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Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).

Aluno Olivia Oliveira Guimarães


LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL CPF - 04326633123
PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

CRIMES HEDIONDOS

(LEI 8.072/90)

Conceito

A expressão “crimes hediondos” foi introduzida pelo art. 5º, XLIII, da CF que, entretanto, relegou à lei
ordinária a definição dessa figura criminosa.
A Constituição prevê o chamado mandado de criminalização, que é uma ordem dirigida ao legislador
para que defina as condutas criminosas referentes à hediondez.
A Lei 8.072/90, ao regular o assunto, absteve-se também de traçar-lhe uma definição e resolveu adotar
o chamado critério legal ou legislativo, especificando, dentre os crimes já existentes no ordenamento jurídico,
aqueles que devem ser rotulados de hediondos.
Portanto, não há na lei uma definição técnica do que seja crime hediondo e, sim, um rol de natureza
taxativo.
O delito que não figura no aludido rol jamais poderá ser considerado hediondo, ainda que de extrema
gravidade, pois, como é sabido, é proibida a analogia “in malam partem”.
Não se seguiu assim o critério judicial, que atribui ao juiz dizer no caso concreto se o delito é ou não
hediondo, nem o critério misto, segundo o qual a lei menciona um rol meramente exemplificativo dos crimes
hediondos, autorizando o juiz a considerar também hediondos outros delitos similares. É evidente que esses
dois critérios afrontam o princípio da reserva legal.

CRIMES ASSEMELHADOS AOS HEDIONDOS

Os crimes assemelhados são os previstos no art. 5º, XLIII, da CF, ou seja, tortura, tráfico de drogas e
terrorismo. Para facilitar a memorização, note-se que os três começam com a letra “t”.
Assim como os hediondos eles são inafiançáveis e insuscetíveis de graça, indulto e anistia, além de
sofrerem outras restrições de caráter penal e processual previstas na Lei 8.072/90.
Os crimes equiparados se sujeitam, portanto, às mesmas consequências que a Constituição e a Lei
8.072/90 preveem para os crimes hediondos.
Todavia, enquanto o rol dos crimes assemelhados figura no art. 5º, XLIII, da CF, sendo, pois, cláusula
pétrea e, por isso, não pode ser alterado nem por emenda à Constituição, o rol dos crimes hediondos é fixado
por lei ordinária, suscetível assim de alteração legislativa, tanto é que, desde o advento da Lei 8.072/90, o
referido rol passou por inúmeras modificações trazidas sucessivamente pelas leis 8.930/94, 9.695/98,
11.464/2007, 12.015/2009, 12.978/2014,13.497/2.017 e 13.964//2.019.

ROL DOS CRIMES HEDIONDOS

A maioria dos crimes hediondos se localiza no Código Penal, mas cinco deles concentram-se na
Legislação Penal Especial.
O art. 1º da Lei 8.072/90 prevê o rol taxativo dos crimes hediondos.
Os delitos previstos neste rol são hediondos na forma tentada ou consumada.
Passo então à análise deste rol, iniciando pelos crimes hediondos previstos no Código Penal.

Crimes hediondos contra a vida

Dentre os crimes contra a vida, apenas o homicídio é hediondo, em duas hipóteses:


a) homicídio praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só
agente. Ainda que se considere como sendo um homicídio simples, previsto no art. 121, “caput”, do CP, nessa
situação, ele será hediondo.
b) homicídio qualificado (art. 121, §2º, I, II, III, IV, V, VI, VII, VIII e IX).

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Vê-se assim que apenas esses dois homicídios são hediondos.


Não se faz menção ao homicídio híbrido, isto é, privilegiado e qualificado ao mesmo tempo, e, diante
da lacuna, a jurisprudência dominante não o considera hediondo. De fato, no homicídio privilegiado, são
nobres as razões morais ou sociais que levam o agente a matar, sendo, pois, contraditório se reconhecer a
hediondez. Ademais, no homicídio privilegiado as circunstâncias são subjetivas e, por isso, prevalecem sobre
as qualificadoras objetivas, nos termos do art. 67 do CP.
Frise-se também que o homicídio simples (art. 121, caput) não é hediondo, salvo quando praticado em
ação típica de grupo de extermínio, ainda que por um só agente.

Crimes hediondos contra a integridade física e a saúde

Os delitos de lesão corporal dolosa de natureza gravíssima (art.129, §2º, do CP) e lesão corporal seguida
de morte (art.129, §3º, do CP) só são hediondos quando cometidos:
a) contra autoridade ou agente descritos nos artigos 142 e 144 da Constituição Federal, no exercício da
função ou em decorrência dela, ou seja, policiais e membros das Forças Armadas (Marinha, Exército e
Aeronáutica). Os policiais abrangidos pelo art. 144, “caput”, da CF são os integrantes da polícia federal, polícia
rodoviária federal, polícia ferroviária federal, polícias civis, polícias militares e corpos de bombeiros militares
e polícias penais federal, estaduais e distrital. Os guardas municipais, embora não sejam policiais, também são
abrangidos, por força do art. 144, §8º, da CF.

b) integrantes do sistema prisional, no exercício da função ou em decorrência dela. Exemplos: diretor


de presídio e funcionários de penitência. Quantos aos agentes penitenciários, são considerados policiais
penais, logo encontram-se abrangidos pelo art. 144, V, da CF.
c) integrantes da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela;
d) ou contra cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, dessas pessoas acima,
em razão dessa condição (art.1º, I-A, da Lei 8.072/90).
A lesão corporal grave contra essas pessoas não é crime hediondo, mas apenas as lesões gravíssimas e
a seguida de morte.
Quanto aos juízes e promotores de justiça que atuam na área criminal, não são abrangidos, sendo
vedada a analogia “in malam partem”.

Crimes hediondos contra o patrimônio

Os crimes hediondos contra o patrimônio são os seguintes:


a) furto qualificado pelo emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum (art.
155, § 4º-A). Trata-se do único furto que é crime hediondo.

b) roubo circunstanciado pela restrição de liberdade da vítima (art. 157, § 2º, inciso V);
c) roubo circunstanciado pelo emprego de arma de fogo de uso permitido (art. 157, § 2º-A, inciso I) ou
pelo emprego de arma de fogo de uso proibido ou restrito (art. 157, § 2º-B);
d) roubo qualificado pelo resultado lesão corporal grave ou morte (art. 157, § 3º). Antes da lei
13.964/2019, apenas o roubo qualificado pela morte, ou seja, o latrocínio, era tido como crime hediondo. Por
se tratar de uma norma que prejudica o réu, não poderá retroagir a fatos ocorridos antes de sua vigência;
e) extorsão qualificada pela restrição da liberdade da vítima, ocorrência de lesão corporal ou morte (art.
158, § 3º). O delito de extorsão só é crime hediondo na situação do art. 158, §3º, do CP. Esta hipótese foi
introduzida pela lei 13.964/2019, que em contrapartida revogou o antigo inciso III do art. 1º da lei 8.072/90,
que considerava como sendo crime hediondo a extorsão qualificada pela morte, prevista no art. 158, §2º, do
CP. A norma em análise comporta três interpretações. Primeira, a extorsão só será crime hediondo quando,
além da restrição da liberdade, houver ainda lesão corporal ou morte. Segunda, a extorsão será crime
hediondo em todas as situações do §3º do art. 158 do CP, ou seja, quando houver apenas a restrição da
liberdade ou quando, além da restrição da liberdade, ainda houver lesão corporal ou morte. Esta exegese,

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torna inócua a menção à ocorrência da lesão corporal ou morte, pois bastaria, para o delito ser hediondo, a
restrição da liberdade de locomoção. Terceira, a extorsão será crime hediondo em três situações distintas.
Primeira, quando houver restrição da liberdade, ainda que não haja lesão nem morte. Segunda, quando
houver lesão corporal, ainda que não haja restrição da liberdade. Terceira, quando houver morte, ainda que
não haja restrição da liberdade. Esta exegese não reflete o propósito da lei, pois esta se refere expressamente
ao §3º do art. 158, que cuida da extorsão com restrição da liberdade de locomoção. Não se pode, dessa forma,
considerar também como crime hediondo as extorsões dos parágrafos anteriores ou do “caput” do art. 158.
Por consequência, a extorsão qualificada pela morte, prevista no §2º do art. 158 do CP, não é mais crime
hediondo. Trata-se de uma “novatio legis in mellius” em relação ao §2º do art. 158 do CP, impondo-se a sua
retroatividade e, “in pejus”, portanto, irretroativa quanto ao §3º do art. 158 do CP.
f) extorsão mediante sequestro. Este crime sempre é hediondo, seja em sua forma simples (art. 159,
caput), seja na qualificada (§§ 1º, 2º e 3º). Quanto ao crime de sequestro, previsto no art. 148 do CP, não é
hediondo.

Crimes hediondos contra a dignidade sexual

Os crimes hediondos contra a dignidade sexual são os seguintes:


a) estupro (art. 213, “caput” e §§ 1º e 2º).
b) estupro de vulnerável (art. 217-A, “caput” e §§ 1º e 2º, 3º e 4º).
c) favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou
de vulnerável (art. 218-B, “caput” e §§1º e 2º).

Crimes hediondos contra a saúde pública

Os crimes hediondos contra a saúde pública são os seguintes:


a) epidemia com resultado morte (art. 267, §1º). Sem o resultado morte, a epidemia não será crime
hediondo.
b) falsificação, adulteração, corrupção ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou
medicinais (art. 273, caput e §1º, §1º-A e §1º-B). A sigla FACA ajuda a memorizar o nome desse crime. Anote-
se que apenas as figuras dolosas é que são crimes hediondos, ainda que a conduta recaia sobre cosméticos.

Crimes hediondos previstos fora do Código Penal

Fora do Código Penal, há ainda os seguintes crimes hediondos, tentados ou consumados:


I - o crime de genocídio, previsto nos arts. 1º, 2º e 3º da Lei nº 2.889, de 1º de outubro de 1956. Anote-
se que o genocídio é crime hediondo e não equiparado ou assemelhado a hediondo. A associação de mais de
três pessoas para a prática de genocídio também é crime é hediondo, posto que prevista no art. 2º da Lei
2.889/1.956. É o único crime de associação que é considerado hediondo. Nem mesmo a associação do art. 8º
da Lei 8.072/90, para praticar crimes hediondos ou assemelhados, é crime hediondo, pois ela não figura nesse
rol taxativo.
II - o crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso proibido, previsto no art. 16 da Lei nº 10.826,
de 22 de dezembro de 2003. Note-se que o crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito ou
permitido não é considerado hediondo. Até então não havia grande diferença pratica entre a arma de uso
restrito e a arma de uso proibido, mas com o advento da lei 13.964/2019, que passou a considerar hediondo
apenas a arma de uso proibido, a distinção, que se encontra no Decreto 9.847/2019, ganhou relevância. Na
verdade, só é hediondo o delito do §2º do art. 16 do Estatuto do Desarmamento, que dispõe: “Se as condutas
descritas no caput e no § 1º deste artigo envolverem arma de fogo de uso proibido, a pena é de reclusão, de
4 (quatro) a 12 (doze) anos.” Trata-se de “novatio legis in mellius”, pois, antes da lei 13.964/2019, também
era considerado hediondo as mesmas condutas criminosas, referentes tanto as armas de fogo de uso restrito
quanto de uso proibido, impondo-se a retroatividade da nova lei para excluir o caráter hediondo quando se
tratar de arma de fogo de uso restrito. As figuras criminosas equiparadas, previstas no § 1º do art. 16 do

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Estatuto do Desarmamento, também são crimes hediondos, desde que envolva arma de fogo de uso proibido.
Quantos aos crimes que envolvem munições e acessórios de uso proibido, a meu ver, não são hediondos, mas
o assunto ensejará polêmica, por força do princípio da gravitação jurídica, segundo o qual o acessório segue a
sorte do principal.
III - o crime de comércio ilegal de armas de fogo, previsto no art. 17 da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro
de 2003. Este delito é hediondo quer se trate de arma de fogo de uso permito, de uso restrito ou de uso
proibido. A hediondez também abrange o comércio ilegal de acessórios e munições, pois o art. 17 também se
refere a esses elementos.
IV - o crime de tráfico internacional de arma de fogo, acessório ou munição, previsto no art. 18 da Lei
nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003. Este delito é hediondo, quer a arma de fogo, acessório ou munição
seja de uso permitido, restrito ou proibido.
V - o crime de organização criminosa, quando direcionado à prática de crime hediondo ou equiparado.
A lei não prevê como hediondo crime de associação criminosa para prática de crime hediondo ou equiparado,
sendo vedada a analogia “in malam partem”. O delito de milícia, previsto no art. 288-A do CP também não é
hediondo.

Crimes militares

Quanto aos crimes militares impróprios, que são aqueles tipificados simultaneamente na Legislação
Penal comum e no Código Penal Militar, como estupro, latrocínio, homicídio qualificado e outros, paira
polêmica.
Uma primeira corrente, que é dominante, sustenta que não são crimes hediondos, pois o rol da Lei
8.072/90 faz menção expressa aos crimes do Código Penal, sendo vedada a analogia “in malam partem”.
Outra, considera que são hediondos, aplicando a interpretação extensiva, isto é, a Lei 8.072/90 quis
abranger também esses delitos. Esta última orientação não é aceita, pois o rol dos crimes hediondos é taxativo.

CONSEQUÊNCIAS DA HEDIONDEZ

Os crimes hediondos e os três que lhe são assemelhados (tortura, tráfico de drogas e terrorismo) sofrem
as seguintes restrições impostas pela Lei 8.072/90:

a) Proibição de anistia, graça e indulto. Anistia é a renúncia do Estado ao direito de punir certos fatos
criminosos.

Graça é o perdão individual concedido a determinado criminoso, isentando ou abrandando a sua pena.
Indulto é a indulgência de caráter coletivo, que extingue ou abranda a pena aplicada, ou ainda comuta
a pena, isto é, prevê a sua substituição por outra mais branda.
O art. 5º, XLII, da CF não proíbe o indulto, e, sim, a anistia e a graça.
Uma corrente, por isso, sustenta que é inconstitucional a proibição do indulto.
Outra interpreta o termo graça, previsto no art. 5º, XLII, da CF, em sentido amplo, para abranger
também o indulto.
A vedação da graça, anistia, indulto e de outros benefícios não se aplica aos crimes praticados antes da
lei que os declarou hediondos, pois a lei penal que prejudica o réu não pode retroagir.
Outra corrente, porém, sustenta que, no decreto de indulto, tendo em vista a discricionariedade do
Presidente da República, é lícita a exclusão de delitos que, antes do aludido decreto, ainda não eram
hediondos.
Ora, nada obsta que o decreto de indulto exclua expressamente determinado delito, mas a exclusão
automática, em face do caráter hediondo, se revela inconstitucional, por provocar a retroatividade da lei penal
mais severa.

b) Proibição de fiança.

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É, pois, proibida, por força da Construção Federal, a liberdade provisória com fiança.
Note-se, porém, que a lei não proíbe a liberdade provisória sem fiança que, em razão disso, pode ser
concedida aos delitos hediondos e assemelhados, conforme jurisprudência do STF.
Há quem visualize nisso uma certa ilógica, pois à medida que se veda a fiança implicitamente se veda
também a liberdade provisória sem fiança, ou seja, não há lógica em se libertar sem fiança e se proibir a
liberdade com fiança.
O STF, porém, admite a liberdade provisória sem fiança.
Aliás, nenhuma lei pode proibir a liberdade provisória, sob pena de ser reputada inconstitucional, ainda
que se trate de delitos hediondos e equiparados.

c) Prisão temporária diferenciada.

Nos crimes hediondos e assemelhados, a prisão temporária, prevista na Lei 7.960/1.989, que não se
confunde com a prisão preventiva, terá o prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável por igual período em caso de
extrema e comprovada necessidade.
Nos demais delitos, o prazo de prisão temporária é de 5 (cinco) dias, prorrogável por mais 5 (cinco).

d) Livramento condicional qualificado.

Exige-se, para obtenção desse benefício, o cumprimento de mais de dois terços da pena, nos casos de
condenação por crime hediondo e assemelhados e se veda esse benefício ao reincidente específico em crimes
dessa natureza (art. 83, V, do CP), outrossim, quando houver morte.
A reincidência específica em crimes da mesma natureza, para a corrente dominante, compreende todos
os crimes mencionados na Lei 8.072/90 (hediondos, terrorismo, tortura e tráfico de drogas), ao passo que
outra exige que os crimes sejam idênticos ou semelhantes (exemplo: estupro e estupro de vulnerável).
Os crimes hediondos e equiparados, com resultado morte, ainda que o condenado seja primário,
também não admitem o livramento condicional (art. 112, VI, “a” e VIII, da LEP).
O art. 112 da LEP, com redação dada pela Lei 13.964/2.019, veda o livramento condicional nos crimes
hediondos e equiparados, com resultado morte, silenciando nas demais situações.
Em função disso, a Defensoria Pública sustenta que o reincidente em crimes hediondos ou equiparados,
sem resultado morte, poderia obter o livramento condicional, operando-se a revogação tácita dá vedação
prevista no art. 83, V, do CP.
Esta exegese, porém, não convence, pois a menção ao resultado morte era necessária para se vedar o
livramento condicional, nessa situação, ao criminoso primário.
e) No crime de corrupção de menores, previsto no art. 244-B, §2º, do ECA, a pena aumenta de 1/3 (um
terço) no caso de crimes hediondos ou assemelhados.
f) Progressão de regime diferenciada
De acordo com o art. 112 da LEP, com redação dada pela lei 13.964/2019, a pena privativa de liberdade
será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada
pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:
- 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou
equiparado, se for primário. Antes da lei 13.964/2019, o percentual de progressão de crime hediondo ou
equiparado era de 2/5 (dois quintos), quando o apenado era primário. Na verdade, 2/5 (dois quintos) é a
mesma coisa que 40% (quarenta por cento). Portanto, trata-se de uma alteração puramente semântica. Abre-
se exceção se o apenado for condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização
criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado, pois, nesse caso, mesmo sendo
primário, o percentual será de 50% (cinquenta por cento).
- 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for condenado por exercer o comando, individual
ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado. A hipótese
não faz menção à associação criminosa, prevista no art. 288 do CP, mas apenas à organização criminosa, sendo

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vedada a analogia “in malam partem”. Aqui, não há a vedação do livramento condicional, pois a condenação
é pelo crime de organização criminosa e não por crime hediondo ou equiparado.
- 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou
equiparado. Aqui, também se exige a reincidência específica em crime hediondo ou equiparado. Este
percentual só é aplicável quando não houver o resultado morte. Não há a vedação do livramento condicional.
- 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com
resultado morte. Exige-se uma reincidência específica em crime hediondo ou equiparado com o resultado
morte.
Não se considera equiparado ao crime hediondo, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas
previsto no §4º do art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006 (§5º do art. 112 da LEP). Trata-se do
tráfico de drogas privilegiado, que se verifica quando o agente é primário, de bons antecedentes, não se dedica
às atividades criminosas nem integra a organização criminosa. O aludido delito, para efeito de progressão,
deverá observar os percentuais previstos para os delitos não hediondos ou equiparados.
Os delitos hediondos e equiparados também admitem a progressão especial do §3º do art. 112 da LEP.
A progressão especial é a que exige o cumprimento de apenas 1/8 (um oitavo) da pena no regime
anterior.
Só é possível este benefício à mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas
com deficiência.
O benefício é vedado nos crimes com violência ou grave ameaça contra pessoa e também àquelas que
integram ou integraram organizações criminosas. Outrossim, nos crimes contra seu filho ou dependente.
Exige-se ainda a primariedade e o bom comportamento carcerário.
A propósito dispõe o §3º do art. 112 da LEP, introduzido pela lei 13.771/2018:
“No caso de mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência,
os requisitos para progressão de regime são, cumulativamente:
I - não ter cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa;
II - não ter cometido o crime contra seu filho ou dependente;
III - ter cumprido ao menos 1/8 (um oitavo) da pena no regime anterior;
IV - ser primária e ter bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento;
V - não ter integrado organização criminosa”.
O cometimento de novo crime doloso ou falta grave implicará a revogação do benefício (§ 4º do art.
112 da LEP).
A aludida progressão especial, que exige o cumprimento de apenas 1/8 (um oitavo) da pena no regime
anterior, também se aplica aos crimes hediondos e equiparados, quando não houver violência nem grave
ameaça contra pessoa, desde que preenchidos os demais requisitos acima.

Causas de aumento de pena

O art. 9º da Lei 8.072/90, que prevê aumento de pena da metade a alguns crimes hediondos, quando a
vítima se enquadra no art. 224 do CP, foi revogado tacitamente, à medida que o citado art. 224 foi revogado
expressamente pela Lei 12.015/2.009.

Regime de pena

O art. 2º, §1º, da Lei 8.072/90 determina que a pena seja cumprida inicialmente em regime fechado.
O STF, no HC 111.840/ES, declarou a inconstitucionalidade dessa exigência de se iniciar a pena no regime
fechado, sob o argumento de violação do princípio da individualização da pena.
No texto original da Lei 8.072/90, proibia-se a progressão de regimes à medida que se determinava que
a pena deveria ser cumprida integralmente no regime fechado, mas a súmula vinculante nº 26 considerou
inconstitucional essa hipótese, por violar o princípio da individualização da pena.
Posteriormente, a Lei 11.464/2007 alterou a redação do §1º do art. 2º da Lei 8.072/90 para impor
apenas o regime inicial fechado, mas acabou também tendo o mesmo destino da inconstitucionalidade.

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Em suma, os crimes hediondos e equiparados admitem os três regimes: fechado. semiaberto e aberto.
Em matéria de regime de pena, seguem os mesmos critérios previstos para os demais delitos.

Benefícios permitidos

Os crimes hediondos e equiparados admitem, dentre outros, os seguintes benefícios:


a) remição da pena pelo trabalho ou estudo;
b) penas restritivas de direitos, quando não houver violência nem grave ameaça contra pessoa, desde
que preenchidos os demais requisitos legais. O dispositivo da Lei 11.343/2.006, que vedava a pena restritiva
de direitos ao delito de tráfico de drogas, foi declarado inconstitucional pelo STF, por violar o princípio da
individualização da pena.
c) prisão domiciliar, nas hipóteses do art. 117 da LEP, outrossim, quando não houver vaga no regime
semiaberto.
d) “sursis” do CP. Quanto ao “sursis”, não há vedação, podendo ser concedido aos crimes hediondos e
equiparados, sendo vedado apenas ao delito de tráfico de drogas, por força do art.44 da Lei 11.343/06.
Dificilmente, o benefício será concedido, pois, em regra, só é cabível nas condenações que não excedem a 2
(dois) anos.
e) saída temporária. Os crimes hediondos e equiparados admitem o benefício da saída temporária. Não
terá, entretanto, direito à saída temporária o condenado que cumpre pena por praticar crime hediondo com
resultado morte (§2º do art. 122 da LEP). A lei não exclui o benefício nos crimes equiparados com resultado
morte, sendo vedada a analogia “in malam partem”. Sobre o benefício, o juiz pode no regime semiaberto
autorizar a saída temporária do estabelecimento, sem vigilância direta, para que o condenado visite a sua
família, frequente curso supletivo profissionalizante de segundo grau ou superior na comarca do juízo da
execução, bem como participe de atividades que concorram para o retorno ao convívio social. Para obter este
benefício é preciso cumprir 1/6 da pena se for primário e ¼ se reincidente (art. 122 da LEP.
f) prescrição. Os crimes hediondos e os equiparados sujeitam-se à prescrição. Há, contudo, conforme
será analisado oportunamente, uma certa controvérsia sobre a prescritibilidade ou não do crime de tortura.
A Constituição, de forma expressa, reputa imprescritíveis apenas dois crimes, o racismo e a ação de grupos
armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (art.5º, XLII e XLIV).

DELAÇÃO PREMIADA

Delação premiada ou direito premial é o benefício penal concedido ao criminoso que colabora com a
justiça.
Há no ordenamento jurídico brasileiro inúmeras hipóteses, sendo que duas delas estão previstas na Lei
8.072/90, a saber:
a) Na extorsão mediante sequestro, se o crime é cometido em concurso de pessoas, o concorrente que
o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do sequestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços
(art. 159, §4º, do CP, introduzido pela Lei 8.072/90). Exige-se, para usufruir do benefício, que o delito do art.
159 do CP seja praticado em concurso de pessoas, outrossim, a eficácia da delação, isto é, que ela facilite a
libertação da vítima sequestrada. Esta delação tem a natureza jurídica de causa obrigatória de redução de
pena.
b) No crime de associação para a prática de crimes hediondos ou assemelhados, o participante e o
associado que denunciar à autoridade a associação, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida
de um a dois terços (parágrafo único do art. 8º da Lei 8.072/90). Exige-se dos requisitos. Primeiro que se trate
do delito de associação criminosa para fins de praticar crimes hediondos ou assemelhados. Segundo, que a
delação seja eficaz, isto é, viabilize o desmantelamento da associação. Esta delação também tem a natureza
jurídica de causa obrigatória de redução da pena. O delito de associação criminosa para a prática de crimes
hediondos ou equiparados não é crime hediondo.

PRIORIDADE NA TRAMITAÇÃO

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Dispõe o art. 394-A do CPP:


“Os processos que apurem a prática de crime hediondo terão prioridade de tramitação em todas as
instâncias”.
O dispositivo acima, introduzido pela lei 13.285/2016, não prevê qualquer sanção ao magistrado ou
serventuário da justiça que descumprir a norma acima.
Quanto aos crimes equipados aos hediondos, a lei é omissa. Uma primeira corrente aplica a norma legal
aos crimes equiparados aos hediondos, sendo que alguns de seus defensores utilizam-se da analogia e outros
da interpretação extensiva, ambas expressamente admitidas no processo penal, conforme art. 3º do CPP. Uma
segunda corrente considera que o dispositivo legal acima tem caráter excepcional e, conforme reza a
hermenêutica, norma excepcional não admite analogia.

CRIMES DE TORTURA

(LEI 9.455/97)

Introdução

A Constituição Federal, no seu art. 5º, III, dispõe que:


“Ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”.
Há, neste dispositivo constitucional, bem como no art. 5º, XLIII, da CF, um mandado de criminalização
implícito dirigido ao legislador ordinário para tipificar a tortura como crime.
A necessidade de uma lei específica de prevenção e punição à tortura passou a ser debatida pela
comunidade internacional, a partir da Segunda Grande Guerra Mundial.
O Brasil se tornou signatário de dois instrumentos internacionais específicos sobre a tortura:
a) Convenção da ONU contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, de 1.984, aprovada pelo
Decreto 40/91;
b) Convenção Interamericana para prevenir e punir a tortura, de 1.985, aprovada pelo Decreto
98.386/89.
O primeiro crime de tortura só foi criado no Brasil em 1.990. Era o delito do art. 233 da Lei 8.069/90
(ECA), onde figurava como vítima apenas as crianças e adolescentes.
Os delitos específicos de tortura só foram efetivamente criados pela Lei 9.455/97, que, em seu art. 4º,
revogou expressamente o art. 233 do ECA, figurando como vítimas qualquer pessoa e não apenas as crianças e
adolescentes.
É claro que, antes da lei específica, a tortura já era punida, mas como lesão corporal, constrangimento
ilegal, abuso de autoridade, etc.
Se, de um lado, a punição específica da tortura ocorreu com a Lei 9.455/97, a instituição do Sistema
Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, só se verificou com a edição da lei 12.847/2.013.

A VEDAÇÃO DA TORTURA COMO DIREITO ABSOLUTO

Na doutrina dos direitos humanos, prevalece que a vedação da tortura é um direito absoluto, pois não
comportaria nenhuma exceção.
Coloca-se então a proibição da tortura acima do próprio direito à vida, que, assim como os demais
direitos, é relativo, podendo ser sacrificado em algumas situações. Exemplos: legítima defesa, estado de
necessidade, execução da pena de morte em caso de guerra externa, aborto legal.
O tema em discussão se torna instigante quando se analisa a chamada teoria do cenário da bomba
relógio ou “Ticking Bomb Scenario Theory”, que torna lícita a tortura contra o terrorista responsável para que
ele indique o local onde a bomba se encontra, a fim de se poder desarmá-la, salvando-se assim milhares de
vidas.
A maioria dos doutrinadores de direitos humanos, conforme já dito, proíbe a tortura, mesmo nesta

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situação, por se tratar de um direito absoluto, temendo, sobretudo, que a permissão, de exceção em exceção,
acabe se transformando em regra, expandindo-se como um método de investigação.
É claro que é também possível se relativizar a proibição da tortura, na situação acima e em outras, pois,
em matéria de bens jurídicos, a proteção à vida sempre deve se sobressair. As teses de absolvição, no exemplo
acima, são: legítima defesa de terceiro, estado de necessidade de terceiro e inexigibilidade de conduta diversa,
conforme a hipótese.
Imagine, por exemplo, que um pai, cujo filho tenha sido sequestrado, torture o sequestrador até que
ele preste as informações acerca do local onde a vítima se encontra.
Na linha de raciocínio da corrente absolutista, o pai será condenado pelo crime de tortura, pois teria
agido em desacordo com o direito, enquanto que os relativistas o absolveriam pela legítima defesa de terceiro
ou outra tese similar.
É claro que a tortura não deve ser aceita como um método de investigação, mas a sua vedação absoluta,
sem comportar uma única exceção, está longe de ser aceita por todos que opinam sobre o assunto.

ESPÉCIES

A Lei 9.455/97, que regula a matéria, prevê 6 (seis) crimes de tortura, a saber:
a) Tortura-confissão ou probatória;
b) Tortura ao crime ou tortura-coação ou tortura como crime-meio;
c) Tortura discriminatória ou racista;
d) Tortura-castigo;
e) Tortura pela tortura;
f) Tortura por omissão.

SUJEITO ATIVO

Trata-se, em regra, de crime comum, praticável por qualquer pessoa. Há, entretanto, alguns delitos de
tortura que são crimes próprios. Portanto, a tortura nem sempre é crime comum.
Não obstante a referida lei tenha se inspirado na definição de tortura prevista na convenção da ONU de
1.984, da qual o Brasil é signatário, que insere como sujeito ativo apenas os agentes públicos, o certo é que, na
lei brasileira o delito de tortura não é uma exclusividade dos agentes públicos.
Se, no entanto, o sujeito ativo for agente público, a pena aumenta de um sexto a um terço (§4º do
art.1º).

OBJETIVIDADE JURÍDICA

Tutela-se a integridade física e mental, bem como a dignidade da pessoa humana.

TORTURAS DO VERBO CONSTRANGER

Dispõe o art. 1º, I, que:


“Constitui crime de tortura:
I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou
mental:
a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa;
b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;
c) em razão de discriminação racial ou religiosa”.
O art. 1º, I, da Lei 9.455/97 prevê três modalidades criminosas: tortura-prova, tortura ao crime e tortura
discriminatória ou racista.
Todas as elas apresentam os seguintes elementos comuns:
a) O núcleo do tipo é o verbo constranger, que significa coagir, forçar, obrigar a vítima a fazer ou não

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fazer alguma coisa.


b) Exige-se o emprego de violência física ou grave ameaça à pessoa. A violência física é força bruta,
abrangendo as vias de fato e as lesões corporais. Exemplos: socos, afogamento, asfixia com saco plástico,
choque elétrico, pau de arara, etc. A grave ameaça é a promessa de malefício. Exemplos: roleta russa simulada,
ameaças de agressões, etc. Na tortura com grave ameaça, não é possível o exame de corpo de delito. Na tortura
com violência física, mas que não deixa vestígios, também dispensa-se o exame de corpo de delito.
c) A consumação ocorre com o advento do resultado, que é o sofrimento físico ou mental à vítima. Não
se exige que se trate de um intenso sofrimento. Trata-se, como se vê, de crime material. Não é preciso, para a
consumação, que haja lesão corporal, pois o delito também pode ser praticado com vias de fato ou grave
ameaça.
d) Admite-se a tentativa.
e) a pena é de 2 (dois) a 8 (oito) anos de reclusão.

Tortura-prova

Na tortura-prova, também chamada de tortura-confissão, a violência ou grave ameaça é empregada


com fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa.
A vítima, a que se refere o texto legal, é a do crime de tortura.
Não é preciso que a confissão se refira a algum crime ou que haja algum inquérito ou processo
instaurado. Exemplo: o patrão tortura o empregado para obrigá-lo a confessar determinado fato. Outro
exemplo: o marido tortura a mulher para que ela assine uma confissão de dívida.
Conforme já dito, para a consumação, não se exige que a vítima ou terceiro preste a informação,
declaração ou confissão.
Cumpre ainda fazer a distinção entre a tortura-prova e o crime de abuso de autoridade, previsto no art.
13, inciso III, da Lei 13.869/2019, que dispõe o seguinte:
“Constranger o preso ou o detento, mediante violência, grave ameaça ou redução de sua capacidade
de resistência, a:
III - produzir prova contra si mesmo ou contra terceiro”.

O delito de abuso de autoridade em análise faz menção à violência física, grave e violência imprópria,
ao passo que o crime de tortura-prova só prevê a violência física e a grave ameaça.
O referido crime de abuso de autoridade não exige o sofrimento físico ou mental, que, em relação ao
crime de tortura-prova, é essencial para a consumação.
Por consequência, em havendo o dolo de causar sofrimento físico ou mental, o agente responderá pelo
crime de tortura, caso tenha constrangido a vítima, mediante violência ou grave ameaça, a produzir prova
contra si ou terceiro, através de uma confissão, declaração ou informação, absorvendo-se o delito de abuso de
autoridade, por ser de menor gravidade, por força do princípio da consunção.

Tortura ao crime

Na tortura ao crime, também chamada de tortura coação ou ainda tortura como crime-meio, a violência
ou grave ameaça é empregada para provocar a ação ou omissão de natureza criminosa, isto é, para que a vítima
pratique determinado crime. Exemplo: coagir alguém a assaltar determinado banco.
Nesse caso, responderá, em concurso material, pelo crime de tortura e pelo crime praticado pela vítima.
Esta, por sua vez, se a coação for irresistível, será absolvida (art. 22 do CP), mas se for resistível responderá pelo
crime que praticou com a atenuante genérica do art. 65, III, “c”, do CP.
O tipo penal não abrange a coação para obrigar alguém a praticar contravenção penal. Nesse caso, não
há falar-se em crime de tortura.
Para a consumação, conforme já dito, não é preciso que a vítima pratique efetivamente o crime.

Tortura discriminatória

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Na tortura discriminatória, também chamada de tortura preconceito, a violência ou grave ameaça é


empregada em razão de discriminação racial ou religiosa.
Não é qualquer discriminação que configura crime de tortura, mas apenas a motivada por raça ou
religião. Trata-se da tortura racial ou religiosa. Exemplo: agredir um judeu, causando-lhe sofrimento físico,
simplesmente por sua opção religiosa.
Note-se que não abrange a discriminação por orientação sexual ou procedência regional. Entretanto,
de acordo com o STF, os tipos penais que incriminam o preconceito racial também se aplicam à homofobia e,
nessa linha de raciocínio, a discriminação por preconceito sexual também poderá caracterizar crime de tortura.

TORTURAS DO VERBO SUBMETER

O art. 1º, II e § 1 º da Lei 9.455/97 prevê duas modalidades criminosas: tortura-castigo e tortura de
preso ou pessoa sujeita à medida de segurança (tortura pela tortura).
Ambas têm como núcleo do tipo o verbo submeter, que significa subjugar, sujeitar, dominar a vítima.
A pena é de dois a oito anos de reclusão.

TORTURA-CASTIGO (ART. 1º, II)

Dispõe art. 1º, II:


“Submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça,
a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.
Pena - reclusão, de dois a oito anos.”

Tortura-castigo, também chamada de tortura intimidatória, conforme se verifica, é submeter alguém,


sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico
ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.
Trata-se de crime próprio, pois o sujeito ativo é apenas o guardião ou outra pessoa que tem poder ou
autoridade sobre a vítima.
Uma primeira corrente, que já foi adotada no passado pelo STJ, sustenta que o delito só pode ser
praticado por agente público, de modo que a babá que aplicasse castigos físicos à criança não responderia pelo
crime de tortura. Esta exegese se revela equivocada, pois o tipo penal também se refere à guarda e autoridade,
que são inerentes aos particulares.
Uma segunda francamente dominante, admite que o delito pode ser praticado por qualquer pessoa
que exerça guarda, autoridade ou poder sobre a vítima. É a posição atual do STJ. Assim, no exemplo acima, a
babá responde pelo crime de tortura.
Cumpre frisar que o delito é próprio, pois só pode ser cometido por aquele que exerce a guarda ou tem
autoridade ou poder sobre a vítima.
A guarda é o poder dever de ter o menor ou o maior incapaz sob a sua companhia. Trata-se de um dos
atributos do poder familiar, da tutela e da curatela, outrossim, uma das modalidades de colocação da criança
ou adolescente em família substituta.
Na verdade, a guarda é só para menores e maiores incapazes. Não existe guarda para os maiores
capazes. Pode ter algo similar, como, por exemplo, alguém contrata um segurança particular, mas tecnicamente
não se trata de guarda.
É possível a guarda sem que haja poder familiar, tutela e curatela. Trata-se, nesse caso, de um instituto
autônomo. Quem tem o poder familiar ou a tutela ou a curatela automaticamente terá também a guarda, mas
o juiz pode manter o poder familiar, a tutela e a curatela e conceder a guarda a uma terceira pessoa.
Há ainda a Guarda Subsidiada ou por Incentivo, também chamada de acolhimento familiar, que é a
deferida à pessoa ou casal previamente cadastrado no programa de acolhimento familiar. O objetivo é evitar
que a criança ou adolescente seja enviado a alguma instituição (§1º do art. 34 do ECA).
Em não sendo possível a guarda subsidiada, a última “ratio” do sistema é a colocação da criança ou

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adolescente em alguma instituição. Aqui não há propriamente guarda, mas o dirigente de instituição acolhedora
torna-se responsável legal pelo menor, equipara-se, destarte, ao guardião, para todos os efeitos de direito,
conforme §1º do art. 92 do ECA, devendo garantir a assistência material e moral ao menor.
A autoridade, por sua vez, se refere a uma subordinação jurídica entre particulares. Deriva, pois, de uma
relação jurídica de direito privado. Exemplo: o professor em relação ao aluno menor, a babá em relação à
criança, os pais em relação aos filhos menores, o tutor em relação ao pupilo, o curador em relação ao curatelado.
Os pais, tutor e curador, caso detenham também a guarda, se enquadram simultaneamente, em relação
ao tipo penal, na guarda e na autoridade. Se, ao revés, não exercerem a guarda, o que é perfeitamente possível,
se enquadram apenas na autoridade.
Quanto ao significado do termo “poder”, porém, recai divergência.
A corrente restritiva sustenta que o poder consiste apenas na superioridade que um agente público
exerce sobre a pessoa torturada, em razão da sua função pública. Exemplo: carcereiro em relação ao preso.
Assim, o poder emana de uma relação jurídica de direito público, ao passo que, na autoridade, a superioridade
brota de uma relação de direito privado.
A corrente extensiva, por sua vez, considera que a expressão poder abrange qualquer situação
específica, ainda que circunstancial e ilícita, que coloca uma pessoa na condição de superioridade sobre a outra.
Portanto, o poder não tem necessariamente relação com a função pública. Qualquer situação, onde a vítima se
encontra subjugada ou dominada pelo agente, é suficiente para caracterizar uma relação de poder.
A abrangência conferida por esta corrente ao conceito de poder não foi aceita pelo STJ, que exige, para
a tipificação da tortura-castigo, uma prévia relação jurídica apta a firmar uma posição de garante do agente
sobre a vítima (Recurso especial improvido. (grifamos) (STJ, REsp 1.738.264/DF, 6ª Turma, Rel. Min. Sebastião
Reis Júnior, DJe 14.09.2018).
Houve, porém, no julgamento acima, um voto vencido do ministro Rogério Schietti, que acolheu a
corrente extensiva.
Eis alguns exemplos polêmicos:
a) a vítima de uma tentativa de furto, após dominar o meliante, tatuou em sua testa, a frase “eu sou
ladrão e vacilão”, causando-lhe sofrimento intenso. Este caso é real e teve ampla repercussão;
b) populares dominam o estuprador e passam a agredi-lo fisicamente, causando-lhe sofrimento intenso;
c) credor joga pimenta nos olhos e thinner na genitália do devedor, que não tinha como lhe pagar a
dívida, causando-lhe sofrimento intenso;
d) o marido castiga fisicamente a esposa, causando-lhe sofrimento intenso.
Nos quatros exemplos acima, a corrente restritiva nega a existência de poder e descarta a existência do
crime de tortura, ao passo que a corrente extensiva enquadra o fato no crime de tortura-castigo.
A meu ver, é preciso que a guarda, poder ou autoridade derivem de uma relação jurídica lícita, aceita
pela ordem jurídica. Não há, portanto, crime de tortura nos exemplos acima, malgrado as opiniões em contrário.
Ademais, a ampliação do conceito de poder, para abranger qualquer tipo de superioridade, tornaria
inócua as expressões “guarda” e “autoridade”, que também figuram no tipo penal.
O poder, a que se refere o tipo penal, é o respaldado pelo Direito e não o que decorre de uma situação
fática ilícita, que contrária os fins do ordenamento jurídico. Esta mesma observação também se aplica à guarda
e autoridade.
Quanto à guarda de fato que a pessoa exerce sobre o menor, sem ter sido investida por ordem judicial,
alguns autores a excluem do crime de tortura. Creio que quando se tratar de uma guarda de fato lícita,
amparada pelo Direito, como o caso de uma tia que assumiu os cuidados de um sobrinho órfão, o delito também
pode se caracterizar, mas se guarda de fato estiver à margem do Direito não há falar-se em crime de tortura.
Por outro lado, o meio de execução da tortura-castigo é a violência ou grave ameaça. Se houver
emprego de outros meios, como, por exemplo, fraude ou violência imprópria, o crime não se caracteriza.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo. Exige-se que a violência ou grave ameaça seja empregada como
forma de se aplicar castigo ou medida de caráter preventivo. Exemplo: o professor obriga o aluno a permanecer
meia hora de joelhos sobre grãos de milho.
Castigo é a punição por ato praticado.
Medida preventiva é a que visa evitar a prática de certos atos.

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Consuma-se com a ocorrência do intenso sofrimento físico ou mental.


É o único delito de tortura que exige o intenso sofrimento físico ou mental.
Quando houver violência física, será necessária a prova do intenso sofrimento físico. Caso o laudo de
exame de corpo de delito aponte apenas lesões leves, ainda assim é possível se demonstrar o intenso sofrimento
físico por outros elementos de prova.
Quando houver grave ameaça será exigida a prova do intenso sofrimento mental.
Não basta, portanto, como nas demais modalidades de tortura, o sofrimento físico ou mental, é mister
que este seja intenso, isto é, profundo, brutal, forte, exagerado. Nessa análise, leva-se em conta as condições
pessoais da vítima.
Admite-se a tentativa.
Por fim, cumpre distinguir a tortura-castigo do delito de maus tratos.
No crime de maus-tratos, previsto no art. 136 do CP, a pessoa é exposta a perigo de vida ou à saúde por
agente que também exerce autoridade, guarda ou vigilância sobre ela, mas o dolo é de repreendê-la, há um
excesso nos meios de correção ou disciplina.
Já no crime de tortura-castigo, o fim do agente é fazer a vítima sofrer, não há o objetivo de educá-la ou
ensiná-la.
Se, porém, o agente agir simultaneamente com dolo de repreender e fazer sofrer, em havendo
sofrimento intenso à vítima, o delito será também de tortura.

TORTURA PELA TORTURA (ART. 1º, §1º)

Dispõe o art. 1º, §1º:


“Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento
físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal.”
O delito em análise é denominado tortura pela tortura, pois não se exige do agente nenhum fim
específico. É também conhecido como tortura do encarcerado.
Esta tortura consiste em submeter pessoa presa ou sujeita à medida de segurança a sofrimento físico
ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei.
Exige-se, para a configuração do crime, que haja uma relação de custódia entre o sujeito ativo e o sujeito
passivo.
Uma primeira corrente ensina que se trata de crime próprio, posto que o sujeito ativo é somente o
funcionário público que, em razão dessa condição, tem acesso ao preso ou à pessoa sujeita à medida de
segurança. Exemplos: carcereiro em relação ao preso, médico do hospital psiquiátrico em relação ao doente
mental que cumpre medida de segurança, etc.
Outra corrente, ao revés, defende que o crime é comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa,
inclusive, pelos próprios presos, pois a lei não faz qualquer menção à qualidade especial do sujeito ativo.
O sujeito passivo é a pessoa presa ou sujeita à medida de segurança.
Abrange tanto o preso provisório quanto o definitivo, bem como a prisão civil do devedor de alimentos,
outrossim, a prisão disciplinar militar.
Tratando-se de adolescente apreendido em flagrante ou por ordem judicial, o crime também pode se
configurar, pois a expressão “preso” deve ser interpretada em sentido amplo, à medida que o §4º do art. 1º
refere-se expressamente à criança e adolescente como causas de aumento da pena.
Quanto à medida de segurança, a que se refere o tipo penal, para uma corrente é apenas a detentiva,
ou seja, a internação em hospital psiquiátrico ou estabelecimento similar.
Outra corrente admite que pode abranger também a medida de segurança restritiva, que é o
tratamento ambulatorial, nesse caso, o delito poderá ser também praticado pelo médico particular.
Caso o doente mental esteja interditado numa situação que não seja de medida de segurança, este
delito não se configura, mas o agente poderá responder por lesão corporal.
O tipo penal não faz menção à violência ou grave ameaça. Por consequência, o delito se configura ainda
que não haja o emprego desses meios. Exemplos: carcereiro coloca o preso numa cela escura, privação do sono,
confinamento em cubículo ou junto com animais, exposição ao frio ou calor intenso, etc.

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O dolo é genérico. Ao contrário do tipo anterior, não se exige aqui a finalidade de impor castigo pessoal
ou medida de caráter preventivo.
Consuma-se com o sofrimento físico ou mental, ainda que não seja intenso.
Admite-se a tentativa.

TORTURA POR OMISSÃO OU TORTURA IMPRÓPRIA (ART. 1º, §1º)

Dispõe o §1º do art. 1º da Lei 9.455/97:


“Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre
na pena de detenção de um a quatro anos.”
Trata-se de crime próprio, posto que praticável apenas por quem tinha o dever jurídico de evitar ou
apurar as condutas criminosas de tortura. Exemplos: policial, delegado de polícia, juiz de direito, etc.
São duas as modalidades de tortura por omissão:
a) tortura omissiva imprópria;
b) tortura omissiva própria.
Acrescente-se, ainda, que o crime de tortura por omissão, em ambas as modalidades, é apenado com
detenção e, por consequência, a pena nunca poderá iniciar-se no regime fechado e, sim, no semiaberto ou
aberto.
A pena mínima não excede a um ano e, por isso, admite-se a suspensão condicional do processo.
A tortura por omissão não é equiparada a crime hediondo, pois o art.5º, XLIII, da CF equipara aos crimes
hediondos a “prática” de tortura, indicando uma ação.

Tortura omissiva imprópria

A tortura omissiva imprópria consiste no fato de o agente deixar de evitar a tortura atual ou iminente.
Exemplo: o pai presencia a mãe torturando a criança e queda-se inerte.
Nesta modalidade, o sujeito ativo da tortura por omissão pode ser apenas a pessoa que tem o dever
jurídico de agir para impedir o resultado, nos termos do art. 13, § 2º, do CP. Exemplos: pais, tutor, guardião,
policial, etc.
O delito tem por pressuposto a ocorrência de uma tortura atual ou iminente.
Caso não houvesse o delito em análise, o agente seria punido como participe da tortura por ação, nos
termos do art. 13, § 2º, do CP, CP e a sua pena seria bem maior.
Há, por isso, entendimento doutrinário que o omitente deveria responder por um dos crimes de tortura
por ação, estudados anteriormente, cuja pena é bem maior, na condição de partícipe por omissão, nos termos
do arts. 5º, XLIII, da CF e 13, § 2º, do CP.
De acordo com esse ponto de vista, a pena branda prevista para esta tortura por omissão revela-se
inconstitucional, pois o art. 5º, XLIII, da CF teria equiparado o omitente ao comitente.
Esta exegese não tem cabimento.
De fato, o legislador é livre para prever uma pena mais branda aos delitos por omissão, pois,
ontologicamente, em regra, estes são menos graves que os delitos de ação.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo direto ou eventual.
Não se admite a forma culposa.
É, pois, master que a omissão seja dolosa, que pressupõe a consciência acerca da existência de uma
tortura atual ou iminente praticada por outrem.
O delito se consuma no mesmo momento em que se consuma a tortura por ação, ou seja, com o
resultado naturalístico.
Quanto à tentativa, é possível, pois se trata de crime omissivo impróprio ou comissivo por omissão. Se
a tortura por ação for tentada, a tortura omissiva imprópria também será tentada.

Tortura omissiva própria

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A tortura omissiva própria consiste em deixar de apurar o crime de tortura.


Nesta modalidade, o sujeito ativo é apenas o funcionário público. Exemplo: promotor de justiça, juiz de
direito, policial militar, delegado de polícia, etc.
O núcleo do tipo é o verbo deixar, que indica uma omissão definitiva. Não se pune o mero atraso ou
retardamento.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo. Não se admite a forma culposa
O delito é, ainda, omissivo próprio, consuma-se quando o agente, ao tomar ciência dos fatos, deixa de
realizar, por tempo juridicamente relevante, a ação exigida para evitar ou apurar os fatos.
A tentativa não é possível.

FORMAS QUALIFICADAS

Dispõe o §3º do art. 1º da Lei 9.455/97:


“Se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena é de reclusão de quatro a dez anos;
se resulta morte, a reclusão é de oito a dezesseis anos”.
Trata-se de qualificadora, pois tem pena própria.
A tortura seguida de morte é crime preterdoloso, isto é, exige-se que a morte seja culposa. Há, pois, o
dolo de tortura e culpa em relação ao resultado morte. Se houver “animus necandi”, dolo de matar, o agente
responde por homicídio qualificado pela tortura (art. 121, §2º, III, do CP). Se inicialmente visava apenas a tortura
e depois, no mesmo contexto, resolveu matar a vítima, responderá apenas por homicídio. A tortura será
absorvida, por força da progressão criminosa.
Igualmente, a tortura qualificada pela lesão grave ou gravíssima também é crime preterdoloso.
As referidas qualificadoras preveem uma pena de reclusão e, por isso, não se aplicam à tortura por
omissão, cuja pena é de detenção. Entretanto, os que sustentam que, na tortura por omissão, onde o agente
deixa de evitar a tortura, a pena é a do crime de tortura por ação, haveria também a incidência das qualificadoras
em análise.

CAUSAS DE AUMENTO DE PENA

De acordo com o §4º do art. 1º da Lei 9.455/97, aumenta-se a pena de um sexto até um terço:
I – se o crime é cometido por agente público. Esta expressão compreende o conceito de funcionário
público do art.327 do CP. Outra corrente considera que se trata do conceito de agente público fornecido pela
Lei de Abuso de Autoridade (art. 2º, parágrafo único, da Lei 13.869/2019). Não incide o aumento na tortura-
castigo, pois a condição de funcionário público funciona como elemento do tipo. A excludente da obediência
hierárquica não pode ser invocada para excluir a culpabilidade, pois a ordem de torturar é manifestamente
ilegal (art. 2º da Convenção da ONU).
II – se o crime é cometido contra criança, gestante, portador de deficiência, adolescente ou maior de 60
(sessenta) anos. A razão do aumento é a baixa capacidade de resistência da vítima. Quanto ao enfermo, não é
mencionado no aludido rol, mas, nesse caso, incidirá a agravante do art. 61, II, “h”, do CP).
III – se o crime é cometido mediante sequestro. A hipótese, por interpretação extensiva, também
abrange o cárcere privado. Só incide o aumento quando o sequestro visa a prática da tortura. Se o objetivo for
outro, ainda que haja sofrimento da vítima em razão das condições do cativeiro, o crime será outro (arts. 148
ou 159 do CP).
As referidas causas de aumento de pena também incidem sobre as formas qualificadas, pois se localizam
no parágrafo subsequente.

EFEITO DA CONDENAÇÃO E REABILITAÇÃO

Dispõe o § 5º do art. 1º da Lei 9.455/97:


“A condenação acarretará a perda do cargo, função ou emprego público e a interdição para o seu
exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada.”

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Há aqui duas situações distintas:


a) Efeito de condenação: perda do cargo, emprego ou função pública. Evidentemente que só é aplicável
quando o agente for funcionário público. Note-se que não há a exigência que o crime de tortura seja praticado
em razão da função. Trata-se de efeito automático da condenação, que se verifica, portanto,
independentemente de expressa menção na sentença. Em relação aos demais crimes, a hipótese é regida pelo
art. 92, I, do CP, que exige, para a perda do cargo, emprego ou função pública, expressa menção na sentença
condenatória, pois não se trata de um efeito automático.
b) Reabilitação penal: após o cumprimento da pena, o agente, para pleitear a reabilitação e assim poder
exercer funções públicas, terá que aguardar o dobro do prazo da pena aplicada. Se, por exemplo, for condenado
a três anos de reclusão, após o cumprimento da pena, terá que aguardar mais seis anos para pleitear a
reabilitação. Para os demais crimes, inclusive os hediondos, a reabilitação pode ser requerida depois de dois
anos da extinção ou cumprimento da pena. Note-se que a reabilitação não o reconduz à função pública anterior,
apenas o autoriza a exercer novamente cargo, emprego ou função pública. O particular, que é condenado pelo
crime de tortura, também se sujeita a esse prazo de reabilitação para poder exercer uma função pública.
Aplica-se também essas duas situações acima à tortura por omissão.

CONSEQUÊNCIAS

Vedação da fiança

Dispõe o § 6º do art. 1º da Lei 9.455/97:


“O crime de tortura é inafiançável e insuscetível de graça ou anistia”.
Embora não se admita a fiança, é possível a liberdade provisória sem fiança.

Anistia

A anistia também é proibida.


Quanto à lei 6.683/79, que concedeu anistia bilateral aos agentes públicos e opositores do regime
militar, na época da ditadura, foi considerada válida pelo STF, pois a proibição da anistia só ocorreu a partir da
Constituição de 1.988.
O Brasil, no entanto, foi condenado na Corte Interamericana de Direitos Humanos, pois era signatário
da Convenção das Nações Unidas Contra a Tortura, que já proibia a anistia nos crimes de lesa-humanidade.

Graça e indulto

A graça é expressamente proibida pelo § 6º do art. 1º. Outrossim, pelo art. 5º, XLIII, da CF.
Note-se que a lei e a Construção Federal não proíbem o indulto e, diante disso, uma corrente sustenta
que ele é permitido, enquanto outra também o proíbe, aplicando o art. 2º da lei 8.072/90, que veda
expressamente o indulto ao crime de tortura.
Ora, a Lei 9.455/97, que é posterior e específica, não veda o indulto e, sendo assim, parece-me
revogada, nesse aspecto, em relação ao crime de tortura, a proibição contida no art. 2º da Lei 8.072/90.
Não obstante, o STJ interpreta a expressão graça em sentido amplo para abranger também o indulto.
Portanto, de acordo com o STJ, o crime de tortura não admite o indulto.

Prescrição

A Lei 9.455/97 não considera a tortura crime imprescritível.


A Constituição Federal prevê a imprescritibilidade apenas para dois crimes: racismo e ação de grupos
armados contra a ordem democrática (art.5º, XLI e XLIV).
Uma corrente, no entanto, sustenta que o crime de tortura é imprescritível, pois é crime de lesa-

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humanidade.
Em relação a esses delitos contra a humanidade, é pacífico na jurisprudência da Corte Internacional a
imprescritibilidade, que também é prevista em resoluções da ONU, além de ser um princípio do direito
internacional.
Como o Brasil é signatário da Convenção Interamericana e de outros tratados sobre direitos humanos,
o crime de tortura seria então imprescritível.
A meu ver, não é correta esta exegese. Com efeito, há uma Convenção Internacional específica sobre a
imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade e o Brasil, até o presente momento, não subscreveu essa
Convenção.
Não se pode, sob pena de se afrontar o princípio da reserva legal, acolher uma imprescritibilidade
baseada em jurisprudência e costumes do direito internacional.
O STF já repudiou a tese da imprescritibilidade do crime de tortura. O STJ aceitou a imprescritibilidade,
mas apenas no âmbito cível, em relação à ação de indenização por danos oriundos da tortura, fundando-se no
fato de os direitos da personalidade serem imprescritíveis.

Regime de pena

Salvo na tortura por omissão, nas demais modalidades de tortura, o §2º do art. 1º da Lei 9.455/97 impõe
o regime inicial fechado. Mas esta hipótese é inconstitucional, em razão da violação do princípio da
individualização da pena, conforme jurisprudência do STF.
Por consequência, o crime de tortura por ação admite os três regimes: fechado, semiaberto e aberto.
Aplicam-se as mesmas normas de regime de pena previstas para os demais delitos.
Na tortura por omissão só é possível o regime semiaberto e aberto.

Penas restritivas de direitos

Nos crimes de tortura com violência ou grave ameaça contra a pessoa, não é possível a substituição por
pena restritiva de direitos (STJ).
Na tortura sem violência ou grave ameaça, a substituição, em tese, é possível.

Sursis
Quanto ao sursis, é possível, mas dificilmente será concedido, pois, em regra, só é possível quando a
condenação não exceder a dois anos.

Concurso de crimes

O crime de tortura absorve, por força do princípio da consunção, os delitos de lesão corporal (art.129
do CP), constrangimento ilegal (art.146 do CP), ameaça (art.147 do CP), abuso de autoridade (lei 13.869/19),
etc.

Outros efeitos

Quanto à prisão temporária, progressão de regimes e livramento condicional aplica-se o que já foi dito
no estudo da Lei 8.072/90.

EXTRATERRITORIALIDADE

Extraterritorialidade é a aplicação da lei penal brasileira aos crimes ocorridos no exterior.


O art. 2º da Lei 9.455/97 preceitua que:
“O disposto nesta lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional,
sendo a vítima brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira.”

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Há, pois, duas hipóteses para o crime de tortura praticado no exterior. Ei-las:
a) vítima brasileira;
b) vítima estrangeira.
Trata-se, na primeira hipótese, de extraterritorialidade incondicionada, pois, para se aplicar a lei penal
brasileira ao crime de tortura praticado fora do Brasil, basta que a vítima seja brasileira, não se exige outros
requisitos, como, por exemplo, a entrada do agente no Brasil. Ainda que ele seja absolvido no exterior, o Brasil
poderá julgá-lo. Igualmente quando extinta a punibilidade segundo as leis estrangeiras.
Se, no entanto, a vítima não for brasileira, o Brasil ainda assim poderá julgar o crime de tortura praticado
no exterior, desde que o agente adentre no território brasileiro. Exige-se então esta condição, o que torna a
extraterritorialidade condicionada, embora nenhuma outra condição seja exigida. Alguns autores, no entanto,
sustentam que essa extraterritorialidade também é incondicionada. Trata-se aqui da aplicação do princípio da
justiça universal ou cosmopolita, segundo o qual aplica-se a lei do país em que o delinquente se encontra,
qualquer que seja a sua nacionalidade ou o local da prática do delito. Se o agente for brasileiro, o Brasil não terá
a opção de extraditá-lo, mas se ele for estrangeiro, o Brasil terá a opção de julgá-lo ou extraditá-lo, caso outro
país tenha requerido a sua extradição.

COMPETÊNCIA

Em regra, é da Justiça Estadual.


Se, porém, o agente for funcionário público federal, que realiza a conduta no exercício funcional ou em
razão dela, a competência será da Justiça Federal.
Igualmente, segundo já decidiu o STJ, a competência será da Justiça Federal quando um preso da Justiça
Federal for torturado numa delegacia estadual.
Quanto ao funcionário público federal que pratica tortura fora das suas funções, por razões particulares,
será processado na justiça estadual.
O crime de tortura envolve grave violação de direitos humanos e, diante disso, é possível o Incidente
de Deslocamento de Competência para a Justiça Federal quando a omissão da justiça estadual colocar em risco
o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil
seja signatário (art. 109, V-A, da CF).

AÇÃO PENAL

É pública incondicionada.

LEI DE DROGAS

INTRODUÇÃO

A Lei 11.343/2006 revogou expressamente as Lei 6.368/76 e 10.409/2002, que cuidavam,


respectivamente, dos aspectos penais e processuais.
Conhecida no meio forense como “Lei de Drogas”, ela trata dos seguintes aspectos:
a) Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - SISNAD, regulado pelo Decreto 5.912/2006;
b) medidas de prevenção do uso indevido;
c) reinserção social de usuários e dependentes de drogas;
d) normas de repressão à produção não autorizada e ao tráfico de drogas;
e) cooperação internacional;
f) financiamento das políticas sobre drogas;
g) define crimes e disciplina o respectivo procedimento penal.
A propósito, dispõe o seu art. 1º:
“Esta Lei institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para

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prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece
normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas e define crimes”.
Conforme se verifica, não se trata apenas de uma lei de caráter penal, pois ela também disciplina outros
aspectos.

CONCEITO DE DROGAS

Sobre o conceito de drogas, dispõe o parágrafo único do art. 1º da Lei 11.343/2006:


“Para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar
dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder
Executivo da União”.
Vê-se assim que a substância ou produto, para caracterizar-se como sendo droga, exige dois requisitos:
a) que contenha o princípio ativo, elemento capaz de causar dependência física ou psíquica. Na
maconha, por exemplo, o princípio ativo é o Tetrahidrocanabinol (THC), caso não o contenha, não será
considerada uma droga.
b) estar assim especificada como sendo droga em lei ou relacionada em lista atualizada periodicamente
pelo Poder Executivo da União. Esta lista consta na Portaria nº 344/98 da Secretaria da Vigilância Sanitária do
Ministério da Saúde.
De acordo com o art. 67 da Lei 11.343/2006, “denominam-se drogas substâncias entorpecentes,
psicotrópicas, precursoras e outras sob controle especial, da Portaria SVS/MS nº 344, de 12 de maio de 1998”.

ATUALIZAÇÃO DA PORTARIA 344/1998

A portaria 344 deve ser periodicamente atualizada por Resoluções da Diretoria Colegiada da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), nos termos da Lei 9.782/99.
Caso a inclusão ou exclusão da droga da portaria emane de um ato monocrático de um dos diretores da
Anvisa, a alteração será nula e não extinguirá a punibilidade dos crimes anteriores, pois a atualização, para ser
válida, exige uma decisão colegiada da diretoria da Anvisa. Se, por exemplo, um diretor da Anvisa excluir da
lista o cloreto de etila, que contém o princípio ativo do lança-perfume, não haverá “abolitio criminis”.
A exclusão da droga da portaria, através de uma decisão colegiada da diretoria da Anvisa, porém, tem
o efeito de “abolitio criminis, retroagindo para extinguir a punibilidade dos fatos anteriores, inclusive, os já
transitados em julgado, ainda que posteriormente seja incluída novamente na portaria.
A inclusão da substância na portaria 344/1998 é um ato vinculado, pois é necessário que ela tenha
potencial para causar dependência física ou psíquica, mas, uma vez incluída, presume-se o seu potencial lesivo
à saúde pública, sendo vedado ao juiz excluí-la.
É, pois, incabível a perícia com o fim de se apurar se a substância constante da portaria tem ou não
potencial para causar a dependência física ou psíquica.
O que se exige é a perícia na droga apreendida para se apurar se ela contém o princípio ativo descrito
na portaria 344/1998, que a caracteriza como sendo uma droga ilícita.

ROL TAXATIVO

É taxativo o rol das drogas ilícitas constantes da portaria 344/1998.


A droga, por mais grave que seja, caso não conste desta portaria, não será crime da lei em comento,
posto que é vedada a analogia “in malam partem”.
Não constam, por exemplo, da portaria: cigarros, bebidas alcoólicas e cola de sapateiro. Nestes
exemplos não há falar-se nos delitos da Lei de Droga, mas o fornecimento, ainda que gratuito, a crianças ou
adolescentes, caracteriza o crime do art. 243 do ECA, que se revela subsidiário.
Igualmente, a entrega de produtos destinados a fins terapêuticos ou medicinais, que sejam falsificados,
adulterados, corrompidos ou alterados, caso constem da portaria 344/1998, ensejará os delitos da Lei de
Drogas, mas se não constarem da aludida portaria, o delito será o previsto no art. 273, § 1º, do CP.

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Portanto, o que distingue os delitos da Lei de Drogas dos previstos nos art. 243 do ECA e 273, § 1º, do
CP é o fato de a substância constar ou não da portaria 344/1998.

CLASSIFICAÇÃO DAS DROGAS

O termo entorpecente, utilizado na revogada Lei 6.368/76, foi substituído por droga, que é a
nomenclatura adotada pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
De fato, no sentido científico, entorpecente é apenas uma das espécies de drogas, as que causam torpor
ou sonolência, de modo que a alteração revelou-se correta.
Entretanto, a portaria 344/1998 ainda faz menção ao termo entorpecente, que é empregado em sentido
amplo.
Por isso, o art. 66 esclarece que:
“Para fins do disposto no parágrafo único do art. 1º desta Lei, até que seja atualizada a terminologia da
lista mencionada no preceito, denominam-se drogas substâncias entorpecentes, psicotrópicas, precursoras e
outras sob controle especial, da Portaria SVS/MS nº 344, de 12 de maio de 1998”.
As drogas, conforme a portaria 344/1998, classificam-se nas seguintes substâncias:
a) entorpecente: é a substância que pode determinar dependência física ou psíquica relacionada, como
tal, nas listas aprovadas pela Convenção Única sobre Entorpecentes, reproduzidas nos anexos deste
Regulamento Técnico constante da portaria 344.
b) psicotrópica: é a substância que pode determinar dependência física ou psíquica e relacionada, como
tal, nas listas aprovadas pela Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas, reproduzidas nos anexos deste
Regulamento Técnico constante da portaria 344.
c) precursoras: são as utilizadas para a obtenção de entorpecentes ou psicotrópicos e constantes das
listas aprovadas pela Convenção Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de Substâncias Psicotrópicas,
reproduzidas nos anexos deste Regulamento Técnico constante da portaria 344. Noutras palavras, as
substâncias precursoras são aquelas cuja mistura com outras podem gerar uma nova droga proibida.
d) outras substâncias sob controle especial, constantes na portaria 344.
Em termos científicos, porém, a classificação mais divulgada é a que divide as drogas em três espécies:
a) entorpecentes, também chamados de depressores ou psicolépticos. Exemplos: anestésicos, morfina
e barbitúricos.
b) estimulantes, que recebem também o nome de psicoanalépticos. Exemplos: cocaína, anfetamina e
codeína.
c) alucinógenas ou psicodélicas ou psicodislépticas. Exemplo: ácido lisérgico ou LSD.
Dentre as drogas constantes da portaria 344, constantes da portaria, cumpre mencionar as mais
comuns:
a) cocaína, que pode assumir a forma de sal cloridrato, merla ou crack;
b) maconha ou “canabis sativa lineu”, que contém o princípio ativo denominado “tetrahidrocanabinol”
ou THC.
c) LSD ou ácido lisérgido;
e) ecstasy ou MDMA;
f) cloreto de etila ou lança-perfume.

PERMISSÃO EXCEPCIONAL

Dispõe o art. 2º:


“Ficam proibidas, em todo o território nacional, as drogas, bem como o plantio, a cultura, a colheita e a
exploração de vegetais e substratos dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas, ressalvada a
hipótese de autorização legal ou regulamentar, bem como o que estabelece a Convenção de Viena, das Nações
Unidas, sobre Substâncias Psicotrópicas, de 1971, a respeito de plantas de uso estritamente ritualístico-
religioso.
O parágrafo único acrescenta que:

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“Pode a União autorizar o plantio, a cultura e a colheita dos vegetais referidos no caput deste artigo,
exclusivamente para fins medicinais ou científicos, em local e prazo predeterminados, mediante fiscalização,
respeitadas as ressalvas supramencionadas”.
Do exposto se conclui que as drogas, bem como o plantio, a cultura, a colheita e a exploração de vegetais
e substratos dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas, constantes da portaria 344/1988, serão
permitidas em três situações:
a) autorização prevista em lei;
b) plantio exclusivo para fins medicinais ou científicos, mediante autorização da União, em local e prazo
predeterminados, mediante fiscalização. Esta autorização é através de regulamento baixado pela diretoria
colegiada da Anvisa. É o caso, por exemplo, de uma plantação destinada à fabricação de remédios;
c) plantas tradicionalmente utilizadas em rituais mágicos e religiosos, conforme a Convenção de Viena
de 1971. É, por exemplo, o caso do ayahuasca, também conhecido como santo-daime. Se, porém, não houver
o fim de utilizá-lo em rituais mágicos ou religiosos, o agente responderá pelo crime.
A Anvisa tem também autorizado a importação do canabidiol, que é uma substância extraída da
cannabis sativa, muito eficaz ao tratamento da epilepsia, mas, para tanto, impõe uma série de exigências
burocráticas, inclusive, que a importação se realize através do ente público responsável pelo registro do
medicamento. O STJ, porém, admitiu a importação direta deste medicamento, para fim de tratamento da
epilepsia, com base no direito fundamental à saúde (REsp 1.657.075).

NORMA PENAL EM BRANCO

Os delitos em estudo enquadram-se como sendo normas penais em branco heterogêneas, pois o
complemento da definição criminosa é feito através de um ato administrativo, isto é, pela Portaria nº 344/98.
Não se trata de tipo aberto, cujo complemento é feito pelo juiz, mas, sim, de norma penal em branco
heterogênea.
Isso não viola o princípio da reserva legal, pois não há necessidade de a lei conter todos os elementos
do tipo legal.
Desde que a lei contenha o mínimo de determinação da conduta criminosa, é perfeitamente viável se
delegar a atos administrativos o complemento da definição do tipo penal.

SUJEITO ATIVO

Em regra, os crimes da lei de droga são comuns, pois podem ser praticados por qualquer pessoa. Há,
contudo, algumas exceções.
No verbo prescrever, que significa receitar, o delito de tráfico de droga, previsto no art. 33, é próprio,
pois só pode ser praticado por médico ou dentista.
Igualmente, o delito do art. 38, que também prevê o verbo prescrever, é próprio do médico ou
odontólogo e, no verbo ministrar, além do médico e dentista, só pode ser praticado por farmacêutico e
profissionais de enfermagem.

OBJETIVIDADE JURÍDICA

Em todos os crimes previstos na Lei 11.343/2.006, o bem jurídico protegido é a saúde pública.

PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

A Defensoria Pública sustenta que, no delito de porte de drogas para consumo próprio, deve ser
aplicado o princípio da insignificância, quando não houver a mínima possibilidade de o crime lesar a saúde
pública.
Os crimes de perigo presumido, segundo esta corrente, são inconstitucionais, pois violam o princípio da
presunção da inocência. Outrossim, afrontam o princípio da ofensividade, que exige para a tipicidade a lesão

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ou o perigo concreto de lesão ao bem jurídico.


Outra corrente, no entanto, tem rechaçado este ponto de vista, posto que os delitos da Lei de Droga
são de perigo abstrato ou presumido.
Ademais, a pequena quantidade da droga é inerente ao crime de porte para consumo pessoal. Dessa
forma, caso se aplicasse o princípio da insignificância, este delito dificilmente se configuraria.
O assunto é bem polêmico.
No âmbito do STF, já foi aplicado o princípio da insignificância num caso de o agente ser surpreendido
com 0,6 gramas de maconha, quantidade equivalente a um pequeno cigarro, mas também rejeitada a tese em
várias outras oportunidades.
Quanto ao crime de tráfico de drogas, é pacífico que não pode ser aplicado o princípio da
insignificância.

SUJEITO PASSIVO

Trata-se de crimes vagos, tendo como sujeito passivo a coletividade, titular do bem jurídico, que é a
saúde pública.
Vê-se assim que o sujeito passivo não é a pessoa para quem se entrega a droga, mas em algumas
hipóteses ela também figurará como sujeito passivo secundário, como é o caso, por exemplo, das crianças,
adolescentes e doentes mentais.

CRIMES EM ESPÉCIE

A Lei 11.343/2.006 prevê os seguintes crimes:


a) Porte de drogas para consumo próprio (art. 28, caput);
b) Plantio de drogas em pequena quantidade para consumo pessoal (art. 28, §1º);
c) Tráfico de drogas (art. 33, caput);
d) Delitos equiparados ao tráfico de drogas (art. 33, §1º);
e) Induzimento, instigação e auxílio ao uso de drogas (art. 33 §2º)
f) Uso compartilhado de drogas (art. 33, §3º);
g) Petrechos para tráfico de drogas (art. 34);
h) Associação para o tráfico de drogas (art. 35);
i) Financiamento ou custeio para o tráfico de drogas (art. 36);
j) Crime de colaboração como informante (art. 37);
k) Crime de prescrever ou ministrar, culposamente, drogas (art. 38);
l) Crime de direção perigosa de aeronave ou embarcação (art. 39).

CRIMES DE PORTE DE DROGAS PARA CONSUMO PRÓPRIO (art. 28, “caput”)

Conceito

Dispõe o art. 28:


“Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal,
drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às
seguintes penas:
I - advertência sobre os efeitos das drogas;
II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo”.
O delito em análise, como se vê, não contempla a pena privativa de liberdade que, em hipótese alguma,
poderá ser imposta ao agente.
Diante da total ausência de risco ao cerceamento da liberdade de locomoção, a medida judicial cabível
para se obter o trancamento do procedimento penal instaurado sem justa causa não será o habeas corpus,

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mas o mandado de segurança.

NÚCLEOS DO TIPO

Este delito, previsto no “caput” do art. 28, consiste em adquirir, guardar, ter em depósito, transportar
ou trazer consigo drogas para consumo pessoal.
Faz, pois, menção a cinco verbos (núcleos do tipo). Ei-los:
a) adquirir: é obter a propriedade ou a posse da droga. Exemplo: comprar a droga ou aceitá-la em
doação. A posição dominante é que se consuma com o fechamento do negócio para adquirir a droga. Outra
corrente, porém, sustenta que a consumação só se verifica com a tradição, ou seja, com o recebimento efetivo
da droga.
b) guardar: é armazenar, zelar, tomar conta da droga, em benefício de terceiro.
c) ter em depósito: é armazenar, zelar, tomar conta da droga, em benefício próprio.
d) transportar: é levar a droga de um lugar para outro, através de algum meio de locomoção que não
seja pessoal. Exemplo: levar a droga num carro ou na carroça.
e) trazer consigo: é levar a droga no corpo ou em compartimento ligado ao corpo. Exemplos: na meia
ou na bolsa.
Trata-se de um tipo misto alternativo ou de conteúdo variado, de modo que a prática sucessiva de mais
de uma conduta, mas no mesmo contexto fático, caracteriza delito único, por força do princípio da
alternatividade.
À exceção do verbo adquirir, que é crime instantâneo, nas demais modalidades o delito é permanente.
O tipo penal não prevê os verbos “usar e importar”.
Usar significa consumir a droga.
O consumo pretérito realmente não tem como ser punido, por falta de prova da materialidade. Não há,
por exemplo, crime quando a polícia apreende apenas a seringa vazia, com a qual o agente injetou heroína no
próprio corpo.
Quanto ao agente que é surpreendido consumindo a droga ou à iminência de consumi-la, em
quantidade destinada apenas ao consumo imediato, há duas situações:
a) ele mesmo trouxe a droga consigo. Nesse caso, diante da apreensão da droga, responderá pelo delito
do art. 28, no verbo trazer consigo.
b) ele não trouxe a droga, recebendo-a de terceiro para consumo imediato. Nesta situação, caso seja
surpreendido, antes ou durante o consumo, o fato será indubitavelmente atípico, pois ele não realizou a
conduta anterior de trazer consigo, que é permanente e, por isso, deve se prolongar no tempo por um tempo
além do necessário para o consumo.
A importação da droga para consumo pessoal também não é prevista no art. 28. Para uns, a importação
é uma forma de aquisição, enquadrando-se o fato no art. 28, “caput”. A meu ver, trata-se de fato atípico, pois
o art. 28 não contempla este verbo, mas se o agente tomar posse da droga, por tempo juridicamente
relevante, deverá ser incurso na modalidade trazer consigo do delito em estudo.

Elemento normativo do tipo

O elemento normativo do tipo consiste na oração “sem autorização ou em desacordo com


determinação legal ou regulamentar”.
É preciso que a denúncia, sob pena de inépcia, descreva o elemento normativo do tipo.

Elemento subjetivo do tipo

O elemento subjetivo do tipo é dolo, que consiste na vontade consciente de realizar uma das condutas
descritas no tipo penal.
Exige-se ainda o elemento subjetivo especial, que é o fim de consumo pessoal.

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Distinção entre tráfico e consumo pessoal

A Lei 11.343/2006 conferiu tratamento diferenciado ao usuário, vedando-se, em relação a ele, a


aplicação de pena privativa de liberdade.
Aliás, em relação ao usuário, o juiz determinará ao Poder Público que coloque à sua disposição,
gratuitamente, estabelecimento de saúde, preferencialmente ambulatorial, para tratamento especializado (§
7º do art. 28). Este tratamento só é destinado ao dependente da droga e não ao usuário eventual Trata-se
de um tratamento gratuito e voluntário, pois o agente tem a liberdade de realizá-lo ou não.
No tráfico de drogas, o agente tem o propósito de entregar a droga a uma terceira pessoa, a título
oneroso ou gratuito, sendo, pois, indiferente à tipicidade o fim de lucro.
No consumo pessoal, o agente tem o intuito de consumir a droga.
Para determinar se a droga destina-se ao consumo pessoal, o juiz, de acordo com o §.2º do art. 28,
analisará os seguintes aspectos:
a) a natureza da droga, ou seja, o tipo de droga.
b) a quantidade da droga. Em regra, o consumo pessoal só se caracteriza quando houver uma pequena
quantidade, mas, em determinadas situações justificáveis, é possível que o agente adquira uma quantidade
maior para consumo próprio, por exemplo, para aproveitar o preço barato. Convém também destacar que a
pequena quantidade de droga apreendida, por si só, não exclui o crime de tráfico, pois pode se tratar, inclusive,
de uma estratégia do agente.
c) local do crime. Há, pois, indício de tráfico quando o agente é surpreendido com cocaína num ponto
de drogas.
d) as condições em que se desenvolveu a ação. É, por exemplo, tráfico quando o agente é surpreendido
com pequena quantidade de cocaína, mas com uma balança para pesá-la.
e) as circunstâncias sociais. Há, por exemplo, indício de tráfico, quando o sujeito, em situação de
penúria, é surpreendido com uma droga extremamente cara.
f) as circunstâncias pessoais. Uma pessoa famosa que, para não se expor outras vezes, adquire, num
único ato, um quilo de maconha para consumo pessoal, pode ser enquadrada no art. 28.
g) a conduta social. Trata-se do comportamento anterior do agente. O fato de ser viciado em droga,
porém, por si só, não exclui a possibilidade de ser também traficante.
f) os antecedentes do agente. O passado criminoso, que revela condenações por tráfico,, não pode
excluir, por si só, o intuito de consumo pessoal, sob pena de violação do princípio da presunção da inocência,
mas, aliado a outras provas, pode complementar a prova do tráfico.
No Brasil, como se vê, não se adota o sistema da quantificação legal. Neste sistema, acima de uma
determinada quantidade de drogas, prevista em lei, há o crime tráfico e abaixo dela o consumo pessoal.
Em nosso país, adota-se o sistema do reconhecimento judicial, que atribui ao juiz o poder de dizer se,
no caso concreto, a quantidade da droga, aliada a outros critérios, caracteriza tráfico ou consumo pessoal.
O ônus da prova de que se trata de tráfico compete ao Ministério Público.
É flagratrnte a violação do princípio da presunção da inocência, quando se sustenta que é ônus da defesa
demonstrar o fim de consumo pessoal, sob pena de incidir no delito de tráfico de drogas.
Caso o Ministério Público não consiga demonstrar que se trata de tráfico, o delito deverá ser
desclassificado para o art. 28.
Igualmente, na hipótese de dúvida acerca do tráfico, impõe-se também a aplicação do delito do art. 28,
por força do princípio “in dúbio pro reo”.

Consumação e tentativa

O delito do art. 28 se consuma com a simples conduta, ainda que não haja o efetivo consumo da droga.
Admite-se, em tese, a tentativa, quando o agente, através de atos de execução, exterioriza a vontade
de realizar a conduta, mas não a concretiza por circunstâncias alheias à sua vontade.

Penas

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O agente, no crime do art. 28 será submetido às seguintes penas:


a) advertência sobre os efeitos da droga;
b) prestação de serviços à comunidade;
c) medida educativa de comparecimento a programas ou cursos educativos.
As referidas penas poderão ser aplicadas isoladas ou cumulativamente, bem como substituídas a
qualquer tempo, ouvidos o Ministério Público e o Defensor (art. 27).
A substituição, que é a troca de uma pena por outra, é cabível quando a medida imposta revelar-se
insuficiente para a prevenção e reprovação do crime.
Apenas estas três penas podem ser substituídas entre si. Não se pode, destarte, substitui-las por multa
ou outra pena não prevista no art. 28.
É claro que a substituição depende de motivo justo e exige a prévia oitiva do condenado e a
manifestação do seu advogado ou defensor, sob pena de violação dos princípios do contraditório e da ampla
defesa. Outrossim, de requerimento do Ministério Público, sob pena de violação do princípio da inércia da
jurisdição.
As três penas acima podem ser impostas através da transação penal ou de sentença penal condenatória.
Passo então à análise de cada uma delas.

Advertência sobre os efeitos da droga

Trata-se de uma censura verbal feita pelo juiz, que será reduzida a termo, acerca dos efeitos maléficos
da droga ao indivíduo e à sociedade, sendo essencial a presença do advogado ou defensor público, malgrado
o silêncio da lei.
A aludida pena esgota-se no ato, pois não tem uma duração temporal.
Caso o agente não compareça injustificadamente à audiência de advertência, será cabível a sua
condução coercitiva.

Prestação de serviços à comunidade

A prestação de serviços à comunidade tem a duração máxima de 5 (cinco) meses, se primário, ou 10


(dez) meses, se reincidente.
Quanto à reincidência, que eleva a aludida pena para 10 (dez) meses, para uns, é a específica no delito
do art. 28, enquanto outros admitem a reincidência em qualquer tipo de infração penal, pois a lei não faz
qualquer distinção. De fato, a exigência de reincidência específica, por ter caráter excepcional, só é possível
nos casos expressos em lei.
Convém observar que a lei não prevê o limite mínimo desta pena, mas apenas o máximo. Por
consequência, a reprimenda mínima poderá ser de uma hora. Nada obsta, destarte, que o juiz a fixe em
horas, dias ou semanas.
De preferência, esta pena deverá ser cumprida em estabelecimentos de prevenção e recuperação de
usuários e dependentes de drogas.
De fato, dispõe o §5º do art. 28:
“A prestação de serviços à comunidade será cumprida em programas comunitários, entidades
educacionais ou assistenciais, hospitais, estabelecimentos congêneres, públicos ou privados sem fins
lucrativos, que se ocupem, preferencialmente, da prevenção do consumo ou da recuperação de usuários e
dependentes de drogas”.
A prestação de serviços à comunidade da Lei de Drogas não tem caráter substitutivo da pena privativa
de liberdade e nem pode ser convertida em prisão, sendo prevista diretamente no preceito secundário do art.
28, ao passo que a pena de prestação de serviços à comunidade do Código Penal substitui a pena privativa de
liberdade, além disso, não é prevista no preceito secundário do tipo penal e, em caso de descumprimento,
pode ser convertida em prisão.
Quanto à quantidade de horas que o sujeito poderá trabalhar por dia, a Lei de Drogas é omissa e, por

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isso, aplica-se, nos termos do art. 12 do CP, as normas gerais do Código Penal que, no § 3o do art. 46, prevê
que as tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do condenado, devendo ser cumpridas à razão de uma
hora de tarefa por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho.

Medida educativa de comparecimento a programas ou cursos educativo

A pena de comparecimento a programas ou cursos educativos tem a duração máxima de 5 (cinco)


meses, se primário, ou 10 (dez) meses, se reincidente.
Quanto à reincidência, que eleva a sanção para 10 (dez) meses, para uns, é a específica no delito do art.
28, enquanto outros admitem a reincidência em qualquer tipo de infração penal, pois a lei não faz qualquer
distinção. Ademais, a exigência de reincidência específica, por ter caráter excepcional, só é possível nos casos
expressos em lei.
Convém observar que a lei não prevê o limite mínimo, mas apenas o máximo. Por consequência, a
reprimenda mínima poderá ser de uma hora. Nada obsta, destarte, que o juiz a fixe em horas, dias ou
semanas.
Não se exige que se trate programa ou curso educativo sobre drogas, pois o objetivo da lei, ao prever
esta medida, foi a de buscar a reinserção social do condenado. Por consequência, abrange qualquer programa
ou curso educativo. Exemplos: curso de informática, cursos profissionalizantes, curso de pós graduação, etc.
A lei também admite o programa educativo, por exemplo, vídeos sobre determinados assuntos.

Medidas coercitivas

Dispõe §6º do art. 28:


“Para garantia do cumprimento das medidas educativas a que se refere o caput, nos incisos I, II e III, a
que injustificadamente se recuse o agente, poderá o juiz submetê-lo, sucessivamente a:
I - admoestação verbal;
II - multa.
Assim, se o agente recusar-se a cumprir a prestação de serviços à comunidade ou a comparecer aos
cursos ou programas educativos, poderá o juiz submetê-lo, sucessivamente a:
a) admoestação verbal;
b) multa de 40 (quarenta) a 100 (cem) dias – multa.
Não há como se vê, qualquer possibilidade de o agente responder por crime de desobediência, pois a
lei já prevê as consequências pelo descumprimento das medidas.
Também não há a possibilidade de conversão em prisão, pois a consequência prevista, após o fracasso
da advertência, é a multa.
Convém esclarecer o caráter sucessivo da multa, que será aplicada somente se, após a advertência
acima, o agente insistir em não prestar serviços à comunidade ou em não comparecer a programas ou cursos
educativos.
Não se pode, destarte, aplicar simultaneamente a admoestação e a multa.
Sobre a natureza jurídica da admoestação e da multa, é pacífico que não são penas, mas, sim, medidas
coercitivas de natureza extrapenal, impostas para garantir o cumprimento das duas penas acima, tanto é que
não as elimina, apenas as complementa.
Feitas estas considerações, passo agora a examiná-las em separado.

Admoestação verbal

A admoestação verbal é um aviso feito pelo juiz ao autor da infração penal acerca da possibilidade de
lhe ser aplicada a pena de muita.
Distingue-se da pena de advertência verbal, onde o juiz aborda os efeitos deletérios da droga.
A admoestação verbal é aplicada pelo juiz numa audiência especialmente destinada a este fim, que
contará também com a presença do defensor e do Ministério Público.

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Caso o autor do delito não compareça sem motivo justo, o juiz poderá ordenar a sua condução coercitiva
ou designar uma nova audiência com condução coercitiva.
É razoável também se sustentar que, diante do não comparecimento injustificado, o juiz poderá lhe
aplicar diretamente a multa coercitiva.

Multa coercitiva

A multa coercitiva pode variar entre 40 (quarenta) a 100 (cem) dias – multa.
Cada dia-multa, atento à situação econômica do agente, será arbitrado pelo juiz entre 1/30 (um trinta
avos) até 3 (três) vezes o valor do salário mínimo, sendo que o dinheiro arrecadado será destinado ao Fundo
Nacional Antidrogas.
A referida multa, conforme já dito, não tem natureza penal, mas extrapenal, pois se trata de uma
medida coercitiva, destinada a pressionar psicologicamente o autor do delito a cumprir as penas educativas
do art. 28.
E, diante da sua natureza extrapenal, força convir que, em caso de morte do devedor, ela se transmite
aos herdeiros até as forças da herança, nos termos do art. 1792 do CC, ao contrário da multa penal, que é
intransmissível.
A multa coercitiva pode ser aplicada várias vezes, nas hipóteses de o agente persistir em não cumprir
as penas educativas, mas a soma de todas elas não poderá exceder ao teto máximo de 100 (cem) dias multa.
Prescrição

Dispõe o art. 30:


“Prescrevem em 2 (dois) anos a imposição e a execução das penas, observado, no tocante à interrupção
do prazo, o disposto nos arts. 107 e seguintes do Código Penal”.
Conforme se verifica, a prescrição bienal atinge tanto a prescrição punitiva quanto a prescrição
executória.
Quanto à multa coercitiva, também prescreve em 2 (dois) anos, pois é acessória em relação às duas
penas educativas, cujo prazo prescricional é de 2 (dois) anos.
O art. 30 tem um erro ortográfico, pois, no tocante à interrupção da prescrição, se refere ao art. 107 do
CP, quando o correto é o art. 117.
São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor
de 21 (vinte e um) anos, ou, na data da sentença, maior de 70 (setenta) anos (art. 115 do CP).

Natureza jurídica do art. 28

Discute-se se, em relação ao delito do art. 28 em estudo, houve a descriminalização ou a despenalização.


Na descriminalização, o fato deixa de ser crime. Trata-se da “abolitio criminis”.
Na despenalização, o fato continua sendo crime, mas a pena privativa de liberdade não é prevista pela
lei ou, quando prevista, o juiz pode substituí-la por penas de outra natureza (restritivas de direitos, multa,
etc.).
A nomenclatura despenalização, que foi utilizada no sentido acima pelo Supremo Tribunal Federal, não
se revela adequada, pois o direito penal, além das penas privativas de liberdade, prevê também outras
espécies de penas.
A meu ver, o se deliberou denominar de descriminalização é, na verdade, a descarcerização.
Há sobre o assunto duas correntes.
Primeira, houve descriminalização, ou seja, o fato deixou de ser crime. É o que ensina Luiz Flávio Gomes,
segundo o qual a Lei n° 11.343/2006 (art. 28) aboliu o caráter ‘criminoso’ da posse de drogas para consumo
pessoal. Esse fato deixou de ser legalmente considerado “crime” (embora continue sendo um ilícito “sui
generis”, um ato contrário ao direito). Houve, portanto, descriminalização formal, mas não legalização da
droga (ou descriminalização substancial).
O fundamento desta corrente é que a Lei de Introdução ao Código Penal estabelece, para o crime, a

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pena abstrata de reclusão ou detenção, de forma isolada, alternada ou cumulada com multa.
No tipo penal do art. 28, a pena não é de reclusão nem detenção, por consequência, consoante este
ponto de vista, não se trata de crime.
Segunda corrente, adotada pelo Supremo Tribunal Federal, trata-se de crime. Não houve, destarte, a
descriminalização, mas, apenas a despenalização.
Com efeito, o art. 28 é classificado expressamente como crime no capítulo III da Lei 11.343/2.006.
Ademais, a Lei de Introdução do Código Penal não é hierarquicamente superior à Lei de Drogas para lhe
impor limites à criação de crime.
Realmente, trata-se de crime.
O fato de a Lei de Introdução ao Código Penal estipular para o crime uma pena abstrata de reclusão ou
detenção, não impede que outros leis posteriores e do mesmo nível hierárquico preveja, para o crime, uma
pena abstrata diversa.
Ademais, as penas privativas de liberdade não são as únicas do direito penal, que pode estipular outras,
conforme art. 5°, XLVI, da CF, que prevê um rol exemplificativo das possíveis penas.
Acrescente-se ainda que a tendência do Direito Penal é reduzir, cada vez mais, as penas privativas de
liberdade.
Por conseguinte, como ensina Paulo Queiroz, ao não cominar pena privativa da liberdade, o art. 28 não
implicou “abolitio criminis”, mas simples despenalização, isto é, manteve a criminalização, mas optou por
vedar a pena privativa da liberdade.
Dessa forma, por se tratar de crime, deveria gerar a reincidência e maus antecedentes.
De acordo com o STJ, porém, a contravenção penal não gera reincidência nem maus antecedentes,
mesmo sendo punida com prisão simples, por consequência, o delito do art 28, cujas penas são bem mais
brandas, também não pode gerar reincidência nem maus antecedentes.

Inconstitucionalidade do art. 28

Primeira corrente, o art. 28 é inconstitucional, segundo alguns autores, pois a incriminação da conduta,
em circunstâncias onde não há perigo concreto para terceiros, viola o direito à intimidade e à vida privada,
previsto no art. 5º, X, da CF. Outrossim, ofende o princípio da ofensividade, segundo o qual não há crime sem
lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico.
Outra corrente, porém, nega a existência de qualquer inconstitucionalidade, pois o direito individual
não pode prevalecer sobre o interesse social em se punir a conduta que gera um perigo presumido à saúde
pública. Aliás, o consumo de drogas acaba estimulando também outras pessoas a consumirem e, dessa forma,
expõe a perigo a saúde pública.

Aplicação das normas do JECRIM

Aos delitos do art. 28 aplicam-se as normas dos Juizados Especiais Criminais, por força do §1º do art.
48.
Tecnicamente, porém, não se trata de infração de menor potencial ofensivo, posto que não se sujeita a
pena privativa de liberdade.
A autoridade policial não instaura inquérito por este crime, e, sim, termo circunstanciado.
A competência para o julgamento é do JECRIM estadual, de modo que, desclassificado pela justiça
federal o delito de tráfico internacional de drogas para a figura típica do art. 28, os autos do processo devem
ser remetidos ao JECRIM estadual.
O delito do art. 28 admite a transação penal.
A propósito, dispõe o § 5º do art. 48:
“Para os fins do disposto no art. 76 da Lei nº 9.099, de 1995, que dispõe sobre os Juizados Especiais
Criminais, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena prevista no art. 28 desta Lei, a ser
especificada na proposta”.
No tocante à transação penal, o Ministério Público só poderá propor as três penas previstas no art. 28,

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de forma isolada ou cumulada.


Além disso, poderá também inserir na proposta de transação, para a hipótese de descumprimento das
duas medidas educativas, a admoestação verbal e, sucessivamente, a multa.
A transação, no art. 28, não pode prever a multa, a não ser sucessivamente.
Assim, o descumprimento injustificado da transação penal não ensejará o oferecimento da denúncia,
mas a admoestação verbal.
Caso persista o descumprimento, ainda assim, não haverá denúncia, mas a aplicação da multa
coercitiva.
Depois disso, se o descumprimento persistir, daí sim o Ministério Público poderá ofertar a denúncia.
Em cada descumprimento injustificado, o juiz deverá designar uma audiência admonitória, ouvir o autor
da infração penal, na presença do Ministério Público e do seu defensor, dar oportunidade ao contraditório e
ampla defesa, para só depois aplicar as medidas coercitivas de admoestação e multa.
Em não sendo proposta a transação penal, será ainda cabível a suspensão condicional do processo.

Vedação da prisão em flagrante

Tratando-se da conduta prevista no art. 28, não se imporá prisão em flagrante, devendo o autor do fato
ser imediatamente encaminhado ao juízo competente ou, na falta deste, assumir o compromisso de a ele
comparecer, lavrando-se termo circunstanciado e providenciando-se as requisições dos exames e perícias
necessários (§2º do art. 48).
Se ausente a autoridade judicial, as providências previstas no § 2º deste artigo serão tomadas de
imediato pela autoridade policial, no local em que se encontrar, vedada a detenção do agente (§ 3º do art.
48).
Concluídos os procedimentos de que trata o § 2º deste artigo, o agente será submetido a exame de
corpo de delito, se o requerer ou se a autoridade de polícia judiciária entender conveniente, e em seguida
liberado (§4º do art. 48).
Conforme se pode verificar, em caso de flagrante, não se imporá, em hipótese alguma, a prisão em
flagrante.
Ele será, entretanto, capturado e conduzido coercitivamente até o juiz competente, mas o auto de
prisão em flagrante não será lavrado, nem mesmo na hipótese de o agente se recusar a assumir o
compromisso de comparecer ao JECRIM.
Note-se que a lei prevê o seu encaminhamento ao juízo competente e, somente na ausência do juiz, é
que será encaminhado à autoridade policial.
Conquanto, na prática o encaminhamento seja quase sempre feito ao Distrito Policial, ainda que
presente o juiz competente, o certo é que o Plenário do STF, em julho de 2020, decidiu que, em caso de
flagrante pelo crime de posse ou plantio de drogas para consumo próprio, o encaminhamento do agente só
pode ser feito à autoridade policial na ausência de juiz.
O STF ainda foi além, pois decidiu que o magistrado ainda deverá lavrar o TC (Termo Circunstanciado) e
requisitar o exame pericial da droga.
De acordo com a relatora, ministra Carmen Lúcia, as normas foram editadas em benefício do usuário de
drogas, visando afastá-lo do ambiente policial quando possível e evitar que seja indevidamente detido pela
autoridade policial.
A lavratura do TC pelo juiz, segundo o STF, não implica em usurpação da função investigativa que é
atribuída à autoridade policial, pois o TC é uma peça Informativa e não investigativa.
De qualquer maneira, lavrado o termo circunstanciado, libera-se o agente, que não poderá ser preso
em flagrante, ainda que não assuma o compromisso de comparecer ao JECRIM.

CRIME DE PLANTIO DE DROGA EM PEQUENA QUANTIDADE PARA CONSUMO PESSOAL (ART. 28, §1º)

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Dispõe § 1º do art. 28:


“Às mesmas medidas submete-se quem, para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas
destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física
ou psíquica.”
Este delito consiste em semear, cultivar e colher plantas destinadas à preparação de pequena
quantidade de drogas para consumo pessoal. Exemplo: usuário planta maconha no vaso ou no quintal de sua
casa.
Na vigência da lei 6.368/76, hoje revogada, a hipótese era tratada como crime de tráfico de drogas.
Trata-se, assim, de "novatio legis in mellius", retroagindo para atingir os fatos anteriores, ainda que
transitados em julgado.
Aplica-se a este delito tudo o que foi dito sobre o crime anterior, inclusive quanto à pena.
Os núcleos do tipo são os verbos:
a) semear: é plantar ou lançar as sementes ao solo para elas germinarem.
b) cultivar: é tratar da planta para que ela se desenvolva.
c) colher: é separar os produtos produzidos pelo solo.
Trata-se de um tipo misto alternativo, de modo que a prática sucessiva de mais de uma conduta, mas
no mesmo contexto fático, caracterizará um único delito, por força do princípio da alternatividade.
O objeto material são as plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou
produto capaz de causar dependência física ou psíquica.
Note-se que o tipo penal não faz menção à pequena quantidade de plantas, mas sim à pequena
quantidade de drogas que, através das plantas, se visa preparar.
Se, para se preparar uma pequena quantidade de drogas, se exige uma grande quantidade de plantas,
é possível se caracterizar o delito em análise.
Se, ao revés, uma pequena quantidade de plantas for capaz de produzir uma grande quantidade de
drogas, o agente poderá responder pelo delito de tráfico de drogas.
É, pois, preciso analisar a quantidade de drogas que é capaz de ser produzida por cada planta.
É essencial para que o agente seja enquadrado no tipo penal em análise, que as plantas sejam capazes
de produzir apenas o necessário para o consumo pessoal, pois se tiverem potencial para produzirem mais que
isso, o agente responderá pelo delito de tráfico de drogas.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar as condutas
descritas no tipo penal.
É ainda necessário o elemento subjetivo específico, que consiste no fim de consumo pessoal.
Se houver o plantio para uso compartilhado de pessoas de relacionamento do agente, impõe-se, por
analogia “in bonam partem”, a incidência do delito previsto no § 3º do art. 33 da Lei 12.343/2006, excluindo-
se o delito de tráfico.
Quanto ao elemento normativo, consubstanciado na oração “sem autorização ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar”, não é previsto expressamente, mas se considera, contudo, implícito no
tipo penal, pois, diante de uma autorização legal ou regulamentar, não há falar-se em crime.
A consumação ocorre com a conduta, ainda que não seja realizada a preparação da pequena quantidade
de drogas.
Admite-se a tentativa.

CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT)

Conceito

Dispõe o art. 33, caput:


“Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter
em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer
drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

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Pena- reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e
quinhentos) dias-multa”.

Crimes equiparados aos hediondos

O art. 5º, XLIII, da CF equipara aos hediondos o delito de tráfico ilícito de drogas.
A Lei 11.343/2006, porém, não prevê a nomenclatura dos crimes relacionados com drogas.
Dessa forma, não há na lei nenhum delito com nome legal de tráfico de drogas e, diante disso, o assunto
é polêmico.
De acordo com a corrente restritiva, os delitos de tráfico de drogas, equiparados aos hediondos, a que
se refere o art. 5º, XLIII, da CF, são apenas os previstos no art. 33, caput, e as figuras equiparadas do §1º do
art. 33. É a posição dominante.
A corrente extensiva, porém, apregoa que, além do art. 33, “caput”, e das figuras equiparadas do §1º
do art. 33, ainda devem ser equiparados a hediondos os delitos dos arts. 34, 36 e 37. Discordo desta exegese,
pois o delito do art. 34 trata do tráfico de máquinas e de outros objetos destinados à produção das drogas, ao
passo que a Constituição Federal, ao cuidar da equiparação, se restringe ao tráfico de drogas, sendo vedada a
analogia “in malam partem”. O art. 36, por sua vez, que prevê o crime de financiamento ou custeio destinado
ao tráfico de drogas, conquanto tenha uma pena maior que a do art. 33, “caput”, não é um tráfico de drogas,
tanto é que se consuma ainda que o tráfico não se realize . Quanto ao delito do art. 37, incrimina o informante
do tráfico que, por força de lei, não é considerado traficante.
O fato de os arts. 34, 36 e 37 se sujeitarem às restrições, previstas no art. 44, não os transformam num
tráfico de drogas.
Quanto ao delito de associação para o fim de tráfico de drogas, apesar de também sofrer as restrições
do art. 44, não é equiparado a hediondo por nenhuma das correntes acima.

Sujeito ativo

Trata-se de crime comum, praticável por qualquer pessoa, inclusive, pelo usuário ou dependente.
Abre-se exceção ao verbo prescrever, que significa receitar, cuja prática só é possível pelo médico ou
dentista, e, por isso, caracteriza-se como sendo crime próprio.

Participação por omissão

Quanto ao terceiro que estava junto com o agente, mas que não realizou nenhuma das condutas
criminosas, não responderá como participe, ainda que tenha ciência da existência da droga, pois a lei não lhe
impõe o dever jurídico de agir.
Assim, a omissão, por si só, não gera participação, salvo quando houver o dever jurídico específico de
agir, nos termos do art. 13, §2º, do CP. Exemplo: a mulher do traficante, que estava junto com o marido no
veículo que ele transportava a droga, não responde pelo delito, mesmo tendo ciência do transporte.
Igualmente, não responde pelo crime a pessoa que, ciente do transporte da droga, pediu carona ao
traficante.
Se, porém, a mulher do traficante ou o caronista for um policial, haverá a participação por omissão,
pois, nesse caso, existe o dever jurídico de agir.

Elementos objetivos do tipo

O tipo penal prevê 18 (dezoito) verbos. Ei-los:


1) adquirir: é obter a propriedade ou a posse da droga. Exemplo: comprar a droga ou aceitá-la em
doação. A posição dominante é que se consuma com o fechamento do negócio para adquirir a droga. Por
consequência, não há necessidade da apreensão da droga. Outra corrente, porém, sustenta que a consumação
só se verifica com a tradição, ou seja, com o recebimento efetivo da droga.

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2) guardar: é armazenar, zelar, tomar conta da droga, em benefício de terceiro.


3) ter em depósito: é armazenar, zelar, tomar conta da droga, em benefício próprio.
4) transportar: é levar a droga de um lugar para outro, através de algum meio de locomoção que não
seja pessoal. Exemplo: levar a droga num carro ou na carroça.
5) trazer consigo: é levar a droga no corpo ou em compartimento ligado ao corpo. Exemplos: na meia
ou na bolsa. bolso.
6) importar: é trazer a droga do exterior para o Brasil. Não é preciso que traga pessoalmente a droga. A
importação pode ocorrer pelas vias aéreas, terrestres e marítimas. Consuma-se quando a droga ingressa no
território nacional e não quando ela chega ao destino almejado.
7) exportar: é levar a droga do Brasil para o exterior. Consuma-se quando a droga transpõe a fronteira
brasileira ou a zona aduaneira, ainda que ela não chegue ao país de destino.
8) remeter: é enviar a droga para determinado local, dentro do Brasil, através de um prestador de
serviço. Exemplos: enviar a droga através do correio, transportadora ou de uma pessoa, que na gíria é
conhecida como “mula”. O crime, para uns, se consuma quando a droga chega até o seu destino, de modo
que a simples entrega ao transportador caracterizaria apenas tentativa. Outros, ao revés, inclusive, o STJ,
defendem que o crime se consuma quando a droga é entregue ao serviço de transporte.
9) preparar: é deixar a droga pronta para o consumo, através de sua composição ou decomposição
química. Exemplo: diluir a cocaína para ingestão não veia.
10) produzir: é criar a droga através de um processo manual. Exemplo: juntar manualmente os
componentes químicos da droga. É, pois, dar existência a uma droga que não existia, ao passo que, no verbo
preparar, a droga já existia em estado bruto,
11) fabricar: é criar a droga através de um processo mecânico ou industrial. Há, pois, a utilização de
máquinas e equipamentos para uma produção em grande ou média escala, enquanto que no verbo produzir
a produção é em pequena escala.
12) vender: é o acordo de vontades para alienar a droga mediante contraprestação em dinheiro ou valor
fiduciário equivalente. Consuma-se com o acordo de vontades sobre a droga e o preço, independentemente
da entrega da droga ou do pagamento do preço.
13) expor à venda: é oferecer a droga em troca de dinheiro ou valor fiduciário equivalente. Consuma-
se com a oferta, ainda que a proposta não seja aceita.
14) oferecer: é ofertar a droga como presente, ou seja, de forma gratuita, sem qualquer intenção de
venda.
15) entregar a consumo: é realizar a transferência da propriedade ou posse da droga, a título oneroso
ou gratuito, mas de forma única ou esporádica. A entrega pode ser feita por qualquer pessoa, e não
necessariamente pelo vendedor ou doador. Exemplo: arremessar a droga ao preso por sobre o presídio.
16) fornecer: é entregar a droga a alguém, a título oneroso ou gratuito, mas de forma contínua. É
abastecer com certa continuidade no tempo. Exemplos: fornecer a droga em consignação para receber o preço
depois da venda.
17) prescrever: é receitar a droga. Trata-se de crime próprio, pois só pode ser praticado por médico ou
dentista. Quanto ao veterinário, só pode prescrever drogas para animais, e, caso receite drogas para uma
pessoa, não se enquadrará no verbo prescrever, na verdade, o fato é atípico, por falta de previsão legal, mas
se , com base nesta receita, houver a aquisição da droga, ele será participe do verbo adquirir.
18) ministrar: é introduzir a droga no organismo de alguém. É um crime comum, praticável por qualquer
pessoa. É ainda um delito de forma livre, pois admite uma infinidade de meios de execução.

Tipo misto alternativo

Trata-se crime de ação múltipla ou de conteúdo variado, também chamado de tipo misto alternativo,
pois a reiteração sucessiva de mais de uma dessas condutas, no mesmo contexto fático, caracteriza crime
único, por força do princípio da alternatividade. Exemplo: o agente que importa a droga, e, em seguida passa
a vendê-la a diversas pessoas, responde por apenas um delito.
Se, porém, o agente realizar as condutas em contextos diferentes, sem que haja relação causal entre as

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condutas, responderá por todos os delitos cometidos, em concurso material ou crime continuado, quando
presentes os requisitos do art. 71 do CP. Se, porém, houver mudança do “modus operandi”, haverá concurso
material e não crime continuado.

Elemento subjetivo do tipo

O delito só é punido a título de dolo, que consiste na vontade consciente de realizar as condutas
descritas no tipo penal.
Quanto ao dolo eventual, é perfeitamente possível. Exemplo: o agente, na dúvida se o objeto
transportado é ou não cocaína, resolve realizar o transporte.
A culpa, ainda que grave, não é punida. O agente que, por exemplo, transporta cocaína supondo que se
trata de farinha, incide em erro de tipo, e, por isso, não responde pelo crime, ainda que o erro tenha sido
inescusável.
Não se exige, para a tipificação do crime, nenhum fim especial de agir. Não há, de fato, necessidade do
fim de traficar, revender ou comercializar a droga, pois o delito se caracteriza ainda que as condutas sejam
realizadas a título gratuito.
Prescinde-se também da habitualidade, ou seja, da reiteração criminosa.

Elemento normativo do tipo

O elemento normativo do tipo consiste na expressão “sem autorização ou em desacordo com


determinação legal ou regulamentar “.
A denúncia, sob pena de inépcia, deve fazer menção ao referido elemento normativo do tipo.
Não há, destarte, crime, quando a conduta houver sido autorizada por lei ou ato administrativo.

Consumação

O crime de tráfico de drogas se consuma com a realização de uma das condutas descritas no tipo penal.
Ainda que o fato tenha sido vigiado por policiais, que impedem que a droga chegue ao seu destino, o
delito estará consumado, pois se trata de crime de perigo abstrato ou presumido.
Dos dezoito verbos, alguns são crimes instantâneos, consumam-se num exato momento, e outros
permanentes, isto é, o momento consumativo se prolonga no tempo, como nos verbos ter em depósito,
guardar, transportar e trazer consigo.
Nos crimes permanentes, a prisão em flagrante é possível enquanto não cessar a permanência (art. 303
do CPP).

Tentativa

Quanto à tentativa, em tese, é possível, mas é muito difícil a sua configuração, pois, diante da grande
quantidade de verbos, provavelmente se consumará num deles.

Princípio da insignificância

O princípio da insignificância não se aplica ao delito de tráfico de drogas, pois o fato sempre se reveste
de gravidade.
Há, por exemplo, o crime, quando o agente vende apenas três gramas de maconha.
Trata-se de crime de perigo abstrato ou presumido.

CRIMES EQUIPARADOS AO TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, §1º)

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O §1º do art. 33 prevê quatro crimes equiparados ao tráfico de drogas, inclusive, a pena é a mesma.
Dispõe o §1º que:
“Nas mesmas penas incorre quem:
I - importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em
depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de
drogas;
II - semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou
regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas;
III - utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda
ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em
desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas.
IV - vende ou entrega drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de
drogas, sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar, a agente policial
disfarçado, quando presentes elementos probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente”
A equiparação desses quatro delitos é para todos os fins e, portanto, sujeitam-se às restrições da Lei
8.072/90, que cuida dos crimes hediondos.

Matéria-prima, insumo ou produto químico (§ 1º, I)

Dispõe o § 1º, I, que:


“Nas mesmas penas incorre quem:
I - importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em
depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de
drogas”.
No inciso I, a conduta criminosa recai sobre matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à
preparação de drogas. Exemplos: acetona, éter.
Não há, pois, necessidade que trate de uma substância destinada exclusivamente à produção da droga,
como pasta de coca e folha de “cannabis sativa”, pois o tipo penal também se refere ao insumo e produto
químico destinado à preparação de drogas, eliminando-se qualquer controvérsia.
A expressão matéria-prima, em sentido amplo, também abrange os insumos e produtos químicos.
No delito do art. 33 “caput”, o objeto material é a droga, ao passo que, no delito em análise, o objeto
material consiste em:
a) matéria prima: é a substância com potencial para gerar a droga, mediante adição de outros elementos
químicos. Exemplo: pasta de coca. Não é necessário que contenha o princípio ativo da droga, caso contrário,
por si só, já seria droga e o fato se enquadraria no art. 33 “caput”. Assim, a matéria prima não precisa constar
da portaria 344/98.
b) insumo: é o elemento químico que se agrega à matéria prima para a preparação da droga. Exemplo:
o bicarbonato de sódio agregado à pasta de coca faz surgir o crack.
c) produto químico: é o elemento químico utilizado na preparação da droga, mas que não se agrega à
matéria prima. Exemplo: a acetona não se incorpora à pasta de coca, mas é um produto químico utilizado no
refinamento da cocaína.
Quanto à posse de sementes de maconha destinadas à preparação das drogas, é preciso considerar três
situações:
a) as sementes foram lançadas à terra. Nesse caso, haverá o delito do art. 33, § 1º, II, no verbo semear.
b) as sementes não foram lançadas à terra. Primeira corrente, o agente responde pelo delito em análise,
previsto no § 1º, I, do art. 33, pois as sementes de maconha são consideradas matéria prima (STJ). Segunda
corrente, o fato é atípico, pois as aludidas sementes não contêm o THC, que é o princípio ativo da maconha
(STF). A meu ver, o fato é atípico, mas não pelo argumento da falta de princípio ativo, que não é exigido para

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a matéria prima, mas por não constituir matéria prima. De fato, a matéria prima é a base da preparação da
droga e a ela se agrega, ao passo que as sementes não se incorporam à droga e, por isso, não podem ser
equiparadas à matéria prima, pois é vedada a analogia “in malam partem”.
Também não há o crime quando o agente traz, para consumo próprio, uma pequena quantidade de
folhas de coca que, pela escassez, não eram destinadas ao fabrico de cocaína.
Os núcleos do tipo são importar, exportar, remeter, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda,
oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo ou guardar, ainda que gratuitamente.
Como se vê, o tipo penal repete 13 (treze) verbos do “caput”.
O delito em análise é subsidiário do art. 33 “caput”. Se, por exemplo, o agente importar, no mesmo
contexto, droga e matéria prima destinada à preparação da droga, responderá apenas pelo delito art. 33
“caput”. É minoritária a corrente que sustenta o concurso material entre o art. 33 “caput” e o §1º, I, do art.
33.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar as condutas
descritas no tipo penal, consciente que se trata de matéria prima, insumo ou produto químico destinado à
preparação de drogas.
Não se exige o fim de lucro nem o fim de preparação de drogas.
O elemento normativo do tipo consiste em realizar a conduta sem autorização ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar,

Semeadura, cultivo e colheita

Dispõe o §1º, II, que:


“Nas mesmas penas incorre quem:
II - semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou
regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas”.
No inciso II, o objeto material são as plantas que funcionam como matéria-prima para a preparação de
drogas.
As plantas que não têm princípio ativo, mas que se destinam à preparação da droga, também
caracterizam o delito em análise. Afinal, semeia-se a planta e não a droga.
Os núcleos do tipo são os verbos:
a) semear: é plantar ou lançar as sementes ao solo para elas germinarem.
b) cultivar: é tratar da planta para que ela se desenvolva.
c) colher: é separar os produtos produzidos pelo solo.
Trata-se de um tipo misto alternativo, de modo que a prática sucessiva de mais de uma conduta, mas
no mesmo contexto fático, caracterizará um único delito, por força do princípio da alternatividade.
Se, porém, após a colheita, o agente realizar uma nova plantação, haverá concurso material entre os
crimes.
Nos verbos semear, que significa plantar, o crime é instantâneo (STJ); nos verbos cultivar e fazer
colheita, é permanente.
Assim, a polícia não pode prender o sujeito em flagrante ao detectar que ele realizou uma plantação de
maconha, mas nós verbos semear e colher a prisão em flagrante será possível.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade de realizar as condutas descritas no tipo
penal, consciente que as plantas constituem matéria-prima para a preparação de drogas.
Não se exige o fim de lucro nem o propósito de preparação das drogas.
Quanto ao fim de consumo pessoal, não exclui o delito em análise, salvo quando se tratar de plantas
destinadas à preparação de uma pequena quantidade de drogas, pois, nesse caso, o agente responderá pelo
delito do §1º do art. 28.
Em contrapartida, quem semeia, cultiva ou colhe uma pequena quantidade de plantas, destinadas à
preparação de drogas, sem a intenção de consumo pessoal, responde pela figura equiparada ao tráfico, em
estudo.
O elemento normativo do tipo consiste em realizar a conduta sem autorização ou em desacordo com

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determinação legal ou regulamentar,


De abordo § 4º do art. 32, as glebas cultivadas com plantações ilícitas serão expropriadas, conforme o
disposto no art. 243 da Constituição Federal. Impõe-se a expropriação ainda que o imóvel seja bem de família
do traficante.

Utilização ou consentimento de utilização de local ou bem

Dispõe o § 1º, III, que:


“Nas mesmas penas incorre quem:
III - utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda
ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em
desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas”.
O inciso III incrimina quem utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem propriedade, posse,
administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, para o
tráfico ilícito de drogas.
Trata-se de crime permanente.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa que tenha a propriedade, posse, administração, guarda ou
vigilância do local ou do bem. Exemplo: funcionário de estacionamento de veículo permite que no local seja
realizado tráfico de drogas. Outro exemplo: o sujeito cede o veículo para o traficante transportar a droga.
Convém observar que o sujeito não realiza o tráfico de drogas, caso contrário responderá pelo delito do
art. 33, “caput”.
O objeto material é o local ou bem de qualquer natureza. Exemplos: apartamento, casa, restaurante,
carro, avião, barco, etc.
O local aberto ao público, como praças, ruas e praias, não são abrangidos pelo tipo penal, pois, nesse
caso, não há propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância.
Os núcleos do tipo são os verbos:
a) utilizar: é proporcionar uso. Nesse caso, o agente que tem a propriedade, posse, administração,
guarda ou vigilância libera o local ou o bem para que ali se realize o tráfico de drogas. Exemplo: o dono de um
bar permite o tráfico de drogas em seu estabelecimento.
b) consentir: é anuir, concordar, autorizar. Nesse caso, o local é utilizado por outra pessoa, mas com o
consentimento de quem tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância. Exemplo: o
proprietário aluga uma casa para os traficantes, ciente que eles a utilizarão para venda de drogas. Outro
exemplo: o agente empresta o carro para o traficante transportar a droga.
É preciso, para a caracterização do delito, que a utilização ou consentimento do local ou bem seja para
a prática do delito de tráfico ilícito de drogas.
Não há o crime quando o local ou bem são utilizados para o delito do art. 28, ou seja, consumo pessoal
de drogas, mas, nesse caso, quem tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância do local ou
bem será participe do delito do art. 33, § 2º, consistente em auxiliar alguém ao uso indevido de droga.
Também não há o crime quando o local é utilizado para reuniões por uma associação criminosa,
destinada ao tráfico de drogas, mas o agente que ceder o local de forma estável ou permanente responderá
pelo delito do art. 35. Se a associação criminosa ainda não existia e só se formou graças à cessão do local, o
agente será participe do delito do art. 35. Se, porém, já existia, o fato será atípico.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar as condutas
descritas no tipo penal. Admite-se também o dolo eventual.
Não se exige o fim de lucro, pois o delito pode ser praticado gratuitamente.
O elemento normativo do tipo consiste em realizar a conduta sem autorização ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar,
Quanto à consumação, ocorre com a prática do tráfico de drogas no local ou bem, ainda que por uma
única vez.
Admite-se a tentativa.

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Venda ou entrega a policial disfarçado

Dispõe art. 33, §1º, IV, introduzido pela lei 13.964/2019, que nas mesmas penas incorre quem:
“Vende ou entrega drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de
drogas, sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar, a agente policial
disfarçado, quando presentes elementos probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente.”
O tipo penal em análise introduziu a figura do agente policial disfarçado, cujo propósito é a coleta de
provas acerca da autoria e/ou materialidade.
O objeto material é a droga, bem como a matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à
preparação de drogas.
O criminoso que vende ou entrega droga ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à
preparação de drogas ao policial disfarçado só responderá pelo delito em análise quando houver elementos
probatórios razoáveis de uma conduta criminal preexistente.
No delito em apreço, que introduz no ordenamento jurídico o instituto do agente policial disfarçado, há
duas condutas criminais que se fundem para formar uma só conduta criminosa. São elas:
a) a conduta criminal preexistente. É a praticada pelo criminoso, sem qualquer induzimento ou
instigação do agente policial. Trata-se de uma conduta que pode revelar a autoria ou a materialidade.
Exemplo: o criminoso, numa interceptação telefônica, admite que é vendedor de drogas. Outro exemplo: o
policial sabe que, em determinado local, existe um estoque de cocaína destinada à venda, mas desconhece a
autoria.
b) a conduta criminal subsequente. É a praticada pelo criminoso, mediante induzimento ou instigação
do policial disfarçado. É necessário, para que a ação do policial seja legítima, que, ao tempo do induzimento
ou instigação, ele tenha conhecimento dos elementos probatórios razoáveis da conduta criminal preexistente.
Exemplo: o policial disfarçado, após a coleta das provas da autoria do delito de venda de drogas, se oferece
para comprar droga, com o intuito de comprovar a materialidade. Outro exemplo: o policial disfarçado, após
obter a prova da materialidade, ou seja, que há drogas em determinado balcão, se oferece para comprar
drogas do suspeito, assim agindo com o escopo de comprovar a autoria, prendendo-o em flagrante quando
ele lhe traz a droga do referido local.
Presentes estes dois requisitos, o flagrante será válido.
A hipótese se assemelha, mas não se confunde, com o flagrante provocado, também denominado crime
de ensaio ou delito putativo por obra do agente provocador.
Inicialmente, cumpre observar que o flagrante provocado é nulo, equipara-se ao crime impossível
(súmula 145 do STF), ao passo que o flagrante acima, realizado pelo agente policial disfarçado, é válido.
O flagrante provocado exige dois requisitos cumulativos:
a) o agente é induzido a realizar a conduta criminal, sem que houvesse qualquer prova razoável de uma
conduta criminal preexistente. Antes da criação do tipo penal em análise, o flagrante era provocado ainda que
houvesse prova razoável da conduta criminal anterior.
b) o provocador toma providências que tornam absolutamente impossível a consumação.
Se, por exemplo, o agente não possuía a droga, comprando-a de um terceiro para satisfazer o desejo do
falso cliente, ou seja, do policial disfarçado, a situação será a seguinte:
a) comprova-se, no flagrante, o envolvimento pretérito do agente na venda ilegal de drogas. Nesse caso,
ele responderá pelo delito em análise. Antes desta lei, não havia crime, pois o fato era considerado flagrante
provocado.
b) não se comprova, no flagrante, o envolvimento pretérito do agente na venda ilegal de drogas. Nesse
caso, o flagrante será provocado e, portanto, nulo (Súmula 145 do STF).
Se, por outro lado, o agente já possuí a droga , caso venha a vendê-la ou entregá-la ao policial
disfarçado, o flagrante, diante da comprovação da conduta pretérita de “ guardar ou ter em depósito”, será
válido na modalidade vender ou entregar, sendo que, antes da lei 13.964/2019, que introduziu o delito do art.
33, §1º, IV, o flagrante era nulo nestes verbos, embora válido na modalidade “ guardar ou ter em depósito”,
prevista no “caput” do art. 33, cuja consumação se prolonga no tempo, por se tratar de delito permanente.
De uma certa maneira, o tipo penal em análise facilitou a incriminação, pois o depoimento do policial

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disfarçado se torna uma prova lícita.


A jurisprudência já admitia, portanto, a validade do flagrante quando o agente, antes da provocação, já
guardava ou mantinha em depósito, para o fim de venda, a droga, ou seja, quando a materialidade estivesse
comprovada através de uma conduta anterior à provocação, servindo-se esta apenas para certificar-se da
autoria.
Com o advento do tipo penal em análise, o flagrante também se torna válido quando a autoria estiver
comprovada por uma conduta criminal anterior, prestando-se a provocação, através da figura do policial
disfarçado, apenas para a comprovação da materialidade.
Por fim, cumpre distinguir três situações distintas:
a) agente policial disfarçado: é o que, motivado por elementos probatórios razoáveis de conduta
criminal preexistente, se faz passar por outra pessoa para coletar provas sobre a existência da materialidade
ou da autoria. Trata-se de uma postura legítima em relação aos crimes do §2º do art. 17 e parágrafo único do
art. 18, ambos do Estatuto do Desarmamento, outrossim, no art. 33, §1º, IV, da lei de drogas. Com relação a
outros delitos, há duas exegeses. Primeira, o flagrante será válido, pois o ordenamento jurídico admite todos
os meios de prova moralmente legítimos. Segunda, o flagrante será nulo, pois o ato de induzir ou instigar a
conduta criminal atenta contra os preceitos morais.
b) agente policial provocador: é o que induz outra pessoa à pratica de uma conduta criminosa, com o
intuito de prendê-la em flagrante, sem que houvessem elementos probatórios razoáveis de uma conduta
criminal preexistente. Trata-se de uma conduta ilegítima, de um flagrante provocado. Nesse caso, não há
crime, sendo nulo o flagrante (Súmula 145 do STF);
c) agente policial infiltrado: é o que se faz passar por outra pessoa para ingressar no ambiente dos
criminosos, com o intuito de obter provas. Trata-se de um comportamento legítimo, em relação aos crimes de
organização criminosa, tráfico de drogas e lavagem de capitais.
Por fim, imagine o seguinte exemplo: o policial disfarçado que provoca a conduta criminal, oferecendo-
se para comprar drogas de uma pessoa, mas sem que houvessem elementos probatórios razoáveis de uma
conduta criminal preexistente. Caso obtenha êxito, por se tratar coincidentemente de um traficante de drogas,
o flagrante será válido? Creio que não, pois, de acordo com o tipo penal em estudo, o policial só poderá utilizar-
se do disfarce quando houver elementos probatórios razoáveis de uma conduta criminal preexistente. De fato,
não se pode estimular este tipo de diligência, que se revela como sendo de caráter excepcional, à medida que
é tênue a linha divisória que a separa do campo da imoralidade.

TRÁFICO DE DROGAS PRIVILEGIADO

Dispõe §4º do art. 33:


“Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a
dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons
antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa”.
O §4º do art. 33 prevê uma causa de redução de pena de um sexto a dois terços ao delito de tráfico e
aos delitos equiparados a tráfico, desde que presentes quatro requisitos cumulativos:
a) primariedade;
b) bons antecedentes. Os maus antecedentes, por força do princípio da presunção da inocência, exigem
condenação criminal com trânsito em julgado.
c) que o agente não se dedique às atividades criminosas, ou seja, que se trate de um traficante eventual.
O ônus da prova de que o réu se dedica a atividades criminosas é da acusação. Exemplo: a interceptação
telefônica revela que o sujeito é traficante habitual. Quanto à qualidade e quantidade da droga apreendida,
segundo a jurisprudência dominante, é importante para se definir se o tráfico deve ou não ser considerado
privilegiado, mas não se pode aferir, por si só, que quantidade excessiva de drogas gera a presunção de que o
agente se dedique a atividades criminosas. O STF já decidiu inúmeras vezes que o fato de alguém ter sido
surpreendido com relevante quantidade de drogas não autoriza a conclusão de que a mercancia de drogas
seja um meio de vida e de que não se trata de conduta ocasional. No STJ, porém, prevalece que a quantidade
excessiva da droga impede o tráfico de drogas privilegiado.

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d) que o agente não integre organização criminosa. Ainda que se trate de organização criminosa não
relacionada ao tráfico de drogas, o benefício deverá ser negado.
Os requisitos acima são cumulativos.
O ônus da prova dos requisitos que vedam o benefício é da acusação.
Se não os comprovar, o réu fará jus ao benefício, que só poderá ser afastado mediante decisão judicial
fundamentada.
O delito de tráfico de drogas privilegiado, criado para beneficiar o traficante eventual, não é um crime
autônomo, mas uma causa de diminuição de pena.
A redução atinge tanto a pena de reclusão quanto a pena de multa.
O tráfico privilegiado de drogas não é equiparado aos crimes hediondos. De fato, foi cancelada a súmula
512 do STJ que previa esta equiparação.
Convém ainda destacar o art. 112, §5º, da Lei de Execuções Penais (Lei n. 7.210/1984), com redação que
lhe foi dada pela Lei no 13.964/2019, cujo teor é o seguinte:
"Não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas
previsto no § 4o do art. 33 da Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006".
A expressão “para os fins deste artigo” causou duas interpretações.
Primeira, para outros fins que não seja a progressão de regimes, o tráfico privilegiado é crime hediondo,
caso contrário a aludida expressão séria inócua.
Segunda, o tráfico privilegiado não é crime hediondo para todos os efeitos penais e processuais, pois
seria incoerente a lei lhe negar a hediondez para fins de progressão e admiti-la para outros fins. É a posição
do STF e STJ.
No tráfico de drogas privilegiado é também cabível a substituição por pena restritiva de direitos, pois o
STF declarou a inconstitucionalidade desta vedação, que constava no § 4º do art. 33, e, posteriormente, o
Senado Federal, com base neste acórdão, editou a Resolução número 5 /2012, que suspendeu a eficácia
desta parte da lei que proibia a referida substituição.
Por outro lado, a quantidade e a qualidade da droga, para uma corrente, quando utilizadas, na terceira
fase da pena, para excluir o benefício do tráfico privilegiado, não poderão ser levadas em conta, na primeira
fase, para aumentar a pena-base, sob pena de “bis in idem”.
A causa especial de diminuição de pena em estudo, prevista no § 4º do art. 33, retroage para beneficiar
os réus que praticarem o antigo crime do art. 12 da lei revogada, pois se trata de “novatio legis in mellius”,
mas a combinação de leis é vedada.
Com efeito, dispõe a Súmula 501 do STJ: é cabível a aplicação retroativa da Lei 11.343/06, desde que
o resultado da incidência das suas disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da
aplicação da Lei 6.368/76, sendo vedada a combinação de leis.
No tocante ao regime inicial de cumprimento da pena no tráfico de drogas privilegiado, a 6ª Turma do
Superior Tribunal de Justiça, no HC 596.603-SP, firmou as seguintes teses:
a) o condenado a pena igual ou inferior a 4 (quatro) anos de reclusão, em regra, faz jus a cumprir a
reprimenda em regime inicial aberto;
b) excepcionalmente, será possível o regime semiaberto, ao condenado a pena igual ou inferior a 4
(quatro) anos de reclusão, desde que haja fundamentação idônea, não decorrente da mera natureza do crime,
de sua gravidade abstrata ou da opinião pessoal do julgador;
c) ao condenado a pena igual ou inferior a 4 (quatro) anos de reclusão não poderá ser imposto o regime
fechado;
O referido julgado ainda destacou que o condenado a pena igual ou inferior a 4 (quatro) anos de
reclusão, em regra, faz jus à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.
É importante ressaltar que o tráfico de drogas privilegiado é uma mera causa de diminuição de pena, e
não um delito autônomo, de tal sorte que a concessão do aludido benefício não implicará necessariamente
numa reprimenda penal igual ou inferior a 4 (quatro) anos.
Noutra palavras, nada obsta que haja o reconhecimento do tráfico de drogas privilegiado, que é
analisado apenas na terceira fase da aplicação da pena , e, ao mesmo tempo, uma condenação a pena
superior a 4 (quatro) anos, hipótese em que não será cabível o regime aberto, mas, sim, o semiaberto.

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Se, por exemplo, em razão do tráfico de drogas privilegiado, o juiz, na sentença, reduzir a pena de 5
(cinco) anos de reclusão em 1/6 (um sexto), o resultado será de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses.
Por outro lado, acerca da prisão preventiva no delito de tráfico de drogas privilegiado, o STJ, no mesmo
acórdão acima, decidiu que o condenado não pode permanecer preso preventivamente, após a sentença.
E, mesmo antes da sentença, prosseguiu o venerando acórdão, uma vez presentes os requisitos do 33,
§ 4o, que disciplina o delito de tráfico de drogas privilegiado, a prisão preventiva não poderá ser decretada
porque ela não é cabível por crime punido com pena privativa máxima igual ou inferior a 4 anos (art. 313, I do
Código de Processo Penal).
O referido julgado do Tribunal da Cidadania incidiu no erro de considerar que, uma vez presentes os
seus requisitos, a pena do delito de tráfico de drogas privilegiado não poderia ser superior a 4 (quatro) anos.
O fato de os seus pressupostos se mostrarem presentes não conduz matematicamente a uma
reprimenda igual ou inferior a 4 (quatro) anos, porquanto no sistema trifásico de aplicação da pena,
consagrado no art. 68 do CP, é preciso considerar as circunstâncias judiciais, as agravantes, as atenuantes, as
causas de aumento e as causas de diminuição de pena.
E, nesse aspecto, cumpre lembrar que o tráfico privilegiado, por ser uma mera causa de diminuição da
pena, é apenas um dos critérios que o magistrado levará em conta na hora de aplicar a pena, razão pela qual
a proibição genérica da prisão preventiva se revela inadequada.

CRIME DE INDUZIMENTO, INSTIGAÇÃO E AUXÍLIO AO USO DE DROGA (ART. 33, §2º)

Dispõe o art. 33, §2º:


“Induzir, instigar ou auxiliar alguém ao uso indevido de droga:
Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa de 100 (cem) a 300 (trezentos) dias-multa”.
São três os núcleos do tipo:
a) induzir: é introduzir a ideia até então inexistente. É, pois, convencer a pessoa a fazer uso de droga.
b) instigar: é reforçar o propósito já existente.
c) auxiliar: é ajudar, facilitar a pessoa a fazer uso da droga, mas sem entregar diretamente a
droga. Exemplo: emprestar-lhe dinheiro para adquirir cocaína. Se, porém, o agente realizar a entrega da
droga, responderá pelo delito de tráfico do art. 33 “caput” ou, em caso de entrega para consumo pessoal
compartilhado a pessoa do seu relacionamento, pelo delito do §3º do art. 33.
Se o agente induz, instiga e auxilia, responderá por um único crime, por força do princípio da
alternatividade. Trata-se de tipo penal de ação múltipla ou de conteúdo variado.
Note-se que a pena é de detenção. Não se trata de figura equiparada ao tráfico de drogas.
A instigação genérica ao uso de droga pode caracterizar apologia ao crime, previsto no art. 287 do CP,
pois no delito em análise o sujeito passivo deve ser “alguém”, ou seja, pessoa ou pessoas determinadas.
Quanto às manifestações e debates públicos acerca da legalização do uso de drogas inserem-se no
âmbito da liberdade de reunião e de manifestação do pensamento, não configura crime algum, consoante já
decidiu a STF.
O delito, para uns, se consuma com a conduta, pois se trata de crime formal.
Outros, porém, acertadamente, o consideram crime material, consumando-se com o uso efetivo da
droga pelo terceiro (posição dominante).

CRIME DE USO COMPARTILHADO DE DROGAS OU TRÁFICO PRIVILEGIADO OU TRÁFICO


COMPARTILHADO (ART. 33, §3º)

Dispõe o art. 33, §3º:


“Oferecer droga, eventualmente e sem objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento, para juntos
a consumirem:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.500 (mil e
quinhentos) dias-multa, sem prejuízo das penas previstas no art. 28”.
Este delito é punido com detenção. Trata-se de infração penal de menor potencial ofensivo, posto

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que a pena não excede a 2 (dois) anos.


O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa que seja do círculo de relacionamento da pessoa que recebeu
a droga. Esta, por sua vez, responderá pelo delito do art. 28.
O sujeito passivo, segundo uma corrente, pode ser qualquer pessoa. Outra corrente exige que se trate
de uma pessoa com discernimento, pois se a vítima for menor de 14 (quatorze) anos ou enfermo ou deficiente
mental sem discernimento, destituída, portanto, de uma vontade válida, o agente responderá pelo delito do
art. 33, “caput”.
O núcleo do tipo é o verbo oferecer, que significa colocar a droga à disposição.
Urge, para que o delito se configure, os seguintes requisitos:
a) oferta eventual da droga. É, pois, necessária que a oferta seja esporádica. Se for continua, constante,
reiterada haverá o crime de tráfico do art. 33 “caput”.
b) oferta gratuita, isto é, sem intuito de lucro direto ou indireto. Igualmente, responderá pelo delito em
análise, o agente que faz a oferta da droga, para consumo pessoal e compartilhado, a pessoa do seu
relacionamento, mas a adquire mediante rateio, sem qualquer propósito de lucro. Se, porém, visa fazer da
vítima uma futura compradora da droga, ofertando-a gratuitamente com este propósito, responderá pelo
delito do art. 33, “caput”.
c) oferta a pessoa do seu relacionamento. É preciso que se trate de uma pessoa do relacionamento
próximo do agente. Exemplo: oferecer a droga ao amigo. Se se tratar de uma pessoa recém conhecida, o
agente responderá pelo delito do art. 33 “caput”.
d) oferta da droga para juntos a consumirem. Pressupõe, destarte, que seja uma pequena quantidade
de droga, para que realmente seja interpretado como consumo compartilhado.
Se o agente entrega a droga, a pedido de pessoa do seu relacionamento para juntos consumirem,
atendendo à solicitação, responderá também pelo delito em análise, e não se pelo art. 33 “caput”, por analogia
“in bonam partem”.
O ônus da prova para desclassificar o delito de tráfico de drogas para o delito em análise, segundo uma
corrente, é da defesa, mas prevalece que, por força do princípio da presunção da inocência, é a acusação que
deverá demonstrar a ausência dos requisitos do crime de uso compartilhado, sob pena de se concretizar a
desclassificação.
O crime se consuma com a oferta, ainda que não haja o consumo em conjunto.
O agente responderá, em concurso material, pelas penas do delito em análise juntamente com as do
art. 28, caso haja o efetivo consumo.

CRIME DE PETRECHOS PARA TRÁFICO DE DROGAS OU TRÁFICO DE MAQUINÁRIO PARA FABRICAÇÃO


DE DROGAS

Dispõe o art. 34:


“Fabricar, adquirir, utilizar, transportar, oferecer, vender, distribuir, entregar a qualquer título, possuir,
guardar ou fornecer, ainda que gratuitamente, maquinário, aparelho, instrumento ou qualquer objeto
destinado à fabricação, preparação, produção ou transformação de drogas, sem autorização ou em desacordo
com determinação legal ou regulamentar:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 1.200 (mil e duzentos) a 2.000 (dois mil)
dias-multa”.
O tipo penal prevê 11 (onze) núcleos do tipo, todos eles já estudados no art. 33 “caput”, à exceção do
verbo distribuir, que significa entregar em diferentes locais.
O objeto material consiste em maquinário, aparelhos, instrumentos ou qualquer objeto destinado à
fabricação, preparação, produção ou transformação de drogas. Exemplo: o agente possui uma prensa
hidráulica para poder compactar a maconha ou então para fechar os eppendorf's de cocaína. Outro exemplo:
o agente possui uma balança para pesar a droga.
No delito em análise, incrimina-se o ato preparatório do tráfico de drogas. Trata-se de um tipo
antecipado.
É, pois, essencial que se demonstre que a finalidade do objeto seja a fabricação, preparação, produção

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ou transformação de drogas, mas não é necessário que tenha exclusivamente esta finalidade.
Ainda que nenhuma droga seja encontrada no local, o crime se caracteriza.
Se, além dos maquinários, a polícia ainda apreender drogas no local, o delito será apenas o de tráfico
do art. 33, “caput”, absorvendo-se o crime do art. 34, por força do princípio da consunção.
Haverá, entretanto, concurso material em duas situações:
a) quando as drogas e os aparelhos forem apreendidos em contextos distintos;
b) quando não houver nexo causal entre a droga apreendida e os aparelhos. Exemplo: a polícia apreende
um laboratório de fabricação de cocaína e também 10 (dez) quilos de maconha.
A denúncia deverá descrever o elemento normativo do tipo, que consiste no fato de a conduta ter sido
realizada sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
Quanto à causa de diminuição de pena do § 4º do art. 33, que prevê o tráfico privilegiado, não se aplica
ao delito do art. 34, por falta de previsão legal e também pelo fato de a presença do maquinário,
instrumentos, aparelhos e objetos ser um indício da dedicação em atividade da criminosa como sendo um
estilo de vida.
Outra corrente, porém, sustenta a incidência da minorante, por analogia “in bonam partem”, baseada
no princípio da isonomia, desde que presentes os requisitos do citado § 4º.

CRIME DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO (ART.35)

Dispõe o art. 35:


“Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos
crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 desta Lei:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.200 (mil e duzentos)
dias-multa.
Parágrafo único. Nas mesmas penas do caput deste artigo incorre quem se associa para a prática
reiterada do crime definido no art. 36 desta Lei”.
O delito em análise, para se configurar, exige os seguintes requisitos:
a) associação: é a união estável e duradoura entre os agentes. A reunião eventual, passageira, para
oferecer a droga a certas pessoas, por si só, não é crime de associação e, sim, concurso de pessoas. Quanto ao
“mula”, que faz a entrega da droga, mas não integra a associação, não responderá pelo delito de associação.
O ônus da prova de que o agente integra a associação é da acusação.
b) pluralidade de agentes: exige-se duas ou mais pessoas. Computam-se os menores, os inimputáveis e
os desconhecidos, isto é, não identificados.
c) fim de praticar quaisquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput, §1º e 34, de forma reiterada ou
não. Portanto, ainda que o propósito seja a prática de um único crime, configura-se o delito de associação
para o tráfico. Exemplo: duas pessoas adquirem um sítio para plantar mil pés de maconha e depois vender
toda a plantação de uma única vez. Não se exige, destarte, a intenção de praticar dois ou mais crimes, ao
contrário das outras associações criminosas vigentes no ordenamento jurídico.
Na associação criminosa dos arts. 288 do CP e 8º da Lei 8.072/90, exige-se no mínimo 3 (três) pessoas e
o fim de praticar dois ou mais crimes.
Na associação criminosa do art. 35, em estudo, exige-se duas ou mais pessoas, mas basta o fim de
praticar um único delito.
A associação do art. 8º da Lei 8.072/90, visa a prática dos delitos de tortura, terrorismo e crimes
hediondos.
A associação do art. 35 da Lei de Drogas visa a prática dos delitos dos arts. 33, “caput” e § 1º, e 34 desta
Lei.
A associação do art. 288 do CP visa a prática de quaisquer outros delitos.
Se os associados se dedicam simultaneamente ao tráfico de drogas e a outros delitos, há duas
correntes.
Primeira, respondem apenas pela associação da lei de drogas, por força do princípio da especialidade e
também para se evitar o “bis in idem”.

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Segunda, respondem também em concurso com a associação criminosa do art. 288 do CP ou art. 8º da
Lei 8.072/90, conforme a hipótese, desde que haja pelo menos três agentes.
O crime se consuma com a efetiva associação, ainda que nenhum dos delitos de tráfico seja praticado.
Não se trata de punir o pensamento e, sim, os atos exteriores e preparatórios que revelam o propósito
de associar-se. Exemplo: A e B compram um veículo com o propósito de vender drogas na porta da escola.
Não se exige, para a consumação, a apreensão da droga, pois a materialidade pode ser comprovada
através de outros elementos, por exemplo, interceptação telefônica.
Trata-se de crime formal e permanente.
Acrescente-se, contudo, que, na hipótese de os associados praticarem um dos delitos dos arts. 33, caput
e §1º e 34 haverá concurso material com o crime de associação criminosa em estudo.
Quanto à tentativa, não é possível, posto que o art. 35 já é um ato preparatório erigido à condição de
crime autônomo, e, como se sabe, os atos preparatórios não caracterizam tentativa.
O delito de associação criminosa não é equiparado aos crimes hediondos nem ao crime de tráfico de
drogas. Não sofre, pois, as consequências da hediondez. Entretanto, o art. 44 da Lei 11.343/06 considera o
delito de associação inafiançável e insuscetível de anistia, graça, indulto e sursis, assunto que será abordado
oportunamente.
O parágrafo único do art. 35 prevê a associação de duas ou mais pessoas para o fim de cometimento do
crime do art. 36, que cuida do financiamento ou custeio do tráfico de drogas.
Nesta associação, exige-se o fim da prática reiterada do delito do art. 36, ou seja, dois ou mais. Não
basta o propósito de cometê-lo uma única vez.
A união duradoura entre um traficante e um financiador não caracteriza a associação do parágrafo
único do art. 35, salvo se o agente, além de traficante, também atuar como financiador.
Da mesma forma, a união duradoura entre um traficante e um financiador não caracteriza a
associação do “caput” do art. 35, salvo se o agente, além de financiador, também atuar como traficante.
O agente que integrar duas associações criminosas, uma para fim de tráfico e outra para o fim de
financiamento do tráfico, responderá pelos dois crimes de associação, em concurso material.

CRIME DE FINANCIAMENTO OU CUSTEIO AO TRÁFICO (ART. 36)


Dispõe o art. 36
“Financiar ou custear a prática de qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, “caput” e §1º, e 34 desta
Lei:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 20 (vinte) anos, e pagamento de 1.500 (mil e quinhentos) a 4.000 (quatro
mil) dias-multa”.
O delito do art. 36, que é o mais grave da Lei 11.343/2.006, consiste em financiar ou custear a prática
de quaisquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e §1º e 34.
A pena é de reclusão de 8 (oito) a 20 (vinte) anos, e pagamento de 1.500 (mil e quinhentos) a 4.000
(quatro mil) dias-multa.
O sujeito ativo é aquele que injeta recursos financeiros ou materiais para viabilizar o tráfico de drogas,
Os núcleos do tipo são os verbos financiar e custear.
Não é fácil distinguir os verbos financiar e custear, mas, como a lei não contém palavras inúteis, é
necessário distingui-los, sob o prisma jurídico.
A rigor, em termos léxicos, são sinônimos, pois ambos consistem na liberação de dinheiro, bem ou
valor.
Financiar é o fornecer a estrutura financeira ou física, que torna viável a prática do crime de tráfico de
drogas. Exemplo: emprestar dinheiro para se comprar a droga. Outro exemplo: fornecer os equipamentos e
o local para a produção da droga. Mais um exemplo: fornecer veículos para o transporte da droga.
Custear é pagar as despesas geradas pelo crime praticado ou que se pretende praticar. Exemplo: pagar
o preço cobrado pelo motorista que transportou a droga.
Cumpre não se confundir o crime- meio (financiar ou custear) com o crime-fim (traficar).
O elemento subjetivo do tipo é o fim de se viabilizar os crimes dos arts. 33, caput e §1º e 34. Não se
exige, porém, o fim de lucro, mas, em regra, visa-se o lucro.

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Quanto ao fim de financiar ou custear outros delitos, o fato será atípico, mas se o delito vier a ser
praticado o agente será participe.
Quanto à consumação, há duas correntes.
Primeira, trata-se de crime formal, consumando-se com o ato de financiamento ou custeio, ainda que
o delito-fim não seja praticado.
Segunda, o delito é material, consumando-se com a prática do tráfico consumado ou tentado.
A tentativa, em tese, é possível.
Sobre a natureza jurídica do delito em análise, há três correntes.
Primeira, é crime permanente. Discordo, pois os verbos financiar e custear não exigem um
comportamento prolongado no tempo, podendo se esgotarem num único ato.
Segunda, é crime habitual, pois exige-se a reiteração de atos de financiamento ou custeio, conforme
consta no parágrafo único do art. 35. Ora, o citado parágrafo único se refere ao delito de associação criminosa
para fim do delito do art. 36 e não propriamente ao delito do art. 36.
Terceira, trata-se de crime instantâneo, pois, para se configurar, basta a prática de um único ato de
financiamento ou custeio. Em havendo dois atos de financiamento ou custeio, visando crimes distintos, haverá
dois delitos do art. 36, em concurso material. É a posição correta.
O art. 40, VII, da Lei 11.343/2006, prevê o aumento da pena de um sexto a dois terços quando o agente
financiar ou custear a prática de crime da Lei de Drogas.
A referida majorante não se aplica ao delito do art. 36, pois o financiamento ou custeio já são elementos
do tipo penal.
Quanto ao sujeito ativo do delito em análise, é a pessoa que financia ou custeia, mas não prática os atos
de execução do tráfico. Trata-se de uma exceção pluralista à teoria monista. Se não houvesse o art. 36, o
agente seria participe do delito de tráfico. Assim, a meu ver, o sujeito ativo do delito do art. 36 é o financiador
que não atua como traficante.
O assunto, porém, é polêmico.
Com efeito, se o agente, além de financiador, também praticar atos de execução do tráfico, por
exemplo, realizar o transporte da droga, há três correntes:
a) responde somente pelo delito do art. 36, sem a majorante do art. 40, VII.
b) responde só pelo crime de tráfico dos arts. 33, “caput” e §1º e 34, com a majorante do art. 40, VII. É
a posição que me parece correta, pois o autofinanciamento não pode configurar o delito do art. 36.
c) responde em concurso material pelo crime do art. 36 e pelo crime de tráfico dos arts. 33, caput e §1º
e 34, sem a majorante do art. 40, VII.

CRIME DE COLABORAÇÃO COMO INFORMANTE (ART.37) OU TRÁFICO PRIVILEGIADO

Dispõe o art. 37:


“Colaborar, como informante, com grupo, organização ou associação destinados à prática de qualquer
dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 desta Lei:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e pagamento de 300 (trezentos) a 700 (setecentos) dias-
multa”.
Trata-se do delito de colaboração como informante, que também é conhecido como tráfico
privilegiado.
Sujeito ativo é aquele que colabora para o tráfico, como informante, desde que não seja coautor nem
participe do tráfico de drogas nem integrante da associação, organização ou grupo para o qual colabora.
Exemplo: fogueteiro que solta rojão para avisar que a polícia ou o grupo rival está chegando. Se, além de
informante, o agente integrar o grupo, organização ou associação, não há falar-se no delito em análise, mas,
sim, em participação no crime de tráfico.
Trata-se, pois, de uma colaboração eventual, pois se houver estabilidade o informante será tido como
integrante da associação, organização ou grupo, respondendo também pelo tráfico de drogas. Igualmente,
caso participe dos lucros, será também enquadrado como traficante, na condição de partícipe.
Quanto ao funcionário público, que presta informações gratuitas ao traficante, em razão da função,

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responde pelo delito em análise, com a causa de aumento de pena do art. 40, II. Caso tenha solicitado ou
recebido vantagem, responderá pelo delito em análise, em concurso material, com o crime de corrupção
passiva, previsto no art. 317 do CP, mas sem a majorante do art. 40, II, que já integra o tipo penal do art. 317
do CP.
O trabalho de informante, no delito em estudo, pode ser oneroso ou gratuito. É essencial, no entanto,
que o informante não participe dos lucros do tráfico, pois, em caso positivo, conforme já dito, ele responderá
pelo crime de tráfico de drogas.
Ao punir o informante, que não participa dos lucros, no tipo penal privilegiado do art. 37, o legislador
abriu uma exceção pluralística à teoria monista. Não fosse essa exceção, o informante seria partícipe do crime
de tráfico de drogas, por força do art.29 do CP.
O núcleo do tipo é o verbo colaborar, que significa auxiliar, trabalhar em conjunto, de forma onerosa
ou gratuita.
É necessário, para a tipificação do delito, que a colaboração seja como informante, ou seja, para trazer
informações relevantes. Se a informação for irrelevante, haverá crime impossível. Se a colaboração não for
como informante, mas a outro título, o agente será participe do delito de tráfico de drogas.
A colaboração como informante, no delito em análise, deve ser para uma das seguintes entidades:
a) associação. Trata-se da associação prevista no art. 35 da lei em análise.
b) organização. Trata-se da organização criminosa da Lei 12.850/2013.
c) grupo. Trata-se da reunião eventual ou esporádica de duas ou mais pessoas, para o fim de tráfico.
O delito se consuma quando a informação chega até um dos membros da associação, organização ou
grupo criminoso.
Admite-se a tentativa, quando a informação não chegar até o destino, por circunstâncias alheias à
vontade do agente.
Trata-se de crime formal.
O delito não exige a habitualidade. Basta um único ato para a sua consumação.
Admite-se a tentativa.
Se o agente presta informações a um único traficante, visando facilitar a prática do tráfico de drogas,
há duas correntes.
Primeira, será participe do delito de tráfico, caso este se realize. Ora, não há lógica, pois o informante
de uma associação, organização ou grupo, a rigor, prática conduta mais grave e, no entanto, responde por um
delito mais brando.
Segunda responde pelo delito de informante do tráfico, por analogia “in bonam partem”.
Se, entretanto, nenhum delito houver sido concretizado, o fato será atípico, para ambas as correntes.

