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RESUMO
O presente artigo demonstra, por meio de pesquisa bibliográfica e estudo de caso, as aplicações
das metodologias propostas pelo educador Célestin Freinet (1896-1966). Algumas de suas
atividades e técnicas são discutidas entre autores conhecedores do pedagogo francês, bem como
a funcionalidade de suas idéias e ideais no âmbito educacional, mais detidamente no ensino das
crianças e dos adolescentes. Destaca-se o longo trabalho e o movimento em prol da renovação e
modernização da escola, fruto das discussões no movimento escola-novista, na primeira metade
do século XX. Freinet demonstrou, em suas pesquisas, formas de se resgatar a afetividade dos
alunos na escola, tornando-a mais prazerosa, na tentativa de formar uma identidade que
demonstre a real função social de uma escola inclusiva, construtora de conhecimentos, temas
pertinentes discutidos na atualidade, em que a educação passa pela famigerada globalização.
Dentre as diversas técnicas difundidas por Freinet, destaca-se o Jornal Escolar, desenvolvido em
uma escola de educação infantil no município de Piracicaba-SP. A dinâmica possibilitou aos
alunos que participaram do processo uma vivência e a posterior experimentação dos
procedimentos para a elaboração do Jornal Escolar. Houve seleção dos temas de acordo com o
currículo e os programas de ensino da escola, bem como da abordagem sociocultural e histórica
da região onde a instituição escolar está inserida. Foi feita visita ao jornal da cidade e verificação
do processo de trabalho de um editorial. O professor explorou os aspectos da comunicação entre
as crianças, seus sentidos, significados e expressões da descoberta, o encontro com o novo, o
desconhecido, o que, posteriormente, foi desdobrado em construções coletivas e sociais de novos
conhecimentos e aprendizados, estreitando ainda mais a relação aluno-professor e promovendo a
liberdade de expressão das crianças na educação infantil. Produções artísticas, culturais e
educativas foram realizadas, visando-se aos princípios da pedagogia de Freinet, por meio de
rodas de conversa, aulas-passeio, oficinas, álbuns, livro da vida, dentre outras atividades. A
elaboração do Jornal Escolar pelas crianças, em especial, mostra-nos que os alunos podem
vivenciar momentos de interdisciplinaridade, de produção coletiva do conhecimento, de
socialização de atividades e de integração ao grupo de colegas e professores e socializar esses
conhecimentos entre as famílias, os amigos e a comunidade onde vivem e interagem, valorizando
o conhecimento construído no sentido de formar cidadãos reflexivos, felizes e preparados para
viver em um mundo de constantes mudanças.
Em 1920, Freinet iniciou seus trabalhos em uma escola instalada numa casa antiga, pobre
e escura, com carteiras em mau estado e alinhadas à maneira tradicional. Apesar de faltar
experiência pedagógica a ele, afinal não tinha terminado o curso normal por conta da guerra,
Recomeçou a estudar sozinho, diariamente anotava aquilo que ouvia de seus alunos,
crianças, como seus fracassos e sucessos. Com isso, foi descobrindo os interesses, os problemas
Conhecendo assim, cada vez mais seus alunos, percebeu que existiam outras formas de
eficiência das rígidas normas educacionais como: filas, horários e programas exigidos
oficialmente. Ficou claro para ele que, o interesse das crianças estava “lá fora”: nos bichinhos
que subiam pelo muro, nas pedrinhas redondas do rio, no vôo dos pássaros ou no zumbido das
abelhas.
Assim, surgiu a noção de escola ativa, ou seja, a escola que toma como ponto de partida,
a atividade espontânea, pessoal e produtiva da criança, bem como, sua atividade manual,
construtiva, mental, suas ações, afeições, interesses, gostos predominantes, suas manifestações
elas deveriam ser feitas pela base, ou seja, pelos próprios professores. O movimento pedagógico
fundado por ele caracteriza-se por sua dimensão social, evidenciada pela defesa de uma escola
centrada na criança, que é vista não como um indivíduo isolado, mas, fazendo parte de uma
Um dos aspectos mais relevantes de seu trabalho foi sem dúvida, o fato de abrir todos os
caminhos possíveis para que alunos e professores pudessem se expressar livremente, tendo a
Nesse sentido, acreditava que todos, adultos e crianças, deveriam ter seus direitos
garantidos. À criança, sobretudo, era preciso dar o direito de viver plenamente como criança, sob
todos os aspectos. Era necessário respeitá-la para que pudesse desenvolver suas capacidades e
personalidade, sem afastar-se de uma finalidade social e humana mais ampla, sendo acima de
tudo, um humanista.
