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“Among the Shadows”

*PREFÁCIO*

“Eu conseguia sentir


sentir seus lábios em meu pescoço
conseguia sentir sua ânsia por mim
seu desejo mais profundo pela minha carne
sua sede cada vez mais insuportável….cada vez mais agoniante
e eu lhe tocava, tocava seu rosto bem esculpido
tocava em seus braços tão firmes
tocava e arranhava seu abdômen enquanto ela me devorava
enquanto ela acabava comigo mais um pouco
me fazendo suar
me fazendo enlouquecer”

- mas que porra?! - levantei subitamente e me alertei que de novo por mais uma noite
eu tinha sonhado com aqueles olhos, com seus olhos tão complicados… e de novo
eu tinha sonhado como se visse o que ela via, eu sonhei que estava com ela de
novo, sonhei que estava por cima dela mas eu via tudo com os seus.

Fui até o banheiro para minha rotina de higiene pessoal e, ao olhar para o celular na pia,
que eu havia esquecido, verifiquei o horário. Mais uma vez, para minha surpresa, marcava
"05:00 AM".

Aquela mulher continuava a me assombrar. Mesmo sendo a guerreira mais destemida deste
clã, arrepios percorriam minha espinha ao pensar em seus lábios e em seus olhos tão
singulares. Aqueles olhos, um castanho avermelhado e o outro azul como o céu, eram
impossíveis de esquecer.

A calma que ela demonstrou naquele momento ainda me atormentava. Era como se
estivesse resignada à morte, uma súplica silenciosa para que tudo terminasse logo.

Eu jamais esqueceria o momento em que ela retornou àquele local, como se uma força
invisível a puxasse para lá, como se nunca tivesse tocado o solo coberto de folhas mortas.
Ela estava irremediavelmente ligada àquele lugar, e naquele instante, eu não sabia que, ao
invés de devorá-la, eu ansiaria dar tudo a ela.
1.A Torre
Aquele mundo era verdadeiramente distinto. O Conde Drácula reinava como o monarca
supremo, comandando todos os monstros que habitavam aquele reino. As cidades diferiam
consideravelmente das cidades humanas; em vez de pessoas comuns, as ruas eram
percorridas por uma miríade de criaturas, incluindo lobisomens, vampiros, demônios, trolls,
elfos, centauros e muitos outros. Era um mundo peculiar, onde vivíamos em harmonia, cada
ser classificado de acordo com sua força. Os monstros mais fracos eram designados como
pertencentes à classe 'A', enquanto os mais poderosos, como a nobreza, eram
categorizados como 'SS'.
Os clãs de Lycans geralmente eram fechados para lobos da cidade ou lobos comuns que
nascessem fora dos clãs. Vivíamos em linhagens longas, e o Clã da Rosa foi onde nasci.
No entanto, era evidente que eu era diferente dos outros lobisomens que lá residiam, pois
eu era uma híbrida. Quando meu pai assumiu sua posição como alfa, ele estava sujeito a
regras rígidas que proibiam casar-se com qualquer sobrenatural ou uma loba de fora do clã,
a menos que fosse de outros clãs com linhagem forte.

No entanto, quando o Conde Drácula o nomeou como general, o mesmo título que meu
bisavô havia ostentado, meu pai fez um único pedido incomum: casar-se com uma vampira
de Classe "R" — aquelas que não eram nem poderosas demais, nem frágeis. Minha mãe
era filha de um lorde. Eventualmente, Drácula concedeu o desejo de meu pai, e eu e meus
irmãos nascemos.

No início, não foi fácil para minha mãe. Muitos Lycans do nosso clã a desrespeitaram e não
a consideraram uma líder, ao contrário de meu pai. Até mesmo ele enfrentou críticas por
trás das costas, pois ninguém ousaria desafiar a fúria do alfa mais poderoso dali.

Por sermos híbridos, meus irmãos e eu éramos considerados os Lycans mais poderosos de
todos os clãs. Nossa agilidade, força e resistência eram significativamente superiores, e
possuíamos a dádiva da imortalidade. Enquanto os Lycans comuns tinham uma longa vida
que normalmente alcança 100.000 anos, eles ainda envelheciam, chegando a cerca de
56.000 anos. Isso contrastava com os lobos comuns, cuja expectativa de vida variava de 60
a 100 anos.

