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POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA E A QUESTÃO RACIAL

HISTÓRICO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO


DE RUA NO DISTRITO FEDERAL, COM FOCO NA POPULAÇÃO NEGRA

Autoras:
Edileuza Penha de Souza
Bárbara Oliveira Souza

1
INTRODUÇÃO

No Brasil, há uma grande lacuna de documentos historiográficos e de estudos acadêmicos


sobre as origens das populações em situação de rua. Nesse sentido, o “Projeto de
capacitação para profissionais da saúde envolvidos com população de rua, com foco na
população negra”, promovido pelo Núcleo de Estudos Estratégicos (Nestra) do Centro de
Estudos Avançados Multidisciplinares (Ceam/Observatório da Juventude) da Universidade de

2
Brasília (UnB), constitui-se como um marco de preenchimento desse espaço. Dessa forma, a
modalidade a distância do curso de especialização e aperfeiçoamento do projeto, em
parceria com o Ministério da Saúde, no âmbito do Distrito Federal, tem por objetivo
sensibilizar e capacitar diferentes profissionais da saúde envolvidos com a população em
situação de rua.

Com este módulo, denominado “População em situação de rua e a questão racial: histórico
das políticas públicas de saúde da população em situação de rua no Distrito Federal, com
foco na população negra”, nosso objetivo principal é proporcionar a apropriação de
informações históricas para entender a importância dos direitos humanos e do combate ao
racismo no que se refere à situação da população de rua no Brasil e no Distrito Federal
atualmente. Visamos, ainda, compreender que a ausência das políticas públicas tem como
consequência o adoecimento e o genocídio da população negra.

Partindo do princípio de que o surgimento da “população em situação de rua” nasce com o


sistema escravocrata e racista, bem como do princípio de que a consolidação dessa condição
se deu a partir das leis abolicionistas, buscamos refletir sobre como essas leis se consolidam,
em ações atuais, como um fenômeno negligenciado pelo Estado. Isso ocorre na medida em
que o Estado nega suas responsabilidades no que tange à violência, à pobreza e às
desigualdades sociais produzidas historicamente em torno da população negra. Ao longo
do módulo, procuramos contribuir com as discussões sobre o conceito de população em
situação de rua e sobre como essa situação tem sido denunciada pelos movimentos sociais.
O módulo se estrutura em dois grandes eixos abaixo descritos.

População em situação de rua e a questão racial: histórico das políticas


públicas de saúde da população em situação de rua no Distrito Federal,
com foco na população negra

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EIXO I

Módulo 1 | Conceito e origem da população em situação de rua


1. Sistema escravocrata e formação da população em situação de
Seção 1 rua
● Escravidão e desamparo;
S ● Leis abolicionistas e população em situação de rua;
● Contextualização e histórico contemporâneo.
2. Base legal de apoio à população em situação de rua
SE
● Leis de amparo à população em situação de rua no Brasil;
Seção 2
● Movimentos sociais e direitos da população em situação de
rua.
Módulo 2 | Políticas públicas de saúde – racismo e saúde mental

Seção 1 1. Direitos humanos, racismo e pobreza


● Racismo e adoecimento;
S ● Políticas públicas e saúde.

2. Situação da população de rua no Distrito Federal


SE
● Onde e como está a população em situação de rua no DF;
Seção 2
● Legislações de amparo à população em situação de rua;
● Políticas públicas e desafios de manutenção dos direitos.

Com essa divisão, pretendemos que os/as cursistas possam compreender e recuperar parte
da história e da cultura afro-brasileira, apropriando-se de conhecimentos que, apesar de
historicamente negligenciados pelo Estado, constituem-se como direitos fundamentais para
a redução de danos no que se refere à saúde mental da população em situação de rua.

4
No eixo I, “Conceito e origem da população em situação de rua”, contextualizamos o sistema
escravocrata e suas leis abolicionistas a partir do contexto de desamparo que levou à
formação de populações em situação de rua no Brasil. Já o eixo 2, “Políticas públicas de saúde
– racismo e saúde mental”, aborda as experiências do Distrito Federal e como o racismo se
consolida como ideologia responsável pelo adoecimento da população negra. Ao enfocar a
situação da população de rua no Distrito Federal, nosso objetivo é definir onde e como vivem
essas pessoas na capital do país e seu entorno e finalizar com as leis contemporâneas que,
de fato, têm amparado e garantido direitos às populações em situação de rua. O módulo
demarca o importante papel da sociedade organizada para a manutenção desses direitos,
bem como os principais desafios na conquista de políticas públicas específicas de saúde.

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EIXO 1 | CONCEITO E ORIGEM DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA

O termo “população em situação de rua” (PopSR) parte da compreensão de que as pessoas


que se encontram nessa condição são, em sua maioria, trabalhadores que, em decorrência
das desigualdades sociais, da perda de direitos e do aumento da pobreza, foram
conduzidos/as a essa condição de vida (SILVA, 2009, p. 1371) .

O Decreto nº 7.0532, de 2009, define a população em situação de rua como:


Grupo populacional heterogêneo que possui em comum a pobreza extrema,
os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de
moradia convencional regular, e que utiliza os logradouros públicos e as áreas
degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma temporária ou
permanente, bem como as unidades de acolhimento para pernoite
temporário ou como moradia provisória.

Essa definição, ainda que contemporânea, corresponde à aparição das primeiras pessoas em
situação de rua no Brasil. Nesse sentido, é necessário observar o cenário que origina a
população brasileira para que possamos compreender a origem da população de rua no
país.

1 SILVA, Maria Lúcia Lopes. Trabalho e população em situação de rua no Brasil. São Paulo: Cortez, 2009.
2 Disponível em:
<http://www.mds.gov.br/webarquivos/legislacao/assistencia_social/decreto/decreto_7053.pdf>. Acesso em 11
de abril de 2019.

6
Em 1500, quando portugueses desembarcaram no Brasil, encontraram aqui uma população
originária de mais de cinco milhões de pessoas. O processo de colonização exterminou
grande parte dessa população, reduzindo-a às atuais oitocentos e noventa e seis mil e
novecentas pessoas, conforme dados do censo de 2010 (IBGE, 2010)3.

Apesar da insistência das autoridades em afirmar que os índios no Brasil não foram
escravizados, por terem contado com a proteção das missões jesuíticas e do conhecimento
do território brasileiro, é sabido que o modelo de exploração econômica adotado pelos
europeus não os poupou do processo de escravidão. Desse modo, o trabalho escravo
imposto aos indígenas foi uma causa de epidemias letais que contribuíram para a dizimação
de nações inteiras.

Dessa maneira, é importante ressaltar que, antes da invasão dos territórios indígenas pelos
portugueses, não havia abandono de pessoas. Os valores de comunalidade, de circularidade
e de ancestralidade desenvolveram e desenvolvem, nesses povos, um conjunto de cuidados
e proteções coletivas. Ao escravizar e dizimar os continentes africano e americano
simultaneamente, os europeus provocam a criação das primeiras populações em situação de
rua no Brasil.

Para Saber Mais


Conhecendo um pouco mais sobre pessoas em
situação de rua
Assista ao documentário “À margem da imagem” (2003).
72min.

