especialmente com crianças com
sensorial é um dos procedimentos mais eficazes desvantagem sociocultural ou cognitiva. Estu-
para crianças mais velhas, que apresentam pro- dos de meta-análise comprovam que introduzir
blemas de leitura e escrita há vários anos e que instruções fônicas (ensinar correspondências
possuem histórico de fracasso escolar. grafofonêmicas) e metafonológicas (desenvolver
Alguns princípios que orientam a prática do a consciência fonológica) auxilia a aquisição
método multissensorial são: de leitura e escrita. Porém, no Brasil, até hoje
• Audição: ênfase nos sons das letras e na predomina o método global, tanto no contexto
forma fonológica das palavras; clínico quanto no educacional.

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315
Sebra AG & Dias NM

As razões para a insistência em um modelo algumas evidências mais recentes têm sugerido
que tem logrado péssimos resultados nas ava- a possibilidade de um encontro entre as duas
liações nacionais e internacionais, tendo sido áreas. Exemplos disso são o Relatório Novos
descartado como ineficaz por outros países7, Caminhos da Alfabetização5,7, solicitado a espe-
possui uma explicação complexa, que perpassa cialistas nacionais e internacionais pela Câmara
conjecturas políticas e ideológicas até proble- dos Deputados e a própria referência ao treino da
mas próprios da formação de professores nas consciência fonológica no relatório publicado pelo
universidades do país. Não se sugere aqui uma MEC, em 20096, intitulado “A criança de 6 anos,
linha de raciocínio simplista de que o método a linguagem escrita e o ensino fundamental de 9
de alfabetização é o único responsável por todos anos”. Além disso, em 2011, ocorreu na cidade de
os problemas educacionais do país. Porém, no São Paulo o “Seminário Internacional de Alfabe-
que tange ao domínio específico da aquisição tização na Perspectiva da Psicologia Cognitiva”,
da linguagem escrita, e com aporte em pes­ contando com importantes e influentes pesquisa-
quisas e nas avaliações de desempenho nacio- dores da área e representantes das Secretarias de
nais e internacionais, é inevitável a conclusão Educação de alguns estados brasileiros.
de que a confluência ‘Construtivismo-método A psicologia cognitiva tem muito a contri-
global’, endossada nos PCN’s3, apenas está buir com a Educação e a Pedagogia. Que estas
conduzindo as crianças brasileiras ao posto de áreas possam dialogar e que a educação possa
incompetentes. se beneficiar das evidências científicas estarão
Se durante a última década a educação cami- subordinados os próximos anos da educação
nhou sem a parceria do conhecimento científico, fundamental brasileira.

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Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz

SUMMARY
Literacy methods: definition of procedures and considerations
for effective practice

The article presents the most widespread literacy methods in the country,
defining them in terms of its three fundamental features, i.e., a) starting
point and course of literacy, delimiting the analytical and synthetic methods;
b) the minimum analysis unit on the relationship between speech and
writing, outlining the global, syllabic and phonic methods; and c) type of
stimulation involved, distinguishing between traditional and multisensory
methods. Brief history is presented on literacy methods, and the global and
the phonics ones are described whit more details. The phonic method’s
main objective is to teach the graphophonemic correspondences and to
develop phonological skills, fostering decoding and encoding skills. The
global method assumes that the learning of written language occurs by the
word visual identification, focusing directly the associations between words
and their meanings. In Brazil, the global method is the most broadcast in
universities and most used in classrooms. In addition, in the country, the
constructivist conception has exerted great influence on literacy practices.
However, national and international researches have questioned the effec­
tiveness of the global method and constructivist conceptions, and revealed
the phonics as the most effective in literacy and, aside multisensory method,
in the intervention with children with reading and writing problems. Re­­
cently, some academic and government initiatives has revealed a possible
oncoming between educational practices and scientific evidence produced
by cognitive psychology. This ‘education-science’ confluence could greatly
benefit the country’s practices in elementary education.

KEY WORDS: Literacy. Learning. Language. Reading.

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Métodos de alfabetização: delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz

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319
Sebra AG & Dias NM

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as Boquinhas – livro do professor. São José as Boquinhas – caderno do aluno. São José
dos Campos:Pulso Editorial;2007. dos Campos:Pulso Editorial;2008.

Trabalho realizado no Programa de Pós-Graduação Artigo recebido: 18/5/2011


em Distúrbios do Desenvolvimento da Universidade Aprovado: 30/7/2011
Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, SP, Brasil.

Rev. Psicopedagogia 2011; 28(87): 306-20

320
2.2
Métodos de alfabetização:
princípios e transformações

Isabel Cristina Alves da Silva Frade

Licenciatura em Pedagogia

FRADE, Isabel Cristina Alves da Silva. Métodos e Didáticas de Alfabetização:


História, Características e Modos de Fazer De Professores. In: FRADE, Isabel
Cristina Alves da Silva. Caderno do Professor. Belo Horizonte: Biblioteca da FAE/
UFMG, 2007. Cap. 1. p. 21-42.

35

6 Multiletramento
cap_2_isabel_prof.qxd 18/8/2005 16:11 Page 21

21

e modos de fazer de professores


Métodos e didáticas de alfabetização: história, características
2 Métodos de alfabetização: princípios e transformações

ATIVIDADE 2

1. Você se lembra do tempo em que foi alfabetizado? Tente fazer um exercício de memória, recu-
perando informações sobre:
u ano em que foi alfabetizado
u tipo de escola: rural ou urbana
u objetos escolares no tempo da alfabetização
u método utilizado pelo professor
u exercícios e procedimentos mais utilizados
u materiais e/ou livros didáticos da época
u rituais de avaliação da alfabetização, envolvendo a demonstração do aprendizado da escrita
u contexto de sala de aula
2. Você tinha experiência prévia com a escrita? Teve oportunidade de freqüentar ou não a
pré-escola?

Lembrar-se de cartilhas ou pré-livros e outros materiais que circulavam em sala de aula,


traz à tona um conjunto de informações sobre as didáticas utilizadas. É possível que quem
foi alfabetizado há mais tempo guarde lembranças nítidas do período de alfabetização,
porque havia uma definição sobre o momento certo do aprendizado, porque os méto-
dos de alfabetização eram mais explícitos, porque a cartilha ou pré-livro eram os
primeiros materiais impressos a que tiveram acesso.

