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DIREITO TRIBUTÁRIO

OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA

Fato gerador (hipótese de incidência)

1. Fato gerador

Trata-se do elemento central do vínculo obrigacional tributário. O fato gerador


é, por si só, a grande referência do vínculo obrigacional, com a característica
de construir a relação tributária.

Como bem observado pelo Código Tributário Nacional (CTN), essa dimensão
do fato gerador está presente tanto na obrigação principal quanto na
obrigação acessória. É expressão reproduzida em todos os vínculos
obrigacionais.

Ainda que seja mais fácil imaginar a ideia do fato gerador ligada à obrigação
principal, nesta se dá a perspectiva de um fato jurídico que passa a exigir um
dever jurídico de pagamento, como tradicionalmente associado do ponto de
vista da tributação, o fato gerador também está presente nas obrigações
acessórias.

Portanto, em ambos os casos é preciso que ocorra a hipótese prevista na


norma para que surja a obrigação por parte do contribuinte, seja pagar o
tributo (obrigação principal) ou realizar ou se abster de realizar algo no
interesse da administração tributária (obrigação acessória).

Assim sendo, o fato gerador da obrigação principal está previsto no art. 114
do CTN como a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua
ocorrência. Já o fato gerador da obrigação acessória corresponde a qualquer
situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a

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abstenção de ato que não configure obrigação principal (art. 115 do CTN).

Portanto, a análise do fato jurídico gerador de obrigações tributárias não é


elemento exclusivo da obrigação principal. A expressão fato gerador pode ser
utilizada também no que concerne às obrigações acessórias. Basta concluir
que, nesse momento, o fato gerador não produz nenhuma obrigação de
pagamento. Para o CTN, a expressão fato gerador possui dois significados.
Identifica-se essa expressão ao se falar na aparição do dever, como previsto
no art. 113, § 1º.

Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.

§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por


objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se
juntamente com o crédito dela decorrente.

No fato constitutivo do dever, o fato jurídico que gera a consequência é o fato


gerador, a partir do qual passa a haver o dever jurídico. Em razão disso,
o elemento temporal é dotado de relevância para as relações tributárias como
um todo.

Para se identificar a ocorrência desse fato jurídico, é fundamental,


primeiramente, construí-lo normativamente. Assim, para que se possa falar
em um fato que enseje o aparecimento de obrigação tributária, é necessário
que, antes de tudo, a lei preveja isso.

O CTN utiliza a expressão fato gerador, porém, a doutrina assinala que,


quando o fato é previsto na norma, mais adequado seria utilizar a locução
hipótese de incidência.

Nesse sentido, Geraldo Ataliba critica a utilização do termo “fato gerador”,


pois tal terminologia é utilizada para designar tanto a descrição contida na lei
quanto a ocorrência em concreto da hipótese prevista na lei. Para o autor,
seria uma imprecisão terminológica utilizar o mesmo termo para se referir a
duas situações distintas. Desta forma, Geraldo Ataliba prefere o uso
da expressão “hipótese de incidência” para designar o tipo abstratamente
previsto e “fato imponível” para referir-se a ocorrência no mundo fenomênico.

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Contudo para o CTN, essas duas expressões têm o mesmo sentido, de modo
que fato gerador pode ser tanto o momento em que o legislador o estiver
concebendo quanto o momento em que ele efetivamente ocorre.

A doutrina nacional, contudo, reputou mais adequado nomear como fato


gerador o momento em que o fato jurídico tenha ocorrido, pois, nesse
momento, se passa a perceber o fato jurídico.

A previsão normativa é apenas uma descritiva genérica que permitirá o


encaixe futuro do fato gerador.

Nesse diapasão, o CTN prevê, em seu art. 114, que o fato gerador deve estar
previsto em lei, com todos os seus elementos necessários e suficientes.

Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida


em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.

Na linguagem do CTN, o fato gerador apresenta dois significados: o fato em si


e o momento hipotético da descritiva legal − elaborada pelas pessoas
competentes − que desenha como essa situação tributária se aperfeiçoa.

O art. 114 identifica esse momento legal, ao passo que o art. 113, § 1º dispõe
acerca do momento em que o fato gerador se concretizou e está efetivamente
materializado e consolidado.

