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Modelo médico da deficiência

A Cooperativa de Vida Independente de Estocolmo (STIL), que é o primeiro


centro de vida independente da Suécia, afirma que "uma das razões pelas
quais as pessoas deficientes estão expostas à discriminação é que os
diferentes são Frequentemente declarado doentes. Este modelo médico da
deficiência nos designa o papel desamparado e passivo de pacientes, no qual
somos considerados dependentes do cuidado de outras pessoas, incapazes de
trabalhar, isentos dos deveres normais, levando vidas inúteis, como está
evidenciado na palavra ainda comum 'inválido' ('sem valor', ~m latim)". (STIL,
1990, p. 30).

Tão arraigado é o modelo médico da deficiência que, note-se, ele tem


influenciado fortemente o discurso dos próprios defensores da causa das
pessoas deficientes.

Por exemplo, a Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes, aprovada em


1975, em seu artigo 7, diz o seguinte (grifo meu):

"As pessoas deficientes têm direito a tratamentos médico, psicológico e


funcional, inclusive aparelhos protéticos e ortóticos, à reabilitação física, à
reabilitação social, à educação, ao treinamento e reabilitação profissionais, à
assistência, ao aconselnto, aos serviço de colocação e a outros serviços que
lhes possibilitarão desenvolver suas capacidades e habilidades ao máximo e
acelerarão o processo de sua integração ou reintegração social".
(UnitedNations, 1978).

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Dezoito anos após a adoção dessa Declaração pela Assembleia Geral da ONU,
foi publicado um importante documento escrito por Agnes Fletcher e traduzido
para o português com o título Ideias Práticas em Apoio ao Dia Internacional das
Pessoas Deficientes: 3

de Dezembro. Na página 10, Fletcher se refere a essa Declaração e repete o


referido artigo 7. Observe-se que o documento foi publicado por uma
progressista entidade de pessoas com deficiência, a DAA -Disability
Awareness in Action, junta mente com a poderosa organização DPI - Disabled
Peoples' International.

Fletcher explica o modelo médico da deficiência nos seguintes termos:

"Tradicionalmente, a deficiência tem sido vista como um 'problema' do indivíduo


e, por isso, o próprio indivíduo teria que se adaptar à sociedade ou ele teria que

ser mudado por profissionais através da reabilitação ou cura". (1996, p. 7).

Portanto, segundo este modelo, "a pessoa deficiente é que precisa ser curada,
tratada, reabilitada, habilitada etc. a fim de ser adequada à sociedade como ela
é, sem maiores modificações" (Sassaki, 1997).

O modelo médico da deficiência tem sido responsável, em parte, pela


resistência da sociedade em aceitar a necessidade de mudar suas estruturas e
atitudes para incluir em seu seio as pessoas portadoras de deficiência e/ou de
outras condições atípicas para que estas possam, aí sim, buscar o seu
desenvolvimento pessoal, social, educacional e profissional. É sabido que a
sociedade sempre foi, de um modo geral, levada a acreditar que, sendo a
deficiência um problema existente exclusivamente na pessoa deficiente,
bastaria prover-lhe algum tipo de serviço para solucioná-lo.

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Centros de reabilitação vêm, há muitas décadas, desempenhando


rigorosamente o papel de principal agente disseminador do modelo médico da
deficiência. Em sua dissertação de mestrado, a psicóloga Araci Nallin fez uma
profunda análise da prática institucional no interior de um desses centros de
reabilitação. Uma de suas conclusões:

"Se, por um lado, o discurso dominante em reabilitação enfatiza a necessidade


de se incrementar as capacidades restantes do cliente, por outro lado, a sua
análise revela um enfoque no distúrbio, na doença, na deficiência. E o modelo
médico aplicado à reabilitação. Existe o diagnóstico, o tratamento e a 'cura',
como se a complexa questão da integração social das pessoas deficientes
pudesse ser resolvida por uma operação, uma prótese, ou seja lá o que for."
(Nallin, 1994, p. 171)

O modelo médico da deficiência, segundo Westmacott (1996), "tenta 'melhorar'


as pessoas com deficiência para adequá-las aos padrões da sociedade. [...] E
claro que algumas vezes pessoas portadoras de deficiência necessitam, de
fato, apoio físico ou médico, porém é importante que isto atenda às suas
necessidades e lhes dê maior controle sobre sua vida". E Westmacott
acrescenta que isso deve ser feito 'com elas e não para elas'.

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