3 Disponível em: <https://censo2010.ibge.gov.br/>. Acesso em 20 de abril de 2019.


7
Dirigido por Evaldo Mocarzel.
Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=EB7A__uVQ9E>.
Acesso em 04 de setembro de 2019.

Sinopse
Documentário sobre as rotinas de sobrevivência, o estilo
de vida e a cultura dos moradores de rua de São Paulo,
abordando temas como exclusão social, desemprego,
alcoolismo, loucura, religiosidade e, como sugere o
próprio título, o roubo da imagem dessas comunidades.
Promove-se, assim, uma discussão ética dos processos de
estetização da miséria.
Após assistir ao documentário, responda:
✓ Que personagem mais chamou a sua atenção?
✓ Por quê? Descreva um pouco essa personagem.
✓ O documentário apresentou alguma informação
nova para você? Qual?

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SEÇÃO 1 – SISTEMA ESCRAVOCRATA E FORMAÇÃO DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE
RUA

1.1 Escravidão e desamparo

1.2 Leis abolicionistas e população em situação de rua

1.3 Contextualização e histórico contemporâneo

9
10
Introdução
Sequestrando-os do continente africano na condição de escravos, europeus — portugueses
foram pioneiros — tentaram reduzir africanos ao nível de coisas e de animais, inaugurando,
na história da humanidade, uma situação nunca vista 4 . Capturados, transportados e
mantidos em cativeiro sob condições de extrema violência e precariedade, os povos
africanos recorreram à luta de resistência em todos os processos de escravização.

Muitos intelectuais e pesquisadores negros se contrapõem à ideia (implantada pelos


europeus e seus descendentes) de passividade dos indígenas e africanos e de aceitação da
escravidão. Está comprovado que, mesmo que a estrutura de poder estivesse alicerçada nas
armas de fogo, os mais de cinco milhões de africanos que foram sequestrados para o Brasil
ao longo de trezentos anos resistiram. Estima-se, ainda, que cerca de seiscentos e setenta
mil africanos morreram na travessia do Oceano Atlântico. Mais uma vez, somamos a ideia de
que parte significativa desse número é resultado de ações, individuais e coletivas, daqueles
que preferiram a morte a sucumbir à servidão (FANON, 19685; MOURA, 19816).

1.1 Escravidão e desamparo


No Brasil, os trabalhadores escravizados foram encaminhados a todos os tipos de trabalho.
Nesse sentido, não há como pensar algum trabalho, do mais sofisticado ao de menor
prestígio, realizado sem as mãos e a argúcia dos trabalhadores e trabalhadoras
escravizados/as. O cultivo e processamento de monoculturas, como a cana-de-açúcar e o

4 A história da humanidade registra vários modelos de escravidão em todas as civilizações. No entanto, a escravidão
mercantil inaugura um processo de desumanização e violência nunca antes registrado na história.
5 FANON, Frantz. Os condenados da terra. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.
6 MOURA, Clóvis. Rebeliões na senzala: quilombos, insurreições, guerrilhas. São Paulo: Ciências Humanas, 1981.
11
café; da lavra do ouro e diamantes à lapidação e fabricação de joias e ornamentos; dos
complexos afazeres domésticos à construção — todas as tarefas eram engendradas pela
força de trabalho escravizada.

Se todo e qualquer trabalho era realizado por pessoas escravizadas, as condições de vida e
trabalho dessas pessoas, nas fazendas e nas minas de ouro, eram as piores possíveis.
Explorados de todas as formas e cerceados de liberdade, a média de vida laboral dos/das
trabalhadores/as não ultrapassava quinze anos. Esse fato não era nenhum problema para os
portugueses colonizadores, pois a reposição de mão de obra era imensamente lucrativa. Há
diversos registros de que o comércio de escravizados foi o mais lucrativo para as colônias
europeias.

Ao contrário do que afirmou Gilberto Freyre (1933)7, que descreveu a escravidão no Brasil
como um paraíso de “bons senhores e escravos submissos”, é preciso entender que a
servidão de pessoas jamais será algo passivo ou harmônico. Se por quase quatro séculos
ocorreu a submissão de trabalhadores e trabalhadoras negros e negras a um regime de
crueldade e violência, essas pessoas lutaram e resistiram de todas as formas ao seu alcance,
pois, como afirma o historiador Clóvis Moura, “O mito do ‘bom senhor’ de Freyre é uma
tentativa no sentido de interpretar as contradições do escravismo como episódio natural,
algo extremamente condenável, porém que resultou na construção de uma identidade racial
notável” (MOURA, 1988, p. 18)8.

A experiência de desamparo, com sua falta de horizontes e esperança, resultou em diferentes


atitudes física e psicologicamente dolorosas de escape que os/as africanos/as
escravizados/as adotaram para alcançar a liberdade. Abortos, suicídios, infanticídio, banzo

7 FREYRE, Gilberto. Casa Grande e Senzala. 9ª ed. São Paulo: Global, 2012.
8 MOURA, Clóvis. Sociologia do negro brasileiro. São Paulo: Ática, 1988, p. 18.
12
(depressão), assassinatos dos senhores escravocratas, a destruição das lavouras e plantações
foram apenas algumas das muitas experiências de resistência a que os negros e negras
recorreram ao longo de todo o período em que durou a escravidão. As atitudes de luta e
resistência também possibilitaram a manutenção da integridade, saúde mental e dignidade.

Nessa perspectiva de integridade física e emocional, o desamparo da escravidão consolidou


os quilombos como um elemento determinante de sobrevivência da ancestralidade, da
territorialidade, da memória e da identidade negra. Os quilombos foram e são espaços de
acolhimento de uma sociedade justa e igualitária para todos, uma vez que, além de abrigar
os negros e negras em situações de fuga, abrigou também brancos e indígenas.

Quilombo é um termo advindo do vocabulário quimbundo de origem banto ou bantu,


pertencente aos primeiros povos africanos que chegarem ao Brasil e que aqui foram
chamados de angolas, congos, cabindas, benguelas, moçambiques e outros (LOPES, 2004).
O quilombo foi denominado, por um longo tempo, como lugar de pretos fujões. Entretanto,
definir quilombo exige que se acessem as caracterizações desse território, tão variadas
quanto a extensa denominação que a ele é conferida aqui no Brasil — mocambo, terra de
preto, palmar, comunidades negras rurais (FIABANI, 2005)9 — e nos países de diáspora —
palenques, Colômbia e Cuba; cumbes, Venezuela; marrons, Haiti e demais ilhas do Caribe
francês, Jamaica, Suriname e sul dos Estados Unidos; cimarrones em partes da América
espanhola CARVALHO apud FIABANI, 2005, p. 283)10

(...) o conceito de quilombo, tal como vem sendo utilizado, por prender-se a
um fato do passado (o confronto armado, direto, violento e espacialmente

