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DIREITO PENAL ECONÓMICO

Exame de recurso

06/07/2022

Duração: 3 horas

Em todas as respostas:
a) fundamente sempre, de forma legalmente precisa, as suas afirmações, em
particular, nos pressupostos da responsabilização criminal;
b) Caso se justifique, deve também fazer referência a questões doutrinalmente
discutíveis.
c) Além disso, deve sempre referir todas as circunstâncias agravantes ou
atenuantes e a consequente moldura legal aplicável.
Exceto no caso B-II , não é necessário proceder à determinação concreta das
penas aplicáveis.

O exame tem 6 páginas


Cotações (A)- 6 + 1,5 + 1,5 (9 vals); (B) – 2 +2,5+2,5 ( 7 vals); (C) - 2,5+1,5 vals

(A)

I. Ao abrigo de um programa de incentivo à atividade económica, foi lançado um


conjunto de apoios financeiros às empresas, tendo em vista a melhoria da sua eficiência
energética e a redução de emissões na sua atividade de laboração, cabendo a cada
Estado-membro organizar e selecionar as candidaturas.
O Estado Português avançou com este, programa que consistia num incentivo a
empresas que atuam em setores económicos considerados mais nocivos para o meio
ambiente e mais dependentes de energia; nomeadamente, num apoio financeiro para a
melhoria das instalações e de equipamentos, através do recurso a energias renováveis e
“mais amigas do ambiente”. Com estas melhorias, as próprias empresas ficam
habilitadas a produzir produtos de melhor qualidade. O programa dirige-se a específicas
áreas da atividade económica empresarial (expressamente descritas no texto do diploma
regulamentador), e exige que as empresas, que laborem nessas áreas, tenham um
número mínimo de trabalhadores, uma área mínima de laboração, e regularizada a sua

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situação fiscal e à segurança social; e por fim teriam de apresentar uma indicação
justificada dos equipamentos bem como das melhorias nas instalações que considerem
necessárias para atingir aqueles objetivos.
O apoio consiste no pagamento, a fundo perdido, de um conjunto de equipamentos,
cujas qualidades e características se encontram descritas e especificadas; bem como de
um conjunto de operações de renovação ou construção nos edifícios de empresas
(definindo-se o objetivo e modalidade de intervenção). Depois de aceite a candidatura
pela entidade competente para a gestão do fundo, as entidades empresariais devem,
então, adquirir os equipamentos ou então proceder às obras de melhoramento nas suas
instalações (de acordo com o regulamento), e os custos (de aquisição ou do contrato),
uma vez certificados e comprovados por uma entidade oficial, serão reembolsados
integralmente pelo fundo de apoio
A é administrador da HX, entidade empresarial que tem por objeto social uma das áreas
de atividade que está descrita como suscetível de incentivo financeiro. Mais ainda, a
empresa preenche todas as condições referenciadas no programa acima descrito. Por
isso mesmo, A decide apresentar a candidatura em nome da HX ao programa referido;
proposta que vem a ser aprovada. No entanto, A, em vez de adquirir apenas os
equipamentos especificados ou de contratar empresas para modernizar as instalações de
acordo com os objetivos do programa (como o fez em parte, e com custos de 130.000
euros), “aproveita” para adquirir também outros objetos ou bens mas exclusivamente
para seu fim pessoal, incluindo um veículo automóvel para si (objetos que, no conjunto,
tinham um valor de 70.000 Euros, num total de 200.00 Euros de custos ). De facto, A
conseguiu que C, um outro empresário seu conhecido, lhe emitisse documentos e
faturas falsas sobre todos estes bens adquiridos, tendo sido todos descritos como se
fossem equipamentos (com as condições exigidas) e D, também seu conhecido,
emitisse outros documentos que representavam custos com obras de manutenção; desse
modo, A pôde apresentar como justificativo tais faturas de modo a obter o montante
correspondente (acima descrito, mas que envolve também os 70.000 euros) da entidade
competente para a gestão.
Todavia, o reembolso dos custos a pagar pela entidade gestora (decorrentes dos
melhoramentos, seja do equipamento seja das instalações) está dependente de uma
fiscalização e de uma certificação por organismo público ligado à área de atividade em
causa.

