No ritual do Rito Moderno (GOB, diversas pedras polidas, para que estas
Em termos maçônicos, cada
2009), quando da entrada de um visi-
tante desconhecido, faz-se o telhamento
(p. 62) e neste questionamento existe a
pergunta do Venerável Mestre: " O que
se faz em vossa Loja?". E a resposta
do visitante: "Edi ficam-se Templos
à Virtude e cavam-se ma smorras ao
Vício". (Observe as letras mai úsculas,
conforme o Ritual. ) Esta questão é
repetida no telhamento no 2° Grau
(GOB, 20096), p. 37. O mesmo ocorre
no 3º Grau (GOB, 2009c), p. 4 8. Esse
questionamento consta, também, do
R :.E:.A:. A:. (GOB, 2009d), do Rito
Brasileiro (GOB 2009e) e do Rito Ado-
nhiramita (GOB, 2009f) e se espalhou
por toda M açonaria francesa.
A origem é francesa, do Rito Moder-
no o u Francês e, muito provavelmente,
apareceu na década de 1840. "Levantar
templos à virtude e cavar masmorras ao
vício", no original: " Bâtir des cachots
pour les vices et élever des Temples
à la vertu", traduzindo literalmente:
"Construir masmorras para vícios e
elevar Templos à virtude" .
Nos Ritos anglo-saxões este questio-
namento não existe, mas é pertinente,
de vez que a Maçonaria propaga e
ensina cultiva r as virtudes. Não existe
o telhamento, mas um Maçom pode ser
identificado respondendo a questões da
Preleção .
A frase lembra os preceitos mo-
rais da Maçonaria, baseando-se no
simbolismo maçônico e na arquite-
tura maçônica centrados no Templo
ideal. Construir seu templo interior e
participar do "Templo" (não físico)
da Loja é o objetivo perseguido pelos
M açons. Este trabalho de desbaste da
pedra bruta deve nos permitir corrigir
a nós mesmos, combater o que é mais
vil em nós mesmos, ma nter apenas "o
melhor" de nós.
Vamos compartilha r estas ideias.
Vamos contribuir para a harmonia das
medida.
se unam e formem um "todo" perfeito.
Vamos construir nosso templo interior
e participar da construção do Templo
imaterial da Loja. Sempre usando as
mesmas ferramentas e o mesmo ritual
simbólico, mostrando que a Maçonaria
é uni versai.
A Beleza não se torna realidade ao
unir a Sabedoria da ação de construção
de nosso templo interior, com a Força
que executa? Unindo Sabedoria, Força
e Beleza.
Esta construção do templo interior
passa pelo discernimento do bem e do
mal, do instinto animal e da consci-
ência humana, da paixão e da razão,
tornando possível construir masmorras
aos vícios.
É um pré-requisito para constru-
ção de nosso templo interior, termos
bases sólidas e saudáveis e somente
o homem que procura a virtuosidade
pode realizar esta tarefa. É um convite
para superar a si mesmo e a realizar o
trabalho de transformação de si mesmo.
Uma vez construído o templo interior,
é necessário dar vida às pedras que o
compõem. Este templo deve ser ha bi-
tado pelo homem, por nós mesmos,
tornando vivo por ele (templo), pelos
mitos e Ritos de nossa Maçonaria.
Todos estes conceitos são extraí-
dos da ética arist otélica, existe nte
na obra " Ética a Nicômaco " ('H0tKà
Nucoµétxi:ia), de Aristóteles' . A Maço-
naria retirou-a de Aristóteles (ARIS-
TÓTELES, 1987; ARISTOTLE, 2017).
A ideia de virtude, na Grécia Antiga,
não é idêntica ao conceito atual, este
influenciado pelo cristianismo. Virtu-
de, na Grécia Antiga, tinha o sentido
de excelência de cada ação, o u seja,
de fazer bem feito cada ato, na justa
1
Aristóteles (Apunortl.~;), filósofo, físico, químico,
astrônomo, biólogo, músico e poeta grego, nasceu
cm 384 a.E:. V:., em Esragira, Macedônia, hoje
Grécia, e faleceu em 322 a.E:. V:., em Atenas. Nicô-
maco era seu filho. "Érica a Nicômaco" foi escrito
provavelmente em 350 a.E.V..
ato ser Justo e Perfeito.
Aqui aparecem as primeiras indaga-
ções sobre a resposta dada ao Venerável
Mestre: qual o conceito de vi rtude?