9 FIABANI, Adelmir. Mato, palhoça e pilão: o quilombo, da escravidão às comunidades remanescentes [1532-2004].
São Paulo: Expressão Popular, 2005.
10 Ibidem.
13
localizado — o refúgio), uma das possibilidades apenas de opor-se ao regime
escravocrata, conceito este enfatizado pelo senso comum como possibilidade
única, exatamente pela sua maior visibilidade, esquece e escamoteia toda
uma gama variada e matizada de situações sutis, mas concretas, que fizeram
face a esse processo injusto. (...) acaba por desviar nossa atenção de uma série
de outras situações de resistência, nas quais os negros exercem papéis que
não o de refugiado armado, tornado visível pela historiografia oficial, mas
outros papéis de um confronto relativizado, na sua aparência atenuado, em
relação à sociedade escravista ou recém-pós-escravista do Brasil do final do
século XIX e início do século passado. (ANJOS e SILVA, 2004, p. 29)11

Entender o sistema escravocrata e a formação da população em situação de rua passa por


pautar a pluralidade da história e da cultura brasileira. Nesse sentido, é necessário conhecer
as particularidades que possibilitam entender os conceitos e as origem da população em
situação de rua, entendendo essa população também como um conjunto de pessoas que
resistem ao sistema opressor; pessoas que, como nos quilombos, “alteram o mapa do
escravismo, da branquitude e do poder instituído. Existiram e existem, gentes comuns, que
ao não se constituírem vultos, promoveram e promovem devires, formando uma multidão!”
(NUNES, 2017). Por isso, o termo “populações em situação de rua” é aqui entendido como
pessoas que, coletivamente, necessitam de amparo e políticas públicas.

1.2 - Leis abolicionistas e população em situação de rua

11ANJOS, J.C.; SILVA, S.B. (org.). São Miguel e Rincão dos Martimianos: ancestralidade negra e
direitos territoriais. Porto Alegre: UFRGS, 2004.
14
Oficialmente, “abolicionismo” é um movimento que surgiu na Europa no final do século XVIII,
com o objetivo de pôr fim ao sistema de escravidão. No Brasil, o movimento abolicionista
iniciou tardiamente, na segunda metade do século XIX, sob a liderança dos brancos
considerados liberais. Apesar disso, havia abolicionistas de diversas classes sociais e posições
políticas, como republicanos, religiosos, intelectuais, ex-escravos e mulheres.

Assim como em todos os lugares do mundo, o fim do sistema escravocrata no Brasil é


resultado da organização e luta dos movimentos sociais e populares, a exemplo da Revolta
dos Alfaiates (1798) e da Revolta dos Malês (1835), ambas ocorridas na Bahia.

Apesar do forte estímulo libertário que foi crescendo na sociedade, o processo da abolição
no Brasil foi um processo de golpes contínuos implementados pela elite branca escravocrata
aos trabalhadores escravizados, no sentido, inclusive, de apresentar alguma satisfação aos
ingleses, que pressionavam o país a abolir do trabalho escravo. Exemplo disso foi a Lei
Eusébio de Queirós, de 1850, que determinava o fim do tráfico negreiro, assinada em razão
das pressões inglesas e do risco de guerra com a Inglaterra. No entanto, apesar do
compromisso assumido, os interesses econômicos mantiveram o sequestro de pessoas por
cerca de trinta anos após a assinatura da lei e o tráfego de pessoas escravizadas, em vez de
ser combatido, intensificou-se.

A Lei Eusébio de Queirós previa que os navios de bandeira brasileira ou os navios


estrangeiros encontrados em águas territoriais pertencentes ao Brasil, com escravizados a
bordo, seriam apreendidos e criminalizadas as pessoas envolvidas. Também segundo a lei,
os escravizados e escravizadas apreendidos/as seriam recambiados para os portos de origem
ou para qualquer outro ponto fora do Império Britânico. Caso nenhuma dessas opções fosse
possível, os/as escravizados/as seriam empregados/as sob a tutela do governo.

15
Mais uma vez lançados à sua própria sorte, as pessoas “livres” em função da “extinção do
tráfico” tornaram-se a origem da população em situação de rua. Vale lembrar que, no mesmo
ano da Lei Eusébio de Queirós, é assinada também a Lei nº 601, de 18 de setembro, que vai
estabelecer as questões fundiárias. Essa lei, conhecida como Lei da Terra, impunha a compra
como a única forma de obter o direito à terra no Brasil. Sem trabalho e sem acesso à terra,
as ruas foram a solução encontrada para a falta de moradia das pessoas “libertas”.

16
Da Lei do Ventre Livre às crianças abandonadas

Imagem 1 - Criança em situação de rua. Foto de Tânia R Rego12

Transcorridos mais de vinte anos após a assinatura da Lei Eusébio de Queirós, a Lei do Ventre
Livre (28 de setembro de 1871) propunha que crianças nascidas a partir de sua assinatura,
sendo filhas de mães escravizadas, tornariam-se livres. A perversa lei foi mais uma fachada
do cruel sistema escravocrata. A Lei nº 2.040, assinada pela Princesa Isabel, determinava o
seguinte:
Art. 1º – Os filhos de mulher escrava que nascerem no Império desde a data
desta lei serão considerados de condição livre.

§ 1º – Os ditos filhos menores ficarão em poder ou sob a autoridade dos


senhores de suas mães, os quais terão a obrigação de criá-los e tratá-los até

12 Disponível em:
<https://www.google.com/search?q=Criança+em+situação+de+rua.+Foto+de+Tânia+Rego&tbm=isch&source=iu&
ictx=1&fir=nQdoKvB2cVh1AM%253A%252Cn55ZTGG5RqfgzM%252>.
17
a idade de oito anos completos. Chegando o filho da escrava a esta idade, o
senhor da mãe terá opção, ou de receber do Estado a indenização de
600$000, ou de utilizar-se dos serviços do menor até a idade de 21 anos
completos. No primeiro caso, o Governo receberá o menor e lhe dará destino,
em conformidade da presente lei.

(...)

§ 6.º – Cessa a prestação dos serviços dos filhos das escravas antes do prazo
marcado no § 1° se por sentença do juízo criminal reconhecer-se que os
senhores das mães os maltratam, infligindo-lhes castigos excessivos.

Art. 2.º – O governo poderá entregar a associações, por ele autorizadas, os


filhos das escravas, nascidos desde a data desta lei, que sejam cedidos ou
abandonados pelos senhores delas, ou tirados do poder destes em virtude
do Art. 1.º- § 6º.

§ 1.º – As ditas associações terão direito aos serviços gratuitos dos menores
até a idade de 21 anos completos, e poderão alugar esses serviços, mas serão
obrigadas:

(...)

Art. 6.º – Serão declarados libertos:

(...)

§ 5.º – Em geral, os escravos libertados em virtude desta lei ficam durante 5


anos sob a inspeção do governo. Eles são obrigados a contratar seus serviços
sob pena de serem constrangidos, se viverem vadios, a trabalhar nos
estabelecimentos públicos. Cessará, porém, o constrangimento do trabalho,
sempre que o liberto exigir contrato de serviço.

(...)

18
Nos dez artigos e trinta e quatro parágrafos, a Lei do Ventre Livre apresenta dubiedades que
favorecem unicamente os senhores de escravos como os beneficiados pela lei, uma vez que
as condições por ela determinadas impunham severas condições às mães e aos seus filhos e
filhas. Vale lembrar que é esse o momento inaugural da condição de crianças abandonadas
no Brasil. Ou seja, um dos efeitos da Lei do Ventre Livre foi incluir no cenário do país as
primeiras crianças em situação de rua, essas mesmas crianças de pele negra que somam
quase cinquenta mil meninos e meninas em situação de rua atualmente.

