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INVENTÁRIO DO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO E

PAISAGÍSTICO DE SÃO JOÃO DEL-REI: UMA ANÁLISE


TIPOLÓGICA

Área temática: Cultura


Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ)
Diego Nogueira Dias¹
Silmara Aparecida Ferreira Silva¹
Luzia dos Santos Abreu¹
¹Universidade Federal de São João del-Rei; Arquitetura e Urbanismo;
²Universidade Federal de São João del-Rei; Arquitetura e Urbanismo; PROEX/UFSJ;
³Universidade Federal de São João del-Rei; Arquitetura e Urbanismo; PROEX/UFSJ.

Resumo: Este artigo visa análise do Projeto de Extensão Inventário do Patrimônio de São
João del-Rei, que se encontra em execução, enfatizando que o inventário deve ser uma
atividade de longo prazo. O objetivo é reconhecer a totalidade o conjunto arquitetônico e
paisagístico, dar suporte às intervenções de infraestrutura e mapear as informações
levantadas na cidade.

Palavras-chave: Inventário; Patrimônio; São João del-Rei.

1. Introdução

Para a análise e compreensão da história das cidades e das pessoas, a arquitetura


tem papel relevante por materializar, nas edificações, os modos de vida e de construção de
uma época. Além de referência urbana, as edificações são a história materializada. Nesse
sentido, entende-se que os bens de relevância histórica e/ou arquitetônica devem ser
devidamente documentados e inventariados, antes mesmo de qualquer ação
preservacionista. (FERREIRA, 2012).

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Segundo BAPTISTA (2015), a criação de um inventário dos bens culturais
brasileiros surgiu junto com a fundação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (SPHAN). A produção de um inventário se deu em função da necessidade da
identificação e registro das manifestações culturais arquitetônicas. O inventário do
patrimônio nacional iniciou-se em 1939, período em que Rodrigo Melo Franco de Andrade
era o diretor do SPHAN.
Reconhecermos, que São João del-Rei apresenta grande diversidade arquitetônica,
com edificações que datam de diferentes épocas e estilos, que representam um diferencial
entre as cidades antigas mineiras, e trazem ao conhecimento da comunidade estilos
arquitetônicos que identificam cada período da sua história. Somente no ultimo ano de
2015 foram inventariados 420 imóveis além da atualização do mapeamento desses
monumentos, principalmente na área central e no Bairro Fábricas.
A produção do inventário de bens arquitetônicos é uma etapa substancial no
processo de registro de bens culturais, trabalho necessário para incentivar a preservação
dos mesmos e viabilizar ações municipais. A organização desse amplo registro tem por
intuito, por meio dos instrumentos de inventário, fornecer subsídios para o conhecimento e
a conscientização da sociedade sobre seu patrimônio, como documento histórico e
arquitetônico, a necessidade de preservá-lo e também uma ferramenta para o planejamento
urbano-territorial.
2. Material e Metodologia