Qual o conceito de vício? Quando ocor-
re levantar templos à virtude e cavar
masmorras ao vício? Estas questões são
discutidas abaixo.
Antes de di scorrer so bre vícios
e virtudes, questiona-se "quando" .
Observe que "levantando templos... "
e "cavando masmorras ... " são verbos
no gerúndio o u presente perfeito, que
indica uma ação em andamento, um
processo ainda não fi nalizado. (Tam-
bém em francês: gérondif.) Vale dizer
que um Maçom nunca irá terminar
de "levantar templos à virtude e cavar
masmorras ao vício" .
Seres humanos sempre têm altos e
baixos. Ou seja, a tentativa de viver
uma vida virtuosa se mistura com que-
das envolvendo, também, vícios.
Há inúmeros métodos e caminhos
para se tentar uma vida virtuosa. O
que importa é o caminho, é o tril har em
direção às virtudes. E, cercamente, este
caminho tem muitas pedras. Já dizia o
ga úcho de Alegrete, Mario Quintana 2:
"São os passos que fazem o caminho" .
Ou, nas palavras de Cora Coralina:
"O que vale na vida não é o ponto de
partida e sim a caminhada. Caminhando e
semeando, no fim terás o que colher".
O ca minh ar é que nos dá ma is
prazer do que chegar ao destino. É a
jornada que nos torna felizes. Escalar
o m o nte Everest é mais prazeroso ,
para os alpinistas, do que ficar em pé
em seu topo. A evolução humana nos
controla com uma grande a brangência
de prazeres.
O pensamento de Macio Quintana
tem muito a ver com a Maçonaria. O
' Mário de Miranda Quintana, poeta, tradutor e jor-
nalista gaúcho. Nasceu em Alegrcte, em 1906, e fa-
leceu em Porto Alegre, em 1994.
A TROLHA - JULH0/2020 25
 Maçom não tem um caminho definido e
pavimentado em direção à virtuosidade.
Não existem dogmas na Maçonaria.
O Maçom tem que descobrir a virtude
com seus próprios passos. Com seu pró-
prio caminhar, o caminho em direção à
virtuosidade. Este caminhar em direção
à virtude depende somente do Maçom.
Vícios e virtudes
O vício pode ser interpretado como
tudo aqui lo que se opõe à natureza
humana, contrário à razão. Construir
templos à virtude é cultivar a permanen-
te disposição para querer o bem, é ter a
coragem de assumir valores e enfrentar
os obstáculos que dificultarão a subida
rumo ao conhecimento.
O vício não é apenas a adição a
substâncias psicoativas, ma s sim a
tendência a praticar atos nocivos. Em
termos estéticos, o ato vicioso é defor-
me, decadente, repugnante.
Em contraposição, virtude é a con-
formidade com o bem, com o bom,
com a excelência moral, é dignidade, é
construção. O ato virtuoso é edificante,
estruturante. Comparando com o vício,
em termos estéticos, o ato virtuoso é
belo, admirável, harmonioso, sublime,
venturoso.
Algumas considerações devem ser
feitas. Os termos "bem" e "bom" são
conceitos abertos, relativos, difíceis de
precisar. Por outro lado, a moral é re-
lativa e varia no tempo e no espaço. A
moral do século XIX não é a mesma do
século XXI. A moral de uma sociedade
muçulmana não é a mesma de uma so-
ciedade xintoísta, por exemplo. Apesar
dessas relatividades, pode-se ter parâme-
tros fundamentais e básicos do que seja
"bem", "bom" ou do que seja moral.
Outro problema a ser discutido é
que o vício é fácil e a virtude é difícil. A
inércia é viciosa. A virtude é trabalhosa.
Se um ser humano é largado, afrou-
xado, desviado, solto, abandonado à
26 A TROLHA - J ULH0/2020
l
J
própria sorte, deixa-se vencer, o mesmo
amolece, deteriora etc. Destruir é infi-
nitamente mais fácil que construir. (A
termodinâmica ensina que a tendência
do universo é o inexorável aumento da
entropia. É a medida da desordem num
sistema.) Destruir um comportamento é
mais fácil que construir um comporta-
mento virtuoso. Ou seja, o vício sempre
sai em vantagem sobre a virtude. O
vício conta com a tendência natural do
menor esforço, à euforia instantânea, ao
imediatismo. A virtude é o resultado de
um empenho esforçado, de uma decisão
consciente e racional enquanto o vício
precisa muito pouco para prosperar.