Lei do Sexagenário e o desamparo dos velhos no Brasil

19
Imagem 2 - Negros libertos em Porto Alegre em 1895. Foto de Herr Colembusch. Acervo Ronaldo Bastos13.

Há um provérbio africano que diz “quando morre um velho, morre com ele uma biblioteca”,
pois os anciãos são as pessoas que guardam conhecimentos em suas memórias. São pessoas
experientes e responsáveis, que demonstram condutas exemplares e aconselham os
membros de suas comunidades. Velhos e crianças são, no continente africano, as pessoas
que merecem mais cuidados. As crianças, porque representam o futuro; os velhos, porque
são os guardiães do passado. Aos velhos compete a tarefa de transmitir conhecimentos. Às
crianças, cumprir o papel da aprendizagem, tecendo o fio de continuidade, à medida que
vão aprendendo os mitos, os rituais e as histórias que são repassadas coletivamente. Esses
fios, porém, são totalmente rompidos com a escravização das pessoas.

Quando os historiadores se referem à expectativa de vida dos escravizados no Brasil, a média


consensual não chega aos vinte anos, dadas as precárias condições de alimentação, saúde,
moradia, trabalho e condições gerais de vida. Se dobrarmos esse número, chegaremos a
quarenta anos. Se pensarmos que “as peças” mais caras eram homens e jovens, cuja idade
variava entre 14 e 29 anos, podemos realizar a seguinte conta: o escravizado chegava aqui
com 30 anos de idade e trabalhava durante mais quarenta anos. Estaria apto a se libertar,
portanto, somente aos setenta anos. Que força de trabalho e expectativa de vida lhe restava?

A expectativa de vida entre os trabalhadores escravizados era muito baixa, de modo que a
Lei do Sexagenário, de 1885, que se apresentou na época com o propósito de “beneficiar”
os/as escravizados/as com mais de 60 anos, não representou nada menos do que o

13 Disponível em:
<https://www.google.com/search?tbm=isch&sa=1&ei=dUbPXNPeC5GG0AaB8K2oCA&q=velhos++negros+e+pobre
za&oq=velhos++negros+e+pobreza&gs_l=img.12...30707.32409>.
20
abandono e o desamparo das pessoas mais velhas e doentes, configurando-se como mais
um dos exemplos de crueldade e violência dos brancos abolicionistas.

Pouquíssimos trabalhadores escravizados conseguiam alcançar os sessenta anos de idade


ou ir além. A lei era tão perversa que determinava que o próprio escravizado deveria pagar
pela sua liberdade, indenizando seu senhor. “A indenização deveria ser paga pelo liberto,
sendo, portanto, obrigado a prestar serviços ao seu ex-senhor por mais três anos ou até
completar 65 anos de idade.”

Desalojados, sem moradia e sem trabalho com a aprovação da Lei do Sexagenário, os


escravizados eram obrigados a trabalhar e permanecer por mais cinco anos em suas
províncias de origem. Nas ruas, esses trabalhadores eram frequentemente considerados
vadios e poderiam ser presos e condenados a exercer o trabalho forçado. Velhos e sem as
mínimas condições de cidadania, sem acesso a moradia, saúde ou qualquer outro direito,
parte significativa das pessoas “beneficiadas” pela lei tornou-se uma primeira população de
velhos em situação de rua do Brasil.

Para Saber Mais


Conheça a íntegra da
lei

Disponível em:
<http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Docum

21
entos-Hist%C3%B3ricos-Brasileiros/lei-dos-
sexagenarios.html>.

22
Lei Áurea e a fraude da abolição da escravatura

Imagem 314

Promulgada no dia 13 de maio de 1888, a Lei Áurea, assinada pela Princesa Isabel, “libertou”
cerca de setecentos mil trabalhadores que ainda viviam em situação de escravidão no país.
Registros históricos apontam que na época muitos escravizados já se encontravam
aquilombados, uma vez que nos anos que antecederam a assinatura da Lei Áurea inúmeras
ações de resistência ao sistema escravocrata implementaram rotas de fuga para as
comunidades quilombolas.

Em 1884, uma aguda crise na lavoura, agravada por reflexos da seca de 1877, resultou em
uma forte pressão popular para a libertação dos escravizados no Ceará, ecoando em outras
províncias, como Rio Grande do Sul, Amazonas, Goiás, Pará, Rio Grande do Norte, Piauí e
Paraná. Esse é apenas um exemplo das muitas ações de libertação dos trabalhadores

14 Foto disponível em: <https://www.google.com/search?biw=1440&bih=757&tbm=isch&sa=1&ei=UkzPXKzlLp-


85OUP_e-
MqA8&q=negros+e+pobreza+no+Brasil&oq=negros+e+pobreza+no+Brasil&gs_l=img.12...71075.73497..75586...0.0
..0.149.1362.0j10......1....1..gws-wiz-img.4cZ6i-kovq4#imgrc=kPUQdY2yKCEkEM>.
23
escravizados como uma possibilidade real antes da assinatura da Lei Áurea. Ademais, o
sistema escravocrata já perdera a legitimidade de outrora e as fugas em massa eram
frequentes.

Analisando o período e as turbulências da chamada abolição, o sociólogo Florestan


Fernandes (2008)15 descreve:

A desagregação do regime escravocrata e senhorial se operou, no Brasil, sem


que se cercasse a destituição dos antigos agentes de trabalho escravo de
assistência e garantias que os protegessem na transição para o sistema de
trabalho livre. Os senhores foram eximidos da responsabilidade pela
manutenção e segurança dos libertos, sem que o Estado, a Igreja ou qualquer
outra instituição assumisse encargos especiais, que tivessem por objeto
prepará-los para o novo regime de organização da vida e do trabalho. (...).
Essas facetas da situação (...) imprimiram à Abolição o caráter de uma
espoliação extrema e cruel. (FERNANDES, 2008)

Após a Lei Áurea, o destino dos/as trabalhadores/as escravizados/as gerou diferentes


situações. Muitos foram para os centros das cidades, onde era possível ocupar-se como
engraxate, barbeiro, quitandeiro; alguns viraram peões de gado ou cuidadores nas fazendas
de café. São Paulo, Salvador e Rio de Janeiro foram as cidades que mais receberam os ex-
escravizados, por apresentarem oportunidades e oferta de trabalho. No entanto, os serviços
eram ocasionais e com ínfima remuneração, dada inclusive a abundante oferta de mão de
obra. Ademais, o fluxo de imigração europeia, iniciado pelos portugueses em 1500 e
intensificado a partir de 1808, com a vinda da família real, diversificou-se durante o século
XIX com a chegada de espanhóis, italianos e alemães, expandiu-se pelos principais centros
urbanos, principalmente na cidade de São Paulo, onde europeus e seus descendentes

15 FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. São Paulo: Globo, 2008.
24
passaram a ocupar os empregos fixos. Aos ex-escravizados restavam os trabalhos pesados e
sem o menor prestígio. Nas cidades onde a imigração europeia foi menos intensa, os libertos
tiveram um pouco mais de oportunidades de trabalho. O fato é que a Lei Áurea ampliou as
desigualdades sociais e raciais no Brasil, sendo coroada como a lei da falsa abolição.

