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Alfabetização
1 - Método Silábico
Posicionado no grupo dos métodos sintéticos, que se
organizam das partes para o todo, o método silábico se
caracteriza pela apresentação visual de sílabas prontas,
sem forçar a articulação das consoantes com as vogais, e
sem destacar as partes que compõem a sílaba.
O princípio básico é que a consoante só pode ser emitida se
apoiada na vogal; logo, somente a sílaba (e não as letras)
pode servir como unidade linguística para o ensino inicial da
leitura.
No desenvolvimento do método, geralmente é escolhida uma
ordem de apresentação “do mais fácil para o mais difícil”,
ou seja, das sílabas “simples” para as “complexas”.
Em várias cartilhas, o trabalho inicial deste método centra-
se nas vogais e em seus encontros, como uma das
condições para a sistematização posterior das sílabas.
Muitas delas apresentam desenhos e palavras-chave cujas
sílabas iniciais, realçadas em outras cores e tipos gráficos,
são apenas apresentadas e depois destacadas das palavras
e memorizadas em grupos silábicos.
As famílias silábicas são inicialmente compostas por
consoante e vogal (da, de, di, do, du) e recompostas para
formar novas palavras.
Gradativamente, pequenas frases e textos são propostos, a
partir de combinações entre sílabas já estudadas.
Em geral, a preocupação em focar a sílaba é maior do que a
preocupação com o sentido e as estruturas das frases e dos
textos.
O método silábico nem sempre é concretizado da mesma
forma nos livros didáticos.
Felisberto de Carvalho defendia que o método de emissão
de sons não deveria mostrar à criança as letras isoladas,
como na escrita, mas sons e articulações como na palavra
falada.
Seu Primeiro Livro de Leitura, publicado em 1892,
apresentava as sílabas em forma de monossílabos
significativos, apoiados no desenho – como pá, pé – ou
palavras dissílabas sem distinção gráfica (como dado) ou
com leve separação gráfica (como da- do), com ou sem
apoio de desenhos.
Desde a primeira lição, estas já eram aplicadas em
expressões e frases.
A Cartilha Sodré, publicada na década de 1940, apresenta
mais de uma sílaba em cada lição, mas escolhe sílabas com
uma mesma vogal, visando a reduzir o número de sílabas
para o aprendiz.
A partir da ilustração de uma pata nadando, aparece na
primeira lição: “A pata nada./ Pata, nada/ Pa na /pata papa”.
O método silábico atende a um princípio importante e
facilitador da aprendizagem: quando falamos, pronunciamos
sílabas, e não letras ou sons separados, e opera com um
fragmento que pode ser reconhecido sem preocupação
sobre sua relação direta com o som da fala.
Existem várias sílabas que comportam mais letras do que os
sons que pronunciamos; há letras que têm mais de uma
representação sonora ou sons representados por mais de
uma letra; há sílabas de uma a cinco letras que podem ser
decifradas num bloco silábico único, e não elemento a
elemento.
Na escrita alfabética, em geral, aparecem vários tipos de
combinações silábicas na mesma palavra.
Portanto, dois procedimentos são importantes para os
processos de registro escrito e decodificação na leitura: a
análise fonológica da sílaba, como segmento que compõe a
cadeia sonora da fala e seu registro escrito, e a
segmentação de palavras escritas em sílabas a serem lidas
numa dada sequência.
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3 - Método Global
Defende que a criança percebe as coisas e a O método
global integra o conjunto dos métodos analíticos que se
orientam no sentido do todo para as partes.
linguagem em seu aspecto global, que a leitura é uma
atividade de interpretação de ideias e que a análise de
partes deve ser um processo posterior.
No final do século XIX e início do XX, o método
global encontra sólido apoio na teoria de Decroly, psicólogo
e educador belga, para quem a aprendizagem das crianças
ocorreria através de observações, associação e expressão
de ideias.