CRIME DE PRESCREVER OU MINISTRAR, CULPOSAMENTE, DROGAS (ART. 38)

Dispõe o art. 38:


“Prescrever ou ministrar, culposamente, drogas, sem que delas necessite o paciente, ou fazê-lo em
doses excessivas ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e pagamento de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) dias-
multa.
Parágrafo único. O juiz comunicará a condenação ao Conselho Federal da categoria profissional a que
pertença o agente”.
Trata-se do único crime culposo previsto na Lei 11.343/2.006. Caso a prescrição ou aplicação seja dolosa,
o delito será o previsto no art. 33.
Os núcleos do tipo são os verbos prescrever e ministrar.
Prescrever é receitar. Neste verbo, o delito só pode ser cometido por médico ou dentista. Quanto ao
veterinário ou farmacêutico, caso realizem a conduta de prescrever descrita no tipo penal, não responderão
pelo delito em análise, mas, sim, pelo art. 33 “caput”, igualmente, o falso médico ou falso dentista.
Ministrar, por sua vez, é introduzir a substância no organismo humano. Aqui o crime também é próprio,
praticável apenas pelo médico, dentista, farmacêutico e profissionais da enfermagem.

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O parágrafo único do art. 38 prevê a comunicação da condenação ao Conselho Federal da Categoria e,


por isso, força convir que se trata de crime próprio, em ambos os verbos.

O juiz, na sentença condenatória, não poderá cassar a licença do profissional, mas deverá comunicar a
condenação ao respectivo Conselho Federal para que tome as providências administrativas necessárias. Nada
obsta que esta comunicação ocorra por ocasião do recebimento da denúncia.
Não se trata de um efeito da condenação, pois o juiz, na sentença condenatória, não poderá cassar a
licença.
Quanto ao sujeito passivo, é o paciente da infração, outrossim, a coletividade, pois o bem jurídico
protegido, além da saúde individual, também é a saúde pública.
A culpa, no delito em análise, é bem restrita, pois consiste no fato de se prescrever ou ministrar droga,
através de um dos seguintes atos:
a) sem que o paciente necessite. Exemplo: enfermeiro ministra droga no paciente errado.
b) em doses excessivas, isto é, além do necessário. Se o excesso não for excessivo, o fato será atípico.
c) em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Trata-se de uma norma penal em branco.
Exemplo: o médico prescreve maconha ao doente em situação que a lei ou regulamento não permite.
Outras hipóteses de culpa não são punidas.
O delito é de mera conduta, consuma-se, no verbo prescrever, quando o agente entrega a receita, ainda
que a droga não seja adquirida e, no verbo ministrar, quando a droga é introduzida no organismo humano.
Por ser crime culposo, não admite a tentativa.
Note-se que é um crime culposo de mera conduta, isto é, sem resultado naturalístico, figura rara no
ordenamento jurídico.
Sobrevindo a morte ou lesão, uma corrente sustenta que o agente responderá apenas pelos delitos de
homicídio ou lesão culposos, absorvendo-se o crime do art. 38 em estudo. Outra, ao revés, preconiza pela
existência do concurso material com delito em estudo, pois os bens jurídicos são distintos.

CRIME DE DIREÇÃO PERIGOSA DE AERONAVE OU EMBARCAÇÃO (ART. 39)

Dispõe do art.39:
“Conduzir embarcação ou aeronave após o consumo de drogas, expondo a dano potencial a
incolumidade de outrem:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, além da apreensão do veículo, cassação da habilitação
respectiva ou proibição de obtê-la, pelo mesmo prazo da pena privativa de liberdade aplicada, e pagamento
de 200 (duzentos) a 400 (quatrocentos) dias-multa”.
O delito em apreço abrange apenas a condução de embarcação ou aeronave.
Embarcação é qualquer construção, inclusive as plataformas flutuantes e, quando rebocadas, as fixas,
sujeita a inscrição na autoridade marítima e suscetível de se locomover na água, por meios próprios ou não,
transportando pessoas ou cargas (art. 2° da Lei 9.537/97).
Tratando-se de navio, que é a embarcação apta a navegar em alto mar, a competência será da justiça
federal (art. 109, IX, da CF).
Quanto às demais embarcações, a competência será da justiça estadual.
Aeronave, por sua vez, é todo aparelho manobrável em voo, que possa sustentar-se e circular no espaço
aéreo, mediante reações aerodinâmicas, apto a transportar pessoas ou coisas (art. 106 da Lei 7.565/86). Nesse
caso, a competência será da justiça federal (art. 109, IX, da CF).
Exige-se que essa condução ocorra após o consumo de drogas e ainda que haja perigo concreto à
incolumidade de alguém. Sem este perigo, não há o crime.
Se, sob efeito de álcool ou outra droga, o agente conduzir veículo terrestre, ele responderá pelo crime
de embriaguez ao volante do art. 306 do CTB, independentemente de perigo concreto.
Note-se que, em se tratando de embarcação ou aeronave, conduzida sob efeito de álcool, não se tipifica
o crime do art. 39 da Lei 11.343/2.006, pois o álcool não figura como droga na portaria da Anvisa. Não haverá
também o crime do art. 306 do CTB, que abrange apenas as vias terrestres. Todavia, em havendo perigo

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concreto, quando se tratar de embarcação, haverá a contravenção do art. 34 da LCP e, no caso de aeronave,
o crime do art. 132 do CP, mas sem perigo concreto o fato será atípico.
O núcleo do tipo é o verbo conduzir, que significa dirigir, guiar, colocar em funcionamento.
As penas cumulativamente previstas são as seguintes:
a) detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos. É, entretanto, possível a substituição pela pena restritiva
de direitos.
b) apreensão do veículo, pelo mesmo prazo da pena privativa de liberdade aplicada, ainda que esta
pena seja substituída por pena restritiva de direitos. Não será apreendido o veículo que pertença a terceiro de
boa-fé, pois a pena não pode passar da pessoa do condenado (art.5o, XLV, da CF).
c) cassação da habilitação, se habilitado, pelo mesmo prazo da pena privativa de liberdade aplicada.
Não se trata de uma cassação definitiva, mas temporária. Por isso, na linguagem técnica, não é cassação, mas
suspensão.
c) proibição de se obter a habilitação, quando não habilitado, pelo mesmo prazo da pena privativa de
liberdade aplicada.
d) pagamento de 200 (duzentos) a 400 (quatrocentos) dias-multa”.
A apreensão do veículo, cassação da habilitação e proibição de obtê-la, no delito em análise, são penas
restritivas de direitos, que constam no preceito secundário do tipo penal e, dessa forma, só podem ser
impostas após o trânsito em julgado da condenação. Entretanto, como medidas cautelares probatórias,
podem ser determinadas pelo juiz no curso da investigação ou do processo, por analogia ao art. 294 do CTB.
O parágrafo único do art. 39 prevê uma qualificadora de 4 (quatro) a 6 (seis) anos de detenção e multa
de 400 (quatrocentos) a 600 (seiscentos) dias-multa se a embarcação ou aeronave for de transporte coletivo
de passageiros. É preciso, para a incidência da qualificadora, que haja, ao tempo do crime, passageiros na
embarcação ou aeronave.

BENEFÍCIOS PROIBIDOS

Dispõe o art. 44:


“Os crimes previstos nos arts. 33, caput, §1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de
sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de
direitos.
Como se vê, aos crimes dos arts. 33, caput e §1º, 34 a 37, que são os apenados com reclusão, o art. 40
proíbe os seguintes benefícios:
a) fiança; anistia, graça e indulto. Note-se que a Constituição, no art. 5º, inciso XLIII, proíbe, tão
somente, a fiança, a anistia e a graça, silenciando sobre o indulto. A posição dominante, porém, é que a
expressão graça abrange também o indulto, e, por isso, não há qualquer inconstitucionalidade da lei ao proibi-
lo. A meu ver, a proibição deve ser restrita ao tráfico ilícito de drogas, previsto no art. 33, caput, e à sua figura
equiparada do §1º do art. 33, conforme determina o art. 5º, inciso XLIII, da CF, sendo inconstitucional a
vedação em relação aos demais delitos, previstos nos arts. 34 a 37.
b) liberdade provisória. O STF já declarou a inconstitucionalidade da vedação da liberdade provisória.
c) conversão em pena restritiva de direitos. O STF também já declarou a inconstitucionalidade desta
vedação, por violar o princípio da individualização da pena. Aliás, a Resolução 5/2012 do Senado Federal, com
base em acórdão do STF, cancelou a eficácia da parte final do art. 33, §4º, que proibia a substituição da pena
privativa de liberdade por pena restritiva de direitos.
d) sursis. Quanto à vedação do sursis, para uma corrente, é inconstitucional, pois os crimes hediondos,
tortura e terrorismo o admitem, de modo que a proibição aos delitos da Lei 11.343/2006 fere o princípio da
isonomia. Outra corrente, que é a dominante, considera válida a proibição do art. 40.
O parágrafo único do art. 44 ainda proíbe o livramento condicional ao reincidente específico. Quanto
ao não reincidente específico, será possível o livramento condicional, após o cumprimento de dois terços da
pena.
Por fim, o art. 59 ainda estabelece que, nos crimes previstos nos arts. 33, caput e §1º, e 34 a 37 desta
Lei, o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim

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reconhecido na sentença condenatória. A exigência de recolher-se à prisão para poder apelar também já foi
declarada inconstitucional pelo STF, por violação ao princípio da presunção da inocência.

APLICAÇÃO DA PENA

Sobre a aplicação da pena, dispõe o art. 42:


“O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código
Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente”.
A pena, como se sabe, é aplicada em três fases:
a) pena base;
b) agravantes e atenuantes;
c) causas de aumento e de diminuição de pena
A pena base, também chamada de pena provisória, é aplicada com fundamento nas circunstâncias
judiciais do art. 59 do CP.
Nos crimes da Lei de Drogas, entretanto, as circunstâncias do art. 42 tem preponderância sobre as do
art. 59 do CP. A preponderância significa que o juiz deve atribuir a elas um peso maior
São 4 (quatro) as circunstâncias judiciais preponderantes, previstas no art. 42 da Lei de Drogas. Ei-las:
a) natureza da droga. O crack, por exemplo, é uma droga altamente lesiva e viciante, justificando-se,
destarte, o aumento da pena base;
b) a quantidade da droga. O agente que, por exemplo, é surpreendido com um quilo de maconha não
pode ter o mesmo tratamento daquele que é flagrado com um quilo de cocaína, que é uma droga muito mais
cara e lesiva
c) a personalidade do agente;
d) conduta social do agente.
Quanto à personalidade e conduta social, também constam no art. 59 do CP.
Convém lembrar que as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, além da personalidade e conduta social,
são as seguintes:
a) culpabilidade;
b) antecedentes;
c) motivos;
d) circunstâncias do crime;
e) consequências do crime;
f) comportamento da vítima.
O juiz, ao aplicar a pena nos crimes de drogas, deve analisar, uma a uma, as circunstâncias do art. 42
da Lei de Drogas e do art. 59 do CP, sob pena de nulidade da sentença, em face da violação dos princípios da
suficiência e da individualização da pena.
Fixada a pena base, o próximo passo é a incidência das agravantes e atenuantes genéricas, previstas nos
arts. 61 a 66 do CP.
A propósito da agravante da reincidência, ela pode , segundo o STJ, aumentar a pena, na segunda
fase, e impedir a concessão do benefício do tráfico privilegiado, previsto no § 4º do art. 34, que reduz a
pena, na terceira fase, em relação ao traficante primário, sem que se possa falar em “bis in idem”, pois são
consequências jurídico legais do mesmo instituto.
Por outro lado, a confissão espontânea é uma atenuante genérica da pena, prevista no art. 65, III, “d”,
do CP, mas, no delito de tráfico ilícito de drogas , não basta, para usufruir da referida atenuante, a confissão
da autoria, pois é ainda necessário que confesse a traficância.
A propósito, dispõe a Súmula 630 do STJ:
“A incidência da atenuante da confissão espontânea no crime de tráfico ilícito de entorpecentes exige
o reconhecimento da traficância pelo acusado, não bastando a mera admissão da posse ou propriedade para
uso próprio”.
Após a incidência das agravantes e atenuantes, o juiz deve fazer incidir as causas de aumento e de
diminuição de pena.

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No tocante à fixação da pena de multa, dispõe o art. 43 da Lei de Drogas:


“Na fixação da multa a que se referem os arts. 33 a 39 desta Lei, o juiz, atendendo ao que dispõe o art.
42 desta Lei, determinará o número de dias-multa, atribuindo a cada um, segundo as condições econômicas
dos acusados, valor não inferior a um trinta avos nem superior a 5 (cinco) vezes o maior salário-mínimo”.
Primeiro fixa-se a quantidade dos dias-multa, com base nas circunstâncias dos arts. 42 da Lei de Drogas
e 59 do CP e depois o valor de cada dia, de acordo com a situação econômica do réu
O parágrafo único do art. 43 acrescenta que:
“As multas, que em caso de concurso de crimes serão impostas sempre cumulativamente, podem ser
aumentadas até o décuplo se, em virtude da situação econômica do acusado, considerá-las o juiz ineficazes,
ainda que aplicadas no máximo”.

DELAÇÃO PREMIADA

Dispõe o art. 41 da Lei 11.343/2006:


“O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo
criminal na identificação dos demais coautores ou partícipes do crime e na recuperação total ou parcial do
produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um terço a dois terços”.
Trata-se de causa obrigatória de redução da pena de um a dois terços, cujos requisitos são:
a) colaboração voluntária;
b) eficácia da delação na identificação dos demais coautores e partícipes e na recuperação total ou
parcial do produto do crime.

CAUSAS DE AUMENTO DE PENA

Dispõe o art. 40:


“As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se:
I - a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato
evidenciarem a transnacionalidade do delito;
II - o agente praticar o crime prevalecendo-se de função pública ou no desempenho de missão de
educação, poder familiar, guarda ou vigilância;
III - a infração tiver sido cometida nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais, de
ensino ou hospitalares, de sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas, ou
beneficentes, de locais de trabalho coletivo, de recintos onde se realizem espetáculos ou diversões de
qualquer natureza, de serviços de tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção social, de unidades
militares ou policiais ou em transportes públicos;
IV - o crime tiver sido praticado com violência, grave ameaça, emprego de arma de fogo, ou qualquer
processo de intimidação difusa ou coletiva;
V - caracterizado o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal;
VI - sua prática envolver ou visar a atingir criança ou adolescente ou a quem tenha, por qualquer motivo,
diminuída ou suprimida a capacidade de entendimento e determinação;
VII - o agente financiar ou custear a prática do crime.”

As aludidas causas de aumento de pena, de um sexto a dois terços, são aplicáveis aos delitos dos arts. 33
a 37.
Em caso de concurso material entre os aludidos delitos, haverá a incidência da mesma majorante sobre
cada um deles, sem que se possa falar em “bis in idem”, pois são delitos autônomos e independentes.
Quanto ao critério do aumento da pena, que varia entre um sexto a dois terços, não é a pluralidade de
majorantes previstas no art. 40, conforme raciocínio extraído da súmula 443 do STJ, mas, sim, a
fundamentação concreta.
As referidas causas de aumento de pena só não são aplicadas a quatro crimes:
a) porte de drogas para consumo próprio (art. 28, caput);

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b) plantio de drogas para consumo próprio (art. 28, §1º);


c) prescrever ou ministrar culposamente, drogas (art. 38);
d) direção perigosa de aeronave ou embarcação (art. 39).
Passo agora à análise de cada uma delas.

Transnacionalidade do delito (art. 40, I)

Tráfico transnacional ou internacional é o que envolve o Brasil e outro país, desde que o fato seja crime
em ambos os países.
O lança perfume, por exemplo, não é crime na Argentina, de modo que a sua importação para o Brasil,
por exemplo, caracterizará o crime de tráfico interno, igualmente, a sua exportação do Brasil para a Argentina,
cuja competência é afeta à justiça estadual.
É ainda necessário, para que haja o tráfico transnacional, que a conduta ou resultado ocorra no Brasil,
ainda que parcialmente, ou então que seja esta a intenção do agente, pois se a integralidade da conduta
criminosa e do resultado houver sido cometidos no exterior, sem qualquer intenção de atingir o Brasil, a
questão será de extraterritorialidade, deferindo-se a competência à justiça estadual.
O que evidencia a transnacionalidade é a natureza da droga, a sua procedência e outras circunstâncias de
fato.
O fato de a droga ser estrangeira, porém, por si só, não caracteriza o tráfico internacional.
Igualmente, o estrangeiro flagrado no tráfico, pelo simples fato de ser estrangeiro, não pode ser
enquadrado no tráfico internacional.
No caso de tráfico transnacional, a competência será da justiça federal e nas demais hipóteses, justiça
estadual (Súmula 522 do STF).
A competência da justiça federal se justifica, nos termos do art. 109, V, da CF, por se tratar de um crime
que, em razão de tratado internacional, em especial, através da convenção de Viena, o Brasil se obrigou a
reprimir.
Se, no município da consumação do tráfico transnacional, não houver justiça federal, a competência
será da sessão judiciária da justiça federal a que pertencer o referido município.
Outro delito da Lei de Drogas da competência da justiça federal é o cometido a bordo de navios e
aeronaves (art. 109, IX, da CF).
O fato de o agente levar drogar para o exterior, por si só, não configura o delito de tráfico internacional,
que não se caracteriza quando o fato não for crime no outro país, outrossim, quando o fizer para consumo
próprio.
A majorante do tráfico transnacional de drogas se configura com a prova da destinação internacional
das drogas, ainda que não consumada a transposição de fronteiras (súmula 607 do STJ). Exemplo: a droga é
apreendida em aeroporto internacional, antes do embarque para o exterior.
A destinação internacional é a intenção de levar a droga de um país para outro.
Em regra, o tráfico internacional se verifica nos verbos importar e exportar, mas é também possível a
sua configuração noutros verbos. Exemplo: posta no correio um envelope contendo drogas, com destino ao
exterior. Outro exemplo: guarda a droga que será destinada a outro país.
A propósito, nos verbos importar e exportar o tráfico necessariamente é transnacional e, por isso, uma
corrente sustenta que a referida majorante, por ser elemento do tipo, não incidiria nestes dois verbos, sob
pena de “bis in idem”, mas o STJ não aceita este ponto de vista.
De fato, é possível importar ou exportar drogas sem caráter transnacional, por isso, a
transnacionalidade não é essencial aos aludidos verbos.
Por fim, a majorante do incisivo se refere à transnacionalidade do delito, e não apenas ao tráfico de
drogas transacional, de modo não paira qualquer discussão acerca de sua aplicação a todos os delitos
previstos entre os art. 33 a 37.

Prevalecendo-se de função pública (art. 40, II, 1ª parte)

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A função pública é a que realiza fins próprios do Estado, aplicando-se, para identificá-la, o art. 327 do
CP.
É necessário, para a incidência da causa de aumento de pena, o nexo causal entre o delito e a função
pública, ou seja, que esta tenha facilitado o crime.
A função pública, a que se refere o texto legal, pode ser qualquer uma, e não apenas aquelas
relacionadas com o combate à criminalidade.
Quanto ao delegado de polícia, que vende a droga apreendida, sobre a qual tinha a detenção, responde
pelo crime de peculato em concurso com o delito de tráfico de drogas, incidindo sobre este último crime a
majorante do art. 40, II.

Delito praticado no desempenho de missão de educação, poder familiar, guarda ou vigilância (art. 40,
II, parte final)

Educação é a arte de ensinar. Abrange qualquer modalidade de ensino, inclusive, cursos livres e aulas
particulares em residência.
O poder familiar é o atribuído aos pais de representar ou assistir os filhos menores.
A guarda é poder dever de ter em sua companhia os menores ou maiores incapazes, por força de lei ou
mediante decisão judicial.
A vigilância é o dever de fiscalizar uma pessoa ou determinado local, ainda que de forma eventual.
Conquanto a lei seja omissa, a majorante só se aplica para quem exerce a função de vigilância de locais que
contém licitamente a droga. Exemplo: vigia de um laboratório farmacêutico.

Infração cometida nas dependências ou imediações de estabelecimentos ou em transporte (art. 40,


III)

As dependências do estabelecimento abrangem a sua área interna e externa, que os delimita, como,
por exemplo, o quintal ou jardim.
As imediações compreendem as áreas que não integram o estabelecimento, mas que se localizam nas
proximidades. Exemplo: tráfico de drogas na esquina de uma escola.
Os estabelecimentos a que se refere o art. 40, III, são os seguintes:
a) prisionais;
b) de ensino;
c) hospitalares;
d) sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas ou beneficentes;
e) de locais de trabalho coletivo;
f) de recintos onde se realizem espetáculos ou diversões de qualquer natureza;
g) de serviços de tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção social;
h) de unidades militares ou policiais.
A majorante também incide nos delitos cometidos em transportes públicos. Exemplos: ônibus, metrô.
Não abrange, porém, o interior de táxi ou uber, que são veículos de transporte individual.
O rol acima é taxativo. Não se admite a analogia. Assim, nas imediações de condomínio ou de praça
pública, não há o aumento de pena.
É pacífico que não é preciso que a droga seja destinada às pessoas que frequentam os referidos locais.
Exige-se, porém, que o crime seja efetivamente cometido num desses locais. Não basta, para a
incidência da majorante, a prática de atos preparatórios nos referidos locais.
A corrente objetiva sustenta que, para a incidência da majorante, basta portar a droga num dos
referidos locais.
A corrente subjetiva, porém, defende que é necessário a intenção de entregar a droga nos referidos
locais. É a posição atual do STF e STJ.

Crime praticado com violência, grave ameaça, emprego de arma de fogo, ou qualquer processo de

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intimidação difusa ou coletiva (art. 40, IV)

Violência física é a força bruta, que envolve vias de fato ou lesões corporais. Exemplo: empurrão.
Grave ameaça é a promessa de malefício.
Emprego de arma de fogo é o uso ou porte ostensivo. Não abrange as armas que não são de fogo, como
o punhal, a espada, etc.
Os delitos de lesão corporal, ameaça e porte ilegal de arma de fogo serào absorvidos, por força do
princípio da subsidiariedade implícita, pois já funcionam como causas de aumento de pena.
Qualquer processo de intimação difusa ou coletiva. Aqui o legislador fez uso da interpretação analógica,
pois se trata de fórmula genérica que visa abranger meios similares à violência, grave ameaça e emprego de
arma de fogo. Exemplo: toque de recolher imposto pelo traficante. A intimidação difusa é a que atinge um
número indeterminado de pessoas e a coletiva mira um grupo determinado de pessoas.

Tráfico interestadual (art. 40, V)

Tráfico estadual é o que se estende a dois ou mais Estados ou entre estes e o Distrito Federal. Exemplo:
transportar maconha do Estado de São Paulo para o Estado do Paraná.
Sobre o assunto, dispõe a súmula 587 do STJ:
“Para a incidência da majorante prevista no artigo 40, inciso V, da lei 11.343/06 é desnecessária a efetiva
transposição de fronteiras entre Estados da Federação, sendo suficiente a demonstração inequívoca da
intenção de realizar o tráfico interestadual”.
Quanto ao tráfico intermunicipal, que envolve dois ou mais municípios do mesmo Estado, não gera o
aumento da pena.
A presença do tráfico transnacional absorve a majorante do tráfico interestadual, pelo mesmo fato, pois
há entre eles uma relação de meio e fim.
A majorante em análise se refere ao tráfico e, dessa forma, uma corrente sustenta que só é aplicável ao
delito do art. 33. Outra, ao revés, defende a sua incidência sobre todos os delitos compreendidos entre os
arts. 33 a 37, pois não há qualquer ressalva expressa para excluí-los.

Delito cuja prática envolve ou visa atingir criança ou adolescente ou a quem tenha, por qualquer
motivo, diminuída ou suprimida a capacidade de entendimento e determinação (art. 40, VI)

Delito cuja prática envolve ou visa atingir criança ou adolescente ou a quem tenha, por qualquer motivo,
diminuída ou suprimida a capacidade de entendimento e determinação (art. 40, VI)
Criança é a pessoa que ainda não completou 12 (doze) anos de idade.
Adolescente é a pessoa entre 12 (doze) anos completos e 18 (dezoito) incompletos.
Pessoa com a capacidade de entendimento e determinação suprimida é a que encontra-se totalmente
privada da razão. Exemplo: enfermo ou deficiente mental sem discernimento. Outro exemplo: embriaguez
completa. Mais um exemplo: pessoa em coma.
Pessoa com a capacidade de entendimento e determinação diminuída é a que encontra-se parcialmente
privada da razão. Exemplo: semi-imputável. Outro exemplo: embriaguez incompleta. Mais um exemplo: sob
estado de violenta emoção.
Trata-se de um rol taxativo, que não abrange o idoso nem o enfermo, que se encontram em perfeito
juízo.
É preciso, para a incidência da majorante, que o crime seja praticado com o concurso de uma destas
pessoas ou então que a droga se destine a elas.
Noutras palavras, incide a majorante quando uma destas pessoas figurarem como sujeito ativo ou
sujeito passivo do delito.
Não basta, destarte, a simples presença de uma destas pessoas no local do crime. Não incide, por
exemplo, a majorante quando se vende drogas na frente de uma criança.
Quanto ao traficante que praticar o delito juntamente com criança e adolescente, há duas correntes.

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Primeira, responderá pelo crime de tráfico de drogas em concurso material com o delito de corrupção
de menores, previsto no art. 244-B do ECA, mas, nesse caso, não incidirá a majorante do art. 40, VI, pois ela já
figura como elemento deste último tipo penal. Se, entretanto, se tratar de criança ou adolescente
completamente corrompidos, não há falar-se no delito de corrupção de menores, que se revela crime
impossível, mas o agente responderá pelo delito de tráfico de drogas, com a majorante do art. 40, VI, em
estudo.
Segunda, responderá apenas pelo delito de tráfico de drogas, com a majorante do art. 40, VI, quer o
menor seja ou não corrompido. Quanto ao crime de corrupção de menores, será sempre absorvido, por força
do princípio da especialidade. É a posição dominante na jurisprudência.

Financiar ou custear a prática do crime (art. 40, VII)

Financiar ou custear é disponibilizar os recursos financeiros e materiais para que o delito seja cometido.
Esta majorante, entretanto, não é aplicável ao delito do art. 36, pois, nesse caso, o financiamento ou
custeio funcionam como elementos do tipo.
Quanto ao sujeito que atua simultaneamente como financiador e traficante, o assunto, conforme já
visto, é polêmico.
Uma corrente o enquadra apenas no tráfico de drogas, com a incidência da majorante do art. 40, VII.
Outra o enquadra apenas no delito do art. 36, sem a majorante do art. 40, VII.
Uma terceira sustenta o concurso entre os dois delitos, sem a aludida majorante.
Caso se admita como correta a segunda ou terceira corrente, a majorante em estudo nunca seria
aplicada.

INIMPUTABILIDADE E SEMI-IMPUTABILIDADE

Na Lei 11.343/2006, a inimputabilidade e semi-imputabilidade, além das causas previstas no art. 26 do


CP, podem ainda ser determinadas por outras duas causas:
a) o agente é dependente de droga, ou
b) o agente encontra-se sob efeito de droga, em razão de caso fortuito ou força maior. Ex.: alguém
coloca droga na bebida do agente sem que ele perceba.
Adotou-se, no entanto, o sistema biopsicológico, portanto, não basta a causa, isto é, a dependência em
drogas ou estar sob efeito da droga por caso fortuito ou força maior. É ainda preciso que, em razão disso, o
agente se encontre com a capacidade de entender ou querer suprimida (inimputabilidade) ou reduzida (semi-
imputabilidade).
Presentes uma dessas causas, o agente poderá ser:
a) inimputável;
b) semi-imputável;
c) imputável.
No interrogatório, não é obrigatória a pergunta acerca da dependência em drogas.

Inimputabilidade

A inimputabilidade por dependência toxicológica ou por se encontrar sob os efeitos da droga em razão
de caso fortuito ou força maior se verifica quando o agente, ao tempo da conduta criminosa, for inteiramente
incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento.
Nesse caso, ele será isento de pena, isto é, será absolvido (art. 45, caput), qualquer que seja o crime
praticado, mas o juiz poderá determinar, na sentença, o seu encaminhamento para o tratamento médico
adequado (parágrafo único do art. 45).
Não se trata, a rigor, de medida de segurança e, sim, de um tratamento da dependência químico-
toxicológica.
Se, entretanto, a absolvição se verificar em função de o agente encontrar-se sob o efeito da droga por

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caso fortuito ou força maior, nenhum tratamento médico lhe será imposto.
A inimputabilidade por dependência toxicológica ou por se encontrar sob os efeitos da droga em razão
de caso fortuito ou força maior gera a absolvição, nos termos acima, em relação a qualquer crime. Se, por
exemplo, o dependente toxicológico inimputável praticar um delito de roubo, o juiz deverá absolvê-lo, com
fundamento do art. 45 e parágrafo único da Lei de Drogas.
Sobre a inimputabilidade, dispõe o art. 45:
É isento de pena o agente que, em razão da dependência, ou sob o efeito, proveniente de caso fortuito
ou força maior, de droga, era, ao tempo da ação ou da omissão, qualquer que tenha sido a infração penal
praticada, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento”.
O parágrafo único do art. 45 acrescenta que:
“Quando absolver o agente, reconhecendo, por força pericial, que este apresentava, à época do fato
previsto neste artigo, as condições referidas no caput deste artigo, poderá determinar o juiz, na sentença, o
seu encaminhamento para tratamento médico adequado”.

Semi-imputabilidade

Ocorre a semi-imputábilidade, por dependência toxicológica: ou por se encontrar sob os efeitos da


droga em razão de caso fortuito ou força maior, quando ao tempo da conduta criminosa, o agente não tinha
a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento.
Nesse caso, que é de mera diminuição da capacidade de entender ou querer, e não propriamente de
supressão, a sentença será condenatória, mas a pena será reduzida de um a dois terços (art. 46).
O juiz ainda, em caso de necessidade, poderá ordenar a realização de tratamento médico durante o
cumprimento da pena, dentro do próprio presídio (art. 47).
Este tratamento não tem a natureza jurídica de medida de segurança.
Não há, pois, ao contrário do que prevê o Código Penal, a possibilidade de se substituir a pena por
medida de segurança.
Acerca da semi-imputabilidade, reza o art. 46:
“As penas podem ser reduzidas de um terço a dois terços se, por força das circunstâncias previstas no
art. 45 desta Lei, o agente não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o
caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.”
O art. 47 acrescenta que:
“Na sentença condenatória, o juiz, com base em avaliação que ateste a necessidade de
encaminhamento do agente para tratamento, realizada por profissional de saúde com competência específica
na forma da lei, determinará que a tal se proceda, observado o disposto no art. 26 desta Lei.”

Imputabilidade

Verifica-se a imputabilidade quando, ao tempo da conduta criminosa, o agente encontrava-se


totalmente capaz de entender o caráter ilícito do fato e determinar-se de acordo com esse entendimento.
Nesse caso, ele poderá ser condenado ou absolvido, mas sem que haja a imposição de qualquer
tratamento médico.
Será igualmente imputável o agente que, ao tempo da conduta criminosa, estava sob os efeitos das
drogas e sem capacidade de entender ou querer, mas que, no entanto, não ostentava a condição de
dependente das drogas nem estava sob os efeitos dela em razão de caso fortuito ou força maior.
De fato, como se sabe, a embriaguez produzida pelo álcool, drogas ou outras substâncias similares, não
excluem a imputabilidade penal (art. 28, I, do CP).

Prova da inimputabilidade e semi-imputabilidade

No caso do dependente da droga, ainda esteja interditado, é necessário, para se comprovar a

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inimputabilidade ou semi-imputabilidade, a instauração do incidente de dependência toxicológica, pois a


interdição civil é insuficiente para produzir efeitos na seara penal.
O referido incidente poderá ser ordenado apenas pelo juiz, no curso da investigação criminal ou na fase
processual.
Para a instauração do incidente, não basta a defesa alegar que o réu é dependente de drogas, sendo
ainda necessário indícios concretos capazes de realmente gerar a dúvida acerca da sua higidez mental.
No tocante à inimputabilidade oriunda de caso fortuito ou força maior, em face de sua transitoriedade,
não há a instauração do referido incidente, devendo a inimputabilidade ou semi-imputabilidade ser
comprovada através de testemunhas ou de exame clínico.
O incidente de dependência toxicológica segue o procedimento do incidente de insanidade mental,
disciplinado pelos arts. 149 a 154 do CPP, aplicável subsidiariamente à Lei de Drogas.
Determinada a realização do exame pericial de dependência toxicológica, o juiz deverá nomear curador
ao réu, sob pena de nulidade dos atos processuais, mas nada obsta que o próprio defensor seja nomeado
como curador.
O art. 149, § 2º, do CPP determina a suspensão do processo, até que seja realizado o exame de
insanidade mental, mas o § 2º do art. 56 da Lei de Drogas, que é norma especial, não prevê a suspensão do
processo.
O prazo para o perito concluir o exame de insanidade mental, no CPP, é de 45 (quarenta e cinco) dias,
enquanto que na Lei de Drogas é de 90 (noventa) dias.
O juiz, por força do princípio da livre convicção, não é obrigado a decidir conforme o laudo pericial,
podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em parte, pois é o perito dos peritos, desde que se fundamente
em outras provas (art. 182 do CPP).

INVESTIGAÇÃO PENAL

No procedimento investigatório da Lei de Drogas, há as seguintes peculiaridades:


a) lavratura do auto da infração em flagrante;
b) prazo para conclusão do inquérito policial;
c) infiltração e ação controlada dos policiais.
No tocante à lavratura do auto da infração em flagrante: basta, para comprovar a materialidade, o laudo
de constatação da natureza e quantidade da droga, firmado por perito oficial e, na falta dele, por pessoa
idônea (exemplo: policial com experiência na área).
Este laudo de constatação é a conclusão, a olho nu ou através de um kit reagente, de que a substância
apreendida é maconha, cocaína, etc.
O perito que subscreve o laudo de constatação não ficará impedido de participar do laudo definitivo
(art. 50, §2º).
Quanto ao inquérito policial, deverá ser concluído no prazo de 30 (trinta) dias, se o indiciado estiver
preso, e de 90 (noventa) dias, quando solto (art. 51).
Estes prazos podem ser duplicados pelo juiz, ouvido o Ministério Público, mediante pedido justificado
da autoridade policial (art. 50, parágrafo único).
Por outro lado, durante as investigações policiais, admite-se dois instrumentos de obtenção de provas,
a saber:
a) infiltração dos agentes da polícia, no grupo criminoso;
b) ação controlada ou flagrante diferido ou retardamento da prisão em flagrante, que é o fato dos
agentes policiais aguardarem o momento mais propício para efetuar a prisão, com a finalidade de identificar
e responsabilizar maior número de integrantes do grupo criminoso. Isso só é possível quando o criminoso se
encontrar em território nacional e desde que seja conhecido o itinerário provável que será adotado por ele.
Estas duas medidas dependem de autorização do juiz, ouvido o Ministério Público, podendo ser tomada
em qualquer fase da persecução penal (art. 53).

PROCEDIMENTO ESPECIAL

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É de 10 (dez) dias o prazo para o Ministério Público oferecer a denúncia quer se se trate de indiciado
preso ou solto.
A denúncia pode ser oferecida com base no laudo de constatação.
Todavia, para a condenação, é essencial o laudo toxicológico definitivo, sob pena de nulidade da
sentença.
Oferecida a denúncia, o juiz, antes de recebê-la, ordenará a notificação do acusado para oferecer a
defesa preliminar, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias.
A falta dessa defesa preliminar acarreta a nulidade do processo e, por isso, o juiz nomeará um defensor
para apresentar essa defesa se o réu não a fizer.
Apresentada a defesa, o juiz, sem ouvir o Ministério Público, decidirá em 5 (cinco) dias pelo recebimento
ou rejeição da denúncia.
Vale lembrar que tanto o Ministério Público, na denúncia, quanto o acusado, na defesa preliminar,
podem arrolar até 5(cinco) testemunhas.
Recebida a denúncia, o juiz designará audiência de instrução e julgamento, ordenará a citação pessoal
do réu e a intimação do Ministério Público.
Note-se que, após o recebimento da denúncia, a lei não prevê a manifestação do Ministério Público.
Se o réu for funcionário público que houver praticado um dos delitos dos arts. 33, caput e §1º, 34 e 37,
o juiz ao receber a denúncia, poderá decretar o afastamento cautelar de suas atividades.
Na audiência de instrução e julgamento, pela lei 13.343/2006, o primeiro ato é o interrogatório do réu.
Entretanto, por força do princípio da ampla defesa e da aplicação subsidiária do CPP, o interrogatório é
último ato da instrução, em todos os procedimentos, inclusive, nos crimes de drogas. Trata-se de uma
jurisprudência pacífica, tanto no STF quanto do STJ.
Nesta audiência haverá a inquirição das testemunhas de acusação e defesa, sucessivamente e, por
último, o interrogatório.
Em seguida, as partes falam em debates pelo prazo de 20 (vinte) minutos prorrogável por mais 10 (dez)
a critério do juiz. Primeiro fala o Ministério Público e depois a defesa.
Esta audiência será realizada dentro de 30 (trinta) dias, a contar do recebimento da denúncia, salvo
quando o juiz determinar a realização de perícia para atestar a dependência da droga, nesse caso, o prazo
para a realização da audiência será de 90 (noventa) dias.
Encerrados os debates, proferirá o juiz sentença de imediato ou em 10 (dez) dias.

DESTRUIÇÃO DAS DROGAS

A destruição das drogas depende de ordem judicial.


A destruição das drogas será executada pelo delegado de polícia competente, na presença do Ministério
Público e da autoridade sanitária (art. 50, §4º).
A forma de execução é a incineração.
O local será vistoriado antes e depois de efetivada a destruição das drogas referida no §3º, sendo
lavrado auto circunstanciado pelo delegado de polícia, certificando-se neste a destruição total delas (art. 50,
§5º).
Quanto ao prazo para a autoridade policial executar a destruição varia conforme haja ou não prisão em
flagrante.
São três situações:
a) prisão em flagrante. Recebida cópia do auto de prisão em flagrante, o juiz, no prazo de 10 (dez) dias,
certificará a regularidade formal do laudo de constatação e determinará a destruição das drogas apreendidas,
no prazo de 15 (quinze) dias, a contar da decisão judicial, guardando-se amostra necessária à realização do
laudo definitivo(
b) sem prisão em flagrante. A destruição das drogas apreendidas sem a ocorrência de prisão em
flagrante será feita por incineração, no prazo máximo de 30 (trinta) dias contados da data da apreensão,
guardando-se amostra necessária à realização do laudo definitivo (art. 50-A). O prazo de 30 (trinta) dias não

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se conta da decisão judicial que ordenou a destruição, mas, sim, da apreensão da droga.
c) destruição das amostras guardadas para contraprova. Nesse caso, a destruição só poderá ser
ordenada pelo juiz após o trânsito em julgado da sentença condenatória ou absolutória ou da decisão que
extinguiu a punibilidade, outrossim, após o arquivamento do inquérito policial. A propósito, dispõe o art. 72:
“Encerrado o processo criminal ou arquivado o inquérito policial, o juiz, de ofício, mediante representação da
autoridade de polícia judiciária, ou a requerimento do Ministério Público, determinará a destruição das
amostras guardadas para contraprova, certificando nos autos”. Esta destruição deve ser executada
imediatamente após a decisão judicial, malgrado o silêncio da lei.

DESTRUIÇÃO DAS PLANTAÇÕES

As plantações ilícitas serão imediatamente destruídas pelo delegado de polícia na forma do art. 50-A,
que recolherá quantidade suficiente para exame pericial, de tudo lavrando auto de levantamento das
condições encontradas, com a delimitação do local, asseguradas as medidas necessárias para a preservação
da prova (art. 32).
As plantas ilícitas, ao contrário das drogas, devem ser imediatamente destruídas pela autoridade
policial, sem ordem judicial, recolhendo-se, porém, quantidade suficiente para exame pericial.
As glebas cultivadas com plantações ilícitas serão expropriadas, conforme o disposto no art. 243 da
Constituição Federal, de acordo com a legislação em vigor (§4º do art. 32).

DA APREENSÃO, ARRECADAÇÃO E DESTINAÇÃO DE BENS DO ACUSADO

Apreensão e sequestro

A decretação da apreensão dos bens móveis ou sequestro dos imóveis pode ocorrer no curso do
inquérito ou da ação penal.
A busca e apreensão tem por objeto o produto direto do crime, ou seja, a coisa móvel obtida por meio
criminoso, nos termos do art. 121 do CPP. Exemplo: a barra de ouro recebida em troca da droga.
O sequestro, por sua vez, se refere às coisas, móveis ou imóveis, adquiridas com o delito mediante
especificação ou alienação. Trata-se do produto indireto do crime. Exemplo: transformação da barra de ouro
em correntes de ouro. Outro exemplo: dinheiro obtido com a venda da barra de ouro.
Além da apreensão e do sequestro, o juiz poderá decretar outras medidas assecuratórias.
A decretação destas medidas não pode ser ordenada de ofício pelo juiz, pois depende de requerimento
do Ministério Público ou do assistente de acusação, ou de representação da autoridade policial.
É ainda necessário que haja suspeita de que os bens, direitos ou valores sejam produto do crime ou
constituam proveito dos crimes.
O ônus da prova desta suspeita compete ao requerente.
Não há, destarte, a presunção acerca da origem ilícita desses bens.
A propósito, dispõe o art. 60:
“O juiz, a requerimento do Ministério Público ou do assistente de acusação, ou mediante representação
da autoridade de polícia judiciária, poderá decretar, no curso do inquérito ou da ação penal, a apreensão e
outras medidas assecuratórias nos casos em que haja suspeita de que os bens, direitos ou valores sejam
produto do crime ou constituam proveito dos crimes previstos nesta Lei, procedendo-se na forma dos arts.
125 e seguintes do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo”.
A ordem de apreensão ou sequestro de bens, direitos ou valores poderá ser suspensa pelo juiz, ouvido
o Ministério Público, quando a sua execução imediata puder comprometer as investigações (§4º do art. 60).

Apreensão dos instrumentos do crime

Os instrumentos do crime, que são os meios utilizados pelo agente para a prática do delito, poderão ser
apreendidos pela autoridade policial, sem ordem judicial, que deverá comunicar a apreensão ao juiz

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competente. Exemplo: avião utilizado para transporte da droga.


A propósito, dispõe o art. 61 do CPP:
“A apreensão de veículos, embarcações, aeronaves e quaisquer outros meios de transporte e dos
maquinários, utensílios, instrumentos e objetos de qualquer natureza utilizados para a prática dos crimes
definidos na Lei de Drogas será imediatamente comunicada pela autoridade de polícia judiciária responsável
pela investigação ao juízo competente”.

Pedido de restituição

Nenhum pedido de restituição será conhecido sem o comparecimento pessoal do acusado, podendo o
juiz determinar a prática de atos necessários à conservação de bens, direitos ou valores (art. 63-A).

Utilização dos bens apreendidos pelos órgãos da polícia

Comprovado o interesse público na utilização de quaisquer dos bens de que trata o art. 61, os órgãos
de polícia judiciária, militar e rodoviária poderão deles fazer uso, sob sua responsabilidade e com o objetivo
de sua conservação, mediante autorização judicial, ouvido o Ministério Público e garantida a prévia avaliação
dos respectivos bens ( art. 62).
A utilização dos bens só pode ser deferida aos órgãos da polícia.
O juízo deve cientificar o órgão gestor do FUNAD para que, em 10 (dez) dias, avalie a existência do
referido interesse público mencionado e indique o órgão que deve receber o bem.
Têm prioridade para receber os aludidos bens os órgãos de segurança pública que participaram das
ações de investigação ou repressão ao crime que deu causa à medida.
A autorização judicial de uso de bens deverá conter a descrição do bem e a respectiva avaliação e indicar
o órgão responsável por sua utilização.
Quando a autorização judicial recair sobre veículos, embarcações ou aeronaves, o juiz ordenará à
autoridade ou ao órgão de registro e controle a expedição de certificado provisório de registro e licenciamento
em favor do órgão ao qual tenha deferido o uso ou custódia, ficando este livre do pagamento de multas,
encargos e tributos anteriores à decisão de utilização do bem até o trânsito em julgado da decisão que decretar
o seu perdimento em favor da União.
O uso do bem, em razão da ordem judicial, é provisório, pois perdura somente até o trânsito em julgado
da condenação que ordenou o seu confisco em favor da União.
Caso não haja o confisco e seja constatada a depreciação do bem, o ente federado ou a entidade que
utilizou o bem indenizará o detentor ou proprietário dos bens.

Alienação antecipada

A alienação antecipada será ordenada de ofício pelo juiz, em relação aos seguintes bens:
a) instrumentos do crime, exceto as armas de fogo e os bens cujo uso tenha sido atribuído aos órgãos
da polícia. O juiz, no prazo de 30 (trinta) dias contado da comunicação da apreensão pela autoridade policial,
determinará a alienação dos bens que constituem instrumentos do crime, excetuadas as armas, que serão
recolhidas na forma da legislação específica.
b) moedas estrangeiras apreendidas. A moeda estrangeira apreendida em espécie deve ser
encaminhada a instituição financeira, ou equiparada, para alienação na forma prevista pelo Conselho
Monetário Nacional. Na hipótese de impossibilidade da alienação, a moeda estrangeira será custodiada pela
instituição financeira até decisão sobre o seu destino. Após o confisco da moeda estrangeira, caso seja
verificada a inexistência de valor de mercado, seus espécimes poderão ser destruídos ou doados à
representação diplomática do país de origem.
c) demais bens apreendidos e sequestrados que estiverem sujeitos a qualquer grau de deterioração ou
depreciação, ou quando houver dificuldade para sua manutenção (art. 144-A do CPP).
Quando a apreensão recair sobre títulos, valores mobiliários ou cheques emitidos como ordem de

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pagamento, será determinada, imediatamente, a sua conversão em moeda nacional.


Assim, os cheques e demais títulos deverão ser imediatamente descontados.

CONFISCO

Confisco é a perda, em favor da União, do produto, proveito e instrumento do crime.


O juiz, na sentença condenatória, decidirá sobre o confisco, que é o perdimento dos bens ou valores
apreendidos, sequestrados ou declarados indisponíveis.
O parágrafo único do art. 243 da CF esclarece que:
“Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será confiscado e reverterá a fundo especial
com destinação específica, na forma da lei”.
Assim, o confisco recai sobre os bens, direitos ou valores que sejam
a) produto do crime;
b) proveito do crime;
c) instrumentos do crime. Ainda que a origem do bem seja lícita ele será confiscado se houver sido
utilizado para a prática de qualquer dos crimes da Lei de Drogas. Nos demais crimes, os instrumentos só podem
ser confiscados quando seu fabrico, alienação uso, porte ou detenção constituir fato ilícito (art. 92 do CP).
Na Lei de Drogas, o confisco não é efeito automático da condenação, ao contrário do confisco do Código
Penal, pois o art. 63, I, exige que o juiz decida expressamente sobre o assunto. Em caso de omissão da
sentença, não há falar-se em confisco, salvo quanto aos instrumentos do crime, quando seu fabrico, alienação
uso, porte ou detenção constituir fato ilícito (art. 92 do CP).
Sobre o confisco das glebas de terra, dispõe o art. 243, caput, da CF:
“As propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de
plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à
reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo
de outras sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no art. 5º”.
O procedimento dessa expropriação de glebas de terras é regulamentado pela Lei 8.257/91.

Destino dos bens confiscados

Quanto aos bens confiscados e não leiloados antecipadamente, a União, através do SENAD, do
Ministério da Justiça e Segurança Pública, poderá lhes dar a seguinte destinação;
a) alienação (art. 63-C). Neste caso, o valor arrecadado será destinado ao Funad;
b) incorporação ao patrimônio de órgão da administração pública, observadas as finalidades do Funad;
c) destruição.
d) inutilização.
O produto da alienação dos bens apreendidos ou confiscados será revertido integralmente ao Funad,
nos termos do parágrafo único do art. 243 da Constituição Federal, vedada a sub-rogação sobre o valor da
arrematação para saldar eventuais multas, encargos ou tributos pendentes de pagamento (art. 63-E).
Assim, os bens confiscados são revertidos à União que, por sua vez, reverterá diretamente o produto
de sua alienação ao FUNAD (Fundo Nacional Antidrogas).
Quanto às armas de fogo confiscadas, a União as reverterá ao Comando do Exército, conforme prevê o
Estatuto do Desarmamento.
Note-se que se trata de um confisco “sui generis”, posto que decretado antes mesmo da sentença
condenatória.
De fato, o confisco das armas de fogo deve ser ordenado após a elaboração do laudo pericial e sua
juntada aos autos, quando não mais interessarem à persecução penal (art. 25 do Estatuto do Desarmamento).

Liberação dos bens

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O juiz determinará a liberação total ou parcial dos bens, direitos e objeto de medidas assecuratórias
quando comprovada a licitude de sua origem, mantendo-se a constrição dos bens, direitos e valores
necessários e suficientes à reparação dos danos e ao pagamento de prestações pecuniárias, multas e custas
decorrentes da infração penal (art. 63-B).
Entretanto, decorrido 360 (trezentos e sessenta) dias do trânsito em julgado e do conhecimento da
sentença pelo interessado, se os aludidos bens não forem reclamados serão revertidos ao Funad (§6º do art.
63).
Trata-se de um confisco que recai sobre o patrimônio lícito, que se verifica em razão do decurso do
tempo.
Sobre o confisco das glebas de terra, dispõe o art. 243, caput, da CF:
“As propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de
plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à
reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo
de outras sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no art. 5º”.
O procedimento dessa expropriação de glebas de terras é regulamentado pela Lei 8.257/91.

EFEITO ESPECÍFICO DA CONDENAÇÃO

Dispõe o art. 63-F:


“Na hipótese de condenação por infrações às quais esta Lei comine pena máxima superior a 6 (seis)
anos de reclusão, poderá ser decretada a perda, como produto ou proveito do crime, dos bens
correspondentes à diferença entre o valor do patrimônio do condenado e aquele compatível com o seu
rendimento lícito”.
O §1º acrescenta que:
“A decretação da perda prevista no caput deste artigo fica condicionada à existência de elementos
probatórios que indiquem conduta criminosa habitual, reiterada ou profissional do condenado ou sua
vinculação a organização criminosa”.
Trata-se de efeito específico da condenação, pois depende de fundamentação expressa na sentença
Este efeito só será possível quando presentes os seguintes requisitos cumulativos:
a) infrações às quais esta Lei comine pena máxima superior a 6 (seis) anos de reclusão;
b) elementos probatórios que indiquem conduta criminosa habitual, reiterada ou profissional do
condenado ou sua vinculação a organização criminosa;
c) que haja diferença entre o valor do patrimônio do condenado e aquele compatível com o seu
rendimento lícito. Presentes os dois requisitos acima, a lei presume esta diferença, em flagrante violação ao
princípio da presunção da inocência. Trata-se de uma presunção relativa, pois admite prova em contrário. De
fato, o condenado poderá demonstrar a inexistência da incompatibilidade ou a procedência lícita do
patrimônio.

JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL (Lei 9.099/95)

INTRODUÇÃO

O Juizado Especial Criminal, conhecido pela sigla JECRIM, tem competência apenas para a conciliação,
processo, julgamento e execução das infrações penais de menor potencial ofensivo.
No âmbito dos Estados-Membros e do Distrito Federal, é previsto no art. 98, I, da CF, e, no âmbito da
Justiça Federal, no §1º do citado artigo.
Com efeito, dispõe o art. 98, I, da CF:
“A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:
I - juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação,
o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial
ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a

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transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau”.


O § 1º do art. 98 da CF acrescenta que:
“Lei federal disporá sobre a criação de juizados especiais no âmbito da Justiça Federal”.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

A Lei 9.099/95 rege o Juizado Criminal dos Estados-Membros e Distrito Federal, mas é também aplicada
ao Juizado Criminal Federal.
Com efeito, a Lei 10.259/2.001, que disciplina o Juizado Especial Federal, aborda apenas os aspectos
cíveis e, na seara criminal, faz expressa remissão a todos os institutos da lei 9.099/95.
O art. 95 da Lei 9.099/95 ordenou aos Estados e Distrito Federal a criação e instalação dos Juizados
Especiais permanentes, no prazo de seis meses, a contar da vigência desta Lei.
E, posteriormente, o parágrafo único do art. 95 da Lei 9.099/95, introduzido pela Lei 12.726/2.012,
ordenou também aos Estados e Distrito Federal a criação e instalação dos Juizados Especiais itinerantes, no
prazo de seis meses, a contar da vigência desta Lei, que deverão dirimir, prioritariamente, os conflitos
existentes nas áreas rurais ou nos locais de menor concentração populacional.
Vê-se assim que este juizado especial itinerante deve priorizar sua atuação:
a) nas áreas rurais;
b) nos locais de menor concentração populacional.

Composição

O JECRIM é composto por juízes togados ou togados e leigos.


A inclusão de juízes leigos depende das normas de organização judiciária de cada Estado.
Os juízes leigos, na área penal, segundo o Conselho Nacional de Justiça, não têm poderes decisórios e
só podem atuar na fase preliminar, antes do oferecimento da denúncia ou queixa, presidindo a audiência
preliminar de tentativa de conciliação, sob a supervisão do juiz togado.
Assim, os juízes leigos não podem sentenciar nem presidir a audiência de instrução e julgamento. Em
suma, não podem praticar os atos privativos do juiz togado.
Os juízes leigos devem ser advogados com mais de 5 (cinco) anos de experiência, ao passo que o
conciliador não precisa ser advogado, mas, de preferência, deve ser Bacharel em Direito.
Na prática, sua função é idêntica à do conciliador.

Implantação da jurisdição de consenso

A jurisdição de consenso é a que visa a composição da lide através do acordo entre as partes.
Diversamente, na jurisdição de conflito, o objetivo do processo é, em regra, a imposição de uma pena
privativa de liberdade.
No juizado especial criminal vigora a jurisdição de consenso, pois se visa solucionar o conflito através
de três institutos despenalizadores, que são os seguintes:
a) composição civil dos danos;
b) transação penal;
c) suspensão condicional do processo.
Este último instituto também é cabível para infrações penais que não sejam de menor potencial
ofensivo, cuja pena mínima não exceda a um ano.

Particularidades do JECRIM

Dentre as peculiaridades do JECRIM, merecem destaque as seguintes:


a) não se instaura inquérito policial, mas termo circunstanciado;

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b) a materialidade da lesão corporal pode ser comprovada por boletim médico ou outra prova
equivalente, sem que haja necessidade do exame de corpo de delito;
c) não se lavra o auto prisão em flagrante, quando o autor da infração penal for encaminhado ao juizado
ou assumir o compromisso de comparecer.
d) possibilidade de composição civil dos danos, transação penal e suspensão condicional do processo;
e) adoção do procedimento sumaríssimo.

INFRAÇÕES PENAIS DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO

De acordo com o art. 61 da lei 9.099/95, com redação dada pela Lei 11.313/2.006, são duas as espécies
de infrações penais de menor potencial ofensivo:
a) As contravenções penais, qualquer que seja a quantidade da pena abstrata;
b) Os crimes a que a lei comina pena privativa de liberdade máxima não superior a 2 (dois) anos,
cumulada ou não com multa. Toma-se, pois, por base, a pena abstrata e não a pena concreta. Se a pena
abstrata excede a 2 (dois) anos, ainda que o tipo penal preveja também a multa como pena alternativa, não
há falar-se em infração penal de menor potencial ofensivo.
Se houver causa de aumento de pena, para verificar se a pena excede ou não a 2(dois) anos, toma-se
por base a pena máxima e sobre ela se aplica o aumento máximo.
Na causa de diminuição de pena, toma-se a pena máxima e sobre ela se aplica o percentual mínimo de
diminuição, pois dessa forma se obtém a pena máxima
As agravantes e atenuantes genéricas não exercem qualquer influência. De fato, as agravantes não
podem elevar a pena acima do máximo e as atenuantes não podem trazê-la abaixo do mínimo.

Infrações penais excluídas da Lei 9.099/95

A Lei 9.099/95 não é aplicada a duas infrações penais:


a) crimes militares próprios ou impróprios, praticados por militares, (art. 90-A). Quanto aos crimes
militares perpetrados por civis, segundo o STF, admitem a aplicação dos institutos despenalizadores da Lei
9.099/95, pois eles não estão sujeitos à hierarquia e disciplina militar. Cumpre relembrar que os civis
respondem apenas pelos crimes militares de competência da Justiça Militar da União, pois a Justiça Militar
dos Estados ou Distrito Federal só pode julgar militar.
b) crimes que envolvem violência doméstica contra a mulher (art. 41 da Lei 11.340/06 e súmula 536 do
STJ).
A proibição da aplicação da Lei 9.099/95, de acordo com o STF, incide também sobre as contravenções
penais praticadas no âmbito da violência doméstica e familiar contra a mulher.
Dessa forma, nos casos de violência doméstica e familiar contra mulher, não pode ser aplicado nenhum
dos institutos despenalizadores da Lei 9.099/95, nem mesmo a suspensão condicional do processo, prevista
no art. 89.
De fato, dispõe o art. 41 da Lei 11.340/2.006:
“Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar independentemente da pena prevista, não
se aplica a Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995”.
Ainda que a pena abstrata não exceda a 2 (dois) anos, por exemplo, ameaça, afasta-se a competência
do JECRIM e, por consequência, instaura-se inquérito policial, e não TC, sendo que o agente poderá ser preso
em flagrante e não lhe será aplicada a transação penal nem adotado o procedimento sumaríssimo da Lei
9.099/95.
Aliás, o STF já decidiu que nem a suspensão do processo, prevista no art. 89 da Lei 9.099/95, pode ser
aplicada aos crimes que envolvem violência doméstica e familiar.
A súmula 536 do STJ dispõe que: “A suspensão condicional do processo e a transação penal não se
aplicam nas hipóteses de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha”.

Crimes com procedimentos especiais

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Nos crimes que têm procedimentos especiais, mas que sejam de menor potencial ofensivo, como é o
caso dos crimes contra a honra, impõem-se também a aplicação do procedimento sumaríssimo do JECRIM,
pois a lei não os ressalva.

Foro por prerrogativa de função

Quanto aos crimes de menor potencial ofensivo praticados por agentes com foro por prerrogativa de
função, seguirão o procedimento especial dos crimes de competência originária dos tribunais, aplicando-se,
contudo, as medidas despenalizadoras da Lei 9.099/95. Exemplos: crimes praticados por juízes de direito,
promotores de justiça, deputados, etc.

Crimes eleitorais

No tocante aos crimes eleitorais, segundo a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, o julgamento
será afeto à Justiça Eleitoral, que, entretanto, aplicará às infrações penais eleitorais de menor potencial
ofensivo os institutos despenalizadores da Lei 9.099/95, salvo quando, juntamente com a pena privativa de
liberdade, houver uma sanção específica do sistema eleitoral como acontece, por exemplo, com o delito do
art. 334 do Código Eleitoral, cujo preceito secundário também prevê a cassação do registro da candidatura do
responsável.

VÍTIMA IDOSA

Aos crimes previstos no Estatuto do Idoso, cuja pena abstrata não excede a 4 (quatro) anos, aplica-se o
procedimento da Lei 9.099/95, conforme prevê o art. 94 da Lei 10.741/2.003.
Na ADI 3.096, julgada em 2.010, o STF decidiu que, nos delitos cuja pena máxima excede a 2 (dois)
anos, aplica-se tão somente o procedimento da Lei 9.099/95, mas sem os respectivos benefícios.
Assim, os benefícios da Lei 9.099/95, como a composição civil, a transação penal, a vedação da prisão
em flagrante, etc., não são aplicáveis aos crimes do Estatuto do Idoso em que a pena abstrata exceda a 2 (dois)
anos. Exegese diversa, em vez de beneficiar, prejudicaria o idoso.
Se, no entanto, a pena abstrata do crime praticado contra idoso não exceder a 2 (dois) anos, torna-se
perfeitamente possível a aplicação de todos os institutos da lei 9.099/95.

CRIMES DE TRÂNSITO

Aos crimes de menor potencial ofensivo na direção de veículos automotores aplicam-se, em regra, a Lei
9.099/95, por força de expressa previsão do art. 291 do CTB.
Na lesão corporal culposa, prevista no art. 303 do CTB, a pena não excede a 2 (dois) anos e, por isso,
aplica-se também a Lei 9.099/95, exceto se o agente tiver:
a) sob influência do álcool ou qualquer outra substância psicoativa que determine dependência;
b) participando, em via pública, de corrida, disputa ou competição automobilística, de exibição ou
demonstração de perícia em manobra de veículo automotor, não autorizada pela autoridade competente;
c) transitando em velocidade superior à máxima permitida para a via em 50 km/h (cinquenta
quilômetros por hora), isto é, exceder-se 50 km/h à velocidade máxima permitida.
Nessas três hipóteses, instaura-se inquérito, e não termo circunstanciado, sendo ainda vedada a composição
civil dos danos e a transação penal. Além disso, a ação penal será pública incondicionada.

Competência do JECRIM

Tanto o Juizado Criminal Estadual ou Distrital quanto o Juizado Criminal Federal só tem competência

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para as infrações penais de menor potencial ofensivo. Por exemplo: desacato contra policial federal, a
competência é do Juizado Criminal Federal.
O JECRIM federal só tem competência para julgar os crimes de menor potencial ofensivo, que se
enquadram no art. 109 da CF.
Convém lembrar que justiça federal não tem competência para julgar contravenções penais, ainda que
elas atentem contra bens, interesses ou serviços da União.
As contravenções serão da alçada do JECRIM Estadual ou do Distrito Federal.
As infrações penais de menor potencial ofensivo, em regra, não podem ser julgadas pelo juízo comum.
Para uns, a competência do JECRIM é absoluta, pois é em razão da matéria, prevista na CF (art. 98, I).
Outros, ao revés, sustentam que a competência é relativa, pois a própria Lei 9.099/95 prevê algumas
hipóteses de modificação da competência, sendo que a competência absoluta é imodificável.
Esta última corrente é a mais correta, pois se houver sido aplicado pelo juízo comum os institutos
despenalizadores não haverá qualquer nulidade, diante da falta de prejuízo. Se, entretanto, houver sido
negada esta possibilidade, a nulidade será absoluta.
Definida a justiça do JECRIM, o próximo passo é estabelecer a competência territorial.
A competência territorial do Juizado Criminal será determinada pelo lugar em que houver sido praticada
a infração penal (art. 63 da Lei 9.099/95).
Uma primeira corrente interpreta como sendo o local da consumação, que é o foro competente para os
crimes em geral (art. 70 do CPP).
Outra sustenta que se trata do local da conduta criminosa (ação ou omissão), por força do art. 4o do
CP, que consagra a teoria da atividade. Com efeito, dispõe o art. 4º do CP: “Considera-se praticado o crime no
momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado”.
Há ainda uma terceira corrente, que adota a teoria da ubiquidade, de modo que o foro competente
seria tanto local da conduta quanto o do resultado.
A meu ver, a competência do Juizado não é do local da consumação e, sim, o da prática da conduta,
sendo, pois, uma exceção à regra geral do art. 70 do CPP.

Conflito de competência

Sobre os conflitos de competências, as hipóteses são as seguintes:


a) conflito entre JECRIM federal e juiz de primeiro grau da justiça federal da mesma seção judiciária: a
competência para dirimir este conflito será do respectivo Tribunal Regional Federal (súmula 428 do STJ).
b) conflito entre JECRIM estadual e juiz de direito do mesmo Estado: a competência para julgar este
conflito será do respectivo Tribunal de Justiça.
c) conflito entre JECRIM estadual e JECRIM federal: a competência será do STJ.
d) conflito entre JECRIM's de Estados diferentes: a competência será do STJ.
d) conflito entre JECRIM's Federais de seções judiciárias diferentes: a competência será do STJ.

Princípios

O JECRIM é regido por 6 (seis) princípios:


a) simplicidade: é a diminuição do formalismo dos atos procedimentais. Exemplo: serão objetos de
registro escrito exclusivamente os atos havidos por essenciais. Outro exemplo: os atos realizados
em audiência de instrução e julgamento poderão ser gravados em fita magnética ou equivalente.
Mais um exemplo: substituição do inquérito policial pelo termo circunstanciado.
b) Informalidade: a ausência de algum requisito formal não anulará o ato quando não houver
prejuízo. Assim, não se pronunciará qualquer nulidade sem que tenha havido prejuízo.
c) Celeridade processual: o processo deve tramitar com eficiência no menor tempo possível. Exemplo:
nenhum ato processual será adiado, determinando o Juiz, quando imprescindível, a condução coercitiva de
quem deva comparecer. Outro exemplo: não se admite a citação por edital. Outro exemplo: os atos
processais poderão realizar-se em horário noturno e em qualquer dia da semana, conforme dispuserem as

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normas de organização judiciária.


d) Economia processual: o processo deve tramitar com eficiência com o menor número possível de atos
processais. Exemplo: audiência una de conciliação, instrução e julgamento. Note-se que o princípio da
eficiência diz respeito à rapidez no tempo, ao passo que o princípio da economia processual se relaciona com
a diminuição dos atos processais.
e) Oralidade: é a preponderância de atos verbais sobre os escritos. Exemplo: a denúncia ou queixa
podem ser ofertadas verbalmente. Outro exemplo: embargos declaratórios podem ser orais. Mais um
exemplo: a defesa preliminar é verbal.
f) Publicidade: os atos processais serão públicos (art. 64). Trata-se de uma previsão desnecessária, pois
a publicidade emana do art. 94, IX, da CF.

Objetivos

O processo perante o JECRIM objetivará, sempre que possível, a reparação dos danos sofridos pela
vítima e a aplicação de pena não privativa de liberdade (art. 62).
O JECRIM tem, pois, dois objetivos:
a) a reparação do dano causado pela infração penal; e
a) a descarcerizacão.

Citação

No JECRIM, nos termos do art. 66, a citação será sempre pessoal, podendo ser feita da seguinte forma:
a) no próprio juizado, sempre que possível;
b) por mandado.
Não é possível as seguintes citações:
a) pelo correio;
b) por meio eletrônico;
c) por edital;
d) por carta rogatória, posto que incompatível com o princípio da celeridade.
No JECRIM, segundo uma corrente, é também proibida a citação por hora certa.
O Fórum Nacional dos Juizados Especiais (FONAJE), no entanto, admite a citação por hora certa, posto
que a Lei 9.099/95 proíbe apenas a por edital.
Quanto à citação por carta precatória, ao acusado que reside noutra comarca, é possível, por aplicação
subsidiária do CPP. Nesse caso, em vez da precatória, nada obsta seja citado por qualquer outro meio de
comunicação.

Intimação

A intimação far-se-á por correspondência, com aviso de recebimento pessoal ou, tratando-se de pessoa
jurídica ou firma individual, mediante entrega ao encarregado da recepção, que será obrigatoriamente
identificado, ou, sendo necessário, por oficial de justiça, independentemente de mandado ou carta precatória,
ou ainda por qualquer meio idôneo de comunicação.
Assim, enquanto a citação no JECRIM só pode ser feita por oficial de justiça em cumprimento de
mandado judicial ou no próprio juizado, a intimação admite as seguintes modalidades:
a) via postal, com AR;
b) oficial de justiça, independentemente de mandado;
c) no próprio juizado;
d) qualquer meio idôneo de comunicação.
Dos atos praticados em audiência considerar-se-ão desde logo cientes as partes, os interessados e

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defensores.

Informações importantes

Do ato de intimação do autor do fato e do mandado de sua citação, constarão duas observações:
a) a necessidade de seu comparecimento acompanhado de advogado;
b) a advertência de que, na falta do seu advogado, ser-lhe-á designado defensor.

DESLOCAMENTO DA COMPETÊNCIA

As hipóteses de deslocamento da competência do JECRIM para o juízo comum são as seguintes:


a) conexão ou continência com crime do juízo comum ou do tribunal do júri;
b) necessidade de citação por edital;
c) complexidade da causa.
Em todas estas situações, persistem, no juízo comum ou tribunal do júri, os benefícios da Lei 9.099/95,
inclusive, o delito de lesão corporal leve dependerá de representação.

CONEXÃO E CONTINÊNCIA

Em caso de conexão e continência entre um crime que seja de maior potencial ofensivo e outro de
menor potencial ofensivo, afasta-se, por força do parágrafo único do art. 60 da Lei 9.099/95, a competência
do JECRIM.
Impõem-se, nesses casos, a reunião dos processos perante o juízo comum ou tribunal do júri, conforme
a hipótese, observando-se, contudo, nesses procedimentos, em relação às infrações de menor potencial
ofensivo, os institutos da transação penal e da composição civil dos danos.
Entretanto, a conexão entre infrações penais de menor potencial ofensivo cuja soma das penas não
excede a 2 (dois) anos não retira a competência do JECRIM. Igualmente, na continência, quando a pena não
se exceder a 2 (dois) anos.
Nos casos de conexão com outros crimes mais graves, a infração penal de menor potencial ofensivo
será julgada pela Justiça Comum ou Tribunal do Júri, nos termos do art. 60, parágrafo único, da Lei
9.099/1995).
Sobre o tema há duas correntes.
Primeira, os dispositivos legais, que permitem a alteração de competência, violam o princípio do juiz
natural e afrontam o art. 98 da CF, que conferem aos Juizados Especiais Criminais competência material
absoluta.
Segunda, adotada pelo Plenário do STF na ADI 5264, não há qualquer inconstitucionalidade, pois a
Constituição Federal não torna os Juizados Especiais Criminais instância exclusiva para o julgamento de
infrações de menor potencial ofensivo, mas apenas garante a esse tipo de infração penal a observância do
procedimento célere e dos institutos despenalizadores previstos na Lei 9.099/1995.
Por consequência, a competência do juizado especial não é absoluta, mas, sim, relativa.
De fato, o deslocamento da competência do processo para a Justiça Comum ou para o Tribunal do Júri
se faz em respeito ao princípio do devido processo legal, sem que haja qualquer ofensa às garantias
processuais.

NECESSIDADE DE CITAÇÃO POR EDITAL

No Juizado, em função do princípio da celeridade, só se admite a citação pessoal (art. 66).


Não encontrado o acusado para ser citado cessa a competência do JECRIM e os autos são encaminhados
ao juízo comum, onde será, entretanto, possível a aplicação dos institutos despenalizadores.

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Note-se que o procedimento não é extinto.


Encaminhados os autos ao juízo comum, aplica-se o rito sumário.
Sobre o assunto, dispõe o art. 538 do CPP:
“Nas infrações penais de menor potencial ofensivo, quando o juizado especial criminal encaminhar ao
juízo comum as peças existentes para a adoção de outro procedimento, observar-se-á o procedimento
sumário previsto neste Capítulo”.
Se, no entanto, a infração penal tiver rito especial, não se aplicará o procedimento sumário, e, sim, o
especial. Exemplo: crimes contra honra.
Uma vez encaminhado os autos ao juízo comum, eles jamais poderão retornar ao JECRIM.

CAUSAS COMPLEXAS

Se a complexidade ou circunstâncias do caso for incompatível com a celeridade do processo do JECRIM,


os autos, mediante ordem judicial, poderão ser encaminhados ao juízo comum (§2o e 3o do art. 77).
A complexidade da causa, que se caracteriza pela dificuldade de tramitação do processo, se revela,
dentre outros, pelos seguintes aspectos:
a) excessivo número de acusados;
b) exigência de investigações aprofundadas;
c) forma de execução do delito;
d) necessidade de realização de perícia demorada.

FASE PRELIMINAR

A fase preliminar, isto é, que antecede ao oferecimento da denúncia ou queixa, desenvolve-se no


âmbito policial e no âmbito judicial.

Fase preliminar policial

Na fase preliminar policial, destacam-se dois momentos: a lavratura do termo circunstanciado e a vedação da
prisão em flagrante.

Termo circunstanciado

Nas infrações penais de menor potencial ofensivo não se instaura inquérito policial, mas termo
circunstanciado.
O termo circunstanciado é uma narrativa minuciosa da ocorrência, similar ao boletim de ocorrência,
onde a autoridade policial ouve informalmente a vítima, as testemunhas e o autor da infração penal, inserindo
no termo apenas um resumo do que cada um relatou.
O termo circunstanciado deve necessariamente conter a identificação do autor da infração penal.
Após a sua lavratura, o autor da infração penal será encaminhado ao JECRIM pela autoridade policial ou
então assinará o termo de compromisso de comparecimento ao JECRIM.
A Lavratura do termo circunstanciado (TC) será feita pela autoridade policial que tomar conhecimento
da infração penal.
Não há, destarte, a instauração de inquérito policial nem de boletim de ocorrência.
Todavia, a autoridade policial deverá requisitar os exames periciais necessários.
Se, após a lavratura do termo circunstanciado, se verificar que se trata de um caso complexo ou que há
conexão ou continência com outro delito, que retira a competência do juizado criminal, a autoridade policial
poderá determinar a instauração do inquérito policial.

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Sobre a atribuição para a lavratura do terno circunstanciado, segundo o STF, é exclusiva da autoridade
policial.
O Provimento 806/03 do Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo, porém, admite
que o termo circunstanciado seja também lavrado por oficial da Polícia Militar.
Data venia, a Lei 9.099/95 atribui apenas à autoridade policial a lavratura de termo circunstanciado,
justamente por se tratar de função investigativa, que é exclusiva da polícia judiciária, nos termos do art. 144, §
1º, I, da CF.
Aliás, o decreto 1.557/2.003, do Estado do Paraná, que atribuía também à polícia militar poderes para
lavratura de termo circunstanciado foi declarado inconstitucional pelo STF, na ADI 3.614, por usurpação de
atribuição da polícia civil.
O termo circunstanciado, malgrado o silêncio da lei, devido à possibilidade de haver uma posterior
transação penal, não poderá constar de certidões de antecedentes criminais.
No termo circunstanciado, diante da possibilidade de transação penal, também não se deve realizar o
indiciamento, pois, em havendo transação penal, a infração penal não poderá constar em certidões criminais.

VEDAÇÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE

Nas infrações penais de menor potencial ofensivo, vigora a liberdade provisória obrigatória.
Não se imporá, destarte, prisão em flagrante nem se exigirá fiança ao autor do fato que, após a lavratura
do termo circunstanciado, for imediatamente encaminhado ao JECRIM pela autoridade policial ou então
assumir o compromisso de a ele comparecer na data que lhe for designada.
Trata-se de uma medida que visa evitar o recolhimento ao cárcere, mas não impede que, diante do
flagrante, haja a captura e a condução coercitiva.
Não haverá, entretanto, a lavratura do auto de prisão em flagrante, devendo o autor do fato ser posto
em liberdade sem fiança.
Caso ele se recuse a assumir o compromisso de comparecer ao JECRIM, a autoridade policial, nas
infrações penais onde se comina pena privativa de liberdade, lavrará o auto de prisão em flagrante e, em
seguida, arbitrará a fiança, mas se à infração penal não for cominada pena privativa de liberdade, após a
lavratura do auto de prisão em flagrante, a autoridade policial concederá a liberdade provisória sem fiança.
Lavrado o auto de prisão em flagrante, por recusar-se a comparecer aos atos do juizado, conquanto seja
o indivíduo colocado em liberdade, as investigações serão feitas através de inquérito policial, posto que o
auto de prisão em flagrante é uma das formas de instauração do inquérito e, nesse caso, será possível o
indiciamento, segundo já decidiu o STJ, embora o tema seja polêmico, diante da possibilidade de transação
penal.
No delito do art. 28 da Lei de Drogas, porte ou plantio para consumo próprio, aplica-se, tão somente, a
Lei 9.099/95, conforme §1º do art. 28 da Lei 11.343/06, sendo, ainda vedado, em qualquer hipótese, a prisão
em flagrante. Portanto, apreende-se a droga, lavra-se o TC e, na sequência, libera-se o agente, ainda que ele
não assuma o compromisso de comparecer aos atos do JECRIM.

FASE PRELIMINAR JUDICIAL

Encaminhados os autos ao JECRIM, inaugura-se a fase preliminar judicial, designando-se uma audiência
preliminar.
Nessa audiência preliminar, presentes o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima
e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o juiz esclarecerá sobre a possibilidade
de composição civil dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de
liberdade.
Noutras palavras, o juiz realizará a tentativa de conciliação sobre dois aspectos: composição dos danos
e transação penal.

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COMPOSIÇÃO DOS DANOS OU TRANSAÇÃO CIVIL OU CONCILIAÇÃO CIVIL

A composição dos danos, também chamada de transação civil ou conciliação civil, é o acordo entre o
autor do fato e a vítima sobre o montante que o primeiro deverá indenizar à segunda.
A conciliação será conduzida pelo juiz ou conciliador sob sua orientação.
Não há necessidade da participação do Ministério Público na composição civil dos danos, salvo quando
houver interesse de incapaz (art. 178, II, do CPC).
A composição dos danos será reduzida a escrito e homologada pelo juiz mediante sentença irrecorrível,
que tem a eficácia de título executivo, podendo ser executada no juízo cível competente.
Até 40 (quarenta) salários mínimos, a execução poderá ser feita no juizado especial cível, nos termos do
art. 3º, § 1º, II, da Lei 9.099/95, e, acima deste valor, no juízo cível comum.
Frise-se que, dessa sentença, não cabe nenhum recurso.
Este acordo homologado por sentença ainda tem o efeito de extinguir a punibilidade quando se tratar
de crime de ação penal privada ou ação penal pública condicionada à representação, pois, de acordo com o
parágrafo único do art. 74, ele equivale à renúncia ao direito de queixa ou representação.
Na ação penal privada, esta renúncia ao direito de queixa, por força do princípio da indivisibilidade da
ação penal privada, beneficiará os demais coautores e partícipes que não participaram da conciliação.
Não ação penal pública incondicionada, o juiz também homologará a eventual composição dos danos.
Nesse caso, porém, não haverá a extinção da punibilidade, mas apenas a redução da pena de um a dois terços,
quando se tratar de crime sem violência ou grave ameaça à pessoa, nos termos do art. 16 do Código Penal.

Oferecimento de representação

Nos crimes de ação penal pública condicionada à representação, dispõe o art. 75 da Lei 9.099/95,
que “não obtida a conciliação dos danos civis, será dada imediatamente ao ofendido a oportunidade de
exercer o direito de representação verbal, que será reduzida a termo”.
Uma primeira corrente, com base neste dispositivo legal, sustenta que, ainda que a vítima tenha
oferecido anteriormente a representação, haverá a necessidade de uma nova representação, na hipótese de
resultar infrutífera a tentativa de composição civil dos danos.
Uma segunda corrente, acertadamente, com base no princípio da informalidade, outrossim, pelo fato
de o artigo 92 da Lei 9099/95 mandar aplicar subsidiariamente ao juizado criminal as disposições do Código
Penal e do Código de Processo Penal, preconiza que a representação oferecida anteriormente, por ocasião da
lavratura do termo circunstanciado, já seria suficiente, dispensando-se uma nova representação. Por
consequência, o disposto no citado art. 75 só seria aplicado quando não houvesse uma representação anterior.
O parágrafo único do citado art. 75, por sua vez, acrescenta que “o não oferecimento da representação
na audiência preliminar não implica decadência do direito de representação, que poderá ser exercido no prazo
previsto em lei”.
Sobre o termo inicial do prazo decadencial de 6 (seis) meses para a oferta da representação, também
há duas correntes.
Primeira, é a data da audiência preliminar, por interpretação do parágrafo único do art. 75.
Segunda, é a data do conhecimento da autoria do crime, nos termos do art. 38 do CPP.
A primeira corrente, por consagrar uma interpretação ilógica, não pode prevalecer.
Com efeito, nos crimes que não são de menor potencial ofensivo, o prazo de representação se inicia
com o conhecimento da autoria, por consequência, seria incoerente que nos delitos de menor potencial
ofensivo o prazo só se iniciasse depois, quando restasse infrutífera a conciliação dos danos civis. Estar-se-ia
consagrando um prazo maior para delitos menos graves.
Vale lembrar, porém, que não se exige uma representação formal, pois a simples lavratura do termo
circunstanciado, a pedido da vítima, já equivale a representação.

Representação nos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas

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Os crimes de lesões corporais leves e lesões culposas são de ação penal pública condicionada à
representação, nos termos do art. 88 da Lei 9.098/95.
O prazo para ofertar a representação é de 6(seis) meses, a contar do conhecimento da autoria do delito.
O prazo de 30 (trinta) dias, previsto no art. 90, foi instituído apenas para os delitos cometidos antes da
Lei 9.099/95.
Em relação à contravenção de vias de fato, por interpretação lógica, também depende de
representação, mas outra corrente preconiza que a ação é pública incondicionada
Por fim, na lesão corporal leve, em situação de violência doméstica e familiar contra mulher, a ação
penal é pública incondicionada.

Oferecimento da queixa

Nos crimes de ação penal privada, não obtida a composição dos danos civis, malgrado o silêncio da lei,
será também dada imediatamente ao ofendido a oportunidade de, através de advogado ou defensor público,
exercer o direito de queixa verbal, que será reduzida a termo.
Nos crimes de ação penal privada, o não comparecimento da vítima à audiência preliminar, não gera a
extinção da punibilidade, pois ainda não há a oferta da queixa-crime, de modo que não há falar-se em
perempção, mas os autos permanecerão em cartório aguardando uma nova provocação ou o decurso do prazo
decadencial.

TRANSAÇÃO PENAL OU COMPOSIÇÃO PENAL

Conceito

Transação penal é o acordo entre o Ministério Público e o autor do fato, pelo qual o primeiro, em troca
de não oferecer a denúncia, propõe ao segundo a aceitação de uma pena de multa ou restritiva de direitos.
Esta imposição de pena sem julgamento não é inconstitucional, posto que autorizada expressamente
pelo art. 98, I, da CF.

Princípio da obrigatoriedade regrada

Nas infrações penais de menor potencial ofensivo vigora o princípio da obrigatoriedade regrada ou
discricionariedade regrada ou mitigada ou balizada da ação penal pública, enquanto que nos demais delitos
esse princípio ainda é absoluto, à medida que o Ministério Público não terá outra opção que não seja o
oferecimento da denúncia.

Requisitos

São requisitos da transação penal:


a) Que a hipótese não seja de arquivamento do termo circunstanciado. Se, por exemplo, não houver
indícios de autoria ou prova da materialidade, o Ministério Público deverá requerer o arquivamento e não a
transação penal.
b) Ausência de condenação transitada em julgado por crime, a pena privativa de liberdade. Para se vetar
a transação penal, não se exige a reincidência, e, sim, uma condenação definitiva por crime a pena privativa
de liberdade. O trânsito em julgado desta condenação deve ocorrer antes da audiência preliminar. Assim, se
no momento da prática da infração penal de menor potencial ofensivo ainda não havia condenação definitiva
por crime anterior, não há falar-se em reincidência, mas, nesse caso, se o trânsito em julgado ocorrer antes
da audiência preliminar, malgrado a ausência de reincidência, não será possível a transação penal. Não obsta
a transação a condenação por contravenção ou por crime ao qual não se impôs pena privativa de liberdade.

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c) Não ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores por outra transação penal. Quanto ao
prazo de 5 (cinco) anos, conta-se da extinção da punibilidade do delito que motivou a transação anterior.
d) Que os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, os motivos e as circunstância do
crime indiquem que a pena aplicada na transação é necessária e suficiente. Trata- se de um requisito subjetivo,
que consagra o princípio da suficiência da pena.
e) Aceitação da proposta pelo autor da infração penal e seu defensor. Caso a transação tenha sido
realizada sem a presença de advogado ou defensor público, a nulidade será absoluta, por violação do princípio
da ampla defesa. Se o advogado ou defensor Público concorda com a proposta do Ministério Público, mas o
autor do delito a rejeita, o juiz não poderá homologar a transação. Se, ao revés, o autor do delito concorda,
mas o advogado ou defensor público rejeita a proposta, o juiz poderá homologar a transação, pois, por se
tratar de um instituto baseado na justiça consensual, a vontade do autor deverá prevalecer sobre a do
causídico.
Nos crimes ambientais de menor potencial ofensivo, a transação penal exige mais um requisito, que é
a prévia composição do dano ambiental, salvo em caso de comprovada impossibilidade (art. 27 da Lei
9.605/98).
Nos crimes de ação penal pública condicionada à representação ou requisição do ministro da justiça,
por sua vez, a transação ainda depende de outros dois requisitos:
a) que haja a representação ou requisição do ministro da justiça, conforme a hipótese;
b) que não tenha ocorrido a homologação judicial da composição civil dos danos. De fato, a composição
civil dos danos equivale à renúncia do direito de representação, e, por consequência, extingue a punibilidade,
inviabilizando-se a posterior transação penal.

Homologação

Na transação, a pena sugerida pelo Ministério Público pode ser restritiva de direitos ou multa.
Aceita a proposta, o juiz não estará obrigado a homologar automaticamente o acordo, pois terá que
analisá-lo sob o prisma da legalidade.
O juiz não poderá intervir no mérito da transação, salvo para reduzir a pena de multa, quando ela for a
única pena cominada ao tipo penal.
De fato, se o tipo penal prevê tão somente a pena de multa, como ocorre em várias contravenções
penais, o juiz reduzirá a pena até a metade (§1º do art. 76).
Presentes os requisitos legais, o juiz prolatará sentença homologatória da transação, da qual caberá o
recurso de apelação no prazo de 10 (dez) dias.
Trata-se de uma sentença condenatória imprópria, pois não gera os efeitos secundários da condenação.
Uma segunda corrente sustenta que a sentença é constitutiva, pois não há condenação sem o devido
processo legal.
Uma terceira corrente ensina que é meramente declaratória, pois apenas homologa a vontade das
partes (posição do STJ).

Efeitos

O efeito principal da transação é o dever de cumprir a pena imposta.


Entretanto, como a transação penal não implica reconhecimento da culpabilidade, ela não gerará
reincidência nem maus antecedentes e, na área cível, não será título executivo judicial.
Não produz assim qualquer efeito extrapenal e o único efeito penal secundário será a vedação, durante
os próximos 5 (cinco) anos, de uma nova transação penal, uma espécie de maus antecedentes restrito ao
JECRIM.
Aliás, a transação penal nem consta na certidão de antecedentes, exceto quando requisitado esse
documento por juiz criminal. Assim, a certidão de antecedentes deve sair com a observação de que nada
consta.

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Vedação à concessão de ofício

Não é dado ao juiz o poder de conceder de ofício a transação penal contra vontade do Ministério Público.

Recusa do Ministério Público

Por analogia, o juiz pode aplicar o art. 28 do CPP e enviar os autos ao Procurador Geral de Justiça quando
o promotor de justiça optar pelo oferecimento da denúncia em vez de propor a transação penal.
No âmbito do Ministério Publico Federal, se houver o oferecimento da denúncia sem a prévia proposta
de transação, o juiz, em vez de receber a denúncia, remeterá os autos à Câmara de Coordenação e Revisão do
MPF.
O Procurador Geral de Justiça ou a Câmara de Coordenação e Revisão do MPF poderá insistir na
denúncia ou então propor a transação ou designar outro membro do Ministério Público para propô-la.

A transação na ação penal privada

É também cabível a transação penal nos crimes de ação penal privada, mas a proposta deve ser feita pela
vítima ou por seu representante legal, e não pelo Ministério Público.
O entendimento contrário, que atribui a legitimidade ao Ministério Público, não pode ser aceito, pois
implica em usurpação da legitimidade “ad causam” para a ação penal privada.
Na hipótese de o querelante não oferecer a transação penal, ela se inviabilizará, pois o juiz não poderá
concedê-la de ofício. Outra corrente minoritária sustenta que, nesse caso, o Ministério Público poderia fazer
a proposta.
Nos crimes de ação penal privada só será possível transação quando não houver ocorrido a composição
civil dos danos, pois, nesse caso, antes de surgir a oportunidade para a transação, já terá ocorrido a extinção
da punibilidade.

Assistente de acusação

Convém salientar que, nos crimes de ação penal pública, a vítima não participa da transação penal, cuja
proposta deve ser formulada exclusivamente pelo Ministério Público.
A lei também não confere legitimidade ao assistente de acusação.
Aliás, antes do oferecimento da denúncia não é sequer possível a figura do assistente de acusação, pois
este só pode atuar após o recebimento da denúncia.

Forma

A transação pode ser ofertada por escrito ou verbalmente e deverá conter na proposta uma pena de
multa ou restritiva de direitos.

Concurso de pessoas

Em caso de concurso de pessoas, a proposta não precisa ser direcionada a todos eles.
A aceitação por um não se comunica aos demais.
Recurso

Acrescente-se ainda que da sentença que homologa a transação é cabível o recurso de apelação, nos
termos do art. 75, § 5º, da Lei 9.099/95.
Igualmente, caberá apelação contra decisão que não homologar a transação, nos termos do art. 593, II,
do CPP, pois se trata de uma decisão com força de definitiva.

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Descumprimento injustificado da transação penal

Se a transação for descumprida, os autos serão encaminhados ao Ministério Público para oferecimento
da denúncia ou requisição da instauração de Inquérito policial, desconstituindo-se, destarte, a sentença que
a havia homologado.
Não há falar-se em responsabilidade penal pelo crime de desobediência pelo fato de ter descumprido a
transação.
Quanto à pena de multa imposta na transação, cujo pagamento pode ser feito na própria Secretaria do
JECRIM, se for descumprida, jamais poderá ser convertida em prisão, estando, pois, revogado o art. 85 da Lei
9.099/95, que previa esta conversão, pela Lei 9.268/96, que deu nova redação ao art. 51 do CP para vedar, em
termos absolutos , a conversão da pena de multa em prisão.

Coisa julgada

Transação penal, conforme já visto, é o acordo entre o Ministério Público e o autor do fato, pelo qual o
primeiro, em troca de não oferecer a denúncia, propõe ao segundo a aceitação de uma pena de multa ou
restritiva de direitos. Se o autor do fato aceitar a proposta e o juiz homologá-la, operar-se-á a extinção da
punibilidade com a cláusula “rebus sic stantibus”, podendo o Ministério Público oferecer a denúncia apenas
na hipótese de o autor descumprir a pena.
Não faz, destarte, coisa julgada material a sentença que homologa a transação penal.
A propósito, dispõe a súmula vinculante 35:
“A homologação da transação penal prevista no art. 76 da Lei 9.99/95 não faz coisa julgada material e,
descumpridas as suas cláusulas, retoma-se a situação anterior, possibilitando-se ao Ministério Público a
continuidade da persecução penal mediante oferecimento de denúncia ou requisição de inquérito policial”.

Momento da composição civil e da transação penal

A transação penal e a composição civil, em regra, devem ser oferecidas na audiência preliminar, antes
da propositura da denúncia ou queixa.
Entretanto, poderão ser feitas depois nas seguintes hipóteses:
a) se, na fase preliminar, não tiver havido possibilidade de realização. Nesse caso, o juiz do JECRIM,
na audiência de instrução e julgamento, antes de iniciar o ato, dará oportunidade para a sua realização (art.
79 da Lei 9.099/95).
b) se, no curso do processo que tramita no juízo comum, houver sido dado ao fato criminoso, descrito
na peça acusatória, uma nova definição jurídica, conferindo-lhe o tratamento de infração penal de menor
potencial ofensivo. Trata-se da chamada “emendatio libelli”. Nessa situação, o juiz simplesmente deverá
prolatar uma decisão desclassificatória, onde reconhece a sua incompetência, ordenando a remessa dos autos
ao JECRIM, nos termos do § 2o do art. 383 do CPP, quando então será dada oportunidade para a composição
civil e transação. Caso, entretanto, o magistrado, no próprio processo que tramita no juízo comum, resolver
abrir a oportunidade para a conciliação civil ou transação penal, não há falar-se em nulidade, diante da
ausência de qualquer prejuízo.
c) se, no curso do processo que tramita no juízo comum, houver a alteração do fato descrito na peça
acusatória, que se transmuda em infração penal de menor potencial ofensivo, em razão de novos elementos
ou circunstâncias surgidos durante a instrução. Nessa situação, que é de “ mutatio libelli”, que enseja o
aditamento da denúncia pelo Ministério Público, feito o aditamento para se considerar o fato como sendo
infração penal de menor potencial ofensivo, o juiz deverá reconhecer a sua incompetência e ordenar a
remessa dos autos ao JECRIM, nos termos do art. 384 do CPP, quando então será dada oportunidade para a
composição civil e transação. Se, por exemplo, após a instrução, se constatar que não se trata de receptação
dolosa, mas culposa, o Ministério Público deverá aditar a denúncia, posto que a culpa, até então, não se
encontrava descrita na peça acusatória.

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d) acusado por infração penal de menor potencial ofensivo, que é citado por edital no juízo comum,
mas que depois comparece. Nesse caso, ser-lhe-á, no próprio juízo comum, dada oportunidade para a
composição civil e transação, mas os autos não retornarão ao JECRIM.
e) acusado por infração penal de menor potencial ofensivo, cujos autos, devido à sua complexidade,
tenham sido remetidos ao juízo comum. Nesse caso, o juízo comum deverá dar oportunidade para a
composição civil e transação.
f) acusado, no juízo comum, por dois delitos, cuja soma das penas excedia a 2 (dois) anos, mas que, em
razão da absolvição de um deles, o delito remanescente passou a admitir a composição civil e transação. Nesse
caso, ao contrário dos art. 383 § 2o e 384 do CPP, persiste a competência do juízo comum, conforme art. 81
do CPP, que consagra o princípio da perpetuação da jurisdição. Entretanto, antes de também sentenciar o
delito remanescente de menor potencial ofensivo, o juiz deverá dar oportunidade para a realização da
composição civil e da transação.
Cumpre ainda acrescentar que quando a transação é realizada antes do oferecimento da denúncia, o
assistente de acusação não poderá recorrer da sentença que a homologou, pois a lei não admite que ele atue
antes do recebimento da denúncia.
Nas hipóteses acima, porém, onde a transação é realizada depois do recebimento da denúncia, não vejo
óbice para o recurso do assistente de acusação para questionar a legalidade da transação.

A transação e a prescrição

A prescrição, como se sabe, inicia-se a partir da consumação do delito e a sua primeira causa de
interrupção é o recebimento da denúncia ou queixa, conforme art. 117, I, do CP.
A realização da transação penal não tem a força de interromper nem de suspender a prescrição, pois,
ao contrário do que ocorre com a suspensão condicional do processo, prevista no art. 89 da Lei 9.099/95, onde
a lei ordena a suspensão da prescrição, na transação , a lei é omissa acerca do assunto, sendo vedada a
analogia “in malam partem”.
A prescrição só será interrompida com o recebimento da denúncia ou queixa, que, em caso de
descumprimento injustificado da transação, poderá ser oferecida.
Uma corrente sustenta que o início do cumprimento da pena constante da transação interrompe a
prescrição, nos termos do art. 117, V, do CP, mas esta tese foi repudiada pelo STJ, pois o pressuposto desta
interrupção da prescrição executória é que haja uma sentença condenatória transitada em julgado e, em se
tratando de transação penal, o STJ considera a sentença como sendo meramente declaratória.
Concurso de crimes

Discute-se acerca do cabimento da transação em caso de concurso material ou formal, quando as penas
isoladas não excedem a 2 (dois) anos, mas a soma sim, destacando-se duas correntes.
A primeira sustenta que é cabível a transação, desde que as penas máximas de cada delito não excedam
a 2 (dois) anos.
Esta corrente preconiza que as penas devam ser analisadas isoladamente, sem somá-las ou exasperá-
las. Baseia-se no art. 119 do CP, cujo teor é o seguinte: “No caso de concurso de crimes, a extinção da
punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente”.
A segunda corrente sustenta que não é cabível a transação quando as penas, analisadas conjuntamente,
excederem a 2 (dois)anos. De acordo com esse entendimento, há necessidade de se verificar a soma das
penas, no concurso material, ou exasperá-la no máximo, no caso do concurso formal e crime continuado. Se
as penas cominadas em abstrato, após a soma ou a exasperação, ultrapassarem o prazo de 2 (dois) anos,
exclui-se a competência do Juizado Especial Criminal, obstando-se, por consequência, a transação penal.
Fundamenta-se no fato de o concurso formal e o crime continuado serem causas de aumento de pena,
refletindo na pena cominada (“in abstrato”); e que no concurso material opera-se a soma na pena concreta,
de modo que com maior razão deve operar-se também na pena abstrata, a fim de impedir a transação. De
acordo com essa corrente, o art. 119 do CP cuida apenas de prescrição, não devendo ser aplicado à transação,
porque não há nenhuma semelhança entre esses dois institutos.

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PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO

O procedimento sumaríssimo do JECRIM apresenta os seguintes atos:


I) oferecimento da denúncia ou queixa;
II) citação para a audiência de instrução e julgamento;
III) audiência de instrução e julgamento. Nesta audiência, haverá os seguintes atos:
a) defesa preliminar;
b) recebimento ou rejeição da denúncia ou queixa;
c) absolvição sumária, se o caso, desde que haja o recebimento da denúncia ou queixa;
d) caso não tenha ocorrido a absolvição sumária, se procederá à oitiva da vítima, das testemunhas de
acusação, das testemunhas de defesa e, por último, o interrogatório do réu;
e) debates da acusação e da defesa;
f) sentença.

Oferecimento da denúncia ou queixa

Não sendo possível a transação penal, o Ministério Público oferecerá a denúncia e, nos crimes de ação
penal privada, a vítima poderá oferecer a queixa.
A denúncia ou queixa pode ser oferecida oralmente na própria audiência preliminar ou depois, por
escrito.
A prova da materialidade da infração penal que envolve lesão corporal pode ser feita por boletim
médico ou outra prova equivalente. Portanto, para o oferecimento da denúncia, dispensa-se o exame de corpo
de delito desde que a materialidade esteja comprovada por esses outros meios.
A propósito dispõe o art. 77, § 1º, da Lei 9.099/95
“Para o oferecimento da denúncia, que será elaborada com base no termo de ocorrência referido no
art. 69 desta Lei, com dispensa do inquérito policial, prescindir-se-á do exame do corpo de delito quando a
materialidade do crime estiver aferida por boletim médico ou prova equivalente”.
Uma primeira corrente, com base na interpretação literal, sustenta que o exame de corpo de delito só
pode ser substituído pelo boletim médico para efeito de oferecimento da denúncia ou queixa, mas, por
ocasião da sentença condenatória, haverá a necessidade do exame de corpo de delito.
Outra corrente, com fundamento na interpretação extensiva e no princípio da informalidade, assevera
que a materialidade poderá ser comprovada, inclusive, para efeito de sentença condenatória, com base no
boletim médico ou outra prova equivalente, dispensando-se o exame de corpo de delito.
Esta última exegese é a mais correta, sob pena de o referido dispositivo legal se revelar inócuo, posto
que, em regra, para efeito de oferecimento da denúncia ou queixa, o exame de corpo delito é dispensável
para todos os crimes.
Quanto ao número de testemunhas, uma primeira corrente sustenta que o máximo é de 3 (três)para
cada parte, por aplicação subsidiária do art. 34 da Lei 9.099/95, que cuida do juizado cível. Outra corrente
apregoa que o número seria 5 (cinco), por aplicação subsidiária do procedimento comum sumário do CPP.
Tanto a denúncia quanto a queixa podem ser oral ou escrita, outrossim oferecidas na própria audiência
preliminar ou depois. Caso seja oral será reduzida a escrito.
Convém observar que, enquanto as testemunhas de acusação devem ser arroladas na denúncia ou
queixa, sob pena de preclusão, as testemunhas da defesa não precisam ser arroladas, pois o acusado será
citado para trazê-las à audiência ou apresentar requerimento para intimação, no mínimo cinco dias antes da
realização da audiência, conforme § 1º do art. art. 78 da Lei 9.099/95.
Assim, o réu simplesmente leva as suas testemunhas à audiência, sem prévia comunicação ao juízo.

Citação do réu

Após a oferta da denúncia ou queixa, o réu será citado para comparecer à audiência de instrução e

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julgamento.
Cumpre observar que a lei ordena a citação antes do recebimento da denúncia ou queixa, pois a decisão
de admissibilidade ou não da peça acusatória só será prolatada na audiência de instrução e julgamento.
A doutrina observa que não se trata propriamente de citação, mas, sim, de notificação, posto que a
citação pressupõe o recebimento da denúncia ou queixa.
Na verdade, trata-se ao mesmo tempo de notificação e citação sob condição suspensiva, pois o ato
citatório só se aperfeiçoará se houver o recebimento da denúncia ou queixa.
A lei rotulou o ato de citação para evitar que, após o recebimento da denúncia ou queixa, houvesse a
necessidade de uma citação, que implicaria em designação de nova audiência, retardando inocuamente o
andamento do processo, em contraste com o princípio da celeridade.
Se a denúncia ou queixa houver sido oferecida na audiência preliminar, na qual o acusado se encontrava
presente, a citação, para comparecer à audiência de instrução e julgamento, se considerará realizada na
própria audiência, entregando-lhe uma cópia da peça acusatória.
Com efeito, dispõe o art. 78 da Lei 9.099/95:
“Oferecida a denúncia ou queixa, será reduzida a termo, entregando-se cópia ao acusado, que com ela
ficará citado e imediatamente cientificado da designação de dia e hora para a audiência de instrução e
julgamento, da qual também tomarão ciência o Ministério Público, o ofendido, o responsável civil e seus
advogados”.
Se o acusado não estiver presente na audiência preliminar, será citado pessoalmente, por mandado, e,
no mandado, constará a data da audiência de instrução e julgamento, outrossim, a informação que deverá
trazer para a audiência suas testemunhas ou apresentar requerimento para intimação, no mínimo cinco dias
antes da realização da audiência, conforme § 1º do art. art. 78 da Lei 9.099/95.
Em suma, o réu será citado pessoalmente para comparecer à audiência de instrução e julgamento.
Caso ele esteja presente na audiência preliminar, já sairá citado. Se não estiver, será citado por
mandado.
Do mandado de citação do acusado, também constará a necessidade de seu comparecimento
acompanhado de advogado, com a advertência de que, na sua falta, ser-lhe-á designado defensor.
Quanto à vítima ou responsável civil, se estava na audiência preliminar, também sairá intimado para
comparecer à audiência de instrução e julgamento, caso contrário, a intimação far-se-á por correspondência,
com aviso de recebimento pessoal ou, tratando-se de pessoa jurídica ou firma individual, mediante entrega
ao encarregado da recepção, que será obrigatoriamente identificado, ou, sendo necessário, por oficial de
justiça, independentemente de mandado ou carta precatória, ou ainda por qualquer meio idôneo de
comunicação (art. 67 da Lei 9.099/95).
A propósito, dispõe o art.78, §2º, da Lei 9.088/95:
“Não estando presentes o ofendido e o responsável civil, serão intimados nos termos do art. 67 desta
Lei para comparecerem à audiência de instrução e julgamento”.

Audiência de instrução e julgamento

Aberta a audiência, o primeiro ato é a defesa preliminar, isto é, o juiz dará a palavra ao defensor para
responder oralmente à acusação. Caso a defesa já esteja escrita, o juiz poderá autorizar a sua juntada aos
autos, dando oportunidade para que seja lida pelo órgão acusatório.
Em seguida, o juiz receberá ou não a denúncia ou queixa. Portanto, a denúncia ou queixa não são
recebidas ou rejeitadas de plano, mas somente após a apresentação da defesa preliminar, sob pena de
nulidade do processo.
É pacífico na jurisprudência que o recebimento da denúncia ou queixa não precisa ser fundamentado.
Na ação penal privada, o não comparecimento do advogado do querelante a esta audiência ensejará a
extinção da punibilidade pela perempção (art. 60, III, do CPP).
A defesa preliminar tem o objetivo convencer o magistrado acerca da rejeição da denúncia ou queixa,
suscitando a inépcia da peça acusatória, a falta de pressupostos processuais, de condições da ação ou de justa
causa.

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Entretanto, como não haverá depois do eventual recebimento da denúncia ou queixa uma nova
oportunidade para a apresentar a defesa de mérito , que é denominada de resposta à acusação, é conveniente
que, na própria defesa preliminar, o acusado também suscite as teses de absolvição ou de redução da pena,
mas se não o fizer ainda poderá argui-las durante os debates.
Uma outra corrente, porém, sustenta que, após o recebimento da denúncia ou queixa, ainda não teria
início a instrução processual, pois teria que se dar oportunidade para a apresentação da defesa meritória, que
é denominada
de resposta à acusação.
De fato, o §4º do art. 394 do CPP ordena que a resposta à acusação seja aplicada a todos os
procedimentos, inclusive, quando regidos por leis especiais.
Entretanto, a apresentação de duas defesas na mesma audiência colide com o princípio da
simplicidade, que é um dos postulados do juizado criminal, além de ferir o princípio da celeridade e
representar uma superfetação, ou seja, algo inútil, tendo em vista que, na própria defesa preliminar,
será também possível concentrar todas as teses meritórias.
Ademais, §5o do art. 394 do CPP esclarece que:
“Aplicam-se subsidiariamente aos procedimentos especial, sumário e sumaríssimo as disposições do
procedimento ordinário”.
Vê-se assim que a aplicação das normas do procedimento comum ordinário tem caráter subsidiário, não
podendo contrariar as finalidades da lei.
Após a defesa preliminar, se houver o recebimento da denúncia ou queixa, o juiz analisará a
possibilidade de absolvição sumária, nos termos do §4º do art. 394 do CPP.
Outra corrente, porém, sustenta que o juiz, após o recebimento da denúncia ou queixa, não precisaria
analisar esta possibilidade, pois o recebimento da denúncia ou queixa implica em rejeição tácita da tese de
absolvição sumária.
Em não sendo o caso de absolvição sumária, inicia-se a fase de instrução com a inquirição na seguinte
ordem:
a) vítimas;
b) testemunhas de acusação;
c) testemunhas de defesa;
d) interrogatório do réu, se estiver presente.
Todas as provas serão produzidas na audiência de instrução e julgamento, podendo o juiz limitar ou
excluir as que considerar excessivas, impertinentes ou protelatórias (§1º do art. 81 da Lei 9.099/95).
Tem sido admitido, porém, por força do direito à prova, a inquirição de testemunhas através de carta
precatória, pois o CPP é aplicado subsidiariamente ao procedimento sumaríssimo.
Nenhum ato será adiado, determinando o Juiz, quando imprescindível, a condução coercitiva de quem
deva comparecer.
Após o interrogatório do réu, passa-se imediatamente aos debates orais, no prazo de 20 (vinte) minutos
para a acusação e 20 (vinte) para a defesa.
A lei não prevê a substituição dos debates orais pelos memoriais escritos, mas caso haja esta
substituição não haverá nulidade, diante da falta de prejuízo.
Ato contínuo, haverá a prolação da sentença no próprio termo da audiência. A sentença dispensa o
relatório.
De todo o ocorrido na audiência será lavrado termo, assinado pelo Juiz e pelas partes, contendo:
a) um breve resumo dos fatos relevantes ocorridos em audiência; e
b) a sentença.

RECURSOS

A Lei 9.099/95 só prevê duas modalidades de recursos: apelação e embargos de declaração, mas por
aplicação subsidiária do CPP é pacífico o cabimento do recurso em sentido estrito e do recurso extraordinário.

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Apelação

O recurso de apelação é cabível em 4 (quatro) hipóteses:


a) da decisão que rejeita a denúncia ou queixa (art. 82 da Lei 9.099/95. Nesse caso, o recorrido será
intimado para oferecer resposta escrita no prazo de dez dias (§ 2º do art. 82). A falta de intimação do acusado
para oferecer as contrarrazões constitui nulidade absoluta, ainda que o juiz lhe tenha nomeado advogado
dativo (súmula 707 do STF).
b) da sentença condenatória ou absolutória (art. 82).
c) da sentença que homologa a transação penal (art. 76, § 5º).
d) da decisão que não homóloga a transação (art. 593, II, do CPP).
O prazo para a apelação é de 10 (dez) dias e a petição de interposição deve vir acompanhada
simultaneamente das razões de recurso. Não se pode apelar verbalmente, mas apenas por escrito.
O referido recurso é interposto perante o órgão “a quo”.
Se as razões não forem apresentadas juntamente com a petição recursal, admite-se que sejam
apresentadas depois, desde que dentro do prazo de 10 (dez) dias, independentemente de nova intimação.
A não apresentação das razões ou a sua apresentação intempestiva, para uns, impede o conhecimento
do recurso, enquanto outros asseveram que é uma mera irregularidade, que não prejudica o conhecimento
do recurso interposto tempestivamente.
Cumpre observar que a apelação regida pelo CPP deve ser interposta no prazo é de 5 (cinco) dias, por
petição ou termo nos autos, sendo que o apelante tem ainda a opção de apresentar as razões depois, dentro
do prazo de 8 (oito) dias, no juízo “a quo” ou “ad quem”.
No JECRIM, não há prazo em dobro para o Ministério Público e Defensoria Pública.
O órgão “ad quem” no JECRIM chama-se Turma ou Colégio Recursal, que é composto por três juízes de 1a
instância, e não por desembargadores.
A própria Constituição autoriza esta formação da turma recursal por juízes de primeiro grau (art. 98, I,
da CF).
O magistrado que prolatou a sentença impugnada, caso integre a turma recursal, estará impedido de
participar do julgamento do recurso (art. 252, II, do CPP).
É ainda o Ministério Público de primeiro grau que atua nesses recursos, e não o procurador de justiça.
Quanto à infração penal de menor potencial ofensivo que, por alguma razão, houver sido julgada pelo
juízo comum, terá o seu eventual recurso direcionado ao Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal.
No JECRIM, as partes serão intimadas da data da sessão de julgamento pela imprensa (art. 81, § 4º, da
Lei 9.099/95).
Esta norma, por ser especial, aplica-se também ao Ministério Público e Defensoria Pública, que serão
também intimados pela imprensa, e não pessoalmente como ocorre nos demais procedimentos.
As leis complementares, que regem as carreiras do Ministério Público e da Defensoria Pública, preveem
a intimação pessoal desses órgãos, mas, nesse aspecto, têm natureza de leis ordinárias, pois versam sobre
processo e, por isso, não há qualquer óbice em serem afastadas pelo art. 81, § 4º, da Lei 9.099/95.
Outra, corrente, ao revés, assevera que a intimação do Ministério Público e da Defensoria Pública deve
ser sempre pessoal.
No julgamento das apelações do JECRIM, admite-se, no caso de confirmação da sentença, o acordão
remissivo, que adota como razão de decidir os fundamentos da própria sentença.
Trata-se de uma hipótese de fundamentação “per relationem”, que adota como razão de decidir uma
fundamentação anterior.
Nesse caso, a súmula do julgamento servirá de acórdão.
O STF já decidiu que o acórdão remissivo não ofende o art. 93, IX, da CF, que prevê a necessidade de
motivação das decisões judiciais.

Embargos de declaração

Caberão embargos de declaração quando, em sentença ou acórdão, houver obscuridade, contradição

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ou omissão.
Para dirimir dúvida, não cabe mais embargos de declaração, pois esta hipótese foi revogada pelo art.
1.066 da lei 13.015/2015.
Os embargos de declaração, contra sentença ou acórdão, serão opostos por escrito ou oralmente, no
prazo de 5 (cinco) dias, contados da ciência da decisão (art. 83 da Lei 9.099/95). No CPP, o prazo é de 2(dois)
dias, e só admite a forma escrita.
Quando opostos contra sentença ou acórdão, os embargos de declaração interromperão o prazo para
o recurso (art.83, §2o, da lei 9.099/95).
Não se trata de suspensão e, sim, de interrupção do prazo, de modo que, após a intimação do
julgamento dos embargos declaratórios, o prazo para recorrer será restituído por inteiro.
Quanto aos erros materiais da sentença, poderão ser corrigidos de ofício.

Recurso extraordinário e recurso especial

É pacífico que do acórdão da turma recursal é cabível recurso extraordinário ao STF (Súmula 640 do
STF).
De fato, este recurso é cabível quando a causa for decidida em única ou última instância, não se
exigindo, ao contrário do que ocorre com o recurso especial, que seja decidida por órgão de segundo grau de
jurisdição.
Não é cabível, destarte, o recurso especial ao STJ, pois a turma recursal não é um órgão de segundo
grau de jurisdição, posto que composta por magistrados de primeiro grau de jurisdição (Súmula 203 do STJ).
Ademais, a turma recurso não é um tribunal, sendo que recurso especial só é cabível contra decisões de
tribunal.

Recurso em sentido estrito

Uma primeira corrente sustenta que não é cabível o recurso em sentido estrito, posto que, além de não
previsto na Lei 9.099/95, a matéria poderá ser arguida em preliminar de apelação.
Outra corrente, que é dominante, acertadamente, admite este recurso nas hipóteses do art. 581 do
CPP, pois o CPP é aplicado subsidiariamente (art. 92 da Lei 9.099/95). Exemplo: decisão que reconhece a
prescrição ou outra causa de extinção da punibilidade (art. 581, VIII, do CPP). Outro exemplo: decisão que
reconhece a incompetência do JECRIM (art. 581, II, do CPP).
De fato, a exclusão do recurso em sentido estrito tornaria irrecorríveis as duas decisões citadas nos
exemplos acima e outras decisões relevantes, previstas no art. 581 do CPP.

Mandado de segurança

Sobre o mandado de segurança contra ato de juiz do JECRIM, dispõe a súmula 376 do STJ: “Compete a
turma recursal processar e julgar o mandado de segurança contra ato de juizado especial”.
Não obstante a súmula acima, o pleno do STF já decidiu que não cabe mandado de segurança contra as
decisões interlocutórias do juizado criminal, pois elas poderão ser impugnadas em preliminar de uma futura
apelação.
Quanto ao mandado de segurança interposto contra decisão da turma recursal, de acordo com o STF, é
da competência da própria turma recursal e não do STF ou do Tribunal de Justiça.

“Habeas corpus”

É ainda possível se impetrar “habeas corpus”, contra acórdão da turma recursal, perante o Tribunal de
Justiça ou Tribunal Regional Federal, conforme se trate de JECRIM Estadual ou Federal. A Súmula 690 do STF,

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que atribuía essa competência ao STF, foi cancelada.


A rigor, não há hierarquia entre a turma recursal e os tribunais de justiça ou tribunais regionais federais,
tanto é que estes tribunais não são instâncias revisoras dos acórdãos das turmas recursais, mas o STF, por uma
questão pragmática, resolveu lhes atribuir a competência para a análise de “habeas corpus”, contra acórdão
da turma recursal, cancelando a súmula 690.

Revisão criminal

Por aplicação subsidiária do CPP, também será cabível, após o trânsito em julgado da sentença ou
acórdão condenatório, a revisão criminal, que será julgada pela turma recursal, e não pelo tribunal de justiça.
No âmbito do juizado cível, a lei vedou expressamente a ação rescisória, silenciando, de forma
eloquente, acerca da revisão criminal, autorizando implicitamente o seu cabimento.

SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO

CONCEITO

Suspensão Condicional do Processo, também chamado de “sursis” processual, é o benefício que, após o
recebimento da denúncia ou queixa, paralisa o andamento dos autos, por um período que varia entre 2 (dois)
a 4 (quatro) anos, sujeitando o acusado ao cumprimento de determinadas condições.

Norma geral

Conquanto previsto na Lei n. 9.099/95, o “sursis” processual é norma geral, aplicável, por isso, a todo o
direito penal, inclusive aos delitos que apresentam procedimento especial.
É, pois, um equívoco supor que a suspensão condicional do processo seria cabível apenas nas infrações
penais de menor potencial ofensivo, pois esse instituto é aplicável a todos os demais crimes cuja pena mínima
não exceda a 1 (um) ano.
Na época, introduziu-se no projeto que gerou a Lei 9.099/95 dois outros projetos de leis que tramitavam
separadamente. Foi uma forma de aprová-los em conjunto. O primeiro foi o que passou a exigir representação
na ação penal relativa aos crimes de lesão corporal leve e lesões culposas (art. 88). O segundo foi justamente
a suspensão condicional do processo (art. 89).

Vedação

O benefício só não é aplicável, diante da proibição legal, a dois delitos:


a) crimes militares;
b) crimes e contravenções em que há violência doméstica e familiar contra mulher (súmula 536 do STJ).
Entretanto, nos crimes militares praticados por civis, que só é possível no âmbito da justiça militar da
União, é possível a concessão do benefício, segundo já decidiu o STF, pois o civil não está sujeito à hierarquia
e disciplina militar.

Requisitos

Os requisitos da suspensão condicional do processo são os seguintes:


a) a pena abstrata mínima deve ser igual ou inferior a 1 (um) ano;
b) não pode estar sendo processado por outro crime. O termo “processado” pressupõe que já haja o
recebimento da denúncia ou queixa. O STF já decidiu que este requisito não viola o princípio constitucional da
presunção da inocência. Se o agente já cumpriu suspensão de processo anterior, nada obsta que, antes de 5
(cinco) anos, obtenha novamente o benefício, caso pratique novo crime, pois a lei só veda, dentro de 5(cinco)
anos, uma nova transação penal, sendo vedada a analogia “in malam partem”.

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c) não pode registrar condenação por crime. É preciso, para se obstar o benefício, que se trate de uma
condenação transitada em julgado. Se o novo crime houver sido cometido depois do prazo de 5 (cinco) anos,
a contar do cumprimento da pena do crime anterior ou da extinção da punibilidade, o benefício poderá ser
deferido.
d) as circunstâncias do art. 59 do CP lhe devem ser favoráveis, isto é, demonstrar que o benefício da
suspensão condicional do processo é adequado e suficiente ao agente;
e) aceitação. A aceitação é um ato personalíssimo do acusado, que não poderá fazer-se representar por
procurador com poderes especiais. Ele ainda deverá estar assistido, no ato da aceitação, por advogado ou
defensor público, sob pena de nulidade. A vontade do acusado de aceitar ou negar, no caso de divergência,
sempre prevalecerá sobre a de seu advogado ou defensor público. A aceitação deve ser total à proposta do
Ministério Público, sem imposição de qualquer ressalva. A aceitação é irretratável. Além disso, deve ser
expressa, de modo que não haverá presunção de aceitação ao réu revel.

Pena mínima

Conforme já dito, para se obter o benefício, a pena abstrata mínima deve ser igual ou inferior a um ano;
Abre-se exceção aos tipos penais que preveem alternadamente pena privativa de liberdade ou multa,
nesse caso, ainda que a pena mínima seja superior a um ano, admite-se a suspensão do processo, conforme
Informativo 475 do STF. Exemplo: o crime do art. 7o da Lei 8.137/90 prevê como pena uma detenção de 2
(dois) a 5 (cinco) anos, ou multa.
Na hipótese de tentativa ou outra causa de diminuição de pena, toma-se a pena abstrata mínima e se
reduz ao máximo, obtendo-se assim a pena mínima. Uma tentativa de furto qualificado (§ 4o do art. 155 do
CP), por exemplo, cuja pena mínima é de 2 (dois) anos, mas que, reduzida no máximo de 2/3 (dois terços) pela
tentativa, totaliza 8 (oito) meses, admite a suspensão condicional do processo.
Ao revés, quando houver causa de aumento de pena, toma-se a pena mínima e se aumenta no mínimo,
verificando-se, em seguida, se excede ou não a 1 (um) ano.
Na hipótese de concurso de infrações penais, dispõe a Súmula 243 do STJ:
“O benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em
concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo
somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um ano”.
A propósito, ainda dispõe a Súmula 723 do STF:
“Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado se a soma da pena mínima
da infração mais grave com o aumento de um sexto for superior a um ano”.
Assim, no concurso material, para a análise da concessão do benefício, faz-se a soma das penas
mínimas.
No concurso formal e crime continuado, aplica-se sobre a pena mínima o percentual mínimo de
aumento, que é de 1/6 (um sexto).

NATUREZA JURÍDICA

Trata-se de um direito público subjetivo do réu. Outrossim, de um instituto despenalizador.


Difere do “guilty plea” anglo-saxônico e do “plea bargaining”dos EUA, pois nestes dois institutos o
acusado aceita uma proposta de pena e de reconhecimento da culpa, ao passo que, na suspensão do processo,
não há pena nem reconhecimento de culpa.

Momento da concessão do benefício

O Ministério Público oferece a denúncia e, se entender cabível, propõe a suspensão do processo.


O juiz, se considerar que não é caso de arquivamento do inquérito, após receber a denúncia, suspende o
processo, submetendo o acusado a um período de prova.
Se a hipótese for de arquivamento do inquérito policial, o juiz deve rejeitar a denúncia, em vez de admitir

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a suspensão do processo.
Aliás, se o benefício não for proposto ou concedido no momento do recebimento da denúncia ou queixa,
ainda pode ser proposto e deferido depois, isto é, ao término da instrução probatória, em duas hipóteses:
a) desclassificação do crime;
b) procedência parcial da pretensão punitiva.
Com efeito, dispõe a Súmula 337 do STJ:
“É cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na procedência parcial da
pretensão punitiva”.
No caso de desclassificação, o juiz, antes de prolatar a sentença, deve converter o julgamento em
diligência e abrir vista dos autos ao Ministério Público para que ele se manifeste sobre a suspensão condicional
do processo.
Antes, é claro, o juiz prolata uma decisão desclassificatória (exemplo: afasta a qualificadora do furto,
transmudando-o em furto simples, e, após a preclusão dessa decisão, abre vista ao Ministério Público para se
manifestar sobre a suspensão do processo.
A procedência parcial, por sua vez, se verifica quando o juiz, ao absolver o réu de um dos delitos, verifica
que, em relação ao outro, é possível a suspensão do processo. Nesse caso, após prolatar a sentença
absolutória, o magistrado se abstém de julgar o acusado pelo outro delito, abrindo vista ao Ministério Público
para se pronunciar sobre a suspensão do processo.
Na hipótese de a desclassificação ou procedência parcial se verificar no tribunal, em grau de recurso, o
julgamento deverá ser convertido em diligência para que o juiz intime as partes, a fim de se viabilizar a
concessão do benefício.
Se, antes do trânsito em julgado, ocorrer a extinção da punibilidade, em relação a um dos crimes,
viabilizando-se o benefício quanto ao delito remanescente, creio que o juiz ou tribunal deva converter o
julgamento em diligência para que o Ministério Público ofereça a proposta de suspensão do processo.
Há, entretanto, entendimento no sentido de que a prescrição com base na pena concreta, ainda que
ocorra antes do trânsito em julgado da condenação, obstaria o benefício para os demais delitos, pois, nesse
caso, a procedência da ação teria sido total, sendo inaplicável a súmula 337 do STJ.
Fora das hipóteses de desclassificação e de procedência parcial, se o benefício não houver sido proposto
por ocasião do oferecimento da denúncia, a defesa deve pleiteá-lo na resposta à acusação, sob pena de
preclusão, pois o não oferecimento da proposta de suspensão do processo é causa de nulidade relativa,
sujeitando-se, destarte, à preclusão.

Recursos

Da decisão que concede o benefício, suspendendo o processo é cabível o recurso de apelação (CPP, art.
593, II).
Outra corrente, entretanto, assevera que, por interpretação extensiva, seria o recurso em sentido
estrito, nos termos do art. 581, XI, do CPP.
Não há, data venia, na situação em análise, falar-se em interpretação extensiva, mas, sim, em analogia,
que é vedada no recurso em sentido estrito. Ademais, o “sursis” do Código Penal é concedido na sentença e,
por isso, o recurso cabível é o de apelação, estando, pois, revogado o inciso XI do art. 581 do CPP, que previa
o recurso em sentido estrito, de modo que se torna inviável tanto a interpretação extensiva quanto a analogia.
Da decisão que denega a suspensão do processo, é cabível “habeas corpus”, outrossim, quando o
benefício não é sequer proposto pelo Ministério Público.
A concessão do benefício de ofício pelo juiz ou com condições não constantes da proposta do Ministério
Público ou ainda sem a concordância do réu poderá ser ajuizada uma das seguintes medidas: correição parcial,
mandado de segurança pelo Ministério Público e “habeas corpus”.
Sobre o “habeas corpus”, nada obsta a sua impetração por quem aceitou benefício, com fim de obter o
a extinção do processo por falta de justa causa, pois a possibilidade de revogação do benefício põe em risco a
liberdade de locomoção, justificando-se, destarte, o remédio heroico.
Por fim, cumprido o período de prova sem revogação, o juiz declarará extinta a punibilidade e dessa

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decisão caberá o recurso em sentido estrito (art. 581, VIII, do CPP).

Período de prova

O período de prova é o lapso de tempo em que o acusado deve cumprir as condições legais e judiciais.
Durante o período de prova, cujo prazo é idêntico ao do “sursis”do Código Penal, ou seja de 2 (dois) a 4
(quatro) anos, o réu deve cumprir as condições legais do art. 89, § 1o, I a IV, da Lei n. 9.099/95 e outras que o
juiz eventualmente fixar.
Na hipótese de contravenção penal, o período de prova é de 1 (um) a 3 (três) anos.

Extinção da punibilidade

Expirado o período de prova sem que tenha havido revogação, o juiz declarará extinta a punibilidade (§
5o do art. 89 da Lei n. 9.099/95).
Dessa decisão é cabível o recurso em sentido restrito (CPP, art. 581, IX).
De acordo com o STF, ao contrário do “sursis” do Código Penal que, por força de lei, extingue-se
automaticamente com o simples decurso do prazo do período de prova (art. 82 do CP), na suspensão
condicional do processo, prevista no art. 89 da Lei 9.099/95, a extinção da punibilidade depende de decisão
judicial.
Enquanto não prolatada essa decisão, o benefício pode ser revogado, ainda que tardiamente, quando
se detectar que, durante o período de prova, ele deveria ter sido revogado. Impõe-se, por exemplo, a
revogação quando, expirado o período de prova, o juiz verificar que, na vigência do benefício, o agente foi
processado por outro crime.

VEDAÇÃO DA CONCESSÃO DE OFÍCIO

Questão aberta a polêmicas é a de saber se o juiz pode ou não conceder, de ofício, o “sursis” processual.
Uns respondem afirmativamente, argumentando que, em se tratando de direito subjetivo de liberdade
do réu, não se pode atribuir ao promotor de justiça a decisão sobre o cabimento ou não do benefício.
Outros respondem negativamente, apegados no próprio texto da lei, que confere ao Ministério Público
o monopólio da proposta da medida.
Filio-me a esta última corrente.
O “sursis” processual representa uma mitigação ao princípio da obrigatoriedade da ação penal, cuja
titularidade a Constituição Federal assegura ao Ministério Público (CF, art. 129, I).
É lógico, portanto, que apenas o titular da ação penal deve deter o poder de disponibilidade do “jus
persequendi in juditio”.
Caso, porém, o Ministério Público , por mero capricho, ou por um falso juízo, deixe de propor a
suspensão do processo, o juiz, entendendo cabível a suspensão, pode remeter os autos ao Procurador-Geral
da Justiça, provocando a sua opinião sobre a questão, aplicando, por analogia, o art. 28 do CPP (Súmula 696
do STF). No âmbito federal, porém, o juiz remeterá os autos à Câmara Criminal do Ministério Público Federal,
que é o órgão competente para apreciar a discordância do pedido de arquivamento de inquérito policial.
Nos crimes de competência originária dos tribunais, a proposta de suspensão do processo deverá ser
feita pelo Procurador Geral da República ou Procurador Geral de Justiça, conforme o caso, e, caso não seja
feita, não há o que fazer senão determinar o prosseguimento do processo.

CRIMES DE AÇÃO PENAL PRIVADA

Discute-se sobre a concessão da suspensão do processo em relação aos delitos de ação penal privada.
Uma primeira corrente preconiza pela impossibilidade, argumentando que o art. 89 somente admite a
aplicação do instituto por proposta do Ministério Público, quando do oferecimento da denúncia, não se
referindo à queixa-crime, acrescentando-se ainda que a ação penal privada tem natureza dispositiva, havendo

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possibilidade de renúncia ao direito de queixa e de perdão do ofendido.


Uma segunda corrente sustenta que o benefício deve ser estendido aos delitos de ação penal privada,
por analogia “in bonam partem”.
Filio-me a esta última corrente. Resta saber quem deve propor a suspensão do processo.
Uns entendem que é o querelante (posição dominante); outros sustentam que é o Ministério Público.
Uma terceira corrente atribui ao juiz a iniciativa da proposta.
A meu ver, a proposta deve ser feita pelo querelante, mas se este não a fizer, o Ministério Público poderá
propô-la. Com efeito, não é razoável permitir a suspensão do processo aos casos de ação penal pública, e
negá-la nos delitos de ação penal privada, que, em regra, são mais brandos. Não se pode dar um tratamento
mais rigoroso aos fatos de menor gravidade.
Cumpre ainda acrescentar que o Ministério Público atua na ação penal privada como “custos legis”,
devendo propor a suspensão do processo, quando cabível, na hipótese de o querelante, por mero capricho,
deixar de realizá-la. Afinal, o querelante é um substituto processual, que defende em nome próprio o interesse
punitivo do Estado, competindo ao Ministério Público fiscalizá-lo e velar pelos direitos públicos subjetivos de
liberdade do acusado.
Outra corrente, porém, em caso de o querelante se recusar a formular a proposta, sustenta que o
benefício não poderá ser concedido, pois ele é o titular exclusivo da ação penal privada.

EFEITOS

São 3 (três) os efeitos do benefício:


a) suspensão do processo;
b) sujeição do acusado ao cumprimento de condições durante o período de prova de 2(dois) a 4 (quatro)
anos;
c) suspensão da prescrição. Note-se que, com o recebimento da denúncia ou queixa, opera-se a
interrupção da prescrição e, logo depois, com a suspensão condicional do processo, verifica-se a suspensão
da prescrição. Em caso de revogação do benefício, a prescrição retoma o seu fluxo, a partir da data da
publicação da decisão que cancelou o benefício.

CONDIÇÕES

As condições legais ou obrigatórias são:


a) reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo;
b) proibição de frequentar determinados lugares;
c) proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do juiz;
d) comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas
atividades.
O Juiz poderá especificar outras condições a que fica subordinada a suspensão, desde que adequadas
ao fato e à situação pessoal do acusado. São as chamadas condições judiciais.
Não se pode, a meu ver, impor, a título de condições judiciais, penas restritivas de direito, sob pena de
violação do princípio da reserva legal, ademais, a lei prevê a imposição de condições e não de penas. Não
obstante, o STJ tem admitido a imposição, como condição, de prestação de serviços comunitários, outrossim,
a prestação pecuniária, além de outras penas restritivas de direitos.

REVOGAÇÃO

Se ocorrer a revogação do benefício, o único efeito é o prosseguimento do processo.


Note-se que, durante o período de prova, a prescrição permanece suspensa (§6º do art. 89 da Lei n.
9.099/95).
Em dois casos revoga-se obrigatoriamente a suspensão do processo.

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O primeiro deles ocorre quando o réu vier a ser processado por outro crime, pouco importa se praticado
antes ou depois do delito que ensejou a suspensão condicional do processo. É, no entanto, essencial, para que
haja a revogação obrigatória, que a denúncia ou queixa já tenha sido recebida, pois antes disso, a rigor, ainda
não há processo.
A meu ver, há violação do princípio da presunção da inocência. A hipótese deveria figurar como causa
de prorrogação.
O segundo tem lugar quando o réu não efetuar, sem motivo justo, a reparação do dano.
Por outro lado, revoga-se facultativamente o benefício, isto é, a critério do juiz, quando o réu vier a ser
processado por contravenção ou descumprir qualquer das condições que lhe tenham sido impostas (§4º do
art. 89).

PRORROGAÇÃO

Nos crimes ambientais, conforme art. 28 da Lei 9.605/98, a extinção da punibilidade, em razão da
suspensão condicional do processo, dependerá de laudo de constatação da reparação do dano ambiental,
ressalvado os casos de absoluta e comprovada impossibilidade, ou seja, quando o acusado for insolvente ou
o dano for irreparável.
Na hipótese desse laudo de constatação comprovar não ter sido completa a reparação, o prazo de
suspensão do processo será prorrogado até o máximo, ou seja, 4 (quatro) anos acrescido de mais um ano,
totalizando-se, destarte, 5(cinco) anos, com suspensão do prazo de prescrição.
Nesse período de prorrogação não incidem as condições.
Findo esse prazo, será feito novo laudo de constatação e, apurada que a reparação não foi integral, será
admitida ainda outra prorrogação idêntica, ou seja, de até 5(cinco) anos.
Ao final dessas prorrogações, a declaração de extinção da punibilidade dependerá de um terceiro laudo
de constatação que comprove a reparação do dano ambiental. Se o dano não houver sido reparado
integralmente, revoga-se o benefício e o processo prossegue, salvo se do laudo de constatação o juiz concluir
que o acusado tomou as providências necessárias à reparação integral do dano, nesse caso, ainda que a
reparação não tenha sido integral, o juiz poderá declarar extinta a punibilidade.
Fora dos crimes ambientais, não há outra hipótese de prorrogação da suspensão condicional do processo.

DISTINÇÃO ENTRE O “SURSIS” PROCESSUAL E O “SURSIS” DO CÓDIGO PENAL

O “sursis” processual apresenta nítida a diferença entre o “sursis” do Código Penal e o processual.
No primeiro, o juiz condena o réu, suspendendo a execução da pena privativa de liberdade imposta na
sentença.
No segundo, o juiz, após receber a denúncia, ou então no curso do processo, mas sempre a pedido do
Ministério Público, suspende o prosseguimento da ação penal.
No primeiro, o efeito da revogação é o cumprimento integral da pena; no segundo, a revogação acarreta
apenas o prosseguimento da ação penal.

DISTINÇÃO ENTRE O “SURSIS” PROCESSUAL E O “SURSIS” INGLÊS

O “sursis” processual também difere do antigo “sursis” inglês, que adotava o sistema do “probation
system”.
No primeiro, o juiz não prolata decisão sobre a culpabilidade do réu.
No segundo, o juiz chega a declarar o réu culpado, suspendendo, só depois disso, a prolação da sentença
condenatória.

ESTATUTO DO DESARMAMAMENTO

Introdução

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A lei 10.826/2003, conhecida como Estatuto do Desarmamento, que prevê os crimes relacionados às
armas de fogo, munições e acessórios, foi regulamentada pelos Decretos 9.845, 9.846, 9.847 e 10.030, todos
de 2019.
Os aludidos decretos passaram a considerar de uso permitido algumas armas que, nos decretos
anteriores, eram de uso restrito, ensejando, nessas hipóteses, a alteração retroativa do tipo penal, em
benefício do réu.
Quanto aos decretos 3.665/2000 e 9.493/2018, que também cuidavam do assunto, foram
expressamente revogados pelo decreto 10.030/2019.

Sistema Nacional de Armas – Sinarm

O Sistema Nacional de Armas – Sinarm, instituído no Ministério da Justiça e Segurança, no âmbito da


Polícia Federal, tem circunscrição em todo o território nacional.
Dentre outras, as suas funções são as seguintes:
a) cadastrar as armas de fogo e respectivos proprietários;
b) cadastrar as autorizações de porte de arma de fogo e as renovações expedidas pela Polícia Federal;
c) cadastrar as transferências de propriedade, extravio, furto, roubo e outras ocorrências suscetíveis de
alterar os dados cadastrais, inclusive as decorrentes de fechamento de empresas de segurança privada e de
transporte de valores;
d) cadastrar as apreensões de armas de fogo, inclusive as vinculadas a procedimentos policiais e
judiciais;
e) cadastrar os armeiros em atividade no País, bem como conceder licença para exercer a atividade;
f) cadastrar mediante registro os produtores, atacadistas, varejistas, exportadores e importadores
autorizados de armas de fogo, acessórios e munições;
g) autorizar a compra de arma de fogo de uso permitido;
h) anuir com o registro de arma de fogo de uso permitido.
As funções acima não alcançam as armas de fogo das Forças Armadas e Auxiliares.
Quanto ao cadastro dos elementos de munição deflagrados por armas de fogo relacionados à prática
de crimes, será feito pelo Banco Nacional de Perfis Balísticos, cuja missão será a de cadastrar as respectivas
armas de fogo, com o objetivo de auxiliar as apurações criminais federais, estaduais e distritais.
O Banco Nacional de Perfis Balísticos será gerido pela unidade oficial de perícia criminal e os seus dados
são sigilosos

NORMA PENAL EM BRANCO

Os delitos de arma de fogo são normas penais em branco em sentido estrito ou heterogêneas, pois a
definição das condutas criminosas são complementadas por atos administrativos, em especial pelos Decretos
9.845, 9.846, 9.847 e 10.030, todos de 2019.De fato, o conceito de arma de fogo, acessório e munição não é
fornecido pela lei em comento, mas, sim, pelos decretos acima mencionados.
Com efeito, a classificação legal, técnica e geral bem como a definição das armas de fogo e demais
produtos controlados, de usos proibidos, restritos, permitidos ou obsoletos e de valor histórico serão
disciplinadas em ato do chefe do Poder Executivo Federal, mediante proposta do Comando do Exército
(art. 23).

Objetividade jurídica

O bem jurídico protegido é a segurança ou incolumidade pública


Trata-se de crime de perigo abstrato ou presumido, pois não se exige a demonstração concreta do
perigo à incolumidade pública.
Convém observar que o bem jurídico não é a incolumidade física, mas, sim, a incolumidade ou segurança

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pública.

Sujeito passivo

Trata-se de crime vago, pois o sujeito passivo é a coletividade.


Alguns delitos, além da coletividade, contêm sujeito passivo determinado. São eles:
a) art. 13: o sujeito passivo, além da coletividade, é o menor de 18 (dezoito) anos e o deficiente mental.
b) art. 16, §1º, V: o sujeito passivo, além da coletividade, será também a criança ou adolescente.

Competência

A competência é da justiça estadual, salvo no tocante ao delito de tráfico internacional de armas de


fogo, acessórios e munições, previsto no art. 18, que é da alçada da justiça federal, nos termos do art. 109, V,
da CF, haja vista que este crime está inserido em tratado internacional de que o Brasil é signatário.

OBJETO MATERIAL

O objeto material dos crimes em análise, em regra, são as armas de fogo, munições e acessórios, que
se classificam em de uso permitido, restrito e proibido.
Em alguns delitos, porém, o objeto material é apenas a arma de fogo, com a exclusão dos acessórios e
munições. São eles:
a) delito de omissão de cautela, previsto no art. 13, “caput”;
b) delito de modificação das características da arma de fogo, previsto no art. 16, §1º, II;
c) delito de posse ou porte de arma de fogo com numeração, marca ou sinal de identificação raspado,
suprimido e adulterado, previsto no art. 16, §1º, IV;
d) delito de posse ou porte de arma de fogo de uso proibido, previsto no art. 16, §2º.
Os artefatos explosivos também figuram como objeto material nos delitos do art. 16, §1º, III, IV e VI e
os artefatos incendiários no delito do art. 16, §1º, III.
Há uma lacuna na lei, que não incrimina a posse e o porte de:
a) munições e acessórios de uso proibido. Quanto à comercialização e o tráfico internacional de
munições e acessórios de uso proibido, são incriminadas nos arts. 17 e 18, que não lhes faz distinção.
b) de material destinado à fabricação de arma de fogo, acessório e munição.
c) de partes essenciais à constituição da arma de fogo. Exemplos: gatilho, tambor do revólver, etc. A lei
incrimina a posse ou porte dos acessórios da arma de fogo, mas silenciou sobre as partes essenciais.
Diante da falta de previsão legal, nas situações acima, o fato se revela atípico, pois é vedada a analogia
“in malam partem”.
Quanto à arma branca, também não é contemplada pelo Estatuto do Desarmamento.

Arma branca

Arma branca, por exclusão, é a que não é de fogo. Subdivide-se em:


a) própria: é a que tem a finalidade específica de ataque ou defesa. Exemplo: punhal, estilingue, espada,
gases tóxicos, gases asfixiantes, armas de pressão, etc.
b) imprópria: é a que serve para ataque ou defesa, embora não seja esta a sua finalidade específica.
Exemplos: facão, canivete, caco de vidro, etc.
Em relação às armas brancas, sejam elas próprias ou impróprias, o porte fora de casa é mera
contravenção penal (art. 19 da LCP), mas dentro de casa o fato será atípico.
Quanto ao porte de gás asfixiante ou tóxico, sem licença da autoridade, é crime do art. 253 do CP.

BREVE GLOSSÁRIO

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Arma de fogo é a que arremessa projéteis empregando a força expansiva dos gases, gerados pela
combustão de um propelente confinado em uma câmara, normalmente solidária a um cano, que tem a função
de dar continuidade à combustão do propelente, além de direção e estabilidade ao projétil (Decreto
10,030/2019).
Munição é cartucho completo ou seus componentes, incluídos o estojo, a espoleta, a carga propulsora,
o projétil e a bucha utilizados em armas de fogo (art. 2º, X, do Decreto 9846/19).
Acessório de arma de fogo é o artefato que, acoplado a uma arma, possibilita a melhoria do
desempenho do atirador, a modificação de um efeito secundário do tiro ou a modificação do aspecto visual
da arma (Decreto 10,030/2019). Exemplos: silenciador, carregador, etc.
As armas de fogo, assim como as munições e acessórios, podem ser de:
a) uso permitido;
b) uso restrito;
c) uso proibido.
As penas dos delitos que envolvem armas de fogo, acessórios e munições de uso proibido e restrito são
mais graves que as previstas para os delitos correspondentes às armas de fogo, acessórios e munições de uso
permitido.
As armas de fogo de uso permitido são aquelas cuja posse ou porte pode ser autorizado às pessoas
físicas e jurídicas, que preenchem os requisitos normativos.
O art. 2º, I, do Decreto 9.847/2.019, considera de uso permitido, as armas de fogo semiautomáticas ou
de repetição que sejam:
a) de porte, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, não atinja, na saída do cano de
prova, energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules;
b) portáteis de alma lisa; ou
c) portáteis de alma raiada, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, não atinja, na
saída do cano de prova, energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules.
As armas de fogo de uso restrito, por sua vez, são aquelas em que a posse ou porte só é possível para
os membros das Forças Armadas ou de determinadas instituições, outrossim, por algumas pessoas físicas ou
jurídicas, devidamente, habilitadas, como é o caso dos colecionadores e competidores.
O art. 2º, II, do Decreto 9.847/2.019 considera de uso restrito, as armas de fogo automáticas e as
semiautomáticas ou de repetição que sejam:
a) não portáteis;
b) de porte, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, atinja, na saída do cano de prova,
energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules; ou
c) portáteis de alma raiada, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, atinja, na saída
do cano de prova, energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules;
Por fim, as armas de fogo de uso proibido são aquelas cuja posse ou porte não pode ser autorizada a
nenhuma pessoa. Exemplos: canhão, tanque de guerra, arma de fogo no formato de caneta ou de outros
objetos inofensivos.
O art. 2º, III, do Decreto 9.847/2.019 considera arma de fogo de uso proibido:
a) as armas de fogo classificadas de uso proibido em acordos e tratados internacionais dos quais a
República Federativa do Brasil seja signatária; ou
b) as armas de fogo dissimuladas, com aparência de objetos inofensivos;

Arma de fogo sem munição

Sobre a posse ou porte de arma de fogo desmuniciada, paira discussão.


Uma primeira corrente sustenta que não há crime, diante da falta de potencialidade lesiva e que,
tecnicamente, não se trata de arma.
Uma segunda, adotada no STJ e STF, proclama que há crime, à medida que o objeto material é triplo:
arma de fogo, acessório e munição. Por consequência, não há necessidade que haja munição na arma de fogo

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nem que esta esteja ao fácil alcance do agente.


De fato, o delito se caracteriza ainda que a arma de fogo esteja sem munição, pois se trata de crime de
perigo presumido.
Ademais, a lei incrimina a posse ou porte de arma de fogo, acessório ou munição.
Se a intenção fosse contemplar apenas as armas municiadas não havia necessidade de se fazer menção
aos acessórios e munições.

Princípio da insignificância

O princípio da insignificância ou bagatela. como se sabe, gera a atipicidade material da conduta.


O referido princípio não é aplicável aos delitos que envolvem arma de fogo, pois a gravidade do fato se
revela evidente.
Sobre a aplicação do princípio da insignificância no delito de posse ou porte ilegal de munição ou
acessório, desacompanhado da arma de fogo, há duas correntes.
Primeira, é inaplicável, pois se trata de crime de perigo abstrato ou presumido, que dispensa até mesmo
a apreensão e perícia no objeto material, de tal sorte que não há que se perquirir sobre a lesividade concreta
da conduta em relação ao bem jurídico. Conforme ensina Victor Rios Goncalves, um único projétil é capaz de
provocar lesões ou a morte, não podendo ser tachada a conduta de irrelevante penal.
Segunda, é aplicável, quando a quantidade de munição apreendida for ínfima a ponto de ser incapaz de
gerar sequer perigo abstrato à incolumidade pública (RHC 143.449/MS, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski,
Segunda Turma do STF).
O STJ, em regra, adota a primeira corrente, mas em casos excepcionais tem aplicado o princípio da
insignificância.
Num desses casos, o réu, no final absolvido, havia sido preso em flagrante na posse de 5 (cinco)
munições de calibre 38, de uso permitido, desacompanhadas de dispositivo que possibilitasse o disparo do
projétil.
Por conseguinte, o STJ decidiu que “deve ser reconhecida a inocorrência de ofensa à incolumidade
pública, sendo, pois, de rigor o afastamento da tipicidade material do fato, conquanto seja a conduta
formalmente típica” (STJ: EDcl no AgRg no REsp 1.700.630/RS, j. 04/10/2018).
O STJ também reconheceu a atipicidade material no porte de acessório desacompanhado da arma de
fogo. Exemplo: porte de carregador.

Arma de fogo com defeito

No tocante à arma de fogo com defeito há duas situações:


a) ineficácia relativa para efetuar disparos. Trata-se da arma cujo disparo é suscetível de falha, mas que
também pode funcionar. Nesse caso, o crime se verifica.
b) ineficácia absoluta para efetuar disparos. Trata-se da arma insuscetível de efetuar disparos
permanentes, por mais que se reitere o seu emprego. Haverá crime impossível (art. 17 do CP). Nesse caso,
porém, se a arma estava municiada, o agente poderá responder pelo delito de posse ou porte de munição.
É preciso, para se demonstrar a ineficácia absoluta, que a arma seja apreendida e periciada.
Comprovada, por exemplo, por perícia, que uma arma quebrada é absolutamente ineficaz para efetuar
disparos, o fato será atípico, por se tratar de crime impossível, mas, se havia munição na arma, o agente
responderá pelo crime de porte de munição.
Quanto ao porte de munição deflagrada ou percutida, também é crime impossível por ineficácia
absoluta do meio.

Perícia na arma de fogo

Por se tratar de crime de perigo presumido ou abstrato, o STJ tem dispensado o exame pericial na arma
de fogo, acessórios e munições.

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Aliás, de acordo com o STJ, para que haja condenação pelo crime de posse ou porte, não é necessário
que a arma de fogo tenha sido apreendida.
A doutrina, porém, exige, para a comprovação da materialidade, o exame de corpo de delito, sendo esta
orientação seguida por inúmeros tribunais de justiça. Nessa linha de raciocínio, se o laudo não fizer menção à
potencialidade ofensiva, o agente poderá ser absolvido por falta de prova da materialidade do crime.

Arma de fogo obsoleta

A arma de fogo obsoleta não pode ser objeto material dos delitos em análise e a sua posse ou porte
caracterizará crime impossível, nos termos do art. 17 do CP.
O art. 2º, VI, do Decreto 9.847/2.019, considera obsoletas as armas de fogo que não se prestam ao uso
efetivo em caráter permanente, em razão de:
a) sua munição e seus elementos de munição não serem mais produzidos; ou
b) sua produção ou seu modelo ser muito antigo e fora de uso, caracterizada como relíquia ou peça de
coleção inerte.
A arma, para ser obsoleta e, por consequência, caracterizar crime impossível, deve se enquadrar em
uma de duas situações:
a) não se prestar ao uso efetivo em caráter permanente, em razão de a sua munição não ser mais
produzida. Nesse caso, não é necessário que se trate de uma arma antiga. Exemplo: fechamento da
empresa que fabricava determinada arma de fogo e respectiva munição. Se, porém, ela estiver municiada,
ainda que se trate das últimas munições, haverá o delito.
b) não se prestar ao uso efetivo em caráter permanente, em razão de ser muito antiga. O fato de ser
antiga, tendo sido fabricada há mais de cem anos atrás, por si só, não gera o crime impossível, pois, se apesar
de antiga, ela ainda funcionar, o agente responderá pelo delito.
Assim, a arma de fogo antiga, desde que revestida de eficácia, ainda que relativa, para efetuar disparos,
não se enquadra como obsoleta, podendo ser objeto material dos delitos em analise, pois a lei não lhe abre
qualquer exceção. Se, porém, for absolutamente ineficaz para efetuar disparos, haverá crime impossível (art.
17 do CP).