A assinatura da Lei Áurea, que supostamente apontava para acabar com o trabalho escravo
no Brasil, não passou de mais uma fraude, pois, como afirmou o poeta Paulo Molina: “13 de
maio... A princesa esqueceu de assinar nossa Carteira de Trabalho”. Elevou-se o número de
trabalhadores desempregados e desalojados, sem trabalho, sem moradia. Mais uma vez as
ruas das grandes cidades foram o amparo dessas pessoas que passaram a lutar por
sobrevivência e dignidade.

Se até então todo e qualquer trabalho no Brasil era exercido pelos trabalhadores
escravizados, a partir do dia 13 de maio de 1888 esses mesmos trabalhadores passaram a
ser considerados incapazes e indolentes pelos descendentes dos colonizadores e detentores
das posições de comando do país. Essa política racista não indenizou os trabalhadores
negros, tampouco lhes permitiu o direito à posse da terra e ao trabalho. O acesso à terra,
que lhes permitiria formar algum patrimônio e reconstituírem suas famílias, continuou a lhes
ser negado, consolidando o cenário de exclusão e discriminação que se perpetua nos dias
atuais.

1.3 – Contextualização e histórico contemporâneo de pessoas em situação de


rua

25
Imagem 4 - Moradores em situação de rua na região da Sete Portas, próximo à antiga Rodoviária. Foto:
Evandro Veiga/ Correio.16

O sistema de escravidão e desamparo guiou todas as leis chamadas de abolicionistas no


Brasil e são essas leis, realizadas pela elite branca e racista, que deram origem à população
em situação de rua no Brasil. Nesse sentido, apontamos a falta do acesso à terra e à moradia
como principal consequência da falta de direitos e de cidadania, fatores determinantes para
que mais de cem mil pessoas — quase noventa por cento delas negras — estejam nos dias
atuais na condição de população em situação de rua.

Entender o contexto histórico das pessoas em situação de rua nos ajuda a compreender as
diferentes razões e realidades que levaram homens, mulheres, jovens e crianças a romperem
com suas famílias — são exceção as famílias que podemos encontrar vivendo nos espaços
da rua como meio de sobrevivência e moradia — e com a sociedade formal para se

16 Foto disponível em:


<https://www.google.com/search?q=negros+em+situa%C3%A7%C3%A3o+de+rua&source=lnms&tbm=isch&sa=
X&ved=0ahUKEwj5pNavpIXiAhVnHbkGHZSDCPwQ_AUIDygC&biw=1440&bih=757#imgrc=am5rYXfofIoLbM >.
26
abrigarem nas ruas. Observa-se que a escassa bibliografia existente acerca da população em
situação de rua aponta que a maioria dessas pessoas está nessas condições devido a alguma
adversidade em suas vidas. Situações de violência, perda de emprego, uso de drogas e
alcoolismo são os principais motivos de ruptura dos laços afetivos e sociais.

De maneira geral, são das mais precárias as condições de vida das pessoas em situação de
rua, a maioria delas destituídas de documentação de identificação e vivendo em locais
degradados, sob viadutos, pontes e marquises, em edificações ou terrenos abandonados,
sucatas de automóveis e calçadas, entre outros. A condição de pobreza acarreta, em geral, a
falta de perspectivas e esperança dessas pessoas, que se tornam constantemente vulneráveis
à violência física e mental.

As mulheres que vivem em situação de rua são ainda mais vulneráveis e suas condições de
vida mais precárias, inclusive pelo contexto de preconceitos machistas e misóginos onde a
violência e a desigualdade de gênero e de direitos se tornam ainda mais visíveis (ROSA e
BRETAS, 2015)17. Sem falar que também são as mulheres que mais sofrem com a falta de
saneamento e higiene, como a inexistência de banheiros públicos limpos e confortáveis.

Contemporaneamente, as pessoas em situação de rua são caracterizadas como resultado de


um fenômeno crescente nas áreas urbanas do todo o mundo. Elas vivem em condição de
miséria, o que implica precárias condições de alimentação e mobilidade. Ademais, sofrem a
estigmatização de uma sociedade desigual e preconceituosa.

Portanto, para tratar desse fenômeno, é necessário construir uma pedagogia própria a
respeito das especificidades referentes às populações em situação de rua. Construir

17 ROSA, Anderson da Silva Rosa; BRÊTAS, Ana Cristina Passarella. Violence in the lives of homeless women in the
city of São Paulo, Brazil. Botucatu: Interface – Comunicação, saúde, educação, 2015.
27
mudanças de organização social no Brasil enquanto luta de reconstrução de cidadania e
coletividade, laços esses destruídos pela escravidão.

No contexto contemporâneo, o olhar para as pessoas em situação de rua obriga-nos a


atentar para as perdas de direitos e a falta de inclusão social por parte do Estado. Essas
pessoas são alvo constante das injustiças sociais.

28
SEÇÃO 2 | BASE LEGAL DE APOIO À POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA

2. 1 – Leis de amparo à população em situação de rua no Brasil

2. 2 – Movimentos sociais e direitos da população em situação de rua

Imagem 518

18 Foto disponível em:


< https://www.almapreta.com/images/2018/05/popruaagenciabrasil.jpg>.
29
30
Introdução
A constituição de uma política para inclusão social da população em situação de rua é
determinante para se construir uma base legal de apoio a essas pessoas, de modo que tanto
o poder público como a sociedade civil organizada possam imprimir ações efetivas de
resgate social dessas pessoas, ao mesmo tempo que devem agir no sentido de prevenir que
mais pessoas cheguem a situações de desamparo.

Para o enfrentamento de violências incluindo pessoas em situação de rua, foram criados


alguns serviços de atendimento:

Disque 100 – Disque Direitos Humanos: serviço utilizado para permitir que o
cidadão e a cidadã denunciem atos de violência.

Disque 136 – Disque Saúde: serviço de atendimento aos cidadãos e cidadãs que
utilizam o SUS. É um serviço de comunicação direta do usuário à Ouvidoria do SUS,
parte do Departamento de Ouvidoria-Geral do SUS (DOGES)/Ministério da Saúde
(MS).

Disque 180 – Central de Atendimento à Mulher: serviço ofertado pela Secretaria de


Políticas para as Mulheres (SPM) com o objetivo de receber denúncias ou relatos de
violência, reclamações sobre os serviços da rede e de orientar as mulheres sobre
seus direitos e sobre a legislação vigente, encaminhando as para os serviços quando
necessário.

2.1 - Leis de amparo à população em situação de rua no Brasil


Em outubro de 2008, o Governo Federal apresentou à sociedade civil um documento com
as políticas para inclusão social da população em situação de rua. Participaram da elaboração

31
do documento o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), o
Ministério das Cidades (MC), o Ministério da Educação (MEC), o Ministério da Cultura (MinC),
o Ministério da Saúde (MS), o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), o Ministério da
Justiça (MJ), a Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH) e a Defensoria Pública da
União (DPU), representando o Governo Federal, e também representantes do Movimento
Nacional de População de Rua (MNPR), Pastoral do Povo da Rua (PPR) e Colegiado Nacional
dos Gestores Municipais da Assistência Social (Congemas), representando a sociedade civil
organizada.