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Haveria que demonstrar que os equipamentos se encontravam, de facto, nas instalações
da entidade empresarial (e a funcionar) bem como quais as efetivas obras realizadas
(que teriam de ser vistoriadas). Para esse efeito, é competente um organismo público,
que incumbiria um seu funcionário para se deslocar ao local e, presencialmente,
fiscalizar os equipamentos (comprovar as suas características e o seu valor) bem como
as obras que tenham sido executadas (para avaliar da sua qualidade e compatibilidade
com os objetivos do programa bem como dos custos envolvidos). Só entregue esta
comprovação é que se procederia ao pagamento do montante em causa.
A conhecia há muito B, funcionário público do organismo em causa, e após diligências
várias, conseguiu a cooperação de B para que este “fechasse os olhos” e “esquecesse”
que alguns equipamentos não foram efetivamente adquiridos ou que as obras de facto
não foram realizadas (que obviamente não se poderiam encontrar ou serem fiscalizadas
nas instalações da entidade empresarial), mas emitisse um documento que comprovasse
que todos os equipamentos e obras – todas as que constavam das faturas – tinham sido
realmente adquiridos ou realizadas (facto que não era verdade, como é evidente).
Cooperação obtida sob a promessa de A em nome da HX vir a transferir uma quantia de
15.000 Euros para B, a título de lembrança.
Com o documento emitido por B, A apresenta-o na entidade competente para o efeito, a
qual, face aos elementos fornecidos, remete depois à HX a integralidade do montante,
incluindo aquela verba de 70.000 Euros.

*Averigue da responsabilidade penal de A, HX, e B. (não se deve considerar C ou D).


Na resposta, considere todas as circunstâncias agravantes do caso e determine a
moldura legal aplicável a cada agente (6 vals)

Neste caso estamos perante 2 crimes: crime de fraude na obtenção de subsídio e crime de
corrupção no setor público.
Relativamente ao crime de fraude na obtenção de subsídio...

Tal como referi inicialmente, estamos também perante um crime de corrupção no setor público,
previsto nos artigos 373º ss CP. O bem jurídico protegido é o património do Estado.

Estamos perante um crime de corrupção no setor público uma vez que B mercadeja...

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II – Suponha que o modo de financiamento do projeto foi diferente. Assim, a entidade
competente para a gestão dos fundos de apoio, tendo aprovado o projeto de candidatura
de A, logo lhe adianta um valor de 200.000 Euros, para aquisição dos equipamentos ou
celebração de contratos, tal como acima descrito em I. No fim de cada ano civil, terá de
fazer-se um acerto de contas em função das aquisições, podendo A ter de devolver
quantias que não tenha utilizado para efeitos regulamentares.
No entanto, A procede do mesmo modo que na hipótese anterior (e também com a
colaboração de B) : ou seja, adquire também aqueles bens do mesmo valor (utilizando
também o mesmo esquema).

*Em que medida se alteraria a responsabilidade penal de A e HX (apenas destes


agentes) Justifique - 1,5 vals.

Neste caso estamos perante um crime de desvio de subsídio, logo aplica-se o DL nº28/84. Tal
como referi na pergunta anterior estamos perante um subsídio nos termos do art. 21º DL.

O crime de desvio de subsídio está previsto no art. 37º DL 28/84. Estamos perante este crime
uma vez que A utiliza a prestação obtida a título de subsídio para fim diferente daquele a que
legalmente se destinava, pois o subsídio era para adquirir apenas equipamentos especificados ou
obras de modernização e este utiliza para fim pessoal, incluindo a compra de um veículo
automóvel. Assim, caso não haja agravação da pena, A será punido com pena de prisão até 2
anos ou multa não inferior a 100 dias.

Analisando o art. 37º/3 DL, verificamos que poderá haver agravação da pena caso estejamos
perante um valor consideravelmente elevado, sendo que para determinar se esse é o caso, temos
de analisar a alínea b do art. 202º CP. Assim, e assumindo UC=102€, podemos afirmar que
estamos perante um valor consideravelmente elevado, logo A será punido com pena de prisão
de 6 meses a 6 anos e multa até 200 dias.