O respeito ao ser humano, expresso pelo respeito à criança, era a garantia para as
realizações futuras, era a certeza de que a criança quando adulta estaria pronta a defender os
Ele procurava nos educadores de sua época, o respaldo de uma pedagogia preocupada
com a alegria de viver, mas em todos eles, só encontrava o acúmulo do saber como eixo
principal. Para ele, isso era um reforço para continuar sua busca, pois cada vez mais se sentia no
Para os alunos dele, a curiosidade e a ânsia de saber mais o levavam a encontrar soluções
para seus inúmeros problemas, até descobrir pormenores que certamente acirravam ainda mais o
E assim, lutou combativamente e com todo entusiasmo contra a situação das escolas de
sua época, criticou o fato de que nas condições em que os alunos são postos em contato com a
vida, tornam-se incapazes de julgar, propor novas idéias, criticar artigos de jornais ou até mesmo
compreendê-los:
OS SABERES DE FREINET
nos tempos atuais, utilizarmos as ciências da educação, bem como algumas das técnicas de
trabalho difundidas pelo pedagogo francês Célestin Freinet (1896-1966). Sua proposta tem uma
o rompimento de idéias autocráticas e autoritárias defendidas pela escola tradicional, bem como
Desse modo, a proposta de Freinet está em consonância com a visão de que o estudante é
experimenta, que vivencia as diversas situações cotidianas, que age e interage com seu meio. A
partir dessa perspectiva, as técnicas difundidas por Freinet ganham sentido e significado no
oferecendo ferramentas para que a criança aprofunde seus conhecimentos e progrida em suas
ações.
instrumento que se constitui em um elo entre a classe e o grupo social em que a criança está
inserida. Representa a expressão viva de personalidades que se estão formando e torna-se reflexo
de fontes permanentes de emoção. Propicia-se, então, com essa técnica, a formação ética e o
Para Sampaio (1989), a pedagogia freinetiana tem como alvo principal o atendimento da
desigualdades socioculturais. Assim, esses elementos reunidos podem garantir à criança seu
pleno desabrochar como um indivíduo autônomo, um ser social responsável, co-detentor e co-
Nesse sentido, como aponta Dias (1994), a pedagogia freinetiana afasta-nos de duas
escolarismo, com que se pretende preparar a criança precocemente para o ensino fundamental. É
significativa. Sua proposta pedagógica, em que se mesclam teoria e prática, aborda instrumentos
experiência, por sua ação conjunta, resultam na aprendizagem. Freinet enfatizava que a educação
das crianças devia extrapolar os limites da sala de aula e explorar as experiências vividas por elas
Assim sendo, de acordo com Kramer (1999), as crianças são vistas como pequenos
cidadãos, que com acesso aos conhecimentos produzidos historicamente pela humanidade
Cèlestin Freinet trabalhou suas metodologias por meio de atividades como: aula-passeio,
roda de conversa, elaboração de álbuns e de livro da vida, oficinas (ateliês), por exemplo:
casinha, recorte e colagem, desenho, modelagem (massa de modelar), sucata, pintura, jogos
deixando que a vida entrasse na sala de aula, mediante anotações. No entanto, ele não
concordava com o fato de que essas atividades que se tornavam produções ficassem guardadas
nos armários e, sim, que pudessem ser úteis para outras pessoas. Foi então que surgiu a idéia do
jornal escolar, que era editado cooperativamente pela classe, com textos trabalhados
por professores adeptos da pedagogia freinetiana para a impressão, feito de madeira, pedaços de
náilon, dobradiças e goma laca), mimeógrafos e impressoras. Assim, as crianças que ainda não
sabiam ler nem escrever contavam suas histórias e ilustravam-nas com diferentes materiais. A
uma escola que trabalhe com a pedagogia freinetiana deve conter, em suas classes, cantos de
trabalhos correspondentes aos ateliês, separados por armários, de forma que as crianças se
instalem de maneira confortável e o material possa estar ao alcance delas. Nesses cantos, as
crianças terão uma maior liberdade de ação, permitindo um relacionamento mais amplo entre
O JORNAL ESCOLAR
O jornal escolar é uma das diversas técnicas propostas por Freinet e, de acordo com
Sampaio (1989), constitui-se como elo entre a classe e o grupo social em que a criança está
inserida e a comunidade. Desse modo, o jornal escolar será portador da vida de cada estudante
que produziu um poema, que redigiu um texto ou que fez uma ilustração. Torna-se, então, mais
que se estão formando, torna-se reflexo de fontes permanentes de emoção. O jornal certamente
contribui para a cidadania das crianças e adolescentes, pois oferece a possibilidade de intervir na
vida da escola e da cidade, além de oferecer aos adultos a tomada de consciência de problemas e
atitudes aos quais não davam tanta importância. Sampaio aponta ainda que essa técnica
cidadãos responsáveis.