A pesquisa está baseada no trabalho da Dra. Liziane Peres Mangili, arquiteta, que
na sua tese de doutorado defendida em 2015 na FAUUSP “Anseios, dissonâncias e
enfrentamentos, o lugar e a trajetória da preservação em Lençóis (Bahia), trouxe a
necessidade de conhecer e registrar os reais valores que estão intrínsecos aos monumentos,
por parte da população local. Esta etapa é fundamental para a compreensão da real cultura
da cidade de São João del-Rei, não acreditando que a história da cidade está estagnada no
Século XVIII, mas que a cultura ainda está sendo construída a cada dia e que somente
dessa forma, será possível preservá-la para as futuras gerações.
Entre os recursos utilizados no projeto em análise destaca-se o inventário. Se define
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o inventário como o procedimento administrativo pelo qual o poder público identifica e
cadastra os bens culturais do Município, ou, em termos mais práticos, como o
levantamento sistemático dos bens culturais de uma determinada região. Tem como
objetivos: subsidiar o conhecimento de bens de interesse de preservação, estado de
conservação e fatores de degradação; instrumentalizar as ações no âmbito estadual,
regional e municipal através da atuação do poder público; subsidiar diagnósticos e
pesquisas voltadas ao planejamento urbano e regional, turístico e ambiental, a educação
patrimonial, programas de revitalização de centros históricos e salvaguarda de
manifestações culturais de toda natureza; e, finalmente, orientar a atuação dos Conselhos
de Patrimônio Cultural na definição de áreas e diretrizes de proteção e a mobilização da
sociedade civil na salvaguarda de acervos culturais (IEPHA, 2011b).
A elaboração de um inventário exige, além de uma fundamentação teórica
abordando conceitos básicos – patrimônio cultural, políticas de preservação, inventário,
técnicas e procedimentos de pesquisa e levantamento de dados, etc. – uma fundamentação
histórica específica do lugar ou região de atuação. No caso de São João del Rei, tem-se um
panorama da evolução da cidade e sua cultura através de trabalhos como os de MALDOS
(1995, s/d) e da FJP (1983), devendo-se também ater-se ao contexto histórico geral
(LINHARES, et al 1990). Para aspectos da arquitetura e respectivos bens artísticos
integrados, faz-se necessário aproximar-se ao vocabulário (CORONA & LEMOS, 1972;
ÁVILA et al, 1980) e à evolução estilística (LIMA, 1995). Assim mesmo, chama-se a
atenção para o vasto conhecimento a adquirir nos arquivos da cidade (IPHAN, Biblioteca
Municipal, UFSJ, Museu Regional, entre outros) e também através da história oral com
consultas e entrevistas a agentes comunitários.
A elaboração do inventário do projeto seguiu o seguinte procedimento
metodológico específico, que serviu base para construção de um dossiê sobre cada
edificação: a ficha de cada imóvel apresenta a compilação de conhecimentos básicos sobre
a edificação, que abordam as seguintes informações (Ver Anexos 1 e 2):
- nome da edificação;

- número de registro;

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- localização e endereço original;

- primeiro proprietário e atual proprietário;

- construtor e época/ano da construção;

- uso original e atual;

- data do levantamento e contato;

- descrição e histórico arquitetônico, contendo descrição da área do entorno;

- existência de projetos, fotos e móveis antigos, memoriais, documentação


sobre o imóvel etc.;

- estado de conservação;

- descrição e caracterização da edificação: tipologia, partido, implantação,


características particulares, estilo arquitetônico;

- dados técnicos, materiais e sistemas construtivos;

- levantamento fotográfico externo de todas as edificações e interno quando


possibilitado o acesso.

Além desses dados, um extenso e minucioso levantamento fotográfico é feito sobre


a edificação, destacando seu atual estado de conservação, materiais e técnicas empregados,
assim como ornamentos e características que tornam o bem único e de valor histórico-
arquitetônico. Abaixo exemplificamos o levantamento fotográfico de algumas dessas
edificações (Figuras 1 e 2), com destaque para a arquitetura civil, fugindo da tríade
edificações pública – monumentos – igrejas, já tão visada e resguardada.

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FIGURA 1 – Edificação residencial à Praça Dr. Paulo Teixeira, em São João del-Rei. 1:
Vista geral da fachada frontal; 2 Detalhe da janela em verga reta e sobreverga em
argamassa; 3: Detalhe da porta também em verga reta, com destaque para a presença de
gradil em ferro; 4: Vista do telhado em telha cerâmica capa-canal em duas águas. Fonte:
Arquivo pessoal dos autores, 2016. (Para ficha da edificação ver anexo 1).

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FIGURA 2 – Edificação comercial à Avenida Tancredo Neves, em São João del-Rei. 1:
Vista geral da fachada principal; 2 Vista da fachada lateral; 3: Parte superior das portas,
com destaque para as bandeiras e ornamentos em argamassa; 4: detalhe de um dos modelos
de bandeira em madeira e vidro de uma das portas. Fonte: Arquivo pessoal dos autores,
2016. (Para ficha da edificação ver anexo 2).