Se formos analisar cada situação de aprendizagem rememorada por vocês, leitores,


vamos perceber coincidências de uso de um mesmo material, numa mesma região ou
Estado, e também o uso simultâneo de métodos diferentes, numa mesma época ou
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22
Métodos de alfabetização: princípios e
transformações

numa mesma escola. Encontraremos também práticas de alfabetização constantes, que


se repetem para vocês, leitores professores de diferentes idades.

A partir deste momento, vamos recuperar uma história dos métodos, pois eles têm uma
história. Nessa história, temos que considerar que vários conhecimentos que domi-
namos na atualidade sobre aspectos da aprendizagem do sistema alfabético/ortográfico
da escrita e dos conteúdos relacionados ao seu uso social não se colocavam para a
Pedagogia. Assim, o pólo da discussão era o método utilizado pelo professor para ensi-
nar. Mas, afinal, o que seriam esses métodos?

Os métodos de alfabetização, considerados historicamente, agrupam-se em métodos


sintéticos e métodos analíticos.

Os métodos sintéticos vão das partes para o todo. Nos métodos sintéticos, temos a
eleição de princípios organizativos diferenciados, que privilegiam as correspondências
fonográficas. Essa tendência compreende o método alfabético, que toma como
unidade a letra; o método fônico, que toma como unidade o fonema; o método silábi-
co, que toma como unidade um segmento fonológico mais facilmente pronunciável,
que é a sílaba. A disputa sobre qual unidade de análise a ser considerada – a letra, o
fonema ou a sílaba –, é que deu o tom das diferenciações em torno das correspondên-
cias fonográficas. Para esse conjunto de métodos denominados sintéticos, propõe-se
um distanciamento da situação de uso e do significado, para a promoção de estratégias
de análise do sistema de escrita.

Os métodos analíticos partem do todo para as partes e procuram romper radicalmente


com o princípio da decifração. São mais conhecidos os métodos global de contos, o de
sentenciação e o de palavração. Está presente nesse movimento metodológico a defesa
do trabalho com sentido, na alfabetização. Assim, esses métodos buscam atuar na com-
preensão, por entenderem que a linguagem escrita deve ser ensinada à criança respei-
tando-se sua percepção global dos fenômenos e da própria língua. São tomados como
unidade de análise a palavra, a frase e o texto. Esses métodos supõem que, baseando-
se no reconhecimento global, como estratégia inicial, os aprendizes podem realizar,
posteriormente, um processo de análise de unidades menores da língua.

2.1. OS MÉTODOS SINTÉTICOS

Algumas pesquisas históricas permitem supor que os primeiros métodos utilizados no


ensino da escrita foram os sintéticos. Vários deles permanecem até os dias atuais. Os
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23

e modos de fazer de professores


Métodos e didáticas de alfabetização: história, características
métodos sintéticos se baseiam num mesmo pressuposto: o de que a compreensão do
sistema de escrita se faz sintetizando/juntando unidades menores, que são analisadas
para estabelecer a relação entre a fala e sua representação escrita, ou seja, a análise
fonológica. Dependendo do método, essas unidades de análise podem ser escolhidas
entre letras, fonemas ou sílabas, que se juntam para formar um todo. A aprendizagem
pelos métodos sintéticos leva à decodificação ou decifração.

2.1.1. MÉTODO ALFABÉTICO

Dentre os métodos sintéticos, o mais antigo, que foi utilizado em massa até o início do
século XX, é o método alfabético. Consistia em apresentar partes mínimas da escrita,
as letras do alfabeto, que, ao se juntarem umas às outras, formavam as sílabas ou partes
que dariam origem às palavras. Os aprendizes, primeiro, deveriam decorar o alfabeto,
letra por letra, para encontrar as partes que formariam a sílaba ou outro segmento da
palavra; somente depois viriam a entender que esses elementos poderiam se transfor-
mar numa palavra. Mais tarde, criou-se o procedimento de soletração, que gerou
exaustivos exercícios de “cantilenas” (cantorias com os nomes das letras e suas combi-
nações) e também o treino com possíveis combinações de letras em silabários. Essas
atividades eram sem sentido, porque demorava-se a chegar ao significado. Imaginem
uma pessoa decorando e cantando combinações (be-a-ba, be-e-be, etc.) e soletrando
para tentar decifrar a palavra bola: “be-o-bo, ele-a-la = bola”.

Pouco sabemos sobre como eram realizadas essas aulas, se os alunos tinham apoio de
material escrito ou se apenas o professor possuía um livro de apoio, e são ainda recentes
as pesquisas sobre essas práticas no Brasil.

Sabemos, hoje, que, a partir do século XIX, quando a escola passa a utilizar o ensino
simultâneo, em que se formavam classes ou séries que estudavam o mesmo conteúdo
ao mesmo tempo e no mesmo lugar, houve a necessidade de produção de material
didático para “padronizar” os procedimentos. Tem-se notícia de alguns materiais anti-
gos usados para auxiliar o processo de aprendizagem. Um material que pode ser cita-
do, que coincide com o uso do método alfabético, são as Cartas de ABC e os silabários.
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24
Métodos de alfabetização: princípios e
transformações

ABC da Infância: primeira coleção de cartas para aprender a ler. 107 ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1956.