Dessa percepção, infere-se quais os princípios que orientam esse raciocínio.


Neste cenário, a legalidade se faz presente em todo o tempo. O papel do
legislador é salutar, uma vez que só se pode compreender o fato ocorrido se a
lei o tiver concebido de maneira clara.

Mais do que uma ideia de legalidade, convive-se, tal qual como em outros
campos do direito, com o apotegma da tipicidade. Dessa forma, somente se
pode entender que a obrigação surgiu, materializou-se e foi confirmada na
medida em que se encaixa aquilo que foi previsto na norma com o que ocorrer
na vida social.

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Podemos entender, assim, que só se passa a ter um dever tributário se aquilo
praticado se amoldar com perfectibilidade ao que a norma concebeu. Por isso,
numa relação tributária, mais do que em legalidade, fala-se em uma
tipicidade, na qual o legislador deve descrever o fato típico.

Conforme lição jurisprudencial:

Por força do princípio da legalidade estrita, corolário da tipicidade fechada,


própria do direito tributário, apenas a lei em sentido formal pode estabelecer
os elementos estruturais ou essenciais dos tributos, com exceção dos casos
previstos expressamente no próprio CTN (Superior Tribunal de Justiça
− STJ, 2ª Turma, REsp. nº 1.110.315/RJ, rel. Min. Eliana
Calmon, julgado em 26.08.2010, DJe 27.04.2011).

A tipicidade tributária tem um rigor ainda mais elevado do que a tipicidade


penal, visto que não há algo como a norma penal em branco no campo
tributário.

Por exemplo: não são verificados elementos do tipo tributário a serem


investigados por meio de portaria de algum ministro, como é a definição de
entorpecentes.

Na tradição tributária, identifica-se uma tipicidade rigorosa, na qual os


elementos são descritos em lei, no seu sentido formal, desde que observada
essa lição ligada à ideia da obrigação principal.

É na obrigação principal que está presente a construção da tipicidade


tributária. Mais do que um rigor de legalidade, a obrigação principal impõe um
rigor de tipicidade, fazendo com que o intérprete questione quais elementos
devem estar descritos numa obrigação tributária.

2. Fato gerador da obrigação principal

O fato gerador da obrigação denominada principal demanda múltiplas


atenções à descritiva na linha do art. 114. Para identificar os elementos
necessários e suficientes, é preciso destrinchá-los em cinco atributos.

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2.1. Aspecto material

Todo e qualquer tributo deve trazer seu elemento material da tributação, ou


seja, a essência do que se tributa, o fato social tributado. É a situação
refletora de alguma riqueza que irá gerar a consequência da tributação.

Nesse sentido, se o aspecto material do fato gerador já for tratado por outros
campos do direito, especialmente pela seara do direito privado, deverá ser
feita a cuidadosa junção dos elementos do direito tributário com aqueles do
direito privado.

Esse processo ocorre especialmente porque, se a situação já tiver sido


tratada pelo direito privado, não cabe ao direito tributário alterar esses
conceitos. Isso revela, de certa forma, uma cautela para o legislador tributário
e também consiste em campo tranquilo para o hermeneuta.

Por exemplo: o tributo de mais simples visualização é o Imposto de


Transmissão Causa Mortis (ITCM). O fato gerador, a situação tributada nesse
imposto, é a transmissão do patrimônio pelo óbito. Dessa forma, o Código
Civil sempre estabeleceu que a abertura da sucessão se dá na data do óbito,
rechaçando qualquer dúvida acerca do elemento tributado, que não é alterado
pelo direito tributário.

Respeitados os conteúdos dos arts. 109 e 110 do CTN, esse fenômeno se dá


em todo e qualquer cenário tributário.

Art. 109. Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da


definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas,
mas não para definição dos respectivos efeitos tributários.

Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance
de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou
implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados,
ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou
limitar competências tributárias.

Todavia, por vezes, o legislador invade esse campo.

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Por exemplo: o legislador tenta definir o que é mercadoria, inobstante esse
não seja papel do legislador tributário.