Outro apoio ao método é atribuído ao psicólogo suíço
Claparède, que defendia dois grandes princípios, baseados
na teoria alemã da Gestalt, ou da ‘forma’: ir do simples para
o complexo significa ir do todo às partes; a palavra e a frase
oferecem à criança uma configuração total, ou um perfil
geral necessário a esse movimento.
É possível verificar pontos comuns entre os defensores dos
métodos denominados analíticos/globais:
1) a linguagem funciona como um todo e as partes somente
têm sentido em função de uma unidade;
2) existe um princípio de sincretismo no pensamento
infantil: primeiro percebe-se o todo e depois as partes;
3) os métodos de alfabetização devem priorizar a
compreensão;
4) no ato da leitura, o leitor utiliza estratégias globais de
reconhecimento;
5) o aprendizado da escrita não pode ser feito por
fragmentos de palavras, mas por seu significado;
6) a escola tem que acompanhar os interesses, a linguagem
e o universo infantil e, portanto, as palavras percebidas
globalmente também devem ser familiares e ter sentido
para a criança.
Em São Paulo, adota-se oficialmente o “método analytico”
na primeira década do século XX.
A Cartilha Analytica de Arnaldo Barreto associa o ensino da
leitura ao ensino de “Lições de Coisas”, ou método intuitivo,
defendendo que a educação deveria passar pelos sentidos e
pela observação, e usa textos com sentenças descritivas de
imagens, que deveriam ser reconhecidas em posições
horizontal, vertical e desordenadas, sob a influência
da Cartilha de Arnold, da autora americana Sarah Louise
Arnold.
O método global de contos/historietas foi divulgado por
Lúcia Casasanta, em Minas Gerais e no Brasil, desde 1930,
aproximadamente.
O Livro de Lili, de Anita Fonseca (1940) exemplifica as
etapas/fases a serem seguidas pelos adeptos do método,
com algumas variações: fase da história – reconhecimento
global de um texto (feito juntamente com as crianças ou
produzido por um autor), que é memorizado e “lido” durante
um período; fase da sentença – reconhecimento e
identificação rápida de sentenças do mesmo texto, que
depois são recortadas e remontadas; fase de porção de
sentido – reconhecimento de expressões em sentenças
conhecidas; fase de palavração – reconhecimento de
palavras nas sentenças e depois decomposição/recorte de
sentenças em palavras – fase da silabação, que ocorreria
quando as crianças já tivessem feito vários exercícios de
observação de semelhanças e diferenças entre as palavras.
Na fase de decomposição de sílabas de palavras concretas
e conhecidas, não poderia ser abandonada a leitura pelo
sentido das outras historietas e textos suplementares.
Tomando como foco o sentido, somente após um convívio
mais prolongado com o texto é que viria uma forma de
decomposição; assim, a fase de palavração viria depois da
terceira historieta, por exemplo.
Na atualidade, enfatiza-se que os textos têm que ser
aqueles que circulam na sociedade e não inventados para
efeitos de ensino; as crianças devem ler e escrever na
escola para desenvolver diferentes funções sociais e
gêneros da escrita.
Os professores têm recuperado metodologias semelhantes
às do método global, utilizando a apresentação de histórias,
parlendas, advinhas e outros textos para que as crianças
memorizem, montem e desmontem frases e depois
identifiquem palavras que serão decompostas.
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6 - Instrumentos de Escrita
Instrumentos de escrita podem ser definidos como aqueles
objetos que constituem gestos e modos de escrever de cada
tempo – ou seja, dispositivos que deixam marcas inscritas
em determinados materiais ou suportes.
Os instrumentos fazem parte das práticas sociais internas e
externas à escola e podem alterar o modo como se aprende,
as decisões em torno do ensino da leitura e da escrita e das
formas de manuseio de cada um deles.
Na Europa, e também no Brasil, somente em meados do
século XIX é que o ensino simultâneo da leitura e da escrita
para iniciantes se tornou uma prática escolar corrente,
devido ao barateamento do papel e à divulgação da pena
metálica (inventada em 1803 e divulgada na escola em
1840), pois aparar a pena era um gesto muito perigoso para
crianças pequenas.