Quando Drácula percebeu que estava diante de seres tão poderosos e considerando o
pacto de sangue que nosso clã da Rosa mantinha, que estipulava que todo Lycan nascido
ali não poderia matar um Tepes, mas sim servi-lo e protegê-lo, ele insistiu para que meu pai,
Michael, se transformasse em um híbrido. Assim, minha mãe deu a ele seu sangue. Ela era
a única vampira conhecida capaz de transformar um Lycan em lobisomem em todos os
séculos de existência.

Apesar de pertencermos a um clã, todos os Lycans do Clã da Rosa eram obrigados a


frequentar a escola "Royal Shadows", normalmente reservada apenas para a nobreza.
Todos os clãs foram autorizados a enviar seus jovens guardiões para aprender sobre
etiqueta e comportamento perante seus protegidos. O Clã da Rosa tinha a responsabilidade
exclusiva de proteger a família de Drácula, ou seja, os Tepes, enquanto outros clãs serviam
a outros nobres ou eram eles mesmos membros da nobreza.

Neste ano, aos meus 17 anos, eu estaria lá para aprender tudo sobre a nobreza, a qual em
breve eu serviria.

-X-

Outro dia de trabalho, mais um dia em que eu era encarregado de vigiar a maldita torre.
Meu pai atribuía essa tarefa a todos os lycans que concluíam seu treinamento como Night
Guardians. Nós recebíamos nossas patentes e, agora que havíamos recentemente
terminado nosso treinamento, nos encontrávamos fazendo o que outros como nós faziam
há 16 anos: protegendo a grande torre no coração da floresta. Essa torre estava localizada
dentro do campus da Escola.
Por ser a primogênita, juntamente com meu irmão gêmeo, meu pai nos incumbiu da
responsabilidade de liderar os outros guardiões que estariam na fazendo a vigia da torre.
Nossa missão era manter afastados os demais alunos e possíveis intrusos. Meu pai, a
quem preferimos chamar de General quando estávamos fora de casa, nos informou que
dentro da torre havia algo de imenso valor para o Conde Drácula. Era altamente provável
que pudéssemos sentir o forte aroma de uma joia que continha um poder especial, uma
energia capaz de atrair seres sobrenaturais para consumi-la e, assim, fortalecer-se.
Conforme ensinado pelos meus tenentes, havia poucas dessas joias no mundo, todas elas
protegidas para evitar que seres sobrenaturais se tornassem excessivamente poderosos,
uma vez que a joia, ao ser consumida, incorporava a selvageria de seus poderes e
personalidade.
Desde que iniciei meu serviço, todos os guardiões mantinham suas posições e faziam
rondas diárias, certificando-se de que nenhum aluno curioso se aventurasse na área. No
entanto, durante minha ausência, enquanto eu estava na aula, meu irmão Matthew assumia
o comando dos soldados. Às vezes, ele permitia que eles relaxassem um pouco, já que, ao
longo de 16 anos, aquele lugar nunca tinha enfrentado qualquer tipo de invasão.

"Você soube?" - uma loira baixinha de uniforme branco (os royals) estava conversando com
uma loira alta.

"O quê? Não me diga que aquele idiota realmente foi lá." - a alta disse de repente.

"Dinah, ele disse que iria provar de uma vez por todas que é apenas uma ruína
abandonada." - a baixinha riu, enquanto a mais alta ficou vermelha, claramente irritada.

"Eu odeio aquela maldita torre. Você precisa mandar uma mensagem para o Shawn voltar,
AGORA!" - Quando Dinah disse isso, meu sangue gelou. Senti as mãos suarem e saí
correndo do corredor em direção à floresta. Se tivesse sorte, o garoto ainda não teria
ultrapassado a barreira. Que droga, por que justo na minha vez um desses riquinhos sem
noção decide fazer isso.

-X-
POV Narrador

"Isso aqui é só uma merda, não tem nada aqui", Shawn dizia, aproximando-se do portão da
torre. Ele pulou alto o suficiente para passar para o lado de dentro e se aproximou da
grande porta do lugar, que todos diziam ser amaldiçoada. No entanto, ele parou
abruptamente. De repente, virou-se e tentou voltar a pular o portão para ir embora, mas
algo o impediu. Havia uma barreira ali.

Uma sede avassaladora atingiu Shawn; sua garganta queimava em chamas. Ele começou a
se transformar. Seus cabelos castanhos se tornaram brancos como a neve, seus olhos
adquiriram um tom de vermelho sangue, e suas presas surgiram, tudo isso sem que ele
quisesse. Sua garganta implorava por mais. Seu corpo ardia com o desejo de absorver
aquela energia que pulsava em seu peito. Nunca em milênios algum vampiro havia sentido
algo tão ardente, algo tão infernal.

