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David Schneider – Parentesco Americano

Prefácio
- Na sociedade ocidental, o parentesco (americano) se diferencia fortemente de outras
instituições sociais. Em outras sociedades, instituições são organizadas como partes do
sistema de parentesco. O que quer um homem faça, ele faz como parente. P.7
- Nos EUA as instituições se diferenciam (eleições não incluem parentes). P.7
- Essa separação nos EUA permite pensar o parentesco em sua “forma pura”, sem
influência de outras instituições. P.8
Introdução
- Trata o parentesco americano como sistema cultural, como sistema de símbolo (uma
coisa que representa outra). Uma cultura consiste num sistema de unidades (qualquer
coisa definida e distinguível, por exemplo um tio, cidade, arte, etc) definidas e
diferenciáveis que mantém certas relações. P.13
- Um fantasma de um morto e um morto são constructos culturais reais e definíveis, ainda
que estes empíricos mostrem que o fantasma não é real (apenas como constructo, ideia).
P.14
- Dizer que um homem morto existe mas o fantasma não capta a veracidade apenas num
nível de discurso (a partir da empiria), mas não capta a importância dos constructos
culturais. Fantasma e homem morto são palavras que representam coisas – TEMA
IMPORTANTE PRA EU DIZER QUE MINHA IDEIA FALA QUE EXISTE FORMA
NATIVA DE DESENVOLVER A REALIDADE DESSAS COISAS EM TERMOS
REAIS E NÃO APENAS SIMBÓLICOS, POR MÉTODOS ESPECÍFICOS. P.14
- A questão não é qual coisa essas palavras representam no mundo real, mas quais coisas
diferentes essas palavras representam. Na palavra homem morto, o referente não é o
defunto em si, mas o conjunto de ideias e significados que constituem esse constructo
cultural. P.15
- Assim, cultura consiste em linguagem. Mas, se a linguagem é, em um de seus
significados, cultura, a cultura não é exclusivamente linguagem. Porque existem
constructos culturais sem palavras correspondentes. P.15
- Os significados dos nomes não são a mesma coisa que unidades culturais, pois algumas
dessas unidades não são nomeadas. Isso sem contar que existem muitas palavras pra
nomear as coisas e cada palavra pode ser aplicada em contextos diferentes. P.16
- Assim, a unidade ou constructo cultural tem realidade própria: fantasmas e mortos são
reais enquanto constructos culturais, mesmo que fantasmas não existam em níveis
diferentes. P.16
- Cultura é regularidade de comportamento, mas não qualquer regularidade. Ainda que
constructos culturais definam também interações e regras, nem sempre estas são
cumpridas (essas são observações da realidade). O livro trata das unidades e regras, não
da observação do comportamento. Importante dizer que regras não se estabelecem pela
observação de comportamento. P.19
- Ainda que a linguagem seja o principal meio em que ocorre a comunicação, a cultura
não se limita a ela. P.22
Parte 1- As características distintivas que definem a pessoa como parente
2- Parentes
- Definição de parente para os americanos: envolvimento por sangue ou casamento (os
por casamento são os “por afinidades”). Mas “parente” também pode ser usado para
diferenciar os parentes de sangue dos de casamento. P.33
- 2 grupos de classificação de parentesco americano: básicos (primo) e derivados (primo
de segundo grau) ou pai (básico) e sogro (pai por afinidade – father in law). 34
- 2 tipos de modificadores: restritivo (parentes de sangue e os que não são, ainda que
comparáveis – mother; step-mother) e não restritivo (alcance: grand-father; great-father).