É importante ressaltar que esse documento foi uma ação após a realização da pesquisa
Caracterização da População em Situação de Rua, resultado da primeira Pesquisa Nacional
Censitária e por Amostragem da População em Situação de Rua, que ocorreu em 2007,
coordenada pelo MDS. Essa pesquisa aponta ser imprescindível apresentar as ações dos
diversos órgãos governamentais. Entretanto, entendemos que, apesar dessas ações, é
preciso também ressaltar a omissão e repressão que os moradores em situação de rua vêm
sofrendo com a atual política de governança.

Constitucionalmente, essas pessoas são consideradas cidadãs integrais, devendo, por direito,
ser contempladas com políticas públicas interdisciplinares e integrais, como descrito nas leis.
O amparo às múltiplas e diferentes pessoas que se encontram em situação de rua vem sendo
consolidado em função das ações dos movimentos sociais da sociedade civil organizada.

A Constituição Federal estabelece, no art. 5º, que “Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade”, como também determina, no art. 6º, que “são direitos sociais a educação, a
saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à
maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.
32
No que se refere aos direitos de crianças e adolescentes em situação de rua, observa-se que
a Constituição Federal estabelece que a família, a sociedade e o Estado são responsáveis pela
formação e estruturação dos seres humanos conforme dispõe o artigo 227:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao
adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade,
ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de
colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão.

Portanto, é a Constituição que possibilita ao Estado, por meio da promoção de programas


de assistência integral à saúde de crianças, adolescentes e jovens, mediante políticas
específicas, atender inclusive as pessoas em situação de rua correspondentes a essa faixa
etária. Nesse sentido, a primeira lei de amparo à população em situação de rua no Brasil, seja
de que faixa etária for, é a Constituição Federal, que deveria ser seriamente cumprida pelos
governantes, independentemente de suas crenças e convicções ideológicas. São necessárias
e urgentes as ações municipais, estaduais e federais capazes de uma atuação interdisciplinar
e intersetorial para a população em situação de rua, entendendo que, para isso, é também
urgente se debruçar sobre as leis que já existem, fazendo cumprir o que foi estabelecido.

Estatuto do Idoso
A Lei n° 10.741, de 1º de outubro de 2003, constitui-se como Lei Orgânica do Estado
Brasileiro, no sentido de assegurar e regulamentar direitos às pessoas com idade igual ou
superior a sessenta anos, asseverando assim, proteção jurídica para gozar dos direitos
adquiridos.

33
O estatuto tem 118 artigos que pormenorizam as garantias prioritárias das pessoas idosas,
direitos que vão desde aspectos relacionados a precedências até o direitos à liberdade e à
vida. O estatuto especifica, ainda, as funções das entidades governamentais e civis de
atendimento a essas pessoas, abordando saúde, educação, trabalho, cultura,
profissionalização, previdência social, habitação, esporte, lazer etc. e delimitando garantias
públicas e privadas, além de ações que podem responsabilizar o Estado e a sociedade por
crimes contra a pessoa idosa. Alguma dessas ações são:
a) Nas aposentadorias, reajuste dos benefícios na mesma data do reajuste do
salário mínimo, porém com percentual definido em regulamento; a idade
para requerer o salário mínimo estipulado pela Lei Orgânica da Assistência
Social – LOAS cai de sessenta e sete para sessenta e cinco anos;

b) Assegura desconto de, pelo menos, cinquenta por cento nas atividades
culturais, de lazer e esportivas, além da gratuidade nos transportes coletivos
públicos;

c) No caso do transporte coletivo intermunicipal e interestadual, ficam


reservadas duas vagas gratuitas por veículo para idosos com renda igual ou
inferior a dois salários mínimos, e desconto de cinquenta por cento para os
idosos da classe de renda que excedam essa reserva;

d) Prioridade na tramitação dos processos e procedimentos dos atos e


diligência judiciais nos quais pessoas acima de sessenta anos figuram como
intervenientes;

e) Os meios de comunicação também deverão manter espaços ou horários


especiais voltados para o público idoso, com finalidade educativa,
informativa, artística e cultural sobre o envelhecimento;

34
f) Os currículos mínimos dos diversos níveis de ensino formal deverão prever
conteúdos voltados ao processo de envelhecimento, a fim de contribuir para
a eliminação do preconceito, sendo que o poder público deverá apoiar a
criação de universidade aberta para pessoas idosas e incentivar a publicação
de livros e periódicos em padrão editorial que facilite a leitura;

g) Quanto aos planos de saúde, a lei veda a discriminação do idoso com a


cobrança de valores diferenciados em razão da idade, determinando ainda ao
poder público o fornecimento gratuito de medicamentos, assim como
prótese e outros recursos relativamente ao tratamento, habilitação ou
reabilitação;

h) O idoso terá prioridade para a compra de moradia nos programas


habitacionais, mediante a reserva de três por cento das unidades, sendo
prevista, ainda, a implantação de equipamentos urbanos e comunitários
voltados para essa faixa etária.

O Estatuto do Idoso se constitui, portanto, como um documento de proteção jurídica às


pessoas com sessenta anos de idade ou mais. No entanto, é urgente e necessário que o
Estado, bem como seus entes federados em conjunto com a sociedade e seus órgãos
representativos, assegurem os devidos direitos conforme prevê a lei. Ademais, é urgente que
esses direitos cheguem às pessoas com mais de sessenta anos que se encontram em situação
de rua no Brasil.

Estatuto da Criança e do Adolescente


Instituído pela Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente
– ECA, criado a partir da promulgação da Constituição de 1988, dispõe sobre a proteção
integral à criança e ao adolescente.
35
O ECA nasceu das reivindicações dos movimentos sociais que buscam garantir e reconhecer
crianças e adolescentes como sujeitos de direitos que devem, portanto, ser protegidos pela
lei. Desse modo, o Estatuto da Criança e do Adolescente possibilita a essas pessoas os
direitos fundamentais a vida, saúde, liberdade, respeito, dignidade, convivência familiar e
comunitária, educação, cultura, esporte, lazer, profissionalização e proteção no trabalho. O
ECA se configura como uma lei destinada a garantir o desenvolvimento psicológico, físico,
moral e social desse grupo. Para que, de fato, isso ocorra, estruturou-se o estatuto em dois
princípios fundamentais:

✓ Princípio do interesse do menor: todas as decisões que dizem respeito ao menor


devem levar em conta seu interesse superior. Ao Estado, cabe garantir que a criança
ou o adolescente tenham os cuidados adequados quando pais ou responsáveis não
são capazes de realizá-los;
✓ Princípio da prioridade absoluta: contido na norma constitucional (artigo 227),
estabelece que os direitos das crianças e dos adolescentes devem ser tutelados com
absoluta prioridade.

Com o ECA, o Brasil se compromete a eliminar o trabalho infantil até o de 2020, conforme
proposta da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Ademais, o ECA se configura como
um importante guia para garantir dignidade, cidadania, vida, liberdade, educação e saúde a
todas as crianças e adolescentes, respeitando integralmente os seus direitos.

