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Avaliação pericial da inimputabilidade penal: práticas discursivas e suas implicações.

Marina Candeira Correia2


Jadson Ramos3
4

RESUMO

Estudo referente aos dilemas da não regulamentação do oficio de psicanalista na era


digital, abordando sobre Freud e o movimento acerca da formação analítica e quais os
caminhos desta formação, a diferença entre profissão e o oficio de acordo com a proposta de
Freud, distinção entre a análise e a psicoterapia, e quais os interesses pela regulamentação.
Compõe-se de um estudo que projeta relacionar sobre as teorias da Psicanalise com a estudos
e questões sobre a regulamentação e enfatizar a proposta do mesmo a partir de perspectivas
feitas em artigos subjacentes ao tema. Trata-se de uma revisão de literatura e realiza uma
análise dedutiva de conhecimentos relativos às condições do conteúdo bibliográfico por meio
de pesquisa em livros, artigos e trabalhos já desenvolvidos, embasados no tema do estudo a
partir dos objetivos expostos. Pontua-se o destaque em pautas relacionadas à regulamentação
do oficio de psicanalista na sociedade atual.

Palavras-chave: Freud. Psicanalista. Inconsciente. Regulamentação.

1 INTRODUÇÃO
Quando iniciamos sobre os dilemas da não regulamentação do oficio de psicanalista na era
digital é necessário compreender o conceito e as teorias da psicanalise, no qual o seu termo é
usado para se referir a um método de investigação e a uma pratica profissional. Enquanto
teoria, caracteriza-se por um conjunto de conhecimentos sistematizados sobre o
funcionamento da vida psíquica. Assim, a Psicanálise enquanto método de investigação, se
caracteriza pelo método interpretativo, que busca o significado oculto daquilo que é
manifestado por meio de ações e palavras ou pelas produções imaginárias, como os sonhos,
os delírios, as associações livres, os atos falhos. Além disso, a prática profissional refere-se
à forma de tratamento, a análise que busca o autoconhecimento ou a cura, que ocorre através
deste autoconhecimento.

1 Paper apresentado à disciplina de Fundamentos da abordagem Psicanalítica do Curso de Psicologia do Centro


Universitário Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB.
2 Graduanda do 5° Período do Curso de Psicologia do Centro Universitário Unidade de Ensino Superior Dom
Bosco - UNDB. E-mail: 002-022308@aluno.undb.edu.br
3 Graduanda do 5° Período do Curso de Psicologia do Centro Universitário Unidade de Ensino Superior Dom
Bosco - UNDB. E-mail: 002-020757@aluno.undb.edu.br
4 Professora, Mestra, Docente do Curso Universitário Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB. E-mail:
caroline.torres@undb.edu.br
Desta maneira, nos leva a pensar em sua característica essencial para o trabalho
psicanalítico, em que o deciframento do inconsciente e a integração de seus conteúdos na
consciência. Porque são a partir destes conteúdos desconhecidos e inconscientes que
determinam, em grande parte, a conduta dos homens e dos grupos, as dificuldades para viver,
o mal-estar, o sofrimento.

Em que, a finalidade do trabalho investigativo é o autoconhecimento, que possibilita


lidar com o sofrimento, criar mecanismos de superação das dificuldades, dos conflitos e dos
submetimentos em direção a uma produção humana mais autônoma, criativa e gratificante de
cada indivíduo, dos grupos, das instituições.

Com isso, é necessário que o psicanalista ajude a desmontar, pacientemente, as


resistências inconscientes que obstaculizam a passagem dos conteúdos inconscientes para a
consciência, já que é uma tarefa, muitas vezes bastante desejada pelo cliente.