Nos usos escolares da escrita, é forte a relação entre o que
se escreve e o instrumento disponível: no século XIX
crianças menores escreviam em caixas de areia, depois nos
quadros de ardósia, que exigiam o uso de um giz para pedra
(lápis para ardósia), para inscrever nesse suporte rígido, e
de um pano úmido para apagar.
Os mais adiantados, com as mãos mais treinadas,
escreviam no papel com suas canetas tinteiro e depois nos
cadernos.
No início do século XX, os pedidos de traslados de cadernos
de desenho e cadernos de caligrafia mostram que primeiro
era preciso aprimorar o gesto de escrita, a disciplina do
traçado, para depois escrever, embora se copiassem textos
nesses treinos.
A escrita em ardósia possibilitava o registro de palavras e,
talvez, frases pequenas, mas as escritas eram efêmeras,
pois não era possível conservá-las.
O uso de caneta tinteiro, que não permitia borrões, requeria
um tipo de escrita muito controlada, enquanto o lápis
grafite, já popularizado na Europa e nos EUA desde a
segunda metade do século XIX, com a borracha associada,
passou a permitir erros e acertos.
Conforme estudos de Jean Hébrard e Anne-Marie Chartier,
diferente das folhas soltas, o instrumento caderno passou a
condicionar novos modos de pensar e de organizar o saber
escolar e a escrita. Com ele pode-se registrar a escrita por
dia de trabalho e por disciplina, usar mecanismos gráficos,
como tabelas e listas marcadas pelo uso do espaço vertical
ou horizontal da página, escolher traçados para marcar a
distinção entre os textos dos exercícios ou separar uma
atividade didática da outra.
O uso do fichário pode trazer outra relação com a escrita e
com formas de ordenamento e sequência de registro.
O uso de folhas soltas, que parece comum na alfabetização
atual, leva ao desaparecimento de uma série de
mecanismos sequenciais, dificultando também a
conservação dos escritos.
Depois de quase dois séculos de uso de variados
instrumentos na escrita escolar, parece que houve um
esquecimento de como foi difícil chegar ao mundo do papel
e do lápis na escola e na alfabetização.
A entrada na era do teclado digital traz para a pedagogia,
necessariamente, questões inusitadas, provocadas por este
novo instrumento de escrita.
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7 - Iletrismo
Na década de 1980, o termo iletrismo passou a substituir a
expressão “analfabetismo funcional”, que designava a
incapacidade de compreender um texto simples relacionado
à vida cotidiana.
A dupla literacy / illiteracy, em inglês, foi traduzida
como littératie/ illettrisme, em francês, e
como letramento/iletrismo, em português.
Passou-se a chamar de iletrado não o adulto privado de “ler-
escrever-contar” por falta de escola, mas aquele que não
adquiriu, em determinada época prevista para tal
aprendizado, os saberes de base, variáveis no tempo: leitura
oralizada – ditado – cálculo, em 1880; leitura silenciosa –
expressão escrita – matemática, em 1970; orações –
cânticos – catecismo, em 1700.
Essas variações indicam que tais necessidades básicas são
historicamente produzidas.
No Brasil, no caso de alguns indicadores de alfabetização,
as exigências também são variáveis e crescentes.
Comparando-se as habilidades demandadas nas perguntas
feitas desde o primeiro censo, em 1872, até os censos
atuais, constata-se progressão de exigências sociais e,
consequentemente, de requisitos escolares.
Nos primeiros, as perguntas referem-se à habilidade de
assinar o nome; depois, a de escrever um bilhete simples
(1950); mais recentemente, agrega-se a habilidade de ler e
escrever ao tempo de escolarização, o que supõe,
indiretamente, que o indivíduo fará uso funcional da escrita.
O INAF (Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional),
empregado no Brasil, é constituído de vários níveis,
mostrando que se espera muito mais de jovens e adultos,
em termos de utilização social da escrita: habilidades de
leitura, escrita, cálculo numérico e resolução de problemas,
práticas de letramento e numeramento.