A sociedade brasileira de hoje está
impregnada de vícios, de deformações
da moral e de falsos conceitos. Algu-
mas deformações que já se tornaram
corriqueiras e "politicamente corretas":
direitos humanos para criminosos e de-
veres ilimitados para cidadãos honestos
- direitos humanos deveria ser apenas
para humanos direitos - não levar vanta-
gem em tudo significa ser idiota - pagar
dívidas em dia é ser doido - anistia do
governo para corruptos e sonegadores
- diversão vale mais que um diploma -
e, especialmente, mais vale parecer do
que ser. Como cavar masmorras a esses
vícios? Praticando virtudes; substituindo
na vida diária o "ter" pelo "ser". Que
virtudes pode-se praticar?
Virtudes
Significa disposição constante de
praticar o bem e evitar o mal. Como
se disse, esses conceitos são muito sub-
jetivos: tanto "bem" como "mal" têm
conceitos abertos e não precisos e são
relativos no tempo e no espaço.
Em seguida, expõe-se as principais
virtudes. A determinação de qual vir-
tude é mais importante, depende da
consciência de cada um, das condições
de contorno naquele determinado
momento.
Autoconfiança, Benevolência, Ca-
ridade (ter compaixão, ser bondoso),
Coragem, Determinação, Disciplina,
Empatia, Esperança, Estabilidade, Fé,
Força (energia moral, autoridade),
fortaleza (vigor, robustez), Generosi-
dade, Honestidade, Humildade, Justiça,
Paciência, Prudência, Sabedoria, Tem-
perança e Verdade.
Vícios
Denota uma falha, uma imperfei-
ção, um defeito que torna o ser viciado
inadequa do a determinado propósito.
É a propensão a determinado costume
nocivo. É a disposição para o mal.
Costuma-se calcular somente pre-
juízos monetários, mas, obviamente,
existem prej uízos sociais, afetivos,
morais, mentais e espirituais. Com o
hábito do vício não só o viciado está
perdendo, mas também todos os que
estão próximos: sua família, seus ami-
gos e a população em geral.
Os vícios apresentados abaixo não
são vícios químicos, mas vícios compor-
tamentais, mais próximos de nós. Esses
causam dependência psíquica, ou seja,
a compulsão a realizar repetidamente
os atos viciosos. Abaixo, os principais
vícios comportamentais:
Acanhamento, Apatia, Arrogân-
cia, Astúcia (excesso de sagacidade,
artima nha), Avareza, Corrupção,
Consumismo, Covardia, Crueldade,
Cuidados excessivos com a vida ma-
terial, Egoísmo, Fanatismo, Ganância,
Gula, Ignorância, Imperícia, Imprudên-
cia, Indecisão, Indiferença, Indolência,
Infidelidade, Intolerância, Inveja, Ira,
Luxúria, Medo, Melancolia (baixa
autoestima), Mentira, Negligência,
Omissão, Orgulho, Preguiça, Soberba,
Trabalhador compulsivo ("workaho-
lic") e Vaidade.
Há Maçons viciados? Sim, e muitos.
Por vezes um Maçom de bons costumes
é viciado. Em seguida, alguns dos vícios
r
dos Maçons. Muitas vezes, sem perce-
ber, o bom Maçom:
é Ambicioso (quer ser o "dono " da Lo;a, ou
quer comandar a Loja sem ser o V:.M:.);
é Arrogante (diz entender tudo sobre Ma-
çonaria};
é Avaro (gasta mais no ágape e em bebidas
do que deposita no Tronco de Beneficência);
tem Falsa Caridade (coloca míseras moedas
no Tronco de Beneficência - não tem com-
paixão para com um Irmão);
é Faltoso (ausente em sessões da Loja sem
;ustificação ou, pior, com uma falsa justi-
ficação);
é Hipócrita {aparenta qualidades que não
possui};
é Ignorante (nada sabe sobre os significados
de cada palavra ou cada ato do ritual);
é Tndiferente (lê o ritual mecanicamente,
como um autômato);
é Intolerante (não tolera ideias contrárias
às suas);
é Negligente (descuidado, relapso, displi-
cente e relaxado co m sua Loja);
é Omisso (deixa d e fa zer algo para um
Irmão ou para a Loja);
é Preguiçoso (tem aversão ao trabalho em
Loja ou para a Loja);
é Supersticioso (quer impor à Loja sua
crença pessoal).