ARMAS DE BRINQUEDO

Dispõe o art. 26, “caput”, da Lei 10.823/2.003:


“São vedadas a fabricação, a venda, a comercialização e a importação de brinquedos, réplicas e
simulacros de armas de fogo, que com estas se possam confundir”.
O parágrafo único acrescenta que:
“Excetuam-se da proibição as réplicas e os simulacros destinados à instrução, ao adestramento, ou à
coleção de usuário autorizado, nas condições fixadas pelo Comando do Exército”.
A violação dessa norma, contudo, não é tipificada como crime.
É, pois, fato atípico fabricar, vender ou portar arma de brinquedo ou simulacros de armas de fogo.
Ainda que arma de brinquedo seja uma réplica ou um simulacro, isto é, uma imitação da arma
verdadeira, o fato será atípico.
Entretanto, a importação ou exportação de armas de brinquedo caracteriza crime de contrabando,
previsto no art. 334 do Código Penal, pois se trata de uma mercadoria proibida.

REGISTRO

O certificado de Registro de Arma de Fogo, com validade em todo o território nacional, autoriza o seu
proprietário a manter a arma de fogo exclusivamente no interior de sua residência ou domicílio, ou
dependência desses, ou, ainda, no seu local de trabalho, desde que seja ele o titular ou o responsável legal
pelo estabelecimento ou empresa.
Aos residentes em área rural, para os fins acima, considera-se residência ou domicílio toda a extensão do

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respectivo imóvel rural.


É obrigatório o registro de arma de fogo no órgão competente.
O certificado de registro de arma de fogo de uso permitido será expedido pela Polícia Federal, mediante
prévia autorização do Sinarm.
Ainda que se trate de magistrados e outras pessoas, cujo porte de arma de fogo emana da lei, o registro
é necessário.
Em relação às armas de fogo de uso restrito, o certificado de registro será expedido pelo Comando do
Exército.

PORTE

O porte é documento que autoriza o proprietário a trazer a arma consigo fora de sua residência ou do
local de trabalho.
O porte de arma de fogo, em regra, é proibido, salvo em duas situações:
a) pessoas que, por força de lei tem direito ao porte. Exemplo: magistrados e membros do Ministério
Público. O rol dessas pessoas consta no art. 6o e em outras leis especiais;
b) pessoas que obtiveram o documento que autoriza o porte.
É vedado ao menor de 25 (vinte e cinco) anos adquirir ou portar arma de fogo, mas esta limitação pela
idade, em regra, não se aplica às situações de porte legal.

Autorização de porte ilegal de arma de fogo

A autorização para o porte de arma de fogo de uso permitido, é de competência da Polícia Federal e
somente será concedida após autorização do Sinarm (art. 10).
Quanto à arma de fogo de uso restrito, a competência é do Comando do Exército.
Compete também ao Comando do Exército, a concessão de porte de trânsito de arma de fogo para as
seguintes pessoas:
a) colecionadores, atiradores e caçadores
b representantes estrangeiros em competição internacional oficial de tiro realizada no território
nacional.
Ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, porém, compete a autorização do porte de arma de fogo
para os responsáveis pela segurança de cidadãos estrangeiros em visita ou sediados no Brasil.
A autorização de porte legal de arma de fogo poderá ser concedida com eficácia temporária e territorial
limitada, nos termos de atos regulamentares, e dependerá de o requerente preencher determinados
requisitos previsto na lei e nos decretos que regulam o assunto
O porte de arma de fogo também pode ser concedido em nome da pessoa jurídica, que exerça as
atividades de segurança privada e de transporte de valores.
A empresa de segurança e de transporte de valores deverá apresentar documentação comprobatória
do preenchimento dos requisitos constantes do art. 4o desta Lei quanto aos empregados que portarão arma
de fogo. Esta lista dos empregados deverá ser atualizada semestralmente junto ao Sinarm.
A autorização de porte de arma de fogo, perderá automaticamente sua eficácia caso o portador dela
seja detido ou abordado em estado de embriaguez ou sob efeito de substâncias químicas ou alucinógenas.
Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, o juiz poderá aplicar, de
imediato, ao agressor, como medida protetiva de urgência, suspensão da posse ou restrição do porte de
armas, com comunicação ao órgão competente (art. 22, I, da Lei 11.340/2006).

Distinção entre posse e porte de arma de fogo

O porte autoriza o agente a trazer a arma de fogo consigo fora de sua residência ou do local de trabalho,
ao passo que o registro lhe confere apenas a posse que, no âmbito da referida lei, significa o direito de ter a
arma de fogo em casa ou no local de trabalho onde é o titular do estabelecimento ou responsável legal pela

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empresa.
Na posse, há uma delimitação espacial, pois o agente só poderá possuir a arma de fogo nesses dois
lugares:
a) em sua residência e dependências;
b) local de trabalho, e suas, desde que seja o titular do estabelecimento ou responsável legal pela
empresa.
Aos residentes em área rural, o registro autoriza a posse da arma de fogo no âmbito da residência e de
toda a extensão do respectivo imóvel rural (§5º do art. 5º do Estatuto do Desarmamento).
A posse é, pois, o direito de ter uma arma de fogo, devidamente registrada, em sua residência,
dependências desta, ou no local do trabalho.
No local de trabalho, a posse só é possível ao titular do estabelecimento ou responsável legal da
empresa.
O porte, por sua vez, é o direito de trazer a arma de fogo fora de casa ou do local do trabalho.
Na posse, basta o registro da arma de fogo.
No porte, além do registro, ainda se exige o documento de autorização do porte.

Portes vedados

De acordo com o art. 20 do Decreto 9847/2019, o titular do porte de arma de fogo não poderá conduzi-
la:
a) ostensivamente;
b) com ela adentrar ou permanecer em locais públicos, tais como igrejas, escolas, estádios desportivos,
clubes, agências bancárias ou outros locais onde haja aglomeração de pessoas em decorrência de eventos de
qualquer natureza. Nesse caso, o porte é vedado ainda que de forma não ostensiva.
c) em estado de embriaguez ou sob o efeito de drogas ou medicamentos que provoquem alteração do
desempenho intelectual ou motor.
As circunstâncias acima implicarão na cassação do porte de arma de fogo e na apreensão da arma e,
além disso, o agente responderá pelo delito de porte ilegal de arma (STJ RHC nº 35.260/PI).
De fato, por se tratar de norma penal em branco heterogênea, o porte deverá observar os ditames dos
atos administrativos que regulam o assunto, pois o documento não é uma carta branca para o agente conduzir
a arma de fogo, sem que haja qualquer regramento.
Quanto ao porte visível na residência do agente ou local do trabalho onde é o titular do estabelecimento
ou responsável legal pela empresa, também é vedado, pois o art. 20 do Decreto 9847/2019 não lhe abre
exceção.
Dessa forma, o porte ostensivo nesses dois locais é crime de posse ilegal de arma de fogo.
Se, até para quem tem o documento de porte, o aludido decreto veda o porte ostensivo, com maior
razão, por força de uma interpretação lógica, também é vedado para a pessoa que apenas tem o registro da
arma de fogo, estando, pois, autorizada a possuir, mas de forma não visível, no âmbito de sua residência ou
local do trabalho onde é o titular do estabelecimento ou responsável legal pela empresa.
O porte visível será, entretanto, permitido quando houver necessidade para a defesa pessoal ou do
local. Exemplo: segurança de um banco.

Entrega espontânea da arma de fogo (Art. 32)

Nos crimes de posse de arma de fogo de uso permitido ou restrito ou proibido extingue-se a
punibilidade se o proprietário ou possuidor efetuar a entrega espontânea da arma de fogo à autoridade
competente.
Trata-se de uma causa de extinção da punibilidade aplicável apenas ao delito de posse de arma de fogo.
Não se aplica ao delito de porte.
Esta entrega, que pode se efetuar a qualquer tempo, deve preencher os seguintes requisitos:
a) entrega espontânea. Uma vez apreendida a arma de fogo pela polícia, o agente perderá a

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oportunidade de usufruir desse benefício legal.


b) a entrega deve ser feita pelo proprietário ou possuidor. Por analogia “in bonam partem”, estende-se
a extinção da punibilidade à entrega feita por terceira pessoa autorizada pelo proprietário ou possuidor.
A portaria nº 797/2.011 do Ministério da Justiça e Segurança estabelece o procedimento de entrega de
arma de fogo, acessório e munição e da respectiva indenização a que o agente faz jus.
A entrega deve ser feita à polícia militar mais próxima.
É importante que a arma esteja descarregada, embalada e o agente munido da guia de trânsito, mas
ausente estas formalidades não me parece que deva responder pelo delito, pois não se encontra presente o
dolo de realizar o porte de forma ilegal, mas, sim, o propósito de cumprir o desígnio da lei, que, através dessa
e de outras normas, estimula o desarmamento.

Distinção entre porte e transporte

O transporte ilegal de arma de fogo, acessórios e munições também é crime dos arts. 14 ou 16.
É, pois, equiparado, no tocante à pena, ao delito de porte ilegal.
É importante, porém, fazer a distinção entre os dois verbos.
Portar é trazer consigo a arma de fogo, acessório ou munição.
Transportar, por sua vez, é deslocar a arma de fogo, acessório ou munição de um local para outro.
Ao adquirir licitamente uma arma de fogo, o agente, para transportá-la até a sua residência ou local de
trabalho onde é o titular do estabelecimento ou responsável legal pela empresa, deverá providenciar uma
guia de trânsito, que equivale ao porte de transporte, sob pena de responder pelo delito.
A guia de trânsito autoriza apenas o transporte da arma de fogo, desmuniciada e acondicionada, para o
percurso nela autorizado, sob pena de o agente responder pelo delito (art. 4º, §6º, do decreto 9845/2019).
Entretanto, os colecionadores, os atiradores e os caçadores poderão portar uma arma de fogo curta
municiada, alimentada e carregada, pertencente a seu acervo cadastrado no Sinarm ou no Sigma, conforme o
caso, sempre que estiverem em deslocamento para treinamento ou participação em competições, por meio
da apresentação do Certificado de Registro de Colecionador, Atirador e Caçador, do Certificado de Registro de
Arma de Fogo e da Guia de Tráfego válidos (§3º do art. 5º do decreto 9.846/2019).
Sem a guia de trânsito, é crime o transporte de arma de fogo, ainda que se trate de um atirador,
colecionador ou caçador, mas, se ela estiver desmontada ou descarregada, só haverá o crime quando a
distância for de fácil alcance para a sua montagem e manuseio.
São, pois, requisitos do transporte:
a) guia de trânsito;
b) arma de fogo desmuniciada;
c) arma de fogo acondicionada, ou seja, embalada ou embrulhada. Não se pode, por exemplo,
transportá-la debaixo do banco do carro, sob pena de responder pelo delito.

Abolitio Criminis Temporária

O art. 30 permitiu o registro tardio de arma de fogo de uso permitido até o dia 31 de dezembro de 2.008
mas, depois, este prazo foi prorrogado até 31 de dezembro de 2.009, conforme art. 20 da lei 11.922/2.009.
Por consequência, não era crime, até esta data, a posse de arma de fogo de uso permitido, na própria
residência ou no local de trabalho pelo titular do estabelecimento ou representante legal da empresa.
Trata-se de uma “abolitio criminis” temporária, também chamada de “vacatio legis” indireta, que estava
condicionada à comprovação, por qualquer meio de prova, da origem lícita da arma.
O registro feito até 31 de dezembro de 2009 tornava atípica a conduta de possuir arma de fogo na
residência ou no local de trabalho pelo titular do estabelecimento ou responsável legal da empresa.
O benefício era exclusivo para o crime de posse de arma de fogo. Não abrangia outros delitos.
Quanto à arma de fogo de uso restrito, o registro tardio também foi permitido, mas somente até 23 de
junho de 2005, por força da medida provisória 229/2004.
No tocante à arma de fogo de uso permitido com numeração raspada ou adulterada, o registro tardio

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só foi admitido até 23 de outubro de 2005.


Sobre o assunto, dispõe a Súmula 513 do STJ:
“A abolitio criminis temporária prevista na Lei n. 10.826/2003 aplica-se ao crime de posse de arma de
fogo de uso permitido com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou
adulterado, praticado somente até 23/10/2.005”.

Questões atinentes à adequação típica

No tocante à arma de fogo de uso permitido, a posse é crime do art. 12 e o porte se enquadra no art.
14, que é mais grave.
Quanto à arma de fogo de uso restrito, a posse e o porte se enquadram no art. 16, não há, pois, distinção
entre as penas.
Em relação à arma de fogo de uso proibido, tanto a posse quanto o porte se enquadram na qualificadora
do §2º do art. 16.
Por fim, a posse e o porte de arma de fogo com numeração, marca ou sinal de identificação raspado,
suprimido e adulterado, se enquadra no delito do art. 16, §1º, IV, seja a arma de uso permitido, restrito ou
proibido.
Eis algumas situações:
a) o taxista ou caminhoneiro, que traz a arma no interior do veículo, responde pelo crime de porte, e
não pelo delito de posse, de arma de fogo, pois o veículo não é o local, mas, sim, o instrumento do
trabalho. Ainda que a pessoa more no veículo, haverá o delito, pois o local da residência ou do trabalho deve
ser fixo. Não abrange, destarte, os bens móveis. Na hipótese de o agente morar no veículo será necessário o
mandado judicial de busca domiciliar para que haja a apreensão da arma, salvo na hipótese de flagrante
delito, pois, em tal situação, o veículo funciona como a sua casa, estando, pois, sob a proteção do art. 5º, XI,
da CF, embora não seja a sua residência ou domicílio nem o seu local de trabalho.
b) a posse, no interior da residência, de arma de fogo com registro vencido, é fato atípico, pois não há
o dolo de manter a arma de forma ilegal, em sua residência. Trata-se de mera infração administrativa
(informativo 572 STJ).
c) o crime de homicídio praticado por meio de arma de fogo pode ou não absorver o crime de posse ou
porte de arma. Se a arma houver sido adquirida com a finalidade específica de matar a vítima, impõe-se a
absorção, por força do princípio da consunção, pois há, entre os delitos, uma relação de meio e fim. Se, ao
revés, a aquisição ocorreu por outras razões, haverá o concurso material entre os crimes de homicídio e posse
ou porte de arma de fogo, pois os contextos são diferentes. É a posição do STJ. Na doutrina, porém, há
entendimento que sempre defende a absorção dos delitos de posse ou porte de arma de fogo, aplicando-se o
princípio da consunção.
d) o magistrado tem porte de arma “ex vi legis”, ainda que se trate de arma de fogo de uso restrito,
pois o art. 33, V, Lei Complementar 35/1979, não faz qualquer distinção quanto ao tipo de arma, liberando-
lhe o porte para defesa pessoal. Por consequência, o magistrado não se sujeita à necessidade de expedição
do documento de porte pelo Comando do Exército, mas a lei não o exime do dever de registrar a arma de
fogo.
e) o conselheiro do tribunal de contas da União, e, por simetria, também os dos Estados, nos termos
dos arts. 73, §3°, e 75, da CF, tem as mesmas prerrogativas do magistrado e. portanto, não necessita do
documento de porte, ainda que se trate de arma de fogo de uso restrito.
f) o policial aposentado não tem direito ao porte, cuja permissão legal se relaciona à função pública.
Portanto, responderá pelo delito de porte ilegal de arma de fogo (Informativo STJ 554/2014).
g) no roubo com emprego de arma de fogo, o delito de porte ilegal de arma de fogo é absorvido, por
força do princípio da subsidiariedade tácita, pois já funciona como qualificadora do roubo, nos termos do art.
157, §2º-A e §2º-B, do CP. Se, porém, o porte se verificar em contexto diferente do roubo, não há falar-se em
absorção. Se, por exemplo, no dia seguinte ao roubo com emprego de arma de fogo, o agente portar num bar
a mesma arma, haverá roubo qualificado pelo emprego de arma de fogo em concurso material com o crime
de porte ilegal de arma de fogo.

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h) o porte de arma de fogo por vigia, mas fora do horário de trabalho, é crime (Informativo STJ
581/2016). Trata-se da situação em que o porte é atribuído à pessoa jurídica de segurança e de transporte de
valores. Conforme já visto, o porte de arma de fogo também pode ser concedido em nome da pessoa jurídica,
que exerça as atividades de segurança privada e de transporte de valores. A empresa de segurança e de
transporte de valores deverá apresentar documentação comprobatória do preenchimento dos requisitos
constantes do art. 4o desta Lei quanto aos empregados que portarão arma de fogo. As armas de fogo utilizadas
pelos empregados das empresas de segurança privada e de transporte de valores, serão de propriedade,
responsabilidade e guarda das respectivas empresas, somente podendo ser utilizadas quando em serviço. A
listagem dos empregados das empresas deverá ser atualizada semestralmente junto ao Sinarm.
i) a posse simultânea de duas ou mais armas de fogo, ainda haja, entre elas, armas de uso restrito e
proibido, é crime único, pois o bem jurídico é lesado uma única vez. A pluralidade de armas, porém, exercerá
influência na fixação da pena base (art. 59 do CP).

Porte ilegal de arma de fogo e legítima defesa

O agente que, para repelir uma agressão injusta, atual ou iminente, utiliza, como meio necessário e
moderado, uma arma de fogo, será absolvido do fato praticado, por força da legítima defesa, mesmo que não
tenha porte de arma.
Entretanto, ainda lhe remanescerá a imputação do delito de porte ilegal de arma de fogo, mesmo
estando presentes os requisitos da legítima defesa, na hipótese de se comprovar o porte pretérito,
desvinculado da situação fática posterior, pois, nesse caso, o delito já havia se consumado anteriormente.
Se, contudo, o agente se armar no exato instante em que ocorre a agressão injusta, atual ou iminente,
será também absolvido do delito de porte ilegal de arma de fogo, com base na legítima defesa.
Quanto ao temor de uma agressão futura ou de assaltos, não autoriza a pessoa a andar armada, de
modo que não há falar-se em legítima defesa em relação ao delito de porte ilegal de arma de fogo.

CRIMES HEDIONDOS

Os crimes de arma de fogo hediondos são os seguintes:


I - o crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso proibido, previsto no §2º do art. 16. Note-se
que o crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito não é mais considerado hediondo. Até
então não havia grande diferença entre a arma de uso restrito e a arma de uso proibido, mas com o advento
da lei 13.964/2019, que passou a considerar hediondo apenas os crimes de posse ou porte de arma de uso
proibido, a distinção ganhou relevância. Dessa forma, , só é hediondo o delito do §2º do art. 16 do Estatuto
do Desarmamento, que dispõe: “Se as condutas descritas no caput e no §1º deste artigo envolverem arma de
fogo de uso proibido, a pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos.” Trata-se de “novatio legis in
mellius”, pois, antes da lei 13.964/2019, também era considerado hediondo as mesmas condutas criminosas,
referentes tanto às armas de fogo de uso restrito quanto às de uso proibido, impondo-se a retroatividade da
nova lei para excluir o caráter hediondo quando se tratar de arma de fogo de uso restrito. Assim, as figuras
criminosas equiparadas, previstas no §1º do art. 16 do Estatuto do Desarmamento, também são crimes
hediondos, desde que envolva arma de fogo de uso proibido. Quanto às munições e acessórios de uso
proibido, o fato é atípico, conforme será analisado mais adiante.
II - o crime de comércio ilegal de armas de fogo, previsto no art. 17. Este delito é hediondo quer se trate
de arma de fogo de uso permito, de uso restrito ou de uso proibido. A hediondez também abrange o comércio
ilegal de acessórios e munições, pois o art. 17 também os incluem como objeto material. A figura equiparada
do §2º do art. 17 também é crime hediondo, pois a Lei 8072/90, ao referir-se à hediondez, faz menção ao art.
17 e não apenas ao caput do art. 17.
III - o crime de tráfico internacional de arma de fogo, acessório ou munição, previsto no art. 18. Este
delito é hediondo, quer a arma de fogo, acessório ou munição seja de uso permitido, restrito ou proibido. A
figura equiparada do parágrafo único do art. 18 também é crime hediondo, pois a Lei 8072/90, ao referir-se à
hediondez, faz menção ao art. 18 e não apenas ao caput do art. 18.

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Liberdade provisória e fiança

Os crimes de arma de fogo estão reunidos nos arts. 12 a 18 da lei 10.826/2.003.


Todos eles admitem a liberdade provisória, até mesmo os crimes hediondos.
No tocante à liberdade provisória, qualquer lei que a proíba será inconstitucional, por usurpação de
função típica do Poder Judiciário, que é o órgão competente para analisar essa questão, nos termos do art. 5º,
LIV, da CF.
Os aludidos delitos também admitem a fiança, salvo os crimes de arma de fogo considerados hediondos.
De fato, os únicos crimes inafiançáveis são os hediondos, tráfico de drogas, terrorismo e tortura, por
força de expressa previsão constitucional (art. 5º, XLIII, da CF).
A propósito, o STF já declarou a inconstitucionalidade do preceito secundário dos arts. 14 e 15, no tópico
que proíbe a fiança, bem como o art. 21, que veda a liberdade provisória nos crimes dos arts. 16 a 18.
Sobre o assunto convém ainda destacar que o §2º do art. 310 do CPP, introduzido pela lei 13.964/2019,
dispõe que:
“Se o juiz verificar que o agente é reincidente ou que integra organização criminosa armada ou milícia,
ou que porta arma de fogo de uso restrito, deverá denegar a liberdade provisória, com ou sem medidas
cautelares”.
Vê-se assim que é vedada a liberdade provisória nas seguintes hipóteses:
a) ao reincidente;
b) ao criminoso que integra organização criminosa armada;
c) no crime de porte de arma de fogo de uso restrito. Note-se que a lei não proíbe a liberdade provisória
no crime de arma de fogo de uso proibido, que é mais grave.
Todas as hipóteses acima, porém, são manifestamente inconstitucionais, em face da violação dos
princípios da presunção de inocência e jurisdicionalidade.

Ação penal

Os delitos de arma de fogo, sem exceção, são de ação pública incondicionada.

CONFISCO DA ARMA DE FOGO

Confisco é a decretação da perda da arma de fogo.


O juiz deve encaminhar a arma de fogo confiscada ao Comandante do Exército que, por sua vez, pode
tomar duas atitudes:
a) ordenar a sua destruição,
b) autorizar a sua doação aos órgãos da Segurança Pública ou às Forças Armadas.
Em caso de doação, o Comando do Exército encaminhará a relação das armas a serem doadas ao juiz
competente, que determinará o seu perdimento em favor da instituição beneficiada (§2o do art. 25).
A propósito, dispõe o art. 25:
“As armas de fogo apreendidas, após a elaboração do laudo pericial e sua juntada aos autos, quando
não mais interessarem à persecução penal serão encaminhadas pelo juiz competente ao Comando do Exército,
no prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas, para destruição ou doação aos órgãos de segurança pública
ou às Forças Armadas, na forma do regulamento desta Lei.
O art. 25 prevê o confisco das armas de fogo utilizadas para prática de qualquer outro delito. Exemplos:
homicídio, roubo, lesão corporal, tráfico de drogas, etc.
Note-se que se trata de um confisco “sui generis”, posto que decretado antes mesmo da sentença
condenatória.
De fato, o aludido confisco deve ser ordenado após a juntada do laudo pericial aos autos, quando a
arma de fogo não mais interessar à persecução penal
Claro que se a arma de fogo pertencer a terceiro de boa-fé, ela lhe será devolvida pois, nesse caso, não

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haverá confisco.
As armas de fogo apreendidas, em razão do tráfico de drogas serão também confiscadas após perícia
ou vistoria que atestem seu bom estado, mas o Comando do Exército as destinará com prioridade para os
órgãos de segurança pública e do sistema penitenciário da unidade da federação responsável pela apreensão
(§1º-A do art. 25).
No período que antecede o confisco, o Poder Judiciário encaminhará ao Sinarm ou ao Sigma, conforme
se trate de arma de uso permitido ou de uso restrito, semestralmente, a relação de armas acauteladas em
juízo, mencionando suas características e o local onde se encontram (§5o do art. 25).
O confisco das armas de fogo se verifica ainda que o agente, condenado pelo crime, tenha porte de
arma.
Neste caso, porém, malgrado o silêncio da lei, o confisco só poderá ser concretizado após o trânsito em
julgado da condenação, devolvendo-lhe a arma em caso de absolvição.
Convém esclarecer que o art. 91, II, a, do CP só permite o confisco dos instrumentos do crime, cujo
fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito, mas, por se tratar de uma norma geral, não é
aplicável às armas de fogo, que são regidas por normas especiais.
Vê-se assim que a perda da arma de fogo difere do confisco comum, previsto no Código Penal, nos
seguintes aspectos:
a) a perda é determinada após a juntada do laudo pericial e não como efeito de uma condenação
criminal definitiva.
b) a perda se verifica ainda que se trate de um instrumento lícito.
c) a perda não é em favor da União, mas, sim, para que a arma seja destruída pelo Comando do Exército
ou doada por ele aos órgãos de segurança pública ou às Forças Armadas.
Por fim, de acordo com o STJ, na condenação pelo crime de disparo de arma de fogo haverá também o
confisco. Aliás, ainda que se aplique o art. 91, II, a, do CP, impõe-se o confisco, pois o uso da arma se revelou
ilícito.

CAUSAS DE AUMENTO DE PENA

As causas de aumento de pena estão previstas nos arts. 19 e 20.


Dispõe o art. 19.
“Nos crimes previstos nos arts. 17 e 18, a pena é aumentada da metade se a arma de fogo, acessório ou
munição forem de uso proibido ou restrito”.
Trata-se uma causa de aumento de pena em quantidade fixa, aplicável apenas aos delitos de comércio
ilegal e tráfico internacional de armas de fogo, acessórios e munições, previstos respectivamente nos arts. 17
e 18.
O aumento da pena se verifica quando a arma de fogo, acessório ou munição forem de uso restrito ou
proibido.
Por outro lado, reza o art. 20:
“Nos crimes previstos nos arts. 14, 15, 16, 17 e 18, a pena é aumentada da metade se:
I - forem praticados por integrante dos órgãos e empresas referidas nos arts. 6º, 7º e 8º desta Lei; ou
II - o agente for reincidente específico em crimes dessa natureza.”
Trata-se também de uma causa de aumento de pena em quantidade fixa, que majora a pena na metade,
aplicável aos seguintes delitos:
a) porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (art. 14).
b) disparo de arma de fogo (art. 15).
c) posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito (art. 16, caput).
d) posse ou porte de arma de fogo de uso proibido (art. 16, §2º).
e) figuras típicas equiparadas (§1º do art. 16).
f) comércio ilegal de arma de fogo (art. 17).
g) tráfico internacional de armas de fogo (art. 17).
Noutras palavras, a majorante do art. 20 só não incide em dois crimes:

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a) Posse irregular de arma de fogo de uso permitido (art. 12);


b) Omissão de cautela (art. 13).
A primeira causa de aumento do art. 20 se verifica quando o sujeito ativo for integrante:
a) das Forças Armadas (Marinha, Exército ou Aeronáutica).
b) da Polícia. Abrange tanto a polícia civil quanto a militar.
c) dos outros órgãos mencionados no art. 6º. Trata-se das pessoas que, por força de lei, tem direito ao
porte de arma de fogo.
d) integrante de empresa privada da segurança.
e) integrante de empresa de transporte de valores.
f) integrante de entidades desportivas.
A segunda majorante do art. 20, reincidência específica em crimes dessa natureza, foi introduzida pela
lei 13.964/19. Trata-se da reincidência específica em quaisquer dos delitos previstos nos arts. 14, 15, 16, 17 e
18.

CRIMES EM ESPÉCIE

O Estatuto do desarmamento prevê os seguintes crimes:


a) Posse irregular de arma de fogo de uso permitido (art. 12);
b) Omissão de cautela (art. 13);
c) Porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (art. 14);
e) Disparo de arma de fogo (art. 15);
f) Posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, de uso proibido e figuras típicas equiparadas
(art. 16);
g) Comércio ilegal de arma de fogo (art. 17);
h) Tráfico internacional de arma de fogo (art. 18).

POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO

Dispõe o art. 12:


“Possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, em
desacordo com determinação legal ou regulamentar, no interior de sua residência ou dependência desta, ou,
ainda no seu local de trabalho, desde que seja o titular ou o responsável legal do estabelecimento ou empresa:
Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa”.
O sujeito ativo é apenas a pessoa que reside no local, e, quando o fato ocorre no local de trabalho, o
delito só poderá ser cometido pelo titular do estabelecimento ou responsável legal pela empresa.
Quanto à pessoa que não reside no local, o delito será de porte ilegal de arma de fogo, previsto no art.
14.
Igualmente, responde pelo crime de porte ilegal de arma de fogo, o empregado que possui a arma no
local de trabalho.
No delito em análise, incrimina-se a posse irregular, que é o fato de o agente possuir ou manter a arma
de fogo, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no interior de sua residência ou
dependência desta ou ainda no local de trabalho do qual é o titular do estabelecimento ou responsável pela
empresa.
Cumpre salientar que o delito sofre uma delimitação espacial, pois só pode ser cometido em dois locais:
residência e local de trabalho.
Fora destes dois lugares, caracteriza-se o crime de porte ilegal de arma de fogo, quer a arma esteja ou
não registrada.
Quanto à residência, para que haja o crime em análise, deve ser a do sujeito ativo do delito, abrangendo
também as suas dependências, como o quintal e a garagem.
A pessoa que traz consigo a arma em residência alheia, conforme já dito, responde pelo delito de porte
ilegal de arma de fogo.

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No que tange à pousada eventual, por exemplo, uma casa de veraneio, ainda que pertencente ao sujeito
ativo, que muito pouco a frequenta, a rigor, não se trata de sua residência, e, por isso, em princípio, o
enquadramento será no delito de porte ilegal de arma de fogo.
A residência é, pois, o local onde se fixa a moradia com uma certa estabilidade. Não se exige que se
trate do domicílio, que é a residência com ânimo definitivo, mas é imprescindível uma estabilidade que seja
pelo menos relativa. Há, por exemplo, residência quando se fixa a moradia numa cidade para se realizar um
curso de apenas dois meses.
Nada obsta que se tenha mais de uma residência.
No concernente ao local de trabalho, é preciso também que o sujeito ativo, nos termos do contrato
social, seja o titular do estabelecimento ou o responsável legal pela empresa, caso contrário o enquadramento
será no delito de porte ilegal de arma de fogo (art. 4º, §1º, III e IV, do Decreto 9845/19).
O objeto material é a arma de fogo acessório e munição, de uso permitido. Se for de uso restrito, haverá
o delito do art. 16, “caput” e, em se tratando de arma de fogo de uso proibido, o delito do §2º do art. 16.
Quanto à arma de fogo com sinal de identificação raspado, suprimido e adulterado, a posse ou porte
será crime do art. 16, §1º, IV, seja ela de uso permitido, restrito ou proibido.
As condutas criminosas consistem em possuir e manter sob guarda.
Possuir é o poder de usar, gozar, dispor ou reivindicar a coisa. Abrange qualquer ato exterior que revela
o comportamento de dono.
A posse não exige o contato físico com a arma de fogo nem a possibilidade de seu uso imediato.
Responde, por exemplo, pelo delito, o agente que, no momento da apreensão da arma de fogo, em sua
residência, não se encontrava no local.
No direito penal, a posse é empregada em sentido amplo, para abranger também a detenção, que é o
contato físico com a coisa mediante subordinação, permissão ou tolerância.
Manter sob guarda, por sua vez, é armazenar, zelar, tomar conta do objeto material, em benefício de
terceiro.
Assim, o sujeito que guarda a arma de fogo alheia em sua residência, responde pelo delito em análise,
na modalidade “manter sob guarda”.
A rigor, era desnecessária a alusão à conduta de manter sob guarda, pois ela também se enquadra no
verbo possuir, que é bem abrangente.
O tipo penal não contempla, por exemplo, a conduta de ter em depósito, que significa armazenar, zelar,
tomar conta do objeto material, em benefício próprio, mas este fato também se enquadra no verbo possuir.
O elemento normativo do tipo consiste no fato de o agente possuir ou manter sob guarda o objeto
material, em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
Para possuir licitamente a arma de fogo na residência ou local de trabalho onde é o titular do
estabelecimento ou responsável legal pela empresa, exige-se três requisitos cumulativos:
a) que o agente seja o proprietário da arma de fogo;
b) que haja o certificado de Registro de Arma de Fogo, expedido pela polícia federal;
c) que a posse não seja exercida de forma visível (art. 20 do Decreto 9847/2019).
A aquisição de munição, por sua vez, somente poderá ser feita no calibre correspondente à arma
registrada e na quantidade estabelecida no regulamento desta Lei (§2o do art. 4º).
O agente, que tem o objeto material no interior de sua residência ou no local de trabalho do qual é o
titular do estabelecimento ou responsável legal pela empresa,
responderá pelo delito de posse de arma de fogo, em estudo, nos seguintes exemplos:
a) possuir uma arma com registro, mas da qual não é o proprietário.
b) possuir uma arma sem registro, quer seja ou não o seu proprietário.
c) exercer a posse de forma ostensiva, portando-a, por exemplo, na cintura, sem que houvesse
necessidade.
d) possuir munição que não corresponde ao calibre da arma registrada.
e) possuir munição no caibre da arma registrada, mas em quantidade superior à prevista nas normas
que regulam o assunto.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade de realizar a conduta de possuir ou

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manter sob guarda a arma de fogo, acessório ou munição, consciente que se encontra em desacordo com
determinação legal ou regulamentar.
Se, por erro, ainda que inescusável, o agente supõe que a arma de fogo estava registrada, o fato será
atípico, pois o delito não é punido na forma culposa.
Não se exige, para a tipicidade, o propósito de uso ou qualquer outro fim especial.
No tocante à consumação, ocorre quando se adentra, com a arma de fogo, acessório ou munição, à
residência ou local de trabalho em que é o titular do estabelecimento ou responsável legal pela empresa.
Trata-se de crime permanente, que autoriza a prisão em flagrante a qualquer momento, enquanto não
cessada a conduta.
O delito é de mera conduta.
Quanto à tentativa, a doutrina, de um modo geral, a considera inadmissível. Fernando Capez ensina
que: “Ou o agente mantém consigo ou não mantém. Ou possui ou não possui. Na hipótese do agente
surpreendido enquanto tenta adquirir ilegalmente a arma de fogo, o crime será o do art. 14, na forma tentada,
e não o delito em comento”.
A meu ver, a tentativa é possível, quando houver o dolo de possuir a arma de fogo apenas em sua
residência ou no local de trabalho do qual é o titular do estabelecimento ou responsável legal pela empresa.
Assim, no exemplo acima, citado por Capez, data venia, a hipótese é de tentativa do delito de posse de arma
de fogo, pois, diante da ausência do dolo de ter a arma fora de sua residência, não há falar-se no delito de
porte ilegal de arma de fogo.
Ademais, caso tivesse recebido a encomenda, o enquadramento seria no delito de posse de arma de
fogo, por consequência, é ilógico enquadrá-lo no delito mais grave, quando a entrega não se perfaz, pois,
nesse caso, o fato se revela menos grave.

Omissão de cautela

Dispõe o art. 13, “caput”:


“Deixar de observar as cautelas necessárias para impedir que menor de dezoito anos ou pessoa
portadora de deficiência mental se apodere de arma de fogo que esteja sob sua posse ou que seja de sua
propriedade:
Pena - detenção, de um a dois anos, e multa”.
O delito em análise, juntamente com o previsto no art. 12, posse de arma de fogo de uso permitido, são
os dois únicos apenados com detenção, previstos no Estatuto do Desarmamento.
É o único crime culposo previsto na lei em estudo.
É um delito de menor potencial ofensivo, pois a pena não excede a 2 (dois) anos, sujeitando-se assim
ao procedimento da Lei 9.099/95.
O sujeito ativo é apenas o proprietário ou possuidor da arma.
Trata-se, portanto, de crime próprio.
Não há crime quando a omissão culposa promana de quem não é proprietário nem possuidor da arma.
O bem jurídico protegido é o perigo à integridade física individual e à incolumidade pública.
O sujeito passivo, além da coletividade, é o menor de 18 (dezoito) anos e a pessoa portadora de
deficiência mental. Não abrange o deficiente físico.
Se, por culpa do agente, um maior inexperiente se apossar da arma de fogo, não há falar-se em crime,
mas o agente será incurso na contravenção penal do art. 19, §2º, “c”, da LCP.
O objeto material é somente a arma de fogo. Não abrange o acessório ou munição.
A omissão de cautela para que o menor ou deficiente mental se apodere de arma branca ou munição
é contravenção penal, prevista no art. 19, §2º, “c”, da LCP, mas, quando se tratar de acessórios da arma de
fogo, o fato será atípico, por ausência de previsão legal.
Também comete a aludida contravenção quem omite cautela para que pessoa maior de 18 (dezoito)
anos, que seja inexperiente em manejamento, se apodere de arma de fogo, arma branca ou munição.
Trata-se de crime omissivo próprio, pois a conduta negativa, que consiste em “deixar de tornar as
cautelas necessárias para impedir o apossamento da arma”, é descrita diretamente no tipo penal.

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É ainda um crime culposo, porque “deixar de tomar as cautelas necessárias” significa omissão de
precaução, ou seja, a negligência, que é uma das formas de culpa.
Não há crime, por exemplo, por ausência de culpa, quando o sujeito guarda a arma de fogo
descarregada, em móvel da casa, colocando a munição em local seguro.
O delito em análise é apontado pela doutrina como sendo o único crime omissivo próprio culposo.
Quanto à culpa por ação, que é a imprudência. não é mencionada pelo tipo penal, mas aquele que
realiza uma ação perigosa e não elimina o perigo decorrente de sua conduta será sucessivamente imprudente
e negligente, incidindo também no delito. Exemplo: o agente coloca a arma de fogo em cima da mesa
(imprudência) e se esquece de retirá-la dali (negligência).
Em havendo dolo do agente, que intencionalmente permite o apoderamento da arma de fogo pelo
menor ou deficiente mental, o delito será o de posse ou porte ilegal de arma de fogo, conforme o fato ocorra
dentro ou fora da residência, previstos nos arts. 12, 14 e 16.
Sobre a consumação, ocorre quando o menor ou deficiente mental efetivamente se apodera da arma
de fogo. Não basta a conduta.
Trata-se de crime material, pois só se consuma com a ocorrência do resultado.
Quanto à tentativa, não é possível, porquanto o crime, além de culposo, é ainda omissivo próprio. Se,
por exemplo, o sujeito esquece a arma de fogo sobre a mesa da sala, sem que haja o seu apoderamento pelo
menor ou deficiente mental, não há falar-se em crime.
Haverá concurso material com o crime de posse de arma de fogo, caso a arma não tenha registro e o
fato ocorra na residência ou no local de trabalho do qual o omitente seja titular ou responsável legal pelo
estabelecimento ou empresa. Outrossim, concurso material com o crime de porte ilegal de arma de fogo,
quando o fato ocorrer fora desses dois locais, ainda que haja o registo da arma de fogo.

FIGURA EQUIPARADA À OMISSÃO DE CAUTELA

Dispõe o parágrafo único do art. 13:


“Nas mesmas penas incorrem o proprietário ou diretor responsável de empresa de segurança e
transporte de valores que deixarem de registrar ocorrência policial e de comunicar à Polícia Federal perda,
furto, roubo ou outras formas de extravio de arma de fogo, acessório ou munição que estejam sob sua guarda,
nas primeiras vinte quatro horas depois de ocorrido o fato”.
Conquanto a pena seja a mesma do “caput”, os dois delitos são autônomos e independentes.
O “caput” do art. 13 é um delito culposo, ao passo que o parágrafo único prevê um crime doloso.
No “caput”, o objeto material é apenas a arma de fogo. No parágrafo único é a arma de fogo, acessório
ou munição.
O sujeito ativo é o proprietário ou gerente de empresa de segurança ou de transporte de valores.
Trata-se de crime próprio. Outros funcionários que tenham se omitido não respondem por delito
nenhum.
É ainda necessário, para responder pelo crime, que, além de ser proprietário ou gerente das empresas
acima, a arma de fogo, acessório e munição, esteja sob a guarda do agente, caso contrário, não há falar-se em
delito.
O referido delito só se caracteriza quando o porte da arma de fogo houver sido concedido às pessoas
jurídicas acima.
Conforme já visto, o porte de arma de fogo pode ser concedido em nome da pessoa jurídica, que exerça
as atividades de segurança privada e de transporte de valores, que deverá apresentar documentação
comprobatória do preenchimento dos requisitos constantes do art. 4o desta Lei quanto aos empregados que
portarão arma de fogo.
As armas de fogo utilizadas pelos empregados das empresas de segurança privada e de transporte de
valores, serão de propriedade, responsabilidade e guarda das respectivas empresas, somente podendo ser
utilizadas quando em serviço.
O crime consiste em deixar de registrar a ocorrência policial e de comunicar a polícia federal a perda,
furto, roubo ou outras formas de extravio da arma de fogo, acessório ou munição.

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Exige-se, pois, para que o crime se caracterize, que haja cumulativamente uma dupla omissão:
a) não registrar a ocorrência policial. Este registro é o boletim de ocorrência, que pode ser feito perante
a polícia civil ou militar;
b) não comunicar à Polícia Federal. Esta comunicação pode ser feita por escrito ou verbalmente.
Se o agente toma uma dessas providências não há crime.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo. É, pois, necessário o propósito de omitir-se. Mero retardamento,
isto é, atraso em tomar essas providências, não é crime.
O delito não é punido na forma culposa.
Consuma-se quando expira o período de 24 (vinte e quatro) horas, sem que o fato tenha sido
comunicado. O prazo é contado de minuto a minuto.
O prazo de 24 (vinte e quatro) horas, segundo o texto legal, é contado depois de ocorrido o fato, mas é
pacífico que só se inicia após a ciência do furto, roubo, perda ou extravio. Entendimento diverso seria a
consagração da responsabilidade penal objetiva.
É possível fluir o prazo acima sem que ocorra o delito, desde que o agente comprove que tinha a
intenção de registrar a ocorrência ou comunicar o fato à polícia federal.
Trata-se de crime a prazo, posto que a consumação depende de um certo lapso de tempo.
Quanto à tentativa, não é possível, pois o crime é omissivo próprio.

PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO

Dispõe o art. 14, “caput”:


“Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que
gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou
munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena - reclusão, de dois a quatro anos, e multa”.
O delito em análise recebeu o “nomen juris” de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, mas,
além do porte, há ainda outras 12 (doze) condutas, de modo que a denominação não reflete toda a extensão
do tipo penal.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Ainda que o agente tenha o registro da arma, o delito se
caracteriza.
O objeto material é a arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido. Se for de uso restrito,
haverá o crime de porte de arma de fogo do art. 16, “caput”.
Quanto ao porte de arma de fogo de uso proibido, é crime do § 2º do art. 16, mas o porte de munição
ou acessório de uso proibido não é crime, pois a lei é omissa, sendo vedada a analogia “in malam partem”.
Quanto à arma de fogo de uso permitido, restrito ou proibido, com sinal de identificação raspado,
suprimido e adulterado, o porte ensejará o crime do art. 16, §1º, IV.
O porte ilegal de arma branca, por exemplo, facão, é mera contravenção penal (art. 19 da LCP).
Além do verbo portar, o art. 14 faz menção a outros 12 (doze).
Haverá a absorção do delito de receptação, previsto no art. 180, caput, do CP, quando o agente adquirir,
receber, ocultar ou transportar arma de fogo, acessório ou munição que seja produto de crime.
Outra corrente, porém, sustenta o concurso material, pois os delitos apresentarem bens jurídicos
diversos e vítimas distintas, sendo, por isso, inaplicável o princípio da consunção.
Quanto ao crime de ameaça, previsto no art. 147 do CP, quando praticado com emprego de arma de
fogo, será também absorvido pelo delito do art. 14, que é mais grave.
A ocultação de arma de fogo, para prestar auxílio ao criminoso, que a utilizou para delinquir, é crime do
art. 14, em estudo, absorvendo-se o delito de favorecimento pessoal, previsto no art. 348 do CP, que é menos
grave.
O art. 14 é crime de ação múltipla ou de conteúdo variado, porquanto o tipo penal prevê várias
condutas, sendo que a reiteração sucessiva dessas condutas configura um único crime, por força do princípio
da alternatividade.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar as condutas

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descritas no tipo penal.


Trata-se de crime de mera conduta, pois se consuma com uma das ações previstas no tipo penal,
independentemente da demonstração de qualquer resultado danoso ou perigoso.
A tentativa é possível. Exemplo: o agente é impedido, por terceiro, de portar a arma de fogo fora da sua
residência.
É cabível a fiança, pois o parágrafo único do art. 14, que negava este benefício, foi declarado
inconstitucional pelo STF (ADIN 3.112-1).
Por outro lado, os verbos adquirir, receber, ter em depósito, transportar ou ocultar constam também
no delito do art. 17 (comércio ilegal de arma de fogo).
A distinção entre os delitos dos arts. 14 e 17 recai sobre o sujeito ativo.
Com efeito, o delito do art. 17 é praticado pelo industrial, comerciante ou prestador de serviços, no
exercício de sua atividade empresarial.
Fora dessas atividades, haverá o delito do art. 14.
Assim, o agente que não exerce atividade comercial, industrial ou de prestação de serviços não
responde pelo delito do art. 17, mas pode incidir no crime do art. 14, quando se tratar dos verbos adquirir,
receber, ter em depósito, transportar ou ocultar
O art. 14, entretanto, não contempla o verbo vender, que é previsto no delito do art. 17.
Quanto à venda de arma de fogo, acessório e munição, a pessoa maior de 18 (dezoito) anos, por quem
não exerce atividade comercial, industrial ou de prestação de serviços, há duas correntes.
Primeira, é crime do art. 14 que incrimina a cessão onerosa ou gratuita, sendo que a venda se enquadra
como sendo uma cessão onerosa.
Segunda, é contravenção penal do art. 18 da LCP, quando se tratar de arma de fogo ou munição, mas o
fato será atípico em relação ao acessório.
De fato, a cessão é a transferência dos direitos sobre uma determinada arma de fogo. O seu objeto não
é propriamente a arma, mas os direitos sobre ela. Difere da venda, cujo objeto é a própria arma de fogo. Em
razão disso, a segunda corrente é mais técnica
Se, porém, após a venda, sobrevier a tradição da arma de fogo, o agente será enquadrado no verbo
fornecer. Se antes da venda, o agente já estava em contato físico com a arma de fogo, será também
enquadrado no art. 14, no verbo deter.

DISPARO DE ARMA DE FOGO

Dispõe o art. 15:


“Disparar arma de fogo ou acionar munição em lugar habitado ou em suas adjacências, em via pública
ou em direção a ela, desde que essa conduta não tenha como finalidade a prática de outro crime:
Pena - reclusão, de dois a quatro anos, e multa”.
Inicialmente, cumpre salientar que é cabível a fiança, pois o parágrafo único do art. 15, que negava este
benefício, foi declarado inconstitucional pelo STF (ADIN 3.112-1).
A contravenção de disparo de arma de fogo, prevista no “caput” do art. 28 da LCP, que também era de
perigo presumido, foi revogada pelo delito em análise.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, pois o delito é comum.
O bem jurídico protegido é a incolumidade pública.
A realização de vários disparos, em um mesmo contexto, caracteriza crime único, pois o bem jurídico é
o mesmo, mas o fato será levado em conta pelo juiz na fixação da pena base, nos termos do art. 59 do CP.
O sujeito passivo é a coletividade. Trata-se de crime vago.
Se, porém, houver perigo concreto a alguma pessoa, ela também figurará como vítima, mas, nesse caso,
o delito de perigo de vida, previsto no art. 132 do CP, por revestir-se de menor gravidade, será absorvido, em
razão do princípio da subsidiariedade expressa, constante do próprio art. 132.
São duas as condutas criminosas:
a) disparar arma de fogo;
b) acionar munição,

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O projétil deve ser verdadeiro, caso seja de festim, não há falar-se em crime, pois o festim, para efeitos
desta Lei, não se classifica como sendo munição.
Quanto à deflagração de explosivos, como bombas e dinamites, é crime do art. 16, §1º, III.
A deflagração perigosa de fogos de artifício é contravenção do parágrafo único do art. 28 da LCP.
É, preciso, para que haja o crime em análise, que a conduta seja praticada nas seguintes situações:
a) em lugar habitado ou em suas adjacências. Lugar habitado é aquele onde as pessoas residem em seu
entorno. Exemplos: cidade, fazenda povoada, distrito, aldeia indígena. Adjacência de local habitado é o que
se localiza nas proximidades.
b) em via pública. Exemplos: rua, praça, avenida, rodovia.
c) na direção de via pública. Nesse caso, pouco importa o local de onde emanou o disparo.
Tratando-se de residência ou suas adjacências, é ainda necessário, segundo a jurisprudência, que o fato
ocorra fora dela ou em direção à via pública. Assim, efetuado o disparo de uma residência, não há falar-se no
delito em análise, salvo quando feito na direção de via pública.
O disparo de arma de fogo feito de uma via pública, é crime, ainda que para o alto, pois se trata de crime
de perigo presumido. Não há, pois, necessidade que seja na direção de uma via pública.
Em relação ao disparo emanado de uma residência ou dependência desta, ou de local não habitado só
é crime quando feito na direção de uma via pública, presumindo-se também o perigo. Exemplo: o agente,
de sua residência ou de um lugar ermo, dispara na direção de uma avenida, ainda que deserta.
Em suma, o disparo realizado de via pública, é crime do art. 15, mesmo sendo para o alto. Se, no entanto,
for feito, para o alto, de uma residência ou local não habitado, o fato será atípico.
Dessa forma, não há o delito do art. 15, quando se dispara da própria residência na direção do muro da
respectiva casa, pois o disparo não emanou de via pública nem se direcionou à via pública.
Neste exemplo, não há falar-se no delito do art. 15, em análise, mas o agente poderá responder pelo
delito de posse de arma de fogo. Se, porém, havia o registro da arma de fogo, o fato será atípico, salvo se
houve perigo concreto para alguma pessoa, hipótese em que o agente será incurso no delito de perigo à vida
ou saúde de outrem, previsto no art. 132 do CP.
A propósito, o delito do art. 132 do CP é de perigo concreto, figurando como sujeito passivo pessoa ou
pessoas determinadas, enquanto que o delito do art. 15, em análise, é de perigo presumido, tendo por sujeito
passivo a coletividade.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar o disparo de arma
de fogo nas circunstâncias descritas no tipo penal.
Quanto ao disparo culposo ou acidental, é fato atípico.
A consumação se verifica com o disparo da arma de fogo, independentemente da demonstração de
qualquer perigo, pois se trata de crime de perigo presumido.
Não há, pois, necessidade de se comprovar o perigo concreto de lesão ao bem jurídico.
Admite-se a tentativa. Exemplo: uma pessoa intervém e impede que o agente efetue o disparo.
O crime de disparo de arma de fogo é absorvido quando tiver por finalidade a prática de outro crime,
conforme ressalva expressa constante no próprio art. 15.
Uma primeira corrente sustenta que, nesse caso, o disparo de arma de fogo será sempre absorvido,
ainda que o delito fim seja mais leve, pois a lei não faz qualquer distinção.
Nessa linha de raciocínio, de acordo com Guilherme de Souza Nucci, “se a intenção do agente era ferir,
ainda que levemente a vítima, o delito de dano prevalece sobre o de perigo, embora este tenha pena abstrata
mais grave que o outro. É a incoerência do sistema penal brasileiro.”
Com efeito, a ressalva do art. 15 não ordena a sua absorção apenas pelo delito mais grave. Não se trata,
portanto, de uma subsidiariedade expressa, princípio que, no conflito aparente de normas, ordena sempre a
prevalência do delito mais grave.
De fato, a absorção é imposta quando o disparo de arma de fogo tiver por finalidade a prática de outro
crime, seja este mais leve ou mais grave, pois onde a lei não distingue ao intérprete não é lícito distinguir.
Trata-se, portanto, de uma previsão expressa do princípio da consunção e não da subsidiariedade
expressa, como pensam alguns doutrinadores.
Cumpre lembrar que o falso, delito mais grave, também é absorvido pelo estelionato, delito menos

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grave, quando nele se exaure, conforme súmula 17 do STJ.


Outra corrente, ao revés, salienta que, nesta ressalva do art. 15, a lei disse mais do que quis e, por isso,
impõe-se a interpretação restritiva para se absorver o delito de disparo de arma de fogo apenas quando ele
funcionar como meio de execução de outro delito mais grave, pois a sua absorção por delito menos grave fere
a lógica e serve de estímulo à prática delituosa, contrariando os fins do ordenamento jurídico. Noutras
palavras, o delito do art. 15 se sujeita ao princípio da subsidiariedade expressa.
Nesta esteira hermenêutica, o disparo de arma de fogo será absorvido pelos crimes de homicídio,
infanticídio e lesão corporal grave.
Em contrapartida, impõe-se a absorção dos crimes de lesão corporal leve (art. 129, “caput” do CP) e de
perigo de vida (art. 132 do CP), respondendo o agente apenas pelo delito de disparo de arma de fogo, que é
mais grave.
No tocante à posse ou porte ilegal e o disparo de arma de fogo, haverá também a absorção de um delito
pelo outro, desde que o agente tenha se armado com a finalidade específica de efetuar o disparo.
Há aqui duas situações:
a) o crime de posse ou porte de arma de fogo de uso permitido será absorvido pelo delito de disparo de
arma de fogo, por força do princípio da consunção.
b) o crime de disparo de arma de fogo será absorvido pelo crime de posse ou porte de arma de fogo de
uso restrito ou proibido, que é apenado de forma mais grave.
Não se aplica, porém, o princípio da consunção, de acordo com o STJ, mas, sim, o concurso material,
quando os delitos acima forem praticados em contextos distintos. Exemplo: antes de decidir pelo disparo, o
agente já portava a arma de fogo num bar.

POSSE OU PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO

Dispõe o caput do art. 16:


“Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que
gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou
munição de uso restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar".
O delito do “caput” do art. 16, até antes da lei 13.964/2019, referia-se tanto à arma de fogo, acessório
e munição de uso restrito quanto à de uso proibido.
A partir desta lei, o delito de posse ou porte de arma de fogo de uso proibido, cujas condutas criminosas
são as mesmas do “caput” e do §1º, encontra-se no §2º do art. 16.
A razão da separação é que apenas o delito do §2º do art. 16 é considerado hediondo, conforme já
ressaltado anteriormente.
No mesmo tipo penal do “caput” do art. 16 é previsto tanto a posse quanto o porte, enquanto que, na
arma de fogo de uso permitido, a posse e o porte encontram-se em tipos penais separados (arts. 12 e 14).
Além da posse e do porte, incriminam-se outras 12 (doze) condutas. Trata-se do tipo penal alternativo
ou de conduta variável, apenado com reclusão.
O objeto material, dessa vez, é arma de fogo, acessório ou munição de uso restrito. Se for arma de fogo
de uso proibido, haverá a figura qualificada do §2º do art. 16, que não contempla as munições e acessórios de
uso proibido, sendo o fato atípico.
Quanto à arma de fogo com sinal de identificação raspado, suprimido e adulterado, tanto a posse
quanto o porte, seja arma de uso permitido, restrito ou proibido, o crime será o do art. 16, §1º, inciso IV.
Enfim, os comentários sobre este art.16, caput são exatamente os mesmos já feitos acerca dos delitos
dos arts. 12 e 14, aos quais, para evitar repetição, reporto o leitor.

FIGURAS EQUIPARADAS À POSSE OU PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO.

Dispõe o §1º do art. 16:


“Nas mesmas penas incorre quem:
I – suprimir ou alterar marca, numeração ou qualquer sinal de identificação de arma de fogo ou artefato;

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II – modificar as características de arma de fogo, de forma a torná-la equivalente a arma de fogo de uso
proibido ou restrito ou para fins de dificultar ou de qualquer modo induzir a erro autoridade policial, perito ou
juiz;
III – possuir, detiver, fabricar ou empregar artefato explosivo ou incendiário, sem autorização ou em
desacordo com determinação legal ou regulamentar;
IV – portar, possuir, adquirir, transportar ou fornecer arma de fogo com numeração, marca ou qualquer
outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado;
V – vender, entregar ou fornecer, ainda que gratuitamente, arma de fogo, acessório, munição ou
explosivo a criança ou adolescente; e
VI – produzir, recarregar ou reciclar, sem autorização legal, ou adulterar, de qualquer forma, munição
ou explosivo”.
O §1º do art. 16 prevê 6 (seis) crimes autônomos, cuja pena é a mesma do caput, reclusão de 3 (três) a
6 (seis) anos, e multa, ou do §2º do art. 16, quando se tratar de arma de fogo de uso proibido.
Ao contrário do “caput” do art. 16, que se refere à arma de fogo de uso restrito, o §1º não faz esta
limitação e, por consequência, também é aplicado às de uso permitido, pois onde a lei não distingue ao
intérprete não é lícito distinguir (Informativo STJ 364).
Quanto à arma de fogo de uso proibido, são incriminadas no §2º do art. 16 tanto as condutas descritas
no caput quanto as previstas no §1º.
Os delitos do §1º do art. 16, à exceção do inciso V, não fazem menção aos acessórios e munições da
arma de fogo, sendo vedada a analogia “in malam partem”. O inciso VI também faz referência às munições,
mas silencia sobre os acessórios.
Não se trata de qualificadoras nem de causas de aumento de pena.
As qualificadoras e causas de aumento de pena complementam, através de elementos especializantes,
as mesmas condutas descritas no caput, ao passo que os elementos dos tipos penais em análise gozam de
autonomia, não estando, pois, subordinados ao caput.
São, pois, 6 (seis) os crimes equiparados ao previsto no caput.
Passo à análise de cada um deles.

Suprimir ou alterar marca, numeração ou qualquer sinal de identificação (art. 16, §1º, I)

O delito consiste em suprimir ou alterar marca, numeração ou qualquer sinal de identificação de arma
de fogo ou artefato. Exemplo: raspagem do número ou sinal da arma.
O bem jurídico protegido é duplo: o SINARM (Sistema Nacional de Armas) e a incolumidade pública.
Trata-se de crime pluriofensivo.
A lei faz menção aos verbos suprimir ou alterar, sendo que a prática de ambos sobre a mesma arma de
fogo, caracteriza crime único, pois se trata de tipo misto alternativo ou de conteúdo variado, regido pelo
princípio da alternatividade.
Suprimir é fazer desaparecer a marca, numeração ou qualquer sinal de identificação. Exemplo: raspar,
tornar ilegível, riscar.
Alterar é a modificação da marca, numeração ou qualquer sinal de identificação. Exemplo: apaga a
marca e depois acrescenta outra no lugar.
O objeto material é a arma de fogo e o artefato.
A arma de fogo, conforme já dito, pode ser de uso permitido, restrito ou proibido, pois a lei não faz
qualquer distinção.
Artefato, por sua vez, é o objeto construído para determinado fim.
Entretanto, o tipo penal não esclarece a espécie de artefato e os decretos que regulamentam o assunto
também não fornecem uma definição. Dessa forma, força convir que, no tocante ao artefato, o tipo penal, por
ora, é inaplicável.
Quanto aos acessórios e munições, não são abrangidos pelo tipo penal, de modo que o fato será atípico.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar as condutas
descritas no tipo penal.

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A supressão ou modificação culposa não caracteriza o crime. Exemplo: a numeração é alterada, por
culpa, em função do produto químico utilizado para limpar a arma de fogo.
A consumação se verifica quando o agente ultima a conduta de alterar ou modificar.
Admite-se a tentativa quando o agente iniciar a execução da conduta, mas não consegue conclui-la por
circunstâncias alheias à sua vontade.
Os delitos de porte ou posse de arma de fogo são absorvidos, quando os fatos se verificam no mesmo
contexto, mas, quando praticados em contextos distintos, haverá concurso material de crimes.

Modificação das características da arma de fogo (art. 16, §1º, II)

O delito consiste na modificação das características da arma de fogo, de forma a torná-la equivalente a
uma arma de fogo de uso restrito ou proibido ou então para fins de dificultar ou de qualquer modo induzir a
erro a autoridade policial, perito ou juiz.
O objeto material é apenas a arma de fogo. Não abrange os acessórios e munições.
Há, no tipo em análise, dois delitos.
No primeiro, o agente modifica a arma de fogo de uso permitido para torná-la de uso restrito ou
proibido ou então modifica a de uso restrito para torná-la de uso proibido.
Há, pois, o aumento do potencial lesivo da arma de fogo. Se a modificação for feita com a intenção de
reduzir o potencial da arma, tornando-a, por exemplo, de uso permitido, o delito em análise não se
caracteriza.
A modificação que aumenta o potencial da arma de fogo, mas sem alterar a sua classificação, também
é fato atípico.
Trata-se de crime material. pois só se consuma quando a modificação atinge o resultado, que consiste
na efetiva transformação em arma de fogo de uso proibido ou restrito.
Admite-se a tentativa, quando o resultado não ocorre por circunstâncias alheias à vontade do agente.
No segundo delito, o agente modifica as características da arma de fogo com o fim induzir a erro a
autoridade policial, perito ou juiz ou para dificultar a sua análise por estas pessoas.
Trata-se, na verdade, de um tipo especial de fraude processual, que recai sobre arma de fogo.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, ainda que não seja parte nem tenha interesse na causa. Até
mesmo a vítima pode cometer o crime.
O bem jurídico protegido é o regular funcionamento da Administração Pública e a incolumidade pública.
Trata-se, pois, de delito pluriofensivo.
O sujeito passivo é o Estado, a coletividade e a pessoa prejudicada com a fraude.
O objeto material é apenas a arma de fogo. Não abrange os acessórios e munições.
A conduta criminosa consiste em modificar as características da arma de fogo, ainda que ela se
mantenha na mesma classificação ou tenha o seu potencial reduzido.

O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar a modificação
das características da arma de fogo.
É ainda necessário o fim especial de induzir a erro ou dificultar a análise da arma pela autoridade policial,
perito ou juiz.
A modificação das características da arma de fogo, mas sem a intenção de induzir a erro ou dificultar a
análise da arma pela autoridade policial, perito ou juiz, só será crime, previsto neste mesmo inciso II, primeira
parte, quando a arma de fogo for modificada para outra de uso restrito ou proibido.
Entende-se por juiz os membros da magistratura e os julgadores de processos administrativos.
A referência ao perito era desnecessária, pois quem visa burlar o perito também quer enganar o juiz.
Não é exigível, para a caracterização do crime, que o processo ou inquérito tenha se iniciado.
O delito não é punido na forma culposa.
O delito é formal, pois se consuma com a ultimação da modificação da arma de fogo, ainda que o
propósito de enganar ou dificultar a análise da arma não se concretize.
Admite-se a tentativa, quando o agente não conclui a modificação da arma de fogo por circunstâncias

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alheias à sua vontade.

Posse, detenção, fabricação ou emprego de artefato explosivo ou incendiário (art. 16, §1º, III)

O crime consiste na posse, detenção, fabricação ou emprego de artefato explosivo ou incendiário, sem
autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
O objeto material é o artefato explosivo ou incendiário. Exemplos: bomba explosiva, bomba incendiária,
granada.
Acerca do explosivo, trata-se do tipo de matéria que, quando iniciada, sofre decomposição muito
rápida, com grande liberação de calor e desenvolvimento súbito de pressão (Anexo III do Decreto
10.030/2019).
Artifício pirotécnico ou incendiário, por sua vez, é qualquer artigo, que contenha substâncias explosivas
ou uma mistura explosiva de substâncias, concebido para produzir um efeito calorífico, luminoso, sonoro,
gasoso ou fumígeno, ou uma combinação destes efeitos; devido a reações químicas exotérmicas
autossustentadas (Anexo III do Decreto 10.030/2019).
Há várias lacunas, pois não abrange o artefato de gás nem os acessórios do artefato explosivo ou
incendiário.
Quanto aos mísseis, também não são contemplados pelo tipo penal.
O tipo penal seria mais abrangente se se referisse a qualquer artefato destrutivo.
A propósito, no informativo 599, o STJ reconheceu a atipicidade da conduta de portar granadas de gás
lacrimogêneo e de gás de pimenta, pois não são consideradas artefatos explosivos, à medida que causam
apenas incômodo com o gás tóxico expelido.
O emprego de gás tóxico ou asfixiante, porém, desde que haja perigo concreto à incolumidade pública,
caracteriza o delito do art. 252 do CP.
Quanto aos fogos de artifício, é definido no anexo III do Decreto 10.030/2019 como sendo um artigo
pirotécnico destinado para ser utilizado em entretenimento. Não é, portanto, classificado como artefato
explosivo.
A queima de fogos de artifício ou soltura de rojões, é mera contravenção do art. 28, parágrafo único, da
LCP, desde que haja perigo, caso contrário, o fato será atípico.
A soltura de balões, por sua vez, é crime ambiental, previsto no art. 42 da Lei 9.605/98.
O tipo penal em análise não incrimina a posse de substância incendiária ou explosiva, quando ainda não
inseridas num artefato, mas, nesse caso, a simples posse de substância explosiva será crime do art. 253 do CP,
que não contempla, porém, as substâncias incendiárias, como o álcool e gasolina.
O tipo penal em análise incrimina as seguintes condutas:
a) a posse: é o poder de usar, gozar, dispor ou reivindicar o artefato explosivo ou incendiário.
b) a detenção: é o contato físico com o artefato explosivo ou incendiário, mediante subordinação,
permissão ou tolerância.
c) a fabricação: é a criação, em grande ou média escala, do artefato explosivo ou incendiário, através de
máquinas e equipamentos. Quanto à produção de explosivo, é crime do art. 16, §1º, VI, que não contempla,
porém, a produção de artefato incendiário. Produzir é criar manualmente a munição.
d) emprego: é o uso ou porte ostensivo do artefato explosivo ou incendiário. Em caso de uma efetiva
explosão ou incêndio, em havendo perigo concreto à incolumidade pública, o agente responderá pelo crime
de incêndio ou explosão, absorvendo-se o delito em análise.
Com efeito, o delito em estudo, que é de perigo presumido, não se confunde com os delitos de incêndio
e explosão, previstos, respectivamente, nos arts. 250 e 251 do CP, que exigem o perigo concreto a um número
indeterminado de pessoas ou de patrimônios.
Assim, caso haja perigo comum, o delito em análise será absorvido pelos crimes de incêndio ou
explosão, previstos respectivamente, nos arts. 250 e 251 do CP.
O elemento normativo do tipo reside na oração “sem autorização ou em desacordo com determinação
legal ou regulamentar”.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar as condutas

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descritas no tipo penal.


A consumação se verifica com a conduta, prescindindo-se da demonstração do perigo, pois este é
presumido.
Admite-se a tentativa.

Posse ou porte de arma de fogo com numeração, marca ou qualquer sinal de identificação raspado,
suprimido ou adulterado (art. 16, §1º, IV)

O delito consiste em portar, possuir, adquirir, transportar ou fornecer arma de fogo com numeração,
marca ou qualquer sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado.
Trata-se de um tipo especial de posse e porte de arma de fogo.
O objeto material é a arma de fogo de uso permitido, restrito ou proibido, com numeração, marca ou
qualquer sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado.
Quando se tratar de arma de fogo de uso proibido, nas condições acima, haverá a qualificadora do §2º
do art. 16.
O tipo penal não faz menção à munição e acessório com numeração, marca ou qualquer sinal de
identificação raspado, suprimido ou adulterado. Nesse caso, porém, haverá o delito de posse ou porte de
munição ou acessório, previsto nos arts. 12, 14 ou 16, caput, conforme se trate de uso permitido ou restrito;
mas se for de uso proibido, o fato será atípico, por falta de previsão legal.
Os núcleos do tipo são os verbos portar, possuir, adquirir, transportar ou fornecer.
No “caput” dos arts. 14 e 16 há ainda os seguintes verbos não contemplados no tipo em análise: deter,
receber, ter em depósito, ceder, emprestar, remeter, empregar, guardar e ocultar. Nestes verbos, porém, o
agente responderá pelo delito de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, restrito ou proibido, conforme
a hipótese, previstos respectivamente nos arts. 14, 16 caput e 16 § 2º.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar as condutas
descritas no tipo penal.
A consumação ocorre com uma das condutas descritas no tipo penal.
Trata-se de delito de mera conduta, pois o tipo penal não faz menção a qualquer resultado naturalístico.
Admite-se a tentativa.

Venda ou entrega de arma de fogo, acessório, munição ou explosivo a criança e adolescente (art.
16, §1º, V)

O quinto delito é vender, entregar ou fornecer, ainda que gratuitamente, arma de fogo, acessório,
munição ou explosivo a criança e adolescente.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, exceto o comerciante ou industrial do ramo de armas de fogo,
acessórios ou munição, pois, no exercício dessas atividades empresariais, a venda, entrega ou fornecimento,
em desacordo com as normas legais, caracteriza o delito de comércio irregular de arma de fogo, previsto no
art. 17, que é mais grave.
O sujeito passivo, além da coletividade, também é a criança ou adolescente.
Criança é a pessoa que ainda não completou 12 (doze) anos.
Adolescente é a pessoa que já atingiu 12 (doze), mas ainda não completou 18 (dezoito) anos.
A entrega ou fornecimento de arma de fogo, acessório ou munição a pessoa maior de 18 (dezoito) anos,
é crime dos arts. 14 ou 16, mas estes dispositivos legais não contemplam o verbo vender.
Quanto à venda de arma de fogo a pessoas maiores, para uma corrente, será contravenção penal,
prevista no art. 18 da LCP, que contempla o verbo vender, mas outra corrente enquadra o fato nos arts. 14 ou
16, no verbo ceder, com o argumento de que a cessão onerosa é sinônima de venda.
O objeto material é a arma de fogo, acessório, munição ou explosivo. É importante observar que o
explosivo também figura como objeto material, mas a lei não contempla o artefato incendiário.
Note-se que a lei faz menção ao explosivo sem exigir que ele esteja contido num artefato.
Quanto ao fornecimento de explosivo a maior de 18 (dezoito) anos, é crime do art. 253 do CP.

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O crime do art. 242 do ECA, que se refere a arma (e não apenas arma de fogo), munição ou explosivo,
por ser oriundo de uma lei anterior, deve ser afastado, só sendo aplicado às armas brancas (exemplos: faca,
punhal, etc.).
Assim, por força do princípio da especialidade, outrossim, por se tratar de lei posterior, o delito em
análise afasta a incidência do art. 242 do ECA.
O tipo penal em análise não contempla a venda de artefato explosivo a pessoas maiores nem de artefato
incendiário a pessoas maiores ou menores e, por isso, o fato será atípico. Entretanto, a simples posse,
detenção, emprego ou fabricação de artefato explosivo ou incendiário é crime do art. 16, §1º, III.
No tocante à venda de arma branca, é contravenção penal (art. 18 da LCP).
Os núcleos do tipo são os verbos vender, entregar e fornecer.
Não se incrimina a simples oferta à venda.
A venda é o contrato, escrito ou verbal, onde se assume a obrigação de entregar a coisa mediante
contraprestação em dinheiro.
A entrega é a tradição onerosa ou gratuita da coisa, de eventual.
O fornecimento é a tradição onerosa ou gratuita da coisa, de forma contínua.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo.
A consumação, no verbo vender, ocorre com o fechamento do negócio, independentemente da
tradição. Nos verbos entregar e fornecer, a consumação se verifica com a tradição.
É possível a tentativa.

Produção ou adulteração de munição ou explosivo (art. 16, §1º, VI)

O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Trata-se de crime comum.


Se, porém, o agente exercer habitualmente a atividade de indústria, comércio ou prestação de serviços
de qualquer natureza, referente a munição, ainda que sem autorização, o delito será o previsto no art. 17, que
é mais grave, absorvendo-se o delito em análise, no tocante à munição, mas convém lembrar que o citado art.
17 não cuida do explosivo.
O delito consiste em produzir, recarregar ou reciclar, sem autorização legal, ou adulterar, de qualquer
forma, munição ou explosivo.
O objeto material é a munição e o explosivo. Não abrange os acessórios da arma de fogo nem os
artefatos incendiários.
Os núcleos do tipo são os verbos produzir, recarregar, reciclar e adulterar.
Produzir é criar manualmente a munição ou explosivo.
Recarregar é inserir uma nova carga na munição ou explosivo.
Reciclar é aproveitar algum material relacionado à munição ou explosivo,
Adulterar é falsificar ou alterar a munição ou explosivo.
O verbo fabricar não é previsto no tipo penal em análise.
Fabricar é produzir, em grande ou média escala, através de maquinários e equipamentos.
A fabricação de explosivo é crime do art. 16, § 1º , III.
A fabricação de munição, por sua vez, envolve uma atividade industrial, e, dessa forma, é crime do art.
17, que em seu § 1º incrimina expressamente esta conduta.
Aliás, no tocante à munição, caso o agente exerça habitualmente atividade relacionada com munição,
o delito, em todos os verbos acima, será o previsto no art. 17, conforme já havia salientado antes, pois o §
1º do art. 17 incrimina qualquer forma de prestação de serviços.
O elemento normativo do tipo, que consiste no fato de a conduta se realizar sem autorização legal, é
exigido nos verbos produzir, recarregar e reciclar. A expressão “autorização legal” deve ser interpretada como
sendo a que emana dos órgão públicos competentes.
Se a produção, recarregamento e reciclagem observarem as normas legais e regulamentares, mas não
houver a autorização legal, o delito se configurará.
O elemento subjetivo é a vontade consciente de realizar as condutas descritas no tipo penal.
Não é exigível o fim de lucro.

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A consumação ocorre com a ultimação da conduta.


É possível a tentativa.

FORMA QUALIFICADA

Dispõe o §2º do art. 16:


“Se as condutas descritas no caput e no §1º deste artigo envolverem arma de fogo de uso proibido, a
pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos.”
Trata-se da única qualificadora prevista na lei em comento, pois tem pena própria.
É, pois, um tipo penal derivado, pois a ele é aplicável as mesmas condutas do caput e do §1º do art. 16.
O objeto material é apenas a arma de fogo de uso proibido.
O delito em apreço, que envolve arma de fogo de uso proibido, é ainda hediondo, conforme já analisado
anteriormente.
As condutas do “caput” do art. 16 serão atípicas quando envolverem acessórios e munições de uso
proibido, pois o §2º do art. 16 só se refere à arma de fogo de uso proibido.
O “caput” do art. 16, quando trata dos acessórios e munições, se refere apenas às de uso restrito, sendo
que os arts. 12 e 14 dizem respeito às de uso permitido.
Há uma lacuna em relação à incriminação da posse ou porte de acessórios e munições de uso
proibido, sendo vedada a analogia “in malam partem” e, dessa forma, força convir que o fato será atípico.
COMÉRCIO ILEGAL DE ARMA DE FOGO

Dispõe o “caput” do art. 17:


“Adquirir, alugar, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar,
remontar, adulterar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no
exercício de atividade comercial ou industrial, arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização ou em
desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 12 (doze) anos, e multa”.
No dia 23 de outubro de 2005, houve um referendo em todo território nacional sobre a validação do
art. 35 do Estatuto do Desarmamento.
O citado art. 35 proibia a comercialização de arma de fogo e munição em todo o território nacional,
mas, para entrar em vigor, dependia de aprovação mediante referendo popular, a ser realizado em outubro
de 2005.
O referendo então se realizou, através da consulta popular feita com a seguinte pergunta:
"O comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil?".
O resultado final foi de 59.109.265 votos respondendo "não" (63,94%), enquanto 33.333.045 votaram
pelo "sim" (36,06%).
Manteve-se assim a comercialização de armas de fogo e munição em todo o país, mediante autorização
específica.
O sujeito ativo é apenas as pessoas que participam do exercício da atividade comercial, industrial e de
prestação de serviços.
Trata-se, portanto, de crime próprio e ainda hediondo.
O delito se caracteriza ainda que a atividade seja exercida de forma irregular ou clandestina ou na
própria residência.
Além do titular da empresa individual e do representante legal da sociedade, também respondem pelo
crime os empregados e pessoas contratadas para armazenar ou transportar o objeto material.
O vendedor habitual de armas de fogo, por exemplo, ainda que exerça o comércio sem registro e na
própria residência, responde pelo crime, à medida que faz desse comércio a sua profissão.
A propósito, dispõe o §1º do art. 17 que:
“Equipara-se à atividade comercial ou industrial, para efeito deste artigo, qualquer forma de prestação
de serviços, fabricação ou comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercido em residência”.
Assim, o armeiro que, habitualmente, sem a autorização competente, faz consertos de arma de fogo no

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quintal de sua casa, responde também pelo crime, pois o §1º do art. 17 incrimina qualquer forma de prestação
de serviço.
Para que haja o crime, a atividade industrial, comercial ou de prestação de serviços pressupõe a
habitualidade, ou seja, a reiteração de atos, dispensando-se, porém, o registro.
Exige-se, pois, que se trate de uma profissão do agente.
O sujeito que realiza uma única venda ou vendas esporádicas, por exemplo, não pode ser considerado
empresário e, portanto, não incide no delito em análise.
Não basta, para a configuração do crime, o exercício de qualquer tipo de atividade industrial, comercial
ou de prestação de serviços, pois é preciso que seja uma atividade relacionada às armas de fogo, acessórios
ou munições.
Noutras palavras a atividade deve consistir em adquirir, alugar, receber, transportar, conduzir, ocultar,
ter em depósito, desmontar, montar, remontar, adulterar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma
utilizar armas de fogo, acessórios ou munições, bem como prestar serviços, fabricar ou comercializar armas
de fogo, acessórios ou munições.
O objeto material é arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, proibido ou restrito.
Se o objeto material for de uso proibido ou restrito, a pena aumenta da metade por força da majorante
prevista no art. 19.
O tipo penal não inclui como objeto material o artefato explosivo ou incendiário, mas o assunto é
tratado no art. 16, §1º, III e IV.
Em relação às armas brancas, também não são contempladas pelo tipo penal em análise, mas constitui
contravenção penal, prevista, no art. 18 da LCP, a sua fabricação, importação, exportação, depósito ou venda,
sem permissão da autoridade, quer o fato tenha ou não sido praticado no exercício de uma atividade
empresarial.
Com efeito, o art. 18 da LCP, que prevê a contravenção penal de fabrico, comércio ou detenção de arma
ou munição, encontra-se assim redigido: “Fabricar, importar, exportar, ter em depósito ou vender, sem
permissão da autoridade, arma ou munição”.
Quanto à venda de arma de fogo, acessório e munição, a pessoa maior, por quem não exerce atividade
comercial, industrial ou de prestação de serviços, há duas correntes.
Primeira, é crime do art. 14 ou 16, que incrimina a cessão onerosa ou gratuita, sendo que a venda se
enquadra como sendo uma cessão onerosa.
Segunda, é contravenção penal do art. 18 da LCP, quando se tratar de arma de fogo ou munição, mas o
fato será atípico em relação ao acessório.
De fato, a cessão é a transferência dos direitos sobre uma determinada arma de fogo. O seu objeto não
é propriamente a arma, mas os direitos sobre ela. Difere da venda, cujo objeto é a própria arma de fogo. Em
razão disso, filio-me à segunda corrente.
O tipo penal prevê 17 (dezessete) condutas criminosas, sendo 14 (catorze) no caput e 3 (três) no §1º.
A prática de mais de uma conduta, no mesmo contexto, caracteriza crime único, pois o delito é de ação
múltipla ou de conteúdo variado. Em contextos diferentes, haverá concurso material de crimes.
Os núcleos do tipo, previstos no caput, são os verbos adquirir, alugar, receber, transportar, conduzir,
ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, adulterar, vender, expor à venda e utilizar.
No § 1º há ainda as condutas de prestar serviços, fabricar e comercializar.
Haverá a absorção do delito de receptação qualificada, previsto no art. 180, §1º, do CP, quando se tratar
de arma de fogo, acessórios ou munições que sejam produtos de crime.
Outra corrente, porém, sustenta que há concurso material, pois os bens jurídicos são distintos, sendo,
por isso, inaplicável o princípio da consunção.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar as condutas
descritas no tipo penal.
O delito se caracteriza quer a conduta se realize em proveito próprio ou alheio.
Não se a exige o fim de lucro.
O comerciante de armas de fogo que, por exemplo, no exercício de sua atividade empresarial, adquirir
uma arma de fogo para defesa pessoal, também responde pelo delito em análise, pois o tipo penal não exige

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o fim de lucro ou de revenda.


O elemento normativo do tipo consiste no fato de a conduta ser realizada sem autorização ou em
desacordo com determinação legal ou regulamentar.
O Comando do Exército é o órgão competente para autorizar e fiscalizar o comércio de armas de fogo
e demais produtos controlados.
Quanto à atividade de armeiro, a licença para exercer essa atividade é concedida pelo Sinarm.
Ainda que haja a autorização para o exercício da atividade, o delito poderá se configurar, quando a
conduta houver sido realizada em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
Nesse aspecto, no tocante às munições, o §1º do art. 23 impõe que todas as munições comercializadas
no País deverão estar acondicionadas em embalagens com sistema de código de barras, gravado na caixa,
visando possibilitar a identificação do fabricante e do adquirente, entre outras informações definidas pelo
regulamento desta Lei.
Ainda nesse tópico do elemento normativo, o §3º do art. 23 salienta que as armas de fogo fabricadas
conterão dispositivo intrínseco de segurança e de identificação, gravado no corpo da arma, definido pelo
regulamento desta Lei, exclusive para os órgãos previstos no art. 6º.
O delito se consuma com a prática de uma das condutas descritas no tipo penal, desde que se demonstre
a habitualidade anterior em relação ao exercício da atividade industrial, comercial ou de prestação de
serviços.
O delito, entretanto, não é habitual, pois se consuma com uma única conduta.
De fato, não se exige a habitualidade na conduta típica, mas, sim, no exercício da atividade empresarial
que antecede à prática do crime.
Trata-se, portanto, de crime instantâneo.
Não se pode confundir a habitualidade inerente ao exercício da atividade empresarial, que é necessária,
mas que antecede ao delito, com a habitualidade na prática do crime, que não é exigida pelo tipo penal.
O comerciante de arma de fogo que atua licitamente, responderá, por exemplo, pelo delito em apreço
se vender uma única arma em desacordo com as normas regulamentares.
Em contrapartida, o colecionador que faz várias vendas de armas de fogo a uma única pessoa não
comete o delito em estudo, porquanto não exerce atividade empresarial.
Quanto à tentativa, é possível. Exemplo: o comerciante é surpreendido no momento da entrega das
armas de fogo em seu estabelecimento.

FIGURA CRIMINOSA EQUIPARADA

Dispõe §2º do art. 17, introduzido pela lei 13.964/2019:


“Incorre na mesma pena quem vende ou entrega arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização
ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar, a agente policial disfarçado, quando presentes
elementos probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente.”
O sujeito ativo, malgrado o silêncio da lei, é a apenas o industrial, comerciante ou prestador de serviços
relacionados com armas de fogo, acessórios e munições, que praticam o fato no exercício da atividade
empresarial, ainda que esta seja irregular, clandestina ou residencial.
É, pois, necessário que se prove o exercício habitual de uma das atividades acima, tal qual ocorre com
o caput do art. 17.
O §2º do art. 17, em análise, não exige expressamente que o delito se relacione com o exercício de
atividade industrial, comercial ou de prestação de serviços, mas creio que o criminoso testado pelo policial
disfarçado também deve ser industrial comerciante ou prestador de serviço, até porque o “nomem iuris” do
delito, comércio ilegal de arma de fogo, sugere uma dessas atividades.
O delito em análise, convém lembrar, é hediondo.
Assim, seria ilógico ser crime hediondo um ato isolado de venda ao policial disfarçado e mera
contravenção do art. 18 da LCP a venda isolada ao maior de 18 (dezoito) anos.
Quanto à venda feita a criança ou adolescente, é crime do art. 16, §1º, V, que abrange também o
material explosivo, mas, quando feita no exercício da atividade industrial, comercial ou de prestação de

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serviços, é crime do art. 17, caput.


O objeto material é a arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, restrito ou proibido, pois
a lei não faz qualquer distinção. Não abrange os artefatos explosivos e incendiários nem as armas brancas.
Os núcleos do tipo são os verbos vender e entregar.
A venda é o contrato escrito ou verbal onde o vendedor assume a obrigação de transferir a propriedade
e o comprador a obrigação de efetuar o pagamento em dinheiro.
A entrega é a tradição da coisa.
O criminoso que vende ou entrega arma de fogo, acessório ou munição ao policial disfarçado só
responderá pelo delito em análise quando houver elementos probatórios razoáveis de uma conduta criminal
preexistente.
Ausente os elementos probatórios razoáveis de uma conduta criminal preexistente, o flagrante será
provocado e, portanto, nulo (súmula 145 do STF).
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de vender ou entregar o
objeto material ao policial disfarçado.
O elemento normativo do tipo consiste no fato de a venda ou entrega se realizar sem autorização ou
em desacordo com a determinação legal ou regulamentar. É necessário que isto seja mencionado na denúncia.
Quanto à consumação, no verbo vender, ocorre com o acordo de vontades consistente no fechamento
do negócio, independentemente da entrega ou pagamento.
No verbo entregar, a consumação se verifica com a tradição da arma de fogo, acessório ou munição.
Quando há a venda, a entrega se torna exaurimento, pois o delito já havia se consumado antes.
Dessa forma, o enquadramento no verbo entregar só será necessário quando não houver a venda.
Exemplo: o policial disfarçado solicita a entrega da arma de fogo a título de locação ou permuta.
Quanto à tentativa, é possível.
No delito em apreço, que introduz no ordenamento jurídico o instituto do agente policial disfarçado, há
duas condutas criminosas:
a) a conduta criminal anterior, que é praticada por iniciativa do sujeito ativo, sem qualquer provocação
do policial disfarçado. O tipo penal em análise exige a presença de elementos probatórios razoáveis acerca
dessa conduta criminal preexistente, mas não esclarece em que ela consistiria. É, pois, a meu ver, necessário
que se trate de uma conduta relacionada à indústria, comércio ou prestação de serviços de arma de fogo,
acessório e munição, sob pena de se abrir demasiadamente o tipo penal e de faltar o nexo de compatibilidade
lógica entre a provocação e a conduta criminal anterior.
b) a conduta criminal posterior de vender ou entregar a arma de fogo, acessório ou munição, que é
realizada mediante provocação do agente policial disfarçado. Esta provocação, que é o induzimento ou
instigação, só será lícita quando motivada por elementos probatórios razoáveis acerca da conduta criminal
anterior.
Presentes os dois requisitos acima, o flagrante será válido e, por isso, não será tratado como flagrante
provocado.
O flagrante provocado, como se sabe, é nulo, pois se equipara ao crime impossível conforme súmula
145 do STF, ao passo que o flagrante acima, realizado pelo agente policial disfarçado, é válido.
O flagrante provocado exige dois requisitos cumulativos:
a) o agente é induzido a realizar a conduta típica, sem que houvesse qualquer prova razoável de uma
conduta criminal preexistente.
b) o provocador toma providências que tornam absolutamente impossível a consumação.
Antes da criação do tipo penal em análise, o flagrante era provocado mesmo diante de prova razoável
da conduta criminal anterior.
Se, por outro lado, o agente não possuía a arma de fogo, acessório ou munição, comprando-a de um
terceiro para satisfazer o desejo do policial disfarçado, a situação será a seguinte:
a) comprova-se, no flagrante, o envolvimento pretérito do agente na venda ilegal de arma de fogo,
acessório ou munição. Nesse caso, ele responderá pelo delito do §2º do art. 17, em estudo. Antes desta lei,
não havia crime, pois o fato era considerado flagrante provocado.
b) não se comprova, no flagrante, o envolvimento pretérito do agente na venda ilegal de arma de

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fogo, acessório ou munição. Nesse caso, o flagrante será provocado e, portanto, nulo (Súmula 145 do STF).
Quanto ao agente que já possuí a arma de fogo, acessório ou munição, caso venha, no exercício da
atividade empresarial, a vendê-la ou entregá-la ao policial disfarçado, o flagrante, diante da comprovação da
conduta pretérita de “ter em depósito, será válido na modalidade vender ou entregar, sendo que, antes da lei
13.964/2019, que introduziu o §2º do art. 17, o flagrante era nulo nestes verbos, embora válido na modalidade
“ter em depósito”, prevista no “caput” do art. 17, cuja consumação se prolonga no tempo, por se tratar de
delito permanente.
No exemplo acima, o agente será enquadrado apenas no delito em análise, absorvendo-se o delito
anterior, previsto no art. 17, “caput”, relacionado ao depósito da arma de fogo, acessório e munição.
Vê-se assim que o tipo penal em análise facilitou a incriminação, validando o disfarce do policial ante à
existência de elementos probatórios razoáveis acerca da conduta criminal anterior.
Imagine agora o seguinte exemplo: o policial disfarçado provoca a conduta criminal, oferecendo-se para
comprar arma de fogo de um comerciante, mas sem que houvesse elementos probatórios razoáveis de uma
conduta criminal preexistente.
Caso obtenha êxito, por se tratar coincidentemente de um comerciante de armas, que tinha a arma de
fogo em depósito, o flagrante será válido?
Creio que não, pois, de acordo com o tipo penal em estudo, o policial só poderá utilizar-se do disfarce
quando houver elementos probatórios razoáveis de uma conduta criminal preexistente.
De fato, não se pode estimular este tipo de diligência, que se revela como sendo de caráter excepcional,
à medida que é tênue a linha divisória que a separa do campo da imoralidade.
Outra corrente, porém, considera o flagrante válido, no delito do caput do art. 17, pois, na modalidade
ter em depósito, o delito é permanente.
Por fim, cumpre distinguir três situações distintas:
a) agente policial disfarçado: é o que, motivado por elementos probatórios razoáveis de conduta
criminal preexistente, se faz passar por outra pessoa para coletar provas sobre a existência da materialidade
ou da autoria. Trata-se de uma postura legítima em relação aos crimes do §2º do art. 17 e parágrafo único do
art. 18, ambos do Estatuto do Desarmamento, outrossim, no art. 33, §1º, IV, da Lei das Drogas. Com relação a
outros delitos, há duas exegeses. Primeira, o flagrante será válido, pois o ordenamento jurídico admite todos
os meios de prova moralmente legítimos. Segunda, o flagrante será nulo, pois o ato de induzir ou instigar a
conduta criminal atenta contra os preceitos morais.
b) agente policial provocador: é o que induz outra pessoa à pratica de uma conduta criminosa, com o
intuito de prendê-la em flagrante, sem que houvesse elementos probatórios razoáveis de uma conduta
criminal preexistente. Trata-se de uma conduta ilegítima, de um flagrante provocado. Nesse caso, não há
crime, sendo nulo o flagrante (Súmula 145 do STF);
c) agente policial infiltrado: é o que se faz passar por outra pessoa para ingressar no ambiente dos
criminosos, com o intuito de obter provas. Desde que presentes os requisitos legais, trata-se de um
comportamento legítimo, em relação aos crimes de organização criminosa, tráfico de drogas e lavagem de
capitais, mas que não é previsto no Estatuto do Desarmamento.

TRÁFICO INTERNACIONAL DE ARMA DE FOGO

Dispõe o art. 18:


“Importar, exportar, favorecer a entrada ou saída do território nacional, a qualquer título, de arma de
fogo, acessório ou munição, sem autorização da autoridade competente:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 16 (dezesseis) anos, e multa”.
Trata-se do único crime do Estatuto do Desarmamento, cuja competência é da Justiça Federal, pois sua
punição é prevista em tratado internacional (art. 109, V, da CF).
Ao incriminar as referidas condutas, o Brasil deu cumprimento a compromissos assumidos no plano
internacional, em especial à Convenção Interamericana contra o Tráfico ilícito de Armas de Fogo , de 14 de
novembro de 1997, aprovada pelo Decreto 3.229/97 e ao Protocolo contra o Tráfico ilícito de Armas de Fogo,
aprovada pelo Decreto 5.941/06, que complementa a Convenção de Palermo.

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O tipo penal em análise é especial em relação ao delito de contrabando, previsto no art.334 do CP,
afastando-o, por força do princípio da especialidade.
Trata-se ainda de crime hediondo.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, inclusive, aquele que tem porte de arma. Trata-se de crime
comum.
Não é necessário, para a caracterização do crime, que o fato seja praticado no exercício da atividade
industrial, comercial ou de prestação de serviços, mas, ainda que seja, o agente responderá pelo delito em
análise, absorvendo o delito de comércio ilegal de arma de fogo, previsto no art. 17.
Quanto ao funcionário público, que facilita a importação ou exportação de armas de fogo, acessórios e
munições, também responderá pelo delito em estudo, por força do princípio da especialidade, e não pelo
delito de facilitação ao contrabando, previsto no art. 318 do CP.
O objeto material é arma de fogo, acessório ou munição. Se forem de uso restrito ou proibido incide a
causa de aumento, prevista no art. 19, que majora a pena na metade.
Ainda que a arma de fogo esteja desmontada ou desmuniciada, o delito se caracteriza, mas se estiver
avariada, a ponto de tornar absolutamente ineficaz o seu funcionamento, haverá crime impossível (art. 17 do
CP).
Tratando-se de munição ou acessório, em pequena quantidade, desacompanhado da arma de fogo, o
STF e STJ, conforme já visto, têm admitido a aplicação do princípio da insignificância.
Há o delito ainda que se trate de uma única arma de fogo.
Se, no mesmo contexto, houver a apreensão de várias armas de fogo haverá crime único, ainda que
algumas sejam de uso permitido e outras de uso restrito ou proibido.
No concernente aos artefatos explosivos e incendiários, não constituem objeto material do delito em
análise, mas a sua importação ou exportação caracteriza crime de contrabando, previsto no art. 334 do CP.
Quanto à arma de brinquedo, conquanto proibida, não é objeto material do delito em estudo, mas a
sua importação ou exportação também configura delito de contrabando, previsto no art. 334 do CP.
No concernente â importação ou exportação de arma branca caracteriza contravenção penal, prevista
no art. 18 da LCP. Esta contravenção, no tocante às armas de fogo e munições, encontra-se revogada pelo art.
18 do Estatuto do Desarmamento, em estudo.
Os núcleos do tipo são os verbos importar, exportar ou favorecer.
Importar é promover a entrada do exterior para o Brasil.
Exportar é promover a saída do Brasil para outro país.
Favorecer é facilitar a entrada ou saída do território nacional. É, pois, o auxílio para que haja a
importação ou exportação. Exemplos: providenciar os documentos falsos, fornecer o meio de transporte, etc.
O favorecimento também pode se verificar através da omissão do agente que tem o dever jurídico de
agir. Exemplo: funcionário da alfândega dolosamente se abstém de realizar a fiscalização.
O favorecimento, ainda que não previsto no tipo penal, seria punido como participação, nos termos do
art. 29 do CP, sendo desnecessária a sua inserção no tipo.
O elemento normativo consiste em realizar as condutas descritas no tipo penal sem autorização da
autoridade competente. Ê necessário que seja descrito este elemento na denúncia.
O Comando do Exército é o órgão competente para autorizar e fiscalizar a exportação, importação e
desembaraço alfandegário das armas de fogo, acessórios e munições.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar as condutas
descritas no tipo penal.
Não é exigível o fim de lucro ou de comércio, sendo irrelevante o objetivo do agente.
O fato de o objeto material ser oriundo do exterior, ou de o agente ser estrangeiro, por si só, não implica
no reconhecimento do tráfico internacional ou transnacional, cujo ônus da prova compete à acusação.
Quanto à consumação, nos três verbos, ocorre no instante em que a arma de fogo transpõe a fronteira
do país ou a sua zona de fiscalização aduaneira, prevalecendo o que ocorrer primeiro.
A transposição das fronteiras pode se dar pelas vias terrestre, aérea ou marítima, antes mesmo do
pouso do avião ou atracamento da embarcação.
No verbo favorecer, caso se entenda que a consumação ocorre com o simples favorecimento, mas a

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importação ou exportação não se verificar, haveria a ilógica solução de a conduta de favorecer, fato menos
grave, ser crime consumado, enquanto que o fato mais grave, importar ou exportar, permaneceria no terreno
tentado.
O delito é instantâneo. Não é necessário a habitualidade da conduta criminosa.
Admite-se a tentativa. Exemplo: apreensão da arma de fogo, quando o traficante tentava passar pela
zona aduaneira.

FIGURA CRIMINOSA EQUIPARADA

Dispõe o parágrafo único do art. 18:


“Incorre na mesma pena quem vende ou entrega arma de fogo, acessório ou munição, em operação de
importação, sem autorização da autoridade competente, a agente policial disfarçado, quando presentes
elementos probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente.”
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Não se exige que se trate de um empresário do ramo de
importação.
É necessário, para a caracterização do crime, que o sujeito ativo realize a venda ou entrega ao policial
disfarçado, em operação de importação.
O disfarce só será válido quando houver elementos probatórios razoáveis de conduta criminal
preexistente.
A lei não esclarece no que consiste a conduta criminal anterior, mas, por coerência ao “nomen juris”,
deve se relacionar com o tráfico internacional de armas de fogo, acessórios ou munições, na modalidade
importação.
Se, por exemplo, a venda ou entrega ao policial disfarçado relacionar-se à exportação de arma de fogo,
acessório ou munição, o delito não se caracteriza.
No mais, reporto o leitor aos comentários feitos sobre o §2º do art. 17 e lembro que o delito em análise
é hediondo.

ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

INTRODUÇÃO

A lei 12.850, de 02 de agosto de 2.013, define organização criminosa e outras infrações penais
correlatas, dispondo ainda sobre os meios de obtenção de prova e o procedimento criminal a ser aplicado.
Além disso, revogou expressamente a lei 9.034/95, que disciplinava o crime organizado, substituindo,
esta expressão por organização criminosa.
A Lei 9.034/95 não definia a organização criminosa, obrigando os intérpretes a se valerem do conceito
fornecido pela Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, conhecida
por Convenção de Palermo, aprovada no ordenamento jurídico pátrio com status de lei ordinária.
O acolhimento pelo STF e STJ do conceito contido na Convenção de Palermo não implicou na violação
do princípio da reserva legal, pois a referida convenção não criou crime algum, limitando-se a fornecer o
conceito de organização criminosa, viabilizando-se, destarte, à aplicação dos preceitos processuais da antiga
Lei 9.034/95.
A discussão hoje se encontra superada, pois o conceito de organização criminosa está previsto na Lei
12.850/2013 que, nesse aspecto conceitual, revogou a Convenção de Palermo.
Quanto à Lei 12.694/2.012, revogada parcialmente, que versa sobre o mesmo tema, ainda permanece
em vigor nos assuntos que não colidem com a Lei 12.850/2013, com destaque para o juízo colegiado de
primeiro grau.

OBJETO DA LEI 12.850/2013

A Lei 12.850/2013 é aplicada aos seguintes delitos:

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a) organização criminosa por natureza (art. 2º).


b) figura típica equiparada (art. 2º, §1º).
c) infrações penais praticadas por organizações criminosas, também chamadas de organizações
criminosas por extensão.
d) organizações terroristas, entendidas como aquelas voltadas para a prática dos atos de terrorismo
legalmente definidos art. 1º, §2º, I). Aliás, à investigação, processo e julgamento dos crimes de terrorismo,
ainda que não sejam praticados por organizações terroristas, ou mesmo quando cometidos por um só agente,
são aplicáveis as disposições da Lei 12.850/2013, por força do que reza o art. 16 da Lei 13.260/2016, que
disciplina os delitos de terrorismo.
e) às infrações penais internacionais à distância (art. 1º, §2º, I).
Infrações penais internacionais são aquelas que, por tratado ou convenção internacional, o Brasil se
obrigou a reprimir. Exemplos: tráfico de mulheres, danificação de cabos submarinos, tráfico de drogas, etc.
Infrações penais à distância são aquelas em que a conduta ocorre no Brasil e o resultado noutro país,
ou vice-versa, bem como aquelas cujo resultado deveria ocorrer no Brasil.
Para se aplicar a lei em estudo, não basta que o infração penal seja internacional, pois é ainda
necessário que se trate de uma infração penal à distância, ou seja, que a execução se inicie no Brasil, mesmo
que o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no exterior, ou vice-versa.

CONCEITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente


ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou
indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas
sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional (art.1º, §1º).
São, pois, seus elementos:
a) associação: reunião estável ou permanente, isto é, duradoura entre seus integrantes.
b) quatro ou mais pessoas. O art. 2º da lei 12.694/2.012, que exigia apenas três, encontra-se
tacitamente revogado.
c) estrutura ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente. Não precisa ter
estatuto, nem chefe ou sede, mas não pode ser uma estrutura completamente desordenada.
d) fim de praticar infrações penais (crimes ou contravenções) cujas penas máximas sejam superiores a
4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional, isto é, que lese interesse do Brasil e de outro país,
sendo que, nesse caso, a pena pode ser igual ou inferior a 4 (quatro) anos.
e) fim de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza. A vantagem visada pode ser
patrimonial ou extrapatrimonial.

DISTINÇÃO ENTRE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA

Cumpre, desde logo, fazer a distinção entre organização criminosa e associação criminosa.
A associação criminosa, expressão que substituiu o termo quadrilha ou bando, encontra-se definida no
art. 288 do CP, com nova redação que lhe foi dada pelo art. 24 da lei 12.850/2.013, nos seguintes termos:
“Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos”.
As diferenças são as seguintes:
a) a organização criminosa exige 4 (quatro) ou mais pessoas, na associação criminosa bastam 3 (três) ou
mais.
b) a organização criminosa exige a finalidade de praticar infrações penais (crimes ou contravenções),
cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional, isto é, lese
bem jurídico de mais de um país. Já a associação criminosa exige a finalidade de praticar crimes, quaisquer

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que sejam, mas não abrange as contravenções penais.


c) a organização criminosa exige o fim de obter vantagem de qualquer natureza (econômica ou não), de
forma direta ou indireta, ao passo que na associação criminosa não é preciso o fim de obter vantagem.
d) a organização criminosa requer uma estrutura, ainda que informal, isto é, não escrita, com divisão de
tarefas, pressupondo um grau maior de organização. A associação criminosa não exige sequer uma estrutura
informal nem divisão de tarefas.

Distinção entre organização criminosa e concurso de pessoas

A organização criminosa se distingue do concurso de pessoas nos seguintes aspectos:


a) na organização criminosa há uma união estável ou permanente entre os criminosos, que visam a
prática de infrações penais indeterminadas; no concurso de pessoas, o vínculo entre os agentes é eventual,
sendo que eles miram uma ou mais infrações penais determinadas.
b) a organização criminosa se caracteriza ainda que nenhuma infração penal seja cometida, pois a lei
incrimina a sua simples formação; o concurso de pessoas, ao revés, permanecerá impune se nenhuma infração
penal houver sido cometida na forma consumada ou tentada (art. 31 do CP).

O CRIME DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

O crime de organização criminosa por natureza ou propriamente dito é previsto no art. 2º, caput, da
Lei 12.850/2.013, nos seguintes termos:
“Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização
criminosa:
Pena-reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas correspondentes às demais
infrações penais praticadas”.
Trata-se de crime plurissubjetivo, pois exige-se a presença de pelo menos 4 (quatro) pessoas,
computando-se os menores e os não identificados.
Quanto ao agente policial infiltrado na organização criminosa, não é computado.
Aliás, para que a infiltração seja autorizada pelo juiz, é preciso que se demonstre a prévia existência da
organização criminosa, que pressupõe a presença de pelo menos quatro membros.
O bem jurídico protegido é a paz pública, a tranquilidade social.
Trata-se de crime de perigo abstrato ou presumido.
O sujeito passivo é a coletividade, que é a titular do bem jurídico. É assim um crime vago.
Os núcleos do tipo são:
a) promover: é diligenciar originariamente para a formação da organização criminosa. É fundar a
organização criminosa.
b) constituir: é organizar as bases, estabelecer o plano de uma organização criminosa.
c) financiar: é liberar os recursos financeiros para que a organização criminosa possa se formar ou atuar.
d) integrar: é participar, fazer parte, atuar na organização criminosa.
Trata-se de crime de ação múltipla ou de conteúdo variado, de modo que a prática de mais de uma das
condutas acima caracteriza crime único, por força do princípio da alternatividade.
Acerca do conceito de organização criminosa, que é elemento do tipo em análise, é previsto no art. 1o
da Lei 12.850/2013, de tal sorte que o delito em estudo é uma norma penal em branco homogênea e
homovitelina ou univitelina.
Homogênea por ser complementada por lei federal; homovitelina pelo fato de o seu complemento se
encontrar na própria lei penal.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade de associar-se de forma estável ou
permanente, consciente sobre o número mínimo de agentes exigido pelo tipo penal.
Não há o delito, por exemplo, quando o agente supõe que está associado a apenas duas pessoas,
ignorando a presença de um quarto elemento.
Exige-se ainda dupla finalidade:

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a) fim de praticar infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou infrações
penais de caráter transnacional, ainda que inferior a 4 (quatro) anos.
b) fim de obter vantagem de qualquer natureza, de forma direta ou indireta.
O delito se consuma com a efetiva associação, independentemente da prática de qualquer crime.
Trata-se de crime formal ou de consumação antecipada ou ainda de resultado cortado.
O delito é permanente, pois o momento consumativo se prolonga no tempo, o que viabiliza a prisão em
flagrante a qualquer momento, enquanto não cessada a atividade criminosa.
Quanto à tentativa, é inadmissível, pois os fatos tipificados constituem atos preparatórios de outras
infrações penais.
O preceito secundário do citado art. 2º ressalva expressamente o concurso material entre o delito de
organização criminosa e as demais infrações penais praticadas pelos agentes, eliminando-se, destarte,
qualquer possibilidade de absorção.
Mas, pelos delitos praticados, só responderão os agentes que concorreram efetivamente para a sua
prática. Não basta, portanto, que seja integrante da organização criminosa.
Em contrapartida, o sujeito que não pertence à organização, mas auxiliou os agentes na prática do
crime, responde só por este crime, estando isento de qualquer responsabilidade pelo crime de organização
criminosa.

FIGURA TÍPICA EQUIPARADA

O §1º do art. 2º da lei 12.850/2.013 incrimina, nas mesmas penas, quem impede ou, de qualquer forma,
embaraça a investigação de infração penal que envolva organização criminosa.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa.
Quanto ao agente que já integra a organização criminosa, para uns, só responderia pelo delito anterior.
Outros, ao revés, preconizam pelo concurso material de crimes, pois o delito do §1º do art. 2º é
autônomo em relação ao delito do “caput”.
O tipo penal em análise não é uma qualificadora, mas, sim, um delito autônomo, em relação ao crime
de organização criminosa, previsto no “caput” do art.2o, razão pela qual não há falar-se em sua absorção.
De fato, a qualificadora é um tipo penal derivado, com pena própria, que adiciona às mesmas
elementares do tipo fundamental circunstâncias que complementam a definição legal da conduta criminosa.
A figura típica equiparada, por sua vez, é tipo autônomo, com a mesma pena do tipo fundamental, mas
com elementares próprias e desvinculadas das previstas no tipo fundamental.
O delito em análise é monossubjetivo, pois pode ser praticado por uma única pessoa.
O bem jurídico tutelado é a administração da justiça.
O sujeito passivo é o Estado.
Os núcleos do tipo são os verbos:
a) impedir: é obstar.
b) embaraçar: é atrapalhar ou tumultuar.
O delito é de forma livre, pois admite inúmeros meios de execução.
O tipo se refere a impedir ou embaraçar a investigação de infração penal que envolva organização
criminosa.
O STJ já decidiu que a investigação também se verifica na fase processual e não apenas no inquérito
policial e em outros procedimentos investigatórios que antecedem à propositura da ação penal.
Outra corrente, porém, reputa o delito inexistente, diante da vedação da analogia “in malam partem”,
quando a conduta ocorrer no curso da ação penal.
A consumação ocorre quando o agente efetivamente impede ou embaraça a investigação.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de impedir ou embaraçar à
investigação.
Trata-se de crime material.
Admite-se à tentativa, quando o agente inicia a execução, mas não consegue impedir nem embaraçar
as investigações, por circunstâncias alheias à sua vontade.

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Quanto ao delito de coação no curso do processo, previsto no art. 340 do CP, é absorvido pelo delito
em análise, para se evitar o “bis in idem”.

AGRAVANTE ESPECIAL

Os delitos caput e do §1º do art. 2º da Lei 12.850/2.01 têm uma agravante especial.
Com efeito, a pena é agravada para quem exerce o comando, individual ou coletivo, da organização
criminosa, ainda que não pratique pessoalmente atos de execução (§3º do art. 2º).
Trata-se do autor intelectual ou de escritório, que tem o domínio do fato, isto é, o poder para fazer
cessar a atuação da própria organização criminosa ou de algum integrante que lhe é subordinado.
É, pois, necessário, para a incidência da agravante, que se demonstre a existência de subordinação de
outros membros da organização criminosa, em relação ao autor intelectual.
Quanto à agravante genérica do art. 62, I, do CP, que trata do mesmo assunto, é absorvida pela
agravante especial.
É sempre bom esclarecer que não se trata de causa de aumento de pena, mas sim de agravante.
Na causa de aumento, a lei indica a quantidade da majoração da pena.
Na agravante, a lei ordena a exacerbação da pena, mas não indica a quantidade do aumento.

CAUSAS DE AUMENTO DE PENA

As penas da organização criminosa e do delito de impedimento ou embaraço à sua investigação


aumentam-se até a metade se na atuação da organização criminosa houver emprego de arma de fogo (§2º do
art. 2º).
Não se trata de qualquer arma e, sim, da arma de fogo.
Não basta que haja arma de fogo, pois a lei exige o seu emprego, isto é, o uso ou porte ostensivo, ainda
que por um só dos agentes.
Para a incidência da majorante, não há necessidade de apreensão da arma de fogo.
Há ainda as causas de aumento de pena em quantidade variável de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços),
conforme §4º do art. 2º.
A pena aumenta neste percentual em 5(cinco) hipóteses.
Primeira, se há participação de criança ou adolescente, nesse caso, absorve-se, para se evitar o “bis in
idem”, o crime de corrupção de menores, previsto no art. 244-B do ECA. Segunda, se há concurso de
funcionário público, valendo-se a organização criminosa dessa condição para a prática de infração penal.
Não basta que o funcionário público integre a organização criminosa para que haja o aumento da pena,
é ainda preciso que, na prática de infração penal, a condição de funcionário público tenha exercido alguma
influência ou facilitado as coisas.
Terceira, se o produto ou proveito da infração penal destinar-se, no todo ou em parte, ao exterior.
A intenção de remessa ao exterior é suficiente para a incidência da majorante, ainda que essa remessa
não se concretize.
Quarta, se a organização criminosa mantém conexão, isto é, alguma ligação com outras organizações
criminosas independentes. Quinta, se as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade da
organização, isto é, que ela atua em mais de um país.
Alguns autores, para evitar o “bis ib idem”, sustentam que esta última majorante seria sempre
inaplicável, pois ela já seria elemento da organização criminosa e, por consequência, não poderia ser utilizada
como causa de aumento de pena.
A questão não é bem assim.
De fato, caso a infração penal tenha pena superior a 4 (quatro) anos, impõe-se a incidência da majorante
da transnacionalidade, pois, nessa situação, para a caracterização da organização criminosa, não se exige que
haja a transnacionalidade.
Se, entretanto, a pena não atingir este patamar, a majorante em análise não poderá incidir, pois, nesse
caso, a organização criminosa só se caracteriza em função da transnacionalidade, que passa a ser elemento

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do tipo penal , de tal sorte que a sua incidência, como causa de aumento de pena, geraria o “bis in idem”.

AFASTAMENTO CAUTELAR DAS FUNÇÕES PÚBLICAS

O §5º do art. 2º acrescenta ainda que se houver indícios suficientes de que o funcionário público integra
organização criminosa, poderá o juiz determinar seu afastamento cautelar do cargo, emprego ou função, sem
prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à investigação ou instrução processual.
São, pois, dois os requisitos para o afastamento cautelar:
a) “fumus comissi delicti”: é a aparência do fato criminoso, caracterizada pelos indícios suficientes de
que o funcionário público integra a organização criminosa;
b) “periculum in mora”: que a demora em se decretar o afastamento seja prejudicial à investigação ou
instrução processual.
O afastamento cautelar, por força da argumentação “a fortiori”, pode também ser parcial. Exemplo: o
juiz determina que ele realize apenas serviços internos, proibindo-o de ter contato com o público.
A decisão que decreta ou mantém o afastamento cautelar, é irrecorrível, mas pode ser impugnada por
mandado de segurança.
Quanto à decisão que indefere o pedido de afastamento cautelar ou revoga o afastamento
anteriormente decretado, é suscetível de recurso em sentido estrito, por interpretação extensiva do art. 581,
V, do CPP.
Por fim, durante o afastamento cautelar, a lei esclarece expressamente que a sua remuneração deve
ser mantida.

EFEITOS EXTRAPENAIS DA CONDENAÇÃO

A condenação com trânsito em julgado acarretará ao funcionário público a perda do cargo, função,
emprego ou mandato eletivo e a interdição para o exercício de função ou cargo público pelo prazo de 8 (oito)
anos subsequentes ao cumprimento da pena (art. 2º, § 6º).
Conforme se pode verificar, são dois os efeitos cumulativos da condenação disciplinados pela Lei
12.850/2013, sem prejuízo de outros previstos no Código Penal e em leis especiais. Ei-los:
a) perda do cargo, função, emprego ou mandato eletivo.
Aludido efeito se verifica imediatamente após o trânsito em julgado da sentença condenatória.
Após o cumprimento da pena, não há falar-se em restituição do cargo, função, emprego ou mandato
eletivo, pois se trata da perda e não de uma mera suspensão.
A lei em análise não prevê, como efeito da condenação, a cassação da aposentadoria do funcionário
público, sendo vedada a analogia “in malam partem”.
No tocante à perda do mandato eletivo, é definitiva e, por isso, não se confunde com a previsão do art.
15, III, da CF, que trata da suspensão automática dos direitos políticos, em razão de sentença penal
condenatória transitada em julgado, cujo caráter é transitório, cessando com o cumprimento ou extinção da
pena.
Este efeito da perda do mandado eletivo, porém, em relação aos deputados e senadores, não é
automático.
Além da perda do cargo, função, emprego ou mandato eletivo, ainda haverá a interdição para o
exercício de função ou cargo público pelo prazo de 8 (oito) anos subsequentes ao cumprimento da pena,
conforme se verá logo em seguida.
b) interdição para o exercício de função ou cargo público pelo prazo de 8 (oito) anos subsequentes ao
cumprimento da pena.
Trata-se de uma proibição imposta a todos os condenados pelo crime de organização criminosa e não
apenas aos que já exerciam função pública.
O prazo de 8 (oito) anos se inicia a partir do cumprimento da pena.
A proibição abrange o mandato eletivo e emprego público, malgrado o silêncio da lei, pois são também
funções públicas.

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Findo o prazo de 8 (oito) anos, a meu ver, o referido efeito cessa automaticamente, independentemente
de reabilitação penal.
Outra corrente, porém, exige, para a sua cessação, a reabilitação penal, prevista no art. 93, parágrafo
único, do CP, mas esse raciocínio representa analogia “in malam partem”.
Ambos os efeitos são automáticos, ou seja, prescindem de menção expressa na sentença e se verificam
independentemente da quantidade da pena concreta.
Convém ainda registrar que os efeitos acima não se aplicam aos deputados e senadores, que também
não se submetem à suspensão dos direitos políticos prevista no art. 15, III, da CF.
Com efeito, no tocante à perda do mandado de deputados e senadores, a Constituição exige que seja
decidida pela Câmara dos Deputados ou Senado, por voto aberto e maioria absoluta, mediante provocação da
respectiva Mesa ou de Partido Político representado no Congresso Nacional, assegurada a ampla defesa (art.
55, VI e §2º da Constituição Federal).

INVESTIGAÇÕES DE POLICIAIS

Se houver indícios da participação de policial nos crimes de que trata esta Lei, a Corregedoria de Polícia
instaurará inquérito policial e comunicará ao Ministério Público, que designará membro para acompanhar o
feito até a sua conclusão (art.2º, §7º).
O referido inquérito policial deverá:
a) ser instaurado pela Corregedoria de Polícia, ou seja, não tramitará na delegacia de polícia.
b) ser comunicado ao Procurador Geral do Ministério Público. Esta comunicação deve ser feita pela
própria Corregedoria da Polícia e não pelo Delegado Geral.
c) ser obrigatoriamente acompanhado por um representante do Ministério Público designado pelo
Procurador Geral desta instituição.
A norma em análise se aplica a todos os crimes previstos na Lei 12.850/2013, inclusive, aos disciplinados
nos arts. 18 a 21.
Quanto à possibilidade de o próprio Ministério Público instaurar o procedimento investigatório criminal,
não vejo qualquer obstáculo.
Alguns autores, entretanto, sustentam que como a lei deferiu a investigação à Corregedoria de Polícia,
houve a proibição tácita de o fato ser investigado pelo Ministério Público.

LIDERANÇAS DE ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS ARMADAS

As lideranças de organizações criminosas armadas ou que tenham armas à disposição deverão iniciar o
cumprimento da pena em estabelecimentos penais de segurança máxima (§8º do art. 2º).
O dispositivo prevê implicitamente o regime inicial fechado, com base na gravidade abstrata do fato
criminoso e, por isso, é inconstitucional, em face da violação do princípio da individualização da pena.

VEDAÇÃO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL, DA PROGRESSÃO DE REGIMES E DE OUTROS BENEFÍCIOS


PRISIONAIS

O condenado expressamente em sentença por integrar organização criminosa ou por crime praticado
por meio de organização criminosa não poderá progredir de regime de cumprimento de pena ou obter
livramento condicional ou outros benefícios prisionais se houver elementos probatórios que indiquem a
manutenção do vínculo associativo (§9º do art. 2º).
Na verdade, caso seja condenado por outros delitos, mas mantenha vínculo com organização ou
associação criminosa, também não poderá obter os aludidos benefícios, cuja concessão depende do
preenchimento de requisitos subjetivos relacionados com o merecimento.
Noutras palavras, o dispositivo, por dizer o óbvio, se revela inócuo.
Convém esclarecer que o livramento condicional, progressão de regimes e outros benefícios da Lei de
Execução Penal poderão ser deferidos aos condenados por organização criminosa que romperam o vínculo

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associativo.

EFEITOS PREVISTOS EM OUTRAS LEIS ESPECIAIS

A organização criminosa gera, dentre outros, os seguintes efeitos previstos na legislação especial:
a) aplicação do regime disciplinar diferenciado. De fato, o RDD poderá ser aplicado aos presos
provisórios ou condenados, nacionais ou estrangeiros, sob os quais recaiam fundadas suspeitas de
envolvimento ou participação, a qualquer título, em organização criminosa, associação criminosa ou milícia
privada, independentemente da prática de falta grave (art. 54, § 1º, II, da LEP).
b) possibilidade de interrogatório do réu preso, integrante de organização criminosa, por sistema de
videoconferência ou outro recurso tecnológico (art. 185, § 2o, do CPP).
c) impossibilidade de concessão do benefício do tráfico de drogas privilegiado ao integrante de
organização criminosa (art. 33, §4º, da Lei 11.346/2006).
d) a pena do delito de lavagem de capitais será aumentada de um a dois terços, se for cometido por
intermédio de organização criminosa (art.1º, §4o, da Lei 9.613/98).
e) o crime de organização criminosa é hediondo, mas apenas quando direcionado à prática de crime
hediondo ou equiparados (art. 1o, parágrafo único, inciso V, da Lei 8.072/90). Os crimes equiparados aos
hediondos são o terrorismo, a tortura e o tráfico de drogas;
f) juízo colegiado de primeiro grau.

JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU COLEGIADO

Introdução

O juízo de primeiro grau, em regra, é singular, pois é composto por um único juiz.
Há, entretanto, os seguintes juízos colegiados de primeiro grau:
a) Tribunal do Júri;
b) Conselho de Justiça Militar;
c) Juízo Colegiado nos crimes praticados por organização criminosa (lei 12.694/2.012).

Previsão legal

O juízo colegiado de primeiro grau é previsto na Lei 12. 694/2012.

Criação de Varas Criminais Colegiadas

A criação de varas colegiadas depende de lei federal ou lei estadual, conforme se trate da Justiça
Estadual ou Federal.
Com o advento da lei 13.964/2019, porém, os Tribunais de Justiça e os Tribunais Regionais Federais
poderão instalar, nas comarcas sedes de Circunscrição ou Seção Judiciária, mediante resolução, Varas
Criminais Colegiadas com competência para o processo e julgamento:
I - de crimes de pertinência a organizações criminosas armadas ou que tenham armas à disposição;
II - do crime de milícia privada, prevista no art. 288-A do Código Penal; e
III - das infrações penais conexas aos crimes a que se referem os incisos I e II do caput deste artigo.
Vê-se assim que, no tocante aos delitos acima, a criação de varas colegiadas de primeiro grau pode se
verificar através de uma resolução do tribunal, que é um ato administrativo normativo.
As Varas Criminais Colegiadas terão competência para todos os atos jurisdicionais no decorrer da
investigação, da ação penal e da execução da pena, inclusive a transferência do preso para estabelecimento
prisional de segurança máxima ou para regime disciplinar diferenciado.

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Ao receber, segundo as regras normais de distribuição, processos ou procedimentos que tenham por
objeto os crimes mencionados acima, o juiz deverá declinar da competência e remeter os autos, em qualquer
fase em que se encontrem, à Vara Criminal Colegiada de sua Circunscrição ou Seção Judiciária.
Feita a remessa mencionada, a Vara Criminal Colegiada terá competência para todos os atos processuais
posteriores, incluindo os da fase de execução.
Por fim, segundo já decidiu o STF, no âmbito da Justiça Estadual, o juízo colegiado de primeiro grau
pode, mediante lei estadual de iniciativa dos Tribunais de Justiça, ser estendido para outras infrações penais ,
pois a competência para legislar sobre procedimento é concorrente, conforme preceitua o art. 24, XI, da CF.

Instauração do juízo colegiado de primeiro grau

Caso, nas comarcas sedes de Circunscrição ou Seção Judiciária, não haja a Vara Criminal Colegiada, ainda
assim será possível a instauração deste juízo colegiado, nos crimes praticados por organização criminosa.
Esta instauração, porém, não é automática, pois depende de decisão do juiz que preside o processo.
Só é cabível quando houver risco à sua integridade física ou de seus familiares.
O juízo colegiado pode ser instaurado, na fase de conhecimento ou de execução, para praticar qualquer
ato processual. Exemplos: decretação de prisão ou de medidas assecuratórias; concessão de liberdade
provisória ou revogação de prisão; sentença; progressão ou regressão de regime de cumprimento de pena;
concessão de liberdade condicional; transferência de preso para estabelecimento prisional de segurança
máxima; inclusão do preso no regime disciplinar diferenciado.
O juiz, ao decidir pela instauração do juízo colegiado, deverá dar conhecimento ao órgão correicional,
ou seja, à Corregedoria Geral de Justiça, mas este órgão, por ser administrativo, não tem poder para cassar a
sua decisão judicial.
O juízo colegiado de primeiro será formado pelo juiz do processo e por 2 (dois) outros juízes escolhidos
por sorteio eletrônico dentre aqueles de competência criminal em exercício no primeiro grau de jurisdição. A
competência do colegiado limita-se ao ato para o qual foi convocado.
Não há violação do princípio do juiz natural, pois a escolha dos magistrados é por sorteio e, além disso,
a previsão de sua criação antecede à prática do fato criminoso, mas o tema ainda é polêmico.
As reuniões do juízo colegiado poderão ser sigilosas sempre que houver risco de que a publicidade
resulte em prejuízo à eficácia da decisão judicial. Não há inconstitucionalidade no sigilo, posto que justificado
por razões de interesse público, estando, pois, amparado pelos arts. 5º, LX, e 93, IX, da CF.
As decisões do colegiado, devidamente fundamentadas e assinadas, sem exceção, por todos os seus
integrantes, serão publicadas sem qualquer referência a voto divergente de qualquer membro. Não se trata,
destarte, do juiz secreto ou sem rosto, que decide sem se identificar. Aliás, seria inconstitucional a figura do
juiz secreto ou sem rosto, pois inviabiliza a análise de sua imparcialidade, ofendendo, destarte, o princípio da
ampla defesa.

NORMAS PROCEDIMENTAIS

Os crimes previstos na Lei 12.850/2013 e as infrações penais conexas devem observar as seguintes
normas procedimentais:
a) procedimento ordinário independentemente da quantidade de pena;
b) a instrução criminal deverá ser encerrada em 120 (cento e vinte) dias quando o réu estiver preso.
Note-se que o prazo acima não é para a prolação da sentença, mas, sim, para o encerramento da fase
instrutória.
O referido prazo começa a fluir a partir da data da prisão.
Admite-se, porém, uma prorrogação por igual período por decisão judicial, desde que a causa seja
complexa ou que a demora tenha sido provocada pelo próprio réu.
O termo inicial do prazo é a data da prisão em flagrante, preventiva e temporária.
O termo final é o encerramento da instrução processual.
Encerrada a instrução, fica superada a alegação de constrangimento por excesso de prazo (súmula 52

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do STJ).
No procedimento do júri, pronunciado o réu, também fica superada a alegação de constrangimento por
excesso de prazo (súmula 21 do STJ).

c) o juiz pode decretar o sigilo do inquérito policial e, nesse caso, o defensor, para ter acesso às
investigações, precisará de autorização judicial, mas não poderá ter acesso às diligências ainda em andamento
(art. 23).
Determinado o depoimento do investigado, seu defensor terá assegurada a prévia vista dos autos, ainda
que classificados como sigilosos, no prazo mínimo de 3 (três) dias que antecedem ao ato, podendo ser
ampliado, a critério da autoridade responsável pela investigação (art. 23, parágrafo único).

INVESTIGAÇÃO E MEIOS DE OBTENÇÃO DE PROVA

Os meios de investigação se classificam em:


a) ordinários: são os que utilizam as técnicas convencionais de investigação. Em regra, não são sigilosos
e se destinam aos delitos de menor ou maior gravidade. Dentre esses meios, previstos no art. 6º do CPP,
merecem destaque a prova documental e testemunhal.
b) extraordinários: são os que se utilizam de técnicas especiais de investigação. Exemplo: acordo de
colaboração premiada. Outro exemplo: infiltração de agentes policiais. Em função de serem invasivos, se
destinam à investigação de delitos de maior gravidade e se caracterizam pelo sigilo da diligência e
contraditório posterior ou diferido, pois se realizam de forma dissimulada, sem o prévio conhecimento do
investigado.
Na investigação da organização criminosa, além dos meios ordinários, ainda se admite vários meios
extraordinários de obtenção de prova.
A propósito, dispõe o art. 3º da lei 12.850/2.013:
“Em qualquer fase da persecução penal, serão permitidos, sem prejuízo de outros já previstos em lei,
os seguintes meios de obtenção da prova:
I - colaboração premiada;
II - captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos;
III - ação controlada;
IV - acesso a registros de ligações telefônicas e telemáticas, a dados cadastrais constantes de bancos de
dados públicos ou privados e a informações eleitorais ou comerciais;
V - interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas, nos termos da legislação específica;
VI - afastamento dos sigilos financeiro, bancário e fiscal, nos termos da legislação específica;
VII - infiltração, por policiais, em atividade de investigação, na forma do art. 11;
VIII - cooperação entre instituições e órgãos federais, distritais, estaduais e municipais na busca de
provas e informações de interesse da investigação ou da instrução criminal”.
Dos meios acima de obtenção de provas, abordarei os seguintes:
a) colaboração premiada (inciso I);
b) ação controlada (inciso III);
c) quebra de sigilo de dados (inciso IV);
d) quebra dos sigilos financeiro, bancário e fiscal (inciso VI);
e) infiltração (inciso VII).
Quanto à captação ambiental e interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas, analisarei por
ocasião do estudo da Lei 9.296/96.
Cumpre, entretanto, esclarecer que, no tocante à captação ambiental e interceptação de comunicações
telefônicas e telemáticas, previstas nos incisos II e V do dispositivo acima, respectivamente, há duas normas
importantes:
a) Havendo necessidade justificada de manter sigilo sobre a capacidade investigatória, poderá ser
dispensada licitação para contratação de serviços técnicos especializados, aquisição ou locação de
equipamentos destinados à polícia judiciária para o rastreamento e obtenção de provas previstas nos incisos

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II e V (art. 3º, § 1 º). Trata-se de uma hipótese de dispensa da licitação para se garantir o sigilo das
investigações
b) Nas hipóteses acima, uma vez dispensada a licitação, fica também dispensada a exigência de
publicação resumida do instrumento de contrato ou de seus aditamentos na imprensa oficial, devendo,
entretanto, ser comunicado o órgão de controle interno da realização da contratação (art. 3º, § 2º).

AÇÃO CONTROLADA OU FLAGRANTE DIFERIDO

Conceito

A ação controlada consiste em retardar a prisão em flagrante ou a apreensão de bens para outro
momento mais eficaz à formação de provas e obtenção de informações.
É também denominada flagrante diferido ou postergado ou retardado.

Requisitos

A ação controlada exige os seguintes requisitos:


a) Prévia comunicação ao juiz competente.
A realização da ação controlada, sem prévia comunicação ao juiz, pode caracterizar crime de
prevaricação, previsto no art. 319 do CPP.
Note-se que, na Lei de Drogas, exige-se prévia autorização do juiz, ao passo que na lei de organização
criminosa basta a prévia comunicação ao juiz.
Outra diferença é que, na Lei de Drogas, o parágrafo único do art. 53 condiciona o deferimento judicial
ao conhecimento do itinerário provável e da identificação dos agentes do delito ou de seus colaboradores,
requisitos não exigidos pela Lei de Organização Criminosa.
Convém esclarecer que, no tráfico de drogas, cometido por organização criminosa, a ação controlada
será possível sem prévia autorização judicial, bastando a prévia comunicação ao magistrado.
b) Que o crime seja praticado por organização criminosa ou pessoa a ela vinculada.
Na verdade, não se pode olvidar que a Lei 12.850/2013 também é aplicada aos crimes internacionais à
distância e aos delitos de terrorismo, ainda que não praticados por organização criminosa, conforme já
salientado anteriormente.
c) Que haja o controle para se garantir a eficácia de medida.
Este controle consiste no monitoramento, com observação e acompanhamento, com vistas à
viabilização da prisão em flagrante ou colheita de provas e informações no momento oportuno.
Se, não obstante, o controle a situação de flagrante desaparecer, não será possível a prisão em
flagrante, razão pela qual, juntamente com a prévia comunicação ao juiz, é recomendável que seja também
formulado o pedido de prisão preventiva.
O Ministério Público, malgrado o silêncio da lei, pode também acompanhar o monitoramento da ação
controlada.
d) a cooperação das autoridades dos países que figuram como provável itinerário ou destino do
investigado.
Este último requisito, cujo escopo é reduzir os riscos da fuga e extravio dos bens, só é obrigatório nos
delitos transnacionais, ou seja, quando a ação controlada envolver transposição de fronteiras entre países.

Legitimidade

A ação controlada pode ser comunicada ao juiz pelo delegado de polícia ou por autoridade
administrativa, por inciativa própria ou atendendo à solicitação de subordinados envolvidos na operação.
Trata-se, portanto, de uma intervenção policial, quando levada a efeito pela autoridade policial, bem
como de uma intervenção administrativa, quando emanar de autoridade administrava.
As autoridades administrativas que podem realizar a ação controlada são as que atuam para obter

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elementos de informações acerca de ilícitos administrativos que também configuram infrações penais
perpetradas por organizações criminosas. Exemplos: auditores fiscais, agentes de corregedorias, agentes da
ABIN, fiscais do IBAMA.

Procedimento

O pedido de prévia comunicação tramita em segredo de justiça e o seu conteúdo será sigiloso, isto é,
não pode conter informações que possam indicar a operação a ser realizada.
Até o encerramento da diligência, a defesa não terá acesso aos autos.
Como forma de se garantir o êxito das investigações, o acesso será restrito ao juiz, ao Ministério Público,
outrossim, ao Delegado de Polícia ou à autoridade administrativa, conforme o tipo de intervenção.
O juiz, ao receber a comunicação, comunicará o Ministério Público.
Ao deferir o pedido, o juiz, se for o caso, estabelecerá os limites à ação. Exemplo: fixação de prazo
máximo. Outro exemplo: ordenar que se efetue a prisão imediata, quando surgir risco à vida ou à integridade
física de alguém.
Ao término da diligência, a autoridade policial ou administrativa deverá elaborar auto circunstanciado
acerca da ação controlada.
Não se trata de termo, mas, sim, de auto circunstanciado.

Distinção entre ação controlada e flagrante esperado

No flagrante esperado, a polícia fica de espreita para aguarda a prática do delito, com o intuito de poder
realizar a prisão.
É, pois, uma diligência que antecede à situação de flagrante, ao passo que, na ação controlada, a
situação de flagrante já se encontra presente, mas, por razões estratégicas, a prisão é relegada para outro
momento mais oportuno.
No flagrante esperado há o fim de se realizar a prisão em flagrante.
Na ação controlada o fim é de se retardar a prisão em flagrante.
Não obsta que, após a diligência de flagrante esperado, sobrevindo a prática delituosa, seja também
realizada, sem interrupção, a ação controlada.

Entrega vigiada

A entrega vigiada é a espécie de ação controlada, que consiste no acompanhamento do itinerário do


produto do crime (exemplos: drogas, armas de fogo, mercadorias contrabandeadas, etc.).
Desdobra-se em:
a) entrega vigiada limpa ou por substituição: quando, em dado momento, o produto do crime é trocado
pelos agentes policiais, por outra mercadoria lícita, sem que os criminosos percebam, mantendo-se o
monitoramento até a sua chegada ao destinatário. Exemplo: os policiais substituem por farinha a cocaína
enviada pelo criminoso, através do correio. Aqui é preciso tomar cuidado, pois a mercadoria lícita não poderá
embasar a prisão após o desaparecimento da situação de flagrante.
b) entrega vigiada suja ou com acompanhamento: quando o produto do crime segue o seu itinerário,
sem ser substituído pelos agentes policiais, que realizam o monitoramento. Aqui, o sucesso do flagrante
prorrogado requer cuidados para que os policiais não percam o contato com os criminosos.
c) entrega vigiada de interdição: os policiais, em dado momento, apreendem o produto do crime,
obstando a sua tradição ao destinatário. Aqui não há propriamente entrega, pois o flagrante é realizado antes
de ela pudesse ocorrer.
A entrega vigiada é também prevista na Convenção de Palermo, no art. 204, como sendo “a técnica
que consiste em permitir que remessas ilícitas ou suspeitas saiam do território de um ou mais Estados, os
atravessem ou neles entrem, com o conhecimento e sob o controle das suas autoridades competentes, com
a finalidade de investigar infrações e identificar as pessoas envolvidas na sua prática”.

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Convém esclarecer que é possível a entrega vigiada sem que ocorra uma situação de flagrante.
Neste caso, a entrega vigiada não se classifica como espécie de ação controlada, aproximando-se do
flagrante esperado. Exemplo: a polícia detecta um tráfico de cocaína num envelope do correio, onde não
consta o nome do destinatário, figurando o endereço como sendo uma determinada repartição pública.

Delito relacionado à ação controlada

O art. 20 da Lei 12.850/2.013 prevê como crime “descumprir determinação de sigilo das investigações
que envolvam a ação controlada e a infiltração de agentes”.
Trata-se de crime próprio, praticável apenas pelo funcionário público que tem o dever de sigilo.

INFILTRAÇÃO DE AGENTES

Conceito

Infiltração é o fato de o agente policial ingressar na organização criminosa, de forma disfarçada, fingindo
que é um de seus membros.
O agente infiltrado também se denomina testemunha de coroa.

Previsão

A infiltração física de policiais, além de ser prevista na Lei 13.850/2013, também é admitida para os
crimes das leis de drogas e de lavagem de capitais (arts. 53, I, da Lei 11.343/2006 e 1º, §6º, da Lei 9.613/98).
A infiltração virtual é prevista nos arts. 10-C Lei 12.850/2013 e 190-A do ECA.
De fato, o art. 190-A do ECA permite a infiltração virtual dos seguintes delitos praticados contra criança
e adolescente:
a) crimes de pedofilia: são os previstos nos arts. 240, 241, 241-A, 241-B, 241-C e 241-D;
b) crimes contra a dignidade sexual de vulnerável: estupro de vulnerável (art. 217-A do CP), corrupção
de menores (art. 218 do CP), satisfação de lascívia (art. 218-A do CP) e favorecimento à prostituição (art. 218-
B do CP);
c) invasão de dispositivo Informático (art. 154-A do CP).

Classificação

A infiltração de agentes policiais se classifica em:


a)” light cover”: é a que se verifica de forma rápida, com duração máxima de seis meses, sem que haja
necessidade de se mudar a identidade do agente infiltrado ou de se decretar a perda do seu contato com a
família.
b) “deep cover”: é a que se prolonga no tempo, por mais de seis meses, sendo ainda necessária a troca
de identidade e a perda do contato com a família.
c) preventiva: o agente policial infiltrado não atua de forma ilícita junto à organização criminosa, mas a
acompanha para poder, no momento oportuno, atuar para fazer cessar a atividade criminosa. Exemplo:
infiltração para se resgatar a vítima da extorsão mediante sequestro.
d) repressiva: o agente policial infiltrado atua de forma ilícita junto à organização criminosa, inclusive,
praticando alguns delitos, como, por exemplo, venda de drogas, tendo como foco principal a colheita de
provas.
e) física: o agente policial se infiltra pessoalmente na organização criminosa.
f) virtual ou eletrônica ou cibernética: o agente policial se infiltra na organização criminosa, através de
contatos mantidos pela internet.

Fundamento

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Sob o ponto de vista ético, o instituto tem sido combatido por inúmeros doutrinadores, porquanto se
baseia na mentira.
Além disso, o agente infiltrado pode ser autorizado pelo juiz a cometer determinados delitos, o que de
uma certa forma colide com os fins do Direito.
O certo, porém, é que a periculosidade social ocasionada por certas infrações penais, justifica, com base
no princípio da proporcionalidade, o mal menor com o escopo de se combater o mal maior.

Requisitos

Na Lei de Organização Criminosa, a infiltração exige os seguintes requisitos para a infiltração física ou
virtual:

a) prévia autorização judicial.


Enquanto na ação controlada, conforme já visto, o que se exige é a prévia comunicação ao juiz, na
infiltração, se requer a prévia autorização do magistrado, que deve ser fundamentada, sob pena de nulidade
(art. 93, IX, da CF).

b) Indícios de organização criminosa ou das infrações penais do art. 1º da lei 12.850/2.013.


Trata-se do “fumus comissi deliti”, que é a aparência do fato criminoso.
Note-se que a lei não exige que haja indícios de autoria ou participação.
Aliás, dispensa-se, para o deferimento da medida, a prévia identificação dos nomes ou apelidos dos
integrantes da organização criminosa.
No tocante à infiltração virtual, o art. 10-C, num primeiro momento, passou aparentemente a exigir os
nomes ou apelidos dos investigados, mas logo em seguida ressalvou que, quando possível, o pedido deve
conter “os dados de conexão ou cadastrais que permitam a identificação dessas pessoas”.
Noutras palavras, é também possível a infiltração virtual sem a identificação dos nomes ou apelidos dos
investigados.
Também não é necessária que haja certeza sobre a existência de organização criminosa ou das infrações
penais do art. 1º da lei 12.850/2.013, bastando os indícios, ou seja, a probabilidade de sua existência.

c) que a infiltração seja o único meio de se obter a prova.


Este requisito é o “periculum in mora”, pois revela a dificuldade de se comprovar o fato que, com o
passar do tempo, se torna ainda mais difícil.
Se houver outros meios de se obter a prova, a infiltração será denegada.
De fato, a infiltração é a última “ratio” do sistema probatório, ou seja, uma prova subsidiária.
Se, por exemplo, o fato pode ser comprovado através de uma interceptação ambiental ou telefônica,
não será cabível a infiltração.

d) anuência do agente policial infiltrado.


Assim, nenhum agente policial poderá ser compelido a infiltrar-se contra a própria vontade, de tal sorte
que a recusa não caracteriza insubordinação.
E, caso tenha concordado, poderá, a qualquer tempo, mudar de ideia e fazer cessar a sua atuação
infiltrada.

Legitimidade

O pedido de infiltração pode ser formulado:


a) pela autoridade policial, na fase das investigações, através de representação ao juiz;
b) pelo Ministério Público, tanto na fase das investigações quanto na processual, por requerimento.
Na hipótese de representação da autoridade policial, o juiz, antes de decidir, ouvirá o Ministério Público.

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Da mesma forma, se requerida pelo Ministério Público, no curso do inquérito policial, será necessária a
manifestação técnica do delegado de polícia.

Atribuição para a infiltração

O agente infiltrado deve ser um policial que integra a polícia investigativa.

Agentes da ABIN

Além de a lei fazer expressa menção à infiltração por agentes de polícia, o certo é que a eventual
previsão legal de infiltração por agentes de inteligência, para fins de investigação criminal, seria
inconstitucional, por violação do art. 144, §1º, IV, da CF.
É assim sendo vedada, por usurpação de função pública, que a infiltração, para fins de investigação
criminal, seja executada por agentes da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência).
Os agentes de inteligência podem realizar a infiltração sem ordem judicial, mas não para os fins de
investigação criminal.
Os agentes de inteligência, também chamados de agentes secretos ou agentes especiais, têm a função
de defesa da soberania nacional e do Estado Democrático de Direito.
No Brasil, os agentes de inteligência são os que integram a ABIN (Agência Brasileira de Inteligência),
sendo o assunto disciplinado pela Lei 9.883/1.999.
Entende-se como inteligência a atividade que objetiva a obtenção, análise e disseminação de
conhecimentos dentro e fora do território nacional sobre fatos e situações de imediata ou potencial influência
sobre o processo decisório e a ação governamental e sobre a salvaguarda e a segurança da sociedade e do
Estado.
Os agentes da ABIN, conforme já visto, não podem atuar na investigação de infrações penais, sob pena
de invasão de atribuição que a Constituição Federal reservou à polícia judiciária.
Distinguem-se, destarte, dos agentes policiais infiltrados, pois estes, mediante ordem judicial, podem
atuar na persecução penal.

Infiltração de particulares

Os informantes ou gansos são os particulares que prestam serviços de informações à polícia.


Se, porventura, ingressarem na organização criminosa com esse propósito de auxiliarem nas
investigações, a prova será nula.
Outra não pode ser a conclusão, pois a aludida infiltração, além de ocorrer sem ordem judicial, é ainda
executada por quem não é policial, de tal sorte que haverá uma dupla nulidade.

Infiltração exercida pelo colaborador premiado

O colaborador premiado é o coautor ou partícipe que, além de confessar o seu envolvimento na infração
penal, ainda fornece, em troca da obtenção de benefícios penais e processuais, informações pertinentes à
investigação da infração penal.
Se o acordo de colaboração premiada, que é sigiloso, autorizar o colaborador a permanecer de forma
fingida na organização criminosa, com vistas à colheita de novos elementos de prova, será discutível, ainda
que homologado pelo juiz, a validade de sua atuação.
Primeira corrente, as provas serão nulas, pois não há previsão legal para o juiz ordenar a infiltração de
pessoas que não sejam policiais.
Segunda, as provas serão válidas, à medida que não se trata propriamente do instituto da infiltração,
mas, sim, de um desdobramento do acordo de colaboração premiada.
A meu ver, são, pois, dois institutos distintos, razão pela qual a prova me parece válida.
De fato, o agente policial infiltrado simula ingressar numa organização criminosa da qual não faz

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nem fazia parte, ao passo que o mencionado colaborador premiado simula permanecer numa organização
criminosa da qual já fazia parte.

Agente encoberto ou agente policial disfarçado

O agente encoberto ou “undercover” ou ainda agente policial disfarçado é o policial que, sem ordem
judicial, se disfarça, fazendo-se passar por outra pessoa, para colher informações sobre a infração penal.
Sobre o assunto, dispõe o art. 10-C, incluído pela Lei 13.864/2019:
“Não comete crime o policial que oculta a sua identidade para, por meio da internet, colher indícios de
autoria e materialidade dos crimes previstos no art. 1º desta Lei”.
Não se trata propriamente de uma infiltração, mas de uma ocultação voluntária da identidade.
O parágrafo único do art. 10-C, porém, numa imprecisão técnica, também se refere à hipótese como
sendo infiltração, dispondo que:
“O agente policial infiltrado que deixar de observar a estrita finalidade da investigação responderá pelos
excessos praticados”.
Convém distinguir o instituto em análise da infiltração propriamente dita.
Na infiltração exige-se prévia autorização judicial para que o agente policial infiltrado passe a se
comportar como se fosse um dos membros da organização criminosa, sendo a sua identidade
obrigatoriamente substituída por outra.
O agente encoberto, por sua vez, se limita a ocultar voluntariamente a sua identidade, sem ordem
judicial, mas o fingimento não pode chegar ao ponto de se comportar como se fosse um dos membros da
organização criminosa.
Ambos os institutos são previstos para colher indícios de autoria e materialidade dos crimes previstos
no art. 1º desta Lei”.
O agente policial disfarçado também é previsto no art. 190-A do ECA, nos seguintes termos:
“Não comete crime o policial que oculta a sua identidade para, por meio da internet, colher indícios de
autoria e materialidade dos crimes previstos nos arts. 240 , 241 , 241-A , 241-B ,241-C e 241-D desta Lei e
nos arts. 154-A , 217-A , 218 , 218-A e 218-B do Código Penal”.
A infiltração pode ser física ou virtual.
O agente encoberto, por sua vez, só pode ocultar a sua identidade por meio da internet.
Em três hipótese, porém, admite-se que o agente policial oculte fisicamente a sua identidade:
a) simular a compra ou aquisição de drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à
preparação de drogas, quando presentes elementos probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente
(art. 33, §1º, V, da Lei 11.343/2.006);
b) simular a compra ou aquisição de arma de fogo, acessório ou munição, sem autorização ou em
desacordo com a determinação legal ou regulamentar, quando presentes elementos probatórios razoáveis de
conduta criminal preexistente (§2º do art. 17 da Lei 10.826/2,003).
c) simular a compra ou aquisição de arma de fogo, acessório ou munição, em operação de importação,
sem autorização da autoridade competente, quando presentes elementos probatórios razoáveis de conduta
criminal preexistente (parágrafo único do art. 18 da Lei 10.826/2.0003).
Nas três hipóteses acima, o agente policial só poderá simular a compra ou aquisição de drogas ou armas
de fogo quando presentes elementos probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente.

Duração da infiltração

A infiltração será autorizada pelo prazo de até 6 (seis) meses, sem prejuízo de eventuais renovações,
desde que comprovada sua necessidade (art. 10, § 3º).
Nada obsta que o juiz a autorize a por prazo inferior a 6 (seis) meses.
A renovação ou prorrogação é possível, mas não é automática, pois depende de decisão judicial
fundamentada acerca da necessidade da prorrogação.
Para que haja a prorrogação, não é necessário a apresentação do relatório da infiltração.

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Cada prorrogação pode ser autorizada pelo prazo máximo de até seis meses.
A decisão que autoriza a prorrogação deve ser prolatada antes do vencimento do prazo anterior
Vencido o prazo sem que tenha ocorrido a prorrogação, a prova colhida no período descoberto será
nula, ainda que posteriormente sobrevenha a decisão judicial autorizando a prorrogação.
Na infiltração física, a prorrogação pode ser renovada, sem limite ao número de vezes, desde que
comprovada a sua necessidade.
No tocante à infiltração virtual, porém, as sucessivas prorrogações têm um limite, não podendo
ultrapassar o prazo máximo de 720 (setecentos e vinte) dias.

Relatório Circunstanciado

O relatório circunstanciado é o histórico das atividades do agente policial infiltrado.


Findo o prazo da infiltração e de todas as prorrogações, o relatório circunstanciado será apresentado
ao juiz competente, que imediatamente cientificará o Ministério Público.
Concluída a investigação, todos os atos eletrônicos praticados durante a operação deverão ser
registrados, gravados, armazenados e encaminhados ao juiz e ao Ministério Público, juntamente com relatório
circunstanciado (art. 10-D).
Os atos eletrônicos registrados citados no caput deste artigo serão reunidos em autos apartados e
apensados ao processo criminal juntamente com o inquérito policial, assegurando-se a preservação da
identidade do agente policial infiltrado e a intimidade dos envolvidos (parágrafo único do art. 10-D).
No curso do inquérito policial, antes de findar o prazo da infiltração, o delegado de polícia poderá
determinar aos seus agentes, e o Ministério Público poderá requisitar, a qualquer tempo, relatório da
atividade de infiltração.

Concomitância da ação controlada e infiltração

É perfeitamente possível que, diante da situação de flagrante comunicada pelo agente infiltrado aos
policiais que realizam o monitoramento da operação, seja deliberada a postergação da prisão em flagrante,
com vistas à colheita de outros elementos probatórios

Procedimento

A infiltração depende de representação da autoridade policial ou requerimento do Ministério Público.


O requerimento ou representação deverá demonstrar:
a) a necessidade da medida, ou seja, que não há outros meios de se comprovar o fato.
b) o alcance das tarefas dos agentes. Trata-se das metas que se pretende atingir e dos limites à atuação
do agente policial infiltrado. Exemplos: apreensão de bens, gravação ambiental, gravação telefônica, delitos
que o agente infiltrado poderá ou não cometer.
c) quando possível, o nome ou apelidos das pessoas investigadas e o local da infiltração. Conforme já
dito, não se exige a demonstração dos indícios de autoria e participação, mas, se houver, deverão também
constar no requerimento.
O pedido de infiltração é distribuído sigilosamente e não poderá indicar a operação a ser realizada nem
identificar o agente que será infiltrado.
Se, posteriormente, o Ministério Público oferecer a denúncia, ainda assim a identidade do agente
infiltrado não poderá ser revelada, mas é necessário que se dê imediata ciência de sua identidade tanto ao
Ministério Público quanto ao juiz.
Noutras palavras, após o oferecimento da denúncia, a identidade do agente infiltrado é revelada apenas
ao juiz e ao Ministério Público.
As informações quanto à necessidade da operação de infiltração serão dirigidas diretamente ao juiz
competente, que decidirá no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, após manifestação do Ministério Público na
hipótese de representação do delegado de polícia, devendo-se adotar as medidas necessárias para o êxito das

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investigações e a segurança do agente infiltrado.