Relativamente à responsabilidade penal da empresa HX, importa analisar o art. 3º DL 28/84,


segundo o qual, as pessoas coletivas são responsáveis pelas infrações previstas no presente
diploma (como é o caso do crime de desvio de subsídio) quando cometidas pelos seus órgãos ou
representantes em seu nome e no interesse coletivo. Ora, A é administrador da empresa HX,
logo o crime foi cometido por um órgão da empresa, estando preenchido o critério formal. No
entanto, o crime não foi cometido no interesse da empresa, uma vez que A utiliza o subsídio
para o seu fim pessoal. Assim, não estanho preenchido este requisito, a empresa HX não é
responsabilizada pelo crime de desvio de subsídio.

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III – Na investigação realizada, vem-se a apurar que B tem um património demasiado
elevado em relação àquele que seria expectável, tendo em atenção a sua remuneração
normal como funcionário público.
O Ministério Público na acusação apresenta, conjuntamente com este ato, um outro
documento, no qual faz a exigência de que seja declarado perdido a favor do Estado um
montante de 200.000 Euros em bens e valores que afirma estarem na titularidade de B.
B alega, por seu turno, que há bens que já tem há muito tempo (há mais de 6 anos) na
sua posse e além disso recebeu uma herança recentemente. Tendo presente estes
elementos, refira o instituto em causa, e explicite a atuação do MP e como
eventualmente B deve proceder - 1, 5 val).

Artigo 9/1 – como pode B ilidir esta presunção


 Alínea a) – declarou que o rendimento incongruente resultou de uma
doação do tio – ou seja, é lícito
 Alínea b) – B arguiu que os rendimentos já estavam na sua titularidade
há mais de 5 anos (6 anos, para ser exato)
Atuação do MP: promoção da perda de bens deve ser feita nos termos do artigo 8

(B)

I. A exerce funções na empresa YZ, empresa de distribuição de bens alimentares, tendo


a seu cargo a tarefa de adquirir junto dos produtores/fornecedores bens alimentícios,
como, p. ex., fruta, pescado ou carne. Cabe-lhe, obviamente, fazer a ponderação entre a
qualidade dos bens e o seu preço, para efeito de escolha de contraente. A empresa, na
qual A trabalha, tem uma dimensão muito grande e por isso há muitos
produtores/fornecedores que estão economicamente dependentes das aquisições
efetuadas por YZ.
B, produtor de fruta, pretende que a empresa YZ comercialize os seus produtos. No
entanto, não tem tido sorte, pois, os seus produtos frutícolas, na relação qualidade/preço,
não são nada competitivos. Por isso, opta por abordar A e, após diversas diligências,
consegue obter deste último a promessa de que a YZ virá a ser sua cliente-compradora,
e a empresa de B poderá vir a ocupar o lugar de outros produtores, que já há tempo
eram fornecedores de XY. A, no entanto, só ficou convencido da “qualidade da
proposta” apresentada por B, depois de este o ter confrontado com um prémio de 10.000
Euros pela simpatia demonstrada.

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Assim que os produtos de B passaram a estar à disposição na superfície comercial de
YZ, muitos consumidores se queixaram da “qualidade” e preço dos mesmos.

 Analise a responsabilidade penal de todos os agentes envolvidos (2 vals)

Corrupção no setor privado- lei 20/2008.

Estamos perante um crime de corrupção no setor privado uma vez que...

Este é um crime praticado contra a empresa por alguém de dentro desta...

Relativamente a A, este comete o crime de corrupção passiva (art. 8º lei). Este é um crime
específico próprio...Este crime consuma-se...

Relativamente a B, este comete o crime de corrupção ativa (art. 9º lei). Este é um crime
comum...Este crime consuma-se...

Estamos perante uma situação de agravação da pena, uma vez que esta conduta é idónea a
causar prejuízo patrimonial a terceiro, se entendermos que a empresa YZ é um terceiro, na
medida em que muitos consumidores se queixaram da qualidade e preço dos bens, o que pode
levar à perda de clientes. Assim, e não se verificando nenhuma circunstância de atenuação ou
dispensa de pena previstas no art. 5º, B será punido com pena de prisão até 5 anos ou com pena
de multa até 600 dias e A será punido com pena de prisão de 1 a 8 anos (art. 9/2 e 8º/2,
respetivamente).

Relativamente à responsabilidade penal da empresa YZ, importa analisar o art. 4º da lei, e


segundo este...O art. 11º CP consagra o pp da especificação, segundo o qual as pessoas coletivas
só são responsabilizadas penalmente nos casos expressamente previstos na lei, como é o caso da
corrupção passiva (praticado por A).

