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Neuvânia Curty Ghetti (1); Ravena Barbosa M. de Souza (2); Angélica Borges (3)
INTRODUÇÃO
Deve-se dar particular atenção ao tratamento externo das edificações e seus atributos
originais, e a sua inserção no contexto histórico adquire, na maior parte dos casos, um caráter
polêmico, especialmente, ao se definir a configuração da fachada. Qualquer intervenção
realizada na edificação deve ter como objetivo revalorizar e recompor esteticamente seu
aspecto original, sem prejudicar seu caráter histórico.
Na cidade do Recife, reconhecemos o espaço histórico dos Pátios nos bairros de Santo
Antônio e São José, no Centro como uma área especial, devido à presença marcante de um
casario, ou seja, um conjunto de edificações de estilo eclético.
Para, além disso, em tempos atuais, esses espaços configuram como espaços de
reconhecimento e representatividade, visto que neles acontecem encontros e atividades
culturais ligadas ao movimento negro – Terça Negra no Pátio de São Pedro – e a grupos
religiosos de matriz africana – Noite dos Tambores Silenciosos no Pátio do Terço.
O estudo de conservação dos pátios nos bairros São José e Santo Antônio no Recife
baseou-se inicialmente em um breve levantamento histórico dos pátios, seguido de uma
pesquisa nas documentações existentes no Arquivo da DPPC (Diretoria de Preservação do
Patrimônio Cultural) da cidade o Recife, com a finalidade de identificar e quantificar o total de
imóveis presentes dos polígonos tombados de cada pátio. De posse desses dados,
procedeu-se com o levantamento arquitetônico e fotográfico das fachadas, preenchimento in
loco de um formulário de identificação de danos. Por fim, elaborou-se os mapas gráficos de
danos presentes na fachada principal dos 183 imóveis analisados.
AS FACHADAS
A LEITURA
Leitura Vertical: A leitura vertical informa sobre a edificação isolada e permite avaliar o seu
grau de degradação, ou seja, permite localizar os elementos danificados, no nível de
detalhamento proposto (localizar o problema numa platibanda, ou nos ornatos, no
embasamento, ombreira e verga, etc; e também podendo identificar o tipo de material
afetado.
O MACRO-AMBIENTE E AS FACHADAS
A fachada de uma edificação apresenta nas suas linhas gerais o aspecto das diversas
partes de um edifício. Desta forma, destacamos uma matriz de análise em que os diversos
elementos arquitetônicos e seus danos agrupam-se nas três partes básicas da edificação:
Embasamento, Corpo e Coroamento.
De acordo com Tinoco (2009), toda representação gráfica implica uma forma de ver e
conceber a realidade, a qual é tratada cientificamente através da opção pessoal de
determinados pressupostos teóricos e metodológicos. Nesse sentido, de acordo com Lacerda
(2012), as imagens, como formas de registro de ação e de informação, são portadoras de
materialidade e de recursos de expressão distintos.
As autoras destacam que o Mapa de danos ainda possibilita, a partir das análises de
danos e patologias, que os técnicos e profissionais especializados possam determinar normas e
procedimentos de conservação e restauro mais adequados a serem executados na edificação.
De acordo com Matos e Lima (2006 apud Leite et al, 2017) a fachada é o elemento que
permanece exposto a ação das intempéries, das ações antrópicas e sofre impactos de ordem
física e físico-química estando sujeita a deterioração devido às incidências atmosféricas. As
degradações verificadas nas fachadas ocorrem devido a presença de um conjunto de fatores
que interagem de modo associado e íntimo. Resumidamente, estes podem ser reunidos em
Fatores Extrínsecos e Fatores Intrínsecos de degradação.
Os trabalhos de conservação e/ou restauração mal planejados e mal executados podem ter
como consequências, por exemplo, procedimentos de limpeza inadequados, a introdução de
sais solúveis através de rejuntamento com cimento tipo Portland ou outros produtos, a
inserção de elementos em ferro que se oxidam e dilatam, fraturando a alvenaria, o uso de
resinas que se oxidam e amarelecem modificando a coloração original da cantaria ou ainda
endurecendo o revestimento superficial que termina por quebrar-se e desprender-se,
ocasionando perdas do suporte.
