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Dissecção Aórtica

---
Henrique Murad
Felipe Francescutti Murad

... DEFINIÇÃO
HISTÓRICO

.. CLASSIFICAÇÃO
ASPECTOSMORFOLÓGICOS
ETIOPATOGENIA
. EPIDEMIOLOGIA
. HISTÓRIA
NATURAL
.
.. ,
MANIFESTAÇÕES
CLÍNICAS
EXAMES COMPLEMENTARES

.. PROTOCOLOPARADIAGNÓSTICO .
HEMATOMA INTRAMURALE ÚLCERAPENETRANTE

.
..
TRATAMENTO CLÍNICO

TRATAMENTOCIRÚRGICODAS DISSECÇÕES
TIPOA
TRATAMENTOCIRÚRGICODAS DISSECÇÕES
TIPO'B

.. ACOMPANHAMENTOTARDIO
PREVENÇÃO
COMENTÁRIOS
. REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
Capítulo 34
DISSECÇÃOAÓRTICA

Nicholls, também, em 1761, publicou que a morte


DEFINiÇÃO
súbita de George 11,rei da Inglaterra, ocorrida um ano
antes, teria acontecido devido à dissecção aguda da aorta.
As dissecções aórticas se caracterizam pela separação das
Descrição mais detalhada sobre a morfologia das dis-
camadas da aorta por uma coluna de sangue que se ex-
secções foi feita por Maunoir, em 1802, sendo o primeiro
pande longitudinalmente, circunferencialmente e em
a utilizar o termo "dissecção".
variável extensão. Essa coluna de sangue, ao penetrar na
O termo aneurism disséquant (aneurisma dissecante)
camada média, tende a propagar a área de dissecção, po-
foi primeiramente designado por Laennec, em 1819, sen-
dendo ter progressão proximal ou distal. Como conse-
do utilizado difusamente por diversos autores até recente-
qüência dessa divisão da camada média, irão se distin- mente.
guir duas luzes aórticas, separadas por uma lâmina (flaP)
médio-intimal: luz falsa e luz verdadeira.1 Shekelton, em 1822, publicou um caso de dissecção
aórtica crônica com suposta "cura espontânea", tendo
Na maioria dos pacientes a dissecção inicia-se a partir sido o primeiro autor a fazer referência à expressão "aor-
de um ponto de ruptura da camada íntima, que é o orifí- ta em duplo cano de espingarda".
cio de entrado, que origina a dissecção da média. Outros O primeiro caso de dissecção aórtica diagnosticado
pontos de comunicação entre as luzes, os orifícios de reen- em vida foi descrito em 1856, por Swaine e Lathan.
trada, podem ocorrer no trajeto da dissecção (Fig. 34-1).2 As publicações de Shennan (1934), que analisou 300
No seu trajeto de dissecção, ramos arteriais impor- casos extraídos da literatura, e de Hirst et alo(1958), que,
tantes (coronárias, carótidas, renais, tronco celíaco, me- entre 1933 a 1954, reviram 505 casos publicados na lite-
sentéricas, ilíacas) podem ser comprimidos ou ocluídos. ratura inglesa, proporcionaram melhores esclarecimen-
As comissuras da válvula aórtica podem perder a susten- tos dos aspectos da doença, cOVIo etiologia, patogenia,
tação, levando ao aparecimento de insuficiência aórtica manifestações clínicas, história natural, tratamento e
grave. A parede externa aórtica pode se romper, dando prognóstico.4
origem a hemopericárdio, hemotórax, hemorragia retro- A primeira tentativa de tratamento cirúrgico da dis-
peritoneal e morte. Pode ainda haver dilatação da aorta secção aórtica foi feita por Gurin et ai. (1935), que realiza-
com formação de aneurisma.3 ram comunicação entre as duas luzes aórticas (fenestra-
ção), para restabelecimento do fluxo de sangue no inte-
rior da luz verdadeira. O procedimento não impediu o
HISTÓRICO óbito do paciente no sexto dia pós-operatório.
Uma substancial mudança na terapêutica cirúrgica
Morgagni, em 1761, considerado o fundador da anato- ocorreu a partir dos relatos de DeBakey et al., em 1955,
mia patológica, foi o primeiro a descrever com clareza as que preconizavam a excisão da camada íntima afetada,
alterações anatomopatológicas ocorridas nos aneuris- suturas proximal e distal das camadas da aorta obliteran-
mas e dissecções aórticas. Teceu as primeiras considera- do a falsa luz e reconstrução do segmento aórtico incisa-
ções sobre a ruptura da íntima, a penetração do sangue do por interposição de pró tese de dácron.5 Em análise de
originando a falsa luz e a efusão pericárdica. 179 pacientes tratados cirurgicamente, obtiveram 21%

Luzfalsa

Fig. 34-1. Diagrama ilustrando os eventos que


ocorrem na dissecção aórtica, desde a
formação dos orifícios de entrada e saída
(reentrada), até o descolamento do espaço
intramedial e formação do flap médio-intimal,
Luz verdadeira diferenciando uma luz falsa e outra verdadeira.
(Modificado de Macura, 2002.)
Seção IV
.~1I
ANEURISMASARTERIAIS

de mortalidade precoce e 50% de sobrevida em cinco no subtipo lI/a - limitada a aorta torácica descendente, e
anos, concluindo que o tratamento cirúrgico deveria ser lI/b - estendendo-se desde a aorta torácica até a abdomi-
o de escolha para as dissecções aórticas, apesar de a gran- nal (Fig. 34-2).11
de maioria (121) dos pacientes estudados apresentarem A classificação de Stanford, desenvolvida por Daily et
dissecção crônica.6 al., em 1970, tem sido mais amplamente utilizada. É ba-
Wheat et al., em trabalho publicado em 1965, intro- seada na abordagem terapêutica, não estando relacio-
duziram a "terapêutica farmacológica intensiva" e apre- nada à origem ou extensão distal das dissecções e as divi-
sentaram resultados satisfatórios do tratamento conser- de em: tiPo A - quando á aorta ascendente está envolvida;
vador nas dissecções aórticas.7 Este trabalho influenciou tiPo B - quando a aorta ascendente não está envolvida
Daily et alo (1970), que introduziram a classificação de (Fig. 34-2).8
Stanford, e enfatizaram a marcada diferença existente, Outras classificações foram desenvolvidas, como a
dos pontos de vista terapêutico e prognóstico, entre as de Svensson et alo (1999), que inclui formas atípicas de
dissecções que envolviam a aorta ascendente e aquelas dissecção, como os hematomas intramurais e úlceras pe-
que não envolviam.8 netrantes (Fig. 34-3), e a de Guilmet et alo (1993), que se
Diversos aprimoramentos da técnica cirúrgica e a baseia na localização do orifício de entrada e na extensão
melhoria dos cuidados pré e pós-operatórios, realizados da dissecção. No entanto, essas classificações são menos
nas últimas décadas, melhoraram muito os resultados utilizadas.12.13
cirúrgicos, tanto das dissecções tipo "p.:' quanto tipo "B". Existe uma tendência mais moderna de agrupar as
No entanto, as publicações de Dake et aloe Nienaber et al., dissecções aórticas clássicas, os hematomas intramurais e
em 1999, abriram novas perspectivas na abordagem das as úlceras penetrantes de aorta sob a denominação de
dissecções aórticas, ao proporem o tratamento endovas- "Síndromes Aórticas Agudas".14 ~
cular como uma alternativa menos invasiva.9.10 Ainda, as dissecções da aorta podem ser subdividi-
das em agudas ou crônicas, de acordo com o tempo
entre o diagnóstico e o início dos sintomas. Convencia-
CLASSIFICAÇÃO
nou-se denominar aguda, quando o tempo de evolução
Diversas classificaçõesforam postuladas para diferenciar for inferior a duas semanas, e crônica, quando superior a
e tipificar as dissecções aórticas. isso. Apesar de arbitrária, esta definição parece apropria-
A primeira classificação foi descrita por DeBakey et da, pois o paciente que sobrevive à fase aguda da doença
al., em 1965, definindo as dissecções, de acordo com sua apresenta prognóstico mais favorável.
localização e extensão, em três tipos: tiPo / - quando a
dissecção engloba a aorta ascendente e se estende até a ASPECTOS MORFOLÓGICOS
aorta descendente; tiPoII - quando a dissecção se restrin-
ge à aorta ascendente; tiPo /lI - quando a dissecção se ori- Toda dissecção caracteriza-se pela separação das lâminas
gina após a artéria subclávia esquerda, subdividindo-se da camada média, em geral, originada a partir de um

Classificação de D,eBakey Classificação de Stanford


Tipo I Tipo 11 Tipo 11I Tipo A Tipo B

Fig. 34-2. Classificaçõesde DeBakeye Stanford. (Modificado de Kirkline Baratt-Boyes, 2003.)


Capítulo 34
DISSECÇÃOAÓRTICA

Fig. 34-3. Classificação de Svensson -


representação esquemática da dissecção aórtica
e apresentações atípicas: classe 1 - dissecção
aórtica clássica; classe 2 - hematoma intramural;
classe 3 - dissecção aórtica discreta, com
protrusão da parede aórtica; classe 4 - ulceração
de placa aterosclerótica aórtica;
classe 5 - dissecção traumática ou iatrogênica.
(Modificado de Svensson et aI., 1999.)

ponto de ruptura da camada íntima. Através deste orifí- propaga mais freqüentemente no sentido dista! (anteró-
cio uma coluna de sangue aórtico sob pressão penetra e grada), que no proximal (retrógrada).
divide a camada média da aorta. Esta separação médio- Roberts e Roberts (1991), a6 estudarem 182 necrop-
intimal ocorre perpendicularmente ao longo da aorta, sias em pacientes com dissecção, encontraram a seguinte
por uma distância longitudinal variável, ocupando parte distribuição quanto à localização do orifício de entrada
de sua circunferência. Em algumas raras situações pode ao longo da aorta: 70% na aorta ascendente, ocorrendo
envolver toda a circunferência aórtica. cerca de 2 cm acima da válvula aórtica, 12% no arco aór-
O processo de dissecção da aorta, usualmente, ocor- tico, 22% na aorta descendente, imediatamente distal ao
re a partir de dois componentes: uma ruptura com for- ligamento arterioso e 1% na aorta abdominal. Estes da-
mação de um orifício de entrada na camada íntima e a dos são similares aos encontrados por Daily et alo em
desorganização da camada média, promovida por uma 1970 (Fig. 34-5).8.15
degeneração da matriz extracelular. O sangue sob alta Uma vez ocorrida a ruptura intimal, é deflagrado o
pressão, ao penetrar no espaço intramedial através da processo de dissecção da média, podendo ocorrer três
ruptura intimal, disseca a rede de músculo liso, particu- apresentações:
larmente nas áreas onde não há resistência devida ao
1. Ruptura da parede externa da falsa luz: situação fre-
enfraquecimento causado pelo processo degenerativo.
qüente, que habitualmente leva ao óbito. O sítio de
A lâmina de dissecção origina uma falsa luz de aorta,
ruptura normalmente localiza-se próximo ao orifício
que é constituída internamente pelo flap de íntima e par-
de entrada, ocorrendo mais freqüentem ente na aorta
te da média, e externamente por parte da,média e adven-
ascendente, na parede ântero-Iateral direita.
tícia. A parede externa da luz falsa tende a ser mais delga-
da e menos resistente que sua parede interna, e, portan-
to, mais suscetível à expansão aneurismática e ruptura
(Fig. 34-4).1
... t-
A luz verdadeira é a continuidade da luz da aorta ""J,f .... ..
LF
nativa e está separada da falsa luz pelo flap médio-intimal
da dissecção.
A dissecção da aorta na porção ascendente segue um
Ir
It .
trajeto habitualmente para a direita e posterior, logo aci- I- \ LV

ma do óstio da coronária direita. À medida que a coluna


dissecante avança para o arco aórtico, ela tende a tomar
Fig. 344. Preparo histológico de secção transversal de aorta com
uma posição posterior e superior. Na aorta descendente
dissecção. Observa-se que a camada média (corada de lilás) se divide
e abdominal a dissecção comumente tem um trajeto pos- em 2 (setas finas), dando origem à luz verdadeira (LV)e luz falsa (LF).
terior e à esquerda, resultando em maior envolvimento Ambas as luzes são separadas pelo flap médio-intimal (seta grossa).
das artérias renal e iliofemoral esquerdas. A dissecção se (Modificado de Vilacosta e San Román, 1997.)
Seção IV
ANEURISMAS
ARTERIAIS

Tipo A TipoB

57%

Fig. 34-5. Localização do orifício de entrada da


dissecção(A ou B) conforme freqüência.
(Modificado de Daily et ai., 1970.)

2. Ruptura distal da lâmina médio-intimal, criando Durante o trajeto de dissecção da aorta, pode ocor-
pontos de reentrada: a existência de um orifício de rer, ainda, compressão ou dissec~ão de ramos arteriais
reentrada confere um melhor prognóstico ao paci- (Fig. 34-6), levando à estenose ou oclusão, com conse-
ente na fase aguda, pois a despressurização da falsa qüente isquemia distal nos órgãos relacionados.16
luz tende a diminuir a probabilidade de ruptura. Po-
dem ocorrer trombose e cicatrização da falsa luz, ou
ETIOPATOGENIA
evolução para uma fase crônica. Pacientes que evo-
luem cronicamente podem desenvolver aneurismas,
A pa~ogênese da dissecção ainda é um assunto que gera
a partir da dilatação da falsa luz que se mantém per-
bastante discussão. A principal controvérsia reside na
fundida a partir dos orifícios de entrada ej ou reen-
trada. questão do evento inicial. Duas teorias são postuladas
para explicar esta questão:
3. Dissecção da média em "fundo-de-saco": pode-se
observar inicialmente fluxo bidirecional no espaço 1. A primeira teoria afirma que o orifício de entrada na
"intramedial" (fluxos anterógrado e retrógrado), camada íntima é o evento primário na gênese da dis-
que pode evoluir para trombose da falsa luz, sobretu- secção, permitindo a entrada de sangue na camada
do, se o orifício de entrada for pequenô. Apresenta média, levando à separação dos tecidos da parede
melhor prognóstico a longo prazo. aórtica. Este ponto de vista é mais consagrado e

-y
I
I
i
I
\

A B c
Fig.34-6. Mecanismos de obstrução de ramos aórticos na dissecção aguda. (A) Obstrução dinãmica, provocada pelo prolapso do flap
médio-intimal sobre o óstio do vaso durante o ciclo cardíaco. O fluxo na luz verdadeira comprimida torna-se inadequado, gerando má perfusão do
ramo, que permanece anatomicamente intacto. (B) Obstrução estática, devida à dissecção circunferencial, quase completa, com plano de
clivagem estendendo-se para o óstio do ramo comprometendo sua perfusão. Trombose arterial a montante pode piorar quadro. (C) "Fenestração
espontânea" ocorre quando a dissecção médio-intimal preserva o óstio do ramo, mantendo a perfusão distal a partir do orifício na luz verdadeira
através da luz falsa. F= Falsaluz;T = luzverdadeira.(Modificadode Rutherford,2005.)
Seção IV
ANEURISMAS
ARTERIAIS

Tipo A TipoB

Fig. 34-5. Localização do orifício de entrada da


dissecção(A ou B) conforme freqüência.
(Modificado de Daily et ai., 1970.)

2. Ruptura distal da lâmina médio-intimal, criando Durante o trajeto de dissecção da aorta, pode ocor-
pontos de reentrada: a existência de um orifício de rer, ainda, compressão ou dissec)ão de ramos arteriais
reentrada confere um melhor prognóstico ao paci- (Fig. 34-6), levando à estenose ou oc1usão, com conse-
ente na fase aguda, pois a despressurização da falsa qüente isquemia distal nos órgãos relacionados.16
luz tende a diminuir a probabilidade de ruptura. Po-
dem ocorrer trombose e cicatrização da falsa luz, ou
-- .
evolução para uma fase crônica. Pacientes que evo- - -- ETIOPATOGENIA
- -- - -
luem cronicamente podem desenvolver aneurismas,
A pa~ogênese da dissecção ainda é um assunto que gera
a partir da dilatação da falsa luz que se mantém per-
bastante discussão. A principal controvérsia reside na
fundida a partir dos orifícios de entrada ej ou reen-
trada. questão do evento inicial. Duas teorias são postuladas
para explicar esta questão:
3. Dissecção da média em "fundo-de-saco": pode-se
observar inicialmente fluxo bidirecional no espaço 1. A primeira teoria afirma que o orifício de entrada na
"intramedial" (fluxos anterógrado e retrógrado), camada íntima é o evento primário na gênese da dis-
que pode evoluir para trombose da falsa luz, sobretu- secção, permitindo a entrada de sangue na camada
do, se o orifício de entrada for pequen~. Apresenta média, levando à separação dos tecidos da parede
melhor prognóstico a longo prazo. aórtica. Este ponto de vista é mais consagrado e