São fenômenos que acontecem na vida privada, mas que não são estranhos
à vida tributária. Contudo, o elemento tributário não pode alterar a definição
de circulação de mercadoria ou de prestação de um serviço.

O direito tributário poderá definir o fato gerador do imposto de renda, mas não
cabe a esse campo mudar o que são as atividades sociais para gerar renda,
ou seja, não cabe ao direito tributário disciplinar o que seria um contrato de
trabalho, tampouco o que seria um aluguel. O direito em questão pode,
entretanto, delimitar que, uma vez recebido o aluguel decorrente de contrato
de locação, esse valor será renda.

Essa descritiva deve ser feita de maneira clara, definindo, assim, o que se
tributa.

Por exemplo: o que se tributa em nome do imposto de renda. O papel do


legislador é esclarecer quais atividades sociais constituem fato gerador,
auferir renda, para o imposto de renda.

Todavia, não basta o legislador tributário trazer a descritiva socioeconômica


do aspecto material. É fundamental também cumprir o papel de destacar onde
essas coisas irão acontecer.

2.2. Aspecto espacial

O chamado aspecto espacial é relevante em vários fenômenos tributários.

Por exemplo: no Imposto Predial e Territorial Urbano


(IPTU), cujo fato gerador não é difícil de se estabelecer, propriedade e posse,
não há dúvida sobre onde ele ocorre, visto que, ao se enxergar um bem
imóvel, ainda que por acessão física, o fato gerador é atraído para onde esse
bem se situa.

Não há dúvida quanto à ocorrência do fato gerador propriedade para fins do


IPTU.

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Por outro lado, surge questionamento quanto ao aspecto espacial do fato
gerador do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA).

Pergunta-se: onde ocorre o fato gerador do IPVA?

O imposto também incide sobre propriedade, porém não imobiliária, mas


móvel. A definição, porém, gera problemas, pois pode se tratar do local onde o
sujeito habilitou seu veículo, ou, ainda do local onde ele tem residência. Outra
possível celeuma a respeito é o fato de considerar se esses elementos seriam
sinônimos ou não.

Frise-se que essa problemática sequer está resolvida, uma vez que o IPVA é
um tributo relativamente novo, oriundo dos anos de 1980, sem qualquer
previsão no CTN. Ao revés, há uma guerra fiscal desde a instituição dessa
espécie tributária.

Consequentemente, surge uma dúvida em relação ao IPVA, sobre onde deve


se identificar como ocorrido o fato gerador. Cada estado da federação buscou
tratar o assunto de uma forma e, assim, muitos estados reconhecem o local
de habilitação do veículo como tal.

Ademais, a habilitação do veículo está no campo das normas de trânsito e, ao


se adentrar no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), remete-se ao complexo
art. 120 do CTB.

Art. 120. Todo veículo automotor, elétrico, articulado, reboque ou


semirreboque, deve ser registrado perante o órgão executivo de trânsito do
Estado ou do Distrito Federal, no Município de domicílio ou residência de seu
proprietário, na forma da lei.

§ 1º Os órgãos executivos de trânsito dos Estados e do Distrito Federal


somente registrarão veículos oficiais de propriedade da administração direta,
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de qualquer um
dos poderes, com indicação expressa, por pintura nas portas, do nome, sigla
ou logotipo do órgão ou entidade em cujo nome o veículo será registrado,
excetuando-se os veículos de representação e os previstos no art. 116.

§ 2º O disposto neste artigo não se aplica ao veículo de uso bélico.

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Estabelece o preceptivo em causa que o veículo deve ser habilitado onde o
sujeito mantém seu domicílio ou residência. Contudo, domicílio e residência
são conceitos diferentes, uma vez que residência se refere à pessoa física,
não se prestando para a sujeição passiva da pessoa jurídica. Portanto,
visualizam-se problemas nessa relação tributária como um todo, decorrentes,
em grande parte, do aspecto espacial do fato gerador em foco.

A espacialidade, muito óbvia em vários tributos, contudo, não se identifica


com tanta facilidade em outros tributos. Além desse elemento espacial, há
outro aspecto destacado pelo CTN, denominado elemento temporal, que visa
a identificar quando ocorre o fato gerador.