Na França, quando os empregos que não exigem
qualificação começam a excluir aqueles que não conseguem
ler (por exemplo, instruções, referências) ou escrever (por
exemplo, preencher fichas), as definições e estatísticas se
modificam.
Ainda no caso da França, passa-se de 1 milhão de iletrados,
em 1980, a 5 milhões, em 1998, e a 3,1 milhões em 2009.
Pesquisas como as de Harvey Graff, que desmistificam as
relações sempre positivas entre saber ler e escrever e
outros desenvolvimentos, como o tecnológico, o social e o
educacional, permitem compreender melhor o fenômeno.
Esse autor considera que o domínio da escrita não é uma
variável, que, sozinha, altera as condições econômicas e
sociais.
No exemplo francês, pesquisas desfizeram associações
simplistas:
a) entre iletrismo e desemprego: 67% dos iletrados em idade
ativa estão empregados, o que mostra que é possível
desenvolver atividades de trabalho sem dominar plenamente
a escrita;
b) entre iletrismo e zonas urbanas sensíveis: 10% estão
nessas zonas urbanas- ZUS e 50%, na zona rural;
c) entre iletrismo e pobreza/precariedade: 7 milhões de
pobres, em 2009. Neste último caso, contrapondo-se o
índice de iletrismo de 3,1 milhões com a estatística de
pobreza, no mesmo ano, constata-se que, mesmo
continuando pobre, quase metade dessa população possui
habilidades de leitura e escrita – e isso não altera
automaticamente o nível de pobreza;
d) entre iletrismo e diminuição de nível da educação: menos
de 5% de iletrados aos 17 anos, 14% com mais de 55 anos.
Assim, a escolaridade longa diminui o iletrismo, mas
transforma as dificuldades precoces em fracasso (15% das
crianças de 10-11 anos são computadas como crianças que
fracassam na escola).
Em outros termos: as exigências escolares de ampliação de
habilidades relacionadas ao uso da leitura e escrita criam
novos problemas de ensino e aquisição de tais requisitos;
assim, fracassos antes evidenciados no início da
escolarização são postergados para fases mais avançadas
da escolarização.
No Brasil, evidências dos mesmos problemas são
associadas à persistência expressiva do analfabetismo
funcional e aos desafios de (re)alfabetização em anos finais
do Ensino Fundamental.
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8 - Cartilhas e Materiais para Aprender a Ler
Nos verbetes de diferentes dicionários brasileiros, o
termo cartilha “designa um pequeno caderno que contém as
letras do alfabeto e os primeiros rudimentos para aprender a
ler; carta do abc” (Houaiss); “é diminutivo de carta, livro ou
carta para ensinar a ler” (Caldas Aulete); “é livro para
ensinar a ler” (Koogan/Houaiss) ou, ainda, “é livro para
aprender a ler" (Aurélio Buarque de Holanda).
A diferença entre essas definições está apenas no papel do
sujeito: as cartilhas ensinam a ler – foco no
professor/instrutor –, ou servem para aprender a ler – foco no
aprendiz. Em todas as definições, o significado de cartilha é
restrito ao ato de ensinar e/ou aprender a ler, sem menção
a escrever.
O pressuposto é de que o aprendizado da leitura antecede o
da escrita. Isso de fato se deu por alguns séculos.
Ensinava-se/aprendia-se a ler e, depois, a escrever.
Na História do Ensino no Brasil, as Primeiras Cartas ou
Cartinhas de Alfabetização foram produzidas em Portugal,
chegando até nós no final do século XVI.
Entretanto, são esparsas as informações sobre cartilhas
entre os séculos XVI e XVIII. No século XIX, em documentos
que circularam no Brasil, os termos tabelas, cartas,
cartões, folhetos e cartazes aparecem como materiais para
ensinar a ler e podem ser apresentados no formato
manuscrito ou impresso.
