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LIBRAS

Rosimárcia Fernandes
de Souza
Introdução à
pedagogia bilíngue
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Identificar os princípios da pedagogia bilíngue.


 Analisar o papel do professor como mediador da aprendizagem na
perspectiva da diferença cultural.
 Reconhecer a importância da aprendizagem da língua brasileira de
sinais por parte da sociedade.

Introdução
A pedagogia bilíngue atua em processos relacionados ao ensino e
à aprendizagem da linguagem, abordando os aspectos específicos
desse processo pedagógico a partir da didática, da área educacional
e dos mecanismos instrutivos que dialogam concomitantemente em
duas línguas, ou seja, com o processo do bilinguismo no campo da
educação.
O interesse em questões relativas à pedagogia bilíngue é identificado
por meio das inúmeras iniciativas sobre o ensino da língua de sinais no
ensino regular em uma vertente da educação inclusiva. É importante
destacar que a pedagogia bilíngue se baseia em princípios norteadores
que são considerados elementares para a organização de todo o processo
de ensino e aprendizagem do bilinguismo.
Neste capítulo, você vai estudar esses princípios da pedagogia bilín-
gue, analisando a figura do professor como mediador da aprendizagem
na perspectiva da diferença cultural e reconhecendo a importância da
aprendizagem da língua de sinais por parte da sociedade.
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Princípios da pedagogia bilíngue


Para começar o estudo deste capítulo, é importante entender que o conceito de
pedagogia se refere a um conjunto de técnicas, princípios, métodos e estratégias
de educação e de ensino. Partindo dessa defi nição, a pedagogia é uma ciência que
tem por objeto de estudo a educação e seus processos/técnicas mais efi cientes
para aperfeiçoar e estimular competências e habilidades nos indivíduos.
Quanto ao conceito de bilíngue, consideramos que o que propõe diversos
autores citados por Megale (2005, p. 2) que “[...] um indivíduo bilíngue é
alguém que possui competência mínima em uma das quatro habilidades
linguísticas (falar, ouvir, ler e escrever) em uma língua diferente de sua
língua nativa” (MACNARA, 1967 apud HARMERS; BLANC, 2000, p. 6).
Titone (1972 apud HARMES; BLANC, 2000, p. 7) também define
bilinguismo, afirmando que é “a capacidade individual de falar uma
segunda língua obedecendo às estruturas desta língua e não
parafraseando a primeira língua”. Por fim, a definição mais comum é a de
Barker e Prys (1998) e Li Wei (2000), que propõem que bilíngue se refere
a indivíduos que possuem duas línguas.

A pedagogia bilíngue entende que o indivíduo bilíngue é aquele que se comunica em


outra língua, ainda que com pouca profundidade, estabelecendo uma comunicação.

Na junção de ambos os conceitos, podemos entender que a pedagogia


bilíngue diz respeito aos princípios, técnicas, métodos e estratégias utilizados
na educação bilíngue.
No conceito da pedagogia bilíngue que considera a língua de sinais, importa
dizer que sua prática é embasada por princípios teóricos, que são:

 a inclusão, cujo ponto de vista é integrar a cultura surda por meio do


ato educativo;
 o processo identitário, que organiza a dimensão individual para a di-
mensão social;
 relações de poder, nas quais se expressam as dimensões sociais da vida
de um indivíduo.
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Partindo dos princípios destacados, você pode perceber que há uma


lógica, cuja construção ocorre em etapas para a concretização de um pro-
cesso pedagógico que envolve compreensão da ação educativa, destacando
a diferença cultural e fixando o reconhecimento do ensino da língua de
sinais no contexto social.
Para uma melhor compreensão da inserção dos princípios da pedagogia
bilíngue em processos didático-pedagógicos, é necessário fazer uma alusão
reflexiva ao processo de enaltecimento da cultura surda por meio da pedagogia
bilíngue embasada em seus princípios elementares para o multiculuralismo,
em que o avanço só é possível se todas essas etapas forem bem articuladas
com o ato educativo na sociedade e com suas respectivas dinâmicas de pen-
samento teórico para viabilizar uma prática coerente com a promoção da
educação bilíngue.
Alguns autores entendem que a pedagogia bilíngue ou educação bilíngue,
como alguns a chamam, concretiza-se, primeiramente, no espaço educacional,
a fim de que a cultura surda efetivamente seja reconhecida e, logo, valorizada
pela sociedade — considerando a escola como pressuposto imediato à inclusão
no que se refere às diferenças culturais existentes na sociedade.