As informações da operação de infiltração serão encaminhadas diretamente ao juiz responsável pela
autorização da medida, que zelará por seu sigilo.
Antes da conclusão da operação, o acesso aos autos será reservado ao juiz, ao Ministério Público e ao
delegado de polícia responsável pela operação, com o objetivo de garantir o sigilo das investigações.
Os autos contendo as informações da operação de infiltração acompanharão a denúncia do Ministério
Público, quando serão disponibilizados à defesa, assegurando-se a preservação da identidade do agente.

Sustação da operação

Havendo indícios seguros de que o agente infiltrado sofre risco iminente, a operação será sustada
mediante requisição do Ministério Público ou pelo delegado de polícia, dando-se imediata ciência ao
Ministério Público e à autoridade judicial (§3º do art. 12);
Vê-se assim tanto a autoridade policial quanto o Ministério Público, independentemente de ordem
judicial, obrigatoriamente deverão sustar a infiltração, quando houver indícios seguros de que o agente
infiltrado sofre risco iminente.
A sustação pela autoridade policial deverá ser comunicada ao Ministério Público e ao juiz.
A sustação pelo Ministério Público deverá ser comunicada ao juiz.
Por fim, a infiltração ainda pode ser cessada pelo próprio agente infiltrado (art. 14, I). Nesse caso, ainda
que não lhe haja risco iminente, o infiltrado poderá fazer cessar a infiltração, pois se trata de um direito
potestativo.

Direitos do agente policial infiltrado

De acordo com o art.14, são direitos do agente:


I - recusar ou fazer cessar a atuação infiltrada;
II - ter sua identidade alterada, aplicando-se, no que couber, o disposto no art. 9º da Lei nº 9.807, de 13
de julho de 1999, bem como usufruir das medidas de proteção a testemunhas;
III - ter seu nome, sua qualificação, sua imagem, sua voz e demais informações pessoais preservadas
durante a investigação e o processo criminal, salvo se houver decisão judicial em contrário;
IV - não ter sua identidade revelada, nem ser fotografado ou filmado pelos meios de comunicação, sem
sua prévia autorização por escrito.
Vê-se assim que o agente infiltrado, além de poder fazer cessar a infiltração, tem ainda o direito de
alterar o seu nome e de seus parentes próximos, bem como usufruir das demais medidas de proteção a
testemunhas, previstas na Lei 9.807/1.999.
Outrossim, ter seu nome, sua qualificação, sua imagem, sua voz e demais informações pessoais
preservadas durante a investigação e o processo criminal, salvo se houver decisão judicial em sentido
contrário.
Mesmo após o término da operação, a sua identidade não pode ser revelada e ele não poderá ser
fotografado ou filmado pelos meios de comunicação, sem sua prévia autorização por escrito.

Delitos praticados pelo agente policial infiltrado

Se, no período da infiltração, o agente policial infiltrado praticar algum crime, por exemplo, venda de
drogas, a sua culpabilidade só será excluída se inexigível uma conduta diversa.
A inexigibilidade de conduta diversa se verifica quando a recusa à prática do delito puder comprometer
a finalidade das investigações
É claro que ele responderá pelos excessos representados pelos crimes que se revelarem
desproporcionais à finalidade das investigações.
De fato, reza o art. 13:
“O agente que não guardar, em sua atuação, a devida proporcionalidade com a finalidade da

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investigação, responderá pelos excessos praticados”.


O parágrafo único do art. 13 acrescenta que:
“Não é punível, no âmbito da infiltração, a prática de crime pelo agente infiltrado no curso da
investigação, quando inexigível conduta diversa”.
Convém esclarecer que a exclusão da culpabilidade não elimina a responsabilidade penal dos demais
integrantes da organização criminosa pelos fatos delituosos praticados pelo agente policial infiltrado,
invocando-se, para tanto, a teoria da autoria mediata.

QUEBRA DE SIGILO DE DADOS CADASTRAIS

Nos crimes de organização criminosa e demais abrangidos pela lei 12.850/2.013, alguns sigilos podem
ser quebrados pelo delegado de polícia e Ministério Público, independentemente de ordem judicial. São os
seguintes:
a) dados de cadastros pessoais do investigado, mantidos pela Justiça Eleitoral, empresas telefônicas,
instituições financeiras, provedores de internet e administradores de cartão de crédito (art. 15).
Os dados de cadastro pessoais são os que versam sobre a qualificação pessoal, filiação e endereço. A
qualificação pessoal compreende o nome, estado civil, nacionalidade, naturalidade, RG, CPF e profissão.
Quanto aos dados de cadastros não pessoais, a requisição dependerá de ordem judicial.
O citado art. 15 só se refere aos dados de cadastros pessoais do investigado, silenciando sobre os da
vítima que, entretanto, também poderão ser requisitados pela autoridade policial ou Ministério Público, em
relação aos delitos previstos no art. 13-A do CPP.
Aliás, se nos delitos do art. 13-A do CPP a requisição pode versar sobre os cadastros pessoais da vítima,
o mesmo tratamento, por interceptação extensiva, também deve ser dispensado às organizações criminosas
e aos delitos por ela praticados.
O art. 15 em análise se refere apenas cadastros pessoais do investigado, mantidos pela Justiça Eleitoral,
empresas telefônicas, instituições financeiras, provedores de internet e administradores de cartão de crédito,
surgindo então discussão se o rol seria exemplificativo, podendo se estender a quaisquer órgãos do poder
público e às empresas da iniciativa privada, ou se deveria ser interpretado como sendo taxativo.
Mais uma vez, é possível se aplicar, por interpretação extensiva, o art. 13-A do CPP, que admite a aludida
requisição a quaisquer órgãos do poder público e às empresas da iniciativa privada.
b) informações sobre os dados de reservas e registros de viagens dos últimos 5 (cinco) anos que constam
nos bancos de dados das empresas de transporte (art. 16). Aqui a lei faculta o acesso à informação sobre
qualquer pessoa, e não apenas do investigado, desde que o fato seja do interesse das investigações.
O transporte pode ser aéreo, marítimo e terrestre. Abrange tanto o transporte de carga quanto o de
passageiros.
Nas duas hipóteses acima, previstas nos arts. 15 e 16, a possibilidade de quebra do sigilo sem ordem
judicial, para uns, é inconstitucional, por violação do direito à intimidade, mas a jurisprudência tem
considerado válida, pois o que se encontra sob reserva de jurisdição, nos termos do art. 5º, XII, da CF, é o
sigilo das comunicações, que recai sobre o conteúdo dos dados, e não o sigilo dos dados em si.
Afinal, os dados permanecem armazenados e, dessa forma, são do conhecimento das pessoas jurídicas
que os armazenam, razão pela qual não seria coerente se exigir ordem judicial para que a autoridade policial
e o Ministério Público tivessem acesso a eles.
Por outro lado, o art. 17 dispõe que:
“As concessionárias de telefonia fixa ou móvel manterão, pelo prazo de 5 (cinco) anos, à disposição das
autoridades mencionadas no art. 15, registros de identificação dos números dos terminais de origem e de
destino das ligações telefônicas internacionais, interurbanas e locais”.
A expressão contida no citado art. 17, “manterão, pelo prazo de 5 (cinco) anos, à disposição das
autoridades mencionadas no art. 15”, é de uma clareza cristalina de que o acesso aos registros de identificação
dos números dos terminais de origem e de destino das ligações telefônicas podem ser requisitados
diretamente pela autoridade policial e Ministério Público, prescindindo-se de ordem judicial.
A hipótese, entretanto, para alguns autores, se afigura inconstitucional, por violação do art. 5º, XII, da

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CF, que assegura o sigilo das comunicações telefônicas, pois os números dos telefones não se inserem no
conceito de cadastros pessoais.
Os que assim pensam exigem ordem judicial para se ter acesso aos números dos telefones utilizados
pelos interlocutores.

QUEBRA DE SIGILO FINANCEIRO, BANCÁRIO E FISCAL

Acerca do afastamento dos sigilos financeiro, bancário e fiscal, o art. 3º, VI, preceitua que deve ser
feito nos termos da legislação específica.
O pleno do STF já decidiu, porém, que a Receita Federal não pode transmitir diretamente ao Ministério
Público as informações sobre o contribuinte, sem prévia autorização judicial.
Igualmente, às instituições financeiras e administradoras de cartões de créditos, não podem prestar
informações acerca da data de abertura da conta corrente ou solicitação de cartão de crédito e muito menos
sobre o conteúdo das operações realizadas.
Quanto às informações sobre os dados cadastrais pessoais (qualificação pessoal, endereço e filiação),
devem ser fornecidos pela Receita Federal, bem como por instituições financeiras e de cartão de crédito,
mediante requisição da autoridade policial ou do Ministério Público, por força do art. 15, sem necessidade de
ordem judicial.
No tocante à Receita Federal, o plenário do STF proferiu duas decisões importantes:
a) ela pode requisitar diretamente das instituições financeiras os dados das operações bancárias do
contribuinte, porquanto não há quebra, mas, sim, transferência do sigilo dos bancos ao Fisco.
b) ela não pode transferir as informações acima à autoridade policial ou ao Ministério Público, sem
prévia autorização judicial.
Assim, o Ministério Público não pode requisitar diretamente documentos fiscais e bancários sigilosos
diretamente do Fisco ou das Instituições Financeiras (Informativo 482 - STJ).

ACORDO DE COLABORAÇÃO PREMIADA

Conceito

O acordo de colaboração premiada é o negócio jurídico processual através do qual o investigado,


acusado ou condenado, em troca da obtenção de determinados benefícios penais, confessa a autoria ou
participação e ainda fornece meios de provas aos órgãos incumbidos da persecução penal.
Trata-se, pois, de uma espécie de direito premial.

Nomenclatura

Na Itália, o instituto é conhecido como pentitismo.


No Brasil, a referida denominação não se justifica, pois a colaboração premiada não tem como requisito
o arrependimento.
O legislador pátrio utilizou corretamente a expressão “colaboração premiada”, em vez de “delação
premiada”, também conhecida como chamamento de correu.
De fato, a delação premiada é apenas uma das diversas espécies de colaboração premiada, onde o
colaborador revela o envolvimento de outros coautores e participes.
É, no entanto, possível a colaboração sem que haja delação. Exemplo: o colaborador fornece o local
onde se encontra o sequestrado. Outro exemplo: o colaborador fornece as informações necessárias para a
recuperação do produto do crime. Mais um exemplo: o colaborador presta as informações que impedem a
prática de determinado delito.

Críticas

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A colaboração premiada se baseia na traição e, por isso, é alvo de críticas por alguns doutrinadores, que
a acoimam de ferir a ética, rotulando-a de extorsão premiada.
O certo, porém, é que a ética dos criminosos não merece a proteção legal, pois, acima dela, se encontra
o interesse social em se desvendar a prática da infração penal.
Outra crítica é que o colaborador recebe benefícios que não condizem com o crime que cometeu,
ferindo o ideal da pena justa.
De fato, sob a ótica individual, o argumento acima é inquestionável, mas a verdade é que as vantagens
trazidas pela colaboração premiada atendem à utilidade e interesse público, como, por exemplo, o
desmantelamento de uma organização criminosa ou o repatriamento de milhões de reais desviados dos
cofres públicos, compensando-se, destarte, injustiça individual.

Delitos que admitem a colaboração premiada

A lei não esclarece se o benefício se aplicaria apenas ao crime de organização criminosa, nos termos da
corrente restritiva, ou se estenderia também aos delitos praticados pelo colaborador, enquanto integrante
dessa organização criminosa, conforme defende a corrente extensiva.
Prevalece a corrente extensiva, caso contrário não haveria estímulo para a celebração do acordo e o
instituto estaria fadado ao insucesso.
Quanto ao agente que participou do delito praticado pela organização criminosa, mas que não integra a
organização, não poderá celebrar o acordo de colaboração premiada.

Partes

No acordo de colaboração premiada, as partes são:


a) o colaborador: é o investigado, o acusado e até mesmo o condenado, porquanto o acordo também é
permitido após a sentença condenatória.
b) a autoridade celebrante: na fase do inquérito policial, é o delegado de polícia ou o representante do
Ministério Público, mas, na fase processual, o acordo só poderá ser celebrado pelo representante do
Ministério Público.
Quanto ao juiz, não pode participar do acordo de colaboração premiada, pois terá a missão de
homologá-lo ou não e, para tanto, deverá se manter equidistante, alheio à negociação, sob pena violação do
princípio da imparcialidade.
No concernente ao advogado ou defensor do colaborador, não é parte, embora deva estar presente em
todos os atos de colaboração, sob pena de nulidade do acordo.

Natureza jurídica

O acordo de colaboração premiada é negócio jurídico processual e meio de obtenção de prova, que
pressupõe utilidade e interesse públicos (art. 3º-A).
Reveste-se assim da seguinte natureza jurídica:
a) meio de obtenção de prova;
b) negócio jurídico processual.
Malgrado o silêncio da lei, também é um meio de defesa, pois colaborador, sempre acompanhado de
advogado ou defensor, aufere benefícios que dificilmente conseguiria se não tivesse se aliado ao órgão
acusatório.

Meio de obtenção de provas

O acordo de colaboração premiada é um meio extraordinário de obtenção de provas, pois se baseia em


técnicas especializadas de investigação.
É um método de investigação excepcional, que não pode ser banalizado, mas, sim, reservado apenas

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para a investigação dos crimes de grande complexidade.


Justifica-se a sua existência no interesse público, pois dificilmente a materialidade e a autoria de
organizações criminosas complexas seriam desvendadas sem esta técnica de obtenção de provas.

Negócio jurídico processual

Os negócios jurídicos processuais são os aqueles cuja vontade humana tem o poder decidir tanto sobre
sua prática quanto em relação aos efeitos que se produzirão.
É, pois, necessário se analisar as duas faces do negócio jurídico processual:
a) a voluntariedade;
b) os seus efeitos.
O acordo de colaboração premiada é um negócio jurídico processual bilateral, pois depende do acordo
entre as partes.

Voluntariedade

A voluntariedade é a livre manifestação da vontade para se decidir sobre a prática ou não do negócio
jurídico processual.
É violada quando o agente realiza a colaboração por erro, dolo ou coação.
O fato de o colaborador se encontrar preso preventivamente não retira a voluntariedade do acordo,
pois a prisão não configura coação.
Quanto à espontaneidade, que é o fato de a inciativa de realizar o acordo emanar do colaborador, não
é exigida.
Nada obsta, destarte, que tenha sido convencido a colaborar por iniciativa do seu advogado, mulher,
filhos, parentes e amigos, de tal sorte que a colaboração voluntária pode ser espontânea ou não espontânea.
Os motivos da colaboração são irrelevantes, podendo ela ser oriunda de medo, arrependimento,
interesse em obter os prêmios, etc.
Conquanto não seja vedado expressamente que o representante do Ministério Público tome a iniciativa
de convencer o investigado ou acusado a ser um colaborador, recomenda-se uma postura passiva, a fim de
que a voluntariedade não seja comprometida pela eventual alegação de temor reverencial.

Efeitos

Os efeitos, que cada parte visa obter com o acordo de colaboração premiada, são de duas categorias:
a) os resultados almejados pelo órgão celebrante;
b) os benefícios penais ou prêmios almejados pelo colaborador.
Tanto os resultados quanto os prêmios, devem constar no acordo de colaboração premiada.
A obtenção dos prêmios está condicionada à eficácia da colaboração em relação aos resultados
constantes do acordo.

Resultados da colaboração

No acordo de colaboração premiada, o colaborador deve cooperar para a produção de um ou mais dos
seguintes resultados:
a) identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por
eles praticadas.
Trata-se da delação premiada, também conhecida como chamamento de correu.
É mister, para fazer jus ao benefício, que essa colaboração, identifique todos os demais coautores e
partícipes da organização criminosa e todas as infrações penais por eles praticadas, que sejam do
conhecimento do delator.
Não há necessidade de se delatar infrações penais que não foram praticadas pela organização

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criminosa.

b) a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa.


Trata-se também de uma delação premiada.

c) a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa.


Trata-se da colaboração premiada preventiva.
Aqui a colaboração é para impedir a execução das infrações penais constantes dos planos da
organização criminosa.
Não é preciso delatar os comparsas ou revelar outros crimes.
As infrações penais que o acordo visa prevenir, malgrado o silêncio da lei, são aquelas cujas penas
máximas sejam superiores a quatro anos ou que tenham caráter transnacional.

d) a recuperação total ou parcial do produto ou proveito das infrações penais praticadas pela
organização criminosa.
Trata-se da chamada colaboração premiada recuperadora.
Nesse caso, também não há necessidade de se delatar os comparsas e, sim, de colaborar para a
recuperação do proveito do crime.

e) a localização da eventual vítima com sua integridade física preservada.


É a chamada colaboração premiada libertadora.
Ainda que não delate os comparsas, o agente fará jus ao benefício.
Não fará, porém, jus ao benefício, quando a vítima houver sido libertada antes, por ação de terceiros
ou com a integridade física lesionada.
No acordo de colaboração premiada, é possível constar um ou mais dos resultados acima.
Os aludidos resultados podem ser estipulados de forma:
a) isolada;
b) alternativa;
c) cumulativa.
Não há, destarte, necessidade de uma estipulação cumulativa.
Há, pois, a obrigatoriedade de o acordo estipular pelo menos dos referidos resultados.
É possível a estipulação de outros resultados não previstos em lei, desde que agregados a um dos
resultados acima mencionados.
De fato, o art. 4º, §7º, III, da Lei 12.850/2013, se refere aos aludidos resultados como sendo os
“resultados mínimos exigidos”, sinalizando, destarte, a possibilidade de inserção de outros resultados para
que o colaborador possa fazer jus ao prêmio.

Prêmios legais

Os prêmios são os benefícios penais que podem ser estipulados em favor do colaborador.
A colaboração premiada poderá ensejar ao colaborador os seguintes prêmios:
a) perdão judicial;
b) causa de redução da pena privativa de liberdade em até 2/3 (dois terços);
c) substituição de pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos;
d) não oferecimento da denúncia;
e) progressão de regime ou redução da pena até a metade, quando o acordo houver sido celebrado
após a sentença.

A opção por um dos benefícios acima levará em conta os seguintes critérios:


a) a personalidade do colaborador;
b) a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do fato criminoso e a eficácia da

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colaboração.
A gravidade abstrata do delito, na verdade, não é óbice para o acordo, mas a gravidade concreta pode
servir de fundamento para a sua não homologação pelo juiz.
A lei não impõe como requisito do acordo a primariedade do agente.

Perdão judicial

O perdão judicial é uma causa de extinção da punibilidade concedida pelo juiz, na sentença, nos casos
previstos em lei.
Uma das hipóteses legais de concessão do perdão judicial é o acordo de colaboração premiada,
qualquer que seja o delito praticado pela organização criminosa, ainda que hediondo ou equiparado, pois o
texto legal não faz qualquer restrição.
Acerca do aditamento do acordo, considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério
Público, a qualquer tempo, e o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do
Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador,
ainda que esse benefício não tenha sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do
CPP (§2º do art. 4º).
Em havendo acordo de colaboração premiada, é dever do magistrado, de ofício, ao proferir a sentença,
analisar se o colaborador faz ou não jus ao perdão judicial, ainda que o aludido benefício não esteja previsto
no acordo (art. 4, §2º, da Lei 12.850/2013).

Redução da pena até dois terços

O acordo pode prever uma causa de redução da pena privativa de liberdade em até 2/3 (dois terços).
Note-se que o percentual mínimo dessa redução não é fixado pela lei, mas deve ser interpretado como
sendo de 1/6 (um sexto).
Se a colaboração for posterior à sentença, a pena poderá ser reduzida somente até a metade (§5º do
art. 4º).
O STF decidiu que é possível a incidência simultânea da confissão, como atenuante genérica (art. 65, I,
“d”, do CP), na segunda fase da aplicação da pena, e da causa de redução de pena em análise, na terceira fase,
oriunda da colaboração premiada, pois são dois institutos diferentes e, por isso, não há falar-se em “bis in
idem”.
De fato, embora a colaboração premiada pressuponha sempre uma confissão, o certo é que ela vai
além, à medida que o colaborador também se propõe a fornecer os meios de prova para o êxito da persecução
penal, de tal sorte que são dois institutos distintos.

Substituição por pena restritiva de direitos

O acordo também pode estipular a substituição de pena privativa de liberdade por pena restritiva de
direitos.
Esta substituição poderá ocorrer ainda que não estejam presentes os requisitos do art. 44 do CP, caso
contrário a previsão teria sido inócua, pois as infrações penais praticadas pela organização criminosa, que se
submetem à Lei 12.850/2013, devem ter pena superior a 4 (quatro) anos, salvo as de caráter transnacional.
A lei não prevê a substituição por simples pena de multa.
Não oferecimento da denúncia

O acordo pode estipular o não oferecimento da denúncia, que é uma espécie de imunidade penal.
Trata-se do chamado acordo de leniência, também chamado de acordo de brandura ou doçura, que é
uma causa de exclusão do processo, caracterizada pelo fato de o Ministério Público deixar de oferecer a
denúncia.
Este benefício, que é o maior de todos, representa uma exceção ao princípio da obrigatoriedade da ação

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penal pública, exigindo três requisitos.


O primeiro é que o colaborador não seja o líder, o mentor, o cabeça da organização criminosa, mas
apenas um dos executores.
O segundo é que ele seja o primeiro a prestar a efetiva colaboração. Não basta ser o primeiro a
prontificar-se a colaborar e, sim, que seja o primeiro cuja colaboração tenha realmente se revelado eficaz, em
relação a um dos cinco resultados mencionados acima.
Terceiro, que a proposta de acordo de colaboração se refira a infração de cuja existência o Ministério
Público ou a autoridade policial não tenha prévio conhecimento.
Considera-se existente o conhecimento prévio da infração quando o Ministério Público ou a autoridade
policial competente tenha instaurado inquérito ou procedimento investigatório para apuração dos fatos
apresentados pelo colaborador.
Trata-se da única hipótese em que há o acordo de colaboração premiada sem que ocorra o
oferecimento da denúncia.
No acordo pelo não oferecimento da denúncia, o Ministério Público deverá requerer ao juiz o
arquivamento do inquérito policial, utilizando como fundamento a extinção da punibilidade.
Se o juiz discordar do não oferecimento da denúncia, ele deverá se valer do art. 28 do CPP, enviando os
autos ao Procurador Geral do Ministério Público.
Ainda que beneficiado por perdão judicial ou não denunciado, o colaborador poderá ser ouvido em juízo
a requerimento das partes ou por iniciativa da autoridade judicial (§12º do art. 4º).
No perdão judicial, a denúncia é oferecida, de tal sorte que o colaborador poderá ser ouvido como
correu.
Quanto ao não denunciado, poderá ser inquirido como testemunha, sujeitando-se, destarte, às penas
do crime de falso testemunho.
Convém esclarecer que o acordo de leniência também é previsto na Lei 12.529/11, nos arts. 86 e 86,
podendo ser celebrado pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), com pessoas físicas ou
jurídicas que forem autoras de infrações contra a ordem econômica. No tocante às pessoas físicas, o acordo
de leniência impede a propositura da ação penal, nos crimes contra a ordem econômica. Em relação às pessoas
jurídicas, exclui a responsabilidade administrativa por atos praticados contra a administração pública.

Progressão de regime ou redução da pena até a metade

Quanto ao acordo de colaboração premiada celebrado após a sentença condenatória, é possível


estipular alternativamente um dos seguintes benefícios:
a) progressão de regimes, com a dispensa dos requisitos objetivos previstos para este benefício. Não se
pode, porém, dispensar os requisitos subjetivos.
b) redução da pena até a metade. Antes da sentença, o acordo pode prever uma redução de até dois
terços.

Prêmios não previstos em lei

O §7º art. 4º, introduzido pela Lei 13.964/2019, obriga o juiz a examinar a adequação dos benefícios
pactuados àqueles previstos na Lei 12.850/2013.
Vê-se assim que os prêmios, que podem figurar no acordo de colaboração premiada, são somente
aqueles previstos expressamente na Lei 12.850/2013.
Por consequência, no que tange aos possíveis prêmios, o acordo não poderá afastar as normas cogentes
previstas pelo direito penal e direito processual penal, sob pena de violação do princípio da legalidade.
Antes da alteração trazida pela Lei 13.964/2019, o Pleno do STF admitia que o acordo estipulasse
prêmios não previstos em lei. Exemplo: prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica. Outro exemplo:
substituição da pena privativa de liberdade por pena de multa. Mais um exemplo: redução da pena de multa.
Basicamente, eram dois os fundamentos:
a) o acordo de colaboração premiada é um negócio jurídico processual, cujas consequências podem

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ser acordadas pelas partes.


b) o princípio da legalidade é uma garantia estipulada para favorecer o réu, podendo assim ser afastado
em seu próprio benefício.
No tocante aos resultados, conforme já salientado anteriormente, o art. 4º, §7º, III, da Lei 12.850/2013
permite a estipulação de outros, além dos previstos em lei, ao passo que no tocante aos prêmios o art. 4º, §7º,
II, não abre esta possibilidade, enfatizando que o juiz deverá analisar a “adequação dos benefícios pactuados
àqueles previstos no caput e nos §§ 4º e 5º deste artigo”.
O que poderá se sustentar é a violação do princípio da isonomia, ou seja, à medida que o acordo pode
prever outros resultados, outros prêmios também devem ser admitidos, com vistas a manter o equilíbrio entre
ambas as partes do acordo.
Ademais, à medida que a Lei 12.850/2013 proibiu expressamente a alteração das normas sobre fixação
do regime inicial de pena e de progressão de regimes, o silêncio acerca de outras proibições pode ser
interpretado como sendo a permissão para se estipular novos benefícios, caso contrário as duas proibições
acima não precisariam ter sido mencionadas pela lei.
Em suma, apesar da redação do art. 4º, §7º, II, trazida pela Lei 13.964/2019, ter se empenhado para se
considerar taxativo o rol dos prêmios, a questão ainda continua em aberto.

Acordo de execução antecipada da pena

Quanto ao acordo de execução antecipada da pena, em que o colaborador, após a sua homologação
judicial, já inicia desde logo o cumprimento da pena acordada, é um assunto polêmico.
Uma corrente assevera que é nulo, pois não se pode impor pena sem julgamento.
Outra, referendada pelo Supremo Tribunal Federal, o reputa válida, com base na liberdade, que deve
existir nos negócios jurídicos processuais.
A meu ver, desde que os prêmios e os resultados da colaboração sejam os previstos em lei, não visualizo
qualquer ilegalidade.
Com efeito, nenhum direito é absoluto, de modo que o princípio do devido processo legal e tantos
outros do direito penal e processual penal, previstos em benefício do acusado, podem ser dispensados quando
o seu afastamento lhe for favorável.

Regime inicial de cumprimento de pena


São nulas, de acordo com o §7º do art. 4º, com redação que lhe foi dada pela lei 13.964/2019: as
cláusulas que violem o critério de definição do regime inicial de cumprimento de pena do art. 33 do Código
Penal e na LEP.
São três os regimes de cumprimento da pena privativa de liberdade: fechado, semiaberto e aberto
O art. 33 do CP, que prevê os critérios de definição do regime inicial, não pode ser afastado no acordo
de colaboração premiada.
Numa condenação à pena superior a oito anos, por exemplo, ainda que o réu seja primário, a lei prevê
o regime fechado, de tal sorte que o acordo não poderá prever o regime semiaberto ou aberto.
Quanto à mudança das características do regime, por exemplo, instituição do regime fechado domiciliar,
também não será possível, pois se trata de um prêmio não previsto pela Lei 12.850/2013.

Progressão de regime

São também nulas, de acordo com o §7º do art. 4º, com redação que lhe foi dada pela lei 13.964/2019:
as cláusulas que violarem as normas legais de progressão de regime, salvo na hipótese do §5º do art. 4º que
admite, no caso de colaboração posterior à sentença a progressão de regime ainda que ausentes os requisitos
objetivos.
As normas de progressão de regimes também não podem ser afastadas, salvo no acordo celebrado após
a sentença.
Assim, o acordo celebrado após a sentença, poderá dispensar os requisitos objetivos da progressão, por

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exemplo, a quantidade da pena cumprida, mas em hipótese alguma poderá afastar os requisitos subjetivos,
relacionados ao merecimento do condenado.

Suspensão do prazo para oferecimento da denúncia e suspensão do processo

Em relação ao colaborador, o prazo para o oferecimento da denúncia, ou então o próprio processo em


andamento, poderá ser suspenso por até 6 (seis) meses, prorrogáveis por mais 6 (seis) meses, mas nesse
período a prescrição permanece suspensa.
Trata-se, como se vê, de mais uma nova causa de suspensão do processo e de suspensão da prescrição,
aplicável, malgrado o silêncio da lei, apenas ao colaborador investigado ou acusado, que se encontra solto ou
que estava preso, mas foi solto.
Não se trata propriamente de um prêmio, pois é uma medida de caráter transitório.
A suspensão do processo depende de decisão judicial, malgrado o silêncio da lei, pois o processo é
regido pelo princípio do impulso oficial.
Quanto à suspensão do prazo para o oferecimento da denúncia, creio seja dispensável a intervenção
judicial.

Momento da colaboração

A lei não estabelece limite temporal para colaboração.


Pelo contrário, salienta que o acordo poderá também ser celebrado após a sentença condenatória.
Nada obsta assim que o acordo de colaboração seja feito até depois do trânsito em julgado, pois,
conforme já salientado, a lei não lhe impôs limites temporais.
Sobre as diferenças entre a celebração do acordo antes e depois da sentença condenatória, são as
seguintes:
a) competência. Antes da sentença, a competência para homologar o acordo é do juiz do processo de
conhecimento. Após a sentença, em grau de recurso, a competência passa a ser do tribunal competente para
julgar o recurso. Se, porém, o acordo houver sido celebrado somente após o trânsito em julgado da sentença
condenatória, a competência será do juízo da execução penal.
b) prêmios. Antes da sentença as opções de prêmios são maiores: perdão judicial, redução da pena em
até dois terços, substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e, ao primeiro delator, é
ainda possível a exclusão do processo. Após a sentença, haverá apenas duas opções: redução da pena até a
metade ou a progressão de regime, ainda que ausentes os requisitos objetivos para esta progressão.

Direitos do colaborador

São direitos do colaborador:


I - usufruir das medidas de proteção previstas na legislação específica.
Trata-se das medidas de proteção, revistas na Lei 9.807/99, às vítimas e testemunhas, que estejam
coagidas ou expostas a grave ameaça em razão de colaborarem com a investigação ou processo criminal.
Exemplos segurança na residência; transferência de residência ou acomodação provisória em local
compatível com a proteção; ajuda financeira mensal para prover as despesas necessárias à subsistência
individual ou familiar, no caso de a pessoa protegida estar impossibilitada de desenvolver trabalho regular ou
de inexistência de qualquer fonte de renda; suspensão temporária das atividades funcionais, sem prejuízo dos
respectivos vencimentos ou vantagens, quando servidor público ou militar; apoio e assistência social, médica
e psicológica.
II - ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservados.
A propósito, constitui delito previsto no art. 18:
“Revelar a identidade, fotografar ou filmar o colaborador, sem sua prévia autorização por escrito:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa”.
Se, no curso do processo, surgir a necessidade de o colaborador ser inquirido como testemunha, ainda

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assim a sua identidade terá que ser preservada, não restando outra opção que não a sua oitiva como
testemunha anônima, que não se confunde com a testemunha oculta.
A testemunha anônima não tem a sua qualificação revelada.
A testemunha oculta tem a sua qualificação revelada, mas não pode manter contado visual com os
demais corréus.
III - ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e partícipes;
O objetivo da lei é preservar a sua integridade física e evitar constrangimentos.
IV - participar das audiências sem contato visual com os outros acusados.
No interrogatório do correu colaborador, os advogados dos corréus delatados poderão lhe formular
perguntas, pois o aludido interrogatório, em relação a eles, tem natureza de prova testemunhal.
Entretanto, os corréus delatados não poderão ingressar na audiência, durante o interrogatório do
colaborador, pois este fato implicaria na violação do direito de participar das audiências sem contato visual
com os outros acusados.
O colaborador em relação aos demais corréus será uma testemunha oculta, pois não poderá ser visto
por aqueles.
V - não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem
sua prévia autorização por escrito;
A violação desta norma configura crime do art. 18, acima transcrito.
VI - cumprir pena ou prisão cautelar em estabelecimento penal diverso dos demais corréus ou
condenados.
A hipótese acima se refere tanto à prisão pena, oriunda de condenação penal transitada em julgado,
quanto à prisão cautelar.
Não se trata, porém, de uma prisão especial.

Procedimento do acordo de colaboração premiada

O acordo de colaboração premiada se sujeita a um procedimento com as seguintes fases:


a) proposta inicial;
b) recebimento da proposta;
c) negociações;
d) instrução, quando necessária;
e) acordo;
f) homologação judicial do acordo;
f) execução do acordo;
g) sentença confirmatória do acordo.

Proposta inicial

A proposta inicial, que é a declaração de Vontade para realizar o acordo de colaboração premiada, deve
emanar do investigado, acusado ou condenado.
A proposta inicial não pode emanar da autoridade policial nem do representante do Ministério Público,
mas, segundo uma corrente, eles poderão sugerir que o investigado ou acusado seja um colaborador,
mostrando-lhe os benefícios.
Outra corrente, porém, impõe uma postura absolutamente passiva do Ministério Público e da
autoridade policial, que não poderiam sequer sugerir ao investigado que optasse pela colaboração premiada.
A proposta pode ser assinada:
a) apenas pelo advogado do interessado, desde que munido de procuração com poderes especiais para
celebrar o referido acordo;
b) pessoalmente pelo interessado, assistido por seu advogado ou defensor público, que também
deverão assiná-la.
Convém ressalvar que nenhuma tratativa sobre colaboração premiada deve ser realizada sem a

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presença de advogado constituído ou defensor público.


Em duas situações, a autoridade celebrante deverá solicitar a presença de outro advogado ou a
participação de defensor público:
a) eventual conflito de interesses; ou
b) colaborador hipossuficiente.
A proposta e os seus respectivos anexos devem:
a) narrar todos os fatos ilícitos para os quais concorreu e que tenham relação direta com os fatos
investigados. Quanto aos fatos criminosos não relacionados com a investigação, podem ser omitidos.
b) descrever todas as circunstâncias dos fatos investigados;
c) indicar as provas e os elementos de corroboração dos fatos alegados.
Para cada fato criminoso descrito na proposta, abre-se um anexo, que fornecerá as bases para
a instauração de uma investigação criminal específica.
É, pois, comum acordos com inúmeros anexos.
Quanto aos destinatários da proposta, podem ser:
a) a autoridade policial, na fase das investigações;
b) o Ministério Público, na fase das investigações ou na fase processual.
Como se vê, na fase das investigações, a proposta pode ser endereçada tanto à autoridade policial
quanto ao Ministério Público.
A propósito do acordo de colaboração premiada firmado com a autoridade policial, será objeto de um
item específico,
A proposta poderá ser sumariamente indeferida, com a devida justificativa, cientificando-se o
interessado.
O indeferimento emana da autoridade policial ou do representante do Ministério Público, conforme
quem seja o seu destinatário.
Não há, destarte, o dever de recebimento da proposta, que poderá ser indeferida liminarmente.
Quanto ao juiz, não é o destinatário da proposta nem participa das tratativas ou da celebração do acordo
de colaboração premiada.

Recebimento da proposta

O recebimento da proposta, que é feito pela autoridade policial ou pelo representante do Ministério
Público, conforme a hipótese, produz os seguintes efeitos:
a) demarca o início das negociações, que visam à formalização do acordo de colaboração premiada.
b) constitui também marco de confidencialidade.
A autoridade celebrante, além de lavrar o termo de recebimento da proposta, deverá também lavrar o
termo de confidencialidade, que impõe o dever de sigilo.
As tratativas iniciais e o documento que a formaliza, até o levantamento de sigilo por decisão judicial,
não podem ser divulgados, sob pena de quebra da confiança e da boa-fé.
Os termos de recebimento de proposta de colaboração e de confidencialidade serão elaborados pela
autoridade celebrante e assinados por ela, pelo colaborador e pelo advogado ou defensor público.
c) impede o indeferimento posterior da proposta, sem justa causa.
O recebimento da proposta não obriga a autoridade celebrante a firmar o acordo de colaboração
premiada, mas a vincula a prosseguir com as tratativas.
Assim, em sendo recebida a proposta, o seu indeferimento posterior, com vistas à cessação das
tratativas, só poderá ocorrer se houver justa causa, por exemplo, continuidade da atividade criminosa.
O recebimento da proposta de colaboração ou o Termo de Confidencialidade não implica, por si só, na
suspensão da investigação, ressalvado acordo em contrário quanto à propositura de medidas processuais
penais cautelares e assecuratórias, bem como medidas processuais cíveis admitidas pela legislação processual
civil em vigor.
Assim, o recebimento da proposta não implica em suspensão das investigações, mas as partes podem
celebrar um acordo para suspender:

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a) as medidas processuais penais cautelares. É o caso da prisão cautelar e das medidas cautelares
pessoais diversas da prisão.
b) as medidas assecuratórias (arresto, sequestro e hipoteca legal).
c) as medidas processuais cíveis admitidas pela legislação processual civil em vigor.
A suspensão das referidas medidas deverão ser submetidas à apreciação judicial, mas, como o
magistrado não pode atuar de ofício na fase investigatória, não lhe restará outro caminho que não seja o do
acolhimento da suspensão dessas medidas.

Negociações ou tratativas

Com o recebimento da proposta, se inicia a fase das negociações ou tratativas.


No direito contratual, as negociações ou tratativas antecede à proposta.
Diversamente, no acordo de colaboração premiada, as negociações ou tratativas se verificam após o
recebimento da proposta.
A proposta contém informações genéricas acerca dos fatos criminosos e dos meios de obtenção de
provas, cujo detalhamento será feito somente na fase das negociações.
É ainda na fase das negociações que se discute os prêmios que poderão ser concedidos ao colaborador.
Na fase das negociações, a autoridade celebrante também pode fazer contrapropostas, ou seja, novas
propostas que modificam a proposta inicial, com vistas a aprimorá-la.
Para se conferir maior fidelidade das informações ao acordo de colaboração premiada, o registro das
tratativas e dos atos de colaboração deverá ser feito por um dos seguintes meios ou recursos:
a) gravação magnética;
b) estenotipia;
c) digital, audiovisual ou técnica similar.
É preciso disponibilizar uma cópia do material ao colaborador.
Note-se que enquanto a proposta adota a forma escrita, as tratativas devem observar uma das formas
acima mencionadas.

Instrução

O acordo de colaboração premiada poderá ser precedido de instrução, quando houver necessidade de
identificação ou complementação de seu objeto, dos fatos narrados, sua definição jurídica, relevância,
utilidade e interesse público.
A fase instrutória é facultativa, pois o acordo pode ser celebrado sem ela.
Na fase instrutória, poderá a autoridade celebrante, malgrado o silêncio da lei, inquirir o colaborador,
testemunhas e peritos.

Acordo

O acordo é a convergência, entre a vontade da autoridade celebrante e a vontade do colaborador, que


define o conteúdo da colaboração, os possíveis resultados e os prêmios que poderão ser obtidos.
Na hipótese de não ser celebrado o acordo por iniciativa da autoridade celebrante, esta não poderá se
valer de nenhuma das informações ou provas apresentadas pelo colaborador, de boa-fé, para qualquer outra
finalidade.
Se, entretanto, a não celebração do acordo ocorrer em função da má fé do colaborador, as informações
ou provas apresentadas por ele poderão ser utilizadas, inclusive, para incriminá-lo.
Sob pena de nulidade, o investigado ou acusado ou condenado não pode celebrar o acordo sem a
presença de advogado ou Defensor Público.
Quanto ao juiz, conforme já dito, com vistas à preservação do sistema acusatório, não pode participar
dessas negociações sobre o acordo.
De acordo com o art. 6º, o termo de acordo da colaboração premiada deverá ser feito por escrito e

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conter:
I - o relato da colaboração e seus possíveis resultados. Exemplo: a colaboração deverá revelar a
estrutura hierárquica e a divisão de tarefas da organização criminosa. Não basta, destarte, declarações vagas
e genéricas.
II - as condições da proposta do Ministério Público ou do delegado de polícia. Exemplo: se o objetivo for
atingido, o colaborador terá a pena reduzida em dois terços, desde que não minta em juízo.
III - a declaração de aceitação do colaborador e de seu defensor;
IV - as assinaturas do representante do Ministério Público ou do delegado de polícia, do colaborador e
de seu defensor;
V - a especificação das medidas de proteção ao colaborador e à sua família, quando necessário. Estas
medidas de proteção, previstas na Lei 9.807/99, poderão ser utilizadas quando houver risco à vida ou à
integridade física do colaborador e de seus familiares.
É sempre conveniente reiterar que o juiz não assina nem participa do acordo.

Homologação judicial do acordo

Realizado o acordo, o respectivo termo, acompanhado das declarações do colaborador e de cópia da


investigação, será remetido ao juiz para homologação.
O juiz que homologa o acordo não estará impedido de prolatar sentença, pois a hipótese não figura
entre as causas de impedimento previstas no art. 252 do CPP.
Nos processos de competência originária dos tribunais, em razão do foro por prerrogativa de função, a
competência para homologar o acordo é do relator, em decisão monocrática (art. 2º da Lei 8.038/90).
O pedido de homologação do acordo será sigilosamente distribuído, contendo apenas informações que
não possam identificar o colaborador e o seu objeto.
As informações pormenorizadas da colaboração serão dirigidas diretamente ao juiz a que recair a
distribuição, que decidirá no prazo de 48 (quarenta e oito) horas.
O juiz, em primeiro lugar, deverá ouvir sigilosamente o colaborador, acompanhado de seu advogado
ou defensor público, sem a participação do Ministério Público ou Delegado de Polícia. oportunidade em que
analisará os seguintes aspectos na homologação:
a) a sua regularidade formal, que é a observância do procedimento legal.
b) a sua legalidade, ou seja, se está ou não em consonância com a lei.
c) a adequação dos benefícios pactuados àqueles previstos no caput e nos §§ 4º e 5º do art. 4º.
Conforme se vê, os benefícios são somente aqueles autorizados pela Lei 12.850/2013, mas o assunto ainda
poderá ensejar polêmica.
d) a adequação dos resultados da colaboração aos resultados mínimos exigidos nos incisos I, II, III, IV e
V do caput do art. 4º. O acordo pode conter ainda outros resultados, desde que preveja um daqueles previstos
na Lei 12.850/2013.
e) a voluntariedade da manifestação da vontade. A análise da voluntariedade deverá ser feita com
cuidado redobrado nas hipóteses em que o colaborador está ou esteve sob efeito de medidas cautelares.
Caso o acordo não atenda os requisitos legais, o juiz, segundo a lei, tem duas opções:
a) recusar-se a homologá-lo. Trata-se, para uns, de uma decisão irrecorrível, pois a lei não prevê
nenhum recurso. Outros, porém, admitem o recurso em sentido estrito, por interpretação extensiva do art.
581, I, do CPP, pois a hipótese é de rejeição de um dos aspectos da pretensão acusatória.
A 6ª Turma do STJ, porém, tem admitido a apelação, mas, em função da dúvida objetiva sobre o recurso
cabível, tem também aceito a correição parcial, por força do princípio da fungibilidade (REsp 1834215/RS).
O recurso em sentido estrito não me parece cabível, pois o rol do art. 581 do CPP é taxativo.
A correição parcial também se revela inadequada, pois não se trata de uma decisão que causa tumulto
processual.
Realmente, a apelação é o recurso mais adequado, pois a referida decisão tem força definitiva, à medida que
obsta o negócio jurídico processual, com prejuízo às partes interessadas.
b) devolver às partes para as adequações necessárias. Na verdade, é uma conversão da homologação

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em diligência para que as próprias partes corrijam o acordo nos tópicos que não encontram guarida legal, pois,
como se sabe, o juiz não pode participar do acordo.
A decisão judicial que homologa o acordo produz os seguintes efeitos:
a) o colaborador passa a ter o direito Público subjetivo de obtenção do benefício. Trata-se de um direito
condicionado ao cumprimento das condições. Antes da sua homologação, o acordo gera apenas uma
expectativa de direito. Com a homologação, nasce o direito condicional, que só se transmudará em direito
adquirido se houver o cumprimento integral do acordo.
b) o colaborador, na fase policial, não poderá ser ouvido pelo Delegado de Polícia ou membro do
Ministério Público, sem a presença do seu Defensor;
c) nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu defensor, ao direito ao
silêncio. Não se trata propriamente de uma renúncia ao direito de silêncio, que é indisponível, mas, sim, do
seu não exercício, tanto é que, frustrado acordo, as provas obtidas não poderão ser utilizadas contra
colaborador, surtindo, destarte, o mesmo efeito do direito ao silêncio.
d) O colaborador estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade. Caso falseie, não responderá
por crime de falso testemunho, pois não é testemunha, mas perderá o benefício previsto no acordo. No acordo
de exclusão do processo, porém, o colaborador não será réu e, portanto, responderá pelo crime de falso
testemunho.
e) na fase do inquérito policial, o advogado do colaborador só pode ter amplo acesso aos autos com
autorização judicial e, mesmo assim, apenas quanto aos atos já documentados, pois não terá qualquer acesso
em relação às diligências em andamento.
A súmula vinculante 14, que prevê ao advogado o acesso aos atos documentados do inquérito policial,
foi afastada, pois, a partir da homologação do acordo, o advogado, para ter amplo acesso aos atos já
documentados do inquérito policial, precisará de autorização judicial, mas em nenhuma hipótese terá acesso
às diligências em andamento.
Assim, o acesso aos autos será restrito ao juiz, ao Ministério Público e ao delegado de polícia, como
forma de garantir o êxito das investigações, assegurando-se ao defensor, no interesse do representado, amplo
acesso aos elementos de prova que digam respeito ao exercício do direito de defesa, devidamente precedido
de autorização judicial, ressalvados os referentes às diligências em andamento.
f) o acordo de colaboração premiada e os depoimentos do colaborador serão mantidos em sigilo até o
recebimento da denúncia ou da queixa-crime. Antes disso, é vedado ao magistrado decidir por sua publicidade
em qualquer hipótese.
Por outro lado, são nulas de pleno direito as previsões de renúncia ao direito de impugnar a decisão
homologatória do acordo.
Assim, o fato de ter assinado o acordo não obsta que possa impugná-lo, recorrendo, por exemplo, da
sentença condenatória, com vistas à obtenção de benefícios maiores.
A impugnação do acordo não pode ser interpretada como “venire contra factum proprium”.
Convém, porém, registrar que os demais acusados não têm interesse em impugnar a existência nem o
conteúdo do acordo de colaboração premiada, que é um negócio jurídico processual personalíssimo, pois a
ampla defesa lhes é assegurada, mas poderão impugnar os depoimentos prestados pelo colaborador.

Execução do acordo

Após a homologação judicial, inicia-se a fase de execução do acordo de colaboração premiada, que
consiste no cumprimento pelo colaborador das condições que lhe foram estipuladas.
As provas da acusação devem ser juntadas pelo Ministério Público e não pelo colaborador, que se limita
a prestar as informações sobre os meios de obtê-las.
O colaborador, que cumpre as condições do acordo, prestando informações objetivas e eficazes, fará
jus ao benefício ainda que o delatado seja absolvido, pois a sua obrigação, em relação à condenação, é de
meio e não de resultado.
Aliás, o interesse pela condenação dos demais réus é do órgão acusatório e não do colaborador, pois
este não tem a natureza jurídica de assistente da acusação.

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Finalmente, quanto ao aditamento do acordo já homologado judicialmente, é possível quando a


colaboração mostrar-se relevante, nesse caso, tanto o Ministério Público, a qualquer tempo, quanto a
autoridade policial, durante o inquérito, poderão pleitear ao juiz a concessão do perdão judicial ao
colaborador. Se o juiz discordar, ele deverá, remeter os autos ao Procurador Geral de Justiça, aplicando-se o
art. 28 do CPP.

Confirmação do acordo pela sentença

A decisão judicial que homologa o acordo é prolatada sob condição suspensiva, pois só produzirá efeitos
se for confirmada na sentença.
Com efeito, a sentença apreciará os termos do acordo homologado anterior e sua eficácia.
Força convir, portanto, que o acordo, para surtir efeitos, exige duas decisões judiciais:
a) decisão homologatória;
b) confirmação da sua eficácia pela sentença.
Na sentença, o juiz, de forma fundamentada, pode declarar a ineficácia do acordo. Nesse caso, o
colaborador perderá o benefício, sendo que, no acordo de leniência (exclusão do processo), a denúncia poderá
ser então oferecida.
O acordo apenas prevê os possíveis benefícios, mas a definição concreta desses benefícios é função
exclusiva do juiz.
De fato, na sentença, após verificar o maior ou menor grau de eficácia da colaboração, o juiz fixará, na
medida adequada, os benefícios a que tem direito o colaborador.
Exegese diversa implicaria numa indevida e inconstitucional transferência do direito de punir ao
Ministério Público.
Em sendo, porém, cumprido totalmente o acordo, o magistrado, sob pena de ofensa ao princípio da
moralidade, deve fixar os benefícios estipulados no acordo.
O juiz ou o tribunal deve proceder à análise fundamentada na seguinte ordem:
a) do mérito da denúncia. Trata-se da materialidade e autoria. Ausente a materialidade ou autoria, ou,
em caso de dúvida, o colaborador será absolvido e, por consequência, o acordo nem será apreciado.
b) do perdão judicial. Em havendo acordo de colaboração premiada, o magistrado deverá analisar se é
ou não o caso de concessão do perdão judicial, ainda que não estipulado esse benefício.
c) das primeiras etapas de aplicação da pena. A pena privativa de liberdade é fixada em três fases: pena
base (primeira fase), agravantes e atenuantes (segunda fase) e causas de aumento ou diminuição de pena
(terceira fase).
d) concessão ou não dos benefícios pactuados.

Rescisão do acordo homologado judicialmente

A rescisão do acordo consiste na sua extinção por descumprimento das cláusulas pactuadas.
O acordo homologado poderá ser rescindido em caso de:
a) omissão dolosa sobre os fatos objeto da colaboração. Trata-se da reserva mental emanada do
colaborador, que oculta fatos criminosos, provas ou informações relacionadas com o objeto da colaboração.
b) o colaborador não cessar o envolvimento em conduta ilícita relacionada ao objeto da colaboração.
A rescisão do acordo depende de decisão judicial e gerará a perda do direito de obtenção dos prêmios
previstos no acordo.
Quanto às provas produzidas, em caso de rescisão, poderão ser utilizadas, inclusive, para incriminar o
próprio colaborador.
A lei é omissa sobre a rescisão do acordo pelo fato de o Ministério Público ter descumprido condições,
mas, nesse caso, a doutrina sugere que o colaborador terá a opção de cessar a colaboração, sem perder o
direito à obtenção dos prêmios acordados.
A rescisão, embora também dependa de decisão judicial, não se confunde com a não confirmação do
acordo pela sentença.

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Com efeito, o fundamento da rescisão é o ato ilícito praticado pelo colaborador, que oculta fatos
relevantes ou persiste na atividade criminosa relacionada com a colaboração.
O fundamento da não confirmação do acordo, por sua vez, é o descumprimento pelo colaborador das
condições fixadas no acordo, ou seja, a ineficácia da colaboração.

Retratação da proposta

A retratação é a desistência da proposta.


Convém observar que a proposta inicial sempre é feita pelo colaborador, mas, após o seu recebimento,
no decorrer das tratativas, a autoridade celebrante também poderá fazer propostas.
O §10º do art. 4º dispõe que:
“As partes podem retratar-se da proposta, caso em que as provas autoincriminatórias produzidas pelo
colaborador não poderão ser utilizadas exclusivamente em seu desfavor”.
Note-se que a retratação pode ser feita pela autoridade celebrante ou então pelo colaborador.
A lei não impõe qualquer condição para a retratação, que, na verdade, é um direito potestativo, pois
prescinde de decisão judicial e da anuência da outra parte.
Sobre o momento em que é possível a retratação da proposta, há três interpretações possíveis.
Primeira, até antes da sentença.
Segunda, até antes da decisão homologatória do acordo.
Terceira, até antes da assinatura do termo de acordo.
Como o texto legal se refere à retratação da proposta, e não à retratação do termo de acordo, a terceira
corrente se revela mais adequada, mas o assunto é polêmico, de tal sorte que não há ainda uma corrente
dominante.
Em caso de retratação, as provas que o colaborador produziu contra si mesmo não poderão ser
utilizadas exclusivamente em seu desfavor, mas, embora o assunto seja também polêmico, o certo é que a lei
não proíbe a sua utilização contra os demais réus.
Acerca da distinção entre a rescisão do acordo e a retratação da proposta, é que a rescisão depende de
decisão judicial, ao passo que a retratação da proposta pode ser feita por qualquer das partes, sem
necessidade de apreciação judicial.
O objeto da rescisão é o acordo homologado pelo juiz.
O objeto da retratação é a proposta que ainda não convertida em acordo.
Na rescisão, ao contrário da retratação, as provas podem ser aproveitadas até contra o colaborador.
Não se pode deixar de anotar a incoerência do legislador que, num primeiro momento, salienta que um
dos efeitos do recebimento da proposta é impedir o seu indeferimento posterior, pela autoridade celebrante,
sem justa causa e, depois, num segundo momento, admite a retratação da proposta por qualquer das partes,
sem exigir uma justa causa.
Na verdade, o recebimento da proposta obriga a autoridade a prosseguir com as tratativas, mas não lhe
gera o dever de celebrar o acordo, tanto é que poderá se retratar.
A incoerência, a meu ver, reside na dispensa de justa causa para a retratação.

Anulação judicial do acordo

A nulidade do acordo é a sua extinção total ou parcial, por conter ilegalidades.


Quanto à divergência entre os depoimentos de dois ou mais colaboradores, não invalida o acordo.
De conformidade com o princípio da incomunicabilidade das nulidades, a ilegalidade de uma cláusula
não contamina as demais.
Dessa forma, a nulidade de uma ou mais cláusulas do acordo não elimina a validade das demais nem
das provas que foram produzidas.
Abre-se, entretanto exceção, ao vício de vontade, cuja existência contamina o acordo como um
todo.
Outra hipótese de nulidade total é o acordo celebrado com criminoso que não integra a organização

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criminosa.
A nulidade do acordo depende de decisão judicial.
Na anulação total do acordo, as provas produzidas e as derivadas serão ilícitas, por força da teoria dos
frutos da árvore contaminada.
Difere, nesse aspecto da rescisão, pois, nesse caso, as provas permanecem válidas.
Manifestações do acusado delatado

Em todas as fases do processo, deve-se garantir ao réu delatado a oportunidade de manifestar-se após
o decurso do prazo concedido ao réu que o delatou.
Trata-se de uma norma que visa preservar os princípios do contraditório e da ampla defesa.
Assim, o prazo para a apresentações dos memoriais, após o encerramento da instrução, não pode ser
simultâneo para os corréus, pois o delatado sempre deve se manifestar após o delator.
Aliás, a regra é válida para todas as fases processuais e não apenas para a apresentação dos memoriais.
Valor probatório das declarações do colaborador

O que é dito apenas pelo colaborador, por si só, não tem nenhum valor probatório, embora sirva para
a instauração do inquérito policial.
Assim, nenhuma das seguintes medidas será decretada ou proferida com fundamento apenas nas
declarações do colaborador:
I - medidas cautelares reais ou pessoais;
II - recebimento de denúncia ou queixa-crime;
III - sentença condenatória.
É, pois, necessário, para a relevância das declarações do colaborador, que haja outras provas
confirmando-as.
É assim essencial a chamada regra de corroboração, que é o fato de o conteúdo da colaboração
premiada ser confirmado por outros elementos probatórios.
Quanto à corroboração cruzada ou recíproca, que é a confirmação de uma delação por outra delação,
não é aceita pelo STF.

Celebração do acordo pela autoridade policial

O STF considerou constitucional a possibilidade de o acordo de colaboração premiada ser celebrado na


fase do inquérito pela autoridade policial.
O Ministério Público, entretanto, deve se manifestar previamente, sem caráter vinculante, antes da
homologação judicial do acordo.
Noutras palavras, o Ministério Público não tem atribuição para rejeitar o referido acordo.
Dentre os prêmios que é facultado ao delegado de polícia acordar não poderá figurar a exclusão do
processo, pois implicaria em violação ao princípio da iniciativa do Ministério Público para o oferecimento da
ação penal pública.
Quanto ao perdão judicial, pode ser acordado pela autoridade policial, inclusive, após a homologação
judicial do acordo, através do aditamento deste (§2º do art. 4º da Lei 12.850/2013).
O perdão judicial, como se sabe, não é causa impeditiva do oferecimento da denúncia pelo órgão
acusador, mas, uma vez comprovada a eficácia do acordo, será extinta, pelo juiz, a punibilidade do
colaborador.

DOS CRIMES OCORRIDOS NA INVESTIGAÇÃO E NA OBTENÇÃO DA PROVA

Nos arts. 18 a 21, a Lei 12.850/2013 criou alguns delitos.


Em todos eles, o bem jurídico protegido é a administração da justiça e a ação penal é pública
incondicionada.
Revelar a identidade, fotografar ou filmar o colaborador

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Dispõe o art. 18 da Lei 12.850/2013:


“Revelar a identidade, fotografar ou filmar o colaborador, sem sua prévia autorização por escrito:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa”.
Trata-se de crime comum, praticável por qualquer pessoa.
O bem jurídico protegido é a administração da justiça e o segredo pessoal.
O sujeito passivo é o Estado e o colaborador.
Em se tratando do agente policial infiltrado e do policial envolvido na ação controlada, a quebra do sigilo
de sua identidade caracteriza o delito do art. 20.
São três as formas de se praticar o delito em análise.
A primeira consiste em revelar a identidade do colaborador.
Revelar significa comunicar a alguém. A revelação a uma única pessoa é suficiente para a caracterização
do crime.
Sobre o conceito de identidade, há duas correntes:
Corrente extensiva: abrange a identidade física, a identidade civil e a identidade social.
Corrente restritiva: abrange apenas a identidade física. Assim, o agente só responderia pelo crime
quando mostrar a pessoa do colaborador a outrem.
A identidade civil, por sua vez, é a que diz respeito a idade, filiação, matrimônio, domicílio,
nacionalidade, etc.
A identidade social refere-se à profissão ou outra qualidade pessoal.
Se o legislador quisesse estender o tipo penal para a identificação civil e condição social teria usado a
expressão “qualidade”, como fez no art. 309, parágrafo único, do CP.
Na doutrina, porém, prevalece a corrente extensiva.
A segunda forma de se praticar o delito consiste em fotografar o colaborador e a terceira em filmá-lo.
Nas três modalidades, o delito é excluído quando houver uma prévia autorização por escrito do
colaborador.
Se, após a consumação, o colaborador autorizar por escrito, não há falar-se em exclusão do crime, pois
o bem jurídico protegido é a administração da justiça.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo direto ou eventual.
O delito não é punido na forma culposa. Não há, por exemplo, o crime quando se filma ou fotografa
sem saber que se tratava de um colaborador.
Quanto à consumação, na modalidade revelar a identidade, se verifica no instante em que o fato é
comunicado a uma terceira pessoa.
Nas modalidades fotografar e filmar, a consumação independe de o fato ser revelado a outrem,
bastando a tirar a fotografia ou iniciar a filmagem.
Quanto à tentativa, é possível nas três modalidades.
A ação penal é pública incondicionada.

Colaboração falsa

Dispõe o art. 19 da Lei 12.850/2013:


“Imputar falsamente, sob pretexto de colaboração com a Justiça, a prática de infração penal a pessoa
que sabe ser inocente, ou revelar informações sobre a estrutura de organização criminosa que sabe
inverídicas:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.”
O sujeito ativo é o colaborador.
Trata-se de crime de mão própria, pois ele não poderá delegar a outrem a sua execução.
Não é possível, destarte, a coautoria, mas admite-se a participação, por induzimento, instigação ou
auxílio.
Quanto ao advogado, pode ser partícipe do crime.
O tipo penal não contempla como sujeito ativo o agente policial infiltrado, sendo vedada a analogia,

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mas ele poderá responder por calúnia ou denunciação caluniosa, conforme a hipótese, nos termos dos arts.
138 e 339 do CP.
O bem jurídico protegido é a administração da justiça e também a honra da pessoa injustamente
caluniada.
O tipo penal prevê dois delitos. São eles:
a) imputação falsa da prática de infração penal a pessoa que sabe inocente.
A expressão infração penal abrange tanto os crimes quanto as contravenções.
A falsidade pode recair sobre o fato ou sobre a autoria.
Na primeira, o agente imputa a alguém uma infração penal que não ocorreu.
Na segunda, a infração penal ocorreu, mas não foi praticada pela pessoa a quem se imputou.
O delito em análise, que é uma espécie de calúnia, se caracteriza pela simples imputação falsa,
distinguindo-se do crime de denunciação caluniosa que, além da imputação falsa, ainda exige a instauração
de investigação policial, processo judicial, investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade
administrativa.
Se, porém, em razão da imputação falsa, sobrevier a instauração de um desses procedimentos, o delito
em análise será absorvido pela denunciação caluniosa, que é crime mais grave.

b) revelar informações sobre a estrutura de organização criminosa que sabe inverídicas.


Aqui não há a imputação falsa de uma infração penal, recaindo a falsidade sobre a estrutura da
organização criminosa, ou seja, sobre os seus elementos essenciais. Exemplos: hierarquia, divisão de tarefas,
conexões com outras organizações criminosas.
A falsidade que recai sobre elementos secundários não constitui crime.
No tocante ao elemento subjetivo do tipo, nas duas modalidades criminosas, é o dolo direto, pois se
exige que o agente saiba, isto é, tenha certeza da falsidade.
Quanto à dúvida acerca da falsidade, exclui o delito, que não é punido a título de dolo eventual.
A consumação, malgrado o silêncio da, ocorre quando a falsidade é revelada pelo colaborador à
autoridade policial, ao Ministério Público ou ao juiz, pois se trata de crime contra a administração da justiça.
É ainda necessário, para a caracterização do crime, que a revelação seja feita na presença do advogado
constituído ou defensor público.
A revelação falsa pelo colaborador sem a presença do seu advogado constituído ou defensor público é
destituída de qualquer relevância jurídica, sendo, pois, nula, de modo que o delito em análise não se
configura.
De fato, a Lei 12.850/2013 veda qualquer ato de colaboração sem a assistência de advogado ou
defensor público.
Quanto à tentativa, não é possível na forma verbal, mas por escrito, em tese, sim.
A ação penal é pública incondicionada.

Quebra do sigilo das investigações

Dispõe o art. 20 da Lei 12.850/2013;


“Descumprir determinação de sigilo das investigações que envolvam a ação controlada e a infiltração
de agentes:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa”.
O sujeito ativo, para uns, é apenas o funcionário público que, em razão de sua função, tem acesso aos
dados sigilosos.
Aliás, nada obsta seja o delito praticado pelo próprio policial infiltrado, outrossim, pelo policial que
participou da ação controlada.
O delito em apreço é especial em relação ao previsto no art. 325 do CP, afastando-se a incidência deste
último, por força do princípio da especialidade.
A meu ver, o delito é comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa, inclusive, por particulares,
pois o tipo penal não exige que o descumprimento da determinação de sigilo das investigações seja em razão

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do cargo, emprego ou função público.


Em hermenêutica, onde a lei não distingue ao intérprete não é lícito distinguir.
O bem jurídico protegido é a administração da justiça.
O sujeito passivo é o Estado.
O núcleo do tipo é verbo descumprir, que significa violar, transgredir.
No delito em análise, o agente viola o sigilo resultante da infiltração de agentes ou da ação controlada.
Só há o crime quando estas diligências forem lícitas. Em sendo ilícitas, não há falar-se em crime,
porquanto a prova ilícita não merece a proteção legal.
Quanto à violação do sigilo oriundo da colaboração premiada, não caracteriza o delito em análise, mas
se o fato houver sido revelado por funcionário público, em razão da função, haverá o delito do art. 325 do
CP. Se se revelar a identidade do colaborador, o agente responderá pelo delito do art. 20 da Lei 12.850/2013.
O delito em estudo só versa sobre o sigilo das investigações, sendo vedada a analogia para estendê-lo à
fase processual.
Após a instauração da fase processual, a revelação do sigilo da ação controlada ou da infiltração, pode
caracterizar o delito do art. 325 do CP.
No tocante ao elemento subjetivo do tipo é o dolo direto ou eventual.
A culpa não é punida.
Consuma-se com a revelação do sigilo, ainda que para uma única pessoa, independentemente de
qualquer dano à administração pública.
O delito não é excluído pelo fato de o sigilo ter sido revelado a funcionário público não autorizado a ter
acesso às investigações.
Admite-se à tentativa, exceto na forma verbal. Se, porém, o terceiro a quem o segredo foi revelado já
tinha ciência dos fatos, haverá crime impossível.
A ação penal é pública incondicionada.

Desobedecer requisições

Dispõe o art. 21 da Lei 12.850/2013:


“Recusar ou omitir dados cadastrais, registros, documentos e informações requisitadas pelo juiz,
Ministério Público ou delegado de polícia, no curso de investigação ou do processo:
Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa”.
Trata-se de crime comum, praticável por qualquer pessoa, inclusive, pelo funcionário público.
O delito em apreço é um tipo especial de desobediência, que afasta o delito geral, previsto no art. 330
do CP.
O bem jurídico protegido é a administração da justiça.
O sujeito passivo é o Estado.
São duas as condutas criminosas:
a) recusar a cumprir requisições de dados cadastrais, registros, documentos e informações. Aqui o
agente não atende à requisição no prazo ou, se não houver prazo, a desatende por um tempo juridicamente
relevante para configurar a omissão.
b) omitir, ao cumprir a requisição, dados cadastrais, registros, documentos e informações. Nesta
hipótese, o agente cumpre a requisição, mas se omite no que deveria também constar.
Quanto ao verbo retardar, que é o mero atraso, mas com intenção de cumprir a ordem, não é
contemplado pelo tipo penal.
O delito em análise é aplicado às requisições do juiz, da autoridade policial e do Ministério Público, mas
apenas em relação aos delitos disciplinados pela Lei 12.850/2013.
Noutras hipóteses, haverá o delito de desobediência do art. 330 do CP que, entretanto, segundo a
jurisprudência dominante, não pode ser cometido por funcionário público, em razão da função.
Quanto à recusa, o retardamento ou a omissão de dados técnicos indispensáveis à propositura da ação
civil, quando requisitados pelo Ministério Público, é crime do art. 10 da Lei 7.347/1.985, que só faz menção à
requisição do Ministério Público.

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O descumprimento de requisição ilegal não caracteriza crime. Exemplo: gerente do banco se recusa a
fornecer os extratos bancários do investigado, requisitados pelo delegado de polícia ou pelo representante do
Ministério Público.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo direto ou eventual.
Quanto à culpa, por exemplo, esquecimento, não é punida.
A consumação ocorre quando o agente se abstém de responder ou então responde de forma
incompleta.
Não se admite a tentativa, pois o delito se revela omissivo próprio.
A ação penal é pública incondicionada.

Figuras típicas equiparadas à desobediência

Dispõe o parágrafo único do citado art. 21:


“Na mesma pena incorre quem, de forma indevida, se apossa, propala, divulga ou faz uso dos dados
cadastrais de que trata esta Lei”.
São quatro as condutas criminosas:
a) apossar-se: é subtrair ou se apropriar dos dados.
b) propalar: é transmitir verbalmente os dados a terceiro.
c) divulgar: é transmitir os dados a outrem por escrito ou qualquer outro meio que não seja verbal.
d) fazer uso: é empregar os dados para algum fim. Não basta fazer alusão de que tem os dados.
O delito em análise só se refere aos dados cadastrais disciplinados pela Lei 12.850/2013, sendo omisso
sobre documentos e outras informações.

CRIMES DE TRÂNSITO

(LEI 9.503/97)

ÂMBITO DE INCIDÊNCIA

O Código de Trânsito só regula a circulação de veículos nas vias terrestres, sejam elas urbanas ou rurais
(art. 1º).
Não se aplica os crimes do Código de Trânsito e, sim, os delitos do Código Penal, aos acidentes que
envolvem:
a) o tráfego marítimo: embarcações que circulam nas águas.
b) o tráfego aéreo: aeronaves que circulam pelo espaço aéreo.
c) o tráfego das vias férreas: veículos que circulam sobre os trilhos. Exemplos: trens, metrô, etc.
Há, pois, para a incidência dos crimes de trânsito, a necessidade de que haja o binômio: via terrestre e
veículo catalogado no Código de Trânsito Brasileiro.

VIAS TERRESTRES

São vias terrestres urbanas e rurais as ruas, as avenidas, os logradouros, os caminhos, as passagens, as
estradas e as rodovias, que terão seu uso regulamentado pelo órgão ou entidade com circunscrição sobre elas,
de acordo com as peculiaridades locais e as circunstâncias especiais (art. 2º).
São também consideradas vias terrestres as praias abertas à circulação pública e as vias internas
pertencentes aos condomínios constituídos por unidades autônomas e as vias e áreas de estacionamento de
estabelecimentos privados de uso coletivo (parágrafo único do art. 2º).
Vê-se assim que, em regra, os crimes de trânsito também podem ser cometidos em vias que não são
públicas. Exemplo: homicídio culposo numa rua de condomínio. Outro exemplo: lesão corporal culposa em
estrada particular localizada numa fazenda.
Há, entretanto, dois delitos que só podem ser cometidos em vias públicas. São eles: competição ou

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exibição não autorizada (art. 308) e direção de veículo sem permissão ou habilitação (art. 309).

VEÍCULOS ABRANGIDOS PELO CÓDIGO DE TRÂNSITO

O art. 96 do CTB lista os veículos abrangidos pelo Código de Trânsito e, nesta lista, não se encontram as
embarcações, aeronaves e os que circulam sobre trilhos.
Ainda que o condutor de avião, ou trem provoque o acidente em via terrestre, por exemplo, a aeronave
pousa numa rua, matando culposamente alguém, aplica-se o homicídio culposo do Código Penal. Igualmente,
quando uma lancha ou jet ski atropela alguém numa praia.
De fato, o avião, o trem e a lancha não estão classificados no Código de Trânsito como veículos
automotores.
Não basta assim, para a incidência dos crimes de trânsito, que o delito seja praticado em via terrestre,
é preciso ainda que o condutor se encontre na direção de um dos veículos que figuram nesta lista do CTB.
Nesta lista, além dos veículos automotores, como carros, motos, tratores, caminhões, etc., também
consta os veículos de tração humana, como a bicicleta, e os de tração animal, como a charrete.
Em regra, os delitos do Código de Trânsito, porém, exigem que se trate de veículo automotor, de modo
que os outros veículos, como bicicletas e charretes, ganham importância apenas em relação às sanções
administrativas.
Alguns delitos, porém, se caracterizam ainda que o veículo não seja automotor, como é o caso das
bicicletas, ciclomotores, charrete e outros. São eles: omissão de socorro (art. 304), fuga do local do acidente
(art. 305) e velocidade incompatível ou excessiva (art. 311).

VEÍCULO AUTOMOTOR

Segundo o anexo I do CTB, “veículo automotor é todo veículo a motor de propulsão que circule por seus
próprios meios, e que serve normalmente para o transporte viário de pessoas e coisas, ou para a tração viária
de veículos utilizados para o transporte de pessoas e coisas. O termo compreende os veículos conectados a
uma linha elétrica e que não circulam sobre trilhos (ônibus elétrico)”.
Convém observar que o conceito faz referência ao motor de propulsão, que é o movimento criado a
partir de uma força impulsionadora, que não precisa ser necessariamente uma combustão, pois o conceito
não exige que o motor seja movido por um combustível.
Os veículos automotores, dentre outros, são os seguintes: automóvel, motocicleta, caminhão, trator,
caminhonete, ônibus, micro-ônibus e motoneta.
Quanto ao automóvel com motor elétrico ou à bateria, também se enquadra como veículo automotor,
pois neste conceito, conforme já dito, não se exige que o motor seja de combustão.
A equiparação do ônibus elétrico a veículo automotor foi necessária, pois ele circula graças a uma linha
elétrica, ao passo que o carro elétrico circula por seus próprios meios, enquadrando-se como veículo
automotor, independentemente de equiparação.

CICLOMOTOR E BICICLETA ELÉTRICA

No tocante ao ciclomotor, o anexo I do CTB o define como sendo o veículo de duas ou três rodas, provido
de um motor de combustão interna, cuja cilindrada não exceda a cinquenta centímetros cúbicos (3,05
polegadas cúbicas) e cuja velocidade máxima de fabricação não exceda a cinquenta quilômetros por hora.
O ciclomotor exige quatro requisitos cumulativos:
a) motor de combustão;
b) que não exceda 50 (cinquenta) cilindradas;
c) que velocidade máxima de fabricação não exceda a 50 (cinquenta) quilômetros por hora;
d) veículo de duas ou três rodas.
Na doutrina, discute-se se o veículo ciclomotor é ou não equiparado ao veículo automotor.
Sobre o assunto, há duas correntes.

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Primeira, o ciclomotor é, sim, veículo automotor, pois tem propulsão que o permite circular por seus
próprios meios, servindo para o transporte viário de pessoas e coisas, enquadrando-se no conceito de veículo
automotor do anexo I do CTB.
Segunda, não é veículo automotor, pois a distinção foi estabelecida pelo próprio anexo I do CTB, sendo
vedada a analogia “in malam partem”. É a posição dominante.
O anexo I do CTB, ao definir o ciclomotor, não empregou o vocábulo “automotor”, mas este argumento
não é determinante, pois há no anexo I veículos automotores designados apenas de veículos, como ê o caso
das caminhonetes.
O fato de a legislação não exigir Carteira Nacional de Habilitação para a condução de ciclomotores
também não é um bom argumento para descaracterizá-lo como veículo automotor, pois, para dirigi-lo, exige-
se o documento de autorização, que é similar à carteira de habilitação.
Na verdade, o ciclomotor não se trata de veículo automotor pelo fato de o próprio anexo I do CTB ter
estabelecido a distinção.
Por consequência, o homicídio e lesão corporal culposos cometidos através de ciclomotor serão regidos
pelo Código Penal.
Quanto à bicicleta elétrica, não se enquadra como ciclomotor, pois este exige um motor de combustão,
por consequência, não é necessário autorização para dirigi-la.
Idêntico raciocínio se aplica ao patinete elétrico.

BEM JURÍDICO

Nos crimes de trânsito, o bem jurídico protegido, em todos eles, é a segurança viária, que tem natureza
difusa, supraindividual, pois a tutela é do interesse de toda a coletividade e, em função disso, revela-se
indisponível.
Cada crime de trânsito, entretanto, também tutela outro bem jurídico específico, que será examinado
mais adiante. No homicídio culposo, por exemplo, o bem jurídico protegido, além da segurança viária, é a vida
humana
Vê-se assim que os crimes de trânsito são pluriofensivos, porquanto ofendem mais de um bem jurídico.

SUJEITO PASSIVO

O sujeito passivo dos crimes de trânsito, além da vítima atingida diretamente pela conduta criminosa,
é toda a coletividade, titular do bem jurídico segurança viária.

SANÇÕES ADMINISTRATIVAS

O mesmo fato pode gerar sanção penal e sanção administrativa, sem que haja “bis in idem” nem
tampouco detração penal, pois as instâncias criminais e administrativas são autônomas e independentes.
Dessa forma, a pena de multa imposta pelo crime de trânsito não gera o abatimento da multa
administrativa, e vice-versa, oriunda do mesmo fato.

DISPOSIÇÕES GERAIS DOS CRIMES DE TRÂNSITO

O Código de Trânsito, ao tratar dos crimes, prevê as disposições gerais nos arts. 291 a 301, para só
depois, a partir do art. 302 definir os crimes em espécie.
Passo agora à análise dessas normas gerais.

Aplicação subsidiária

As normas gerais do Código Penal e do Código de Processo Penal são aplicadas subsidiariamente aquilo
que o Código de Trânsito não dispuser de modo diverso (art. 292). A Lei 9.099/95 também será aplicada

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subsidiariamente aos crimes de trânsito, quando não houver conflito com as disposições específicas.
Assim, nos delitos de trânsito cuja pena máxima não excede a 2 (dois) anos, será instaurado Termo
Circunstanciado, em vez de Inquérito Policial, admitindo-se também a transação penal.
É claro que, por força do princípio da especialidade, no conflito entre as normas de diplomas distintos,
deverá prevalecer a norma específica do Código de Trânsito Brasileiro.
Assim, em relação ao delito de lesão corporal culposa, há algumas hipóteses de exclusão da transação
penal e outras regras específicas, que serão abordadas oportunamente.

PENA ACESSÓRIA

Conceito

O Código de Trânsito prevê também pena acessória, que é a imposta cumulativamente com a pena
privativa de liberdade ou com a pena restritiva de direitos substitutiva da privativa de liberdade.

Espécies

A pena acessória consiste na proibição ou suspensão de se obter a permissão ou a habilitação


para dirigir veículo automotor
Na verdade, são quatro penas acessórias. Ei-las:
a) Suspensão da permissão para dirigir veículo automotor;
b) Suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor;
c) Proibição de se obter a permissão para dirigir veículo automotor;
d) Proibição de obter a habilitação para dirigir veículo automotor.
A permissão é o documento que autoriza a pessoa a dirigir o veículo automotor durante um ano. Se,
nesse período, não cometer nenhuma falta grave ou não reincidir em faltas de gravidade menor ou média, o
agente recebe a carteira de habilitação, documento que o autoriza a dirigir em caráter permanente.
A pena de suspensão da permissão ou da habilitação é aplicada ao agente que havia obtido
anteriormente o documento de permissão ou a carteira de habilitação. Em contrapartida, a pena de proibição
de se obter permissão ou a habilitação é aplicada ao agente que não tinha permissão ou habilitação para dirigir
veículo automotor.

Duração

A pena acessória de suspensão ou de proibição de se obter a permissão ou a habilitação, para dirigir


veículo automotor. tem a duração de 2 (dois) meses a 5 (cinco) anos.
O STJ exige que os mesmos critérios utilizados para a fixação da pena privativa de liberdade sejam
também aplicados à pena de suspensão ou de proibição de se obter a permissão ou a habilitação, para dirigir
veículo automotor. Se, por exemplo, o juiz aumentou em 1/6 (sexto) a pena privativa de liberdade, deverá
também aumentar em 1/6 (sexto) a aludida penalidade.
Noutras palavras, os critérios de dosagem da pena acessória são os mesmos utilizados para a pena
privativa de liberdade.

Início

A pena acessória só se inicia após o trânsito em julgado da condenação, com a entrega do documento
de permissão ou da carteira de habilitação.
Sobre a entrega do documento de permissão ou da carteira de habilitação, em regra, só deverá ser feita
após o trânsito em julgado da condenação, devendo o réu ser intimado a efetuar essa entrega ao juiz (§1º do
art. 293).
Entretanto, a pena acessória não se inicia enquanto o sentenciado estiver preso em estabelecimento

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prisional em razão de condenação penal (§2º do art. 293).


A prisão preventiva ou em flagrante, outrossim, a prisão que não se verifica em estabelecimento
prisional, como, por exemplo, o albergue domiciliar, não obstam o início desta pena acessória, pois é vedada
a analogia “in malam partem”.

Destinatários

Se o réu for reincidente em crimes de trânsito, o juiz obrigatoriamente lhe aplicará a pena acessória de
suspensão da permissão ou da habilitação para dirigir veículo automotor, além das demais penas previstas no
tipo penal (art. 296).
Vê-se assim que a aludida pena acessória para dirigir veículo automotor será necessariamente
aplicada ao réu que for reincidente em crimes de trânsito, pouco importa se a reincidência é em crime doloso
ou culposo.
É, pois, necessário, para que haja a aplicação desta pena, que os delitos geradores da reincidência
estejam previstos no Código de Trânsito Brasileiro.
Abre-se exceção aos crimes de trânsito em que o preceito secundário prevê como pena a proibição ou
suspensão para se obter a permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor, pois, nesse caso, a aludida
pena acessória será aplicada cumulativamente com a pena privativa de liberdade, independentemente de o
réu ser reincidente em crimes de trânsito.
Os delitos que preveem abstratamente a referida pena acessória são os seguintes:
a) homicídio culposo (art. 302);
b) lesão culposa (art. 303);
c) embriaguez ao volante (art. 306);
d) participação em competição ou exibição não autorizada (art. 308).
Convém acrescentar que não há qualquer inconstitucionalidade em se aplicar ao motorista profissional
a pena acessória de suspensão da carteira de habilitação, porquanto à liberdade de trabalho não é um direito
absoluto, assim como os demais direitos, podendo sofrer restrições oriundas de normas de ordem pública.
A propósito, o STJ firmou a seguinte tese:
“O fato de a infração ao art. 302 do Código de Trânsito Brasileiro – CTB ter sido praticada por motorista
profissional não conduz à substituição da pena acessória de suspensão do direito de dirigir por outra
reprimenda, pois é justamente de tal categoria que se espera maior cuidado e responsabilidade no trânsito“.

Forma de aplicação

A suspensão ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor pode
ser imposta isolada ou cumulativamente com outras penalidades (art. 292).
Na verdade, a aludida pena, por falta de previsão legal, nunca será aplicada isoladamente, mas sempre
cumulativamente com outra pena.
A pena acessória de suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo
automotor não tem caráter substitutivo da pena privativa de liberdade.
É, pois, uma sanção cumulativa e não alternativa.
Não há assim, como se vê, a possibilidade de esta pena substituir a pena privativa de liberdade, estando,
pois, derrogado o art. 47, III, do CP, que subsiste apenas em relação à autorização para dirigir veículos, que é
diferente da permissão e habilitação.
Esta autorização, a que se refere o art. 47, III, do CP, é necessária para veículos ciclomotores, isto é, com
menos de 50 (cinquenta) cilindradas.
Em tal situação, salvo nos delitos dos arts. 304, 305 e 311, não é aplicável o Código de Trânsito e, sim, o
Código Penal, sendo perfeitamente possível a substituição da pena privativa de liberdade pela pena de
suspensão da autorização para dirigir veículo.

Aplicação cautelar da suspensão ou proibição de se obter a permissão ou habilitação

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Em qualquer fase da investigação ou da ação penal, havendo necessidade para a garantia da ordem
pública, poderá o juiz, como medida cautelar, de ofício, ou a requerimento do Ministério Público ou ainda
mediante representação da autoridade policial, decretar, em decisão motivada, a suspensão da permissão ou
da habilitação para dirigir veículo automotor, ou a proibição de sua obtenção (art.294).
Creio que a possibilidade de concessão de ofício pelo juiz viola o sistema acusatório e o princípio da
imparcialidade do magistrado e, diante da inconstitucionalidade, não pode ser aceita.
Da decisão que deferir ou indeferir esta medida cautelar, é cabível o recurso em sentido estrito, sem
efeito suspensivo.
Se, porém, o pedido houver sido formulado pelo delegado de polícia, mediante representação, o
parágrafo único do art. 294, em caso de indeferimento, não prevê nenhum recurso.
A imposição em caráter cautelar não tem natureza de pena acessória, mas, sim, de medida cautelar
pessoal diversa da prisão, mas, por analogia “in bonam partem” ao art. 42 do CP, impõe-se a detração penal
em relação à pena acessória.
De fato, a pena não se inicia antes do trânsito em julgado da condenação, em razão do princípio da
presunção da inocência.

Não cabimento do habeas corpus

A imposição da suspensão do direito de dirigir veículo automotor, segundo o STJ, não tem o condão, de,
por si só, caracterizar ofensa ou ameaça à liberdade de locomoção do paciente, razão pela qual não é cabível
o manejo do habeas corpus. Assim, caso a decisão cautelar, ou a sentença que impôs a pena acessória, seja
manifestamente ilegal, o remédio cabível será o mandado de segurança.

Comunicação da suspensão ou proibição de se obter a permissão ou habilitação

A suspensão para dirigir veículo automotor ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação será
sempre comunicada pela autoridade judiciária ao Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN, e ao órgão de
trânsito do Estado em que o indiciado ou réu for domiciliado ou residente (art. 295).
Estas comunicações devem ser feitas quer a aplicação tenha sido como medida cautelar ou como pena
acessória.

MULTA REPARATÓRIA

Conceito

A multa reparatória consiste no pagamento, mediante depósito judicial, em favor da vítima, ou de seus
sucessores, de quantia em dinheiro, sempre que houver prejuízo material resultante do crime.

Natureza jurídica

Quanto à sua natureza jurídica, não se trata de pena, mas, sim, de um efeito secundário específico da
condenação, pois exige motivação expressa na sentença.
Não se trata, portanto, de efeito automático da condenação.

Execução

À medida que não é pena, a sua execução deve ser feita pela vítima, e não pelo Ministério Público, no
juízo cível.

Valor

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A multa reparatória não poderá ser superior ao valor do prejuízo demonstrado no processo.
É, pois, aplicável a todos os crimes de trânsito em que houver dano material.
De acordo com a jurisprudência, ela pode ser imposta de ofício pelo juiz.
A meu ver, a imposição de ofício deve ser vedada, pois viola o princípio da inércia da jurisdição e o
sistema acusatório, além de representar uma decisão surpresa, que atenta contra os princípios do
contraditório e da ampla defesa.
Esta multa, na verdade, é uma indenização, tendo, pois, natureza civil, e, por isso, só é devida quando
houver danos materiais (econômicos) e o seu valor não pode ultrapassar o valor dos prejuízos, sob pena de
enriquecimento sem causa, respeitado o limite máximo previsto para a multa penal.
De fato, nos termos do processo.
O §2º do art. 297, aplica-se à multa reparatória o disposto nos arts. 50 a 52 do Código Penal.
Assim, o valor desta multa é igual ao da multa penal, isto é, varia de 10 (dez) a 360 (trezentos e sessenta)
dias – multa, sendo que cada dia-multa pode ser de 1/30 (um trigésimo) até 5 (cinco) vezes o valor do salário
mínimo.

Distinção com a muita penal

Note-se que enquanto a multa penal é revertida em favor do Fundo Penitenciário Nacional, a multa
reparatória destina-se à vítima ou seus sucessores.
A multa penal, ao contrário da multa reparatória, é aplicada ainda que o delito não tenha causado
prejuízo material.

Distinção com a pena de prestação pecuniária

Cumpre ainda observar a distinção entre a multa reparatória e a pena de prestação pecuniária, prevista
no Código Penal.
A multa reparatória não substitui a pena privativa de liberdade.
A pena prestação pecuniária é aplicada em substituição à pena privativa de liberdade.
A multa reparatória não é pena, mas uma medida de caráter civil, tendo, pois, a natureza de efeito
extrapenal específico da condenação.
A prestação pecuniária, por sua vez, é uma das espécies de pena restritiva de direitos.
A multa reparatória, entretanto, não poderá ser imposta cumulativamente com a pena de prestação
pecuniária, pois a única pena restritiva de direitos cabível nos crimes de trânsito é a de prestação de serviços
à comunidade ou à entidades públicas.

Pena restritiva de direitos cabível nos crimes de trânsito

Nos crimes definidos no Código de Trânsito, nos casos em que o juiz substituir privativa de liberdade
por restritiva de direitos, esta somente poderá consistir na prestação de serviço à comunidade ou às entidades
públicas. Não poderá, destarte, substituir a pena privativa de liberdade por outra modalidade de pena
restritiva de direitos.
Vê-se assim que, nos crimes de trânsito, a única pena restritiva de direitos que é cabível é a de prestação
de serviço à comunidade ou às entidades públicas.
Nas condenações superiores a 1 (um ano), o 2o do art. 44 do CP, prevê que a pena privativa de
liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos.
Entretanto, neste caso, nos crimes de trânsito, a substituição será por uma pena restritiva de direitos e
multa, nos termos do art. 12 do CP, pois a aplicação de duas restritivas de direitos geraria a imposição, em
relação a uma delas, de uma pena restritiva de direitos diversa da prestação de serviços à comunidade ou às
entidades públicas, em flagrante violação ao art. 312-A do CTB.
Nos crimes de trânsito, a pena de prestação de serviço à comunidade ou às entidades públicas deverá

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consistir em tarefas gratuitas relacionadas com atendimento e recuperação às vítimas de acidente de trânsito.
Com efeito, dispõe o art. 312-A do CTB, que foi introduzido pela lei 13.281/2016:
“Para os crimes relacionados nos arts. 302 a 312 deste Código, nas situações em que o juiz aplicar a
substituição de pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, esta deverá ser de prestação de
serviço à comunidade ou a entidades públicas, em uma das seguintes atividades:
I - trabalho, aos fins de semana, em equipes de resgate dos corpos de bombeiros e em outras unidades
móveis especializadas no atendimento a vítimas de trânsito;
II - trabalho em unidades de pronto-socorro de hospitais da rede pública que recebem vítimas de
acidente de trânsito e politraumatizados;
III - trabalho em clínicas ou instituições especializadas na recuperação de acidentados de trânsito;
IV - outras atividades relacionadas ao resgate, atendimento e recuperação de vítimas de acidentes de
trânsito.”

Efeito extrapenal da condenação

O condutor condenado por delito de trânsito deverá ser submetido a novos exames para que possa
voltar a dirigir, de acordo com as normas estabelecidas pelo CONTRAN, independentemente do
reconhecimento da prescrição, em face da pena concretizada na sentença (art. 160).
Assim, em caso de condenação, em qualquer crime de trânsito, haverá este efeito extrapenal, que
consiste na necessidade de novos exames para que se possa voltar a dirigir.
Trata-se de um efeito automático da condenação, pois independe de menção expressa na sentença.
Caso ocorra a prescrição em face da pena concreta, o art. 160 ressalva a persistência deste efeito.
O art. 160, porém, só poderá ser aplicado em relação à prescrição executória, que se verifica após o
trânsito em julgado da condenação.
Quanto às prescrições retroativas e supervenientes, que também se baseiam na pena concreta, não
geram este efeito.
De fato, estas duas prescrições ocorrem antes do trânsito em julgado da condenação. Por consequência,
impedem que a condenação transite em julgado e, ausente o trânsito em julgado da condenação, o princípio
que prevalece é o da presunção da inocência.

Circunstâncias judiciais preponderantes

Na fixação da pena-base dos crimes de trânsito, há uma hierarquia entre as circunstâncias judiciais, pois
a culpabilidade, as circunstâncias e as consequências do crime devem merecer uma especial atenção do
julgador.
Noutras palavras, o magistrado deve conferir a estas três circunstâncias um peso maior que as demais
circunstâncias judiciais do art. 59 do CP.
Assim, de acordo com o §4º do art. 291 do CTB, o juiz fixará a pena-base segundo as diretrizes previstas
no art. 59 do Código Penal, dando especial atenção:
a) à culpabilidade do agente;
b) às circunstâncias;
c) às consequências do crime.
O caráter preponderante, conforme a hipótese, pode beneficiar ou prejudicar o réu.
As outras circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, conquanto não preponderantes, também deverão
ser levadas em conta.

Agravantes específicas

O art. 298 prevê o rol das agravantes obrigatórias da pena, que incidem na segunda fase da aplicação
da pena, aplicáveis a todos crimes de trânsito, dolosos ou culposos.
Ao lado da reincidência, são as únicas agravantes do sistema penal que também incidem sobre os delitos

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culposos.
Ressalte-se que, além dessas agravantes específicas, ainda se impõe, aos crimes dolosos de trânsito, por
força do art. 12 do CP, as agravantes dos arts. 61 e 62 do CP, que, no entanto, não se aplicam aos crimes
culposos, salvo a agravante da reincidência, esta, sim, incide sobre todos os delitos, dolosos ou culposos.
Claro que essas agravantes não são aplicáveis quando já integrarem o delito como elementar,
qualificadora ou causa de aumento de pena.
As agravantes dos incisos III, V (no transporte de passageiros) e VII do art. 298, por exemplo, não são
aplicáveis ao homicídio ou lesão culposos, pois, nesses delitos, elas já figuram como causas de aumento de
pena.
De acordo com o art. 298 do CTB, são circunstâncias que sempre agravam as penalidades dos crimes de
trânsito ter o condutor do veículo cometido a infração:

I – com dano potencial para duas ou mais pessoas ou com grande risco de grave dano patrimonial a
terceiros;
Dano potencial significa perigo, ou seja, a probabilidade concreta do dano.
Há, a rigor, duas agravantes neste inciso I:
a) dano potencial para duas ou mais pessoas.
Nos crimes em que o perigo concreto à vida, saúde ou integridade física e psíquica já funciona como
elemento do tipo não há falar-se na incidência da aludida agravante, sob pena de “bis in idem”.
A aludida agravante, no tocante ao homicídio ou lesão culposos, só é aplicável quando outras duas ou
mais pessoas não se lesionaram, mas sofreram perigo de lesão ou de morte. Se, por exemplo, por culpa do
motorista, duas ou mais pessoas morrem ou sofrem lesão corporal, não incide a aludida agravante, pois já
haverá concurso formal entre os crimes (art. 70 do CP).
b) grande risco de grave dano patrimonial a terceiros.
Aqui, não basta, para a incidência da agravante, um perigo patrimonial, mas, sim, um grande perigo,
que se caracteriza pelo fato de o perigo quase ter se convertido em dano.
Além disso, ainda é necessário o perigo de um dano patrimonial grave a terceiros, ou seja, ao patrimônio
de duas ou mais pessoas, não se computando a vítima.
O dano patrimonial grave é o de grande valor, tomando-se por base a situação econômica dos terceiros
que foram expostos ao perigo.

II - utilizando o veículo sem placas, com placas falsas ou adulteradas;


A maior dificuldade que o fato trará à persecução penal justifica a existência desta agravante.
Se a placa houver sido falsificada ou adulterada pelo condutor do veículo, ele responderá pelo delito
previsto no art. 311 do CP, mas, em contrapartida, para se evitar o “bis in idem”, não incidirá a agravante em
análise.
Por consequência, a referida agravante só será aplicada ao motorista que, embora ciente do fato, não
praticou nem participou do crime do art. 311 do CP.

III - sem possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação;


A agravante em análise não se aplica aos delitos de homicídio e lesão culposos, pois, nestes delitos, ela
já funciona como causa de aumento de pena.
Também não é aplicável aos delitos dos arts. 307, 309 e 310 do CTB, pois, nestes crimes, a falta de
permissão ou de habilitação já funciona como elemento do tipo.

IV - com Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação de categoria diferente da do veículo;

De acordo com o art. 143, os candidatos poderão habilitar-se nas categorias de A a E.


Há, pois, uma gradação das categorias de Permissão para Dirigir ou de Carteira de Habilitação.
Incide, por exemplo, esta agravante quando o motorista que provocou a lesão corporal culposa tinha
habilitação para dirigir motocicleta, mas conduzia um caminhão.

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V - quando a sua profissão ou atividade exigir cuidados especiais com o transporte de passageiros ou de
carga.
A hipótese abrange os seguintes exemplos: taxista, motorista de empresa, motorista particular,
motorista de caminhão, motorista de ônibus, motorista de vã escolar, etc.
No tocante ao homicídio e lesão culposos, a agravante só é aplicável quando se tratar de veículo de
transporte de carga, pois, no tocante ao transporte de passageiros, exclui-se a agravante pelo fato de ela já
funcionar como causa de aumento de pena.
Se, por ocasião do delito, o agente não desempenhava a profissão nem a atividade, não há falar-se na
agravante. Exemplo: motorista de ônibus provoca acidente quando dirigia o seu carro.

VI - utilizando veículo em que tenham sido adulterados equipamentos ou características que afetem a
sua segurança ou o seu funcionamento de acordo com os limites de velocidade prescritos nas especificações
do fabricante;
Não é qualquer alteração no veículo que faz incidir a agravante em análise, mas apenas a que afeta a
sua segurança, outrossim, o seu funcionamento em relação ao limite da velocidade especificada pelo
fabricante.
Não incide, por exemplo, a agravante quando a alteração da suspensão tornar o veículo ainda mais
seguro.
No tocante à alteração dos limites da velocidade, o texto legal não faz distinção se é para aumentá-la
ou reduzi-la, mas, a meu ver, não deve incidir a agravante quando o agente altera o funcionamento do motor
com vistas à redução de sua velocidade, tendo em vista que, nesse caso, o veículo se torna menos perigoso.

VII - sobre faixa de trânsito temporária ou permanentemente destinada a pedestres.


A razão da agravante é a maior reprovabilidade da conduta criminosa.
Não há falar-se, porém, na agravante quando o delito houver sido cometido sobre a faixa de trânsito
destinada a outro veículo ou a mercadorias.
A agravante em análise não incide nos delitos de homicídio e lesão culposos, pois ela já funciona como
causa de aumento de pena.
Quando o delito é cometido sobre a calçada, não há agravante, mas, em relação aos delitos de homicídio
e lesão culposos, o fato funciona como causa de aumento de pena.

Exclusão da prisão em flagrante e da fiança

Ao condutor de veículo, nos casos de acidentes de trânsito de que resulte vítima, não se imporá a prisão
em flagrante, nem se exigirá fiança, se prestar pronto e integral socorro àquela (art.301).
Trata-se de uma norma de caráter pedagógico, que visa induzir o agente a prestar socorro à vítima.

Perdão judicial

Quanto ao perdão judicial, no homicídio culposo ou lesão culposa, é possível, com base nos arts. 107,
IX, 121, §5º e 129, §8º, todos do Código Penal, quando as circunstâncias do crime atingirem o próprio agente
de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária. Exemplo: morte do filho. Outro exemplo: o
motorista culpado fica tetraplégico.
Com efeito, o art. 291 do CTB manda aplicar aos crimes de trânsito as normas gerais do CP e uma dessas
normas é justamente o art. 107, IX, que prevê o perdão judicial.
É certo, pois, que o CTB não prevê o perdão judicial, mas, durante os trâmites do seu projeto de lei,
havia previsão e o Presidente da República ao vetar esse dispositivo ressalvou que deveria ser aplicado, por
ser mais abrangente, o perdão judicial do homicídio ou lesão culposos do Código Penal.
De fato, o perdão judicial que constava no Código de Trânsito era muito restrito, pois só tinha incidência
quando a morte ou lesão culposos atingisse, exclusivamente, o cônjuge ou companheiro, ascendente,

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descendente, irmão ou afim em linha reta, do condutor do veículo.

HOMICÍDIO CULPOSO

Dispõe o art. 302, caput:


“Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor:
Penas - detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a
habilitação para dirigir veículo automotor”.
Não se aplica a Lei 9.099/95, pois a pena máxima é superior a dois anos, de modo que haverá a
instauração de inquérito policial e não de Termo Circunstanciado.
Note-se que a pena mínima é de 2 (dois) anos e, portanto, também não se admite a suspensão
condicional do processo, que só é cabível nos delitos cuja pena mínima não exceda a um ano.
Veja ainda que a pena máxima é de 4 (quatro) anos e, por isso, não é cabível a transação penal, que é
restrita aos delitos de menor potencial ofensivo, ou seja, em que a pena máxima não ultrapassa a 2 (dois)
anos.
Nada obsta, no entanto, a aplicação de “sursis” ou de pena restritiva de direitos, institutos que
substituem a pena privativa de liberdade.
Em qualquer hipótese, o motorista condenado sofrerá cumulativamente, independentemente de
reincidência, a pena de detenção e a pena acessória de suspensão ou proibição de se obter a permissão ou
habilitação para dirigir veículo automotor.
A indenização dos familiares da vítima não gera a redução da pena de um a dois terços, prevista no art.
16 do CP (Informativo 590 do STJ).
Na doutrina, porém, valiosas opiniões sustentam esta redução, pois o art. 16 do CP só nega este
benefício nos crimes cometidos com violência ou grave ameaça contra pessoa, devendo ser interpretada a
exclusão apenas em relação aos crimes dolosos.
O delito em análise, por força do princípio da especialidade, afasta a incidência do crime de homicídio
culposo previsto no Código Penal.
Sujeito ativo do crime é a pessoa que dirigia o veículo automotor. Terceiros que concorreram
culposamente com o crime, por exemplo, passageiros que instigaram a ação imprudente do motorista
também incidirão nas mesmas penas, por força da teoria monista (art. 29 do CP).
De acordo com Victor Rios Gonçalves, será aplicado o homicídio culposo do Código Penal nas seguintes
hipóteses:
“a) Pedestre que atravessa pista de rolamento em momento e local inadequados, causando a queda e
morte de um motociclista. A imprudência ocorreu no trânsito, mas por pessoa que não estava conduzindo
veículo, devendo responder pelo crime do Código Penal (art. 121, § 3º).
b) Passageiro de automóvel ou de ônibus que atira garrafa de refrigerante pela janela, provocando
acidente com morte na estrada. Igualmente, incorre em crime comum.
c) Pessoa na garupa de motocicleta que, por brincadeira, balança o veículo e provoca a queda e morte
do condutor.
d) Pessoa que mata motociclista por abrir a porta de um carro sem olhar para trás, provocando colisão.
e) Pessoa que está empurrando um carro desligado e perde o controle sobre o veículo, que atropela
alguém.
f) Responsável por oficina mecânica que se esquece de colocar determinada peça em um automóvel, o
que acaba gerando um acidente, hipótese em que a conduta culposa não é do condutor do veículo”.
O bem jurídico protegido é a vida humana e também a segurança viária.
O sujeito passivo é a vítima e toda a coletividade.
A caracterização do crime depende dos seguintes elementos:
a) culpa;
b) veículo automotor;
c) via terrestre.
Sobre a culpa, cumpre salientar que a imprudência, negligência e imperícia são as três formas de culpa.

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Não há crime quando a culpa for exclusiva da vítima, mas, em caso de culpa concorrente do motorista
e da vítima, subsiste o crime.
Se houver dolo eventual, isto é, assunção do risco de se produzir o resultado, o agente responderá por
homicídio doloso, previsto no art. 121 do CP.
A propósito do dolo eventual, o STJ firmou a seguinte tese:
“Na hipótese de homicídio praticado na direção de veículo automotor, havendo elementos nos autos
indicativos de que o condutor agiu, possivelmente, com dolo eventual, o julgamento acerca da ocorrência
deste ou da culpa consciente compete ao Tribunal do Júri, na qualidade de juiz natural da causa”.
Assim, na dúvida se houve dolo eventual ou culpa consciente, o Ministério Público deve oferecer a
denúncia por homicídio doloso, por força do princípio da obrigatoriedade da ação penal pública; e o juiz, na
dúvida, também deverá pronunciar o réu, em função do princípio do juiz natural, remetendo-o a júri.
No tocante ao veículo automotor. a expressão abrange carros, tratores, motos, ônibus, caminhões e
outros.
É, pois, todo veículo de propulsão que circule por seus próprios meios, inclusive, os conectados a uma
linha elétrica e que não circulam sobre trilhos (ônibus elétricos).
Não se compreende nesse conceito os veículos de propulsão humana (exemplo: bicicletas) e os de
tração animal (exemplo: charretes).
Os veículos que trafegam sobre trilhos, como trens, metrô, também não são abrangidos no conceito.
Igualmente, o conceito não abrange as lanchas, barcos, jet ski, aviões, etc.
Em todas essas hipóteses, aplica-se o homicídio culposo do Código Penal.
Por fim, no que tange à via terrestre, cumpre ressaltar que o tipo penal não exige que o fato ocorra em
via pública, ao contrário dos delitos previstos nos arts. 308 e 309.
Portanto, o motorista que pratica homicídio culposo em vias particulares, responderá pelo art. 302 do
CTB. Exemplos: estrada de um sítio, estacionamento de condomínio, pátio de um posto de gasolina, garagem,
etc. Em suma, qualquer que seja o lugar do crime, será aplicado o homicídio culposo do art. 302 do CTB.
A consumação ocorre com a morte.
Quanto à tentativa, não é possível.
O §1º do art. 302 prevê que a pena é aumentada de 1/3 (um terço) à 1/2 (metade), se o agente:
I – não possui permissão para dirigir ou carteira de habilitação.
Nesse caso, absorve-se o crime do art. 309, direção sem permissão ou habilitação, pois ele já funciona
como causa de aumento pena (princípio da subsidiariedade tácita ou implícita).
Exclui-se também a agravante genérica do art. 298, III, pois ela já funciona como causa de aumento de
pena.
Não incide a majorante quando houver o vencimento da carteira de motorista, pois, nesse caso, o
agente passou pelos trâmites legais para a aquisição da permissão ou habilitação (Informativo 581 do STJ).
Se o agente tem carteira de habilitação de categoria diferente ao veículo que dirigia, a meu ver, não
incide a majorante, mas haverá a agravante genérica do art. 298, IV, do CTB.
Com efeito, a direção de veículo de categoria diferente, para a qual o motorista se encontra
habilitado, não pode ser equiparada à falta de habilitação, porquanto o art. 298 do CTB trata das duas
situações em incisos separados, sinalizando o nítido propósito de distingui-las, sendo, pois, vedada a analogia
“in malam partem”.
Exegese diversa tornaria inócuo o inciso IV do art. 298 do CTB, pois a hipótese já estaria abrangida pelo
inciso III e, como se sabe, a lei não contém palavras inúteis.
Outra corrente, porém, sustenta a incidência da majorante, pelo fato de a hipótese se equiparar à falta
de habilitações.

II – praticá-lo em faixa de pedestre ou na calçada.


Afasta-se a agravante do art. 298, VII, que não pode ser aplicada, sob pena de “bis in idem”.
Não incide a causa de aumento de pena quando o delito houver sido praticado perto da faixa de
pedestre ou perto da calçada, pois é vedada a analogia “in malam partem”.
III – deixar de prestar socorro, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à vítima do acidente.

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O delito de omissão de socorro, previsto no art. 304, é também absorvido, por força do princípio da
subsidiariedade tácita.
Ainda que a vítima tenha morte instantânea incide a majorante, segundo o STJ, o que me parece
inconstitucional, pois, nesse caso, inexiste o bem jurídico “vida”.
Exclui-se a causa de aumento de pena se o socorro não foi prestado em função do risco de agressão ou
linchamento.
IV – no exercício de sua profissão ou atividade, estiver conduzindo veículo de transporte de passageiros.
Exemplos: ônibus, táxi, van escolar, etc.,
Para se evitar o “bis in idem”, exclui-se a agravante do art. 298, V, do CTB, mas se for veículo de
transporte de carga, por exemplo, caminhão, não há nenhuma causa de aumento de pena e, por
consequência, aplica-se a dita agravante.
É necessário, para a incidência da majorante, que o agente, ao tempo do crime, esteja exercendo a
profissão ou atividade de motorista, mas não se exige a presença de passageiros (Informativo 537 do STJ).
Por outro lado, incidirá a qualificadora do §3º se o agente conduziu o veículo sob influência de álcool
ou de qualquer outra substancia psicoativa que determine dependência.
Com efeito, dispõe o §3º do art. 302 do CTB, que foi introduzido pela lei 13.546/2017:
“Se o agente conduz veículo automotor sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância
psicoativa que determine dependência:
Penas - reclusão, de cinco a oito anos, e suspensão ou proibição do direito de se obter a permissão ou
a habilitação para dirigir veículo automotor.”
Trata-se de qualificadora, pois tem pena própria.
A hipótese abrange a condução do veículo sob influência do álcool ou de outra substância psicoativa
que causa dependência, como, por exemplo, cocaína.
Não se exige, porém, para a incidência da qualificadora, que a capacidade psicomotora esteja alterada,
ao contrário do que ocorre com a qualificadora similar prevista para o delito de lesão corporal culposa.
O delito de embriaguez no volante, previsto no art. 306 do CTB, deverá ser absorvido pelo homicídio
culposo, por força da subsidiariedade implícita, pois já funciona como qualificadora do homicídio culposo.
Convém esclarecer que o delito de homicídio culposo funciona como qualificadora do delito do art. 308,
§ 2o, sendo, pois, por este absorvido, por força do princípio da subsidiariedade tácita.
Por fim, no homicídio culposo, a ação penal, é pública incondicionada.

LESÃO CORPORAL CULPOSA

Dispõe o art. 303 do CTB:


“Art. 303. Praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor:
Penas - detenção, de seis meses a dois anos e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a
habilitação para dirigir veículo automotor”.
Trata-se de infração penal de menor potencial ofensivo, sujeitando-se, salvo nas hipóteses do §1º do
art. 291, à Lei 9.099/95, comportando o Termo Circunstanciado, a composição civil dos danos como causa de
extinção da punibilidade e a transação penal.
Admite-se também a suspensão condicional do processo, pois a pena mínima é inferior a 1 (um) ano.
A ação penal, em regra, é pública condicionada à representação, salvo nas hipóteses do §1º do art. 291.
No art. 129 do CP há a descrição da lesão corporal, que consiste na ofensa à integridade física ou à saúde
de outrem, ao passo que, no delito do art. 303 do CTB, o tipo penal se refere à lesão corporal, mas não
esclarece o seu significado.
Em razão disso, uma corrente sustenta a sua inconstitucionalidade, por violação do princípio da
taxatividade, que se insere no âmbito do conteúdo do princípio da reserva legal.
Não compactuo deste minoritário ponto de vista, pois a lesão corporal é uma expressão comum, que
dispensa explicação legal, abrangendo a ofensa à integridade física ou à saúde da pessoa.
O sujeito ativo é o condutor do veículo automotor.
O bem jurídico é a integridade física e a saúde fisiopsíquica da pessoa, outrossim, a segurança viária.

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O sujeito passivo é a vítima e a coletividade.


O delito exige:
a) culpa;
b) veículo automotor;
c) que o fato ocorra em via terrestre, que não precisa ser necessariamente pública.
Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) até a ½ (metade) nas mesmas hipóteses do §1º do art. 302.
Em suma, aplica-se tudo que foi dito sobre o homicídio culposo, com as algumas ressalvas.
A primeira é que o homicídio culposo nunca admite a transação penal, nem a suspensão condicional do
processo, ao passo que a lesão culposa, em regra, admite esses institutos.
Com efeito, na lesão corporal culposa, a pena mínima não excede a 1 (um) ano e, por isso, admite a
suspensão do processo, e, a pena máxima, por sua vez, não ultrapassa 2 (dois) anos, o que viabiliza a transação
penal.
A segunda é que, no homicídio culposo, instaura-se inquérito policial; na lesão culposa, por ser, em
regra, delito de menor potencial ofensivo, lavra-se o Termo Circunstanciado.
A terceira é que, no homicídio culposo, a ação penal é pública incondicionada, na lesão culposa, a ação
penal, em regra, é pública condicionada à representação, por força do art. 88 da Lei 9.099/95, salvo nas
hipóteses do §1º do art. 291.
Com efeito, o delito de lesão culposa do CTB, conforme §1º do art. 291, será de ação pública
incondicionada se o agente estiver:
I - sob a influência de álcool ou qualquer outra substância psicoativa que determine dependência;
II - participando, em via pública, de corrida, disputa ou competição automobilística, de exibição ou
demonstração de perícia em manobra de veículo automotor, não autorizada pela autoridade
competente. Convém esclarecer que o delito de lesão culposa de natureza grave ou gravíssima funciona como
qualificadora do delito do art. 308, §2o, sendo, pois, por este absorvido, por força do princípio da
subsidiariedade tácita. Por consequência, a hipótese prevista neste inciso II se refere à lesão culposa de
natureza leve, impondo-se o concurso com o delito do art. 308 “caput”.

III - transitando em velocidade superior à máxima permitida para a via em 50 km/h (cinquenta
quilômetros por hora).
Nessas hipóteses, deverá ser instaurado inquérito policial e não se admitirá os institutos composição
civil dos danos como causa de extinção da punibilidade, nem a transação penal.
Assim, se a velocidade permitida era 40 Km/h e o agente dirigia a 85 Km/h, o delito de lesão corporal
culposa, por ele causado ,dependerá de representação, será investigado através de Termo Circunstanciado e
ainda admitirá a composição civil dos danos e a transação penal, pois o excesso de velocidade, em relação à
permitida, foi de 45 Km/h.
Por fim , incidirá a qualificadora do §2º se o agente conduziu o veículo sob influência de álcool ou de
qualquer outra substancia psicoativa que determine dependência, se do crime resultar lesão corporal grave
ou gravíssima, que são os resultados previstos, respectivamente, nos §§ 1º e 2º do art. 129 do CP.
Com efeito, dispõe o §2º do art. 303 do CTB, que foi introduzido pela lei 13.546/2017:
“A pena privativa de liberdade é de reclusão de dois a cinco anos, sem prejuízo das outras penas
previstas neste artigo, se o agente conduz o veículo com capacidade psicomotora alterada em razão da
influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência, e se do crime resultar lesão
corporal de natureza grave ou gravíssima.”
A incidência da qualificadora depende de três requisitos cumulativos:
a) influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência;
b) alteração da capacidade psicomotora, em razão da influência de álcool ou de outra substância
psicoativa;
c) que do crime resulte lesão corporal de natureza grave ou gravíssima. Estas lesões são as que
produzem os resultados previstos nos §§ 1º e 2º do art. 129 do CP, respectivamente.
Quanto ao delito de embriaguez no volante, previsto no art. 306 do CTB, deverá ser absorvido, por força
da subsidiariedade implícita, pois já funciona como qualificadora do homicídio culposo.

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Em havendo lesão corporal leve, não incide a qualificadora. Nesse caso, haverá o concurso material
entre os crimes de lesão corporal culposa e embriaguez no volante (STJ, recurso especial 1.629.107/DF). Outra
corrente, porém, sustenta a absorção do crime de embriaguez ao volante, por força do princípio da consunção.

Vedação de penas restritivas de direito

A Lei 14.071/2020, publicada em 13 de outubro de 2020, passou a vedar a pena restritiva de direitos
aos delitos do:
a) 3º do art. 302 do CTB: homicídio culposo, quando o agente conduzia veículo automotor sob a
influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência.
b) § 2º do art. 303 do CTB: lesão culposa, se o agente conduzia o veículo com capacidade psicomotora
alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência, e se
do crime resultar lesão corporal de natureza grave ou gravíssima. Aqui, ao contrário do homicídio culposo,
onde basta a embriaguez para se vedar a pena restritiva de direitos, é ainda preciso a alteração da capacidade
psicomotora, em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa e que do crime resulte lesão
corporal de natureza grave ou gravíssima. Estas lesões são as que produzem os resultados previstos nos §§ 1º
e 2º do art. 129 do CP, respectivamente.

OMISSÃO DE SOCORRO

Dispõe o caput do art. 304:


“Deixar o condutor do veículo, na ocasião do acidente, de prestar imediato socorro à vítima, ou, não
podendo fazê-lo diretamente, por justa causa, deixar de solicitar auxílio da autoridade pública:
Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa, se o fato não constituir elemento de crime mais
grave”.
Trata-se de crime próprio, praticável apenas pelo condutor do veículo envolvido, sem culpa, no
acidente.
Outras pessoas, como passageiros, pedestres e demais motoristas respondem pela omissão de socorro
do art. 135 do CP.
Sobre o sujeito ativo, cumpre frisar que o motorista que responde pelo crime omissão de socorro é o
que se envolve sem culpa no acidente.
De fato, o motorista culpado pelo acidente, caso omita socorro, responderá por homicídio ou lesão
corporal culposos, majorados pela omissão de socorro (arts. 302, §1º, III, ou 303, §1º).
Na hipótese acima, o delito autônomo de omissão de socorro, previsto no art. 304, será absorvido.
Aliás, há ressalva expressa no preceito secundário do art. 304 acerca do seu caráter subsidiário,
ordenando a sua absorção quando o fato integrar crime mais grave, como elementar, qualificadora e causa de
aumento, devendo a expressão elementar, que consta no preceito secundário do tipo penal, ser interpretada
em sentido amplo, a fim de se evitar o “bis in idem”.
Se, por exemplo, um fusca colide contra a traseira de uma ferrari e, em razão da colisão, um pedestre
se machuca, na hipótese de ambos os motoristas fugirem sem prestar socorro, o motorista do fusca, que foi
o culpado exclusivo, responderá pela lesão corporal culposa do art.303, com a majorante da omissão de
socorro, ao passo que o motorista da ferrari, que não teve culpa, será incurso apenas no delito de omissão de
socorro do art. 304.
O bem jurídico tutelado, além da segurança viária, é a integridade física, a saúde e a vida da pessoa.
O sujeito passivo é a vítima da omissão e toda a coletividade.
O núcleo do tipo é o verbo deixar, que é a abstenção do socorro.
O socorro, sempre que possível, deve ser direto e imediato, isto é, prestado pelo próprio agente.
Caso não possa fazê-lo diretamente por justa causa, deverá valer-se do socorro indireto, que consiste
em solicitar o auxílio da autoridade pública.
Vê-se assim que o socorro indireto tem caráter subsidiário. Se era possível o socorro direto, mas o
agente optou pelo socorro indireto, haverá o crime.

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O tipo penal em análise é aplicado a qualquer acidente ocorrido em via terrestre. Não se exige que se
trate de veículo automotor nem tampouco que o fato ocorra em via pública.
Por consequência, abrange também os veículos disciplinados pelo Código de Trânsito, que não são
automotores, como bicicletas, charretes, bem como os acidentes de trânsito ocorridos em vias particulares,
como a rua de condomínio e a estrada de fazenda.
De acordo com o parágrafo único do art. 304, o delito se caracteriza ainda que:
a) a vítima tenha sido socorrida por terceiros. Se o socorro por terceiros não for imediato, é pacífico que
haverá o crime de omissão de socorro. Se, ao revés, o socorro por terceiros houver sido imediato, há duas
correntes Primeira, não há falar-se no delito, em face de o socorro pelo agente ter se tornado desnecessário.
Segunda, há o crime se o agente não parou o veículo para socorrer ou auxiliar no socorro.
b) a vítima tenha morte instantânea. Aqui é estranho, pois já não há vida e, portanto, tipificou-se como
criminosa uma conduta sem que houvesse um bem jurídico correspondente. Flagrante a
inconstitucionalidade, por violação dos princípios da intervenção mínima e lesividade. No STJ, contudo, a
jurisprudência proclama a existência do crime.
c) a vítima tenha sofrido apenas ferimentos leves. Se, porém, os ferimentos foram tão leves a ponto de
ela não necessitar de socorro, o delito não se perfaz.
A consumação ocorre com a omissão por tempo juridicamente relevante.
Não há aumento da pena, quando houver morte ou lesão grave, mas o juiz poderá levar em conta, cimo
consequência do crime, na dosagem da pena base, nos termos do art. 59 do CP.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de omitir socorro.
É, pois, necessário, para que haja o crime, que o agente tenha consciência de que a vítima necessitava
de socorro, sendo que a dúvida caracteriza dolo eventual.
Quanto à tentativa, não é possível, pois se trata de crime omissivo próprio.
A ação penal é pública incondicionada. O motorista culpado pelo acidente, conforme já dito, não
responde pelo crime de omissão de socorro. Neste caso, se a vítima da lesão corporal não ofertar a
representação, o agente, segundo a jurisprudência, não poderá responder pelo delito autônomo de omissão
de socorro, permanecendo impune.

FUGA DO LOCAL DO ACIDENTE

Dispõe o art. 305:


“Afastar-se o condutor do veículo do local do acidente, para fugir à responsabilidade penal ou civil que
lhe possa ser atribuída:
Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa”.
Trata-se de delito de menor potencial ofensivo.
O sujeito ativo é o condutor do veículo envolvido no acidente.
Trata-se, pois, de crime próprio, pois o agente, para responder pelo delito, deve estar envolvido no
acidente.
É ainda necessário, para que haja o delito, que o agente tenha sido o culpado pelo acidente, pois o tipo
penal refere-se em “fugir à responsabilidade penal ou civil que lhe possa ser atribuída”.
O tipo penal só abrange as hipóteses em que não há necessidade de se prestar socorro à vítima, pois,
nesse caso, o delito será de omissão de socorro.
O delito incide quando a vítima sofre ferimentos leves, mas não necessita de socorro, outrossim, em
casos de danos materiais.
De acordo com a doutrina, o delito é inconstitucional.
Com efeito, na hipótese, de afastar-se para fugir da responsabilidade civil, o delito é inconstitucional,
pelo fato de a lei não poder incriminar a dívida, à medida que a Constituição proíbe a prisão civil por dívida.
O afastamento para fugir à responsabilidade penal também é inconstitucional, pois ninguém é obrigado
a produzir provas contra si mesmo, de modo que a incriminação viola o princípio do “nemo tenetur se
detegere”.
Ademais, a fuga para se eximir da responsabilidade penal advinda de outros delitos mais graves, como

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estupro e roubo, não é incriminada, sendo desproporcional a incriminação apenas quando a fuga se relacionar
a acidentes de trânsito.
O STF, entretanto, posicionou-se pela existência do crime, ainda que tenha ocorrido apenas danos
patrimoniais, afastando a tese da inconstitucionalidade.
O bem jurídico protegido é a administração da Justiça e também a segurança viária.
O sujeito passivo é o Estado, e também a pessoa cujo direito tenha sido lesado pela fuga.
Não se exige que se trate de veículo automotor nem que o local do acidente ocorra em via pública.
Por consequência, abrange também os demais veículos disciplinados pelo Código de Trânsito, como
bicicletas e charretes, bem como as vias particulares.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade de empreender fuga, consciente de sua
responsabilidade civil ou penal.
A consumação ocorre com a fuga. que é o afastamento do local, ainda que o agente acabe sendo
identificado.
O delito é formal, pois a consumação se verifica independentemente da ocorrência do resultado visado
pela fuga, que é a subtração da responsabilidade civil ou penal.
Admite-se a tentativa. Exemplo: o agente é detido pela vítima quando iniciava a fuga.
A ação penal é pública incondicionada.
Em havendo outros delitos de trânsito, como embriaguez ao volante, direção sem habilitação, etc.,
impõe-se o concurso material com o delito em análise.
No tocante ao homicídio e lesão culposos cometidos na direção de veículo automotor, porém, a fuga já
gera o aumento da pena, em face da omissão de socorro, e, por isso, o delito em apreço é excluído, sob pena
de a fuga ser incriminada duas vezes.
Na lesão culposa, contudo, é possível o concurso com o delito em análise, se a vítima não necessitava
de socorro.

EMBRIAGUEZ AO VOLANTE

Dispõe o art. 306:


“Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou
de outra substância psicoativa que determine dependência:
Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão
ou a habilitação para dirigir veículo automotor”.
O preceito secundário prevê cumulativamente três penas: privação de liberdade, multa e a pena
acessória de suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
A pena máxima é superior a dois anos e, portanto, não se trata de crime de menor potencial ofensivo,
excluindo-se, destarte, a possibilidade de transação penal.
Quanto à suspensão condicional do processo, é admitida, porquanto a pena mínima não excede a um
ano.
O sujeito ativo é o condutor do veículo. Trata-se de crime comum, praticável por qualquer pessoa.
Quanto àquele que permite que o agente dirija em estado de embriaguez, não será partícipe, pois
responderá pelo crime do art. 310 do CTB. Trata-se de uma exceção plurarística à teoria monista.
O bem jurídico protegido é a segurança viária.
O sujeito passivo é a coletividade.
O núcleo do tipo é o verbo conduzir, que significa dirigir o veículo automotor.
A condução só se perfaz quando o agente coloca o veículo em movimento, sob seu controle de direção,
ainda que com o motor desligado.
O delito, para se caracterizar, exige a presença cumulativa dos seguintes elementos:
a) veículo automotor;
b) via terrestre;
c) que o agente esteja sob influência do álcool ou de outra substância psicoativa que determine
dependência;

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c) que a capacidade psicomotora esteja alterada.


O delito em análise só se configura quando se tratar de veículo automotor. Exclui-se assim a bicicleta, a
charrete, e outros.
O local do crime, porém, é irrelevante, pois abrange qualquer via terrestre, pública ou particular.
Exemplos: garagem, rua de condomínio, caminho de fazenda etc.
Exige-se ainda que o agente esteja sob influência do álcool ou de outra substância psicoativa que
determine dependência. Exemplos: cocaína, maconha, heroína, remédio, etc.
Sobre a apuração da embriaguez, há três sistemas:
a) sistema do parâmetro normativo ou sistema quantitativo ou sistema fechado ou sistema tarifado: é
o fato de a norma jurídica aceitar a embriaguez somente a partir de determinada concentração de álcool ou
de substância psicoativa no organismo. Atingido o limite normativo, a embriaguez é presumida em termos
absolutos e abaixo a embriaguez será excluída. Este sistema, que foi adotado no Brasil até antes da
Lei 12.760/2012, gera a impunidade do delito, pois, para esquivar-se do crime, basta o agente se recusar a
fazer o bafômetro, o exame de sangue ou o exame da urina, que são os únicos meios de se fazer esta apuração
matemática acerca da quantidade de álcool no organismo.
b) sistema aberto ou judicial: a caracterização da embriaguez pelo álcool ou outra substância psicoativa
pode ser feita por qualquer meio de prova, competindo ao juiz, no caso concreto, concluir ou não
pela existência do estado etílico.
c) sistema misto: a norma jurídica presume a embriaguez a partir de determinada concentração de
álcool ou de substância psicoativa no organismo, mas admite também outros meios de prova onde a
embriaguez é constatada sem que se apure a quantidade de álcool no organismo.
O CTB adotou o sistema misto, pois o §1o do art. 306 prevê o sistema do parâmetro normativo,
enquanto o §2 admite também o sistema aberto.
De acordo com o § 1o do art. 306 a influência do álcool será constatado por:
a) concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue, apurado em exame de
sangue.
b) concentração igual ou superior a 0,3 miligramas de álcool por litro de ar alveolar, apurado no teste
do bafômetro.
c) outros testes de alcoolemia, previstos pelo Contran, com parâmetros normativos equivalentes aos
dois anteriores. Assim, o Contran disporá sobre a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia ou
toxicológicos para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo. Quanto à influência de
substância psicoativa que causa dependência, será também regulada pelo Contran, que estipulará os
parâmetros normativos.
Atingido o patamar de 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou a 0,3 miligramas de álcool por litro
de ar alveolar ou ainda outro índice equivalente previsto nas Resoluções do Contran haverá uma presunção
absoluta de embriaguez.
O inconveniente deste parâmetro normativo é que a prova da embriaguez, no tocante à apuração
destes percentuais, só poderá ser feita por:
a) teste de alcoolemia ou teste etilômetro. É o bafômetro;
b) exame do toxicológico. É a perícia sobre a urina ou sangue.
O agente, porém, não pode ser obrigado a realizar o bafômetro nem o exame toxicológico, por força do
princípio “nemo tenetur se detegere”.
Na hipótese de o agente se recusar a realizar estes exames ou se os fizer, mas o parâmetro normativo
não for atingido, ainda assim a embriaguez poderá ser comprovada por outros meios, o que não era possível
antes da Lei 12.760/2012.
Com efeito, o §2º do art. 306, conforme redação da Lei 12.760/2012, esclarece que a prova da
embriaguez, além do teste de alcoolemia e do exame toxicológico, também pode ser feita por:
a) exame clínico. É o que analisa as reações externadas pelo agente, ou seja, os sinais objetivos da
embriaguez;
b) vídeos;
c) testemunhas;

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d) outros meios de prova em direito admitidos.


Trata-se, pois, em relação a estes meios, do sistema aberto ou judicial, onde a embriaguez pode ser
demonstrada sem a exata apuração da quantidade de álcool no organismo.
Desde a modificação trazida pela Lei 12.760/12, a influência do álcool ou de substância psicoativa pode
ser apurada sem a exigência matemática do parâmetro normativo, através do exame clínico, vídeos,
testemunhas e outros meios de prova em direito admitidos.
A propósito, o STJ firmou a seguinte tese:
“Com o advento da Lei n. 12.760/2012, que modificou o art. 306 do CTB, foi reconhecido ser dispensável
a submissão do acusado a exames de alcoolemia, pois se admite a comprovação da embriaguez do condutor
de veículo automotor por vídeo, testemunhos ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o
direito à contraprova”.
Antes da Lei 12.760/2012, em face da adoção do sistema do parâmetro normativo, era imprescindível
a aferição da concentração de álcool no sangue por meio de teste de etilômetro ou de exame de sangue,
conforme parâmetros normativos, mas, a partir da referida lei, a prova pode ser feita através de exame clínico,
vídeos, testemunhas e outros meios de prova em direito admitidos.
Claro que o agente também terá direito de produzir a contraprova, por força dos princípios do
contraditório e ampla defesa.
Por outro lado, não se pode olvidar, contudo, que, além da prova da embriaguez, o tipo penal ainda
exige que a capacidade psicomotora esteja alterada.
A simples conduta de dirigir veículo automotor em via terrestre , com concentração de álcool por litro
de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, por si só, não configura o crime previsto no art. 306 do CTB,
pois, a partir da Lei 12.760/2012, o tipo penal também passou a exigir a alteração da capacidade psicomotora.
É, pois, necessário, para a caracterização do crime, o nexo causal entre a embriaguez e a alteração da
capacidade psicomotora.
Não há, portanto, o delito quando:
a) houver embriaguez, mas sem qualquer alteração da capacidade psicomotora;
b) houver a alteração da capacidade psicomotora, mas sem embriaguez.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar a conduta descrita
no tipo penal.
O delito se consuma com a conduta de dirigir o veículo automotor, em estado de embriaguez e com a
capacidade psicomotora alterada, ainda que não haja nenhum perigo.
Basta, para a consumação, que o agente coloque o veículo em movimento, sob sua direção, ainda que
com o motor desligado.
A realização de uma pequena manobra é suficiente para a consumação, pois, diante da gravidade do
fato, não há falar-se em aplicação do princípio da insignificância.
O fato de o agente dirigir o veículo de forma normal, devagar e com cuidado, não exclui o crime.
Trata-se, pois, de crime de perigo abstrato, pois o tipo penal não exige que a conduta acarrete a
probabilidade do dano (Informativo 466 do STJ).
Há, destarte, uma presunção absoluta de periculosidade da conduta descrita no tipo penal.
Se, entretanto, houver perigo concreto a duas ou mais pessoas, incidirá a agravante genérica prevista
no art. 298, I, do CTB.
Quanto à tentativa, é assunto polêmico. A meu ver, é possível, pois o delito é plurissubisistente.
Exemplo: o agente é impedido por populares de dirigir o veículo em estado de embriaguez. Outra corrente,
porém, nega a possibilidade de tentativa.
Caso haja homicídio culposo, o delito em estudo será absorvido. Igualmente, será absorvido pela lesão
corporal culposa, quando ocorrer lesão grave ou gravíssima.
De fato , a embriaguez no volante funciona como qualificadora do homicídio culposo e da lesão corporal
culposa, quando ocorrer um dos resultados dos §§1º e 2º do art. 129 do CP, conforme preceitua o §3º do art.
302 e o §2º do art. 303 do CTB, respectivamente, aplicando-se, para justificar a absorção, o princípio da
subsidiariedade tácita.
Se, na lesão culposa, não houver os resultados dos §§1º e 2º do art. 129 do CP, ainda assim uma corrente

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propõe a absorção do crime de embriaguez no volante, por força do princípio da consunção. Outra, porém,
sustenta o concurso de crimes.

VIOLAÇÃO DA SUSPENSÃO OU PROIBIÇÃO DE DIRIGIR

Dispõe o art. 307:


“Violar a suspensão ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo
automotor imposta com fundamento neste Código:
Penas - detenção, de seis meses a um ano e multa, com nova imposição adicional de idêntico prazo de
suspensão ou de proibição”.
O sujeito ativo é a pessoa cujo direito de dirigir estava suspenso ou proibido, por decisão judicial ou
administrativa.
Note-se que, no delito do caput, ao contrário do parágrafo único, não se exige que se trate de um
condenado.
O bem jurídico protegido é a administração da justiça, além da segurança viária.
O sujeito passivo é o Estado e a coletividade.
O núcleo do tipo é o verbo violar, que significa infringir a ordem de suspensão ou proibição.
O delito em apreço, a meu ver, se verifica quando o agente, suspenso ou proibido de dirigir, formula
requerimento fraudulento para obter a permissão ou carteira de habilitação, silenciando sobre a suspensão
ou proibição.
A doutrina dominante, entretanto, não interpreta a norma desta forma, sustentando que o delito em
análise se caracteriza quando o agente, suspenso ou proibido de dirigir, desobedece a proibição e dirige o
veículo automotor.
Não concordo com a exegese acima, pois o tipo penal incrimina a violação da suspensão ou da proibição
de se “obter” a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor, que é diferente da violação da
suspensão ou da proibição da permissão ou da habilitação para dirigir veículo automotor.
Por outro lado, a suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo
automotor imposta com fundamento neste Código, abrange a decisão administrativa, a imposição como
medida cautelar pelo juiz criminal e a imposição como pena acessória.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar a conduta descrita
no tipo penal. Se o agente não tinha ciência da decisão que o proibia de dirigir, não há falar-se em crime, pois
haverá erro de tipo.
A consumação, segundo a doutrina dominante, ocorre quando o agente dirige o veículo automotor em
via pública ou particular.
Admite-se a tentativa. Exemplo: o agente é preso em flagrante no exato instante em que daria início à
condução do veículo. Outros penalistas, porém, negam a possibilidade da tentativa.
A meu ver, a consumação se verifica com o protocolo do requerimento fraudulento para se obter a
permissão ou carteira de habilitação, silenciando sobre a suspensão ou proibição, junto ao órgão competente
A ação penal é pública incondicionada.
O preceito secundário prevê três penas cumulativas, que são as seguintes:
a) detenção, de seis meses a um ano;
b) multa;
c) nova imposição adicional de idêntico prazo de suspensão ou de proibição suspensão de se obter a
permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. Se, por exemplo, a carteira de habilitação estava
suspensa por um ano, a sentença deverá impor ao agente um adicional de mais um ano de suspensão.

OMISSÃO NA ENTREGA DA PERMISSÃO OU CARTEIRA DE HABILITAÇÃO

Dispõe o parágrafo único art. 307 do CTB:


“Nas mesmas penas incorre o condenado que deixa de entregar, no prazo estabelecido no §1º do art.
293, a Permissão para Dirigir ou a Carteira de Habilitação”.

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O sujeito ativo é a pessoa cujo direito de dirigir estava suspenso, em razão de condenação penal
transitada em julgado.
O bem jurídico protegido é a administração da justiça, além da segurança viária.
O sujeito passivo é o Estado e a coletividade.
O núcleo do tipo é o verbo deixar, que significa se omitir.
O pressuposto deste crime é que haja uma condenação penal transitada em julgado, que tenha imposto
ao agente a pena acessória de suspensão da permissão ou da habilitação para dirigir veículo automotor, pois
o tipo penal exige que o delito seja praticado pelo condenado.
Não há falar-se no delito em análise, quando esta suspensão houver sido imposta pelo juiz como medida
cautelar ou administrativamente pela autoridade competente, pois é vedada a analogia “in malam partem”,
mas o agente responderá pelo crime de desobediência, previsto no art. 330 do CP.
É ainda necessário, para a caracterização do crime, que após o trânsito em julgado da condenação o
agente seja intimado a entregar ao juiz a permissão para dirigir ou a carteira de habilitação, omitindo-se por
mais de 48 (quarenta e oito) horas, nos termos do § 1º do art. 293.
Enquanto não houver esta intimação, o delito não se configura.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de não entregar o
documento no prazo legal.
A consumação se verifica quando se expira o lapso de tempo de 48 (quarenta e oito) horas, sem que o
documento tenha sido entregue.
Trata-se, pois, de crime a prazo, pois a consumação depende da expiração deste lapso de tempo, que é
contado de minuto a minuto.
Caso não conste a hora exata da intimação, o prazo será de dois dias.
Quanto à tentativa, não é possível, porquanto o delito é omissivo próprio.
A ação penal é pública incondicionada e as penas são as mesmas do caput do art. 307.

COMPETIÇÃO OU EXIBIÇÃO NÃO AUTORIZADA

Dispõe o art. 308, com redação conferida pela lei 13.546/2017:


“Participar, na direção de veículo automotor, em via pública, de corrida, disputa ou competição
automobilística ou ainda de exibição ou demonstração de perícia em manobra de veículo automotor, não
autorizada pela autoridade competente, gerando situação de risco à incolumidade pública ou privada:
Penas - detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a
permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor”.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Trata-se de crime comum.
O bem jurídico protegido é a segurança viária e também a incolumidade pública ou privada.
O sujeito passivo é a coletividade e eventualmente a pessoa que sofreu perigo.
O tipo penal prevê dois delitos:
a) corrida, disputa ou competição automobilística de veículo automotor. É o denominado “racha” ou
“pega”. Este delito é de concurso necessário, pois pressupõe o envolvimento de outras pessoas.
b) exibição ou demonstração de perícia em manobra de veículo automotor. Esta modalidade criminosa
foi introduzida pela Lei 13.546/2017. Exemplo: “cavalo de pau” com o veículo para demonstrar habilidade.
Note-se que, nesta segunda modalidade criminosa, a lei se refere a uma exibição ou demonstração, o
que pressupõe obviamente que o agente realize a conduta com a intenção de ser observado por outra pessoa.
Entretanto, a pessoa para quem ele se exibe só será participe, se concorrer para o crime, mediante
induzimento, instigação ou auxílio (art. 29 do CP).
Vê-se assim que, na exibição ou demonstração de perícia através de manobra com o veículo automotor,
o agente, ao contrário ”racha”, pode agir sozinho, pois a pessoa para quem ele se exibe só será participe, se
concorrer para o crime mediante induzimento, instigação ou auxílio (art. 29 do CP).
Melhor seria se a lei tivesse se limitado a incriminar a realização de manobra não autorizada,
independentemente do propósito de se exibir ou de fazer demonstração.
Exige-se, para a caracterização de ambos os delitos, que o fato ocorra em via pública, com veículo

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automotor.
Outrossim, que haja perigo concreto à incolumidade pública ou privada.
A incolumidade pública é violada quando o perigo atinge coletividade, que representa um número
indeterminado de pessoas.
A incolumidade privada é violada quando o perigo atinge pessoa ou pessoas determinadas.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar a conduta descrita
no tipo penal.
Na primeira modalidade criminosa, é preciso a vontade consciente de participar de corrida, disputa ou
competição automobilística.
Na segunda, exige-se a vontade consciente de exibição ou demonstração de perícia em manobra de
veículo automotor.
O elemento normativo do tipo é o fato de a conduta ser realizada sem a prévia autorização da
autoridade competente.
O delito se consuma com o surgimento da situação de risco à incolumidade pública ou privada.
Não há, portanto, necessidade que haja perigo à coletividade, pois o tipo penal também faz menção à
incolumidade privada, que deve ser interpretada como sendo o perigo a pessoa ou pessoas determinadas.
Igualmente, não é preciso que o perigo atinja pessoa ou pessoas determinadas, porquanto o tipo penal
também se refere à incolumidade pública.
Não se exige, porém, para a consumação, a ocorrência de lesão corporal.
Quanto à tentativa, é possível, quando o perigo à incolumidade pública ou privada não ocorre por
circunstâncias alheias à vontade do agente.
Outra corrente, porém, nega a possibilidade de tentativa, sob o argumento de que o início de execução
se coincide com a consumação. Nesse sentido, Victor Rios Gonçalves.
Ora, não se trata de crime de perigo abstrato, onde a conduta é suficiente para a consumação, mas,
sim, de delito de perigo concreto, cuja consumação depende do resultado naturalístico, que consiste na
demonstração da ocorrência do perigo.
Imagine, por exemplo, que o “racha” visava criar uma situação de perigo para determinada pessoa, que
estava no veículo, mas que, segundos antes do início da conduta, saiu do automóvel, sem que o agente
percebesse. Neste exemplo, se não houver nenhuma outra situação de risco, o delito será tentado, pois crime
não se consumou por circunstâncias alheias à vontade do agente.
Ambos os delitos são qualificados, quando ocorrer morte ou lesão corporal grave (§§1º e 2º do art. 308)
A expressão lesão corporal de natureza grave foi empregada em sentido amplo para abranger também
a lesão corporal gravíssima, pois o tipo penal se refere aos resultados previstos nos §§1º e 2º do art. 129 do
CP, mas a lesão corporal leve, não qualifica o delito em análise.
No caso de lesão corporal grave, a pena do tipo qualificado é de reclusão de 3 (três) a 6 (seis) anos e, se
ocorrer morte, a pena é de reclusão de 5 (cinco) a 10 (dez) anos.
Nas duas qualificadoras, além da pena de reclusão, há ainda as penas de multa e de suspensão ou
proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor, previstas no preceito
secundário do tipo penal fundamental.
São, pois, duas as qualificadoras, a morte e a lesão corporal grave e, em ambas, o delito é preterdoloso,
pois há dolo no antecedente, que é o delito do art. 308, e culpa no consequente, que é a morte ou lesão grave.
Com efeito, por ser a pena inferior à pena dos delitos dos arts. 129, §§1º e 2º e 121 do CP, força convir
que se trata de uma qualificadora preterdolosa, onde a lesão grave ou a morte ocorre a título de culpa.
Quanto aos crimes de homicídio e lesão culposos, previsto nos art. 302 e 303 do CTB, são absorvidos,
por força do princípio da subsidiariedade tácita, pois já funcionam como qualificadoras do delito em análise.
Se, no entanto, houver lesão corporal culposa de natureza leve, não incide a qualificadora. Nesse caso,
haverá concurso entre o crime de lesão culposa (art. 303) e o delito em análise (art. 308 caput).
Em havendo mais de uma morte ou lesão grave, todas culposas, o deito será um só, mas o número de
mortes ou de lesões graves será levado em conta, na fixação da pena base, como circunstância judicial do art.
59 do CP.
Caso não haja sequer culpa em relação à morte ou lesão grave, exclui-se a qualificadora.

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Convém ainda esclarecer que responderá por homicídio doloso (art. 121 do CP) ou lesão corporal grave
ou gravíssima (art. 129, §§1º e 2º do CP), o agente que quis ou assumiu o risco de matar ou causar a lesão
corporal grave, sem prejuízo da incidência do delito do art. 308, em sua forma simples.
Assim, caso haja dolo direto ou eventual em relação à morte ou lesão grave, o agente responderá pelo
delito em análise, na sua forma simples (art. 308, caput, do CTB) em concurso com os crimes dos arts. 121 ou
129, §§1º e 2º do CP.
A ação penal, tanto no tipo fundamental quanto no qualificado, é pública incondicionada.

DIREÇÃO SEM PERMISSÃO OU HABILITAÇÃO

Dispõe o art. 309 do CTB:


“Dirigir veículo automotor, em via pública, sem a devida Permissão para Dirigir ou Habilitação ou, ainda,
se cassado o direito de dirigir, gerando perigo de dano:
Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa”.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Trata-se de crime comum. Quem induz, instiga ou auxilia
alguém a dirigir nessas condições, será participe.
Quanto ao terceiro que permite, confia ou entrega a direção do veículo automotor a pessoa não
habilitada, com a habilitação cassada ou suspensa, responderá pelo crime do art. 310 do CTB. Trata-se de uma
exceção pluralística à teoria monista, pois o condutor incidirá no art. 309.
O bem jurídico protegido é a segurança viária.
O sujeito passivo é a coletividade e também a pessoa ou pessoas expostas a perigo pelo agente.
Exige-se, para a tipificação, que o fato ocorra em via pública, caso contrário não haverá crime algum.
Não há, por exemplo, o delito quando o fato houver sido praticado em ruas de condomínio fechado,
estacionamentos e garagem.
Se não houver perigo, o fato é atípico, sendo que a contravenção penal, prevista no art. 32 do LCP, de
dirigir veículo automotor sem habilitação em vias terrestres, encontra-se revogada tacitamente, nos termos
do art. 2o, § 1o, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, pois se revela incompatível com o tipo
penal em estudo (súmula 720 do STF).
A contravenção do art. 32, porém, ainda subsiste para as vias marítimas e aéreas.
É ainda necessário, além do perigo concreto, que se trate de veículo automotor.
No tocante aos ciclomotores, não há falar-se no delito em análise. A lei exige autorização para dirigir
este tipo de veículo e não habilitação ou permissão, sendo vedada a analogia “in malam partem”.
Ademais, o ciclomotor não se enquadra como veículo automotor, que é um dos elementos do tipo
penal.
Entretanto, a direção perigosa de ciclomotor, ou mesmo de bicicletas e charretes, em via pública
caracteriza a contravenção do art. 34 da LCP, assim redigida: “Dirigir veículos na via pública, ou embarcações
em águas públicas, pondo em perigo a segurança alheia”.
O art. 309 do CP incrimina o agente que dirige veículo automotor em três situações:
a) sem a devida permissão (habilitação provisória);
b) sem a devida carteira de habilitação;
c) quando cassado o seu direito de dirigir. A cassação é imposta por decisão administrativa.

Diante da proibição da analogia “in malam partem”, não há o crime em análise nas seguintes hipóteses:
a) exame médico vencido. É mera infração administrativa.
b) suspensão da carteira de habilitação. Não há crime, pois o art. 309 se refere à cassação, mas, segundo
a doutrina, configura o crime do art. 307, caput. Mas quem permite que o agente dirija responde pelo crime
do art. 310 do CTB.
c) sem portar o documento de permissão ou a carteira de habilitação. É mera infração administrativa
(art. 232).
Nas hipóteses acima, porém, haverá a contravenção penal de direção perigosa (art. 34 da LCP).
Se o agente tem carteira de habilitação de categoria diferente ao veículo que dirigia perigosamente, a

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meu ver, não responde pelo delito em análise, mas, sim, pela contravenção penal do art. 34 da LCP.
Com efeito, a direção de veículo de categoria diferente, para a qual o motorista se encontra
habilitado, não pode ser equiparada à falta de habilitação, porquanto o art. 298 do CTB trata das duas
situações em incisos separados, sinalizando o nítido propósito de distingui-las, sendo, pois, vedada a analogia
“in malam partem”.
Exegese diversa tornaria inócuo o inciso IV do art. 298 do CTB, pois a hipótese já estaria abrangida pelo
inciso III e, como se sabe, a lei não contém palavras inúteis.
Outra corrente, porém, sustenta a incidência do crime do art. 309, considerando também a hipótese
como sendo de falta de habilitação.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar a conduta descrita
no tipo penal.
A consumação se verifica quando ocorre o perigo concreto em relação a pelo menos uma pessoa.
Quanto ao perigo suportado pelo próprio motorista, a meu ver, é insuficiente para a caracterização do
crime, pois ninguém pode ser ao mesmo tempo sujeito ativo e sujeito passivo de sua própria conduta.
Sobre a consumação, outra corrente, defendida por Victor Rios Goncalves, sustenta que
basta demonstrar que o agente conduzia o veículo sem habilitação e de forma anormal, irregular,
sendo desnecessário provar que certa pessoa sofreu efetiva situação de risco.
Não compactuo desse ponto de vista, pois o tipo penal faz expressa menção ao perigo de dano.
Por consequência, a mera direção sem habilitação, com violação das normas de trânsito, mas sem
causar qualquer perigo, é fato atípico.
Quanto à tentativa, a meu ver, é possível, quando o perigo não se verifica por circunstâncias alheias à
vontade do agente. Outra corrente, porém, nega a sua possibilidade.
A ação penal é pública incondicionada.
Em se tratando de carteira de habilitação falsa, o agente responderá pelo delito em análise e pelo crime
de uso de documento falso (art. 304 do CP), em concurso material.
O delito em estudo é absorvido pelo homicídio ou lesão corporal culposos, previstos nos arts. 302 e
303, pois já os integra como causa de aumento de pena.
Será também absorvido pelos delitos de embriaguez ao volante (art. 306), participação em competição
não autorizada (art. 308) e excesso de velocidade (art. 311), pois, em todos eles, há a exigência do perigo,
mas a falta de permissão ou habilitação servirá como agravante genérica destes delitos, nos termos do art.
298, III, do CTB.

CONFIAR OU ENTREGAR A DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR A PESSOA NÃO HABILITADA

Dispõe o art. 310 do CTB:


“Permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada, com habilitação
cassada ou com o direito de dirigir suspenso, ou, ainda, a quem, por seu estado de saúde, física ou mental, ou
por embriaguez, não esteja em condições de conduzi-lo com segurança:
Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa”.
Trata-se de crime comum, praticável por qualquer pessoa e não apenas pelo proprietário ou possuidor
do veículo.
O bem jurídico protegido é a segurança viária
O sujeito passivo é a coletividade
Os núcleos do tipo são os verbos permitir, confiar e entregar.
Permitir é a concessão expressa para que a pessoa dirija o veículo.
Confiar é a concessão tácita para que a pessoa dirija o veículo. É, pois, o fato de o agente perceber que
a pessoa dirige ou vai dirigir o veículo automotor e, no entanto, quedar-se inerte. Noutras palavras, no verbo
confiar o delito é praticado por omissão
Entregar é passar a posse ou detenção do veículo à pessoa.
O tipo penal não exige que o fato seja cometido em via pública, de modo que o delito se caracteriza
ainda que ocorra em condomínios, estacionamentos e garagens.

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Em sentido contrário, exigindo que se trate de via pública, há a opinião de Victor Gonçalves Rios.
É ainda necessário, para a tipificação, que o destinatário do veículo automotor seja uma das
seguintes pessoas:
a) não habilitada. Exemplos: entrega da direção de veículo automotor a menor de 18 (dezoito) anos, a
deficiente visual, a deficiente mental ou a qualquer outra pessoa sem habilitação.

b) com habilitação cassada. É a perda do direito de dirigir, em razão de decisão administrativa.


c) com o direito de dirigir suspenso. A suspensão pode ser imposta por decisão judicial ou
administrativa
d) que, por seu estado de saúde, física ou mental ou por embriaguez, não esteja em condições de
conduzi-lo com segurança. Esta hipótese é aplicada à pessoa que é habilitada, mas que se encontra
momentaneamente sem condições físicas ou mentais para dirigir. Exemplos: bêbados e drogados.
Esta pessoa a quem se entregou, permitiu ou confiou a direção do veículo automotor, não comete delito
algum, mas se vier a expor alguém em perigo haverá o delito de dirigir sem habilitação (art. 309) ou
embriaguez ao volante (art. 306).
O tipo penal não incrimina a entrega do veículo automotor às seguintes pessoas:
a) motorista com exame médico vencido;
b) motorista habilitado, mas que, no momento, não portava a carteira de habilitação;
c) motorista habilitado, mas para veículo de categoria diferente. Esta hipótese, a meu ver, não pode ser
equiparada à falta de habilitação, porquanto o art. 298 do CTB trata das duas situações em incisos separados,
sinalizando o nítido propósito de distingui-las, sendo, pois, vedada a analogia “in malam partem”. Outra
corrente, porém, sustenta a incidência do crime do art. 310, considerando também a hipótese como sendo de
falta de habilitação.
No tocante à entrega da direção de veículo ciclomotor a pessoa não autorizada, também é fato atípico,
pois para dirigir este tipo de veículo não se exige documento de permissão ou carteira de habilitação, mas,
sim, o documento de autorização, que não é contemplado pelo tipo penal do art. 310, sendo vedada a analogia
“in malam partem”.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade de realizar a conduta descrita no tipo
penal, consciente de uma das situações acima.
Se, por erro, ainda que inescusável, o agente supõe que a pessoa era habilitada, não há falar-se em
crime, em razão do erro de tipo.
O delito não é punido na forma culposa. Não há, portanto, o crime quando o filho menor ou sem
habilitação dirige o veículo sem autorização dos pais.
A consumação ocorre no instante em que a pessoa começa a dirigir o veículo automotor, pondo-o em
movimento, independentemente de qualquer situação de perigo concreto.
Trata-se, pois, de delito de perigo presumido.
A propósito, dispõe a súmula 575 do STJ:
“Constitui crime a conduta de permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor à pessoa
que não seja habilitada, ou que se encontre em qualquer das situações previstas no art. 310 do CTB,
independentemente da ocorrência de lesão ou de perigo de dano concreto na condução do veículo”.
Quanto à tentativa, é possível. Exemplo: a pessoa é impedida de dirigir quando já estava prestes a ligar
o veículo.
A ação penal é pública incondicionada.