As cartas podiam vir destacadas como folhas soltas e eram
designadas como “Cartas de ABC”, “Cartas de Nome”,
“silabários” ou “abecedários” e algumas cartas também
vinham agrupadas na forma livro.
Assim, nem sempre se deu o nome de cartilha a livros para
iniciantes.
As designações variam conforme a pedagogia, o país e a
época, sendo comum, no final do século XIX e início do
século XX, o termo “Primeiro Livro de Leitura”.
No Brasil, o termo pré-livro aparece vinculado ao método
global de contos, e se constitui como a reprodução, em
miniatura, de cartazes que o professor apresentava para a
classe e os alunos iam montando, aos poucos, na forma de
um fichário.
O termo cartilha não se vincula necessariamente a um
método, havendo cartilhas dos métodos analíticos e
cartilhas dos métodos sintéticos.
O século XX foi marcado pela expansão das escolas e,
consequentemente, pelo crescimento editorial dos livros
didáticos.
Com a diversificação da produção e inovações nos métodos,
o termo cartilha passa a ser associado a métodos que
primam pela repetição de sílabas e fonemas, pela presença
de textos produzidos artificialmente, portanto
descontextualizados, denominados na cultura pedagógica
como “textos acartilhados ou pseudotextos”.
Atualmente, as cartilhas cederam espaço para os livros de
alfabetização.
Os alunos podem ler e escrever em seus próprios livros, que
se baseiam em diferentes concepções sobre ensinar e
aprender a ler e a escrever e na perspectiva do letramento.
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9 - Alfabetização Digital
O termo alfabetização digital tem sido usado para designar
um tipo de aprendizado da escrita que envolve signos,
gestos e comportamentos necessários para ler e escrever
no computador e em outros dispositivos digitais.
Podemos pensar numa alfabetização feita com instrumentos
digitais, em ambiente digital e no contexto de letramento
digital.
Os instrumentos digitais trazem novas formas de produção,
transmissão, circulação e divulgação dos escritos.
No caso da alfabetização digital, se entrecruzam o uso do
instrumento de registro, os usos sociais da escrita, os
sistemas de representação (letras, sinais gráficos, ícones,
cores, sonoridades, imagens fixas e em movimento) no
mesmo suporte – e estas formas interferem mutuamente no
gesto de escrever e no pensamento sobre o funcionamento
da escrita.
Algumas pesquisas empreendidas por Emília Ferreiro
evidenciam que o computador não interfere no conceito de
representação da escrita alfabética.
No entanto, seu uso influencia o aprendiz em várias
questões: na noção de espaçamento e nas decisões sobre a
disposição do texto em página; na experimentação de
formas, cores e tamanho das letras; na percepção das
marcas e correções automáticas de ortografia.
Tendo em vista que a multimodalidade é muito
potencializada no ambiente digital, a inter-relação entre
signos sonoros, verbais e visuais pode exigir maior
articulação entre sistemas ideográficos e alfabéticos.
Com novos recursos de sonorização é possível que a criança
explore as relações de simultaneidade entre o que tecla
e/ou fala e o produto escrito que vê.
Isso poderá, futuramente, interferir ainda mais no
aprendizado do sistema de escrita.
A escrita no computador parece fazer parte de saberes não
ensinados na escola, pois vários gestos presentes na
cultura digital são aprendidos através de jogos, brinquedos
eletrônicos, celulares, operações no comércio e bancos, e
outras tecnologias móveis (como ligar, desligar, clicar, tocar
em ícones, arrastar, baixar programas).
Entretanto, a criança precisa e pode dominar diferentes
técnicas relacionadas ao que se chama de usabilidade:
aprender a lidar com as ferramentas do sistema para ligar a
máquina; compreender o teclado, seus símbolos e a função
de cada tecla para além de digitar as letras; operar com a
tela, interagir com ícones, localizar programas, manusear o
mouse de adulto com suas mãos pequenas (sabendo que ele
tem mais de uma função), arrastar, clicar e desenvolver
operações cognitivas que permitam memorizar e internalizar
tais operações.
