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In:
SANTOS, M. F. O.; MORAIS, E. P.; CAVALCANTI, R. J. S. Saussure: outros olhares. Maceió:
Edufal, 2014.
RESUMO: Quando se pensa nas origens da Linguística é comum vir à mente o Curso
de Linguística Geral, de Ferdinand de Saussure, publicado no início do século XX e
considerado como obra episteme da linguística moderna. Este artigo busca, no
entanto, refletir a realização de estudos linguísticos anteriores a publicação do CLG
que de algum modo tenha contribuído para o amadurecimento das ideias de Saussure.
Veja-se que algumas questões linguísticas são discutidas desde os gregos antigos e
mesmo durante a Idade Média a língua fora objeto de investigação e intriga. De modo
que este texto se propõe a questionar porque sendo a língua um objeto investigado há
milênios, a Linguística apenas tenha surgido no início do século XX.
INTRODUÇÃO
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O que podemos pensar em português como os verbos ser e ir, que não apresentam regularidade morfológica no
No período Alexandrino, os gregos desenvolveram uma preferência pela língua
escrita sobre a falada. Acreditavam que a língua literária clássica deveria ser tida como mais
próxima da perfeição, como também, deveria ser almejada por seus falantes. “A admiração
pelas grandes obras literárias do passado encorajou a crença de que a própria língua na qual
elas tinham sido escritas era em si mais pura e mais correta do que a fala coloquial, corrente
de Alexandria e de outros centros helênicos.” (LYONS, 1979, p. 09). Assim, as pessoas
deviam tentar se aproximar dessa língua escrita clássica e tudo que se distanciasse dela seria
erro.
Os filósofos gregos, seguidos pelos estóicos, foram os grandes responsáveis por
estudar e estabelecer as primeiras classes gramaticais que até hoje conhecemos, bem como
uma análise sintática moderna. Platão, por exemplo, foi quem primeiro fez uma definição do
que seriam os substantivos e verbos, ao perceber que há determinados elementos na língua
que dão nome às coisas, enquanto outras marcam ações. Aristóteles notou que um número
grande de palavras não exercia nenhuma das funções determinadas por Platão, e acrescentou
uma terceira classe gramatical que seria o das conjunções. Protágoras, em seguida, notou
que alguns elementos linguísticos eram gramaticalmente masculinos ou femininos ou
neutros. Foi nesse período que também se observou a noção de tempo passado, presente e
futuro, com as flexões verbais.
Veja-se que essa gramática que se apresenta desde os gregos, nasce sob uma ótica
descritiva, em que os seus delineadores observam como os elementos linguísticos se
comportam. Esses estudos linguísticos atravessaram todo o período medieval até a
Renascença. Neste período, na França, surgiram os mestres de Port Royal que defendiam uma
gramática especulativa, cujo principal objetivo era demonstrar que a língua é um produto da
razão e que as diferentes línguas são apenas variedades de um sistema lógico e racional. Os
seguidores de Descartes defendiam uma capacidade inata de adquirir a língua, bem como
questionavam a gramática do bom uso3.
Note-se que até este momento, as investigações e discussões acerca da língua
mostravam-se mais sob um aspecto lógico-filosófico que científico. Estes estudos partiam da
radical e muito menos traços onomatopaicos, dispensando qualquer tentativa de relacionar estes vocábulos a uma
motivação da natureza.
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Esse pensamento, embora bastante criticado pelos estudiosos da época, motivará as ideias inatistas de Chomsky
na segunda metade do século XX.
observação empírica dos estudiosos para chegar aos seus resultados, dispensando um rigor
metodológico-científico para a obtenção de resultados.
Já no século XVIII, com a descoberta do sânscrito, os estudos linguísticos ganharam
novas perspectivas, pois ao perceber que havia uma estreita semelhança entre o grego, o latim
e a língua hindu, puderam ampliar os estudos comparativos entre essas línguas. Até então, as
semelhanças Greco-romanas eram atribuídas mais à questões sociais e políticas que
linguísticas. Com a adição do sânscrito a essa comparação, pôde-se imaginar a possibilidade
de uma única língua originar essas três línguas comparadas, que seria, portanto, o indo-
europeu.
No fim do século XVIII, nasceu uma nova disciplina linguística que logo
recebeu, graças a autoridade de Friedrich Schlegel e depois de Bopp, o nome
de gramática comparada. Essa disciplina, que a partir dos anos de 1810 se
transformou num verdadeiro programa de pesquisa, tomou forma na relação
sistemática de suas perspectivas, acrescentadas à das gramáticas clássicas: de
um lado a comparação das diversas línguas entre si, de outro a história
fonológica e gramatical de línguas em particular. (BOUQUET, 1997, p. 83).
4. A LINGUÍSTICA SAUSSURIANA
O signo linguístico une uma coisa e uma palavra, mas um conceito e uma
imagem acústica. Este não é um som material, coisa puramente física, mas a
impressão (empreinte) psíquica do som, a representação que dele nos dá o
testemunho de nossos sentidos; tal imagem é sensorial e, se chegarmos a
chamá-la “material”, é somente neste sentido, e por oposição ao outro termo
da associação, o conceito, geralmente mais abstrato (SAUSSURE, 2006, p.
80).
Da mesma forma, o signo não tem valor em si mesmo, apenas por convenção social
ele se realiza. Acreditar que não existem fatos linguísticos independentes de uma matéria
fônica, dividida em elementos significativos é o que confere ao signo uma realidade. Isso
leva a crer que em sua existência real, o signo adquire identidade ao se consolidar
socialmente com um mesmo valor linguístico.