Política Nacional para Promoção da Igualdade Racial


A criação de Política Nacional para Promoção da Igualdade Racial nasceu das reivindicações
dos movimentos sociais, em especial dos movimentos sociais negros, no sentido de pautar

36
a temática das desigualdades raciais e definir ações de longo, médio e curto prazos, em todas
as esferas do governo e da sociedade civil, para o estabelecimento de direitos.

Desde a década de 1970, para destacar apenas a luta mais contemporânea, o marco na
história das conquistas dos negros brasileiros foi a Marcha Zumbi dos Palmares contra o
Racismo, pela Cidadania e a Vida, ocorrida em Brasília em 1995. Muito embora os anos de
1970 e 1980 tenham sido cruciais nas ações e histórias recentes do movimento social negro
brasileiro, na Marcha Zumbi constituiu-se o primeiro documento produzido pelo movimento
que apresentava a necessidade de implementar políticas públicas de promoção da igualdade
racial em todas as esferas.

Os avanços na Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial na área governamental


foram impulsionados, também, pelo aparato internacional de combate ao racismo e de
promoção da igualdade racial. Acrescenta-se, ainda, a forma como o Brasil tem interagido
com essas ações de proteção dos direitos humanos a partir da Convenção Internacional
sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (CERD), que já em 1965
denominava os direitos e ações de combate ao racismo e à discriminação racial. Nesse
movimento internacional, destacamos as conferências internacionais, considerando a
Declaração de Durban um marco para a criação da Política Nacional de Promoção da
Igualdade Racial.

A criação, em 23 de maio de 2003, da Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da


Igualdade Racial (SEPPIR), sistematizou a atuação do Estado com o objetivo de realizar
políticas públicas nesse setor. O trabalho realizado pela SEPPIR trouxe expectativas de
mudanças para a população em situação de rua, pois um dos objetivos era o de assegurar a
extensão das políticas públicas às áreas sociais.

37
À Lei nº 10.678, de criação da SEPPIR, seguiram-se os decretos nº 4.885 e nº 4.886, ambos
de 20 de novembro de 2003, que dispunham, respectivamente, sobre a composição,
estruturação, competências e funcionamento do Conselho Nacional de Políticas de
Igualdade Racial (CNPIR) e sobre a Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial
(PNPIR), de modo que a criação da SEPPIR na estrutura do governo federal tem — ou, pelo
menos, teve — como propósito a formulação, a coordenação, o acompanhamento, a
avaliação e a execução de políticas para a promoção da igualdade racial.

Antes da SEPPIR, a Lei nº 10.639, de 2003 alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB), com o propósito de incluir no currículo oficial da rede de ensino a
obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-Brasileira, estabelecendo diretrizes e
bases para a educação nacional.

Um dos últimos atos de caráter revisionista do governo Temer foi revogar a Lei nº 10.63919,
de 2003, a fim de retirar a pauta antirracista das instituições de ensino. No entanto, é
importante conhecer as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações
Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Isso é
necessário para que se possa entender o “perigo” do ensino da cultura negra nas escolas,
em que a população negra era, porventura, tratada como uma população de escravos e
pessoas sem história.

19 Conheça o texto integral da Lei nº 10.639/2003. Disponível em:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.639.htm>.

38
Para Saber Mais
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das
Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e
Cultura Afro-Brasileira e Africana
Disponível em:
<http://www.acaoeducativa.org.br/fdh/wp-
content/uploads/2012/10/DCN-s-Educacao-das-
Relacoes-Etnico-Raciais.pdf>.

Outras importantes ações de promoção da igualdade racial foram os decretos nº 6.872, de


4 de junho de 2009, que aprovou o Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial
(PLANAPIR), e o de nº 8.136, de 5 de novembro de 2013, que regulamenta o Sistema Nacional
de Promoção da Igualdade Racial (SINAPIR), coroado com a aprovação do Estatuto da
Igualdade Racial (EIR), instituído pela Lei nº 12.288, de 20 de julho de 2010. Esse é o
documento embrionário da construção de oportunidades para criminalização do racismo, da
construção das ações afirmativas, das articulações da temática de raça e gênero e da
promoção da igualdade racial como construção de justiça e cidadania para pelo menos 54%
da população brasileira.

39
Para Saber Mais
Leia e conheça o Estatuto da Igualdade Racial.
Disponível em:
<https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/
496308/000898128.pdf?sequence=1>.

40
Políticas para as mulheres
“A taxa de homicídio de mulheres negras é o dobro da taxa das mulheres brancas,
isto na média nacional, pois existem estados onde a desigualdade racial é maior.
Além da questão da mulher indígena, que muitas vezes é ignorada na elaboração
destes índices, com justificativa no baixo volume das mortes desta população.
Quando calculamos a proporção dessas mortes para mulheres indígenas,
observamos que o índice vem aumentando, aproximando-se do das mulheres
negras, demonstrando que ser vítima de homicídios tem relação com as
desigualdades étnico-raciais.”
Jackeline Aparecida Ferreira Romio

Drª em Demografia pelo Instituto de Filosofia e Ciência Humanas da Universidade Estadual de


Campinas (IFCH/Unicamp).

A realização da I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres (CNPM) em julho de


2004 constituiu um marco na afirmação dos direitos para as mulheres brasileiras, dando
origem ao Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM). A partir dos princípios de
igualdade e respeito à diversidade, equidade, autonomia das mulheres, laicidade do Estado,
universalidade das políticas, justiça social, transparência dos atos públicos, participação e
controle social, o Estado brasileiro afirma seu compromisso com o enfrentamento integrado
do racismo, do sexismo e da lesbofobia, protegendo, assim, os direitos humanos de todas
as mulheres e meninas brasileiras.

A necessidade de se pensar políticas públicas para as mulheres, em especial para as mulheres


em situação de rua, passa por entender que a condição de rua dificulta o acesso aos serviços
de saúde, bem como à prevenção e ao tratamento das doenças, além de afastar a mulher do

41
convívio social, acarretando a piora dos agravos de saúde. Desse modo, as políticas públicas
de saúde para as mulheres em situação de rua são uma forma de justiça social e
universalização de políticas públicas, no sentido de garantir o acesso aos direitos sociais para
todas as mulheres. Dada a precariedade dessas políticas, a falta de saúde e o agravamento
de doenças implicam alto índice de mortalidade dessas mulheres.

Para Saber Mais


Leia na íntegra o Plano Nacional de Políticas para as
Mulheres (PNPM).
Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/planonacional
_politicamulheres.pdf>.
Escreva um texto, de cinco a dez linhas, a respeito de
como as suas principais ações favorecem ou podem
favorecer a qualidade de vida de mulheres em situação
de rua.

Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e


Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária
É importante conhecer, também, o Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do
Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária, construído a partir
das ações do movimento social em conjunto com o Governo Federal. Esse plano nacional foi
estabelecido a fim de formular e implementar políticas públicas que assegurassem os direitos
de crianças e adolescentes em conjunto com todos os entes federados.