VELOCIDADE INCOMPATÍVEL OU EXCESSIVA

Dispõe o art. 311:


“Trafegar em velocidade incompatível com a segurança nas proximidades de escolas, hospitais, estações
de embarque e desembarque de passageiros, logradouros estreitos, ou onde haja grande movimentação ou
concentração de pessoas, gerando perigo de dano:
Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa”.

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O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, pois o delito é comum.


O bem jurídico protegido é a segurança viária.
O sujeito passivo é a coletividade e a pessoa ou pessoas expostas a perigo.
O delito consiste em trafegar em velocidade incompatível com a segurança de certos locais.
Não se exige que se trate de veículo automotor. Portanto, abrange também charretes, bicicletas,
ciclomotores outros veículos que figuram na lista do art. 96 do CTB.
Também não há necessidade que o fato ocorra em via pública.
A velocidade incompatível, quando houver placa de sinalização da velocidade, é a que extrapola o limite
previsto. Se, no entanto, não houver esta placa, é preciso analisar o caso concreto.
Para se comprovar a velocidade incompatível, admite-se todos os meios de prova, inclusive, radares e
testemunhas.
Há uma lacuna no tipo em análise, que só incrimina o perigo oriundo da velocidade incompatível,
silenciando sobre o perigo advindo de outras manobras, como , por exemplo, “cavalo de pau”, restando para
estas situações, diante da vedação da analogia “in malam partem”, o enquadramento na contravenção de
direção perigosa (art. 34 da LCP).
Impõe-se, ainda , para que haja o crime, a presença do elemento espacial do tipo, ou seja, que o fato
ocorra nas proximidades de um dos locais indicados pelo art. 301: escolas, hospitais, estações de embarque e
desembarque de passageiros, logradouros estreitos, ou onde haja grande movimentação ou concentração de
pessoas.
É preciso que o fato ocorra nas proximidades de um destes locais, que abrange o entorno, sem que
exigir que seja em frente.
O legislador, na fórmula genérica, se refere a local “onde haja grande movimentação ou concentração
de pessoas” e, dessa forma, sinalizou que os locais mencionados na fórmula casuística ou exemplificativa, que
são as escolas, hospitais, estações de embarque e desembarque de passageiros e logradouros estreitos,
também só ensejarão o delito quando houver também grande movimentação ou concentração de pessoas.
A conclusão só pode ser essa, como bem esclarece Victor Rios Gonçalves, uma vez que, durante a
madrugada, por exemplo, não existe diferença entre dirigir em excesso de velocidade ao lado de uma escola
ou de qualquer outro lugar.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar a conduta descrita
no tipo penal.
É mister, para a configuração do crime, que o agente tenha consciência que se trata de um daqueles
locais descritos no tipo penal. Em caso de não ter ciência disto, não há falar-se em crime, ainda que o erro seja
inescusável.
A consumação só ocorre quando, em razão da velocidade incompatível, houver probabilidade de dano,
pois o delito é de perigo concreto.
Não basta, portanto, a velocidade incompatível.
Quanto à tentativa, é possível. Outros autores, porém, não a admitem.
Ora, imagine, por exemplo, que o agente, para causar perigo, imprima velocidade excessiva rumo a
determinada escola, mas segundos antes de atingir as proximidades do local, é parado pela polícia. A meu
ver, é um exemplo de tentativa.
A ação penal é pública incondicionada.
Se, em razão da velocidade incompatível, houver homicídio ou lesão culposos, o delito em análise, será
absorvido, por força do princípio da consunção.

FRAUDE PROCESSUAL

Dispõe o art. 312:


“Inovar artificiosamente, em caso de acidente automobilístico com vítima, na pendência do respectivo
procedimento policial preparatório, inquérito policial ou processo penal, o estado de lugar, de coisa ou de
pessoa, a fim de induzir a erro o agente policial, o perito, ou juiz.
Penas — detenção, de seis meses a um ano, ou multa.

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Parágrafo único. Aplica-se o disposto neste artigo, ainda que não iniciados, quando da inovação, o
procedimento preparatório, o inquérito ou o processo aos quais se refere”.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, ainda que não esteja envolvida no acidente. Exemplo: o tio
do motorista vai até o local e altera a posição do veículo.
O bem jurídico protegido é a administração da justiça e a segurança viária.
O sujeito passivo é o Estado e também a coletividade.
Trata-se de um tipo especial de fraude processual que, portanto, afasta a incidência do tipo genérico
previsto no art. 347 do CP.
A conduta criminosa consiste no emprego de fraude para alterar o estado de lugar, da coisa ou da
pessoa e assim induzir a erro o agente policial, o perito, ou o juiz.
Exemplos:
a) retirar os estilhaços de vidro do local do crime;
b) mudar a posição dos cadáveres;
c) apagar os sinais de frenagem no asfalto.
A simples fuga, sem alterar o estado de lugar, da coisa ou da pessoa, não configura o delito em análise,
mas, sim, o previsto no art. 305 do CTB.
Só se aplica o delito em apreço em relação aos acidentes automobilísticos com vítima. Não se exige que
haja morte. Bastam lesões corporais. Se houver apenas danos patrimoniais, não há falar-se em crime.
A expressão “acidentes automobilísticos” deve ser interpretada como acidentes com veículos
automotores e não apenas com automóveis, mas certamente também ensejará interpretações restritivas para
se excluir, por exemplo, os acidentes que envolvem apenas motocicletas.
Não é preciso que o fato ocorra em via pública e nem que, ao tempo da conduta, já se tenha instaurado
o procedimento preparatório, o inquérito policial ou o processo-crime.
A propósito, o parágrafo único do dispositivo em análise esclarece que o delito se caracteriza, ainda que
não iniciados, quando da inovação, o procedimento preparatório, o inquérito ou o processo aos quais se
refere.
Aliás, ainda que não haja nenhum crime de trânsito anterior, o delito pode se configurar, quando o
acidente automobilístico com vítima motivar a instauração de um destes três procedimentos policiais.
Exemplo: o motorista que, sem culpa, atropela o pedestre que se atirou à frente do seu veículo, altera o local
dos fatos.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar os elementos do
tipo.
Exige-se ainda o fim de induzir a erro o agente policial, o perito, ou juiz.
A mera alteração do estado de lugar, da coisa ou da pessoa, sem o propósito de induzir a erro o agente
policial, o perito, ou juiz, é fato atípico.
Não se exige o propósito de beneficiar a si próprio ou a terceiro nem o fim de causar prejuízo.
A consumação com a conduta de alteração do estado de lugar, de coisa ou de pessoa,
independentemente do resultado.
Assim, o delito se caracteriza, ainda que a conduza não surta o efeito de induzir a erro o agente policial,
o perito, ou juiz.
Trata-se, portanto, de crime formal.
Quanto à tentativa, é possível. Exemplo: o agente é impedido por terceiro de alterar o local do crime.
A ação penal é pública incondicionada.
Haverá concurso material entre o delito em análise e o eventual crime de trânsito anterior, quando
praticados pelo mesmo agente.

VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER (LEI 11.340/2006)

INTRODUÇÃO

A lei em análise tem dois objetivos:

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a) proteção à mulher que é vítima de violência doméstica e familiar. Exemplos: atendimento policial
especializado e concessão das medidas protetivas de urgência.
b) tratamento jurídico mais rigoroso ao agressor. Exemplo: exclusão da Lei 9.099/95 às infrações penais
cometidas em ambiente de violência doméstica e familiar contra mulher.

FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL

A coibição da violência no âmbito familiar tem fundamento constitucional no art. 226, §8º, da CF, cujo
teor é o seguinte:
“O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando
mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”.

FUNDAMENTO CONVENCIONAL

O combate da violência contra mulher é ainda previsto, no âmbito do direito internacional, na


Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, que foi concluída em
Belém do Pará, em 9 de junho de 1984, por isso, é também conhecida como Convenção de Belém do Pará,
tendo sido aprovada, no Brasil, pelo Decreto Legislativo nº 107/1995 e promulgada pelo Decreto 1.973/1996.
A violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos
humanos (art. 6º).

FUNDAMENTO LEGAL

A Lei 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, instituiu os mecanismos contra a violência
doméstica e familiar à mulher.
A lei recebeu este nome em função da luta da farmacêutica Maria da Penha para ver seu marido
agressor condenado.
Cumpriu-se assim, através da Lei Maria da Penha, os compromissos internacionais assumidos pelo
Brasil.
Há uma imprecisão técnica na terminologia “violência doméstica e familiar”, pois, na verdade, a
violência pode ser doméstica ou familiar, podendo ainda ocorrer nas relações de afeto.

MARIA DA PENHA

Maria da Penha é uma farmacêutica brasileira, nascida em Fortaleza, no ano de 1945.


Em 1983, o marido tentou matá-la duas vezes, mas, antes disso, já a agredia constantemente.
Na primeira, simulou um assalto e atirou em suas costas, enquanto ela dormia, deixando-a paraplégica.
Na segunda, ocorrida quatro meses depois, tentou eletrocutá-la durante o banho.
O seu marido, nascido na Colômbia, economista e professor universitário, acabou sendo condenado,
mas só iniciou o cumprimento da pena quase 20 (vinte) anos após o crime, em 2002, em função da lentidão
do processo.
O caso chegou à Comissão Interamericana dos Direitos Humanos da Organização dos Estados
Americanos (OEA), que, no ano de 2001, censurou o Brasil pela falta de normatização da Convenção
Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, concluída em Belém do Pará, em
9 de junho de 1994.
Em razão desta repreensão internacional e da luta de inúmeras entidades de proteção à mulher, 5
(cinco) anos depois, finalmente foi promulgada a Lei 11.340/2006, que ficou conhecida como Lei Maria da
Penha.

CONSTITUCIONALIDADE

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A Lei Maria da Penha ê aplicável apenas à violência doméstica e familiar contra mulher
Frise-se, apenas contra mulher.
Quando a vítima for homem, a referida lei não é aplicada.
E, nesse aspecto, não há qualquer inconstitucionalidade por eventual violação à isonomia.
Com efeito, o objetivo da lei é justamente a preservação do aludido princípio, que, no plano substancial,
consiste em tratar de forma desigual os desiguais, a fim de se reduzir a desigualdade material.
É histórica a desigualdade material entre o gênero masculino e feminino e, em razão disso, foi editada a
Lei Maria da Penha, que se revela como sendo uma importante ação estatal afirmativa, com vistas à
eliminação ou pelo menos a redução desta desigualdade.
Não é, pois, qualquer delito praticado contra mulher que se sujeita à referida lei, mas apenas os
cometidos em situação de violência doméstica e familiar, por razões de gênero, quando houver, entre as
partes, uma unidade doméstica ou relação familiar ou vínculo afetivo e, desde ainda, que o fato lhe acarrete
morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial (art. 5º).
A propósito, o STF na ADC 19 decidiu: “VIOLÊNCIA DOMÉSTICA – LEI Nº 11.340/06 – GÊNEROS
MASCULINO E FEMININO – TRATAMENTO DIFERENCIADO. O artigo 1º da Lei nº 11.340/06 surge, sob o ângulo
do tratamento diferenciado entre os gêneros – mulher e homem –, harmônica com a Constituição Federal, no
que necessária a proteção ante as peculiaridades física e moral da mulher e a cultura brasileira. COMPETÊNCIA
– VIOLÊNCIA DOMÉSTICA – LEI Nº 11.340/06 – JUIZADOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A
MULHER. O artigo 33 da Lei nº 11.340/06, no que revela a conveniência de criação dos juizados de violência
doméstica e familiar contra a mulher, não implica usurpação da competência normativa dos estados quanto
à própria organização judiciária. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER – REGÊNCIA – LEI Nº
9.099/95 – AFASTAMENTO. O artigo 41 da Lei nº 11.340/06, a afastar, nos crimes de violência doméstica
contra a mulher, a Lei nº 9.099/95, mostra-se em consonância com o disposto no § 8º do artigo 226 da Carta
da República, a prever a obrigatoriedade de o Estado adotar mecanismos que coíbam a violência no âmbito
das relações familiares”. (ADC 19, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 09/02/2012,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-080 DIVULG 28-04-2014 PUBLIC 29-04-2014).

INEXISTÊNCIA DO TIPO PENAL DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR

A Lei 11.340/2006, à exceção do delito de desobediência (art. 24-A), não define outros crimes, mas
apenas determina a sua incidência aos delitos em que há violência doméstica e familiar contra mulher.
A rigor, portanto, não há um crime específico de violência doméstica e familiar, mas esta violência, por
sua vez, pode se encontrar presente numa gama enorme de delitos contra a mulher. Exemplos: homicídio,
lesão corporal, ameaça, crimes contra a honra, estupro, constrangimento ilegal, furto, dano, etc.
Aliás, a Lei Maria da Penha também é aplicada no âmbito cível, nas ações de divórcio, dissolução de
união estável e dissolução de união homoafetiva feminina.
Portanto, é possível a incidência da lei em estudo mesmo quando a violência doméstica e familiar não
configurar nenhum crime.

CONCEITO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR

A violência doméstica e familiar, para se caracterizar, depende de 5 (cinco) requisitos cumulativos:


a) que o sujeito passivo seja mulher;
b) que a ação ou omissão ocorra no âmbito de unidade doméstica ou da relação familiar ou de qualquer
relação íntima de afeto;
c) que esta ação ou omissão apresente uma das formas de violência doméstica e familiar, contra a
mulher que, entre outras, são a física, a psicológica, a sexual, a patrimonial e a moral;
d) que a violência seja praticada por razões de gênero;
e) que a vítima se encontre numa situação de vulnerabilidade.
É, pois, necessária a presença simultânea destes 5 (cinco) requisitos para que haja a incidência da lei
Maria de Penha.

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Uma corrente minoritária acrescenta mais um requisito, exigindo que o sujeito ativo seja homem, mas
este ponto de vista é isolado.
Antes de analisar os 5(cinco) requisitos acima, farei uma exposição sobre o sujeito ativo.

SUJEITO ATIVO

Tanto o homem quanto a mulher podem praticar a violência doméstica e familiar, a que se refere a lei
em comento. É a posição do STJ.
Aplica-se, por exemplo, esta lei quando a mãe agride a própria filha, por não aceitar a sua opção sexual.
Há, entretanto, uma corrente minoritária que exclui a aplicação da lei quando o delito houver sido
praticado por uma mulher contra outra, pois, nesse caso, a vítima não se encontraria em situação de
vulnerabilidade em relação à sua agressora.
Não merece guarida esta posição, pois a vulnerabilidade não se limita apenas à inferioridade física,
estendendo-se também a outras situações, como, por exemplo, a dependência econômica.

SUJEITO PASSIVO

O primeiro requisito para se aplicar a Lei Maria da Penha é que violência doméstica e familiar seja
praticada contra mulher.
Sobre o conceito de mulher, há duas correntes.
Primeira, é a pessoa do sexo feminino, pois se trata de um conceito biológico.
Segunda, é a pessoa do gênero feminino, pois se trata de um conceito sociológico.
Gênero é um conceito que leva em conta o comportamento de construção social, que identifica papéis
de natureza cultural, que levam a pessoa à aquisição da masculinidade ou da feminilidade.
Não se confunde assim com o sexo, que é um conceito puramente biológico.
O STJ adotava o conceito biológico, mas acabou aderindo à segunda corrente para que a proteção seja
também estendida aos transexuais, transgêneros, cisgêneros, travestis e outras categorias relacionadas ao
gênero feminino (REsp 1.977.124).
Não se trata de analogia “in malam partem”, como asseveram alguns doutrinadores, mas sim de
interpretação sociológica sobre o significado atual do termo “mulher”, adaptando-se o Direito à realidade
social.
No tocante à violência doméstica e familiar contra criança e adolescente, ainda que do sexo masculino,
independentemente portanto de razões de gênero, aplica-se a lei 14.344/2022, por força do princípio da
especialidade, sendo que a aludida lei prevê uma sistemática bem similar à Lei Maria da Penha, a qual é ainda
aplicada subsidiariamente.

UNIDADE DOMÉSTICA, ÂMBITO DA FAMÍLIA E QUALQUER RELAÇÃO ÍNTIMA DE AFETO

O segundo requisito para se aplicar a Lei Maria da Penha é que haja, entre o agressor e a vítima, um
vínculo oriundo da unidade doméstica, do âmbito familiar ou da relação de afeto.
Basta um destes três vínculos, mas, ausentes os três, a lei não será aplicada, ainda que o fato seja
praticado por razões de gênero contra uma mulher vulnerável.
Se, por exemplo, por razões de gênero, o agente agride uma prostituta, com a qual não tinha qualquer
vínculo, não há falar-se na incidência da Lei Maria da Penha.
Nos três vínculos, para a configuração da violência doméstica e familiar prevista no artigo 5º da Lei
n.11.340/2006 não se exige a coabitação entre autor e vítima (súmula 600 do STJ).
Passo então à análise destes três vínculos.

Vínculo de unidade doméstica

Unidade doméstica é o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar,

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inclusive, as esporadicamente agregadas (art. 5º, I). Exemplo: patrão que agride a empregada doméstica.
Outro exemplo: república de mulheres em que uma agride a outra. Mais um exemplo: mulher que é agredida,
no ambiente laborativo, por seu colega de trabalho. Neste último exemplo, que retrata a agressão de uma
colega de trabalho, o assunto é polêmico, pois valiosas opiniões excluem a incidência da Lei Maria da Penha
que, a meu ver, deve ser aplicada, pois não se exige a convivência sob o mesmo teto nem relação amorosa
entre a vítima e o agressor.
Para a incidência da lei em estudo, pouco importa o local do crime, que não precisa ser praticado no
recinto da unidade doméstica.
Não é necessário, para a caracterização da unidade doméstica, que agressor e vítima convivam sob o
mesmo teto, mas é imprescindível que haja, entre eles, um convívio permanente, ou seja, prolongado no
tempo.
A hipótese ainda abrange as pessoas esporadicamente agregadas. Se, por exemplo, uma amiga convida
outra para morar um mês em sua casa, agredindo-a por razões de gênero, impõe-se a incidência da lei.
No tocante ao patrão que agride a faxineira que, uma vez por semana, vai fazer a limpeza na sua casa,
o assunto comporta duas interpretações.
Primeira, a lei não é aplicada, pois o convívio não se revela permanente.
Segunda, a lei é aplicada na hipótese de a diarista prestar serviços no local durante um tempo
juridicamente relevante.
De fato, o convívio permanente não precisa ser diário, mas duradouro, prolongado no tempo, ainda que
de forma espaçada, ou seja, esporádica. Exemplo: diarista que há três anos presta serviços no mesmo local,
onde vai uma vez por semana.
A menção ao advérbio esporádico não elimina a necessidade de uma unidade doméstica, que é o espaço
de convívio permanente de pessoas, mas, em contrapartida, não é também exigido um convívio diário.

Vínculo familiar

Na Lei Maria da Penha, a família é conceituada como sendo a comunidade formada por indivíduos que
são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa (art. 5º,
II).
Assim, a união que configura o âmbito familiar emana de:
a) Laços naturais: é o parentesco consanguíneo.
b) Laços de afinidade: é o vínculo entre o cônjuge ou companheiro e os parentes do outro. É o caso do
sogro, sogra, genro, nora, padrasto, madrasta, enteado, enteada e cunhado.
c) Por vontade expressa. Exemplos: adoção, parentesco socioafetivo, isto é, filho de criação. Outro
exemplo: mulher que o agressor considera como sendo sua irmã.
Não é necessário que haja, entre agressor e vítima, que integram a mesma família, a convivência
permanente na mesma unidade doméstica.
Também não é preciso que morem ou tenham morado sob o mesmo teto.
Assim, presente o vínculo familiar, não há necessidade de se comprovar o vínculo de unidade doméstica.

Qualquer relação íntima de afeto

Relação Íntima de afeto é uma expressão que indica o fato de o agente conviver ou ter convivido com a
vítima, independentemente de coabitação (art. 5º, III).
A coabitação, que significa morar ou ter morado junto, é dispensável.
Não há assim a necessidade de morarem ou terem morado sob o mesmo teto. Aplica-se, por exemplo,
a lei à ameaça que o sujeito faz à ex-noiva, por não concordar com o desfazimento do noivado.
Sobre o namoro o STJ firmou a seguinte tese:
“A agressão do namorado contra a namorada, mesmo cessado o relacionamento, mas que ocorra em
decorrência dele, está inserida na hipótese do art. 5o, III, da Lei n. 11.340/06, caracterizando a violência
doméstica”.

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O próprio STJ ressalva, porém, que o namoro só será considerado uma relação íntima de afeto quando
não houver sido fugaz ou passageiro.
É, pois, preciso analisar o caso concreto para se concluir se as agressões à namorada ou à ex-namorada
se sujeitam ou não à Lei Maria da Penha.
A invocação da relação íntima de afeto, para se justificar a incidência da lei em análise, só é necessária
quando não houver, entre as partes, convívio permanente numa unidade doméstica nem relação familiar.
A relação íntima de afeto, para uns, abrange o amor, o sexo e também a amizade. Dessa forma, se, por
exemplo, o agente agride uma amiga, com quem convive quase que diariamente, aplicar-se-á a lei em estudo.
Outros, porém, restringem a expressão à intimidade amorosa e sexual, excluindo-se a amizade.
De fato, trata-se de uma relação íntima de afeto e não relação íntima de amizade. Não se aplica,
destarte, a lei em análise ao sujeito que agride a sua vizinha.
Outra questão interessante diz respeito ao fato de a lei ter dispensado a coabitação, pois a Convenção
de Belém do Pará, nas relações íntimas de afeto, exige que as partes convivam ou tenham convivido sob o
mesmo teto.
Uma primeira exegese impõe também esta exigência, pois as Convenções de Direitos Humanos são
hierarquicamente superiores às leis internas.
Outra corrente, que é a adotada no STJ, aplica o princípio “pro homine”, que, em matéria de conflito de
leis internas e tratados sobre direitos humanos, prioriza a norma que confere a maior proteção e, nessa linha
de raciocínio, prevalece a Lei Maria da Penha, que dispensa a convivência sob o mesmo teto.

FORMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA OU FAMILIAR CONTRA A MULHER

O terceiro requisito da violência doméstica e familiar diz respeito às formas de violência.


De acordo com o art. 7º da lei 11.340/2.006, são formas de violência doméstica e familiar contra a
mulher, entre outras, a física, a psicológica, a sexual, a patrimonial e a moral.
Basta uma destas violências. Não se exige a habitualidade.
Uma corrente sustenta que é taxativo o rol das violências que caracterizam a violência doméstica e
familiar, pois se trata de norma restritiva de direitos, sendo vedada a ampliação analógica.
Uma segunda corrente admite outras violências similares, através da interpretação analógica, pois o art.
7º utiliza a expressão “entre outras”, sinalizando assim que o rol acima é exemplificativo.
Passo agora à análise destas violências.

Violência física

A violência física é qualquer conduta que ofenda a integridade ou a saúde corporal.


Trata-se da força bruta, que abrange as vias de fato, lesão corporal e morte.

Violência psicológica

A violência psicológica é qualquer conduta que causa à vítima:


a) dano emocional; ou
b) diminuição da autoestima; ou
c) que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento; ou
e) que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões.
É praticada mediante as seguintes condutas:
a) ameaça;
b) constrangimento;
c) humilhação;
d) manipulação;
e) isolamento;
f) vigilância constante;

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g) perseguição contumaz;
h) insulto;
i) chantagem,
j) violação de sua intimidade;
k) ridicularização;
l) exploração;
m) limitação do direito de ir e vir; ou
n) qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação.

Violência sexual

A violência sexual é qualquer conduta que constranja a vítima


a) a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça,
coação ou uso da força;
b) para induzi-la a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade;
c) para impedi-la de usar qualquer método contraceptivo;
d) para forçá-la ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem,
suborno ou manipulação;
e) para limitar ou anular o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos.

Violência patrimonial

A violência patrimonial é qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou
total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos
econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades.
No aspecto da violência patrimonial, cumpre lembrar a imunidade absoluta, também chamada de
escusa absolutória, prevista para os crimes contra o patrimônio sem violência ou grave ameaça, cometidos
em prejuízo de cônjuge (por isonomia, abrange também o companheiro), ascendente e descendente, cujo
efeito é o de impedir a instauração do inquérito policial, deixando, pois, o fato impune (art. 181 do CP).
Uma primeira corrente sustenta que, em sendo a vítima mulher, em situação de violência doméstica ou
familiar, já não há mais esta imunidade, diante da incompatibilidade com o art. 7º, IV, da lei Maria da Penha,
que, de forma expressa, classifica o fato como sendo um ato de violência, ao passo que a imunidade só incide
nos crimes sem violência ou grave ameaça.
Uma segunda corrente mantém em vigor a imunidade nos crimes patrimoniais praticados em ambiente
de violência doméstica e familiar, desde que não haja violência física nem grave ameaça, pois a Lei Maria da
Penha não afastou expressamente a incidência do art. 181 do CP.

Violência moral

A violência moral é qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.


Convém esclarecer que, no ordenamento jurídico, a violência moral significa grave ameaça, mas, na lei
em análise, o terno foi empregado no sentido de atentado à honra.

RAZÕES DE GÊNERO

O quarto requisito diz respeito às razões de gênero.


É, pois, preciso, para que incida a Lei Maria da Penha, além dos três requisitos já analisados, que o delito
seja praticado por razões de gênero.
As razões de gênero se referem à motivação do crime, que deve consistir numa opressão à mulher.
Exemplos: ciúme, vingança por ela ter saído de casa, agressão por ela ter sido infiel, injúria por ela ter atrasado
o jantar.

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É, assim, necessário o nexo causal entre a conduta e o fato de a vítima ser mulher.
Se, por exemplo, o sujeito agride a ex-mulher motivado pelo fato de ela descumprir a decisão judicial
que lhe garantia o direito de visita da criança, não há falar-se na incidência da lei em estudo, pois a razão da
agressão não foi o fato de ela ser mulher.
Da mesma forma, o irmão que xinga a irmã, por razões de herança, não sofre os efeitos danosos da Lei
Maria da Penha, pois não há nexo causal entre a ofensa e a condição feminina da vítima.
Diante da exigência de o delito ser praticado por razões de gênero, que pressupõe uma motivação
dolosa, poder-se-ia concluir, à primeira vista, que a Lei Maria da Penha não seria aplicável aos crimes culposos.
Ledo engano, pois as razões de gênero também podem se verificar no crime culposo. É a produção do
STJ. Exemplo: o marido, em função do atraso do jantar, discutiu com a mulher, quebrando um prato no chão,
mas um dos estilhaços a atingiu numa das vistas, cegando-a.
Eis aí um exemplo de lesão corporal culposa cometido em ambiente violência doméstica e familiar, cuja
ação penal será pública incondicionada.

SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE DA VÍTIMA

O quinto e último requisito é a vulnerabilidade da vítima.


É preciso, por fim, para que incida a Lei Maria da Penha, além dos 4 (quatro) requisitos já analisados,
que a vítima se encontre em situação de vulnerabilidade.
A vulnerabilidade é a inferioridade física, econômica, moral, social, intelectual ou de qualquer outra
natureza, em relação ao agressor ou agressora.
Não se trata apenas da inferioridade física.
Em sendo o fato praticado por homem, a doutrina defende que a lei instituiu uma presunção absoluta
de vulnerabilidade, nas agressões por razões de gênero.
Assim, o fato de a mulher ser financeiramente independente do marido, exercendo um cargo público
importante, não elimina a sua vulnerabilidade que, por força de lei, é presumida, em relação às agressões por
razões de gênero.
Se, no entanto, o sujeito ativo for também mulher, a presunção é relativa, admitindo a prova em sentido
contrário.
Numa união homoafetiva entre duas mulheres, por exemplo, incide a Lei Maria da Penha quando a
agressora, em razão de sua condição financeira, exercia uma superioridade hierárquica sobre a vítima, a quem
incumbia as tarefas domésticas, mas a recíproca não é verdadeira, impondo-se a exclusão da referida lei.

EFEITOS DA LEI MARIA DA PENHA

A incidência da lei Maria da Penha produz, dentre outros, os seguintes efeitos:


a) a exclusão total da Lei 9.099/95;
b) renúncia à representação deve ser feita perante o juiz;
c) afastamento do princípio da insignificância;
d) vedação das penas de cesta básica, prestação pecuniária e substituição por pena de multa isolada;
e) vedação de penas restritivas de direitos quando houver violência ou grave ameaça;
f) atuação do Ministério Público;
g) assistência judiciária gratuita;
h) atendimento especial pela autoridade policial;
i) criação das Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deams);
j) criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher;
k) competência;
l) relevância das declarações da vítima;
m) não suspensão dos prazos processuais.
n) incidência das medidas protetivas de urgência.

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EXCLUSÃO DA LEI 9.099/95

Dispõe o art. 41 da lei 11.340/2006:


“Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da
pena prevista, não se aplica a Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995.”
Dessa forma, as infrações penais que envolvem violência doméstica e familiar contra mulher jamais
poderão ser consideradas de menor potencial ofensivo.
O STF, por unanimidade de votos, julgou procedente a ADECON nº 19, para declarar a
constitucionalidade desse artigo 41, afastando a corrente que sustentava a violação do princípio da isonomia
(DOU de 17.02.2012).
Já se decidiu no STF no HC 106.212, que a lei 9.099/95 não é aplicável sequer às contravenções penais
que envolvam violência doméstica e familiar, por exemplo, vias de fato (art. 21 da LCP), interpretando a
palavra crime, constante do art. 41, em sentido amplo.
Assim, nas infrações penais em que há violência doméstica ou familiar afasta-se, por completo, a
incidência da lei 9.099/95, sem abrir qualquer exceção.
As consequências dessa exclusão são as seguintes:
a) instaura-se inquérito policial, em vez de termo circunstanciado. No inquérito, a instauração, em regra,
exige portaria da autoridade policial, é possível o indiciamento e o seu encerramento é feito através de um
relatório final. O Termo Circunstanciado não exige nada disso. É, sem dúvida mais trabalhosa para a autoridade
policial, a investigação que exige instauração de inquérito policial. Acrescente-se ainda que, no Termo
Circunstanciado, a autoridade policial faz um resumo das declarações da vítima, dos depoimentos das
testemunhas e do interrogatório do autor da infração penal, ao passo que, no inquérito policial, as
declarações, depoimentos e interrogatório são atermados, ou seja, tomados por termo.
b) será lavrado o auto de prisão em flagrante, ainda que se trate, por exemplo, de um simples crime de
ameaça. A autoridade policial, porém, após a lavratura do auto de prisão em flagrante, poderá conceder a
fiança, quando a pena abstrata não exceder a 4 (quatro) anos (art. 322 do CPP). Convém lembrar que, nas
infrações de menor potencial ofensivo, a autoridade policial poderá deixar de lavrar o auto de prisão em
flagrante se o autor assumir o compromisso de comparecer aos atos do juizado.
c) veda-se a transação penal (súmula 536 do STJ).
d) não se admite, como causa de extinção da punibilidade, a composição civil dos danos.
e) é proibida a suspensão condicional do processo, pois este benefício é previsto no art. 89 da Lei
9.099/99 (súmula 536 do STJ). Quanto à suspensão condicional da pena ou sursis, é possível, pois é previsto
no Código Penal.
f) o procedimento não será o sumaríssimo do art. 77 da Lei 9.099/95, mas, sim, o procedimento comum
ordinário, quando a pena máxima cominada ao delito for igual ou superior a 4(quatro) anos de pena privativa
de liberdade ou o procedimento comum sumário, quando a pena máxima for inferior a 4(quatro) anos (art.
394, §1º, I e II do CPP). Cumpre assim observar que a Lei Maria da Penha não prevê nenhum tipo de
procedimento.
g) a ação penal nos crimes de lesão corporal leve e lesão corporal culposa é pública incondicionada.
Nos crimes em que há violência doméstica e familiar contra mulher, a ação penal, em regra, reveste-se
da mesma natureza dos crimes sem violência doméstica ou familiar.
No delito de ameaça, por exemplo, a ação penal é pública condicionada à representação (art. 147 do
CP).
Nos crimes contra a honra, a ação penal é privada (art. 145 do CP).
No crime de constrangimento ilegal, é pública incondicionada (art. 146 do CP).
Portanto, a violência doméstica e familiar não interfere na natureza da ação penal.
Abre-se exceção à lesão corporal leve e à lesão corporal culposa, caso haja violência doméstica e familiar
contra mulher, a ação penal será pública incondicionada, pois o art. 88 da lei 9.099/95, que prevê para estes
crimes a ação penal pública condicionada à representação, não pode ser aplicado à violência doméstica e
familiar.
É a posição adotada pelo STF na ADI 4424.

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De fato, o art. 41 da lei 11.340/2.006 excluiu, na íntegra, a aplicação de qualquer dispositivo da Lei
9.099/95, sem abrir exceção para o citado art. 88.
A propósito, dispõe a súmula 542 do STJ:
“A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é
pública incondicionada”.
Onde consta na súmula a oração “violência doméstica contra a mulher”, deve ser lido “violência contra
mulher nos termos da Lei Maria da Penha”.

RENÚNCIA À REPRESENTAÇÃO

Dispõe o art. 16 da Lei 11.340/2006:


“Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será
admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade,
antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público”.
O dispositivo em apreço trata dos crimes de ação penal pública condicionada à representação. Exemplo:
delito de ameaça (art. 147 do CP).
Se a vítima ou seu representante legal, após formular a representação para que o agente seja
processado, vier a arrepender-se, o juiz, antes de receber a denúncia, deve designar uma audiência preliminar
especialmente para o fim de ouvi-la acerca dessa renúncia.
Noutras palavras, a renúncia, para surtir efeito, deve ser confirmada pela vítima ou seu representante
legal, na presença do juiz, ouvindo-se também o Ministério Público.
A rigor, o termo técnico não é renúncia e, sim, retratação da representação, pois a renúncia
propriamente dita opera-se antes da oferta da representação.
Após o recebimento da denúncia, não será mais possível retratar-se da representação.
A propósito, o STJ firmou a seguinte tese:
“A audiência de retratação prevista no art. 16 da Lei n. 11.340/06 apenas será designada no caso de
manifestação expressa ou tácita da vítima e desde que ocorrida antes do recebimento da denúncia”.
Note-se que nos crimes que não envolvem violência doméstica e familiar a retratação só é possível até
antes do oferecimento da denúncia, conforme arts. 102 do CP e 25 do CPP, prescindindo-se de confirmação
na presença do juiz, ao passo que na violência doméstica e familiar a retratação é viável até antes do
recebimento da denúncia, mas a vítima precisará confirmá-la na presença do juiz.
A representação é ofertada pela vítima ou seu representante legal, sendo reduzida a termo pela
autoridade policial, por ocasião do registro da ocorrência (art. 12, I).
Uma vez ofertada a representação, a vítima ou seu representante legal não precisa mais ratificá-la.
Assim, a menos que a vítima ou seu representante legal tenha manifestado a vontade de se retratar,
não há na lei qualquer exigência de designação de audiência judicial para se ratificar a representação.
Tanto o STF quanto o STJ já descartaram a hipótese de qualquer nulidade pela não designação dessa
audiência nos casos em que a vítima sempre manteve firme o propósito de ver o agente sendo processado.
Se, ao revés, antes do recebimento da denúncia, a vítima já havia esboçado a intenção de se retratar,
mas aquela audiência preliminar não foi designada, nada obsta a retratação tardia, formulada na primeira
oportunidade em que é ouvida, ainda que após o recebimento da denúncia.

AFASTAMENTO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

À medida que as infrações penais que envolvem violência doméstica e familiar nunca são consideradas
de menor potencial ofensivo, força convir que a elas também não se aplicam o princípio da insignificância.
A propósito, dispõe a súmula 589 do STJ:
“É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou contravenções penais praticados contra a
mulher no âmbito das relações domésticas”.
Embora a súmula só faça referência à violência doméstica, o seu escopo foi abranger todas as situações
de violência contra mulher previstas na Lei Maria da Penha.

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Onde a súmula diz “no âmbito das relações domésticas” deve ser lido “no âmbito da Lei Maria da Penha”.
A violência doméstica que não se enquadra na Lei Maria da Penha pode ensejar a aplicação do princípio
da insignificância, pois o que impede a incidência deste princípio é o fato de se tratar de uma violência por
razões de gênero, cujas marcas são indeléveis no âmbito da personalidade da mulher.

VEDAÇÃO DAS PENAS DE CESTA BÁSICA, PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA E SUBSTITUIÇÃO POR


MULTA ISOLADA

Dispõe o art. 17 da Lei 11.340/2006:


“É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta
básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado
de multa.”
São, pois, duas as penas restritivas de direito proibidas:
a) fornecimento de cestas básicas;
b) prestação pecuniária.
A pena privativa de liberdade ainda não pode ser substituída apenas por multa isolada, mas nada obsta
a sua substituição por multa cumulada com pena restritiva de direito, o que é possível, nas condenações cuja
pena seja superior a 01 (um) ano, nos termos do §2º do art. 44 do Código Penal. No tocante à multa, há apenas
a vedação da multa vicariante, que é a aplicada em substituição à pena privativa de liberdade.
Na hipótese de o preceito secundário do tipo penal prever a multa, como sendo a única pena, como
ocorre em certas contravenções, ela poderá ser aplicada, outrossim, quando a pena de multa for cominada no
preceito secundário de forma alternativa ou cumulativa com a pena privativa de liberdade.
Assim, a Lei Maria da Penha proíbe a substituição da pena privativa de liberdade por cesta básica, multa
isolada ou outras de natureza pecuniária.
Estas três penas, diante da brandura, não atendem realmente aos propósitos da lei, de coibir a violência
doméstica e familiar, ademais, diante do desfalque patrimonial, poderiam prejudicar a própria vítima, na
hipótese de ela depender economicamente do réu.

VEDAÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO QUANDO HOUVER VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA

Nos crimes ou contravenções com violência ou grave ameaça contra a mulher, em ambiente doméstico,
a vedação da substituição estende-se a qualquer pena restritiva de direito, por força da súmula 588 do STJ
que, a rigor, repete a proibição que já é ditada pelo art. 44, I, do CP.
A propósito, dispõe a súmula 588 do STJ:
“A prática de crime ou contravenção penal contra a mulher, com violência ou grave ameaça, no
ambiente doméstico impossibilita a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos”.
Onde consta na súmula a expressão “no ambiente doméstico”, deve ser lido “quando presentes os
requisitos da Lei Maria da Penha”.
Nos crimes com violência ou grave ameaça de menor potencial ofensivo, que não sejam praticados
contra mulher em ambiente doméstico e familiar, cuja pena abstrata não exceda a 2 (dois) anos, a
jurisprudência tem admitido a substituição por pena restritiva de direito, posto que esta substituição é cabível
no âmbito da transação penal do JECRIM.
Caso a hipótese seja de violência doméstica e familiar contra mulher a substituição por pena restritiva
de direito, não será possível quando envolver violência física ou grave ameaça.
Os crimes ou contravenções contra mulher no ambiente doméstico e familiar podem ter a pena privativa
de liberdade substituída por pena restritiva de direito, desde que não haja violência ou grave ameaça,
ressalvando-se que substituição por cesta básica, multa ou outra prestação pecuniária não é cabível nem
mesmo nos crimes ou contravenções, em ambiente doméstico, sem violência ou grave ameaça contra mulher.

ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

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O Ministério Público intervirá, quando não for parte, nas causas cíveis e criminais decorrentes da
violência doméstica e familiar contra a mulher (art. 25).
Justifica-se a intervenção do Ministério Público, nas causas cíveis e criminais, em função da qualidade
da parte, que se revela vulnerável, outrossim, pelo interesse social em se coibir a violência doméstica e familiar
contra mulher.
Aliás, no tocante às causas criminais, a intervenção do Ministério Público é sempre obrigatória, ainda
que se trate de ação penal privada, de modo que, nesse aspecto, o citado art. 25 se revela inócuo.
Caberá ao Ministério Público, nos termos do art. 26, sem prejuízo de outras atribuições, nos casos de
violência doméstica e familiar contra a mulher, quando necessário:
I - requisitar força policial e serviços públicos de saúde, de educação, de assistência social e de
segurança, entre outros.
A requisição é uma ordem e não uma mera solicitação.
A requisição do Ministério Público dispensa a aprovação judicial, quando se tratar de requisição de força
policial e requisição para prestação de serviços públicos, em favor da mulher, vítima de violência doméstica e
familiar.
Aliás, a requisição de serviços públicas em favor da mulher e seus dependentes, nas situações de
violência doméstica e familiar, conforme já visto, também pode ser feita pela autoridade policial.
II – fiscalizar os estabelecimentos públicos e particulares de atendimento à mulher em situação de
violência doméstica e familiar, e adotar, de imediato, as medidas administrativas ou judiciais cabíveis no
tocante a quaisquer irregularidades constatadas.
O Ministério Público aqui exerce uma fiscalização extrajudicial sobre os estabelecimentos públicos e
particulares de atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar.
Ao constatar quaisquer irregularidades, deverá tomar as medidas administrativas ou judiciais cabíveis.
III - cadastrar os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher.
A lei criou junto ao Ministério Público o cadastro dos casos de violência doméstica e familiar contra a
mulher.
O ideal é que haja um cadastro local, em cada promotoria, outro estadual e ainda o cadastro nacional.

ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA

O art. 27 preceitua que todos os atos processuais, cíveis e criminais, a mulher em situação de violência
doméstica e familiar deverá estar acompanhada de advogado, ressalvado o previsto no art. 19 desta Lei.
É, pois, dispensada a presença de advogado, na fase processual, apenas para se requerer as medidas
protetivas de urgência (art. 19).
É garantido a toda mulher em situação de violência doméstica e familiar o acesso aos serviços de
Defensoria Pública ou de Assistência Judiciária Gratuita, nos termos da lei, em sede policial e judicial, mediante
atendimento específico e humanizado (art. 28).
Portanto, ainda que se trate de uma mulher rica, ela poderá pleitear o acesso aos serviços de Defensoria
Pública ou de Assistência Judiciária Gratuita.
O ideal é que o juiz comunique a defensoria pública ou nomeie um advogado dativo para acompanhar
a mulher nos atos processuais em que ela deva estar presente.

ATENDIMENTO ESPECIAL PELA AUTORIDADE POLICIAL

Atendimento imediato

Na hipótese da iminência ou da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, a autoridade


policial que tomar conhecimento da ocorrência adotará, de imediato, as providências legais cabíveis (art. 10).
Aplica-se o disposto no caput deste artigo ao descumprimento de medida protetiva de urgência deferida
(parágrafo único do art. 10).
Não se pode, destarte, deixar a mulher esperando longas horas para só depois atendê-la, pois a lei

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impõe que o atendimento seja expedito.


Assim, a inquirição da vítima, testemunhas e autor do delito deve ser imediata, quer haja ou não a
situação de flagrante.
Aliás, em caso de flagrante, a autoridade policial deverá se dirigir até o local onde se encontra o agressor
para prendê-lo em flagrante.

Servidores do sexo feminino

É direito da mulher em situação de violência doméstica e familiar o atendimento policial e pericial


especializado, ininterrupto e prestado por servidores - preferencialmente do sexo feminino - previamente
capacitados (art. 10-A).

Diretrizes da inquirição da mulher e de testemunha

Dispõe o § 1º do art. 10-A:


“A inquirição de mulher em situação de violência doméstica e familiar ou de testemunha de violência
doméstica, quando se tratar de crime contra a mulher, obedecerá às seguintes diretrizes: I - salvaguarda
da integridade física, psíquica e emocional da depoente, considerada a sua condição peculiar de pessoa em
situação de violência doméstica e familiar;
II - garantia de que, em nenhuma hipótese, a mulher em situação de violência doméstica e familiar,
familiares e testemunhas terão contato direto com investigados ou suspeitos e pessoas a eles relacionadas;
III - não revitimização da depoente, evitando sucessivas inquirições sobre o mesmo fato nos âmbitos
criminal, cível e administrativo, bem como questionamentos sobre a vida privada”.

Procedimento de inquirição

Reza o §2º do art. 10-A:


“Na inquirição de mulher em situação de violência doméstica e familiar ou de testemunha de delitos de
que trata esta Lei, adotar-se-á, preferencialmente, o seguinte procedimento:
I - a inquirição será feita em recinto especialmente projetado para esse fim, o qual conterá os
equipamentos próprios e adequados à idade da mulher em situação de violência doméstica e familiar ou
testemunha e ao tipo e à gravidade da violência sofrida;
II – quando for o caso, a inquirição será intermediada por profissional especializado em violência
doméstica e familiar designado pela autoridade judiciária ou policial;
III - o depoimento será registrado em meio eletrônico ou magnético, devendo a degravação e a mídia
integrar o inquérito.

Providências

De acordo com o art. 11:


“No atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, a autoridade policial deverá,
entre outras providências:
I - garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato ao Ministério Público e ao
Poder Judiciário;
II - encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal;
III - fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver
risco de vida;
IV - se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do local da
ocorrência ou do domicílio familiar;
V - informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis, inclusive os de

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assistência judiciária para o eventual ajuizamento perante o juízo competente da ação de separação judicial,
de divórcio, de anulação de casamento ou de dissolução de união estável”.

Procedimentos imediatos (art. 12)

O art. 12 prevê o rol meramente exemplificativo das diligências que deverão ser tomadas pela
autoridade policial.
Assim, de acordo com o art. 12, em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher,
feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos,
sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal:
I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se apresentada.
Conforme se verifica, a oitiva da vítima, sempre que possível, deve ser imediata. Além disso, será lavrado
imediatamente o boletim de ocorrência e, nos crimes que dependem de representação, esta será atermada,
ou seja, reduzida a termo
As declarações da vítima, em regra, é a principal prova e, quase sempre, a única, pois os referidos delitos
costumam ocorrer na clandestinidade, em recinto particular e sem testemunhas.
Assim, nos delitos com violência doméstica e familiar, a vítima, quando procura a delegacia de polícia
sai de lá com o boletim de ocorrência e com o termo de suas declarações, ao passo que nos demais delitos
haverá, de imediato, apenas a lavratura do boletim de ocorrência, pois a sua oitiva só ocorrerá no curso do
inquérito policial.
Se a vítima, por alguma razão não for ouvida de imediato, ela será devidamente intimada para prestar
as declarações e, caso não compareça, a autoridade policial poderá determinar a sua condução coercitiva, nos
termos do § 1º do art. 201 do CPP, aplicado subsidiariamente, salvo nos delitos de ação penal privada e ação
penal pública condicionada à representação.

II – colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas circunstâncias.

III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz com o pedido da
ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência.
É necessário que o delegado de polícia tome a iniciativa de esclarecer a vítima sobre as espécies de
medidas protetivas.
O ideal é ele lhe apresentar um formulário contendo o rol destas medidas para que ela assinale aquelas
que deseja.
O §1º do art. 12 esclarece que o pedido da ofendida será tomado a termo pela autoridade policial e
deverá conter qualificação da ofendida e do agressor; o nome e idade dos dependentes, a descrição sucinta
do fato e das medidas protetivas solicitadas pela ofendida e a informação sobre a condição de a ofendida ser
pessoa com deficiência e se da violência sofrida resultou deficiência ou agravamento de deficiência
preexistente.
A autoridade policial ainda deverá anexar ao pedido de medida protetiva o boletim de ocorrência e
cópia de todos os documentos disponíveis em posse da ofendida (§2º do art.12).
Cumpre, porém, observar que, de acordo com o STJ, para o requerimento da medida protetiva de
urgência, não há necessidade de se lavrar boletim de ocorrência e nem de oferecer representação nos crimes
que a exigem.
Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e
postos de saúde (§ 3º do art. 12). Esta medida facilita a comprovação da materialidade para efeito de
concessão da medida protetiva, pois o laudo de exame de corpo de delito não costuma ficar pronto na hora.

IV - determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e requisitar outros exames
periciais necessários.
A realização do exame de corpo de delito é necessária apenas nos delitos que deixam vestígios.
O § 3º do art. 12, conforme já dito, esclarece que serão admitidos como meios de prova os laudos ou

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prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde.


É, pois, pacífico que os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde são
suficientes para embasar as seguintes peças:
a) pedido de medida protetiva de urgência;
b) oferecimento da denúncia ou queixa;
c) requerimento ou representação de prisão preventiva e de outras medidas cautelares diversas da
prisão.
A discussão cinge-se em saber se seria ou não suficiente para embasar uma sentença penal
condenatória, a ponto de se dispensar a realização do laudo de exame de corpo de delito â semelhança do
que ocorre no JECRIM.
Creio que não, pois a Lei Maria da Penha, ao contrário da Lei 9.099/95, manteve a obrigatoriedade do
exame de corpo de delito.
Em sentido contrário, pronuncia-se Renato Brasileiro, sob pena de o §3º do art. 12 revelar-se inócuo,
pois, independentemente de sua existência, aquelas outras medidas, conforme jurisprudência, poderiam ser
decretadas sem o acompanhamento do laudo de exame de corpo de delito.
O argumento é sólido, mas o certo é que o laudo de corpo de delito, em função da sua importância,
para efeito de embasamento de uma condenação, só poderá ser dispensado nos casos expressos em lei.

V - ouvir o agressor e as testemunhas.


A oitiva do agressor, na fase policial, pode ser feita sem a presença de advogado.
A oitiva, sempre que possível, deverá ser imediata, ao passo que nos delitos onde não há violência
doméstica e familiar a oitiva será feita posteriormente.

VI - ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes criminais,
indicando a existência de mandado de prisão ou registro de outras ocorrências policiais contra ele.
O inciso VI não esclarece se se trata da identificação civil ou criminal (dactiloscópica e fotográfica).
Uma corrente defende que, nas infrações penais que envolvem violência doméstica e familiar, a
identificação criminal, por força do inciso VI em análise, é sempre obrigatória.
Outra corrente sustenta que o texto legal quis se referir apenas à obrigatoriedade da identificação civil,
porquanto a criminal só é obrigatória nas hipóteses previstas na Lei 12.037/2009, que silencia acerca dos
crimes que envolvem violência doméstica e familiar.
De fato, a identificação criminal é uma medida excepcional e, por isso, a sua imposição ao identificado
civilmente deve resultar da lei, de forma clara e inequívoca.

VI-A - verificar se o agressor possui registro de porte ou posse de arma de fogo e, na hipótese de
existência, juntar aos autos essa informação, bem como notificar a ocorrência à instituição responsável pela
concessão do registro ou da emissão do porte, nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003
(Estatuto do Desarmamento).
Em relação à arma de fogo, haverá:
a) a apreensão: quando o delito houver sido praticado com arma de fogo, ainda que haja o registro e o
documento de porte, outrossim, quando o agente possuir a arma sem o registro ou portá-la sem ter o
documento de porte.
b) notificar a ocorrência à instituição responsável pela concessão do registro ou da emissão do porte,
que é a Polícia Federal ou Comando do Exército, conforme se trata de arma de fogo de uso permitido ou
restrito, que poderá então cassar o registro e o porte. Esta notificação é necessária, ainda o agente tenha o
registro e o porte, e não tenha utilizado a arma para a prática do crime de violência doméstica e familiar contra
mulher.
Vê-se assim que a diligência de verificação do registro de porte ou posse de arma de fogo é obrigatória,
ainda que o delito não tenha sido praticado por meio de arma de fogo, pois onde a lei não distingue ao
intérprete não é lícito distinguir.
Ainda que o agente tenha o registro e documento de porte da arma de fogo e o delito não houver sido

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praticado com a arma, a autoridade policial, embora não possa apreendê-la, deverá notificar a ocorrência à
instituição responsável pela concessão do registro ou da emissão do porte, que é a Polícia Federal ou Comando
do Exército, conforme se trata de arma de fogo de uso permitido ou restrito, que poderá então cassar o
registro e o porte.
Se o delito houver sido praticado com arma de fogo, a autoridade policial deverá apreendê-la, ainda
que haja o registro e a autorização do porte.
Haverá igualmente a apreensão quando a arma de fogo não guardar qualquer relação com o crime, mas
o agente não tiver o registro ou o porte, pois, nesse caso, ele responderá também pelo delito de posse ou
porte de arma de fogo.

VII - remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao Ministério Público.
O prazo para conclusão do inquérito policial é o mesmo previsto para os delitos cometidos sem violência
doméstica e familiar.
Não há nenhuma especificidade.
O §3º do art. 12-B ainda prevê que a autoridade policial poderá requisitar os serviços públicos
necessários à defesa da mulher em situação de violência doméstica e familiar e de seus dependentes

Criação das Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deams)

Os Estados e o Distrito Federal, de acordo com o art. 12-A, na formulação de suas políticas e planos de
atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, darão prioridade, no âmbito da Polícia
Civil, à criação de:
a) Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deams);
b) Núcleos Investigativos de Feminicídio;
c) equipes especializadas para o atendimento e a investigação das violências graves contra a mulher.
A criação dos três órgãos acima é um dever dos Estados e Distrito Federal, e não uma mera faculdade,
devendo o orçamento público reservar uma verba para o cumprimento desta norma.
A não criação destes órgãos pode ensejar a propositura de ação civil pública, pelo fato de o orçamento
público não priorizar a política pública de atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar.

CRIAÇÃO DOS JUIZADOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER

A criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher não é um dever, mas mera
faculdade da União, dos Estados ou Distrito Federal, que têm a opção de criá-los ou não (arts. 14 e 29).
É pertinente a sua criação nos Estados e Distrito Federal.
A União também pode também criá-los, nas não há grande demanda, pois dificilmente um crime com
violência doméstica e familiar contra mulher será da competência da justiça federal.
Nos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, os atos processuais poderão realizar-
se em horário noturno, conforme dispuserem as normas de organização judiciária (parágrafo único do art. 14).
Nas comarcas em que o aludido juizado não houver criado, a Lei Maria da Penha será normalmente
aplicada pelo juízo comum.
Sobre o assunto, dispõe o art. 33, caput:
“Enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as varas
criminais acumularão as competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática
de violência doméstica e familiar contra a mulher, observadas as previsões do Título IV desta Lei, subsidiada
pela legislação processual pertinente”.
O dispositivo em análise preceitua que as varas criminais acumularão as competências cível e criminal
para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher,
enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.
A competência das varas, porém, não pode ser disciplinada por lei federal, mas sim pelas normas locais
de organização judiciária, nos termos do art. 125, §1º, da CF.

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Por consequência, o dispositivo acima, sob pena de inconstitucionalidade, deve ser interpretado como
sendo uma mera recomendação dirigida aos Estados Membros.
O parágrafo único do art. 33 ainda recomenda que seja garantido o direito de preferência, nas varas
criminais, para o processo e o julgamento das aludidas causas.

COMPETÊNCIA

Âmbito de incidência da lei


A Lei Maria da Penha poderá ser aplicada nas seguintes hipóteses:
a) nas causas criminais que envolvem crimes ou contravenções praticados com violência doméstica e
familiar contra mulher;
b) nas causas cíveis de divórcio e dissolução de união estável, quando houver violência doméstica e
familiar contra mulher.

Aplicação subsidiária

Sobre o assunto dispõe o art. 13:


“Ao processo, ao julgamento e à execução das causas cíveis e criminais decorrentes da prática de
violência doméstica e familiar contra a mulher aplicar-se-ão as normas dos Códigos de Processo Penal e
Processo Civil e da legislação específica relativa à criança, ao adolescente e ao idoso que não conflitarem com
o estabelecido nesta Lei”.
O art. 13 faz menção à aplicação subsidiária das seguintes leis:
a) Código de Processo Penal: quando houver sido instaurada a persecução penal (inquérito policial e
ação penal).
b) Código de Processo Civil: quando a violência doméstica e familiar houver sido detectada nas ações
de divórcio e dissolução de união estável. As medidas protetivas de urgência, conforme será visto, podem ser
aplicadas por juízes criminais e cíveis. Quando determinadas por juízes criminais, será cabível o recurso em
sentido estrito, mas quando ordenadas pelos juízes cíveis, o recurso cabível será o agravo de instrumento e,
por se tratar de erro grosseiro, não há falar-se na incidência do princípio da fungibilidade.
c) Estatuto da Criança e Adolescente: quando a violência doméstica e familiar for objeto de discussão
nos processos da competência do juízo da infância e juventude. Esta previsão do art. 13 torna evidente que
as medidas protetivas de urgência também podem ser impostas ao adolescente que, através de ato
infracional, praticar violência doméstica e familiar contra mulher. Caso contrário, a remissão à aplicação
subsidiária do ECA seria inócua
d) Estatuto do idoso: quando a violência doméstica e familiar for praticada contra mulher com mais de
60 (sessenta) anos.

Atribuição da competência aos Juizados Especiais Criminais

Nos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher não há falar-se em Turmas Recursais
compostas por juízes de primeiro grau, pois eles não se confundem com os Juizados Especiais Criminais, que
são regidos pela Lei 9.099/95.
Alguns Estados, porém, em razão da falta de recursos financeiros para criá-los, têm atribuído aos
Juizados Especiais Criminais a competência para julgar as infrações penais com violência doméstica e familiar
contra mulher, mas, nesse caso, impõe-se duas observações:
a) a Lei 9.099/95 não poderá ser aplicada aos delitos de violência doméstica e familiar contra mulher.
b) os recursos e habeas corpus contra atos do juiz não poderão ser julgados pelas Turmas Recursais, que
é composta por magistrados de primeiro grau, cuja competência se restringe às infrações penais de menor
potencial ofensivo, nos termos do art. 98, I, da CF, das quais são excluídas, em termos absolutos, as que

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envolvem violência doméstica e familiar contra mulher (art.41). Portanto, os recursos e habeas corpus contra
atos do juiz serão julgados pelos respectivos Tribunais de Justiça.

Competência cumulativa

Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher têm competência cível e criminal, para
o processo, o julgamento e a execução das das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar
contra a mulher (art. 14).
Vê-se assim que os dispositivos da Lei Maria da Penha, inclusive, as medidas protetivas de urgência,
poderão também ser aplicados nas causas cíveis, ainda que a violência doméstica e familiar não se enquadre
como crime.
Se não houver o juizado, a Lei Maria da Penha será normalmente aplicada pelo juízo comum competente
para processar, julgar e executar a causa.

Competência criminal

A competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher estende-se a todos os
crimes e contravenções, inclusive, os delitos cuja pena máxima não exceda a 2 (dois) anos.
Os delitos conexos aos cometidos mediante violência doméstica e familiar, por força da conexão
instrumental ou probatória, em algumas situações, também serão julgados pelo referido juizado, observando-
se as normas legais sobre conexão
No tocante à competência territorial, é a do juizado do local da consumação (art. 70 do CPP).
Nas ações penais exclusivamente privadas, o querelante poderá optar entre o juizado do local da
consumação e o juizado do domicílio ou residência do querelado (art. 73 do CPP).
No concernente aos crimes dolosos contra a vida cometidos mediante violência doméstica e familiar
contra mulher, por exemplo, feminicídio, a competência para o julgamento é do tribunal do júri, por força de
previsão constitucional.
Entretanto, a primeira fase do procedimento do júri, que medeia entre a denúncia ou queixa e a decisão
de pronúncia, pode tramitar no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, quando assim
dispuser expressamente a norma de organização judiciária local, mas, após a preclusão da pronúncia, o
processo deverá ser enviado ao juiz presidente do tribunal do júri.

Competência cível

No tocante às causas de família, a competência do aludido juizado se limita às ações de divórcio e de


dissolução de união estável, mas a vítima pode optar pelo ajuizamento no juízo comum.
A propósito, dispõe o art. 14-A:
“A ofendida tem a opção de propor ação de divórcio ou de dissolução de união estável no Juizado de
Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher”.
Aliás, nestas duas ações, divórcio e dissolução de união estável, não será admitida a discussão sobre a
partilha dos bens.
Exclui-se, portanto, da competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher a
pretensão relacionada à partilha de bens (§1º do art. 14-A).
A lei não excluiu a pretensão sobre guarda, alimentos, separação de corpos e direito de visita, que, por
consequência, poderão ser discutidas nas ações de divórcio e dissolução de união estável.
Iniciada a situação de violência doméstica e familiar após o ajuizamento da ação de divórcio ou de
dissolução de união estável, a ação terá preferência no juízo onde estiver (§2º do art. 14-A).
Neste caso, não haverá, portanto, o deslocamento do processo, que começou no juízo comum, para
o Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.
Trata-se da aplicação do princípio da perpetuação da jurisdição, mas, nesse caso, as medidas protetivas
de urgência e demais dispositivos da Lei Maria da Penha serão aplicadas normalmente pelo juízo comum.

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Vê-se assim que, à exceção das ações de divórcio, dissolução de união estável e, por isonomia, também
as de dissolução de união homoafetiva feminina, o aludido juizado não dispõe de mais nenhuma competência
cível, em termos de tutela principal.
Noutras palavras, os dispositivos da Lei Maria da Penha só poderão ser aplicados, no âmbito cível, nas
ações de divórcio, dissolução de união estável e dissolução de união homoafetiva feminina.
Não há, portanto, competência para se aplicar a referida lei nas demais causas cíveis.
Todas as medidas protetivas de urgência, sem exceção, podem ser aplicadas nas ações de divórcio,
dissolução de união estável e dissolução de união homoafetiva feminina.
Em algumas dessas medidas, a ação principal, porém, difere das ações de divórcio, dissolução de união
estável e dissolução de união homoafetiva feminina, o que torna a competência do juizado de violência
doméstica e familiar mais ampla para a tutela cautelar que para a tutela definitiva.
As hipóteses em que o juizado de violência doméstica e familiar contra mulher tem competência para a
tutela cautelar, sob a forma de medida protetiva de urgência, mas não tem para a tutela definitiva, são as
seguintes:
a) restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida (art. 24, I);
b) proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de
propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial (art. 24, II);
c) suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor (art. 24, III);
d) prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes
da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida (art. 24, IV).
Nestas hipóteses, a ação principal deverá ser ajuizada no juízo comum, no prazo de 30 (trinta) dias, a
contar do deferimento da medida cautelar, sob pena de caducidade.
Trata-se de uma situação em que a tutela cautelar, sob a forma de medida cautelar de urgência, é
julgada pelo Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e a tutela definitiva pelo juízo comum,
que poderá evidentemente revogar a tutela cautelar.
Nada obsta que a tutela cautelar, nas situações acima, também seja pleiteada diretamente ao juízo
comum.
Por outro lado, acerca da competência territorial, de acordo com o art. 15, é competente, por opção da
ofendida, para os processos cíveis regidos pela Lei Maria da Penha, o Juizado:
I - do seu domicílio ou de sua residência;
II - do lugar do fato em que se baseou a demanda;
III - do domicílio do agressor.
Trata-se de foro alternativo, aplicável apenas aos processos cíveis regidos pela Lei Maria da Penha.
A questão que surge é se a competência acima só se aplica às ações de divórcio, dissolução de união
estável e dissolução de união homoafetiva ou se também se estenderia às ações principais ajuizadas no juízo
comum quando houver a tutela cautelar, na forma de medida protetiva de urgência concedida pelo juizado
de violência doméstica e familiar contra mulher.
Creio que a competência territorial acima também se aplica às ações principais ajuizadas no juízo
comum cujo objeto esteja relacionado com a medida protetiva de urgência concedida pelo Juizado de
Violência Doméstica e Familiar contra Mulher, pois, na interpretação desta Lei, serão considerados os fins
sociais a que ela se destina e, especialmente, as condições peculiares das mulheres em situação de violência
doméstica e familiar (art. 4º da Lei Maria da Penha).

RELEVÂNCIA DAS DECLARAÇÕES DA VÍTIMA

De acordo com o STJ, nos crimes praticados no âmbito doméstico e familiar, a palavra da vítima tem
especial relevância para fundamentar o recebimento da denúncia ou a condenação, pois normalmente são
cometidos sem testemunhas.
É, pois, possível uma condenação baseada exclusivamente na palavra da vítima, quando o delito ocorre
na clandestinidade, sem que tenha sido presenciado por testemunhas.

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NÃO SUSPENSÃO DOS PRAZOS PROCESSUAIS

De acordo com o art. 798-A do CPP, introduzido pela Lei 14.365/2022, os prazos processuais não se
suspendem nos procedimentos regidos pela Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha).
A propósito, dispõe o art. 798-A do CPP:
Suspende-se o curso do prazo processual nos dias compreendidos entre 20 de dezembro e 20 de janeiro,
inclusive, salvo nos seguintes casos:
I - que envolvam réus presos, nos processos vinculados a essas prisões;
II - nos procedimentos regidos pela Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha);
III - nas medidas consideradas urgentes, mediante despacho fundamentado do juízo competente.
Durante o período de suspensão, fica vedada a realização de audiências e de sessões de julgamento,
salvo nas hipóteses dos incisos I, II e III acima mencionadas (parágrafo único do art. 798-A do CPP).

MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA

Conceito

As medidas protetivas de urgência são providências determinadas pelo juiz, com o intuito de proteger
a ofendida e os seus bens contra o agressor.

Órgão incumbido de sua decretação

Elas só podem ser decretadas pelo juiz, cível ou criminal, nos casos de violência doméstica e familiar
contra mulher (art. 22).
Abre-se exceção à medida de afastamento do agressor do lar, domicílio ou local onde de convivência
com a ofendida, que, nos termos do art. 12-C, verificada a existência de risco atual ou iminente à vida ou à
integridade física ou psicológica da mulher em situação de violência doméstica e familiar, ou de seus
dependentes, pode ser decretada pelo delegado de polícia, quando o Município não for sede de comarca; ou
pelo policial quando o Município não for sede de comarca e não houver delegado disponível no momento da
denúncia. Em ambas as hipóteses, o juiz deverá ser comunicado em 24 (vinte e quatro) horas.

Aplicação analógica das medidas protetivas de urgência

O art. 313, III, do CPP estabelece que será admitida a prisão preventiva “se o crime envolver violência
doméstica e familiar contra a mulher, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das
medidas protetivas de urgência”.
Vê-se assim que os crimes que envolvem violência doméstica e familiar contra idoso, enfermo ou pessoa
com deficiência, ainda que do sexo masculino, pois o art. 313, III, não faz qualquer distinção, admitem
expressamente a aplicação de medidas protetivas de urgência.
Entretanto, não há na lei nenhum dispositivo mandando estender expressamente as medidas protetivas
de urgência dos arts. 22 a 24 da Lei Maria da Penha às referidas pessoas do sexo masculino.
Diante disso, há duas interpretações.
Primeira, o art. 313, III, do CPP é inaplicável às pessoas do sexo masculino, pois as normas restritas de
direito não admitem a analogia, sob pena de violação do princípio da legalidade, previsto no art. 5º, II, da CF.
Segunda, é possível a aplicação das medidas protetivas de urgência dos arts. 22 a 24 da Lei Maria da
Penha, pois o art. 313. III, do CPP, de forma implícita, admitiu a sua incidência aos crimes que envolvem
violência doméstica e familiar contra idoso, enfermo ou pessoa com deficiência.
Convém destacar que a aplicação da Lei Maria da Penha às pessoas mencionadas no art. 313, III, do CPP,
para os que adotam esta segunda corrente, será restrita às medidas protetivas de urgência, não se estendendo
às restrições de direito penal.
No tocante à violência doméstica e familiar contra a criança e adolescente, ainda que do sexo masculino,

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independentemente portanto de razões de gênero, aplica-se a lei 14.344/2022, que, em seu artigo 33, prevê
expressamente a aplicação subsidiária da Lei Maria da Penha, admitindo ainda a prisão preventiva do agressor,
quando houver suficientes indícios de ameaça à criança ou ao adolescente vítima ou testemunha de violência
(art. 21, III).

Rol das medidas protetivas de urgência

As medidas protetivas de urgência estão arroladas nos arts. 22 a 24.


A doutrina considera o rol meramente exemplificativo, pois os arts. 22 e 24 utiliza a expressão “entre
outras” e o art. 23 “sem prejuízo de outras”, de modo que o juiz, com base no seu poder geral de cautela, pode
criar outras medidas protetivas de urgência, que são então regidas pelo princípio da atipicidade.
Os adeptos da tese do rol taxativo, porém, poderão argumentar o seguinte:
a) a restrição de direitos só pode ser instituída por lei, sob pena de violação do princípio da legalidade,
estampado no art. 5º, II, da CF;
b) o propósito de se criar um rol meramente exemplificativo é incompatível com o número excessivo
de medidas protetivas de urgência arroladas pelo legislador, nos arts. 22 a 24;
c) as expressões “entre outras” e “sem prejuízo de outras” sinalizam a possibilidade de aplicação de
outras medidas, desde que previstas em lei, como é o caso das medidas cautelares pessoais dos arts. 318 e
319 do CPP;
d) o §1º do art. 22 preceitua que “as medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras
previstas na legislação em vigor”.

Natureza jurídica

Sobre a natureza jurídica das medidas protetivas de urgência, há duas correntes.


Primeira, trata-se de medida cautelar tradicional, pois visa garantir a eficácia do processo principal,
estando assim agregadas das características da instrumentalidade, temporariedade e não satisfatividade.
Nesta linha de raciocínio, as medidas protetivas de urgência se revelam acessórias do processo criminal
ou cível e, por consequência, em não sendo proposta a ação penal ou cível, elas são extintas.
Se, por exemplo, a vítima ou seu representante legal, no crime de ameaça, não ofertar a representação,
no prazo de 6 (seis) meses a contar do conhecimento da autoria do fato, haverá a extinção da punibilidade e,
em decorrência disso, a cessação de todas medidas protetivas de urgência.
Outra corrente, porém, adotada pelo STJ, defende que a sua natureza jurídica é de medida cautelar
satisfativa, dotada de autonomia, dispensando qualquer outro procedimento, pois o seu objetivo não é
garantir a eficácia do processo, mas, sim, proteger os direitos fundamentais da mulher que se encontra em
situação de violência doméstica e familiar.
Dentro deste ponto de vista, o STJ destaca que as medidas protetivas de urgência podem ser pleiteadas
de forma autônoma para fins de cessação ou de acautelamento de violência doméstica contra a mulher,
independentemente da existência, no presente ou futuro, ou mesmo em potencial, de processo crime ou cível
contra o suposto agressor.
De fato, o objetivo das medidas protetivas de urgência, não é garantir o resultado efetivo do processo,
mas proteger a mulher e seus dependentes, evitando a continuidade da violência, impondo-se a sua
manutenção, enquanto necessárias para garantir a integridade física, psicológica, moral, sexual e patrimonial
da vítima em situação de violência doméstica e familiar, estando assim, em sua manutenção, inserida a
cláusula “rebus sic stantibus”.
No exemplo do crime de ameaça, onde se operou a extinção da punibilidade pela falta de
representação, o STJ tem mantido as medidas protetivas de urgência de caráter pessoal, enquanto perdurar
o perigo, como é o caso da proibição de se aproximar da vítima na distância fixada pelo juiz, asseverando que
elas não são, necessariamente, preparatórias de qualquer ação judicial e que não buscam provar crimes, até
porque podem ser deferidas mesmo em sua ausência.
Adoto uma corrente híbrida ou mista.

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Endosso a corrente que trata o tema como medida cautelar satisfativa, mas apenas em relação às
medidas protetivas de urgência de caráter pessoal.
Neste caso, as medidas protetivas, quando necessárias à proteção da mulher e de seus dependentes,
devem perdurar, ainda que o processo principal não seja instaurado.
No tocante, porém, às medidas protetivas de urgência de caráter patrimonial, previstas no art. 24,
outrossim, as que versam sobre alimentos provisórios e provisionais (art. 22, V). a meu ver, têm a natureza
das cautelares tradicionais, que são acessórias e não sobrevivem sem o processo principal.

Pressupostos

São dois os seus pressupostos de aplicação:


a) a demonstração sumária da existência de violência doméstica e familiar contra mulher. No âmbito
penal, é o “fumus comissi delicti”: consiste na prova da materialidade e dos indícios suficientes de autoria
acerca da prática do crime ou contravenção, em situação de violência doméstica e familiar contra mulher. No
âmbito cível, é possível aplicar as medidas protetivas de urgência sem que haja uma infração penal.
b) “Periculum in mora”: é o perigo da demora em se adotar a providência solicitada pela vítima.

Cumulação de medidas

As medidas protetivas de urgência serão aplicadas de forma isolada ou cumulativamente.


Aliás, as medidas referidas não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre
que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem (art. 22, § 1º).
Nada obsta, portanto, nas hipóteses de infração penal, a sua cumulação com as medidas cautelares
pessoais, previstas nos arts. 319 e 320 do CPP. É, por exemplo, possível se cumular a medida protetiva de
afastamento do lar com a medida cautelar pessoal de monitoramento eletrônico.
Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer
momento, auxílio da força policial (art. 22, §3º).

Legitimidade para requerer as medidas protetivas de urgência

As medidas protetivas de urgência poderão ser requeridas:


a) pela vítima ou se representante legal; e
b) pelo Ministério Público.
A propósito, dispõe o art. 19:
“As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério
Público ou a pedido da ofendida”.
O agressor não tem legitimidade para pedir medida protetiva, mas, quando houver pedido de prisão
preventiva, nada obsta que ele requeira contra si próprio, para evitar a prisão, uma medida protetiva de
urgência em favor da vítima.
Quanto ao juiz, não pode concedê-las de ofício. A substituição, entretanto, pode ser ordenada de ofício
pelo magistrado. Igualmente, a revogação.
Quanto à autoridade policial também não tem legitimidade para requerer as medidas protetivas de
urgência, mas deve orientar a vítima acerca do assunto. Nada obsta que sugira ao Ministério Público para que
este requeira determinada medida.

Momento do requerimento

O pedido de medida protetiva de urgência poderá ser feito pela vítima ou seu representante legal, ou
ainda pelo Ministério Público, na própria delegacia de polícia ou no curso do processo, inclusive, após o
trânsito em julgado da condenação.
Normalmente, o pedido é formulado perante a autoridade policial, que deverá encaminhar o

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expediente ao juiz, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas.


Tanto na fase policial quanto na fase judicial, a vítima pode requerer a medida protetiva de urgência,
sem advogado (art. 27).
A autoridade policial deverá remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao
juiz com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência (art. 12, III).
Recebido o expediente com o pedido da ofendida, caberá ao juiz, nos termos do art. 18, no prazo de 48
(quarenta e oito) horas:
I - conhecer do expediente e do pedido e decidir sobre as medidas protetivas de urgência;
II - determinar o encaminhamento da ofendida ao órgão de assistência judiciária, quando for o caso,
inclusive para o ajuizamento da ação de separação judicial, de divórcio, de anulação de casamento ou de
dissolução de união estável perante o juízo competente;
III - comunicar ao Ministério Público para que adote as providências cabíveis.
IV - determinar a apreensão imediata de arma de fogo sob a posse do agressor.

Dispensa do contraditório prévio

As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato, independentemente de


audiência das partes (§1º do art. 19).
Em relação às medidas protetivas de urgência, como se vê. o contraditório pode ser diferido, ou seja,
ocorrer somente após a concessão da medida.
Diversamente, no tocante à prisão preventiva e medidas cautelares pessoais dos arts. 319 e 320 do CPP,
a regra é o contraditório prévio, admitindo-se o posterior apenas quando houver urgência ou perigo de
ineficácia da medida (§ 3º do art. 283 do CPP).

Dispensa da prévia manifestação do Ministério Público

As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato, independentemente de


manifestação do Ministério Público, devendo este ser prontamente comunicado (§1º do art. 19).
O Ministério Público não precisa se manifestar previamente à concessão da medida protetiva de
urgência, mas obrigatoriamente terá que ser comunicado do deferimento do pedido.

Descumprimento injustificado das medidas protetivas de urgência

Em havendo o descumprimento injustificado das medidas protetivas de urgência, o magistrado poderá


tomar uma das seguintes providências:
a) substituição por outra mais severa. As medidas protetivas de urgência poderão ser substituídas a
qualquer tempo por outras de maior eficácia, sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados
ou violados (§2º do art. 19).
b) reforço da medida. Trata-se da manutenção da medida anterior com o acréscimo de outra. Poderá o
juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida, conceder novas medidas protetivas de
urgência ou rever aquelas já concedidas, se entender necessário à proteção da ofendida, de seus familiares e
de seu patrimônio, ouvido o Ministério Público (§ 3º do art. 19).
c) execução específica (§ 4º do art. 22). Trata-se das providências judiciais ordenadas para compelir o
agente a cumprir as medidas. O juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de multa, a busca
e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva,
podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial (§ 1º do art. 536 do CPC).
d) aplicação das medidas cautelares pessoais dos arts. 319 e 320 do CPP.
e) decretação da prisão preventiva (art. 20).
Além disso, ainda haverá o crime de desobediência por descumprimento de medida protetiva de
urgência (art. 24-A).
As medidas cautelares pessoais e a prisão preventiva só devem ser decretadas quando presentes

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os fundamentos previstos no art. 312 do CPP.


Convém ainda registrar que o juiz cível, em havendo descumprimento injustificado da medida protetiva
de urgência não poderá aplicar as medidas cautelares pessoais dos arts. 319 e 320 do CPP, nem decretar a
prisão preventiva, pois estas duas providências pressupõem a prática de uma infração penal. Ademais, a prisão
civil só é possível na hipótese de inadimplência de débito alimentar.

Prisão preventiva

A prisão preventiva nos crimes que envolvem violência doméstica e familiar apresenta um diferencial
apenas quando houver o descumprimento injustificado das medidas protetivas de urgência.
Este diferencial consiste no fato de poder também ser decretada nas infrações penais em que a pena
máxima não excede a 4 (quatro) anos, ainda que o agente seja primário.
De fato, o art. 313, III, do CPP, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência, admite a
prisão preventiva quando o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança,
adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, independentemente da quantidade da pena abstrata.
É, por exemplo, cabível, com base no art. 313, III, do CPP, a prisão preventiva pelo crime de ameaça (art. 147
do CP).
Entretanto, quando a situação não envolver o descumprimento injustificado de medidas protetivas de
urgência, a prisão preventiva, ainda que se trate de crime com violência doméstica e familiar contra mulher,
segue a regra comum, só podendo ser decretada em crime doloso punidos com pena privativa de liberdade
máxima superior a 4 (quatro) anos ou então quando se tratar de pessoa condenada por outro crime doloso,
em sentença transitada em julgado (art. 313, I e II).
Sobre a prisão preventiva, quer haja ou não o descumprimento injustificado das medidas protetivas de
urgência, convém fazer as seguintes observações:
a) não existe a prisão preventiva automática. Assim, o descumprimento injustificado das medidas
protetivas de urgência não conduz automaticamente à prisão preventiva, que sempre dependerá de uma
decisão judicial.
b) o juiz não poderá decretar de ofício a prisão preventiva, conforme §2º do art. 282 do CPP, com
redação dada pela Lei 13.964/2019, estando, nesse aspecto, revogado o art. 20, caput, da Lei Maria da
Penha. A revogação da prisão preventiva, entretanto, poderá se dar de ofício pelo juiz. quando verificar a falta
de motivo para que subsista (art. 20, parágrafo único).
c) a prisão preventiva poderá ser decretada pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou mediante
representação da autoridade policial, em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal.
d) prisão preventiva, para ser decretada, além da necessidade de se enquadrar numa das hipóteses do
art. 313 do CPP, ainda depende da presença de um dos fundamentos do art. 312 do CPP: garantia da ordem
pública, conveniência da instrução criminal ou assegurar a aplicação da lei penal.
e) no tocante ao descumprimento de medidas protetivas de urgência impostas por juiz cível, não será
cabível a prisão preventiva, pois esta só é admitida quando se imputar ao agente a prática de crime. Nesse
caso, será possível a imposição das medidas de execução específica, como, por exemplo, multa diária,
previstas no CPC (art. 22, § 4º).

Crime de Descumprimento de Medidas Protetivas de Urgência

O descumprimento das medidas protetivas de urgência constitui crime de desobediência, previsto no


art. 24-A, introduzido pela lei 13.641/2018, nos seguintes termos:
“Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei:
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos”.
Trata-se de um tipo penal especial de desobediência.
A configuração do crime independe da competência civil ou criminal do juiz que deferiu as medidas
(§1º).
Na hipótese de prisão em flagrante, apenas a autoridade judicial poderá conceder fiança neste delito

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de desobediência (§2º).
O disposto neste artigo não exclui a aplicação de outras sanções cabíveis (§3º). Portanto, além
do crime de desobediência, o juiz ainda poderá decretar a prisão preventiva, quando presentes os requisitos
do art. 312 do CPP ou outras providências como o reforço ou substituição da medida por outra mais severa,
outrossim, a imposição de multa pelo descumprimento.
Convém esclarecer que, antes da criação deste tipo penal, o descumprimento das medidas protetivas
de urgência não caracterizava crime de desobediência, pois a lei previa outras sanções e não ressalvava
expressamente a existência do crime de desobediência.
O descumprimento injustificado da medida protetiva de urgência de afastamento do lar, quando
imposta pela autoridade policial ou por policial, nos termos do art. 12-C, antes de ser ratificada pelo juiz, não
caracteriza crime de desobediência, pois o tipo penal em análise só se refere à decisão judicial.
Por fim, o delito em análise, a meu ver, também é regido pela Lei Maria da Penha e, por isso, nos termos
do seu art. 41, não se sujeita à Lei 9.099/95.
De fato, o sujeito passivo não é apenas o Estado, mas também a mulher que, diante do descumprimento
injustificado da medida protetiva de urgência, tem também o seu direito lesado.
O assunto, porém, não é pacífico, pois outra corrente considera o referido delito como sendo
exclusivamente contra a administração pública e, dessa forma, a ele poderia ser aplicado a Lei 9.099/95, pois
o art. 41 da Lei Maria da Penha só veda a incidência desta lei aos delitos que envolvem violência doméstica e
familiar contra mulher.

Revogação e substituição da medida protetiva de urgência

A medida protetiva de urgência é decretada com a cláusula “rebus sic stantibus”, pois só será mantida,
nos termos de sua decretação, se a situação fática permanecer a mesma.
Se, em razão de fato novo, ela se tornar excessiva, o juiz, de ofício, a qualquer tempo, poderá revogá-la
ou substituí-la por outra.
A revogação é o cancelamento da medida protetiva, por decisão judicial.
A substituição é a troca da medida por outra mais branda ou mais severa.
A substituição, de ofício pelo juiz, por outra medida mais severa poderá ensejar polêmica.

Recursos

Na seara processual penal, por interpretação extensiva do art. 581, V, do CPP, que cuida da prisão
preventiva, caberá recurso em sentido estrito, interposto pelo Ministério Público ou querelante da ação penal
privada, contra a decisão que:
a) indeferir o requerimento de medida protetiva de urgência;
b) revogar a medida protetiva de urgência.
Este recurso não tem efeito suspensivo e. por isso, o Ministério Público ou o querelante, paralelamente
à sua interposição, poderá ingressar com uma medida cautelar para, em sede de liminar, obter a decretação
da medida protetiva de urgência ou impedir a sua revogação, conforme a hipótese.
Quanto à vítima, ainda que habilitada como assistente de acusação, não poderá interpor recursos no
processo penal, salvo nas hipóteses do art. 584, §1º, e 598 do CPP, ou seja, sentença absolutória e decisão
que extingue a punibilidade. Por consequência, não lhe é facultado ingressar com recurso em sentido estrito
contra a decisão que indeferir ou revogar a medida protetiva de urgência, mas poderá impugnar a aludida
decisão através do mandado de segurança.
Por outro lado, na hipótese de o indeferimento do requerimento de medida protetiva de urgência ou a
sua revogação emanar de decisão do juiz cível, o recurso cabível será o agravo de instrumento (art. 1.015, I,
do CPC).
Em relação à decisão que decreta a medida protetiva de urgência, no âmbito do processo penal, é
irrecorrível.
Neste caso, uma corrente sustenta o cabimento do “habeas corpus”, pois o descumprimento

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injustificado poderá ensejar a decretação da prisão preventiva, pondo em risco a liberdade de locomoção.
Outra corrente, porém, sustenta que, quando a medida protetiva de urgência não implica na violação
do direito de ir e vir, não tem cabimento o “habeas corpus”, por exemplo, suspensão do porte de arma de
fogo. Se, entretanto, afetar o direito de ir e vir, justifica-se o cabimento do remédio heroico, por exemplo,
obrigação de manter distância da vítima.
É, pois, a posição do STJ, que fixou a seguinte tese:
“O habeas corpus não constitui meio idôneo para se pleitear a revogação de medidas protetivas
previstas no art. 22 da Lei n. 11.340/2006 que não implicam constrangimento ao direito de ir e vir do paciente”.
Por fim, no âmbito cível, é cabível o recurso de agravo de instrumento contra a decisão que decretar ou
indeferir o pedido de decretação de medida protetiva de urgência, nos termos do art. 1.015, I, do CPC. Nesse
caso, a interposição de recurso em sentido estrito será considerado erro grosseiro, inviabilizando-se a sua
conversão em agravo.

Concessão de fiança pela autoridade policial

A autoridade policial pode conceder fiança aos delitos cuja pena abstrata não excede a 4 (quatro) anos
(art. 322 do CPP).
Não se abre exceção aos delitos cometidos mediante violência doméstica e familiar contra
mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, sendo, pois, perfeitamente viável a
concessão da fiança pela autoridade policial.
É equivocada a corrente que nega a possibilidade de fiança concedida pela autoridade policial, sob o
singelo argumento de que os referidos delitos admitem a prisão preventiva, nos termos do art. 313, III, do
CPP.
Ora, a admissão da prisão preventiva, na hipótese do art. 313, III, do CPP, não deriva da prática do crime,
mas, sim, de um acontecimento futuro e incerto, que é o descumprimento injustificado da medida protetiva
de urgência.
Ademais, a admissão da prisão preventiva depende da presença dos fundamentos do art. 312 do CPP e
é claro que, diante da presença de um desses fundamentos, a autoridade policial não poderá conceder a
fiança.
Acrescente-se que quando foi para proibir a fiança pela autoridade policial a lei o fez expressamente,
como no delito de desobediência, previsto no art. 24-A, silenciando de forma eloquente quanto aos demais
crimes.

Vedação da liberdade provisória

É necessário, para que haja liberdade provisória, que se trate de uma prisão em flagrante lícita, sob o
prisma formal e material, pois a prisão ilícita não é tecnicamente objeto de liberdade provisória, mas, sim, de
relaxamento do flagrante.
A concessão da liberdade provisória, com ou sem fiança, como se sabe, é função exclusiva do juiz, salvo
nos delitos cuja pena máxima não excede a 4 (quatro) anos, pois, nesse caso, a autoridade policial poderá
conceder a liberdade provisória mediante fiança à pessoa que é presa em flagrante.
Convém observar que a autoridade policial não pode conceder a liberdade provisória sem fiança.
Na Lei Maria da Penha, o §2º do art. 12-C preceitua que nos casos de risco à integridade física da
ofendida ou à efetividade da medida protetiva de urgência, não será concedida liberdade provisória ao preso.
A vedação da liberdade provisória, segundo o dispositivo acima, ocorrerá quando houver a presença de
um dos seguintes requisitos:
a) risco à integridade física da ofendida; ou
b) risco à efetividade da medida protetiva de urgência.
Nas infrações penais cometidas com violência doméstica e familiar contra mulher, no âmbito da Lei
Maria da Penha, em havendo um dos riscos acima, o agente, que é preso em flagrante, não poderá mais ser
posto em liberdade provisória.

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É claro que, enquanto persistir o risco, não deverá ser concedida a liberdade provisória, mas o texto da
lei induz à interpretação de que, uma vez caracterizado o risco, não poderia mais ser posto em liberdade
provisória, ainda que posteriormente houvesse a cessação do risco.
Criou-se aparentemente uma hipótese de presunção de periculosidade permanente.
No tocante à vedação da liberdade provisória pela autoridade policial, quando houver um dos riscos
acima, não vislumbro qualquer inconstitucionalidade, pois da mesma forma que a lei pode lhe atribuir o poder
de conceder fiança, nos delitos cuja pena máxima não excede a 4 (quatro) anos, também pode prever
hipóteses de vedação da fiança pela referida autoridade policial.
O dispositivo em análise, entretanto, veda, em termos peremptórios, sem fazer qualquer distinção,
entre a autoridade policial e a autoridade judiciária, a liberdade provisória ao preso, nos casos de risco à
integridade física da ofendida ou à efetividade da medida protetiva de urgência.
No concernente à autoridade judiciária, a vedação, pela lei, da liberdade provisória se reveste de
inconstitucionalidade, conforme já decidiu o STF (HC 104.339/SP, de 10 de maio de 2012).
De fato, segundo o Plenário do STF, a vedação abstrata da liberdade provisória viola os princípios
constitucionais da presunção da inocência e do devido processo legal.
Noutras palavras, a lei obriga o juiz a converter a prisão em flagrante em prisão preventiva e, como se
sabe, a lei não pode estabelecer situações de prisão preventiva obrigatória.

Intimação da vítima

A ofendida deverá ser notificada dos atos processuais relativos ao agressor, especialmente dos
pertinentes ao ingresso e à saída da prisão, sem prejuízo da intimação do advogado constituído ou do defensor
público (art. 21).
Há um equívoco neste art. 21, quando utiliza o termo notificação, em vez de intimação.
A notificação é a comunicação para realizar um comportamento. Notifica-se, por exemplo, a
testemunha para que compareça para prestar depoimento.
A intimação, por sua vez, é a comunicação de ato já praticado.
Assim, a ofendida deverá, portanto, ser intimada dos atos pertinentes ao ingresso e à saída da prisão,
outrossim, dos atos processuais relativos ao agressor.
Sobre a forma desta intimação, entende-se que deve ser pessoal e não através da imprensa.
A propósito, dispõe o art. 201, §3o do CPP:
“As comunicações ao ofendido deverão ser feitas no endereço por ele indicado, admitindo-se, por opção
do ofendido, o uso de meio eletrônico”
A intimação da ofendida não é uma mera discricionariedade, mas, sim, um dever. Entretanto, a
falta de intimação não tem o condão de anular o processo, salvo quando:
a) ela houver se habilitado como assistente de acusação;
b) nos casos de ação penal privada.

Intimação ou notificação do agressor

A função de intimação ou notificação do agressor é da polícia e do Poder Judiciário, conforme se trate


de inquérito policial ou processo judicial e não pode ser delegada à vítima da violência doméstica e familiar.
A propósito, dispõe o parágrafo único do art. 21:
“A ofendida não poderá entregar intimação ou notificação ao agressor”.

Espécies de medidas protetivas de urgência

A lei 11.340/2.006 prevê duas espécies de medidas protetivas de urgência:


a) as que obrigam o agressor (art. 22);
b) as que visam proteger a pessoa ou patrimônio da ofendida (arts. 23 e 24). O art. 23 cuida das
medidas protetivas de urgência à ofendida de caráter pessoal. O art. 24 trata das medidas protetivas de

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urgência à ofendida de caráter patrimonial.


As medidas protetivas de urgência podem ser impostas por juiz criminal e também por juiz cível
(normalmente, os da vara de família), conforme já salientado anteriormente.

Medidas Protetivas de Urgência que Obrigam o Agressor

O art. 22 prevê o rol das medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor. Ei-las:

I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos
termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003 .
Há, neste inciso I, duas medidas protetivas de urgência aplicadas pelo juiz ao agressor que tinha a posse
lícita ou o porte lícito da arma de fogo. São elas:
a) suspensão da posse da arma de fogo. É a proibição de ter a arma de fogo em sua residência ou no
local de trabalho do qual é o titular do estabelecimento ou responsável legal da empresa. Trata-se da hipótese
em que o agente tem o certificado de registro da arma.
b) restrição do porte de arma de fogo. É a diminuição do tempo e do espaço para portar a arma de fogo
fora de casa. Neste caso, além do registro, o agente ainda tem o direito ao porte. Exemplo: o juiz autoriza o
policial que agrediu a mulher a portar a arma apenas durante o exercício de suas funções. Note-se que a lei
não confere ao juiz o poder de suspender o porte, mas apenas restringi-lo. A lei também não autoriza o juiz a
cassar o registro nem o porte, pois estas sanções são impostas pela polícia federal ou comando do exército.
As duas medidas acima são aplicadas quando a arma não houver sido utilizada para a prática da violência
doméstica e familiar, pois, caso contrário, a apreensão, por se tratar de instrumento de crime, será feita pela
própria autoridade policial.
Além das duas medidas acima, o juiz ainda comunicar o órgão competente para o registro e concessão
do porte de arma de fogo, que são a polícia federal e o comando do exército, conforme se trate de arma de
fogo de uso permitido ou restrito;
Nas hipóteses de porte de arma de fogo autorizado pela lei, nos termos do art. 6º do Estatuto do
Desarmamento, juiz tem o dever de aplicar esta medida de restrição do porte de arma de fogo e de comunicar
ao órgão, corporação ou instituição a que pertencer o agressor sobre toda e qualquer medida protetiva de
urgência que lhe tenha sido aplicada, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento
da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o
caso (§2º do art. 22).
Trata-se de uma hipótese rara de crime de desobediência, previsto no art. 330 do CP, que poderá ser
cometido pelo funcionário público superior incumbido da fiscalização. Se o superior permitir o
descumprimento da ordem judicial para satisfazer interesse ou sentimento pessoal, o crime será de
prevaricação (art. 319 do CP).

II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;


De acordo com o art. 12-C, introduzido pela lei 13.827/2019, “verificada a existência de risco atual ou
iminente à vida ou à integridade física ou psicológica da mulher em situação de violência doméstica e familiar,
ou de seus dependentes, o agressor será imediatamente afastado do lar, domicílio ou local de convivência
com a ofendida:
I - pela autoridade judicial;
II - pelo delegado de polícia, quando o Município não for sede de comarca; ou
III - pelo policial, quando o Município não for sede de comarca e não houver delegado disponível no
momento da denúncia”.
Vê-se assim que o delegado de polícia pode aplicar apenas a medida protetiva de afastamento do
agressor do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida, quando o município não for sede da
comarca, ou seja, quando não houver um juiz de direito.
O policial também pode aplicar esta medida protetiva de afastamento do lar, quando o município não
for sede de comarca e não houver delegado de polícia disponível no momento da denúncia.

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A expressão “denúncia” foi empregada no sentido de comunicação do fato.


A lei não adjetiva o policial que teria atribuição para aplicar esta medida. Por consequência, abrange
tanto os policiais civis quanto os policiais militares.
Quanto ao guarda municipal, não exerce função de polícia e, por isso, não poderá aplicar esta medida,
mas o assunto ensejará polêmica.
O objetivo da lei, de permitir que a medida protetiva de urgência seja aplicada, nas situações acima,
pela autoridade policial ou por policial, é evitar que o seu retardamento seja lesivo à vítima.
Só pode ser aplicada pela autoridade policial ou por policial quando houver risco atual ou iminente à
integridade física ou psicológica da mulher em situação de violência doméstica e familiar ou a seus
dependentes.
Certamente, uma corrente sustentará a inconstitucionalidade desta medida protetiva de urgência
decretada pela autoridade policial ou por policial, por conferir aos agentes policiais uma nova atribuição que
não é prevista pelo art. 144 da CF.
A meu ver, não há qualquer inconstitucionalidade, pois não se trata de prisão.
Este afastamento do lar é, sim, uma função policial, à medida que visa proteger a integridade física ou
psicológica da ofendida ou de seus dependentes.
Segundo a jurisprudência do STF, a lei pode atribuir à autoridade policial o poder de realizar a condução
coercitiva, que é uma medida próxima à prisão, desde que não se trate de condução coercitiva para o fim de
interrogatório. Se é cabível a condução coercitiva, com maior razão se torna lícita a medida de afastamento
do lar.
Pode também ser invocado o instituto da legítima defesa de terceiro, diante do risco atual ou iminente
à vida ou integridade física ou psicológica da mulher ou de seus dependentes.
O §1º do art. 12-C acrescenta que nessas duas situações, o juiz será comunicado no prazo máximo de
24 (vinte e quatro) horas e decidirá, em igual prazo, sobre a manutenção ou a revogação da medida aplicada,
devendo dar ciência ao Ministério Público concomitantemente.
É de 24 (vinte e quatro) horas o prazo máximo para se comunicar o juiz, que terá também, 24 (vinte e
quatro) horas para decidir pela manutenção ou revogação da medida.
A lei não exige a oitiva do Ministério Público, mas ele deverá ser comunicado sobre a decisão tomada
pelo juiz.

III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:


a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância
entre estes e o agressor; Exemplo: o juiz fixa uma distância mínima de 200 metros;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da
ofendida. É preciso especificar os lugares proibidos. A frequência significa o ingresso habitual, mas o juiz pode
também proibir um único acesso ao local.

IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento


multidisciplinar ou serviço similar.
Há neste inciso duas medidas:
a) restrição de visitas aos dependentes menores. Trata-se da visita monitorada. No Estado de São Paulo
existe o Centro de Visitas Assistidas do Tribunal de Justiça (Cevat), local onde se realiza as visitas
monitoradas.
b) suspensão de visitas aos dependentes menores. É a paralisação total das visitas durante um
determinado período.
Estas duas medidas, em função da gravidade, não podem ser deferidas sem a prévia oitiva da equipe de
atendimento multidisciplinar ou serviço similar.
Esta equipe de atendimento multidisciplinar é a composta por psicólogos e assistentes sociais.

V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.

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Trata-se da única hipótese em que os alimentos podem ser concedidos por juiz criminal.
Os alimentos podem ser pleiteados pela mulher em benefício próprio ou em favor dos filhos menores,
na sua qualidade de representante legal.
A mulher só poderá pleitear os alimentos em benefício próprio, nos casos em que a lei civil lhe defere
este direito, ou seja, quando se tratar de cônjuge, companheira, ascendente, descendente e irmã do agressor.
Una namorada que, por exemplo, é agredida pelo namorado não faz jus aos alimentos, pois a lei civil
não lhe confere este direito.
Os alimentos, a que se refere o inciso V em análise, são apenas os provisórios ou provisionais.
Segundo a própria lei, estes alimentos não são definitivos e, por isso, não é razoável sustentar que se
trata de uma medida cautelar satisfativa, que esgota-se em si mesma a ponto de se prescindir do ajuizamento
da ação principal.
Na Lei Maria da Penha, tanto os alimentos provisórios quanto os alimentos provisionais têm caráter de
medida cautelar acessória e, por isso, a ação principal deve ser proposta no prazo de 30 (trinta) dias, a contar
da decisão concessiva, sob pena de caducidade.
Ambos, na lei em estudo, são arbitrados liminarmente, sem ouvir a parte contrária.
A diferença consiste no fato de os alimentos provisórios serem destinados ao sustento, habitação e
vestuário da vítima de violência doméstica e familiar, ao passo que os alimentos provisionais ou “ad litem”,
além do sustento, habitação e vestuário, ainda visam obter uma quantia para pagar as despesas processuais
e honorários advocatícios da ação principal que se pretende mover em face do agressor.
A ação principal pode ser de alimentos, divórcio, dissolução de união estável e outras.

VI – comparecimento do agressor a programas de recuperação e reeducação.

Trata-se de uma medida que visa recuperar e reeducar o agressor, conscientizando-o dos malefícios da
violência doméstica e familiar contra mulher.
O comparecimento do agressor a programas de recuperação e reeducação é previsto:
a) pelo art. 152 da Lei de Execução Penal, quando lhe houver sido imposta a pena de limitação de fim
de semana, que é uma das espécies de penas restritivas de direito.
b) pelo inciso VI do art. 22 da Lei Maria da Penha, em análise, como medidas protetivas de urgência.
Quando imposto em decorrência da pena de limitação de fim de semana, o seu início só se verifica após
o trânsito em julgado da condenação e, nesse caso, a recusa injustificada em comparecer poderá ensejar a
conversão da pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade, mas não caracteriza crime de
desobediência.
Quando imposta como medida protetiva de urgência, o início ê imediato, prescindindo-se da
condenação penal e até mesmo da necessidade de instauração de processo criminal. Nesse caso, a recusa
injustificada em comparecer caracteriza crime de desobediência do art. 24-A, além de outras sanções.

VII – acompanhamento psicossocial do agressor, por meio de atendimento individual e/ou em grupo de
apoio.
O acompanhamento psicossocial do agressor pode ser feito de forma individual ou através de grupo de
apoio, contando sempre com a participação de profissionais especializados (psicólogos e assistentes sociais).
Trata-se de uma medida que, na prática, costuma surtir o efeito de recuperar e reeducar o agressor.

Das Medidas Protetivas de Urgência à Ofendida

Espécies

As medidas protetivas de urgência à ofendida estão previstas nos arts. 23 e 24.


São duas as espécies de medidas protetivas de urgência à ofendida:
a) medidas de caráter pessoal (art. 23);
b) medidas de caráter patrimonial (art.24).

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Medidas protetivas de urgência à ofendida de caráter pessoal

Consoante preceitua o art. 23, poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:
I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de
atendimento.
De acordo com o art. 35, a União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios poderão criar e
promover, no limite das respectivas competências, centros de atendimento integral e multidisciplinar para
mulheres e respectivos dependentes em situação de violência doméstica e familiar. Outrossim, casas-abrigos
para mulheres e respectivos dependentes menores em situação de violência doméstica e familiar;

II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após


afastamento do agressor;
A ofendida que, em razão da violência doméstica e familiar, havia se afastado do lar poderá pedir ao
juiz a sua recondução, mas o magistrado, nesse caso, deverá tomar a cautela de primeiro determinar o
afastamento do agressor.
Se, necessário, o juiz. deve cumular esta medida com a de fixação de distância mínima do agressor em
relação à vítima.

III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos
filhos e alimentos.

IV - determinar a separação de corpos.


Os incisos III e IV do art. 23 cuidam da medida cautelar onde a própria ofendida pede ao juiz que a
autorize a deixar o lar.
Quando ela pede que o agressor seja afastado do lar, o fundamento é o art. 22, II.
O inciso III ressalva que o fato de a ofendida ter pleiteado o próprio afastamento do lar não a prejudicará
na partilha dos bens, guarda dos filhos e alimentos, questões que serão resolvidas no juízo de família.
A separação de corpos é uma medida cautelar onde o cônjuge pleiteia o próprio afastamento do lar ou
o afastamento do outro consorte.
É também cabível a separação de corpos na união estável e união homoafetiva e não apenas no
casamento.
A menção à separação de corpos no inciso IV era desnecessária, pois o inciso III já disciplina o assunto
de forma mais abrangente.
De fato, o pedido da vítima para deixar o lar do agressor pode se verificar em qualquer situação de
violência doméstica e familiar, ainda que não se trate de uma entidade familiar.
A medida em análise pode, por exemplo, ser pleiteada no concubinato, que é a união com pessoa
casada, não separada de fato, outrossim, com parente com o qual a lei civil proíbe o casamento.
Igualmente, é cabível no namoro qualificado, onde os namorados moram juntos, mas não há, entre eles,
união estável, ante à ausência do propósito de constituir família.
A mãe que, por exemplo, mora com o filho agressor, pode pedir ao juiz apoio para se retirar do lar.
A rigor, para deixar o lar, a ofendida não precisa de ordem judicial, mas esta é salutar para se precaver
de eventual imputação de culpa pelo abandono do lar, outrossim, quando o agressor cria obstáculos para
impedi-la de sair.
Sobre a necessidade de a ação principal ser ou não proposta dentro de 30 (trinta) dias, há duas
correntes, conforme já abordado anteriormente.
Primeira, por se tratar de uma medida cautelar, é necessário que, dentro de 30 (trinta) dias, seja
proposta a ação principal, sob pena de a liminar se tornar sem efeito. A ação principal, conforme a hipótese,
pode ser a de divórcio, dissolução de união estável, partilha de bens e alimentos.
Segunda, trata-se de uma medida cautelar satisfativa, que dispensa a propositura de qualquer outra
ação

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V - determinar a matrícula dos dependentes da ofendida em instituição de educação básica mais


próxima do seu domicílio, ou a transferência deles para essa instituição, independentemente da existência de
vaga.
Esta medida se faz necessária em duas situações. Primeira, quando o agressor cria obstáculos para que
a matrícula se realize numa instituição de educação básica mais próxima do seu domicílio. Segundo,
quando é a escola que se recusa, por falta de vaga ou outro motivo.
A educação básica abrange o ensino infantil, o ensino fundamental e o ensino médio
A instituição de educação básica pode ser pública ou privada, pois onde a lei não distingue ao intérprete
não é lícito distinguir.
É claro que, em se tratando de instituição particular, o juiz não poderá isentar a ofendida do pagamento
da matrícula e mensalidades.

Medidas protetivas de urgência à ofendida de caráter patrimonial (art. 24)

A proteção patrimonial se estende a duas espécies de bens:


a) bens da sociedade conjugal: são aqueles que, por força do regime de bens, pertencem a ambos os
cônjuges ou companheiros. Trata-se dos bens comuns. Por analogia, a hipótese também se aplica aos bens
que, por força do condomínio, pertence também à mulher, como na hipótese de uma irmã, que junto com o
irmão, herda o mesmo veículo.
b) bens de propriedade particular da mulher: são os bens próprios, que pertencem exclusivamente à
mulher.
As medidas que serão analisadas logo em seguida não podem recair sobre bens que pertençam
exclusivamente ao agressor
Com efeito, de acordo com o art. 24, para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou
daqueles de propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as seguintes medidas,
entre outras:
I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida.
A restituição só poderá recair sobre bens que o agressor subtraiu indevidamente da vítima.
É, pois, necessário a existência de indícios desta subtração.
Essencial, portanto, que vítima demonstre que, antes da subtração, tinha a posse do bem comum ou
particular
É ainda preciso, em atenção ao caput do art. 24, que o bem seja comum ou então que pertença
exclusivamente à ofendida.
Se o bem for de propriedade exclusiva do agressor, não há falar-se em restituição, ainda que a ofendida
o possuísse licitamente, mas, nesse caso, poderá pleitear seus direitos no juízo cível competente.
II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de
propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial.
III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor.
A proibição da venda e locação dos bens particulares da mulher emana da lei, prescindindo-se de
decisão judicial.
Em razão disso, o inciso II prevê a proibição, por decisão judicial de atos e contratos de compra, venda
e locação de propriedade em comum.
Nesse caso, o bem se torna temporariamente inalienável e a eventual venda ou locação sem ordem
judicial será nula.
Conquanto o inciso II do art. 24 se refira apenas à venda ou locação, o certo é que o juiz pode estender
a proibição para todo e qualquer ato de oneração ou disposição do bem. Exemplos: permuta, comodato,
arrendamento, penhor, etc.
O inciso III não cuida da revogação, mas, sim, da suspensão das procurações, que é a sua ineficácia por
tempo determinado ou indeterminado.
A ofendida, para revogar a procuração outorgada ao agressor, não precisa de ordem judicial, pois, para

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tanto, basta notificá-lo.


Nada obsta, porém, que, em vez da suspensão, a vítima requeira ao juiz a revogação.
O juiz, ao impor esta medida do inciso II e do inciso III, deverá oficiar ao cartório competente (parágrafo
único do art. 24).
O objetivo é conferir publicidade, pois, a partir do registro, o terceiro que celebrar negócio jurídico com
o agressor não poderá alegar boa-fé.
Em se tratando de bens imóveis, o ofício é endereçado ao oficinal do Registro de Imóveis, que deverá
providenciar a averbação da decisão judicial junto à matrícula do imóvel.
Em relação aos bens móveis, o ofício é dirigido ao oficial do Cartório de Títulos e Documentos.

IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais
decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida.
A caução é o depósito feito em dinheiro para se garantir o cumprimento de uma obrigação.
Trata-se de um ato acessório, pois se destina a garantir o adimplemento de uma outra obrigação.
A caução pode ser:
a) legal: quando imposta por lei;
b) convencional: quando imposta por acordo entre as partes;
c) judicial: quando imposta por decisão judicial.
O inciso IV prevê a caução judicial para garantir o pagamento das perdas e danos materiais decorrentes
da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida.
É, pois, necessário que a ofendida, em seu pedido, demonstre, num juízo de cognição sumária, os
seguintes requisitos:
a) a existência do dano material;
b) o valor do dano material;
c) a autoria do dano
Não é possível a aludida caução quando se tratar de danos morais.
Prestada a caução, o dinheiro permanecerá depositado em juízo, em caráter provisório, pois, ao término
da ação principal, será entregue à vítima, em caso de procedência; ou restituída ao agressor, na hipótese de
improcedência.
Sobre a necessidade de se ajuizar a ação principal de perdas e danos, no prazo de 30 (trinta) dias, sob
pena de restituição da caução ao agressor, ê preciso considerar duas situações.
Primeira, a medida foi imposta no curso da persecução penal.
Neste caso, a ação principal será a própria ação penal pública ou privada, pois a condenação penal
transitada em julgado torna certa a obrigação de indenizar a vítima, funcionando como título executivo judicial
na esfera cível.
Não haverá, pois, a necessidade de se ajuizar a ação de indenização, mas, após o trânsito em julgado da
condenação, a vítima terá que ajuizar a ação de liquidação de sentença, no prazo de 30 (trinta) dias, para se
apurar o valor do dano, sob pena de a caução ser restituída ao agressor.
Segunda, a medida foi imposta pelo juiz cível.
Neste caso, a ação principal de indenização pelos danos materiais deverá ser ajuizada em 30 (trinta)
dias, sob pena de restituição da caução ao agressor.
Ajuizada a ação indenizatória, o juiz do juizado de violência doméstica e familiar contra mulher
encaminhará o depósito judicial ao juízo comum, onde tramita a ação de indenização.

INCLUSÃO DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA EM BANCOS DE DADOS DO CNJ

De acordo com o parágrafo único do art. 38-A, as medidas protetivas de urgência serão, após sua
concessão, imediatamente registradas em banco de dados mantido e regulamentado pelo Conselho Nacional
de Justiça, garantido o acesso instantâneo do Ministério Público, da Defensoria Pública e dos órgãos de
segurança pública e de assistência social, com vistas à fiscalização e à efetividade das medidas protetivas.”
O juiz, quando aplica a medida protetiva de urgência, deverá determinar o seu registro imediato em

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Banco de Dados mantido e regulamentado pelo Conselho Nacional de Justiça.


O acesso a este registro deverá ser garantido instantaneamente ao Ministério Público, Defensoria
Pública, órgãos de segurança pública e órgãos de assistência social, com vistas à fiscalização e à efetividade
das medidas protetivas.
Cumpre lembrar que o CNJ tem dois bancos de dados similares:
a) o banco de dados para registro de mandado de prisão. É para qualquer mandado de prisão e não
apenas os expedidos nos crimes relacionados com violência doméstica e familiar contra mulher.
b) o banco de dados para o registro de medidas protetivas de urgência, que é exclusiva para os crimes
relacionados com violência doméstica e familiar contra mulher.
O objetivo é a criação de um sistema nacional de armazenamento de todos os mandados de medidas
protetivas de urgência do país, relacionados à violência doméstica ou familiar contra mulher.

AGRAVANTE DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR

A alínea “f” do art. 61, II, preceitua que “a pena será agravada quando o agente cometer o crime com
violência contra a mulher na forma da lei específica”.
A agravante da violência doméstica e familiar contra a mulher só terá incidência quando presentes os
requisitos para a aplicação da Lei Maria da Penha.

LESÃO CORPORAL LEVE QUALIFICADA PELA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Com a designação legal de Violência Doméstica, dispõe o § 9º do art. 129 do CP:


“Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com
quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação
ou de hospitalidade:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos”.
O “nomem juris” do delito, violência doméstica, não corresponde à descrição típica, tanto é que até o
homem pode ser vítima, ao contrário do que ocorre na Lei 11.340/2.006 (Lei Maria da Penha).
Por isso, optei pela nomenclatura “Lesão Corporal Leve Qualificada pela Violência Doméstica”, em
detrimento da rubrica lateral “violência doméstica”.
De fato, o delito em análise não passa de uma lesão corporal leve qualificada, e não de um crime
específico de violência doméstica.
É assim uma qualificadora, pois tem pena própria, detenção de 3 (três) meses a 3 (três) anos, não se
enquadrando, portanto, como infração penal de menor potencial ofensivo.
O sujeito ativo é o ascendente, descendente, irmão, cônjuge, companheiro, pessoa com quem convive
ou tenha convivido, pessoa de suas relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade.
Este rol é taxativo.
Trata-se de crime próprio.
O sujeito passivo são as mesmas pessoas acima.
A propósito, relações domésticas são as instauradas entre pessoas da mesma família ou entre patrões
e empregados.
As relações de coabitação, por sua vez, se caracterizam pela moradia duradoura sob o mesmo teto
(exemplo: república de estudantes). Quanto às relações de hospitalidade, compreendem as recepções
eventuais ou passageiras, sem necessidade de pernoite, como, por exemplos, o convite para o almoço em
casa.
Quanto à expressão “com quem convive”, prevista no tipo penal, refere-se às pessoas que vivem
habitualmente em proximidade, ainda que não morem sob o mesmo teto. Exemplos: colegas de trabalho,
namorados.
No concernente à “pessoa com quem tenha convivido”, abrange “ex-cônjuges ou ex-companheiros,
bem como as pessoas que, no passado, viviam habitualmente em proximidade. Exemplos: ex-namorados, ex-
colegas de trabalho.

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No tocante ao ascendente, descendente, irmão, cônjuge, companheiro, pessoa com quem convive ou
tenha convivido, não é necessário, para a incidência da qualificadora, que o agente tenha se prevalecido de
relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade.
Acrescente-se ainda que não se aplicam as agravantes do art. 61, II, “e” e “f”, pois elas já integram o
tipo penal em estudo.
No delito em análise, em sendo a vítima mulher, a violência não é cometida em razão do gênero
feminino.
Com efeito, a lesão corporal leve contra mulher, por razões do gênero feminino, se enquadra na
qualificadora do §13 do art. 129 do CP.
Há, entretanto, algumas situações excepcionais, que serão analisadas mais adiante, que admitem a
aplicação do §9º do art. 129 do CP, quando presentes as razões de gênero contra vítima mulher.
Por fim, a ação penal é pública condicionada à representação.

CAUSA DE AUMENTO DE PENA DO §9º DO ART. 129

Dispõe o §11 do art. 129 do CP:


“Na hipótese do §9º deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra
pessoa portadora de deficiência”.
Exige-se, para a incidência da majorante, três requisitos cumulativos:
a) que o sujeito ativo seja o ascendente, descendente, irmão, cônjuge, companheiro, pessoa com quem
convive ou tenha convivido, pessoa de suas relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade.
b) que o sujeito passivo seja pessoa portadora de deficiência. Esta deficiência pode ser física,
mental, intelectual e sensorial, pois onde a lei não distingue ao intérprete não é lícito distinguir. Ademais, o
Estatuto da Pessoa com Deficiência, instituído pela Lei 13.146/2.015, refere-se a essas quatro modalidades de
deficiência.
c) que se trate de uma lesão corporal leve. Não há, pois, o aumento da pena quando se tratar das lesões
qualificadas dos §§ 1º a 3º do art. 129 do CP.
Na hipótese de a vítima ser menor de 14 (quatorze) anos, o §7º do art. 129 do CP também prevê um
aumento da pena de 1/3 (um terço).
Se, entretanto, a vítima for simultaneamente menor de 14 (quatorze) anos e ainda portadora de alguns
deficiência, só incidirá a majorante do §11, pois, diante do concurso entre duas ou mais causas de aumento
de pena previstas na parte especial do Código Penal, pode o juiz limitar-se a um só aumento, prevalecendo-se
a causa que mais aumenta, conforme parágrafo único do art. 68 do CP. A expressão “o juiz pode” deve ser
interpretada como “o juiz deve”, pois se revela inconcebível imaginar que o juiz teria a discricionariedade para
conceder ou não um favor ao réu. Não se trata, aliás, de um favor, mas, sim, de um direito público subjetivo
do réu. No caso, como ambas as causas preveem o aumento de 1/3 (um terço), prevalece a do §11, que é
específica em relação ao delito do §9º do art. 129 do CP.

PROGRAMA DE COOPERAÇÃO SINAL VERMELHO CONTRA A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Conceito
O programa de cooperação Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica é uma das medidas de
enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher, através da ampliação dos canais para se
denunciar os crimes desta natureza.
Antes deste programa, que foi instituído pela Lei 14.188/2.021, a mulher, para fazer uma denúncia de
crime de violência doméstica e familiar, tinha que entrar em contato com a polícia, pessoalmente ou por
telefone, o que, em função da permanência vigilância e opressão impostas pelo agressor, nem sempre era
possível.
Com o advento desta lei, a mulher pode fazer a denúncia numa farmácia ou supermercado, por
exemplo, onde então o atendente treinado tomará as providências protocolares para socorrê-la.

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Natureza jurídica

Trata-se de mais uma das medidas de enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher,
que visa dar cumprimento à política pública que mira a sua proteção.
No sentido técnico jurídico, não se trata de uma medida de proteção, mas, sim, da concretização da
política pública de ampliação dos canais de denúncia de violência doméstica e familiar contra mulher.

Organização do programa

A promoção e a realização do programa Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica será feita através
da integração entre o setor público as entidades privadas de todo o país.
Está integração é que é uma das diretrizes da política pública de combate à violência doméstica contra
mulher (art. 8º, I, da Lei 11.340/2.006).
No âmbito do setor público, os legitimados para instrumentalizar a integração são:
a) Poder Executivo. Abrange o Poder Executivo federal, estadual, distrital e municipal, em suas
respectivas áreas de atuação.
b) Poder Judiciário. Compreende os juízos e tribunais federais, estaduais, trabalhistas, eleitorais e
militares. Outrossim, o Conselho Nacional de Justiça, os Tribunais Superiores e o Supremo Tribunal Federal.
c) o Ministério Público. Abrange o Ministério Público Federal, Estadual, Distrital, Trabalhista, Eleitoral e
Militar. Outrossim, o Conselho Nacional do Ministério Público.
d) Defensoria Pública. Compreende a Defensoria Pública da União, dos Estados e do Distrito Federal.
e) os órgãos de segurança pública. Estes órgãos, nos termos do art. 144 da CF, são: a polícia federal,
polícia rodoviária federal polícia ferroviária federal, polícias civis, polícias militares, corpos de bombeiros
militares e polícias penais federal, estadual e distrital.
Cada um desses órgãos desfruta de legitimidade concorrente e autônoma para celebrar o instrumento
de integração, pois o objetivo é a expansão cada vez maior do programa de proteção.
Quanto às entidades privadas de todo o país, que podem aderir ao programa, são as sociedades,
associações, fundações, organizações religiosas, partidos políticos, empresas individuais de responsabilidade
limitada, bem como os partidos políticos e as empresas individuais.
É importante destacar que a adesão ao programa, por entidades privadas de todo o país, é facultativa.
Acrescente-se ainda que lei não cuidou da forma da integração, que deverá ser definida por cada um
dos órgãos públicos acima referidos.
Canal de comunicação

Os órgãos públicos acima mencionados deverão estabelecer um canal de comunicação imediata com as
entidades privadas participantes do programa.
Este canal de comunicação poderá ser um site, um telefone, um e-mail, um WhatsApp, etc.
Cada um dos referidos órgãos públicos deverá ter o seu próprio canal de comunicação, a fim de se
viabilizar a assistência e segurança à vítima, a partir do momento em que houver sido efetuada a denúncia por
meio do código "sinal em formato de X", preferencialmente feito na mão e na cor vermelha.
Com o objetivo de se estimular a mulher a denunciar a violência doméstica, através do programa de
cooperação Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica, deverão ser realizadas campanhas informativas.
E, para que a mulher seja realmente protegida, deverão ser realizadas a capacitação permanente dos
profissionais pertencentes ao programa.
Aliás, o art. 8º, VII, da Lei 11.340/2.006 já determinava a capacitação permanente das Polícias Civil e
Militar, da Guarda Municipal, do Corpo de Bombeiros e dos profissionais pertencentes aos órgãos e às áreas
de segurança pública, assistência social, saúde, educação, trabalho e habitação, quanto às questões de gênero
e de raça ou etnia.

Forma silenciosa de denunciar

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De acordo com a lei, a denúncia poderá ser feita pela vítima por meio do código "sinal em formato de
X", preferencialmente feito na mão e na cor vermelha.
Exemplo: a vítima, ao sair do toalete de um restaurante, mostra discretamente, para o garçom, o “X”
em sua mão, contornado com batom vermelho.
Trata-se assim de uma forma de denúncia silenciosa, para que o agressor, que esteja ao lado dela, não
possa perceber.
Sobre o "sinal em formato de X", é preciso fazer duas observações:
a) é um mero exemplo de se fazer a denúncia silenciosa, que poderá obviamente ser realizada por
outros meios.
b) deverá ser divulgado em campanha publicitária informativa como sendo o código oficial de se realizar
a denúncia.
A promoção e a realização de campanhas educativas de prevenção da violência doméstica e familiar
contra a mulher deve ser voltada ao público escolar e à sociedade em geral, com o intuito escopo da difusão
da Lei 11.350/2.006 e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos das mulheres (art. 8º, V, da Lei
11.340/2.006).

Locais da denúncia

A denúncia, através do sinal em formato de X, poderá ser feita pela vítima pessoalmente em:
a) repartições públicas
b) entidades privadas de todo o País.
No tocante as repartições públicas, todas elas necessariamente deverão aderir ao programa.
Em contrapartida, as entidades privadas só participarão do programa mediante adesão voluntária, pois
ainda não há lei que as obrigue.

CRIMES AMBIENTAIS

(LEI 9.605/98)

INTRODUÇÃO

Meio ambiente é o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e
biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas. Este conceito é extraído do art. 3º da lei
12.305/2.010, que é a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente.
No aspecto penal, o meio ambiente é regido pela lei 9.605, que dispõe sobre:
a – Disposições gerais sobre o sujeito ativo;
b – Aplicação da pena;
c – Apreensão do produto e instrumentos dos crimes;
d – Ação e Processo penal;
e – Crimes contra a fauna;
f – Crimes contra a flora;
g – Poluição e outros crimes ambientais;
h – Crimes contra o ordenamento urbano e patrimônio cultural;
i - Crimes contra a Administração Ambiental.

LEIS REVOGADAS

No aspecto penal, operou-se a revogação tácita do Código de Pesca e do Código de Caça, à medida que
a lei 9.605/98 disciplinou toda a parte criminal referente à pesca e caça.
O antigo Código Florestal (lei 4.771/65), quanto aos crimes contra a flora, também foi revogado pela lei

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em estudo, mais ainda sobreviveu por alguns anos em relação às contravenções florestais. Com o advento da
lei 12.651/2.012, que instituiu o novo Código Florestal, operou-se a revogação expressa do antigo e, por
consequência, de todas as contravenções penais que ele previa. Em resumo, não existe mais nenhuma
contravenção florestal.
A lacuna que ficou foi quanto à “queimada”, isto é, o fogo sem as devidas cautelas para se evitar a sua
propagação. De mera contravenção prevista no antigo Código Florestal, tornou-se fato atípico.
O Código de Pesca, o Código de Caça e o novo Código Florestal não tratam mais de questões penais,
mas são diplomas normativos úteis na exegese dos delitos ambientais previstos na lei 9.605/98.

SUJEITO ATIVO

Sujeito ativo dos crimes ambientais pode ser tanto a pessoa física quanto a pessoa jurídica (art. 2º).
No concernente às pessoas físicas, há duas observações:
a) em regra, os crimes são comuns, isto é, podem ser praticados por qualquer pessoa, salvo quanto aos
crimes contra a administração pública ambiental dos arts. 66 e 67, cujo sujeito ativo é o funcionário público.
Saliente-se, ainda, que os demais crimes contra a administração ambiental, também são comuns.
b) nos crimes praticados por pessoa jurídica, a pessoa física também responderá pelo delito, conforme
art. 2º, mediante três requisitos. O primeiro é que ocupe o cargo de diretor, administrador, membro de
conselho e de órgão técnico, auditor, gerente, preposto ou mandatário da pessoa jurídica. O segundo é o dolo
direto, ou seja, a ciência da conduta criminosa de outrem. O terceiro é a omissão de deixar de impedir a sua
prática quando podia agir para evitá-la.
Quanto à pessoa jurídica, a sua responsabilidade penal exige dois requisitos:
a) que o delito seja praticado por decisão de seu representante legal ou contratual ou de seu órgão
colegiado (exemplos: assembleia geral, conselho de administração, etc).
b) que o delito seja praticado no interesse ou benefício da própria pessoa jurídica.
A responsabilidade penal da pessoa jurídica não exclui a das pessoas físicas, autoras, coautoras ou
partícipes do mesmo fato (parágrafo único do art. 3º). Há, pois, o concurso necessário de agentes entre a
pessoa jurídica e as pessoas físicas responsáveis pelo delito. São, pois, os delitos praticados pela pessoa jurídica
de dupla ou plúrima subjetividade ativa.
Denota-se, portanto, a prevalência, pelo menos na doutrina, do sistema da dupla imputação, consagrado
no parágrafo único do art. 3º da Lei n. 9.605/98, segundo o qual a responsabilidade penal da pessoa jurídica
implica necessariamente a responsabilidade criminal das pessoas físicas que participaram do mesmo delito. Força
convir, destarte, que os crimes praticados pela pessoa jurídica são plurissubjetivos, porque necessariamente
devem ser também perpetrados por pessoas físicas. Entretanto, a posição do STF é a que não vigora o sistema
da dupla imputação, de modo que a pessoa jurídica pode ser processada criminalmente, independentemente
das pessoas físicas responsáveis pela deliberação ou execução do ato criminoso. O argumento da Excelsa Corte é
que o § 3º do art. 225 da CF refere-se aos infratores pessoas físicas ou jurídicas, e não pessoas físicas e jurídicas.
O art. 4º ainda acrescenta que poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua
personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.
Na desconsideração da personalidade jurídica, os sócios passam a ser também os responsáveis diretos
e solidários pela indenização aos danos ambientais.

APLICAÇÃO DA PENA

A lei 9.605/98 cuida dos seguintes aspectos da pena:


a) circunstâncias judiciais;
b) atenuantes e agravantes genéricas;
c) pena de multa;
d) penas restritivas de direitos aplicáveis às pessoas físicas;
e) “sursis”

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f) penas restritivas de direitos aplicáveis à pessoa jurídica;


g) reparação do dano.

CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS

Para fixar a pena-base, o juiz deverá examinar as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP e do art. 6º, I
e II, da lei 9.605/98.
Estas circunstâncias do art. 6º são:
I - a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública
e para o meio ambiente;
II - os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental;

ATENUANTES GENÉRICAS

Além das atenuantes genéricas dos arts. 65 e 66 do CP, o art. 14 ainda prevê as seguintes, que são
específicas para os crimes ambientais:
I - baixo grau de instrução ou escolaridade do agente;
II - arrependimento do infrator, manifestado pela espontânea reparação do dano, ou limitação
significativa da degradação ambiental causada;
III - comunicação prévia pelo agente do perigo iminente de degradação ambiental;
IV - colaboração com os agentes encarregados da vigilância e do controle ambiental.
7 – Agravantes genéricas
As agravantes genéricas específicas das crimes ambientais concentram-se no art. 15. São as seguintes:
I - reincidência nos crimes de natureza ambiental;
II - ter o agente cometido a infração:
a) para obter vantagem pecuniária;
b) coagindo outrem para a execução material da infração;
c) afetando ou expondo a perigo, de maneira grave, a saúde pública ou o meio ambiente;
d) concorrendo para danos à propriedade alheia;
e) atingindo áreas de unidades de conservação ou áreas sujeitas, por ato do Poder Público, a regime
especial de uso;
f) atingindo áreas urbanas ou quaisquer assentamentos humanos;
g) em período de defeso à fauna;
h) em domingos ou feriados;
i) à noite;
j) em épocas de seca ou inundações;
l) no interior do espaço territorial especialmente protegido;
m) com o emprego de métodos cruéis para abate ou captura de animais;
n) mediante fraude ou abuso de confiança;
o) mediante abuso do direito de licença, permissão ou autorização ambiental;
p) no interesse de pessoa jurídica mantida, total ou parcialmente, por verbas públicas ou beneficiada
por incentivos fiscais;
q) atingindo espécies ameaçadas, listadas em relatórios oficiais das autoridades competentes;
r) facilitada por funcionário público no exercício de suas funções.
Claro que também incidirão as agravantes genéricas dos arts. 61 e 62 do CP, por força do art. 12 do CP.

PENA DE MULTA

A pena de multa será calculada segundo os critérios do Código Penal e, portanto, varia de 10 (dez) a 360
(trezentos e sessenta) dias-multa.

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Na fixação do valor do dia-multa, o juiz levará em conta a situação econômica do réu. Cada dia-multa
varia entre 1/30 (um trigésimo) a 5 (cinco) vezes o valor do salário mínimo.
A multa será calculada segundo os critérios do Código Penal; se revelar-se ineficaz, ainda que aplicada
no valor máximo, poderá ser aumentada até três vezes, tendo em vista o valor da vantagem econômica
auferida.
A perícia de constatação do dano ambiental, sempre que possível, fixará o montante do prejuízo
causado para efeitos de prestação de fiança e cálculo de multa.
A perícia produzida no inquérito civil ou no juízo cível poderá ser aproveitada no processo penal,
instaurando-se o contraditório.

PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS APLICÁVEIS ÀS PESSOAS FÍSICAS

As penas restritivas de direitos previstas no art. 8º são:


I - prestação de serviços à comunidade;
II - interdição temporária de direitos;
III - suspensão parcial ou total de atividades;
IV - prestação pecuniária;
V - recolhimento domiciliar.
A lei 9.605/98 prevê também a pena privativa de liberdade e a pena de multa, mas a preferência é que
sejam aplicadas as penas restritivas de direitos.
As penas restritivas de direitos são autônomas, pois elas visam substituir as privativas de liberdade.
Esta substituição é possível mediante os seguintes requisitos:
a) condenação por crime culposo, qualquer que seja a quantidade da pena, ou por crime doloso em que
a condenação a pena privativa de liberdade seja inferior a quatro anos. Note-se que a pena igual a quatro anos
não admite a substituição por restritivas de direitos;
b) que a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como
os motivos e as circunstâncias do crime indicarem que a substituição seja suficiente para efeitos de reprovação
e prevenção do crime.
As penas restritivas de direitos terão a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída.
A prestação de serviços à comunidade consiste na atribuição ao condenado de tarefas gratuitas junto a
parques e jardins públicos e unidades de conservação, e, no caso de dano da coisa particular, pública ou
tombada, na restauração desta, se possível.
As penas de interdição temporária de direitos consiste em certas proibições impostas ao condenado
pelo prazo de cinco anos, no caso de crimes dolosos, e de três anos, nos crimes culposos.
Estas restrições são:
a) proibição de contratar com o Poder Público;
b) proibição de receber incentivos fiscais ou quaisquer outros benefícios;
c) proibição de participar de licitação.
A suspensão de atividades será aplicada quando estas não estiverem obedecendo às prescrições legais
(art.11).
A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima ou à entidade pública ou privada
com fim social, de importância, fixada pelo juiz, não inferior a um salário mínimo nem superior a trezentos e
sessenta salários mínimos. O valor pago será deduzido do montante de eventual reparação civil a que for
condenado o infrator.
O recolhimento domiciliar baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado, que
deverá, sem vigilância, trabalhar, frequentar curso ou exercer atividade autorizada, permanecendo recolhido
nos dias e horários de folga em residência ou em qualquer local destinado a sua moradia habitual, conforme
estabelecido na sentença condenatória.

SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA (SURSIS)

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Nos crimes ambientais, o “sursis” é cabível na condenação a pena privativa de liberdade de até três
anos (art. 16), ao passo que nos demais crimes o benefício só pode ser aplicado em condenações que não
excedem a dois anos.
O sursis pode ser:
a) simples: quando o condenado não houver reparado o dano. Nesse caso, o condenado, no primeiro
ano de período de prova, presta serviços à comunidade ou submete-se à limitação de fim de semana (§1º do
art. 78 do CP).
b) especial: quando o condenado reparar o dano ambiental, devidamente comprovado em laudo
ambiental. Nesse caso, não terá que prestar serviços à comunidade nem se submeterá à limitação de fim de
semana. Terá, no entanto, que cumprir as condições do §2º do art. 78 do CP e outros impostas pelo juiz
relacionadas com a proteção ao meio ambiente.

PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS APLICÁVEIS À PESSOA JURÍDICA

As penas aplicáveis à pessoa jurídica, segundo o art. 21, são:


I – multa;
II – restritiva de direitos;
III – prestação de serviços à comunidade.
O art. 24 ainda prevê mais uma pena, que é a de liquidação forçada.
As referidas penas podem ser aplicadas de forma isolada, alternativa ou cumulativa.
As penas restritivas de direitos aplicáveis à pessoa jurídica são:
I - suspensão parcial ou total de atividades;
II - interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade;
III - proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou
doações.
A suspensão de atividades será aplicada quando estas não estiverem obedecendo às disposições legais
ou regulamentares, relativas à proteção do meio ambiente.
A interdição será aplicada quando o estabelecimento, obra ou atividade estiver funcionando sem a
devida autorização, ou em desacordo com a concedida, ou com violação de disposição legal ou regulamentar.
A proibição de contratar com o Poder Público e dele obter subsídios, subvenções ou doações não poderá
exceder o prazo de dez anos.
Por outro lado, a prestação de serviços à comunidade pela pessoa jurídica consistirá em:
I - custeio de programas e de projetos ambientais;
II - execução de obras de recuperação de áreas degradadas;
III - manutenção de espaços públicos;
IV - contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas.
Quanto à pena de multa, não há qualquer diferença quanto à multa aplicada às pessoas físicas.
Finalmente, a pena de liquidação forçada, só pode ser aplicada quanto a pessoa jurídica houver sido
constituída ou utilizada, preponderantemente, com o fim de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crime
ambiental. Esta pena gera a extinção da pessoa jurídica, uma espécie de “pena de morte”, e o seu patrimônio
será considerado instrumento do crime e como tal confiscado a favor do Fundo Penitenciário Nacional.

REPARAÇÃO DO DANO

A sentença penal condenatória, sempre que possível, fixará o valor mínimo para reparação dos danos
causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido ou pelo meio ambiente.
Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá efetuar-se pelo valor fixado nos
termos do caput, sem prejuízo da liquidação para apuração do dano efetivamente sofrido.
A execução desse valor mínimo será no juízo cível.
Quanto ao restante da indenização, caso ela ultrapasse esse valor mínimo, deverá primeiro ser objeto
de ação de liquidação para depois se iniciar a execução.

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APREENSÃO DO PRODUTO E DO INSTRUMENTO DO CRIME OU DA INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA

Verificada a prática do crime ou da infração administrativa, lavra-se de imediato o auto de apreensão


desses bens ou animais.
Os animais serão prioritariamente libertados em seu habitat ou, sendo tal medida inviável ou não
recomendável por questões sanitárias, entregues a jardins zoológicos, fundações ou entidades assemelhadas,
para guarda e cuidados sob a responsabilidade de técnicos habilitados.
Até que os animais sejam entregues às instituições mencionadas no § 1o deste artigo, o órgão autuante
zelará para que eles sejam mantidos em condições adequadas de acondicionamento e transporte que
garantam o seu bem-estar físico.
Tratando-se de produtos perecíveis ou madeiras, serão estes avaliados e doados a instituições
científicas, hospitalares, penais e outras com fins beneficentes.
Os produtos e subprodutos da fauna não perecíveis serão destruídos ou doados a instituições científicas,
culturais ou educacionais.
Esta venda deverá ser feita em leilão público. Mas antes da venda é preciso descaracterizar esses
instrumentos, ou seja, retirar o seu potencial lesivo, através de reciclagem, por exemplo, transformar num
bloco de ferro uma armadilha que se destinava a caçar onças.

AÇÃO PENAL

Todos os crimes ambientais são de ação pública incondicionada.

PROCESSO PENAL

A competência, em regra, é da Justiça Estadual, mas se o delito lesar bens, serviços ou interesses da
União, ou de suas autarquias e empresas públicas, a competência será da Justiça Federal, conforme art. 109,
IV, da CF. Se lesar interesses de sociedade de economia mista, persiste a competência da Justiça Estadual.
Embora não haja mais contravenções ambientais, na época em que existia o STJ editou a Súmula 38:
“Compete à Justiça Estadual Comum, na vigência da Constituição de 1988, o processo por contravenção penal,
ainda que praticada em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades”.
É que a Justiça Federal não tem competência julgar contravenções penais, consoante se ressalva no art.
109, IV, da CF.
Sobre a conexão entre crimes da Justiça Federal e da Justiça Estadual, dispõe a Súmula 122 do STJ:
“Compete à Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de competência
federal e estadual, não se aplicando a regra do art. 78, II, “a”, do Código de Processo Penal”.
Quanto à transação penal, também é cabível nos crimes ambientais de menor potencial ofensivo, isto
é, cuja pena abstrata não exceda a dois anos, mas exige-se um requisito extra, que é a prévia reparação do
dano ambiental, salvo em caso de comprovada impossibilidade (art. 27).
A suspensão condicional do processo, prevista no art. 89 da lei 9.099/95, também é cabível nos crimes
ambientais.
Estranhamente, o art. 28 da lei 9.605/98 só prevê esse benefício aos crimes de menor potencial
ofensivo, ao passo que o art. 89 da lei 9.099/95 estende o benefício aos crimes de médio potencial ofensivo,
que são aqueles cuja pena mínima não excede a um ano. Por interpretação lógica, é preciso concluir que a
expressão “crimes de menor potencial ofensivo”, prevista no art. 28, foi empregada em sentido amplo para
abranger também aqueles cuja pena mínima não exceda a um ano. Exegese diversa tornaria inócuo o referido
benefício, posto que, para os genuínos crimes de menor potencial ofensivo, já existe o instituto da transação
penal, que é muito mais benéfico.
Após cumprir o período de prova oriundo da suspensão do processo, a declaração de extinção da
punibilidade dependerá de laudo de constatação da reparação total do dano ambiental, salvo comprovada
impossibilidade.

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Apurado que o dano não foi reparado na íntegra, prorroga-se a suspensão do processo até o prazo
máximo, que é de quatro anos, acrescido de mais um ano.
Durante a prorrogação, a prescrição permanece suspensa e não há exigência de se cumprir qualquer
condição.
Findo o prazo de prorrogação, é feito novo laudo de constatação de reparação do dano ambiental e,
para que a punibilidade seja extinta, será preciso que o laudo de constatação comprove ter o acusado tomado
as providências necessárias à reparação do dano. Caso contrário, o período de prova, se ainda não havia sido
prorrogado até o máximo, poderá ser novamente prorrogado. Se já havia atingido o máximo da prorrogação,
o benefício será revogado, impondo-se então o prosseguimento do processo.

CRIMES CONTRA A FAUNA

Nos arts. 29 a 37 estão os crimes contra a fauna, todos eles dolosos. Não há nenhum culposo.
Alguns desses delitos referem-se à fauna silvestre, outros, não.
São espécimes da fauna silvestre todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e
quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro
dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras (§3º do art.29).
Trata-se, como se vê, de uma norma penal explicativa.
Os crimes dos arts. 29 a 32 cuidam da fauna terrestre e os previstos nos arts. 33 a 35 da fauna aquática,
em especial da pesca.
O art. 36, que é outra norma penal explicativa, dispõe que: “Para os efeitos desta Lei, considera-se pesca
todo ato tendente a retirar, extrair, coletar, apanhar, apreender ou capturar espécimes dos grupos dos peixes,
crustáceos, moluscos e vegetais hidróbios, suscetíveis ou não de aproveitamento econômico, ressalvadas as
espécies ameaçadas de extinção, constantes nas listas oficiais da fauna e da flora”.
O art. 37, por fim, é uma norma penal permissiva, aplicável tanto à fauna terrestre quanto à aquática.
Preceitua que não é crime o abate de animal, quando realizado:
a) em estado de necessidade, para saciar a fome do agente ou de sua família. É o chamamento abate
famélico.
b) para proteger lavouras, pomares e rebanhos da ação predatória ou destruidora de animais, desde
que legal e expressamente autorizado pela autoridade competente. É o chamado abate científico ou de
equilíbrio, cuja ilicitude só é excluída se houver prévia autorização da autoridade competente.
c) por ser nocivo o animal, desde que assim caracterizado pelo órgão competente. É o abate nocivo. É,
no entanto, necessário, para se excluir o crime, que o animal seja realmente caracterizado pelo órgão
competente como sendo nocivo, isto é, perigoso à vida ou saúde das pessoas. Exemplo: matar animal
contaminado por uma doença transmissível e grave.
No tocante à fauna terrestre, os crimes são os seguintes:
a) matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, seja ela natura ou em rota
migratória (art. 29, caput).
b) impedir a procriação da fauna (art. 29, §1º, I).
c) modificar ou danificar ninho, abrigo ou criadouro de animal (art. 29, §2°, II).
d) vender, expor a venda, exportar ou adquirir, guardar, ter um cativeiro ou depósito, utilizar ou
transportar ovos, larvas ou espécies da fauna silvestre, nativa ou rota migratória, bem como produtos e
objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados (art. 29, §1°, III). No tocante à guarda
doméstica de espécie silvestre, o §2° do art. 29 permite o perdão judicial desde que o animal não esteja
ameaçado de extinção e ainda as circunstâncias sejam favoráveis ao agente.
Em todos esses delitos acima previstos no art. 29, caput e §1°, a pena é aumentada da metade,
conforme §4°, se o crime é praticado:
I - contra espécie rara ou considerada ameaçada de extinção, ainda que somente no local da infração;
II - em período proibido à caça;
III - durante a noite;
IV - com abuso de licença;

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V - em unidade de conservação;
VI - com emprego de métodos ou instrumentos capazes de provocar destruição em massa.
O §5° do art. 29 ainda preceitua que a pena é aumentada até o triplo, se o crime decorre do exercício
de caça profissional.
A fauna terrestre não abrange evidentemente os atos de pesca e por isso essas normas do art. 29 não
se aplicam aos crimes contra a pesca.
O art. 30 incrimina quem exporta para o exterior peles e couros de anfíbios e répteis em bruto, sem a
autorização da autoridade ambiental competente. Não se exige que se trate de animais silvestres. A
importação desse material bruto não é crime. A exportação de bolsas, sapatos e outros produtos feitos com
esse material também não é incriminada.
Na sequência, o art. 31 incrimina a importação ilegal, ou seja, a introdução de espécie animal no país
sem parecer técnico oficial favorável e licença expedida pela autoridade competente. É, pois, preciso esses
dois documentos, obtidos previamente, para que se exclua a tipicidade. Evita-se, destarte, o desequilíbrio
ambiental. A expressão “espécie animal”, abrange tanto a fauna terrestre quanto a aquática. O delito persiste
ainda que não se trate de animal silvestre. O crime se consuma quando o animal ingressa no Brasil, ainda que
ele não seja solto na natureza.
O art. 32 descreve o crime de maus tratos nos seguintes termos:
“Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados,
nativos ou exóticos:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa”.
Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para
fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos (§1º).
§ 1º-A Quando se tratar de cão ou gato, a pena para as condutas descritas no caput deste artigo será de
reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, multa e proibição da guarda (Incluído pela Lei nº 14.064, de 2020).
A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal (§2º).
O objeto material do crime de maus tratos pode ser os animais silvestres, domésticos ou domesticados.
Pouco importa se o animal é nativo (originário do Brasil) ou exótico (oriundo de outro país).
Cumpre observar que a pena do crime de maus tratos a animais é superior à do art. 136 do CP, que
cuida dos maus tratos a pessoa.
No tocante à fauna aquática, o art. 33, caput, prevê como crime provocar o perecimento dessas espécies
em rios, lagos, açude, lagoas, baías ou águas jurisdicionais brasileiras. Trata-se, no entanto, de um crime de
forma vinculada, pois só há crime quando o perecimento é provocado através da emissão de efluentes ou
carreamento de materiais.
O parágrafo único do art. 33 também incrimina:
I - quem causa degradação em viveiros, açudes ou estações de aquicultura de domínio público;
II - quem explora campos naturais de invertebrados aquáticos e algas, sem licença, permissão ou
autorização da autoridade competente;
III - quem fundeia embarcações ou lança detritos de qualquer natureza sobre bancos de moluscos ou
corais, devidamente demarcados em carta náutica.
Por outro lado, no tocante à incriminação específica da pesca, cumpre observar que equipara-se à pesca
a captura ou apreensão de crustáceos, moluscos e vegetais hidróbios. A planta vitória régia, por exemplo, é
um vegetal hidróbio, logo a sua retirada do local onde se encontra caracteriza também crime de pesca.
Portanto, a pesca não se relaciona apenas aos peixes.
É, pois, crime pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão
competente (art. 34, caput).
Se a pesca é feita em período no qual ela é permitida, o crime ainda pode se caracterizar quando a pesca
recair sobre espécies que devam ser preservadas ou espécimes com tamanhos inferiores ao permitido (art.
34, parágrafo único, inciso I). Outrossim, quando pescar uma quantidade superior à permitida ou então
utilizar-se de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos (art. 34, parágrafo único, inciso II). Se,
no entanto, o agente pescar mediante explosivos ou substâncias tóxicas, incidirá no crime do art. 34, que é
punido com reclusão de um a cinco anos.

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Quem transporta, comercializa, beneficia ou industrializa as espécimes oriundas da pesca proibida


responde pelo crime do art. 34, parágrafo único, inciso III, que é um tipo especial de receptação.

CRIMES CONTRA A FLORA

São inúmeros os delitos contra a flora, a maioria dolosos, mas há alguns culposos. Em todos esses
crimes, conforme preceitua o art. 53, a pena é aumentada de um sexto a um terço se:
I - do fato resulta a diminuição de águas naturais, a erosão do solo ou a modificação do regime climático;
II - o crime é cometido:
a) no período de queda das sementes;
b) no período de formação de vegetações;
c) contra espécies raras ou ameaçadas de extinção, ainda que a ameaça ocorra somente no local da
infração;
d) em época de seca ou inundação;
e) durante a noite, em domingo ou feriado.
Quanto aos delitos contra a flora, cumpre destacar os seguintes:
a) danificar ou utilizar indevidamente floresta de preservação permanente (art. 38). Se o crime for
culposo a pena será reduzida na metade.
b) danificar ou utilizar indevidamente vegetação do Bioma Mata Atlântica (art. 38-A). Só há o crime
quando se tratar de vegetação primária ou secundária em estágio avançado ou médio de regeneração. Se o
crime for culposo a pena será reduzida na metade.
c) cortar árvores em floresta considerada de preservação permanente (art. 39).
d) causar dano direto ou indireto às Unidades de Conservação da Natureza, independentemente de sua
localização (art. 40). Entende-se por Unidades de Conservação de Proteção Integral as Estações Ecológicas, as
Reservas Biológicas, os Parques Nacionais, os Monumentos Naturais e os Refúgios de Vida Silvestre e entende-
se por Unidades de Conservação de Uso Sustentável as Áreas de Proteção Ambiental, as Áreas de Relevante
Interesse Ecológico, as Florestas Nacionais, as Reservas Extrativistas, as Reservas de Fauna, as Reservas de
Desenvolvimento Sustentável e as Reservas Particulares do Patrimônio Natural. Também é crime do art. 40
causar dano às áreas de que trata o art. 27 do Decreto 99.724/1.990. Trata-se aqui de uma norma penal em
branco, essas áreas compreendem um raio de dez quilômetros ao redor das Unidades de Conservação. Se o
crime for culposo a pena será reduzida à metade (art. 40, §3° e 40-A, §3°). A ocorrência de dano afetando
espécies ameaçadas de extinção no interior das Unidades de Conservação de Proteção Integral será
considerada circunstância agravante para a fixação da pena.
e) provocar incêndio em mata ou floresta (art. 41). A pena é de reclusão de dois a quatro anos e multa.
Se o crime é culposo a pena passa a ser de detenção de seis meses a um ano e multa. Exige-se, para a tipificação
do incêndio, que haja perigo comum a um número indeterminado de pessoas ou a espécimes da flora ou da
fauna. A simples queimada, que não provoca incêndio, isto é, que não gera perigo comum, é fato atípico. No
Código Florestal, era contravenção penal, que, no entanto, foi revogada pelo advento da lei 12.651/2.012.
f) fabricar, vender, transportar ou soltar balões (art. 42). É necessário, para que haja crime, que o balão
tenha potencial para provocar incêndios em florestas, vegetações, em áreas urbanas ou em assentamentos
humanos. Se o balão for totalmente inofensivo à provocação de incêndios, o fato será atípico.
g) extrair pedra, areia, cal ou qualquer espécie de minerais de florestas de domínio público ou
consideradas de preservação permanente (art. 44).
h) cortar ou transportar em carvão madeira de lei para fins industriais ou para qualquer outra
exploração econômica ou não (art. 45).
i) receber ou adquirir, para fins comerciais ou industriais, madeira, lenha, carvão e outros produtos de
origem vegetal, sem exigir a exibição de licença do vendedor, outorgada pela autoridade competente, e sem
munir-se da via que deverá acompanhar o produto até final beneficiamento (art.46, caput). Incorre nas
mesmas penas quem vende, expõe à venda, tem em depósito, transporta ou guarda madeira, lenha, carvão e
outros produtos de origem vegetal, sem licença válida para todo o tempo da viagem ou do armazenamento,
outorgada pela autoridade competente (parágrafo único do art.46).