Nos levantamentos fotográficos e preenchimento das fichas os alunos voluntários


são levados a vivenciar na prática as características dos bens patrimoniais da cidade, suas
modificações ao longo do tempo e suas peculiaridades, que o tornam único. A grande
vantagem de poder realizar tais levantamentos em São João del-Rei é a variedade de estilos
presente na cidade, desde o colonial até o contemporâneo, o que permite ao estudante
conhecer as características construtivas e os materiais empregados em cada época da
história da arquitetura brasileira.
Também é produto um mapa (Figura 3) onde são demarcadas as edificações já
levantadas no projeto, visando maior controle e um plano de estratégias a se seguir.

FIGURA 3 – Mapa da delimitação do centro histórico de São João del-Rei, com


edificações já inventariadas destacadas em roxo. Fonte: Elaboração dos autores, 2016.

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O projeto de pesquisa que ora desenvolvemos 1 tem o intento de, por meio do
inventário arquitetônico da cidade de São João del-Rei, reconhecer e identificar os marcos
deste sitio urbano, como as casas, sobrados, etc., que estabelecem o elo de ligação entre a
cidade e o cidadão, e que ao longo dos últimos anos está sendo destruída ou
descaracterizada. Com essa análise buscamos destacar a importância do estudo e do
registro da arquitetura, apontando para a necessidade de conscientização e preservação
deste patrimônio como documento histórico e arquitetônico.

3. Resultados e Discussões

O desenvolvimento do Plano de Inventário de reconhecimento do patrimônio


Arquitetônico e Paisagístico de São João del-Rei constitui atividade de destacada
relevância para a UFSJ, na medida em que a coloca em interface com as políticas e ações
de preservação praticadas na cidade. O curso de Arquitetura e Urbanismo, bem como os de
História, entre outros, são beneficiários diretos do inventário do patrimônio cultural, na
medida em que se entra em estreito contato com as teorias e práticas que envolvem a
preservação do patrimônio. Em contrapartida, há um benefício significativo da cidade e sua
gente, no sentido de se conhecer e se registrar melhor o seu rico patrimônio. Ganha-se
assim tanto em aspectos materiais – a formação de uma base de dados para consulta livre
tanto de cidadãos como de profissionais e acadêmicos – quanto em aspectos humanos – a
conscientização sobre os valores históricos, estéticos e simbólicos de seus bens. Os laços
entre universidade e comunidade se estreitam, criando relações de maior confiança e
trabalho mútuo, sem as quais se dificulta a realização de projetos de pesquisa em interface
com a extensão, como já acontece. Permite-se, finalmente, o estreitamento de laços entre o
poder público municipal e a universidade.
A relevância do programa de extensão desde a perspectiva social se define ainda na
execução do Plano de Inventário em si, na medida em que as políticas e ações de
preservação de bens culturais traduzem a salvaguarda de cultura e memória. Estes

1
Esta pesquisa, iniciada em março de 2015, conta com o apoio da Pró-Reitoria de Extensão (PROEX) da
Universidade Federal de São João del-Rei (projeto aprovado pelo Edital Nº 12/2014/UFSJ/PROEX).
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constituem os principais fatores de coesão e identidade coletiva de um povo, na medida em
que unem as pessoas em torno de uma noção comum de compartilhamento e senso de
cidadania (IEPHA, 2009, p.15).
Cabe lembrar, ainda, a importância da experiência e treinamento dos estudantes
envolvidos, que se tornarão futuros profissionais que estarão aptos a atuar em seus
municípios de origem e outros na elaboração dos seus respectivos Planos de Inventário. O
programa proporciona a experiência direta dos estudantes com os processos e técnicas de
inventário e com as políticas patrimoniais de modo geral, na medida em que participam
ativa e efetivamente dos estudos de fundamentação teórica, das discussões sobre os rumos
metodológicos do processo de inventário, da coleta, organização, análise e interpretação
dos dados e, finalmente, na divulgação dos resultados, seja para a comunidade, seja em
eventos técnico-científicos. O conhecimento adquirido nas atividades investigativas do
programa proporciona um significativo crescimento intelectual, dada a maior consciência
adquirida sobre os aspectos teóricos e práticos envolvidos na preservação do patrimônio
cultural.
4. Conclusão