P.35
- Isso mostra que critérios: o primeiro é a questão do casamento ou sangue. Ao separar
sangue e afinidade, também estabelece distância (primeiro grau, por exemplo) e inclusão
ou exclusão (ex-marido). P.35
- Relação de sangue definida em termos biogenéticos – o que a ciência descobre de novo
define o parentesco, mesmo não conhecido antes. Assim, a formulação cultural é o que a
ciência diz baseada na natureza real (citar essa parte pra discutir natureza e cultura,
falando que, Schneider toma biologia como natureza externa. [não explorar atoa]: Posso
dizer que a biologia está certa na sua relação com a realidade, mas que essa não é a única
forma, pois seus métodos são específicos e captam parte da realidade, não é via do
relativismo que nega tudo). P.36
- Assim, a relação de sangue não pode ser desfeita. Sendo o sangue uma coisa, o grau de
compartilhamento de substância é mensurado e se estabelece uma distância. P.37
- A natureza do sangue implica também na crença do compartilhamento de identidade
comum (seja física ou temperamental). P.37
- Parente de sangue se define pela materialidade do sangue, natural. Casamento nem é
natural e nem material, pode ser encerrado. No termo step, por exemplo, indica
proximidade sem serem parentes (step-mother). P.38
- Parentes por sangue tem a substância natural e o relacionamento, os de afinidade só
relacionamento. Parentes de sangue, então, são relacionados por natureza, ordem natural
na cultura americana. Os de casamento se diferenciam pelo padrão de comportamento,
gerida pela ordem da lei, que especifica na regulamentação, costumes e tradições. P.39
- Assim, há duas grandes ordens culturais: da natureza e da lei (natureza e cultura). P.40
3- Família
- A ideia de família pode abarcar todos os parentes, mas pode indicar a restrição das
relações com pais e filhos. Família para os americanos é uma unidade natural, e o fato da
natureza que serve como símbolo pra definir membros da família é a relação sexual de
pai e mãe. A família, em outro sentido, precisa viver junto. Assim, filhos que crescem,
casam e tem filhos, formam outras famílias, então a primeira se desfaz, ainda que o outro
sentido de família ligado apenas a pais e filhos, permaneça. Também, família sem pai ou
mãe não são família, pois falta membro P.44/45
- Na visão americana, o arranjo de família pai, mãe e filhos é natural. Mulheres geram
filhos e cuidam deles, essa é uma visão da natureza da mulher. P.47
- Os pais devem cuidar dos filhos que são indefesos e os adultos, por serem mais velhos,
sabem o que fazer e daí vem a autoridade sobre a criança. P47
- A natureza constitui a família e os papeis naturais do marido, esposa, pai e mãe definem
os membros da família. Nessa tendência inata, acrescenta-se algo a mais nos papeis:
autoridade do pai baseada nele ser homem, mais velho, experiência, etc. Essa natureza
compõe-se da razão humana (seleciona, altera ou adiciona o que julga ser bom), capaz de
diferenciar as duas naturezas: animal e humana – adiciona-se razão humana no âmbito
animal. O constructo americano da família se dá na combinação natureza e ordem da lei.
Um marido ou esposa que só quer copular é ruim, mas o da total razão, que não quer
copular, é ruim também por não ser natural. A família americana, assim, resolve a
oposição natureza e razão humana. P.48
- Essas relações são chamadas de amor: existe o conjugal entre marido e esposa, em que
se tem sexo e não compartilha sangue e o cognático, baseado na relação de sangue entre
pais e filhos. Amor conjugal é unidade de opostos, amor cognático é unidade de
identidades. P.50
- Entre americanos, macho e fêmea se definem pelas genitais. O macho se define por
certas características agressivas e mulheres passivas. Por isso se considera que mães e
esposas são melhores pra cozinhar, cuidar de casa e de criança, e maridos e pais pra
trabalhar e ter autoridade. Assim, trabalho em casa é trabalho de mulher e de fora de
homem, isso tem menos haver com esposa ou mãe, e mais com mulher. P.53
- As vezes, se atribui à família a delinquência juvenil, quando a culpa é dos pais e não da
família (enquanto constructo). P.56
- Um dos elementos que mostra a separação de parentesco com outros tipos relação é a
separação entre trabalho e lar. Não se misturam, pois o trabalho tem objetivo claro. O lar
não tem finalidade específica. P.57
- Parente não se escolhe. Para parente, vale só quem é, e não o que ele faz, para
empregados, importa o que ele faz. P.58
- Casamento pode ser terminado pois não compartilha substância, parentesco de sangue
compartilha. P.59
- Contrastes como amor e trabalho se especificam no dinheiro que é material e impessoal
e não qualificado moralmente, ao passo que o amor não é material, moral e pessoal. Ele
orienta as bases relacionais do marido e esposa e com os filhos, além de lealdade e
respeito. P.61
- Esses símbolos de amor implicam, na prática, que só se tem sexo com o cônjuge e com