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A B c
Fig. 34-6. Mecanismos de obstrução de ramos aórticos na dissecção aguda. (A) Obstrução dinãmica, provocada pelo prolapso do flap
médio-intimal sobre o óstio do vaso durante o ciclo cardíaco. O fluxo na luz verdadeira comprimida torna-se inadequado, gerando má perfusão do
ramo, que permanece anatomicamente intacto. (B) Obstrução estática, devida à dissecção circunferencial, quase completa, com plano de
clivagem estendendo-se para o óstio do ramo comprometendo sua perfusão. Trombose arterial a montante pode piorar quadro. (C) "Fenestração
espontãnea" ocorre quando a dissecção médio-intimal preserva o óstio do ramo, mantendo a perfusão distal a partir do orifício na luz verdadeira
através da luz falsa. F = Falsaluz; T = luz verdadeira. (Modificado de Rutherford, 2005.)
Capítulo 34
DISSECÇÃOAÓRTICA

apóia-se em estudos de necropsia e de correlação Os achados histopatológicos típicos de degeneração


com ecocardiografia e ressonância magnética (RM). da camada média, que foram observados em pacientes
2. A segunda tese postula que inicialmente ocorre a for- com dissecção, também ocorrem em pacientes idosos e
mação de um hematoma intramedial, que separa as hipertensos sem dissecção. Dessa forma, muitos autores
lâminas elásticas e gera subseqüente ruptura da ca- consideram as alterações da camada média como impor-
mada intima com formação do orifício de entrada. tante fator predisponente, resultado da combinação de
Esta hipótese foi estabelecida a partir da observação lesões de injúria e reparação produzidas por agressões
de alguns pacientes com dor torácica, sugestiva de hemodinâmicas repetidas, por toda a vida do paciente.
dissecção, e que as imagens iniciais mostraram ape- A agressão hemo dinâmica que a parede da aorta é
nas hematoma intramural sem conexão com a luz da submetida é definida como estresse parietalaórtico(E), que
aorta, mas que tardiamente desenvolveram orifício está relacionado à pressão arterial sistêmica (PA), diâme-
de entrada comunicante com a luz aórtica verdadei- tro luminal (2R) e espessura parietal (G). A lei de Laplace
ra. Considera-se que o evento inicial seja devido à modificada pode expressar este valor em: estresse circun-
ruptura de pequenos vasos da camada média e da ferencial (Ec) = PA x 2R/G e estresse longitudinal (EI) =
vasa vasorum por forças de cisalhamento. PA x 2R/2G. Tortuosidades da aorta torácica descenden-
te encontradas em pacientes com aneurismas e dissec-
A despeito do mérito de uma ou de outra teoria, são ções são uma conseqüência deste estresse longitudinal.
relatados outros fatores como integrantes da patogênese A hiPertensão arterial é o exemplo mais evidente deste
da dissecção da aorta. processo, pois é determinante no aumento do estresse
A integridade da parede aórtica é dependente, sobre- parietal, sendo o principal fator de risco de dissecção
tudo, da capacidade de contenção de suas camadas, que é aórtica, presente em mais de 70% dos pacientes.2o
determinada pelas estruturas bioquímica e anatômica da Da mesma forma: a dilatação aneurismática da aorta e
aorta e pelo estresse hemodinâmico a que é submetida. a diminuição da espessura parietal, também, aumentam o
A desorganização da camada média da aorta favore- estresse sobre a parede aórtica, propiciando a ocorrência
ce o aumento do estresse circunferente, bem como do es- de dissecções, tal qual ocorre na síndrome de Marfan. Estes
tresse de cisalhamento. As alterações degenerativas da pacientes possuem alterações degenerativas relacionadas
média podem ocorrer nas estruturas elástica, muscular a uma proteína estrutural, a fibrilina, que leva à dilatação
ou no colágeno. A perda e a fragmentação de qualquer da aorta e aumenta a sensibilidade dela às forças de cisa-
um destes elementos diminuem a resistência da parede lhamento. A fibrilina é uma glicoproteína, principal cons-
da aorta ao estresse hemodinâmico, propiciando o pro- tituinte das microfibrilas extracelulares, encontradas nas
cesso de dissecção fibras elásticas e são responsáveis pela propriedade de ten-
A lesão degenerativa que envolve a média foi descrita são dos tecidos de sustentação. A síndrome de Marfan,
inicialmente por Gsell, em 1928, porém a denominação descrita pelo pediatra francês Antoine Bernard:Jean Mar-
medionecrosecística idiopática da aorta foi consagrada por fan, em 1896, é uma doença do tecido conjuntivo, autossô-
Erdheim, em 1930.17,18Deve ser ressaltado que a necrose mica dominante, com prevalência de 1/10.000, envolven-
não é uma característica proeminente e inexorável e, por do diversos órgãos e sistemas: musculoesquelético (Fig.
isso, alguns autores preferem chamar de-degeneraçãomu- 34-7), cardiovascular, pulmonar, ocular, pele e tegumento
cóideda média. A lesão tem como característica a perda de e dura-máter (Quadro 34-1).21.22
fibras elásticas e musculares da camada média e a deposi-
ção de material metacromático entre os elementos rema-
nescentes. Grandes quantidades desse material formam
espaços císticos na média. O exame histoquímico revela
que esses espaços císticos são formados pelo acúmulo de
proteoglicanos.
)
No entanto, estas alterações estruturais não explicam
porque algumas aortas se dilatam podendo levar à rup-
tura, outras se dissecam e muitas outras permanecem
livres de qualquer complicação.
Existe uma falsa idéia de que a degeneração da mé-
dia é uma alteração difusa, o que na prática não é obser- Fig. 34-:'. Paciente com síndrome de Marfan, onde se observa
vado, pois uma vez iniciada a dissecção, esta pode esten- aracnodactilia, além de deslocamento medial do maléolo medial,
der-se distalmente, afetando segmentos histologicamente provocando pé plano, que constitui um dos critériosdiagnósticos
normais.19 maiores_
Seção IV
,'LT'.I

ANEURISMAS ARTERIAIS

mEU Critériosdiagnósticos da síndrome de Marfan

Sistema Critérios maiores Critérios menores

Pectus carinatum
Pectus excavatum com necessidade de cirurgia
Pectus excavatum de gravidade moderada
Relaçãoenvergadura/altura> 1,05
Sinal do punho e/ou do polegar Hipermobilidade articular
Escoliose> 200 ou espondilolistese Palato alto e a'rqueado com dentes aglomerados
Sistema esquelético
Redução da extensão dos cotovelos < 1700 Aparência facial (dolicocefalia, hipoplasia malar,
enoftalmia, retrognatismo e fissuras palpebrais
Deslocamento medial do maléolo medial, causando inclinadas)
pé plano
Protrusão acetabular em qualquer grau

Córnea plana (avaliada por ceratometria)


Aumento axialdo comprimento do globo ocular
Sistema ocular Ectopia do cristalino (medida por USG)
íris hipoplásicaou hipoplasia do músculo ciliar,
provocando miose

Prolapso de válvulamitral com ou sem insuficiência


mitral
Dilatação da aorta ascendente com ou sem Dilatação da artéria pulmonar, na ausência de outras
insuficiênciaaórtica, envolvendo pelo menos dois causas, em < 40 anos "
Sistema cardiovascular seios de Valsalva
Calcificaçãodo anel mitral em < 40 anos
Dissecçãoda aorta ascendente
Dilatação ou dissecção da aorta descendente torácica
ou abdominal em < 50 anos

Pneumotórax espontâneo
Sistema pulmonar Nenhum
Bolhas apicais (avaliadas nos raios X de tórax)

Estriasatróficas, não relacionadas à perda de peso,


Pele e tegumento Nenhum gravidez ou estresse repetitivo
Hérnias recorrentes ou incisionais

Dura-máter Ectasia durallombossacra na TC ou RM Nenhum

Parente de primeiro grau com síndrome de Marfan


(por estes critérios)
Presença de mut~ção do gene FBN1 capaz de causar
Históriafamiliare genética síndrome de Marfan Nenhum
Presença de halotipo do gene FBN1, herdado por
descendente conhecido, associado à síndrome de
Marfan diagnosticad~ na família

Não havendo história familiarou critério genético, é necessário haver 2 critérios rttaioresem sistemas diferentes e o envolvimento de um
terceiro sistema.

Havendo história familiarou genética positivaé necessário haver um critério maior relacionado a um sistema, com um segundo sistema
envolvido.

*Para se considerar que o sistema esquelético está envolvido devem estar presentes pelo menos 2 critérios maiores ou 1 maior e 2 menores; para o sistema
ocular devem estar presentes pelo menos 2 critérios menores; e para os demais sistemas basta que 1 único critério, maior ou menor, esteja pFesente.
Extraído de De Paepe et ai., 1996.
Capítulo 34
DISSECÇÃOAÓRTICA

Além da pressão arterial e do estresse parietal a ela por um defeito estrutural no colágeno tipo lU e caracteri-
relacionado, outra força tem papel importante, não só na za-se por hipermobilidade articular, hiperextensibilidade
formação do esgarçamento da íntima, mas também na da pele e fragilidade dos tecidos conjuntivos.
propagação da dissecção aórtica: o impulso cardíaco ou Uso de cocaína e anfetamina em pacientes previamen-
onda de pressão de pulso (dp/ dt máx.), resultado da con- te saudáveis e normotensos têm sido descritos como fato-
tratilidade do coração e da natureza pulsátil do fluxo res etiológicos.
aórtico. É possível comprovar experimentalmente que o Outras causas de dissecção aórtica incluem: aneuris-
controle da pressão arterial e a redução do dP/dt podem mas, ectasia anuloaórtÜ;a,hiPoPlasia de arco aórtico, aortites,
inibir de forma eficaz a propagação da dissecção.23 síndrome de Turner, síndrome de Noonan e lúpus eritematoso
Em mulheres abaixo de 40 anos, 50% das dissecções sistêmico, que, embora mais raras, têm sido citadas na lite-
aórticas ocorrem na gravidez.24 Contudo, o número de ratura.
pacientes com dissecção aórtica durante a gravidez é pro- Há, ainda, algumas lacunas na explicação do papel
porcionalmente baixo. Existe uma importante relação de alguns fatores no desenvolvimento das dissecções da
entre dissecção aórtica em mulheres grávidas e hiperten- aorta, embora os principais agentes etiológicos estejam
são arterial. Alterações hormonais e associação com sín- bem estabelecidos.
drome de Marfan também explicam a predisposição de
mulheres grávidas à dissecção. O sítio mais comum de EPIDEMIOLOGIA
-
acometimento é a aorta proximal, e a doença comumen-
te ocorre no 3Qtrimestre da gestação ou durante o pri- Sua incidência varia de 0,5 a 3 casos por 100.000 pessoas
meiro estágio do trabalho de parto.
por ano, de acordo com a prevalência dos fatores de risco
Indivíduos com válvula aórtica bicúspide apresentam na população estudada. Nos Estados Unidos, em estudo
alto risco de desenvolver dissecção da aorta: acredita-se recente, a incidência foi estimada em 2,9 casos por
que jatos assimétricos de alta velocidade, através das vál- 100.000 habitantes por ano, com cerca de 7.000 novos
vulas bicúspides, podem alterar a distribuição do estresse casos ao ano.26 No Brasil não há dados específicos, no
na primeira porção da aorta ascendente. Diversos estu- entanto, com o crescimento da população de idosos e a
dos têm demonstrado também que pacientes com válvu- elevada incidência de hipertensão, a dissecção aórtica
la aórtica bicúspide apresentam alterações da fibrilina na
te~ sido descrita com maior freqüência.
aorta ascendente e tronco da artéria pulmonar.25
O sexo masculino é o mais freqüentemente acometi-
A dissecção aórtica pode ocorrer, também, tardia- do, com uma relação sexo masculino/feminino que po-
mente, após trocavalvar aórtica. Admite-se que as modifi- de chegar a 5:1.4
cações hemodinâmicas provocadas pela doença valvar
O Registro Internacional de Dissecção da Aorta
provoquem alterações estruturais na aorta que propici- (IRAD), baseado na análise de 464 pacientes em 12 cen-
am o processo de dissecção. tros de referência, demonstrou incidência de 65,3% do
Coarctaçãoaórtica também está associaqa à dissecção, sexo masculino, e uma idade média de 63 anos. A dissec-
provavelmente, por causar hipertensão arterial e por fre- ção proximal (tipo A) foi identificada em 62,3% dos paci-
qüentemente estar associada à válvula aórtica bicúspide. entes, com pico de idade variando entre 50 e 60 anos, e a
iatrogênicas,emgera~ocorremapós canula-
As dissecções dissecção distal (tipo B) esteve presente em 37% dos paci-
ções arteriais ou induzidas por incisão cirurgica da aorta entes, com pico de ocorrência entre 60 e 70 anos.20 As
e representam cerca de 5% dos casos de dissecção. Nor- dissC'{,cçõesem pacientes com menos de 40 anos afetam,
malmente estão relacionadas à gravidade da doença ate- principalmente, portadores de síndrome de Marfan e
rosclerótica.
mulheres grávidas.27,28
Por outro lado, a doença ateroscleróticanão parece aumen- Januzzi et ai., ao relatarem a análise do lRAD em 2004,
tar o risco de dissecção aórtica espontânea clássica, mas demonstraram que pacientes abaixo de 40 anos com dis-
favorece o desenvolvimento de duas variantes: o hemato- secção aórtica tinham cerca de 50% de associação com sín-
ma intramural e a úlcera penetrante de aorta. drome de Marfan e 34% de associação com hipertensão
O trauma da aorta é uma causa incomum de dissec- arterial. Já, pacientes com dissecção aórtica acima de 40
ção, geralmente, relacionado a movimentos de desacele- anos apresentavam 72% de relação com hipertensão arte-
ração, ocorrendo mais freqüentemente na região do ist- rial e apenas 2% de relação com síndrome de Marfan.29
mo da aorta. Há um padrão circadiano na apresentação aguda da
A síndrome de Ehler-Danlos, doença hereditária do dissecção aórtica. Isselbacher relata que no hemisfério
tecido conjuntivo, é também descrita como fator de risco norte ocorre mais freqüentem ente no mês de maio entre
para dissecção aórtica, sobretudo o subtipo IV. É causada 6 e 12 horas.3o
Seção IV
ANEURISMASARTERIAIS

HISTÓRIA NATURAL tanto, nos pacientes com dissecção subaguda ou crônica,


a ausência de dor é mais freqüente. A dor é de início súbi-
Segundo trabalho de Hirst (1958), a relação temporal to e tipicamente de forte intensidade, sobretudo no prin-
entre mortalidade cumulativa e o início da dissecção agu- cípio. Em alguns momentos pode ser incapacitante, ge-
da da aorta é a seguinte: nas primeiras 24 horas morre rando grande agitação por parte do paciente, que comu-
21 % dos pacientes; em 48 horas este percentual se eleva mente descreve a sensação de estar sendo "rasgado por
dentro".
para 37%; chegando a 49% em quatro dias e 74% em
duas semanas. Desse modo, depreendemos que na histó- A dor na dissecção aórtica aguda difere da dor típica'
ria natural das dissecções agudas ocorre cerca de 1% de do infarto agudo do miocárdico, na sua característica e
mortalidade por hora, nas primeiras 48 horas.4 intensidade, tanto no seu início quanto no decorrer da
A mortalidade com tratamento clínico, nos três pri- evolução. A precordialgia típica do infarto agudo do mio-
meiros meses, é de 90% nas dissecções do Tipo A e de cárdio usualmente tem um caráter progressivo e em cres-
25% nas dissecções do Tipo B.31
cendo.
Outra característica importante da dor na dissecção
aórtica é a tendência de migrar do ponto de origem para
MANIFESTAÇÕES CLíNICAS
outros sítios, geralmente acompanhando o trajeto de
o diagnóstico da dissecção aguda da aorta pode ser for- dissecção.
temente suspeitado a partir de parâmetros clínicos de A localização da dor pode ser bastante sugestiva do
anamnese e exame físico (Fig. 34-8). tipo de dissecção. Spitell et alo demonstraram que quan-
Os principais relatos sobre as manifestações clínicas do a dor tem localização ou maior gravidade na face ante-
da dissecção aórtica aguda são encontrados nas antigas rior do tórax, há envolvimento,da aorta ascendente
séries de Slater e De Sanctis e Spittel et al., assim como na (tipos I e II da classificação de DeBakey) em mais de 90%
recente análise do IRAD, que avaliou 464 pacientes em dos casos. Inversamente, quando a dor tem localização
12 centros de referência.2o,32 interescapular, cerca de 90% dos pacientes têm a aorta
O sintoma inicial mais comum é a dor, que é encon- descendente envolvida (tipos I e III). A presença de dor
trada em cerca de 96% dos pacientes. Os casos de dissec- no pescoço, mandíbula ou face prediz o envolvimento do
ção aórtica aguda que cursam sem dor são raros, entre- arco .aórtico e aorta ascendente, enquanto forte dor em

Dissecção aguda da aorta

Compressão/Obstrução/Dissecção Ruptura
vascular da aorta

Insuficiência
Infarto
cardíaca isquemia
agudo do renal
aguda miocárdio

Acidente
vascular Isquemia
cerebral mesentérica
isquêmico

Choque
~.
Insuficiência
vascular
periférica
aguda Fig. 34-8. Correlação entre fisiopatologiae
achadosclínicosna dissecçãoagudada aorta.
(Extraído de Recomendaçõesda SOCERJ -
DissecçãoAguda da Aorta, 2003.)3
Capítulo 34
DISSECÇÃOAÓRTICA

qualquer lugar nas costas, abdome ou membros inferio- de dissecção pode obstruir diversos ramos aórticos ou
res sugere envolvimento da aorta descendente. A suspei- provocar compressão induzindo este fenômeno. Pares te-
ta clínica deve aumentar nos casos de dor acima e abaixo sia unilateral e fraqueza muscular sugerem isquemia agu-
do diafragma.33 da de nervo periférico.
Em raros casos, pode ocorrer dor pleurítica devida à Insuficiência cardíaca congestiva aguda reflete, na
pericardite aguda, como conseqüência de hemorragia grande maioria das vezes, a presença de insuficiência
para o espaço pericárdico na dissecção da aorta ascen- aórtica grave, conseqüência da dissecção da aorta ascen-
dente. dente. A insuficiência aórtica é uma complicação impor-
Manifestações vasovagais associadas ao quadro álgi- tante e comum, presente em mais de 50% das dissecções
co podem ocorrer, como: sudorese, náuseas e vômitos. tipo A.
Conforme o tipo de dissecção e as complicações rela- Em uma pequena minoria (1% a 2% dos casos), a dis-
cionadas, diversos outros sintomas, menos comuns, po- secção tipo A pode envolver o óstio das artérias coroná-
dem acontecer: síncope (9,4%), insuficiência cardíaca rias, causando infarto agudo do miocárdio. Isso ocorre
congestiva (6,6%), acidentes cerebrovasculares (4,7%), is- mais comumente com a artéria coronária direita, o que
quemia visceral ou de membros, paraplegia, parada car- explica a associação freqüente com infartos da parede in-
díaca, morte súbita (IRAD).2o ferior do miocárdio. As manifestações clínicas da dissec-
A síncope freqüentemente está relacionada à instabi- ção da aorta e do infarto agudo do miocárdio se confun-
lidade hemodinâmica e à dissecção aguda tipo A. Tais dem, podendo um ou outro diagnóstico ser mascarado.
pacientes apresentam alta taxa de mortalidade quando A infiltração de tecidos adjacentes pelo hematoma
comparados àqueles sem síncope e, comumente cursam formado após ruptura ou a expansão aórtica pela falsa
com tamponamento cardíaco e/ou acidente vascular luz pode resultar em compressão de estruturas próxi-
cerebral associado. Nesses casos, em geral, ocorre cho- mas, ocasionando: disfagia, comprometimento das vias
que cardiogênico decorrente de hemopericárdio e do aéreas, síndrome de veia cava superior, rouquidão por
tamponamento cardíaco, mas, o choque pode ser hipovo- compressão do nervo laríngeo recorrente, síndrome de
lêmico, quando ocorre ruptura aórtica. Quando analisa- Horner por lesão do plexo cervical simpático.
da isoladamente como fator independente, a síncope
A extensão da dissecção para a aorta abdominal po-
parece não aumentar a mortalidade.34
de causar isquemia visceral. O comprometimento da ar-
Em geral, a ruptura na aorta ascendente ocorre para téria renal (uma ou ambas) ocorre em 5% a 8% dos casos
o pericárdio, levando ao tamponamento cardíaco e à e pode levar à isquemia ou infarto, resultando em grave
ruptura da aorta torácica descendente para o espaço
hipertensão arterial e falência renal. Isquemia e infarto
pleural, podendo provocar volumoso hemotórax.
mesentérico são também complicações ocasionais da dis-
Manifestações neurológicas ocorrem em 6% a 19% secção aórtica abdominal, vistos em 3% a 5% dos pacien-
de todos os casos de dissecção aórtica, sendo mais co- tes.34
mum nas proximais. As síndromes neurológicas ocorrem
A dissecção aórtica quando atinge as artérias ilíacas
como conseqüência de isquemia cerebral, da medula es-
pode obstruir o fluxo, provocando isquemia de mem-
pinal ou dos nervos periféricos.34 bros inferiores.
Acidente vascular cerebral, em geral, está relacionado
Embora extremamente variados os achados do exa-
ao acometimento do tronco braquiocefálico ou da caróti-
da esquerda, sendo a complicação neurológica mais co- me físico geralmente refletem a localização da dissecção
mumente vista. aórtita e a extensão do envolvimento cardiovascular.
A oclusão de uma ou mais artérias intercostais e/ou A hipertensão é vista em cerca de 70% dos pacientes
artéria de Adamk.iewicz, associado a uma circulação cola- com dissecção aórtica tipo B, no entanto, é menos co-
teral pouco proeminente, pode comprometer a perfusão mum nos pacientes com dissecção tipo A (36%). Instabili-
medular, sobretudo nas dissecções envolvendo a aorta dade hemodinâmica, por outro lado, ocorre mais comu-
descendente. O dano isquêmico à medula espinal pode mente nos pacientes com dissecção tipo A.do que tipo B
provocar paraparesia e paraplegia, e em raros casos tetra- (25% e 4% respectivamente), geralmente relacionado a
paresia, tetraplegia, síndrome do corno anterior da me- tamponamento cardíaco, regurgitação aórtica grave, ou
dula ou mielopatia ruptura (IRAD).20
A neuropatia periférica é uma manifestação extre- O envolvimento do tronco braquiocefálico ou artéria
mamente rara na dissecção aórtica, pois os nervos perifé- subclávia esquerda pode resultar em uma medida impre- .
ricos possuem um rico suprimento vascular e baixa ne- cisa da pressão arterial, decorrente da compressão ou
cessidade metabólica, no entanto, a progressão do flap oclusão, suscitando "falsa" instabilidade hemo dinâmica.
Seção IV
ANEURISMAS
ARTERIAIS