O método alfabético trazia uma vantagem: o próprio nome de cada letra do alfabeto
(com algumas exceções) remete a pelo menos um dos fonemas que ela representa na
escrita. Entretanto, no momento de leitura das palavras, na junção das partes feita
mediante a pronúncia do nome da letra, ocorria um percurso tortuoso. Era preciso
pronunciar primeiro o nome da letra, mas também tentar abstrair os outros sons exis-
tentes em seu nome. Isso era necessário porque, ao se pronunciar o nome da letra,
entravam sons que não pertenciam à sílaba ou à palavra. Tente imaginar a abstração
necessária ao aprendiz, para retirar o excesso de sons na palavra que se soletra assim:
“bê-a-ba, ene-a-na, ene-a-na = banana”. Talvez por isso tenham sido criados outros
alfabetos, como o alfabeto popular de regiões do nordeste: a, bê, cê, dê, ê, fê... lê, mê,
nê, etc., que ajudam a eliminar algumas sobras de sons, na hora da junção de letras.
Assim, se poderia soletrar, com menos sacrifício: “bê-a-ba, nê-a-na, nê-a-na = banana”.
Esse alfabeto é explorado, por exemplo, em letras de músicas:
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Métodos e didáticas de alfabetização: história, características
ABC DO SERTÃO
Zé Dantas / Luiz Gonzaga

Lá no meu sertão pros caboclo lê


Têm que aprender um outro ABC
O jota é ji, o éle é lê
O ésse é si, mas o erre
Tem nome de rê
Até o ypsilon lá é pssilone
O eme é mê, o ene é nê
O efe é fê, o gê chama-se guê
Na escola é engraçado ouvir-se tanto “ê”
A, bê, cê, dê,
Fê, guê, lê, mê,
Nê, pê, quê, rê,
Tê, vê e zê.
Letra da música ABC do Sertão, de José Dantas e Luiz Gonzaga.

2.1.2. MÉTODO FÔNICO

Outro método sintético é o fônico, cujo princípio é de que é preciso ensinar as relações
entre sons e letras, para que se relacione a palavra falada com a escrita. Dessa forma, a
unidade mínima de análise é o som.

Segundo Braslavsky (1988), no método fônico começa-se ensinando a forma e o som


das vogais. Depois ensinam-se as consoantes, estabelecendo entre consoantes e vogais
relações cada vez mais complexas. Cada letra é aprendida como um som que, junto a
outro som, pode formar sílabas e palavras. Para o ensino dos sons, há uma seqüência
que deve ser respeitada, indo-se de relações diretas entre fonemas e grafemas para
relações mais complexas. Na organização do ensino, a aprendizagem da relação fone-
ma/grafema é o principal objetivo.

O sistema de escrita do português representa unidades


abstratas do sistema fonológico – os fonemas – por letras ou
conjuntos de letras – os grafemas. Por exemplo, o fonema / g
/, de galo, guerra, guia, gola, agulha, é representado pelos
grafemas g (em gato, gola e agulha) e gu (em guerra e guia).
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Métodos de alfabetização: princípios e
transformações

Veja mais sobre as relações entre fonemas e grafemas no


Caderno “Conhecimento lingüístico e apropriação do sistema
de escrita”, que faz parte dos Módulos 1 e 2 deste Programa
de Formação Continuada.

O método fônico traz uma vantagem. Nos casos em que realmente há uma correspondên-
cia direta entre um fonema e sua representação escrita, os aprendizes vão decifrar rapida-
mente, desde que entendam essa relação e decorem as correspondências. Os casos de
correspondência direta entre fonemas e letras descritos por Lemle (1991) são: p e b, v
e f, t e d. Cada uma dessas letras sempre representa o mesmo fonema e só representa
esse fonema (e mais nenhum outro). Por isso, não oferece maior dificuldade para a
decodificação e a codificação.

No entanto, existem alguns problemas. Há variações dialetais na pronúncia das


palavras e, mesmo assim, elas são escritas de forma estável. Por exemplo: a palavra
tomate, escrita com o e e, é pronunciada como [tumatSi] (“tumatchi”) em algumas
regiões do Brasil. Outro problema é que algumas letras podem representar diversos
fonemas, segundo sua posição na palavra: a letra s, por exemplo, corresponde a diferentes
fonemas, conforme apareça no começo da palavra (sapato, semente, sílaba, sorte,
susto) ou entre vogais (casa, pose, música, pouso, usual). Além disso, um fonema pode
ser representado por várias letras: o fonema / s / por ser representado pela letra s
(sapeca), pela letra c (cenoura), pela letra ç (laço), pelo dígrafo ss (assar), pelo dígrafo
sc (descer), pelo dígrafo xc (excelente). O princípio de relação direta da fala com a
escrita não se aplica, então, à maioria dos casos. Por isso temos a ortografia e diversas
convenções para estabilizar essas diferenças de representação.

Outro problema identificado é que a consoante não é pronunciável sem o apoio de


uma vogal. É por isso que, ao se ensinar o fonema / f /, por exemplo, era preciso pro-
nunciá-lo com o apoio de uma vogal, que ficava meio escondida na emissão sonora,
para que pudesse se materializar o “som”: [ fe ] (“fê”).

As relações entre fala e escrita e outras questões rela-


cionadas a essa são estudadas no Caderno “Conhecimento
lingüístico e apropriação do sistema de escrita”, dos Módulos
1 e 2 deste Programa de Formação Continuada.

Para atenuar esses problemas e aproximar os alunos de algum significado é que foram
criadas variações do método fônico. O que difere uma modalidade da outra é a
maneira de apresentar os fonemas: a partir de uma palavra significativa, de uma palavra
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e modos de fazer de professores


Métodos e didáticas de alfabetização: história, características
vinculada a uma imagem que buscava representar a letra associando-a a um som (por exem-
plo, o desenho de uma mangueira jorrando água, que tinha o formado da letra J), de um per-
sonagem associado a um som, de uma história para dar sentido à apresentação dos fonemas.

Citando Gray, Berta Braslavsky (1988) apresenta algumas variantes propostas para des-
pertar o interesse nessa aprendizagem, tais como a onomatopéica, que parte de figuras
de animais ou pessoas produzindo determinados sons e as “palavras-chave”, nas quais
se presta atenção ao som inicial. Nessa perspectiva, parte-se da percepção visual para
associá-la a um som. Mas há variantes que partem de um caminho inverso, começan-
do pela percepção auditiva para depois codificar cada som mediante uma letra.

Aplicações mais recentes do método fônico continuam propondo como atividade ini-
cial a apresentação das vogais e, depois, a das consoantes, indicando blocos de ativi-
dades específicos a serem seguidos após a apresentação de um e de outro grupo: iden-
tificação das letras e repetição de seu nome e do seu som característico; identificação
de fonemas em palavras ditas pelo professor ou criação de palavra a partir de um som;
ênfase nos sons correspondentes a figuras com letra inicial destacada; identificação de
som final e som inicial e também discriminação entre sons diferentes. Assim, os alunos
identificam o som, pensam na letra que o representa e acham a palavra que começa
com o mesmo som. De qualquer modo, permanece a preocupação primordial em tra-
balhar os sons e as letras, numa ordem determinada pela complexidade da relação entre
fonemas e grafemas no sistema de escrita.