No ato comunicativo semiótico, a comunicação se materializa no pensamento e no


sentimento em signos conhecidos pelas partes envolvidas, ou seja, símbolos transmi-
tidos pelo emissor e interpretados pelo receptor, na sua língua ou em outra língua.

A língua de sinais inserida nos conteúdos didáticos do ambiente escolar


fundamenta a prática da educação bilíngue, na qual está o princípio da
inclusão. Ou seja, com o ensino de Libras partindo da escola por meio
atividades extraclasse, por exemplo, o aluno do ensino regular poderá
adquirir interesse pelo assunto numa abordagem de interação a partir de
estratégias de ensino.
No princípio do processo identitário, a partir da inclusão, é produzido
um pensamento a respeito da cultura surda em que assuntos relacionados a
essa comunidade podem ser motivo de discussões entre os alunos. Nisso, o
processo identitário da pessoa surda e de sua cultura pode ser mais explorado,
despertando interesse nos aprendizes de uma segunda língua.
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Ainda no princípio do processo identitário, inserem-se temas como carac-


terísticas de comportamento frente à interação dos surdos com os ouvintes ou
entre outros surdos, além de outros assuntos que fazem parte do conjunto das
características pertinentes que definem a realidade dos surdos.
A língua brasileira de sinais é uma expressão do pensamento o surdo brasileiro.
Durante muito tempo, os surdos foram considerados incapazes pelo fato de, entre
outras inúmeras razões, a língua oral ter supremacia nas relações entre as pessoas.
No entanto, esse pensamento presente na sociedade brasileira foi desprezado graças
às diferenças culturais existentes no meio social, dentre as quais temos a cultura
surda com sua especificidade, que têm se apropriado dos atos educativos do ensino
bilíngue em escolas de ensino regular, cursos livres, pastorais e outros segmentos
religiosos cuja ideia inicial é fortalecer a comunicação entre surdos e ouvintes.
Quanto ao princípio das relações de poder, pode-se dizer que a pedagogia
bilíngue tem um viés de socialização, de interação e de integração da pessoa
surda. Nesse cenário, temos a comunicação como fator primordial das relações
que envolvem os surdos, pois a efetivação do ensino de duas línguas numa
proposta de bilinguismo Libras/língua portuguesa e vice-versa leva a um
enriquecimento nas relações sociais, em que fronteiras não terão mais espaço
devido à comunicação entre surdos e ouvintes.
As relações de poder se traduzem como, por exemplo, dependência de
acesso a serviços públicos, informações básicas, ou seja, na dimensão da
vida social, limitando-a ou até mesmo cerceando-a; com o ensino bilíngue,
atinge-se o objetivo da quebra das barreiras da comunicação entre surdos/
ouvintes, trazendo um empoderamento à pessoa surda.
Cabe destacar, ainda, que a pedagogia bilíngue, além de ter a base teórica
pautada em seus próprios princípios, na prática, ocorre por meio de um processo
de aquisição e desenvolvimento da linguagem de acordo com as metodologias
aplicadas na alfabetização tanto para crianças quanto para jovens e adultos.
Assim, seu objeto principal consiste na interação com a língua por meio de
habilidades, como a visuoespacial, a motora e a construtiva.
O ensino bilíngue, assim, tem uma estrutura inicial em que o ponto de partida
é o input linguístico de representações visuais ativadas com estímulos de imagens
dos sinais e seus significados; passa por ativação da habilidade visuoespacial e
da habilidade linguística; e chega à competência bilíngue (comunicação total ou
comunicação semiótica em níveis básico, intermediário e avançado) (Figura 1).
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Figura 1. Etapas do ensino bilíngue.