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j) impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação (art.48). A pena
é de detenção, de seis meses a um ano, e multa.
k) destruir, danificar, lesar ou maltratar, por qualquer modo ou meio, plantas de ornamentação de
logradouros públicos ou em propriedade privada alheia (art.49). A pena é de detenção, de três meses a um
ano, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. No crime culposo, a pena é de um a seis meses, ou multa.
Incrimina-se, como se vê, o dano culposo em plantas.
l) destruir ou danificar florestas nativas ou plantadas ou vegetação fixadora de dunas, protetora de
mangues, objeto de especial preservação (art.50). A pena é de detenção, de três meses a um ano, e multa.
m) desmatar, explorar economicamente ou degradar floresta, plantada ou nativa, em terras de domínio
público ou devolutas, sem autorização do órgão competente (art.50-A). A pena é de reclusão de 2 (dois) a 4
(quatro) anos e multa. Não é crime a conduta praticada quando necessária à subsistência imediata pessoal do
agente ou de sua família. Se a área explorada for superior a 1.000 ha (mil hectares), a pena será aumentada
de 1 (um) ano por milhar de hectare. Assim, a cada mil hectares de desmatamento, a pena aumenta de um
ano. É o crime ambiental mais grave.
n) comercializar motosserra ou utilizá-la em florestas e nas demais formas de vegetação, sem licença
ou registro da autoridade competente (art.51). A pena é de detenção, de três meses a um ano, e multa.
o) penetrar em Unidades de Conservação conduzindo substâncias ou instrumentos próprios para caça
ou para exploração de produtos ou subprodutos florestais, sem licença da autoridade competente (art.52). A
pena é de detenção, de seis meses a um ano, e multa. Trata-se da incriminação como crime autônomo de
alguns atos preparatórios da destruição da flora. É ainda um crime de mera conduta.

INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO

Nos crimes dos arts. 38, 39 e 48, o art. 60 do Código Florestal (lei 12.651/2.012), ao cuidar do Programa
de Regularização Ambiental, estabelece que a assinatura do termo de compromisso para regularização do
imóvel ou posse rural perante o órgão ambiental competente, suspenderá a punibilidade, enquanto o termo
estiver sendo cumprido. A adesão a esse programa implicará na suspensão do processo e durante esse período
a prescrição, consoante §1° do art. 60, ficará interrompida. Descumprido o programa, a prescrição volta fluir
do início, pois a lei se refere à interrupção, e não à suspensão da prescrição. Se, no entanto, o agente cumprir
todas as exigências, a punibilidade será extinta.

DA POLUIÇÃO E OUTROS CRIMES AMBIENTAIS

Causar poluição de quaisquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à
saúde humana é crime do art. 54. Outrossim, quando provocar efetivamente a mortandade de animais ou a
destruição significativa da flora.
Quanto à poluição sonora, é mera contravenção de perturbação do sossego alheio (art. 45 do LCP), pois
o art. 59 da Lei Ambiental, que incriminava este fato, foi vetado pelo Presidente da República.
O crime de poluição pode também ser culposo (§1° do art. 54).
O crime de poluição é qualificado, nos termos do §2º do art.54, quando:
I - tornar uma área, urbana ou rural, imprópria para a ocupação humana;
II - causar poluição atmosférica que provoque a retirada, ainda que momentânea, dos habitantes das
áreas afetadas, ou que cause danos diretos à saúde da população;
III - causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de
uma comunidade;
IV - dificultar ou impedir o uso público das praias;
V - ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias
oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos
O §3° preceitua que incorre nas mesmas penas previstas no parágrafo anterior quem deixar de adotar,
quando assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental
grave ou irreversível. Trata-se um tipo especial de desobediência.

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Ainda sobre a poluição, o art. 60 preceitua como crime construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer
funcionar, em qualquer parte do território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente
poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais
e regulamentares pertinentes. Exemplo: empresas petrolíferas construídas ilegalmente.
Há ainda nessa seção III da lei 9.605/98 outros crimes ambientais, que atentam contra aspectos do meio
ambiente que não envolvem a flora nem a pesca nem a poluição.
São eles:
a) executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão,
concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida (art.55).
b) produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar,
guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao
meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos (art.56). Se
o produto ou a substância for nuclear ou radioativa, a pena é aumentada de um sexto a um terço. O fato é
também punível na modalidade culposa (§3° do art. 56).
c) disseminar doença ou praga ou espécies que possam causar dano à agricultura, à pecuária, à fauna,
à flora ou aos ecossistemas (art.61).

CRIMES CONTRA O ORDENAMENTO URBANO E O PATRIMÔNIO CULTURAL

Aqui, há alguns tipos especiais de dano:


a) destruir, inutilizar ou deteriorar bem, móvel ou imóvel, especialmente protegido por lei, ato
administrativo ou decisão judicial, como museu, biblioteca, pinacoteca, etc (art.62). Operou-se a revogação
tácita, ou melhor, a substituição do art. 165 do CP, que prevê delito idêntico. O parágrafo único do art. 62
admite também a forma culposa.
b) pichar ou por outro meio conspurcar edificação ou monumento urbano (art. 65). Se o fato ocorrer no
interior do imóvel, não há crime, diante da falta de lesividade ao meio ambiente. Se o ato for realizado em
monumento ou coisa tombada em virtude do seu valor artístico, arqueológico ou histórico, nesse caso, a pena
é de 6 (seis) meses a 1 (um) ano de detenção e multa. Quanto ao grafite, que é uma expressão artística, não
configura crime quando autorizado pelo proprietário do imóvel ou pelo órgão público competente, quando
realizado em imóvel público (§2° do art. 65).
Também é crime alterar a edificação ou local especialmente protegido por lei, ato administrativo ou
decisão judicial (art. 63), bem construir nesses locais protegidos em razão do seu valor histórico, arqueológico,
religioso, cultural, etc (art. 64).

CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO AMBIENTAL

Os arts. 66 e 67 preveem crimes funcionais, isto é, praticados por funcionário público.


O art. 66 incrimina o funcionário público que, em procedimentos de autorização ou licenciamento
ambiental, faz afirmações falsas ou enganosas ou sonega informações. Se a falsidade em processo
administrativo emanar de um particular, o delito será o do art. 69-A.
O art. 67 incrimina o funcionário público que concede licença, autorização ou permissão em desacordo
com as normas ambientais, seja para o exercício de certas atividades ou para a execução de obras ou serviços.
Este crime também é punido na forma culposa.
Dos arts. 68 a 69-A, encontram-se os delitos que também podem ser praticados por particulares contra
a Administração Ambiental. Estes delitos são os seguintes:
a) deixar, aquele que tiver o dever legal ou contratual de fazê-lo, de cumprir obrigação de relevante
interesse ambiental (art.68, caput). Admite também a forma culposa (parágrafo único do art. 68). Trata-se de
crime omissivo próprio. Sujeito ativo é apenas aquele que, por lei ou contrato, tem o dever de cumprir
obrigações de relevante interesse ambiental.
b) obstar ou dificultar a ação fiscalizadora do Poder Público no trato de questões ambientais (art.69).

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c) elaborar ou apresentar, no licenciamento, concessão florestal ou qualquer outro procedimento


administrativo, estudo, laudo ou relatório ambiental total ou parcialmente falso ou enganoso, inclusive por
omissão (art.69-A). Admite-se também a forma culposa. A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois
terços), se há dano significativo ao meio ambiente, em decorrência do uso da informação falsa, incompleta ou
enganosa.

ABUSO DE AUTORIDADE

Introdução

Os crimes de abuso de autoridade são disciplinados pela Lei 13.869/2.019, que revogou expressamente
a Lei 4.898/65.
A referida lei, na visão de muitos, foi editada com o propósito de conter os excessos ocorridos na
operação lava jato e outras similares, cometidos por magistrados, delegados de polícia, membros do
Ministério Público e policiais, gerando uma série de críticas.
Dificilmente, porém, terá uma ampla aplicação prática, pois para a tipificação dos delitos exige-se um
especial fim de agir, mas com certeza conterá abusos, tendo, destarte, efeito pedagógico.
Todos os delitos de abuso de autoridade são punidos com pena de detenção. Não há nenhum punido
com reclusão.

Sujeito ativo

Os crimes de abuso de autoridade são os cometidos por agente público, servidor ou não, que, no
exercício da função ou a pretexto de exercê-la, extrapole o poder que lhe tenha sido atribuído, com o fim
específico de prejudicar outrem ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, por mero capricho ou
satisfação pessoal.
Trata-se de delito próprio, pois só pode ser cometido por agente público. Quanto ao particular, pode
figurar como coautor ou partícipe, nos termos dos arts. 29 e 30 do CP.
É ainda necessário que o delito seja praticado no exercício das funções ou a pretexto de exercê-las.
Assim, o agente público que está de férias, mas age como se estivesse no exercício das funções, pode
responder pelos delitos em análise.
Reputa-se agente público, nos termos do art. 2º, parágrafo único, para os efeitos desta Lei, todo aquele
que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação,
contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função em órgão
ou entidade abrangidos pelo “caput” do art. 1º da Lei 13.869/2019. Exemplos: jurados, mesários de eleição,
prefeito, vereador, funcionários públicos.
A propósito, dispõe o art. 2º, caput, da Lei 13.869/2019:
“É sujeito ativo do crime de abuso de autoridade qualquer agente público, servidor ou não, da
administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal, dos Municípios e de Território, compreendendo, mas não se limitando a:
I - servidores públicos e militares ou pessoas a eles equiparadas;
II - membros do Poder Legislativo;
III - membros do Poder Executivo;
IV - membros do Poder Judiciário;
V - membros do Ministério Público;
VI - membros dos tribunais ou conselhos de contas”.
Trata-se de uma norma penal explicativa ou interpretativa.
O conceito acima tem amplitude similar ao art. 327 do CP, que define o funcionário público para fins
penais.

Elemento subjetivo do tipo

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Os delitos de abuso de autoridade só são punidos a título de dolo, que é a vontade consciente de realizar
os elementos do tipo penal.
Além do dolo, ainda se exige o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a si mesmo ou a
terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
Os referidos elementos subjetivos são exigidos para quase todos os delitos de abuso de autoridade,
exceto alguns.
A exigência de um destes elementos subjetivos é para os tipos penais que não fazem menção expressa
a nenhum elemento subjetivo.
Nos tipos penais que fazem menção expressa ao elemento subjetivo, não se exige os elementos
subjetivos acima, mas apenas os mencionados no próprio tipo, por força do princípio da especialidade.
Em regra, os tipos penais não contemplam nenhum elemento subjetivo e por isso exige-se um dos
elementos subjetivos do art. 1º, §1º, acima mencionados.
É necessário, para a caracterização dos delitos, a presença de pelo um dos seguintes elementos
subjetivos do tipo:
a) finalidade específica de prejudicar outrem, ou seja, causar dano patrimonial ou extrapatrimonial;
b) finalidade específica de beneficiar a si mesmo ou a terceiro, isto é, trazer alguma vantagem
patrimonial ou extrapatrimonial para si ou para outrem. Se o fim for beneficiar o sujeito passivo, não há crime;
c) fim de mero capricho, ou seja, satisfazer um desejo ou vontade, ou por simples birra;
d) fim de satisfação pessoal, que é o fim de obter prazer, alegria ou contentamento. A lei não prevê o
fim de agradar uma terceira pessoa, nesse caso, o delito não se configura, pois é vedada a analogia “in malam
partem”.
Assim, se a agente agir de boa-fé, por exemplo, com o fim de promover a defesa da sociedade, os delitos
não se caracterizam.
Uma primeira corrente, que é a dominante, sustenta que os delitos de abuso de autoridade só admitem
o dolo direto.
Outra, ao revés, aceita também o dolo eventual.

Causas de exclusão do crime

A divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas não configura abuso de


autoridade (art. 1º, § 2º).
O legislador teve, pois, o cuidado de não incriminar a hermenêutica e a avaliação das provas.
Trata-se, para uns, de causa de exclusão da antijuridicidade, enquanto outros acertadamente
proclamam que exclui a tipicidade.
É, pois, necessário, para a exclusão do crime, que haja a divergência, caraterizada por mais de um ponto
de vista razoável acerca da interpretação da lei ou da avaliação dos fatos.
Se, por exemplo, a exegese adotada pelo agente for absurda, grosseira, sem qualquer resquício de
razoabilidade, não há falar-se na referida excludente.

Ação penal

A ação penal nos crimes de abuso de autoridade é pública incondicionada.


Não havia necessidade de o art. 3º fazer esta previsão, pois no silêncio da lei, a ação é pública
incondicionada.
Em não sendo a denúncia oferecida no prazo legal, por inércia do Ministério Público, será cabível, como
nos demais delitos, a ação penal privada subsidiária da pública, no prazo de 6 (seis) meses, contado da data
em que se esgotar o prazo para oferecimento da denúncia.
O prazo para a denúncia é o mesmo que é previsto no CPP para os demais delitos.
Não há, pois, prazo especial, ao contrário da lei anterior, que previa o prazo de 48 horas.

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Dos Efeitos da Condenação

Dispõe o art. 4º:


“São efeitos da condenação:
I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime, devendo o juiz, a requerimento do
ofendido, fixar na sentença o valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando
os prejuízos por ele sofridos;
II - a inabilitação para o exercício de cargo, mandato ou função pública, pelo período de 1 (um) a 5
(cinco) anos;
III - a perda do cargo, do mandato ou da função pública”.
O parágrafo único acrescenta que:
“Os efeitos previstos nos incisos II e III do “caput” deste artigo são condicionados à ocorrência de
reincidência em crime de abuso de autoridade e não são automáticos, devendo ser declarados motivadamente
na sentença”.
São, pois, três os efeitos da condenação, acima mencionados:
a) obrigação de reparar o dano. Trata-se, como nos demais delitos, de um efeito automático da
condenação, que se verifica ainda que a sentença seja omissa acerca do assunto, porquanto a sentença penal
condenatória transitada em julgado é título executivo na esfera cível. Entretanto, o valor mínimo da
indenização só poderá ser arbitrado pelo juiz se houver requerimento expresso da vítima e comprovação dos
prejuízos sofridos, ao passo que, nos demais, delitos, o juiz criminal arbitra na sentença o valor mínimo da
indenização, ainda que não haja requerimento da vítima. O Ministério Público, na denúncia, para que se
preserve o contraditório, sempre deve pleitear a fixação do valor mínimo da indenização pela sentença penal
condenatória.
b) a inabilitação para o exercício de cargo, mandato ou função pública, pelo período de 1 (um) a 5 (cinco)
anos. Este efeito não é a perda, mas, sim, a proibição de exercer cargo, mandato ou função pública. Só pode
ser aplicado em caso de reincidência específica em crime de abuso de autoridade. Não é um efeito automático,
mas específico, pois deve ser declarado motivadamente na sentença.
c) a perda do cargo, do mandato ou da função pública. Igualmente, só pode ser aplicada em caso de
reincidência específica em crime de abuso de autoridade. Da mesma forma, não é um efeito automático, mas
específico, pois deve ser declarado motivadamente na sentença.
Este efeito da inabilitação ou perda do cargo, mandato ou função pública pode ser imposto pelo juiz
qualquer que seja a quantidade da pena aplicada, em todos os crimes de abuso de autoridade, mas em
contrapartida exige a reincidência específica em crime de abuso de autoridade.
Diferentemente, nos demais crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a
Administração Pública, a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo só poderá ser imposta pelo juiz
na sentença quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos termos
do art. 92, I, do CP, quer o réu seja primário ou reincidente.

Das Penas Restritivas de Direitos

De acordo com o art. 5º, as penas restritivas de direitos substitutivas das privativas de liberdade
previstas nesta Lei são:
I - prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas;
II - suspensão do exercício do cargo, da função ou do mandato, pelo prazo de 1 (um) a 6 (seis) meses,
com a perda dos vencimentos e das vantagens.
As penas restritivas de direito substituem as penas privativas de liberdade. O juiz, na sentença,
primeiramente aplica a pena privativa de liberdade e, em seguida, na própria sentença, pode substituí-la pela
pena restritiva de direitos.
No Código Penal, a pena de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas só pode ser
aplicada em condenações superiores a 6 (seis) meses, mas nos crimes de abuso de autoridade, por razões
lógicas, pode ser imposta em condenações inferiores, iguais ou superiores a 6 (seis) meses, caso contrário o

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juiz teria que optar pela pena do inciso II, que é mais grave, na condenação igual ou inferior a 6 (seis) meses.
O parágrafo único do 5º acrescenta que:
“As penas restritivas de direitos podem ser aplicadas autônoma ou cumulativamente”.
A redação não é boa, mas o que o legislador quis dizer foi que as duas penas restritivas de direitos
podem ser aplicadas de forma isolada ou cumulativa.
Sobre os critérios de substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos, a lei de abuso
de autoridade é omissa e, por isso, a doutrina sugere a aplicação subsidiária do Código Penal, por força do art.
12 do CP.
Assim, grosso modo, as penas restritas de direitos só serão aplicadas aos crimes cometidos sem
violência ou grave ameaça à pessoa, cuja condenação seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos e, desde ainda,
que não se trate de reincidente específico em crime doloso (art. 44 do CP).
Sobre o reincidente, o §3º do art. 44 do CP esclarece que:
“Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação
anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática
do mesmo crime”.
Exige-se ainda, para a aplicação de pena restritiva de direitos, que a culpabilidade, os antecedentes, a
conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa
substituição seja suficiente”.
O §2º do art. 44 do CP acrescenta que:
“Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena
restritiva de direitos; se superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena
restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos”.
A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento
injustificado da restrição imposta. No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo
cumprido da pena restritiva de direitos, respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão (§4º
do art. 44 do CP).
Sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade, por outro crime, o juiz da execução penal decidirá
sobre a conversão, podendo deixar de aplicá-la se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva
anterior (§5º do art. 44 do CP).

Substituição da pena privativa de liberdade por multa

A lei de abuso de autoridade é omissa acerca da possibilidade de substituição da pena privativa de


liberdade por pena de multa.
Diante da ausência de vedação expressa, força convir que é possível, nos termos do art. 12 do CP, nos
delitos cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, quando a pena privativa de liberdade aplicada for
igual ou superior a 1 (um) ano, sendo vedada a substituição ao reincidente específico em crime doloso (art.
44, §2º, do CP).

DAS SANÇÕES DE NATUREZA CIVIL E ADMINISTRATIVA

As penas previstas na Lei de Abuso de Autoridade serão aplicadas independentemente das sanções de
natureza civil ou administrativa cabíveis.
As notícias de crimes de abuso de autoridade, que descreverem falta funcional, serão informadas à
autoridade competente com vistas à apuração administrativa.
As responsabilidades civil e administrativa são independentes da criminal.
Entretanto, não se poderá mais questionar sobre a existência ou a autoria do fato quando essas
questões tenham sido decididas no juízo criminal.
Assim, a absolvição penal por negativa de autoria ou inexistência do crime impede a condenação civil e
administrativa pelo mesmo fato.
Igualmente, a condenação penal transitada em julgado obsta que, nas searas civil e administrativa,

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sejam reconhecidas a inexistência do fato ou a negativa de autoria.


Faz coisa julgada em âmbito cível, assim como no administrativo-disciplinar, a sentença penal que
reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento
de dever legal ou no exercício regular de direito.
Nestas excludentes não há o dever de indenizar, salvo nas seguintes hipóteses:
a) legítima defesa putativa;
b) legítima defesa que atinge terceiro inocente, ou seja, com “aberractio ictus”;
c) estado de necessidade agressivo, isto é, que lesa bem jurídico pertencente a terceiro inocente.

Dos crimes em espécie

Os delitos de abuso de autoridade não têm “nomen juris”, mas para efeito didático nominá-los-ei.
É ainda necessário, para a configuração de quase todos os crimes, o fim específico de prejudicar outrem
ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
Cumpre ainda lembrar do crime de violência arbitrária, previsto no art. 322 do CP, que consiste no fato
de o funcionário público praticar violência física no exercício da função ou pretexto de exercê-la, funciona
como crime subsidiário, caso o fato não se enquadre nos delitos de abuso de autoridade.
Os crimes de abuso de autoridade da lei 13.869/2019 contém uma definição mais precisa que os
previstos na revogada lei 4.898/65, que abarcava um número maior de situações, mas era genérica e tida por
muitos como inconstitucional.

Decretação de medida de privação da liberdade em desacordo com a lei

Dispõe o art. 9º:


“Decretar medida de privação da liberdade em manifesta desconformidade com as hipóteses legais:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa”.
Trata-se da punição da prisão ou medida de segurança detentiva decretada fora das hipóteses legais.
O sujeito ativo não é apenas o juiz, mas qualquer agente público que decreta ilegalmente a privação da
liberdade de alguém.
Exemplos:
a) delegado de polícia prende o sujeito para averiguação;
b) juiz cível decreta a prisão fora da hipótese de alimentos;
c) juiz criminal decreta a prisão preventiva fora das hipóteses do art. 313 do CPP;
d) juiz criminal decreta a prisão temporária pela prática de delito que não admite este tipo de prisão;
e) policial prende alguém sem ordem judicial e sem que haja uma situação de flagrante.
O bem jurídico protegido é a liberdade de locomoção.
O sujeito passivo é o maior de 18 anos. Tratando-se de criança ou adolescente, o delito será o do art.
230 do ECA.
O núcleo do tipo é o verbo decretar, que significa determinar, por escrito ou verbalmente, a imposição
de medida de privação da liberdade.
O aludido delito, para se configurar, exige que a decretação seja manifestamente ilegal. Se a ilegalidade
não for tão evidente, exclui-se o crime.
Trata-se de uma norma penal em branco, pois as hipóteses de privação da liberdade são previstas
noutras leis.
A privação da liberdade abrange qualquer medida que impede o sujeito de se locomover por um tempo
juridicamente relevante. Exemplos: prisão, internação, retenção da pessoa em determinado local.
O delito em análise não abrange a decretação de medidas restritivas da liberdade, por exemplo,
tornozeleira eletrônica, sendo, pois, vedada a analogia “in malam partem”.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que é a vontade de decretar a medida privativa de liberdade,
consciente da sua manifesta ilegalidade
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a

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si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.


Quanto à consumação, ocorre no momento da decretação da medida privativa de liberdade, ainda que
não haja a efetiva prisão.
Trata-se, pois, de crime formal.
A tentativa não é possível, pois ou se decreta a prisão e o crime se consuma ou não se decreta e não há
o crime.

Deixar de afastar a prisão ilegal

Dispõe o parágrafo único do art. 9º:


“Incorre na mesma pena a autoridade judiciária que, dentro de prazo razoável, deixar de:
I - relaxar a prisão manifestamente ilegal;
II - substituir a prisão preventiva por medida cautelar diversa ou de conceder liberdade provisória,
quando manifestamente cabível;
III - deferir liminar ou ordem de habeas corpus, quando manifestamente cabível”.

Trata-se crime que só pode ser cometido pelo magistrado competente.


O bem jurídico protegido é a liberdade de locomoção.
O sujeito passivo pode ser qualquer pessoa.
O núcleo do tipo é o verbo deixar, que significa abster-se de forma definitiva.
O mero atraso, que é o decurso do prazo legal, mas com a intenção de agir depois, é insuficiente para a
caracterizar o crime, pois a lei é omissa acerca do verbo retardar.
O delito é omissivo próprio, pois a lei incrimina diretamente a omissão. Exemplos:
a) juiz deixa de relaxar a prisão em flagrante por fato atípico;
b) cessado os motivos da prisão preventiva, o juiz deixa de conceder a liberdade provisória;
c) o juiz deixa de conceder habeas corpus ao condenado que já cumpriu integralmente a pena.
O delito em análise só se configura quando a omissão do magistrado se prorrogar por prazo razoável,
ou seja, após fluir um lapso de tempo suficiente para revelar a sua intenção de se omitir diante da manifesta
ilegalidade.
As condutas criminosas consistem em:
a) deixar de relaxar a prisão manifestamente ilegal. Não se trata apenas do relaxamento da prisão em
flagrante, mas de qualquer prisão ilegal. Em se tratando de criança ou adolescente, haverá o delito do art. 234
do ECA.
b) deixar de substituir a prisão preventiva por medida cautelar diversa ou deixar de conceder liberdade
provisória, quando manifestamente cabível.
c) deixar de deferir liminar ou ordem de habeas corpus, quando manifestamente cabível. O CPP não
prevê liminar em habeas corpus, e, por isso, a liminar era admitida por analogia à lei de mandado de segurança.
Diante da previsão no tipo penal em análise, a liminar torna-se agora cabível sem necessidade de socorrer-se
da analogia.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que é a vontade de deixar de decretar uma das medidas acima.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
Quanto à consumação, ocorre quando flui um lapso de tempo além do razoável, sem que as medidas
tenham sido tomadas.
Não se admite a tentativa, pois se trata de crime omissivo próprio.

Decretação descabida de condução coercitiva

Dispõe o art. 10:


“Decretar a condução coercitiva de testemunha ou investigado manifestamente descabida ou sem
prévia intimação de comparecimento ao juízo:

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Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa”.

O sujeito ativo não é apenas o juiz e a autoridade policial, mas qualquer agente público que decreta
ilegalmente a condução coercitiva de alguém.
O bem jurídico protegido é a liberdade de locomoção.
O sujeito passivo é a testemunha e o investigado.
Fora das hipóteses do investigado e da testemunha, a condução coercitiva ilegal poderá caracterizar o
delito do art. 9º. Exemplo: o juiz decreta a condução coercitiva do réu para interrogatório. Outro exemplo: o
juiz decreta a condução coercitiva da vítima sem prévia intimação. Outra corrente, porém, sob o argumento
de o silêncio ter sido eloquente, considerará o fato atípico.
O núcleo do tipo é o verbo decretar, que significa ordenar, determinar, deliberar.
A condução coercitiva é uma medida cautelar diversa da prisão, embora não catalogada no rol do art.
319 do CPP, posto que consiste numa rápida privação da liberdade com o escopo de participar de um ato na
presença da autoridade.
O art. 206 do CPP prevê a condução coercitiva para o interrogatório ou qualquer outro ato que não
possa ser realizado sem a presença do acusado, como, por exemplo, o reconhecimento pessoal.
Não obstante o art. 206 do CPP condicione a condução coercitiva ao não atendimento da intimação
pessoal, o certo é que na prática alguns juízes já expediam o mandado de condução coercitiva juntamente
com o mandado de busca e apreensão domiciliar, como ocorreu com o ex-presidente Lula, na operação “lava-
jato”.
O plenário no STF, no julgamento da ADPF 444, decidiu pela não recepção do citado art. 260 do CPP, no
que diz respeito à condução coercitiva para interrogatório, por colidir com as garantias trazidas pela
Construção de 1.988.
De fato, a condução coercitiva é uma medida privativa da liberdade, ainda que por breve período, sem
embasamento constitucional.
Além disso, ainda viola os princípios da presunção de inocência. Se o acusado tem direito ao silêncio,
não faz sentido obrigá-lo a comparecer para o interrogatório.
O magistrado que ordenar a condução coercitiva para interrogatório estará sujeito à responsabilidade
penal, civil e disciplinar.
Antes deste julgamento, o STF havia dado mostras de conivência com a condução coercitiva, a ponto de
permitir que ela fosse determinada até na fase investigatória, ordenada pela autoridade policial, pois o art.
260 do CPP refere-se à autoridade e não apenas à autoridade judicial.
A condução coercitiva, entretanto, ainda é possível para o réu participar de ato processual cuja presença
seja necessária, desde que não seja para compeli-lo a fazer prova contra si mesmo.
O tipo penal em análise incrimina a condução coercitiva de testemunha ou investigado, em duas
situações.
a) quando manifestamente descabida. Não é, por exemplo, possível a decretação da condução
coercitiva do investigado, para fim de interrogatório, pois ele tem direito ao silêncio. Se houver controvérsia
jurídica sobre o cabimento da condução coercitiva, não há falar-se no delito, que só se configura, nessa
modalidade, quando a condução coercitiva for manifestamente incabível;
b) sem prévia intimação de comparecimento em juízo. O juiz Sérgio Moro, por exemplo, decretou a
condução coercitiva do ex-presidente Lula, sem prévia intimação. Hoje, isto é vedado, pois não é mais possível,
segundo já decidiu o plenário do STF, condução coercitiva para o fim de interrogatório. Em outras situações,
a condução coercitiva só poderá ser decretada após a desobediência à prévia intimação.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que é a vontade de decretar a condução coercitiva
manifestamente descabida ou sem prévia intimação.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
Quanto à consumação, ocorre quando o agente ordena a condução coercitiva, ainda que está não se
concretize. Trata-se, pois, de crime formal.
A tentativa, não é possível, pois se trata de delito unissubisistente.

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Omissão dos deveres de comunicação relacionados à prisão

Dispõe o art. 12:


“Deixar injustificadamente de comunicar prisão em flagrante à autoridade judiciária no prazo legal:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa”.
Quanto ao sujeito ativo do delito em análise, será a autoridade que lavrou o auto de prisão em flagrante
ou o subalterno que, incumbido pela autoridade de enviar o ofício ao juiz, quedar-se inerte.
O bem jurídico protegido é a liberdade de locomoção.
O sujeito passivo é a pessoa presa em flagrante. Tratando-se de criança ou adolescente, o delito será o
do art. 230, parágrafo único, do ECA.
O núcleo do tipo é o verbo deixar, que significa abster-se de realizar.
O flagrante deve ser comunicado ao juiz dentro do prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas, a contar
da prisão. Antes de fluir este prazo, o delito não se configura.
A prisão em flagrante também deve ser comunicada ao Ministério Público, nos termos do art. 306 do
CPP, mas a falta desta comunicação não configura crime.
O elemento normativo do tipo é o termo “injustificadamente”, que significa sem motivo justo. Em
havendo motivo justo, o delito não se configura.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de deixar de comunicar a
prisão em flagrante ao juiz, no prazo legal.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
Quanto à consumação, só se verifica após o decurso do prazo de 24 horas, a contar da prisão.
Trata-se, pois, de crime a prazo, pois só se consuma após a fluência de um lapso de tempo.
A tentativa não é possível, pois se trata de delito unissubisistente.

Figuras típicas equiparadas

O parágrafo único do art. 12 acrescenta que:


“Incorre na mesma pena quem:
I - deixa de comunicar, imediatamente, a execução de prisão temporária ou preventiva à autoridade
judiciária que a decretou;
II - deixa de comunicar, imediatamente, a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontra à sua
família ou à pessoa por ela indicada;
III - deixa de entregar ao preso, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, a nota de culpa, assinada pela
autoridade, com o motivo da prisão e os nomes do condutor e das testemunhas;
IV - prolonga a execução de pena privativa de liberdade, de prisão temporária, de prisão preventiva, de
medida de segurança ou de internação, deixando, sem motivo justo e excepcionalíssimo, de executar o alvará
de soltura imediatamente após recebido ou de promover a soltura do preso quando esgotado o prazo judicial
ou legal”.

A falta de comunicação da prisão em flagrante ao juiz se enquadra no art. 12, caput, mas a não
comunicação ao juiz acerca da execução da prisão temporária ou preventiva é delito do art. 12, parágrafo
único, inciso I. A prisão em flagrante deve ser comunicada ao juiz em até 24 horas. A execução da prisão
preventiva ou temporária lhe deve ser comunicada imediatamente.
Há também o crime de abuso de autoridade quando o agente público responsável pela prisão deixa de
comunicar imediatamente a prisão e o local onde se encontra o preso à sua família ou à pessoa por ele
indicada. Esta comunicação, que deve ser imediata, é necessária em qualquer prisão e não apenas na prisão
em flagrante. Em se tratando de criança ou adolescente, a falta de comunicação da apreensão em flagrante
será delito do art. 231 do ECA.
O tipo penal ainda incrimina o fato de deixar de entregar a nota de culpa ao preso.

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Na prisão em flagrante, a identificação dos responsáveis pela prisão consta na nota de culpa, que
deverá ser entregue ao preso.
A nota de culpa é o documento dirigido ao preso, onde consta:
a) o nome da autoridade policial que lavrou o auto de prisão em flagrante;
b) o nome do condutor, que é a pessoa que efetuou a prisão;
c) o nome das testemunhas;
d) o motivo da prisão.
A nota de culpa deverá ser expedida no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, após a realização da prisão
em flagrante, nos termos do §2o do art. 306 do CPP. É, pois, contado este prazo do momento da captura e não
da lavratura do auto de prisão em flagrante.
A nota de culpa, que deverá ser assinada pelo preso, não significa o reconhecimento da culpa. Trata-se,
a rigor, de um simples recibo da prisão. Caso ele se recuse a assiná-la, duas testemunhas instrumentárias
atestarão que houve a entrega da nota de culpa ao preso.
Com o fim de preservar a sua identidade, imagem e dados pessoais, é possível, nas exceções legais, que
da nota de culpa não conste o nome do condutor, das testemunhas e das vítimas.
Na prisão com ordem judicial, o preso deve receber uma cópia do mandado de prisão, onde consta a
identificação do juiz e dos responsáveis pela execução do mandado, mas a falta da entrega deste documento
não caracteriza crime de abuso de autoridade, pois é vedada analogia “in malam partem”.
Também configura crime de abuso de autoridade, nos termos do citado inciso IV, prolongar a execução
de pena privativa de liberdade, de prisão temporária, de prisão preventiva, de medida de segurança ou de
internação, deixando, sem motivo justo e excepcionalíssimo, de executar o alvará de soltura imediatamente
após recebido ou de promover a soltura do preso quando esgotado o prazo judicial ou legal. A internação, a
que se refere o texto legal, é a provisória, decretada nos termos do art. 319, VII, do CPP.
O inciso IV incrimina duas situações:
a) deixar de executar o alvará de soltura imediatamente após tê-lo recebido;
b) deixar de promover a soltura do preso quando esgotado o prazo judicial ou legal. Esgotado o prazo
judicial ou legal da prisão, o diretor do presídio, independentemente de alvará de soltura, deverá promover a
soltura do preso. A execução imediata do alvará de soltura deve ocorrer após o cumprimento dos
procedimentos de segurança necessários, incluindo a checagem sobre a existência de outras ordens de prisão
e da autenticidade do próprio alvará.
Nestas duas hipóteses, não haverá o delito se o prolongamento da prisão ocorrer por motivo justo e
excepcionalíssimo. Exemplo: o alvará de soltura é recebido na sexta-feira pela autoridade policial e não havia
ninguém no juízo criminal para confirmar a sua autenticidade.

Constrangimento ilegal do preso

Dispõe o art. 13:


“Constranger o preso ou o detento, mediante violência, grave ameaça ou redução de sua capacidade
de resistência, a:
I - exibir-se ou ter seu corpo ou parte dele exibido à curiosidade pública;
II - submeter-se a situação vexatória ou a constrangimento não autorizado em lei;
III - produzir prova contra si mesmo ou contra terceiro:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, sem prejuízo da pena cominada à violência”.
Sujeito ativo é qualquer o agente público no exercício da função ou a pretexto de exercê-la.
O bem jurídico protegido é a dignidade do preso e a moralidade administrativa.
O sujeito passivo do delito é o preso ou detento. Detento é a pessoa privada da sua liberdade de
locomoção, mas que ainda não se encontra formalmente presa. Exemplo: testemunha detida para fim de
condução coercitiva. Outro exemplo: pessoa capturada que aguarda a lavratura do auto de prisão em
flagrante. Mais um exemplo: pessoa sujeita a medida de segurança detentiva.
Quanto ao preso, pode ser o definitivo ou provisório, conforme haja ou não condenação transitada em
julgado, bem como a pessoa presa por débito de alimentos.

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O referido delito é uma espécie de constrangimento ilegal, que é previsto no art. 146 do CP.
O núcleo do tipo é o verbo constranger, que significa coagir, forçar ou obrigar.
Exige-se ainda uma das seguintes modalidades de violência:
a) violência física: é a força bruta. Abrange as vias de fato, as lesões corporais e morte. O preceito
secundário ressalva expressamente que o agente responderá pelo delito em análise em concurso com o delito
correspondente à violência, ou seja, lesão corporal e homicídio. As vias de fato e a grave ameaça, porém, são
absorvidas.
b) violência moral: é a grave ameaça.
c) violência imprópria: é reduzir a capacidade de resistência da vítima, sem empregar violência física ou
grave ameaça. Exemplo: hipnose. Outro exemplo: aplicação de sonífero.
No delito em análise, a pessoa presa ou detida é compelida a:
a) exibir-se ou ter seu corpo ou parte dele exibido à curiosidade pública. A curiosidade pública se refere
à exposição a um número indeterminado de pessoas. O preso, para poder ser fotografado pela imprensa ou
ter a sua imagem divulgada, precisa anuir expressamente, pois essa exposição causa danos irreparáveis tanto
ao preso quanto aos seus familiares. Não se pode, entretanto, censurar o veículo de comunicação, mas este
terá que indenizar os danos materiais e morais oriundos da divulgação do momento prisão e das imagens do
preso no presídio ou na cela.
b) submeter-se a situação vexatória ou a constrangimento não autorizado em lei. A situação vexatória
é a que causa humilhação. A situação constrangedora é a que causa mal estar ou desconforto. Exemplo: o
preso é compelido a exibir o seu corpo, de forma vexatória, perante pessoa ou pessoas determinadas.
c) produzir prova contra si mesmo ou contra terceiro. Exemplo: obrigar o indiciado a contribuir para a
prova pericial que lhe prejudicará. Se o preso ou detento for compelido a produzir prova em benefício próprio,
o agente responderá pelo delito de constrangimento ilegal (art. 146 do CP).
Cumpre ressalvar que o constrangimento, mediante violência ou grave ameaça, para se obter
declaração, informação ou confissão é crime de tortura-prova, previsto no art. 1º, I, “a”, da Lei 9.455/97, que
absorve o crime de abuso de autoridade.
O delito de abuso de autoridade em análise faz menção à violência física, grave e violência imprópria,
ao passo que o crime de tortura-prova só prevê a violência física e a grave ameaça.
O referido crime de abuso de autoridade não exige o sofrimento físico ou mental, que, em relação ao
crime de tortura-prova, é essencial para a consumação.
Por consequência, em havendo o dolo de causar sofrimento físico ou mental, o agente responderá pelo
crime de tortura-prova, caso tenha constrangido a vítima, mediante violência ou grave ameaça, a produzir
prova contra si ou contra terceiro, através de uma confissão, declaração ou informação, absorvendo-se o
delito de abuso de autoridade, por ser de menor gravidade, por força do princípio da consunção.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
Quanto à consumação, ocorre quando:
a) o corpo do preso ou detento ou parte dele é exibido à curiosidade pública;
b) o preso ou detento é submetido a uma situação vexatória ou a constrangimento não autorizado em
lei;
c) o preso ou detento produz prova contra si mesmo ou contra terceiro.
Trata-se de crime material, pois, para a consumação, não basta a conduta de constranger, sendo ainda
necessária a ocorrência de um dos resultados acima mencionados.
Admite-se a tentativa, quando o agente emprega a violência, mas o resultado não ocorre por
circunstâncias alheias à sua vontade.

Violação de sigilo

Dispõe o art. 15:


“Constranger a depor, sob ameaça de prisão, pessoa que, em razão de função, ministério, ofício ou

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profissão, deva guardar segredo ou resguardar sigilo:


Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa”.

O sujeito ativo deste delito são os agentes públicos incumbidos de colherem depoimentos. Exemplos:
juiz de direito, delegado de polícia, membros de CPI, membro do Ministério Público.
O depoimento pode ser prestado em processos cíveis, criminais, trabalhistas, administrativos,
inquéritos policiais, inquéritos civis, CPI’s e outros. Aliás, ainda que não haja qualquer procedimento
instaurado, o delito pode se configurar.
O bem jurídico protegido é o direito à proteção de segredos pessoais, que é prevista no art. 5º, X, da CF.
Os sujeitos passivos são os confidentes necessários, pessoas que, em razão da função, ministério, ofício
ou profissão, tomam conhecimento de fatos sigilosos que lhes são narrados. Exemplos: médico, advogado,
padre.
Função, ensina Magalhães Noronha, é “o encargo que alguém recebe, em virtude de lei, decisão judicial
ou contrato, como ocorre com os tutores, curadores, inventariantes, diretores de empresas, hospitais etc.”.
Ministério é o encargo relacionado a um estado ou condição pessoal, em que normalmente não há lucro.
Por exemplo: o sacerdote, a freira, o ministro de qualquer culto religioso etc.
Ofício é a atividade mecânica ou manual. Por exemplo: costureiro, barbeiro etc.
Profissão é toda atividade, particular ou pública, geralmente lucrativa e especializada, a que
habitualmente se entrega uma pessoa, destinada a prestar serviços a terceiros, inclusive ao Estado. Por
exemplo: médico, advogado, dentista, engenheiro, comerciante, servidor público etc.
Estas pessoas têm o dever de guardar segredo, sob pena de cometerem o delito do art.154 do CP. Caso
sejam arroladas como testemunhas, terão o dever de comparecer, mas não poderão prestar depoimentos
sobre fatos sigilosos.
Se o titular do segredo autorizar o depoimento, o confidente necessário terá a faculdade de revelar ou
não o segredo, de modo que, ainda assim, poderá se recusar a depor.
Confidência necessária é a revelada a pessoas que, para bem desenvolver a função, ministério, ofício ou
profissão, devem inteirar-se de segredos alheios.
Confidência voluntária é a revelada a pessoas cuja missão não é a de receber segredos.
O confidente voluntário não pode se recusar a depor.
Pela nossa lei, exige-se nexo causal entre o exercício do trabalho e o conhecimento do segredo. Urge
que o segredo tenha sido revelado ao confidente necessário, isto é, ao profissional que pela natureza da
atividade se vê obrigado a receber informações sobre fatos secretos da vida do paciente (v. g., médico,
advogado, padre etc.).
Vê-se do exposto que o trabalho deve ser a causa, e não a ocasião, do conhecimento do segredo. Este
deve ser obtido ratione officii.
Como explica Magalhães Noronha, “o médico que vai visitar a cliente e a encontra em colóquio amoroso
com outrem, não está obrigado a segredo profissional, pois as relações ilícitas da paciente nada têm a ver com
o exercício de medicina”.
Este dever de guardar segredo nem sempre foi compreendido por todos magistrados, sendo comum o
confidente necessário, num primeiro momento invocar o dever de sigilo, mas, após ser ameaçado de prisão
pelo juiz, acaba sendo compelido a depor.
Cumpre ressalvar que, nos casos em que a própria lei obriga o confidente necessário a revelar o segredo,
ele terá que depor, sob pena de ser preso em flagrante por falso testemunho.
O núcleo do tipo é o verbo constranger, que significa obrigar, forçar, intimidar, coagir.
É necessário, para que o delito se configure, que o constrangimento seja para compelir o sujeito passivo
a depor, o que pressupõe a sua condição de testemunha.
Não há o crime quando o constrangimento é para a vítima prestar declarações, pois é vedada a analogia
“in malam partem”.
O delito é ainda de forma vinculada, pois o meio de execução deve ser a ameaça de prisão. Outras

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ameaças não são contempladas pelo tipo penal, mas o agente poderá responder pelo crime de
constrangimento ilegal, previsto no art. 146 do CP. Exemplo: ameaça de colocar tornozeleira eletrônica.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
Sobre o momento consumativo, o tipo penal comporta duas interpretações.
Primeira, consuma-se com o constrangimento, independentemente do efetivo depoimento. Nesse caso,
não há falar-se em tentativa.
Segunda, consuma-se com o depoimento. Nesse caso, o constrangimento seria mera tentativa.

Interrogatório abusivo

Dispõe o parágrafo único do art. 15:


“Incorre na mesma pena quem prossegue com o interrogatório:
I - de pessoa que tenha decidido exercer o direito ao silêncio; ou
II - de pessoa que tenha optado por ser assistida por advogado ou defensor público, sem a presença de
seu patrono”.

Sujeito ativo é o agente público que preside o interrogatório, geralmente, o juiz e a autoridade policial.
A lei, entretanto, não exige que se trate de um procedimento investigatório ou judicial e, por isso, abarca
também os interrogatórios que ocorrem em procedimentos administrativos e inquérito civil
O bem jurídico protegido é o princípio da ampla defesa.
O sujeito passivo é a pessoa interrogada.
O núcleo do tipo é o verbo prosseguir, que significa continuar, dar sequência.
São dois os delitos descritos no referido parágrafo único.
O primeiro consiste em prosseguir o interrogatório da pessoa que tenha decidido exercer o direito ao
silêncio. Exemplo: após o réu exercer o direito ao silêncio, o juiz continua a lhe formular perguntas.
O segundo se refere a prosseguir o interrogatório sem a presença de patrono da pessoa que tenha
optado em ser assistida por advogado ou defensor público. Assim, se o investigado ou réu se recusa a depor
sem a presença de advogado ou defensor público, a autoridade policial ou judicial não poderá realizar o seu
interrogatório. Aliás, na fase processual, o interrogatório sem a presença do advogado ou defensor público
será nulo.
Ambos os delitos podem se verificar em qualquer tipo de processo ou procedimento, penal ou
extrapenal, onde haja interrogatório.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
O delito se consuma com o prosseguimento do interrogatório, após o sujeito passivo optar pelo silêncio
ou pela presença de advogado ou defensor público, ainda que não responda a nenhuma pergunta.
Admite-se a tentativa, quando o agente público é impedido de prosseguir com o interrogatório, por
circunstâncias alheias à sua vontade. Exemplo: fuga do interrogado.

Deixar de identificar-se ao preso ou identificar-se falsamente

Dispõe o art. 16:


“Deixar de identificar-se ou identificar-se falsamente ao preso por ocasião de sua captura ou quando
deva fazê-lo durante sua detenção ou prisão”:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa”.

O sujeito ativo é o agente público que participa da captura, detenção ou prisão.


O bem jurídico protegido é o direito do preso de conhecer a identidade do responsável pela captura,

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detenção ou prisão.
O sujeito passivo é a pessoa presa. Caso haja a captura ou detenção, mas sem a concretização da prisão,
o delito não se configura, pois o sujeito passivo é o preso e não a pessoa capturada ou detida. Tratando-se de
criança ou adolescente, o delito será o previsto no parágrafo único do art. 230 do ECA.
A propósito, a prisão em flagrante passa por quatro fases:
a) captura;
b) condução coercitiva até a autoridade policial;
c) lavratura do auto de prisão em flagrante;
d) recolhimento ao cárcere.
A prisão em flagrante só se verificará se houver o recolhimento ao cárcere. A captura e a condução
coercitiva não são prisões, mas meros atos de privação da liberdade, pois, no sentido técnico jurídico, prisão
é a privação da liberdade mediante encarceramento.
É perfeitamente possível a captura e a condução coercitiva sem que haja a lavratura do auto de prisão
em flagrante e o recolhimento ao cárcere, nas seguintes hipóteses:
a) infrações penais de menor potencial ofensivo. Nesse caso, após a lavratura do Termo
Circunstanciado, se o agente for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de
comparecer ao juizado criminal não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança (art. 69, parágrafo
único, da Lei 9.099/95). Se, porém, o agente se recusar a assumir este compromisso de comparecer, a
autoridade policial deverá lavrar o auto de prisão em flagrante e, em seguida, lhe conceder a liberdade
provisória com fiança.
b) crime de porte ou plantio de droga para consumo pessoal. Nesse caso, não se imporá prisão em
flagrante, devendo o autor do fato ser imediatamente encaminhado ao juízo competente ou, na falta deste,
assumir o compromisso de a ele comparecer, lavrando-se termo circunstanciado e providenciando-se as
requisições dos exames e perícias necessários (§2o do art. 48 da Lei 11.343/06). Ainda que o agente se recuse
a assinar o compromisso de comparecer não lhe será imposta a prisão em flagrante ou qualquer medida
restritiva da liberdade, pois o delito do art. 28 não admite a pena privativa de liberdade.
c) quando a autoridade policial constatar que não há fundada suspeita (§1o do art. 304 do CPP).
d) crimes de trânsito, quando o motorista houver socorrido a vítima. Ao condutor de veículo, nos casos
de acidentes de trânsito de que resulte vítima, não se imporá a prisão em flagrante, nem se exigirá fiança, se
prestar pronto e integral socorro àquela (art. 301 do CTB).
São duas as formas de realizar o delito em análise. Ei-las:
a) deixar de identificar-se ao preso. Aqui o delito é omisso próprio. É preciso que se trate de uma
omissão dolosa, ou seja, intencional, pois o delito não é punido na forma culposa. Assim, o mero esquecimento
não constitui crime. Se, porém, a pessoa que está sendo presa a identificação e o agente público se recusa a
identificar-se haverá o delito em análise, salvo se havia algum motivo justo. Ao prender, por exemplo, um
perigoso bandido, o agente policial que, por temer represálias, recusa-se a identificar-se, não cometerá o
referido delito.
b) identificar-se falsamente. Trata-se de crime comissivo. É, pois, uma espécie de falsa identidade. É
preciso que a mentira recaia sobre o nome, pois o tipo penal, ao contrário do seu parágrafo único, não faz
menção à falsidade sobre o cargo e função.
O delito só se caracteriza quando o agente deixa de identificar-se ao preso ou identifica-se falsamente
durante a captura, detenção ou prisão. Fora desses momentos, o delito não se configura.
Convém frisar que, no caso de captura ou detenção, a recusa em se identificar ou a falsa identificação
só será crime se a captura ou detenção se converter em prisão, pois, conforme já dito, o sujeito passivo é o
preso e não a pessoa detida ou capturada.
O crime só se configura quando a omissão ou a falsa identidade ocorrer por ocasião da captura ou
durante a detenção ou prisão. Em relação às pessoas que já se encontram presas, não há falar-se no delito em
análise. Não comete, por exemplo, o crime, o carcereiro que se recusa a fornecer a sua identificação a uma
pessoa presa.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a

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si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.


Na primeira modalidade, o crime se consuma no instante em que o agente se recusa a identificar-se,
ainda que depois se arrependa e resolva se identificar. É omissivo próprio e, por isso, não admite a tentativa.
Na segunda, a consumação ocorre com o primeiro ato revelador da identificação falsa. É crime
unissubsistente, e, por isso, não admite a tentativa.

Violência Institucional

No plano processual, a violência institucional, que produz a revitimização, já era proibida pelos seguintes
diplomas normativos:
a) Lei nº 13.431/2017, que disciplina a escuta especializada e o depoimento especial de crianças e
adolescentes que figurem como vítimas ou testemunhas de violência (artigos 7º a 12).
b) Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha): prevê a inquirição especial de mulher em situação de violência
doméstica e familiar ou de testemunha de violência doméstica, quando se tratar de crime contra a mulher
(art. 10-A, introduzido pela Lei 13.505/2017).
c) Lei 14.245/2021 (Lei Mariana Ferrer): estabelece que, na audiência de instrução e julgamento,
durante a instrução em plenário do júri, bem como na audiência do Juizado Especial Criminal, todas as partes
e demais sujeitos processuais presentes no ato deverão respeitar a dignidade da vítima (arts. 400-A e 474-A
do CPP e 81 da Lei nº 9.099/95, introduzidos pela Lei 14.245/2021).
Não se pode, destarte, se recorrer ao princípio da ampla defesa como pretexto para se produzir a
revitimização, pois todo e qualquer direito só pode ser invocado à vista de uma finalidade ética.
Noutras palavras, a vedação da violência institucional impõe limites à ampla defesa, relativizando-a, a
fim de que seja exercida dentro dos padrões de razoabilidade.
No âmbito do direito penal, porém, ainda não havia o crime específico de violência institucional, mas a
lacuna acabou sendo suprida com o advento do art. 15-A da Lei 13.869/2019, introduzido pela Lei nº 14.321,
de 2022.
De fato, dispõe o citado art. 15-A:
“Submeter a vítima de infração penal ou a testemunha de crimes violentos a procedimentos
desnecessários, repetitivos ou invasivos, que a leve a reviver, sem estrita necessidade:
I - a situação de violência; ou
II - outras situações potencialmente geradoras de sofrimento ou estigmatização:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa”.
Como se vê, o delito de violência institucional é o praticado por agente público, no exercício da função
ou em razão dela, através de procedimentos desnecessários, repetitivos ou invasivos, que produzem a
revitimização.

A revitimização ou vitimização

A secundária ou sobrevitimização é o fato de a vítima ou testemunha de crimes, por iniciativa


desnecessária, repetitiva ou invasiva do agente público, rememorar a situação criminosa potencialmente
lesiva à sua saúde psíquica.
A violência institucional é o único delito de abuso de autoridade cujo “nomem juris” é fornecido pela
própria lei.
Trata-se de crime próprio, pois o sujeito ativo é apenas o agente público, no exercício da função ou em
razão dela. Exemplo: delegado de polícia, no período de férias, durante a lavratura de um boletim de
ocorrência de estupro, em sua circunscrição, intervém para fazer perguntas invasivas à vítima.
Normalmente, a violência institucional advém do despreparo do agente público ou da sua falta de
sensibilidade, o que não o isentará do crime, desde que presente o dolo direto ou eventual, pois a ele se impõe
o dever de se informar para o bom desempenho da função pública.
Quanto aos particulares, não podem cometer o delito em análise, salvo na condição de coautores ou
participes, mas o fato poderá ser punido como violência psicológica, se a vítima for mulher (art. 147-B do CP)

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ou, em sendo homem a vítima, como injúria (art. 140 do CP), outrossim, como coação no curso do processo,
caso haja emprego de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio (art. 344
do CP).
No concernente aos agentes públicos que podem figurar como sujeito ativo, há duas interpretações.
Primeira, apenas os que atuam na área criminal. Exemplos: delegados de polícia, promotores de justiça,
juízes criminais, policiais militares, policiais penais, policiais civis, etc.
Segunda, qualquer agente público que, no exercício da função ou em razão dela, entrar em contato,
ainda que informalmente, com vítimas e testemunhas de crimes. Exemplo: psicólogos e assistentes sociais que
atuam como auxiliares da justiça na área da Infância e Juventude.
Filio-me entre os adeptos da segunda corrente, pois o tipo penal não faz qualquer referência à área de
atuação do agente público, de tal sorte que onde a lei não distingue ao intérprete não é lícito distinguir.
Nesta linha de raciocínio, o delito poderia também ser perpetrado em processos cíveis, trabalhistas,
administrativos, inquéritos civis, procedimentos de apuração de atos infracionais, etc.
O delito também pode ser praticado antes da instauração de qualquer procedimento. Exemplo:
revitimização praticada por policial militar durante a lavratura do boletim de ocorrência.
Quanto ao bem jurídico protegido, é prioritariamente a saúde psicológica e secundariamente o regular
funcionamento das instituições estatais.
A saúde psicológica é abalada com o sofrimento psíquico. É a que é atingida pelo dano emocional.
De fato, o tipo penal se refere à conduta que leva a vítima ou testemunha a reviver “situações
potencialmente geradoras de sofrimento ou estigmatização”.
O delito, como se vê, é de perigo concreto, sendo mister a demonstração de que a revivência dos fatos
expõe a vítima ou testemunha a perigo de sofrimento ou estigmatização.
Quanto, à honra, que é o conjunto dos atributos que confere à pessoa estima própria e reputação social,
a rigor, não é objeto jurídico, pois, para a tipicidade, não há necessidade de o agente proceder com “animus
injuriandi” vel diffamandi”.
O sujeito passivo é a vítima de infração penal ou a testemunha de crimes violentos, podendo atingir
tanto os homens quanto as mulheres, inclusive, idosos ou crianças.
Quanto ao informante, que é a testemunha que não presta compromisso legal, também pode figurar
como sujeito passivo do delito, pois não há como negar que, na essência, se trata também de testemunha,
mas o assunto poderá ensejar polêmica.
A testemunha de crime só pode figurar como sujeito passivo quando houver testemunhado crime
violento.
Diversamente, a vítima pode ser sujeito passivo, ainda que a infração penal que a acometeu não tenha
sido praticada com violência,
Em suma, o tipo penal se refere à vítima de infração penal e testemunha de crimes violentos.
É, no entanto necessário, que tanto os crimes violentos quanto as demais infrações penais provoquem
no sujeito passivo situações potencialmente geradoras de sofrimento ou estigmatização, caso contrário o fato
será atípico por ausência de perigo de lesão ao bem jurídico.
O termo infração penal é o gênero que abrange tanto os crimes quanto as contravenções, ainda que
sem violência ou ameaça, compreendendo até mesmo os delitos culposos, pois a lei não faz qualquer
distinção.
Sobre o que significa “crimes violentos”, há três interpretações.
Primeira, compreende somente os cometidos com violência física, pois se o tipo penal almejasse
também abranger a violência psicológica teria empregado a expressão “crimes violentos ou com grave
ameaça”.
Segunda, abrange tanto os crimes cometidos com violência física quanto os perpetrados com grave
ameaça, pois o bem jurídico protegido é a saúde psicológica, que também pode ser lesada ou exposta a perigo
com a grave ameaça.
Terceira, os crimes violentos são os que lesam ou expõe a perigo, com intensidade, qualquer bem
jurídico, compreendendo não só aqueles em que há violência física ou grave ameaça (violência psicológica)
como também os que se caracterizam pela violência patrimonial, violência sexual e violência moral, tanto é

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que o tipo penal se refere a fatos que levam a reviver não só a situação de violência; como também outras
situações potencialmente geradoras de sofrimento ou estigmatização, circunstância que permite a
interpretação de que o termo violência foi realmente empregado em sentido amplo, nos moldes já adotado
pela Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha).
Aliás, a adoção das duas primeiras correntes geraria o absurdo de deixar sem proteção a vítima do crime
de estupro de vulnerável (art. 217-A do CP, diante da ausência de violência ou grave ameaça.
Por outro lado, o núcleo do tipo é o verbo submeter, que foi empregado no sentido de expor a uma
situação ruim.
É importante destacar que, para a caracterização do crime, o agente deve submeter a vítima ou
testemunha a procedimentos desnecessários, repetitivos ou invasivos.
Não há necessidade, para a tipicidade, que a pergunta seja dirigida ao sujeito passivo, pois o que importa
é que ele tenha sido submetido, no ambiente supervisionado pelo Estado, a uma situação de revitimização.
Se, por exemplo, o juiz, ao formular ao perito uma pergunta totalmente desnecessária, que leve a
vítima, presente à audiência, a reviver a situação de violência, o delito poderá se caracterizar.
Se o mesmo fato causar a revitimização em mais de um sujeito passivo haverá concurso de crimes de
violência institucional.
O tipo penal se refere a “procedimentos” no plural, mas a referida expressão, que compreende os
diversos modo de agir do agente, é indicativa de gênero, no sentido de que o delito pode se caracterizar com
qualquer tipo de ação ou omissão que leve à revitimização do sujeito passivo.
Não se exige, destarte, a pluralidade de atos, o que transformaria o delito em habitual, bastando assim
apenas um.
Os procedimentos que caracterizam o crime são os desnecessários, repetitivos ou invasivos.
Desnecessários são os dispensáveis à solução dos fatos.
Repetitivos são os que já foram realizados, com força probatória.
Invasivos são os que adentram na esfera de privacidade do sujeito passivo, além dos limites aceitáveis
pelo bom senso.
O delito é de forma livre. pois admite inúmeros meios de execução. Exemplos: perguntas humilhantes,
exibição de fotos da vítima nua, reconstituição simulada do crime sexual, com a presença da vítima.
Não basta, para a caracterização do crime, que os procedimentos sejam desnecessários, repetitivos ou
invasivos, pois é ainda mister que cause a revitimização, ou seja, que leve a vítima ou a testemunha a reviver
sem estrita necessidade a situação de violência ou outras situações potencialmente geradoras de sofrimento
ou estigmatização.
O tipo penal prevê a interpretação analógica, pois, após mencionar a fórmula casuística representada
pela expressão “situação de violência”, se utiliza da seguinte fórmula genérica: “ou outras situações
potencialmente geradoras de sofrimento ou estigmatização”.
Assim, a revivência de situação de violência ou não violência só gera a revitimização, necessária à
configuração do delito em apreço, quando for potencialmente geradora de sofrimento ou estigmatização, o
que deve ser analisado no caso concreto.
A revivência de situações que não tem potencial para gerar sofrimento ou estigmatização constitui fato
atípico.
O sofrimento é a dor psicológica.
A estigmatização, por sua vez, é o fato de o sujeito passivo ser lembrado, classificado ou qualificado de
uma forma desagradável, o que obviamente também tem potencial para gerar sofrimento, razão pela qual
nem havia necessidade de sua menção.
O sofrimento ou estigmatização não precisam ter conotação sexual, pois o tipo penal não faz qualquer
restrição nesse sentido, podendo assim compreender outros tipos de recordações com potencial para causar
dor psíquica, como é o caso do sofrimento patrimonial, moral, físico, etc.
O elemento normativo do tipo recai sobre a expressão “sem estrita necessidade”.
Por consequência, se o agente realizar os procedimentos repetitivos ou invasivos, que levam à
revitimização, mas que se revelam estritamente necessários à solução dos fatos, não há falar-se em crime.
Em relação aos procedimentos desnecessários, sob pena de redundância, prescindem da invocação do

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aludido elemento normativo do tipo.


Sobre a estrita necessidade dos procedimentos adotados pelo agente, convém relembrar que
a mera divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas não configura abuso de autoridade
(§2º do art. 1º da Lei 13.869/2019).
O elemento subjetivo do tipo é o dolo de perigo, que pode ser direto ou eventual, conforme o agente
queira ou assuma o risco de causar o perigo de levar a vítima ou testemunha a recordações potencialmente
danosas.
Quanto à modalidade culposa, constitui fato atípico, pois não é contemplada pelo tipo penal.
O dolo deve compreender dois aspectos. Ei-los:
a) a vontade de realizar conduta descrita no tipo penal, consciente de que ela é desnecessária, repetitiva
ou invasiva;
b) a vontade de levar o sujeito passivo à revitimização, ou seja, a reviver a situação de violência ou
outras situações potencialmente geradoras de sofrimento ou estigmatização.
Se, por erro escusável ou inescusável, o agente supõe que os aspectos abordados eram necessários, não
repetidos ou não invasivos, o delito será excluído, em face do erro de tipo.
Igualmente, não há crime, por força do erro de tipo, quando o agente, apesar de ciente de que a
abordagem era desnecessária, repetitiva ou invasiva, ignorava que ela pudesse levar o sujeito passivo a reviver
a situação de violência ou outras situações potencialmente geradoras de sofrimento ou estigmatização.
Na esteira do §1º do art. 1º da Lei 13.869/2019, além do dolo, o delito só se configura quando praticado
pelo agente com a finalidade específica de prejudicar outrem ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda,
por mero capricho ou satisfação pessoal.
Trata-se do chamado dolo específico, que é exigido como regra geral nos crimes de abuso de autoridade.
Quanto à consumação, ocorre com a revitimização, ou seja, quando, em razão dos procedimentos
desnecessários, repetitivos ou invasivos, o sujeito passivo acaba revivendo a situação de violência; ou outras
situações potencialmente geradoras de sofrimento ou estigmatização.
Trata-se assim de crime de perigo concreto, pois se exige a demonstração do perigo de sofrimento ou
estigmatização, oriundo da revivência dos fatos.
Basta, para a consumação, o perigo, prescindindo-se da ocorrência do dano psicológico, representado
pelo efetivo sofrimento ou estigmatização, cuja ocorrência, porém, influirá na dosagem da pena base, por se
tratar de exaurimento, isto é, consequência do crime (art. 59 do CP).
Importante destacar que não constitui crime a revivência de fatos sem o mínimo potencial para causar
sofrimento ou estigmatização.
Quanto à demonstração do perigo de sofrimento ou estigmatização, exigirá exame de corpo de delito
materializado em laudo psiquiátrico ou psicológico.
A tentativa se revela possível, quando a revitimização não ocorrer por circunstâncias alheias à vontade
do agente. Exemplo: a vítima não compreendeu a pergunta desnecessária e humilhante que lhe fora
formulada pelo delegado de polícia, que com certeza a faria reviver a situação potencialmente geradora de
sofrimento ou estigmatização.
Por outro lado, há ainda duas causas de aumento de pena.
Com efeito, dispõe o §1º do art. 15-A:
“Se o agente público permitir que terceiro intimide a vítima de crimes violentos, gerando indevida
revitimização, aplica-se a pena aumentada de 2/3 (dois terços)”.
A majorante em debate se refere à intimidação da vítima por terceiro, mediante anuência do agente
público.
Intimidar é assustar, assombrar, aterrorizar.
Para ser aplicado o aumento da pena, se exige os seguintes requisitos:
a) que a intimidação seja praticada por terceiro. Exemplos: advogado, cônjuge, irmão, etc. O terceiro
que realiza a intimidação não responde pelo crime, que é próprio dos agentes públicos, mas poderá ser
enquadrado no crime de violência psicológica contra mulher (art. 147-B do CP) ou injúria, se a vítima for
homem (art. 140 do CP).
Mas se houver violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, ser-lhe-

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á imputado o delito de coação no curso do processo, previsto no art. 344 do CP. Nesse caso, o agente público,
que permitiu a intimidação através de violência ou grave ameaça, será participe, por omissão, do crime de
coação no curso do processo, absorvendo-se, porém, o crime de violência institucional, que é de menor
gravidade, por força do princípio da consunção.
b) que o agente público permita a intimidação. Permitir é anuir, concordar. Assistir inerte à intimidação
configura permissão tácita, tendo em vista que há o dever jurídico de impedir o resultado (§2º do art. 13 do
CP).
c) que a intimidação recaia sobre a vítima de crimes violentos. Exclui-se assim a majorante quando a
intimidação é dirigida à testemunha de crimes violentos ou a vítima de crimes não violentos.
d) que a intimidação gere a indevida revitimização, ou seja, faça a vítima reviver, sem estrita
necessidade. a situação de violência ou outras situações potencialmente geradoras de sofrimento ou
estigmatização.
e) que a intimidação ocorra mediante procedimentos desnecessários, repetitivos ou invasivos. De fato,
como se trata de tipo penal derivado, impõe-se, para a sua incidência, a realização dos elementos descritos
no “caput”.
É relevante acrescentar que se ocorrer de o terceiro realizar procedimentos desnecessários, repetitivos
ou invasivos, mas sem intimidar a vítima, levando-a, porém, à revitimização, não há falar-se na incidência da
majorante em debate, mas o agente público, que permitiu ou assistiu inerte, como tinha o dever jurídico de
agir, nos termos do § 2º do art. 13 do CP, responderá pelo delito de violência institucional, previsto no “caput”
do citado art. 15-A.
A segunda majorante, prevista no § 2º do art. 15-A, prevê que “se o agente público intimidar a vítima
de crimes violentos, gerando indevida revitimização, aplica-se a pena em dobro”.
Eis os requisitos para a sua incidência:
a) que a intimidação recaia sobre a vítima de crimes violentos. Exclui-se assim a majorante quando a
intimidação é dirigida à testemunha de crimes violentos ou a vítima de crimes não violentos.
b) que a intimidação gere a indevida revitimização, ou seja, faça a vítima reviver, sem estrita
necessidade. a situação de violência ou outras situações potencialmente geradoras de sofrimento ou
estigmatização.
c) que a intimidação ocorra mediante procedimentos desnecessários, repetitivos ou invasivos. De fato,
como se trata de tipo penal derivado, impõe-se, para a sua incidência, a realização dos elementos descritos
no “caput”.
Por fim, a ação penal é pública incondicionada.

Figura típica equiparada

O parágrafo único do art. 16 acrescenta que:


“Incorre na mesma pena quem, como responsável por interrogatório em sede de procedimento
investigatório de infração penal, deixa de identificar-se ao preso ou atribui a si mesmo falsa identidade, cargo
ou função”.

O delito em análise incrimina o responsável pelo interrogatório do preso que deixa de identificar-se ou
identifica-se falsamente.
O sujeito ativo é a pessoa responsável pelo interrogatório, ainda que, pela lei, não tenha esta atribuição.
Comete, por exemplo, o delito, o escrivão de polícia que, ao realizar o interrogatório do preso, identifica-se
como sendo o delegado de polícia.
O sujeito passivo é o investigado preso. Não há o delito, diante da lacuna da lei, quando se tratar de
investigado solto, pois o tipo penal refere-se apenas ao preso.
Estranhamente, a lei só incrimina o fato quando ocorrido em procedimento investigatório de infração
penal. Caso se verifique na fase judicial, não há falar-se no delito em análise, pois é vedada a analogia “in
malam partem”.
São duas as formas de se praticar o crime:

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a) deixar de identificar-se;
b) identificar-se falsamente. É o fato de atribuir a si mesmo falsa identidade, falso cargo ou falsa função.
Se o agente é confundido com outra autoridade e se mantém em silêncio, o delito não se caracteriza, pois é
necessário que a falsidade seja irrogada pelo próprio agente.

Interrogatório policial durante o repouso noturno

Dispõe o art. 18:


“Submeter o preso a interrogatório policial durante o período de repouso noturno, salvo se capturado
em flagrante delito ou se ele, devidamente assistido, consentir em prestar declarações:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa”.

O sujeito ativo é o agente público que realizou o interrogatório policial, no exercício da função ou a
pretexto de exercê-la, ainda que não seja esta a sua a função.
O tipo penal só faz menção ao interrogatório policial, ou seja, realizado na fase do inquérito policial.
Por consequência, o delito não se caracteriza quando o interrogatório durante o repouso noturno
houver sido realizado pelo representante do Ministério Público, nos procedimentos investigatórios de sua
atribuição.
O bem jurídico protegido é a administração da justiça e a dignidade do preso.
O sujeito passivo é o investigado preso.
O delito em análise incrimina o interrogatório policial do preso durante o repouso noturno, salvo em
duas hipóteses:
a) prisão em flagrante;
b) consentimento do preso, que esteja assistido por advogado ou defensor público. Sem a assistência
do seu patrono, ele não poderá ser interrogado durante o repouso noturno, ainda que consinta.
O repouso noturno é um elemento normativo do tipo. Trata-se do pedaço da noite em que, segundo os
costumes ou as normas administrativas do presídio, os presos se recolhem para dormir.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
Quanto à consumação, ocorre com o início do interrogatório.
Admite-se a tentativa, quando o interrogatório não se inicia por circunstâncias alheias à vontade do
agente.

Violação do direito de petição do preso

Dispõe o art. 19:


“Impedir ou retardar, injustificadamente, o envio de pleito de preso à autoridade judiciária competente
para a apreciação da legalidade de sua prisão ou das circunstâncias de sua custódia:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa”.

O sujeito ativo pode ser qualquer agente público que, no exercício da função ou a pretexto de exercê-
la, tenha realizado a conduta descrita no tipo penal.
O bem jurídico protegido é o direito de petição, que consiste em formular requerimentos às autoridades
públicas, sem a assistência de advogado.
O sujeito passivo é o preso. Não abrange os adolescentes apreendidos, pois eles não são rotulados como
presos, mas outra corrente, por interpretação extensiva, também os compreende. O tipo penal também não
faz menção ao doente mental internado, em razão de medida de segurança, sendo vedada a analogia “in
malam partem”.
Os núcleos do tipo são os verbos impedir e retardar.
Impedir é obstar, criar obstáculos.

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Retardar é atrasar o envio.


O delito em análise incrimina o agente público que, ao receber a petição formulada pelo preso, impede
ou retarda o seu envio ao juiz competente.
O tipo penal não incrimina quem impede ou retarda o envio de pleito do preso endereçados à
autoridade policial, ao Ministério Público, à Defensoria Pública ou a outros órgãos ou autoridades diversas da
autoridade judiciária competente.
Igualmente, não há o crime quando o pleito do preso se dirige a uma autoridade judiciária
incompetente.
De fato, só há o crime em relação às petições endereçadas à autoridade judiciária que seja responsável
para apreciar a legalidade ou as circunstâncias da prisão.
O elemento normativo do tipo é o termo “injustificadamente”. Só há o delito se não havia motivos justos
para se impedir ou retardar a remessa do requerimento ao juiz competente.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
A consumação ocorre com a conduta de impedir ou retardar o envio de pleito de preso à autoridade
judiciária competente.
Admite-se a tentativa, quando o agente realiza atos de execução para impedir ou retardar o envio, mas
mesmo assim, o pleito, por circunstâncias alheias à sua vontade, é enviado oportunamente ao juiz
competente.

Figura típica equiparada

O parágrafo único do art. 19 acrescenta que:


“Incorre na mesma pena o magistrado que, ciente do impedimento ou da demora, deixa de tomar as
providências tendentes a saná-lo ou, não sendo competente para decidir sobre a prisão, deixa de enviar o
pedido à autoridade judiciária que o seja”.

O sujeito ativo do delito é apenas o magistrado que tem competência para fiscalizar o presídio ou decidir
sobre a prisão. Não abrange outras autoridades.
O núcleo do tipo é verbo deixar, que indica uma omissão definitiva. Não se incrimina o retardar, que é
o simples atraso com o propósito de agir posteriormente.
São duas as formas de se praticar o delito:
a) o magistrado, ciente do impedimento ou da demora, deixa de tomar as providências para sanar
ilegalidade, ou seja, para que o pleito do preso lhe seja enviado.
b) o magistrado, ciente do impedimento ou da demora, mas não sendo competente para decidir sobre
a prisão, deixa de enviar o pedido à autoridade judiciária que o seja.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo. Exige-se o dolo direto, a ciência, ou seja, a certeza acerca da
violação do direito de petição do preso. Na dúvida, não há falar-se no delito.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
Em ambas as modalidades, o delito é omissivo próprio e se consuma quando flui um tempo suficiente
para se demonstrar a omissão do magistrado.
Não se admite a tentativa.

Impedimento da entrevista do preso com seu advogado

Dispõe o art. 20:


“Impedir, sem justa causa, a entrevista pessoal e reservada do preso com seu advogado:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa”.

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O sujeito ativo pode ser qualquer agente público que, no exercício da função ou a pretexto de exercê-
la, tenha realizado a conduta descrita no tipo penal.
O bem jurídico protegido é o direito de defesa do preso e o direito do advogado de comunicar-se com
seu cliente preso.
Sujeitos passivos são o preso e o seu advogado. Não é qualquer advogado, mas apenas o advogado do
preso, pois o tipo penal se refere à comunicação do preso “com seu advogado”. O tipo penal, ao contrário do
seu parágrafo único, não faz menção à defensoria pública, sendo vedada a analogia “in malam partem”,
embora o defensor público também tenha o direito de se comunicar com o preso.
Em qualquer modalidade de interrogatório, ainda que realizado mediante videoconferência, o juiz
garantirá ao réu o direito de entrevista prévia e reservada com o seu advogado ou defensor durante um tempo
razoável.
O direito de entrevista prévia é uma conversa reservada para acertar os pontos da defesa.
Em relação ao investigado ou réu solto, o delito em análise não se caracteriza, mas se o impedimento,
nessa hipótese, ocorrer antes de uma audiência judicial, haverá o delito do parágrafo único do art. 20.
O núcleo do tipo é verbo impedir, que significa obstar. Não se incrimina a conduta de retardar ou atrasar
a comunicação entre o preso e seu advogado.
O referido delito visa garantir o contato entre o preso e seu advogado, em local reservado, ou seja, onde
se garanta o sigilo desta conversa.
Trata-se da entrevista que não antecede a uma audiência judicial, pois, nesse caso, o delito será o
previsto no parágrafo único deste art. 20.
Vê-se assim que o direito de o preso entrevistar-se com seu advogado é também assegurado na fase
das investigações, antes do interrogatório ou em qualquer outro momento.
O elemento normativo do tipo é a expressão “sem justa causa”. Se havia motivos, por exemplo, motim
no presídio, não há falar-se no delito.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
A consumação ocorre quando a conduta do agente impede a comunicação entre o preso e seu
advogado.
Trata-se de crime material. Admite-se, portanto, a tentativa, quando o agente realiza, sem sucesso, os
atos de execução para impedir a comunicação.

Figura típica equiparada

Dispõe o parágrafo único do art. 20:


“Incorre na mesma pena quem impede o preso, o réu solto ou o investigado de entrevistar-se pessoal
e reservadamente com seu advogado ou defensor, por prazo razoável, antes de audiência judicial, e de sentar-
se ao seu lado e com ele comunicar-se durante a audiência, salvo no curso de interrogatório ou no caso de
audiência realizada por videoconferência”.

O tipo penal incrimina duas situações ocorrida na audiência judicial:


a) quem impede a entrevista pessoal, reservada e por prazo razoável, antes da audiência judicial, entre
investigado ou réu, preso ou solto, com seu advogado ou defensor. Não se exige que se trate da audiência de
interrogatório, podendo abranger qualquer audiência judicial, pois onde a lei não distingue ao intérprete não
é lícito distinguir. Convém observar que o tipo penal, ao contrário do “caput”, também se refere ao defensor
público, outrossim, ao investigado ou réu, preso ou solto.
b) quem impede o investigado ou réu, preso ou solto, de sentar-se ao lado de seu advogado ou defensor
e com ele comunicar-se durante a audiência, salvo no caso de interrogatório ou de audiência realizada por
videoconferência. Ora, na audiência realizada por videoconferência, o advogado ou defensor também deverá
estar acompanhando o réu, no local onde ele se encontra, e, por isso, não se compreende a ressalva feita pelo
tipo penal. O delito se caracteriza quando houver cumulativamente o impedimento de sentar-se ao lado do

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seu advogado ou defensor e de com ele se comunicar. Se não sentou ao lado, mas pode se comunicar, não há
o crime. Se sentou ao lado, mas não pode se comunicar, também não há crime. A redação inadequada obsta
a tipificação dessa última conduta, não obstante a sua gravidade

Manutenção ilegal de presos na mesma cela

Dispõe o art. 21:

“Manter presos de ambos os sexos na mesma cela ou espaço de confinamento:


Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

O parágrafo único acrescenta que:


“Incorre na mesma pena quem mantém, na mesma cela, criança ou adolescente na companhia de maior
de idade ou em ambiente inadequado, observado o disposto na Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto
da Criança e do Adolescente)”.

O sujeito ativo é o agente público que, no exercício da função ou a pretexto de exercê-la, realiza a
conduta descrita no tipo penal.
O bem jurídico protegido é a dignidade da pessoa.
O sujeito passivo, no delito do “caput”, pode ser qualquer pessoa, mas, na figura típica do parágrafo
único, é a criança ou adolescente.
O núcleo do tipo é o verbo manter, que significa fazer permanecer ou perdurar determinada situação,
outrossim, reter ou acondicionar.
É preciso que a manutenção seja na mesma cela ou no mesmo espaço de confinamento, ou seja, em
qualquer ambiente onde as pessoas são isoladas das demais. Exemplos: camburão, quarto, sala, etc.
O tipo penal incrimina as seguintes situações:
a) manter presos de ambos os sexos na mesma cela ou em espaço de confinamento. Não se pune a
manutenção de um travesti numa cela masculina, sendo vedada a analogia “in malam partem”, salvo quando
em seu documento pessoal constar o sexo feminino.
b) manter na mesma cela criança ou adolescente na companhia de maior de idade. Ainda que todos
sejam do mesmo sexo, haverá o delito em análise.
c) manter na mesma cela criança ou adolescente em ambiente inadequado. O tipo penal não veda
expressamente a manutenção na mesma cela de criança ou adolescente de sexos diferentes, mas, nessa
situação, o delito pode se caracterizar se o ambiente se revelar inadequado, ou seja, gerar constrangimento
ou for propício a atos impróprios.
Convém observar que a criança não pode, em hipótese alguma, ser mantido em cela, pois não se sujeita
às medidas socioeducativas.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, a realização da conduta por mero capricho ou satisfação pessoal.
A consumação ocorre quando o agente mantém as pessoas numa das situações descritas no tipo, ainda
que por pouco tempo.
Admite-se a tentativa.

Violação de domicílio

Dispõe o art. 22:


“Invadir ou adentrar, clandestina ou astuciosamente, ou à revelia da vontade do ocupante, imóvel
alheio ou suas dependências, ou nele permanecer nas mesmas condições, sem determinação judicial ou fora
das condições estabelecidas em lei:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

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§ 1º Incorre na mesma pena, na forma prevista no caput deste artigo, quem:


I - coage alguém, mediante violência ou grave ameaça, a franquear-lhe o acesso a imóvel ou suas
dependências;
II - (VETADO);
III - cumpre mandado de busca e apreensão domiciliar após as 21h (vinte e uma horas) ou antes das 5h
(cinco horas).
§ 2º Não haverá crime se o ingresso for para prestar socorro, ou quando houver fundados indícios que
indiquem a necessidade do ingresso em razão de situação de flagrante delito ou de desastre”.

Trata-se do crime de violação de domicílio cometido por agentes públicos, estando, pois, revogado
expressamente pela lei em comento o disposto no §2º do art. 150 do CP, que também versava sobre o mesmo
assunto.
A revogação, entretanto, não foi uma boa solução, pois a violação de domicílio, que constitui delito de
abuso de autoridade, exige elementos subjetivos específicos que tornam difícil a sua configuração.
O bem jurídico protegido é o direito à intimidade.
O sujeito passivo pode ser qualquer pessoa física ou jurídica.
O delito em análise refere-se a imóvel alheio. Quanto aos bens móveis que funcionam como domicílio ,
como na hipótese de o agente morar no próprio veículo, a invasão sem ordem judicial ou com ordem judicial,
mas no período noturno, conquanto ilícita, não configura o delito em análise, pois é vedada a analogia “in
malam partem”, mas o agente poderá ser enquadrado no delito de violação de domicílio do art. 150 do CP.
O tipo penal incrimina as seguintes condutas:
a) Invadir, adentrar ou permanecer em imóvel alheio ou em suas dependências, sem autorização do
ocupante ou do juiz. Durante o dia, o ingresso é possível com ordem judicial ou autorização do morador, mas
à noite, ou seja, após as 21h (vinte e uma horas) ou antes das 5h (cinco horas), só é possível mediante
autorização do morador.
b) coagir alguém, mediante violência ou grave ameaça, a franquear-lhe o acesso a imóvel ou suas
dependências. O delito se consuma com a coação, ainda que o agente não consiga ter acesso ao imóvel. Trata-
se de uma tentativa punida como crime consumado.
c) cumprir mandado de busca e apreensão domiciliar após as 21h (vinte e uma horas) ou antes das 5h
(cinco horas). O mandado de busca domiciliar só pode ser expedido pelo juiz competente, sendo que o seu
cumprimento só poderá ser feito durante o dia, ou seja, após as 5h (cinco horas) e antes das 21h (vinte e uma
horas). Se, entretanto, houver a autorização do morador, o cumprimento também poderá ocorrer no período
noturno.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, que o agente realize a conduta por mero capricho ou satisfação pessoal.
O delito se consuma com a realização da conduta. No verbo permanecer, exige-se, para a consumação,
que o agente persista em ficar no local, contra a vontade da vítima, por um lapso de tempo razoável, que
demonstre o seu propósito de ali continuar.
Admite-se a tentativa. No verbo coagir, só será possível a tentativa na hipótese de o agente enviar uma
ameaça por escrito, mas que, por circunstâncias alheia à sua vontade, não chega ao conhecimento da vítima.
Por fim, não haverá delito algum quando o ingresso for no imóvel alheio for para:
a) prestar socorro;
b) realizar prisão em flagrante, quando houver fundados indícios da situação de flagrante;
c) em caso de desastre.

Fraude processual
Dispõe o art. 23:
“Inovar artificiosamente, no curso de diligência, de investigação ou de processo, o estado de lugar, de
coisa ou de pessoa, com o fim de eximir-se de responsabilidade ou de responsabilizar criminalmente alguém

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ou agravar-lhe a responsabilidade:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem pratica a conduta com o intuito de:
I - eximir-se de responsabilidade civil ou administrativa por excesso praticado no curso de diligência;
II - omitir dados ou informações ou divulgar dados ou informações incompletos para desviar o curso da
investigação, da diligência ou do processo”.

Trata-se de uma espécie de fraude processual, cuja incriminação já é prevista no art. 347 do CP.
O sujeito ativo é o agente público que, no exercício da função ou a pretexto de exercê-la.
Não é necessário que o sujeito ativo seja parte ou tenha interesse no processo. Aliás, ele nem precisa
conhecer os eventuais beneficiados.
O bem jurídico protegido é o regular funcionamento da administração da justiça.
O sujeito passivo é tanto o Estado quanto a pessoa prejudicada com a fraude processual.
O núcleo do tipo é o verbo inovar, que significa modificar, através de acréscimo ou supressão.
O meio de execução é a fraude, que consiste em qualquer meio enganoso. É, pois, necessária que se trate
de uma inovação artificial, que é o oposto daquilo que é natural. Este delito, na doutrina, também é conhecido
como estelionato processual.
O delito deve ser praticado no curso de diligência, investigação ou processo. Abrange qualquer processo
judicial. Exemplos: processos trabalhistas, família, sucessões, etc. O processo administrativo, por sua vez, é o
instaurado perante as autoridades administrativas (exemplos: sindicâncias, processos disciplinares, processos
fiscais).
O delito pode ser também praticado até mesmo antes do início do processo ou das investigações, pois a
lei admite a sua prática quando também praticado no curso de diligência, ainda que esta não tenha caráter
investigatório ou processual.
A inovação fraudulenta, para ser criminosa, deve modificar o estado, ou seja, a situação ou posição do:
a) lugar: Exemplo: o criminoso limpa o local do crime para apagar as suas impressões digitais.
b) coisa: Exemplo: mudar a posição do cadáver ou colocar uma arma em suas mãos para simular o
suicídio.
c) pessoa.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar a conduta
criminosa.
É ainda necessário o dolo específico, o fim de prejudicar outrem ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro
ou ainda o fim de mero capricho ou de satisfação pessoal.
Caso haja o fim de eximir-se de responsabilidade civil ou administrativa por excesso praticado no curso
de diligência ou de omitir dados ou informações ou divulgar dados ou informações incompletos para desviar
o curso da investigação, da diligência ou do processo, o agente responderá pela figura equiparada, prevista no
parágrafo único do art. 23.
Quanto à consumação, verifica-se no momento da alteração do local, coisa ou pessoa,
independentemente de se atingir o fim de induzir a erro o juiz ou o perito. Trata-se de delito formal, pois se
consuma independentemente do resultado.
Admite-se a tentativa. Exemplo: o agente é surpreendido segundos antes de iniciar a inovação
fraudulenta.

Coação para forjar tratamento hospitalar de pessoa morta

Dispõe o art. 24:


“Constranger, sob violência ou grave ameaça, funcionário ou empregado de instituição hospitalar pública
ou privada a admitir para tratamento pessoa cujo óbito já tenha ocorrido, com o fim de alterar local ou

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momento de crime, prejudicando sua apuração:


Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, além da pena correspondente à violência”.

O bem jurídico protegido é administração da justiça.


O tipo penal em análise aborda uma situação em que o agente público obriga o funcionário da
instituição hospitalar a tratar uma pessoa morta como se estivesse viva, com o fim de alterar o local ou o
tempo do crime, prejudicando a sua apuração.
A rigor, trata-se também de uma fraude processual, com elemento subjetivo específico, ou seja, o fim
de alterar local ou momento de crime, prejudicando sua apuração.
A hipótese revela-se surreal e será uma figura decorativa, sem qualquer incidência prática.

Obtenção de prova por meio ilícito

Dispõe o art. 25:


“Proceder à obtenção de prova, em procedimento de investigação ou fiscalização, por meio
manifestamente ilícito:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem faz uso de prova, em desfavor do investigado ou
fiscalizado, com prévio conhecimento de sua ilicitude”.

O bem jurídico protegido é a administração da justiça.


O tipo penal incrimina a obtenção de prova através de meio manifestamente ilícito, outrossim, uso da
prova ilícita.
Só há o crime quando se tratar de procedimento de investigação ou fiscalização. Não abrange os
procedimentos judiciais e os procedimentos administrativos que não sejam de investigação ou fiscalização.
O tipo penal prevê duas condutas criminosas:
a) proceder à obtenção de prova, por meio manifestamente ilícito. Proceder é realizar atos de execução
com vistas à obtenção da prova ilícita. O crime é formal, pois se consuma com a conduta, ainda que o agente
não consiga obter a prova ilícita. Não basta, para a caracterização do crime, que o meio seja ilícito, pois a lei
exige que seja manifestamente ilícito, isto é, que seja uma ilicitude evidente. Haverá o crime ainda que a
finalidade seja colher uma prova em favor do investigado ou fiscalizado.
b) fazer uso de prova, em desfavor do investigado ou fiscalizado, com prévio conhecimento de sua
ilicitude. O sujeito ativo é o agente público que não participou da obtenção da prova ilícita, pois o que
participou será enquadrado na modalidade anterior, do caput do art. 25. O uso da prova ilícita só configura
crime quando utilizada em desfavor do investigado ou fiscalizado. Exige-se ainda o dolo direto, a certeza sobre
a ilicitude, pois, no caso de dúvida (dolo eventual), o fato será atípico. Além de direto, o dolo deve ser “ab
initio”, pois a certeza da ilicitude deve anteceder ao uso. Se somente após o uso o agente tomar conhecimento
da ilicitude da prova, quedando-se inerte, não há falar-se no delito em análise. A consumação ocorre com o
uso da prova, ou seja, com a apresentação da prova no procedimento.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.

Instaurar ou requisitar instauração de procedimento investigatório sem qualquer indício da prática


de crime

Dispõe o art. 27:


“Requisitar instauração ou instaurar procedimento investigatório de infração penal ou administrativa,
em desfavor de alguém, à falta de qualquer indício da prática de crime, de ilícito funcional ou de infração
administrativa:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

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Parágrafo único. Não há crime quando se tratar de sindicância ou investigação preliminar sumária,
devidamente justificada”.

O bem jurídico protegido é a administração da justiça.


O delito em análise incrimina o agente público que instaura ou requisita a instauração contra alguém,
dos seguintes procedimentos:
a) investigatórios de infração penal. Exemplos: inquérito policial, PIC (procedimento investigatório
criminal instaurado pelo Ministério Público). Quando se tratar de investigação preliminar, desde que
devidamente fundamentada, não há falar-se no delito em análise, mas sem a devida fundamentação o delito
se caracteriza.
b) administrativo de ilícito funcional ou infração administrativa. Só haverá o delito em apreço quando
não houver qualquer indício da prática de crime, do ilícito funcional ou da infração administrativa. Quando se
tratar de sindicância prévia, desde que devidamente fundamentada, não há falar-se no delito em análise, mas
sem a devida fundamentação o delito se caracteriza.
Não há o crime no requerimento de instauração dos aludidos procedimentais, sem indícios da infração,
pois o tipo penal se refere à requisição, que é uma ordem de instauração. Responderá, porém, pelo delito, o
agente público que, à vista de um requerimento sem qualquer indício da infração, instaurar o procedimento
contra alguém.
O tipo penal não faz menção às contravenções penais nem ao inquérito civil. Nestas duas situações, o
fato será atípico.
A instauração da persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada, quanto não
se atribui a autoria a alguém, caracteriza o crime de abuso de autoridade do art. 30.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.

Divulgação de gravação

Dispõe o art. 28:


“Divulgar gravação ou trecho de gravação sem relação com a prova que se pretenda produzir, expondo
a intimidade ou a vida privada ou ferindo a honra ou a imagem do investigado ou acusado:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa”.

O delito em análise foi motivado pelo ato do juiz Sérgio Moro que, na operação lava jato, divulgou
trechos da gravação do ex-presidente Lula e também de sua mulher Maria Letícia, sem relação com a prova
do processo.
O bem jurídico protegido é o direito à intimidade e à vida privada.
A publicidade do processo só autoriza a divulgação das provas relacionadas com o fato criminoso.
Quanto às gravações ou trechos de gravações sem qualquer relação com o processo, devem
permanecer em sigilo e serem destruídos.
O delito em análise, na verdade, incrimina a violação do sigilo que deve recair sobre as gravações ou
trechos dela, que não se relacionam com o processo.
A consumação ocorre com a divulgação, bastando a revelação do fato a uma única pessoa, pois o tipo
penal não exige a publicidade, ou seja, a revelação do fato ao número indeterminado de pessoas.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.

Prestar informações falsas

Dispõe o art. 29:


“Prestar informação falsa sobre procedimento judicial, policial, fiscal ou administrativo com o fim de
prejudicar interesse de investigado:

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Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa”.

O bem jurídico protegido é a administração da justiça.


O tipo penal pune o agente público que presta informações falsas, com o fim de prejudicar o investigado.
Exemplo: delegado de polícia relata falsamente à imprensa que o investigado confessou o crime.
Não há, destarte, o delito quando o propósito for beneficiá-lo. Outrossim, quando se tratar de inquérito
civil.
Conforme se vê, o tipo penal prevê elemento subjetivo específico.
O tipo penal faz menção ao investigado e silencia acerca do réu, mas ao mesmo tempo contempla o
procedimento judicial.
Em se tratando de informações falsas sobre réu, não há falar-se no delito em análise, diante da vedação
da analogia “in malam partem”.
Quanto ao procedimento judicial, a que se refere o texto legal, é o que se relaciona com o investigado.
Exemplo: procedimento judicial investigatório onde se apura os delitos cometidos por magistrados.

Persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa ou contra pessoa que sabe inocente

Dispõe o art. 30:


“Dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada ou
contra quem sabe inocente:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa”.

O bem jurídico protegido é a administração da justiça.


Tipo penal em análise prevê duas modalidades criminosas:
a) dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada. No
delito do art. 27, o agente identifica o investigado, ao passo que, no delito em apreço, não há esta identificação
prévia. Assim, em não havendo justa causa para a instauração da persecução penal, por exemplo, denúncia
anônima, o que pode ser feito é uma investigação sumária, mas sem se instaurar formalmente a persecução
penal, senão depois de se obter os elementos componentes da justa causa.
b) dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada
contra quem sabe inocente. Trata-se de uma espécie de denunciação caluniosa, que exige o dolo direto, a
certeza da inocência, pois, no caso de dúvida, o delito não se perfaz, mas o agente poderá responder pelo
delito do art. 27. O juiz de direito ou o promotor de justiça, e até mesmo o delegado de polícia e o ministro da
justiça, que, por exemplo, provocam a instauração de um inquérito policial, sabendo da inocência da pessoa,
respondem pelo delito do art. 30 da lei 13.869/2019, e não pelo art. 339 do CP, por força da princípio da
especialidade. Portanto, no delito do art. 339 do CP, o sujeito ativo é o particular, ao passo que, no delito do
art. 30 da lei 13.869/2019, o sujeito ativo é um agente público.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
O art. 339 do CP prevê a pena de reclusão, de dois a oito anos, e multa.
Entretanto, a denunciação caluniosa praticada por agente público, no exercício da função ou a pretexto
de exercê-la, que configura crime de abuso de autoridade, previsto no art. 30, parte final, da lei 13.869/2019,
é punido com pena de detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Noutras palavras, a denunciação caluniosa praticada por agente público, que é fato mais grave, é apenada
de forma bem mais branda que a cometida por particular, que é fato menos grave.
É, pois, flagrante a violação do princípio constitucional da proporcionalidade da pena, previsto no art.
5º, XLVI, da CF.
Força convir, portanto, para que o referido princípio seja preservado, que a denunciação caluniosa
perpetrada por particular, prevista no art. 339 do CP, também deve ser apenada com detenção, de 1 (um) a 4
(quatro) anos, e multa.
No âmbito do Ministério Público do Estado de São Paulo sustenta-se a inconstitucionalidade do citado

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art. 30, por violação do princípio do retrocesso na tutela dos bens jurídicos envolvidos, já protegidos pelo art.
339 do CP, punido, inclusive, com pena em dobro.
Esta tese, entretanto, não convence, pois o princípio da vedação do retrocesso, que proíbe a eliminação
de determinados direitos, é aplicável apenas aos direitos sociais e não às normas penais.

Procrastinar a investigação

Dispõe o art. 31:


“Estender injustificadamente a investigação, procrastinando-a em prejuízo do investigado.
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, inexistindo prazo para execução ou conclusão de
procedimento, o estende de forma imotivada, procrastinando-o em prejuízo do investigado ou do fiscalizado”.

O bem jurídico protegido é a administração da justiça.


O tipo penal, que incrimina o atraso injustificado para se concluir o procedimento investigatório ou de
fiscalização, só se configura quando houver prejuízo ao investigado ou fiscalizado.
Se o prolongamento do procedimento lhe flor benefício, não há falar-se no delito.
O delito se configura quer se trate de investigado preso ou solto, desde que o atraso seja injustificado.
Se for, por exemplo, justificado pelo excesso de serviço, exclui-se o crime.
Inexistindo prazo para a conclusão do procedimento, ainda assim o delito poderá se configurar, quando
se estender injustificadamente além do prazo que seria o razoável.
O tipo penal não exige, para a caracterização do crime, que se trate de um procedimento destinado à
apuração de infrações penais e, por isso, abrange qualquer tipo de procedimento cuja natureza seja
investigatória ou fiscalizatória. Por exemplo: inquérito civil instaurado pelo Ministério Público.
Não há, porém, o delito, quando se tratar de processos judiciais, pois é vedada a analogia “in malam
partem”.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.

Violação de prerrogativas do advogado

Dispõe o art. 32:


“Negar ao interessado, seu defensor ou advogado acesso aos autos de investigação preliminar, ao termo
circunstanciado, ao inquérito ou a qualquer outro procedimento investigatório de infração penal, civil ou
administrativa, assim como impedir a obtenção de cópias, ressalvado o acesso a peças relativas a diligências
em curso, ou que indiquem a realização de diligências futuras, cujo sigilo seja imprescindível:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa”.

O bem jurídico protegido é o direito ao livre exercício da profissão de advogado ou da função de


defensor público, outrossim, o princípio da ampla defesa.
O tipo penal em análise, inspirado na súmula vinculante 14 do STF, incrimina a violação de determinadas
prerrogativas do advogado, previstas no Estatuto da OAB.
O tipo penal prevê dois delitos:
a) negar ao interessado, seu defensor ou advogado acesso aos autos de investigação preliminar, ao
termo circunstanciado, ao inquérito ou a qualquer outro procedimento investigatório de infração penal, civil
ou administrativa. O tipo penal não faz menção aos procedimentos judiciais.
b) impedir a obtenção de cópias dos aludidos procedimentos.
Não há, porém, o crime, quando se vedar o acesso a peças relativas a diligências em curso, ou que
indiquem a realização de diligências futuras, cujo sigilo seja imprescindível.
Também não há o crime quando se vedar o acesso a processos judiciais, pois é vedada a analogia “in

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malam partem”.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
Ainda que o advogado não tenha procuração do investigado, o Estatuto da OAB lhe faculta, em regra, o
acesso aos autos desses procedimentos.
O sigilo no inquérito se desdobra em três graus:
a) automático ou extremo;
b) extensivo;
c) extremado.
O sigilo automático ou externo é o que se opera por força de lei, sem que haja uma expressa
manifestação da autoridade policial.
Dispensa-se, portanto, despacho da autoridade policial. Em regra, todo inquérito é sigiloso em relação
à população em geral.
O objetivo do sigilo é assegurar o sucesso das investigações e também proteger a dignidade das pessoas
envolvidas.
A propósito, dispõe o art. 20 do CPP: “A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à
elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade”.
Este sigilo externo, que recai tanto sobre a existência quanto sobre o conteúdo do inquérito, vedando-
lhe o acesso a qualquer pessoa, não se aplica à autoridade judiciária, ao membro do Ministério Público, ao
advogado, ao indiciado e à vítima. Quanto ao advogado, mesmo sem procuração, tem o direito de examinar
os inquéritos policiais e qualquer outro procedimento investigatório, findos ou em andamento, ainda que
conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou digital (art. 7º, XIV,
da Lei 8.906/94).
O sigilo extensivo é o decretado pela autoridade policial para vedar que os advogados sem procuração,
e eventualmente o próprio indiciado ou a vítima, tenha acesso aos autos do inquérito.
É possível quando o sigilo for necessário à elucidação dos fatos ou aos interesses da sociedade.
Nesse caso, além do juiz e do Ministério Público, o acesso aos autos só será deferido ao advogado que
apresentar procuração (art. 7º, §10, da Lei 8.906/94).
O sigilo extremado é o decretado pela autoridade policial para vedar que, até mesmo o advogado com
procuração, tenha prévia ciência dos próximos atos de investigação que ainda serão realizados.
Entretanto, uma vez documentado nos autos o ato praticado, o advogado, com procuração, passa a
ter acesso, que lhe poderá ser franqueado pela própria autoridade policial.
Sobre o assunto, dispõe a Súmula Vinculante 14:
“É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já
documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária,
digam respeito ao exercício do direito de defesa”.
Nos crimes relacionados com organização criminosa, se a autoridade policial decretar o sigilo, o
advogado com procuração nos autos, após documentada a diligência realizada, só poderá ter acesso a ela com
autorização judicial (art. 23 da Lei 12.850/2.003).

Violação da legalidade

Dispõe o art. 33, “caput”:


“Exigir informação ou cumprimento de obrigação, inclusive o dever de fazer ou de não fazer, sem
expresso amparo legal:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa”.
Parágrafo único: Incorre na mesma pena quem se utiliza de cargo ou função pública ou invoca a
condição de agente público para se eximir de obrigação legal ou para obter vantagem ou privilégio indevido”.
O tipo penal em análise visa proteger o princípio da legalidade, previsto no art. 5º, II, da CF, segundo o
qual ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.
O delito do “caput” consiste em exigir o cumprimento de informação, obrigação ou dever, sem expresso

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amparo legal.
A obrigação é a prestação patrimonial; o dever é a prestação extrapatrimonial.
Não há a necessidade de violência ou grave ameaça, ao contrário do delito de constrangimento ilegal,
previsto no art. 146 do CP.
A incriminação recai apenas sobre a exigência, que é a imposição de uma ordem.
Quanto à solicitação, mero pedido para, de forma livre e sem coação, prestar informação ou cumprir
obrigação ou dever, não caracteriza crime.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
O parágrafo único do art. 33 incrimina o agente público que se utiliza de cargo ou função pública ou
invoca a condição de agente público para se eximir de obrigação legal ou para obter vantagem ou privilégio
indevido.
O tipo penal incrimina a famosa “carteirada” do agente público.
São duas as modalidades criminosas:
a) usar ou invocar a função pública para se eximir de obrigação legal.
b) usar ou invocar a função pública para obter vantagem ou privilégio indevido. Exemplo: identifica-se,
num espetáculo, como agente público para não pagar o ingresso.
O tipo penal prevê expressamente o elemento subjetivo, que consiste no fim de eximir de obrigação
legal ou de obter vantagem ou privilégio indevido.

Indisponibilidade indevida de ativos financeiros

Dispõe o art. 36:


“Decretar, em processo judicial, a indisponibilidade de ativos financeiros em quantia que extrapole
exacerbadamente o valor estimado para a satisfação da dívida da parte e, ante a demonstração, pela parte,
da excessividade da medida, deixar de corrigi-la:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa”.
O tipo penal em análise tem como sujeito ativo o juiz, pois se refere a processo judicial. Não há, pois, o
delito nos arrolamentos de ativos financeiros decretados pela fiscalização tributária.
Trata-se de crime de conduta mista, pois inicia-se com uma ação, mas se consuma com a omissão.
De fato, o crime tem duas fases:
a) fase da ação, que consiste em decretar a indisponibilidade de ativos financeiros em valor
exacerbadamente acima do débito. Exemplo: em uma execução de dez mil reais, o juiz autoriza a penhora de
cem mil reais. Não há o crime quando o exagero da indisponibilidade não emanou da decisão judicial, mas,
sim, do equívoco no seu cumprimento.
b) fase da omissão, que consiste em deixar de corrigir o referido excesso, devidamente demonstrado
nos autos pela parte. É claro que o juiz, antes de decidir pela correção, poderá remeter os autos ao contador
e dar oportunidade para a parte contrária também se manifestar.
Não basta, para a configuração do crime, que o juiz decrete a indisponibilidade excessiva de ativos
financeiros, pois é ainda necessário que ele deixe de corrigi-la, após o excesso ter sido demonstrado pela parte.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.

Demora no exame de processo

Dispõe o art. 37:


“Demorar demasiada e injustificadamente no exame de processo de que tenha requerido vista em
órgão colegiado, com o intuito de procrastinar seu andamento ou retardar o julgamento:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa”.
O sujeito ativo é o integrante de órgão colegiado incumbido de julgar processo. O órgão colegiado é o
formado por mais de um julgador. Exemplo: Turmas Recursais dos Juizados Especiais e os Tribunais do Poder

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Judiciário. Abrange também os tribunais administrativos, os tribunais de contas e qualquer outro órgão
colegiado incumbido de julgar processos disciplinares ou administrativos, pois o tipo penal se refere a processo
e não apenas aos processos judiciais.
O bem jurídico protegido é a administração da justiça.
O sujeito passivo é o Estado e secundariamente a pessoa prejudicada.
O núcleo do tipo é o verbo demorar, que significa atrasar, procrastinar, retardar. É preciso que se trate
de uma demora demasiada, ou seja, exagerada, muito além do tempo normal para devolução do processo.
No tipo penal em análise, incrimina-se o julgador do órgão colegiado que requereu vista dos autos com
o intuito de procrastinar o andamento do processo ou retardar o julgamento.
De fato, o tipo penal prevê expressamente o elemento subjetivo, que consiste no fim de procrastinar o
julgamento ou o andamento do processo. Não se exige, destarte, o fim específico de prejudicar outrem ou
beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
O elemento normativo do tipo é o termo injustificadamente. Se houver motivo justo para a demora,
não há crime.
O delito se consuma quando flui lapso de tempo suficiente para demonstrar que se trata de uma demora
demasiada.
Quanto à tentativa, não possível, pois, implicitamente, é um crime omissivo próprio, tendo em vista que
a demora consiste no fato de abandonar o processo por tempo exagerado.

Antecipação da atribuição de culpa

Dispõe o art.38:
“Antecipar o responsável pelas investigações, por meio de comunicação, inclusive rede social, atribuição
de culpa, antes de concluídas as apurações e formalizada a acusação:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa”.
O sujeito ativo deste delito é o responsável pelas investigações. Exemplo: Delegado de Polícia, no
inquérito policial. Outro exemplo: presidente de CPI. Mais um exemplo: Promotor de Justiça que preside o
PIC (procedimento investigatório criminal). O tipo penal não exige que se trate de uma investigação penal e,
dessa forma, abrange também as investigações extrapenais. Exemplos: inquérito civil, presidido pelo
Ministério Público, procedimento administrativo fiscal presidido por auditor da receita federal.
O bem jurídico protegido é o princípio da presunção da inocência.
O sujeito passivo é a pessoa a quem se atribuiu a culpa.
O núcleo do tipo é o verbo antecipar, que significa comunicar com antecedência, ou seja, antes do
tempo previsto.
O delito é de forma vinculada, pois só se incrimina a antecipação realizada através de meio de
comunicação.
Os meios de comunicação são os instrumentos utilizados para difundir as informações entre as pessoas.
Exemplo: jornal, revista, televisão, YouTube, etc.
O próprio tipo penal fornece a rede social como exemplo de meio de comunicação.
O telefone, a rigor, também é um meio de comunicação, mas, a meu ver, o tipo penal só abrange os
meios de comunicação de massa, ou seja, capazes de atingirem um grande número de pessoas, com efeito
similar à rede social a que faz menção o tipo penal.
Não se pune, destarte, a antecipação da culpa feita reservadamente a uma determinada pessoa.
A conduta típica consiste em antecipar a atribuição de culpa antes de concluídas as apurações e
formalizada a acusação.
A atribuição de culpa consiste em imputar a autoria da infração penal ou administrativa a determinada
pessoa.
A formalização da acusação ocorre com o oferecimento da peça acusatória. Exemplo: denúncia ou
queixa, em relação à ação penal. Outro exemplo: lavratura do auto de infração, em relação aos procedimentos
administrativos fiscais ou ambientais. Mais um exemplo: portaria nos procedimentos administrativos.
Antes de se formalizar a acusação, é possível que haja a formalização da suspeita. No inquérito policial,

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por exemplo, a suspeita se formaliza com o indiciamento.


Entretanto, após a formalização da suspeita e a conclusão das investigações, ainda não se pode, através
de um meio de comunicação, imputar a culpa a alguém, pois o tipo penal só admite esta atribuição por
antecipação após a formalização da acusação.
É claro que, mesmo diante da formalização da acusação, a atribuição de culpa ao acusado será
antecipada, por força do princípio da presunção da inocência, mas não será incriminada.
É ainda necessário, para a configuração do crime, o fim específico de prejudicar outrem ou beneficiar a
si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, o fim de mero capricho ou satisfação pessoal.
Quanto à consumação, ocorre quando a antecipação da culpa é efetivamente divulgada através de um
meio de comunicação.
Admite-se a tentativa quando a divulgação pelo meio de comunicação não ocorre por circunstâncias
alheias à vontade do agente.

CRIMES DE “LAVAGEM” OU OCULTAÇÃO DE BENS, DIREITOS E VALORES

(LEI 9.613/98)

INTRODUÇÃO

A lei 9.613/98, conhecida popularmente como “lei de lavagem de dinheiro”, além de definir os referidos
crimes, também prevê displavagemosições processuais e efeitos da condenação, tendo ainda criado o
Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), órgão vinculado ao Ministério da Fazenda com a
finalidade de disciplinar, aplicar penalidades administrativas e identificar as ocorrências suspeitas de
atividades ilícitas previstas nesta lei, sem prejuízo da competência de outros órgãos e entidades. O COAF tem,
pois, a missão de baixar instruções às atividades arroladas no art. 9º desta lei, que geralmente servem de
ponte para a consumação do crime de lavagem de dinheiro. Exemplos: pessoas físicas ou jurídicas que
comercializam joias ou pedras preciosas, compra e venda de imóveis, empresas de “factoring”, bolsa de
valores, etc.

CRIMES DE LAVAGEM OU OCULTAÇÃO DE BENS DIREITOS E VALORES

O delito, basicamente, consiste em ocultar ou dissimular os bens, direitos ou valores provenientes de


infração penal.
Trata-se de crime acessório, pois pressupõe a existência de uma infração penal anterior, que tanto pode
ser um crime quanto uma contravenção penal. Esta ampliação, para abranger também as contravenções, foi
propiciada pelo advento de lei 12.683/2.012, que, na definição do crime do art. 1º da lei em estudo, passou a
referir-se a bens, direitos e valores provenientes de infração penal, expressão que abarca também as
contravenções.
Na doutrina, as leis de lavagem de dinheiro classificam-se em:
a) leis de primeira geração: são as que consideram como crime anterior apenas o tráfico ilícito de drogas.
Este foi o perfil das primeiras leis que, no direito alienígena, trataram do assunto.
b) leis de segunda geração: são que apresentam o rol taxativo dos crimes anteriores. Até antes da Lei
12.683/2.012, era o sistema adotado no Brasil.
c) leis de terceira geração: são as que consideram como pressuposto do crime qualquer infração penal,
abrangendo até mesmo as contravenções penais. É, pois, o sistema atual, adotado no Brasil, EUA e na maioria
dos países europeus.
Sendo a lavagem de dinheiro um crime acessório, sujeita-se aos ditames do art. 108 do CP, segundo o
qual a extinção da punibilidade do crime principal não se estende ao acessório. Assim, por exemplo, prescrito
o crime anterior ou morto o seu autor, ainda assim persiste o crime de lavagem de dinheiro. Igualmente, ainda
que o autor do crime anterior seja desconhecido ou isento pena, isto é, menor ou doente mental, mesmo
assim subsiste o crime de lavagem de dinheiro (§1º do art. 2º).

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Nos referidos delitos, ao contrário de outros crimes acessórios, não se exige que o autor do crime
anterior seja pessoa diversa daquela que pratica a lavagem de dinheiro. Adota-se, destarte, o sistema da
superproteção dos bens jurídicos, porquanto o delito pode ser praticado pelo próprio autor do crime anterior.
O extorsionário que, por exemplo, investe o dinheiro da chantagem em postos de gasolina, responde em
concurso material pelos dois crimes, extorsão e lavagem de dinheiro.
Sobre as espécies criminosas, dispõe o art. 1º da Lei 9.613/98:
“Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de
bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime:
Pena: reclusão de três a dez anos e multa”.
Os núcleos do tipo são ocultar e dissimular.
Ocultar, na referida lei, é esconder através de algum negócio jurídico, pois simplesmente esconder é
mero delito de receptação.
Dissimular, por sua vez, é encobrir, disfarçar, dar uma ideia falsa.
A ocultação ou dissimulação deve recair sobre um dos seguintes aspectos:
a) a natureza dos bens, direitos ou valores. É a sua transformação em espécie diversa. Exemplo: utiliza
o dinheiro do crime para comprar um veículo.
b) a sua localização. É a mudança do local.
c) a sua disposição. É a alienação ou oneração do bem. Exemplo: aliena o carro roubado. Outro exemplo:
dá em penhor a joia furtada.
d) a sua movimentação. Exemplo: transferência do dinheiro criminoso de um banco para outro.
e) a sua propriedade. É o fato de o criminoso colocar o produto do crime em nome de “laranja” ou “testa
de ferro”.
O objeto material do crime são os bens, direitos ou valores, provenientes, direta ou indiretamente, da
infração penal. A expressão valores abrange, além do dinheiro, os títulos ou documentos representativos de
dinheiro. Bens, aqui, são as coisas corpóreas; direitos, são os bens incorpóreos.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo direto ou eventual.
Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, inclusive, os autores, coautores e partícipes da infração penal
anterior.
A consumação ocorre com a ocultação ou dissimulação que recai sobre um dos seis aspectos
mencionados.
Quando à tentativa, é possível.
O §1º do art. 1º ainda dispõe que “incorre na mesma pena quem, para ocultar ou dissimular a utilização
de bens, direitos ou valores provenientes de infração penal:
I - os converte em ativos lícitos. Exemplo: aplicação financeira do dinheiro oriundo da contravenção de
jogo do bicho;
II - os adquire, recebe, troca, negocia, dá ou recebe em garantia, guarda, tem em depósito, movimenta
ou transfere. Esta hipótese consagra a chamada teoria da cegueira deliberada ou teoria do avestruz ou das
instruções do avestruz, oriunda do EUA, segundo a qual aquele que, na realização de um negócio suspeito,
não procura indagar a procedência dos bens, direitos ou valores, incide em dolo eventual, porque assume o
risco de estar contribuindo para a lavagem do dinheiro criminoso. O dono de uma concessionária de veículos
que, sem tomar as cautelas devidas, vende diversos carros a uma pessoa que se propõe a pagar em dinheiro
“vivo”, oriundo de crime, incide também no delito de lavagem de dinheiro.
III - importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos verdadeiros.

Outras condutas criminosas ainda são previstas no §2º do art. 1º. Com efeito, incorre, ainda, na mesma
pena quem:
I - utiliza, na atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou valores provenientes de infração
penal. Exemplo: empresário que utiliza em seus negócios o dinheiro criminoso;
II - participa de grupo, associação ou escritório tendo conhecimento de que sua atividade principal ou
secundária é dirigida à prática de crimes previstos nesta Lei. Este delito só é punível se houver dolo direto, isto

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é, a certeza que uma das atividades do escritório, ainda que secundária, destina-se ao crime de lavagem de
dinheiro. Se o agente tem dúvida, dolo eventual, não responde pelo crime.

CAUSAS DE AUMENTO DE PENA

Dispõe o §4º do art. 1º:


A pena será aumentada de um a dois terços, se os crimes definidos nesta Lei forem cometidos de forma
reiterada ou por intermédio de organização criminosa.
São duas as causas de aumento de pena:
a) reiteração criminosa. Exige-se, a meu ver, a prática de três ou mais delitos dessa espécie.
b) organização criminosa. Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais
pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com
objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações
penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.
Quanto ao crime de organização criminosa, será absorvido, pois já funciona como causa de aumento de pena,
aplica-se, destarte, o princípio da subsidiariedade tácita.

DELAÇÃO PREMIADA

Dispõe o §5º do art. 1º:


“A pena poderá ser reduzida de um a dois terços e ser cumprida em regime aberto ou semiaberto,
facultando-se ao juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la, a qualquer tempo, por pena restritiva de direitos, se o
autor, coautor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que
conduzam à apuração das infrações penais, à identificação dos autores, coautores e partícipes, ou à localização
dos bens, direitos ou valores objeto do crime”.
Trata-se da delação ou colaboração premiada que, para surtir efeito, exige os seguintes requisitos:
a) delação espontânea: é a colaboração por vontade própria, sem qualquer coação ou pressão
psicológica.
b) delação eficaz: é a que produz a apuração das infrações penais ou identificação dos demais agentes
ou então a localização dos bens, direitos e valores objetos do crime.
Os benefícios que o juiz poderá aplicar ao delator são:
a) redução da pena de um a dois terços;
b) imposição do regime aberto ou semiaberto, isto é, exclusão do regime fechado;
c) substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos;
d) perdão judicial, isto é, o juiz deixa de aplicar a pena.
Nada obsta que o juiz conceda simultaneamente a redução da pena, o regime aberto e ainda a
substituição da pena por restritiva de direitos.
Quanto ao momento da delação, pode ser feita a qualquer tempo, inclusive, após o trânsito em julgado
da condenação, pois a lei não fixa limite temporal.

LIBERDADE PROVISÓRIA E FIANÇA

A liberdade provisória é possível a todos os crimes. A fiança também, salvo os crimes hediondos,
terrorismo, tortura e tráfico de drogas.
Portanto, esses dois benefícios são cabíveis nos crimes de lavagem de dinheiro.

DISTINÇÃO ENTRE LAVAGEM DE DINHEIRO E RECEPTAÇÃO

Ambos são crimes acessórios. O receptador simplesmente adquire, recebe, oculta, transporta ou conduz
o produto crime, sem procurar conferir-lhe uma aparência lícita, ao passo que, no crime de lavagem de
dinheiro, o agente realiza a ocultação ou dissimulação que confere uma imagem lícita ao produto criminoso.

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Quem, por exemplo, simplesmente esconde o dinheiro roubado pratica o crime de receptação. Se, no entanto,
aplica este dinheiro na caderneta de poupança ou compra um carro, incide nas penas do crime de lavagem de
dinheiro.
Acrescente-se ainda que o coautor ou partícipe de crime anterior não responde por receptação, mas
pode incidir no delito de lavagem de dinheiro.
Por fim, a receptação, em regra, só admite o dolo direto, ao passo que na lavagem de dinheiro também
é punível o dolo eventual.

COMPETÊNCIA

Em regra, competência é da Justiça Estadual.


Será, no entanto, da competência da Justiça Federal:
I – quando praticados contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira, ou em detrimento
de bens, serviços ou interesses da União, ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas;
II – quando a infração penal antecedente for de competência da Justiça Federal.

CITAÇÃO POR EDITAL

O acusado que não comparece nem constitui advogado, estando, portanto, em lugar incerto e não
sabido, será citado por edital, prosseguindo-se o feito até o julgamento, com a nomeação de defensor dativo
(§2º do art. 2º). Não há, pois, a suspensão do processo pelo fato de ser citado por edital. Trata-se de exceção
à regra do art. 366 do CPP.

MEDIDAS ASSECURATÓRIAS SOBRE BENS, DIREITOS E VALORES

Poderão ser decretadas medidas assecuratórias sobre bens, direitos ou valores para reparação do dano
decorrente da infração penal antecedente ou da prevista nesta Lei ou para pagamento de prestação
pecuniária, multa e custas.
A constrição de bens consiste em sua apreensão por ordem judicial ou na proibição de alienação quando
se tratar de imóveis.
Em havendo indícios suficientes de infração penal, o juiz pode decretar essa medida de ofício ou a
requerimento do Ministério Público ou ainda mediante representação do Delegado de Polícia, ainda que os
bens estejam no nome de interposta pessoa.
Com a decretação dessa medida, a lei impõe a inversão do ônus da prova para presumir a ilicitude da
origem desses bens. Por consequências, o juiz só determinará a liberação dos bens se o réu comprovar a
origem lícita. E, ainda assim, o juiz manterá a constrição de uma parte desses bens, direitos e valores
necessários para reparação do dano e pagamento de prestação pecuniária, multas e custas decorrentes de
infração penal.
Acrescente-se, contudo, que nenhum pedido de liberação será conhecido sem o comparecimento
pessoal do réu ou da pessoa em nome de quem os bens se encontravam.
Quando as circunstâncias o aconselharem, o juiz, ouvido o Ministério Público, nomeará pessoa física ou
jurídica qualificada para a administração dos bens, direitos ou valores sujeitos a medidas assecuratórias,
mediante termo de compromisso (art.5º). Esta pessoa “fará jus a uma remuneração, fixada pelo juiz, que será
satisfeita com o produto dos bens objeto da administração” (art.6º, I).

ALIENAÇÃO ANTECIPADA DE BENS

Em duas hipóteses, o juiz, de ofício, determinará a venda antecipada dos bens:


a) bens sujeitos a riscos, em qualquer grau, de deterioração ou depreciação,
b) quando houver dificuldade para sua manutenção.

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A alienação antecipada para preservação de valor de bens sob constrição será decretada pelo juiz, de
ofício, a requerimento do Ministério Público ou por solicitação da parte interessada, mediante petição
autônoma, que será autuada em apartado e cujos autos terão tramitação em separado em relação ao processo
principal (art.4º-A).
O juiz determinará a avaliação dos bens, nos autos apartados, e intimará o Ministério Público (§2º do
art.4º-A).
A alienação será em leilão ou pregão, preferencialmente eletrônico, por valor não inferior a 75%
(setenta e cinco por cento) da avaliação.
O dinheiro obtido com a venda será depositado em conta judicial e, após o trânsito em julgado da
condenação, será destinado à União, nos processos de competência da Justiça Federal e da Justiça do Distrito
Federal, e, ao Estado-Membro, respectivo, nos processos de competência da Justiça Estadual.
Em caso de sentença absolutória ou extintiva da punibilidade, será colocado à disposição do réu pela
própria instituição financeira.
Eventuais recursos contra a alienação antecipada de bens não terão efeito suspensivo (art. 4º-A, §9º)

EFEITOS DA CONDENAÇÃO

O art. 7º prevê dois efeitos da condenação:


a) confisco: é a perda, em favor de União ou dos Estados, conforme a competência, de todos os bens,
direitos e valores relacionados, direta ou indiretamente, à prática dos crimes de lavagem de dinheiro, inclusive
aqueles utilizados para prestar fiança. Se, no entanto, o bem pertencer a terceiro de boa-fé, não haverá o
confisco, pois os direitos desse terceiro são ressalvados pela lei.
b) interdição do exercício de cargo ou função pública, de qualquer natureza. Outrossim, do exercício
das atividades de direção, membro do Conselho de Administração ou gerência das pessoas jurídicas referidas
no art. 9º. Em ambas as hipóteses, a interdição é pelo dobro do tempo de pena aplicada. Não se trata da perda
do cargo, função ou atividade e, sim, de suspensão temporária.
Estes dois efeitos são automáticos, independem de menção expressa na sentença.

ACESSO A DADOS CADASTRAIS DO INVESTIGADO

O acesso a dados cadastrais do investigado pode ser requisitado diretamente pela autoridade policial
ou Ministério Público, independentemente de autorização judicial, desde que se trate de informações sobre
qualificação pessoal, filiação e endereço mantidos pela Justiça Eleitoral, pelas empresas telefônicas, pelas
instituições financeiras, pelos provedores de internet e pelos administradores de cartão de crédito (art. 17-B).
Na lei 11.850/2.013, que trata das organizações criminosas, ainda é possível à autoridade policial e
Ministério Público o acesso, junto às empresas de transporte aos bancos de dados de reservas e de registros
de passagens bem como requisitar das concessionárias de telefonia os registros da identificação das ligações
feitas ou recebidas pelo investigado.

AFASTAMENTO PROVISÓRIO DO SERVIÇO PÚBLICO

Em caso de indiciamento de servidor público, este será afastado, sem prejuízo de remuneração e demais
direitos previstos em lei, até que o juiz competente autorize, em decisão fundamentada, o seu retorno.
Trata-se, como se vê, de um efeito automático do indiciamento que só será cancelado mediante decisão
judicial.

BENS, DIREITOS E VALORES ORIUNDOS DE CRIMES PRATICADOS NO ESTRANGEIRO

Mediante carta rogatória, o juiz brasileiro poderá determinar constrição dos bens, direitos e valores
oriundos de crimes praticados no estrangeiro, outrossim, a alienação antecipada. Se houver tratado entre o

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Brasil e este país, a divisão desses bens será feita nos moldes previsto no referido tratado. Se, ao revés, não
houver qualquer tratado, metade pertencerá ao Brasil e a outra metade do Estado requerente. Sem o tratado,
o Brasil só cumprirá essa carta rogatória de constrição dos bens mediante compromisso de reciprocidade do
outro país.

INFILTRAÇÃO DE AGENTES E AÇÃO CONTROLADA

Todos os delitos de lavagem, previstos na lei 9613/98, conforme §6º do art. 1º, introduzido pela lei
13.964/2019, admitem a utilização de dois meios probatórios:
a) ação controlada;
b) a infiltração de agentes.
A ação controlada ou flagrante diferido consiste em retardar a prisão em flagrante ou a apreensão de
bens para outro momento mais eficaz à formação de provas e obtenção de informações.
Infiltração é o fato de o agente policial ingressar no ambiente dos criminosos, de forma disfarçada,
fingindo que é um de seus membros.
A lei 9613/96 não prevê os requisitos para que haja a ação controlada e a infiltração de agentes. Diante
disso, comporta duas interpretações. Primeira, aplica-se por analogia o procedimento previsto para estas
medidas nas leis 12.850/2012 e 11.343/2006, respectivamente, que cuidam da organização criminosa e dos
crimes de drogas. Segunda, os referidos meios de provas são inaplicáveis aos delitos da lei 9613/96, pois as
normas restritivas de direitos não admitem analogia.

INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA

CONCEITO

Interceptação telefônica é a captação da conversa realizada por telefone, sem o conhecimento dos
interlocutores.
De acordo com o art. 5, XII, da CF só é possível, por ordem do juiz criminal competente, para os fins de:
a) investigação criminal;
b) instrução processual penal.
A proteção constitucional consiste, pois, na necessidade de a quebra do sigilo das comunicações
telefônicas ocorrer mediante decisão do juiz criminal competente.

FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL

Dispõe o art. 5º, XII, da CF que “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas,
de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma
que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”.
Quanto ao sigilo das correspondências e das comunicações telegráficas, de dados, o dispositivo acima
é omisso, mas a sua quebra também é possível, mediante decisão judicial fundamentada em razões de
relevante interesse público, porquanto nenhum direito é absoluto.
A interceptação telefônica só é cabível, mediante decisão do juiz criminal competente, ao passo que os
demais sigilos podem ser quebrados por decisão de juiz criminal, cível, trabalhista e das demais áreas do
Direito.
O fato de o art. 5º, XII, da CF ter previsto a quebra do sigilo apenas em relação à interceptação telefônica
estimulou a interpretação de que os demais sigilos seriam absolutos, raciocínio que não se sustenta, pois
nenhum direito é absoluto, só podendo ser invocado à vista de uma finalidade ética.
Ademais, a razão da menção expressa foi exigir decisão do juiz criminal para se quebrar o sigilo das
comunicações telefônicas e não para se vedar, em termos absolutos, o sigilo das demais comunicações, que
podem ser quebrados por decisão de qualquer juiz e não apenas do juiz criminal.

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FUNDAMENTO LEGAL

O assunto é regulado pela Lei 9.296/96.

GRAVAÇÃO E ESCUTA TELEFÔNICA

Gravação telefônica ou gravação clandestina é o registro de conversa por um dos interlocutores, sem o
conhecimento do outro.
Escuta telefônica ou escuta clandestina é a captação de conversa por um terceiro, mas com a
autorização de um dos interlocutores.
Consoante jurisprudência do STJ e do STF, tanto a gravação quanto a escuta telefônica são meios lícitos
de prova, que dispensam ordem judicial, porquanto não são proibidas pela Constituição nem pela Lei
9.296/96.
É, como se vê, reconhecido pela jurisprudência o direito de gravar a própria conversa.

COMUNICAÇÕES EQUIPARADAS À TELEFÔNICA

A interceptação telefônica, que exige ordem de juiz criminal, abrange as comunicações telefônicas de
qualquer natureza, compreendendo tanto o telefone fixo quanto o móvel (celular), inclusive, o que funciona
com fibras ópticas.
A Lei 9.296/96, entretanto, equiparou à telefônica as comunicações em sistemas de informática ou
telemática, condicionando a interceptação à exigência de decisão do juiz criminal competente.
A informática é a ciência que regula a comunicação através do computador, softwares, sistemas de
rede, etc. Exemplo: comunicação por e-mails.
A telemática é a comunicação que se faz pela junção dos serviços de telefonia com os de
Informática. Exemplos: Skype, WhatsApp, etc.
A propósito, dispõe o parágrafo único do art. 1º:
“O disposto nesta Lei aplica-se à interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e
telemática”.
Não há qualquer inconstitucionalidade, malgrado a opinião contrária do festejado Vicente Greco Filho,
pois a equiparação, em vez de reduzir, ampliou a proteção, à medida que a interceptação em sistemas de
informática ou telemática dependerá também de decisão do juiz criminal competente.
Não fosse a aludida equiparação legal, as referidas interceptações poderiam ser ordenadas por juiz
extrapenal.

DISPENSA DE DECISÃO JUDICIAL

Em duas situações, a interceptação poderá ser realizada sem a necessidade de ordem judicial. São elas:
a) salas de bate-papo da internet ou chats, pois se trata de ambiente público.
b) e-mails corporativos, que são os disponibilizados pela empresa aos empregados para assuntos
exclusivamente profissionais. Nesse caso, o empregador tem o direito de monitorar o uso destes e-mails e
utilizá-los como meios de prova para demissão por justa causa.

APREENSÃO DE CELULAR

O telefone celular, caso contenha as informações necessárias à elucidação do crime, pode ser
apreendido pela autoridade policial, sem necessidade de ordem judicial.
Entretanto, a jurisprudência do STJ e STF salientava que o acesso ao conteúdo das informações
armazenadas no celular, em WhatsApp, SMS e outros recursos tecnológicos, dependiam de ordem judicial,
sob pena de a prova ser considerada ilícita.
Assim, o acesso às comunicações contidas no celular apreendido equiparava-se às interceptações de e-

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mails e, por isso, era necessária a autorização judicial, com o escopo de se resguardar o direito à intimidade.
Operou-se, porém, a mudança da jurisprudência pelo Plenário do STF, no ARE 1042075, de 30/10/2020,
onde se firmou o seguinte entendimento:
"É lícita a prova obtida pela autoridade policial, sem autorização judicial, mediante acesso a registro
telefônico ou a agenda de contatos de celular apreendido ato contínuo no local do crime atribuído ao acusado,
não configurando esse acesso ofensa ao sigilo das comunicações à intimidade ou a privacidade do indivíduo
(CF, art. 5º, incisos X e XII)."

DISTINÇÃO ENTRE INTERCEPTAÇÃO E SIGILO DE DADOS

A interceptação, a rigor, se refere ao conteúdo de uma comunicação em andamento, realizada por


telefone, computador ou meios telemáticos.
A jurisprudência, porém, também exige ordem judicial para se ter acesso ao conteúdo destas
comunicações, quando elas estiverem concluídas.
O sigilo de dados, por sua vez, se refere às informações que não recaem sobre o conteúdo das
comunicações. Exemplos: o horário da ligação, a duração da chamada, os números dos telefones, o IP do
computador e a titularidade do computador.
O sigilo, cuja quebra depende de ordem judicial, estando, pois, sob reserva de jurisdição, é o das
comunicações de dados, nos termos do art. 5º, XII, da CF, e não dos dados em si mesmos.
Por consequência, a lei pode autorizar outras autoridades públicas a terem acesso aos dados acima
mencionados, mediante decisão fundamentada, pois a matéria não se encontra sob reserva de jurisdição.
Assim, os dados telefônicos, telemáticos e de computador podem ser quebrados:
a) por Comissão Parlamentar de Inquérito (art. 58, §3º, da CF);
b) pelo Ministério Público (art. 129, VI, da CF);
c) pela autoridade policial (art. 13-A do CPP).
Frise-se, porém, que tanto a interceptação quanto o acesso ao conteúdo da comunicação dependem de
ordem judicial.

FINALIDADE

A interceptação telefônica tem a finalidade de obter elementos probatórios para instruir a


investigação criminal ou o processo penal.
A investigação criminal abrange a que se desenvolve no curso do inquérito policial ou de outros
procedimentos destinados à apuração da materialidade e autoria de crime.
Não é, porém, cabível a interceptação telefônica para instruir processos cíveis, trabalhistas e
administrativos.

PROVA EMPRESTADA

A Lei 9.296/96 é omissa sobre a utilização da interceptação telefônica, que é colhida na área penal, em
outros tipos de processos.
O STF tem admitido que, em processos administrativos envolvendo o mesmo fato delituoso, a prova
obtida na área penal, por ordem do juiz criminal, sirva também de fundamento para o julgamento
administrativo, pois, nesse caso, o interesse público revela-se evidente. Proíbe-se, no entanto, a sua utilização
para fins particulares, isto é, em ações cíveis ou trabalhistas.
Não se pode, por exemplo, fazer uso desse meio de prova para, em ação de indenização movida pelo
marido, se comprovar o adultério da mulher.

LEGITIMIDADE ATIVA

Dispõe o art. 3°:

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“A interceptação das comunicações telefônicas poderá ser determinada pelo juiz, de ofício ou a
requerimento:
I - da autoridade policial, na investigação criminal;
II - do representante do Ministério Público, na investigação criminal e na instrução processual penal”.
O dispositivo em análise autoriza o juiz a decretar, de ofício, a interceptação telefônica.
Na fase das investigações, porém, há um consenso na doutrina acerca da vedação de o magistrado agir
de ofício, sob pena de violação do sistema acusatório e do princípio da imparcialidade.
Na fase processual, o princípio da busca da verdade real o autoriza a proceder de ofício, mas ainda assim
o assunto é polêmico, pois uma parcela da doutrina sustenta que a interceptação telefônica, assim como
qualquer outra prova, ordenada de ofício pelo juiz, mesmo na fase judicial, atenta contra o sistema acusatório
e o princípio da imparcialidade.
Há uma tendência muito forte em se proibir o juiz de decretar de ofício as medidas cautelares.
O §2o do art. 282 do CPP, com redação dada pela Lei 13.964/2019, veda que o magistrado decrete de
ofício a prisão preventiva ou qualquer outra medida cautelar pessoal, por consequência, em função da
argumentação lógica “a fortiori”, também não poderia decretar de ofício a interceptação telefônica, estando,
pois, nesse aspecto, revogado o art. 3° da Lei 9.296/96.
No tocante à autoridade policial, poderá ela requerer ao juiz a interceptação telefônica, mas somente
na fase das investigações.
O requerimento de interceptação telefônica também pode ser formulado pelo Ministério Público, tanto
na fase das investigações quanto na fase processual.
Aliás, nas investigações criminais presididas pelo próprio Ministério Público, também lhe será lícito
requerer ao juiz a interceptação telefônica.
No concernente à vítima, não tem legitimidade para requerer a interceptação telefônica, quer tenha ou
não se habilitado como assistente de acusação, pois o dispositivo acima é omisso, sendo vedada a
analogia, por se tratar de norma restritiva de direitos.
Ressalve-se, porém, que, em relação aos delitos de ação penal privada, malgrado o silêncio da lei, a
doutrina dominante tem admitido o requerimento da vítima, com base na analogia.
Outra corrente, porém, acertadamente, lhe nega a legitimidade mesmo nos crimes de ação penal
privada, diante da proibição da analogia em normas restritivas de direito, nesse caso, a vítima teria que
solicitar à autoridade policial ou ao Ministério Público para formular o requerimento ao juiz.
A lei também não atribuiu legitimidade ao réu , mas, com base nos princípios da ampla defesa e
proporcionalidade, uma parcela da doutrina responde afirmativamente e, nesse caso, com vistas a obter a
prova de sua inocência, a interceptação, para aqueles que a admitem, poderia recair até sobre o telefone da
própria vítima.
Este posicionamento, porém, revela-se minoritário, pois não se pode fazer analogia em normas
restritivas de direito, de tal sorte que o acusado não desfruta de legitimidade para pleitear a interceptação
telefônica.

INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA EM ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA

As conversas entre o advogado e o cliente, porventura captadas durante a interceptação telefônica,


constituem provas ilícitas, pois atentam contra o princípio da ampla defesa e ao livre exercício da advocacia,
além de afrontar o sigilo profissional, cujo resguardo é protegido pela Constituição Federal.
É, entretanto, possível que o juiz autorize a interceptação na linha telefônica do advogado do réu,
quando ele estiver também envolvido na prática criminosa, pois a proteção do sigilo profissional não é
absoluta.
Ademais, o envolvimento na prática criminosa não constitui ato de exercício da advocacia e, dessa
forma, a inviolabilidade de seu escritório ou do local de trabalho deixam de ter a proteção prevista no art. 7º,
II, da Lei 8.906/94.

VEDAÇÃO DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA

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Dispõe o art. 2°:


“Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer das
seguintes hipóteses:
I - não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal;
II - a prova puder ser feita por outros meios disponíveis;
III - o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção.

REQUISITOS DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA

Os requisitos da interceptação telefônica são os seguintes:


a) indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal.
Trata-se do “fumus comissi delicti”, que é a aparência da ocorrência do fato criminoso, requisito
indispensável para a decretação da interceptação telefônica.
Os indícios significam a probabilidade da autoria ou participação, extraída com base nos elementos
probatórios constantes dos autos do inquérito ou do processo.
Não se pode, destarte, utilizar a interceptação telefônica para se colher estes indícios.

b) que não haja outros meios disponíveis para a obtenção da prova.


Este requisito é o “periculum in mora”, que é necessário à concessão de medidas cautelares.
Com efeito, tendo em vista que não há outros meios disponíveis para a obtenção da prova, significa que
a demora para se deferir a interceptação telefônica poderá comprometer o conjunto probatório.
Entretanto, desde que seja possível se comprovar os fatos por documentos, testemunhas, perícia, ou
outros meios, veda-se a interceptação telefônica, que tem, pois, caráter excepcional e subsidiário.

c) crime punido com reclusão.


Não se admite a interceptação telefônica em relação às contravenções penais nem nos crimes punidos
com detenção.
De acordo com o STJ e STF, porém, uma vez autorizada a interceptação telefônica em crime de reclusão,
a prova será também válida para os crimes conexos punidos com detenção.
Atente-se, porém, que a interceptação telefônica não pode ser autorizada em crimes de detenção, ainda
que conexo com crime de reclusão, devendo recair exclusivamente sobre crimes de reclusão.
A interceptação telefônica é possível para qualquer crime punível com reclusão, independentemente
da quantidade da pena, pois a lei se absteve de apresentar um rol específico.
Nos crimes contra a ordem tributária, o STJ só admite a interceptação telefônica após o
encerramento do procedimento administrativo fiscal, que apura a existência do débito, pois, antes disso, ainda
não há falar-se em crime, em face da ausência do lançamento definitivo do crédito.

d) descrição com clareza da situação objeto da investigação.


Com efeito, dispõe o parágrafo único deste art. 2° :
“Em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da investigação, inclusive com a
indicação e qualificação dos investigados, salvo impossibilidade manifesta, devidamente justificada”.
É, pois, necessário que a decisão judicial descreva o fato criminoso e delimite o objeto da investigação.
Não é, pois, cabível a interceptação telefônica para se apurar fatos indeterminados, sendo, pois, vedado
o “fishing expedition”, que é a pescaria de provas via mandados genéricos.

e) qualificação dos investigados, salvo impossibilidade manifesta, devidamente justificada.

f) individualização da linha telefônica que será interceptada.


Se a linha telefônica não pertence ao criminoso, mas ele a utiliza, será cabível a interceptação telefônica,
inclusive, em linhas de telefones públicos.

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Os executores da ordem judicial não podem ampliar a interceptação para outras linhas telefônicas não
abrangidas pela decisão judicial e se o fizerem a prova será ilícita e eles ainda responderão pelo delito do art.
10 da Lei 9.296/96.

PROCEDIMENTO

O procedimento de interceptação telefônica, que tramita em segredo de justiça, envolve os seguintes


atos:
a) requerimento;
b) manifestação do Ministério Público, quando não for ele o requerente;
c) decisão do juiz;
d) execução da diligência;
e) possibilidade de prorrogação da diligência;
f) autuação em autos apartados;
g) apensamento aos autos principais.

Requerimento

A peça inicial do procedimento de interceptação telefônica pode ser:


a) o requerimento da autoridade policial ou do Ministério Público;
b) a portaria do juiz, quando este agir de ofício, mas o poder de o magistrado agir de ofício, conforme
já visto, não é pacífico.
O pedido de interceptação de comunicação telefônica conterá a demonstração de que a sua realização
é necessária à apuração de infração penal, com indicação dos meios a serem empregados (art. 4º).
Excepcionalmente, o juiz poderá admitir que o pedido seja formulado verbalmente, desde que estejam
presentes os pressupostos que autorizem a interceptação, caso em que a concessão será condicionada à sua
redução a termo (§1º do art. 4º).
O juiz, no prazo máximo de vinte e quatro horas, decidirá sobre o pedido (§2º do art. 4º).
Manifestação do Ministério Público

Na fase das investigações, conforme já dito, o pedido de interceptação telefônica pode ser formulado
tanto pela autoridade policial quanto pelo Ministério Público.
Nos casos em que o requerimento emana da autoridade policial, a lei é silente sobre a oitiva do
Ministério Público.
A doutrina, entretanto, sustenta que é obrigatória, além da sua manifestação, a concordância com o
pedido, por ser ele o destinatário das investigações policiais e o titular da ação penal pública.
Na hipótese de o procedimento ser desencadeado de ofício pelo juiz, malgrado o silêncio da lei, será
também necessária a manifestação do representante do “parquet”.

Decisão do juiz competente

A interceptação telefônica só pode ser ordenada pelo juiz criminal competente.


Outros magistrados não podem decretá-la e muito menos a autoridade policial e o representante do
Ministério Público.
Quanto ao titular da linha telefônica, que é utilizada por outra pessoa, também não pode realizar a
interceptação telefônica, pois o sigilo sob proteção é o dos interlocutores.
Acrescente-se ainda que o consenso posterior de um ou ambos os interlocutores não tornam a prova
válida, pois a nulidade é absoluta e, portanto, insanável.
Caso a interceptação telefônica tenha sido decretada por juiz criminal incompetente, é preciso distinguir
duas situações:
a) o juiz aparentemente era competente, mas, com base em fatos supervenientes, apurou-se a sua

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incompetência. Exemplo: somente após a interceptação telefônica é que surgiram as provas de que se tratava
de crime de tráfico internacional de drogas, de competência da justiça federal, e não de mero tráfico
interestadual, da alçada da justiça estadual. Nesse caso, invoca-se a teoria do juízo aparente para se considerar
a prova como válida.
b) o juiz criminal, que decretou a interceptação telefônica, desde o início não dispunha de competência.
Nesse caso, a decisão será nula, em face da violação do princípio do juiz natural.
Por outro lado, a decisão judicial que decreta a interceptação telefônica deve ser fundamentada, sob
pena de nulidade, devendo ainda indicar a forma de execução da diligência, que não poderá exceder o prazo
de 15 (quinze) dias, renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova (
art. 5°).
Por fim, a decisão do juiz que defere ou indefere o pedido de interceptação telefônica pode ser
impugnada por mandado de segurança.

EXECUÇÃO DA DILIGÊNCIA

A interceptação telefônica é presidida pelo Delegado de Polícia, que obrigatoriamente dará ciência ao
Ministério Público, que poderá, caso queira, acompanhar a diligência.
Note-se, então, que não é o juiz que presidirá esta diligência.
A ciência ao Ministério Público será dada diretamente pelo Delegado de Polícia, e não pela autoridade
judiciária.
A ciência da diligência ao Ministério Público é obrigatória, sob pena de nulidade relativa, mas o membro
do “parquet” tem a mera faculdade de acompanhá-la ou não.
O delegado de polícia poderá requisitar serviços técnicos especializados às concessionárias de serviço
público, para auxiliá-lo na execução da diligência.
Acrescente-se ainda que, nos crimes militares, a interceptação telefônica será conduzida pela Polícia
Militar.
Nos procedimentos investigatórios presididos pelo Ministério Público, a execução da interceptação
telefônica será coordenada pelo representante do “parquet”.
O STF também já admitiu a condução da interceptação telefônica pelo CISPEN (Coordenadoria de
Inteligência do Sistema Penitenciário).
Outrossim, pela Polícia Rodoviária Federal, com base no art. 1º, X, do Decreto 1.665/1.995, que confere
ao referido órgão a função de auxiliar na prevenção de repressão de determinados delitos.
Por outro lado, não há na lei a obrigatoriedade, mas sim a mera faculdade de a autoridade policial gravar
a comunicação, interceptada.
Se não houver, porém, a gravação, a prova do conteúdo das conversas terá que ser feita pela inquirição,
como testemunhas, dos responsáveis pela execução das diligências.
Caso, entretanto, a conversa seja gravada, deverá ser transcrita.
A jurisprudência é pacífica que, nas gravações muito longas, como as que perduraram por 60 (sessenta)
dias, só há necessidade da transcrição dos trechos importantes.
Quanto à degravação, que é a transcrição das conversas, não precisa ser feita por perito, pois a sua
execução dispensa conhecimentos técnicos.

POSSIBILIDADE DE PRORROGAÇÃO

Dispõe o art. 5° da Lei 9.296/96:


“A decisão será fundamentada, sob pena de nulidade, indicando também a forma de execução da
diligência, que não poderá exceder o prazo de quinze dias, renovável por igual tempo uma vez comprovada a
indispensabilidade do meio de prova”.
Conforme se verifica, a diligência não poderá exceder o prazo de 15 (quinze) dias, a contar do início da
execução da medida e não da decisão judicial que a autorizou.
Nada obsta que o juiz autorize a interceptação telefônica por prazo inferior a 15 (quinze) dias.

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Mediante ordem judicial, o referido art. 5º admite a renovação “por igual tempo”, uma vez comprovada
a indispensabilidade do meio de prova.
Não é preciso, para se formular o pedido de prorrogação, que haja a transcrição da conversa captada
no período anterior, mas é essencial que se demonstre que se trata de uma medida indispensável para a coleta
das provas.
A prorrogação, entretanto, deve ser autorizada antes de findar o prazo inicial.
Caso a interceptação perdure, sem ordem judicial, além do prazo inicial, a prova colhida neste período
descoberto será considerada ilícita, ainda que depois sobrevenha decisão judicial autorizando a prorrogação.
A expressão “igual tempo”, de acordo com o STJ e STF, significa que cada prorrogação será de até 15
(quinze) dias, admitindo-se, no entanto, inúmeras prorrogações, e não apenas uma, pois a lei não impõe
limites ao número de vezes que essa diligência poderá ser prorrogada.
Noutras palavras, tem sido admitido a prorrogação por um número indefinido de vezes, mediante
comprovação de que se trata de uma prova indispensável, o que afronta o princípio da duração razoável.
Há, entretanto, sobre o assunto, outras três correntes:
a) só é possível uma única prorrogação, de tal sorte que o tempo máximo da interceptação telefônica
será de 30 (trinta) dias;
b) o tempo máximo será de 60 (sessenta dias), pois, no estado de sítio, por força do art. 136, §2º, da CF,
a interceptação telefônica não pode perdurar além desse período, por consequência, este também será o
limite temporal no estado de normalidade.
c) é possível inúmeras prorrogações, desde que se respeite o princípio da duração razoável.

AUTUAÇÃO EM AUTOS APARTADOS

A autuação é a documentação do procedimento.


A interceptação de comunicação telefônica, de qualquer natureza, ocorrerá em autos apartados,
preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectivas (art. 8º).
Tanto o pedido quanto a portaria do juiz, quando este agir de ofício, não podem ser formulados no bojo
do inquérito policial ou do processo penal, mas, sim, em autos apartados, onde também se desenvolverá a
execução dessa diligência.
A tramitação em autos apartados visa preservar o sigilo das diligências, gravações e das
respectivas transcrições.
Quanto ao momento da autuação em autos apartados, ocorrerá somente após o cumprimento da
diligência, com vistas a evitar o vazamento.
Com efeito, cumprida a diligência, a autoridade policial encaminhará o resultado da interceptação ao
juiz, acompanhado de auto circunstanciado, que deverá conter o resumo das operações realizadas (art. 6º,
§2º).
Somente após o recebimento desses elementos é que o juiz determinará a sua autuação em autos
apartados, dando ciência ao Ministério Público (§3º do art. 6º).

APENSAMENTO

O apensamento é o fato de se anexar o procedimento incidental aos autos principais.


A autuação ainda não gera o apensamento.
O apensamento, nos termos do parágrafo único do art. 8º, somente será feito nos seguintes momentos:
a) imediatamente antes do relatório do delegado de polícia, quando se tratar de inquérito policial.
Portanto, apenas na fase final do inquérito, quando já estiver tudo pronto para a autoridade policial encerrá-
lo, é que, antes de se relatar o inquérito, será determinado o apensamento;
b) antes da sentença, isto é, da conclusão do processo, quando a prova tiver sido colhida durante o
processo penal;
c) antes da decisão de pronúncia, nos procedimentos da competência do tribunal do júri.
É claro que, antes de prolatar sentença, a defesa deverá ter oportunidade de manifestar-se sobre essa

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prova.
Com efeito, a defesa não é ouvida previamente, pois o pedido tramita em segredo de justiça, de tal
sorte que o contraditório só será instaurado após a conclusão das diligências, quando sobrevier o
apensamento.
E, nessa manifestação, nada obsta que a pessoa, que não reconheceu como sua a voz interceptada,
requeira a perícia de comparação do espectograma das vozes.

SEGREDO DE JUSTIÇA

A interceptação telefônica, conforme já visto, é decidida pelo juiz sem ouvir o indiciado ou acusado, ou
seu defensor, tramitando, pois, em segredo de justiça.
O contraditório será posterior ou diferido.
Após o apensamento, o indiciado ou acusado e respectivo defensor passam a ter acesso aos autos para
o exercício do contraditório posterior ou diferido, mantendo-se, porém, o sigilo para as demais pessoas, com
o intuito de se preservar a intimidade e a vida privada do investigado ou acusado e das pessoas que com ele
se comunicaram.
A violação do aludido sigilo caracteriza delito do art. 10 da Lei 9.296/96.