2.1.3. MÉTODO SILÁBICO

Um outro método de marcha sintética, que vai das partes para o todo, é o da silabação.
No método silábico, a principal unidade a ser analisada pelos alunos é a sílaba. No
entanto, em várias cartilhas, o trabalho inicial centra-se nas vogais e seus encontros,
como uma das condições para a sistematização posterior das sílabas.

No desenvolvimento do método, geralmente é escolhida uma ordem de apresentação,


feita segundo princípios calcados na idéia “do mais fácil para o mais difícil”, ou seja,
das sílabas “simples” para as “complexas”. São apresentadas palavras-chave, utilizadas
apenas para indicar as sílabas, que são destacadas das palavras e estudadas sistematica-
mente em famílias silábicas. Estas são recompostas para formar novas palavras. O
método permite que se formem novas palavras apenas com as sílabas já apresentadas e
formam-se, gradativamente, pequenas frases e textos, forjados para mostrar apenas as
combinações entre sílabas já estudadas.
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Métodos de alfabetização: princípios e
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Veja o exemplo de uma lição da página 24 da cartilha Caminho Suave, de Branca Alves
de Lima, na qual a preocupação com a sílaba a ser ensinada é maior que a preocupação
com o sentido do texto.

LIMA, Branca Alves de. Caminho Suave. 76ªed., São Paulo: Editora Caminho Suave, 1974.
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e modos de fazer de professores


Métodos e didáticas de alfabetização: história, características
Nem sempre os métodos são concretizados da mesma forma: há cartilhas mais antigas,
como a Cartilha Sodré, por exemplo, publicada na década de 40 do século passado, que
apresenta mais de uma sílaba em cada lição, escolhe sílabas com uma mesma vogal, e
parece não se prender à mesma ordem de sílabas apresentadas nos métodos silábicos de
cartilhas na década de 70/80. A cartilha Sodré tem, no entanto, em comum com as
outras, a apresentação de textos cujo sentido é dependente da composição de sílabas a
serem ensinadas.

Exemplo de lição da Cartilha Sodré, de Stahl Sodré, página 9.

SODRÉ, Benedita Stahl. Cartilha Sodré. 230ªed., São Paulo: Cia Ed. Nacional, 1965.

O método silábico tem uma vantagem: ao se trabalhar com a unidade sílaba, atende-
se a um princípio importante e facilitador da aprendizagem: quando falamos, pronun-
ciamos sílabas e não sons separados. Assim, suprime-se a etapa tortuosa pela qual o
aluno passa ao tentar transformar letras ou fonemas em sílabas, como no método de
soletração (alfabético) ou no fônico. Além disso, o método silábico se presta bem a um
trabalho com determinadas sílabas às quais não se aplica o princípio de relação direta
entre fonema e grafema. Existem várias sílabas que comportam mais letras do que os
sons que pronunciamos: na representação da nasalidade, em algumas palavras, escreve-
mos as letras n ou m sem que elas correspondam a algum som (canto, campo); nos
dígrafos, usamos duas letras para representar um único som (chuva, carro, excelente,
gueto, brinquedo).
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Métodos de alfabetização: princípios e
transformações

No entanto, a complexidade é organizada do ponto de vista do adulto e, às vezes, sem


uma precisão conceitual sobre o que torna a sílaba mais fácil ou difícil. Seria sua fre-
qüência maior no Português? Seria sua regularidade na relação fonema/grafema? Seria
o padrão silábico consoante + vogal, que é o mais freqüente do português? Um exem-
plo claro de equívoco sobre o que é mais fácil para a criança é iniciar o trabalho nos
métodos silábicos com a apresentação das vogais, seguidas dos “encontros vocálicos”.
Acontece que as sílabas compostas por uma vogal ou por encontro vocálico, como não
coincidem com o padrão mais freqüente do português, podem ser de difícil apreensão
pelos alunos. Por outro lado, uma sílaba que os autores de cartilha considerem com-
plexa, tal como, o “tra” da palavra trator, pode ser de fácil apreensão, porque é muito
utilizada em palavras que os alunos conhecem.

Outro problema que geralmente aparece na organização dos métodos silábicos é que
os textos “fabricados” para treino das sílabas são artificiais, muitas vezes sem sentido e
descolados de qualquer uso social. Esses métodos, no entanto, em seu conjunto, abor-
dam uma dimensão importante e necessária para o aprendizado da escrita: a análise das
relações entre unidades sonoras e grafemas (“letras” ou grupos de letras).

Em síntese, os métodos que seguem a marcha sintética (das partes para o todo, da
análise para a síntese) e que demonstram rigidez no controle das aprendizagens tendem
a priorizar apenas a decodificação, ou seja, a análise fonológica, com pouca ênfase no
sentido dos textos e no uso social da escrita.

Devemos também compreender que são complexas as relações entre os métodos, com
seus princípios gerais, e as apropriações pedagógicas desses princípios. Assim, como já
foi dito, há variações em torno do método fônico, por exemplo, quando se criam gestos
para auxiliar na memorização dos fonemas (daí a expressão método fônico-gestual).

A respeito das classificações dos métodos, é bom ressaltar que o caráter político da alfa-
betização, o contexto de aplicação, a escolha do universo vocabular, entre outros
fatores, podem dar a um método um significado muito mais amplo, que extrapola a
simples escolha por um ou outro princípio. Um exemplo é o chamado “método Paulo
Freire”, de caráter silábico, mas que prioriza o sentido e a compreensão crítica do
mundo, por meio da escolha das palavras a serem trabalhadas, eliminando, portanto,
o controle artificial do vocabulário. A partir da chamada palavra geradora é que são
analisadas e sistematizadas as famílias silábicas. Dessa forma, podemos dizer que uma
pedagogia de alfabetização baseada nas idéias de Paulo Freire utiliza procedimentos dos
métodos sintéticos e analíticos. Ele mesmo afirmou que não inventou um novo méto-
do e classificou seu trabalho como método eclético, conforme Soares (2003). Sua apro-
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e modos de fazer de professores


Métodos e didáticas de alfabetização: história, características
priação foge de princípios rígidos e rompe com a mera decodificação porque, em sua
base teórica, visa à discussão política, pelos analfabetos oprimidos, de suas necessidades
e projetos de transformação da sociedade.

