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Ioannis F. Papageorgiou
Katrin Nyman-Metcalf
Os Estados, com suas democracias, veem o poder de determinar suas leis e normas
através da influência do povo, mas que muitas vezes está vinculado a determinado grupo
de pessoas. Diante disso, a legitimidade de um regime deve vir do respeito às regras, do
consentimento popular demonstrável, assim como do poder de autoridade que cumpre
com as expectativas da população.
A legitimidade pode ser absoluta, parcial ou condicional e, diante do que é aplicado aos
Estados, podem ser adaptadas aos sistemas de integração regional que vem a ter um
desenvolvimento relevante quando a legitimidade pode conformar unidades de maior
proporção que os Estados, com o desafio de serem suportadas a nível internacional.
Ainda, sabe-se que a legitimidade dos Estados-nação é maior do que a das organizações
de integração regional, ocorre de maneira diferente. Diante disso, busca-se aqui analisar
como os sistemas de integração regional alcançam sua legitimidade.
A legitimidade expressa a relação entre os governantes e seus governados, e traz a um
governo uma convicção compartilhada, um sistema aceito, com normas e leis a serem
cumpridas. Para uma integração regional, como o caso da União Europeia (UE),
estuda-se a aceitação das decisões da organização e se isso leva a um efeito desejado.
O Estado compõe essa integração como unidade básica de onde emanam as regras,
como mecanismo permanente de delegação e de decisão. A legitimidade dos organismos
de uma integração regional advém da atuação dos Estados membros já que estes
conservam o poder último de decisão da organização internacional.
A legitimidade da organização é exercida e influenciada pelos Estados em conjunto.
Quando há decisões tomadas por instituições onde os Estados não estão representados
diretamente, como em tribunais regionais de justiça independentes, percebe-se a
crescente autonomia das organizações de integração regional, onde a base da
legitimidade se volta mais complexa pois não é uma mera acumulação das legitimidades
dos Estados membros. Já o sistema internacional atual segue estando fundado diante dos
Estados e de sua autoridade como a razão última para que as ordens sejam cumpridas,
que podem partir de organismos privados ou criados pelos Estados.
Considerando necessária a legitimidade emocional, diferente dos Estados por envolver a
condição de ir além de suas fronteiras, uma organização regional tem sua legitimidade a
partir das emoções e sentimentos de patriotismo e de identidade das pessoas pelo
pertencimento a um determinado grupo ou de apego a um determinado território. Não só
para as organizações de integração regional, mas também para os Estados
multinacionais de onde seu povo é uma criação política e constitucional ao fundar-se
sobre as bases étnicas ou históricas. No entanto, o Estado-nação nem sempre se apoia
em uma população unida, diante de fatores influentes como etnia, raça, religião ou idioma.
O único que mantém o demos unido (comunidade política) são as fronteiras criadas pelo
Estado nacional com seu sistema legal e político. Por essa condição, pode-se considerar
um demos para um sistema de integração regional.
Diante disso, tomando como exemplo a legalidade do Tratado de Lisboa, este se baseia
no entendimento de que a democracia, a autodeterminação e a cidadania derivam do
Estado soberano, que deve ter seu povo unido também diante da organização de
integração regional. E para a legitimação desta integração, um elemento essencial, diante
da percepção do povo e dos governantes, é que hajam interesses comuns e outros
fatores que liguem os Estados uns com os outros. Ainda, a necessidade da similaridade
nos sistemas políticos para uma integração mais profundo pode ser vista em todas as
regiões do mundo.
Quanto às expectativas da legitimidade, um sistema de integração regional está sujeito a
diversas possibilidades e diferentes fatores determinarão se essas podem ser satisfeitas e
cumpridas. Considerando a autodeterminação individual, a sociedade buscará diferentes
formas de lealdade, onde o Estado deve atuar ampliando o alcance das eleições e
controles democráticos. Diante disso, as pessoas vêm a usufruir de uma maior proteção
pela democracia e pelos direitos humanos pela integração regional (exemplos como o
Convênio Europeu e o Tribunal Europeu de Direitos Humanos). Assim, o estabelecimento
de um marco constitucional para os exercícios de poder a nível nacional e supranacional
pode aumentar a capacidade integradora, com respeito aos direitos das minorias e sua
eficiência quando seja envolvente aos interesses dos povos.
Quanto mais avançada a integração, mais o sistema de integração regional pode criar um
entorno legítimo para as ações de relevância transfronteiriça (imposição de multas a
empresas; fixação de tarifas aduaneiras para outros Estados). Já as barreiras mentais
podem obstaculizar a cooperação, o que pode ser favorável ou não, condicionante das
grandes potências que atuam com desconfiança mútua, mas que devem aprender a
cooperar diante da multilateralidade do sistema.