INCIDENTE DE INUTILIZAÇÃO

A gravação que não interessar à prova será inutilizada por decisão judicial, durante o inquérito, a
instrução processual ou após esta, em virtude de requerimento do Ministério Público ou da parte interessada
(art. 9º).
A inutilização das conversas que não interessar à prova é uma medida salutar para preservação dos
direitos à intimidade e à vida privada.
O requerimento pode ser formulado:
a) pelo Ministério Público;
b) pela parte interessada, que pode ser o investigado, o acusado e o terceiro que tenha também se
comunicado com a pessoa interceptada.
O ato judicial, que defere ou indefere o incidente de inutilização, poderá ser impugnado através do
recurso de apelação, pois se trata de uma decisão com força de definitiva (art. 593, II, do CPP).
A destruição só será possível após a preclusão da aludida decisão judicial.
O incidente de inutilização será assistido pelo Ministério Público, sendo facultada a presença do acusado
ou de seu representante legal (parágrafo único do art. 9º).

CAPTAÇÃO AMBIENTAL

Conceito

Captação ambiental é a gravação ou oitiva das conversas pessoais, bem como a filmagem ou
visualização das pessoas, através de aparelhos que captam os sinais acústicos, ópticos ou eletromagnéticos.
É também denominada de vigilância eletrônica.

Previsão legal

A captação ambiental é disciplinada pelo art. 8º-A da Lei 9.296/96, introduzido pela Lei 13.964/2019,
sendo cabível para todas as infrações penais, cuja pena máxima seja superior a 4 (quatro) anos.
Antes da referida lei, era prevista no art. 3º, II, da Lei 12.850/2013, mas apenas para os crimes de
organização criminosa.

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OBJETO

A captação ambiental tem por objeto a conversa e a imagens das pessoas.


Distingue-se da interceptação telefônica, cujo objeto é a conversa telefônica.
Atualização captação ambiental

ESPÉCIES

A captação ambiental é o gênero que se desdobra em três espécies:


a) interceptação ambiental: é a captação de sons ou imagens, feita por terceiros, sem a prévia
autorização das pessoas que são filmadas ou cujas conversas são monitoradas ou gravadas.
b) escuta ambiental: é a captação de sons ou imagens de duas ou mais pessoas, feita por terceiro,
mediante prévia autorização de uma delas, sem que a outra ou outras tenham conhecimento.
c) gravação ambiental: é a captação de sons ou imagens feita por um dos interlocutores sem o
conhecimento do outro.
Na verdade, a autorização judicial só é exigida para a interceptação ambiental.
Como toda pessoa tem o direito de gravar a própria conversa e de filmar a si mesma, a jurisprudência
considera lícita tanto a escuta ambiental quanto a gravação ambiental.
O §4º do art. 8º-A da Lei 9.296/96, porém, que havia sido vetado pelo Presidente da República, mas
cujo veto acabou sendo derrubado pelo Congresso Nacional, dispõe que:
“A captação ambiental feita por um dos interlocutores sem o prévio conhecimento da autoridade
policial ou do Ministério Público poderá ser utilizada, em matéria de defesa, quando demonstrada a
integridade da gravação”.
O texto legal acima comete dois equívocos.
Primeiro, se refere à captação ambiental realizada sem o “prévio conhecimento da autoridade policial
ou do Ministério Público”, quando o correto seria “sem prévia decisão judicial”.
Segundo, a única modalidade de captação ambiental que exige prévia decisão judicial é a interceptação
ambiental, embora o texto legal não faça qualquer distinção.
Há duas as interpretações possíveis:
a) a captação ambiental, nas suas três modalidades (escuta, gravação e interceptação), não poderá ser
utilizada pelo órgão acusatório, quando realizadas sem ordem judicial. É uma mera interpretação literal, que
se desvencilha da lógica.
b) o dispositivo acima só é aplicável à interceptação ambiental realizada sem ordem judicial, hipótese
em que a prova poderá ser utilizada exclusivamente pela defesa, quando demostrada à integridade da
gravação, o que já é admitido pela jurisprudência do STF e STJ. É a interpretação restritiva, que reduz o alcance
das palavras da lei, para preservar a lógica do ordenamento jurídico.
A primeira exegese viola o direito constitucional de liberdade, já consagrado pela Excelsa Corte, que
atribui à pessoa o direito de gravar as próprias conversas.
Assim, na linha de raciocínio da segunda corrente, no tocante à gravação ambiental e escuta ambiental,
a prova será válida, pois não há necessidade de ordem judicial nem do prévio conhecimento da autoridade
policial ou do Ministério Público.

Direito de reserva

O direito de reserva consiste na proibição de se divulgar o conteúdo das conversas e das imagens das
pessoas.
Se, por um lado, existe o direito de gravar as próprias conversas e de filmar a si próprio, por outro lado,
vigora a proibição de se divulgar o que se gravou ou filmou, com vistas à proteção da intimidade e vida privada
do outro interlocutor.

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Em algumas hipóteses a divulgação de segredo caracteriza crime. Exemplo: divulgar conteúdo de


correspondências fechadas (art. 153 do CP). Outro exemplo: revelar segredo profissional (art. 154 do CP).
Ainda que não haja um crime específico, a divulgação de gravações e filmagens, quando envolve a
intimidade e vida privada alheia, constitui ato ilícito, ensejando a indenização no juízo cível.
Em havendo, porém, justa causa para a sua revelação, por exemplo, instruir uma investigação
criminal, não há falar-se em crime.

MEIOS DE EXECUÇÃO

A captação ambiental pode ser realizada através de três meios:


a) sinais acústicos: são os aparelhos que viabilizam a oitiva ou gravação. Exemplo: gravadores.
b) sinais ópticos: são os aparelhos que possibilitam a visualização ou filmagem. Exemplo: câmeras.
c) sinais eletromagnéticos: são os aparelhos que captam sinais emitidos por rádios transmissores ou por
outros aparelhos eletrônicos de comunicação. Exemplo: rádios.

CAPTAÇÃO AMBIENTAL ENTRE PRESENTES

Ocorre quando o aparelho, que grava ou filma a conversa, ou, então, que permite a sua oitiva ou
visualização, é instalado no próprio local em que se encontram os interlocutores.

CAPTAÇÃO AMBIENTAL ENTRE AUSENTES OU À DISTÂNCIA

Ocorre quando o aparelho que filma ou grava a conversa, ou que possibilita a visualização ou oitiva, é
instalado fora do local em que se encontram os interlocutores e, por isso, exige uma tecnologia mais avançada.

VALIDADE DA PROVA

Da mesma forma que a escuta e a gravação de comunicações telefônicas são provas válidas, que
dispensam a autorização judicial, a escuta e a gravação ambiental também são admitidas pela jurisprudência,
com base no direito de gravar as próprias conversas e de filmar a si mesmo.
Ainda que verse sobre fato sigiloso, a revelação do conteúdo da escuta ou gravação ambiental, para fins
de investigação de uma infração penal, constitui justa causa para violação de segredo.
Quanto à interceptação ambiental, por ser feita sem o conhecimento dos interlocutores, é preciso
distinguir duas situações:
a) interceptação em ambiente público ou privado aberto ao público. Exemplos: ruas, praças, estádio de
futebol, teatros, cinemas. As conversas pessoais nesses locais não são propriamente sigilosas e, por isso, a
Excelsa Corte considera válida a prova obtida através de interceptação ambiental independentemente de
ordem judicial. Exemplo: policial disfarçado, numa praça pública, aproxima-se dos interlocutores e liga o
gravador.
b) interceptação em ambientes privados ou fechados, que não são abertos ao público, como
residências, presídios, ambiente de trabalho, motéis, hotéis, etc. Nesses locais, a interceptação de sons e
imagens somente é possível mediante prévia autorização do juiz criminal competente, aplicando-se o
procedimento das interceptações telefônicas, nos termos do art. 8º-A, § 5º, da lei 9.296/96.
Quanto à prova obtida pelo sujeito que da varanda de sua casa filma o crime praticado no interior da
residência de seu vizinho, o STJ a considerou válida.
De fato, à medida que é lícita a instalação de câmeras na residência para filmar o seu entorno, não há,
destarte, como se negar a validade da aludida prova, sob pena de afronta ao direito de visão.
É, no entanto, ilícita, por invasão da privacidade e da intimidade, a instalação de câmeras para filmar o
que está por detrás das paredes da residência alheia, embora, até o momento, ainda não exista uma tecnologia
avançada a esse ponto.

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TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA

Oriunda dos EUA, a teoria do “fruits of the poisonous tree” (frutos da árvore envenenada), adotada pelo
STF, significa que a prova ilícita gera a nulidade de todas as demais provas que derivaram dela.

INSTALAÇÃO DO APARELHO NA INTERCEPTAÇÃO AMBIENTAL

Na interceptação ambiental, em ambientes privados ou fechados, a instalação do aparelho de gravação


ou filmagem, em domicílio, terá que ocorrer durante o dia, mediante prévia autorização do juiz criminal
competente.
Por força da proteção constitucional conferida ao domicílio, o juiz não pode autorizar a instalação do
aparelho no período noturno.
A propósito, dispõe o §2º do art. 8º-A.
A instalação do dispositivo de captação ambiental poderá ser realizada, quando necessária, por meio
de operação policial disfarçada ou no período noturno, exceto na casa, nos termos do inciso XI do caput do
art. 5º da Constituição Federal.
Quanto à instalação que ocorre fora do âmbito da casa, pode também se verificar no período noturno,
quando necessária.
Acerca da instalação do dispositivo de captação ambiental, por meio de operação policial disfarçada e
no período noturno, segundo o texto legal, só é possível quando necessária, o que pode repercutir sobre dois
aspectos:
a) a instalação por policiais disfarçados e no período noturno têm caráter subsidiário, só podendo ser
realizada quando necessária;
b) necessidade de fundamentação da diligência.
Há, pois, um juízo discricionário da autoridade policial responsável pelo cumprimento da ordem judicial
sobre a conveniência e oportunidade de se valer de policiais disfarçados e de optar pelo período noturno,
devendo expor, porém, a motivação de sua necessidade.
Se a motivação for verdadeira, a questão da necessidade não poderá ser questionada judicialmente,
pois se trata de mérito de ato administrativo.
Se, no entanto, for falsa, será possível invalidá-la judicialmente, invocando-se a teoria dos motivos
determinantes, oriunda do direito administrativo, anulando-se então toda a prova derivada dessa instalação.
A meu ver, porém, é possível, se interpretar a exigência acima mencionada como sendo mera
irregularidade, mantendo-se a prova válida, ainda que não verdadeira a necessidade se valer de policiais
disfarçados ou do período noturno, relegando a questão para a via das sanções disciplinares de âmbito
administrativo “interna coporis”, sem qualquer repercussão processual, pois não há nulidade sem prejuízo.
Por fim, convém frisar que, no período noturno, o aparelho não poderá ser instalado em casa.

FINALIDADE

A interceptação ambiental em ambiente privado só é possível para fins de investigação ou instrução


criminal.
Não é, pois, cabível para se instruir processos cíveis ou trabalhistas.
A interceptação ambiental em ambientes privados, por se tratar de uma medida ainda mais invasiva
que a telefônica, foi a esta nivelada, de tal sorte que só poderá ser ordenada pelo juiz criminal competente.

REQUISITOS

Os requisitos da interceptação ambiental em ambientes privados são os seguintes:


a) que a prova não possa ser feita por outros meios disponíveis e igualmente eficazes.
Desde que seja possível se comprovar os fatos por documentos, testemunhas, perícia, ou outros meios
lícitos de prova, veda-se a interceptação ambiental, que tem, pois, caráter excepcional e subsidiário.

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Caso a prova só possa ser obtida através de interceptação telefônica ou ambiental, poderá ocorrer duas
interpretações.
Primeira, o magistrado poderá autorizar uma ou outra medida, pois ambas se inserem no âmbito do
sigilo, de modo que uma não exerce preferência sobre a outra.
Segunda, o magistrado deverá optar pela interceptação telefônica, que é menos invasiva, à medida que
só quebra o sigilo do investigado ou do réu.
b) que haja elementos probatórios razoáveis de autoria e participação.
Trata-se do “fumus comissi delicti”, que é a aparência da ocorrência do crime.
É, pois, necessário que já exista a probabilidade de autoria, baseada em elementos probatórios
constantes dos autos, pois não se pode utilizar a interceptação ambiental para se colher os indícios de
autoria.
De fato, é vedado o “fishing expedition”, ou seja, a pescaria de provas, numa investigação especulativa,
onde ainda não há indícios razoáveis de autoria.
c) que se trate de infrações criminais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos ou em
infrações penais conexas.
A lei não exige que a pena seja de reclusão, mas deve ser superior a 4 (quatro) anos, ainda que de
detenção.
A rigor, é cabível até para contravenção penal, se a pena de prisão simples for superior a 4 (quatro)
anos, pois a lei utiliza a nomenclatura infrações penais, que é o gênero que abrange os crimes e as
contravenções.
Na interceptação telefônica, por sua vez, não há limites quantitativos em relação à pena que, em
contrapartida, tem que ser de reclusão.
Em infrações conexas à com pena superior a 4 (quatro), a interceptação ambiental ainda pode ser
deferida, ainda que a pena máxima da infração penal conexa seja inferior a este patamar.
A interceptação telefônica, ao revés, jamais poderá ser autorizada para investigar delitos de detenção,
ainda que conexo com crime de reclusão.

LEGITIMIDADE ATIVA

A interceptação ambiental deve ser requerida:


a) pela autoridade policial, na investigação criminal;
b) pelo Ministério Público, na investigação criminal e na instrução processual penal.
O juiz, nem mesmo na fase processual, poderá deferi-la de ofício.
Diversamente, a interceptação telefônica, na fase processual, pode ser concedida de ofício pelo juiz,
mas cresce, entre os processualistas, de forma acertada, o movimento que veda ao magistrado atuar de ofício
em matéria probatória, mesmo na fase judicial, com vistas à preservação do sistema acusatório e do princípio
da imparcialidade.

PRESSUPOSTOS DO PEDIDO

O pedido de interceptação ambiental deverá descrever circunstanciadamente o local e a forma de


instalação do dispositivo de captação ambiental.
A captação ambiental não poderá exceder o prazo de 15 (quinze) dias, renovável por decisão judicial
por iguais períodos, se comprovada a indispensabilidade do meio de prova e quando presente atividade
criminal permanente, habitual ou continuada.
Outrossim, observar os demais requisitos previstos para a interceptação telefônica, já analisados,
conforme §5º do art. 8º-A, que dispõe:
“Aplicam-se subsidiariamente à captação ambiental as regras previstas na legislação específica para a
interceptação telefônica e telemática.”

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PRORROGAÇÃO

A prorrogação da interceptação ambiental, conforme já salientado anteriormente, depende de dois


requisitos cumulativos:
a) que se trate de um meio de prova indispensável;
b) que o delito seja permanente ou continuado ou que haja habitualidade criminosa.
No crime permanente, a conduta se prolonga no tempo.
No crime continuado, o agente pratica mais de um delito da mesma espécie, interligados pelas conexões
do art. 71 do CP. Quanto à habitualidade criminosa, é uma característica do agente, que se dedica à prática de
crimes.
Não se confunde com o crime habitual, que é uma característica do fato criminoso, cuja tipicidade
depende da reiteração de atos a ponto de se demonstrar que é um estilo de vida do agente.
A prorrogação deve ser admitida tanto na atividade criminosa quanto nos crimes habituais, pois, uma
vez caracterizado o delito habitual, a reiteração do seu comportamento também se caracteriza uma atividade
criminosa.

GRAVAÇÃO AMBIENTAL EFETIVADA POR POLICIAIS OU PROGRAMAS DE TELEVISÃO

O indiciado ou suspeito que, em conversa informal com policiais, tem o seu diálogo gravado pela própria
polícia, sofre evidente violação ao seu direito constitucional ao silêncio, do qual não fora informado, e,
portanto, esta gravação é nula.
Será igualmente nula, quando, diante das câmeras de televisão, o sujeito confessa um crime a
jornalistas, sem ser previamente informado do seu direito constitucional de permanecer calado.

INTERCEPTAÇÕES AMBIENTAIS EM ESCRITÓRIOS DE ADVOGADO

Evidente que, sem ordem judicial, a interceptação ambiental será nula em qualquer ambiente privado,
sobretudo, nos escritórios de advocacia, onde são elaboradas as estratégias de defesa.
A interceptação ambiental instalada na residência do investigado, com ordem do juiz criminal
competente, será nula, em relação à captação dos diálogos travados com seu advogado, por força do princípio
da ampla defesa e da proteção ao sigilo profissional.
Será, porém, uma prova válida a oriunda de interceptação ambiental instalada na residência ou
escritório do advogado, com ordem do juiz criminal competente, se o investigado for o próprio advogado,
suspeito de praticar o crime em conluio ou não com o cliente.
Se, contudo, a investigação recair exclusivamente sobre o cliente, a interceptação ambiental realizada
com ordem judicial no escritório do seu advogado será nula, por violação ao direito de defesa e do princípio
do resguardo ao sigilo profissional.

CRIMES DE INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA, TELEMÁTICA, INFORMÁTICA E AMBIENTAL E DE QUEBRA


DE SEGREDO DE JUSTIÇA

Dispõe o art. 10 da lei 9296/96:


“Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática,
promover escuta ambiental ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não
autorizados em lei:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
O parágrafo único do citado artigo acrescenta que:
“Incorre na mesma pena a autoridade judicial que determina a execução de conduta prevista no caput

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deste artigo com objetivo não autorizado em lei.”


São, pois, quatro os crimes previstos no caput e parágrafo único do aludido tipo penal:
a) Interceptação da comunicação telefônica, de informática, telemática ou promoção de escuta
ambiental, sem autorização do juiz competente;
b) Interceptação da comunicação telefônica, de informática, telemática ou promoção de escuta
ambiental, com ordem do juiz competente, mas com objetivo não autorizado em lei;
c) Quebrar segredo de justiça, sem autorização judicial;
d) Quebrar segredo de justiça, mediante autorização judicial, mas com objetivo não autorizado em lei.
Os quatro delitos são comuns, pois podem ser praticados por qualquer pessoa.
O bem jurídico protegido é a administração da justiça, a intimidade e a privacidade.
Os sujeitos passivos são o Estado e as pessoas que tiveram a intimidade e a privacidade lesionadas pela
conduta criminosa.
A ação penal é pública incondicionada.
O primeiro delito consiste na interceptação da comunicação telefônica, de informática, telemática ou
promoção de escuta ambiental, sem autorização do juiz criminal competente.
É o chamado “grampo ilegal”, cuja consumação se opera quando se toma conhecimento da conversa,
ainda que não haja a sua gravação ou divulgação.
No tocante à promoção de escuta ambiental, é preciso tecer algumas considerações.
Com efeito, a escuta ambiental, que é a gravação ou filmagem por uma pessoa autorizada por um dos
interlocutores, é um meio de prova lícito.
Dessa forma, não pode ser incriminada, porquanto toda pessoa tem o direito de gravar e filmar a própria
conversa.
Por consequência, o tipo penal, nesse aspecto, reveste-se de flagrante inconstitucionalidade, pois não
se pode incriminar o exercício de direito.
Ademais, não haveria lógica em se incriminar a escuta ambiental e liberar a escuta telefônica.
É provável que o legislador tenha se equivocado e empregado a expressão “escuta ambiental” como
“interceptação ambiental “, que é a gravação ou filmagem sem autorização dos interlocutores.
Nesse aspecto, teria ocorrido a revogação tácita do art. 10 pelo art. 10-A, ambos previstos na Lei
9.296/96, que também incrimina a interceptação ambiental sem ordem judicial.
De fato, o art.10-A, introduzido pela Lei 13.964/2019, é posterior à alteração do art. 10 trazida pela Lei
13.869/2019, e, por isso, o revogou tacitamente, no que tange à interceptação ambiental.
O segundo delito é a interceptação da comunicação telefônica, de informática, telemática ou promoção
de escuta ambiental, mediante ordem do juiz competente, mas com objetivo não autorizado em lei.
Exemplo: o delegado de polícia, sob o pretexto de investigar certo crime, faz a interceptação telefônica,
com ordem judicial, para demonstrar o adultério da mulher de seu amigo.
Caso o juiz tenha ciência do objetivo não autorizado em lei, também responderá pelo crime.
Quanto à escuta ambiental, pode ser realizada licitamente sem ordem judicial, por isso, o referido termo
deve ser interpretado como sendo a interceptação ambiental realizada mediante ordem judicial, mas com
objetivo não autorizado em lei.
O tipo penal em análise, como se vê, também se aplica à interceptação ambiental, pois o referido fato
incriminado não é previsto no art. 10-A.
O terceiro crime é a quebra de segredo de justiça, sem autorização judicial,
O tipo penal é omisso sobre o tipo de segredo de justiça cuja quebra a lei visa incriminar.
A quebra de segredo de justiça se verifica em três hipóteses:
a) quando se revela a existência da investigação criminal, ainda que silencie sobre a existência e
conteúdo da interceptação de comunicação telefônica, de informática, telemática ou promoção de escuta
ambiental. Exemplo: o escrivão de polícia comenta com um advogado que existe um inquérito policial para
investigar certa pessoa, mas silencia sobre a existência da interceptação telefônica.
b) quando se revela a existência da comunicação oriunda da interceptação de comunicação telefônica,
de informática, telemática ou promoção de escuta ambiental, ainda que não se revele o seu conteúdo nem a
existência da investigação criminal. Exemplo: o funcionário da empresa telefônica mostra a um amigo a

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gravação da conversa telefônica, sem lhe comunicada que é oriunda de uma investigação criminal.
c) quando se revela o conteúdo da comunicação oriunda da interceptação de comunicação telefônica,
de informática, telemática ou promoção de escuta ambiental, ainda que silencie sobre a existência da
investigação criminal.
Exemplo: funcionário da concessionária telefônica que auxiliou o delegado na execução da diligência,
revela o conteúdo da diligência à sua namorada. Outro exemplo: advogado do réu divulga à imprensa as
transcrições das gravações das interceptações telefônicas.
Nas duas últimas hipóteses, o delito se configura, mas, na primeira, não, pois o que o tipo penal
incrimina é a violação do sigilo da interceptação e não o das investigações criminais.
Convém esclarecer que, no § 2º do art. 10-A, que prevê delito similar, o tipo penal também se refere à
quebra do sigilo das investigações.
Aliás, no tocante à quebra do segredo de justiça oriundo da captação ambiental, o tipo penal em
análise pode ou não ser aplicado, conforme quem seja o sujeito ativo do delito.
Com efeito, se a revelação do segredo emanar de funcionário público que tem o dever de sigilo, o delito,
por força do princípio da especialidade, será o previsto no § 2º do art. 10-A da Lei 9.296/96, reservando-se o
art. 10 “caput” para quando for perpetrado por particulares ou funcionários públicos que não têm o dever
de sigilo.
O quarto delito é a quebra de segredo de justiça, mediante autorização judicial, mas com objetivo não
autorizado em lei.
Aqui o que se incrimina é a revelação do sigilo autorizado pelo juiz, mas com objetivos não autorizados
por lei, hipótese que também se aplica à quebra de sigilo da captação ambiental, pois o art. 10-A não disciplina
o assunto.
A quebra do sigilo, que caracteriza o delito em análise, conforme já salientado anteriormente, pode
recair sobre a existência ou conteúdo da interceptação.

CRIME DE CAPTAÇÃO AMBIENTAL

Dispõe o art. 10-A:


“Realizar captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos para investigação ou
instrução criminal sem autorização judicial, quando esta for exigida:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa”.
Trata-se de crime comum, praticável por qualquer pessoa.
O bem jurídico protegido é a administração da justiça e o direito à privacidade e intimidade.
Os sujeitos passivos são o Estado e as pessoas cujos direitos à privacidade e intimidade foram
lesionados.
O núcleo do tipo é o verbo realizar, que significa fazer com que seja desenvolvido, colocar em prática,
executar.
O delito é de forma livre, admitindo inúmeros meios de execução.
Só haverá o crime quando se tratar da realização de interceptação ambiental, que é feita sem a anuência
dos interlocutores.
As outras duas espécies de captação ambiental, que são a gravação e a escuta, não se encontram
inseridas no âmbito do tipo penal.
A propósito, dispõe o §1º do art. 10-A:
“Não há crime se a captação é realizada por um dos interlocutores”.
Trata-se de uma causa de exclusão da tipicidade prevista expressamente para a gravação ambiental
que, por interpretação extensiva, também se aplica à escuta ambiental, que é feita por terceiro, mas
autorizada por um dos interlocutores.
Ademais, a escuta ambiental prescinde de ordem judicial, ao passo que o tipo penal em apreço só se
refere à captação ambiental realizada “sem autorização judicial, quando esta for exigida”.
Da mesma forma, só haverá o delito quando o fato houver sido realizado em recinto privado ou fechado,
porquanto em local público ou aberto ao público, conforme já salientado anteriormente, a autorização judicial

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é dispensada.
No tocante ao elemento normativo do tipo, se encontra na expressão “sem autorização judicial, quando
esta for exigida”.
Em relação à realização de interceptação ambiental, com ordem do juiz competente, mas com objetivo
não autorizado em lei, é crime do art. 10 da Lei 9.296/96.
Em havendo autorização do juiz criminal competente, com objetivo autorizado por lei, não há crime.
Igualmente, não há crime nos casos onde não se exige a autorização judicial, que são os seguintes:
a) gravação ambiental, em qualquer local;
b) escuta ambiental, em qualquer local;
c) interceptação ambiental em local público ou aberto ao público.
Os elementos subjetivos do tipo são:
a) o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar a interceptação ambiental, sem ordem do juiz.
Se, por erro, ainda que inescusável, o agente supõe que havia autorização judicial, o delito não se caracteriza,
em função do erro de tipo, previsto no art. 20 do CP, outrossim, por não ser punido na forma culposa.
b) fim de investigação ou instrução criminal. Assim, além do dolo, ainda se exige, para a caracterização
do crime, o especial fim de agir. Se o intuito do agente for uma investigação não criminal, o delito não se
configura, pois é vedada a analogia “in malam partem”.
Quanto à consumação, se verifica com o início da oitiva da conversa ou visualização da imagem,
independentemente da gravação ou filmagem, prescindido-se também da divulgação que, se ocorrer, será
mero exaurimento, ou seja, um “post factum impunível”.
Convém também relembrar que o delito previsto no art. 10 “caput”, no que se refere à interceptação
ambiental, foi revogado pelo delito em análise, que é oriundo de lei posterior.
Quanto à tentativa, é possível.
Por fim, a ação penal é pública incondicionada.

CRIME DE REVELAÇÃO DO SIGILO ORIUNDO DA CAPTAÇÃO AMBIENTAL

Dispõe o § 2º do art. 10-A:


“A pena será aplicada em dobro ao funcionário público que descumprir determinação de sigilo das
investigações que envolvam a captação ambiental ou revelar o conteúdo das gravações enquanto mantido o
sigilo judicial”.
Trata-se de crime próprio, praticável apenas pelo funcionário público incumbido do dever de sigilo.
Outros funcionários públicos, não respondem pelo delito. O delegado de polícia que, por exemplo,
revela o sigilo à sua amante, que, por sua vez, comenta com sua amiga, responderá pelo crime em análise, ao
passo que a amante será incursa no delito de quebra de sigilo do art. 10.
O bem jurídico protegido é o normal funcionamento da administração da justiça, a intimidade e a vida
privada das pessoas envolvidas.
Trata-se de um tipo penal autônomo em relação ao caput.
De fato, no art. 10-A, “caput” o que se incrimina é a realização de interceptação ambiental sem ordem
judicial, ao passo que o §2º do art. 10-A, em análise, cuida da quebra do sigilo.
As condutas criminosas consistem em:
a) descumprir determinação de sigilo das investigações que envolvam a captação ambiental. Aqui, para
o delito se caracterizar, basta o agente revelar a terceiro a existência das investigações, ainda que silencie
sobre a captação ambiental. Exemplo: o escrivão de polícia comenta com seu amigo que existe um inquérito
policial contra fulano, mas não lhe revela a existência de uma ordem judicial de interceptação ambiental.
b) revelar o conteúdo das gravações sigilosas. Nesse caso, o delito consiste em contar ou mostrar o
conteúdo da gravação para alguém, ainda que silencie que ela é oriunda de uma investigação criminal. No
tocante à revelação de filmagem sigilosa, também se encontra abrangida pelo tipo penal em análise, pois a
filmagem nada mais é que uma gravação de imagens.
Por outro lado, não haverá o crime quando o fato ocorrer após o cancelamento do sigilo imposto nas
investigações ou no processo.

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Quanto à quebra segredo de justiça de interceptação ambiental, com autorização judicial, mas com
objetivo não autorizado em lei. é crime do art. 10 da Lei 9.296/96.
É importante registrar que o tipo penal em análise se refere à captação ambiental, que foi empregada
em sentido amplo para abranger as suas três espécies que são a gravação ambiental, a escuta ambiental e a
interceptação ambiental.
De fato, o tipo penal faz alusão à “determinação de sigilo das investigações” que, em relação à
interceptação ambiental, emana da lei, o que tornaria a exigência inócua.
A aludida expressão só se justifica se o tipo penal também for aplicável à escuta ambiental e à gravação
ambiental, hipóteses em que a determinação de sigilo depende de uma determinação judicial.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que consiste na vontade consciente de realizar uma das condutas
descritas no tipo penal.
Quanto à culpa, ainda que grave, não é punida.
A consumação se verifica quando se revela a alguém a existência das investigações criminais ou o
conteúdo da captação ambiental.
Admite-se a tentativa. Exemplo: a carta que revelaria o segredo é interceptada pela autoridade policial
antes de ser aberta pelo destinatário.
A ação penal é pública incondicionada.

CRIMES DE PRECONCEITO

(LEI 7.716/89)

INTRODUÇÃO

Dispõe o art. 5º, XLII da CF:


“A prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão nos termos
da lei”.
A lei 7.716/89 regulamenta o dispositivo constitucional ao descrever uma série de crimes resultantes
de discriminação ou preconceito, todos eles previstos com reclusão.
Historicamente, o racismo no Brasil sempre foi tratado com brandura. A lei 1.390/51, a primeira sobre
o assunto, de autoria do então Senador Afonso Arinos, abordava o tema como mera contravenção penal. Foi
revogada pela lei 7.437/85, que insistiu em conferir menor importância à matéria, mantendo-lhe o enfoque
de “crime anão”, expressão utilizada por Nelson Hungria para denominar as contravenções penais.
Como a lei 7.716/89, editada sob a égide da Constituição de 1.988, que cuidou da matéria com o rigor
que ela merece, não abrange todos os fatos da lei 7.347/85, ela ainda continua em vigor quanto às práticas
preconceituosas envolvendo sexo e estado civil. Impedir por exemplo, o acesso de mulher em certo local em
razão da simples condição feminina ou barrar um pessoa em um restaurante pelo fato de ela ser solteira,
constitui contravenção penal da lei 7.347/85.
Na exegese dominante, só há dois sexos, o masculino e o feminino, sendo então a lei omissa sobre a
conduta preconceituosa de impedir o acesso de gays, lésbicas, travestis, etc, em certos locais. É, no entanto,
possível enquadrar o fato como crime de injúria ou ainda, caso haja violência ou grave ameaça, como crime
de constrangimento ilegal.

FORMAS DE PRECONCEITO

A lei 7.716/89 só pune o preconceito ou discriminação resultante de:


a) raça;
b) cor;
c) etnia;
d) religião;
e) procedência nacional.

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A referida lei não abrange o preconceito ou descriminação oriundo de doença nem de sexo, estado civil
e deficiência. Quanto ao preconceito resultante de sexo ou estado civil, que impede o ingresso em certos
locais, caracteriza contravenção da lei 7.437/85.
O STF, entretanto, na ADO 26 e MI 4.733, equiparou a homofobia e a transfobia ao crime de racismo,
através da analogia “ in malam partem”, disfarçada de argumentações jurídicas baseadas, sobretudo, no
princípio da isonomia e na proibição do preconceito, em flagrante violação ao princípio da reserva legal. A
Excelsa Corte reconheceu expressamente a mora legislativa, ou seja, a omissão da lei em relação à
criminalização da homofobia e transfobia, ato contínuo, decidiu pela aplicação da lei de racismo, que rege
hipóteses semelhantes. O pressuposto da analogia é a omissão da lei, mas, em matéria penal, não se pode
fazer analogia “in malam partem”, sob pena de violação do princípio da reserva legal, que é uma cláusula
pétrea. Ademais, a rigor, tanto a homofobia quanto a transfobia, é um preconceito relacionado à opção sexual
e, dessa forma, não havia omissão, pois os preconceitos relacionados ao sexo são expressamente tipificados
como contravenção penal, conforme lei 7437/1985.
A lei 7.853/89, por sua vez, cuida do preconceito contra portadores de deficiência, punindo com
reclusão o responsável pela instituição de ensino que o discrimina.
Com efeito, em relação ao portador do HIV e o doente da AIDS, a lei 12.984/2014, tornou crime as
seguintes condutas:
“Constitui crime punível com reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, as seguintes condutas
discriminatórias contra o portador do HIV e o doente de aids, em razão da sua condição de portador ou de
doente:
I - recusar, procrastinar, cancelar ou segregar a inscrição ou impedir que permaneça como aluno em
creche ou estabelecimento de ensino de qualquer curso ou grau, público ou privado;
II - negar emprego ou trabalho;
III - exonerar ou demitir de seu cargo ou emprego;
IV - segregar no ambiente de trabalho ou escolar;
V - divulgar a condição do portador do HIV ou de doente de aids, com intuito de ofender-lhe a dignidade;
VI - recusar ou retardar atendimento de saúde”.
Saliente-se, contudo, que o preconceito referente às demais doenças não se encontram tipificando
como crime.

CRIMES EM ESPÉCIE

Basicamente, os crimes se dividem em três grupos:


a) impedir o acesso de alguém (art. 3º a 14º);
b) anúncio de recrutamento de trabalhadores (§2º do art. 4º);
c) apologia ao preconceito (art. 20 e seus parágrafos).
Todos os crimes da lei 7.716/89 são imprescritíveis, inafiançáveis e punidos com reclusão. Abre-se
exceção ao crime de anúncio preconceituoso de recrutamento de trabalhadores cuja pena não é de reclusão.
Acrescente-se ainda que todos esses delitos exigem o dolo de preconceito de raça, cor, etnia, religião
ou procedência nacional. O preconceito oriundo de descendência, estado civil, doença, sexo e outros não são
abrangidos por esta lei.
Nos crimes do §1º do art. 4º, no entanto, o legislador excluiu o preconceito oriundo de religião e, por
sua vez, acrescentou o advindo de descendência.
Por outro lado, nos crimes de impedimento de acesso o legislador adotou uma forma escalonada. Assim,
por exemplo, impedir o acesso em escola é crime mais grave que impedir o acesso em bares ou salões de
cabelereiros. Esta postura é criticada por alguns autores que entendem que bastaria, para abranger todas as
hipóteses, um único tipo penal.

IMPEDIMENTO DE ACESSO A CARGOS PÚBLICOS

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O delito consiste em impedir ou obstar o acesso de alguém, devidamente habilitado, a qualquer cargo
da Administração Direta ou Indireta, bem como das concessionárias de serviços públicos.
Também é crime obstar a promoção funcional a quem já ocupa cargo ou emprego público (art.3º e
parágrafo único).

IMPEDIMENTO DE ACESSO A EMPREGOS PRIVADOS

É também crime negar ou obstar emprego em empresa privada (art. 4º).


De acordo com o §1º do art.4º, incorre na mesma pena quem, por motivo de discriminação de raça ou
de cor ou práticas resultantes do preconceito de descendência ou origem nacional ou étnica:
I - deixar de conceder os equipamentos necessários ao empregado em igualdade de condições com os
demais trabalhadores;
II - impedir a ascensão funcional do empregado ou obstar outra forma de benefício profissional;
III - proporcionar ao empregado tratamento diferenciado no ambiente de trabalho, especialmente
quanto ao salário.
Outrossim, deixar de conceder equipamentos necessários ao empregado em igualdade de condições
com os demais trabalhadores.
É também crime impedir a ascensão funcional do empregado ou obstar outra forma de benefício
profissional.
Igualmente, é crime proporcionar ao empregado tratamento diferenciado no ambiente de trabalho,
especialmente quanto ao salário.
Nessas hipóteses do §1º do art. 4º acrescenta-se um preconceito extra, que é a descendência. Assim, o
crime se caracteriza quando houver preconceito da raça, cor, etnia, procedência nacional ou de descendência.
Em contrapartida, não se incrimina essas condutas quando o preconceito for de religião.

IMPEDIMENTO DE ACESSO A ESTABELECIMENTOS

Aqui os crimes consistem em:


a) recusar ou impedir acesso a estabelecimento comercial, negando-se a servir, atender ou receber
cliente ou comprador.
b) recusar, negar ou impedir a inscrição ou ingresso de aluno em estabelecimento de ensino público ou
privado de qualquer grau. Se o crime for praticado contra menor de dezoito anos a pena é agravada de 1/3
(um terço).
c) impedir o acesso ou recusar hospedagem em hotel, pensão, estalagem, ou qualquer estabelecimento
similar.
d) impedir o acesso ou recusar atendimento em restaurantes, bares, confeitarias, ou locais semelhantes
abertos ao público.
e) impedir o acesso ou recusar atendimento em estabelecimentos esportivos, casas de diversões, ou
clubes sociais abertos ao público.
f) impedir o acesso ou recusar atendimento em salões de cabeleireiros, barbearias, termas ou casas de
massagem ou estabelecimento com as mesmas finalidades.
g) impedir o acesso às entradas sociais em edifícios públicos ou residenciais e elevadores ou escada de
acesso aos mesmos.

IMPEDIMENTO DE ACESSO A SERVIÇO

Estes crimes são:


a) impedir o acesso ou uso de transportes públicos, como aviões, navios barcas, barcos, ônibus, trens,
metrô ou qualquer outro meio de transporte concedido.
b) impedir ou obstar o acesso de alguém ao serviço em qualquer ramo das Forças Armadas.

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IMPEDIR O CASAMENTO OU CONVENIÊNCIA FAMILIAR OU SOCIAL

Dispõe o art. 14:


“Impedir ou obstar, por qualquer meio ou forma, o casamento ou convivência familiar e social.
Pena: reclusão de dois a quatro anos”.
Trata-se, como nos demais hipóteses, de crime comum, isto é, praticável por qualquer pessoa. Comete,
por exemplo, o delito o pai que impede o casamento ou união estável da filha com uma pessoa negra.
Outrossim, quando proíbe que o filho tenha amizade com um judeu.

RECRUTAMENTO PRECONCEITUOSO DE TRABALHADORES

O §2º do art. 4º incrimina quem, no recrutamento de trabalhadores, exige aspectos de aparência


próprios de raça ou etnia para emprego, cujas atividades não justifiquem essa exigência.
Basta, para a consumação, que esta exigência seja feita em anúncios ou qualquer outra forma de
recrutamento de trabalhadores.
A pena, para o presente delito, é a multa cumulada com prestação de serviços à comunidade. Estes
serviços devem também se referir à promoção da igualdade racial.
Note-se que é único delito no qual não se prevê a pena de reclusão.
Cumpre observar que se trata da incriminação de um ato preparatório como crime autônomo. Se, por
exemplo, o sujeito faz esse anúncio preconceituoso o crime já se consuma. E, se depois, ele ainda efetivamente
nega o emprego a alguém por esses motivos, ele incidirá no crime do art. 4º, caput, punido com reclusão e
ainda sofrerá as penas do crime do §2º do citado art. 4º. Não há absorção desse último crime.
Com efeito, no delito do caput do art. 4º o sujeito passivo é determinado, ao passo que o previsto no
§2º do art. 4º atenta contra um número indeterminado de pessoas.

APOLOGIA AO PRECONCEITO

Dispõe o art. 20, caput, da lei 7.716/89:


“Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência
nacional”.
Vê-se então que a simples incitação ao preconceito já é crime.
Trata-se, pois, de um ato preparatório que a lei tipifica como crime autônomo.
O crime é vago, pois o sujeito passivo é um número indeterminado de pessoas, isto é, a coletividade.
Se o crime é cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer
natureza, incide a qualificadora do §1º do art. 20, cuja pena é de reclusão de dois a cinco anos e multa.
Exemplos: rádio, televisão, panfletos, internet, etc. Nesses casos, o juiz poderá determinar, ainda na fase do
inquérito policial, a busca e apreensão dos exemplares preconceituosos ou a cessação das transmissões
ofensivas feitas através do rádio, televisão, etc, ou ainda a interdição das respectivas mensagens ou páginas
da internet.
Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por intermédio dos meios de comunicação social
ou publicação de qualquer natureza, a pena será de reclusão de dois a cinco anos e multa.
Por outro lado, no tocante à proibição da divulgação do nazismo há um crime específico.
Com efeito, reza o §1º do art. 20:
“Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou
propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo.
Pena: reclusão de um a três anos e multa”.

EFEITOS DA CONDENAÇÃO

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Constitui efeito da condenação a perda do cargo ou função pública, para o servidor público, e a
suspensão do funcionamento do estabelecimento particular por prazo não superior a três meses (art.16). Este
efeito não é automático, pois depende de ser motivadamente declarado na sentença (art. 17).
Na hipótese de apologia ao preconceito, cometido através de meios de comunicação ou de publicação,
após o trânsito em julgado da condenação, o material apreendido deverá ser destruído. Trata-se de um efeito
automático da condenação, previsto no §4º do art. 20, pois independe de expressa menção na sentença.
Vê-se assim que o art. 16 prevê dois efeitos específicos da condenação:
a) perda do cargo ou função pública;
b) suspensão do funcionamento do estabelecimento particular por até três meses.

EXECUÇÃO PENAL

(LEI 7.210/1984)

INTRODUÇÃO

A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e
proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado (art.1º).
Em resumo, o objetivo da execução penal é o cumprimento da sentença ou decisão criminal e a
ressocialização do condenado ou internado.
Vale lembrar que entende-se por condenado o que sofreu pena e internado aquele a quem se impôs
medida de segurança.

DESTINATÁRIOS

A lei em análise é aplicada aos condenados e internados, em caráter definitivo, ou seja, por força de
sentença penal transitada em julgado, outrossim, ao preso provisório, conforme parágrafo único do art. 2º.
O preso provisório tem, portanto, direito aos diversos benefícios que a lei de execução penal prevê.
Exemplos: progressão de regimes, remição, etc.
Quanto aos condenados pela Justiça Eleitoral e Militar, aplica-se também a Lei de Execução Penal, desde
que recolhidos a estabelecimento sujeito à jurisdição comum ou ordinária (parágrafo único do art. 2º).
Caso estejam recolhidos em presídio militar, não se aplica a lei em comento, mas sim o Código Penal
Militar e o Código de Processo Penal Militar.

PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO POPULAR

O Estado deverá recorrer à cooperação da comunidade nas atividades de execução da pena e da medida
de segurança (art.4º). Exemplo: Conselho de Comunidade, que é um dos órgãos da Execução Penal.
Vigora, destarte, o princípio da participação popular.

COMPETÊNCIA

O processo de conhecimento, como se sabe, se encerra com o trânsito em julgado da sentença penal e,
a partir de então, deve se iniciar o processo de execução das sentenças penais condenatórias ou absolutórias
impróprias.
A justiça competente para o processo de execução penal é definida pela natureza do presídio. Ou seja,
será da justiça federal ou estadual, conforme se trate de presídio federal ou estadual.
A execução penal do condenado pela justiça federal, que cumpre pena em presídio estadual, por
exemplo, será da competência da justiça estadual, e vice-versa.
A propósito, dispõe a Súmula 192 do STJ:
“Compete ao juízo das execuções penais do Estado a execução das penas impostas a sentenciados pela

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justiça federal, militar ou eleitoral, quando recolhidos a estabelecimentos sujeitos a administração estadual”.
No tocante ao foro competente, é o da comarca ou sessão judiciária a que se encontra situado o
estabelecimento penal onde se cumpre a pena ou medida de segurança.
No Estado de São Paulo foi criado o DEECRIM, que são os departamentos estaduais de execuções penais,
cuja constitucionalidade é duvidosa, por violação do princípio do juiz natural.
Os DEECRIM’s englobam grupos de comarcas cujas execuções penais serão presididas por determinado
juiz, em relação aos condenados em regime fechado e semiaberto.
Por outro lado, hipótese de o condenado cumprir o regime aberto em sua residência, bem como quando
se tratar de penas restritivas de direitos, o foro competente para a execução penal será o do local de sua
residência.
No tocante ao juízo competente, é o da execução penal, pois o juízo do processo de conhecimento já se
encerrou.
Tratando-se de preso provisório, ou seja, cuja sentença condenatória ainda não transitou em julgado, a
competência para decidir sobre as questões de execução penal será também do juízo do processo de
execução, pois se trata de uma competência funcional, portanto, absoluta.

NATUREZA JURÍDICA

As decisões prolatadas pelo juiz das Execuções Penais tem natureza jurisdicional, sujeitando-se à coisa
julgada material.
E, por consequência, deve se assegurar ao condenado ou internado o devido processo legal, a ampla
defesa, o contraditório, enfim, os mesmos princípios pertinentes ao processo de conhecimento.
Está assim superada a doutrina que visualizava na execução penal uma atividade administrativa exercida
pelo magistrado.
Aliás, o art. 2º da LEP faz expressa menção à expressão jurisdição penal, espancando assim qualquer
dúvida acerca do caráter jurisdicional das decisões proferidas pelo magistrado.
Há, por outro lado, na Lei de Execução Penal, além de uma atividade jurisdicional, uma atividade
administrativa. Exemplo: normas sobre fiscalização dos estabelecimentos penais. Outro exemplo: normas que
tratam do cumprimento das políticas públicas dentro dos presídios, acerca do trabalho do preso, estudo,
tratamento médico, etc. Mais um exemplo: imposição de sanções disciplinares aplicadas pelo diretor do
presídio.
Vê-se assim que a Lei de Execução Penal tem caráter misto ou híbrido, pois, além de versar sobre a
jurisdicional, ainda contém uma série de normas de natureza administrativa.

CLASSIFICAÇÃO

Os condenados serão classificados, segundo os seus antecedentes e personalidade, para orientar a


individualização da execução penal.
De fato, o princípio da individualização da pena também se projeta na fase da execução penal, onde se
deve atentar para as condições específicas de cada preso. Exemplo: os estupradores devem ser postos numa
área específica do presídio. Outro exemplo: os primários não devem cumprir pena junto com os reincidentes.
A classificação será feita por Comissão Técnica de Classificação que elaborará o programa
individualizador da pena privativa de liberdade adequada ao condenado ou preso provisório.
A Comissão Técnica de Classificação, existente em cada estabelecimento, será presidida pelo diretor e
composta, no mínimo, por 2 (dois) chefes de serviço, 1 (um) psiquiatra, 1 (um) psicólogo e 1 (um) assistente
social, quando se tratar de condenado à pena privativa de liberdade.
Nos demais casos a Comissão atuará junto ao Juízo da Execução e será integrada por fiscais do serviço
social.

EXAME CRIMINOLÓGICO

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O condenado ao cumprimento de pena privativa de liberdade, em regime fechado, será submetido a


exame criminológico para a obtenção dos elementos necessários a uma adequada classificação e com vistas à
individualização da execução.
Ao exame criminológico poderá também ser submetido o condenado ao cumprimento da pena privativa
de liberdade em regime semiaberto.
Assim, no regime semiaberto, o exame criminológico é facultativo e, no regime aberto, este exame não
pode ser realizado por falta de previsão legal.
O exame criminológico, a rigor, deve ser realizado no início do cumprimento da pena, mas na prática só
costuma ser feito quando há o pedido de progressão de regime.
Entretanto, de acordo com a jurisprudência, a sua feitura por ocasião do pedido de progressão de
regime exige uma decisão judicial que realmente fundamente a sua necessidade para esse fim.
Para efeito de progressão de regime, dispõe a súmula 439 do STJ:
“Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada.”
Quanto ao crime hediondo ou equiparado, preceitua a súmula vinculante 26:
“Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o
juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990, sem
prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício,
podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico.”
Vê-se assim que, antes de decidir acerca da progressão de regime, o juiz pode ordenar a realizado de
exame criminológico, desde que de forma devidamente fundamentada.
É polêmico se o exame criminológico, para efeito de progressão de regime, poderia ser fundamentado
na reincidência e nas circunstâncias judiciais do art. 59 do CP.
A Defensoria Pública se insurge contra esse tipo de fundamentação, acoimando-a de “bis in idem”, à
medida que tanto a reincidência quanto as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP já foram valoradas na
sentença e, além disso, na progressão de regime o que deve ser analisado é a projeção do comportamento da
pessoa para o futuro, devendo ser desconsiderado o seu comportamento pretérito.

IDENTIFICAÇÃO DO PERFIL GENÉTICO

A identificação do perfil genético, disciplinada no art. 9º-A da LEP, é a feita mediante extração de DNA
- ácido desoxirribonucleico.
No âmbito da execução penal, deve ser realizada apenas por perito oficial, utilizando-se de técnica
adequada e indolor
Aliás, o §7º do art. 9º-A da LEP, estabelece que tanto a coleta da amostra quanto a realização do
respectivo laudo serão realizados por perito oficial. Ora, a coleta é um procedimento simples, de modo que
bastaria a sua supervisão pelo perito judicial.
A identificação do perfil genético é obrigatória ao condenado definitivamente, a pena privativa de
liberdade, nas seguintes hipóteses:
a) crime doloso cometido com violência grave contra pessoa;
b) crime contra vida;
c) crime contra a liberdade sexual;
d) crime sexual contra vulnerável.
Quanto aos condenados por crimes hediondos, que não se enquadram em nenhuma das situações
acima, não há falar-se em identificação genética, em função do advento da Lei 12.964/2019, que a aboliu para
os referidos delitos.
Sobre o momento de sua realização, será após o trânsito em julgado da condenação, por ocasião do
ingresso no estabelecimento prisional, mas, caso não realizada nesta oportunidade, deverá ser feita durante
o cumprimento da pena.
Constitui falta grave a recusa do condenado em submeter-se ao procedimento de identificação do perfil
genético (arts. 9º-A, §8º e 50, VIII, da LEP).
A autoridade policial só poderá ter acesso a esses dados mediante ordem judicial e, mesmo assim, desde

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que haja inquérito instaurado (art. 9º, §2º, da LEP).


Vê-se assim que a identificação do perfil genético poderá ser utilizada para o fim de investigação
criminal.
Deve ser viabilizado ao titular de dados genéticos o acesso aos seus dados constantes nos bancos de
perfis genéticos, bem como a todos os documentos da cadeia de custódia que gerou esse dado, de maneira
que possa ser contraditado pela defesa (art. 9º, §3º, da LEP).
Este contraditório é postergado, ou seja, após a inserção dos dados genéticos no sistema.
Quanto à amostra biológica coletada pelo perito oficial só poderá ser utilizada para o único e exclusivo
fim de realização do exame do perfil genético.
Aliás, a lei determina que, após a realização do exame de identificação do perfil genético, a amostra
recolhida seja imediatamente descartada, pela forma correta, de maneira a impedir a sua utilização para
qualquer outro fim.
Quanto à estereotipagem genética, que é o apontamento das características idênticas a todos os
membros de um determinado grupo, também não poderá servir de justificativa para a utilização da amostra.
Igualmente, o fim de busca familiar, por exemplo, identificar se o estuprador é ou não pai da vítima, não
poderá servir de base para a utilização da amostra recolhida.
Em suma, nem mesmo os fins de estenotipagem e de busca familiar justificam a preservação da
amostra.

ASSISTÊNCIA

A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o


retorno à convivência em sociedade.
A assistência estende-se ao egresso.
Considera-se egresso para os efeitos da Lei de Execução Penal:
I - o liberado definitivo, pelo prazo de 1 (um) ano a contar da saída do estabelecimento;
II - o liberado condicional, durante o período de prova.
O serviço de assistência social colaborará com o egresso para a obtenção de trabalho.
A assistência ao egresso consiste na orientação e apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade, bem como
na concessão, se necessário, de alojamento e alimentação, em estabelecimento adequado, pelo prazo de 2
(dois) meses, que poderá ser prorrogado uma única vez, comprovado, por declaração do assistente social, o
empenho na obtenção de emprego.
A assistência ao preso, internado ou egresso, será:
I – material.
É o fornecimento de alimentação, vestuário e instalações higiênicas.
O estabelecimento disporá de instalações e serviços que atendam aos presos nas suas necessidades
pessoais, além de locais destinados à venda de produtos e objetos permitidos e não fornecidos pela
Administração.
Quanto aos dependentes do segurado preso em regime fechado, têm direito ao auxílio reclusão, que é
pago pelo INSS, nas mesmas condições da pensão por morte (art. 80 da Lei 8.213/90).
O auxílio-reclusão é pago aos dependentes do segurado de baixa renda recolhido à prisão em regime
fechado que não receber remuneração nem estiver em gozo de auxílio-doença, de pensão por morte, de
salário-maternidade, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço.

II – à saúde.
É o atendimento médico, farmacêutico e odontológico.
Será assegurado acompanhamento médico à mulher, principalmente no pré-natal e no pós-parto,
extensivo ao recém-nascido.

Quando o estabelecimento penal não estiver aparelhado para prover a assistência médica necessária,
esta será prestada em outro local, mediante autorização da direção do estabelecimento.

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De acordo com o STJ, os problemas graves de saúde justificam a mudança para prisão domiciliar, mesmo
em casos de condenados que cumprem pena em regime fechado, a qualquer momento do cumprimento da
pena, quando o serviço médico do presídio for insuficiente (HC 366.517).
Se, no entanto, a doença grave for passível de tratamento no próprio presídio não se justifica a prisão
domiciliar.

III – Jurídica.
É destinada apenas aos que não tem recursos financeiros para constituir advogado. Esta assistência
jurídica, que é gratuita e integral, será exercida pela Defensoria Pública, dentro e fora dos estabelecimentos
penais.
Em todos os estabelecimentos penais, haverá local apropriado destinado ao atendimento pelo Defensor
Público.
Fora dos estabelecimentos penais, serão implementados Núcleos Especializados da Defensoria Pública
para a prestação de assistência jurídica integral e gratuita aos réus, sentenciados em liberdade, egressos e
seus familiares, sem recursos financeiros para constituir advogado.

IV – Educacional.
É a instituição escolar e a formação profissional do preso e do internato.
A educação é um dos caminhos mais eficazes para a reinserção social do preso.
O ensino de 1º grau será obrigatório, integrando-se no sistema escolar da Unidade Federativa.
O ensino profissional será ministrado em nível de iniciação ou de aperfeiçoamento técnico.
A mulher condenada terá ensino profissional adequado à sua condição.
As atividades educacionais podem ser objeto de convênio com entidades públicas ou particulares, que
instalem escolas ou ofereçam cursos especializados.
Em atendimento às condições locais, dotar-se-á cada estabelecimento de uma biblioteca, para uso de
todas as categorias de reclusos, provida de livros instrutivos, recreativos e didáticos.
O STJ já decidiu pela permissão da saída temporária do preso, em regime semiaberto, para frequentar
curso superior, nos termos do art. 122, II, da LEP (HC 535.383).

V – Social.
A assistência social tem por finalidade amparar o preso e o internado e prepará-los para o retorno à
liberdade. Incumbe ao serviço de assistência social:
a) conhecer os resultados dos diagnósticos ou exames;
b) relatar, por escrito, ao Diretor do estabelecimento, os problemas e as dificuldades enfrentadas pelo
assistido;
c) acompanhar o resultado das permissões de saídas e das saídas temporárias;
d) promover, no estabelecimento, pelos meios disponíveis, a recreação;
e) promover a orientação do assistido, na fase final do cumprimento da pena, e do liberando, de modo
a facilitar o seu retorno à liberdade;
f) providenciar a obtenção de documentos, dos benefícios da Previdência Social e do seguro por
acidente no trabalho;
g) orientar e amparar, quando necessário, a família do preso, do internado e da vítima.

VI – Religiosa.
A assistência religiosa, com liberdade de culto, será prestada aos presos e aos internados, permitindo-
se-lhes a participação nos serviços organizados no estabelecimento penal, bem como a posse de livros de
instrução religiosa.
No estabelecimento haverá local apropriado para os cultos religiosos.
Nenhum preso ou internado poderá ser obrigado a participar de atividade religiosa.

TRABALHO

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O trabalho do preso não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho.
O trabalho do preso será remunerado, mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a 3/4 (três
quartos) do salário mínimo.
O produto da remuneração pelo trabalho deverá atender:
a) à indenização dos danos causados pelo crime, desde que determinados judicialmente e não
reparados por outros meios;
b) à assistência à família;
c) a pequenas despesas pessoais;
d) ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado, em proporção
a ser fixada e sem prejuízo da destinação prevista nas letras anteriores.
A sobra será depositada em caderneta de poupança para constituir o pecúlio penitenciário, que o preso
poderá levantar após ser posto em liberdade.
A jornada normal de trabalho não será inferior a 6 (seis) nem superior a 8 (oito) horas, com descanso
nos domingos e feriados.
Caso haja excesso de jornada ou trabalho aos domingos e feriados, porém, o período trabalhado
também deverá ser computado para efeito de remição.
Poderá ser atribuído horário especial de trabalho aos presos designados para os serviços de conservação
e manutenção do estabelecimento penal.
O condenado à pena privativa de liberdade está obrigado ao trabalho na medida de suas aptidões e
capacidade.
Trata-se assim de um dever do preso.
A recusa em trabalhar é falta grave. Todavia, não se pode coagir o preso a trabalhar, pois é vedado o
trabalho forçado.
O dever de trabalho não se confunde com a pena de trabalho forçado, também conhecida como pena
das galés, que é vedada pelo art. 5º, XLVI, da CF, onde o preso era compelido a trabalhar com os pés amarrados
com correntes de ferro.
De fato, no dever de trabalho o preso não pode ser compelido fisicamente a trabalhar. Aliás, o art. 6º
da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto San José da Costa Rica) não considera como trabalho
forçado os trabalhos ou serviços exigidos de pessoa reclusa em cumprimento de sentença (HC 264.989).
Só não estão obrigados a trabalhar:
a) o condenado por crime político (art. 200 do LEP);
b) o preso provisório;
c) o condenado por contravenção penal a pena de prisão simples que não exceder a 15 (quinze) dias
(art. 6º, §2º da LEP).
Os maiores de 60 (sessenta) anos poderão solicitar ocupação adequada à sua idade.
Os doentes ou deficientes físicos somente exercerão atividades apropriadas ao seu estado.
Quanto ao tipo de trabalho, dispõe o art. 32 que “na atribuição do trabalho deverão ser levadas em
conta a habilitação, a condição pessoal e as necessidades futuras do preso, bem como as oportunidades
oferecidas pelo mercado”.
Deverá ser limitado, tanto quanto possível, o artesanato sem expressão econômica, salvo nas regiões
de turismo.
O trabalho interno no presídio poderá ser gerenciado por fundação, ou empresa pública, com
autonomia administrativa, e terá por objetivo a formação profissional do condenado. Nessa hipótese,
incumbirá à entidade gerenciadora promover e supervisionar a produção, com critérios e métodos
empresariais, encarregar-se de sua comercialização, bem como suportar despesas, inclusive pagamento de
remuneração adequada.
Os governos federal, estadual e municipal poderão celebrar convênio com a iniciativa privada, para
implantação de oficinas de trabalho referentes a setores de apoio dos presídios.
Conforme a natureza do estabelecimento, nele poderão trabalhar os liberados ou egressos que se
dediquem a obras públicas ou ao aproveitamento de terras ociosas.

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Quanto ao trabalho externo, será admissível para os presos em regime fechado somente em serviço ou
obras públicas realizadas por órgãos da Administração Direta ou Indireta, ou entidades privadas, desde que
tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina.
O limite máximo do número de presos será de 10% (dez por cento) do total de empregados na obra.
Caberá ao órgão da administração, à entidade ou à empresa empreiteira a remuneração desse trabalho.
A prestação de trabalho à entidade privada depende do consentimento expresso do preso.
A prestação de trabalho externo, a ser autorizada pela direção do estabelecimento, dependerá de
aptidão, disciplina e responsabilidade, além do cumprimento mínimo de 1/6 (um sexto) da pena (art.37).
No regime semiaberto, o trabalho externo pode ser realizado, ainda que o preso não tenha cumprido
1/6 (um sexto) da pena (REsp 450.592).
Revogar-se-á a autorização de trabalho externo ao preso que vier a praticar fato definido como crime,
for punido por falta grave, ou tiver comportamento contrário aos requisitos estabelecidos neste artigo
(parágrafo único do art. 37).
O trabalho externo é vedado ao preso provisório, mas não é proibido ao condenado por crime hediondo,
quando presentes as condições permissivas do trabalho extramuros.
A remuneração do trabalho do preso, que pode ser inferior ao salário mínimo, nos termos do art. 29 da
LEP, segundo decidiu o Pleno do STF, na ADPF 336/DF, não ofende os princípios da isonomia e da dignidade
da pessoa humana, em razão dos seguintes argumentos:
a) é inaplicável à hipótese a garantia de salário mínimo prevista no artigo 7º, IV, da Constituição Federal,
pois preso não se sujeita ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e seu trabalho possui
finalidades educativa e produtiva, não podendo ser comparado com o trabalho das pessoas que não cumprem
pena;
b) o preso já tem atendidas pelo Estado boa parte das necessidades vitais básicas que o salário-mínimo
almeja satisfazer, tais como educação, alojamento, saúde, alimentação, vestuário e higiene;
c) o preso recebe o benefício da remição da pena, na proporção de 1 dia de redução da sanção criminal
para cada 3 dias de trabalho;
d) o produto da remuneração do preso é direcionado para a indenização dos danos causados pelo crime,
a assistência à família, para pequenas despesas pessoais e para promover o ressarcimento ao Estado das
despesas realizadas com a sua manutenção;
e) o trabalho do detento pode até mesmo ser subsidiado pelo Erário.
Portanto, a legitimidade da diferenciação entre o trabalho do preso e o dos empregados é evidenciada
pela distinta lógica econômica do labor no sistema executório penal.

DIREITOS DO PRESO

O preso, à exceção da sua liberdade de ir e vir e do direito de votar, conserva todos os seus demais
direitos.
O preso, cuja sentença condenatória tenha transitado em julgado, não poderá votar, por força do art.
15, III, da CF, mas ao preso provisório é garantido o direito ao voto.
Além do direito ao trabalho remunerado, constituem ainda direitos do preso: previdência social,
pecúlio, entrevista pessoal e reservada com o advogado, chamamento nominal, isto é, pelo nome, audiência
especial com o diretor do presídio, enviar e receber correspondências escritas, atestado anual de pena a
cumprir fornecido pela autoridade competente, etc.
No tocante à previdência social, o preso deve contribuir para o INSS para que o seu trabalho na prisão
conte como tempo de serviço para fins de aposentadoria.
O pecúlio penitenciário é a remuneração destinada ao preso pelo trabalho prestado durante a execução
da pena, que só é liberada após ser colocado em liberdade, sendo, pois, depositado em caderneta de poupança
(§2º do art. 29 da LEP). A liberação antecipada, desde que fundada em motivo justo, por exemplo, custear o
estudo de filho, tem sido autorizada pela jurisprudência.
Em defesa do seu direito, o próprio preso pode peticionar ou formular representação a qualquer
autoridade.

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Portanto, para pleitear os benefícios da execução penal, o próprio preso pode peticionar ao juiz da
execução, independentemente de advogado.
O preso ainda tem direito à visita íntima, isto é reservada, do cônjuge, da companheira, de parentes e
amigos em dias determinados. Este direito, que também deve ser assegurada às uniões homoafetivas, pode
ser suspenso em algumas situações, por exemplo, cometimento de falta grave.
É garantida a liberdade de contratar médico de confiança pessoal do internado ou do submetido a
tratamento ambulatorial, por seus familiares ou dependentes, a fim de orientar e acompanhar o tratamento.
As divergências entre o médico oficial e o particular serão resolvidas pelo juiz da execução.

Documentos internacionais

Ainda sobre os direitos do preso, é preciso observar, dente outros, os seguintes documentos
internacionais aprovados pela ONU e vigentes no Brasil:
a) Resolução 43/173 da ONU, que prevê os princípios para a proteção de todas as pessoas presas ou
detidas;
b) Regras de Mandela, que são as regras mínimas, estipuladas pelas Nações Unidas, para tratamento
dos presos;
c) Regras de Bangkok, igualmente aprovadas pela ONU, versam sobre o tratamento das mulheres presas
e das políticas públicas de medidas não privativas de liberdade às mulheres infratoras. Disciplinam também a
questão da presa gestante, o seu direito à prisão domiciliar e de amamentação no presídio;
d) Regras de Tóquio, que contém os padrões mínimos das Nações Unidas para a elaboração de medidas
não privativas de liberdade, versando, destarte, sobre a política pública do desencarceramento.

RECOMPENSAS

As recompensas são os benefícios concedidos ao preso por seu merecimento, em função


do bom comportamento, de sua colaboração com a disciplina e dedicação ao trabalho.
São recompensas:
I - o elogio. É feito de forma verbal, mas anotado no prontuário do preso.
II - a concessão de regalias. Trata-se da concessão de privilégios ao preso, de modo transparente,
baseados em critérios preestabelecidos. Exemplos: TV na cela, aparelho de som, etc.
A legislação local e os regulamentos estabelecerão a natureza e a forma de concessão de regalias.

Transferência de presos

O art. 103 da LEP prevê o direito de o preso cumprir pena em local próximo ao seu meio social e familiar.
Não se trata, porém, de um direito absoluto, podendo ser afastado em função do interesse da
administração do presídio e da segurança social.
Em suma, o preso não tem o direito de escolher o local onde cumprirá a pena, mas, sempre que possível,
com vistas à sua ressocialização e em atenção ao princípio da dignidade da pessoa humana, deve ser atendida
a sua pretensão de cumprir a pena em estabelecimento penal próximo aos seus familiares, desde que revele
bom comportamento carcerário.
Os interesses do preso, em querer cumprir a pena próximo ao seu meio social e familiar, não pode,
porém, sobrepor-se aos interesses da administração do presídio, de modo que o disposto no art. 103 da LEP
não é um direito absoluto.
Por outro lado, a transferência de presos para estabelecimentos penais federais de segurança máxima
é regida pela lei 11.671/2008.
A sua transferência para outro presídio é decidida de acordo com a conveniência da administração
prisional pela autoridade judicial encarregada da execução da pena.
Aliás, de acordo com o STJ, as razões da decisão do juiz estadual que ordena a transferência do preso
para presídio federal de segurança máxima não podem ser questionadas pelo juízo federal.

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De fato, compete à autoridade judicial responsável pela execução da pena decidir pela transferência ou
não do apenado de um presídio para outro.
Sobre a transferência de presos, dispõe a Súmula 639 do STJ:
“Não fere o contraditório e o devido processo decisão que, sem ouvida prévia da defesa, determine
transferência ou permanência de custodiado em estabelecimento penitenciário federal”.
É possível, porém, o contraditório diferido ou postergado, onde o preso poderá questionar
judicialmente a legalidade extrínseca de sua transferência.

DISCIPLINA

Disposições gerais

A disciplina consiste na colaboração com a ordem, mediante obediência às determinações das


autoridades e seus agentes e no desempenho do trabalho.
Estão sujeitos à disciplina o condenado à pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos e o preso
provisório.
Não haverá falta nem sanção disciplinar sem expressa e anterior previsão legal ou regulamentar (art. 45
da LEP).
É, pois, vedada a retroatividade da norma que institui a falta ou sanção disciplinar, por força do princípio
da anterioridade.
O art. 45 ainda consagra o princípio da legalidade.
A legislação local especificará as leves e médias, bem assim as respectivas sanções (art. 49 da LEP). A
expressão ‘legislação local’ deve ser interpretada como sendo a lei estadual e as normas administrativas
estaduais, como os decretos, resoluções regimento interno do presídio, etc., pois o art. 45 da LEP faz menção
à previsão regulamentar, dispensando-se, destarte, a exigência de uma lei formal. Assim, o princípio da
legalidade, em relação às faltas leves e médias, é amenizado.
As faltas graves, porém, dependem de lei federal, conforme se deduz, a “contrario sensu”, da
interpretação do art. 49 da LEP, sendo taxativo o seu rol, vedando-se a analogia.
O condenado ou denunciado, no início da execução da pena ou da prisão, será cientificado das normas
disciplinares.
O poder disciplinar, na execução da pena privativa de liberdade, será exercido pela autoridade
administrativa conforme as disposições regulamentares.

FALTA DISCIPLINAR

Conceito

Entende-se por falta disciplinar a inobservância das normas de comportamento.

Espécies

As faltas disciplinares classificam-se em leves, médias e graves.


Trata-se de uma infração administrativa de atentado ou empreendimento, pois se pune a tentativa com
a sanção correspondente à falta consumada.

Rol das faltas graves

Sobre a falta grave, durante o cumprimento da pena privativa de liberdade, o art. 50 da LEP prevê as
seguintes:

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I - incitar ou participar de movimento para subverter a ordem ou a disciplina.


II - fugir.
A fuga configura falta grave de natureza permanente, porquanto o ato de indisciplina se prolonga no
tempo, até a recaptura do apenado. Por consequência, o termo inicial da prescrição desta falta grave só se
inicia com a recaptura do foragido.
III - possuir, indevidamente, instrumento capaz de ofender a integridade física de outrem. Exemplo:
estilete, faca, pedaço de pau, arma de fogo, etc.
O reconhecimento de falta grave prevista no artigo 50, III, da Lei 7.210/1984 dispensa a realização de
perícia no objeto apreendido para verificação da potencialidade lesiva, por falta de previsão legal (STJ).
IV - provocar acidente de trabalho.
V - descumprir, no regime aberto, as condições impostas.
VI - inobservar os deveres previstos nos incisos II e V, do artigo 39, desta Lei.
O inciso II do art. 39 prevê o dever de obediência ao servidor e respeito a qualquer pessoa com quem
deva relacionar-se.
É assim falta grave a desobediência aos agentes penitenciários (atualmente denominados policiais
penais). Exemplo: inobservância do perímetro estabelecido para monitoramento de tornozeleira eletrônica.
Outro exemplo: a utilização de tornozeleira eletrônica sem bateria suficiente, bem como o rompimento da
tornozeleira eletrônica. Mais um exemplo: a posse de drogas no curso da execução penal, ainda que para uso
próprio, também constitui falta grave.
O inciso V do art. 39, por sua vez, cuida da execução do trabalho, das tarefas e das ordens recebidas. A
recusa injustificada ao trabalho também constitui falta grave.
VII – tiver em sua posse, utilizar ou fornecer aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a
comunicação com outros presos ou com o ambiente externo.
É prescindível a perícia de aparelho celular apreendido para a configuração da falta disciplinar de
natureza grave do artigo 50, VII, da Lei 7.210/1984.
O STJ já decidiu que a conduta consistente na apreensão de bateria de celular, micro cartões de
memória e de adaptadores USB, após a regular instauração de Procedimento Administrativo Disciplinar, no
qual a defesa foi plenamente exercida, configura a falta disciplinar de natureza grave prevista no art. 50, VII,
da Lei de Execuções Penais” (AgInt no HC 532.846/SC, j. 03/12/2019).
O julgado acima, data venia, viola o princípio da reserva legal, pois a falta grave não engloba a posse de
baterias, carregadores e outros acessórios que possam viabilizar ou facilitar o uso dos aparelhos de
comunicação, sendo vedada a analogia.
VIII – recusar submeter-se ao procedimento de identificação do perfil genético.
O art. 52 da LEP também considera como falta grave a prática de crime doloso no curso da execução
penal.
A súmula 526 do STJ dispõe que a prática de crime doloso constitui falta grave, independentemente do
trânsito em julgado da condenação por este crime.
Valiosas opiniões visualizam nesta súmula 526 a violação do princípio da presunção da inocência.
No tocante à pena restritiva de direitos, de acordo com o art. 51 da LEP, comete falta grave o condenado
que:
I - descumprir, injustificadamente, a restrição imposta;
II - retardar, injustificadamente, o cumprimento da obrigação imposta;
III - inobservar os deveres previstos nos incisos II e V, do artigo 39, desta Lei. Trata-se do dever de
obediência ao servidor e respeito a qualquer pessoa com quem deva relacionar-se, outrossim, do dever de
execução do trabalho, das tarefas e das ordens recebidas.

Consequências da falta grave

A prática de falta grave pode gerar dois tipos de consequências:


a) sanções administrativas disciplinares. São impostas pelo diretor do estabelecimento penal, à exceção
da inclusão no regime disciplinar diferenciado, que depende de decisão judicial.

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b) sanções judiciais. São impostas pelo juiz da execução penal.


No tocante às sanções disciplinares, a sua imposição só pode ser feita através de processo
administrativo disciplinar.
Em relação às sanções judiciais, há duas correntes:
Primeira, o juiz da execução penal só poderá impô-las após a falta grave ser reconhecida em processo
administrativo disciplinar.
Segunda, que é a dominante, o juiz da execução penal pode aplicá-las, independentemente da
instauração ou do resultado do processo administrativo disciplinar, por força do princípio da inafastabilidade
da jurisdição, outrossim, pelo fato de não se poder subordinar a decisão judicial ao resultado de uma decisão
administrativa, de tal sorte que a condenação ou absolvição administrativa não impede o juiz da execução
penal de decidir de forma diferente.
De fato, de acordo com o STJ, o procedimento administrativo disciplinar, que é instaurado pelo diretor
do presídio, tem por objetivo a aplicação de sanções disciplinares, mas não interfere nas consequências que
extravasam a esfera administrativa, como é o caso, por exemplo, da determinação da regressão do regime
(art. 118, I, da LEP), da perda dos dias remidos (art. 127, da LEP), e da suspensão do benefício de livramento
condicional (art. 145, da LEP), que são medidas concernentes ao controle jurisdicional do cumprimento da
pena e que não podem ficar jungidas à discricionária atuação da autoridade administrativa.
A propósito, decidiu o Tribunal da Cidadania:
“O condicionamento da atuação do Juízo da Execução à decisão da Comissão Disciplinar implica
inaceitável subordinação do Judiciário à Autoridade Administrativa.
É certo que a Lei de Execução Penal atribui ao diretor do estabelecimento prisional o poder de apurar e
aplicar sanções disciplinares.
Contudo, há faltas que, quando praticadas no curso da execução da pena, geram consequências que
extravasam a esfera administrativa da disciplina prisional.
É o caso, por exemplo, da determinação da regressão do regime (art. 118, I, da LEP), da perda dos dias
remidos (art. 127, da LEP), e da suspensão do benefício de livramento condicional (art. 145, da LEP), que são
medidas concernentes ao controle jurisdicional do cumprimento da pena e que não podem ficar jungidas à
discricionária atuação da autoridade administrativa.
Por outro lado, consoante prevê o art. 67, da LEP, cabe ao Ministério Público a função de fiscalizar a
execução penal, tanto no âmbito administrativo, quanto na seara judicial, tendo por obrigação provocar o
Poder Judiciário, na hipótese de vislumbrar algum ilícito no curso da execução.
Dessa forma, vincular a esfera judicial à decisão obtida no âmbito administrativo, seja qual for ela –
absolvição ou condenação –, de modo a impedir o Parquet de fiscalizar a execução da pena, é violar a sua
competência institucional, além de afrontar o Princípio Constitucional da Inafastabilidade da Jurisdição,
positivado no inciso XXXV, do art. 5º, da Carta Magna.
Não se pode aceitar a submissão do Judiciário à esfera administrativa, nem tampouco é admissível
restringir a competência legal do Ministério Público, sendo, em todo caso, inafastável o direito constitucional
de acesso à jurisdição” (HC 418.569/RS, j. 26/06/2018).

Consequências judiciais da falta grave

No tocante às consequências judiciais, ao tomar conhecimento da falta grave, a autoridade


administrativa representará ao Juiz da execução para os fins dos artigos 118, inciso I, 125, 127, 181, §§ 1º,
letra d, e 2º desta Lei.
Vê-se assim que a falta grave gera, dentre outras, as seguintes consequências judiciais:
a) regressão obrigatória de regime (art. 118, I).
O cometimento de falta grave durante a execução penal autoriza a regressão do regime de
cumprimento de pena, mesmo que seja estabelecido de forma mais gravosa do que a fixada na sentença
condenatória (artigo 118, I, da Lei de Execução Penal - LEP), não havendo falar em ofensa à coisa julgada,
sendo possível inclusive à regressão “por salto”, que é a passagem do regime aberto para o fechado.

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Na regressão por falta grave, o § 2º do art. 118 da LEP exige a prévia oitiva do condenado.
É dispensável, porém, nova oitiva do apenado antes da homologação judicial da falta grave, se
previamente ouvido em procedimento administrativo disciplinar, em que foram assegurados o contraditório
e a ampla defesa STJ).
Outra corrente, porém, exige a oitiva em juízo, ainda que já tenha ocorrido a oitiva no processo
administrativo disciplinar.
No tocante à regressão cautelar, é perfeitamente possível sem a prévia oitiva do preso, que será,
entretanto, necessária para a regressão definitiva.
b) revogação do direito de saída temporária (art. 125);
c) perda de até 1/3 (um terço) do tempo temido (art. 127);
d) conversão em prisão da pena de prestação de serviços à comunidade (art. 181, §1º, d);
e) conversão em prisão da pena de limitação de fim de semana (art. 181, §2º);
f) interrupção do prazo para a progressão de regime (art. 112 da LEP). O STJ, porém, após a falta grave,
admite o reinício da contagem do prazo, ou seja, a fixação de novo termo inicial para progredir.
A propósito, a súmula 534 do STJ:
“A prática de falta grave interrompe a contagem do prazo para a progressão de regime de cumprimento
de pena, o qual se reinicia a partir do cometimento dessa infração”.
g) A falta grave pode ser utilizada para se verificar o cumprimento do requisito subjetivo necessário
para a concessão de benefícios da execução penal.
h) A falta grave é justificativa idônea para a realização de exame criminológico para fins de progressão
de regime.

Não interrupção do prazo para obtenção de benefícios

A prática de falta grave, salvo nos casos expressos em lei, não interrompe o prazo para a obtenção dos
benefícios previstos na Lei de Execução Penal, embora seja motivo para o indeferimento do pedido.
O indeferimento, porém, não será baseado na ausência do preenchimento do requisito temporal, mas,
sim, na falta de merecimento.
Assim, a prática de falta grave não interrompe o prazo para fim de livramento condicional, comutação
de pena ou indulto (súmulas 441 e 535 do STJ).
Por falta da previsão legal, também não interrompe o prazo para obtenção do direito de saída
temporária e trabalho externo.
Ou seja, não há, diante da falta grave, a alteração do marco inicial para a concessão de livramento
condicional, indulto e comutação da pena e de outros benefícios, à exceção da progressão de regime.
Entretanto, o preso que cometeu falta grave nos dozes meses anteriores ao pedido de livramento
condicional não poderá obter o aludido benefício (Lei 13.964/19).
Acrescente-se ainda que a falta grave praticada no período estabelecido pelos decretos presidenciais
de indulto ou de comutação da pena, impede também estes benefícios (STJ).

Reabilitação da falta grave

A reabilitação é o lapso de tempo necessário para que a falta disciplinar deixe de ser obstáculo à
concessão do atestado de bom comportamento carcerário.
No tocante à falta grave, o assunto, para fins de progressão de regime, é disciplinado pelo §7º do art.
112 da LEP, introduzido pela Lei 13.964/2019, que dispõe:
“O bom comportamento é adquirido após 1 (um) ano da ocorrência do fato, ou antes, após o
cumprimento do requisito temporal exigível para a obtenção do benefício”.
O prazo de 1 (um ano) é contado da prática da falta grave e não do término do cumprimento da
respectiva sanção disciplinar que dela se originou.
Se, porém, antes do prazo de 1 (um) ano, o condenado, que havia cometido falta grave, preencher o
lapso temporal exigível para a obtenção do benefício da progressão de regime, também poderá ser expedido

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o atestado de bom comportamento carcerário.


Em suma, a reabilitação por falta grave, para o fim de progressão, se verifica com o decurso do prazo
de 1 (um) ano ou pelo cumprimento do requisito temporal exigível para a obtenção da progressão, devendo
prevalecer o que ocorrer primeiro, sendo ambos os lapsos temporais contados a partir da ocorrência do fato
tipificado como falta grave.
Por outro lado, é a legislação e regulamentos estaduais ou federal, conforme se trate de presídio
estadual ou federal, que disciplinam a reabilitação por falta média e leve. Outrossim, a reabilitação por falta
grave que não seja para o fim de progressão.
Nos presídios federais, o art. 81 do decreto 6.049/2007 dispõe que o preso terá os seguintes prazos para
reabilitação da conduta, a partir do término do cumprimento da sanção disciplinar:
I - três meses, para as faltas de natureza leve;
II - seis meses, para as faltas de natureza média;
III - doze meses, para as faltas de natureza grave; e
IV - vinte e quatro meses, para as faltas de natureza grave que forem cometidas com grave violência à
pessoa ou com a finalidade de incitamento à participação em movimento para subverter a ordem e a disciplina
que ensejarem a aplicação de regime disciplinar diferenciado.
De acordo com o STJ, as faltas graves cometidas em período longínquo e já reabilitadas não configuram
fundamento idôneo para indeferir o pedido de progressão de regime ou de outros benefícios.
Esta tese se fundamenta nos princípios da razoabilidade e da ressocialização da pena e no direito ao
esquecimento.

SANÇÕES DISCIPLINARES

Conceito

Sanções disciplinares são as penalidades administrativas previstas para a prática de faltas leves, médias
e graves.

Vedações

São vedadas:
a) as sanções com o emprego de cela escura.
b) as sanções coletivas. Assim, ainda que se trate de falta grave, em autoria coletiva, por exemplo,
celular apreendido na cela e nenhum dos presos assume a autoria, é preciso individualizar a conduta de cada
um dos eventuais participantes.
c) as sanções que poderão colocar em perigo a integridade física e moral do preso.

Espécies

Constituem sanções disciplinares:


I - advertência verbal.
É anotada no prontuário do preso.

II - repreensão.
Trata-se da admoestação por escrito.

III - suspensão ou restrição de direitos mencionados no art. 41, parágrafo único, da LEP.
A duração máxima da suspensão é de trinta dias.
Não se trata, portanto, da perda definitiva de direitos.
Os direitos que podem ser suspensos ou restringidos são apenas seguintes:

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a) proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação;


b) - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados;
c) - contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de
informação que não comprometam a moral e os bons costumes.

IV - isolamento na própria cela, ou em local adequado, nos estabelecimentos que possuam alojamento
coletivo, observado o disposto no artigo 88 desta Lei.
O isolamento não pode falar exceder trinta dias.
O isolamento não é a incomunicabilidade do preso.
O isolamento será sempre comunicado ao Juiz da execução.
A autoridade administrativa poderá decretar o isolamento preventivo do faltoso pelo prazo de até dez
dias, que será computado no período de cumprimento da sanção disciplinar.

V - inclusão no regime disciplinar diferenciado.


Convém observar que a incomunicabilidade do preso não é catalogada como sanção disciplinar.

Atribuição para aplicação

As sanções dos incisos I a IV do art. 53 serão aplicadas por ato motivado do diretor do estabelecimento
e a do inciso V, por prévio e fundamentada decisão do juiz competente.
Assim, à exceção da inclusão no regime disciplinar diferenciado, todas as demais sanções disciplinares
são aplicadas pelo diretor do estabelecimento penal.
Nas faltas graves, aplicam-se as sanções previstas nos incisos III a V do art. 53 desta Lei, ou seja,
suspensão ou restrição de direitos e o isolamento.
Nas faltas leves e médias, aplicam-se as sanções de advertência e repreensão.

Procedimento administrativo disciplinar

A falta disciplinar, para ensejar sanções disciplinares, exige a instauração de um procedimento


administrativo disciplinar, com direito à ampla defesa, exercida através de advogado ou defensor público.
Sobre o assunto, dispõe a súmula 533 da Súmula do STJ:
“Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da execução penal é imprescindível a
instauração de procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional, assegurado o direito
de defesa, a ser realizado por advogado constituído ou defensor público nomeado”.
A aludida súmula 533 também se aplica à falta disciplinar cometida fora do presídio, pois não há
qualquer ressalva sobre esta hipótese.
Quanto à súmula vinculante número 5 do STF, que preceitua que a falta de defesa técnica por advogado
no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição, é inaplicável ao processo administrativo
disciplinar instaurado no âmbito da execução penal.
A decisão que reconhece a falta disciplinar no processo administrativo disciplinar é ato administrativo
e, portanto, se sujeita ao controle de legalidade do Poder Judiciário.
Por fim, no processo administrativo disciplinar, não há obrigatoriedade de que o interrogatório do
sentenciado seja o último ato da instrução, bastando que sejam respeitados o contraditório e a ampla defesa,
e que um defensor esteja presente (STJ).

Prescrição da falta disciplinar

O prazo prescricional para se instaurar o procedimento, à mingua de previsão legal, é de três anos, que
é o menor prazo prescricional do Código Penal, a contar da prática da falta disciplinar, mas, quando esta
consistir na fuga, o termo inicial da prescrição será a data da recaptura.

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A propósito, firmou-se no STJ a seguinte tese:


“As Turmas que compõem a Terceira Seção desta Corte firmaram o entendimento de que, em razão da
ausência de legislação específica, a prescrição da pretensão de se apurar falta disciplinar, cometida no curso
da execução penal, deve ser regulada, por analogia, pelo prazo do art. 109 do Código Penal, com a incidência
do menor lapso previsto, atualmente de três anos, conforme dispõe o inciso VI do aludido artigo. 3. In casu,
conforme consta do voto condutor do acórdão impugnado, a falta grave foi cometida em 4/4/2017 (fuga em
26/12/2013, com recaptura do sentenciado em 4/4/2017), tendo sido determinada a instauração de
procedimento administrativo disciplinar para a respectiva apuração. 4. O termo inicial do prazo prescricional,
no caso de fuga, é a data da recaptura, por ser uma infração disciplinar de natureza permanente (HC n.
362.895/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, Quinta Turma, julgado em 14/2/2017, DJe 22/2/2017). 5. A conduta
foi praticada após a edição da Lei n. 12.234/2010, cujo menor lapso prescricional é de 3 anos, prazo ainda não
implementado” (HC 527.625/SP, j. 12/11/2019).

REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO (RDD)

Introdução

O Regime Disciplinar Diferenciado surgiu para conter o poder de organização das facções criminosas,
através do isolamento de seus líderes, por até 360 (trezentos e sessenta) dias.

Discussão sobre a constitucionalidade

Uma corrente sustenta a inconstitucionalidade do instituto, alegando que se trata de pena cruel,
desumana e degradante e por isso viola o princípio da dignidade da pessoa humana.
Outrossim, por afrontar a coisa julgada, à medida que altera o regime imposto na sentença.
Outra corrente proclama a sua constitucionalidade, pois não se trata de uma forma cruel de
cumprimento da pena, mas, sim, de uma medida que visa cumprir os ditames do princípio da
proporcionalidade da pena, com vistas à garantia da ordem e segurança do estabelecimento penal e da
sociedade.
Outrossim, que não há qualquer ofensa à coisa julgada, pois não se trata de um novo regime de pena,
mas de uma forma de se cumprir o regime fechado.

Conceito

O Regime Disciplinar Diferenciado é a sanção disciplinar que consiste no isolamento do preso, cumulada
com a suspensão e a restrição de determinados direitos.
Anote-se que, apenas no regime disciplinar diferenciado, o isolamento, a suspensão e a restrição de
direitos podem exceder a 30 (trinta) dias (art. 58 da LEP).

Competência

O RDD só pode ser decretado pelo juízo da execução penal.


Em se tratando de preso provisório, uma parcela da doutrina sustenta que a competência seria do juiz
do processo de conhecimento, mas prevalece que também é do juiz da execução penal, por força do art. 65
da LEP.

Natureza jurídica

Batizado doutrinariamente de regime “fechadíssimo”, na verdade, não se trata de um novo regime


penitenciário, mas de uma forma de se cumprir o regime fechado.
Reveste-se da natureza jurídica de sanção disciplinar, conforme se depreende da análise do art. 53 da

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LEP.
Faz parte do direito penitenciário, e não propriamente do direito penal, razão pela qual, conquanto mais
severa, a nova lei tem aplicação imediata, abrangendo também fatos anteriores à sua vigência.

Características
As características desse regime, conforme art. 52 da LEP, são:
I - duração máxima de até 2 (dois) anos, sem prejuízo de repetição da sanção por nova falta grave de
mesma espécie;

II - recolhimento em cela individual;

III - visitas quinzenais, de 2 (duas) pessoas por vez, a serem realizadas em instalações equipadas para
impedir o contato físico e a passagem de objetos, por pessoa da família ou, no caso de terceiro, autorizado
judicialmente, com duração de 2 (duas) horas.
As visitas serão gravadas em sistemas de áudios ou de áudios e vídeos e, com autorização judicial,
fiscalizadas por agentes penitenciários (§ 6º do art. 52 da LEP).
Após os primeiros 6 (seis) meses de regime disciplinar diferenciado, o preso que não receber visita
poderá, após prévio agendamento, ter contato telefônico, que será gravado, com uma pessoa da família, 2
(duas) vezes por mês e por 10 (dez) minutos (art. 52, §7º da LEP).

IV - direito do preso à saída da cela por 2 (duas) horas diárias para banho de sol, em grupos de até 4
(quatro) presos, desde que não haja contato com presos do mesmo grupo criminoso;

V - entrevistas sempre monitoradas, exceto aquelas com seu defensor, em instalações equipadas para
impedir o contato físico e a passagem de objetos, salvo expressa autorização judicial em contrário;

VI - fiscalização do conteúdo da correspondência;


VII - participação em audiências judiciais preferencialmente por videoconferência, garantindo-se a
participação do defensor no mesmo ambiente do preso.

Fatos autorizadores do ingresso no RDD

São três os fatos autorizadores do ingresso no sobredito regime:


I — Prática de fato previsto como crime doloso, que ocasione subversão da ordem ou disciplinas
internas (art. 52, “caput”, da LEP). Não basta, como se vê, a prática do crime doloso, sendo ainda necessária a
subversão, isto é, o tumulto da ordem (organização) ou disciplina (obediência às normas e aos superiores) do
presídio.
Não é preciso o trânsito em julgado da condenação para o ingresso no RDD, sendo suficiente a prática
do crime.
Inegável o caráter cautelar da medida extrema, cuja frustração seria fatal se a lei tivesse exigido o
trânsito em julgado.
Quanto ao crime preterdolo, nada mais é que um crime doloso com resultado culposo e, por isso,
também justifica a inclusão no RDD.
Igualmente, é possível o RDD em caso de crime tentado, que ocasione subversão da ordem ou disciplinas
internas, por força do parágrafo único do art. 50 da LEP, que confere à tentativa a mesma sanção disciplinar
prevista para a falta disciplinar consumada.
II — Apresentação de alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade
(§1º, I, do art. 52 da LEP).
III — quando houver fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em
organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada, independentemente da prática de falta grave
(§1º, II, do art. 52 da LEP).

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Destinatários

A LEP autoriza a inclusão no Regime Disciplinar Diferenciado tanto para os presos provisórios quanto
para os presos definitivos, nacionais ou estrangeiros.
Saliente-se, ainda, que, malgrado a omissão da lei, o ingresso no regime disciplinar diferenciado é tão
somente para quem se encontra no regime fechado, ou cujo prognóstico seja de cumprimento da pena nesse
regime, quando se tratar de preso provisório, sendo incoerente, sem a prévia regressão, incluir no regime
excepcional os presos que se encontram no semiaberto ou aberto.

Prorrogação do RDD

A prorrogação é o prolongamento do RDD, após a expiração do prazo inicialmente fixado.

De acordo com o §4º do art. 52 da LEP, o regime disciplinar diferenciado poderá ser prorrogado
sucessivamente, por períodos de 1 (um) ano, existindo indícios de que o preso:
I - continua apresentando alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal de origem
ou da sociedade;
II - mantém os vínculos com organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada,
considerados também o perfil criminal e a função desempenhada por ele no grupo criminoso, a operação
duradoura do grupo, a superveniência de novos processos criminais e os resultados do tratamento
penitenciário.
Cada período de prorrogação deve ser no máximo de 1 (um) ano, mas se os fatos acima persistirem
poderá ocorrer uma nova prorrogação de 1 (um) ano e assim sucessivamente.
Não há, pois, limite ao número de prorrogações, que não poderá, porém, exceder o tempo de
cumprimento da pena.
Vê-se assim que, em caso de prorrogação, a duração do RDD pode ultrapassar o período de 2 (dois)
anos.
A rigor, é possível permanecer no RDD durante todo o tempo de cumprimento da pena, desde que
persistam os fatores de sua prorrogação.

Local do cumprimento do RDD

Em regra, o RDD é cumprido no próprio presídio onde o preso cumpre a pena.


Entretanto, o regime disciplinar diferenciado será obrigatoriamente cumprido em estabelecimento
prisional federal nas seguintes hipóteses (§3º do art. 52 da LEP):
a) quando houver indícios de que o preso exerce liderança em organização criminosa, associação
criminosa ou milícia privada;
b) quando o preso tiver atuação criminosa em 2 (dois) ou mais Estados da Federação.
Nestas hipóteses, o regime disciplinar diferenciado deverá contar com alta segurança interna e externa,
principalmente no que diz respeito à necessidade de se evitar contato do preso com membros de sua
organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada, ou de grupos rivais (art. 52, §5º, da LEP).
A competência para determinar a transferência para o presídio federal de segurança máxima é do juiz
responsável pela execução da pena e não poderá ser alterada pelo juiz federal corregedor do presídio federal.
Esta transferência. nos termos da súmula 639 do STJ, poderá ser preventiva, sem ouvir previamente o
preso, que poderá, entretanto, impugná-la posteriormente, assegurando-se, destarte, o contraditório
posterior ou diferido.

O regime disciplinar diferenciado preventivo

O art. 60, 2ª parte, da LEP autoriza o Juiz da execução penal a incluir o preso no regime disciplinar
diferenciado, de forma preventiva, no interesse da disciplina e da averiguação do fato, pelo prazo máximo de

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10 (dez) dias, sem possibilidade de prorrogação ou de nova decretação preventiva pelo mesmo fundamento.
Escoado o decênio, como esclarece Renato Flávio Marcão, ou se determina a inclusão no regime
disciplinar diferenciado, conforme regulado no art. 52, ou se restitui ao preso sua normal condição de
encarcerado.
A decretação do Regime Disciplinar Diferenciado Preventivo depende de fumus boni iuris e periculum
in mora acerca dos fatos autorizadores da sua inclusão definitiva.
O tempo de isolamento ou inclusão preventiva no regime disciplinar diferenciado será computado no
período de cumprimento do regime disciplinar definitivo (art. 60, parágrafo único, da LEP).

Procedimento

O juiz não pode, de ofício, determinar a inclusão do preso no regime disciplinar diferenciado.
O pedido de inclusão no regime disciplinar diferenciado só pode ser formulado pelo diretor do presídio
ou outra autoridade administrativa, como o Secretário da Segurança Pública e o Secretário da Administração
Penitenciária, mediante requerimento fundamentado (§1º do art. 54 da LEP).
O Ministério Público não tem legitimidade para postular a inclusão no regime disciplinar diferenciado,
malgrado opiniões contrárias, que o enquadram como autoridade administrativa.
O pedido é dirigido ao Juiz da execução, que dará vista dos autos ao Ministério Público e à defesa,
sucessivamente, no prazo máximo de 15 (quinze) dias para cada um.
Em seguida, o Juiz decidirá, podendo a sua decisão ser impugnada por agravo de execução.

ORGÃOS DA EXECUÇÃO PENAL

Regras de Mandela

As Regras de Mandela apregoam que deve haver um sistema duplo de inspeções regulares nos
estabeleci- mentos e serviços prisionais:
a) Inspeções internas ou administrativas conduzidas pela própria administração prisional;
b) Inspeções externas conduzidas por um órgão independente da administração prisional, que pode
incluir órgãos internacionais ou regionais competentes.
Cumpre desde já destacar a existência de órgãos internacionais e regionais de inspeção nos
estabelecimentos prisionais, que serão abordados mais adiante, por ocasião do estudo do Protocolo de
Istambul.

Rol dos órgãos da execução penal

De acordo com o art. 61 da LEP, são oito os órgãos da execução penal:


I - o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária;
II - o Juízo da Execução;
III - o Ministério Público;
IV - o Conselho Penitenciário;
V - os Departamentos Penitenciários;
VI - o Patronato;
VII - o Conselho da Comunidade.
VIII - a Defensoria Pública.

No LEP, como se vê, não há apenas um órgão independente de inspeção e fiscalização externa, mas,
sim, oito.
De fato, os oito órgãos da execução penal acima mencionados têm em comum os seguintes atributos:
a) a função de inspecionar e fiscalizar os estabelecimentos penais, podendo, inclusive, fazer registros
fotográficos;

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b) são órgãos externos e independentes da administração prisionais, à qual não se encontram


subordinados;
c) são órgãos independentes entre si, pois não há subordinação entre um e outro órgão. exceto o
Patronato e Conselho de Comunidade, que, segundo a doutrina, se classificam como órgãos auxiliares do juízo
da execução penal.

Conteúdo da função de inspecionar e fiscalizar

Em sua função de inspecionar e fiscalizar os estabelecimentos penais, os oito órgãos acima têm
autoridade para:
a) ter acesso a todas as informações sobre o estabelecimento penal e detentos. Exemplo: acesso sobre
o número de reclusos;
b) ter acesso a todos os locais de detenção;
c) ter acesso à informação relevante sobre o tratamento dos reclusos, incluindo os seus registos e as
condições de detenção;
d) realizar visitas por iniciativa própria sem aviso prévio;
e) entrevistar os reclusos e funcionários prisionais, em total privacidade e confidencialidade, durante
as suas visitas;
f) depois de uma inspeção, devem elaborar um relatório escrito à autoridade competente.
g) empreender esforços para tornar público os relatórios das inspeções externas, excluindo-se qualquer
dado pessoal dos reclusos, a menos que estes tenham dado explicitamente o seu acordo.
h) fazer recomendações à administração prisional e a outras autoridades competentes.
A administração prisional ou qualquer outra autoridade competente, por sua vez, deve indicar, num
prazo razoável, se as recomendações provindas das inspeções externas serão implementadas.
Estas funções também se aplicam aos órgãos de prevenção da tortura, criados com base no Protocolo
de Istambul, que são os seguintes:
a) Subcomitê Internacional de Prevenção e Combate à Tortura;
b) Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura - CNPCT;
c) Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura - MNPCT.
É ainda possível a criação de Comitês e Mecanismos Estaduais e Distrital de Prevenção e Combate à
Tortura.

CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIO

O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), com sede na Capital da República, é
subordinado ao Ministério da Justiça, tendo atuação tanto em âmbito federal quanto estadual.
Trata-se do primeiro órgão da execução, cujas funções principais são:
a) elaborar o Plano Nacional de Política Criminal e Penitenciária, quanto à prevenção do delito,
administração da justiça criminal e execução das penas e das medidas de segurança.
Estas diretrizes, que devem ser cumpridas por todos os Estados, estão previstas na Resolução 16/2003
do CNPCP.
b) realizar avaliação periódica do sistema penitenciário;
c) realizar inspeções em estabelecimentos prisionais de todo o país;
d) preparar a minuta do decreto de indulto, que será encaminhada ao Ministro da Justiça que, por sua
vez, caso a acolha, submeterá à apreciação do Presidente da República, que poderá ou não aprová-la. Convém
esclarecer que a competência para a expedição do decreto de indulto é do Presidente da República.
É composto por 13 (treze) membros nomeados e selecionados pelo Ministério da Justiça, com mandato
de 2 (dois) anos, renovado 1/3 (um terço) em cada ano.
Assim. todos os anos, um terço do Conselho é renovado, com a posse de novos membros.
É um órgão multidisciplinar, pois deve ser formado por profissionais de diversas áreas
Com efeito, a escolha deve recair sobre professores e profissionais da área do Direito Penal, Processual

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Penal, Penitenciário e ciências correlatas, bem como por representantes da comunidade e dos Ministérios da
área social.
De acordo com o art. 64 da LEP, ao Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, no exercício
de suas atividades, em âmbito federal ou estadual, incumbe:
I - propor diretrizes da política criminal quanto à prevenção do delito, administração da Justiça Criminal
e execução das penas e das medidas de segurança;
II - contribuir na elaboração de planos nacionais de desenvolvimento, sugerindo as metas e prioridades
da política criminal e penitenciária;
III - promover a avaliação periódica do sistema criminal para a sua adequação às necessidades do País;
IV - estimular e promover a pesquisa criminológica;
V - elaborar programa nacional penitenciário de formação e aperfeiçoamento do servidor;
VI - estabelecer regras sobre a arquitetura e construção de estabelecimentos penais e casas de
albergados;
VII - estabelecer os critérios para a elaboração da estatística criminal;
VIII - inspecionar e fiscalizar os estabelecimentos penais, bem assim informar-se, mediante relatórios
do Conselho Penitenciário, requisições, visitas ou outros meios, acerca do desenvolvimento da execução penal
nos Estados, Territórios e Distrito Federal, propondo às autoridades dela incumbida as medidas necessárias
ao seu aprimoramento;
IX - representar ao Juiz da execução ou à autoridade administrativa para instauração de sindicância ou
procedimento administrativo, em caso de violação das normas referentes à execução penal;
X - representar à autoridade competente para a interdição, no todo ou em parte, de estabelecimento
penal.
O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária ainda determinará o limite máximo de
capacidade do estabelecimento, atendendo a sua natureza e peculiaridades.

JUÍZO DA EXECUÇÃO

O segundo órgão da execução penal, é o juiz da execução penal.


A execução penal competirá ao Juiz indicado na lei local de organização judiciária e, na sua ausência, ao
da sentença.
Além das funções processuais, o juiz da execução penal também acumula a função administrativa de
Corregedor de Presídios e dos demais estabelecimentos penais
Exerce, pois, as seguintes funções administrativas, previstas no art. 66, VI a X da LEP:
a) zelar pelo correto cumprimento da pena e medida de segurança,
b) inspecionar, pessoalmente e mensalmente, os estabelecimentos penais, tomando providências para
o adequado funcionamento, conforme também prevê a Resolução 47/2007 do Conselho Nacional de Justiça;
c) instaurar processo administrativo disciplinar para a apuração de responsabilidade das irregularidades
detectadas nas inspeções dos estabelecimentos penais;
d) interditar, no todo ou em parte, estabelecimento penal que estiver funcionando em condições
inadequadas ou com infringência aos dispositivos da LEP;
e) compor e instalar o Conselho da Comunidade.
f) emitir anualmente atestado de pena a cumprir, solicitado pelo preso.
Quanto à competência para a ação civil pública ou ação popular sobre questões relacionadas ao sistema
penitenciário, a melhor solução será a seguinte:
a) questão que versa sobre matéria que afeta apenas determinado presídio federal ou estadual. Nesse
caso, competência para a ação será do juiz da execução penal federal ou estadual, conforme a hipótese.
Exemplo: ação civil pública para questionar a validade da portaria do diretor de determinado presídio, que
proíbe a visita íntima.
b) questão que versa sobre matéria que afeta todos os presídios de determinado Estado-membro. Nesse
caso, a competência será do juiz da Fazenda Pública Federal ou Estadual, conforme se trate de presídio federal
ou estadual, pois a questão extrapola os interesses de determinado presídio.

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No tocante às funções processuais do juiz da execução penal, previstas no art. 66 da LEP, são as
seguintes:
I - aplicar aos casos julgados lei posterior que de qualquer modo favorecer o condenado.
Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao juízo das execuções a aplicação de lei mais
benigna (súmula 611 do STF).

II - declarar extinta a punibilidade.


Trata-se da extinção da punibilidade da pretensão executória, que se verifica após o trânsito em julgado
da sentença condenatória. Exemplo: prescrição executória.

III - decidir sobre:


a) soma ou unificação de penas.
A soma advém do concurso material de crimes ou do concurso formal impróprio.
A unificação emana do crime continuado e do concurso formal perfeito.
A soma e a unificação só serão julgadas pelo juízo da execução em relação às infrações penais que não
constaram do mesmo processo de conhecimento.
b) progressão ou regressão nos regimes.
Ainda que se trate de preso provisório, a competência será do juiz da execução penal.
c) detração e remição da pena.
A detração só será feita pelo juízo da execução quando não houver sido realizada no processo de
conhecimento.
d) suspensão condicional da pena.
A concessão do “sursis”, em regra, é na sentença do processo de conhecimento, mas a sua revogação é
matéria de execução.
Em algumas hipóteses excepcionais, poderá também ser concedido pelo juízo da execução.
e) livramento condicional.
Trata-se de um benefício concedido exclusivamente pelo juiz da execução penal.
f) incidentes da execução.

IV - autorizar saídas temporárias;

V - determinar:
a) a forma de cumprimento da pena restritiva de direitos e fiscalizar sua execução.
b) a conversão da pena restritiva de direitos e de multa em privativa de liberdade.
A multa, em hipótese alguma, poderá ser convertida em prisão, estando, pois, revogada a hipótese
acima, desde a Lei 9.268/96.
c) a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos;
d) a aplicação da medida de segurança, bem como a substituição da pena por medida de segurança;
e) a revogação da medida de segurança;
f) a desinternação e o restabelecimento da situação anterior;
g) o cumprimento de pena ou medida de segurança em outra comarca;
h) a remoção do condenado na hipótese prevista no §1º, do artigo 86, desta Lei.

MINISTÉRIO PÚBLICO

O Ministério Público, na execução penal, além das funções processuais, também exerce a função
administrativa de fiscalizar os estabelecimentos penais, visitando-os mensalmente, registrando a sua presença
em livro próprio (parágrafo único do art. 68 da LEP).
No âmbito processual, nos termos do art. 67 da LEP, o Ministério Público sempre deve se manifestar,
antes de o juiz decidir, inclusive, nos incidentes de execução, pois lhe é incumbida a função de fiscalizar a
execução da pena e da medida de segurança, velando pelo cumprimento do ordenamento jurídico.

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A ausência de manifestação do Ministério Público no processo de execução penal, para uns, gera a
nulidade absoluta da decisão, por violação do art. 67 da LEP e 127 da CF. Outros, ao revés, relativizam a
nulidade, que só será decretada mediante comprovação de prejuízo.
Em sua função de fiscal do ordenamento jurídico, deverá zelar pelo cumprimento dos direitos e deveres
dos condenados. manifestando-se de forma favorável ou desfavorável ao sentenciado, conforme este
preencha ou não os requisitos legais para obtenção do benefício pleiteado.
Ainda lhe é lícito formular pedidos em benefício do condenado. Exemplos: progressão de regimes,
livramento condicional, remição, prescrição, revogação da medida de segurança, etc.
Poderá igualmente recorrer em favor do preso. Exemplo: juiz da execução aplica o RDD por tempo
indeterminado.
É claro que também atuará contra o condenado, quando os interesses deste colidir com o ordenamento
jurídico. Exemplo: pedido de perda de 1/3 (um terço) do tempo remido em função da prática de falta grave.
De acordo com o art. 68 da LEP, cujo rol é meramente exemplificativo, incumbe ao Ministério Público:
I - fiscalizar a regularidade formal das guias de recolhimento e de internamento;
II - requerer:
a) todas as providências necessárias ao desenvolvimento do processo executivo;
b) a instauração dos incidentes de excesso ou desvio de execução;
c) a aplicação de medida de segurança, bem como a substituição da pena por medida de segurança;
d) a revogação da medida de segurança;
e) a conversão de penas, a progressão ou regressão nos regimes e a revogação da suspensão condicional
da pena e do livramento condicional;
f) a internação, a desinternação e o restabelecimento da situação anterior.
III - interpor recursos de decisões proferidas pela autoridade judiciária, durante a execução.

CONSELHO PENITENCIÁRIO

O Conselho Penitenciário é órgão consultivo e fiscalizador da execução da pena, que só atual nos
Estados e Distrito Federal.
Não se trata, portanto, de órgão de atuação nacional.
O Conselho será integrado por membros nomeados pelo Governador do Estado ou do Distrito Federal,
conforme a hipótese.
A sua composição é multidisciplinar, ou seja, de áreas distintas.
Ou seja, devem ser escolhidos dentre professores e profissionais da área do Direito Penal, Processual
Penal, Penitenciário e ciências correlatas, bem como por representantes da comunidade.
A legislação federal e estadual regulará o seu funcionamento.
O mandato dos membros do Conselho Penitenciário terá a duração de 4 (quatro) anos.
No tocante à sua função fiscalizadora, são três:
a) inspecionar os estabelecimentos e serviços penais;
b) supervisionar os patronatos, que é outro órgão da execução penal;
c) supervisionar o serviço de assistência aos egressos.
Quanto à sua função consultiva, isto é, de emitir parecer antes de o juiz decidir, a LEP previa para duas
situações:
a) livramento condicional. A hipótese, que era prevista no art. 70, I, da LEP, foi revogada pela Lei
10.792/93. O art. 131 da LEP ainda mantém a exigência do perecer do Conselho Penitenciário para a concessão
do livramento condicional, mas se pacificou na jurisprudência pela sua desnecessidade, operando-se, neste
aspecto, a revogação tácita desta parte do citado art. 131.
b) indulto e comutação da pena, que não versa sobre o estado de saúde do preso (art. 70 da LEP). O
Superior Tribunal de Justiça, porém, firmou entendimento pela desnecessidade do parecer Conselho
Penitenciário se o decreto de indulto não tiver estabelecido tal requisito. O argumento é que a Constituição
Federal atribui exclusivamente ao Presidente da República a competência para concessão de indulto e, por
isso, a lei não pode lhe impor outros requisitos, sob pena de afronta ao princípio da separação dos poderes.

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Por outro lado, o Conselho Penitenciário tem algumas funções que não são fiscalizadoras nem
consultivas. Ei-las:
a) apresentar, no 1º (primeiro) trimestre de cada ano, ao Conselho Nacional de Política Criminal e
Penitenciária, relatório dos trabalhos efetuados no exercício anterior (art. 70, IV, da LEP);
b) a cerimônia do livramento condicional será realizada solenemente no dia marcado pelo Presidente
do Conselho Penitenciário, no estabelecimento onde está sendo cumprida a pena (art. 137 da LEP);
c) a sentença que concede o livramento condicional será lida ao liberando, na presença dos demais
condenados, pelo Presidente do Conselho Penitenciário ou membro por ele designado, ou, na falta, pelo Juiz
(art. 137, I, da LEP);
d) formular ao juiz da execução pedido de revogação, modificação e extinção do livramento condicional
(arts. 143, 144 e 146 da LEP)
e) propor ação civil pública para defesa dos direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos
referentes à fiscalização de estabelecimentos penais. De fato, a ação civil pública pode ser proposta por órgãos
da administração pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica, conforme art. 82, III, da Lei
8078/90, aplicável a todas as ações civis públicas, por força do art. 21 da Lei 7.347/85.

DEPARTAMENTOS PENITENCIÁRIOS

Os Departamentos Penitenciários são os órgãos incumbidos de colocar em prática a política


penitenciária, outrossim, supervisionar e coordenar os estabelecimentos penais da Unidade da Federação a
que pertencer.
Há o Departamento Penitenciário Nacional e os Departamentos Penitenciários Estaduais ou órgãos
similares.
O Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), subordinado ao Ministério da Justiça, é órgão
executivo da Política Penitenciária Nacional e de apoio administrativo e financeiro do Conselho Nacional de
Política Criminal e Penitenciária.
São atribuições do Departamento Penitenciário Nacional:
I - acompanhar a fiel aplicação das normas de execução penal em todo o Território Nacional;
II - inspecionar e fiscalizar periodicamente os estabelecimentos e serviços penais;
III - assistir tecnicamente as Unidades Federativas na implementação dos princípios e regras
estabelecidos nesta Lei;
IV - colaborar com as Unidades Federativas mediante convênios, na implantação de estabelecimentos
e serviços penais;
V - colaborar com as Unidades Federativas para a realização de cursos de formação de pessoal
penitenciário e de ensino profissionalizante do condenado e do internado.
VI – estabelecer, mediante convênios com as unidades federativas, o cadastro nacional das vagas
existentes em estabelecimentos locais destinadas ao cumprimento de penas privativas de liberdade aplicadas
pela justiça de outra unidade federativa, em especial para presos sujeitos a regime disciplinar.
VII - acompanhar a execução da pena das mulheres beneficiadas pela progressão especial de que trata
o §3º do art. 112 desta Lei, monitorando sua integração social e a ocorrência de reincidência, específica ou
não, mediante a realização de avaliações periódicas e de estatísticas criminais.
Os resultados obtidos por meio do monitoramento e das avaliações periódicas previstas no inciso VII do
caput deste artigo serão utilizados para, em função da efetividade da progressão especial para a
ressocialização das mulheres de que trata o §3º do art. 112 desta Lei, avaliar eventual desnecessidade do
regime fechado de cumprimento de pena para essas mulheres nos casos de crimes cometidos sem violência
ou grave ameaça (§2º, art. 72).
Incumbem também ao Departamento a coordenação e supervisão dos estabelecimentos penais e de
internamento federais.
É ainda possível o Departamento Penitenciário local, ou seja, estadual, que na maioria dos Estados
recebe o nome de Secretaria de Administração Penitenciária (SAPEN).
Com efeito, dispõe o art. 73:

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“A legislação local poderá criar Departamento Penitenciário ou órgão similar, com as atribuições que
estabelecer”.
O Departamento Penitenciário local, ou órgão similar, tem por finalidade supervisionar e coordenar os
estabelecimentos penais da Unidade da Federação a que pertencer.
Outrossim, executar a política estadual de assuntos penitenciários.
Quanto ao ocupante do cargo de diretor de estabelecimento deverá satisfazer os seguintes requisitos:
I - ser portador de diploma de nível superior de Direito, ou Psicologia, ou Ciências Sociais, ou Pedagogia,
ou Serviços Sociais;
II - possuir experiência administrativa na área;
III - ter idoneidade moral e reconhecida aptidão para o desempenho da função.
O diretor deverá residir no estabelecimento, ou nas proximidades, e dedicará tempo integral à sua
função.

PATRONATO

O Patronato, que pode ser instituído pelo poder público ou por particular.
É claro que patronato particular, malgrado o silêncio da lei, deve ser instituído por entidades sem fins
lucrativos, ou seja, por associações ou fundações.
O patronato é o órgão da execução penal que têm as seguintes funções:
a) prestar assistência aos albergados, que são os que cumprem pena no regime aberto, em casa de
albergado;
b) prestar assistência ao egresso, que abrange o liberado definitivo, pelo prazo de 1 ano, a contar da
saída do estabelecimento, e o liberado condicional, durante o período de prova;
c) orientar os condenados à pena restritiva de direitos;
d) fiscalizar o cumprimento das penas de prestação de serviço à comunidade e de limitação de fim de
semana;
e) colaborar na fiscalização do cumprimento das condições da suspensão condicional da pena e do
livramento condicional.
O patronato é fiscalizado pelos seguintes órgãos:
a) juiz da execução penal;
b) Ministério Público;
c) Conselho Penitenciário;
d) Departamento Penitenciário.

CONSELHO DE COMUNIDADE

Haverá, em cada comarca, um Conselho da Comunidade, cuja função principal é a prestar assistência
material e humana ao preso ou internado, reduzindo-se assim os efeitos danos da prisão. Exemplo: diligenciar
a prestação de alimentação e alojamento, se necessário.
É composto, no mínimo, por 1 (um) representante de associação comercial ou industrial, 1 (um)
advogado indicado pela Seção da Ordem dos Advogados do Brasil, 1 (um) Defensor Público indicado pelo
Defensor Público Geral e 1 (um) assistente social escolhido pela Delegacia Seccional do Conselho Nacional de
Assistentes Sociais.
Esta composição, prevista no art. 80 da LEP, é a mínima, pois quanto maior o número de Conselheiros
melhor para o cumprimento da finalidade da lei.
Trata-se assim de um órgão multidisciplinar, que tem por fundamento o princípio da participação
popular.
Na falta da representação acima, ficará a critério do Juiz da execução a escolha dos integrantes do
Conselho.
Incumbe ao Conselho da Comunidade:
I - visitar, pelo menos mensalmente, os estabelecimentos penais existentes na comarca;

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II - entrevistar presos;
III - apresentar relatórios mensais ao Juiz da execução e ao Conselho Penitenciário;
IV - diligenciar a obtenção de recursos materiais e humanos para melhor assistência ao preso ou
internado, em harmonia com a direção do estabelecimento.
Compete ao juiz da execução compor e instalar o Conselho da Comunidade (art.66, IX, da LEP).
Uma primeira corrente sustenta que o juiz da execução também integra o Conselho de Comunidade.
Outra corrente responde negativamente, pois o art. 80 da LEP não o incluiu na composição. Quanto ao
verbo compor, previsto no citado art. 66, IX, foi empregado no sentido de reunir os membros do Conselho de
Comunidade.
Caso não haja na comarca Conselho de Comunidade, o juiz tem o dever de instalá-lo.
Sobre as diferenças entre o patronato e o conselho de comunidade, são as seguintes:
a) a composição do patronato não é prevista em lei, ao contrário da composição do conselho de
comunidade.
b) o patronato auxilia e fiscaliza os albergados, os egressos e os que cumprem pena restritiva de direitos;
o conselho de comunidade presta auxílio aos presos em regime fechado ou semiaberto e aos internados por
medida de segurança.
É, no entanto, perfeitamente lícito que o Conselho de Comunidade também atue sobre os egressos,
mediante auxílio e fiscalização, conforme art. 5º da Resolução 10/04 do CNPCP.

DEFENSORIA PÚBLICA

A Defensoria Pública, além de suas funções processuais, ainda exerce, na execução penal, a função de
fiscalizar os estabelecimentos penais, podendo, para tanto, praticar os seguintes atos:
a) representar ao Juiz da execução ou à autoridade administrativa para instauração de sindicância ou
procedimento administrativo em caso de violação das normas referentes à execução penal;
b) visitar os estabelecimentos penais, registrando a sua presença em livro próprio, podendo ingressar
em todas as dependências do local e fazer inclusive registro fotográfico;
c) entrevistar presos e funcionários;
d) fazer recomendações para melhoria do estabelecimento prisional;
e) tomar as providências para o adequado funcionamento dos estabelecimentos penais, e requerer,
quando for o caso, a apuração de responsabilidade;
f) requerer à autoridade competente, que é o juiz da execução penal, a interdição, no todo ou em parte,
de estabelecimento penal. Este pedido pode ser feito de forma administrativa ou mediante a propositura de
ação civil pública.
Por outro lado, no que tange à sua atuação no processo de execução penal, se restringe à defesa dos
necessitados, ou seja, que não reúne condições financeira para constituir advogado.
De fato, a Defensoria Pública velará pela regular execução da pena e da medida de segurança, oficiando,
no processo executivo e nos incidentes da execução, para a defesa dos necessitados em todos os graus e
instâncias, de forma individual e coletiva.
Vê-se assim Defensoria Pública pode também mover ação civil pública para defesa dos direitos dos
detentos necessitados.
Incumbe-lhe, para o desempenho de suas funções:
I - requerer:
a) todas as providências necessárias ao desenvolvimento do processo executivo;
b) a aplicação aos casos julgados de lei posterior que de qualquer modo favorecer o condenado;
c) a declaração de extinção da punibilidade;
d) a unificação de penas;
e) a detração e remição da pena;
f) a instauração dos incidentes de excesso ou desvio de execução;
g) a aplicação de medida de segurança e sua revogação, bem como a substituição da pena por medida
de segurança;

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h) a conversão de penas, a progressão nos regimes, a suspensão condicional da pena, o livramento


condicional, a comutação de pena e o indulto;
i) a autorização de saídas temporárias;
j) a internação, a desinternação e o restabelecimento da situação anterior;
k) o cumprimento de pena ou medida de segurança em outra comarca;
l) a remoção do condenado na hipótese prevista no § 1o do art. 86 desta Lei;
II - requerer a emissão anual do atestado de pena a cumprir;
III - interpor recursos de decisões proferidas pela autoridade judiciária ou administrativa durante a
execução.
A atuação é sempre na defesa dos interesses do preso ou internado, inclusive, quanto à previsão para
requerer a conversão de penas. Exemplo: requerer a transmudação da pena privativa de liberdade em
restritiva de direitos. Outro exemplo: requerer o cumprimento do regime fechado na residência, por razões
de saúde.

Órgãos de prevenção da tortura dos presos - Protocolo de Istambul

O protocolo de Istambul é uma Convenção Internacional da ONU, promulgada no Brasil pelo decreto
presidencial 6.085/07.
O objetivo do Protocolo de Istambul é estabelecer um sistema de visitas regulares efetuadas por órgãos
nacionais e internacionais independentes a lugares onde pessoas são privadas de sua liberdade, com a
intenção de prevenir a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes.
Aludido protocolo, para cumprir seu objetivo, criou um órgão internacional independente denominado
Subcomitê de Prevenção da Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes.
Trata-se de um órgão da ONU.
Cada país signatário do Protocolo de Istambul deverá permitir visitas do Subcomitê de Prevenção nos
estabelecimentos penais, que, no final, elaborará um relatório com as recomendações.
O Protocolo de Istambul ainda ordenou a criação, em cada país signatário, a criação de um órgão
nacional independente de Prevenção e Combate à Tortura.
No Brasil, houve a criação, pela Lei 12.847/13, de dois órgãos específicos:
a) Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura - CNPCT;
b) Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura - MNPCT.
É ainda possível a criação de Comitês e Mecanismos Estaduais e Distrital de Prevenção e Combate à
Tortura.
Estes órgãos têm competência para:
a) inspecionar os estabelecimentos penais;
b) visitar todas as dependências dos estabelecimentos penais;
c) entrevistar os presos e funcionários, de forma reservada e sem testemunhas;
d) ter acesso ao número de presos do estabelecimento penal e a todas as informações sobre os
detentos;
e) fazer recomendações às autoridades para melhorar o tratamento e as condições dos presos.

ESTABELECIMENTOS PENAIS

Introdução

O direito penitenciário é o conjunto de princípios e normas que regulam a atividade administrativa da


execução da pena e da medida de segurança.
Faz parte do seu conteúdo, dentre outros, os seguintes temas:
a) faltas disciplinares;
b) sanções disciplinares;
c) estabelecimento penal;

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c) deveres dos presos ou internados;


d) direitos dos presos ou internados perante a administração do estabelecimento penal.
Quanto aos direitos dos presos, que podem ser pleiteados na esfera processual da execução penal, têm
natureza de direito penal. Exemplos: progressão de regime, remição da pena, livramento condicional, indulto,
etc.
O juiz da execução penal também aplica o direito penitenciário nas situações previstas em lei. Exemplo:
interdição do estabelecimento penal. Outro exemplo: inclusão do preso no regime disciplinar diferenciado.
Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre direito
Penitenciário (art. 24, I, da CF).
No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais
(§1º do art. 24 da CF).
As normas específicas são da competência dos Estados ou Distrito Federal.
As normas gerais sobre direito penitenciário constam na Lei de Execução Penal e em inúmeros Tratados
e Convenções Internacionais ratificados pelo Brasil.
As normas especiais, por sua vez, constam em leis e atos administrativos emanados dos Estados e
Distrito Federal.
É claro que as normas especiais locais não podem contrariar as normas gerais da União.
Entretanto, a União também não pode legislar sobre as especificidades locais da execução penal, sob
pena de usurpação de competência.

Conceito

Os estabelecimentos penais são os locais de cumprimento da pena, medida de segurança, prisão


cautelar, internação cautelar e da realização exames criminológicos.

Destinatários

Os estabelecimentos penais, de acordo com o art. 82 da LEP, destinam-se às seguintes pessoas:


a) ao condenado ou sentenciado, com trânsito em julgado;
b) ao preso provisório, ou seja, antes do trânsito em julgado da condenação;
c) ao submetido à medida de segurança;
d) ao egresso, que abrange o preso definitivamente liberado, durante o período de um ano, a contar da
liberação, bem como o beneficiário do livramento condicional, durante todo período de prova deste benefício.
A destinação se refere ao trabalho nos estabelecimentos penais. Conforme a natureza do estabelecimento,
nele poderão trabalhar os liberados ou egressos que se dediquem a obras públicas ou ao aproveitamento de
terras ociosas (§2° do art. 86 da LEP);
e) ao internado provisório, em razão de medida penal cautelar. Malgrado o silêncio da lei, os
estabelecimentos penais também se destinam ao internado provisório, por medida cautelar, prevista no art.
319, VII, do CPP.

Espécies

A LEP prevê seis espécies de estabelecimentos penais:


a) Penitenciária;
b) Colônia Agrícola, Industrial ou Similar;
c) Casa de Albergado;
d) Centro de Observação;
e) Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico;
f) Cadeia Pública.
Como o assunto é de direito penitenciário, os Estados ou Distrito Federal também podem legislar de
forma especial, inclusive, para estabelecer outros modelos de estabelecimentos penais, com vistas à maior

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eficácia da ressocialização e melhoria das condições do preso ou internado (§1º do art. 24 da CF).
No Estado de São Paulo, por exemplo, há os seguintes estabelecimentos penais:
a) Centro de Detenção Provisória (CDP): é destinado aos presos provisórios. Equivale a uma grande
cadeia pública.
b) Penitenciária Compacta: é a que abriga um número menor de presos em comparação com as
penitenciárias tradicionais. Contém a estrutura de uma penitenciária, como cozinha, oficinas e salas de aula.
Destina-se aos presos já condenados, em regime fechado.
c) Centro de Ressocialização de Presos (CRP): destina-se aos presos primários e de baixa periculosidade,
tanto em regime semiaberto como fechado.
d) Centro de Progressão Penitenciária (CPP): se destina exclusivamente aos detentos que cumprem
pena em regime semiaberto.

Mulher e Maior de 60 anos

A mulher e o maior de sessenta anos, separadamente, serão recolhidos a estabelecimento próprio e


adequado à sua condição pessoal.
O mesmo conjunto arquitetônico poderá abrigar estabelecimentos de destinação diversa desde que
devidamente isolados.
De acordo com o §2º do art. 82 da LEP, os estabelecimentos penais destinados a mulheres serão dotados
de berçário, onde as condenadas possam cuidar de seus filhos, inclusive amamentá-los, no mínimo, até 6 (seis)
meses de idade.
A Resolução n° 4/2009 do Conselho Nacional de Políticas Criminais e Penitenciária, porém, preceitua
que deve ser garantida a permanência de crianças no mínimo até um ano e seis meses para as(os) filhas(os)
de mulheres encarceradas junto as suas mães, visto que a presença da mãe nesse período é considerada
fundamental para o desenvolvimento da criança.
Uma norma não é incompatível com a outra. Ou seja, a lei obriga o mínimo de 6 (seis) meses e a
Resolução recomenda o mínimo de um ano e seis meses.
Outrossim, possuir, exclusivamente, agentes do sexo feminino na segurança de suas dependências
internas.
A penitenciária de mulheres, nos termos do art. 89 da LEP, será ainda dotada de:
a) seção para gestante e parturiente;
b) seção de creche para abrigar crianças maiores de 6 (seis) meses e menores de 7 (sete) anos, com a
finalidade de assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa.
Convém ainda esclarecer que as Regras de Bangkok, oriunda das Nações Unidas, que cuida do
tratamento das mulheres presas e da política de medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras,
recomenda, sempre que possível e apropriado, a preferência para a aplicação de penas não privativas de
liberdade.
Nas situações acima, ainda que a hipótese seja de regime fechado ou semiaberto, o ideal seria o
cumprimento da pena no próprio domicílio, devendo a prisão em estabelecimentos penais ser apenas
considerada, nos termos da Regra 64 de Bangkok, quando o crime for grave ou violento ou a mulher
representar ameaça contínua.

Presos provisórios

De acordo com o art. 84 da LEP, o preso provisório ficará separado do condenado por sentença
transitada em julgado.
O objetivo da lei, que tem conotação discriminatória, é evitar que sejam moralmente contaminados
pelos presos definitivos
Os presos provisórios ficarão separados em seção do estabelecimento penal destinada a eles, de acordo
com os seguintes critérios:
I - acusados pela prática de crimes hediondos ou equiparados;

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II - acusados pela prática de crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa;
III - acusados pela prática de outros crimes ou contravenções diversos dos apontados nos incisos I e II.

Preso funcionário da administração da justiça criminal

O preso que, ao tempo do fato criminoso, era funcionário da Administração da Justiça Criminal ficará
também em dependência separada.
Aqui é separação é em relação aos presos provisórios e definitivos.

Critérios de separação dos presos

Os presos condenados ficarão separados, em seções dos estabelecimentos penais, de acordo com os
seguintes critérios:
I - condenados pela prática de crimes hediondos ou equiparados;
II - reincidentes condenados pela prática de crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa;
III - primários condenados pela prática de crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa;
IV - demais condenados pela prática de outros crimes ou contravenções em situação diversa das
previstas nos incisos I, II e III.
O preso que tiver sua integridade física, moral ou psicológica ameaçada pela convivência com os demais
presos ficará segregado em local próprio do estabelecimento penal. Exemplo: estupradores. Esta ala do
estabelecimento penal é conhecida como “seguro”.

Preso indígena

O assunto é disciplinado pelos arts. 56 e 57 do Estatuto do Índio (Lei 6.001/73).


Outrossim, pela Convenção 69 da Organização Internacional do Trabalho - OIT sobre Povos Indígenas e
Tribais, adotada em Genebra, em 27 de junho de 1989, em vigor no Brasil
No caso de condenação de índio por infração penal, a pena deverá ser atenuada e na sua aplicação o
Juiz atenderá também ao grau de integração do silvícola.
As penas de reclusão e de detenção serão cumpridas, se possível, em regime especial de semiliberdade,
no local de funcionamento do órgão federal de assistência aos índios mais próximos da habitação do
condenado.
Caso não seja possível o cumprimento da pena no local de funcionamento do órgão federal de
assistência ao índio, o ideal é que a pena seja cumprida, na própria comunidade indígena, em prisão domiciliar.
Será tolerada a aplicação, pelos grupos tribais, de acordo com as instituições próprias, de sanções penais
ou disciplinares contra os seus membros, desde que não revistam caráter cruel ou infamante, proibida em
qualquer caso a pena de morte.

Número de presos

O estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua estrutura e finalidade.
O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária determinará o limite máximo de capacidade do
estabelecimento, atendendo a sua natureza e peculiaridades.

Local do cumprimento da pena

Caberá ao juiz competente, a requerimento da autoridade administrativa definir o estabelecimento


prisional adequado para abrigar o preso provisório ou condenado, em atenção ao regime e aos requisitos
estabelecidos.
As penas privativas de liberdade aplicadas pela Justiça de uma Unidade Federativa podem ser
executadas em outra unidade, em estabelecimento local ou da União (art. 86).

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Outrossim, em estabelecimentos penais federais, independentemente da quantidade da condenação,


desde que a medida se justifique no interesse da segurança pública ou do próprio condenado.

Estrutura

O estabelecimento penal, conforme a sua natureza, deverá contar em suas dependências com áreas e
serviços destinados a dar assistência, educação, trabalho, recreação e prática esportiva (art. 83 da LEP).
Haverá instalação destinada a estágio de estudantes universitários.
Serão instaladas salas de aulas destinadas a cursos do ensino básico e profissionalizante.
Em todos os estabelecimentos penais, haverá instalação destinada ao atendimento pela Defensoria
Pública.

Serviços indelegáveis

Os estabelecimentos penais são públicos e não podem ser de propriedade da iniciativa privada.
Não há, pois, estabelecimentos penais particulares.
A administração dos estabelecimentos penais não pode ser delegada a empresas particulares.
De acordo com o art. 83-B da LEP, são indelegáveis as funções de direção, chefia e coordenação no
âmbito do sistema penal, bem como todas as atividades que exijam o exercício do poder de polícia, e
notadamente:
I - classificação de condenados;
II - aplicação de sanções disciplinares;
III - controle de rebeliões;
IV - transporte de presos para órgãos do Poder Judiciário, hospitais e outros locais externos aos
estabelecimentos penais. (

Serviços delegáveis

Poderão ser objeto de execução indireta, ou seja, por particulares, as atividades materiais acessórias,
instrumentais ou complementares desenvolvidas em estabelecimentos penais, e notadamente:
I - serviços de conservação, limpeza, informática, copeiragem, portaria, recepção, reprografia,
telecomunicações, lavanderia e manutenção de prédios, instalações e equipamentos internos e externos;
II - serviços relacionados à execução de trabalho pelo preso.
É assim possível, mediante convênio, que empresas ofertem trabalho dentro do estabelecimento penal.
A execução indireta, ou seja, por pessoa jurídica de direito privado, contratada mediante licitação, será
realizada sob supervisão e fiscalização do poder público.
Os serviços acima relacionados poderão compreender o fornecimento de materiais, equipamentos,
máquinas e profissionais.

Penitenciária

A penitenciária destina-se ao condenado à pena de reclusão, em regime fechado (art. 87 da LEP).


Quanto à pena de detenção, nunca se inicia no regime fechado, mas, em caso de regressão para este
regime, também será cumprida em penitenciária.
Quanto ao preso provisório, deve ser mantido em cadeia pública, mas, na hipótese de ser incluído no
regime disciplinar diferenciado, será transferido para penitenciária (arts. 87, parágrafo único, e 102 da LEP).
A penitenciária pode ser federal, estadual e distrital, conforme tenha sido construída pela União,
Estados ou Distrito Federal (parágrafo único do art. 87 da LEP).
A construção deve seguir o padrão de arquitetura descrito pelo Conselho Nacional de Política Criminal

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e Penitenciária
Não, destarte, penitenciárias municipais nem particulares.
A União, Estados e Distrito Federal podem também construir penitenciárias exclusivas para presos
provisórios e condenados no regime fechado, sujeitos ao regime disciplinar diferenciado (parágrafo único do
art. 52 da LEP).
Na penitenciária, o condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho
sanitário e lavatório (art. 8º da LEP). Na prática, porém, as celas são coletivas.
São requisitos básicos da cela individual, também conhecida como unidade celular:
a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento
térmico adequado à existência humana;
b) área mínima de 6,00m² (seis metros quadrados).
Art. 89. Além dos requisitos referidos no art. 88, a penitenciária de mulheres será dotada de seção para
gestante e parturiente e de creche para abrigar crianças maiores de 6 (seis) meses e menores de 7 (sete) anos,
com a finalidade de assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa.

Parágrafo único. São requisitos básicos da seção e da creche referidas neste artigo:
I – atendimento por pessoal qualificado, de acordo com as diretrizes adotadas pela legislação
educacional e em unidades autônomas; e
II – horário de funcionamento que garanta a melhor assistência à criança e à sua responsável.
A penitenciária de homens será construída, em local afastado do centro urbano, à distância que não
restrinja a visitação (art. 90 da LEP). O afastamento não pude ser muito distante da cidade, caso contrário
dificultaria as visitas.

Colônia Agrícola, Industrial ou Similar

A Colônia Agrícola, Industrial ou Similar destina-se ao cumprimento da pena em regime semiaberto.


O condenado poderá ser alojado em compartimento coletivo.
São também requisitos básicos das dependências coletivas:
a) a seleção adequada dos presos;
b) o limite de capacidade máxima que atenda os objetivos de individualização da pena.
Na ausência de vagas no regime semiaberto, a pena será cumprida em casa de albergado e, caso não
haja casa dê albergado, em albergue domiciliar (súmula vinculante 56 do STF).

Casa do Albergado

A Casa do Albergado destina-se ao cumprimento de pena privativa de liberdade, em regime aberto, e


da pena de limitação de fim de semana (art. 93 da LEP).
O prédio deverá situar-se em centro urbano, separado dos demais estabelecimentos penais.
A casa de albergado não deve ter obstáculos físicos contra a fuga (art. 94 da LEP)
Em cada região haverá, pelo menos, uma Casa do Albergado, a qual deverá conter, além dos aposentos
para acomodar os presos, local adequado para cursos e palestras.
O estabelecimento terá instalações para os serviços de fiscalização e orientação dos condenados.
Na ausência de casa de albergado, o regime aberto será cumprido no domicílio. É a chamada prisão
albergue domiciliar.

Centro de Observação

No Centro de Observação realizar-se-ão os exames gerais e o criminológico, cujos resultados serão


encaminhados à Comissão Técnica de Classificação (art. 96 da LEP).
No Centro também poderão ser realizadas pesquisas criminológicas.
O Centro de Observação será instalado em unidade autônoma ou em anexo a estabelecimento penal.

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Os exames poderão ser realizados pela Comissão Técnica de Classificação, na falta do Centro de
Observação.

Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico

O Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico destina-se aos inimputáveis e semi-imputáveis


referidos no artigo 26 e seu parágrafo único do Código Penal (art. 99 da LEP).
É, pois, o estabelecimento penal que se destina aos internados por medida de segurança.
O exame psiquiátrico e os demais exames necessários ao tratamento são obrigatórios para todos os
internados (art. 100 da LEP).
Quanto ao alojamento, aplica-se, no que couber, o disposto no parágrafo único, do artigo 88, da LEP,
que cuida da estrutura da cela individual.
Quando a medida de segurança consistir em tratamento ambulatorial não haverá internação, mas, sim,
a liberdade, com a imposição de tratamento psiquiátrico, que poderá ser realizado em Hospital de Custódia e
Tratamento Psiquiátrico ou em outro local com dependência médica adequada, inclusive, em clínicas
particulares.

Cadeia Pública

A cadeia pública destina-se ao recolhimento de presos provisórios (art. 102 da LEP).


Cada comarca terá, pelo menos 1 (uma) cadeia pública a fim de resguardar o interesse da Administração
da Justiça Criminal e a permanência do preso em local próximo ao seu meio social e familiar (art. 103 da LEP).
A cadeia pública será instalada próximo de centro urbano, observando-se na construção as exigências
mínimas referidas no artigo 88 e seu parágrafo único da LEP (art. 104 da LEP).
Ou seja, deve conter cela individual com dormitório, aparelho sanitário e lavatório, com área mínima
de 6,00m² (seis metros quadrados).
Na prática, porém, as celas são coletivas, de tal sorte que a LEP não é cumprida, servindo como mera
recomendação.

PROCESSO DE EXECUÇÃO PENAL

Títulos executivos judiciais

O processo de execução penal, para ser instaurado, depende de um título executivo judicial, que se
denomina guia de execução.
Convém esclarecer que a guia de execução é o gênero, que se desdobra em cinco espécies:
a) guia de recolhimento, quando se tratar da execução de pena privativa de liberdade no regime fechado
ou semiaberto;
b) guia de execução de regime aberto, quando imposto o referido regime para a pena privativa de
liberdade;
c) guia de execução de pena restritiva de direitos, quando imposta uma dessas penas, à exceção da pena
de prestação pecuniária;
d) guia de internação para a execução de medida de segurança detentiva;
e) guia de tratamento ambulatorial para a execução de medida de segurança restritiva.
No tocante à execução das penas de multa e prestação pecuniária, não há falar-se em guia de execução,
pois o título executivo é a certidão da sentença penal condenatória, com menção do trânsito em julgado.
No processo civil, o processo de execução, para se instaurar, exige uma petição inicial instruída com o
título executivo, ao passo que, na área criminal, o título executivo judicial serve também como a peça inicial
do processo de execução penal, salvo nas seguintes hipóteses:
a) quando a execução penal não for instaurada de ofício pelo juiz. Nesse caso, será possível um
requerimento do interessado

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b) execução da pena de multa e da pena de prestação pecuniária. A instauração depende de uma


petição do Ministério Público.

Expedição dos títulos executivos

Os títulos executivos judiciais acima mencionados são expedidos mediante ordem do juiz da
condenação e encaminhados para o juiz da execução penal.
Abrem-se duas exceções, pena de multa e pena de prestação pecuniária, pois, nesses casos, o
encaminhamento do respectivo título executivo judicial é para o Ministério Público (art. 164 da LEP).

Legitimidade para instauração

O processo de execução, salvo em relação às penas de multa e de prestação pecuniária, é instaurado de


ofício pelo juiz da execução, após o recebimento dos títulos judiciais acima mencionados.
No tocante às penas de multa e de prestação pecuniária, porém, o processo de execução penal só
poderá ser instaurado através de petição subscrita pelo representante do Ministério Público (art. 164 da LEP).

Competência

A competência para o processo de execução é do juízo da execução penal, mas, se na comarca não
houver este juízo, a competência será do juízo da condenação que, nesse caso, acumulará as funções do juiz
da execução.
No tocante às condenações emanadas do Juizado Especial Criminal, é preciso distinguir duas situações:
a) a execução das penas privativas de liberdade e restritivas de direitos, ou de multa cumulada com
estas, será processada perante o juízo comum da execução penal. É o que estatui o art. 86 da Lei 9.099/95,
que se revela uma norma especial em relação ao art. 60 da mesma Lei.
b) execução das penas de multa aplicadas isoladamente, outrossim, da pena de multa ou restritivas de
direitos aplicadas em transação penal, serão da competência do próprio Juizado Especial Criminal. É o que se
deduz da norma geral prevista no art. 60 da Lei 9.099/95. Como a norma especial do citado art. 86 não faz
menção expressa à transação, força convir que a sua execução deve ser realizada no próprio JECRIM.

Hipóteses de não instauração do processo de execução penal

Não haverá a formação do processo de execução penal nas seguintes hipóteses:


a) pena privativa de liberdade, no regime fechado ou semiaberto, enquanto não houver o cumprimento
do mandado de prisão (art. 105 da LEP);
b) quando for imposta a pena de advertência prevista no art. 28, I, da Lei n.º 11.343/06);
c) quando houver o pagamento voluntário da pena de multa, no juízo da condenação, dentro do prazo
de 10 (dez) dias a contar do trânsito em julgado (art. 50 do CP).
Execução Provisória e Definitiva

A execução será provisória ou definitiva, conforme se verifique antes ou depois do trânsito em julgado
da condenação.
Somente as penas privativas de liberdade admitem a execução provisória, na hipótese de prisão
cautelar.
Quanto às penas restritivas de direitos e de muita só comportam a execução definitiva, nos termos dos
arts. 147 e 164 da LEP, que fazem expressa menção ao trânsito em julgado da condenação como condição do
início da execução.
A propósito das penas restritivas de direitos, dispõe a súmula 643 do STJ:
“A execução da pena restritiva de direitos depende do trânsito em julgado da condenação".

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PROCEDIMENTO JUDICIAL DA EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE, RESTRITIVAS DE


DIREITO E MEDIDAS DE SEGURANÇA

Introdução

São duas as espécies de sanções penais:


a) pena;
b) medida segurança.
A pena se desdobra em três espécies:
a) penas privativas de liberdade: reclusão, detenção e prisão simples;
b) penas restritivas de direitos;
c) pena de multa.
A medida de segurança, por sua vez, apresenta duas espécies:
a) internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou estabelecimento similar;
b) tratamento ambulatorial.
O processo e o procedimento de execução penal em relação às penas e medidas de segurança tem um
regramento comum.
Abre-se exceção às penas de multa e de prestação pecuniária, cuja execução é regida por normas
específicas, que serão analisadas noutro capítulo.

Caráter jurisdicional

O procedimento correspondente às situações previstas na Lei de Execução Penal será judicial,


desenvolvendo-se perante o Juízo da execução (art. 194 da LEP).
Vê-se assim que o processo de execução penal tem natureza jurisdicional, e não meramente
administrativa, sujeitando-se as decisões judiciais à coisa julgada material.

Formação do processo de execução

O Juiz competente para a execução da pena ordenará, de ofício, a formação do Processo de Execução
Penal (PEP), a partir de uma das espécies de guia de execução e das peças que a acompanham. A guia de
execução é, pois, a peça inicial do processo de execução penal.
Em caso de inércia do juiz da execução, a instauração do processo poderá ser requerida por um dos
legitimados do art. 195 da LEP.
A propósito, dispõe o art. 195 da LEP:
“O procedimento judicial iniciar-se-á de ofício, a requerimento do Ministério Público, do interessado,
de quem o represente, de seu cônjuge, parente ou descendente, mediante proposta do Conselho
Penitenciário, ou, ainda, da autoridade administrativa”.
A menção ao descendente era desnecessária, pois o texto legal também se refere a parente.
Quanto à companheira, também desfruta de legitimidade, por isonomia ao casamento, desde que a
união esteja documentalmente comprovada.
O art. 4º da Resolução 113/2010 do CNJ também confere legitimidade ativa aos órgãos da execução
penal.

Processo individual e indivisível

Para cada réu condenado, formar-se-á um Processo de Execução Penal, individual e indivisível.
Não há, pois, litisconsórcio passivo no processo de execução penal, pois a execução penal é individual.

No mesmo processo de execução, se reunirão todas as condenações impostas contra o mesmo réu,

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inclusive aquelas que vierem a ocorrer no curso da execução.


Ou seja, haverá um único processo de execução para cada condenado e para todas as condenações que
lhe dizem respeito, pois a execução penal, além de individual, é também indivisível.
A execução da medida de segurança também é individual e indivisível.

Sequência de atos processuais

O procedimento tem os seguintes atos processuais:


a) requerimento e medidas de ofício
O processo de execução, uma vez instaurado, costuma ser pontificado por uma série de requerimentos
e medidas tomadas de ofício pelo juiz da execução.
Em função disso, para uma melhor organização, o ideal é que os requerimentos do condenado, do
Ministério Público e de outros legitimados sejam autuados e processados em apenso ao processo principal.
Da mesma forma, o juiz, antes de decidir de ofício alguma questão, deveria baixar uma portaria, que
seria autuada e processada em apenso ao processo principal.
De fato, dispõe o art. 196 da LEP:
“A portaria ou petição será autuada ouvindo-se, em 3 (três) dias, o condenado e o Ministério Público,
quando não figurem como requerentes da medida”.
A realidade brasileira, porém, é a escassez de funcionários, o que dificulta a autuação em apenso, razão
pela qual os requerimentos e as medidas tomadas de ofício pelo juiz costumam tramitar no bojo do próprio
processo de execução.
Assim, os pedidos de progressão de regime, remição, livramento condicional, indulto e tantos outros,
assim como a elaboração do roteiro de penas, com o amparo da Resolução 113 do CNJ podem tramitar em
apenso ou no bojo do processo de execução.
b) manifestação da parte contrária
Formulado algum requerimento pelo condenado, o Ministério Público deve ser ouvido em três dias, e
vice-versa, com vistas à preservação do princípio do contraditório e ampla defesa.
Assim, no tocante à oitiva do condenado, só é necessária quando ele não for o requerente do pedido e,
na hipótese de regressão por falta grave, há entendimento que dispensa a sua oitiva na hipótese de já ter sido
inquirido sobre o mesmo fato pelo diretor do estabelecimento penal, na presença de seu advogado ou
defensor público, no processo administrativo disciplinar.

c) julgamento antecipado
Sendo desnecessária a produção de prova, o Juiz decidirá de plano, em igual prazo, ou seja, em três dias
(§1º do art. 196 da LEP).

d) fase instrutória e decisão


Entendendo indispensável a realização de prova pericial ou oral, o Juiz a ordenará, decidindo após a
produção daquela ou na audiência designada (§2º do art. 196 da LEP).
É claro que, após a produção da prova oral ou pericial, o juiz, antes de decidir, sob pena de violação do
princípio do contraditório, deve ouvir o Ministério Público e o condenado, na própria audiência, ou no prazo
de três dias, por analogia ao art. 196 da LEP.

Extinção da execução

O processo de execução será extinto quando houver:


a) o cumprimento total da pena;
b) a extinção da punibilidade, cujas causas, dentre outras. são: morte, anistia, “abolitio criminis”,
prescrição executória, cumprimento sem revogação do período de prova do sursis ou livramento condicional.
Cumprida ou extinta a pena, o condenado será posto em liberdade, mediante alvará do Juiz, se por
outro motivo não estiver preso (art. 109 da LEP).

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Há discussão se a execução poderia ou não prosseguir, quando, no processo de execução provisória,


após o trânsito em julgado da decisão que declarou extinta a pena, ocorrer a juntada do acórdão que, no
recurso da acusação, a majorou.
Uma primeira corrente sustenta que, da mesma forma que é vedada a revisão criminal “pro societate”,
também se deve obstar a reabertura do referido processo, sob pena de violação da coisa julgada.
Outra corrente, porém, que é dominante, admite o prosseguimento do processo de execução, pois o
erro do magistrado torna a sua decisão inexistente, à semelhança do que ocorre com a decisão que extingue
a punibilidade com base em atestado de óbito falso.

Sigilo das condenações

O sigilo das condenações, após o cumprimento ou extinção da pena, pode ser automático ou oriundo
da reabilitação penal.
Cumprida ou extinta a pena, o direito ao sigilo sobre os antecedentes criminais é automático, isto é,
independe de pedido de reabilitação. Efetivamente, dispõe o art. 202 da LEP:
“Cumprida ou extinta a pena, não constarão da folha corrida, atestados ou certidões fornecidas por
autoridade policial ou por auxiliares da Justiça, qualquer notícia ou referência à condenação, salvo para instruir
processo pela prática de nova infração penal ou outros casos expressos em lei”.
Este sigilo automático do art. 202 da LEP, entretanto, tem dois inconvenientes:
a) pode ser quebrado por simples ofício de qualquer autoridade judiciária, mesmo cível ou trabalhista,
e até mesmo do delegado de polícia;
b) não apaga a condenação dos bancos de dados dos institutos de identificação.
Em contrapartida, o sigilo oriundo da reabilitação penal tem duas vantagens:
a) só pode ser quebrado por requisição do juiz criminal, nos termos do art. 748 do CPP;
b) apaga a condenação dos bancos de dados dos institutos de identificação.
Caso não seja respeitado o sigilo automático do art. 202 da LEP ou o derivado da reabilitação, será
cabível mandado de segurança, e não habeas data, pois este último remédio não se presta para impor o sigilo,
mas, sim, para a retificação ou supressão de dados falsos, outrossim, para se obter o acesso a informações.
A vantagem do sigilo do art. 202 da LEP é que é automático, emana diretamente da lei.
A desvantagem do sigilo oriundo da reabilitação é que depende da ação judicial de reabilitação, que
tramita no juízo da condenação, só podendo ser proposta após o decurso do prazo de dois anos, a contar do
cumprimento ou extinção da pena.
Da sentença que concede ou denega a reabilitação é cabível o recurso de apelação, e não o agravo de
execução, porque não se trata de matéria a ser decidida pelo juiz da execução. Além disso, na hipótese de
concessão, é ainda cabível o recurso de ofício (art. 746 do CPP).