Assim, para a empresa YZ ser responsabilizada penalmente têm de estar preenchidos 2 critérios:
formal e material

O pp formal exige que o crime seja cometido por uma pessoa que ocupe uma posição de
liderança, ou por alguém que esteja sob autoridade de uma dessas pessoa (art. 11º/2 al. a e b).
Ora, é dito que A exerce funções, mas não sabemos se são de liderança, no entanto, acaba por
ser indiferente, uma vez que o critério material exige que o crime seja cometido em nome e no
interesse da empresa, o que não é o caso, pois A cometeu o crime no seu próprio interesse e a
empresa até saiu prejudicada. Assim, não se verificando os requisitos material e formal, a
empresa ZY não é responsabilizada penalmente pelo crime de corrupção passiva.

II. Suponha, agora, que A foi expressamente encarregado, pela Administração YZ, da
área de manutenção e conservação da qualidade dos produtos alimentares, sendo

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responsável por um conjunto de trabalhadores que executam, embora sob a sua
supervisão, tarefas para garantir a genuinidade dos produtos alimentares da XY que
estão à vendo do público. No entanto, A pouco se interessa por esta tarefa e deixa os
seus subordinados sem orientação ou controlo. Por isso, um dos trabalhadores seu
subordinado, F, deixou que certos produtos alimentares passassem o seu prazo de
validade e continuassem a ser comerciados aos consumidores, tendo-se já deteriorado;
tais produtos acabam por vir a colocar em perigo de vida várias pessoas. Assim, em
consequência o trabalhador F foi acusado de ter cometido o crime do artigo 282º, nº 2
do Código Penal.

- Averigue da responsabilidade penal de YZ; e, caso entenda que há


responsabilidade ,determine concretamente a eventual pena que lhe possa vir a ser
aplicada (3 vals)
 Relativamente à responsabilidade penal da empresa YZ, importa analisar o art. 11º CP.
A norma do artigo 11 consagra o pp da especificação, segundo o qual as PC só são
responsáveis pelos casos expressamente previstos na lei
 O crime cometido por F faz parte do elenco previsto no nº2 do artiog 11
 Critério formal: o crime foi cometido por alguém em posição de liderança ou por
alguem que está sob a autoridade dessas pessoas.
o Estamos perante o segundo caso: F é um subordinado de A (que é uma pessoa
que, nos termos do nº4 do artigo 11) ocupa uma posição de liderança
 Há uma violação do dever de vigilância de A
 Esta norma pretende responsabilizar pela omissão destes deveres
 Critério material: o crime tem de ser cometido e nome da empresa e no seu interesse
o É discutível se será este o caso de o crime ter sido cometido no interesse da
empresa. Não parece haver nenhum interesse da empresa ter à venda produtos
cujo prazo de validade já passou
o Ainda assim, se considerarmos q era do interesse da empresa vender os
produtos mm fora de validade par na ter de lidar com custos resultantes de se
ver livre dos produtos – então a empresa é penalmente responsável
o Penas aplicáveis as PC – multa ou dissolução – artiog 90A
o Pena de multa: 1 mês de prisão corresponde a 10 dias de multa – artiog 90B/1
o Cada dia de muta corresponde a uma quantia entre 100 e 10000€, q o tribunal
fixa em função da situação financeira e económica do condenado – artiog 90B/5

III A é o administrador da YZ encarregado da aquisição de produtos alimentícios e, por


isso, de gerir todos os contratos com os fornecedores. Está obrigado a apresentar
mensalmente à Administração um relatório sobre os aspetos financeiros destes
contratos, como obviamente, quando necessário ,informar a Assembleia de sócios. No