Os métodos ecléticos ou mistos não foram tratados sistemati-


camente neste texto e são pouco trabalhados na bibliografia
sobre o tema, uma vez que, para alguns teóricos, eles não
constituem um novo método, mas apresentam algumas carac-
terísticas de diferentes métodos, tais como a de trabalhar
simultaneamente a análise e a síntese ou de trabalhar várias
unidades de análise sem se preocupar com um tempo rígido
para cada fase.

Reproduzimos a seguir um trecho do romance Quarup, de Antonio Callado, no qual se


retrata um trabalho com alfabetização, possivelmente inspirado no método Paulo Freire.

“... A salinha escura. O projetor jorrando luz na parede caiada, na mão de


Francisca que mudava um slide, no cabelo de Francisca. A luz do projetor de
volta para a parede acendendo a cara dos camponeses. Repetindo por fora o
trabalho de escultura que as palavras faziam por dentro.
– Cla. Disse o camponês.
– Classe, clamor, disse Francisca.
– Cle.
– Clemência.
– Clima.
– Clu.
– Clube.
Francisca tirou um slide de fora da série. A palavra de duas letras mas grande
na parede. Vários camponeses leram juntos:
– Eu.
Outro slide e disseram:
– Re.
– Pensem em classe e clamor – disse Francisca enquanto colocava o slide com
o pronome e o verbo.
– Eu re – disse um camponês.
– Eu remo – disse um outro.
– Eu clamo – disse o outro.
– Eu sei professora, eu sei Dona Francisca. EU RECLAMO!
Mesmo agora, já habituado a assistir e a ensinar ele próprio, Nando sentia os
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Métodos de alfabetização: princípios e
transformações

olhos cheios d’água quando diante de um camponês uma coisa ou ação virava
palavra. A criança tantas vezes vai fazer a coisa a comando da palavra. Para
aqueles camponeses tudo já existia, menos a palavra.
– De – disse um camponês.
– Cla – disseram todos.
– Ra – disse um camponês.
– Declaração! Disse outro.
Como se visse entrar num alçapão um pássaro palpitante, pensou Nando. E lem-
brou dos possantes dentes alvos e quadrados do padre Gonçalo quando riu da
emoção de Nando ao assistir sua primeira aula. “É o porre do verbo, Seu Nando”.
– Reclamar vocês todos sabem o que é – disse Francisca.
Os camponeses riram.”
CALLADO, A. Quarup. Rio de Janeiro/São Paulo. Editora Record. 1996 (1ª ed. 1967). p. 383-384.

2.2. OS MÉTODOS ANALÍTICOS

Seguindo nosso percurso na discussão, voltaremos o pêndulo para os métodos analíti-


cos, que partem da síntese para a análise, do todo para as partes. Os métodos globais
trabalham com diversos pressupostos, que podem ser verificados nas discussões sobre
sua utilização, desde Comênio até a atualidade.

Comênio (1593-1670) foi o fundador da didática moderna e


propôs várias idéias revolucionárias sobre a importância do
interesse dos alunos na aprendizagem. Era contra a memo-
rização vazia e a favor da compreensão e combateu o méto-
do da soletração em sua obra Orbis Pictus.

Em cada momento histórico, com as respectivas teorias existentes sobre a aprendiza-


gem, sobre o ensino e sobre a linguagem, é possível verificar pontos comuns entre os
defensores dos métodos analíticos:
u a linguagem funciona como um todo;
u existe um princípio de sincretismo no pensamento infantil: primeiro percebe-se o todo
para depois se observar as partes;
u os métodos de alfabetização devem priorizar a compreensão;
u no ato da leitura, o leitor se utiliza de estratégias globais de reconhecimento;
u o aprendizado da escrita não pode ser feito por fragmentos de palavras, mas por seu sig-
nificado, que é muito importante para o aprendiz;
u a escola tem que acompanhar os interesses, a linguagem e o universo infantil e, portanto, as
palavras percebidas globalmente também devem ser familiares e ter valor afetivo para a criança.
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e modos de fazer de professores


Métodos e didáticas de alfabetização: história, características
Vemos, então, por que os métodos analíticos priorizam como unidade a palavra, a frase
ou o texto.

2.2.1. MÉTODO DE PALAVRAÇÃO E MÉTODO DE SENTENCIAÇÃO

Com ênfase na palavra, temos o método denominado palavração.

Nesse método, apresenta-se uma palavra que, posteriormente, é decomposta em


sílabas. Você pode estar se perguntando: não é o mesmo processo do método silábico?
A diferença desse método em relação ao silábico é que as palavras não são decompostas
obrigatoriamente no início do processo, são apreendidas globalmente e por reconheci-
mento. A escolha de palavras também não obedece ao princípio do mais fácil ao mais
difícil. São apresentadas independentemente de suas regularidades ortográficas. O
importante é que tenham significado para os alunos.

Para Gilda Rizzo Soares (1986), Comênio é apontado como o introdutor do método
da palavração. Nesse método, as palavras são apresentadas em agrupamentos e os
alunos aprendem a reconhecê-las pela visualização e pela configuração gráfica. Os
defensores dessa memorização pelo perfil gráfico acreditavam ser essa estratégia cogni-
tiva algo “natural” no ser humano. Em suas aplicações, as figuras podem acompanhar
as palavras, no início do processo, e a repetição garante a memorização. Ao mesmo
tempo em que são incentivadas estratégias de leitura inteligente, a atenção do aluno
pode ser dirigida a componentes da palavra escrita ou falada, como letras, sílabas e
sons. Essas duas estratégias reunidas garantiriam o enfrentamento de textos novos.

Para o desenvolvimento de atividades, são utilizados cartões para fixação, com palavras
de um lado e gravuras de outro, exercícios cinestésicos para o ensino do movimento de
escrita de cada palavra, entre outros recursos e procedimentos.