2.3. Aspecto temporal

Entender um tributo não é apenas compreender o que é o fato gerador,


quando e onde ele acontece. Vale ressaltar que o aspecto espacial atine às
pessoas que terão competência para essa relação.

Porém, também merece destaque o elemento temporal, quando se reputa por


ocorrido o fato gerador. De acordo com o art. 113, § 1º, a obrigação surge
com a ocorrência do fato gerador.

Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.

§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por


objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se
juntamente com o crédito dela decorrente.

Isso significa dizer que o momento constitutivo do dever é aquele do


surgimento do fato gerador. Consequentemente, é importante precisar esse
momento.

Por exemplo: para o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação


(ITCMD), o fato gerador ocorre na data do óbito. No estado do Rio de Janeiro,
foi alterada a lei do ITCMD. A alíquota era de 4% e passou
a ser de 4,5%. Isso foi feito na passagem de 2015 para 2016, devendo
cumprir os 90 (noventa) dias.

Lei do Estado do Rio de Janeiro nº 7.174, de 28 de dezembro 2015

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Dispõe sobre o imposto sobre a transmissão causa mortis e doação de
quaisquer bens ou direitos (ITD), de competência do estado do Rio de
Janeiro.

Cumprida a noventena em 28 de março de 2016, sucessores dos que vieram


a óbito antes dessa lei estão se dirigindo hodiernamente ao cartório, com o
fim de lavrar escritura. Na cobrança do imposto pelo cartório, o sistema
estabelece uma alíquota de 4,5%.

Contudo, o processo não pode se dar dessa forma, em atenção ao momento


em que ocorreu o fato gerador. Deve ser aplicada, então, a lei que vigia à
época do óbito, não importando se o inventário levará dez anos para ser feito,
visto que eventual atraso reverterá na possibilidade de o estado cobrar ou não
as multas pertinentes.

Logo, é vedado cobrar uma alíquota diversa do que a aplicável quando da


ocorrência do fato gerador. Ressalte-se que essas cobranças estão sendo
feitas no ano de 2016, matéria já enfrentada nos anos de 1950 pelo Supremo
Tribunal Federal (STF).

A Súmula nº 112 do STF já estabelecia que: “O imposto de


transmissão causa mortis é devido pela alíquota vigente ao tempo da
abertura da sucessão”. Ou seja, não vige a alíquota ao tempo da abertura do
inventário, mas da abertura da sucessão. Esta é a data do óbito, conforme
estabelecido pelo Código Civil de 2002.

Com essa análise, infere-se que é preciso marcar o elemento temporal, visto
que dele são retiradas as características. O cenário teratológico ora narrado,
nada obstante essa qualidade, vem ocorrendo nos tempos de hoje, em que o
oficial cartorário desconhece aquilo já consolidado há muito nos tribunais.

Cabe ao legislador estabelecer de maneira minimamente clara o que ele


entende por ser o aspecto temporal do fato gerador. O conteúdo do art. 113, §
1º, do CTN, permite uma significativa ponderação para reconhecer que esse
elemento de ocorrência é decisivo, inclusive modificando o valor da alíquota
que o sujeito passivo deverá, eventualmente, suportar.

A incansável busca pelo elemento temporal é ainda mais sensível naqueles


tributos em que a alíquota é modificada com maior facilidade.

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2.4. Aspecto pessoal

Com o somatório de todos os elementos ora traçados, percebe-se outro


aspecto que decorre da construção completa do fato gerador. Nesse contexto,
o fato gerador depende também da descrição do seu elemento pessoal.

Esse aspecto analisa quais as pessoas extraídas desse vínculo obrigacional,


posto que, uma vez marcado onde ocorreu o fato gerador, passa-se a
identificar quem é o sujeito ativo dessa relação. Assim como, identificado o
momento do fato gerador, pode-se inferir quem é a pessoa obrigada, o sujeito
passivo dessa relação. Os sujeitos que decorrem da relação tributária são
extraídos da própria compreensão do fato gerador.

Por exemplo: em um tributo simples, como o IPTU, o fato gerador é a


propriedade. Por conseguinte, seu sujeito passivo é o proprietário. O fato
gerador ocorre onde está localizada a propriedade. Ademais, o imposto é
calculado sobre o valor da propriedade.