Apesar de ser importante acervo arquitetônico, ao longo dos anos, grande parte das
edificações de São João del-Rei vem sendo destruída ou descaracterizada, sendo escassos
os registros, documentação ou estudos mais aprofundados. Verificamos uma preocupante
escassez de estudos referentes ao objeto, o que certamente impede que ações que
assegurem sua manutenção sejam devidamente tomadas. Com a produção de um inventário
arquitetônico almejamos propiciar um maior conhecimento do lugar, das pessoas e das
edificações, pois de acordo com FERREIRA (2012), conhecendo a história entenderemos
nosso presente, e, não se preserva aquilo que não se conhece, é preciso dar a conhecer para
então saber preservar.
A realização do Inventário contribui para o sentido e a responsabilidade da
preservação do patrimônio, devendo ser cultivados e persuadidos no próprio seio da
comunidade. Partindo da premissa que só preservamos o que conhecemos, acreditamos que
o trabalho venha contribuir para entendimento e envolvimento tanto do cidadão comum

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como das instituições, tais como associações, escolas, entre outras. Faz parte da proposta, o
programa de educação patrimonial, dado o potencial de transformação do conhecimento e
da conscientização do patrimônio.
5. Referências

ÁVILA, Affonso et al. Barroco mineiro: glossário de arquitetura e ornamentação.


São Paulo: Melhoramentos, 1980.

BAPTISTA, A. V. S. Inventário Arquitetônico - Importância e desdobramentos na


FIOCRUZ. In: IV Congresso Internacional na 'Recuperação, Manutenção e Restauração de
Edifícios', 2015, Rio de Janeiro. Anais do IV Congresso Internacional na, 2015.

CORONA, Eduardo; LEMOS, Carlos. Dicionário da Arquitetura Brasileira. São


Paulo: Edart, 1972.

FERREIRA, Camila Corsi. Identificação patrimonial e instrumentos de inventário


aplicados às edificações históricas de Espírito Santo do Pinhal – SP. A conservação do
patrimônio no Brasil: teoria e prática. 1º seminário da rede Conservação_br. Recife, 2012.

GUIMARÃES, Marcos V. T.; RODRIGUES, Karina S. M.; SIGAUD, Luan A. V.


S.; COSTA, Amanda A. R.; RIBEIRO, Isaac C. Inventário arquitetônico do município de
São João del-Rei. Anais do 3° Fórum Mestres e Conselheiros: Municipalização do
Patrimônio e Educação Patrimonial. Belo Horizonte: MACPS/UFMG, 2011.

IEPHA – Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais.


Modelos para apresentação do ICMS Patrimônio Cultural. Belo Horizonte: IEPHA, 2005.
Disponível em: <http://www.iepha.mg.gov.br/component/docman/cat_view/23-
legislacao/38-modelos>. Acesso em 18 fev. 2011.

______. Inventário de Proteção ao Acervo Cultural de Minas Gerais - IPAC/MG.


Belo Horizonte: IEPHA, 2011b. Disponível em: <http://www.ipac.iepha.mg.gov.br/>.
Acesso em 18 fev. 2011.

ISBN: 978-85-93416-00-2
IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Patrimônio
Material. Brasília: IPHAN, 2011. Disponível em:
<http://portal.iphan.gov.br/portal/montarPaginaSecao.do;jsessionid=8DDBAFE113940D2
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______. Inventário nacional de bens imóveis: sítios urbanos tombados: Manual de


preenchimento. Brasília: IPHAN/Senado Federal, 2007.

LIMA, Sérgio J. F. de S. Arquitetura São-Joanense do século XVIII ao XX. Revista


do Instituto Histórico e Geográfico de São João Del-Rei, vol.VIII, 1995, p.47-63.

MALDOS, Roberto (coord.). São João del-Rei: passado, um presente para o futuro.
São João del-Rei: IPHAN, 1995.

Anexo 1

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Anexo 2

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