42
Movimentos sociais e implementação de direitos
Historicamente, o Estado brasileiro convive com as pressões dos movimentos organizados e
dessas pressões nasce a implementação de direitos. O sociólogo Sales Augusto dos Santos,
ao abordar o surgimento de instituições governamentais e as pressões dos movimentos
negros organizados, descreve:

43
Para muitos cientistas sociais brasileiros, as atuais reivindicações dos
movimentos sociais negros por políticas de promoção da igualdade racial em
todas as esferas da nossa sociedade, especialmente na educação e no
mercado de trabalho, nasceram num vácuo político-social, ou seja, de forma
espontânea. Mas a apresentação de propostas de políticas de promoção da
igualdade racial pelos movimentos negros e o rompimento com o discurso
do mito da democracia racial pelos dois últimos presidentes, FHC e Luiz Inácio
Lula da Silva, são resultados de pressões internas contra as supostas relações
harmoniosas entre os nossos grupos étnico-raciais. (SANTOS, 2010)20

Desse modo, os movimentos sociais têm sido responsáveis pela implementação de direitos.
No marco das ações específicas referentes aos direitos conquistados pela população em
situação de rua, podemos demarcar a promulgação da Constituição Federal como o primeiro
grande passo de conquista de cidadania. Entende-se, assim, que somente um governo
legitimamente democrático é capaz de promover e implementar valores que promovam a
igualdade de direitos.

✓ 1988 – Promulgação da Constituição Federal.

✓ 2001 – Acontece a primeira Marcha do Povo da Rua.

✓ 2004 – PNAS, que assegura cobertura à população em situação de


rua.

20 SANTOS, Sales Augusto. Políticas públicas de promoção da igualdade racial: questão racial, mercado de trabalho e
justiça trabalhista. Rev. TST, Brasília, vol. 76, no 3, jul/set 2010. Disponível em:
<https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/20.500.12178/18076/003_santos.pdf?sequence=4&isAllowed=y>.
Acesso em 30 de abril de 2019.
44
✓ 2004 - Ocorre a aprovação da Política Nacional de Assistência Social
(Resolução CNAS nº 145, de 15 de outubro de 2004), que estende a
proteção social a pessoas em situação de rua.

✓ 2004 – O então Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à


Fome Nacional (MDS), criado pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
estabelece convênio de cooperação técnico-científica e financeira
com o objetivo de fortalecer a organização não governamental
Movimento Nacional da População de Rua (SDH, 2013) e possibilitar
a capacitação profissional de pessoas nessa condição.

✓ 2005 – Realização do I Encontro Nacional de População em Situação


de Rua, que propicia o início da formulação da política nacional para
a população em situação de rua, além de subsídios para o texto que
altera a Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS e inclui
atendimento especializado para a população em situação de rua.

✓ 2005 – Criação da Lei nº 11.258, de 30 de dezembro de 2005, que


altera o parágrafo único do art. 23 da Lei nº 8.742, de 7 de dezembro
de 1993 - LOAS: “Na organização dos serviços da Assistência Social
serão criados programas de amparo: II - às pessoas que vivem em
situação de rua. “Estabelece a obrigatoriedade de criação de
programas direcionados à população em situação de rua, no âmbito
da organização dos serviços de assistência social, numa perspectiva
de ação intersetorial”.

✓ 2005 – Aprovação do decreto de 25 de outubro de 2006, que


constitui o Grupo de Trabalho Interministerial - GTI, com a finalidade
de elaborar estudos e apresentar propostas de políticas públicas para
a inclusão social da população em situação de rua.

45
✓ 2007/2008 – Pesquisa Nacional da População em Situação de Rua.
Portaria MDS nº 381, de 12 de dezembro de 2006: cofinanciamento
de serviços continuados de acolhimento institucional para a
população em situação de rua, em municípios com mais de 250 mil
habitantes, e normativas sobre a atenção à população em situação
de rua.

✓ 2009 – Realização do II Encontro Nacional sobre População em


Situação de Rua. Resolução CNAS nº 109, de 11 de novembro, de
2009 – Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais; Decreto n
º 7.053, de 23 de dezembro de 2009: instituiu a Política Nacional para
a População em Situação de Rua e o seu Comitê Intersetorial de
Acompanhamento e Monitoramento;

✓ 2010 – Instrução operacional conjunta — SNAS e SENARC nº 7, 22 de


novembro de 2010 — que reúne orientações aos municípios e ao
Distrito Federal para a inclusão de pessoas em situação de rua no
Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.

✓ Portaria nº 843, de 28 de dezembro de 2010: dispõe sobre o


cofinanciamento federal dos serviços socioassistenciais ofertados
pelos CREAS e pelos Centros Pop, além de outras providências.

✓ Portaria 139/2012: dispõe sobre parâmetros para o cofinanciamento


federal para oferta de serviços socioassistenciais pelo Centro POP;

✓ 2013 – É criado o Movimento Nacional da População de Rua (MNPR).


A entidade é criada com apoio do Movimento Nacional dos
Catadores de Materiais Recicláveis. O MNPR tem por objetivo cobrar
dos órgãos competentes as políticas públicas de implementação e
direitos das pessoas em situação de rua.

46
Embora, tradicionalmente, as ações governamentais se configurassem como ações que
variam da omissão à repressão, passando por episódios de caridade, a sequência de
acontecimentos no período acima considerado, desde a promulgação da Constituição de
1988, contribuiu para potencializar as políticas de inclusão das populações em situação de
rua.

47
BIBLIOGRAFIA

ABREU, W.; ASSIS, M. Revisão sistemática sobre o conceito de acesso nos serviços de
saúde: contribuições do planejamento. Ciênc. Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 15, n. 1,
pp. 161-170, jan. 2010.

BARRETO, Katia M.; NASCIMENTO, Ana G.; PEREIRA, Vinícius O. de M.; SANTOS, Lia M. Estado
e políticas de equidade em saúde: democracia participativa? Saúde Debate. Rio de
Janeiro, v. 40, n. especial, pp. 49-62, dezembro de 2016.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: 1988.

BRASIL, Presidência da República. Política Nacional para População em Situação de Rua.


Decreto 7.053 de 23 de dezembro de 2009.

______. Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial (2009). Também instituiu o


comitê de articulação e monitoramento dessas políticas públicas.

______. Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (desde 2006, oferece
atenção especial às doenças prevalecentes nos negros).

______. Política Nacional para Inclusão Social da População em Situação de Rua. Brasília,
2008.

______. Lei nº 12.288, de 20 de julho de 2010. Estatuto da Igualdade Racial.

______. Resolução nº 453 de 10 de Maio de 2012a. Aprova diretrizes para instituição,


reformulação, reestruturação e funcionamento dos Conselhos de Saúde. Diário Oficial
da União, Brasília, DF, Seção 1, 11 maio 2012.

48
______. Ministério da Saúde. Portaria n° 3.305 de 24 de dezembro de 2009b. Institui o Comitê
Técnico de Saúde para a População em Situação de Rua. Diário Oficial da União, Brasília,
DF, Seção 1, 25 dez. 2009.

______. Ministério da Saúde. Portaria n° 122, de 25 de janeiro de 2011b. Define as diretrizes


de organização e funcionamento das Equipes de Consultório na Rua. Diário Oficial da
União, Brasília, DF, Seção 1, 26 jan. 2011.

______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção à


Saúde. Manual sobre o cuidado à Saúde junto a População em Situação de Rua. Brasília,
2012c.

______. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria Nacional de


Renda e Cidadania e Secretaria Nacional de Assistência Social. Orientações técnicas: Centro
de Referência Especializado para População em Situação de Rua – Centro Pop. Brasília,
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