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Da bestial elevação do grande Leviatã, a mítica criatura imortalizada nos escritos

hobbesianos como metáfora do poder autocentrado – o grande ente que organiza e


ordena o âmbito social – até a potentia kantiana de definição soberana de um território,
o conceito de Estado é fruto germinado em diversas terras, regado por ideias, conceitos
e práticas múltiplas. É a organização social máxima, a transcendência da ideia e
materialidade da prática que (ao menos em tese) se impõe acima da transitoriedade dos
governos – e aqui poderíamos nos remeter à autoritas romana e sua correlação com a
potestas.
No caso brasileiro, a partir da Constituição de 1988 e sua forte inspiração social-
democrata, o Estado brasileiro pode ser pensado enquanto ordem jurídica soberana,
fundada no bem comum e na garantia de direitos básicos e universais a partir da
delimitação de um dado território historicamente circunscrito. Ainda que o modelo
constitucional brasileiro seja constantemente atacado por políticas neoliberais – desde
seus primeiros intentos em nossas terras, ainda nos anos 1990 com Collor e FHC,
fundadas numa antropologia filosófica minimalista de exaltação do Homo Economicus
(o triunfo narrativo da ortodoxia econômica, e exaltação de uma natureza humana
hedonista, utilitarista e essencialmente racional e calculista) – a estrutura estatal tem por
função garantir o combate às desigualdades historicamente construídas no Brasil,
oriundas de séculos de exploração, escravidão e etc.
Desta forma, a partir do reconhecimento da educação enquanto direito humano
básico, cabe ao Estado brasileiro garantir a priorização de acesso aos cidadãos por meio
de investimentos e políticas públicas que identifiquem particularidades e questões
específicas, a fim de agir e afiançar melhores resultados. Porém, frente aos percalços
recentemente impostos por minúsculas forças maiores – o vírus e a pandemia – a
vivência educacional, tão definida pelas relações humanas, foi forçada a se adaptar aos
novos tempos de isolamento físico, enfatizando a importância dos laços sociais
constituídos nas novas formas de desencaixe tempo-espaço (para retomar o termo de
Giddens) expressas por redes sociais, internet e plataformas online de aulas remotas.
Tal como expresso anteriormente, se o Estado brasileiro se impõe por meio da
Constituição e esta descreve a centralidade da educação enquanto garantia e dever
público, a inexorabilidade da pandemia impõe a necessidade de ações práticas frente aos
problemas de qualidade de ensino e acesso aos conteúdos. Como é possível observar nas
descritas pesquisas da matéria jornalística, alguns pontos saltam à vista: 1) a falta de
acesso à internet é mais grave em escolas públicas; 2) a instituição de ensino remoto é
um forte obstáculo ainda não superado por grande parte das escolas e universidades; 3)
o ensino remoto, mesmo quando instituído, possui diversos percalços que afetam a
qualidade das aulas; 4) é grande a preocupação de pais sobre os riscos de retorno ao
ensino presencial, frente a persistente onda pandêmica. Tais problemáticas exacerbam
problemas diversos, que vão desde a falta de acesso igualitário ao ensino remoto –
afetando alunos e instituições mais pobres – até preocupações constantes com a
qualidade das aulas e riscos de retornos precipitados.
Pesquisas desta natureza, portanto, são capazes de trazer à tona os problemas
diários frutos da desigualdade de acesso a bens, serviços e direitos básicos e a constante
dificuldade de se readaptar frente a inevitabilidade da pandemia. Tomadas então como
fontes balizadoras que evidenciam problemas, cabe ao Estado fazer-se presente por
meio de políticas públicas que garantam acesso, ao menos minimamente equiparável,
aos meios e ferramentas de compartilhamento da educação, no momento reduzidas à
tecnologia e meios de comunicação. Fazer-se presente por meio de políticas públicas,
tendo por intermédio o exercício do governo, é realizar aquilo especificado na carta
máxima de uma nação, a Constituição.

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