A definição de indivíduo bilíngue como aquele que se comunica em


outra língua, ainda que com pouca profundidade, mas estabelecendo uma
comunicação, deve-se enfatizar que é simples e que tem apenas o intuito
de destacar o mínimo de comunicação, já que, é preciso lembrar, a escrita
dos surdos não tem a mesma estrutura da língua portuguesa — por exem-
plo, uma transcrição da Libras pra língua escrita poderia criar a seguinte
frase: “Eu ir hoje casa pai”. Nesse caso, há pouca apropriação da estrutura
em si da língua portuguesa, mas há um processo de comunicação sendo
realizado. O mesmo pode acontecer na relação do ouvinte com o surdo,
em que esse tenta gestualmente realizar comunicação a partir de sinais
conhecidos e apontamentos básicos agregados na mensagem a fim de
garantir a comunicação.
Obviamente, quando não se tem domínio da língua (fluência), o tempo da
comunicação aumenta, pois não há objetividade nos termos utilizados, mas
o mesmo ocorre com outras línguas no ato comunicativo.
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Há situações em que, ao se depararem com um surdo e na tentativa de se comunicarem,


alguns ouvintes se utilizam da escrita da língua portuguesa para estabelecer contato.
A tentativa é válida, mas nem sempre tem êxito, pois alguns surdos não conseguem
realizar leituras extensas. Vale lembrar que, quando não há êxito no ato comunicativo
bilíngue, por mais simples que seja, o surdo e o ouvinte ficam com uma sensação de
incapacidade de aproximação. Nesse sentido, a pedagogia bilíngue tem a função de
romper as barreiras e facilitar a comunicação.

Nesse contexto, também é importante destacar que a cultura surda faz parte
da pluralidade brasileira, em que diferentes costumes, modos de ser, modos de
se comunicar ou ainda de tradições e outras manifestações não nos separam,
ao contrário, nos unem pela ideia da pluralidade num só lugar. Essa cultura
está politicamente estabelecida, visto que a Libras passou a ser reconhecida
por intermédio da Lei nº. 10.436, de 24 de abril de 2002, como língua de
manifestação e expressão dos surdos, conforme artigos preliminares, a saber:

Art. 1º É reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a língua


brasileira de sinais — Libras e outros recursos de expressão a ela associados.
Parágrafo único. Entende-se como língua brasileira de sinais — Libras a
forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natu-
reza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constitui um sistema
linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de
pessoas surdas do Brasil.
Art. 2º Deve ser garantido, por parte do poder público em geral e empresas
concessionárias de serviços públicos, formas institucionalizadas de apoiar
o uso e difusão da língua brasileira de sinais — Libras como meio de comu-
nicação objetiva e de utilização corrente das comunidades surdas do Brasil.
(BRASIL, 2002, documento on-line).

A legislação que reconhece a Libras como língua oficial dos surdos oferece, ainda, a
garantia de direitos no que se refere à educação brasileira, pois, além da obrigatorie-
dade da inclusão de surdos no sistema educacional, salienta que a Libras não poderá
substituir a modalidade escrita da língua portuguesa; desse modo, pode-se concluir
que a educação bilíngue está presente no campo legal.
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O professor como mediador da aprendizagem


na perspectiva da diferença cultural
A mediação da aprendizagem no enfoque da diferença cultural deve ser tra-
balhada na modalidade da interação. É importante destacar que a mediação
do professor, a partir das suas práticas pedagógicas, inicialmente, alinha-se
para a interação do objeto a ser aprendido pelos seus alunos — interagir no
seu sentido de influência, de diálogo ou mesmo de contato.
A interação ou o contato com os conteúdos via mediação do professor,
inicialmente, trará à tona o contexto cultural do surdo, observando as suas
peculiaridades, das mais simples às mais complexas, ainda que, de uma forma
geral, será importante vislumbrar as informações e provocar as curiosidades
de seus alunos. Nesse primeiro momento, torna-se fundamental conhecer a
cultura da segunda língua a ser aprendida e entendê-la como uma diferença
cultural presente na sociedade, tal como outras existentes, mas que fazem
parte da realidade brasileira. Nesse sentido, Botelho (2002, p. 26) afirma
que, no ensino e na aprendizagem na visão da concepção interacionista de
aprendizagem, o cerne é a interação via construção do conhecimento; a partir
disso, o ensino bilíngue recorre a algumas metodologias da alfabetização na
aquisição da linguagem.
Também é importante destacar que, na mediação da aprendizagem, as tec-
nologias possuem um importante papel para as necessidades de comunicação
que transformam a realidade do aluno surdo quando oferecem possibilidades
como mandar um e-mail e receber uma pronta resposta, ter acesso à informação
em tempo real e, ainda, acessar rapidamente com uma mensagem todo o grupo
de amigos de uma mesma cidade, de outras cidades e de participar de grupos
virtuais, além de acesso às compras on-line e outras possibilidades da internet.
Assim, para os surdos, as modificações trazidas pelas novas tecnologias vão
muito além da educação, têm um viés social cuja inserção comunicativa, em
muitas das atividades de vida diária antes inacessíveis, encurta-se pelo uso
das novas tecnologias.