Os achados ao exame físico mais tipicamente associa- mimetizada por várias outras doenças (Quadro 34-2),
dos à dissecção aórtica são: ausência ou diminuição de seja no evento agudo ou crônico, seja relacionada ao tipo
pulso, sopro diastólico de insuficiência aórtica e manifes- A ou B.35Embora o diagnóstico se baseie principalmente
tações neurológicas. na suspeição clínica, é necessária uma adequada investi-
Ausência ou diminuição de pulso em pacientes com gação complementar para confirmação.
dor torácica de início agudo sugere a presença de dissec- A confirmação diagnóstica ou o estabelecimento de
ção aórtica. Tanto nos membros superiores quanto nos um diagnóstico diferencial faz-se necessária e deve ser
inferiores, o déficit de pulso, sobretudo, quando assimé- buscada exaustivamentf, devendo delineá-Ia conforme as
trico, é resultado da compressão e obstrução dos ramos manifestações clínicas, estabilidade do paciente e exames
aórticos pelo flap de dissecção. Ocorre em até 50% dos disponíveis.
pacientes com dissecção tipo A e em somente 15% a 20%
dos casos de dissecção tipo B. Alterações do pulso po- ELETROCARDIOGRAMA (ECG)/LABORATÓRIO
dem ser normalizadas com a descompressão da falsa luz OS achados eletrocardiográficos de dissecção aórtica são
por uma reentrada distal ou por movimentação do flap inespecíficos. Cerca de um terço dos pacientes irá apre-
adjacente a ramos obstruídos. sentar sinais de hipertrofia ventricular esquerda, secun-
A insuficiência aórtica ocorre devida à perda de sus- dários à hipertensão arterial, e outro terço terá ECG nor-
tentação das comissuras da válvula aórtica, cursando com mal. No entanto, o ECG é fundamental, sobretudo, no
sopro cardíaco característico em 16% a 67% dos pacientes. diagnóstico diferencial de dor torácica relacionada à co-
O sopro é diastólico, mais audível ao longo da borda ester- ronariopatia, ou, ainda, no diagnóstico de isquemia mio-
nal direita, varia de intensidade de acordo com a pressão cárdica em paciente com dissecção aórtica cujo flap inti-
arterial e tende a tornar-se mais intenso quando o paciente mal envolveu o óstio das artérias coronárias.
é auscultado na posição sentada. Dependendo da gravida- Em pacientes com síndrome ~oronariana aguda, em
de da insuficiência, sinais periféricos de incompetência especial o infarto agudo do miocárdio, deve-se afastar a
valvar aórtica podem estar presentes, tais como colapso possibilidade da presença de dissecção aórtica, pois esses
dos pulsos e alargamento da pressão de pulso. Insuficiên- pacientes que também apresentam dor torácica têm indi-
cia aórtica grave pode evoluir com insuficiência cardíaca cação do uso de trombolíticos e anticoagulantes, que na
congestiva, podendo apresentar diminuição ou ausência dissecção aórtica podem ser catastróficos.
do sopro cardíaco e ausência de sinais periféricos. Os exames de laboratório, também, são inespecífi-
A ausculta de atrito pericárdico pode refletir sangra- cos para o diagnóstico de dissecção aórtica. Podem ocor-
mento para o saco pericárdico conseqüente à ruptura rer anemia e leucocitose discretas, dependendo do volu-
aórtica. me de sangue seqüestrado pela falsa luz e, muito rara-
Também podem ser observadas manifestações abdo- mente, coagulação intravascular disseminada, por consu-
minais, como massa pulsátil, devidas à dilatação da aorta mo de plaquetas e fatores de coagulação. A presença de
ou ramos, dor abdominal, hemorragia dige~tiva e irrita- hemólise na falsa luz pode elevar os níveis de bilirrubina
ção peritoneal decorrentes de isquemia visceral, sobretu- (sobretudo, indireta) e LDH. Elevação de enzimas, como
do mesentérica, além de hematúria, oligúria ou anúria,
que, embora raras, pressupõem comprometimento renal.
Em caso de ruptura, hemopericárdio, hematoma j ~~ Diagnósticodiferencial
mediastinal, hemotórax, hematoma retroperitoneal, he- . Sínqrome coronariana aguda
moperitônio e fístulas aortodigestivas (especialmente no . Aneurisma torácico e/ou abdominal sem dissecção
esôfago) podem ser encontrados. . Insuficiência aórtica aguda sem dissecção
Derrame pleural nos pacientes com dissecção aórti-
ca é mais comum à esquerda e inicialmente se deve a
uma reação inflamatória exsudativa periaórtica.
.
.

.
Insuficiência
Pericardite
Pneumotórax
cardíaca

Quadros febris também são descritos, relacionados à . Embolia pulmonar


absorção de substâncias piogênicas devidas à hemólise . Abdome agudo
na falsa luz. . Síncope
. Acidente vascular encefálico
. Dores musculoesqueléticas
EXAMES COMPLEMENTARES
. Tumores de mediastino

A dissecção aórtica se manifesta por uma grande diversi- (Modificado de Recommendations of Task Force on Aortic Dissection -
dade de apresentações clínicas, mimetizando ou sendo EuropeanSocietyof Cardiology,2001.)
Capítulo 34 .---...
DISSECÇÃOAÓRTICA

CPK, CK-MB, troponina, mioglobina, TGO, TGP, amilase derrame pericárdico e derrame pleural. No entanto,
e fosfatase, pode significar comprometimento coronariano apresenta baixa sensibilidade (590/0-85%)e especificidade
ou visceral. Quando há envolvimento renal, pode ocorrer (630/0-96%)globais, sobretudo em pacientes com envolvi-
elevação das escórias nitrogenadas (uréia e creatinina). mento da aorta descendente. Esta baixa acurácia diag-
nóstica é o maior fator limitante para o uso da técnica.
RADIOGRAFIA DE TÓRAX Ainda, a qualidade da imagem pode ser afetada em de-
corrência de obesidade, enfisema pulmonar, ventilação
Os achados de dissecção aórtica na radiografia de tórax
mecânica ou espaços iptercostais reduzidos.34
são pouco específicos e raramente determinantes no
Com o advento da ecocardiografia transesofágica hou-
diagnóstico, no entanto, são de grande valor quando cor-
ve uma melhora substancial na capacidade diagnóstica do
relacionados ao quadro clínico.
método. A ausência de estruturas entre o esôfago e a aorta
Apenas uma pequena porcentagem dos pacientes
torácica, associada a sondas multiplanares e transdutores
com dissecção aórtica terá o exame radiológico simples
de alta freqüência, permitiu a obtenção de imagens bem
de tórax completamente normal « 10%). Devem ser
defmidas. O ecocardiograma transesofágico permite uma
obtidas radiografias de tórax nas posições ântero-poste-
boa visualização de toda, aorta torácica, com exceção de
riar, perfil e oblíqua anterior esquerda.
um pequeno segmento da aorta ascendente próxiIno ao
A alteração mais comummente encontrada é o alarga-
arco aórtico. Resultados de estudos prospectivos demons-
mento do mediastino, presente entre 80% e 90% dos casos.34
traram sensibilidade de 98-99% e especificidade de
Outra alteração radiológica freqüente é a presença 940/0-97%.Trata-se de exame semi-invasivo, realizado à bei-
de derrame pleural que, segundo Hata et alo(2002), ocor-
ra do leito, em tempo real que possibilita o estudo da mor-
re mais tardiamente, em média cerca de quatro dias e
fologia da dissecção, do envolvimento dos óstios coronários
meio após o diagnóstic<;>e foi observado em 87,5% dos
e da presença de possíveis compficações. Permite o diag-
pacientes, sendo 73,8% bilateral e em 23,2% somente à nóstico de insuficiência aórtica e derrame pericárdico em
esquerda. Os autores associam a presença de derrame
100% dos casos e possui sensibilidade de 73% para identifi-
pleural à reação inflamatória da pleura mediastinal. 36
cação do orificio de entrada. Não deve ser realizado em
Na presença de calcificação do botão aórtico, uma
pacientes com disfagia e sangramento digestivo altO.34
separação maior que 1 cm da calcificação da íntima em
Além de excelente método diagnóstico, o ecocardio-
relação ao contorno externo da aorta ("sinal do cálcio") é
grama transesofágico também fornece dados importantes
sugestiva, mas não diagnóstica, de dissecção aórtica. O
no manuseio intra-operatório, podendo ser fundamental
sinal do cálcio é a única alteração radiológica com nível
para orientação da conduta cirúrgica. Permite monitoriza-
de significância (P = 0,05) para distinção das dissecções
ção da função ventricular global e segmentar, verificação
tipos A e B.20.33
do correto posicionamento da perfusão arterial na luz ver-
Irregularidades do contorno aórtico, como "borra-
dadeira, durante circulação extracorpórea e identificação
mento" do botão aórtico; disparidade de calibres entre
de insuficiência aórtica residual, especialmente importan-
aortas ascendente e descendente; dupla densidade da aor-
tes nos pacientes com dissecção da aorta ascendente (tipo
ta descendente, delineada por uma luz verdadeira mais
A). Também possibilita avaliação da correta expansão e
densa em contrapartida a uma luz falsa menos densa, são
do posicionamento de endopróteses aórticas na aborda-
achados que também podem auxiliar no diagnóstico.
gem endovascular, podendo determinar se houve oclusão
ECOCARDIOGRAFIA do orifício de entrada e exclusão da falsa luz.

TRANSTORÃCICA/TRANSESOFÃGICA
TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA (Te)
O exame ecocardiográfico é extremamente útil na avalia-
ção de pacientes com dissecção aórtica, pois é um método Possibilita o diagnóstico de dissecção aórtica pela visuali-
pouco invasivo, de rápi?a realização, baixo custo, que zàção do flap intimal, separando duas luzes aórticas que
pode ser feito à beira do leito, estando amplamente dispo- são distinguidas por diferentes taxas de opacificação do
nível na maioria dos hospitais. É o exame preferencial a contraste (Fig. 34-9).
ser realizado em pacientes hemodinamicamente instáveis. Quando há trombose completa da falsa luz pode ha-
É importante lembrar que se trata de métodos de- ver dificuldade de diferenciação entre dissecções e aneu-
pendentes do examinador, onde a curva de aprendizado rismas aórticos com trombo mural. Nestes casos, a presen-
influi fundamentalmente nos resultados. ça de cálcio na luz da aorta pode cyudar no diagnóstico.
O ecocardiograma transtorácico pode ser útil no TC helicoidal permite reconstruções tridimensionais
diagnóstico de dissecção aguda da aorta ascendente, ou da aorta e ramos, aumentando a acurácia diagnóstica,
na detecção de complicações, como insuficiência aórtica, possibilitando correlações anatômicas.
.ml Seção IV
ANEURISMAS
ARTERIAIS

Fig. 34-9. Paciente masculino, 61 anos, com


déficit neurológico compatível com isquemia de
hemisfério cerebral direito e discrepância da
pressão arterial nos membros superiores.
Realizou TC de urgência que evidenciou
A dissecção aórtica tipo A. Evoluiu com parada
cardiorrespiratória e óbito 15 horas após
exame. (A) Complexa dissecção, envolvendo
arco aórtico, tronco braquiocefálico e artéria
carótida esquerda, podendo observar-se o flap
médio-intima!. (8) Flap de dissecção
determinando 2 luzes na aorta ascendente e
na descendente. (C) Volumoso hemopericárdio
com compressão do ventrículo direito
(confirmado postetiormente por
ecocardiograma). (D) Extensão da dissecção
até a aorta abdominal, não havendo
visualização da artéria renal direita nem
c contrastamento do parênquima renal direito.

Diversas séries têm demonstrado sensibilidade e es- Ressonância magnética (RM)


pecificidade para o diagnóstico de dissecção aórtica por Trata-se de método não-invasivo, que não utiliza radiação
TC entre 96% e 100%.35.37
ionizante e que permite o estabelecimento do diagnósti-
Apresenta como vantagem ser um método não-inva- co sem utilização de contraste iodado. A obtenção de
sivo que, além de estabelecer o diagnóstico, possibilita imagens de alta resolução nos planos transversal, sagital
avaliação da presença de derrame pericárdico ou pleu- e coronal permite reconstruções tridimensionais, que
ral, do comprometimento de ramos nos segmentos torá- facilitam o diagnóstico da dissecção aórtica, possibilitan-
cico e abdominal e da presença de trombo"na falsa luz. do determinação da extensão e de possíveis complica-
Entretanto, apresenta algumas desvantagens, como: ne- ções (Fig. 34-10).
cessidade de utilização de contraste iodadp intravenoso,
A RM apresenta sensibilidade e especificidade seme-
radiação ionizante, não detecção de insufi,ciência valvar lhantes à TC, em torno de 98%.39
aórtica ou comprometimento coronariano, além de
menor acurácia para detecção precisa da localização do Apgiorressonância magnética com a utilização de
contráste intravenoso com sais de gadolínio (menos ne-
orifício de entrada, sobretudo quando comparado à arte-
frotóxico e alergênico que o contraste iodado, emprega-
riografia.
do na TC) é utilizada para avaliar os ramos aórticos, defi-
Tomógrafos mais modernos com múltiplos canais de
nindo patência e possível presença de dissecção.
detecção possibilitam a aquisição de imagens com altíssima
resolução e reconstruções tridimensionais precisas. Tais A introdução de técnicas de RM dinâmica permite o
aparelhos podem ser utilizados para avaliação de doença diagnóstico de insuficiência aórtica com- sensibilidade
em até 85%.35,40
coronariana, assim como, permitem estabelecer com exati-
dão a medida dos diâmetros aórticos, aspectos fundamen- No entanto, o campo magnético gerado limita a pre-
tais no manuseio terapêutico dos pacientes com dissecção sença de equipamentos de monitorização e suporte na
aórtica. A disponibilização destes aparelhos de alta tecnolo- sala de exame. Muitos pacientes em assistência ventilató-
gia nos diversos setores de emergência tem sido cada vez ria não podem ser estudados pelo método (exceto, nos
mais freqüente, permitindo um diagnóstico preciso e minu- raros hospitais que dispõem de ventiladores totalmente
cioso em poucos minutos.38 construídos com polímeros). Além disto, é um exame
Capítulo 34 ."~

DISSECÇÃOAÓRTICA

Fig.34-11.
Arteriog rafia
evidenciando
dissecção aórtica tipo
B com dupla luz
aórtica (LV = luz
verdadeira; LF = luz
falsa) e orifício de
Fig.34-10.Angiorressonânciaobtida entrada (seta)
no plano sagital oblíquo, com infusão próximo à artéria
de gadolínio,evidenciando: ectasia da subclávia esquerda.
aorta ascendente, flap de dissecção
na porção anterior da croça e em
toda a extensão da aorta de.34 Resultados falsos-negativos não foram infreqüentes,
descendente. Observa-seemergência estando relacionados à presença de trombose da falsa
da carótida e subcláviaesquerdas, luz, opacificação simultânea e igualitária da verdadeira e
originadas na luz verdadeira, assim falsa luz e presença de hematoma intramural.
como a artéria mesentérica superior
(setas). Importantes vantagens são peculiares ao método, co-
mo a habilidade de localizar orifícios
I'
de entrada e reen-
trada, avaliar a presença de insuficiência aórtica, além de
que demanda maior tempo de realização quando compa-
delinear com relativa exatidão a extensão da dissecção e
rado à TC. Dessa forma, pacientes graves e instáveis têm
contra-indicação relativa ao método. o acometimento de ramos, possibilitando, entre outros, o
estudo das artérias coronárias.
Em contrapartida, tendo em vista a não utilização de
radiação ionizante e o uso de um contraste com menos efei- A demora em se instituir o tratamento cirúrgico ou
tos adversos, torna-se importante método para o acompa- endovascular imediato é um fator limitante importante
nhamento evolutivo dos pacientes com dissecção aórtica. paia a adoção do método. Possui, ainda, como desvanta-
A RM ainda não está disponível amplamente nos gens os riscos inerentes a um procedimento invasivo, a
diversos setores de emergência, e sua realização é con- necessidade de utilização de contraste iodado e o tempo,
tra-indicada em pacientes portadores de marcapasso, local e materiais necessários para realização do método.
desfriladores implantados, algumas pró teses ortopédicas
e certos cliPese stentsvasculares.
ULTRA-SONOGRAFIA INTRAVASCULAR
ARTERIOGRAFIA
A arteriografia retrógrada foi a primeira técnica com Trata-se de exame invasivo, que necessita de material espe-
acurácia diagnóstica para avaliação dos pacientes com cífico e de alto custo, com manejo e complicações compará-
suspeita de dissecção aórtica. O diagndstico pode ser veis ao da arteriografia. No entanto, nos pacientes com
estabelecido, baseado em sinais diretos, considerados indicação prévia de arteriografia ou coronariografia a
confirmatórios, como visualização de dupla luz aórtica ultri-sonografia intravascular (IVUS@ - intravascular ultra-
e/ ou identificação do flap intimal e de sinais indiretos, sound) é um adjuvante potencialmente útil, pois permite vi-
considerados sugestivos, como deformidade da luz da sualização intraluminal da arquitetura da parede aórtica e
ramos, identificando a dissecção aórtica e suas caracterí~ti-
aorta, anormalidades dos seus ramos, espessamento da
parede da aorta e insuficiência aórtica (Fig. 34-11). cas com maior precisão. Yamada et aL (1995) demonstra-
Durante muito tempo, a arteriografia foi considera- ram sensibilidade e especificidade de aproximadamente
da padrão-ouro para o diagnóstico de dissecção aórtica, 100% (Fig. 34-12).41
apesar de sua sensibilidade e especificidade não terem A elevada acurácia para determinação da extensão
sido bem definidas. Entretanto, com a recente introdu- da dissecção, localização do orifício de entrada e identifi-
ção de modalidades diagnósticas alternativas, tem-se cação do acometimento de ramos torna a ultra-sonogra-
demonstrado que a acurácia diagnóstica da arteriografia fia intravascular um importante método para orientação
não é tão alta como se previa. Estudos prospectivos de- intra-operatória do tratamento endovascular, seja no im-
monstraram 88% de sensibilidade e 94% de especificida- plante de endopróteses, seja nas fenestrações.
Seção IV
.'T'~

ANEURISMASARTERIAIS

Fig.34-12. Ultra-sonografia intravascular de


dissecçãoaórtica tipo B que se estende até
aorta abdominal com cateter posicionado na
luz verdadeira (LV). A artéria renal esquerda
(ARE) sai da luz verdadeira, enquanto a artéria
renal direita (ARD) sai da luz falsa (LF).