as genitais e não abandonar o lar. O amor, ao significar relação entre pessoas e não coisas,
envolver afeição, confiança, lealdade. Por isso parentesco é movido por amor. Por isso o
adultério não envolve só sexo, mas uma falta com o amor conjugal. P.61/62
- A família, no parentesco americano, se define como um sistema de símbolos que
definem membros e tipos de relacionamentos. Os membros da família se definem em
termos de relação sexual, seja de marido e esposa seja na identidade biológica, e esses
relacionamentos tem o amor como base, que pode se traduzir como “solidariedade difusa
duradoura”. P.64
- Elementos biológicos na definição de parentesco tem qualidade de símbolos: parentes
de sangue compartilham substância e simboliza a unidade, que é simbolicamente
permutável pelo amor. P.64
4- Um parente é uma pessoa
- A decisão sobre quem é parente é de uma pessoa sobre outra. Pessoa é uma categoria
que mistura vários elementos (pode ser professor, pai, policial) que faz algo, que tem
ação. P.69
- Papeis: uma esposa cuida da casa e cozinha. Mas ela faz isso por ser mulher, o que a
distingue como esposa é que ela tem um marido como parceiro sexual. Da mesma forma,
a autoridade do pai vem do fato dele ser homem mais velho. P.70/71
-Mas, nos EUA, o parente como pessoa é diferente da definição de uma pessoa como
parente. A pessoa como unidade cultural se constitui de vários subsistemas (classe, idade,
profissão, sexo, etc). É no constructo da pessoa que se articula esses símbolos (padrão
normativo) e se tem forma de ação. P.71/72
- Esse constructo do parente como pessoa é diferente da pessoa como parente, pois esta
deve mostrar atos específicos de solidariedade difusa duradoura (ou amor) de diversas
formas possíveis (questão relacional, não formação de identidade). P.73
- Uma pessoa é parente se estiver relacionada por sangue ou casamento. A distância pode
ser medida tanto por afinidade ou por grau de compartilhamento de sangue. P.76/77
- Decisão de considerar parente é complicada: alguém pode considerar um primo de 3º
grau parente e um de 2º, mas distante, não ser considerado. P.79
- Nomeação de parentesco na forma de uma árvore de natal: ancestral na ponta de cima e
os descendentes abaixo formando uma base mais larga e firme. Quando se fala dos
parentes por afinidade, é incomum nomear cônjuges desses ou estender muito o sangue.
P.80
- Assim, a decisão sobre quem é parente é da pessoa sobre outra pessoa. P.81
- Quando perguntados, os parentes mortos eram mencionados como tais, seja por
considerar, seja por perguntar se valiam mencionar. Também há parentes distantes que só
se consideram pelo sangue apesar do relacionamento distante. P.81/82
- Questão dos mortos: para judeus, existe um ritual que extingue parentesco por sangue,
então existe ex-filho ou ex-pai, mas o que se extingue é o relacionamento entre eles. Em
outros contextos, as vezes pais e filhos que não se dão bem não se consideram parentes.
Assim se põe a questão dos mortos: é problema pois se extingue o relacionamento, mas
não se desfaz o que era um fato. P.82/83
- Parente famoso também é questão: não tem proximidade e as vezes nem de sangue
direito, mas a fama faz com que seja reconhecido. P.83
- Americanos dizem que parentes estão ligados por sangue ou casamento, mas ao nomear
pessoas concretas, o crucial é se existe relacionamento. P.84
- A questão da distância é crucial, ela pode ser distância física, socioemocional ou
genealógica. P.85
- Assim, o parentesco é apenas um dos domínios da vida de alguém, e considerar ou não
uma pessoa como parente não depende da regra geral (sangue ou casamento). P.86
5- Parentes por afinidade e termos de parentesco
- Parente pode significar 3 coisas: compartilhamento de sangue, possuir algum
relacionamento que segue um código de conduta (solidariedade difusa duradoura) ou
possuir sangue e relacionamento. P.105
- Identificar alguém como parente muitas vezes não se estabelece claramente essa
distinção. A ambiguidade de considerar certas categorias como parentes ou não (esposa
de tio, por exemplo) se dá mais em relação ao relacionamento estabelecido, não como
regra. P.106
- Coito como símbolo fundamental do parentesco, seja por gerar filho que compartilha
substância, seja pela relação das partes – casamento. Casamento então é estrito na questão
sexual (lei), e não permite variações de significados. P.108
- Casamento é um exemplo de relacionamento na lei (com regras) dentro do domínio do
parentesco. A ideia de parentesco por casamento marca uma relação de parentesco. P.109
- O marido ou esposa de um tio ou tia não é chamado de tio ou tia por demarcadores de
posições, mas acima de tudo em termos de proximidade de relacionamento. Mas também
a questão da idade pode indicar certo respeito no tratamento. P.118
Conclusão
- Relacionamento homem-natureza: ativo - busca domínio da natureza. Mas não no
parentesco: o que existe na natureza é o que o parentesco é (relacionamento de sangue).