A interação como metodologia de ensino na educação bilíngue gera contato com


a segunda língua e, por sua vez, aproxima o aluno por meio de pesquisa, relatos de
experiência e outras ações.
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Desvelar uma diferença cultural na mediação da aprendizagem implica


tornar o assunto interessante para os alunos a partir de diálogos curiosos a
respeito da cultura surda, de modo que os alunos se sintam instigados a realizar
suas próprias buscas sobre o assunto. Antes de tudo, falar de diferença cultural
requer discutir a constituição da identidade surda e seus desdobramentos.
A identidade surda por si só já gera questões sobre a trajetória histórica
dos surdos e o histórico da educação dessa comunidade no país, além de
chamar a atenção para comportamento, assuntos relacionados à psicologia
social e aos contextos vivenciados pela comunidade surda, assim como para
as mudanças relevantes para os surdos nos últimos anos, como as principais
questões políticas e as conquistas alcançadas.
Enfim, são diálogos pertinentes a uma cultura dentro de outras culturas,
num mesmo país. A proposta da mediação no primeiro momento pedagógico
via interação é de conscientizar os alunos para a importância da aprendizagem
dessa cultura, assim como de outras culturas, e, ao mesmo tempo, sensibili-
zar para o reconhecimento das partes como um todo, ou seja, elementos de
um mesmo conjunto, ainda que com fortes e marcantes diferenças — nessa
perspectiva, somos iguais.
A mediação do professor na aprendizagem como recurso para tornar efi-
ciente a conscientização da segunda língua em face das diferenças culturais
insere-se nesse contexto. Isso ocorre por meio da participação em escolas de
surdos, encontros sociais com surdos e outros eventos que possam gerar a
empiria, que se soma aos conteúdos didáticos da segunda língua, propondo
uma prática da linguagem, ainda que elementar em sua estrutura, visto que
essa ação pedagógica estimula o aprendizado e o torna mais atraente para
quem aprende. Por fim, na mediação, o professor é um promotor da interação
e da empiria no que se refere à educação bilíngue.

A importância da aprendizagem da língua


brasileira de sinais por parte da sociedade
A comunicação entre as pessoas é um fator de contato, permite que se estabe-
leçam relações e, nesse sentido, que se participe da vida social. A importância
da aprendizagem da língua de sinais tem como pressuposto a educação social,
que tem como cerne da questão “a inclusão”, ou seja, a participaçãto de todos,
gerando contato em sociedade, apropriação de direitos e deveres, receptação
e emissão de informação.
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As propostas educacionais atuais que favorecem a cultura surda têm sido