A cooperação facilita o fortalecimento de convicções compartilhadas e a promoção da
cooperação e do consenso. Além da troca de informações, as nações podem aprender
com a solidariedade e a compreensão das diferenças sociais e culturais, que leva ao
fortalecimento da cooperação. Diante das relações entre Estados pela integração
regional, estas são melhores exploradas do que as relações bilaterais, onde os Estados
“débeis” aceitam estar subordinados a um Estado mais forte se este se encontra em um
sistema regional, podendo aumentar o atrativo do sistema pela condição de ali se
encontrarem Estados desiguais tratando de questões numa relação hierárquica de
igualdade. Como exemplo, a criação da OTAN e a cláusula de garantia mútua deve fazer
possível que os Estados não tenham que aceitar ordens de um só país (EUA) mas
alcançar os efeitos positivos da existência de um país dominante entre eles.
As organizações de integração regional devem demonstrar que podem participar no
sistema global, consolidando sua estrutura institucional junto à credibilidade e a influência
de suas ações e normas legais, condições que criam legitimidade. Para o êxito da
integração, os objetivos devem ser limitados ou graduais; sua profundidade tem que ser
gradual, em paralelo com a legitimação da integração mais profunda. Ainda, as estruturas
de integração regional são fundadas no Direito Internacional Público, onde os tribunais
regionais limitam as tarefas da organização e também indicam seu potencial, o que pode
fortalecer a organização e conduzir a uma legitimidade mais ampla. Os tribunais de justiça
para a estrutura dos sistemas de integração regional podem defender e fortalecer as
outras instituições do sistema de integração repartindo as competências entre a
organização e os Estados membros.
O tribunal regional deve assegurar o respeito do princípio de estado de direito no sistema
de integração regional. O acesso à justiça regional serve para que os particulares
acessem os benefícios dos seus direitos reconhecidos, com garantias práticas e formais
que garantam o acesso aos tribunais e a outros órgão judiciais, para haver um alcance da
integração regional aos sujeitos individuais, como princípio de acesso à justiça, para que
o sistema de integração tenha um efeito positivo para o estado de direito e para a
democracia. Os sistemas de integração regional são criticados por estarem longe dos
cidadãos e contribuir para a alienação da cidadania do poder político, sentimentos que
podem afetar a legitimidade das instituições que tomam decisões, sendo ameaçadas pela
globalização.
A globalização econômica perturbou as funções estatais, criando regulações e
desregulações, levando a mudanças dos sistemas legais internos ou internacionais.
Diferentemente, para as relações econômicas, a situação é mais complexa diante da
democracia. O Estado segue mantendo muitos poderes ou limitações, o que influencia na
legitimidade diante das bases tradicionais de seus poderes, ainda mais para uma
legitimidade transnacional. Ainda, os Estados são necessários a nível local e dentro dos
sistemas globais. Diante disso, um sistema transnacional não pode ter sua legitimidade
própria. O único modo de criar legitimidade transnacional é por meio dos Estados, já que
o sistema internacional é constituído por eles, e estes são essenciais para edificar a
legalidade transnacional, limitando os efeitos negativos das decisões econômicas,
tomando em conta também as questões sociais.
As instituições criadas legalmente são as que dão legitimidade ao poder. Diante disso,
nos sistemas de integração regional, os Estados-membros são formalmente os que criam
as instituições já que não há outra autoridade para fazê-lo. Assim, os Estados passam a
aceitar decisões de outros Estados, já que há um sistema regular da relação entre todos,
com uma hierarquia institucional e métodos de autoridade para proteger, pôr limites e
disciplinar seus membros. Quando há restrições no sistema internacional, mas se elas
não são impostas ao sistema regional pelo Estado mais poderoso ou dominante, podem
proteger melhor a igualdade e a soberania.
Citando algumas premissas para que as organizações de integração regional possam
ganham legitimidade, este é resultado de um amplo processo de empoderamento e
consolidação, com o aumento de poder da organização de tomar decisões de modo
autônomo e vista como autônoma por outros atores e pela sociedade. O sistema de
integração deve ter instituições que possam garantir e manter o sistema e suas normas.
Ainda, os tribunais regionais ganham espaço para criar fundamentos de legitimidade de
nível regional, com independência e capacidade para cumprir decisões. E os Estados
mantém uma ampla margem de intervenção para fortalecer ou impedir a legitimidade,
sempre pela influência junto aos cidadãos.
REFERÊNCIA
PAPAGEORGIOU, Ioannis F.; NYMAN-METCALF, Katrin. La Legitimidad de los Procesos
de Integración Regional. Revista de la Secretaria del Tribunal Permanente de Revisión –
RSTPR – MERCOSUR. Año 6, Nº 11, Abril de 2018; pp. 12-28.
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