Logo, o método psicanalítico é utilizado para desvendar o real, compreender o sintoma


individual ou social e suas determinações, e o interpretativo. Em que na análise individual, o
material de trabalho do analista são sonhos, as associações livres, os atos falhos (os
esquecimentos, as substituições de palavras, dentre outros.). Onde cada um desses caminhos
de acesso ao inconsciente, o que vale é a história pessoal, cada palavra, cada símbolo possui
um significado particular para cada indivíduo, o qual só pode ser apreendido a partir de sua
história que é absolutamente única e singular. [pg. 81]

Outrossim, o exercício da Psicanalise ocorre de muitas outras formas, ou seja, é


utilizada como base para psicoterapias, aconselhamentos, orientações; pode ser aplicada no
trabalho com grupos, instituições. A Psicanalise também é um instrumento importante para a
análise e compreensão de fenômenos sociais relevantes, que podem ser as novas formas de
sofrimento psíquico, o excesso de individualismo no mundo contemporâneo, a exacerbação da
violência, entre outros.

A posteriori, este paper contará com a crítica literária realizada através da recolha,
seleção, análise e síntese da literatura relevante sobre o tema abordado. Desta forma, serão
analisados livros, artigos científicos, monografias e sites de fontes seguras que contenham
informações acerca do tema, com o intuito de auxiliar no estudo acerca da não
regulamentação do oficio de psicanalistas.
2 FREUD E O MOVIMENTO ACERCA DA FORMAÇAO ANALITICA
2.1 Quais os caminhos desta formação
Em seus escritos sobre A História do Movimento Psicanalítico Freud já deixara clara sua
firme preocupação com os rumos da psicanálise. Nessa época, o criador da teoria já beirava
seus sessenta anos de idade e sabia que sua saúde não aguentaria mais tantos anos de
investimento, zelo e sustentação por todo o trabalho que havia feito até então. Nesse mesmo
período, o antissemitismo se expandia por toda a Europa, tornando-se mais um dentre todos os
fatores que o perturbavam. Além de tudo, as divergências conceituais e técnicas
apresentavam-se cada vez mais evidentes e entre um número maior de profissionais que se
interessavam pela teoria que só crescia. Logo, justifica-se a ansiosa e ao mesmo tempo
coerente inquietude de Freud perante um contexto notadamente ameaçador dentro do qual se
desenvolvia sua teoria tão complexa, inovadora e, desde seu nascimento, encarada com tanta
resistência (FREUD, 1914/1996).

Movido por muitas questões, especialmente as citadas acima, além do reconhecimento


internacional que já vinha dando novas proporções à psicanálise, Freud não demorou a pensar
em como expor todo o conhecimento por ele traduzido até aquele momento. Nesse sentido,
começou a traçar estratégias, estreitou alianças teóricas e prontamente se mobilizou para a
institucionalização da psicanálise, que começou sua expansão geográfica pelo oeste europeu e
rapidamente foi atraindo interesses de todo o mundo (FREUD, 1914/1996).

Segundo Roudinesco (ROUDINESCO, 1988), a institucionalização da psicanálise se


deu em quatro etapas. A começar pelo período crítico entre 1902 e 1906, estágio sublinhado
pelas resistências da grande maioria da sociedade da época que era rendida à repressão e às
censuras, além de sustentada por preceitos religiosos. Em 1902, alguns médicos jovens se
aproximaram de Freud no intuito de “aprender, praticar e difundir o conhecimento da
psicanálise”, e assim formaram a Sociedade Psicanalítica de Viena (FREUD, 1914/1996).
Muito entusiasmado pelo interesse tão vivaz desse jovem grupo, Freud não economizou
esforços ao tentar transmitir todo o seu saber e experiências a estes profissionais. No entanto,
as discordâncias já se faziam fortemente presentes e, não obstante, foram desde aí causa de 13
importantes dificuldades ligadas ao ensino da técnica psicanalítica que, consequentemente,
geraram grandes divergências teóricas e práticas, ainda tão presentes nos dias de hoje.