No sexo, só relações heterossexuais e com base na genital são consideradas naturais
dentro dos limites do casamento. P.120
- Antítese natureza-humano resolvida com base na razão que diferencia animais e
humanos, mas que isso é atributo natural do homem. Na cultura americana, a ordem da
lei é o resultado da ação humana sobre a natureza selecionando o bom, e também
descoberto (prevenção de doenças). Assim, é a cultura que resolve as contradições entre
homem e natureza, e não pode ser vista como oposta à natureza. P.121
- Ao compreender o parentesco como sistema cultural, a ideia de família é o estado de
coisas biológico natural que se centra na reprodução. Por isso que um par de lobos com
seus filhotes também é visto como família. P.121/122
- Na classificação americana, o parentesco de sangue está num extremo (mesmo que
envolva ou não afinidade) e o de afinidade em outro (regulações de conduta). P.122
- Da mesma forma que “homem” inclui-se na natureza como espécie, mas pode ser usada
pra diferenciar da natureza, parente pode significar esposa (por casamento) ou só os de
sangue, tal como família pode significar o sangue ou a unidade pai, mãe e filhos. (pode
ser física, socioemocional ou genealógica). P.123
- Sendo os termos de parentesco polissêmicos, a variância de usos são decisões dos
sujeitos sob condições específicas. As essas variações constituem-se características
distintivas e definidas, ou seja, a variação ocorre segundo um núcleo firme P.125
- Relação sexual é o símbolo central do parentesco. Relação sexual é vista como fato
biológico e biologia é o constructo cultural sobre fatos biológicos. Mas também existem
as crenças (etnociência) sobre os fatos biológicos. A biologia é uma formulação teórica
sobre o parentesco. P.127
- Assim, os constructos de relacionamento no parentesco americano se ajustam aos fatos
da vida e biológicos sobre reprodução. Esses constructos culturais sobre esses fatos
biológicos (ideia de amor, relacionamentos ideais heterossexuais e a ideia do coração-que
não tem nada de biológico) simbolizam algo que não guarda relação intrínseca com o que
eles simbolizam, isto é, a solidariedade duradoura difusa. P.128
- Simbolizam relações interpessoais que humanos precisam ter se quiserem nascer e
crescer. Falam de confiança, amor, solidariedade duradoura – uma construção, um ato
humano de vontade que vai além da especificação irracional da natureza (precisa de sexo
pra procriar). Assim, essa solidariedade difusa duradoura é pré-requisito social e
psicobiológico da continuidade da sociedade e cultura. P.129
- Os fatos biológicos se transformam, pela atribuição de significado, em constructos
culturais, constituindo um modelo de compromisso para ligações apaixonadas e de
confiança. P.129
12 anos depois
- Não existe uma coisa chamada “parentesco”. “O ‘parentesco’, assim como o totemismo,
não é um assunto de estudo, e sim puramente um artefato de uma teoria
demonstravelmente falsa”. Pois essa ideia de parentesco como coisa era no máximo
possível pensando em termos de uma cultura americana. P.131
- A oposição entre substância e código, estabelecida no livro, não é universal, mas
relacionada à cultura americana. P.132
- Problema no próprio livro quando se considera para além de classes médias brancas
americanas.

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