---- A incidência de coronariopatia é baixa em pacientes


PROTOCOLO PARA DIAGNÓSTICO
com dissecção aórtica, de modo que, nestes pacientes não
Inicia-se com a história e o exame físico do paciente. Um é indicada coronariografia. Uma exceção seria em paci-
alto nível de suspeição deve ser mantido para que se pos- entes com dissecção aórtica após cirurgia de revasculari-
zação miocárdica.
sa chegar ao diagnóstico. História de hipertensão arterial
e doença aórtica familiar deve ser pesquisada. O IRAD demonstrou que a TC foi exame de imagem
Devem ser investigados no exame físico: estigmas da mais freqüentemente utilizado cQmo primeira escolha,
síndrome de Marfan, presença de déficit neurológico para o diagnóstico de dissecção aórtica aguda (63%). O
focal, dor e distensão abdominal, diferença de pressão ar- ecocardiograma transesofágico foi o exame de escolha
terial entre os membros, ausência de pulsos, sinais de em 32%. Em apenas 4% dos pacientes o exame utilizado
tamponamento cardíaco, sinais de choque. foi a arteriografia e em 1% a RM. Em 66% dos pacientes
Exames iniciais incluem eletrocardiograma e radio- dois ou mais exames foram necessários para confirma-
grafia de tórax, que, na maioria das vezes, são inespecífi- ção diagnóstica (Quadro 34-3).35.40
cos, mas que podem orientar a conduta diagnóstica. Von Tem sido recomendado por Bavaria et ai. que pacien-
Kodolitsch et ai., usando três variáveis (dor torácica, dife- tes com dissecção tipo A, comprovada ou altamente sus-
rença de pressão arterial nos membros e alargamento do peita, devam ser levados diretamente para a sala de opera-
medias tino na radiografia de tórax), encontraram alta ção onde serão anestesiados e avaliados com ecocardio-
probabilidade (96%) de dissecção quando as 3 variáveis grama transesofágico para confirmar ou afastar o diag-
estavam presentes e baixa probabilidade (7%) quando nóstico. Com esta medida e refinamento da técnica cirúr-
estavam ausentes.42 gica, em 163 pacientes consecutivos, portadores de dissec-
O próximo método diagnóstico deve ser o ecocar- ção tipo A, obtiveram uma mortalidade global de 9,8% e
diograma transtorácico que pode demonstrar insuficiên- naqueles sem quadro neurológico de apenas 6,6%.43
cia aórtica, tamponamento cardíaco e a dissecção da aor-
ta ascendente através da visualização do flàp de íntima. --
O diagnóstico definitivo pode ser confirmado por HEMATOMA INTRAMURAL E
ecocardiograma transesofágico ou TC helicoidal, e mais
raramente pela RM. Esta escolha é dependente da dispo-
--- ÚLCERA ,PENETRANTE
-
nibilidade imediata do serviço hospitalar. A TC helicoi- A evolução dos métodos de imagem permitiu a distinção
dal é o exame mais utilizado e pode ser o único para o e entendimento de diferentes formas de apresentação da
planejamento do tratamento. RM é utilizada mais fre- doença aórtica. Além da dissecção "clássica", são descri-
qüentemente para acompanhamento de dissecção aórti- tos o hematoma intramural e a úlcera penetrante, que
ca crônica. antes eram referidos como fatores de risco ou formas atí-
Aortografia foi substituída por exames não-invasivos, picas da dissecção, e que na atualidade são reconhecidos
sendo sua utilização reservada para casos pontuais. como patologias aórticas distintas (Fig. 34-13).3
Ultra-sonografia intravascular tem pequena aplicabi- Modernamente, dissecções, úlceras penetrantes sin-
lidade como método exclusivo para o diagnóstico, no tomáticas e hematomas intramurais, envolvendo a aorta,
entanto, é fortemente recomendada durante o implante têm sido designados como Síndromes Aórticas Agudas
de endoprótese aórtica. que se referem ao espectro de patologias que determi-
Capítulo 34
..,.'A

DISSECÇÃO AÓRTICA

rF.r.ma~ , Comparação entre diferentes métodos de imagem para o diagnóstico de dissecção aórtica

ETT/ETE T.C RM Angiografia IVUS

Sensibilidade ++ ++ +++ ++ +++

Especificidade +++ ++ +++ ++ +++

Determinação da classificação +++ ++ ++ + ++

Localização do orifício de entrada +++ - ++ + +

Insuficiência aórtica +++ - ++ ++

Derrame pericárdico +++ ++ ++

Hematoma mediastinal ++ +++ +++ - +

Envolvimento de ramo aórtico + ++ ++ +++ +++

Envolvimento da artéria coronária ++ - + +++ ++

Exposiçãoà radiação - ++ - +++

Conforto do paciente + ++ + + +

Avaliação intra-operatória ++ ++ +++


+++ - - (+) (+)
Acompanhamento pós-operatório

ETT/ETE= Ecocardiograma
transtorácicoe transesofágico;TC= tomografiacomputadorizada;RM= ressonânciamagnética;IVUS = ecodoppler intravascular.
(Modificado de Recommendations of Task Force on Aortic Dissection - European Society of Cardiology, 2001.)

,
nam emergências aórticas.14 A estes, alguns autores da (25,7%), seja aneurisma (13,6).47Regressão espontâ-
incluem, também, as rupturas e transecções da aorta.2 nea com reabsorção do hematoma ocorre em cerca de
10% dos pacientes.3
HEMATOMA INTRAMURAL Acredita-se que a ruptura do vasavasorumsejao even-
Descrito pela primeira vez por Krukenberg em 1920, o to inicial, resultando em hemorragia na camada externa
hematoma intramural da aorta foi inicialmente definido da média, a qual se estende para a adventícia, podendo
como "uma dissecção sem ruptura da íntima", e é atual- progredir, também, tangencialmente ao longo da parede
da aorta. O hematoma intramural é diferenciado da dis-
mente considerado patologia distinta da dissecção, onde
ocorre essencialmente uma hemorragia contida dentro secção aórtica clássica pela ausência de uma ruptura na
da camada média da parede aórtica.44.45 íntima ou de uma comunicação direta entre a luz aórtica
O hematoma intramural pode evoluir com diferentes e a camada medial (Fig. 34-14).2
apresentações. Pode causar ruptura da íntima e se trans- O diagnóstico do hematoma intramural freqüente-
formar em uma dissecção aórtica "clássica" (observado mente se confunde com o da dissecção aórtica. Nos paci-
em 33% dos pacientes na série de Mohr-Kahaly et al.),46 entes com suspeita de dissecção aórtica, grandes séries
pode penetrar em camadas mais profundas e se transfor- de necropsias observaram incidência de 4% a 13% de he-
mar em pseudo-aneurisma, ou, ainda, pop.e romper-se. matoma intramura1.4.48
Von Kodolitsch et aI. observaram que 59% dos pacientes, Ganaha et aI. relatam que a associação de hematoma
independente da localização do hematoma intramural, intramural com úlcera penetrante é um fator de mau
apresentaram algum tipo de progressão nos primeiros prognóstico da doença, podendo ocorrer complicações,
30 dias: seja para dissecção aórtica (19,6), ruptura conti- como dilatação, dissecção e ruptura aórtica.49

~~,-j +í:~ Fig. 34-13. Desenho esquemático


diferenciando a dissecção aórtica de
Úlcera Hematoma apresentações atípicas. (Modificado de
Dissecção
clássica penetrante intramural -
Recomendações da SOCERJ DissecçãoAguda
da Aorta, 2003.)
Seção IV
ANEURISMASARTERIAIS

f.r
~. ---~.
i
.
~

f } ,
Fig.34-14.Diagrama ilustrandoos eventosque
ocorrem na formação do hematoma
intramural, desde a ruptura da vasa vasorum e
hemorragia na camada média até a formação
do hematoma intraparietal que mantém a
camada íntima intacta. (Modificadode
Macura, 2002.)

Evangelista et al., investigadores do IRAD, demons- dendo do segmento acometido. Insuficiência aórtica,
traram 5,7% de incidência de hematoma intramural em derrame pleural e pericárdico podem estar presentes. A
1.010 síndromes aórticas agudas analisadas. O hemato- maioria dos pacientes tem hipertensão arterial sistêmica
ma intramural ocorreu na aorta descendente em 60,3% (88,2%) e portadora de co-morbidades como doença pul-
dos pacientes e na aorta ascendente em 39,7%, em fran- monar obstrutiva crônica (47,1 %); cardiopatias (41,2%) e
co contiaste com a dissecção "clássica" cuja proporção foi insuficiência renal crônica (29,4%).53 Nienaber et al., em
de 64,7% na aorta ascendente e 35,3% na aorta descen- 25 pacientes com hematoma intramural, encontraram 2
dente. A média de idade dos pacientes com hematoma (8%) portadores de síndrome de Marfan e uma paciente
intramural foi de 68,7 anos, superior aos 61,5 anos grávida (2%).52.
encontrado nos pacientes com dissecção "clássica". A Outro mecanismo de formação dos hematomas in-
mortalidade foi de 8,3% nos pacientes com hematoma da tramurais é o trauma aórtico. Vilacosta e San Román
aorta descendente e de 39,1% naqueles com envolvimen- (1995) estudaram com ecocardiograma transesofágico
to da aorta ascendente. Cerca de 16% dos hematomas 22 pacientes politraumatizados com trauma torácico,
evoluíram para dissecção aórtica.5o vítimas de acidente automobilístico, e encontram 5 casos
Em geral, a evolução dos pacientes com hematoma (22%) de hematomas aórticos. Nestas situações é neces-
intramural limitado à aorta descendente é melhor que sário estabelecer criteriosamente o diagnóstico diferenci-
aqueles que apresentam envolvimento da aorta ascen- al entre hematoma intramural e ruptura traumática con-
dente. Vilacosta e San Román, em uma série de 15 paci- tida da aorta.54
entes, observaram que apenas 1 paciente entre 7 com Pacientes com hematoma intramural possuem cerca
hematoma restrito à aorta descendente necessitou de de 30% de associação com aneurismas de aorta abdomi-
cirurgia devido à ruptura. Em contrapartida, dos 8 paci- nal, no entanto, não costumam apresentar sinais de oclu-
entes restantes com hematoma intramural; envolvendo a são dos ramos aórticos ou isquemia distal de órgãos.53,55
aorta ascendente, 2 faleceram de forma súbita e 3 tive- A;ssim como na dissecção aórtica, o diagnóstico de
ram que ser submetidos à cirurgia em caráter de emer- hematoma intramural pode ser obtido com relativa acu-
gência.51 Já, Nienaber et alo analisaram 12 pacientes com rácia com a ecocardiografia transesofágica e tomografia
hematoma intramural da aorta ascendente e constata- computadorizada helicoidal. A ressonância magnética e
ram que dos 5 pacientes tratados clinicamente, 4 falece- eco-Doppler intravascular também podem contribuir pa-
ram na primeira semana após o diagnóstico.52 A gravida- ra o diagnóstico.
de e a morbimortalidade dos hematomas intramurais O ecocardiograma transesofágico (E-TE) mostra o
estarão diretamente relacionadas ao sítio da aorta envol- espaço livre de ecos ao redor da parede da aorta, signifi-
vido. cando sinais de penetração devidos ao hematoma pe-
O quadro clínico, assim como os fatores de risco dos riaórtico. O hematoma mediastinal pode ser visuali-
pacientes com hematomaintramural, é semelhante aos zado no ETE através da maior distância entre o esôfago
dos pacientes com dissecção aórtica. Um alto índice de e o átrio esquerdo.
suspeita é necessário. A dor é o sintoma mais freqüente e A tomografia computadorizada (Te) helicoidal é a
pode ser referida na região lombar ou torácica, depen- modalidade diagnóstica mais usada. Podemos observar
Capítulo 34
."
DISSECÇÃOAÓRTlCA

na TC imagens com orientação concêntrica do espaço hematomas intramurais da aorta descendente não é su-
contendo sangue em torno da luz da aorta, sem um flap perior ao tratamento clínico.
de dissecção da íntima. Como não há comunicação dire- O implante de endopróteses vem se estabelecendo
ta com a luz aórtica, não ocorre intensificação da área do como abordagem de escolha nos pacientes com hemato-
hematoma quando se administra contraste. mas intramurais da aorta descendente com indicação
A ressonância magnética permite a detecção da fase cirúrgica. A baixa morbidade associada ao procedimento
aguda ou subaguda da hemorragia. Os achados típicos in- e a relativa facilidade técnica tornam a técnica promisso-
cluem uma parede espessada (> 7 mm), com superfície lisa, ra e podem ampliar as indicações de intervenção, no en-
contendo áreas de alta intensidade do sinal. Essas áreas tanto, estudos ainda são necessários para confirmar esta
correspondem à metemoglobina formada, que ocorre perspectiva. 58
após vários dias e persiste por meses, ainda que possa estar Tratamento clínico com ~-bloqueador, controle rigo-
ausente na fase aguda (Fig. 34-15).2 roso da hipertensão e exames de imagens seriados de-
A arteriografia vem sendo substituída por outras vem ser instituídos para todos os pacientes.47
modalidades diagnósticas, pois se trata de método inva- O tratamento do hematoma intramural aórtico deve
sivo e que permite apenas o estudo intraluminal, o que ser individualizado, uma vez que não existem na literatu-
justifica os freqüentes achados falsos-negativos. ra grandes casuísticas ou estudos multicêntricos que .per-
O uso da ultra-sonografia intravascular (IVUS) tem mitam fundamentar plenamente a melhor abordagem
sido advogado para complementar a informação angio- terapêutica.
gráfica. A ultra-sonografia intravascular permite não só
visualizar a arquitetura da parede do vaso de dentro do ÚLCERASATEROSCLERÓTICAS
lúmen aórtico, como é muito acurado em delinear a
extensão circunferencial e longitudinal do hematoma. A maioria das lesões ateroscleróticas aórticas, mesmo
Diversos estudos têm recomendado tratamento cirúr- quando se acompanham de erosão e ulceração da placa,
gico para os hematomas intramurais envolvendo a aorta tem evolução insidiosa, assintomática e limitada à íntima,
ascendente (tipo A).53,56Já quando há acometimento da não se estendendo à camada média. Por definição, as
aorta descendente (tipo B) o tratamento cirúrgico estará úlceras penetrantes ocorrem quando há ruptura da lâmi-
indicado somente se houver sintomatologia, quando o diâ- na elástica interna, ocorrendo invasão da camada média
metro aórtico ultrapassar 60 a 65 mm, se houver expansão da ~orta (Fig. 34-16).2
aguda do diâmetro da aorta, associação com úlcera pene- A história natural da úlcera penetrante da aorta é
trante ou na presença de ruptura aórtica.57 incerta, mas sua progressão e evolução podem levar à
Os hematomas intramurais da aorta ascendente têm gênese de inúmeras complicações, tais quais: emboliza-
melhor prognóstico quando tratados cirurgicamente, ção, hematoma intramural, dissecção aórtica, formação
em contrapartida, a abordagem cirúrgica primária dos de aneurismas e pseudo-aneurismas e ruptura da aorta.

Fig.34-15.Corteaxialde RMem pacientede


76 anos, masculino,com hematoma intramural
com progressão para dissecção aórtica.
(A) Imagem demonstrando coleção intramural
com alta intensidade do sinal, em crescente,
correspondendo a hematoma intramural tipo A
subagudo(seta).(8) Após6 diasnovoexame
evidencia progressão para dissecção aórtica
tipo A. Percebe-sediferença do sinal entre as
2 luzes, refletindo a alta velocidade de fluxo
sanguíneo na luz verdadeira e fluxo turbulento
de baixa velocidade na luz falsa. Nota-se
também defeito no flap médio-intimal,
A B representando o orifíciode entrada (seta).
~ -.

Seção IV
ANEURISMASARTERIAIS

Fig. 34-16. Diagrama ilustrando os eventos que


ocorrem na formação da úlcera penetrante,
desde a formação de placa de ateroma na
camada íntima até a progressão para ulceração
com penetração na camada média. A entrada
do sangue pressurizado neste espaço propicia
a formação associada de hematoma
intramural. (Modificado de Macura, 2002.)