A ênfase no significado e em ações inteligentes de busca de leitura como fonte de prazer


e informação e a crença na ligação entre a percepção de idéias e formas na aprendiza-
gem são destacadas, por alguns autores, como vantagens desse método. Como princi-
pais desvantagens, aparecem as dificuldades em enfrentar palavras novas, quando os
professores se limitam à simples visualização, sem incentivar a análise e o reconheci-
mento de partes da palavra.

Um segundo desdobramento do princípio global levou à criação do método de senten-


ciação. Temos poucos dados para precisar a época de sua primeira divulgação. Nesse
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Métodos de alfabetização: princípios e
transformações

método, a unidade é a sentença que, depois de reconhecida globalmente e compreendi-


da, será decomposta em palavras e, finalmente, em sílabas. Um outro procedimento
descrito na história desse método, segundo Gilda Rizzo Soares (1986), é a estratégia de
comparar palavras e isolar nelas elementos conhecidos, para ler e escrever palavras novas.

Braslavsky (2004) descreve o método da frase, que parece ter um sentido similar ao méto-
do de sentenciação, destacando que se faz nele o uso de um grupo de palavras com sen-
tido desde o começo da alfabetização. Segundo a autora, o ponto de partida são ativi-
dades de expressão oral das crianças, cujos enunciados são transformados em orações
simples e escritos em faixas de distintos tamanhos, exibidas na sala de aula para que as
crianças possam ilustrá-las, conservando-as numa certa ordem. Essas frases podem depois
ser consultadas para que as crianças encontrem nelas novas palavras e combinações.

Há poucas informações sobre suas aplicações no Brasil e podemos dizer que a abor-
dagem das sentenças precisa ser mais bem investigada. Em linhas gerais, são elencadas
duas vantagens: a de se trabalhar com a frase, considerada, de acordo com as teorias gra-
maticais vigentes na época, como a unidade mais completa da língua; e a de se enfati-
zar um tipo de leitura que pode utilizar pistas do contexto para a compreensão. Como
desvantagem, aparece a mesma citada quanto ao método de palavração: o perigo de se
gastar muito tempo com a memorização e de se dar pouca atenção à análise de palavras.

2.2.2. MÉTODO GLOBAL DE CONTOS

Mais tardio, do ponto de vista histórico, é o aparecimento e utilização do método global de


contos ou de historietas. Nesse método, a unidade tomada como ponto de partida é o texto.

Houve a divulgação dos métodos globais em vários estados brasileiros, como Rio
Grande do Sul, São Paulo e Minas Gerais. Em Minas Gerais, por exemplo, sabemos
que houve, nas primeiras décadas do século XX, a adesão oficial ao método global de
contos ou de historietas.

Para o trabalho com os métodos globais, eram produzidos os chamados pré-livros.


Neles, tanto poderia ser utilizado um texto já conhecido de antemão (como foi o caso
do pré-livro As mais belas histórias, de Lúcia Casasanta) ou um texto desconhecido, em
que cada lição é um conto completo, mesmo que os personagens do livro reapare-
cessem em diversos contos. O Livro de Lili, de Anita Fonseca, utilizado em vários esta-
dos brasileiros, é exemplar dessa forma de organização. No mesmo modelo, foi pro-
duzido, no Rio Grande do Sul, o livro Sarita e seus Amiguinhos, de Cecy Thofehrn e
Jandira Szechir, segundo Eliane Peres e Gilceane Porto (2004). Abaixo, capas de dois
pré-livros.
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e modos de fazer de professores


Métodos e didáticas de alfabetização: história, características
FONSECA, Anita. O Livro de Lili. Cartilha. 87ªed., São Paulo: THOFEHRN, Cecy Cordeiro; SZECHIR, Jandira Cardias. Sarita e
Editora do Brasil, 1961. seus Amiguinhos. s/ed. São Paulo: Editora do Brasil, 1953.

A marcha seguida, então, com algumas variações, parte do reconhecimento global de


um texto que é memorizado e “lido” durante um período, para o reconhecimento de
sentenças, seguido do reconhecimento de expressões (porções de sentido), de palavras
e, finalmente, de sílabas. Aqui, não estamos falando de um processo seqüencial e
simultâneo entre essas fases. Tomando como foco o sentido, o professor encaminhava
o processo utilizando-se, por um período, de textos completos das várias lições
seguidas. Somente após esse convívio maior com o texto é que viria uma forma de
decomposição, mas com o cuidado de fragmentá-lo em parcelas maiores: primeiro a sen-
tença, depois a palavra. Assim, se um livro constava de 10 lições, recomendava-se que só
após a 4a lição, por exemplo, é que se fizesse a fragmentação em sentenças da primeira
lição aprendida. Quando se estava na 6a lição é que se fazia a palavração da 1a lição, e
assim por diante. Esse movimento mostra que havia um cuidado em não se chegar, de
forma abrupta, a unidades menores, que poderiam ficar sem sentido para os alunos.
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Métodos de alfabetização: princípios e
transformações

Na divulgação dos métodos globais em outros países, nem sempre se pensou em ado-
tar o procedimento de escolha anterior de textos ou de um livro, o que gerou muitas
resistências dos professores e a demanda para que se produzissem materiais de apoio,
para uso em sala de aula. Isso aconteceu na França, por exemplo (CHARTIER E
HÉBRARD, 2001), e também no Brasil. O caso de Minas Gerais é emblemático: logo
que o método global foi divulgado no Estado, houve a demanda dos professores para
um direcionamento maior do seu trabalho, o que gerou a produção de pré-livros e car-
tazes como material de apoio.

No Brasil, os métodos globais que foram descritos até o momento apoiaram-se em mate-
riais impressos para serem usados como livros didáticos e não deixam de apresentar uma
progressão em termos de sua apresentação e análise. Os textos não apresentavam proble-
mas de simplificação na escolha das palavras, mas os autores procuravam contemplar os
principais casos de regularidade e irregularidade do sistema ortográfico do Português. No
entanto, mesmo defendendo a concepção de linguagem como um fenômeno global, os
textos dos livros ainda não manifestam a mesma linguagem presente em textos autênti-
cos, como o das histórias infantis. Reproduzimos, como exemplo, uma lição de O livro
de Lili, de Anita Fonseca, que apresenta a personagem com um modelo de texto pouco
usual, em que se observa certa desarticulação entre as frases que o compõem.