É por meio do texto impresso que o pensamento e a cultura são consagrados. Assim, um
jornal bem feito não precisa do estímulo de notas ou prêmios, ele é em si o próprio objetivo, isto
De acordo com essa perspectiva, o jornal também está dirigido a outras pessoas além
daquelas que o produziram, por exemplo, a outras classes, a outras escolas, ao grupo de amigos,
à família, enfim, ele é uma mensagem afetiva, que se transforma em arquivo vivo da vida das
em realidade novos recursos que surgiam principalmente por conta da vida ativa e criadora das
crianças. Então, por volta de 1964, a proposta era que se substituísse a rotina dos antigos
manuais, dos trabalhos de casa e das lições, impostos autoritariamente pelos adultos, pelo texto
livre, pela observação, pela experiência, pelos desenhos, pelas pinturas e músicas.
O texto livre era, então, a expressão natural inicial da vida infantil no seu meio ambiente
em ciências, cálculos, história e geografia. Mas, para a efetivação do uso desses novos recursos,
necessária para a concretização dos recursos ocorreu a partir do jornal escolar, base da
correspondência interescolar. Era então uma nova técnica de trabalho que timidamente ia
educadores.” (FREINET, 1974). Freinet aponta que a escola tradicional dava início ao trabalho
pedagógico pelas paredes e tetos para avançar mais depressa e mais rapidamente poder abrigar
os que a utilizavam, e só ocorreria melhoria pedagógica, neste esquema, à medida que o
dinamismo das novas forças triunfasse sobre essas resistências e soubesse construir, pedra a
valorização da expressão das ações humanas. Este autor compreende que a técnica do jornal
escolar, difundida por Freinet, tinha de importante a espontaneidade e a livre expressão dos
cooperação.
No Brasil, essa técnica foi vivenciada em iniciativas isoladas até os anos 1970. Já a partir
da década seguinte, com o advento da educação como função renovadora, houve certa abertura
técnica do jornal escolar, que passou a ser sugerida pelas Diretrizes Curriculares da Secretaria de
expressão oral e escrita, sendo que o tecnicismo predominava na educação escolar. Avançando
escolas o uso de jornais em sala de aula. Este autor enfatiza a experiência de produção de jornal
escolar sob dois ângulos: conhecer e produzir o jornal, ou seja, reconhecer o jornal não apenas
como um veículo de comunicação e sim concebê-lo como uma ferramenta que propicia a
conquistas desejadas pelo ensino formal, como: clima de motivação e envolvimento, cooperação,
afetividade entre os participantes. O jornal escolar tem seu envolvimento com a produção
cultural, que, por sua vez, não tem limites de conceitos e informações para serem quantificados
em uma avaliação periódica, mas tem incorporado a experiência vivida, ou seja, mais que
traduzir o que aprendeu em novos conhecimentos para si, para o outro e para o mundo.
ESTUDOS DE CASO
bem como na técnica do jornal escolar. O que se propõe, então, é compartilhar e socializar a
técnica, que não oferece apenas ao estudante informação, mas alegria e prazer no processo de
ensino-aprendizagem.
Desse modo, pode-se dizer que teoria e prática caminham juntas, bem como a valorização
significativa. Assim sendo, acredita-se que a criança é um sujeito que pode protagonizar sua
aprendizagem, que é ativa, dinâmica, criativa, um ser pensante, que se posiciona, que toma
decisões, que exprime seus sentimentos e emoções, que concorda, discorda, compara, estabelece
uma roda de conversa (técnica preciosa e imprescindível na rotina da educação infantil), em que
todos, alunos e professores, conversaram e exploraram a utilidade desse meio de comunicação,
Foi sugerida, então, pelos professores, a idéia de se construir um jornal escolar. O grupo,
motivado pela idéia, foi composto e escolheu temas pertinentes, que já tinham sido discutidos ao
longo do ano letivo. Dentre as diversas temáticas que surgiram e foram estudadas no decorrer do
ano, selecionaram-se, para fazer parte do jornal escolar: “Aula-passeio à redação do Jornal de
Em relação ao tema “Aula-passeio”, pode-se dizer que o interesse surgiu no início do ano
de 2001, devido ao estudo dos meios de comunicação pelo grupo. O assunto surgiu por causa de
um aparelho telefônico que havia na “oficina da casinha”, que trabalha a representação simbólica
contém utensílios de uma casa, com suas devidas proporções às crianças (armários, fogão,
telefone, roupas etc). A partir disso, novos interesses surgiram. Começamos a pesquisar e foram
fixo e celular, computador, fax, carta, telegrama, e-mail, recado, bilhete, jornal, revista, livro,
Dentre esses meios de comunicação, o que mais interessou ao grupo foi o jornal, bem
como foi despertada a curiosidade de se aprender como ele é feito e produzido. Decidimos,
então, conhecer todo o processo de produção do jornal até sua impressão, o que ocorreu na aula-
passeio ao Jornal de Piracicaba. As idéias, opiniões e sugestões das crianças sobre essa temática
foram expressas durante rodas de conversas e organizadas em forma de um texto coletivo pelos
“Classificação dos animais”. Percebemos que podíamos cuidar na nossa própria sala, de alguns
animais pequenos que gostavam de viver na terra, como caracóis, tatu bolinha e besouros.