O valor linguístico de um signo é sempre paradoxal, tal qual uma moeda, em que há
uma dessemelhança, que a permite possuir um valor diferente de outras moedas, e que
tem como função a possibilidade de ser trocada por um pão, pois ambos têm valores que
se opõem; por outro lado, há um valor semelhante dessa moeda, que permite a sua
comparação com a moeda de outro país. Ou seja, o signo linguístico pode ser comparado
internamente com outros signos da mesma língua, ou externamente com signos de línguas
diferentes.
Assim, fica evidente que o valor do signo se estabelece como tal, por fornecer ao
termo um aspecto de oposição. “Sua característica mais exata é ser o que os outros não são.”
(SAUSSURE, 2006, p. 136). Na significação da língua, só existe uma relação externa de
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Saussure vai defender que os signos linguísticos se relacionam entre si numa organização sintagmática que
permite, por exemplo, a construção de frases em uma língua; do mesmo modo em que se relacionam em nível
mental associativamente (paradigmaticamente) com outros signos ao passo que quando uma pessoa pensa uma
palavra como escola é levada a associá-la com outras como aluno, ensino, professor etc. Mais adiante falaremos
um pouco mais sobre essas relações.
oposição dos signos, o que lhes confere uma identidade.
Para Saussure, cada signo contém seu valor atribuído. O autor argumenta que
sinônimos nunca são exatos, por mais que sejam sinônimos. Isso é possível devido à
oposição do signo estabelecido por seus valores que lhes conferem uma identidade
dessemelhante.
Todavia, o valor linguístico não se limita às oposições da palavra, ele se expande
aos critérios gramaticais, como gênero e número; o que permite, pois, obter-se as definições
opositivas em todas as línguas, quanto ao masculino e feminino, singular e plural, sujeito e
predicado, dentre outros.
Para Saussure, diferentes línguas têm diferentes modos de marcar essas oposições,
pois a língua tem o caráter de convenção social. Se a parte conceitual do valor do signo é
constituída unicamente por relações de semelhanças e diferenças com outros termos da
língua, pode-se dizer que o mesmo acontece em sua parte formal, importando na palavra não
o som em si, mas as diferenças fônicas que permitem uma palavra se diferenciar de todas as
outras.
Acerca da arbitrariedade do signo linguístico, Saussure utilizou o exemplo do jogo de
xadrez, pois se uma peça qualquer, como o cavalo, for substituída por outra, o jogo não será
comprometido, pois o valor que era atribuído ao cavalo, agora pertence à nova peça. Isso será
possível sempre que a peça não for igual às outras, desde que não interfira no sistema de regras
do jogo.
Da mesma forma, acontece com a língua, quando uma palavra se perde, outra lhe
surge no lugar, mantendo o mesmo valor, porém sem ameaçar o sistema linguístico.
Ainda comparando com este jogo, cada alteração na língua ocorre isoladamente,
cada lance acontece por sua vez. Nunca se pode prever os resultados de uma evolução no
signo; são imprevisíveis as consequências provenientes de cada lance. Não adianta lembrar a
sucessão de lances para o jogador; para o falante também não adiante saber a evolução
histórica da língua, apenas compreender o seu estado de funcionamento.
Apenas o que impossibilita uma comparação mais exata entre a língua e o jogo de
xadrez, é a intenção. Neste, há a intenção do jogador ao mover as peças, enquanto que na
língua, toda evolução é involuntária.
Dessa forma, toda e qualquer evolução linguística é permitida desde que preserve
esse traço distintivo entre os signos. Assim, importa menos o que há de matéria fônica em
um signo, do que aquilo que há ao redor do signo, permitindo essa diferenciação. O que
distingue um signo, portanto, é tudo o que o constitui. A diferença é que essa relação lhe
possibilita a caracterização de valor e de unidade.
Nas relações sintagmáticas que são baseadas no caráter linear da língua também se
faz presente a oposição do valor do signo linguístico, excluindo a possibilidade de
pronunciar dois elementos ao mesmo tempo. A oposição que se estabelece entre um termo
pronunciado anteriormente e os posteriores ocorre devido ao valor que é responsável pela
integridade do sistema e assim mantém a significação.
Em nível mental, como já foi adiantado, as ideias se realizam por meio de
oposições, de modo que as relações associativas em que os conceitos se organizam,
existem como uma constelação, em que para cada termo dado, outros termos coordenados
surgem em uma soma indefinida. Essas relações são associadas por oposições de valores
estabelecidos e que se transformam em signos ao proporcionar para essa ideia conceitual, uma
imagem acústica.
Saussure defende que o signo tem um caráter estritamente social, uma vez que não
cabe ao falante alterar o valor do signo, da mesma forma que não cabe ao jogador de xadrez,
isoladamente, acrescentar ou retirar uma peça do jogo.
5. CONCLUSÃO
Desse modo, encerramos o texto, embora não tenhamos feito o mesmo com a reflexão
acerca das origens teóricas de Saussure e da publicação do Curso de Linguística Geral, o que
mudou o rumo dos estudos linguísticos em todo o mundo.
Pudemos aqui considerar alguns pontos da teoria saussuriana que transformaram
Ferdinand de Saussure no pai da linguística moderna, principalmente no que refere aos
conceitos de língua, fala, signo, e ao valor distintivo do signo. Bem como conhecer um pouco
da história dos estudos linguísticos que antecederam Saussure e que muitas vezes é esquecida.
Essa discussão nos permite entender a importância que tem os estudos de Saussure
para a linguística produzida no século XXI, possibilitando uma gama de reflexões sobre o
funcionamento, uso e aplicações da língua que caminham por correntes mais formalistas ou
funcionalistas, mais estruturalistas ou mais discursivas, mais práticas ou mais teóricas e assim
por diante.
6. REFERÊNCIAS