Ele já beirava a loucura, atravessou a porta e a arremessou em algum lugar dentro da torre.
Subiu as escadas o mais rápido que pôde e, de repente, ouviu o som de seu coração
batendo lentamente. Abriu a porta e se deparou com uma garota de costas, olhando pela
janela. Nesse momento, seu coração deu três batidas tão fortes quanto um ataque
cardíaco, e sua sede se intensificou, deixando-o completamente exaurido. Ele se lançou
sobre a garota, que caiu com ele. Ambos começaram a cair da torre, ele em um frenesi
assassino e ela com um olhar vazio.

Tudo aconteceu tão rapidamente. Foi Lauren quem pulou e segurou a garota em seus
braços, retornando a terra firme com ela. A garota a olhou com um vinco na testa, e Shawn
tentou avançar novamente, mas todos sentiram seus pelos arrepiarem devido à aura que
emanava da garota. Lauren sentiu uma sede, algo que nunca antes havia experimentado.
Pela primeira vez, desejou devorar algo, mas com a garota segura em seus braços, algo a
impedia de fazê-lo.

Os outros Night Guardians formaram uma barreira à frente de Lauren para protegê-la do
que o garoto se tornara: um monstro selvagem.

“Por que está aqui?” - Lauren perguntou à garota, que ainda a encarava. A garota olhou
profundamente nos olhos de Lauren. Ela nunca tinha visto olhos como aqueles, um azul tão
claro em um e um castanho que beirava o vermelho no outro.

"Por quê? Aqui é minha prisão." A garota saiu dos braços de Lauren, e enquanto o garoto
era contido, ela voltou a entrar pela porta daquele lugar. Parecia que ela sabia que seu
destino era permanecer eternamente aprisionada ali. Lauren sentiu suas mãos formigarem,
recordando as palavras de seu pai que enfatizavam que nenhum Night Guardian deveria
entrar naquele local. Além de proteger, a única tarefa deles era deixar as caixas de
mantimentos do lado de dentro e sair para continuar as rondas e ela sempre achou
estranho que eles guardassem comidas ali.

-X-
Acordei mais uma vez com aqueles olhos em minha mente, incapaz de afastar a imagem
daquela garota. Era a sexta noite consecutiva em que sonhava com ela. Meu pai voltaria
para casa hoje e já estaria ciente do que aconteceu. O garoto pertencia a uma grande
família nobre e foi enviado às bruxas para ter suas memórias apagadas. Com certeza, eu
questionaria meu pai sobre os eventos daquele dia e o motivo de ele ter mentido para mim.

Escutei o barulho de carros estacionando ao lado de fora de casa e soube que meu pai
havia chegado. Levantei, fiz minha higiene matinal e verifiquei meu celular. Havia uma
mensagem de uma das minhas melhores amigas.

{Mani: Ei, Jauregui, onde você está? Sumiu e não mandou mais nada LOL - 12:00 AM}

Normani havia me enviado essa mensagem no dia anterior, mas eu estava tão transtornada
com a garota que passei os cinco dias treinando sem parar, desde as “05:00 AM" até a
madrugada.

{Eu: Desculpe, estive treinando - 07:00 AM}

Deixei o celular de lado, tomei um banho e então voltei ao quarto para vestir um top preto,
meu short de compressão e uma jogger. Desci imediatamente, sem tomar café ou falar com
minha família, determinada a esclarecer toda essa situação com meu pai.

Desci as escadas. Meu pai estava na sala de estar, conversando com alguns de seus
associados quando me aproximei.

"Pai, precisamos conversar", disse, com um tom sério em minha voz.

Ele olhou para mim, surpreso com minha determinação. "Claro, Lauren, o que está
acontecendo?"

Assim que nos afastamos do grupo, desabafei. "Poderia me explicar por que mentiu sobre o
que de fato havia naquele lugar?"

Seu semblante mudou de surpresa para decepção. "Lauren, você deveria ter sido uma
comandante mais atenta. Um aluno chegou perto da torre, e isso é inaceitável."

Eu estava disposta a enfrentá-lo. "Pai, você precisa me contar a verdade. Quem é essa
garota? Por que ela está na torre? E por que eu não sabia de nada disso?"

Ele suspirou, parecendo resignado. "Vamos para o escritório."

Caminhamos até o escritório, onde meu pai abriu a porta para mim, e me sentei de frente
para sua mesa.