Essas operações provocam efeitos nos escritos e na tela e,
consequentemente, no conhecimento sobre o
funcionamento mais técnico do novo instrumento de escrita.
Esse tipo de alfabetização digital é um dos componentes do
letramento digital, e ambos precisam ser ensinados na
escola.
Instrumentos como lousas, penas de ganso, lápis, cadernos,
folhas, entre outros, provocaram pequenas revoluções nas
modalidades de escrita e em seu ensino. A alfabetização
contemporânea já está alterada pelo ambiente digital e por
essa nova configuração tecnológica e a escola tem uma
grande contribuição a dar nesta questão.
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10 – Alfabetização
A palavra alfabetização é de uso comum e frequente, não só
no léxico específico de profissionais do ensino e da
Educação, mas também no léxico de todos os indivíduos,
alfabetizados ou não, de uma sociedade letrada. Entre estes
últimos, há em geral concordância quanto ao conceito que a
palavra alfabetização nomeia: pergunte-se a qualquer
pessoa o que é alfabetização, e a resposta dificilmente será
outra que não a de que alfabetização é “o processo de
ensinar a ler e a escrever”.
Entre os profissionais do ensino e da Educação, porém, esse
conceito foi posto em discussão a partir de meados dos
anos 1980, quando as crescentes demandas sociais de
leitura e escrita em sociedades grafocêntricas, como são
quase todas as sociedades modernas, evidenciaram a
insuficiência de apenas “saber ler e escrever” e, em
decorrência, a necessidade de que se ampliasse o conceito
de alfabetização, para incluir nele o saber fazer uso
competente da leitura e da escrita nas situações sociais em
que a língua escrita esteja presente
Entretanto, logo se reconheceu que essas duas
competências – de um lado, saber ler e escrever, de outro
lado, saber responder adequadamente às demandas sociais
de uso da leitura e da escrita – envolviam processos
linguísticos e cognitivos bastante diferentes; como
consequência, passou-se a designar por uma outra
palavra, letramento, o desenvolvimento de habilidades de
uso social da leitura e da escrita, e a designar com a
palavra alfabetização especificamente a aprendizagem de
um sistema que converte a fala em representação gráfica,
transformando a língua sonora – do falar e do ouvir –
em língua visível – do escrever e do ler: a aprendizagem do
sistema alfabético.
Assim, a alfabetização, atualmente, é entendida como a
aprendizagem de um sistema de representação da cadeia
sonora da fala pela forma gráfica da escrita – o sistema
alfabético – e das normas que regem seu emprego.
Não se trata, porém, como frequentemente se supõe, de
aquisição de um código; um código é, em seu sentido
próprio, um sistema que substitui os signos de um outro
sistema já existente; ao contrário, o sistema alfabético não
é um sistema de substituição de um outro sistema
preexistente: é um sistema de grafemas
que representam sons da fala, os fonemas, portanto,
um sistema de representação, não um código.
É esse sistema de representação que se materializa no
sistema alfabético, que é um sistema notacional: ao
compreender o que a escrita representa (a cadeia sonora da
fala, não seu conteúdo semântico), é preciso também
aprender a notação – os grafemas – com que, arbitrária e
convencionalmente, são representados os sons mínimos da
fala – os fonemas.
Em síntese, alfabetização é o processo de aprendizagem do
sistema alfabético e de suas convenções, ou seja, a
aprendizagem de um sistema notacional que representa, por
grafemas, os fonemas da fala.
É importante destacar que, na prática pedagógica, a
aprendizagem da língua escrita, ainda que inicial, deve ser
tratada como uma totalidade: a alfabetização deve integrar-
se com o desenvolvimento das habilidades de uso do
sistema alfabético – com o letramento; embora os dois
processos tenham especificidades quanto a seus objetos de
conhecimento e aos processos linguísticos e cognitivos de
apropriação desses objetos, dissociá-los teria como
consequência levar a criança a uma concepção distorcida e
parcial da natureza e das funções da língua escrita em
nossa cultura.
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