Descritas por Shennan, em 1935, as úlceras pene- 6,2 cm (1 1,5) e observaram 30,6% de associação com
trantes podem ser encontradas em toda a extensão da aneurisma da aorta abdominal. 53
aorta, mas sua localização mais freqüente é na aorta torá- Quando ocorre destruição completa da camada mé-
cica descendente proximal, seguida da aorta abdomi- dia, o sangue aórtico fica contido apenas pela delgada
nal.59 Os pacientes com úlcera penetrante apresentam camada adventícia, levando à formação de pseudo-aneu-
uma "dissecção" localizada, limitada por áreas de calcifi- risma. Evolução mais fatal ocorre quando há ruptura da
cação intensa, associada a um acometimento ateroscleró- parede da aorta.
tico localmente avançado, constituindo, portanto, uma As ulcerações ateroscleróticasKla parede da aorta, ge-
aortopatia diferente da clássica dissecção aórtica. Podem ralmente, acometem pacientes idosos, com aterosclerose
ser únicas ou múltiplas, e o "nicho" ulceroso pode ser difusa e múltiplas co-morbidades associadas, como hiper-
sítio de acúmulo e depósito de material necrótico, célu- tensão (94,7%), doença pulmonar obstrutiva crônica
las espumosas, cristais de colesterol e trombos, o que (63,1 %), cardiopatias (42,1%), insuficiência renal crônica
explica a freqüente incidência de eventos embólicos. (26,3%) e diabetes melito (15,7%).53 Em dados extraídos
Ao atingir os 2/3 externos da camada média, que das séries de Stanson et aloe Harris et aloobservou-se idade
possui exuberante vasa vasorum, as úlceras penetrantes médIa de 73 anos, superior ao encontrado nas dissecções
freqüentemente geram hemorragia e hematoma intra- aórticas, 58% de associação com doença coronariana e foi
mural. Stanson et al., a partir da análise histopatológica identificado hipertensão como fator de risco mais fre-
de 8 segmentos aórticos com úlceras penetrantes, de- qüente.60.61As manifestações clínicas, quando presentes,
monstraram que 7 apresentavam hematoma intramural são semelhantes à dissecção "clássica", sendo a dor toráci-
associado.6o Em geral, estes hematomas têm extensão ca ou lombar o sintoma preponderante. Estarão ausentes,
limitada, pois sua propagação é dificultada pela intensa porém, os achados de oclusão de ramos vasculares ou
fibrose e calcificação da parede aórtica. isquemia de órgãos, salvo os fenômenos embólicos. As
A progressão de uma úlcera penetrante com hemato- complicações valvulares ou pericárdicas são raras.
ma intramural a uma dissecção aórtica "clássica" com O diagnóstico da úlcera penetrante é estabelecido
dupla luz eflap médio-intimal é possível, no' entanto rara. através de métodos de imagem que demonstrem o nicho
Shennan, em 218 pacientes com dissecção aórtica, ulcerqso semelhante a uma cratera. A arteriografia é um
encontrou apenas 4 casos em que a dissecção claramente excelénte método, pois revela uma evaginação excêntri-
iniciava-se a partir de úlceras ateroscleróticas da parede ca, cheia de contraste, na ausência de um flap intimal e
aórtica.59 O orifício de entrada da dissecção em pacientes freqüentemente com extensa doença aórtica. Outros mé-
com úlcera penetrante é a própria úlcera. todos como a TC, o ETE e a RM são de grande valia no
Uma evolução mais freqüente das úlceras penetran- diagnóstico, também nas complicações associadas e de-
tes são as dilatações aórticas. Estes pacientes possuem vem ser usados conforme a experiência e disponibilida-
alta incidência de aterosclerose difusa, que freqüente- de local (Fig. 34-17).
mente provoca invasão da camada média, expondo-a ao Stanton et alo (1986) e Coady et alo (1998) relataram
fluxo arterial pulsátil, o que fragiliza a parede da aorta e em suas séries que as úlceras penetrantes mais comu-
propicia a formação de aneurismas, sobretudo os sacula- mente apresentam evolução tardia desfavorável, entre-
res. Elefteriades et al., ao analisarem pacientes com úlce- tanto, deve-se considerar que a grande maioria dos paci-
ras penetrantes sintomáticas na aorta descendente, esti- entes estudados eram sintomáticos.6o.62 Dor torácica
maram o diâmetro médio da aorta destes pacientes em recorrente e derrame pleural são dois significativos indi-
Capítulo 34 - --- ------
DISSECÇÃOAÓRTICA

va de um procedimento menos invasivo e com menor


morbidade parece oferecer vantagens quando compa-
Fig.34-17. rado ao tratamento cirúrgico.65
Tomografia Aqueles pacientes que serão manejados apenas clini-
computadorizada camente devem ter seu tratamento baseado no controle
evidenciando grande
úlcera aórtica
dos fatores de risco e monitorização seriada com méto-
penetrante e dos de imagem para detecção precoce de eventuais com-
hematoma intramural plicações.
localizado.

TRATAMENTO (LíNKO
cadores de progressão de doença (P < 0,0001 e P
0,0003,respectivamente).49
Em contrapartida, Harris et O paciente com suspeita clínica de dissecção deve ter seu
alo e Quint et ai. demonstraram baixa incidência de com- diagnóstico definitivo estabelecido tão logo seja possível,
plicações em pacientes assintomáticos.61.63 Esta diferença para que seja instituída a terapêutica mais adequada.
de prognósticos pode ser explicada pela natureza dos A abordagem inicial daqueles com suspeita de dis-
pacientes, sintomáticos versus assintomáticos, depreen- secção aórtica aguda, comumente, ocorre nas salas de
dendo-se que tratamento mais agressivo deve ser consi- emergência, uma vez que a apresentação clínica da doen-
derado em pacientes sintomáticos. ça habitualmente se caracteriza por quadros agudos e
Ganaha et alodemonstraram que o tamanho da úlce- emergenciais. A imensa maioria destes pacientes, em vir-
ra penetrante também é importante preditor de mau tude da freqüente presença de dor precordial, está envol-
prognóstico, com significância estatística. Úlceras com vida em algum tipo de protocolo,.formal de investigação
diâmetro máximo maior que 20 mm apresentaram valor de dor torácica, permanecendo em ambientes muitas
preditivo positivo de 100% e negativo de 71% para pro- vezes não ideais para o seu adequado tratamento.
gressão da doença, assim como aquelas com profundida- Recomenda-se que, após a suspeita de dissecção aórti-
de maior que 10 mm apresentaram valor preditivo positi- ca, o paciente seja internado em ambiente de terapia inten-
vo e negativo de 80% e 88%, respectivamente.49 sivapara monitorização eletrocardiográfica, ventilatória e
Outra variável importante no prognóstico das úlce- hemodinâmica. Esta conduta se justifica como forma de
ras penetrantes da aorta é a associação com hematoma garàntir a estabilidade clínica e circulatória dos pacientes,
intramural. Ganaha et al., a partir da análise de exames uma vez que a associação com crise hipertensiva encon-
de imagem, observaram significativo pior prognóstico tra-se presente em quase metade dos pacientes e o choque
quando as duas patologias estavam presentes, em compa- com ou sem tamponamento cardíaco em cerca de 10%.3
ração com os hematomas intramurais isolados.49 Enquanto exames complementares são realizados, tra-
As divergências na literatura sobre a melhor aborda- tamento farmacológico precoce deve ser sempre instituí-
gem das úlceras penetrantes aórticas ainda permane- do, independente da terapêutica definitiva a ser emprega-
cem. No entanto, pacientes sintomáticos, apresentando: da, seja ela a cirurgia, a abordagem endovascular, seja a
hematoma intramural associado, úlceras com diâmetro manutenção do tratamento clínico. A eliminação do qua-
máximo maior que 20 mm ej ou profundidade maior dro álgico, das reduções da pressão arterial sistêmica e do
que 10 mm, acometendo aorta ascendente, arco ou des- impulso cardíaco ou da onda de pressão de pulso (dpjdt)
cendente proximal, apresentam pior curso da doença, são eficazes na prevenção de ruptura, na estabilização da
sendo recomendado abordagem cirúrgica. disseéção e na atenuação de suas complicações 66.
Estes pacientes, em geral, devido à idade avançada, A melhora do quadro álgico pode ser obtida com sul-
presença de aterosclerose difusa e co-morbidades associ- fato de morfina ou seus derivados sintéticos, entretanto,
adas muitas vezes têm contra-indicação ao tratamento dificilmente o uso de analgésicos isoladamente possibili-
cirúrgico, devendo-se considerar a manutenção da tera- tará um adequado controle da dor. O alívio da dor é um
pia farmacológica e o tratamento endovascular. bom indicador da eficácia terapêutica, pGis de maneira
A interposição de endoprótese sobre os nichos geral indica estabilização da dissecção. O uso de morfina
ulcerosos parece conter as complicações relacionadas. ou outros opióides pode ocasionar queda exagerada da
Demers et aloobtiveram sucesso técnico superior a 90% pressão arterial e depressão respiratória, sobretudo em
e sobrevida de 1, 3 e 5 anos de 85%, 75% e 70%, respec- idosos e portadores de doenças pulmonares associadas.
tivamente. Apesar dos poucos relatos na literatura, a A manutenção de níveis tensionais mais baixos e o
abordagem endovascular das úlceras penetrantes na controle do impulso cardíaco (dpjdt) atenuam o dano
aorta descendente vem se sedimentando. A perspecti- parietal aórtico, reduzindo significativamente a probabi-
.~~: Seção IV
ANEURISMASARTERIAIS

lidade de ruptura. Neste contexto, a presença de hiper- ção da pressão arterial sistólica inferior a 130 mmHg.
tensão arterial em pacientes com dissecção aórtica tor- Pacientes com síndrome de Marfan devem manter níveis
na-se extremamente deletéria, devendo ser evitada a to- tensionais mais baixos, com pressão arterial sistólica infe-
do custo. Esta adaptação hemo dinâmica a uma condição rior que 120 mmHg.68
de menor estresse da parede da aorta é obtida com o uso
de medicamentos como o nitroprussiato de sódio e blo-
TRATAMENTO CIRÚRGICO DAS
queadores beta-adrenérgicos.
DISSECÇÕES TIPO A
O nitroprussiato de sódio tem ação vasodilatadora e
promove redução da pós-carga, sendo um importante
INDICAÇÃO CIRÚRGICA
hipotensor. Entretanto, também provoca aumento do
inotropismo e conseqüente taquicardia reflexa, não de- A cirurgia na dissecção aórtica do tipo A está indicada
vendo, portanto, ser utilizado isoladamente. A associação nas seguintes situações:
com agentes P-bloqueadores reduz a freqüência cardíaca,
1. Dissecção tipo A aguda: todos os pacientes devem
reduzindo o impulso cardíaco (dpjdt). O labetalol, um
ser operados. Esta é uma emergência cirúrgica que
P-bloqueador venoso, oferece particular eficácia na dis-
não pode ser postergada.
secção aórtica, podendo ser utilizado isoladamente, pois
A partir da análise de pacientes não operados, em
apresenta ação de bloqueador alfa-adrenérgico seletivo e
estudo de Scholl et ai., foi possível estabelecer algu-
beta-adrenérgico não-seletivo, sendo efetivo não só na
mas premissas: caso o paciente seja visto logo após o
redução da freqüência cardíaca, mas também da pressão
sintoma, ele deve ser operado logo; caso o paciente
arterial. A utilização isolada de outros bloqueadores
seja examinado dias após o evento agudo ele poderá
p-adrenérgicos está indicada somente para os pacientes
ser tratado de modo semi-eletivo; tratamento clínico
com pressão arterial normal.1,3,20,35
exclusivo deve ser instituído nos pacientes que não
Em casos de contra-indicação aos P-bloqueadores ou querem ou não podem ser operados; uma vez passa-
hipertensão arterial refratária pode-se utilizar enalapril do o período crítico de altíssima mortalidade, nas
venoso. Antagonistas de canais de cálcio, tais como o primeiras horas e dias, a expectativa de vida é me-
verapa"1tile o diltiazem, podem também ser empregados, lhor do que se antecipava.69
embora não existam evidências suficientes que garantam Nos pacientes em investigação diagnóstica a cirur-
sua efetividade na dissecção aguda da aorta.3,53 gia deve ser realizada imediatamente após a confir-
Quando há tamponamento cardíaco, complicação que mação do diagnóstico de dissecção aórtica tipo A.
constitui um dos principais mecanismos de óbito nas dis- Estudos de Bavaria et ai. demonstraram o aumento
secções tipo A, a pericardiocentese pode não ter o benefI- da mortalidade com a demora em se iniciar o proce-
cio esperado, podendo levar à dissociação eletromecânica e dimento cirúrgico. 70
óbito. Isto, em tese, explica-se pelo fato que após a drena- Não se deve realizar coronariografia de forma roti-
gem pericárdica o coração recupera parte d~ sua função neira, para não postergar o tratamento cirúrgico,
contrátil, gerando aumento da pressão aórtica. O aumento uma vez que a incidência de doença coronariana em
da pressão local induz a manutenção do pertuito previa- pacientes com dissecção aórtica aguda é baixa.
mente originado, entre a aorta e o pericárdio que acabara 2. Dissecção tipo A crônica: devem ser operados todos
de ser despressurizado, propiciando, assim, hemorragia os pacientes sintomáticos e os assintomáticos com di-
recorrente e tamponamento fatal.67 Dessa forma, hoje é laçação aneurismática. Os sintomas da dissecção tipo
mais amplamente aceito que estes pacientes devem ser
A' estão ligados a sintomas dolorosos ou compressi-
abordados cirurgicamente, tão logo que possível, para trata- vos, insuficiência aórtica, dilatação aneurismática ou
mento da dissecção e de suas complicações.34 oclusão de ramos arteriais. A dor torácica é o sintoma
Choque persistente, sobretudo se hipovolêmico, deve mais comum. A insuficiência aórtica pode provocar
ter tratamento agressivo e imediato. Salienta-se que o uso cansaço, síncope, dor e dilatação ventricular esquer-
de aminas vasoativas ou elevação excessiva da pressão ar- da. Pode haver oclusão de artérias coronárias, tron-
terial pode transformar uma ruptura contida em uma rup- cos supra-aórticos, artérias viscerais abdominais e ar-
tura livre, piorando, sobremaneira, o prognóstico. térias ilíacas.
Tanto os pacientes tratados clinicamente, como aqueles Nos pacientes assintomáticos a indicação cirúrgica
submetidos a procedimento cirúrgico ou endovascular, depende do diâmetro do aneurisma de aorta ascenden-
devem manter terapia farmacológica na fase crônica da te que se forma. Indicamos cirurgia com diâmetros de
doença. O uso de p-bloqueadores e anti-hipertensivos aorta ascendente ;:tcimade 5,5 cm ou acima de 5,0 cm
devem ser usados por longo tempo, visando a manuten- se o paciente for portador de síndrome de Marfan.
--- Capítulo 34 ."'~II
DISSECÇÃOAÓRTICA

Nos pacientes com hematoma intramural de aorta as- mia e parada circulatória. Saturação acima de 95% indica
cendente a probabilidade de ruptura é maior do que na que o cérebro não mais está extraindo oxigênio da circu-
dissecção tipo A, e a indicação cirúrgica também se im- lação e que a circulação extracorpórea pode ser inter-
põe, assim como nas úlceras penetrantes sintomáticas. rompida; f) ecocardiograma transesofágico permite ava-
liar a adequação da perfusão durante a circulação extra-
':ONSIDERAÇÕES TÉCNICAS corpórea, ou seja, se há perfusão da luz verdadeira; e a
Houve uma grande evolução no tratamento cirúrgico da qualidade do reparo valvar aórtico.
dissecção de aorta nos últimos anos. O resultado cirúrgi- A operação é feita 'por esternotomia mediana e a con-
co inicial foi tão ruim que Wheat e Palmer, em 1971, pro- dução da circulação extracorpórea é feita de modo rotinei-
puseram tratamento clínico como única forma de abor- ro. A aorta é totalmente ressecada e substituída por enxer-
dagem para dissecção aguda da aorta.7,71 O panorama to de Dacron@ impregnado por gelatina ou colágeno.
vem mudando desde então com melhora importante no Algumas considerações técnicas são específicas das
resultado cirúrgico. operações para o tratamento das dissecções aórticas do
O objetivo do tratamento cirúrgico é a ressecção da tipo A:
área da aorta que está pondo em risco a vida do paciente.
Assim, na dissecção da aorta tipo A, o importante é resse- 1. A operação é realizada com hipotermia profunda.
car a aorta ascendente, independentemente se a dissec- Quando se atinge 18°C pela temperatura retal ou
ção está restrita proximalmente (Tipo II de DeBakey) ou quando se obtém silêncio eletroencefalográfico, a
se progride. por toda a aorta (Tipo I de DeBakey). A aorta circulação extracorpórea pode ser interrompida, ob-
ascendente deve ser substituída por enxerto de Dacron@, tendo-se a parada circulatória total. Comumente é
necessário cerca de 40 minutos de resfriamento, du-
devendo-se corrigir a insuficiência aórtica e ressecar o
local de ruptura da íntima, para que o fluxo sanguíneo rante a circulação extracorpÓ'rea, para atingir este ní-
possa ser redirigido para a luz verdadeira (Fig. 34-18). vel de temperatura. A 18° C a perfusão cerebral pode
Estas operações são feitas com uso de circulação extra- ser interrompida por até 45 minutos.
corpórea, hipotermia profunda e parada circulatória total. 2. O retorno arterial da bomba de circulação extracor-
Os pacientes devem ser monitorizados com: a) ele- pórea é preferencialmente feito através da artéria axi-
trocardiograma; b) Catet~rização da artéria radial direita lar direita, exposta na região infraclavicular. A canuli-
para medida da pressão arterial média. Método que per- .zação arterial pode ser direta, ou através de enxerto
mite avaliar, indiretamente, se, durante a circulação ex- de Dacron@ suturado terminolateral na artéria. As
tracorpórea, a artéria carótida direita está recebendo flu- vantagens do uso da artéria axilar direita são: a) ma-
xo sanguíneo adequado para perfusão cerebral; c) cate- nutenção de fluxo anterógrado na aorta descendente
ter de Swan-Ganz, para avaliação hemo dinâmica. Deve-se no retorno à circulação extracorpórea. Quando se
tomar o cuidado, durante a fase de hipotermia, de reposi- utiliza o retorno arterial da bomba de circulação ex-
cioná-Io no tronco da artéria pulmonar para evitar que o tracorpórea com fluxo retrógrado pela aorta, pode
cateter encunhado em ramo segmentar da áftéria pulmo- haver pressurização da falsa luz através dos orifícios
nar, enrijecido pelo frio, ocasione ruptura arterial; d) ele- de reentrada da aorta dissecada, provocando sangra-
troencefalograma, que permite avaliar qualquer assime- mento na anastomose distal do enxerto com a aorta;
tria de perfusão cerebral e indica ausência de função b) permitir perfusão anterógrada cerebral seletiva
cerebral durante a hipotermia e a parada circulatória; e) durante a parada circulatória total (Fig. 34-19).72
saturação do bulbo venoso jugular, também usado como , O retorno arterial da bomba de circulação extra-
critério de ausência de função cerebral durante hipoter- corpórea pode ser feito, também, pela artéria femo-

Fig. 34-18. (A) Dissecçãoaguda da aorta


ascendente, evidenciando-sedilatação da falsa
luz. (8) Ressecçãoaórtica e interposição de
B prótese de Dacron@.
Seção IV
1181'
ANEURISMAS ARTERIAIS

Drenagem
deVE

Fig. 34-20. Retorno


arterial por meio de
cânula inserida
através da ponta do
ventrículo esquerdo e
avançada até a aorta
ascendente.

grande inconveniente da hipotermia profunda é a


.. " sanguínea, em ge-
possibilidade de ocorrer discrasia
Ganuliz~ção
alternativa
..',~... \\ ral, relacionada à microagregação plaquetária, des-
--\\\\

naturação de proteínas e tempo mais prolongado de


t
'~~~~ Canulização
-"-~:" femoral
'::: ::: :.:::::~I
;