A descaracterização de uma fachada com a eliminação de alguns de seus componentes
e a troca de materiais com composição e porosidade distintas das do material original podem
criar zonas de acumulação de umidades que trazem consigo problemas com sais e a
proliferação de algas, musgos, fungos e bactérias e até o crescimento de plantas superiores na
cobertura das edificações. O uso de tintas, vernizes e tintas à base de soluções betuminosas,
ou de spray, compostos principalmente por corantes/pigmentos ou tendo como veículo
resinas afetam a porosidade dos revestimentos, dificultando procedimentos de limpeza
posteriores.
CONTAMINAÇÃO ATMOSFÉRICA
A contaminação atmosférica decorrente de processos de poluição decorrentes da
ocupação humana é o fator mais grave relacionado com a alteração dos materiais construtivos
e com a agravante da impossibilidade de eliminação.
Os contaminantes mais importantes são os gases: anidrido sulfuroso (SO2), anidrido
carbônico (CO2), óxidos de nitrogênio (NOx), amoníaco (NH3) e os aerossóis de ácidos, sais,
metais e partículas carbônicas. Também devem ser levados em conta os contaminantes
secundários, gerados por reação dos primários e pela ação conjunta de vários agentes, já que
ambos efeitos podem ser graves. Exemplos são, dos primeiros, os ácidos sulfúrico e nítrico, e
dos segundos, a presença de umidade.
Está relacionada com a maior parte dos danos, mas destacam-se os depósitos,
decoesões e descamamentos.
A água presta ajuda a outros agentes, sem a qual não seriam efetivos, como os agentes
biológicos, por exemplo. De acordo com Matos e Lima (2006 apud Leite et al, 2017), a
incidência do vento nas edificações é dependente de uma série de fatores, que vão desde o
formato da edificação, sua altura até as condições do entorno.
Souza (2008 apud LEITE et al,2017) destaca ainda que a umidade é fator essencial para o
aparecimento de eflorescências, ferrugens, mofo, bolores, perda de pinturas e de rebocos,
danos que acometem os elementos arquitetônicos que compõem as fachadas dos imóveis dos
Pátios estudados no Recife.
● FISSURAS
De acordo com Freitas, Carasek e Cascudo (2014 apud Leite et al, 2017), as fissuras são
indícios de diversos problemas ocorridos em fachadas. As estruturas antes de entrarem em
colapso apresentam um estado de fissuração, que permite o trabalho de correção. Nas
fachadas, as fissuras têm formas variadas, e assim, pode ser diagnosticado o problema para as
devidas correções necessárias. As mesmas podem se apresentar na forma horizontal, em
forma de mapa e geométricas.
● BIOCROSTA
Esses agentes biológicos produzem uma alteração que pode ser constatada
macroscopicamente na superfície de diferentes materiais, sendo consequência do
desenvolvimento de microorganismos pertencentes ao grupo dos fungos, dos liquens e dos
musgos. Assim, como para todos os organismos vivos, as condições ambientais podem afetar
o seu desenvolvimento tendo a umidade como um fator essencial para seu crescimento,
resultando a degradação do suporte. A atividade biológica vem sempre acompanhada de
umidade, que proporciona o meio adequado para outros mecanismos atuarem.
● VEGETAÇÃO
As colônias de vegetação parasitária atuam na corrosão dos materiais construtivos e
são propiciadas pela presença de umidade e de luz adequadas, constituem-se sob ou na
superfície das alvenarias, revestimentos e das coberturas. Essas colônias de vegetação
parasitária se nutrem dos sais e matérias orgânicas que extraem do próprio material a que se
fixam.
No caso do desenvolvimento de vegetação parasitária nos revestimentos é originada com
facilidade pela presença de umidade, em conjugação com a radiação solar que serve de fonte
de energia, a vegetação se desenvolve onde encontra um substrato adequado ao seu
crescimento.
● EFLORESCÊNCIA
Os sais podem ter origem na própria constituição das alvenarias, nas argamassas,
ascender do solo com a água por capilaridade, ser aportados por aerossóis atmosféricos, ou de
reações do revestimento com os componentes do ar. Os sais solúveis são nocivos, e sua ação
se deve à criação de tensões, ao crescerem nos poros ou ao formar hidratos a partir do sal
anidro. Os sais pouco solúveis mais frequentes são carbonatos e sulfato cálcico, cujas ações
são menos nocivas que as dos solúveis. A eflorescência de forma prática, apresenta-se como
manchas esbranquiçadas que aparecem na parte superficial do revestimento. Destaca-se que o
processo de eflorescência é estritamente químico.