2.5. Aspecto quantitativo

O aspecto quantitativo busca identificar qual o montante devido da obrigação


tributária. Assim, na vida tributária, enxerga-se o que é materialmente
tributado, a situação tributada da qual, a princípio, são tiradas todas as
demais consequências.

Alerta-se que tal análise pode não se revelar tão simples em determinados
tributos.

Por exemplo: tributos que utilizam institutos do direito privado permitem uma
conclusão mais fácil quanto aos seus diversos aspectos.

No entanto, tributos que se valem de ferramentas não tratadas somente pelo


direito privado acarretam uma linguagem tributária mais árida.

Por exemplo: existem tributos que buscam identificar o faturamento, ou


patrimônio líquido ajustado. São tributos complexos nesse contexto.

O que se pretende estabelecer é que, independentemente do tributo, se mais


complicado ou mais trabalhoso, o legislador tributário deve passar por todos
os aspectos do fato gerador, identificar a situação tributada, qual o elemento

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revelador de riqueza e, consequentemente, como devem ser tratadas suas
outras derivações.

Para o CTN, o elemento mais importante é o aspecto temporal do fato


gerador, quando ocorre esse fato jurídico. Nesse toar, cumpre abordar
algumas classificações feitas em relação aos fatos geradores nas suas
versões.

3. Classificações do fato gerador da obrigação principal

Existe o fato gerador denominado simples ou instantâneo, caracterizado em


razão da possibilidade de se precisar e determinar o momento de sua
verificação.

Por exemplo: vale a hipótese do ITCM. Quando alguém vem a óbito, é


possível precisar de maneira clara e determinada que se trata de um fato
instantâneo.

Isso também poderia ser observado no que tange ao Imposto sobre Produtos
Industrializados (IPI) ou ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e
Serviços (ICMS), pois é possível perceber cada circulação de mercadoria, ou
cada saída de produto industrializado.

Esses fatos são passíveis de identificação física na vida social. Nos exemplos
vertidos, não há qualquer dificuldade, pois, ainda que o legislador deva
determinar isso de maneira mais adequada, pode-se aferir quando ocorre o
fato gerador, momento do qual é possível extrair as consequências práticas
desse aspecto temporal.

Voltando aos casos ilustrados, analisa-se o fato gerador do IPTU, que é a


propriedade, e pergunta-se: o que é, temporalmente, tributar a propriedade,
quando esta ocorre?

A propriedade não é um momento e não apresenta perspectiva temporal


clara. Trata-se de uma figura constante, a qual não se pode precisar ou
temporalizar. Por isso, a doutrina tradicional nomeia tal evento como fato
gerador continuado.

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Por exemplo: a solução legislativa pode ser encontrada, a título ilustrativo, na
lei do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR).

Lei nº 9.393, de 19 de dezembro de 1996:

Art. 1º O Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural - ITR, de apuração


anual, tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de
imóvel por natureza, localizado fora da zona urbana do município, em 1º de
janeiro de cada ano.

Dada a adoção de exercícios financeiros, a propriedade é fatiada para se


coadunar a esse lapso temporal. O papel do legislador reside em eleger uma
data para identificar como ocorrido o fato gerador.

O fato gerador do imposto sobre a propriedade imobiliária rural é a


propriedade de apuração anual, verificável no dia 1º de janeiro de cada ano.
Esse é um modelo adotado por todo IPTU e IPVA.

Em síntese, leciona Ricardo Alexandre (2016, p. 123 – adaptado):

– Fatos geradores instantâneos são aqueles que ocorrem num momento


preciso da linha do tempo, dando ensejo ao surgimento, em cada caso de
ocorrência, de uma nova obrigação tributária, como é o caso do imposto de
importação, cujo fato gerador se verifica a cada entrada de mercadoria
estrangeira no território nacional.

– Fatos geradores periódicos seriam aqueles que se prolongam no tempo,


sendo considerados ocorridos nos instantes legalmente determinados,
gerando, a cada período concluído, uma nova obrigação tributária, como é o
caso do IPVA, cujo fato gerador ocorre anualmente, no dia 1º de janeiro.