I ci~culação extracorpórea (necessários para esfriar e


Linha secundária aquecer o paciente).
para perfusão
anterógrada
.f
{11' O tempo de proteção cerebral considerado seguro
é de 20 minutos a 22°C e 45 minutos a 18°C. Para
Fig. 34-19. Retorno arterial por enxerto posicionado na artéria axilar tempos mais prolongados é necessário se adicionar
esquerda. (Modificado de Gardner, 2004.) .
perfusão cerebral anterógrada.
Os trabalhos de Bachet et alo demonstraram bons
ral, pela aorta ascendente e, muito raramente, por ca- resultados com perfusão cerebral anterógrada através
teter introduzido pela ponta do ventrículo esquerdo e de uma ou das duas carótidas.75 O método mais utili-
avançado até a aorta ascendente (Fig. 34-20). zado inclui o retorno arterial pela artéria axilar direita.
3. A hipotermia profunda e parada circulatória total são Quando se interrompe a circulação extracorpórea,
utilizadas para que se possa realizar a anastomose do pinça-se o tronco braquiocefálico e se inicia perfusão
enxerto com a aorta distal aberta, sem pinçamento cerebral pela artéria axilar direita, com fluxo sanguí-
aórtico. A pinça na aorta pode provocar traumatismo neo dirigido para carótida direita e vertebral direita.
na íntima e ser origem de redissecção. Após a anasto- Utiliza-se fluxo sanguíneo de 600 mIl min, a 18°C, de
mose, o enxerto é pinçado proximalmente e a circula- mpdo que a pressão arterial em artéria radial direita
ção extracorpórea restabeleci da, iniciando o reaque- fique entre 50 a 70 mmHg. A artéria subclávia esquer-
cimento do paciente. Outra vantagem de realizar a da e artéria carótida esquerda devem ser ocluídas por
anastomose distal sem pinçamento aórtico é a possibi- pinça ou cateter balão para evitar fenômeno de roubo
lidade de se inspecionar o arco aórtico à procura do sanguíneo da circulação cerebral. Outra opção é per-
orificio de entrada, para que então seja ressecado. fundir a carótida esquerda por cateter a partir de tubo
Desde os trabalhos do Griepp et al., em 1975, a hi- em "y" advindo da perfusão axilar.
potermia profunda tem sido utilizada em cirurgia Com a perfusão cerebral anterógrada hipotérmica
aórtica.73 Crawford et al., em 1998, sugerem hipoter- alguns grupos cirúrgicos (Haverich e seus colabora-
mia profunda até 18°C de temperatura retal ou até dores, Di Bartolomeo e seus colaboradores) advo-
que haja silêncio eletroencefalográfico.74 Como me- gam manter a temperatura corpórea em 28°C, o que
didas adicionais, devem ser administrados corticoste- seria vantajoso para evitar discrasia sanguínea e di-
róides antes da parada circulatória total, e a cabeça minuir o tempo cirúrgico.76,77 São necessários mais
do paciente deve ser envolta em sacos de gelo. O estudos em relação a esta proposição.
Capítulo34
DISSECÇÃOAÓRTICA

ciência aórtica ocorre por desabamento das comissu-


ras aórticas pelo processo de dissecção, com perda
de contato entre a média e a adventícia. A comissura
aórtica que mais vezes se solta é a que fica entre os fo-
lhetos não coronarianos e a coronária direita. Com
Fig.34-21 esta perda de sustentação das comissuras, um ou
Suspensão valvar dois, e às vezes os três folhetos desabam para a via de
aórtica por refixação saída do ventrículo esquerdo, provocando uma insu-
das comissuras
ficiência aórtica aguda e grave.
aórticas. (Modificado
de Coselli, 1999.) O tratamento cirúrgico consiste na refixação das
comissuras em seu local original, acrescido de nova
Nos anos 1990 a perfusão cerebral retrógrada cere- fixação ao se realizar a sutura da aorta com a porção
bral ganhou grande interesse após os trabalhos de Usui proximal do enxerto (Fig. 34-21).80
etaL Estes preconizavam que, após interrupção da circu- Quando a dissecção progride pelo seio de Valsalva
lação extracorpórea, a perfusão cerebral retrógrada de- não coronariano até o anel aórtico, deve-se ressecar o
veria ser instituída através da veia cava superior, manten- folheto não coronariano e substituí-Io por uma exten-
do fluxo sanguíneo entre 500 e 1.000 rnl/min e pressão são do enxerto de Dacron@.
na veia cava superior entre 15 e 20 mmHg.78 Os objeti-
vos são obter uma hipotennia cerebral mais demorada, Quando há comprometimento dos folhetos aórti-
a eliminação' de ar ou embolia da árvore arterial cere- cos, a válvula aórtica deve ser ressecada e deve-se rea-
bral e fornecer alguma nutrição cerebral, o que pennite lizar a operação de Bentall-De Bono. Esta consiste na
uma parada circulatória cerebral mais prolongada. Tra- ressecção da raiz da aorta cóm substituição por um
balhos consecutivos do grupo de Griepp, do Hospital enxerto tubular deDacron@, valvado com pró tese
Monte Sinai de New York, demonstraram que a maior mecânica ou biológica, além do reimplante das arté-
parte do fluxo sanguíneo retrógrado era desviada da rias coronárias (Fig. 34-22a).81
c~culação cerebral, e em estudo experimental com pa- Quando a dissecção aórtica envolve os seios de
rada circulatória total prolongada demonstraram que a Valsalva com folhetos aórticos normais, o grupo de
perfusão cerebral retrógrada era inferior à perfusão ce- Haverich preconiza realização da operação de David,
rebral anterógrada e, até mesmo, à hipotennia profun- em que a aorta ascendente é ressecada até próximo
da isolada.79O entusiasmo com perfusão cerebral retró- do anel aórtico e a válvula aórtica reimplantada no
grada regrediu, e poucos grupos a usam atualmente. enxerto tubular de dácron, com posterior reanasto-
4. Na maioria das vezes é possível reparar a insuficiên- mos e das artérias coronárias (Fig. 34-22b).81,82Esta
cia valvar aórtica sem substituição valvar. A insufi- conduta é seguida por poucos grupos.

Fig. 34-22. (A) Operação de Bentall-De Bano.


(B) Operação de David. (Modificado de Topol,
A B 2007.)
Seção IV
ANEURISMASARTERIAIS

5. Um problema que existe na cirurgia da dissecção aór- quer seja pelo processo fibrinolítico que se instala
tica é a fragilidade dos tecidos. Reforço da anastomo- com a dissecção aórtica. O uso de enxertos imper-
se com tiras de feltro de PTFE e o uso de cola biológi- meáveis (impregnados por colágeno ou gelatina) de
ca para promover a aderência e resistência entre a Ín- dácron permite fácil penetração de agulhas finas e
tima e a média dissecadas ajudam a resolver este pro- facilita a confecção de anastomoses hemostáticas. O
blema. Uso imoderado de cola pode, no entanto, uso de autotransfusão é importante, pois diminui a
ocasionar necrose da parede da aorta. necessidade de uso de sangue homólogo. Há questio-
6. Outro questionamento cirúrgico é até aonde resse- namentos sobre o uso de antifibrinolíticos (aprotinina,
car. Resultados melhores têm sido obtidos quando se ácido épsilon-aminocapróico, ácido tranexâmico), mas
resseca o local de ruptura da íntima. Para tal, deve-se estes parecem ter ação na diminuição de sangramento
inspecionar o arco aórtico e realizar a ressecção do cirúrgico. A aprotinina deve ser evitada em pacientes
mesmo quando houver comprometimento desta re- com insuficiência renal e durante a fase de resfriamen-
gião. Na maioria das vezes faz-se uma ressecção oblí- to e parada circulatória total, pelo risco de microtrom-
qua em hemiarco, com ressecção da parte côncava do bose com o sangue estagnado na microcirculação.
arco aórtico (Fig. 34-23).80 Eventualmente é necessá-
PESUlTADOS DO TPATAME~Tr; ('):1..JPGKIj
rio ressecar todo o arco aórtico com reimplante dos
vasos da base, mas esta operação tem maior compli- O tratamento cirúrgico modifica de modo substancial a
cação e mortalidade. história natural da dissecção aguda da aorta do tipo A.
A anastomose distal e proximal do enxerto com a Pacientes com dissecção aguda do tipo A têm uma mor-
aorta deve englobar todas as camadas da parede aórti- talidade acima de 70% nos primeiros 90 dias do episódio
ca. Para tal, a anastomose deve ser feita em locais em agudo.
que estejam presentes a íntima e a média. Quando es- Analisando os dados do Int~rnational Registry for
tas camadas estiverem separadas pela dissecção, de- Aortic Dissection (IRAD), Hagan et alo catalogaram 464
ve-se proceder à união por fio de sutura ou por cola bi- pacientes, sendo 289 do tipo A e 175 do tipo B. Dos paci-
ológica. Desse modo pretende-se que o fluxo sanguí- entes do tipo A, 87 foram tratados clinicamente e 202 tra-
neo seja redirigido apenas para a luz verdadeira. tados cirurgicamente. Entre os pacientes tratados clinica-
7. Quando há o comprometimento das artérias coroná- mente a mortalidade foi de 58%, enquanto que para os
rias, mais comumente à direita, é possível fazer o re- paci~ntes tratados cirurgicamente a mortalidade foi de
implante destas no enxerto. Por vezes, em virtude da apenas 26%. O IRAD representa a soma de experiência
destruição dos óstios coronarianos é mais prudente de 12 centros especializados em tratamento de dissecção
suturá-Ios e fazer pontes de safena. de aorta em 6 países, sendo um excelente termo de com-
8. O sangramento pós-operatório é um problema com paração aonde se esperar resultados.20 Publicação mais
estes pacientes, quer seja pela fragilidade dos tecidos, recente advinda da experiência do IRAD mostra mortali-
dade de 25,1% para o tratamento cirúrgico de dissecção
aguda tipo A, sendo 31,4% para pacientes instáveis e
16,7% para os pacientes estáveis.83
São preditores negativos para sobrevida após trata-
mento cirúrgico da dissecção tipo A: insuficiência renal,
choque, tamponamento, hipotensão, início abrupto da
dor, apolição de pulso, eletrocardiograma anormal e ida-
de acima de 70 anos.
As maiores razões de uma mortalidade ainda alta
após uma cirurgia bem-sucedida estão relacionadas à má
perfusão de órgãos e às suas conseqüências.
Diminuição do tempo entre o início dos sintomas e o
tratamento cirúrgico, assim como resolução de oclusões
arteriais para órgãos importantes, podem contribuir
Flg. 3<1:23 Ressecção para uma melhoria dos resultados cirúrgicos.
aórtica tipo hemiarco. Bavaria et alo enfatizam a necessidade de rapidez no
Anastomose distal
aberta com parada
manuseio dos pacientes com dissecção aguda da aorta.
circulatória total. Preconizam transferência imediata dos pacientes do se-
(Modificado de tor de emergência ou do heliporto, para o centro cirúrgi-
Coselli, 1999.) co, com rápida passagem pelo angiotomógrafo, quando
Capítulo 34
DISSECÇÃOAÓRTICA

possível. Não se deve perder tempo em centro de trata- Os pacientes com dissecção do tipo B tratados cli-
mento intensivo ou setor de hemo dinâmica para coro na- nicamente, em acompanhamento seriado com exa-
riografia. O diagnóstico de dissecção tipo A é confirma- mes de imagem, têm indicação cirúrgica quando
do ou rejeitado na sala de operações, com o paciente já houver sintomas ou formação aneurismática supe-
anestesiado através de ecocardiograma transesofágico. rior a 6,5 cm (ou 6,0 cm em pacientes com síndrome
Com esta estratégia operou 163 pacientes com 9,8% de de Marfan).
mortalidade hospitalar.43 Matsuda et alo observaram que os pacientes com
Resultados igualmente bons foram obtidos por dissecção tipo B tinham uma sobrevida de 95% em 7
Nakajima et alo (9% de mortalidade hospitalar em 100 dias, mas que após 10 anos do evento inicial, esta so-
pacientes operados) e Westaby et alo (mortalidade hos- brevida era de apenas 60%, bem menor do que a so-
pitalar de 5,3% em 95 pacientes operados).84,85 brevida da população em geral equivalente. Ruptura
Rampoldi et aloanalisaram 290 variáveis em 682 paci- de aneurisma em aorta descendente é causa impor-
entes, inclusos no IRAD, submetidos a tratamento cirúr- tante desta diminuição de sobrevida.
gico da dissecção aguda do tipo A, entre 1996 e 2003. 2. Dissecção tipo A crônica: a cirurgia está indicada nos
Foram atribuídos escores em que o logaritmo da razão casos sintomáticos ej ou complicados, seja por dor,
de chance de cada variável permitiu prever o risco opera- oclusão de ramo arterial ou formação de aneurisma.
tório destes pacientes. Tiveram riscos mais elevados his- Nos pacientes assintomáticos a operação está indi-
tória de troca valvar aórtica (1,5), hipotensão, choque ou cada quando houver dilatação superior a 6,5 cm (ou
tamponamento (1,2), dor torácica migratória (1,0), dis- 6,0 cm se o paciente for portador de síndrome de
função ventricular direita (1,6). A soma dos escores se Marfan).
correlacionou à mortalidade encontrada. Por exemplo,
uma soma de escores de 3,8 estimava o risco de mortali- CONSIDERAÇÕES TÉCNICAS DO TR)!T~.MEUTO
dade cirúrgica em 61 %, e um escore de 2,4 estimava esta <:IPÚRGJCO CONVENCIONAL
mortalidade em 31 %.86
Uma das maiores preocupações no tratamento cirúrgico
da dissecção aórtica tipo B é a proteção medular. A por-
TRATAMENTO CIRÚRGIÇO DP.5 ção anterior da medula espinal, de função motora, é
DISSECÇÕES TIPO B nutrida unicamente pela artéria espinal anterior. Esta ar-
téria se origina a partir de artérias vertebrais e de algu-
.. JDKAÇÃO CIRÚRGICA mas artérias intercostais e lombares. A principal nutrido-
O tratamento cirúrgico na dissecção tipo B está indicado ra da artéria espinal anterior é a artéria radicular magna,
nas seguintes situações: ou artéria de Adarnkiewicz, que é ramo de uma artéria
intercostal esquerda originada entre T8 e L2 (Fig.
1. Dissecção tipo B aguda: o tratamento cirúrgico está 34-24).89
indicado nos casos sintomáticos ej ou complicados, Existe uma discussão sobre a real existência da arté-
onde h<ya:a) sinais de ruptura, como dor, hemotórax, ria radicular magna. Griepp et aloacreditam que a circu-
alargamento progressivo do medias tino; b) aneurisma lação medular forma um sincício e, portanto, não acham
de aorta preexistente; c) sinais de isquemia em rim, in- importante revascularizar as artérias intercostais. Preco-
testino, medula espinal, membro inferior; d) dor in- nizam ligadura seriada das artérias intercostais antes do
tratável; e) progressão da dissecção d~ modo anterá- pinçamento aórtico, na presunção de que h<ya acomoda-
grado ou retrógrado; f) hipertensão arterial não con- ção pa circulação sincicial medular, com pré-condiciona-
trolável (pseudocoarctação). mento isquêmico.9o
Quando ocorre controle clínico da dor e não há A maioria dos cirurgiões, para evitar paraplegia, pro-
má perfusão de órgãos e membros, apenas o trata- cura revascularizar as artérias intercostais entre T8 e L2,
mento clínico deve ser instituído, com betabloquea- anastomosando as artérias em "bloco" de forma oblíqua
dores e anti-hipertensivos. Estes pacientes devem ser na prótese, a fim de incluir o maior número possível de
acompanhados clinicamente e com métodos de ima- artérias. .
gem de modos seriado e cuidadoso. Em uma série de A artéria espinal anterior é por vezes descontínua, o
68 pacientes tratados clinicamente no Mount Sinai que torna a medula espinal extremamente vulnerável à
Hospital de Nova Iorque, Schor et aloobtiveram 10% isquemia. Como parte da nutrição da medula espinal é
de mortalidade durante o acompanhamento e obser- proveniente das artérias vertebrais, torna-se importante
varam que 25% dos pacientes clínicos se tornaram ci- evitar o pinçamento da artéria subclávia esquerda e,
rúrgicos por formação de aneurismas ej ou progres- quando isto não for possível, deve-se manter o menor
são da dissecção.87 tempo possível de oclusão subclávia.
Seção IV
ANEURISMAS ARTERIAIS

T4

Iterior
T7
'ill: :)

278J.1
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34-24. A
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artéria radicular magna (ARM) é ramo de uma artéria intercostal esquerda localizada entre T8-T12, e nutre a artéria espinal anterior.
B

(Modificado de Svensson, 2005.)

A pressão de perfusão medular é a diferença entre a monstraram ser de 50 mmHg a pressão mínima em aorta
pressão na aorta distal ao pinçamento aórtico e a pressão descendente necessária para se evitar paraplegia após
do líquido cefalorraquidiano. Intervenções que permi- pinçamento aórtico.91
tam o aumento da pressão aórtica distal ao pinçamento A diminuição da pressão liquórica pode ser conse-
aórtico e que façam diminuir a pressão do líquido cefa- guida por exsanguinação controlada ou pela drenagem
lorraquidiano produzem uma melhora da pressão de do líquido cefalorraquidiano.92
perfusão medular. A cirurgia da dissecção da aorta descendente se baseia
A pressão aórtica distal ao pinçamento aórtico pode na ressecção da origem do segmento dissecado, incluindo o
ser aumentada com uso de alguma forma de circulação local de ruptura da íntima e substituição do segmento aórti-
extracorpórea. Vários trabalhos, inclusive um nosso, de- co ressecado por um enxerto de Dacron@ (Fig. 34-25).

t'

B .~~~\.:. . '\,:,,",:' C
4-25. Paciente com dissecção de aorta tipo B crônica envolvendo aorta torácica e abdominal, apresentando grande dilatação aneurismática
da falsa luz na aorta descendente. (A) Visualização da aorta descendente dilatada, evidenciando-se o local de pinçamento proximal, entre as
artérias carótida esquerda e subclávia esquerda. (B) Ressecção da aorta descendente com interposição de enxerto de Dacron@, desde a artéria
subclávia esquerda até o tronco celíaco. Acesso realizado por dupla via intratorácica, uma no leito da quinta costela esquerda ressecada e outra no
nono espaço intercostal esquerdo, com acesso retroperitoneal à aorta abdominal. (C) Segmento da aorta descendente ressecada, demonstrando
as 2 luzes, trombo na falsa luz e o flap de íntima espessado.
Capítulo34
DISSECÇÃOAÓRTICA

Nos casos agudos, a ressecção é comumente limitada Vários são os métodos utilizados para proteção
ao terço superior da aorta, podendo ser estendida a seg- medular na cirurgia da aorta descendente. Alguns deles
mentos mais distais caso sejam demonstradas reentradas raramente são utilizados:
aórticas. Na aorta distal, as camadas íntima e média de-
1. Cirurgia rápida com pinçamento aórtico simples
vem ser unidas com sutura e/ou cola biológica, de modo
(clamp and go) - somente teve sucesso com raros ci-
que o enxerto a ser suturado redirecione o sangue para a
rurgiões, sendo utilizado somente em situações ex-
luz verdadeira. Nestas operações a aorta proximal comu-
cepcionais, uma vez que pinçamento aórtico acima
mente é pinçada entre as artérias carótida esquerda e
de 20 minutos provoca uma incidência crescente de
subclávia esquerda, devendo o pinçamento ser liberado
paraplegia, chegando a 90% com uma hora de pin-
tão logo a anastomose proximal (distal à artéria subclávia
çamento (Fig. 34-27).
esquerda) seja feita, a fim de diminuir o tempo de oclu-
são da artéria subclávia esquerda. 2. Pinçamento proximal com anastomose distal aberta,
Nos casos crônicos, o flapde íntima originado a partir no intuito de promover exsanguinação distal.
da dissecção se toma espesso e imóvel, com ramos viscerais 3. Shunt de Gott, com tubo entre a aorta ascendente e a ar-
podendo sair de luzes diferentes, o que toma necessária a téria femora! - apresenta como desvantagens: ser uma
manutenção das duas luzes distais ao segmento aórtico que derivação passiva dependente do estado hemodinâmi-
foi ressecado. É recomendado ressecar o flapde íntima dis- co do paciente; e a utilização da aorta ascendente, que é
ta! por cerca de 4 a 5 cm. Dessa forma, a anastomose do frágil, sobretudo, nos casos de dissecção aórtica.
enxerto com a aorta dista! é realizada apenas com as cama- 4. Tromba de elefante, com acesso à aorta descendente
das média e adventícia da parede aórtica (Fig. 34-26).72 através do arco aórtico, sob parada circulatória total.