● GRAFITISMO/PICHAÇÃO
Trata-se de uma alteração superficial que afeta fundamentalmente o aspecto exterior
do revestimento da fachada manifestando-se superficialmente, provocando alteração da
coloração e manchamentos.
ANÁLISE E DISCUSSÃO
Após análise dos dados coletados em campo, através de inspeção visual das fachadas
das edificações, constatou-se a presença das seguintes manifestações patológicas:
● Danos relacionados aos fatores ambientais: Fissuras/Trincas, eflorescência, biocrosta,
vegetação, descascamento da pintura e destacamento, sujidades, corrosão/oxidação.
● Danos relacionados aos fatores antropológicos: Uso de material incompatível; fiação e
tubulação expostas; acréscimos (toldos, placas e marquises), grafitismo/ pichação;
falta de manutenção- perda de matéria (ornatos, guarda-corpo, revestimentos).
FISSURAS/TRINCAS
Este tipo de manifestação patológica esteve presente em 42 % das fachadas dos
imóveis estudadas.
BIOCROSTA
A biocrosta apresentou-se em 97% das fachadas analisadas, essa manifestação
patológica foi evidenciada principalmente na parte superior (platibanda e beiral) e em detalhes
arquitetônicos. Notou-se a presença de pombos, como agentes que proporcionam a presença
de microorganismos que juntamente com a umidade, desencadeiam esse tipo de alteração
que é visto em forma de manchas marrons, pretas e esverdeadas.
VEGETAÇÃO
A vegetação superior foi evidenciada em 43% dos imóveis. Essa anomalia nessas
estruturas é causada pela presença de umidade alta e insolação que são características
climáticas típicas do Recife, os pombos também podem estar influenciando com o transporte
de sementes.
EFLORESCÊNCIA
A eflorescência foi observada em 5% das fachadas. Essa anomalia é vista em forma de
manchas brancas. A provável causa dessa manifestação patológica nas fachadas é a junção de
sais solúveis que podem ter vindo dos materiais incompatíveis como o cimento acrescido às
paredes porosas e a presença de umidade. Cabe ressaltar que a baixa incidência desse dano é
decorrente da aplicação de revestimentos cerâmicos no embasamento das edificações,
encobrindo sua manifestação.
DESCASCAMENTO DA PINTURA E DESTACAMENTOS
O descascamento da pintura fez-se presente em 76% das edificações, atrelado ao
descascamento está presente o destacamento do reboco das paredes. Notou-se também o
destacamento de partes dos detalhes construtivos. Esse dano pode ter sido causado pelo
excesso de umidade advindo de infiltrações que causam expansão das camadas de
revestimento da parede.
A partir do processamento dos dados constatou-se que no Pátio de São Pedro 7% dos
imóveis apresentam-se com as fachadas em Grau I, 49% em Grau II e 44% em Grau III. No Pátio
do Carmo, 10% das edificações apresentam-se com as fachadas em Grau I, 45% em Grau II e
45% em Grau III. No Pátio do Livramento, 10% das fachadas encontram-se em Grau I, 63% em
Grau II e 27% em Grau III.
Uma vez constatado o nível de degradação de uma edificação e suas partes, seja nos
elementos estruturais ou decorativos, o problema que sempre se coloca é o de escolher o
tratamento adequado para cada dano ou conjunto de dados apresentado, ou seja:
● Conservar o elemento afetado, intervindo de forma adequada a deter o processo de
degradação;
● Substituir o elemento afetado por um outro que mantenha as mesmas funções e
características do anterior e, dependendo do grau de comprometimento, a mesma
forma que deve ser obtida após análise no projeto original de materiais, técnicas e
formas.
No caso das edificações que compõem os Pátios do Recife, onde as fachadas foram
parcialmente preservadas, seria interessante substituir o autêntico degradado ou as partes
transformadas por um similar da mesma forma e, na medida do possível, com o mesmo
material e a mesma técnica.
REFERÊNCIAS
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