O segundo momento ficou conhecido pela considerável expansão da psicanálise,


sobretudo nos contextos de ensino e aprendizagem. Entre os anos de 1906 a 1912, escolas
renomadas, universidades conceituadas e profissionais de prestígio dentro do cenário
acadêmico se aproximaram e, consequentemente, muitos congressos e conferências tomaram
nota da teoria que se difundia cada vez mais nos meios literário e científico. Nesse mesmo
período, Freud conheceu um de seus melhores amigos, Sándor Ferenczi, dentre muitos, um
dos representantes de maior contribuição à psicanálise. Anos depois dessa aliança que se
iniciara e juntamente com toda a difusão do movimento, foram criadas as primeiras
associações psicanalíticas, a considerar de forma especial a IPA (Internatinonal Psycoanalytic
Association), fundada no segundo congresso de psicanálise realizado em Nuremberg nos dias
30 e 31 de março de 1910 (ROUDINESCO, 1988).

A terceira etapa, de 1912 a 1927, foi caracterizada pela instituição do Comitê secreto,
criado por Freud após sua tentativa “desastrosa” de nomear Jung como seu sucessor para dar
sequência ao seu legado, quando se deu conta de que tal atitude colocaria em risco os
princípios fundamentais de sua teoria. Aceitou então a proposta de Ernest Jones e formou um
círculo íntimo de analistas de sua confiança no intuito de cuidar de tudo o que já havia
construído. Com sua liderança atravessada por ameaças físicas, políticas e conceituais, a
criação do Comitê o assegurou da expansão internacional da psicanálise e concentrou a
liderança do movimento nas associações e instâncias de gestão, dando a continuidade
institucional que regeu a política interna do movimento até a sua posterior dissolução, no
quinto Congresso Internacional, realizado em Innsbruck (ROUDINESCO, 1988).

A quarta fase foi descrita por Roudinesco (ROUDINESCO, 1988) como o período da
“psicanálise moderna”, um verdadeiro marco institucional evidenciado pela padronização e
sistematização da formação do analista. Isso se deu em 1926, ano em que, após instauradas
suas políticas previamente traçadas, o Comitê Secreto se dissolveu com as destacadas saídas
de Ferenczi e Otto Rank, cujas contradições teóricas ao precursor se davam de maneira
relevante. Esse foi um momento simbólico inaugurado pela profissionalização dos
correspondentes que dariam seguimento à prática psicanalítica, pois foi aí que surgiu como
obrigatoriedade a análise didática, sendo considerada, desde então, quesito primordial à
formação de um analista.

A depender dos esforços de Freud em relação à institucionalização da psicanálise, esta


seria regulamentada no intuito de oferecer psicoterapia para as massas, formação aos analistas
e promoção para pesquisas psicanalíticas. Todavia, o modelo que prevalecia na época foi
elegido pelo Instituto Psicanalítico de Berlim, fundado por Eitingon, Abraham e Simmel em
1920, modelo adotado como padrão na criação de todas as posteriores instituições, o que
acabou apontando fortes influências no futuro do movimento (ROUDINESCO, 1988).
É evidente que a inquietação de Freud no intuito de proteger os princípios
fundamentais da psicanálise não se reduziu apenas aos atos políticos da fundação de
associações, muito menos sob a criação de regras a serem estritamente seguidas.
Indubitavelmente, o reconhecimento natural da psicanálise, a partir dos congressos, aumentou
de forma súbita a preocupação dele em fomentar sua técnica articulando a esta a formação dos
profissionais que exerceriam a atividade analítica. Embora apreensivo com essa articulação, o
autor sempre foi muito cuidadoso em não impor suas sugestões técnicas sob a forma de um
manual prático a ser simplesmente obedecido, como de praxe dentro das ciências normativas.
E além de deixar isso claro em seus diversos discursos acerca da prática psicanalítica, ele
manteve sua postura não impositiva ao tratar suas advertências técnicas como recomendações
(FREUD, 1913/1996).

Nesse sentido, Freud ressaltou de maneira substancial a importância do trabalho


inconsciente que é realizado na condução de um tratamento analítico, não se deixando induzir
por critérios fixos para uma conduta ideal do profissional que se dispõe a aplicar sua técnica,
sendo esta regida por uma teoria que ele próprio sempre reconheceu como inacabada
(FREUD, 1913/1996).

