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Sem delongas, Excelência, veja-se que o laudo pericial elaborado no presente feito é o
mesmo feito para os processos relativos aos benefícios por incapacidade, tendo o médico
perito analisado única e exclusivamente a incapacidade laboral do Autor. Ocorre que existe
uma clara diferença ontológica entre a DEFICIÊNCIA e a incapacidade laborativa.
Veja-se que a deficiência é conceituada pelo preâmbulo da Convenção Internacional
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (incorporada no direito brasileiro com status de
Emenda Constitucional), em sua alínea “e”, da seguinte forma:
E tendo sido recepcionada pelo ordenamento jurídico brasileiro com status de Emenda
Constitucional, como é sabido, todos os atos legislativos e judiciais tem de se conformar à tal
definição, aplicando-se uma interpretação conforme à Constituição. A fim de corroborar tal
posição, pede-se vênia para trazer à baila os apontamentos de Ingo Wolfgang Sarlet referentes
à Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência:
o caso das pessoas com deficiência tem sido central para a teoria e prática
do princípio da igualdade e dos direitos de igualdade, pois se trata de grupo
de pessoas particularmente vulnerável (em maior ou menor medida, a
depender da condição pessoal) [...], além da forte atenção dispensada ao
tema pelo direito internacional dos direitos humanos [...]. Além disso, o fato
de a Convenção ter sido aprovada [...] na forma do disposto no art. 5º, §
3º, da CF, de modo a se tratar de normativa equivalente a emenda
constitucional, assegura-lhe ainda maior relevância, pois torna cogente a
"releitura" de todo e qualquer norma infraconstitucional que tenha
relação com o tema, seja revogando normas incompatíveis [...]. De
qualquer modo, [...] a CF, fundada na dignidade da pessoa humana,
acertadamente se refere à pessoa portadora (hoje há de adotar-se a
designação pessoa com deficiência) de deficiência, ou seja, enfatiza-se a
condição primeira de pessoa, deixando-se de lado a mera referência aos
deficientes, fórmula felizmente superada [...]. As ações afirmativas
destinadas à integração das pessoas com deficiência não se limitam, ao
mundo do trabalho, abarcando um dever de inclusão (integração e
promoção) em todas as esferas da vida social, econômica, política e
cultural, o que também tem sido alvo das preocupações da CF [...]. A
mesma preocupação se verifica no âmbito do sistema internacional de
proteção dos direitos humanos, da legislação interna [...].[1]
Nesse sentido, observa-se que houve uma alteração da redação original do art. 20. §2º
da LOAS, com o advento do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/15):
REDAÇÃO ORIGINAL:
2º Para efeitos de concessão deste benefício, a pessoa portadora de
deficiência é aquela incapacitada para o trabalho e para a vida
independente.
NOVA REDAÇÃO:
Neste sentido, percebe-se que o legislador foi minucioso ao estabelecer no art. 3º,
inciso IV do referido diploma, a conceituação das diferentes espécies de barreiras que podem
atravancar a participação em igualdade de condições da pessoa com deficiência, veja-se:
Logo, não mais se conceitua a deficiência que enseja o acesso ao BPC-LOAS como aquele
que incapacite a pessoa para a vida independente e para o trabalho, e sim aquele que possui
algum tipo de impedimento, que, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas.
Em momento algum a norma condiciona o recebimento do benefício à demonstração da
incapacidade para o trabalho!
Assim, fica evidente a diferença entre os dois conceitos, de maneira que a incapacidade
necessita da deficiência, e que esta impeça o regular exercício das atividades laborais,
enquanto que a deficiência não necessita da incapacidade para estar presente.
[...]
Diante disto, não devem ser considerados apenas as questões biomédicas, pois estas
podem apontar para uma direção e a conjuntura macro e micro social apontarem para outra,
que torne a inclusão do indivíduo no corpo social dificultada em face da sua deficiência.
Como se não bastasse, o próprio texto legal prevê a possibilidade dos beneficiários do
BPC de desenvolverem atividades não remuneradas, a fim de se inserirem na sociedade, o que
per se refuta totalmente a tese da incapacidade laboral, veja-se o que assevera o art. 21, §3º da
LOAS:
Art. 21. O benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada 2 (dois)
anos para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem.
[...]
[...]
6oO benefício poderá ser concedido nos casos em que não seja possível
prever a duração dos impedimentos a que se refere o inciso I do § 5 o, mas
exista a possibilidade de que se estendam por longo prazo. (Incluído pelo
Decreto nº 7.617, de 2011) (grifos acrescidos)
Aliás, não só a CIF merece observância para análise do requisito de deficiência para
acesso ao BPC-LOAS. Veja-se que a Portaria Interministerial AGU/MPS/MF/SEDH/MP Nº 1 DE
27.01.2014[3] criou o Índice De Funcionalidade Brasileiro Aplicado Para Fins De Classificação E
Concessão Da Aposentadoria Da Pessoa Com Deficiência (IF-BRA), visando fornecer o método
a ser utilizado a fim de se avaliar a deficiência do segurado. E saliente-se que o próprio INSS já
se adequou aos parâmetros do IF-BRA e do CIF na concessão administrativa dos BPC.
Destarte, considerando que não é necessário muito esforço para concluir que um
indivíduo com visão subnormal em um olho e cegueira em outro possui inúmeras
desigualdades latentes com relação aos demais indivíduos “sadios” da sociedade, é claro o
enquadramento no novo conceito de deficiência introduzido pela Convenção Internacional
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Do Requisito Socioeconômico
O laudo socioeconômico (evento xx) fez inconteste prova no sentido de que a parte
Autora vive em estado de necessidade, satisfazendo o requisito social atinente à concessão do
benefício pretendido.
E veja-se que a situação é tão precária e desumana que o Autor está com a água
cortada e a luz parcelada! A própria assistente social relata a situação material do autor como
“muito precária”:
${informacao_generica}
E para ilustrar a situação penosa do Autor, veja-se o registro fotográfico (evento xx):
${informacao_generica}
ISTO POSTO, requer a PROCEDÊNCIA dos pedidos que constam na exordial, sendo
concedido ao Autor o Benefício de Prestação Continuada, desde a DER – ${data_generica}.
Subsidiariamente, requer a realização de perícia médica nos moldes estabelecidos pelo IF-BRA,
devendo ser analisada a existência da deficiência com fundamento no CID-10 conjugado com o
CIF.
Nestes Termos;
Pede Deferimento.
, 06 de outubro de 2022.
[4] BITTENCOURT, Andre Luiz Moro. Manual dos benefícios por incapacidade laboral e
deficiência. Curitiba: Alteridade, 2016, p. 338.