"Sobre o que tem lá, Lauren, você não precisa se preocupar. Sua única obrigação é manter
os alunos longe dali. O garoto Shawn Mendes Shardel teve sua mente apagada, para ele,
era apenas um lugar vazio, e, portanto, não existem maldições. E assim deve permanecer."
Ele olhou para mim mais uma vez e saiu. Não podia mais ficar sem respostas, não
suportava mais ter aquela garota em minha mente. Olhei pela fresta da porta para ver onde
meu pai estava e o vi saindo com outros tenentes. Meu pai sempre confiara que eu era a
filha mais exemplar e nunca mexeria em seus pertences, mas desde criança eu sabia que
todos os generais mantinham diários sobre as missões que lhes eram atribuídas.

Pressionei a cabeça do lobo que ficava sobre a mesa de meu pai, e atrás dela, onde
ficavam os livros, uma biblioteca cheia de volumes vermelhos se abriu. Peguei o diário de
16 anos atrás.

"Em 03 de março de 2004, o Conde me enviou uma mensagem urgente, solicitando


minha presença no castelo. Quando cheguei lá, ele estava com um bebê nos braços,
seus olhos demonstravam um medo que eu nunca tinha visto antes. Ele entregou a
criança a mim e ordenou que a colocasse na torre do relógio, localizada no campus
da Escola dos Reais. Informou-me que bruxas já haviam estabelecido uma barreira de
proteção ao redor do local.

A criança possuía uma marca incomum no ombro, a marca que aparece quando os
poderes de um sobrenatural são selados. Quando seus olhos se abriram, deparei-me
com aqueles olhos singulares, um azul que lembrava o oceano e o outro castanho
avermelhado. O Conde me disse que eu deveria vigiá-la de perto, juntamente com
uma empregada que a ensinaria a se cuidar sozinha.

O cheiro peculiar da criança não me atingia, mas observei como algumas pessoas na
sala demonstravam desconforto, seus olhos fixos na criança, como se desejassem
atacá-la, mas algo as impedia. Perguntei ao Conde sobre a identidade da criança, e a
única coisa que ele conseguiu murmurar foi: 'Ela é minha', antes de sair da sala, com
todos o seguindo.

Levei a criança para a torre, acompanhada da empregada, e organizei uma ronda


especial que duraria 24 horas. Eu estava perplexo, sem saber o que fazer, e
questionando por que aquela pequena criança estava naquele lugar, em vez de ser
criada no castelo. Cumpri as ordens que me foram dadas."

Terminei de ler e coloquei o livro de volta em seu lugar. Saí rapidamente do escritório, ainda
chocada com a informação que acabara de descobrir. A garota era filha do rei, e sua
verdadeira mãe provavelmente não era a rainha.

Eu precisava saber mais sobre aqueles olhos, mais sobre ela, eu precisava….
2.Azul
O tempo sempre passava de forma estranha nessa cidade. Mesmo ao percorrer longas
distâncias, eu continuava a me deparar com prédios e vielas escuras. Observava ogros
bêbados derrubando caixas nas esquinas, que esperavam para serem removidas. Súcubos
estavam à espreita, mas os olhos daquela menina permaneciam fixos em minha mente. Seu
rosto e delicadas mãos não saíam de meus pensamentos. Algo dentro de meu lobo interior
ansiava por conhecê-la mais profundamente.

“Oh, gata!” ouvi um homem chamar, “DOS OLHOS VERDES.”

Virei-me para trás, o cara sorria de lado junto com os outros. Ele me olhou de cima a baixo
como se visse um bife diante dele. Prendi a respiração para evitar sentir o cheiro podre que
o mesmo exalava; provavelmente, ele estava bebendo desde cedo.

“O que você quer?” Eu sabia que meus olhos totalmente pretos o assustaram o suficiente
para fazê-lo virar e ir embora com os outros.

Continuei pelas ruas, sentindo a vontade de tirar um cigarro do bolso, mas um súbito desejo
me dominou, uma ansiedade insaciável. Meu lobo interior enlouquecia pela bastarda do rei,
quase automaticamente parei e olhei o celular para verificar a distância da escola.

[ The Crown High - 1,4 km]

Novamente, aquele formigamento quase instantâneo me envolveu, mesmo tendo visto a


garota apenas uma vez.

Corri o mais rápido possível, sentindo-me enlouquecida. Cheguei ao campus e fui direto
para a floresta, pulei em uma das árvores próximas e observei alguns guardas fazendo a
ronda no solo. Meu irmão conversava com alguns deles sobre investigar a parte de trás da
torre, pois havia sentido um cheiro estranho. Em sua mente, a garota era uma bruxa que
tinha vindo purificar a ‘joia,’ cuja existência eu nem sabia se era real após sentir o cheiro da
tal ‘bruxa,’ ou melhor, a bastarda de Vlad.