Diante das ocorrências graves de tantos equívocos e falhas, Freud se viu no dever de
nortear e sobretudo preservar o trabalho dos profissionais que se colocassem a serviço da
psicanálise. Para tanto, com uma postura defensiva, ele se permitiu corrigir alguns erros e
prestar esclarecimentos sobre o método analítico a ser posto em prática, referindo-se
especialmente sobre o que o analista não deveria fazer (FREUD, 1904-1905/1996).

Conforme essa constatação, Freud relembra que já havia respondido a frequente


pergunta: “como se tornar um analista?”, com a resposta direta de que isso seria possível por
meio da análise dos próprios sonhos. Não obstante, ele reforça inclusive que não é qualquer
um e a qualquer momento que consegue realizar tal trabalho sem um suporte externo. Logo,
legitima o mérito da escola de Zurique por meio da qual se tornou obrigatório a todos os que
almejassem exercer a psicanálise em outros, o dever primeiro de se submeter ao mesmo
processo com algum profissional que domine a mesma técnica. Ele considerava o custo de se
apresentar ao outro de forma transparente como uma atitude enobrecedora e recompensável a
todo analista que assim se identificasse (FREUD, 1912/1996).

Assim, declara que o espaço analítico não só pode como deve sustentar todo tipo de
afeto manifesto na relação transferencial, a partir da qual ele enxerga como uma oportunidade
de viver, enfrentar e de elaborar os sintomas produzidos pelos conteúdos inconscientes.
Cabendo então ao analista o papel de comandar a transferência, identificar as resistências
contidas nessa relação e assim prosseguir com seu trabalho em provocar no paciente uma
reflexão que o leve ao movimento de se auto analisar diante da sua própria existência
(FREUD, 1914-1915/1996).

Ao final dessas suas recomendações, une os motivos éticos aos técnicos da psicanálise
e aponta que a chave para uma conduta ideal de um analista se estabelece a partir da postura
respeitosa e consistente do profissional tal como a honestidade entre ele e seus pacientes. E
afirma que só assim tornar-se possível estabelecer a confiança entre ambos, que constitui a
base de todo processo analítico.

O psicoterapeuta analítico tem, assim, uma batalha tríplice a travar – em sua própria
mente, contra as forças que procuram arrastá-lo para abaixo do nível analítico; fora da
análise, contra opositores que discutem a importância que ele dá às forças instintuais
sexuais e impedem-nos de fazer uso delas em sua técnica científica; e, dentro da
análise, contra as pacientes, que a princípio comportam-se como opositores, mas,
posteriormente, revelam a supervalorização da vida sexual que as domina e tentam
torna-lo cativo de sua paixão socialmente indomada (FREUD, 1914-1915/1996, Vol.
XII, p. 107).

A DIFERENÇA ENTRE A PROFISSAO E O OFICIO DE ACORDO COM A


PROPOSTA DE FREUD E QUAIS OS ATUAIS INTERESSES PELA
REGULAMENTAÇAO.
A Psicanálise nasce de uma pratica clinica que se estabelece a partir do
desenvolvimento de uma teoria que, fundamenta uma nova concepção de mundo e de homem
como um ser histórico, social e cultural e em consonância tenta compreender como se dá a
inserção desse homem na cultura. Em seus artigos ‘’ Totem e Tabu’’ (1912) e o ‘’ Mal estar
da civilização’’ (1929), Freud expõe sua visão evolutiva tanto do indivíduo como da cultura
considerando, o desenvolvimento do homem numa interação com o meio social.

Portanto, Freud(1929) em ‘’ Mal-estar da civilização’’ reflete sobre o sofrimento


psíquico a partir da relação do sujeito com o outro. Ademais, esse ‘’ mal-estar’’ por
conseguinte, seria uma resultante inevitável da concessão com o simbólico pela via da
linguagem tendo, como efeito assim, a impossibilidade de ter acesso ao todo real. Dessa
maneira o todo real se apresenta ao sujeito porem, algo sempre lhe escapará à linguagem se
tornando assim, impossível de representar.