sobre sua construção e estudo constam no texto coletivo organizado pelos professores e
de seus 120 anos. O grupo de alunos foi até o laboratório de comunicação da Universidade
Metodista de Piracicaba (UNIMEP) para gravar uma música escolhida e ensaiada pela professora
de música. Em seguida, as crianças exprimiram o que sentiram e o que acharam, e esse registro
deu-se em um texto coletivo que foi organizado pelos professores, votado pelas crianças e
publicado no jornal.
Figura 3 - CD do Colégio, 2001.
O tema “Receitas culinárias” gerou efervescência porque uma criança levou para a escola
algumas mandiocas de seu sítio. Conversamos sobre esse alimento, sua utilidade, sua
importância, vimos algumas fotos de plantação de mandioca em livros, contando com o suporte
do professor de ciências naturais da escola. O grupo decidiu, então, fazer algumas receitas para
provar a mandioca trazida pela amiga. Com o professor de ciências, pesquisamos algumas
escola.
o que era discutido e contemplavam a fala e a opinião dos estudantes em organização de textos
coletivos. Os educadores, então, tinham a função de escribas, uma vez que as crianças da faixa
desenho, colagem, recorte, dobradura, entre outros, e com diversificados materiais: giz de cera,
lixa, papéis de variadas cores e tamanhos, tesoura, cola, canetas coloridas, lápis de cor, tinta
guache, esponja etc. Cada estudante ilustrou as páginas de seu jornal, da maneira que quisesse.
Vale lembrar que as ilustrações foram feitas uma por dia e durante o momento em que as
crianças se ocupavam das oficinas de trabalho. Depois de todos os jornais prontos, eles foram
socializados entre os alunos. Cada um contou que materiais e/ou técnicas utilizou, que idéias
outras salas da escola e depois o levaram para suas casas, estendendo a dinâmica às famílias,
amigos e comunidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
de se produzir um jornal escolar por meio da metodologia proposta por Freinet, na sala de aula,
presentes na trajetória de vida dessas crianças. Além do mais, podemos contribuir para a
formação de cidadãos reflexivos, críticos e atuantes, que se interessam pela pesquisa, que são
investigativos e que estabelecem relações afetivas, cooperativas e solidárias com o outro, com
leque imenso de outros métodos de ensino, portanto a escola que tem a pedagogia freinetiana
como eixo sustentador de seu trabalho pedagógico, bem como uma outra que busque elevar os
padrões de qualidade da educação nacional, pode priorizar, em suas ações educativas, atitudes
complementaridades. Já o professor precisa estar atento às demandas dos estudantes, àquilo que
inseriam. Tivemos como escopo demonstrar alternativas efetivas para o resgate da função social
da escola, propor elementos para sua renovação, modernização e transformação, como, por
preservados seus ideais desde que surgiu, com o educador e seus alunos. Enfim, a partir desta
pesquisa, fica clara a oportunidade de, por meio dessas dinâmicas, possibilitar às crianças uma
grupo de estudantes.
REFERÊNCIAS
DIAS, Ruth Jofflily. O cotidiano na pedagogia de Freinet. Idéias, São Paulo, n. 2, p. 69-78,
1994.
ELIAS, Marisa Del Cioppo. Pedagogia Freinet: teoria e prática. Campinas: Papirus, 1996.
14 mar. 2008.
KRAMER, Sônia. Com a pré-escola nas mãos. São Paulo: Ática, 1999.
SAMPAIO, Rosa Maria Whitaker Ferreira. Freinet: evolução histórica e atualidade. São Paulo:
Scipione, 1989.