FONSECA, Anita. O Livro de Lili. Cartilha. 87ª ed., São Paulo: Editora do Brasil, 1961.
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e modos de fazer de professores


Métodos e didáticas de alfabetização: história, características
A seguir, trazemos um texto do livro As mais belas histórias, de Lúcia Casasanta, que se
aproxima da estrutura narrativa típica dos textos autênticos de histórias infantis, com
os verbos conjugados no pretérito e a presença do articulador mas. No entanto, no
todo do livro, aparecem também, como no Livro de Lili, textos que ficam no meio do
caminho entre a narrativa e a descrição, com os verbos no tempo presente.

CASASANTA, Lucia Monteiro. As mais belas historias – pré-livro. 209ª ed. Belo Horizonte: Editora do Brasil em MG, s/d.

Os métodos globais têm uma vantagem. A linguagem é apresentada de uma maneira


que se aproxima mais do uso efetivo do que nos outros métodos, porque não se disso-
cia a forma do significado. Apesar do tom artificial de alguns textos e mesmo quando
se elege a organização por palavra ou sentença, a criança tem acesso a uma significação,
podendo “ler” palavras, sentenças ou textos desde a primeira lição, por reconhecimen-
to global. Supõe-se que, assim, mantém-se o interesse desde o início do processo de
aprendizagem da leitura e da escrita. Esse tipo de leitura, com foco na memorização
global, possibilita que os alunos não se percam na tentativa de decodificação e que
leiam com rapidez palavras conhecidas. Contudo, há também desvantagens. Se os
alunos não aprenderem a decodificar, como lerão palavras novas? Como o professor pode
saber se os alunos estão realmente lendo ou recitando palavras e textos decorados?

Em síntese, poderíamos dizer que os métodos globais, tal como foram popularizados,
seguem a marcha analítica (do todo para as partes, da síntese para a análise), pretendem
priorizar o sentido e estabelecem algum tipo de progressão na fragmentação das unidades
que serão analisadas. Essa progressão também define a intervenção do professor.
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Métodos de alfabetização: princípios e
transformações

2.2.3. MÉTODO NATURAL E MÉTODO DE IMERSÃO

Para alguns autores, segundo Gilda Rizzo Soares (1986), há relações entre o método
global e o método natural, apesar de algumas diferenças: no segundo, haveria uma pro-
dução “espontânea” de textos, escritos pelas crianças com base num repertório mínimo
de palavras conhecidas pela classe. A esse repertório que a classe dominava, como
alguns substantivos e verbos, poderiam ser acrescentados, no meio do texto, alguns
desenhos para ajudar a complementar a escrita. A partir daí seria desencadeado um
método natural de aprendizagem da leitura.

Modelo de exercício apresentado em SOARES, Gilda Rizzo. Estudo comparativo dos métodos de ensino da leitura e da escrita. 4 ed. Rio de
Janeiro: Papelaria América Editora, 1986. p. 41.

Para Anne Marie Chartier e Jean Hébrard (2001), o método natural utilizado pelo
pedagogo francês Freinet e assumido por ele como uma adesão ao método global de
leitura teria como foco a produção escrita. Na tarefa de escrever, a criança teria neces-
sidade de solicitar a um adulto um modelo gráfico das palavras. Para ele, a vontade de
escrever da criança seria mantida pelo incentivo de que ela se comunicasse à distância.
A leitura, assim, seria conseqüência da escrita. O papel do adulto seria informar, quan-
do necessário, as formas escritas que trouxessem dificuldade para as crianças, impedin-
do-as de se ocupar do significado do texto. Acreditava-se que, à medida que elas fos-
sem escrevendo, gravariam a forma global das palavras e que estariam também atentas
à decodificação, em fase posterior. Por essa razão, a produção de uma imprensa
pedagógica tem centralidade no método natural de Freinet. Nessa pedagogia, as cri-
anças escrevem porque é preciso realizar um jornal escolar e trocar correspondências e
não apenas para cumprir uma atividade escolar, escrevendo para pessoas que estão pre-
sentes. Percebe-se, assim, que a produção de textos visava cumprir uma função social.
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e modos de fazer de professores


Métodos e didáticas de alfabetização: história, características
Na apropriação feita pelos professores franceses, o método natural sofreu algumas alterações:
após discussões livres, os professores encaminhavam com a classe a escrita de uma frase ou
texto lidos e copiados no caderno. O texto era transformado em letra script e depois
impresso com a escolha dos alunos “tipógrafos do dia”. Esse texto era conservado na versão
copiada e impressa, impresso em cartolina e cortado em tiras para ser remontado.

A questão da decodificação só se tornava necessária em determinada época do ano, na


qual os alunos trocavam arquivos entre salas e era necessário ler palavras novas. O pro-
fessor intervinha com comparação entre as palavras novas e as memorizadas, propon-
do a análise em forma de jogo. Com o tempo, constatou-se que a correspondência e a
imprensa nas escolas tornaram-se atividades mais esporádicas e os princípios defendi-
dos por Freinet foram abandonados.

Na França, esse método chega ao auge em 1960 e modifica-se quando o fracasso esco-
lar obriga a um movimento de volta aos métodos mistos. No Brasil, há poucas infor-
mações sobre sua aplicação e destaca-se o trabalho de Gilda Rizzo Soares, já citado, que
foi uma de suas divulgadoras.

O trabalho de alfabetização hoje denominado de imersão segue um princípio parecido


com o do método natural, privilegiando a escrita e a leitura quando essas se fazem
necessárias nas situações de uso. As atividades de alfabetização são aquelas em que são
necessárias ações autênticas em torno dos atos de ler e escrever, porque se acredita que
as crianças aprendem a ler e a escrever lendo e escrevendo textos, em situações de uso
da escrita, sem muita diretividade. Um risco que se corre, quando os professores não
fazem intervenções pertinentes no processo de uso _ para informar e apresentar situ-
ações problema centradas na análise do sistema de escrita – é que se caia num espon-
taneísmo que prejudica a função inalienável da escola: a de ensinar.