Nesse interim, para a Psicanálise, o ensino tangencia o impossível, enquanto a


transmissão e a transferência parecem ser a via pela qual se pode ter acesso a algum saber.
Desse modo, a psicanálise questiona desde Freud, depois com Lacan, o ensino baseado na
verdade categórica. Sabe-se ainda que, a necessidade da transmissão de conceitos e
disciplinas para o saber da psicanálise é evidente porém, essa transmissão só é possível
através da contribuição de cada um de seus praticantes para encontrar seu devido lugar no
mundo. Segundo Musse (2021), “A mera transmissão de um conceito é conhecimento
morto.Transmitir algo é advertir-se de que a verdade nunca pode ser dita por completo.”

Nesse sentido, Baleeiro(2002) ainda cita:

O trabalho da psicanálise encontra-se no domínio do ambivalente, logo, tem


enfrentado desde a sua invenção, ataques quanto à sua legitimidade e,
consequentemente, problemas com a formação do analista. Como foi Freud o
primeiro, formou-se a si próprio. Inventou-se por assim dizer. Os que o
seguiram já encontraram uma porta aberta, uma profissão inventada e uma
tradição - os mais antigos analisam e supervisionam os mais novos. A
formação de um analista compreende o estudo dos textos de Freud, e
continua nos dos seus seguidores. Não se restringe ao específico da
psicanálise - porque trabalhar o ser humano não requer limites. Exige do
analista uma curiosidade intelectual que adentre no terreno da literatura, das
artes, da antropologia, da história etc.

Entretanto, pode-se observar no cenário brasileiro tentativas pontuais de


estabelecer uma regulamentação da Psicanálise tendo em vista, o rápido processo de formação
de analistas como é possível notar, por exemplo, na Sociedade Brasileira Ortodoxa de
Psicanálise. Ademais, esse fato deve-se também ao interesse de Instituições de Ensino
Superior em estabelecer um curso de graduação em Psicanalise além, da evidente crescente de
ofertas de cursos online de formação rápida que não consideram os critérios indispensáveis a
formação de um psicanalista, desde a criação da Psicanálise.

Ambas as práticas supracitadas, no entanto, vão de encontro com o que fora instituído
por Freud desde a elaboração de sua teoria. Já que, a formação em Psicanálise se configura
como continuada e singular. Continuada porque seu término tem um limite de tempo
indeterminado, sendo passível de se manter até a morte do próprio psicanalista. Sendo assim,
a formação do psicanalista é um processo permanente, realizada via textos clássicos e com os
produzidos por outros analistas, em consonância com a sua experiência pessoal e na relação
com seus analisando. Nesse sentido, apesar da formação ser frequentemente realizada em
cursos, módulos e seminários com data de início e término, isso não implica na identificação
entre formação do analista e seminários, cursos etc. realizados com este propósito. O
psicanalista se vale desses dispositivos para realizar sua formação, mas sua formação não se
reduz a eles.

Por outro lado, a formação em psicanálise é singular porque não existe um currículo
previamente determinado, mas cada psicanalista deve percorrer o seu próprio caminho nesse
processo de formação. Dessa maneira, torna-se inviável que essa formação se ajuste aos
modelos de certificação instituídos por órgãos públicos. Por conseguinte, o indicador será a
instituição que forma, quem são seus componentes e os padrões seguidos. As instituições
psicanalíticas têm a responsabilidade social de formar psicanalistas competentes, conferir-lhes
autonomia para o exercício de sua função, responsabilizando-os quanto a ética de seus atos.