Os fatos geradores periódicos podem ser divididos em periódicos simples e


periódicos compostos (complexivos).

São periódicos simples aqueles que tomam por base um único evento, que se
prolonga no tempo, como é o caso dos impostos sobre a propriedade. Assim
sendo, no IPTU, no IPVA e no ITR a propriedade do bem é fato único, mas os
seus efeitos se mantêm indefinidamente no tempo.

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São periódicos compostos (complexivos) os fatos geradores compostos de
diversos eventos que devem ser considerados de maneira global, dentro de
um determinado período de tempo legalmente definido. O fato gerador do
imposto de renda, por exemplo, é periódico composto (complexivo), pois é
formado por um conjunto de eventos (recebimentos mensais de renda,
investimentos financeiros, alienações de bens com lucro etc.) que,
globalmente considerados, implicam aumento patrimonial do contribuinte
dentro de um determinado exercício financeiro.

O grande problema da classificação é que, nos fatos geradores ditos


periódicos, a lei estipula exatamente o instante da completude e perfeição, o
que faz com que tais fatos possam ser tratados como instantâneos, sendo-
lhes aplicável a legislação vigente na data em que a lei define como verificado
o fato gerador do tributo. Dito isso, para tais tributos (IPVA, IPTU, ITR) o fato
gerador se liga à propriedade, que não tem uma limitação temporal
predefinida, contudo, uma vez que a lei estabelece exatamente o momento
em que deve ser considerada a propriedade para fazer nascer a obrigação
tributária (por exemplo, ao estabelecer como marco a propriedade em 1º de
janeiro de cada exercício fiscal), o tratamento que esses tributos recebem
acaba sendo o mesmo dos tributos de fato gerador instantâneo.

É cediço que o fato gerador tem uma compreensão ampla, na qual são
identificadas características daí decorrentes. Um fato gerador continuado é
típico da propriedade, portanto, comum nas situações dos impostos que
adotem como elemento de tributação a propriedade, seja o IPTU, IPVA ou o
ITR.

Esse raciocínio se aproxima do chamado fato gerador instantâneo. Diante de


tal qualidade, há ainda outro modelo de tributo que não se reveste dessa
simplicidade.

Determinados fatos geradores ostentam uma visão complexa; para muitos, é


denominado fato gerador complexivo aquele em que se percebe o fato
tributável não num determinado momento, instantaneamente, mas ao longo
de um elemento temporal. Ou seja, o fato gerador complexivo se alonga no
tempo, não é instantâneo e tem perspectiva de prolongamento. Ele começa
em determinado momento, mas somente se aperfeiçoa após completado um
dado período.

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Alguns tributos adotam esse modelo em que o fato gerador não é visto de
maneira isolada. Assim, para identificar o elemento tributável, o tempo é
necessário.

Por exemplo: o fato gerador complexivo é observado, em especial, no Imposto


sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), que incide sobre o lucro dessa
entidade. Para saber se uma pessoa jurídica tem lucro, não se deve analisar
cada operação realizada isoladamente, tendo em vista que o lucro é o
resultado positivo do que o ente personalizado recebeu e gastou.

Para uma pessoa jurídica que deve efetuar pagamento de salários todo mês,
não se pode apurar o lucro em cada evento isolado. Lucro é uma figura
somente constatável temporalmente. Por esse motivo, o exemplo, por
excelência, do fato gerador complexivo é o do imposto sobre a renda.

O chamado fato gerador complexo ou complexivo ocorre em determinado


tempo. Na maior parte das vezes, adota-se o lapso do dia 1º de janeiro até 31
de dezembro.

Já existe um padrão anual para o tributo, porém, o fato gerador acontece ao


longo desse tempo, somente se aperfeiçoando no dia 31 de dezembro. Desse
modo, o fato gerador só poderá ser considerado ato jurídico perfeito quando
ocorrer o seu último momento.

Combinando-se à irretroatividade e à anterioridade, isso representa grave


risco à segurança jurídica, pois, ainda que o fato gerador se alongue
temporalmente, o mesmo só se aperfeiçoa no final, no dia 31 de dezembro, o
que representa uma complicação por si só.

