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A perspetiva representada neste ensaio é a perspetiva de Kant. Segundo Kant, a guerra surge
de uma necessidade que as pessoas têm de expressar suas necessidades individuais (seus
impulsos, suas inclinações, ou seja, tudo o que não surge da razão), decorrente de um estado
natural (status naturalis), como tal, deve ser um organismo capaz de se envolver em conflitos
que surgem da natureza humana (inclinações),
para que seja possível sair desse estado e passar para um estado jurídico em que haja uma
regulamentação legal pautada pela razão. Esta transição é garantida por um contrato social
celebrado com a humanidade, que serve de imperativo e permite a cada um gozar da sua
liberdade individual sem pôr em causa a dos outros.
Para Kant, os Países têm o estatuto de agentes morais e, portanto, são abrangidos pelo
contrato ético que se aplica entre entidades racionais, razão pela qual os países devem
organizar-se em repúblicas. A constituição republicana é a única forma de constituição da
sociedade civil que pode levar à 'paz perpétua' (sem conflitos) porque é uma forma de governo
que permite que todos os membros da sociedade sejam devidamente representados, sejam
livres e vivam em um sistema de igualdade.
De acordo com Immanuel Kant, para um estado de "paz perpétua" as seguintes condições
devem ser atendidas: primeiro, os estados/países não devem assinar tratados de paz que
forneçam motivos para guerra futura; segundo, o país não pode adquirir outro, pois um país
não é uma herança e, como tal, não pode ser trocado ou vendido para destruir sua própria
existência como pessoa; terceiro, os países devem abolir os seus exércitos permanentes (miles
perpetuus), uma vez que estes são uma ameaça constante à paz - e podem até desencadear
uma guerra preventiva; quarto, um país não pode, por qualquer motivo, contrair uma dívida
com outro país, pois isso pode ser motivo de guerra; quinto, nenhum país pode exercer
pressão sobre outro país para mudar sua constituição, pois isso seria uma interferência em sua
autodeterminação e resultaria em retaliação; finalmente, mesmo que os países estejam em
guerra, devem criar condições que permitam alguma confiança entre eles para que possam
concluir um tratado de paz no futuro.
Ao contrário de Kant, Walzer faz uma distinção clara entre guerra justa (guerra moralmente
aceitável) e guerra injusta. Para Walzer, uma guerra justa, conhecida como "jus ad bellum", é
uma guerra que surge da necessidade de legítima defesa, ou seja, uma guerra que seria
"indispensável" (sine qua non). O objetivo da legítima defesa é proteger os direitos humanos e
preservar a humanidade dos indivíduos. Walzer argumenta que esses direitos humanos são
baseados no senso comum e em um entendimento mínimo da moral, e que os países têm os
mesmos direitos e deveres dos indivíduos.
No entanto, a linha crucial que precisa ser traçada para discutir o tema se a guerra preventiva
pode ser considerada legítima defesa. Walzer argumenta que um país não precisa esperar pela
concretização de um ataque para agir em legítima defesa, pois isso diminuiria seu poder de
defesa. Ele afirma que a legitimidade de um ataque é determinada pela justiça do mesmo, e
não por quem age primeiro ou depois. Para um ataque ser considerado legítimo, Walzer
estabelece três condições: primeiro, deve haver uma intenção e/ou ameaça objetiva por parte
do oponente, não podendo ser baseada apenas em convicções criadas pelo medo do
Uma crítica que pode ser feita à perspetiva de Walzer é que, embora ele faça a distinção entre
guerras preventivas e guerras preemptivas, salvaguardando que uma guerra legítima resulta
apenas de ameaças reais e iminentes, a distinção entre ataques reais e iminentes e meras
provocações é subjetiva. Isso ocorre porque Walzer não faz uma distinção explícita entre uma
intenção objetiva de ataque e uma mera incitação de ataque. Portanto, pode haver guerras
preventivas (não legítimas) que poderiam ser consideradas guerras preemptivas (legítimas)
4 - A Guerra ao Terror
A Guerra ao Terror, que teve início após os ataques de 11 de setembro de 2001, foi uma
resposta ao terrorismo perpetrado pelo grupo extremista Al-Qaeda, liderado por um
iraquiano. O objetivo desse ataque era expressar o descontentamento em relação à
intervenção dos Estados Unidos no Oriente Médio. A Guerra ao Terror foi justificada como
uma estratégia de combate ao terrorismo, visando proteger o mundo de possíveis ataques
provenientes do Iraque. O presidente George Bush argumentou que essa guerra era uma
legítima defesa, recorrendo à ideia de guerra preventiva. No entanto, não houve ameaças ou
provas concretas de que o Iraque iniciaria um conflito contra os Estados Unidos.
Para Kant, essa guerra é ilegítima, pois os Estados Unidos recorreram à violência em vez de
buscar uma resolução diplomática por meio de acordos ou tratados. Além disso, ao adentrar o
território iraquiano e recorrer a hostilidades, como matar e torturar seus habitantes, os
Estados Unidos violaram o 6º artigo preliminar para a paz perpétua de Kant, que estabelece
que nenhum Estado em guerra com outro deve permitir hostilidades que tornem impossível a
confiança mútua na paz futura.
Para Walzer, teoricamente, essa guerra também seria moralmente inaceitável, uma vez que a
ameaça não era considerada iminente ou real, já que não havia indícios ou provas concretas de
que o Iraque iniciaria um conflito ou outro ataque contra os Estados Unidos. No entanto, a
distinção entre um ataque iminente e uma mera provocação representa uma fragilidade na
teoria de Walzer, o que pode levar a considerar essa guerra moralmente aceitável.
Em outras palavras, a Guerra ao Terror foi questionada quanto à sua legitimidade tanto por
Kant, devido à falta de busca de uma solução diplomática, quanto por Walzer, devido à falta de
uma ameaça iminente e à fragilidade na distinção entre provocação e ataque iminente.
5 -Conclusão
Para concluir o ensaio, irei por fim responder da forma mais breve e clara possível à questão,
inicialmente, colocada, que norteia o ensaio: Será legítimo um país iniciar uma guerra
preventiva? Nem a guerra preventiva, nem a guerra preemptiva são legítimas, porque
recorrem ao uso da força/violência e não da diplomacia (razão e constituição) para resolver
um conflito. Os conflitos devem, entre seres racionais, ser sempre resolvidos através da razão
(por meio de acordos, tratados).