3 DISTINÇAO ENTRE ANALISE E PSICOTERAPIA

Os princípios éticos da Psicanálise servem de suporte teórico e técnico para a


compreensão da singularidade do fenômeno retratado em uma pesquisa com o método
psicanalítico. A Psicanálise propõe um sujeito de Inconsciente, reconhecido naquilo que lhe é
particular, sendo, de acordo com Dockhorn e Macedo (2008), um eficiente instrumento de
reflexão e indagação a respeito da experiência humana.

Retomar um pouco o histórico da noção de escuta é imprescindível quando


pensamos em psicanálise. Em 1912, Freud apresentou um texto direcionado a médicos que
exercem a psicanálise e nele fez algumas recomendações fundamentais. É neste texto que a
noção de escuta aparece mais didática e claramente atrelada à ideia de atenção flutuante.
Segundo Sigmund Freud, é preciso que suspendamos nossa atenção e não nos detenhamos em
nenhum ponto específico da fala do paciente, para que assim, de alguma forma, possamos
ficar atentos a tudo que nos é dito. A regra freudiana de associação livre pressupõe que o
paciente fale livremente o que lhe vier à cabeça e também não selecione conteúdos
intencionais para falar ao analista. Para serem coerentes com esta regra, os analistas precisam
se desprender das influências conscientes e deixar a atenção uniformemente suspensa, sem se
fixar a um ponto qualquer. Freud diz: "Ver-se-á que a regra de prestar igual reparo a tudo
constitui a contrapartida necessária da exigência feita ao paciente, de que comunique tudo o
que lhe ocorra, sem crítica ou seleção" (FREUD, 1912, p. 150)
A noção de escuta encontra-se atrelada ao conceito de inconsciente, na medida em que
a associação livre é uma possibilidade para a investigação das próprias formações
inconscientes. Os sonhos, por exemplo, são considerados importantes formações do
inconsciente e, em análise, podem ser trabalhados por meio dos relatos dos pacientes, que os
levam a buscar um sentido oculto por seu enigma. Assim, os sonhos não são interpretáveis por
si sós, e é no espaço da análise que são investigados. Freud (1912), ao ser interrogado sobre
como alguém poderia se tornar analista, respondeu que é pela análise dos próprios sonhos,
uma vez que para esta análise é imprescindível que a pessoa esteja num processo analítico.
Desta forma, é a fala do próprio analisando que o conduz ao encontro do enigma de seus
sonhos, juntamente com a presença, com as pontuações e indagações do analista.

Freud aprendeu muito com uma de suas pacientes histéricas, que o interrompeu e
pediu que ele parasse de falar e a escutasse. Escutar implica um deslocamento da posição
narcísica, do lugar de mestre e de poder sobre o outro. O analista precisa dar atenção à
singularidade do sujeito, estar atento ao que ouve e ter curiosidade em sua escuta, como nos
diz Lacan (1979). A atenção e a curiosidade levam-no a intervir nos momentos mais
inesperados, que podem revelar algo novo, algo que impulsione o paciente a pensar de forma
diferente da que vinha pensando, que possa suspender suas verdades e que seja capaz de
surpreendê-lo.

A psicanálise enfatiza a necessidade de resgatar a singularidade da pessoa por meio de


sua fala e de sua palavra. Os alunos, por exemplo, precisam que os professores lhes deem
chances de expressarem- se por si próprios, para que possam falar e ser escutados, pois a
posição de escuta é fundamental para resgatar as particularidades e as hipóteses de cada um
(MRECH, 1999).

A escuta tem muitas consequências e é uma ferramenta imprescindível para a


investigação da subjetividade. Para dar consequência à escuta não podemos ser
compreensivos, estabelecer reciprocidade, mas ficar atentos e curiosos ao discurso do outro.
Lacan (1979) diz que nós não somos compreensivos e que a escuta deve ser exercida a partir
de duas qualidades: a curiosidade e a ignorância douta. A posição do analista de orientação
lacaniana ao escutar seu paciente é a de "douta ignorância", ou melhor, de um sábio não saber,
que impede, por exemplo, a generalização de um caso particular e único.