Todos estes atos são nocivos e po-
i dem ser incluídos em vícios pessoais,
i1 se constantes. Chamo a consciência de
cada um de nós: quais os vícios que pra-
ticamos? Por que não cavar masmorras
a estes vícios?
Considerações Finais
Um pensamento de Margaret Mead3
é emblemático: "A virtude é quando se
' Margaret Mead, antropóloga cultural norte-america-
na, nasceu em Filadélfia, em 1901 , e faleceu em "\!ova
Iorque, em 1978. Fez doutorado na Universidade de
Columbia, onde foi professora de antropologia.
tem a dor, seguida do prazer; o vício é
quando se tem o prazer seguido de dor".
A virtude deve sempre ser o resulta-
do de uma decisão consciente e de um
empenho esforçado, enquanto o vício
precisa de muito pouco para prosperar.
O esforço de alcançar a virtude é lon-
go, penoso e repetitivo. Há uma outra
alegoria sobre a virtude. Na Maçonaria
operativa, um frade perguntou a dois
maçons de ofício o que faziam durante a
construção da catedral de Notre Dame
(construída entre 1163 e 1345). O pri-
meiro disse que assentava uma fileira de
pedras muito bem polidas. O segundo,
em êxtase, disse: "Eu construo uma
catedral". Para que a virtude prospere
é necessá rio ser os dois pedreiros ao
mesmo tempo: persistentes nos peque-
nos atos virtuosos e, também, ter em
mente a beleza da construção total de
seu templo interior.
Temos que ser Maçons especulati-
vos, e Maçons especulativos entre os
homens (profanos).
Bibliografia:
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco.
Coleção Os Pensadores. São Paulo: Abril
Cultural, 1987.
ARISTOTLE. Nicomachean Ethics.
VirtueScience.com. 2017. Disponível
em: hrrp://www.virruescience.com/
nicomachean-erhics.hrml. Acesso em: 25
jul. 2018.
BLECH, B. O mais completo guia sobre
judaísmo. São Paulo: Sêfer, 2004.
---NÃO PERCA-TEMPO ·~·
.. ASSINE JÁ A REVISTA "A TROLHA".
SOMENTE R$ 178,00, EM 2 VEZES (1 + 1) DE R$ 89,00 CADA
www.atrolha.com.br
BLOG DU RITE FRANÇAIS. Bâtir
des cachots pour les vices et élever des
Temples à la vertu. Le Blog-Nores du
Rite Français, Levallois-Perret, 2013.
Disponível em: http://www.trusatiles.org/
article-batir-des-cachots-pour-les-vices-et-
el ever-des-temples-a-la-vertu-11605 8118.
html. Acesso em: 7 maio 2020.
BLOG OU RITE FRANÇAIS. Bâtir
des cachots pour les vices et élever des
Temples à la vertu. Le Blog-Notes du
Rite Français, Levallois-Perret, 2020.
Disponível em: http://www.trusatiles.org/
pages/Batir-des-cachots-pour-les-vices-et-
elever-des-temples-a-la-vertu-85 8 8 771.
html. Acesso em: 3 maio 2020.
CORTELLA, M. S.; LA TAILLE, Y. Nos
labirintos da moral. 6. ed. Campinas:
Papirus 7 Mares, 2009.
GOB. Ritual. 1 º Grau - Aprendiz-Maçom.
Rito Moderno. São Paulo: Grande Oriente
do Brasil, 2009.
GOB. Ritual. 2º Grau - Companheiro-
Maçom. Rito Moderno. São Paulo:
Grande Oriente do Brasil, 2009.
GOB. Ritual. 3° Grau - Mestre-Maçom.
Rito Moderno. São Paulo: Grande Oriente
do Brasil, 2009.
LIMA, Walter Celso de. Vícios e virtudes.
ln: LIMA, W. C. Rito Moderno. Origens,
Tnstruções, Simbologia". Londrina: A
TROLHA, 2019. p. 67-84.
SERUFO, J. C. Um abreviado da virtude.
A TROLHA, Londrina, n. 401, p. 10-13,
março 2020.
SILVEIRA, E. A. Cavando masmorras
aos vícios. [S. l.j: Recanto das Letras,
2009. Disponível em: http://www.
recantodasletras.com. br/ensaios/9 82122.
Acesso em: 25 jul. 2018.
A TROLHA - JULH0/2020 27