alvo de discussões nos encontros de educação inclusiva, o que representa
mudanças e aspectos evolutivos na atenção à pessoa surda e na importância do
conhecimento acerca dessa cultura, presente na realidade brasileira há muito
tempo, embora tenha sido ignorada durante uma fase enorme. As rupturas que
crescem em torno do pensamento arcaico e preconceituoso quanto ao ensino de
Libras têm se mostrado potentes frente às propostas educacionais amparadas
pela obrigatoriedade do ensino dessa língua nos cursos de licenciaturas e da
sua presença em cursos de especialização em bilinguismo.
Durante um longo período histórico, o surdo foi esquecido e sua foi cultura
desprezada. A inclusão e a valorização do pensamento acerca das diferenças
culturais envolvendo a comunidade surda revelam que, nos últimos anos,
novos horizontes têm sido erguidos a partir de políticas públicas educacionais,
viabilizando a legitimidade da valorização do bilinguismo.
Percebe-se, assim, que houve, e há, alguns esforços pelo reconhecimento
da cultura surda, cujas políticas educacionais atuais acabam por realizar um
resgate histórico a partir do reparo de uma dívida social com a comunidade surda
no país, pois muito pouco foi feito em prol desses indivíduos — só a partir de
2002 os olhares se voltaram para a questão do surdo e seus direitos. Para Soares
(1999, p. 218), o pouco, ou quase nenhum, conhecimento sobre a Libras garantiu
o pensamento equivocado de que essa era “[...] uma metodologia oral e, por ser
considerada apenas como mímica, motivou a cultura hegemônica ouvinte a
estigmatizar e a condenar o uso dessa língua, considerando-a imprópria”. Muitas
vezes, a Libras também foi vista na educação do surdo como algo prejudicial à
aquisição da linguagem oral, bem como à sua integração na sociedade.
A necessidade da aprendizagem de Libras na sociedade vai para além
da escola, pois estabelecimentos comerciais, órgãos públicos, prestação de
serviços e outros espaços sociais, na sua grande maioria, são deficientes na
comunicação com as pessoas surdas que desejam utilizar-se desses espaços
para determinados fins. Existem, ainda, muitas barreiras no acesso da pessoa
surda a informações sobre produtos, compras, crediários, serviços bancários e
outros. Desse modo, percebe-se, ainda, uma ausência comunicativa da Libras
em espaços públicos, como shoppings, bancos e até mesmo serviços públicos
de espectro amplo, limitando a vida social de uma pessoa surda e tornando-a
dependente de outros.
Diante do exposto, embora tenhamos obtido avanços, é importante destacar
que ainda há muito que se fazer para a valorização da cultura surda em espaços
para além da escola. Para Quadros (1997, p. 57), já que “a identidade surda se
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constrói dentro de uma cultura visual, essa diferença precisa ser entendida não
como uma construção isolada, mas como construção multicultural”. Dessa
forma, entende-se que a identidade dos surdos é o conjunto de traços que os
distinguem dos ouvintes, representada por uma cultura específica, resultante
das interações entre esses indivíduos.
Assim, dada a importância da Libras como fator de educação social para
o pensamento inclusivo, implementá-la é uma ação que requer rupturas no
campo do estigma e do preconceito. Dessa forma, a pedagogia bilíngue segue
desbravando tais rupturas e enaltecendo a cultura surda na perspectiva do
ato educativo/interacionista pelo respeito às diferenças e pela apropriação de
direitos e deveres a partir da comunicação total ou da comunicação semiótica
do ensino da segunda língua, a fim de compartilhar indivíduos entre si como
seres ativos (BOTELHO, 2002).
É importante ter claro que a comunidade surda quer ser levada a sério,
deseja um tratamento respeitoso e uma inclusão, isto é, que seus indivíduos
sejam reconhecidos como figuras capazes na sociedade.

O avanço das ações em prol da pedagogia bilíngue pode ser compreendido a partir
da presença de intérpretes, por exemplo, em instituições privadas, cuja ausência é
uma das grandes barreiras comunicativas encontradas por pessoas surdas em seu
cotidiano. Intérpretes disponíveis minimizariam os problemas cotidianos vivenciados
pela maioria dos surdos atualmente e essa ação nos levaria ao multiculturalismo,
valorizando outros modos de ser e viver no mundo. Outro ponto importante que não
colabora para efetivar a pedagogia bilíngue é a falta de pessoas surdas trabalhando
em ambientes educacionais, além de professores que se mostram indiferentes à Libras,
sem adquirir esse conhecimento para aperfeiçoamento e capacitação docente para
o exercício de sua profissão.
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BOTELHO, P. Linguagem e letramento na educação dos surdos: ideologias e práticas


pedagógicas. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Lei nº. 10.436, de 24 de
abril de 2002. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 25 abr. 2002.
MEGALE, A. H. Bilinguismo e educação bilíngue: discutindo conceitos. Revista Virtual
de Estudos da Linguagem – ReVEL, v. 3, n. 5, ago. 2005.
QUADROS, R. M. Educação de surdos. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
SOARES, M. A. L. Educação do surdo no Brasil. Campinas: Autores Associados, 1999.

Leituras recomendadas
REILY, L. Escola inclusiva: linguagem e mediação. Campinas: Papirus, 2004.
SKLIAR, C. (Org.). Educação e exclusão: abordagens socioantropológicas em educação
especial. Porto Alegre: Mediação, 1997.
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