A Psicanálise, como singular procedimento de investigação, de acordo com Jardim e


Rojas Hernández (2010), toma por objeto de estudo os processos psíquicos inconscientes
originários da sessão analítica, revelando que no tratamento o percurso e a investigação
psicanalítica são complementares, sendo a clínica a base e a origem dessa investigação.
Portanto, para as autoras, a investigação mostra a posteriori o que surge a partir da escuta de
pacientes em análise, não sendo possíveis nem necessárias a demonstração e a comprovação,
pois os fatos clínicos obtidos são uma construção do analista/investigador a partir da escuta do
Inconsciente. Nesse sentido, as autoras afirmam que o “saber do inconsciente não é buscado
como se busca conhecer aos objetos de estudo na explicação das ciências cartesianas, o
inconsciente é encontrado, e a forma de fazê-lo não se estabelece seguindo métodos
positivistas, por ser um saber que não é possível controlar ou quantificar” (Jardim, & Rojas
Hernández, 2010, p. 535).

4 CONCLUSÃO
No referente estudo, conclui -se que a partir dos conceitos e teorias a Psicanalise,
entende -se que diante das experiências do seu próprio inconsciente é que um candidato se
capacita ao exercício de escuta em um registro que possa ser qualificado de psicanalítico.
Onde não será um título de especialista devidamente registrado em um conselho autorizara um
especialista ao seu oficio. Desse modo, constroem-se hipóteses acerca dos verdadeiros
objetivos de uma regulamentação de ensino universitário para a psicanalise.

A psicanálise é uma função que se opera a partir da experiência do analista no interior


da sua própria analise, na qual é por isso que a formação do psicanalista é tão complexa. E,
pela mesma razão, ela não existe como profissão autônoma em nenhum lugar do mundo.
Logo, a sua legalização leva a desconhecer o seu princípio fundamental, ou seja, a descoberta
do inconsciente. Em que o fazer do psicanalista não se rege por normas, estatutos elaborados a
partir de especifico e particular é um saber diferenciado em que a análise pessoal é a
experiencial fundamental para se tornar analista.

REFERÊNCIAS

BALEEIRO, Maria Clarice. Sobre a regulamentação da psicanálise. Cogito, Salvador, v. 4, p.


81-87, 2002 Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php? script=sci_arttext&
pid=S1519-94792002000100013& lng=pt&nrm=iso>.

FREUD (1914). A história do movimento psicanalítico. In: Obras Completas – Edição


Standart Brasileira, Volume XIV. Tradutores diversos. Rio de Janeiro: Imago, 1996.
FREUD(1913). Sobre o início do tratamento (Novas recomendações sobre a técnica da
psicanálise). In: Obras Completas – Edição Standart Brasileira, Volume XII. Tradutores
diversos. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

FREUD(1905). Três ensaios sobre a sexualidade. In: Obras Completas – Edição Standart
Brasileira, Volume VII. Tradutores diversos. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

FREUD(1912). Recomendações aos médicos que exercem a psicanálise. In: Obras Completas
– Edição Standart Brasileira, Volume XII. Tradutores diversos. Rio de Janeiro: Imago, 1996

FREUD(1915). Observações sobre o amor transferencial (Novas recomendações sobre a


técnica da psicanálise III). In: Obras Completas – Edição Standart Brasileira, Volume XII .
Tradutores diversos. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

MRECH, L. M. Psicanálise e educação: novos operadores de leitura. São Paulo:


Pioneira, 1999

ROUDINESCO, E. (1986). História da Psicanálise na França – A batalha dos Cem Anos,


Volume 2 (1925-1985) Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1988.

SILVA, Clarice Moreira da; MACEDO, Mônica Medeiros Kother. O método psicanalítico de pesquisa e
a potencialidade dos fatos clínicos. Psicologia: ciência e profissão, v. 36, p. 520-533, 2016

VIEIRA, Angélica Maçaneiro. A análise pessoal como pilar fundamental à formação analítica: uma
perspectiva freudiana.

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