Assim como vimos que aconteceu na França, também no Brasil a oscilação entre méto-
dos se faz presente. Na história da divulgação e aplicação dos métodos em nosso país,
constatamos que, em determinados momentos, adotam-se métodos oficiais que vêm
romper completamente com os adotados antes. Por exemplo, em Minas Gerais, após
anos de indicação oficial do método global, temos, nos anos 70, a introdução do pro-
jeto Alfa para classes com dificuldades de aprendizagem, nas quais se adota o método
fônico. Até hoje, muitos professores permanecem com métodos sintéticos ou aderem a
métodos mistos. Muitos se fixam também no método global, sobretudo quando são
bem sucedidos e aplicam bem os princípios dessa tendência.
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Métodos de alfabetização: princípios e
transformações

2.3. O CONSTRUTIVISMO: UMA CONCEPÇÃO DE APRENDIZAGEM OU UMA PEDA-


GOGIA DE ALFABETIZAÇÃO?

O construtivismo, como teoria psicológica aplicada à compreensão do percurso viven-


ciado pela criança na tentativa de compreender como a escrita funciona, foi-nos apre-
sentado por Emília Ferreiro e Ana Teberosky na década de 1980. No livro intitulado
“A psicogênese da língua escrita”, as autoras propõem uma inversão na discussão: mais
do que pensar em métodos, é preciso compreender os processos de aprendizagem da
criança ao tentar reconstruir a representação do sistema alfabético. Assim, o que as
autoras apresentam é uma descrição do processo evolutivo da escrita da criança.

Para maior aprofundamento, consulte as referências à abor-


dagem da psicogênese da aquisição da escrita nos Cadernos
“Alfabetização e letramento” e “A aprendizagem e o ensino da
língua escrita”, que fazem parte deste Módulo.

Interpretando os desdobramentos dessa teoria, podem-se ressaltar alguns princípios


básicos que levariam o professor a ter outra postura perante o aluno. O aprendiz é visto
como um sujeito que:
u tem acesso à escrita na sociedade antes de passar por um processo sistemático de ensino na
escola;
u tem um processo lógico de pensamento, de modo que cada “erro” de escrita que produz
indica uma hipótese sobre o conteúdo do sistema alfabético de escrita;
u constrói conhecimentos em situação espontânea, desde que conviva com o sistema de
escrita e obtenha algumas informações sobre seu funcionamento.

Partindo desses princípios, a escola precisa compreender que:


u um método ou uma única direção não é determinante da aprendizagem e que é preciso
considerar o processo do aprendiz;
u o contexto escolar deve propiciar a experimentação em torno da escrita, sem provocar nos
alunos o medo de avaliação de “erros”;
u o material usado na escola deve ser aquele que representa a diversidade de uso da escrita
existente na sociedade;
u é necessário, antes de iniciar o ensino e durante o processo, saber em que nível de com-
preensão da escrita o aluno se encontra;
u para acompanhar o processo de aprendizagem, é importante que a escola construa instru-
mentos que permitam ao aluno expressar, sem medo, o que sabe;
u é fundamental que o professor conheça as teorias sobre o “como se aprende” para interpre-
tar os resultados apresentados pelos alunos;
u a escrita e a leitura devem ser aprendidas em uso social.
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e modos de fazer de professores


Métodos e didáticas de alfabetização: história, características
Produção de uma criança de 5 anos

Um ponto que precisa ser ressaltado é que o construtivismo de Emília Ferreiro é uma teo-
ria psicolingüística (que explicita como os aprendizes organizam psicologicamente a apren-
dizagem de um conteúdo de escrita) e não uma teoria pedagógica sobre como ensinar. No
entanto, mesmo que as práticas dos professores construtivistas ainda não estejam devida-
mente organizadas para configurar um método pedagógico, o chamado construtivismo
parece adotar princípios gerais dos métodos natural e de imersão, embora reconhecendo a
necessidade de abordar unidades menores de análise, como a letra, o fonema ou a sílaba.

Em texto no qual discutem o que recuperam dos métodos diretos e dos métodos de
imersão (também chamados de “linguagem integral”), Ana Teberosky e Teresa
Colomer (2003) afirmam que:

“... o enfoque construtivista compartilha com a linguagem integral o objetivo


de fazer com que as crianças entrem no mundo do texto escrito e da cultura
escrita. Ainda que suas propostas sejam diferentes, compartilha com o ensino
direto a necessidade de compreender o funcionamento do sistema. Para o
enfoque construtivista, facilitar o processo de compreensão da natureza do sistema –
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Métodos de alfabetização: princípios e
transformações

e, portanto, a análise de palavras em fonemas – e facilitar a participação em


atividades de escrita são objetivos complementares, não sucessivos, como susten-
ta o ensino direto, nem tampouco alternativos, como sustenta a linguagem inte-
gral, e ambos podem realizar-se conjuntamente na mesma aula” (p. 98)

Temos também novas demandas e descobertas que levam os professores a eleger novas
estratégias para a alfabetização. É o que veremos no próximo tópico.

2.4. ATIVIDADES DE SÍNTESE DA DISCUSSÃO CONCEITUAL

ATIVIDADE 3

1. Numere a segunda coluna, de acordo com a primeira, identificando as idéias-chave contidas


nos métodos:
(1) Método alfabético ( ) elege como unidade o fonema, ressaltando as
relações diretas entre a cadeia sonora e a repre-
sentação escrita.
(2) Método fônico
( ) prioriza o ensino do alfabeto e a identificação de
letra por letra para o reconhecimento de sílabas
(3) Método silábico e palavras.
( ) toma como unidade mínima as sílabas e as reor-
ganiza para compor novas palavras.
(4) Método global de contos ( ) elege como unidade o texto, por considerá-lo
uma unidade que leva à compreensão.

2. Complete o quadro abaixo para sistematização das discussões feitas até aqui.

Métodos Unidade Princípio que Marcha/ Capacidade Natureza da inter-


prioriza organização priorizada venção pedagógica
que se consolidou
Alfabético Alfabeto (grafema) Relação do nome da Sintética Decodificação/ Foco:
letra com o som que análise fonológica controle/
ela representa seqüência/
diretivismo

Fônico

Silábico

Palavração

Sentenciação

Global de contos ou
de historietas

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