Fig. 34-26. Ressecçãoda íntima na aorta distal


em operação para tratar dissecção crônica em
aorta descendente, mantendo as 2 luzes
A B distais. (Modificadode Gardner, 2004.)

1,0

0,0
30 60 90
Tempo de pinçamento aórtico (min) Fig. 34-27 Relaçãoentre tempo de
pinçamento aórtico e paraplegia.
Seção IV
ANEURISMASARTERIAIS

Os métodos mais utilizados atualmente são: qualquer trauma sobre o pulmão esquerdo, pois san-
A. Circulação extracorpórea parcial do átrio esquerdo-fe- gramento pulmonar pode ser causa de óbito.
moral - o coração mantém a perfusão dos vasos da A aorta descendente no local da anastomose proxi-
mal deve ser dissecada circunferencialmente, a fim de
base, enquanto a perfusão aórtica distal é feita por
uma bomba de circulação extracorpórea (Fig. 34-28).1 evitar sutura inadvertida do esôfago. A utilização de
A canulização do átrio esquerdo é realizada por cânula sonda nasogástrica facilita a localização do esôfago.
que pode ser colocada através do "apêndice" atrial es- Os nervos frênico, vago e recorrente devem ser
querdo, da veia pulmonar inferior esquerda ou da veia dissecados e protegidos de eventuais lesões.
pulmonar superior esquerda. O retorno arterial é feito As artérias intercostais localizadas entre a artéria
pela artéria femoral esquerda ou pela aorta descen- subclávia esquerda e T8 são ligadas e seccionadas an-
dente distal ao pinçamento aórtico. O paciente é anti- tes do início da circulação extracorpórea.90 As artérias
coagulado com heparina, com 2 a 4 mglkg de peso. intercostais localizadas distalmente a T8 são reimplan-
Utilizamos bomba centrífuga para diminuir a possibi- tadas no enxerto com retalhos aórticos tipo Carrel.
lidade de hemólise. O fluxo sanguíneo é mantido en- Outra medida que deve ser feita para evitar para-
tre 1.500 e 2.500 mljmim, de tal modo, que a pressão plegia é a drenagem do líquido cefalorraquidiano
arterial medida na artéria femoral direita, ou seja, dis- através de cateter posicionado ao nível de L2, antes
tal ao pinçamento aórtico fique acima de 60 mmHg. da incisão cirúrgica. É mantida uma drenagem contí-
Estes pacientes são operados por toracotomia es- nua por até 72 horas de pós-operatório para se man-
querda com acesso torácico no leito da quinta costela ter a pressão do líquido cefalorraquidiano abaixo de
esquerda. Às vezes é necessário outro acesso torácico, 10 mmHg. Ao se pinçar a aorta descendente há um
no oitavo espaço intercostal esquerdo, para se reali- aumento da pressão arterial proximal que pode ser
zar anastomose distal. Na fase de dissecção e de aces- deletéria para a função cardíaca. Esta hipertensão ar-
so a aorta, hipotensão controlada com nitroprussiato terial proximal é controlada através de exsanguina-
de sódio facilita as manobras cirúrgicas e evita san- ção temporária, drenando sangue para um reservató-
gramentos. Antes do início da circulação extracorpó- rio, onde também converge o sangue aspirado do
rea o nitroprussiato de sódio é descontinuado, pois campo cirúrgico. Ao término da anastomose distal
pode contribuir para a diminuição da perfusão me- todo o sangue do reservatório é devolvido ao pacien-
dular, por provocar mai~ produção de líquido cefa- te, a circulação extracorpórea interrompida e a aorta
lorraquidiano e aumento de pressão liquórica. lentamente despinçada. Com o uso da circulação ex-
A cirurgia é realizada com ventilação unipulmonar, tracorpórea há uma hipotermia passiva geralmente
através de tubo endotraqueal de dupla luz, que permi- até 32°C de temperatura retal, que contribui para a
te manter o pulmão esquerdo colabado. Durante a ex- proteção medular. É importante ter um sistema de
posição do campo cirúrgico deve-se evitar ao máximo troca de calor no circuito de circulação extracorpó-
rea que permita o reaquecimento do paciente.
B. Circulação extracorpórea parcial entre a veia e arté-
ria femoral, utilizada em re-operações ou aneurismas
gigantes onde se torna impossível o acesso ao átrio
esquerdo. Tem como desvantagem a necessidade de
se~incorporar um oxigenador ao circuito de circula-
ção extracorpórea.
C. Hipotermia profunda e parada circulatória total, de-
senvolvidas por Kouchoukos et al., onde a proteção
medular é feita através de hipotermia com conse-
qüente abolição do metabolismo celular.93 A circula-
ção extracorpórea é iniciada entre a attéria e a veia
femoral e o paciente resfriado até 18° C de tempera-
tura retal, quando, então, a circulação extracorpórea
Fig. 34-28. Circulação é interrompida. Utilizamos uma cânula venosa longa,
extracorpórea parcial
que através de fio-guia e com aUXIlio de ecocardio-
átrio esquerdo-
femoral. (Modificado grama transesofágico peroperatório, é posicionada
de Vilacosta e San em veia cava superior, de tal modo que fiquem os ori-
Roman, 1997.) fícios da cânula na veia cava superior e no átrio direi-
Capítulo 34
DISSECÇÃOAÓRTICA

to. A adição de um sistema de vácuo à cânula inserida Com base nestes dados, sustenta-se a afirmativa que
pela veia femoral permite uma melhor drenagem ve- o tratamento clínico deve ser o tratamento de escolha
nosa. Na eventualidade de a drenagem venosa ser in- para os pacientes assintomáticos, enquanto que o trata-
suficiente uma canulização adicional da artéria pul- mento cirúrgico deve ser oferecido para os pacientes sin-
monar pode complementar esta drenagem. O ventrí- tomáticos ej ou com complicações.
culo esquerdo é drenado através do átrio esquerdo São fatores que contribuem para o insucesso do tra-
ou da ponta do ventrículo esquerdo. tamento cirúrgico da dissecção de aorta tipo B: hipoten-
são, choque, comprometimento de vasos do membro su-
Logo depois de finalizada a anastomose proximal a
perior e ausência de dor no dorso.
circulação extracorpórea é reiniciada através do enxerto,
a fim de se diminuir o tempo de isquemia cerebral. Tão Relatando uma experiência mais atual, após análise de
1.898 casos operados em centros de excelências, Svensson
logo sejam revascularizadas as artérias intercostais de-
et aL (2007) demonstraram uma mortalidade de 4,8%, com
ve-se iniciar o reaquecimento do paciente até 35°C (Fig.
incidência de paraplegia de 3,4% e de acidente vascular
34-29).72A maior desvantagem deste método é o sangra-
cerebral de 2,7%.94
mento por discrasia sanguínea secundária à hipotermia
profunda. Nós apenas utilizamos hipotermia profunda e Estretra et aloapresentaram os dados de 159 pacien-
parada circulatória total em pacientes com ruptura aórti- tes com dissecção aguda da aorta tipo B operados .entre
ca e hemotórax esquerdo maciço, onde a abertura do es- 2001 e 2006. A mortalidade cirúrgica foi de 8,8%, a inci-
paço intercostal pode provocar exsanguinação, ou, ainda, dência de paraplegia de 8,2% e de acidente vascular cere-
naqueles pacientes em que é não possível fazer com segu- bral de 5,0%. Entretanto, quando foram distinguidos os
rança o pinçamento aórtico proximal (cálcio, debris, gran- pacientes operados com complicações e sem complica-
des aneurismas, dissecção justacarotídea). ções, foi observada uma mortalidade de 17% versus ape-
nas 1,2%, respectivamente. Inte{essante que a mortalida-
RESULTADOS DO TRATAMENTO CIRÚRGICO de dos pacientes não complicados tratados clinicamente
CONVENCIONAL foi de 7,4% no período. Relatam também alta incidência
O resultado do tratamento cirúrgico da dissecção aguda de complicações pulmonares e renais pós-operatórias.95
de aorta em 175 pacientes catalogados pelo IRAD, entre
1996 e 1998, mostrou uma mortalidade hospitalar de
MANUSEIO DA MÁ PERFUSÃO
31 %, contra apenas 11% nos pacientes tratados clinica- DISTAl/TRATAMENTO CIRÚRGICO
mente.20 Entretanto, deve-se considerar que os pacientes CONVENCIONAL E ENDOVASCUlAR
do grupo cirúrgico foram aqueles que apresentaram mais A má perfusão de rim, intestino, medula espinal ou
freqüentemente dissecção associada a complicações. Para membros inferiores pode ter conseqüências catastrófi-
pacientes complicados, o risco cirúrgico do grupo clínico cas. A deterioração clínica do paciente pode ser reverti-
foi muito maior do que o do grupo cirúrgico, enquanto, da, aliviando-se a obstrução arterial.
para o grupo não complicado, este risco foi igual. Fann et alo relataram que dos pacientes que são sub-
metidos a tratamento cirúrgico da aorta torácica devido
à dissecção aórtica tipo B com complicações isquêmicas,
cerca de 8% permanecem com isquemia de membro in-
ferior ou órgãos, necessitando de nova intervenção. 96
fsta desobstrução arterial pode ser obtida através de

.
procedimentos de revascularização ej ou fenestração,
seja cirúrgica seja endovascular.

Fig. 34-29. Revascularização e fenestração cirúrgica


Anastomose proximal
do enxerto na aorta Revascularizações arteriais com reimplante de ramos em
descendente, com. locais da aorta com perfusão adequada ou confecção de
hipotermia profunda pontes diretas ou extra-anatõmicas são procedimentos
e parada circulatória de exceção no tratamento das dissecções aórticas. No en-
total. Reinício da
tanto, apresentam especial indicação na isquemia de
perfusão cerebral
através de ramo
membro inferior unilateral, onde a ponte femorofemo-
ral cruzada é a cirurgia preferencial.97
~ lateral do enxerto
aórtico. (Modificado
de Gardner, 2004.)
A fenestração cirúrgica redireciona o fluxo aórtico
através da criação de uma comunicação entre a luz falsa e
Seção IV
ANEURISMASARTERIAIS

a verdadeira na aorta abdominal, despressurizando a fal- isquêmicas, sendo inicialmente descrita por Williams et
sa luz e reperfundindo setores antes isquêmicos. al., em 1990.100A fenestração endovascular percutânea,
Diferentes abordagens existem para a realização da assim como a fenestração cirúrgica, se propõe a realizar
fenestração cirúrgica da aorta. Elefteriades et alopreconi- uma comunicação entre a luz falsa e a verdadeira, reper-
zam acesso retroperitoneal, transecção completa da aorta fundindo os ramos aórticos previamente isquêmicos. A
infra-renal, excisão doflaP médio-intimal, obliteração dis- utilização de stents e outros sistemas podem ser necessá-
tal da falsa luz, com restabelecimento do fluxo por anas- rios na revascularização endovascular de vasos ocluídos.
tomose terminoterminal primária ou por interposição de Através de acesso percutâneo femoral é criado um per-
pró tese de dácron (Fig. 34-30).1.98Webb e Williams reco- tuito no flap médio-intimal, comunicando a luz comprimi-
mendam incisão longitudinal da aorta, pois permite reali- da (geralmente, a verdadeira) com a luz em expansão (em
zar extensa fenestração, além de possibilitar melhor vi- geral, a falsa). Esta fenestração mais comumente é realizada
sualização de artérias renais e mesentérica superior. na topografia dos vasos viscerais, sendo utilizadas agulhas
Quando há necessidade do uso de prótese, aortotomia de Roesch-Uchida,Brockenboroughou Colapinto. Após a cria-
transversa deve ser preferencialmente realizada.99 Panne- ção do pertuito um fio-guia rígido introduzido por via
ton et alo preferem acesso transperitoneal por permitir femoral na luz verdadeira é avançado através do orifício cri-
avaliação do grau de isquemia ou a presença de necrose ado e posicionado na luz falsa. Este fio-guia servirá de
intestina1.97 O acesso aos vasos viscerais permite eventual suporte para posicionamento do cateter balão, com diâme-
trombectomia, caso haja trombose secundária ou trom- tros de 12 a 15 mm, que será expandido, dilatando o pertui-
bos na falsa luz. to inicialmente criado pela agulha, permitindo assim a per-
fusão e descompressão da luz verdadeira (Fig. 34-31).1 A
Revascularização e fenestração confirmação da eficácia da fenestração pode ser estabeleci-
endoyascular da através da mensuração do gradi~nte de pressão nas duas
A abordagem endovascular nas dissecções aórticas foi pri- luzes. Redução significativa no gradiente de pressão denota
meiramente aplicada para o tratamento de complicações adequada perfusão na luz verdadeira.

Fig. 34-30. Fenestração abdominal cirúrgica.


(Modificado de Vilacosta e San Roman, 1997.)

Fig. 34-31. Fenestração do flap de dissecção


na aorta abdominal através de cateter balão.
(Modificadode Vilacostae San Roman, 1997.)
Capítulo 34 ...-....
DISSECÇÃOAÓRTICA

o uso de ultra-sonografia intravascular (IVUS@)per- ção cirúrgica deve ser considerada quando o comprome-
mite identificar a passagem de fios-guia e cateteres, certi- timento de ramos ou a oclusão aórtica for complicada
ficando o correto posicionamento dos mesmos na aorta, pela presença de trombose, ou, ainda, em pacientes que
reduzindo, assim, o risco de perfuração aórtica. têm indicação de interposição de prótese.97
Procedimento alternativo pode ser realizado com a
colocação de 2 fios-guia rígidos, um na luz falsa e outro CONSIDERAÇÕES TÉCNICAS E RESULTADOS
na luz verdadeira, introduzidos pelo mesmo acesso femo- DO TRATAMENTO ENDOVASCULAR
ral. A seguir um único introdutor é avançado sobre
As publicações de Dake et alo e Nienaber et al., em 1999,
ambos os fios-guia, provocando uma ruptura longitudi- estabeleceram o tratamento endovascular como uma
nal da íntima, restabelecendo o fluxo sanguíneo arterial.
nova opção de abordagem das dissecções aórticas tipo
Nos casos em que a fenestração não tenha sido eficaz B.9,1OO implante de endoprótese, ocluindo o orifício de
ou nos casos em que algum flap de íntima esteja gerando entrada da dissecção, interrompe o fluxo na falsa luz ge-
obstrução estática de ramo aórtico, o uso de stents na luz rando trombose da mesma, provocando expansão da luz
verdadeira da aorta ou nos ramos pode se fazer necessá- verdadeira (Fig. 34-33).38Dessa forma, as principais com-
rio (Fig. 34-32).97 plicações das dissecções seriam passíveis de solução: a
Williams et alorealizaram fenestração percutânea com dilatação da falsa luz, a compressão da luz verdadeira e a
balão ej ou implante de stent em 24 pacientes, obtendo isquemia de órgão-alvo.
92% de sucesso técnico, mortalidade em 30 dias de 25% e O procedimento, em geral, é realizado no centro ci-
recorrência de isquemia em 8%.101Slonim et al: utilizaram rúrgico, tendo em vista o potencial maior de conversão,
técnicas endovasculares para o tratamento das complica- devendo o paciente ser submetido à anestesia geral com
ções isquêmicas da dissecção aórtica em 22 pacientes, monitorização invasiva e extensivp..Ecocardiografia transe-
apresentando 93% de sucesso técnico e mortalidade em sofágica, ou ainda, ultra-sonografia intravascular (IVUS@),
30 dias de 25%.102A elevada taxa de mortalidade precoce podem servir como adjuvantes no controle do implante da
nestas duas séries foi devida à isquemia de órgãos intra- endoprótese, sobretudo, na identificação da luz verdadei-
abdominais, sobretudo isquemia mesentérica. ra e no correto posicionamento dos sistemas (Fig. 34-34).103
A criação de um orifício de reentrada relativamente Durante o implante a pressão arterial média (PAM) deve
pequeno, quando comparado à fenestração cirúrgica, ser temporariamente reduzida para 50-6.0mmHg para evi-
pode levar à descompressão apenas parcial da luz verda- tar'possíveis deslocamentos da próiese.38 Parada circulató-
deira, predispondo a recorrência isquêmica e expansão e ria com administração de adenosina, dipiridamol ou outros
ruptura da falsa luz.97 tem sido pouco utilizada. A endoprótese deve ser liberada
A principal indicação de fenestração é quando ocor- justaposta à artéria subclávia esquerda, ocluindo o orifício
re obstrução estática de ramos aórticos, gerando má per- de entrada da dissecção. Eventual oclusão da artéria sub-
fusão e isquemia de órgãos ou membros inferiores. clávia esquerda pode ser necessária para se obter a com-
Obstruções dinâmicas, provocadas pela compressão da pleta oclusão do orifício de entrada. Nestes casos, a revas-
luz verdadeira, em geral, são solucionadas com o implan- cularização subclávia imediata é controversa, e alguns
te de endoprótese na aorta torácica proximal, ocluindo o autores só a realizam em caso de insuficiência vertebroba-
orifício de entrada e redirecionando o fluxo aórtico para silar ou claudicação de braço
a luz verdadeira (ver adiante). No entanto, quando isso O tratamento endovascular com implante de endo-
não ocorre, devem-se realizar fenestração do flaP de dis- prótrse, além de evitar o risco associado à cirurgia aber-
secção e revascularização dos ramos ocluídos.38 ta, foi propulsionado pela perspectiva de indução do
No estudo de Dake et al., ao analisarem 28 complica- remodelamento aórtico a partir da oclusão do orifício de
ções isquêmicas de pacientes com dissecção aórtica tipo entrada proximal. Este conceito foi originalmente estabe-
B, observaram que todas as obstruções de origem dinâ- lecido, a partir da observação que alguns pacientes que
mica foram corrigidas pela colocação de endoprótese na evoluíam com trombose espontânea da falsa luz tinham
aorta torácica. Nos casos de obstrução de origem estática melhor prognóstico a longo prazo.104 Em contrapartida,
esta correção ocorreu em apenas 40% dos casos, sendo a persistência de fluxo na luz falsa tem sido identificada
necessária realização de fenestração e o uso de stents.9 como fator. de risco independente de predição de pro-
A abordagem endovascular deve ser considerada a gressão de dilatação aórtica e pior prognóstico a longo
primeira linha de tratamento das complicações isquêmi- prazo.105 Trombose espontânea da falsa luz é raramente
cas da dissecção aórtica tipo B, sobretudo a aguda, sendo observada, em ::;4% dos casos.104
um procedimento menos invasivo e que rapidamente res- Hematomas intramurais e úlceras penetrantes aórti-
tabelece o fluxo dos territórios isquêmicos. A fenestra- cas também podem ser tratados por técnica endovascu-
.hI' Seção IV
ANEURISMASARTERIAIS