Uma vez que o CTN exige do legislador todos os elementos necessários e


suficientes para a verificação do fato gerador, esse olhar exige um
destacamento dos seus cinco componentes, o que pode requisitar uma
percepção mais aguçada do intérprete, a depender do tributo abordado.

Repita-se que a obrigação tributária surge com o fato gerador (art. 113, § 1º,
do CTN), portanto, esse momento, com todas as suas características e o seu
aperfeiçoar, é fundamental. Contudo, o processo requer uma prévia descrição
clara pelo legislador.

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Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.

§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por


objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se
juntamente com o crédito dela decorrente.

§ 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as


prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da
arrecadação ou da fiscalização dos tributos.

§ 3º A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-


se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária.

Os elementos arrolados no art. 114 devem estar previstos na norma de forma


inequívoca e evidente.

Embora, para o CTN, essa análise possa não restar evidente, por outro lado,
para a doutrina, a exigência contida no art. 114 deve ser desdobrada nos
cinco aspectos que dizem respeito à hipótese tributária.

Sem prejuízo desses destaques, o CTN elencou como mais importante o


elemento temporal, conforme resta destacado no art. 116.

Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato


gerador e existentes os seus efeitos:

I − tratando-se de situação de fato, desde o momento em que o se verifiquem


as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que
normalmente lhe são próprios;

II − tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja


definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável.

Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou


negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do
fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação
tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei
ordinária. (Incluído pela LCP nº 104, de 2001.)

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O legislador deve estabelecer de forma clara o que é o fato gerador em si.
Dessa construção, caso o legislador não defina o momento de ocorrência
desse fato jurídico, a resposta é encontrada no art. 116 do CTN.

Dependerá, porém, se o tema já tiver sido tratado pelo direito.

I − tratando-se de situação de fato, desde o momento em que se verifiquem


as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que
normalmente lhe são próprios.

Caso já exista regra jurídica dispondo sobre o assunto, basta investigar como
o restante do direito irá tratar o fato.

Por exemplo: não seria necessário que o legislador do ITCMD definisse como
e quando ocorre o fato gerador do imposto de transmissão causa mortis. Da
mesma forma que seria despiciendo que o legislador do Imposto de
Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) dispusesse quando ele entende ocorrido
o fato gerador deste imposto, pois a transmissão de bem imóvel é cenário
tratado há muito pelo direito civil, também se encontrando previstos de forma
exaustiva os demais fenômenos, como a venda a contento e a retrovenda na
lei civil.

Sendo necessária alguma digressão, em razão de o legislador não tê-la feito


de forma inequívoca, cabe identificar se se trata de uma situação jurídica ou
não. Em se tratando de situação juridicamente tratada, basta recorrer ao
direito aplicável para verificar quando ocorre o fato gerador.

No entanto, não se tratando de algo devidamente disciplinado pelo


ordenamento jurídico em geral, incorre-se em uma situação de fato.

II − tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja


definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável.

Como o evento não é tratado pelo direito, os elementos materiais deverão ser
investigados. Existem cada vez menos cenários nos quais se vive uma
situação de fato.

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Por exemplo: existe situação de fato em cenários relativos ao comércio
internacional, ainda que fenômeno relativamente comum, posto que não
tratado por nenhum campo do direito.

Hodiernamente, a OMC (Organização Mundial do Comércio) trata do


comércio internacional, porém, não define quando é praticado o fenômeno da
importação. Não é situação detalhada pelo direito empresarial, que reconhece
os princípios que regem o comércio internacional, mas não detalha esse tipo
de evento.

Quando e como ocorre o fenômeno da importação não é tratado por nenhum


campo do direito, a não ser pelo direito tributário. Nesse caso, legislador
tributário deve ser o mais preciso de todos.

Caso o legislador tributário não dispusesse quando ocorre o fenômeno da


importação, seria uma situação de fato, impondo a investigação de suas
circunstâncias materiais.

Nesse exemplo, as leis específicas do regime aduaneiro estabelecem


claramente quando ocorrem a importação e a exportação.