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âmbito desta sua competência, a Administração instruiu-o expressamente no sentido de
respeitar as regras da concorrência e, por isso, procurar e escolher o fornecedor sempre
pela relação melhor “preço-qualidade”. A, no entanto, nesta sua atividade, nem sempre
se pautou pelo cumprimento desta regra, antes favoreceu, em muito, determinados
fornecedores (aliás, deliberadamente favorecidos), circunstância que, por força da
menor qualidade dos produtos por estes oferecidos, veio a suscitar críticas e protestos
dos consumidores.
Face aos rumores e às críticas, os outros administradores bem como alguns sócios
decidiram convocar uma Assembleia Geral da YZ para pedir informações sobre todos
estes contratos e sobre a atuação de A. A no entanto recusa-se, perentoriamente, a dar
informações na AG, como de resto, já se tinha recusado a dar informações pedidas para
a preparação da AG. Por isso mesmo, foi ordenada a realização de um exame à atuação
de A, tendo-se, então, apurado que o favorecimento na contratação de determinados
fornecedores, além de ter causado danos à reputação da YZ (junto dos clientes-
consumidores), também foi negativo para a própria XY, pois os contratos que foram
celebrados com estes fornecedores, caso tivessem sido contratados segundo as regras da
concorrência e do livre mercado, teriam permitido uma poupança de 50.000 Euros à
YX.

 Averigue da responsabilidade penal de A (2 vals)

Neste caso estamos perante o crime de recusa ilícita de informações, previsto no art. 518º
CSC. Estamos perante este crime uma vez que A (administrador) recusou, em reunião de
assembleia social, informações que está obrigado a prestar (art. 518º/2 1º parte). Para além
disso, também recusou informações que lhe tinham sido pedidas anteriormente para a
preparação da AG, logo se estas tiverem sido pedidas por escrito preenche-se o art. 518º/2 2º
parte. Assim, e não havendo lugar à dispensa de pena prevista no art. 518º/4 CSC, A será
punido com pena de prisão até 1 ano e 6 meses ou com pena de multa (art. 518º/2).
Para além disso, estamos perante um crime de infidelidade, previsto no art. 224º CP. Este é um
crime específico próprio, só podendo ser cometido por quem tenha o encargo de dispor de
interesses patrimoniais alheios, de os administrar ou fiscalizar. Este é também um crime de
resultado, só se consumando com o efetivo prejuízo patrimonial importante. Exige-se dolo
direto: o agente tem de saber que a sua ação é adequada a produzir o prejuízo patrimonial
importante e que este se verificará.
Neste caso, A é o administrador da YZ que está encarregue da aquisição de produtos
alimentícios e, por isso, de gerir todos os contratos com os fornecedores. Assim, A tem o
encargo de dispor de interesses patrimoniais da sociedade YZ, logo recaem sobre ele especiais
deveres e existe uma relação especial de confiança. Ao favorecer determinados fornecedores
com menor qualidade de produtos, A viola os seus deveres. Tendo em conta que era a profissão

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de A, podemos assumir que ele tinha conhecimentos para escolher o melhor fornecedor e para
perceber que a escolha daqueles fornecedores levaria a prejuízo patrimonial para a empresa,
logo verifica-se o dolo direto.
Relativamente ao prejuízo patrimonial, este foi de 50 000 €. Existe 2 critérios para determinar
de estamos ou não perante um prejuízo patrimonial importante: critério objetivo e subjetivo. O
critério objetivo tem em conta o valor absoluto do prejuízo e o critério subjetivo tem em conta a
situação económica da vítima (empresa) após o crime. Neste caso, sem dúvida que estamos
perante um prejuízo patrimonial importante.
Assim, e não havendo lugar à atenuação da pena prevista no art. 224º/4 CP, A será punido com
pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa (art. 224º/1 CP).

(C)
O Estado português decidiu criar um regime de beneficio fiscal a atribuir a empresas
que façam investimentos na área da informática e da digitalização. Assim, as empresas
que demonstrem ter investido nessas áreas (de acordo com as tabelas legais) podem ter
direito a um benefício fiscal. Terão, para o efeito, de apresentar os elementos
probatórios sobre os pressupostos de acesso ao benefício fiscal; p. ex., recibos e faturas
de aquisição de programas de software ou então de custos que tenham suportado com
empresas informáticas que tenham prestado serviços à empresa.
A é administrador da empresa XX e pretende que esta tenha direito ao benefício fiscal;
no entanto, não está propriamente preocupado com a passagem ou com a transição para
estas novas áreas. Assim, entra em contacto com um amigo que “inventa” uma empresa
denominada “Magical software” através da qual emite recibos e faturas em favor da XX
por prestação de serviços informáticos; além disso, o próprio A emite faturas relativas a
negócios com empresas inexistentes, para demonstrar a compra e também o uso de
novas tecnologias.
Deste modo, a XX vem a obter um benefício fiscal que lhe permite
I. Reduzir o pagamento em IRC no valor de 45.000 Euros;

Neste caso estamos perante um crime fiscal, pelo que se aplica o regime geral das infrações
tributárias, doravante “RGIT”. O bem jurídico protegido é o património do Estado.