B
Fenestração

Fig. 34-32. Arteriografiacom injeção de contraste


na luz falsa (A) e verdadeira (8) demonstrando
que artéria renal esquerda, mesentérica superior e
tronco celíaco saem da luz ver.dadeiraenquanto 2
artérias renais direitas saem da luz falsa. O
gradiente de pressão entre as 2 luzes aórticas foi
mensurado em 30 mmHg. Realizadafenestração
endovascular no níveldas artérias renais,
utilizando-secateter balão através do flap
médio-intimalpara criação de comunicação entre
luz verdadeira e a falsa (C).Stent (Palmaz 12 mm)
foi implantado no níveldo tronco celíaco para
expansão na luz verdadeira na origem dos vasos
viscerais.Controle arteriográfico (D) evidenciou
adequada perfusão de ambas as luzes, havendo
gradiente de pressão entre elas de apenas de
7 mmHg (gradiente anterior era de 30 mmHg).
c (Modificadode Panneton, 2000.)
Capítulo 34
DISSECÇÃOAÓRTICA

Artéria carótida esquerda

Artéria subclávia esquerda


com seu óstio ocluído

Trombose da
falsa luz

Endoprótese

Fig. 34-33. Esquema evidenciando implante de


endoprótese na aorta torácica proximalcom
oclusão do orifíciode entrada e trombose da
falsa luz. Observa-seque houve oclusão
também do óstio da artéria subclávia
esquerda. (Modificadode Baliga.2007.)

lar. O implante de endoprótese interpondo a área de ocluídas, e instabilidades hemodinâmicas são menos
lesão na aorta descendente tem apresentado bons resul- comuns do que na cirurgia convencional, dessaforma, o
tados preliminares.58.65 potencial de lesãomedular é menor, nãojustificando o uso
Diversas publicações demonstraram que o tratamen- rotineiro de drenagem liquórica. Nos casosem que há défi-
to endovascular é factível, tecnicamente seguro e associa- cit neurológico agudo por lesão medular, ou em pacientes
do a baixa morbidade e mortalidade operatórias. Egge- com cirurgia da aorta abdominal prévia a drenagem liquó-
brecht et al., em extensa revisão da literatura, em metaná- rica deve ser instituída, para melhoria da perfusão medular.
lise de 609 pacientes com dissecção tipo B, submetidos Elevação da pressão arterial sistêmica e administração de
corticóides também são benéficas nestes casos.3.53
ao tratamento endovascular com endoprótese, observa-
ram sucesso técnico em mais de 95% dos procedimentos, A ocorrência de acidente vascular cerebral durante o
e sobrevida em dois anos de até 90%. Complicações in- implante de endopróteses torácicas é creditada à mani-
tra-hospitalares ocorreram em 14 a 18% dos pacientes, pulação de fios-guia, cateteres e sistemasintrodutores da
sendo metade destas complicações relacionadas direta- endoprótese no arco aórtico, gerando eventos embóli-
mente ao procedimento. As complicações mais freqüen- coso Espera-se que com o desenvolvimento de materiais
tes foram as neurológicas, que ocorreram em 2,9 a 3,4% mais maleáveis e pró teses de menores perfis, o risco de
dos pacientes, sendo o risco de paraplegia de 1% e de aci- acidente vascular cerebral diminua.
dente vascular cerebral de 1,9 a 2,6%.106 Eggebrecht et al., em sua abrangente revisão, tam-
O mecanismo de indução à paraplegia no tratamento bém demonstraram que os pacientes tratados na fase
endovascular parece estar relacionado à ocluSão de artérias aguda tiveram risco maior de morte ou complicações
intercostais pela interposição da endoprótese, em especial pós-operatórias quando comparados àqueles com dissec-
quando ocorre oclusão da artéria de Adamkiewics. Quanto ção ~rônica.106 Kato et aloobservaram dados semelhantes
maior a extensão e quanto mais dista! é o posicionamento da e argumentam que o reparo endovascular deveria ser
endoprótese, maior o potencial de danO.I07O implante de empregado tardiamente em pacientes com dissecção
endoprótese na aorta torácica e abdominal, assim como a aguda, em decorrência da fragilidade da parede da aor-
oclusão da artéria subclávia esquerda e artérias ilíacas inter- ta.I08 No entanto, este conceito não é confirmado por
nas aumenta o risco de paraplegia, pois gera insuficiência da outros autores, devendo ser considerado. que os pacien-
circulação colateral.53 Eggebrecht et aL preconizam o trata- tes na fase aguda apresentam mais freqüentemente com-
mento inicial apenas do orifício de entrada proximal; e quan- plicações relacionadas à dissecção, que tornam sua sobre-
do houver presença de outros orificios de entrada distais, vida menor quando comparados a pacientes estáveis na
estesdevem ser tratados com intervalo de pelo menos 2 me- fase crônica, independente da terapêutica empregada.
sesem um segundo procedimento endovascular.I06 Pacientes com dissecção aguda parecem possuir po-
Na abordagem endovascular não há clampeamento tencial maior para que ocorra o remodelamento da aorta
aórtico, raramente as artérias intercostais entre T8 e L2 são induzido pela endoprótese. Shimono et alo observaram
Seção IV
ANEURISMASARTERIAIS

A A1

I'
Fig. 34-34. Imagens de ecocardiograma
transesofágico (ETE)com Doppler colorido
durante implante de endoprótese para
tratamento de dissecção aórtica. (A) ETE
realizado após implante da endoprótese,
evidenciando "vazamento" ao redor do stent,
com presença de fluxo da luz verdadeira (TL)
para a luz falsa (FL)da dissecção aórtica
(seta). A 1) Doppler confirma o "vazamento",
com alta velocidade de fluxo (120 cm/s) e
alta intensidade do sinal. (B) ETE
demonstrando insuflação de cateter balão
(setas) para adequado selamento da
endoprótese à parede aórtica. (C) ETE
evidenciando resolução do "vazamento"
(seta) com trombose parcial da luz falsa (FL),
10 minutos após insuflação do cateter balão.
((1) Doppler apresentando apenas fluxo
relacionado a porosidade da prótese
(Dacron@), com baixa velocidade de fluxo
50 cm/s) e baixa intensidade do sinal.
c «

C1 (Modificadode Rocchi,2004.)

que a obliteração e resolução da falsa luz, no tratamento pacientes, a esperada trombose da falsa luz da aorta toráci-
endovascular, ocorreu mais freqüentemente nas dissec- ca não ocorreu em cerca de um quarto dos casos (24,5%).
ções agudas quando comparados às crônicas (70% VS. Entretanto, mesmo havendo a trombose da falsa luz,
38,5% ).109 . alguns pacientes evoluíram com dilatação aórtica abdomi-
O implante de endoprótese na aorta torácica para nal ou torácica descendente distal, 2,3% (:I:0,6%) apresen-
exclusão do orifício de entrada das dissecções tipo B ain- taram ruptura aórtica durante o acompanhamento, e cer-
da não apresenta sucesso absoluto quando avaliado seus ca de 12% dos pacientes necessitaram de implante de
objetivos primários: trombose da falsa luz e reperfusão endopróteses adicionais ou conversão tardia para cirurgia
de órgãos previamente isquêmicos. aberta.106 Neste levantamento não há dado sobre a trom-
Na metanálise realizada por Eggebrecht et al., com bose da falsa luz da aorta abdominal. Dake et aloobserva-
base em 39 estudos diferentes, observou-se que em 237 ram trombose da falsa luz abdominal em apenas 5% das
Capítulo 34
DISSECÇÃOAÓRTICA

dissecções tratadas com endoprótese.9 Kato et alo avalia- 2. O tratamento endovascular, com implante de endo-
ram 15 pacientes com dissecção crônica e notaram que pró tese na aorta torácica proximal, e eventual fenes-
cerca de 80% permaneciam com a falsa luz abdominal tração e implante de stent devem ser a escolha nos pa-
patente após o tratamento endovascular, sendo que um cientes com dissecção aórtica tipo B com síndrome
paciente desenvolveu aneurisma da aorta abdominal.llo de má perfusão.
Lopera et alorelacionam a presença de múltiplos ori- 3. Pacientes com dissecção aórtica tipo B aguda com com-
fícios de entrada na aorta abdominal e torácica descen- plicações outras, que não má perfusão de órgãos ou
dente distal, que perpetuam o fluxo na falsa luz e a fibro- membros, também se beneficiam do tratamento endo-
se do flap médio-intimal, presente nas dissecções crôni- vascular, apesar de este não afastar por completo a pos-
cas, como fatores de insucesso do tratamento endovascu- sibilidade futura de dilatação aneurismática e ruptura.
lar nas dissecções da aorta.lll
Ainda permanecem algumas dúvidas na indicação
O implante da endoprótese proximalmente na luz ver- do uso de endoprótese no tratamento da dissecção aórti-
dadeira restabelece o adequado fluxo sanguíneo para os ca tipo B: pacientes instáveis hemodinamicamente, rup-
ramos aórticos, não sendo necessária na grande maioria tura iminente, dissecções crônicas.
das vezes a realização de fenestrações ou implante de Novos estudos são necessários para estabelecer uma
stent.lll Dake etalorelataram 76% de sucesso na revasculari-
resposta confiável para estes questionamentos. No mo-
zação de ramos previamente obstruídos após dissecção aór- mento a terapia endovascular deve ter sua indicação
tica, apenas com o implante de endoprótese na aorta toráci- estratificada e individualizada para cada paciente, sem-
ca.9 No entanto, nos casos em que há isquemia persistente, pre se considerando a possibilidade do tratamento clíni-
geralmente relacionada à obstrução estática dos ramos aór- co e cirúrgico.
ticos, procedimentos como fenestração e stent devem ser
.l
realizados concomitantemente ao implante da endoprótese
aórtica.112Em caso de novo insucesso, a revascularização ou ACOMPANHAMENTO TARDIO
fenestração cirúrgica deve ser considerada.
É muito importante que estes pacientes sejam acompa-
Além da dilatação aneurismática e ruptura, outras
nhados por toda a vida, independente da terapêutica ins-
complicações são descritas no acompanhamento tardio
tituída, pois a incidência de complicações tardias é muito
como fratura, migração ou até mesmo trombose da en- alta.
doprótese e fístula aortoesofágica. A ocorrência de dis-
As complicações tardias mais comuns são: 1. progres-
secção retrógrada para aorta ascendente (tipo A) ocorre são da insuficiência valvar aórtica; 2. formação de aneuris-
em cerca de 2% dos pacientes no período intra-hospitalar
ma e ruptura da aorta; 3. dissecção recorrente da aorta ou
e em similar proporção durante o acompanhamento,
progressão de dissecção já existente; 4. pseudo-aneurisma
sendo creditada indução de lesão intimal pela endopró-
tese. anastomótico; 5. má perfusão de ramos aórticos.
Estão em maior risco de problemas tardios pacientes
A experiência da equipe cirúrgica também foi aponta-
com síndrome de Marfan e aqueles com falsa luz pérvia.
da como um importante fator de influênci\i nos resulta-
dos do tratamento endovascular das dissecções aórticas. Após o tratamento cirúrgico das dissecções tipo A,
em aproximadamente 90% dos casos, há uma dissecção
Centros que relataram casuísticas superiores a 20 pacien-
do tipo B residual, distal ao segmento da aorta ascenden-
tes tratados obtiveram resultados significatjvamente supe-
te operado. Aproximadamente 30% dos pacientes trata-
riores, com taxas de complicações menores.106
dos de dissecção tipo A necessitarão de cirurgia futura
Na atualidade, o implante de endoprótese para oclu-
para 'ressecção de aneurisma de aorta descendente. Este
são do orifício de entrada da dissecção e redirecionamen-
risco é ainda maior, se o paciente for jovem e tiver síndro-
to do fluxo encontra importante espaço no arsenal tera- me de Marfan.
pêutico, devendo adequa;-se às seguintes evidências e
proposições: . Da mesma forma, pacientes submetidos ao tratamep.-
to cirúrgico da aorta torácica nas dissecções tipo B
1. O tratamento clínico deve ser mantido como primei- podem permanecer com dissecção residual na aorta torá-
ra opção para os pacientes com dissecção aórtica tipo cica distal e na aorta abdominal, havendo possibilidade
B estáveis e sem complicações e deve, também, ser futura da necessidade de novas intervenções.
instituído como terapia adjuvante em todos os de- Pacientes submetidos ao tratamento endovascular
mais pacientes. No momento, não há evidência que também não estão isentos de complicações futuras e
justifique o implante de endopróteses nas dissecções devem ser acompanhados rigorosamente, tendo em vista
tipo B assintomáticas, no entanto, esta é uma tendên- o potencial de não trombose da falsa luz e a possibilidade
cia futura. de complicações relacionadas à endoprótese.
'l,..'J Seção IV
ANEURISMASARTERIAIS

o acompanhamento deverá ser realizado por visitas COMENTÁRIOS


ambulatoriais regulares, controle ecocardiográfico (para
avaliar a insuficiência aórtica) e exames de imagem seria- Uma abordagem eficaz das dissecções aórticas está rela-
dos. Este controle deve ser feito com 1, 3, 6, 12 meses e
cionado à suspeição clínica, com um rápido diagnóstico
depois anualmente.
e precisa classificação, permitindo, assim, que seja feita a
O exame de imagem a ser utilizado como primeira melhor opção entre o tratamento clínico, endovascular e
escolha é a angiorressonância magnética, que tem a cirúrgico.
grande vantagem de não utilizar radiação ionizável nem
Os meios diagnósticos atuais permitem uma avalia-
contraste iodado. A 2" escolha é a angiotomografia heli- ção mais precisa da dissecção aórtica, localizando o sítio
coidal, e a 3", o ecocardiograma transesofágico.
de ruptura da íntima, locais de reentrada e possíveis obs-
É muito importante que os pacientes já operados de truções arteriais.
dissecção aguda da aorta tenham sua pressão arterial
As dissecções aórticas devem ser estudadas de forma
mantida em níveis máximos de 130/80 mmHg à custa de
individualizada, distinguindo-as das demais patologias
betabloqueadores e outros agentes anti-hipertensivos.68
da aorta, tais quais, aneurismas, úlceras penetrantes e
hematomas intramurais.
PREVENÇÃO O tratamento clínico é condição sine qua non para
todo o paciente com dissecção aórtica, independente do
o melhor modo de prevenir dissecção aórtica é pelo con- tipo de dissecção, ou da necessidade de abordagem
trole rigoroso da pressão arterial, inclusive naqueles paci- endovascular ou cirúrgica associada.
entes com alterações estruturais e hereditárias da parede O tratamento cirúrgico obteve uma substancial me-
aórtica. Betabloqueadores são os agentes de escolha, por lhora de seus resultados a partir de aprimoramentos da
abaixar a pressão e diminuir a onda de pressão de pulso técnica cirúrgica, seja nas dissecções tipo A ou B, entre-
(dp/ dt) sobre a parede da aorta. Já foi demonstrado que tanto, ainda mantêm morbidade e mortalidade relativa-
os betabloqueadores fazem retardar a dilatação aórtica mente altas, sendo sua efetividade dependente da pre-
em portadores de síndrome de Marfan.1l3 Pacientes com sença de má perfusão de órgãos, gravidade do paciente e
síndrome de Marfan devem ser mantidos com pressão ar- da estrutura institucional em que estes são atendidos.
terial inferior a 120/80 mmHg e freqüência cardíaca
O tratamento endovascular vem progressivamente
menor do que 60 batimentos por minuto.68 ganhando espaço na abordagem da dissecção tipo B, no
Uso de estatinas, por abaixar os níveis de colesterol, entanto, estudos ainda são necessários para definição de
está indicado em pacientes com risco de dissecção de critérios precisos para sua indicação, sobretudo, nos
aorta, pois diminui a produção de metaloproteinase 9 da pacientes assintomáticos ou com dissecção crônica. Já a
matriz extracelular, tornando a parede aórtica menos frá- abordagem endovascular nas dissecções tipo B agudas e
gil.1l4 na resolução de má perfusão de órgãos é uma realidade e
Em pacientes com dilatação aneurismática da aorta pode modificar a história natural da dissecção aguda da
deve-se indicar ressecção cirúrgica sempre que houver aorta.
sintomas ou, nos pacientes assintomáticos, que apresen-
tarem aorta ascendente com pelo menos 5,5 cm (ou 5,0 QUESTÕES
cm em pacientes com síndrome de Marfarl) e aorta des-
cendente com 6,5 cm (ou 6,0 cm em pacientes com sín- 1. A dissecção aórtica limitada apenas à aorta ascen-
drome de Marfan). Para crianças utilizam-se nomogra- d~nte pode ser classificada como:
mas que demonstrem o diâmetro da aorta para determi- (a) Tipo I de DeBakey.
nado peso e altura; indicando tratamento cirúrgico (b) Tipo B de Stanford.
quando este diâmetro for superior a 1,5 vez o diâmetro (c) Tipo 11de DeBakey.
normal.
(d) Tipo III de DeBakey.
Nos pacientes em que é necessária a troca da válvula
aórtica, por estenose ou insuficiência, é recomendado 2. Qual o agente etiológico mais comum para dissec-
que seja feita a ressecção simultânea da aorta ascendente ção aguda da aorta tipo B em paciente com mais de
65 anos:
toda vez que o diâmetro aórtico for superior a 4 cm. Des-
sa forma, o risco de ruptura e dissecção da aorta no (a) Válvula aórtica bicúspide.
pós-operatório a médio prazo é reduzido. Esta conduta é (b) Hipertensão arterial.
ainda mais importante se o paciente for mulher, a aorta (c) Doença de Marfan.
tiver paredes finas e a válvula aórtica for bicúspide.ll5 (d) Coarctação de aorta.
Capítulo 34
DISSECÇÃOAÓRTlCA

3. O comprometimento aórtico na síndrome de Mar- (c) Ligar as artérias intercostais entre T8 e L2.
fan está ligado à alteração estrutural de: (d) Manter hipotensão induzida no pós-operatório
(a) Miosina. imediato.
(b) Elastina.
10. Em qual dos pacientes a seguir, com dissecção aór-
(c) Fibrilina. tica, estaria indicado tratamento cirúrgico?
(d) Actina.
(a) Tipo A crônica com aneurisma de 4,5 em.
4. Um paciente de 40 anos dá entrada no serviço de (b) Tipo A aguda com insuficiência aórtica.
emergência do Hospital com dor torácica. Angioto- (c) Tipo B crônica com aneurisma de 5,5 em.
mografia helicoidal demonstra dissecção aórtica (d) Tipo B aguda sem dor.
tipo A. O próximo passo é:
(a) Angiografia digital. QUESTÕES
(b) Cirurgia imediata.
1. C 2. B 3. C 4. B 5. C 6. B 7. C 8. D 9. A 10. B
(c) Cinecoronariografia.
(d) Monitorização hemo dinâmica.

5. Qual das seguintes artérias menos contribui para REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


irrigação da medula espinal?
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