Olhei para cima e percebi que a janela do relógio estava muito alta para que eu pulasse
sem ser notada. Optei por pular em direção ao telhado, achando que seria mais discreto do
que chamar a atenção de todos ao meu redor. Ao descer por uma sacada, cheguei a uma
sala repleta de móveis antigos cobertos por lençóis brancos. O aroma dela impregnava o
ambiente, meu coração palpitava, mas não de maneira ruim. No entanto, senti que
deveria...

DEVORAR.

Sacudi a cabeça para afastar o pensamento que surgiu repentinamente em minha mente.
Continuei subindo as escadas que levam diretamente ao último andar da torre. À medida
que subia, meu coração palpitava ainda mais, ansioso por aqueles olhos fixos em mim,
ansiando ver sua boca perfeita, desejando revê-la.
Ao me aproximar da porta entreaberta, vislumbrei novamente aquela garota. Seus cabelos
estavam espalhados pelo chão enquanto ela lia deitada. Vi seus lábios se movendo, lendo
em voz baixa. Sua roupa era incomum para a época em que vivíamos, usando uma
camisola vitoriana. Seus pés pareciam inquietos, e eu nunca tinha visto um nariz tão
perfeito.

Seus olhos estavam imersos. Senti-me como uma stalker ao observá-la pela fresta, mas
parei para pensar por alguns segundos. Ela não me sentia. Por quê? Sendo filha de
Drácula, deveria ser uma vampira automaticamente, deveria saber da minha presença. No
entanto,eu ouvia seu coração tão vivo e pensava que ela parecia ser a única humana
habitando um mundo de criaturas. Fico intrigada cada vez mais enquanto a observo. De
repente, ela se senta.

“Assim que se olharam, amaram-se; assim que se amaram, suspiraram; assim que
suspiraram, perguntaram-se um ao outro o motivo; assim que descobriram o motivo,
procuraram o remédio.” - ela parou um pouco e tirou os olhos do livro, levantou a cabeça e
encarou o teto - “O que é amor?”

Ela parecia tão genuína ao se perguntar isso. Foi então que notei: seus olhos pareciam
faltar algo. Eram tão lindos, mas ainda sentia a ausência de algo entre eles. Então, ela
baixou a cabeça novamente e voltou a ler. Eu mesma me sentei no chão do lado de fora da
porta, continuando a observá-la. Por sorte, a parte externa de seu quarto ou biblioteca
estava totalmente escura, e ela não conseguiria me ver.

“Irmãzinha, vejo que está lendo os poemas de Shakespeare que lhe dei.” - De repente, uma
voz surge, e ao observar com mais cuidado, vejo Timothee, o filho mais velho de Drácula.

"Merda" - é a única coisa que penso. Timothee é meu futuro trabalho, e eu seria a pessoa
ao lado dele durante tudo o que ele iria fazer. O pior é que ele conhece meu cheiro muito
bem. Dou uma última olhada para a garota, que o olha por alguns segundos, mas volta a
ler. Ele faz um bico como se estivesse chateado por ser ignorado. Estava do mesmo jeito de
sempre, com seus trajes sociais pretos, sobretudo e um mocassim.

“Você ainda não me deu um nome” - ela murmurou, parecendo até mesmo com raiva dele
por isso - “Eu gostaria de um nome, Timothee.”

“Minha querida irmã, eu não sei como fazê-lo. Você sabe muito bem que nem aqui eu
deveria estar. Apenas vim deixar um livro para você... O que acha de eu lhe dar um nome
da próxima vez que vier?” - ele se aproxima dela, acariciando sua cabeça, e ela parece não
entender o significado do carinho, mas permite que ele o faça - “Olhe, eu não posso ficar
muito hoj... Que cheiro é esse?”

Arregalo os olhos e olho para as escadas, depois para a parte desprotegida que me levaria
direto ao chão. Uma pessoa normal desceria as escadas, mas ela não estaria na merda
como eu estou agora. Decido pelo mais fácil e pulo. O vento bate diretamente em meus
cabelos, que logo ficam para cima, até que eu chegue no chão fazendo um alto estrondo.
Olho para o fim das escadas e apenas vejo uma sombra saindo do quarto para avaliar o
que estava acontecendo. Corro para a sacada de onde entrei, deixando-a com o trinco
quebrado, caso um dia eu voltasse, e subo o telhado para pular entre as árvores
novamente. Corro o mais rápido que posso para sair dali logo.

-x-

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