Importa começar por referir que a distinção entre burla tributária e fraude fiscal prende-se com
os conceitos de enriquecimento e não empobrecimento, respetivamente, ou seja, no caso da
burla tributária há um aumento do ativo patrimonial e no caso da fraude fiscal há uma não
diminuição do ativo patrimonial.

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Neste caso como a empresa XX obtém um benefício fiscal que lhe permite reduzir o pagamento
em IRC no valor de 45 000 €, então estamos perante um não empobrecimento (não diminuição
do ativo patrimonial), logo estamos perante um crime de fraude fiscal, previsto no art. 103º
RGIT.

De facto, A através de condutas ilegítimas (emitir faturas relativas a negócios com empresas
inexistentes; entrar e contacto com um amigo para inventar uma empresa através da qual emite
recebidos e faturas em favor de XX por prestação de serviços informáticos), causa a diminuição
das receitas tributárias (art. 103º/1 al. a) e c) RGIT)

De notar que, neste caso, o valor mínimo exigido no art. 103º/2 RGIT está cumprido.

Analisando o art. 104º RGIT, verificamos que estão preenchidas as alíneas d) e e), logo estamos
perante um crime de fraude qualificada, pelo que A será punido com pena de prisão de 1 a 5
anos. De notar que a falsificação documentos não é, em princípio, punível autonomamente (art.
104º/4 RGIT).

Relativamente à responsabilidade penal da empresa XX, importa analisar o art. 7º RGIT. De


acordo com a norma deste artigo, as pessoas coletivas são responsáveis pelas infrações previstas
na presente lei (como é o caso do crime de fraude qualificada ) quando cometidas pelos seus
órgãos ou representantes, em seu nome e no interesse coletivo. Ora, A é administrador da
empresa XX, logo o crime é cometido por um órgão da empresa estando o critério formal
preenchido. Para além disso, o crime foi também cometido em nome e no interesse da empresa,
na medida em que esta beneficia da redução do pagamento de IRC. Assim, e não havendo lugar
à exclusão de responsabilidade prevista no art. 7º/2 RGIT, a empresa XX é responsabilizada
penalmente pelo crime de fraude qualifica sendo punida com pena de multa de 240 a 1200 dias
(art. 104º/1 RGIT).

II. Ser-lhe atribuído pela administração tributária uma quantia no valor de 15.000
euros que aumentou o seu património.
Neste caso mais uma vez estamos perante um crime fiscal, pelo que se aplica o RGIT. O
bem jurídico protegido é o património do Estado.
Tendo em conta a distinção entre burla tributária e fraude fiscal que referi no exercício
anterior, e uma vez que foi atribuído pela A.T uma quantia no valor 15 000 € então
podemos afirmar que neste caso, como há um enriquecimento (aumento do ativo
patrimonial), então estamos perante um crime de burla tributária, previsto no art. 87º RGIT.
Este é um crime de resultado, só se consumando com o efetivo enriquecimento. É também
um crime de processo típico de execução vinculada, tendo de ser cometido através de um
dos meios previstos no art. 87º/1 RGIT, o que se verifica, pois A utilizou documentos
falsificados (faturas falsificadas). Assim, caso não agravação da pena, A será punido com
pena de prisão até 3 anos ou multa até 360 dias.
Analisando o art. 87º/2 e 3 RGIT, verificamos que se a atribuição patrimonial for de valor
elevado ou valro consideravelmente elevado, há agravação da pena, sendo que para
deteriminar se esse é o caso, temos de analisar as alínea a e b do art. 202º CP. Assim, e

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assumindo UC=102€, podemos afirmar que estamos perante um valor elevado (art. 202º al.
a), pelo que A será punido com pena de prisão de 1 a 5 anos.
Relativamente à responsabilidade penal da empresa XX, pelos mesmos motivos explicados
anteriormente, esta será responsabilizada penalmente pelo crime de burla tributária, sendo
punida com pena de multa de 240 a 1200 dias.

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