O CTN, enquanto norma geral e destinado a construir um modelo para a


tributação, estatuiu que incumbe ao legislador de cada uma das formas
tributárias precisar o momento de ocorrência do fato gerador. Caso essa
missão não seja cumprida, caberá se socorrer das ferramentas descritas no
art. 116, do CTN.

Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato


gerador e existentes os seus efeitos:

I − tratando-se de situação de fato, desde o momento em que o se verifiquem


as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que
normalmente lhe são próprios;

II − tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja


definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável.

Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou


negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do

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fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação
tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei
ordinária. (Incluído pela LCP nº 104, de 2001.)

Nessa seara, se o cenário tributado for submetido a uma condição, caberá


analisar qual o tipo de condição tratada, se suspensiva ou resolutória.

Art. 117. Para os efeitos do inciso II do artigo anterior e salvo disposição de lei
em contrário, os atos ou negócios jurídicos condicionais reputam-se perfeitos
e acabados:

I − sendo suspensiva a condição, desde o momento de seu implemento;

Não há outra característica da condição suspensiva senão suspender os


efeitos do fato jurídico até que essa condição se verifique. O fato gerador só
será identificado quando do implemento de tal condição.

II − sendo resolutória a condição, desde o momento da prática do ato ou da


celebração do negócio.

Já a condição resolutória retrata situação oposta, pois não inibe a produção


imediata de efeitos. Portanto, essa condição já se verifica imediatamente,
ainda que pendente evento futuro para confirmá-la.

Por exemplo: determinados sujeitos realizam a compra e venda de imóvel,


porém, o comprador não tem condições financeiras para pagar o valor à vista,
de forma que financia o imóvel.

As partes então celebram uma promessa de compra e venda, pactuando-se


as regras de um financiamento do imóvel. Ao completar todo o período do
financiamento, é celebrada a escritura definitiva, consolidando a propriedade
do comprador.

Pensando-se à luz do direito de propriedade, esse direito é transferido quando


da celebração da escritura definitiva. Portanto, o fato gerador do ITBI não
ocorre quando do primeiro negócio jurídico firmado, submetido a uma
condição suspensiva de pagamento do financiamento.

O primeiro ato, correspondente à promessa de compra e venda, não é


suficiente para a ocorrência do fato tributável. O fato gerador do tributo só

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ocorre quando da aquisição da propriedade, vez que esse evento está
submetido a uma condição suspensiva de pagamento.

Diverso seria o caso em que o comprador realizasse um empréstimo perante


uma instituição financeira para adquirir o imóvel. Nessa hipótese, o indivíduo
já adquire a propriedade, com a celebração da escritura definitiva ou
documento que tenha força de escritura.

Todavia, a pessoa deverá pagar o financiamento que realizou perante o


banco, visto que a escritura foi lavrada com base em um crédito bancário, de
financiamento imobiliário, caso em que, se o comprador não pagar, a
propriedade reverterá ao banco. Essa é a situação em que há uma hipoteca
em favor da instituição financeira para que esta resgate o bem. O banco
empresta dinheiro para o comprador, porém exige o próprio bem adquirido
como garantia desse débito.

Há o adquirente e o alienante do bem imóvel, assim como o banco como


credor e terceiro interveniente nessa relação. Esteve presente um negócio
jurídico submetido a uma condição, porém essa condição não inibiu a
transmissão da propriedade. O fato gerador do ITBI já ocorreu quando da
aquisição do imóvel pelo comprador.

Novamente, verifica-se uma íntima preocupação do CTN com o momento da


ocorrência do fato gerador, conforme arts. 116 e 117.

Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional):

Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato


gerador e existentes os seus efeitos:

I − tratando-se de situação de fato, desde o momento em que o se verifiquem


as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que
normalmente lhe são próprios;

II − tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja


definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável.

Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou


negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do

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fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação
tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei
ordinária. (Incluído pela LCP nº 104, de 2001.)

Art. 117. Para os efeitos do inciso II do artigo anterior e salvo disposição de lei
em contrário, os atos ou negócios jurídicos condicionais reputam-se perfeitos
e acabados:

I − sendo suspensiva a condição, desde o momento de seu implemento;

II − sendo resolutória a condição, desde o momento da prática do ato ou da


celebração do negócio.

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