AGRAVO EM EXECUÇÃO

Conceito

Agravo em execução é o recurso cabível para impugnar as decisões do juiz da execução penal.

Cabimento

Qualquer decisão do juiz da execução penal será passível de agravo em execução, inclusive, quando se
tratar de execução penal de pena de multa.
A competência do juiz da execução, em regra, inicia-se após o trânsito em julgado da sentença penal
condenatória ou absolutória imprópria.
Entretanto, estando o condenado preso preventivamente, na pendência do seu recurso, ele fará jus aos
benefícios da LEP, sendo que contra estas decisões do juiz da execução penal também será cabível o recurso

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de agravo em execução.

Legitimidade

O agravo em execução pode ser interposto pelo condenado ou por quem o represente.
Outrossim, por seu cônjuge (ou companheiro), parente ou descendente, pois todas essas pessoas
também podem formular pedidos na execução em favor do condenado.
Trata-se de uma rara previsão de interposição de recurso por terceiro moralmente interessado.
O Conselho Penitenciário e autoridades administrativas não podem recorrer, pois não podem formular
pedidos, mas apenas requerer ao juiz a instauração da execução.
O advogado ou defensor público do condenado também podem recorrer.
O condenado pode recorrer contra a vontade de seu advogado ou defensor, e vice-versa.
Interposto o recurso pelo condenado, as razões devem ser apresentadas por advogado ou defensor
público, com o fim de se preservar a ampla defesa.
Não se deve assim confundir a interposição do recurso, que é a manifestação da vontade de recorrer,
com as razões do recurso, que é a sua fundamentação.
Para se interpor o recurso, basta o condenado, ao ser intimado da decisão, manifestar ao oficial de
justiça a sua intenção de recorrer.
Por fim, o Ministério Público também pode interpor agravo em execução.

Prazo e procedimento

O art. 197 da LEP, que prevê o agravo em execução, não prevê o prazo nem o procedimento do aludido
recurso, mas, por analogia, a jurisprudência manda aplicar as normas do recurso em sentido estrito.
Por consequência, o prazo é de 5 (cinco) dias para a interposição e de dois dias para as razões (arts. 586
e 588 do CPP).
A propósito, dispõe a súmula 700 do STF:
“É de cinco dias o prazo para interposição de agravo contra decisão do juiz da execução penal”.
O agravo em execução sobe em instrumento para o tribunal.
Assim, o agravante deverá, no ato da interposição, indicar as peças processuais que deverão compor o
referido instrumento.

Efeitos

O agravo em execução tem efeito devolutivo.


Outrossim, o efeito regressivo, pois o juiz da execução poderá exercer o juízo de retratação de sua
decisão.
Não é, porém, dotado de efeito suspensivo (art. 197 da LEP). Assim, a sua interposição não impede o
cumprimento da decisão agravada.
De fato, o art. 197 da LEP veda expressamente o efeito suspensivo. Na doutrina, porém, há os que
defendem a utilização do mandado de segurança para se obter o efeito suspensivo.
Convém destacar que STJ não tem admitido a impetração de mandado de segurança para conferir efeito
suspensivo aos recursos do Ministério Público.
A propósito, dispõe a Súmula 604 do STJ:
“O mandado de segurança não se presta para atribuir efeito suspensivo a recurso criminal interposto
pelo Ministério Público”.
Diante dessa vedação, na prática, o Ministério Público, invocando, por analogia, o CPC, tem ajuizado
medidas cautelares inominadas, com vistas à obtenção do efeito suspensivo.
Cumpre, porém, ressalvar que a única hipótese de efeito suspensivo automático se verifica no agravo
em execução interposto contra a decisão que determinou a suspensão da medida de segurança, ordenando a
soltura do sentenciado, em face da cessação da periculosidade.

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Neste caso, o agente só será posto em liberdade após o trânsito em julgado desta decisão, conforme
preceitua o art. 179 da LEP.
Desse modo, o agravo em execução do Ministério Público, à medida que retarda o trânsito em julgado,
será revestido de efeito suspensivo, obstando a libertação do sentenciado.

EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE

Introdução

As penas privativas de liberdade são a de reclusão, detenção e prisão simples.


Na pena de reclusão, o regime inicial poderá ser o fechado, semiaberto e aberto.
Nas penas de detenção e prisão simples, é vedado o regime inicial fechado.

GUIA DE RECOLHIMENTO

Conceito

A guia de recolhimento é a peça inicial do processo de execução das penas privativas de liberdade, no
regime fechado ou semiaberto.
Trata-se de uma espécie do gênero “guia de execução “.

Nomenclatura

A expressão guia de recolhimento é utilizada pela LEP, enquanto que o CPP utiliza o termo carta de guia.

Funções

Além de ser a peça inicial do processo de execução penal da pena privativa de liberdade no regime
fechado ou semiaberto, a referida guia é também necessária para que haja o recolhimento do condenado no
estabelecimento penal.
A propósito, dispõe o art. 107 da LEP:
“Ninguém será recolhido, para cumprimento de pena privativa de liberdade, sem a guia expedida pela
autoridade judiciária”.
Vê-se assim que enquanto o cumprimento da prisão cautelar é autorizado pelo mandado de prisão, o
cumprimento da pena privativa de liberdade, além do mandado de prisão, ainda exige a expedição da guia de
recolhimento, sob pena de o agente público receptor cometer crime de responsabilidade e falta funcional.

Competência para a expedição

A expedição da guia de recolhimento, em regra, é autorizada pelo juiz da condenação, mas há algumas
exceções, que serão vistas mais adiante.
Ordenada a expedição, a guia de recolhimento será extraída pelo escrivão, que a rubricará em todas as
folhas e a assinará com o Juiz, remetendo-a ao juízo da execução penal (art. 106 da LEP).

Espécies

A guia de recolhimento pode ser:


a) definitiva: é a expedida após o trânsito em julgado da condenação;
b) provisória: é a expedida antes do trânsito em julgado da condenação.

Guia de Recolhimento Definitiva

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Dispõe o art. 105 da LEP:


“Transitando em julgado a sentença que aplicar pena privativa de liberdade, se o réu estiver ou vier a
ser preso, o Juiz ordenará a expedição de guia de recolhimento para a execução.
Do dispositivo acima se extrai as seguintes conclusões sobre a guia de recolhimento definitiva:
a) a expedição é ordenada pelo juiz da condenação e endereçada ao juiz da execução penal;
b) a expedição só é feita se o réu estiver ou vier a ser preso. Não há, destarte, a expedição de guia de
recolhimento enquanto o mandado de prisão não houver sido cumprido.
c) a expedição é feita após o trânsito em julgado da condenação. A lacuna da lei sobre o prazo é suprida
pela Resolução 113/2010 do CNJ, que prevê a sua expedição no prazo máximo de cinco dias, a contar do
trânsito em julgado da sentença ou acórdão, ou do cumprimento do mandado de prisão.

Guia de Recolhimento Provisória

A Guia de Recolhimento Provisória será também expedida pelo juiz da condenação, para o fim de
execução provisória, em caso de recurso, quando o réu estiver preso em razão de prisão cautelar decretada
no referido processo.
Trata-se da única hipótese de expedição de guia de recolhimento sem que haja ainda o trânsito em
julgado da condenação.
Os requisitos para a sua expedição são:
a) réu preso provisoriamente em função do processo;
b) sentença condenatória, que lhe tenha imposto o regime fechado ou semiaberto;
c) interposição de recurso da acusação ou defesa.
Assim, a guia provisória de recolhimento só poderá ser expedida após a prolação da sentença
condenatória, independentemente de quem tenha recorrido, devendo, nesse caso, o juízo da execução definir
o agendamento dos benefícios cabíveis (art. 8º da Resolução 113/2010 do CNJ).
Estando o processo em grau de recurso, sem expedição da guia provisória de recolhimento, às
Secretarias desses órgãos caberão expedi-la e remetê-la ao juízo competente (§2° do art. 8º da Resolução
113/2010 do CNJ).
Note-se que, neste caso, há uma competência concorrente para a expedição da guia provisória de
recolhimento, que será tanto do juiz da condenação quanto da Secretaria do Tribunal incumbido de julgar o
recurso.

Guia de Execução no regime aberto

No tocante à execução da sentença que impõe o regime aberto, há duas correntes.


Primeira, o título executivo judicial é também a guia de recolhimento, que será expedida pelo juiz da
condenação, após o trânsito em julgado, assim que houver o cumprimento do mandado de prisão.
Argumenta-se que, no regime aberto, a pena também é privativa de liberdade, o que justifica a
expedição do mandado de prisão.
Segunda corrente, o título executivo judicial é a guia de execução do regime aberto, que é expedida
pelo juiz da condenação, após o trânsito em julgado.
O fundamento é que, no regime aberto, não se deve expedir o mandado de prisão e, por consequência,
não há falar-se em guia de recolhimento.
De fato, o regime aberto é fixado com base no senso de disciplina e responsabilidade, prescindindo-se
da expedição do mandado de prisão.
Ademais, a sentença que impõe este regime depende da aceitação do condenado.
Na linha de raciocínio desta segunda corrente, em vez da expedição do mandado de prisão, o juiz deve
designar a audiência admonitória.
Sobre o juiz competente para a designação desta audiência, há também duas correntes:
Primeira, a competência é do juiz da execução penal. Assim, após o trânsito em julgado da condenação,

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o juiz da condenação ordena a expedição da guia de execução do regime aberto, e o juiz da execução, após
formar o processo de execução, designa a referida audiência.
Segunda corrente, a competência é do juiz da condenação. Assim, após o trânsito em julgado, o próprio
Juiz da condenação realizará a audiência admonitória, pois o art. 113 da LEP preceitua que o ingresso do
condenado em regime aberto supõe a aceitação de seu programa e das condições impostas pelo Juiz. Ou seja,
a guia de execução do regime aberto só será expedida após a realização da audiência admonitória pelo juiz da
condenação.
Acerca da audiência admonitória, o art. 113 da LEP apenas disciplina que o ingresso do apenado no
regime aberto supõe sua anuência às condições do referido regime, não impondo ou obrigando nenhuma
audiência.
É pacífico, porém, que a audiência admonitória deve sim ser realizada após o trânsito em julgado da
condenação, intimando-se para tanto o condenado, mas o art. 113 da LEP não é claro se deve ser feita pelo
juiz da condenação ou pelo juiz da execução.
Particularmente, defendo que a realização da audiência admonitória é atribuição do juiz da execução,
pois, após a sentença, o magistrado do processo de conhecimento esgota o seu poder jurisdicional.

Guias de recolhimento expedidas pelo juiz da execução penal

O juiz da execução penal expedirá a guia de recolhimento em duas situações:


a) para transformar a guia provisória em guia de recolhimento definitiva, após o trânsito em julgado
da condenação;
b) quando houver a conversão da pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade.

Guia de recolhimento sem prisão

Imagine uma condenação no regime fechado ou semiaberto, mas que, em razão do tempo de
cumprimento da prisão preventiva, deveria ter sido fixada no regime aberto.
Nesse caso, será cabível habeas corpus, com dupla finalidade:
a) impedir o cumprimento do mandado de prisão;
b) pleitear a expedição da guia de recolhimento provisória, mesmo sem prisão, para que o juiz da
execução penal aprecie a questão da progressão de regime oriunda da detração penal.
Trata-se da única hipótese em que seria possível a expedição de guia de recolhimento para condenado
solto.
Somente após a decisão do juiz da execução, é que haveria ou não a expedição da guia de recolhimento
definitiva.
Ou seja, aceita a progressão para o regime aberto, não se expediria o mandado de prisão nem a guia de
recolhimento., mas, sim, a guia de execução de regime aberto.
Negada a progressão ou sendo ela admitida para o regime semiaberto, o mandado de prisão seria
expedido e, após o seu cumprimento, haveria também a expedição da guia de recolhimento definitiva.

Conteúdo

Nos termos do art. 105 da LEP, a guia de recolhimento deverá conter as seguintes informações:
a) o nome do condenado;
b) a sua qualificação civil e o número do registro geral no órgão oficial de identificação;
c) a informação sobre os antecedentes e o grau de instrução;
d) a data da terminação da pena;
Se o condenado, ao tempo do fato, era funcionário da Administração da Justiça Criminal, far-se-á, na
guia, menção dessa circunstância, para fins do disposto no §2°, do artigo 84, da LEP, que ordena que ele

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cumpra pena separado dos demais presos.


É também necessário constar as informações sobre a reincidência, pois se trata de uma circunstância
que influi na concessão de vários benefícios penais.
A reincidência antecedente, ou seja, que já existia ao tempo da condenação, só poderá ser levada em
conta pelo juiz da execução penal quando for expressamente reconhecida na sentença condenatória, sob pena
de violação da coisa julgada.
O citado art. 105 da LEP ainda dispõe que a guia de recolhimento deve vir acompanhada das seguintes
peças processuais:
a) do inteiro teor da denúncia;
b) do inteiro teor da sentença; condenatória;
c) da certidão do trânsito em julgado, salvo na hipótese de execução provisória
d) de outras peças do processo reputadas indispensáveis ao adequado tratamento penitenciário.
A Resolução 113/2010 do CNJ ainda exige, dentre outras, as seguintes informações e peças processuais
a) qualificação completa do executado;
b) interrogatório do executado na polícia e em juízo;
c) informação sobre os endereços em que possa ser localizado, antecedentes criminais e grau de
instrução;
d) instrumentos de mandato, substabelecimentos, despachos de nomeação de defensores dativos ou
de intimação da Defensoria Pública;
e) cópia do mandado de prisão temporária e/ou preventiva, com a respectiva certidão da data do
cumprimento, bem como com a cópia de eventual alvará de soltura, também com a certidão da data do
cumprimento da ordem de soltura, para cômputo da detração, caso, nesta última hipótese, esta já não tenha
sido apreciada pelo juízo do processo de conhecimento para determinação do regime de cumprimento de
pena, nos termos do art. 387, § 2o, do
Código de Processo Penal;
f) informações acerca do estabelecimento prisional em que o condenado encontra-se recolhido e para
o qual deve ser removido, na hipótese de deferimento de detração que importe determinação do regime de
cumprimento de pena mais benéfico;
g) cópias da decisão de pronúncia e da certidão de preclusão em se tratando de condenação em crime
doloso contra a vida;
h) certidão carcerária;
i) cópias de outras peças do processo reputadas indispensáveis à adequada execução da pena.

Cientificação e Registro

Ao Ministério Público se dará ciência da guia de recolhimento.


Igualmente, ao condenado (§1° do art. 107 da LEP).
As guias de recolhimento, nos termos do §2º do art. 107 da LEP, serão:
a) registradas em livro especial, segundo a ordem cronológica do recebimento;
b) anexadas ao prontuário do condenado.

Retificação

A retificação é a correção das informações constantes na guia de recolhimento.


A guia de recolhimento será retificada sempre que sobrevier modificação quanto ao início da execução
ou ao tempo de duração da pena.
É o que ocorre, por exemplo, em função do cálculo da remição de pena homologado pelo juiz.

Outras guias de execução

No tocante às demais guias de execução, previstas para o regime aberto, penas restritivas de direitos e

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medidas de segurança, devem conter os mesmo requisitos e informações da guia de recolhimento definitiva.

Conteúdo do processo de execução penal

No âmbito do processo de execução penal, os assuntos principais são os seguintes:


a) Roteiro das Penas;
b) Atestado de Pena a Cumprir;
c) Soma e Unificação das Penas;
d) Incidentes da Execução;
e) Doença Mental Superveniente;
f) Benefícios Penais: progressão de regime, autorizações de saída, remição de penas e livramento
condicional.
g) Regressão de regime.

ROTEIRO DAS PENAS

Conceito

O Roteiro das Penas contém o cálculo de liquidação das penas e o resumo das informações relacionadas
ao cumprimento da pena. Ou seja, além do cálculo da pena, deve ainda conter as informações sobre remição
da pena, progressão de regime, indulto, livramento condicional, certidões de feitos em curso, folhas de
antecedentes e outros documentos que permitam o direcionamento dos atos a serem praticados, tais como
requisição de atestado de conduta carcerária, comunicação de fuga e recaptura.
É regulado pela Resolução 113 do CNJ e deve ser constantemente atualizado.

Momento de realização

Autuada a guia de recolhimento no juízo de execução, imediatamente deverá ser providenciado o


cálculo de liquidação de pena com informações quanto ao término e provável data de benefício, tais como
progressão de regime e livramento condicional (art. 5º da Resolução 113 do CNJ).

Forma de tramitação

Pode ser realizado no bojo do processo de execução ou em separado.


Devido à sua importância, no caso de se optar pela tramitação em separado, o primeiro apenso
constituirá o Roteiro de Penas, no qual devem ser elaborados e atualizados os cálculos de liquidação da pena.

Homologação judicial

Este cálculo é elaborado pelo contador judicial.


Os cálculos serão homologados por decisão judicial, após manifestação da defesa e do Ministério
Público (§1º do art. 5º da Resolução 113 do CNJ).
Há, pois, necessidade de homologação judicial tanto da elaboração quanto da atualização do cálculo
que constitui o Roteiro das Penas.

Efeitos

Homologado o cálculo de liquidação, a secretaria do juízo da execução penal deverá, nos termos do §2º

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do art. 5º da Resolução 113 do CNJ, providenciar:


a) o agendamento da data do término do cumprimento da pena;
b) o agendamento das datas de implementação dos lapsos temporais para postulação dos benefícios
previstos em lei;
c) o encaminhamento de duas cópias do cálculo ou seu extrato ao diretor do estabelecimento
prisional, a primeira para ser entregue ao executado, servindo como atestado de pena a cumprir e
a segunda para ser arquivada no prontuário do executado.

Coisa julgada

A homologação judicial do cálculo se sujeita à coisa julgada, exceto em relação aos erros materiais e
omissões de penas, que não foram levadas em consideração, devendo a retificação ser providenciada de ofício
pelo juiz da execução penal.

ATESTADO DE PENA A CUMPRIR

Conceito

O atestado de pena a cumprir é o documento que contém a data do início e do término da pena privativa
de liberdade.
Deve anda conter o montante da pena, o regime e as informações sobre a data em que poderá postular
a progressão de regime e o livramento condicional.
A cópia do cálculo do roteiro da pena também serve como atestado de pena a cumprir.

Competência

É expedido por decisão do juiz da execução penal.


A sua emissão pode ser feita de ofício pelo juiz da execução penal ou a requerimento do preso, da
Defensoria Pública e do Ministério Público.
É entregue ao condenado, mediante recibo.

Momento da expedição

Nos termos da Resolução 113 do CNJ, deve ser emitido anualmente pelo juiz da execução penal:
a) até o último dia do mês de janeiro de cada ano; e
b) em sessenta dias, para os presos que iniciaram ou reiniciaram o cumprimento da pena, a contar da
data do início ou do reinício.
Assim, é expedido logo no início ou reinício do cumprimento da pena privativa de liberdade e, depois
disso, a expedição deve ser anual.

Conteúdo

O atestado de pena a cumprir conterá, dentre outras, as seguintes informações, previstas no art. 13 da
Resolução 113:
I - o montante da pena privativa de liberdade;
II - o regime prisional de cumprimento da pena;
III - a data do início do cumprimento da pena e a data, em tese, do término do cumprimento integral da
pena; e
IV - a data a partir da qual o apenado, em tese, poderá postular a progressão do regime prisional e o
livramento condicional.

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Omissão

Se o requerimento de emissão do atestado de pena a cumprir não for apreciado, no prazo legal, pelo
juiz da execução penal, será cabível a impetração de mandado de segurança.
Outra corrente, porém, preconiza que o remédio cabível seria o “habeas corpus”, pois a referida
omissão coloca em risco a liberdade de locomoção.
Ora, tendo em vista que o requerente já se encontra preso, dificilmente haveria o agravamento do risco
à liberdade de locomoção, razão pela qual o mandado de segurança se revela mais adequado.

Doença Mental Superveniente

A doença mental, que ocorre após o trânsito em julgado da condenação a pena privativa de liberdade,
pode ensejar duas situações:
a) conversão da pena privativa de liberdade em medida de segurança, quando se tratar de doença
mental permanente;
b) internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, quando se tratar de doença mental
transitória (arts.41 do CP e 108 da LEP). Nesse caso, o tempo de internação será computado como pena, nos
termos do art. 42 do CP.
Por outro lado, a doença mental, que ocorre após o trânsito em julgado da condenação a pena de multa,
é causa de suspensão do processo de execução da pena de multa (art. 52 do CP).
Sobre a doença mental, que ocorre após o trânsito em julgado da condenação a pena restritiva de
direitos, a lei é omissa, mas, por analogia “in bonam partem”, deve também ser aplicado o art. 52 do CP,
suspendendo-se a execução penal.
Nas duas situações acima, suspenso o processo de execução das penas de multa ou restritiva de direitos,
a prescrição da pretensão executória, diante da falta de previsão legal, não é suspensa, fluindo normalmente.

INCIDENTES DE EXECUÇÃO

Conceito

Incidentes de Execução são os acontecimentos supervenientes que alteram o fluxo normal de


cumprimento da pena ou da medida de segurança.

Espécies

A LEP prevê os seguintes incidentes:


a) conversões de penas;
b) excesso ou desvio de execução;
c) anistia e indulto.

CONVERSÃO DE PENAS

Conceito

A conversão de penas é a sua transformação noutra espécie de pena ou em medida de segurança.


Não se confunde com os institutos da progressão e regressão, onde se altera apenas o regime e não a
espécie da pena.
Há as conversões que são decididas na sentença condenatória, ainda na fase de conhecimento, e as que
se verificam na fase de execução, que é o que interessa neste estudo.

Hipóteses de conversão no processo de execução

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A LEP prevê as seguintes hipóteses:


a) conversão de pena privativa de liberdade em pena restritiva de direitos;
b) conversão de pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade;
c) conversão de pena privativa de liberdade em medida de segurança.
É ainda possível a conversão da medida de segurança restritiva em medida de segurança detentiva.
Quanto à pena de multa, não pode ser convertida em pena privativa de liberdade, nem em restritiva de
direitos, por falta de previsão legal.

Conversão de penas privativas de liberdade em penas restritas de direitos

Na fase de execução penal, o art. 180 da LEP prevê que a pena privativa de liberdade, não superior a 2
(dois) anos, poderá ser convertida em restritiva de direitos, desde que:
I - o condenado a esteja cumprindo em regime aberto;
II - tenha sido cumprido pelo menos 1/4 (um quarto) da pena;
III - os antecedentes e a personalidade do condenado indiquem ser a conversão recomendável.
O art. 180 da LEP comporta duas interpretações.
Primeira, só é cabível a conversão nas condenações que não excedem a 2 (dois) anos.
Segunda, admite-se a conversão, qualquer que seja o montante da condenação, desde que o restante
da pena não exceda a 2 (dois) anos.
Filio-me a esta última orientação, pois onde a lei não distingue ao intérprete não é lícito distinguir.
No processo de conhecimento, a conversão da pena privativa de liberdade, nos termos do art. 44 do CP,
só é cabível:
a) aos crimes culposos, qualquer que seja a quantidade da pena concreta;
b) aos crimes dolosos, cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, cuja condenação não exceda
a 4 (quatro) anos.
Já a conversão na fase de execução, prevista no art. 180 da LEP, pode ser aplicada a qualquer crime,
inclusive, aos cometidos com violência ou grave ameaça contra pessoa.
A conversão do processo de conhecimento não pode ser aplicada ao reincidente específico na prática
do mesmo crime (§3º do art. 44 do CP).
A conversão na fase de execução, por sua vez, pode ser aplicada ao reincidente específico, pois o art.
180 da LEP não impõe esse obstáculo.
Por fim, não se vislumbra vantagem na conversão do art. 180 da LEP, pois o regime aberto, que é um
dos requisitos da conversão, na prática, por ser domiciliar, é mais vantajoso que as penas restritivas de direitos.
Se, entretanto, na comarca houver casa de albergado, a conversão se revelará atrativa.

CONVERSÃO DE PENA RESTRITIVA DE DIREITOS EM PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE

Introdução

As penas restritivas de direitos, também chamadas de penas alternativas, são as seguintes:


a) prestação de serviços à comunidade ou à entidades públicas;
b) limitação de fim de semana;
c) interdição temporária de direitos,
d) prestação pecuniária,
e) perda de bens e valores.

Polêmica sobre a conversão

Em relação à pena de prestação pecuniária, o assunto é polêmico, quando o condenado solvente deixa
de efetuar o pagamento.

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Uma primeira corrente sustenta que também pode ser convertida em pena privativa de liberdade,
porquanto a lei não lhe abre exceção.
Outra corrente rejeita a conversão, pois esta implicaria numa prisão civil por dívida, o que é vedado pelo
art. 5º, LXVII, da CF.
De fato, na prestação pecuniária revertida em prol da vítima ou seus beneficiários, o montante pago
será deduzido do valor da indenização, de tal sorte que, ao lado do seu caráter de pena, também se reveste
da natureza de dívida.

Causas de conversão

São três as causas de conversão das penas restritivas de direitos em pena privativa de liberdade. Ei-las:
a) descumprimento das restrições impostas;
b) superveniência de condenação por crime doloso à pena privativa de liberdade.
c) prática de falta grave.

Descumprimento das restrições impostas ao condenado

Quando houver o descumprimento das restrições que foram impostas ao condenado, a conversão será
obrigatória (art. 44, §4º, do CP).
No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva
de direitos, respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão.
A conversão é assim pelo restante da pena.
Se, porém, restava menos que trinta dias, a conversão será por trinta dias, que é o saldo mínimo.
No tocante ao descumprimento das restrições, o §1º do art. 181 da LEP dispõe que:
“A pena de prestação de serviços à comunidade será convertida quando o condenado:
a) não for encontrado por estar em lugar incerto e não sabido, ou desatender a intimação por edital;
b) não comparecer, injustificadamente, à entidade ou programa em que deva prestar serviço;
c) recusar-se, injustificadamente, a prestar o serviço que lhe foi imposto;
d) praticar falta grave;
e) sofrer condenação por outro crime à pena privativa de liberdade, cuja execução não tenha sido
suspensa”.
O §2º do citado art. 181 da LEP acrescenta que:
“A pena de limitação de fim de semana será convertida quando o condenado não comparecer ao
estabelecimento designado para o cumprimento da pena, recusar-se a exercer a atividade determinada pelo
Juiz ou se ocorrer qualquer das hipóteses das letras "a", "d" e "e" do parágrafo anterior”.
O § 3º do dispositivo acima ainda rege que:
“A pena de interdição temporária de direitos será convertida quando o condenado exercer,
injustificadamente, o direito interditado ou se ocorrer qualquer das hipóteses das letras "a" e "e", do § 1º,
deste artigo”.

Superveniência de condenação a pena privativa de liberdade por outro crime

Sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade, por outro crime, o juiz da execução penal decidirá
sobre a conversão, podendo deixar de aplicá-la se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva
anterior (art. 44, §5º, do CP).
Trata-se assim de uma conversão facultativa, quando for possível o cumprimento simultâneo de ambas
as penas.
Com efeito, na condenação à pena privativa de liberdade, no regime aberto, será possível ao condenado
cumprir a pena alternativa anterior e, dessa forma, a conversão será facultativa.
Será igualmente facultativa a conversão, na condenação no regime fechado ou semiaberto, em relação
às penas de prestação pecuniária e perda de bens e valores, pois, em relação a elas, será possível cumprir

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simultaneamente a pena privativa de liberdade.


No tocante às demais penas restritivas de direitos, a conversão, em face de nova condenação no regime
fechado ou semiaberto, será obrigatória, tendo em vista a incompatibilidade de cumprimento simultâneo.
Por outro lado, não será possível a conversão quando, na nova condenação, houver sido concedido o
sursis (art. 181, §1º, “e”, §§ 2º e 3º, da LEP).
Por falta de previsão legal, será também vedada a conversão nas seguintes hipóteses:
a) condenação a pena de multa;
b) condenação a pena restritiva de direitos;
c) condenação por contravenção penal.

Prática de falta grave

Outra causa de conversão é a prática de falta grave, em relação às penas de:


a) prestação de serviços à comunidade (§1º do art. 181 da LEP);
b) limitação de fim de semana (§2º do art. 181 da LEP);
c) interdição temporária de direitos (§3º-A do art. 181 da LEP).
Uma das hipóteses de falta grave é a prática de crime doloso (art. 52 da LEP).
Sobre o assunto, dispõe a Súmula 526 do STJ:
“O reconhecimento de falta grave decorrente do cometimento de fato definido como crime doloso no
cumprimento da pena prescinde do trânsito em julgado de sentença penal condenatória no processo penal
instaurado para apuração do fato.”
Aparentemente, a referida súmula colide com o art. 44, §5º, do CP, que se refere à condenação a pena
privativa de liberdade por crime doloso como sendo causa de conversão e não à mera prática do delito.
É, no entanto, possível conciliá-los.
Com efeito, a prática de crime doloso, quando constitui falta grave, ou seja, cometido no curso da
execução da pena restritiva de direitos, é regida pela súmula 526 do STJ, que dispensa o trânsito em julgado
da condenação, ao passo que a prática do crime doloso que não constitui falta grave, isto é, cometido antes
da execução da pena restritiva de direitos, é regulada pelo art. 44, §5º, do CP, que exige, para a regressão, a
efetiva condenação.

Conversão da pena privativa de liberdade em medida de segurança

Ao condenado a quem sobrevier doença mental ou perturbação da saúde mental, no curso do processo
de execução, poderá ocorrer duas situações
a) doença ou perturbação mental transitória, ou seja, com prognóstico de cessação.
Nesse caso, não há falar-se na conversão da pena em medida de segurança.
O condenado será internado em Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (art. 108 da LEP).
Ou seja, até que se restabeleça, cumprirá a pena neste local.
Com a cessação da doença ou perturbação mental, haverá o seu retorno ao estabelecimento penal
anterior, computando-se como pena cumprida o período em que permaneceu internado (art. 42 do CP).

b) doença ou perturbação mental de caráter permanente.


Nesse caso, o art. 183 da LEP prevê a conversão da pena privativa de liberdade em medida de segurança.
O pedido de conversão pode ser ordenado de ofício pelo juiz da execução penal ou mediante
requerimento do Ministério Público, da Defensoria Pública ou da autoridade administrativa.
Trata-se da medida de segurança substitutiva ou vicariante, que perdurará pelo restante da pena, sendo
minoritária a corrente que sustenta a sua duração por tempo indeterminado.
Assim, ainda que não cesse a periculosidade, após exaurido o prazo da pena, o sentenciado deverá ser
solto, mas será possível se requerer, no juízo cível, a internação regida pelas leis civis.
Com a cessação da periculosidade, o sentenciado deverá ser liberado sob condições, nos termos do art.
178 da LEP, ainda que não esgotado o prazo do restante da pena.

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Outra corrente, porém, sustenta que, uma vez cessada a periculosidade, deverá ocorrer, caso ainda
reste pena a cumprir, a regressão da medida de segurança em pena, mas este ponto de vista, diante da falta
de previsão legal, não se sustenta, pois viola o princípio da reserva legal.
Assim, cessada a periculosidade, impõe-se a suspensão da medida de segurança, mediante liberação,
com as seguintes condições obrigatórias, previstas no §1º do art. 132 da LEP, especificadas pelo juiz:
a) obter ocupação lícita, dentro de prazo razoável se for apto para o trabalho;
b) comunicar periodicamente ao Juiz sua ocupação;
c) não mudar do território da comarca do Juízo da execução, sem prévia autorização deste.
O §2° do art. 132 da LEP ainda prevê as seguintes condições facultativas:
a) não mudar de residência sem comunicação ao Juiz e à autoridade incumbida da observação cautelar
e de proteção;
b) recolher-se à habitação em hora fixada;
c) não frequentar determinados lugares.
Se, dentro do prazo de um ano, a contar da liberação condicional, houver a prática de fato indicativo da
persistência da periculosidade, que não precisa ser necessariamente um crime, a medida de segurança, que
estava suspensa, será restabelecida (§3º do art. 97 do CP).
Se, entretanto, não houver nenhum fato indicativo da periculosidade, a medida de segurança será então
declarada extinta pelo juiz da execução penal.

Conversão da medida de segurança

Dispõe o art. 184 da LEP:


“O tratamento ambulatorial poderá ser convertido em internação se o agente revelar incompatibilidade
com a medida”.
Como se trata de sanções da mesma espécie, a terminologia adequada seria a regressão de medida de
segurança, mas a LEP tratou o assunto como sendo conversão.
Assim, a medida de segurança restritiva, que é o tratamento ambulatorial, poderá ser convertida em
medida de segurança detentiva, que é a internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, nos
termos do citado art. 184 da LEP, se o agente revelar incompatibilidade com a medida.
Nesta hipótese, o prazo mínimo de internação será de 1 (um) ano (parágrafo único do art. 184 da LEP).
Quanto à conversão da internação em tratamento ambulatorial, o que implicaria numa progressão de
medidas de segurança, não tem previsão legal.
Em função disso, não é admitido pela doutrina nem jurisprudência.
Não há também previsão legal para a conversão da medida de segurança em pena.

EXCESSO OU DESVIO DE EXECUÇÃO

Conceito

Dispõe o art. 185 da LEP:


“Haverá excesso ou desvio de execução sempre que algum ato for praticado além dos limites fixados na
sentença, em normas legais ou regulamentares”.
O conceito acima merece reparo, em relação ao desvio de execução.
Quanto ao excesso de execução, realmente é o ato praticado além dos limites fixados na sentença, em
normas legais ou regulamentares.
Entretanto, o desvio de execução pode consistir no ato praticado além ou aquém dos limites fixados na
sentença, em normas legais ou regulamentares.
Se o sujeito, por exemplo, é condenado a dez anos de reclusão, mas na guia de recolhimento consta
dez meses, haverá desvio de execução.
Note-se que, no exemplo acima, o ato praticado permaneceu aquém dos limites fixados na sentença
condenatória.

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Tanto no excesso quanto no desvio de execução, o ato praticado viola o ordenamento jurídico,
afrontando:
a) a sentença condenatória;
b) a sentença absolutória imprópria;
c) normas legais,
d) normas regulamentares.
O desvio ou excesso de execução pode atentar contra as normas de direito penal ou de direito
penitenciário.
A concessão indevida de regalias ao preso, por exemplo, afronta o direito penitenciário.
A apreciação do excesso ou desvio de execução será da competência do juiz da execução penal, quer a
norma violada seja de direito penal ou de direito penitenciário.

Excesso de execução

O excesso de execução é a prática de ato que aumenta a quantidade da sanção penal ou disciplinar.
Há, pois, excesso nos seguintes exemplos:
a) a condenação de três anos de reclusão é inscrita na guia de recolhimento como treze anos de
reclusão;
b) o condenado cumpre integralmente a pena, mas não é solto;
c) o condenado por falta grave perde todo o tempo de remição, quando o limite máximo da perda seria
de um terço;
d) o condenado é incluído no RDD preventivo por prazo superior a dez dias;
e) o diretor do presídio aplica a sanção disciplinar de isolamento por prazo superior a trinta dias.
Desvio de execução

O desvio de execução, por sua vez, é a prática de ato que altera a qualidade da sanção penal ou
disciplinar ou que reduz a sua quantidade.
Exemplos:
a) a sentença impõe o regime fechado, mas o sujeito é recolhido em regime semiaberto;
b) a sentença impõe o regime semiaberto, mas, por falta de vaga, a pena é cumprida no regime fechado,
o que afronta a súmula vinculante 56 do STF;
c) o diretor do presídio concede ao preso regalias não previstas nas normas legais ou regulamentares;
d) o juiz concede livramento condicional antes de o condenado cumprir o tempo mínimo da pena
privativa de liberdade exigido pela lei;
e) o diretor do presídio concede dispensa injustificada do trabalho prisional;
f) não instauração de procedimento administrativo disciplinar pela prática de falta grave;
g) autorização de saída temporária fora das hipóteses legais;
h) o sujeito é condenado a dez anos de reclusão, mas na guia de recolhimento consta dez meses.

Distinção

O excesso de execução é o ato que eleva a quantidade da pena, medida de segurança ou sanção
disciplinar, ao passo que o desvio de execução afeta a qualidade ou reduz a quantidade da sanção penal ou
disciplinar.
Outra diferença é que o excesso de execução é necessariamente maléfico para o condenado, ao passo
que o desvio de execução pode ser tanto benéfico quanto maléfico.

Legitimidade

O art. 186 da LEP acrescenta que:


“Podem suscitar o incidente de excesso ou desvio de execução:

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I - o Ministério Público;
II - o Conselho Penitenciário;
III - o sentenciado;
IV - qualquer dos demais órgãos da execução penal”.
Assim, o juiz, de ofício, também pode instaurar o incidente de excesso ou desvio de execução, por duas
razões:
a) é um dos órgãos da execução penal e, portanto, se enquadra no citado art. 186, IV, da LEP;
b) compete ao juiz da execução penal zelar pelo correto cumprimento da pena e da medida de
segurança; nos termos do art. 66, VI, da LEP.

DA ANISTIA, GRAÇA E INDULTO

Generalidades

Anistia, graça e indulto são formas de indulgência, emanadas de órgãos alheios ao Poder Judiciário, que
dispensam, em certos casos, a aplicação da lei penal.
Conquanto oriundos de órgãos estranhos ao Judiciário, anistia, graça e indulto só provocam a extinção
da punibilidade depois de acolhidos por decisão judicial (CP, art. 107, II).

ANISTIA

Conceito

Anistia é a exclusão de um ou mais fatos criminosos da órbita de atuação do direito penal.

Forma

É concedida por lei ordinária.


Exige-se a sanção do Presidente da República (CF, arts. 21, XVII, e 48, VIII), pois é veiculada por lei
ordinária, e não por decreto legislativo.
A iniciativa do projeto de lei é comum, ainda quando se trate de crime político.

Vedações

Em regra, qualquer delito pode ser anistiado, salvo os crimes hediondos, tortura, tráfico ilícito de
entorpecentes e o terrorismo (art. 5º, XLIII, da CF).

Efeitos

A anistia tem efeito “ex tunc”, isto é, para o passado, apagando todos os efeitos penais, rescindindo,
inclusive, a sentença condenatória.
Se, posteriormente, o agente vier a cometer novo delito não será considerado reincidente.
Subsistem, porém, os efeitos civis da sentença penal, que continuará a valer como título executivo
judicial.

Momento

Pode a lei de anistia ser aprovada antes ou durante o processo-crime e mesmo depois do trânsito em
julgado da condenação.

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Classificação

A anistia sempre gera a extinção da punibilidade, não podendo assumir o perfil de comutação de pena.
Ela pode ser:
a) plena ou geral: é a que não abre exceção ao fato anistiado, beneficiando todos os criminosos;
b) restrita ou parcial: é a que excetua certas pessoas ou certos fatos, como a que abrange só os réus
primários;
c) própria: é a concedida antes do trânsito em julgado;
d) imprópria: é a concedida após o trânsito em julgado da sentença condenatória;
e) incondicionada: quando a lei não impõe nenhum encargo ao criminoso, hipótese em não poderá ser
recusada, pois se trata de um benefício de ordem
pública.
f) condicionada: quando a lei impõe algum encargo ao criminoso, que, em função disso, pode se recusar
a aceitar o benefício;
g) especial: abrange só crimes políticos;
h) comum: abrange outros delitos.

Juiz competente

Uma vez em vigor a lei de anistia, a punibilidade, para ser extinta, depende ainda de decisão judicial,
prolatada após a prévia oitiva do Ministério Público.
Caso ainda não haja sentença, a decisão judicial será proferida pelo juiz que conduz o processo de
conhecimento.
Se, porém, o processo, após a sentença, encontrar-se no tribunal, em grau de recurso, o próprio tribunal
reconhece a extinção da punibilidade.
Pode ainda ocorrer de a lei de anistia entrar em vigor após o trânsito em julgado da sentença, quando,
então, a extinção da punibilidade será decretada pelo juízo da execução.

Distinção

Anistia e abolitio criminis têm diversos pontos comuns.


Ambas emanam de lei e apagam o fato criminoso, rescindindo a eventual sentença condenatória e todos
os seus efeitos penais.
Em ambas, subsiste o dever de indenizar a vítima, de modo que a sentença penal condenatória
transitada em julgado continua a valer como título executivo na área cível (art. 67, II, do CPP).
Todavia, na anistia, mantém-se a vigência da norma penal incriminadora, que não é revogada e continua
a ser aplicada aos fatos não abrangidos pela lei alforriante.
Já a abolitio criminis provoca o desaparecimento da norma penal, que é revogada.

INDULTO E GRAÇA

Terminologia

A LEP não utiliza o termo “graça”, mas, em contrapartida, emprega a palavra indulto em dois sentidos:
a) indulto individual, que é a graça (art. 188);
b) indulto coletivo, que é o indulto propriamente dito (art. 193).
O art. 70, II, da LEP ainda se refere à comutação de pena.
Entretanto, a comutação das penas, que é a sua substituição por outra de espécie diversa, em razão de
decreto presidencial, é, na verdade, uma espécie de indulto.

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Conceito

Indulto é a indulgência, de caráter coletivo, que extingue, substitui ou abranda a pena aplicada.
Graça é a indulgência concedida a determinado criminoso, que extingue, substitui ou abranda a pena
aplicada. É também chamada de indulto individual.
A graça, como ensina Basileu Garcia, visa premiar o sentenciado exemplar, para quem a pena já se
mostrou manifestamente desnecessária, ou eximir de maior sofrimento o preso enfermo que tem os dias
contados em razão de algum mal cruciante e incurável.
É claro que outras razões louváveis também poderão motivar a concessão da graça.
Na hipótese de pena de morte, imposta por tribunais militares, em caso de guerra externa (CF, art. 5º,
XLVII, a), transitada em julgado a condenação, cuja execução é por fuzilamento, deverá ser comunicado o
Presidente da República, que poderá, ou não, em sete dias, exercer o direito de graça (arts. 707 e 708 do
CPPM).

Vedação

Dispõe a Constituição Federal que são insuscetíveis de graça e anistia a prática de tortura, o tráfico ilícito
de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os crimes hediondos (art. 5º, XLIII).
A Lei n. 8.072/90, porém, estende a proibição ao indulto (art. 2º, I), ensejando duas interpretações.
Primeira, a restrição ao indulto é inconstitucional, devendo a proibição limitar-se à graça.
Segunda, o termo graça foi empregado em sentido amplo pela Constituição, estendo-se a proibição ao
indulto, de tal sorte que a previsão legal apenas reforça a norma constitucional. É a posição do STJ.
Quanto ao delito de tráfico de drogas privilegiado, previsto no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006, não é
equiparado ao hediondo, razão pela qual admite a anistia, a graça e o indulto.
A Lei 9454/97 não veda o indulto ao crime de tortura, mas o STJ tem decidido que a proibição emana
do texto constitucional, que interpreta o termo graça em sentido amplo para abranger também o indulto.

Classificação

A graça e o indulto podem ser:


a) plenos: quando extinguem a punibilidade;
b) parciais: quando se limitam a prever a diminuição ou a comutação das penas, sendo que, no silêncio
do decreto, os benefícios não se estendem à pena de multa.
Os requisitos previstos para a graça e indulto são apenas os previstos no decreto presidencial.
A lei não pode impor outros requisitos, sob pena de violação do princípio da separação dos poderes,
pois a Constituição Federal atribuiu ao Presidente da República esta função.
Se, por exemplo, o decreto de indulto exige o não cometimento de falta grave nos doze meses
anteriores à sua publicação, o benefício deverá ser concedido aos presos que praticaram falta grave no período
que antecede aos doze meses.
No exemplo acima, as faltas graves cometidas após a publicação do decreto não poderão servir de óbice
ao indulto.

Efeitos

Acerca dos efeitos da graça e do indulto, cumpre mencionar a Súmula 631 do STJ: “
O indulto extingue os efeitos primários da condenação (pretensão executória), mas não
atinge os efeitos secundários, penais ou extrapenais”.
Esta súmula se refere obviamente ao indulto pleno, que extingue a punibilidade e, por
consequência, afasta o efeito primário da condenação, que é a aplicação da pena ou medida de
segurança, subsistindo, na íntegra os efeitos secundários de natureza penal ou civil (exemplos: reincidência,
maus antecedentes, título executivo no cível).

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Quanto ao indulto parcial, não há falar- se em extinção da punibilidade.


A aludida súmula sedimenta o entendimento doutrinário e jurisprudencial, segundo o qual
persistem os efeitos secundários da condenação, tendo em vista que o indulto e a graça são
concedidos somente após o trânsito em julgado.

Semelhanças

Graça e indulto apresentam os seguintes pontos comuns:


a) são concedidos por decreto do Presidente da República, que pode delegar a atribuição aos Ministros
de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União (parágrafo único do art. 84 da
CF). Já a concessão da anistia depende de lei.
b) só devem ser concedidos após o trânsito em julgado da condenação, diferentemente da anistia, que
pode ser concedida antes ou depois do trânsito em julgado. Na prática, porém, às vezes se tem visto decreto
de indulto beneficiando condenados com sentença ainda não transitada em julgado, desvirtuando-se, assim,
a estrutura desse instituto. No tocante à graça, não paira dúvida: só pode ser concedida após o trânsito em
julgado, por força do art. 734 do CPP, que usa o termo “condenado”.
c) não rescindem a sentença penal condenatória, que subsiste, intacta, com todos os seus efeitos
secundários, penais e civis. Se, posteriormente, o agente vier a cometer novo delito, será considerado
reincidente.
d) para surtirem efeitos, dependem de decisão do juízo da execução penal.
e) não admitem a recusa do beneficiado, em relação à extinção ou redução da pena. Entretanto, podem
ser recusados em duas situações. Primeira, quando forem condicionados. Segunda, quando comutarem penas.

Distinção

Conquanto apresentem tantas características comuns, indulto e graça têm também alguns pontos de
divergência.
O indulto, tal como a anistia, é medida de caráter coletivo, de efeitos impessoais, pois os seus
beneficiários não são identificados nominalmente, e, sim, através de circunstâncias em que o delito tenha sido
cometido, ao passo que a graça tem caráter individual, contemplando uma determinada pessoa.
O indulto e a anistia têm caráter espontâneo, pois são concedidos independentemente de
requerimento.
A graça, por sua vez, pode ser:
a) espontânea: quando o decreto houver sido expedido por iniciativa do próprio Presidente da
República.
b) provocada: quando houver sido requerida ao Presidente da República, por petição do próprio
condenado, do Ministério Público, do Conselho Penitenciário ou da autoridade administrativa (art. 188 da
LEP).

Procedimento administrativo

Na hipótese de graça provocada, após o requerimento, instaura-se um procedimento administrativo no


Ministério da Justiça, onde haverá:
a) o relatório e parecer do Conselho Penitenciário para posterior encaminhamento ao Ministério da
Justiça (arts. 189 e 190 da LEP).
O relatório versará sobre a narração do ilícito penal e dos fundamentos da sentença condenatória, a
exposição dos antecedentes do condenado e do procedimento deste depois da prisão.
O parecer será sobre o mérito do pedido.
b) o parecer do Ministro da Justiça (art. 189 da LEP).
c) o encaminhamento dos autos ao Presidente da República para decidir sobre o pedido.
d) o decreto presidencial de graça, caso defira o pedido.

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Aludido decreto poderá ou não se basear nos pareceres do Conselho Penitenciário e do Ministério da
Justiça, pois estes não têm caráter vinculante.
O procedimento acima, conquanto previsto para a graça provocada, também se aplica ao indulto e à
graça espontânea, colhendo-se assim o parecer do Conselho Penitenciário e do Ministro da Justiça, o que é
salutar, pois se confere um certo suporte jurídico ao Presidente da República, antes de ele expedir o decreto
de indulto.

Procedimento judicial

Expedido o decreto de graça ou indulto, o juiz da execução penal, nos termos do art. 192 da LEP,
declarará extinta a pena ou ajustará a execução aos termos do decreto, no caso de comutação.
O juiz, antes de decidir, deverá ouvir o Ministério Público.
De acordo com o STJ, o juiz da execução penal, malgrado a previsão no art. 70, II, da LEP, não deve
colher a manifestação do Conselho Penitenciário, salvo quando houver expressamente esta exigência no
decreto de indulto.

EXECUÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS

Considerações gerais

De acordo com o art. 43 do CP, as penas restritivas de direitos são:


I - prestação pecuniária;
II - perda de bens e valores;
III - limitação de fim de semana.
IV - prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas;
V - interdição temporária de direitos;
VI - limitação de fim de semana
A Lei de Execução Penal só prevê o procedimento de execução das penas de prestação de serviços à
comunidade, limitação de fim de semana e interdição temporária de direitos.
É omissa em relação às penas de prestação pecuniária e perda de bens e valores, pois, na época de sua
promulgação, estas duas penas ainda não existiam no ordenamento jurídico brasileiro.
Em razão disto, a execução destas duas penas serão examinadas de forma separada das demais.

Vedação da execução provisória

Nos termos da súmula 643 do STJ, a execução da pena restritiva de direitos depende do trânsito em
julgado da condenação.
É, pois, vedada, por falta de previsão legal e em atenção ao princípio da presunção da inocência, a
execução provisória, qualquer que seja a modalidade das penas restritivas de direitos.

Competência

A competência, para a execução, é do juízo comum da execução penal do local de cumprimento da


pena.
Caso a pena restritiva de direitos, porém, tenha emanado de transação penal, a sua execução será no
próprio juizado especial criminal, mas se imposta por sentença, ainda que oriunda do JECRIM, a competência
será do juízo comum da execução penal, por força do art. 86 da Lei 9.099/95, que é uma norma especial em
relação ao art. 60 da mesma Lei.

Legitimidade ativa

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O processo de execução das penas de prestação de serviços à comunidade, limitação de fim de semana
e interdição temporária de direitos deve se iniciar de ofício, pelo juiz da execução penal, ou mediante
requerimento do Ministério Público.
Assim, tanto o juiz da execução penal quanto o Ministério Público têm legitimidade ativa para a
instauração do processo de execução das referidas penas.
Sobre o assunto, dispõe o art. 147 da LEP:
“Transitada em julgado a sentença que aplicou a pena restritiva de direitos, o Juiz da execução, de ofício
ou a requerimento do Ministério Público, promoverá a execução, podendo, para tanto, requisitar, quando
necessário, a colaboração de entidades públicas ou solicitá-la a particulares”.

Peça inicial

A peça inicial do processo de execução penal será a guia de execução de pena restritiva de direitos ou
o requerimento do Ministério Público.
Quando instaurado de ofício, a peça inicial do processo de execução será a guia de execução de pena
restritiva de direitos.
Com efeito, transitada em julgado a sentença, o juiz da condenação tem o dever de ordenar a expedição
da guia de execução de pena restritiva de direitos, que será encaminhada ao juízo da execução penal que, por
sua vez, ao receber a guia, instaurará o processo de execução.
Se, por algum lapso, o juiz não instaurar o processo de execução, o Ministério Público deverá requerer
a sua instauração, hipótese em que o juiz da execução providenciará a juntada da guia de execução de pena
restritiva de direitos, para que seja anexada aos autos, solicitando-a ao juiz da condenação, caso este ainda
não lhe tenha enviado.

Procedimento de execução da pena de prestação de serviços à comunidade ou à entidades públicas

A pena de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas consiste na atribuição de tarefas


gratuitas ao condenado (§1º do art. 46 do CP).
As tarefas serão realizadas em entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros
estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais (§2º do art. 46 do CP).
As tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do condenado, devendo ser cumpridas à razão de uma
hora de tarefa por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho (§3º do
art. 46 do CP).
Se a pena substituída for superior a um ano, é facultado ao condenado cumprir a pena substitutiva em
menor tempo (art. 55), nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada (§4º do art. 46 do CP). É
claro que, para tanto, terá que trabalhar mais.
A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas só é aplicável às condenações superiores
a seis meses de privação da liberdade (art. 46 do CP).
Instaurado o processo de execução, o juiz da execução penal deverá designar a entidade onde o serviço
será prestado.
A designação da entidade é função do juiz da execução penal e não do juiz da condenação.
Em seguida, deverá intimar o condenado acerca do início do cumprimento da pena.
A propósito, dispõe o art. 149 da LEP:
“Caberá ao Juiz da execução:
I - designar a entidade ou programa comunitário ou estatal, devidamente credenciado ou
convencionado, junto ao qual o condenado deverá trabalhar gratuitamente, de acordo com as suas aptidões;
II - determinar a intimação do condenado, cientificando-o da entidade, dias e horário em que deverá
cumprir a pena;
III - alterar a forma de execução, a fim de ajustá-la às modificações ocorridas na jornada de trabalho”.
O trabalho terá a duração de 8 (oito) horas semanais e será realizado aos sábados, domingos e feriados,
ou em dias úteis, de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho, nos horários estabelecidos pelo Juiz

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(§1º do art. 149 da LEP).


Note-se que a jornada é de 8 (oito) horas por semana e não 8 (oito) horas por dia.
Se a condenação for superior a um ano, a pena poderá ser cumprida em menor tempo, mas nunca
inferior à metade, de tal sorte que poderá trabalhar no máximo 16 (dezesseis) horas semanais
A execução terá início a partir da data do primeiro comparecimento (§2º do art. 149 da LEP).
A entidade beneficiada com a prestação de serviços encaminhará mensalmente, ao Juiz da execução,
relatório circunstanciado das atividades do condenado, bem como, a qualquer tempo, comunicação sobre
ausência ou falta disciplinar (art. 150 da LEP).
Em qualquer fase da execução, poderá o Juiz, motivadamente, alterar, a forma de cumprimento da
referida pena, a fim de ajustá-las:
a) às modificações ocorridas na jornada de trabalho (art. 149, III, da LEP);
b) às condições pessoais do condenado (art. 148 da LEP);
c) às características da entidade ou do programa comunitário ou estatal (art. 148 da LEP).

Procedimento de execução da pena de limitação de fim de semana

A pena de limitação de fim de semana consiste na obrigação de permanecer, aos sábados e domingos,
por 5 (cinco) horas diárias, em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado (art. 48 do CP).
Ou seja, 5 (cinco) horas no sábado e outras 5 (cinco) nos domingos, sendo, pois, uma prisão de fim de
semana.
Nesta pena, poderão ser ministrados ao condenado, durante o tempo de permanência, cursos e
palestras, ou atribuídas atividades educativas (art. 152 da LEP).
Nos casos de violência doméstica contra a mulher, o juiz poderá determinar o comparecimento
obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação (parágrafo único do art. 152).
Instaurado o processo de execução, caberá ao Juiz da execução determinar a intimação do condenado,
cientificando-o do local, dias e horário em que deverá cumprir a pena (art. 151 da LEP).
A execução terá início a partir da data do primeiro comparecimento (parágrafo único do art. 151).
O estabelecimento designado encaminhará, mensalmente, ao Juiz da execução, relatório, bem assim
comunicará, a qualquer tempo, a ausência ou falta disciplinar do condenado (art. 153 da LEP).
Em qualquer fase da execução, poderá o Juiz, motivadamente, alterar, a forma de cumprimento da
aludida pena, ajustando-as:
a) às condições pessoais do condenado;
b) às características do estabelecimento ou do programa comunitário ou estatal (art. 148 da LEP).

Procedimento da execução da pena de interdição temporária de direitos

De acordo com o art. 47 do CP, as penas de interdição temporária de direitos são:


I - proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo;
II - proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de
licença ou autorização do poder público;
III - suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo.
IV – proibição de frequentar determinados lugares.
V - proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos.
Quanto à pena de suspensão da habilitação para dirigir veículos, operou-se a revogação tácita do art.
47, III, do CP, pois esta pena passou a ser disciplinada pelo Código de Trânsito Brasileiro, mas ainda remanesce
a vigência do aludido inciso III em relação à pena de suspensão da autorização
Instaurado o processo de execução, caberá ao juiz da execução duas providências:
a) comunicar à autoridade competente a pena aplicada;
b) determinar a intimação do condenado acerca da restrição que lhe fora imposta;
O início da execução da pena se verifica com esta intimação, salvo em relação à pena de proibição do
exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo, prevista no art. 47, I, do CP.

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situação em que o início da pena é disciplinado pelo § 1º do art. 47 do CP, que dispõe:
“Na hipótese de pena de interdição do artigo 47, inciso I, do Código Penal, a autoridade deverá, em 24
(vinte e quatro) horas, contadas do recebimento do ofício, baixar ato, a partir do qual a execução terá seu
início”.
Assim, o início da execução desta pena ocorre com o ato de proibição da autoridade administrativa
acerca da proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo.
Nas hipóteses do artigo 47, incisos II e III, do Código Penal, o Juízo da execução determinará a apreensão
dos documentos, que autorizam o exercício do direito interditado (§2º do art. 47 da LEP).
Assim, serão apreendidos os seguintes documentos:
a) a autorização para dirigir veículo, quando aplicada a respectiva pena de suspensão da autorização.
b) o documento de habilitação especial, a licença e autorização, conforme a hipótese, quando aplicada
a correspondente pena de proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício.
A autoridade deverá comunicar imediatamente ao Juiz da execução o descumprimento da pena (art.
155 da LEP).
A comunicação também poderá ser feita por qualquer prejudicado (parágrafo único do art. 155 da LEP).

Procedimento de execução da pena de prestação pecuniária

A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou a entidade


pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a 1 (um) salário mínimo
nem superior a 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos (primeira parte do § 1º do art. 45 CP)
O valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil, se
coincidentes os beneficiários (segunda parte do §1º do art. 45 CP).
Se houver aceitação do beneficiário, a prestação pecuniária pode consistir em prestação de outra
natureza (§2º do art. 45 CP).
É a chamada pena de prestação inominada, cuja constitucionalidade é discutível, tendo em vista que o
seu conteúdo não é definido em lei, afrontando-se assim o princípio da taxatividade.
O processo de execução da pena de prestação pecuniária, conforme já dito, não é regulado pela LEP e,
diante disso, por analogia, se aplica o procedimento de execução da pena de multa, previsto no art. 164 e
seguintes da LEP.
O título executivo será a certidão da sentença condenatória, extraída pelo escrivão, com menção do
trânsito em julgado, constando também o valor da condenação. Não há, destarte, a expedição da guia de pena
restritiva de direitos.
A competência é do juízo da execução penal.
O procedimento se resume nos seguintes atos:
a) a execução se inicia através de petição do Ministério Público, pois não se pode delegar ao particular
a execução de uma pena.
Outra corrente, porém, sustenta que a execução teria que ser movida pelo beneficiário, pois o
Ministério Público não pode patrocinar interesse privado. Ora, sempre há interesse público no cumprimento
de uma pena, ainda que esta consista na reparação do dano.
b) o condenado será citado para, no prazo de 10 (dez) dias, pagar ou nomear bens à penhora.
c) decorrido o prazo sem o pagamento, ou o depósito da respectiva importância, proceder-se-á à
penhora de tantos bens quantos bastem para garantir a execução.
d) se a penhora recair em bem imóvel, os autos apartados serão remetidos ao Juízo Cível para
prosseguimento (art. 165 da LEP). Trata-se de uma exceção ao princípio da perpetuação da jurisdição.
e) após a penhora e avaliação, ainda haverá o leilão, a arrematação e o pagamento.

Procedimento da execução da pena de perda de bens e valores

A perda de bens e valores, regulada pelo §3º do art. 45 do CP, consiste na expropriação de coisas
corpóreas ou incorpóreas do condenado, tendo como teto o que for maior entre o montante do prejuízo

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causado e o provento obtido pelo agente ou por terceiro, em consequência da prática do crime.
É destinada, ressalvada a legislação especial, ao Fundo Penitenciário Nacional.
O processo de execução desta pena, conforme já dito, não é regulado pela LEP.
Na verdade, com o trânsito em julgado da condenação, a propriedade do bem ou valor expropriado será
automaticamente incorporado ao patrimônio do Fundo Penitenciário Nacional, prescindindo-se de uma
execução penal.
No tocante à posse, é preciso distinguir três situações:
a) o bem ou valor expropriado se encontra apreendido no processo. Nesse caso, o próprio juiz da
condenação, após o trânsito em julgado, determinará a sua entrega ao Fundo Penitenciário Nacional.
b) o bem ou valor expropriado se encontra na posse de terceiro. Nesse caso, a União terá que mover na
esfera cível federal
a ação de imissão de posse.
c) o bem ou valor expropriado se encontra na posse do condenado. Nesse caso, penso que, por analogia,
deve ser aplicado, no que couber, o procedimento de cumprimento de sentença para entrega de coisa,
previsto no art. 538 do CPC, que tramitará no juízo da execução penal, tendo em vista a possibilidade de esta
pena, em caso de descumprimento, ser convertida em pena privativa de liberdade.
O procedimento pode ser instaurado de ofício pelo juiz da execução penal, nos termos dos arts. 536 e
538 do CPC, ou mediante petição inicial do Ministério Público, funcionando como título executivo a carta de
sentença.
Por se tratar de execução de pena, não poderá ser movida pela Fazenda Pública Nacional.
O condenado será citado para entregar a coisa no prazo fixado pelo juiz e, se o fizer, será lavrado o
termo de entrega ou auto de imissão na posse, conforme se trate de bem móvel ou imóvel, extinguindo-se a
execução.
Se a coisa não for entregue no prazo será possível duas alternativas:
a) a expedição do mandado de busca e apreensão ou de imissão de posse, conforme se trate de bem
móvel ou imóvel; ou
b) a conversão em pena privativa de liberdade.
Decretada a conversão em pena privativa de liberdade, os efeitos serão os seguintes:
a) desaparece a pena de perda de bens e valores, de modo que o bem ou valor volta a pertencer ao
condenado;
b) o juiz da execução penal manda expedir a guia de recolhimento e instaura formalmente o processo
de execução da pena privativa de liberdade.
Se ocorrer o perecimento do bem sem culpa do condenado, a execução será extinta e não haverá a
conversão em pena privativa de liberdade, pois, nesse caso, o descumprimento da pena restritiva ocorreu por
motivo justificado.

EXECUÇÃO DA PENA DE MULTA

Introdução

A pena de multa é aplicada em duas fases.


Na primeira, o juiz fixa a quantidade de dias-multa, que varia entre o mínimo de dez e o máximo de
trezentos e sessenta.
Na segunda, é fixado valor de cada dia-multa, que pode variar entre o mínimo de um trigésimo do salário
mínimo e o máximo de cinco salários mínimos, mas que pode ser aumentado até o triplo, se o juiz considerar
que, em virtude da situação econômica do réu, é ineficaz, embora aplicada no máximo.

Tipos de processos

O pagamento é a execução da multa.


É vedada a execução provisória da pena de multa, cuja cobrança só poderá ser realizada após o trânsito

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em julgado da condenação.
O pagamento da pena de multa pode se verificar em dois tipos de processos:
a) processo de conhecimento;
b) processo de execução.

Normas comuns

Em ambos os processos, cumpre observar as seguintes regras comuns


à pena de multa:
a) não poderá ser convertida em pena privativa de liberdade, por falta de previsão legal;
b) não poderá ser convertida em pena restritiva de direitos. A Lei 9.099/95 prevê esta conversão para
as infrações penais de menor potencial ofensivo, mas não disciplina a forma de conversão, razão pela qual é
inaplicável;
c) é possível o pedido de parcelamento mensal (art. 50, 2ª parte, do CP). A lei não impõe limites ao
número de parcelas, mas é importante se observar o princípio da razoabilidade. O parcelamento, para ser
aceito, depende de decisão judicial;
d) após a quitação integral, o juiz declarará extinta a pena de multa e, caso seja a única pena aplicada,
comunicará o Tribunal Regional Federal, para o fim de restabelecimento dos direitos políticos do condenado,
que estavam suspensos;
e) a pena de multa é destinada ao Fundo Penitenciário Nacional ou Estadual, conforme se trate de crime
da competência federal ou estadual, em função do princípio da federação. Outra corrente sustenta que será
sempre destinada ao Fundo Penitenciário Nacional, por força do art. 2º, V, da LC 79/94;
f) as decisões sobre a pena de multa só poderão ser tomadas no próprio processo onde se realiza a sua
cobrança e não no processo de execução que trata da pena privativa de liberdade ou da pena restritiva de
direitos;
g) o recurso cabível contra as decisões judiciais, sobre a cobrança da pena de multa no juízo criminal, é
o agravo em execução;
h) o procedimento é o mesmo, quer se trate depena de multa aplicada isoladamente ou
cumulativamente com pena privativa de liberdade ou com pena restritiva de direitos.
i) caráter autônomo da pena de multa. A pena de multa, mesmo quando imposta cumulativamente
com a pena privativa de liberdade, não tem caráter acessório.
Assim, o cumprimento da pena privativa de liberdade, ou do sursis, bem como a obtenção de livramento
condicional, não implica na extinção da pena de multa, que foi imposta cumulativamente (§§ 1º e 2º do art.
170 da LEP).

Cobrança no processo de conhecimento

Nas condenações com trânsito em julgado à pena de multa, aplicada isoladamente ou cumulativamente
com pena privativa de liberdade ou com pena restritiva de direitos, o juiz da vara onde tramitou o processo
de conhecimento deverá primeiramente verificar se houve ou não a decretação de fiança.
De fato, caso o réu tenha recolhido fiança, o respectivo valor servirá para pagamento da pena de multa,
nos termos do art. 336 do CPP, prescindindo-se da intimação do condenado.
Em sendo o valor da fiança suficiente para o pagamento total, o juiz declarará extinta a pena de multa;
se o valor for insuficiente, será feito o respectivo abatimento da pena de multa.
Se não houver fiança, ou se o seu valor for insuficiente, o juiz do processo de conhecimento ordenará a
intimação do condenado, nos termos do art. 50 do CP, para que, dentro do prazo de 10 (dez) dias, efetue o
pagamento ou requeira o seu parcelamento.
O referido prazo de 10 (dez) dias começa a fluir no primeiro dia útil seguinte à intimação.
No mandado de intimação deve constar o valor atualizado da multa, mas sem a incidência de juros, pois
ainda não há mora, outrossim, o prazo de 10 (dez) dias para que se efetue o pagamento ou se requeira o
parcelamento.

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Na prática, a aludida intimação costuma ser feita por carta com AR.
Caso o condenado não seja encontrado, após esgotados os meios para se tentar localizá-lo, o juiz do
processo de conhecimento determinará a sua intimação por edital.
Na intimação por edital, o prazo de 10 (dez) dias para pagamento voluntário ou requerimento de
parcelamento, só começa a fluir após esgotado o prazo do edital, que é de 15 (quinze) dias (arts. 370 c/c 361
do CPP).
Efetivada a intimação, por carta, mandado ou por edital, dentro do prazo de 10 (dez) dias, podem
ocorrer três situações:
a) o pagamento integral da pena de multa. Nesse caso, o juiz declarará extinta a pena de multa e, em
sendo ela a única pena aplicada, comunicará o Tribunal Regional Federal para restabelecimento dos direitos
políticos do condenado
b) o não pagamento. Nesse caso, o juiz ordenará a extração da certidão da sentença penal condenatória,
com menção do trânsito em julgado e do valor da multa, que será enviada ao Ministério Público para que o
mesmo providencie a instauração do processo de execução.
Em alguns Estados, o juiz da vara onde tramitou o processo, no lugar dessa certidão, manda expedir a
carta de sentença, que é a cópia das principais peças do processo, que também funciona como título executivo
judicial.
c) o pedido de parcelamento em parcelas mensais, nos termos art. 50, 2ª parte, do CP.
A lei não impõe limites ao número de parcelas, que deverá observar o princípio da razoabilidade. Se o
juiz deferir o parcelamento, sobrevindo a quitação de todas as parcelas, a pena de multa será declarada
extinta.
Em havendo impontualidade de uma das parcelas, o juiz revogará o parcelamento e mandará extrair a
certidão da sentença condenatória transitada em julgado, entregando-a ao Ministério Público para o fim de
instauração do processo de execução.

COBRANÇA NO PROCESSO DE EXECUÇÃO

Momento da instauração do processo de execução

Em não havendo o pagamento voluntário, no decênio legal, ou o cumprimento pontual do


parcelamento, o juiz da vara onde tramitou o processo de conhecimento ordenará a extração do título
executivo judicial da pena de multa, para que seja entregue ao Ministério Público.
Assim, o processo de execução da pena de multa só será instaurado quando, após o trânsito em julgado
da condenação, se verificar infrutífera a cobrança levada a efeito pelo juízo da vara da condenação.
Caso, porém, o processo de execução tenha sido instaurado sem que houvesse uma prévia tentativa de
cobrança no juízo da condenação, não há falar-se em nulidade, diante da ausência de prejuízo.

Título executivo judicial

A rigor, o título executivo judicial da pena de multa é a certidão da sentença condenatória, contendo o
valor da multa e a menção do trânsito em julgado, que é extraída pelo escrivão, prescindindo-se de outras
peças do processo cognitivo (art. 164 da LEP).
Nada obsta, porém, que seja extraída a carta de sentença, que contém as principais peças do processo
de conhecimento, inclusive, a certidão do trânsito em julgado.
Em suma, o título executivo judicial da pena de multa, quer tenha sido aplicada isoladamente ou
cumulativamente com a pena privativa de liberdade, pode ser tanto certidão da sentença condenatória com
menção do trânsito em julgado, extraída com base no art. 164 da LEP, quanto a carta de sentença.
Ambos os documentos são extraídos pelo escrivão, por ordem do juiz do processo de conhecimento e
entregue ao Ministério Público.

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Competência

A competência para o processo de execução da pena de multa é do juízo da execução penal (art. 51 do
CP).
Se, porém, a penhora recair sobre bem imóvel, a competência será deslocada para o juízo cível (art. 165
da LEP).
A pena de multa, quando aplicada, juizado criminal, terá a seguinte competência;
a) juízo comum da execução penal, quando aplicada cumulativamente com as penas privativa de
liberdade ou restritiva de direitos (art. 86 da Lei 9.099/95).
b) no próprio juizado especial criminal, quando for a única pena aplicada ou imposta em transação penal
(art. 60 da Lei 9.099/95).

Legitimidade ativa

A legitimidade ativa para propor a ação de execução da pena de multa, ainda que se trate de ação penal
privada, é exclusiva do Ministério Público (arts. 129, I, da CF e 164 da LEP).
A súmula 521 do STJ, que previa a competência do juízo da execução fiscal e a legitimidade exclusiva da
Procuradoria da Fazenda Pública, foi cancelada, em razão do advento da Lei 13.964/2019 que alterou a
redação do art. 51 do CP para determinar que a multa deve ser executada perante o juiz da execução penal.

Procedimento da execução

O primeiro ato do processo de execução, previsto no art. 164 e seguintes da LEP, é a petição inicial do
Ministério Público, contendo o valor da multa e o pedido de citação para, no prazo de 10 (dez) dias, pagar ou
nomear bens à penhora (art. 164 da LEP).
Efetuada a citação, podem ocorrer, dentro do prazo de dez dias, quatro situações:

I) o executado realiza o pagamento.


Nesse caso, o juiz declara extinta a pena de multa e, se ela for a única aplicada, oficia ao Tribunal
Regional Eleitoral, para o fim de se restabelecer os direitos políticos, que estavam suspensos, em razão da
condenação.

II) o executado requer o parcelamento da pena de multa, em prestações mensais, iguais e sucessivas.
O pedido de parcelamento só pode ser feito dentro deste prazo de dez dias (art. 69 da LEP).
O Juiz, conforme preceitua o §1° do art. 169 da LEP, antes de decidir sobre o pedido de parcelamento,
poderá determinar diligências para verificar a real situação econômica do condenado e, ouvido o Ministério
Público, fixará o número de prestações.
O parcelamento é um direito público subjetivo do condenado, só podendo ser indeferido quando puder
pagar à vista sem ser privado dos recursos necessários à sua sobrevivência.
Acolhido o pedido parcelamento, o §2º do citado art. 169 esclarece que se o condenado for impontual
ou se melhorar de situação econômica, o Juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, revogará o
benefício executando-se a multa, prosseguindo-se na execução já iniciada.
Como se vê, o benefício do parcelamento será revogado em duas situações:
a) se houver impontualidade. Não se exige, para a revogação, o inadimplemento.
b) se o executado melhorar a sua situação econômica.
III) o executado apresenta impugnação. Exemplo: alega a prescrição da pena de multa. Outro exemplo:
alega que ainda não houve o trânsito em julgado da condenação.
Se a impugnação recair sobre o valor da execução, ou seja, excesso de execução, é mister que esteja
acompanhada:
a) do pagamento da parte incontroversa, sob pena de penhora.

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b) do cálculo do valor que reputa ser o correto, sob pena de não conhecimento desse fundamento, por
aplicação subsidiária do §5º do art. 525 do CPC.
IV) o executado não paga, não requer o parcelamento nem nomeia bens à penhora.
Neste caso, o juiz expedirá o mandado de penhora e avaliação de tantos bens quantos bastem para
garantir a execução, sendo também possível a penhora on-line, que é uma ordem de bloqueio de dinheiro
dirigida às instituições financeiras.
Se a penhora recair em bem imóvel, os autos apartados serão remetidos ao Juízo Cível para
prosseguimento (art. 165 da LEP).
Recaindo a penhora em outros bens, dar-se-á prosseguimento nos termos do § 2º do artigo 164, da LEP,
no próprio juízo da execução penal (art. 166 da LEP).
Dispõe o §2º do art. 164 do CPC:
“A nomeação de bens à penhora e a posterior execução seguirão o que dispuser a lei processual civil”.
Assim, após a penhora, são aplicáveis às normas do Código de Processo Civil, que prevê que os próximos
atos devem ser os seguintes:
a) o executado será intimado da penhora e se esta recair sobre imóvel, intima-se também o seu cônjuge,
que poderá ingressar com embargos de terceiro para excluir a sua meação da penhora;
b) avaliação do bem penhorado;
c) leilão;
d) pagamento realizado pelo arrematante do bem penhorado;
e) extinção da execução.
Com a arrematação do bem penhorado, se o valor for suficiente, a pena de multa será declarada extinta;
se insuficiente, a execução prosseguirá, em relação ao saldo remanescente.

Execução da pena de multa por desconto em folha de pagamento

Sobre a conversão do procedimento, dispõe o art. 168 da LEP:


“O Juiz poderá determinar que a cobrança da multa se efetue mediante desconto no vencimento ou
salário do condenado, nas hipóteses do artigo 50, §1º, do Código Penal, observando-se o seguinte:
I - o limite máximo do desconto mensal será o da quarta parte da remuneração e o mínimo o de um
décimo;
II - o desconto será feito mediante ordem do Juiz a quem de direito;
III - o responsável pelo desconto será intimado a recolher mensalmente, até o dia fixado pelo Juiz, a
importância determinada”.
Conforme se pode verificar, a conversão do procedimento de penhora para desconto em folha de
pagamento depende de uma decisão judicial.
Não se trata, portanto, de uma opção do Ministério Público em mover a execução por penhora ou
desconto em folha de pagamento.
O Ministério Público deve mover a execução por penhora de bens, nos termos do art. 164 da LEP.
Após a citação, se não houver o pagamento no prazo de dez dias, o juiz, em vez de ordenar a penhora,
poderá, de ofício ou a requerimento do Ministério Público ou do executado, determinar que a execução se
realize mediante desconto em folha de pagamento.
Esta forma de execução é mais eficiente, pois o juiz oficia a empregadora ordenando o desconto do
valor da pena de multa em folha de pagamento, sob pena de crime de desobediência.
Ela só será cabível quando o executado receber salário ou vencimentos por holerite. Exemplo:
funcionário público. Outro exemplo: empregado sujeito à legislação do trabalho.
O desconto não deve incidir sobre os recursos indispensáveis ao sustento do condenado e de sua família
(§2º do art. 51 do CP).
Em razão disso, o limite máximo do desconto mensal será o da quarta parte da remuneração e o mínimo
o de um décimo.
O §1º do art. 51 do CP cobrança da multa só pode efetuar-se mediante desconto no vencimento ou
salário do condenado quando:

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a) aplicada isoladamente;
b) aplicada cumulativamente com pena restritiva de direitos;
c) concedida a suspensão condicional da pena.
Noutras palavras, só não seria possível o desconto em folha quando a pena de multa houvesse sido
aplicada cumulativamente com pena privativa de liberdade
Entretanto, veja o que dispõe o art. 170 da LEP:
“Quando a pena de multa for aplicada cumulativamente com pena privativa da liberdade, enquanto
esta estiver sendo executada, poderá aquela ser cobrada mediante desconto na remuneração do condenado”.
Ou seja, a pena de multa, mesmo quando cumulada com a pena privativa de liberdade, poderá também
ser executada mediante desconto em folha.
A conclusão é que sempre será possível a execução por desconto em folha, devendo ser desconsiderada
a proibição implícita prevista no §1º do art. 51 do CP, por colidir com o citado art. 170 da LEP, impondo-se,
destarte, a sua interpretação “ab rogante”.

Suspensão da execução

O processo de execução da pena de multa será suspenso em duas hipóteses:


a) superveniência de doença mental (art. 52 do CP);
b) quando não houver bens a serem penhorados.

Extinção da punibilidade da pena de multa sem que haja pagamento

Questão interessante é saber se a extinção da punibilidade da pena privativa de liberdade ou restritiva


de direitos gera ou não a extinção da pena de multa, em relação aos condenados hipossuficientes.
O assunto tem relevância prática, pois, enquanto não extinta a punibilidade da pena de multa, o
condenado não poderá obter a reabilitação penal, que lhe assegura o sigilo da condenação. Em função disso,
não conseguirá a certidão negativa de antecedentes criminais, com a qual busca emprego formal.
Outrossim, não poderá regularizar o seu título de eleitor, pois os seus direitos políticos permanecerão
suspensos. Logo, estará proibido de votar, de se matricular em instituição de ensino público e de exercer
cargos públicos concursados.
A persistência dos efeitos acima militam contra o processo de ressocialização do condenado, fazendo
perdurar o seu estigma de “criminoso” por tempo superior à própria pena privativa de liberdade, o que fere a
lógica.
Sensibilizado com o problema, o Superior Tribunal de Justiça afirmou, em recurso especial repetitivo, a
seguinte tese:
"Nos casos em que haja condenação a pena privativa de liberdade e multa, cumprida a primeira (ou a
restritiva de direitos que eventualmente a tenha substituído), o inadimplemento da sanção pecuniária não
obsta o reconhecimento da extinção da punibilidade” (REsp 1.785.383 e REsp 1.785.861).
É claro que a extinção da punibilidade da pena de multa, sem que haja o respectivo pagamento ou a
prescrição, é um benefício que se aplica exclusivamente aos condenados pobres, estando assim amparado
pelo princípio da isonomia, que possibilita a conferência de tratamento desigual aos desiguais.
Quanto à prova da pobreza, a meu ver, por analogia, é feita através de simples declaração do
condenado, sujeita, porém, a verificação, tal como ocorre na esfera cível, mas o assunto ainda será,
certamente, debatido com maior profundidade pela jurisprudência.

DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE

Conceito e Espécies

Pena privativa de liberdade é a que restringe o direito de ir e vir do condenado, infligindo-lhe um


determinado tipo de prisão.

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As penas privativas de liberdade são três: reclusão, detenção e prisão simples. As duas primeiras estão
previstas no CP (art. 33) e a terceira, na LCP (art. 5º).
Não é correto chamar as penas privativas de liberdade de penas corporais, porque esta denominação
amolda-se melhor às penas de açoite ou flagelo, proibidas pelo ordenamento jurídico pátrio.

Regimes ou sistemas penitenciários

Regime é o modo pelo qual é cumprida a pena privativa de liberdade.


O CP, no § 1º do art. 33, prevê três regimes:
a) regime fechado: a pena é executada em estabelecimento de segurança máxima ou média;
b) regime semiaberto: a pena é executada em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;
c) regime aberto: a pena é executada em casa de albergado ou estabelecimento adequado.

Fixação do regime inicial da pena

O regime de cumprimento da pena deve ser fixado na sentença, de forma fundamentada, dispensando-
se a fundamentação apenas quando se tratar dos crimes da Lei n. 8.072/90, cujo regime, por força de lei, é o
fechado, mas o STF, mesmo nesses delitos, exige a fundamentação, por força do princípio da individualização
das penas. Acerca da necessidade de fundamentação, convém destacar o teor da Súmula 719 do STF: “A
imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea”.
Atualmente, a jurisprudência do STF exige fundamentação inclusive para imposição de regime fechado nos
crimes da lei 8.072/90 e equiparados.
Ainda que se tenha concedido sursis ou pena restritiva de direitos, é necessária a anterior fixação do
regime, antes da concessão daqueles benefícios, diante da possibilidade de serem revogados.
Ressalte-se ainda que a não fixação do regime viola o princípio da individualização da pena, reputando-
se nula a sentença passível de habeas corpus, não se podendo aferir que do silêncio se adote este ou aquele
regime. Não comungamos do posicionamento adotado no Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual a falta
de fixação do regime é mera irregularidade, algo que pode ser corrigido, invocando-se, para tanto, o princípio
do aproveitamento dos atos jurídicos. Sobredito princípio, data venia, não pode sobrepor-se aos preceitos de
ordem pública.
De acordo com o CP, a qualidade da pena, a quantidade da pena e a reincidência são os três fatores
determinantes na fixação do regime inicial, mas devem também ser levadas em conta a reeducação do agente
e a segurança da sociedade.
Aliás, a fixação da pena no mínimo legal nem sempre justifica o regime mais brando. Com efeito, a
aplicação da pena é pautada pela dosagem das circunstâncias que a influenciam, sobretudo as do art. 59 do
CP. Conquanto estas circunstâncias também sejam consideradas na definição do regime, este também é fixado
visando à reeducação do agente e à segurança social.

Pena de reclusão

A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto (art. 33, caput, do CP).
Assim, nem sempre ela se inicia no regime fechado.
As regras são as seguintes:
a) o reincidente sempre iniciará o cumprimento no regime fechado, qualquer que seja a quantidade da
pena a que tenha sido condenado; todavia, a Súmula 269 do STJ admite que o reincidente condenado a pena
igual ou inferior a quatro anos inicie o cumprimento da pena no regime semiaberto, se favoráveis as
circunstâncias judiciais do art. 59 do CP;
b) o não reincidente condenado a pena superior a oito anos deverá começar a cumpri-la no regime
fechado;
c) o não reincidente, cuja condenação seja superior a quatro anos e não exceda a oito anos, poderá,
desde o princípio, cumpri-la em regime semiaberto;

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d) o não reincidente condenado a pena igual ou inferior a quatro anos poderá, desde o início, cumpri-la
em regime aberto.
Nada impede, porém, que o réu não reincidente, condenado a pena de reclusão inferior a oito anos, inicie
o cumprimento da pena no regime fechado, pois, consoante dispõe o § 3º do art. 33 do CP, “a determinação do
regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código”.
Todavia, conforme salienta a Súmula 719 do STF, a imposição do regime de cumprimento mais severo do que a
pena aplicada permitir exige motivação idônea. Finalmente, a Súmula 718 do STF preceitua que: “A opinião do
julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime
mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada”.

Pena de detenção

A pena de detenção deve ser cumprida em regime semiaberto ou aberto (CP, art. 33, caput, 2ª parte).
Nunca se inicia no regime fechado.
As regras são as seguintes:
a) o condenado reincidente deve iniciar o cumprimento no regime semiaberto, qualquer que seja a
quantidade da pena;
b) o não reincidente condenado a pena superior a quatro anos deve iniciar o cumprimento no regime
semiaberto;
c) o não reincidente condenado a pena igual ou inferior a quatro anos deve iniciar o cumprimento no
regime aberto.
Nada impede, porém, que o réu não reincidente, condenado a pena de detenção igual ou inferior a
quatro anos, inicie o cumprimento no regime semiaberto, desde que as circunstâncias do art. 59 do CP lhe
sejam desfavoráveis. Saliente-se, contudo, que a gravidade abstrata do crime, por si só, não pode justificar a
fixação de regime mais severo, quando a pena comporta regime menos rigoroso, sendo necessárias, para
tanto, a demonstração da periculosidade do agente e a necessidade da segurança social.
Como se vê, a pena de detenção, nunca se inicia no regime fechado. Admite-se, no entanto, durante a
execução, a regressão para esse regime.

O réu reincidente

Numa ligeira interpretação gramatical do §2º do art. 33 do CP, verifica-se que o reincidente, quando a
pena for de reclusão, deve começar a cumpri-la no regime fechado; se de detenção, no regime semiaberto.
Urge, porém, que se faça a interpretação restritiva, pois o texto escrito extrapolou a vontade da lei. Por
isso, aquelas regras acima devem prevalecer apenas ao reincidente em crime doloso.
A nosso ver, o reincidente em crime culposo ou, então, o reincidente que cometeu um crime doloso e
outro culposo, ou vice-versa, pode iniciar o cumprimento da pena de reclusão no regime semiaberto ou aberto.
É certo, pois, que o §2º do art. 33, b e c, não faz distinção entre os reincidentes. Porém, o reincidente em
crime culposo ou o reincidente em que o crime anterior é culposo e o posterior doloso, ou vice-versa, pode obter
o sursis (CP, art. 77, I). Seria ilógico negar-lhe o benefício menor, qual seja, o regime semiaberto ou aberto.
Desnecessário dizer o absurdo que seria o juiz fixar o regime fechado a condenado que obtém o sursis.
Aliás, até o reincidente em crime doloso, desde que a condenação anterior tenha sido de multa, pode
obter a concessão do sursis (§1º do art. 77 do CP). Portanto, nesse caso, malgrado a sua condição de
reincidente em crime doloso, reunindo condições para a concessão do sursis, o juiz deverá fixar-lhe o regime
aberto, pois é contrária à lógica a fixação de regime fechado. Sim, pois quem tem direito ao sursis, com maior
razão, faz jus ao regime aberto.
A propósito, o STJ, visando amenizar o rigor excessivo da lei, editou a Súmula 269: “É admissível a adoção
do regime prisional semiaberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro anos se
favoráveis as circunstâncias judiciais”.

Pena de prisão simples

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A pena de prisão simples deve ser cumprida sem rigor penitenciário em estabelecimento especial ou
seção especial da prisão comum, em regime semiaberto ou aberto, separado dos presos de reclusão ou
detenção. Quanto ao trabalho é facultativo se a pena não exceder a quinze dias.

Pluralidade de crimes

Sobre a quantidade da pena, dispõe o art. 111 da Lei de Execução Penal: “Quando houver condenação
por mais de um crime, no mesmo processo ou em processos distintos, a determinação do regime de
cumprimento será feita pelo resultado da soma ou unificação das penas, observada, quando for o caso, a
detração ou remição. Parágrafo único. Sobrevindo condenação no curso da execução, somar-se-á a pena ao
restante da que está sendo cumprida, para determinação do regime”.
O regime inicial de cumprimento das penas privativas de liberdade é determinado pelo juiz da sentença
(CP, art. 59, III). E se no processo estiver sendo imputado mais de um crime ao acusado, o juiz, ao fixar o
regime, tomará por base a soma das penas concretas.
Sendo todas as penas de detenção, salienta Mirabete, o regime inicial será o semiaberto ou aberto, mas,
se houver uma de reclusão, poderá ser determinado o fechado. Além disso, se a soma ultrapassar quatro anos,
não poderá ser imposto o regime aberto, seja qual for a espécie da pena privativa de liberdade e, se superar
oito anos, sendo uma delas ao menos de reclusão, deve ser determinado o regime fechado.
Se no curso da execução surgirem outras condenações transitadas em julgado, caberá ao juiz da
execução efetuar a soma do restante da pena que estava sendo cumprida com a nova pena aplicada, fixando,
em seguida, o regime inicial de cumprimento das penas somadas.
Vê-se, portanto, que se houver mais de uma condenação, a determinação do regime inicial se dará pelo
resultado da soma ou unificação das penas. Todavia, como observa José Paulo Baltazar, em havendo uma pena
de reclusão e outra de detenção, não será imposto o regime mais gravoso se o quantitativo for alcançado com
a pena de detenção. Se, por exemplo, o réu é condenado a sete anos de reclusão pelo crime de roubo e a um
ano e dois meses de detenção pelo delito de lesão corporal leve, não se lhe impõe o regime fechado, mas o
semiaberto, porque o quantitativo superior a oito anos só foi atingido graças à pena de detenção, que, como
veremos adiante, não admite o regime fechado.

Distinção entre as penas de reclusão e de detenção

A pena de reclusão pode se iniciar no regime fechado, semiaberto ou aberto; a pena de detenção não
se inicia no regime fechado.
Na pena de reclusão, a medida de segurança é detentiva, consistente na internação em hospital
psiquiátrico ou outro estabelecimento adequado, ao passo que na pena de detenção é cabível a medida de
segurança detentiva ou a medida de segurança restritiva, esta última consistente em tratamento ambulatorial
(art. 97 do CP).
Nos crimes dolosos sujeitos à pena de reclusão, cometidos contra filho, tutelado ou curatelado, se prevê
como efeito da condenação a perda do poder familiar, tutela ou curatela (art. 92, II, do CP); na pena de
detenção, não há esse efeito da condenação.
Finalmente, o juiz só pode autorizar interceptação telefônica em crimes de reclusão (Lei 9296/96) e na
execução penal primeiro se cumpre a pena de reclusão e depois a de detenção (art. 76 do CP).

Delitos de regime fechado

Os delitos em que o regime é obrigatoriamente fechado, quer o réu seja reincidente ou não, são os
seguintes:
a) crime de tortura, exceto quando praticado por omissão (Lei n. 9.455/97);
b) crimes hediondos, tráfico ilícito de entorpecentes e terrorismo (Lei n. 8.072/90).
Todavia, o STF, estabeleceu, por maioria de oito votos contra três, no HC 111840/ES (Rel. Min. DIAS

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TOFFOLI, j. 27/06/2012), que esta determinação é inconstitucional, pela violação do princípio da


individualização da pena (artigo 5º, inciso XLVI), porque a Constituição Federal não contempla a
obrigatoriedade de imposição de regime fechado para início do cumprimento de pena do inciso XLIII, do artigo
5º.
Tal posicionamento tem sido adotado por ambas as Turmas do STF, a exemplo dos seguintes julgados:
HC 113562/SP (1ª Turma, Rel. Min. ROSA WEBER, j. 30/10/2012) e HC 113944/SP (2ª Turma, Rel. Min. GILMAR
MENDES, j. 30/10/2012).
Quanto ao estrangeiro em situação irregular, alguns julgados sustentam a obrigatoriedade do regime
fechado, diante da presunção de evasão e da impossibilidade de ele vir a trabalhar. Discordamos, porque se
violaria o princípio da isonomia, previsto no art. 5º, caput, da CF, aplicável ao estrangeiro residente no Brasil,
considerando-se como tal aquele que se encontra em nosso território, consoante interpretação da Declaração
Universal dos Direitos do Homem, sendo, pois, viável o regime semiaberto, mas sem que ele tenha direito a
trabalho externo.

CARACTERÍSTICAS DOS REGIMES

A rigor, o regime fechado deve ser cumprido em penitenciária afastada do centro urbano, isto é, for a
da cidade, alojando-se o condenado em cela individual, com área mínima de seis metros quadrados, que
conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório (arts. 88 e 90 da LEP), pois a cadeia pública destina-se ao
recolhimento de presos provisórios (art. 102 da LEP). Aliás, a cadeia pública localiza-se em centro urbano e os
presos permanecem juntos em compartimento coletivo.
Vale a pena ainda destacar que, no regime fechado, o condenado será obrigatoriamente submetido, no
início do cumprimento da pena, a exame criminológico de classificação para individualização da execução (CP,
art. 34). Esse exame, que no regime semiaberto é facultativo (parágrafo único do art. 8º da LEP), é realizado
pela Comissão Técnica de Classificação de cada presídio e só pode ser feito após o trânsito em julgado da
sentença. Não se realiza esse exame quando a sentença impõe o regime aberto ou pena restritiva de direitos.
No regime fechado, o condenado fica sujeito a trabalho no período diurno e a isolamento durante o
repouso noturno (§ 1º do art. 34 do CP). O trabalho será em comum dentro do estabelecimento, na
conformidade das aptidões ou ocupações anteriores do condenado, desde que compatíveis com a execução
da pena (§ 2º do art. 34 do CP). O trabalho a que alude o texto legal é o interno, pois o trabalho externo, no
regime fechado, só é admissível em serviços ou obras públicas realizados por órgãos da administração direta
ou indireta, ou entidades privadas, desde que tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina (art.
36 da LEP). O limite máximo do número de presos será de 10% do total de empregados na obra. Caberá ao
órgão da administração, à entidade ou à empresa empreiteira a remuneração desse trabalho. A prestação de
trabalho a entidade privada depende do consentimento expresso do preso (§§ 1º, 2º e 3º do art. 36 da LEP).
Urge, ainda, para que se admita o trabalho externo, o cumprimento de no mínimo 1/6 da pena. A autorização
para este tipo de trabalho será dada pela direção do estabelecimento penitenciário (art. 37 da LEP).
Por outro lado, o regime semiaberto deve ser cumprido em colônia agrícola, industrial ou similar,
alojando-se o condenado em compartimento coletivo, atentando-se para o limite da capacidade máxima que
atenda aos objetivos de individualização da pena (arts. 91 e 92 da LEP). Nesse regime semiaberto, o condenado
fica sujeito a trabalho em comum durante o período diurno. O trabalho externo é admissível, bem como a
frequência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior (§ 2º do art. 35
do CP). O art. 92 da LEP, como vimos, prevê que as colônias contenham, facultativamente, compartimento
coletivo para o alojamento dos condenados.
O juiz também pode no regime semiaberto autorizar a saída temporária do estabelecimento, sem
vigilância direta, para que o condenado visite a sua família, frequente curso supletivo profissionalizante de
segundo grau ou superior na comarca do juízo da execução, bem como participe de atividades que concorram
para o retorno ao convívio social. Para obter este benefício é preciso cumprir 1/6 da pena se for primário e ¼
se reincidente (art. 122 da LEP), sendo certo que a súmula 40 do STJ dispõe que para obtenção dos benefícios
de saída temporária e trabalho externo, considera-se o tempo de cumprimento da pena no regime
fechado Todavia, de acordo com a Lei n. 12.258/2010, o juiz poderá definir a fiscalização por meio da

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monitoração eletrônica, que é um equipamento de vigilância indireta que se agrega ao condenado, quando
autorizar a saída temporária do regime semiaberto. Vale lembrar que a ausência de vigilância direta não
impede a utilização de equipamento de monitoração eletrônica pelo condenado, quando assim determinar o
juiz da execução (parágrafo único do art. 122 e art. 146-B, II, da LEP). Ao conceder o benefício da saída
temporária o juiz imporá ao condenado, dentre outras condições pertinentes, as seguintes (art. 124, § 1º, da
LEP):
“I — fornecimento do endereço onde reside a família a ser visitada ou onde poderá ser encontrado
durante o gozo do benefício;
II — recolhimento à residência visitada no período noturno;
III — proibição de frequentar bares, casas noturnas e estabelecimentos congêneres”.
O condenado que se beneficiou de uma saída temporária somente poderá obter outra após 45
(quarenta e cinco) dias, conforme § 3º do art. 124 da LEP, salvo quando se tratar de frequência a curso
profissionalizante, de ensino médio ou superior, quando então o tempo de saída será o necessário para o
cumprimento das atividades discentes.
Não terá direito à saída temporária a que se refere o caput deste artigo o condenado que cumpre pena
por praticar crime hediondo com resultado morte (§2º do art. 122 da LEP).
O benefício da saída temporária, nos termos do art. 125 da LEP, será automaticamente revogado
quando o condenado:
a) praticar crime doloso;
b) for punido por falta grave;
c) violar as condições impostas na autorização;
d) revelar baixo grau de aproveitamento do curso.
A recuperação do direito à saída temporária dependerá da absolvição no processo penal, do
cancelamento da punição disciplinar ou da demonstração do merecimento do condenado.
Vale ressaltar que a revogação do benefício da saída temporária não implica necessariamente em
regressão do regime semiaberto para o fechado, pois as hipóteses de regressão somente são aquelas previstas
nos arts. 118 e 146-C, parágrafo único, ambos da LEP.
Já no regime aberto, cujo fundamento é a autodisciplina e senso de responsabilidade, o condenado deverá,
fora do estabelecimento e sem vigilância, trabalhar, frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada,
permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga.
O ingresso do condenado em regime aberto supõe a aceitação de seu programa e das condições
impostas pelo juiz (art. 113 da LEP). É inadmissível a fixação de pena substitutiva (art. 44 do CP) como condição
especial ao regime aberto (súmula 493 do STJ).
Somente poderá ingressar no regime aberto o condenado que estiver trabalhando ou comprovar a
possibilidade de fazê-lo imediatamente, sendo que as pessoas referidas no art. 117 da LEP poderão ser
dispensadas do trabalho. O condenado ainda deve apresentar, pelos seus antecedentes ou pelo resultado dos
exames a que foi submetido, fundados indícios de que irá ajustar-se, com autodisciplina e senso de
responsabilidade, ao novo regime (art. 114 da LEP).
Acrescente-se ainda que a Lei n. 9.613/98 prevê o regime aberto para quem colaborar
espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações
penais e da sua autoria ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime de lavagem de dinheiro.
O regime aberto é cumprido em casa de albergado ou estabelecimento adequado. Admite-se,
excepcionalmente, o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar
de (art. 117 da LEP):
“I — condenado maior de 70 (setenta) anos;
II — condenado acometido de doença grave;
III — condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental;
IV — condenada gestante”.
Fora dessas hipóteses torna-se inadmissível a prisão domiciliar, de modo que, nas comarcas onde ainda
não se encontram instaladas as casas de albergado, o magistrado poderá determinar o cumprimento do
regime aberto em cela especial do estabelecimento carcerário. Na prática, porém, diante da ausência de casa

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de albergado, generalizou-se a concessão do albergue domiciliar a qualquer condenado. Todavia, o art. 146-B
da LEP, introduzido pela Lei n. 12.258/2010, estabelece que o juiz poderá definir a fiscalização por meio da
monitoração eletrônica quando determinar a prisão domiciliar.
A propósito, referida lei introduziu no ordenamento jurídico pátrio um moderno sistema de
monitoramento eletrônico, consistente na utilização de equipamento de vigilância indireta pelo condenado,
uma espécie de detector do âmbito territorial em que ele se encontra, que segue eletronicamente os seus
passos.
Só é possível a implantação desse monitoramento eletrônico por ordem do juiz das execuções penais e
apenas em duas hipóteses: autorização para saída temporária no regime semiaberto e determinação de prisão
domiciliar no regime aberto, conforme art. 146-B da LEP. Note-se que esse monitoramento eletrônico, por
falta de previsão legal, não pode ser implantado no regime aberto em que o condenado cumpre a pena em
casa de albergado ou estabelecimento similar.
O condenado será instruído acerca dos cuidados que deverá adotar com o equipamento eletrônico e
dos seguintes deveres:
“I - receber visitas do servidor responsável pela monitoração eletrônica, responder aos seus contatos e
cumprir suas orientações;
II - abster-se de remover, de violar, de modificar, de danificar de qualquer forma dispositivo de
monitoração eletrônica ou de permitir que outrem o faça”.
A violação desses deveres poderá acarretar uma das seguintes sanções:
a) regressão do regime;
b) revogação da autorização de saída temporária;
c) revogação da prisão domiciliar;
d) advertência por escrito.

REMIÇÃO

Remição é o benefício instituído ao preso, consistente no desconto de um dia de pena por três de
trabalho ou por doze horas de frequência escolar.
Todos os crimes, inclusive os hediondos, admitem a remição, pois nenhuma vedação se encontra na Lei
n. 8.072/90.
A remição só era possível por trabalho. Com o advento da Lei nº 12.433/2011, passou a ser admitida
também por frequência escolar. O objetivo da lei é a reinserção social do preso, mediante política criminal que
estimula o trabalho e o estudo, revelando-se como sendo um eficiente meio de combate à ociosidade.
A remição por trabalho só é aceita ao condenado que cumpre pena em regime fechado ou semiaberto,
outrossim, no caso de prisão cautelar, que é a decretada antes do trânsito em julgado da condenação. A cada
três dias de trabalho abate-se um dia de pena.
No regime fechado, o condenado só pode trabalhar internamente. O trabalho externo só é admissível
em serviços ou obras públicas ao preso que tenha cumprido no mínimo 1/6 da pena. No regime semiaberto,
o trabalho pode ser interno ou externo. É claro que o trabalho externo, conhecido como atividade laborativa
“extramuros”, também gera direito à remição, quer seja realizado no regime fechado ou semiaberto (súmula
562 do STJ).
Para o preso provisório, o trabalho não é obrigatório e só poderá ser executado no interior do
estabelecimento. A jornada normal de trabalho não poderá ser inferior a 6 (seis), nem superior a 8 (oito) horas,
com descanso nos domingos e feriados. Caso o preso extrapole o limite de 8 (oito) horas, as horas extras
deverão ser computadas para efeito de remição da pena (STJ, HC 426.424-SP). O artesanato é também uma
forma de trabalho (§1º do art. 32 da LEP).
Assim, além de uma remuneração mínima de três quartos do salário mínimo, o trabalho do preso ainda
dá ensejo à remição da pena.
Por outro lado, a remição por frequência escolar, no regime fechado, só abrange o ensino oficial, isto é,
o ensino fundamental, o ensino médio profissionalizante ou não, o ensino superior e o ensino de requalificação
profissional. Ensino oficial é o reconhecido pelo Governo, podendo ser ministrado por instituições públicas ou

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particulares. A cada 12 (doze) horas de frequência escolar, divididas, no mínimo, em 3 (três) dias, abate-se um
dia de pena.
De acordo com o STJ, se o preso estudar além das 12 (doze) horas, as horas excedentes também devem
ser computadas para efeito de remição (Informativo 677 do STJ). De fato, não há qualquer vedação legal em
relação ao cômputo das horas excedentes, devendo ser prestigiada a exegese mais favorável ao estímulo do
estudo.
Referidas atividades de estudo poderão ser desenvolvidas de forma presencial ou por metodologia de
ensino a distância e deverão ser certificadas pelas autoridades educacionais competentes dos cursos
frequentados.
O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um terço) no caso de conclusão
do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão
competente do sistema de educação. O fato de o preso ser reprovado é irrelevante, porquanto a lei se
contenta com a frequência escolar.
O condenado que cumpre pena em regime aberto ou semiaberto e o que usufrui liberdade condicional
(sursis e livramento condicional) poderão remir, não só pelo ensino oficial como também pela frequência a
cursos de ensino regular ou de educação profissional, parte do tempo de execução da pena ou do período de
prova. Note-se que, nessas hipóteses, admite-se a remição pela frequência a cursos livres, isto é, não oficiais,
como por exemplo, curso de inglês, curso preparatório para concurso público etc. Exige-se apenas que se trate
de curso regular, que envolva uma sequência de aulas ou palestras, ou então de curso profissionalizante, como
é o caso dos cursos para cabeleireiros, operadores de telemarketing etc. Em relação à prisão cautelar, admite-
se também a remição pela frequência a curso de ensino regular ou de educação profissional, pois o §7º do
art.126 da LEP não impõe qualquer restrição.
O preso impossibilitado de prosseguir no trabalho ou nos estudos por acidente continuará a beneficiar-
se com a remição (§4º do art. 126 da LEP).
A remição será declarada pelo juiz da execução, ouvido o Ministério Público e a Defesa (§8º do art. 126
da LEP). O deferimento do pedido depende de comprovação da execução da jornada mínima de 6 (seis) horas,
sendo que a jornada diária não pode exceder 8 (oito) horas. Na remição por estudo, a cada 12 (doze) horas de
frequência escolar abate-se um dia de pena. Transitada em julgado a decisão que a reconheceu, a remição
não pode mais ser revista, sob pena de violação da coisa julgada.
O tempo remido será computado como pena cumprida para todos os efeitos, e não apenas para o fim
de concessão do livramento condicional e indulto (art. 128 da LEP).
O condenado que foi punido por falta grave poderá perder no máximo 1/3 do tempo remido,
começando o novo período a partir da data da infração disciplinar (art. 127 da LEP). Compete ao juiz da
execução a decisão sobre a perda do tempo remido. O magistrado não poderá analisar o mérito da punição
disciplinar, pois, como é sabido, o mérito administrativo escapa à apreciação jurisdicional. Poderá, porém,
anular a decisão administrativa, caso ela tenha inobservado os requisitos extrínsecos. Antes do advento da Lei
nº 12.433/2011, a falta grave ensejava a perda de todo o tempo remido.
A autoridade administrativa encaminhará mensalmente ao juízo da execução cópia do registro de todos
os condenados que estejam trabalhando ou estudando, com informação dos dias de trabalho ou das horas de
frequência escolar ou de atividades de ensino de cada um deles. O condenado autorizado a estudar fora do
estabelecimento penal deverá comprovar mensalmente, por meio de declaração da respectiva unidade de
ensino, a frequência e o aproveitamento escolar. Ao condenado dar-se-á a relação de seus dias remidos. O
art. 130 da LEP preceitua que “constitui o crime do art. 299 do Código Penal declarar ou atestar falsamente
prestação de serviço para fim de instruir pedido de remição”. Essa regra, tipificando o fato na falsidade
ideológica do art. 299 do CP, não é supérflua, pois exclui a norma do art. 301 do mesmo Código. Efetivamente,
a falsidade ideológica de certidão ou atestado constitui delito previsto no art. 301, mas se se destina a instruir
pedido de remição, o fato é enquadrado no art. 299, cuja pena é bem mais severa.
Nas cadeias ou penitenciárias em que o preso não trabalha nem estuda por falta de condições materiais,
a jurisprudência tem negado a remição, embora a situação se mostre injusta, uma vez que o direito do preso
é prejudicado pela inércia do Estado. Isso viola até mesmo o princípio da isonomia, uma vez que o benefício é
atribuído aos presos recolhidos em estabelecimento prisional aparelhado para o trabalho ou estudo e negado

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a outros, que tiveram a infelicidade de ser recolhidos em estabelecimento onde não há oportunidade de
trabalho ou estudo.
Nesse caso, como ensina Sidnei Agostinho Beneti, “de rigor a concessão da remição, mesmo que o
trabalho não tenha sido prestado por culpa da administração carcerária, como no caso comum de omissão de
organização de serviços aptos à laborterapia, subordinando-se, contudo, o deferimento da remição à prova,
pelo sentenciado, de que requereu a colocação em condições de trabalho”.
É possível a cumulação de ambas as remições, desde que sejam compatíveis as horas de trabalho com
as horas de estudo.
Conforme salientado anteriormente, admite-se a remição nas hipóteses de prisão cautelar. Todavia, a
apreciação do pedido de remição só deve ser admitida após o trânsito em julgado da condenação. De fato,
antes disso, o que há é uma prisão sem pena, tornando-se ilógica a concessão da remição. Caso o réu seja
absolvido, o tempo de trabalho ou estudo só poderá ser levado em conta para remição de crimes cometidos
antes da prisão cautelar, mas não pode ser considerado para os crimes posteriores, pois isso estimularia a
prática de outros delitos, criando um crédito para o agente.
Finalmente, o instituto da remição pertence ao Direito Penitenciário, e não propriamente ao Direito
Penal, impondo-se a aplicação imediata da nova lei, aos casos pendentes de julgamento, mas não há falar-se
em retroatividade da lei benéfica aos casos já definitivamente julgados, à medida em que apenas a lei penal
benéfica tem o condão de rescindir a coisa julgada.

PROGRESSÃO DE REGIMES

São três os sistemas penitenciários clássicos: o de Filadélfia, o de Aurbun e o inglês ou progressivo.


No sistema da Filadélfia, o condenado permanece em isolamento absoluto, fechado na cela, sem poder
sair, salvo esporadicamente para passeio em pátios cerrados.
No sistema de Aurbun, o condenado trabalha em silêncio, durante o dia, juntamente com outros,
permanecendo isolado apenas no período noturno.
No sistema inglês ou progressivo, o condenado inicia a pena em isolamento. Depois, passa a trabalhar
junto com os outros detentos. E, na última fase, é posto em liberdade condicional.
A reforma penal de 1984 adotou o sistema progressivo ou evolutivo, com características próprias.
Efetivamente, o condenado a cumprir pena em regime fechado fica sujeito a trabalho em comum no
período diurno e a isolamento durante o repouso noturno (§§ 1ºe 2º do art. 34 do CP). E, depois de cumprir
um percentual legal da pena, pode requerer a transferência para o regime semiaberto, onde o trabalho é
comum durante o período diurno, sendo que o repouso noturno também pode ser coletivo (art. 92 da LEP). E,
vindo a cumprir mais um percentual da pena, previsto em lei, passa para o regime aberto, quando, então,
permanece solto durante o período diurno, recolhendo-se no período noturno à casa de albergado.

Percentuais de progressão de regime

Até o advento da lei 13.964/2019, bastava cumprir 1/6 (um sexto) da pena para pleitear a progressão
de regimes, mas com o advento desta lei instituiu-se inúmeros percentuais, cujos critérios são:
a) a reincidência e a primariedade;
b) o fato de o crime ser ou não cometido com violência ou grave ameaça à pessoa;
c) o fato de se tratar de crime hediondo ou equiparado, com ou sem resultado morte.
Assim, de acordo com o art. 112 da LEP,
com redação dada pela lei 13.964/2019, a pena privativa de liberdade será executada em forma
progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso
tiver cumprido ao menos:
I - 16% (dezesseis por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem
violência à pessoa ou grave ameaça. Neste aspecto, a nova lei pode ou não se revelar mais branda, pois 16%
(dezesseis por cento) é um pouco mais favorável que 1/6 (um sexto), impondo-se a retroatividade, nas
situações benéficas ao réu. A violência, a que se refere o texto legal, é a física, que abrange as vias de fato, a

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lesão corporal e a morte. Não abarca a violência imprópria, que é o fato de o agente, sem aplicar violência ou
grave ameaça, reduzir a vítima à impossibilidade de resistência, por exemplo, hipnotizar ou drogar a vítima
antes de praticar o delito de constrangimento ilegal, previsto no art. 146 do CP. Assim, o delito de
constrangimento ilegal praticado por réu primário, mediante violência imprópria, admitirá a progressão com
percentual de 16% (dezesseis por cento). No tocante à violência culposa, por exemplo, homicídio ou lesão
culposos, também admitirá a progressão com base neste percentual.
II - 20% (vinte por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido sem violência à
pessoa ou grave ameaça. Este percentual, assim como os dos incisos posteriores, é mais rigoroso que o
anterior, que era de 1/6 (um sexto), e, por isso, não há falar-se em retroatividade. O texto legal não faz
distinção entre o reincidente em crime doloso e o reincidente em crime culposo. Quanto ao tecnicamente
primário, que é o réu que ostenta condenação definitiva sem ser reincidente, diante da omissão da lei, deve
se enquadrar no inciso anterior, que exige apenas o cumprimento de 16% (dezesseis por cento) da pena.
III - 25% (vinte e cinco por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido com
violência à pessoa ou grave ameaça. Esta hipótese revela-se injusta em relação às infrações penais de menor
potencial ofensivo cometidas com violência ou grave ameaça à pessoa, mas como a lei não faz qualquer
distinção, elas também terão que seguir o percentual 25% (vinte e cinco por cento). Tratando-se de violência
imprópria não se aplica este percentual, mas, sim, o previsto no inciso I, de 16% (dezesseis por cento).
IV - 30% (trinta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido com violência à
pessoa ou grave ameaça. Tratando-se de violência imprópria não se aplica este percentual, mas, sim, o
previsto no inciso II, de 20% (vinte por cento). O texto legal não se refere a qualquer reincidente, mas apenas
ao reincidente em crime cometido com violência à pessoa ou grave ameaça. Se um dos crimes, que gera a
reincidência, houver sido cometido sem e o outro com violência ou grave ameaça à pessoa, o percentual,
diante da lacuna da lei, será de 20% (vinte por cento).
V - 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou
equiparado, se for primário. Antes da lei 13.964/2019, o percentual de progressão de crime hediondo ou
equiparado era de 2/5 (dois quintos), quando o apenado era primário. Na verdade, 2/5 (dois quintos) é a
mesma coisa que 40% (quarenta por cento). Portanto, trata-se de uma alteração puramente semântica. Os
delitos hediondos são os catalogados na lei 8.072/90. Os equiparados são o tráfico de drogas, terrorismo e
tortura. Não há vedação do livramento condicional.
VI - 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for:

a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário,
vedado o livramento condicional. Este percentual só será aplicado ao não reincidente em crime hediondo e
equiparado, mas nada obsta que seja reincidente noutros delitos. De fato, o reincidente em crime hediondo
ou equiparado, com resultado morte, para obter a progressão, terá que cumprir 70% (setenta por cento) da
pena. Na hipótese de tentativa, onde não ocorre a morte por circunstâncias alheias à vontade do agente, não
se aplica este percentual, mas, sim, o de 40% (quarenta por cento), previsto no inciso V.
b) condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para
a prática de crime hediondo ou equiparado. A hipótese não faz menção à associação criminosa, prevista no
art. 288 do CP, mas apenas à organização criminosa, sendo vedada a analogia “in malam partem”. Aqui, não
há a vedação do livramento condicional, pois a condenação é pelo crime de organização criminosa e não por
crime hediondo ou equiparado.
c) condenado pela prática do crime de constituição de milícia privada. A hipótese não faz menção à
associação criminosa, prevista no art. 288 do CP, nem ao crime de organização criminosa, mas apenas à milícia
privada, tipificada no art. 288-A do CP, sendo vedada a analogia “in malam partem”. Aqui, não há a vedação
do livramento condicional, pois a condenação é pelo crime de milícia privada e não por crime hediondo ou
equiparado.
VII - 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou
equiparado. Aqui, também se exige a reincidência específica em crime hediondo ou equiparado. Este
percentual só é aplicável quando não houver o resultado morte. Não há a vedação do livramento condicional.
VIII - 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado

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com resultado morte, vedado o livramento condicional. Exige-se uma reincidência específica em crime
hediondo ou equiparado com o resultado morte.

Para efeito didático, as regras são as seguintes:


I- Primário e tecnicamente primário:
a) 16% (dezesseis por cento) da pena, nos crimes sem violência ou grave ameaça à pessoa.
b) 25% (vinte e cinco por cento) da pena, nos crimes cometidos com violência à pessoa ou grave ameaça.
II- Reincidente:
a) 20% (vinte por cento) da pena, quando reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou
grave ameaça. Outrossim, quando um dos crimes for com e o outro sem violência ou grave ameaça à pessoa.
b) 30% (trinta por cento) da pena, quando reincidente em crime cometido com violência à pessoa ou
grave ameaça.

III- Crimes hediondos e equiparados, tanto ao primário quanto ao não reincidente específico nesses
crimes:
a) 40% (quarenta por cento);
b) 50% (cinquenta por cento), quando houver morte.
IV- Crimes hediondos e equiparados, ao reincidente específico nesses crimes:
a) 60% (sessenta por cento);
b) 70 % (setenta por cento), quando houver morte
V- Regras específicas:
a) 50% (cinquenta por cento), ao condenado por exercer o comando de organização criminosa
estruturada para a prática de crimes hediondos e equiparados.
b) 50% (cinquenta por cento), ao condenado por crime constituição de milícia privada.
Vê-se assim que o critério principal do percentual de progressão não é o tipo de crime cometido, mas,
sim, o fato de o agente ser primário ou reincidente em determinadas categorias de delitos. O agente que, por
exemplo, é reincidente em crime cometido com violência ou grave ameaça à pessoa para obter a progressão
de regimes terá que cumprir 30% (trinta por cento) da pena, mesmo em relação aos crimes cometidos sem
violência ou grave ameaça à pessoa.
Da mesma forma, por exemplo, o reincidente em crime hediondo com o resultado morte terá, para
obter a progressão, que cumprir 70% (setenta por cento) da pena, mesmo em relação aos crimes que não
sejam hediondos nem equiparados.
Quanto ao reincidente em contravenções penais, a lei é omissa e, por isso, para efeito de progressão, o
agente deverá ser tratado como primário.
Em todos os casos, o apenado só terá direito à progressão de regime se ostentar boa conduta carcerária,
comprovada pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão (§1º do art. 112
da LEP). Não basta, para se obter a progressão, cumprir um percentual da pena; é preciso ainda que o
condenado tenha méritos para obter a progressão, isto é, bom comportamento carcerário. A única forma de
comprovação da boa conduta carcerária é através do atestado do diretor do estabelecimento penal, mas se
houver má-fé do aludido diretos, o juiz da execução poderá anular o atestado e deferir a progressão.
No caso de a condenação ser superior a 40 (quarenta) anos, é preciso cumprir um percentual da pena
total, e não dos 40 (quarenta) anos (Súmula 715 do STF).
Observe-se ainda que o condenado por crime contra a administração pública terá progressão do regime
de cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito
praticado, com os acréscimos legais (§4º do art. 33 do CP).
A decisão do juiz que determinar a progressão de regime será sempre motivada e precedida de
manifestação do Ministério Público e do defensor, procedimento que também será adotado na concessão de
livramento condicional, indulto e comutação de penas, respeitados os prazos previstos nas normas vigentes
(§2º do art. 112 da LEP).
Não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas
previsto no §4º do art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006 (§5º do art. 112 da LEP). Trata-se do

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tráfico de drogas privilegiado, que se verifica quando o agente é primário, de bons antecedentes, não se dedica
às atividades criminosas nem integra a organização criminosa. O aludido delito, para efeito de progressão,
deverá observar os percentuais previstos para os delitos não hediondos ou equiparados.
O cometimento de falta grave durante a execução da pena privativa de liberdade interrompe o prazo
para a obtenção da progressão no regime de cumprimento da pena, caso em que o reinício da contagem do
requisito objetivo terá como base a pena remanescente (§6º do art. 112 da LEP). É flagrante a violação do
princípio constitucional da presunção da inocência, pois a lei presume a culpabilidade pelo simples
cometimento de falta grave. Na verdade, a interrupção só poderá ocorrer após a condenação definitiva pela
falta grave, em processo administrativo disciplinar, observando-se o contraditório e a ampla defesa. A partir
da interrupção, inicia-se uma nova contagem do percentual de cumprimento de pena, tomando-se por base a
pena remanescente, e não o total da pena inicialmente imposta.
Por outro lado, o ideal seria que só após a concessão do regime aberto o condenado pudesse progredir
para o livramento condicional. Todavia, a lei não impõe esse requisito, de modo que o livramento condicional
pode ser deferido aos criminosos que estejam cumprindo pena em regime fechado.
Cabe também ressaltar que o caráter progressivo do sistema, consistente na transferência do regime
mais rigoroso para o imediatamente menos rigoroso, veda, por raciocínio lógico, a progressão “por saltos”,
isto é, a passagem direta do regime fechado para o aberto. Se, porém, não houver vaga no semiaberto, o
condenado deverá aguardar a vaga no regime aberto, conforme Súmula Vinculante 56.
Finalmente, dispõe a Súmula 192 do STJ que compete ao Juízo das Execuções Penais do Estado a
execução das penas impostas a sentenciados pela Justiça Federal, Militar ou Eleitoral, quando recolhidos a
estabelecimentos sujeitos à administração estadual.

PROGRESSÃO ESPECIAL

A progressão especial é a que exige o cumprimento de apenas 1/8 (um oitavo) da pena no regime
anterior.
Só é possível este benefício à mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas
com deficiência.
O benefício é vedado nos crimes com violência ou grave ameaça contra pessoa e também àquelas que
integram ou integraram organizações criminosas. Outrossim, nos crimes contra seu filho ou dependente.
Exige-se ainda a primariedade e o bom comportamento carcerário.
A propósito dispõe o §3º do art. 112 da LEP, introduzido pela lei 13.771/2018:
“No caso de mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência,
os requisitos para progressão de regime são, cumulativamente:
I - não ter cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa;
II - não ter cometido o crime contra seu filho ou dependente;
III - ter cumprido ao menos 1/8 (um oitavo) da pena no regime anterior;
IV - ser primária e ter bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento;
V - não ter integrado organização criminosa”.
A propósito deste último requisito, o STJ firmou entendimento que se trata da organização criminosa
prevista na Lei 12.850/2013, sendo vedada a analogia “in malam partem” ou interpretação extensiva para se
abranger outras espécies de sociedades criminosas (Informativo 678 do STJ).
O cometimento de novo crime doloso ou falta grave implicará a revogação do benefício (§ 4º do art.
112 da LEP).
A aludida progressão especial, que exige o cumprimento de apenas 1/8 (um oitavo) da pena no regime
anterior, também se aplica aos crimes hediondos e equiparados, quando não houver violência nem grave
ameaça contra pessoa, desde que preenchidos os demais requisitos acima, pois a lei não faz qualquer ressalva
em relação a esses delitos.

Vedação da progressão de regimes e de outros benefícios prisionais

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O condenado expressamente em sentença por integrar organização criminosa ou por crime praticado
por meio de organização criminosa não poderá progredir de regime de cumprimento de pena ou obter
livramento condicional ou outros benefícios prisionais se houver elementos probatórios que indiquem a
manutenção do vínculo associativo (§9º do art. 2º).

SÚMULA VINCULANTE 56

Dispõe a Súmula Vinculante 56:


“A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime
prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS.”
Os itens 3 e 4 deste recurso extraordinário 641.320/RS traçam as seguintes regras:
"3. Os juízes da execução penal poderão avaliar os estabelecimentos destinados aos regimes semiaberto
e aberto, para qualificação como adequados a tais regimes. São aceitáveis estabelecimentos que não se
qualifiquem como 'colônia agrícola, industrial' (regime semiaberto) ou 'casa de albergado ou estabelecimento
adequado' (regime aberto) (art. 33, § 1º, alíneas "b" e "c"). No entanto, não deverá haver alojamento conjunto
de presos dos regimes semiaberto e aberto com presos do regime fechado.
4. Havendo déficit de vagas, deverão ser determinados:
I - a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas;
II - a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em
prisão domiciliar por falta de vagas;
III - o cumprimento de penas restritivas de direito e/ou estudo ao sentenciado que progride ao regime
aberto. Até que sejam estruturadas as medidas alternativas propostas, poderá ser deferida a prisão domiciliar
ao sentenciado. (RE 641320, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgamento em 11.5.2016, DJe
de 8.8.2016, com repercussão geral - tema 423)”.
O item 3 do referido recurso extraordinário admite, conforme já consta na lei, que o regime semiaberto
pode recair sobre estabelecimento similar a uma colônia agrícola ou industrial. Igualmente, que o regime
aberto seja um estabelecimento similar à casa de albergado.
Recaindo o regime semiaberto ou o aberto sobre estabelecimento similar ao previsto na lei, os juízes da
execução penal poderão avaliar se os referidos estabelecimentos são ou não adequados, isto é, se eles
equivalem ou não a uma colônia agrícola ou industrial, no caso do regime semiaberto, ou a uma casa de
albergado, na hipótese de regime aberto. Nesta avaliação, o juiz deverá atentar-se para a proibição
de alojamento conjunto de presos dos regimes semiaberto e aberto com presos do regime fechado.
O item 4 do sobredito recurso extraordinário trata da hipótese em que não há vagas no regime
semiaberto ou aberto.
Com efeito, não havendo vagas no regime semiaberto, é preciso antecipar a abertura desta vaga
promovendo a saída antecipada do sentenciado que estava próximo de progredir deste regime semiaberto
para o aberto, a fim de que a sua vaga seja ocupada por aquele sentenciado que obteve a progressão do
regime fechado para o semiaberto. Ao sentenciado que saiu antecipadamente do regime anterior, para que
se abrisse a vaga, será imposta a liberdade eletronicamente monitorada.
Esta solução prevista na referida súmula viola o princípio da isonomia. De fato, presos numa colônia
agrícola ou industrial onde há vagas cumprirão o percentual legal de progressão da pena no regime
semiaberto, ao passo que os presos de outra colônia onde faltam vagas têm a chance de obterem o regime
aberto antes de cumprirem o percentual legal de progressão da pena, quando houver necessidade de abertura
de vagas.
Ademais, a Súmula Vinculante 56 não esclarece quem teria o dever de providenciar a saída antecipada
do preso em regime semiaberto para abertura de vagas. Enquanto ninguém requer esta saída antecipada, o
preso que estava no regime fechado e progrediu para o semiaberto, onde não há vagas, deverá aguardar a
vaga no regime aberto, em domicílio, posto que, como se sabe, na prática quase que não existe casa de
albergado. Esta situação também fere a isonomia, pois este preso, que deveria ter passado do regime fechado
para o regime semiaberto, permanecerá na sua própria residência, enquanto os outros presos que já se
encontravam no regime semiaberto continuarão cumprindo a pena neste regime.

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Outro problema que a súmula não resolve é o fato de, após a saída antecipada do regime semiaberto
para o aberto, a fim de se abrir vagas, ressurgir outras vagas no regime semiaberto. Nesse caso, o preso que
havia saído antecipadamente deverá ou não voltar para o regime semiaberto? A meu ver, impõe-se o retorno,
pois o seu regime é o semiaberto, salvo se ao tempo do ressurgimento da vaga havia verdadeiramente
completado o tempo de progredir de um regime para o outro.
Por outro lado, o sentenciado que obtém a progressão para o regime aberto, em caso de falta de vagas
por ausência de casa de albergado ou estabelecimento similar, deverá, como primeira opção, ter a pena
privativa de liberdade convertida em pena restritiva de direitos. Numa segunda opção, até que sejam
estruturadas estas medidas alternativas consubstanciadas nas penas restritivas de direitos, o juiz deverá
conceder o albergue domiciliar (prisão domiciliar) com tornozeleira eletrônica. A primeira opção, de substituir,
na fase de execução, a pena privativa de liberdade por pena restritiva de direito, não tem previsão legal, a não
ser nas hipóteses do art. 180 da LEP, mas não se vislumbra qualquer prejuízo, posto que a pena restritiva de
direitos é mais branda que a pena de prisão no regime aberto.

EXECUÇÃO PROVISÓRIA

Antes mesmo de transitar em julgado a sentença penal condenatória, a progressão de regimes já pode
ser requerida ao juízo competente. Esse fenômeno dá-se o nome de execução provisória. Tal ocorre quando
o acusado, preso provisoriamente e já estando condenado por sentença, aguarda o julgamento de seu recurso
pelo tribunal. O pressuposto básico da execução provisória é o trânsito em julgado para a acusação, pois, se
também estiver pendente o apelo do Ministério Público, torna-se inadmissível que, antes do trânsito em
julgado, pleiteie-se a progressão de regimes. Há, todavia, uma corrente que aceita a execução provisória
mesmo na pendência do apelo do Ministério Público, argumentando que o art. 2º da Lei n. 7.210/84 não exige
o requisito do trânsito em julgado para a acusação.
A súmula 716 do STF preceitua que é possível a progressão de regime antes do trânsito em julgado da
sentença condenatória. A súmula 717 do STF esclarece que o fato de o réu se encontrar em prisão especial
não impede a progressão de regime antes do trânsito em julgado da sentença.
A expressão “execução provisória” tem sido objeto de debate. Os seus opositores salientam que no
processo penal não há execução provisória, devido ao princípio da presunção da inocência. Argumentam que
a progressão não passa de uma medida cautelar de antecipação dos efeitos da sentença definitiva. Sidnei
Agostinho Beneti destaca: “o que é provisória, esta sim, é a concessão da contracautela assecuratória do
direito à progressão de regime, e não a execução”.
Quando se fala, porém, em execução provisória, a nosso ver, não se deseja afrontar o princípio da
presunção de inocência, e, sim, beneficiar o acusado, razão pela qual não compreendemos a celeuma
instaurada sobre a aludida expressão.
Aliás, a Excelsa Corte já decidiu que “a execução provisória da sentença transitada em julgado para a
acusação e pendente recurso interposto pela defesa pressupõe estejam presentes no Juízo das Execuções
Penais as peças indispensáveis, incumbindo ao interessado providenciá-las junto ao Tribunal que exercerá o
crivo de revisão” (HC 69.152-8, Rel. Marco Aurélio, DJU, 2 dez. 1992). Utilizou-se, como se vê, a expressão
“execução provisória”.
O réu deve requerer, perante o tribunal pelo qual se processa o recurso, a expedição de carta de guia
provisória. Deferido o pedido, o juízo da execução realizará a autuação provisória e processará o pedido de
progressão de regimes. Ressalte-se, por fim, a existência de numerosas decisões atribuindo a competência ao
juízo da condenação (RT, 686:337, 688:307; RJDTACrimSP, 11:28). Essas decisões baseiam-se na inexistência de
execução provisória, encarando o problema como mera antecipação cautelar dos efeitos da sentença definitiva.
A nosso ver, existe, sim, execução provisória, de modo que o pedido deve ser apreciado pelo juízo da
execução, pois o juízo da condenação, com a sentença, esgota o seu poder jurisdicional. Sobremais, ele não
dispõe de poderes para decidir questões afetas ao juízo da execução.
A execução provisória, a propósito, é admitida expressamente pelo parágrafo único do art. 2º da Lei n.
7.210/84. Em São Paulo, o assunto encontra-se regulamentado no Provimento n. 653/99 do Conselho Superior
da Magistratura.

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Entretanto, não é possível a execução provisória das penas de multa e restritivas de direito, pois o art.
147 da LEP exige expressamente o trânsito em julgado da sentença.
Finalmente, quanto à possibilidade de execução provisória na pendência de recurso especial perante o
STJ e de recurso extraordinário perante o STF, uma corrente sustenta que esses dois recursos não inviabilizam
a expedição do mandado de prisão, ainda que se trate de réu primário e de bons antecedentes. Assim, na
pendência de um desses recursos, o condenado não teria o direito de aguardar em liberdade o julgamento,
porque despojados, ambos, de eficácia suspensiva. De acordo com esse entendimento, o direito de recorrer em
liberdade circunscreve-se aos recursos de apelação e embargos infringentes. Confirmada a condenação no
julgamento desses recursos, ocorre uma espécie de trânsito em julgado provisório, razão pela qual deve ser
expedido o mandado de prisão, iniciando-se, por consequência, a execução provisória, a despeito da pendência
dos recursos especial ou extraordinário. Ora, o art. 675, § 1º, do CPP exige expressamente o trânsito em julgado
para o fim de ser expedido o mandado de prisão, não abrindo exceção aos recursos especial e extraordinário.
Onde a lei não distingue, o intérprete não pode distinguir. Ademais, o entendimento acima viola o princípio da
presunção da inocência, previsto no item LVII do art. 5º da CF. Na verdade, reveste-se de flagrante
inconstitucionalidade os dispositivos que negam efeito suspensivo aos recursos especial e extraordinário. Na
esfera penal, os recursos devem ter efeito suspensivo, sob pena de violação do princípio da presunção da
inocência, segundo o qual ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença
condenatória penal. Não se pode antecipar a culpabilidade do condenado, apegando-se à velha distinção,
proposta por Espínola Filho, que diferencia o caso julgado da coisa julgada. De acordo com o ilustre
processualista, ocorre o caso julgado na hipótese de a sentença poder ser executada na pendência de recurso
extraordinário, sem efeito suspensivo, ao passo que a coisa julgada verifica-se quando da decisão não cabe mais
recurso de espécie alguma. Ora, se a lei pode excluir o efeito suspensivo dos recursos especial e extraordinário,
pode também exclui-lo no recurso de apelação e, dessa forma, fazer tábula rasa do princípio da presunção da
inocência.

REGRESSÃO

Regressão é a transferência do condenado para um regime mais rigoroso do que o inicialmente


deferido. O pedido de regressão deve ser dirigido ao juízo da execução penal.

Admite-se a regressão para qualquer dos regimes mais rigorosos. É, portanto, admissível a regressão
direta do regime aberto para o fechado.
As hipóteses de regressão, previstas no citado art. 118 da LEP, são as seguintes:
a) Se o condenado praticar fato definido como crime doloso ou falta grave. Para o deferimento da
regressão, a lei exige a oitiva prévia do condenado (§2º do art. 118 da LEP). A prática de crime culposo ou
contravenção, por si só, não autoriza a regressão, salvo se revelar que o condenado está frustrando os fins da
execução. A regressão depende apenas da prática do crime doloso ou falta grave; a lei não exige condenação
ou trânsito em julgado da sentença ou decisão. A nosso ver, a hipótese é inconstitucional, porque viola o
princípio da presunção da inocência (CF, art. 5º, LVII).
b) Se o condenado sofrer condenação por crime anterior cuja pena, somada ao restante da pena em
execução, tornar incabível o regime. Nesse caso, a regressão pode ser apreciada sem a prévia inquirição do
condenado.
c) Violação dos deveres previstos no art. 146-C da LEP decorrentes da implantação da monitoração
eletrônica. O juiz, nesse caso, poderá, após ouvir o Ministério Público e a defesa, determinar uma das seguintes
medidas: regressão do regime aberto para o semiaberto ou deste para o fechado; revogação apenas da
autorização de saída temporária concedida no regime semiaberto; revogação da prisão domiciliar (volvendo
o condenado ao regime aberto normal); ou advertência por escrito. Note-se que são várias opções, sendo que
a regressão é apenas uma delas.
Aquele que cumpre pena no regime aberto, além das hipóteses anteriores, também será regredido,
mediante a sua prévia oitiva, quando:
— Frustrar os fins da execução. Exemplos: desobediência a ordens recebidas, provocação de rescisão

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de contrato de trabalho ou seu abandono, prática de contravenção ou crime culposo, prática de falta leve ou
média etc. Nesses exemplos, hauridos do ensinamento de Júlio Fabbrini Mirabete, desde que revelem a falta
de autodisciplina e de senso de responsabilidade do condenado, será de rigor a regressão.
— Não pagar, podendo, a multa cumulativamente imposta. A nosso ver, com o advento da Lei n.
9.268/96, que proíbe a conversão da multa em pena privativa de liberdade, operou-se a revogação tácita dessa
causa de regressão. Seria ilógico que o não pagamento da multa continuasse a figurar como causa de regressão
se a própria lei veda a conversão da multa em pena privativa de liberdade.

DETRAÇÃO

Dispõe o art. 42 do CP:


“Computam-se, na pena privativa de liberdade e na medida de segurança, o tempo de prisão provisória,
no Brasil ou no estrangeiro, o de prisão administrativa e o de internação em qualquer dos estabelecimentos
referidos no artigo anterior”.
O dispositivo transcrito cuida da detração penal. De acordo com esse instituto, computa-se na pena
privativa de liberdade e na medida de segurança o período de prisão provisória, o de prisão administrativa e o
de internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico.
Detração penal é, pois, o abatimento na pena ou medida de segurança do tempo de prisão ou
internação já cumprido pelo agente.
A medida de segurança tem prazo mínimo de um a três anos e o período de prisão ou de internação
provisória é computado nesse prazo mínimo da medida de segurança.
A expressão “prisão provisória” compreende toda e qualquer prisão decretada pelo juiz criminal, que
antecede o trânsito em julgado de uma sentença condenatória. Abrange a prisão em flagrante (arts. 301 a 310
do CPP), a prisão temporária (Lei n. 7.960/89) e a prisão preventiva (CPP, arts. 311 a 316).
Suponha-se que o agente, em razão de flagrante, permaneça preso por dois meses. Vindo a ser
condenado a um ano e dois meses de reclusão, terá de cumprir apenas um ano, pois os dois meses do flagrante
são computados como pena cumprida.
Por outro lado, a expressão “prisão administrativa”, ensina José Celso de Mello Filho, “constitui medida
coercitiva destinada a pressionar o responsável a cumprir dever jurídico que lhe incumbe”.
A prisão civil ou administrativa não se reveste de caráter penal. Sua finalidade é compelir as pessoas a
cumprir determinada obrigação. Se a obrigação for de direito privado, alguns preferem usar a expressão
“prisão civil” (p. ex.: alimentos). Se a obrigação for de direito público, tal como a prisão decretada para
compelir as pessoas que se tenham apropriado de bens públicos a reparar o dano, costuma-se falar em prisão
administrativa propriamente dita.
Perante o nosso Código Penal, não há diferença entre prisão administrativa e prisão civil. A expressão
“prisão administrativa”, utilizada no art. 42 do CP, deve compreender toda prisão decretada por juiz
extrapenal, com a finalidade de compelir a pessoa a cumprir dever jurídico que lhe incumbe.
A Magna Carta proíbe a prisão civil por dívida, salvo a do devedor de alimentos (CF, art. 5º, LXVII, e Súmula
Vinculante 25 do STF). Não há, porém, proibição de prisão civil sem dívida, de modo que a lei pode
perfeitamente estipulá-la, sem qualquer afronta à Constituição Federal.
Cumpre lembrar que apenas o magistrado pode decretar a prisão de alguém (CF, art. 5º, LXI),
encontrando-se revogado o art. 319 do CPP e outros dispositivos legais que permitiam a prisão decretada por
autoridade administrativa.
De outra parte, o instituto da detração penal não faz alusão à prisão disciplinar, que é decretada por
autoridades administrativas para obter obediência à ordem que deve reinar nos serviços públicos.
A prisão disciplinar é proibida, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar,
definidos em lei (CF, art. 5º, LXI). É a única prisão que não é decretada por juiz. Nesses dois casos, o emprego
da analogia in bonam partem possibilita a detração na hipótese de o agente vir a ser condenado
criminalmente, pelo mesmo fato, a pena privativa de liberdade.
Se, por outro lado, o réu vier a ser absolvido, o tempo em que esteve preso provisoriamente deverá ser
computado na pena que lhe foi imposta em razão da prática de crime cometido antes da prisão. Tratando-se de

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crime perpetrado após ou durante a prisão, torna-se inadmissível a detração, sob pena de se instituir uma “conta
corrente” em favor do réu. Este, animado pelo crédito adquirido, certamente não hesitaria em delinquir
novamente. Cumpre mencionar a existência de superadas decisões que só admitiam a detração na hipótese de
conexão ou continência entre o crime de que o réu veio a ser absolvido e o crime pelo qual foi condenado.
Por outro lado, no tocante às penas restritivas de direitos, no caso de conversão em prisão, desconta-
se o tempo cumprido, respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão, operando-se,
portanto, a detração penal (CP, art. 44, § 4º).
Quanto ao réu condenado à pena de multa, a lei silencia acerca da detração do tempo de prisão
provisória. Esse tempo de prisão, a nosso ver, deve ser computado como dia-multa, aplicando-se por
analogia in bonam partem a detração penal prevista no art. 42 do CP. Um critério razoável, à míngua de texto
legal, seria abater um dia-multa para cada dia de prisão.
Finalmente, a decisão sobre a detração é da competência do juízo da execução (art. 66, III, c, da LEP). A
formulação do pedido diretamente no tribunal suprime um grau de jurisdição.

Detração penal e sua influência no regime da pena

Dispõe o art. 387, §2º, do CPP:


“O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro,
será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade”.
A detração penal, como se vê, também deverá ser levada em conta na fixação do regime inicial da pena
privativa de liberdade. Uma condenação superior a 8 (oito) anos, por exemplo, ainda que o réu seja primário,
exige que o regime inicial seja o fechado. Suponha-se que o réu tenha sido condenado a 8 (oito) anos e 3 (três)
meses, mas tenha permanecido preso provisoriamente durante 6 (seis) meses. Nesse caso, o juiz sentenciante
deverá fixar o regime semiaberto, pois, abatendo-se os 6 (seis) meses, a condenação seria inferior a 8 (oito)
anos, de tal sorte que, sendo o réu primário, fará jus a este regime menos rigoroso.
Note-se, entretanto, que a detração não reduz a pena concreta, mas apenas influenciará na fixação do
regime, ou seja, a condenação continuará sendo de 8 (oito) anos e 3 (três) meses.
Seria errado, no exemplo acima, o juiz fixar a pena em 8 (oito) anos e 3 (três) meses e, em seguida, na
própria sentença, em razão da detração dos 6 (seis) meses, fazer constar que a condenação passará ser de 7
(sete) anos e 9 (nove) meses.
A detração não reduz o montante da condenação, mas apenas computa como pena cumprida o período
de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, além de considerar este tempo para interferir
na definição do regime inicial da pena.

SUPERVENIÊNCIA DE DOENÇA MENTAL

O condenado a quem sobrevém doença mental deve ser recolhido a hospital de custódia e tratamento
psiquiátrico ou, à falta, a outro estabelecimento adequado (CP, art. 41). O tempo de internação é computado
na pena privativa de liberdade (CP, art. 42). Ressalte-se, porém, que essa internação não pode exceder ao
tempo da pena privativa de liberdade fixada na sentença.

LIVRAMENTO CONDICIONAL

Conceito

Livramento condicional é a liberdade antecipada, mediante certas condições, conferida ao condenado


que cumpriu uma parte da pena que lhe foi imposta.
O livramento condicional deveria ser elemento integrante do chamado sistema progressivo. Todavia, no
Brasil, o condenado, para obtê-lo, não precisa frequentar os regimes menos rigorosos (semiaberto e aberto).
Essa progressão por “saltos”, do regime fechado para o livramento condicional, é perniciosa para o condenado,
pois este deixa de frequentar os outros regimes, não se preparando suficientemente para o retorno ao convívio

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social.
O condenado que obtém o livramento condicional é denominado egresso.

Natureza jurídica

Trata-se de um incidente da execução, que se caracteriza como causa condicionada de extinção da


punibilidade.

Distinção entre livramento condicional e “sursis”

Enquanto no sursis o condenado não chega a iniciar o cumprimento da pena privativa de liberdade,
no livramento ele só conquista a liberdade no curso da execução, após cumprir uma parcela da pena que lhe
foi imposta. Sobremais, no sursis o período de prova é fixado entre dois e quatro anos, ao passo que, no
livramento, perdura pelo restante da pena.
O sursis, em regra, é concedido na sentença e o recurso cabível é a apelação; o livramento é concedido
pelo juízo da execução, cabendo de sua decisão o recurso de agravo de execução.
Sursis e livramento condicional, porém, apresentam diversos pontos comuns:
a) em ambos o condenado é submetido a um período de provas;
b) os dois benefícios são causas condicionadas de extinção da punibilidade;
c) ambos ingressam nos chamados direitos públicos subjetivos de liberdade do réu. Não se trata de mera
faculdade, e, sim, de dever do magistrado conceder esses benefícios aos acusados que preencham os
requisitos legais.

Requisitos

A concessão do livramento depende do preenchimento de uma série de requisitos objetivos e


subjetivos. Os primeiros dizem respeito à pena imposta e à reparação do dano. Os segundos relacionam-se
com o lado pessoal do condenado.
São quatro os requisitos objetivos.
O primeiro é que a pena deve ser privativa de liberdade (reclusão, detenção e prisão simples).
O segundo é que a pena concreta deve ser igual ou superior a dois anos de prisão, ainda quando se trate
de contravenção penal. As penas que correspondem a infrações diversas, ainda que impostas em processos
distintos, devem somar-se para efeito da concessão do livramento (art. 84 do CP). Assim, o réu condenado a
um ano de re-clusão não pode obter o livramento. Se, porém, for novamente condenado, noutro processo, a
outra pena igual ou superior a um ano, já poderá obter o benefício, porque a soma das penas atinge dois anos.
Se a pena for igual a dois anos, é cabível também o sursis, mas se este for negado, o condenado poderá, a
posteriori, pleitear o livramento condicional. Percebe-se que se a pena for inferior a dois anos, a lei fecha as
portas para o livramento condicional. Essa situação mostra-se injusta para o reincidente em crime doloso,
porque ele também não tem direito ao sursis, reinando assim a seguinte ilógica: o reincidente em crime doloso,
condenado a pena igual ou superior a dois anos, não terá direito ao sursis, mas poderá obter o livramento
condicional; se, porém, for condenado a pena inferior a dois anos, não terá direito ao sursis nem ao livramento.
Diante dessa falta de lógica, entendemos que o reincidente em crime doloso, ainda que condenado a pena
inferior a dois anos, também poderá obter o livramento condicional.
O terceiro requisito objetivo é que haja o cumprimento de mais da metade da pena se o condenado for
reincidente em crime doloso (livramento condicional ordinário); e de um terço se não for reincidente em crime
doloso e tiver bons antecedentes (livramento condicional especial). Note-se que o não reincidente em crime
doloso, mas que é portador de maus antecedentes, a nosso ver, deve cumprir somente um terço da pena, pois
o cumprimento da metade só é exigível para o reincidente em crime doloso. Diante da omissão da lei, a dúvida
deve ser resolvida em favor do condenado. Mirabete, porém, prefere a exegese mais severa, considerando a
hipótese implícita no inciso II do art. 83 do CP, exigindo o cumprimento de mais da metade da pena. Se, por
exemplo, quando da prática do primeiro delito o réu era primário e foi condenado a três anos e depois pratica

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novo delito na qualidade de reincidente em crime doloso e é condenado a quatro anos, de modo que ambas
as penas somam sete anos, para o fim de cálculo do tempo do livramento condicional, tendo em vista a teoria
da atividade, que considera o tempo do crime como sendo o momento da conduta, terá que cumprir um terço
da primeira pena e metade da segunda, totalizando quatro anos. Portanto, as penas, conquanto somadas, são
analisadas separadamente, consoante a situação do condenado ao tempo do crime.
Exige-se o cumprimento de mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo,
prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo, se o apenado
não for reincidente específico em crimes dessa natureza (livramento condicional qualificado), conforme art.
83, V, do CP, com nova redação dada pela lei 13.344/2016, que acrescentou a este rol o tráfico de pessoas. O
dispositivo em apreço trouxe à tona a antiga distinção entre reincidente genérico e específico. O reincidente
específico em crimes dessa natureza está proibido de obter o livramento condicional. Quem não é reincidente
específico, para obter o livramento condicional, precisa cumprir mais de dois terços da pena. Sobre o exato
significado da expressão “reincidente em crimes dessa natureza”, duas correntes se desenvolveram. Uma,
defendida por Scarance Fernandes, compreende nos aludidos termos todos os crimes mencionados na Lei n.
8.072/90, quais sejam, os crimes hediondos, a prática de tortura, o tráfico de entorpecentes, tráfico de pessoas
e o terrorismo. Outra, sustentada por Alberto Silva Franco, reduz o alcance da expressão, que deve abranger
apenas os crimes idênticos ou os que apresentam certas características comuns, como, por exemplo, o furto
fraudulento e o estelionato. Filiamo-nos a este segundo ponto de vista. Referentemente ao crime de tráfico de
entorpecentes, o livramento condicional só não é cabível se o agente for reincidente específico nesse crime (art.
44, parágrafo único, da lei 11.343/2.006). Os crimes hediondos e equiparados, com resultado morte, ainda que
o condenado seja primário, não admite livramento condicional (art. 112, VI, “a” e VIII, da LEP).
O último requisito objetivo é a reparação do dano causado pela infração, salvo efetiva impossibilidade
de fazê-lo. A falta de reparação do dano, a nosso ver, só é óbice para a concessão do livramento quando o réu
solvente tiver sido notificado judicialmente para o pagamento de um título líquido, certo e exigível. Antes disso,
não há mora. Se a própria vítima não o notifica, através da via judicial, para ressarcir-se do dano sofrido, não
é justo sonegar-lhe o benefício do livramento. Na prática, porém, a maioria dos condenados são insolventes e,
por isso, não reparam o dano. E a vítima, para evitar o constrangedor contato com o seu algoz, também não o
procura para fazer valer o seu direito à indenização. E assim o requisito da reparação do dano acaba sendo
“letra morta”.
Por outro lado, para obter o livramento condicional, urge ainda o preenchimento de mais cinco
requisitos subjetivos.
O primeiro é o bom comportamento durante a execução da pena. Antes da lei 13.964/2019, não se
exigia bom comportamento, mas, sim, o comportamento carcerário satisfatório. A ausência de falta disciplinar,
por si só, não preenche esse requisito. A boa conduta carcerária deve ser comprovada pelo diretor do
estabelecimento penal (§1º do art. 112 da LEP).
O segundo requisito, introduzido pela lei 13.964/2019, é o não cometimento de falta grave nos últimos
12 (doze) meses. O mero cometimento da falta grave, segundo o texto da lei, é fator inibitório do livramento
condicional, sendo flagrante a violação do princípio da presunção da inocência. Se, entretanto, sobrevier a
absolvição em processo administrativo o obstáculo desaparecerá. Convém esclarecer que a prática de falta
grave não interrompe o prazo para se obter o livramento condicional (súmula 441 do STJ). Mas, após a falta
grave, para se obter o livramento condicional, é preciso revelar bom comportamento carcerário.
O terceiro é o bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído. Se nenhum trabalho lhe foi
incumbido, devido à deficiência do presídio, fica prejudicado esse requisito.
O quarto é a aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto. A lei fala em aptidão,
isto é, capacidade para arrumar trabalho honesto. Não é exigida a proposta de emprego, mesmo porque isso
não depende apenas do condenado. Na prática, porém, costuma-se fazer tal exigência, embora descabida.
O quinto é a constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir.
Esse requisito só é exigido para os crimes dolosos, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa (p. ex.:
roubo, homicídio, estupro com violência real etc.), dispensando-o em relação aos demais crimes. O objetivo da
lei é denegar o benefício aos condenados que apresentam periculosidade, isto é, personalidade voltada para o
crime. Havendo um prognóstico de que o réu voltará a delinquir, o livramento deve ser negado. Na análise desse

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requisito costuma-se determinar, acertadamente, a realização de perícia psiquiátrica. Embora a lei não exija
exame criminológico, é de bom alvitre a sua realização, pois assim o juiz encontrará melhores subsídios para a
apreciação do fato. A propósito, dispõe a súmula 439 do STJ: “Admite-se o exame criminológico pelas
peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada”.

PROCESSAMENTO DO PEDIDO DE LIVRAMENTO

O pedido de livramento é dirigido ao juízo da execução. Pode ser formulado pelo sentenciado, cônjuge,
parente em linha reta, diretor do estabelecimento penal e pelo Conselho Penitenciário (art. 712 do CPP). Não
há necessidade de advogado. O juiz pode também conceder o benefício de ofício.
Antes de decidir, o juiz deve colher a manifestação do promotor de justice e do defensor, sob pena de
nulidade. Conforme se depreende do art. 131 da LEP, não há mais necessidade de se ouvir o diretor do
estabelecimento carcerário, estando, pois, revogado o art. 714 do CPP, mas um dos requisitos do livramento
condicional é o atestado de bom comportamento carcerário que é expedido pelo diretor do presídio (art. 112
da LEP).
Quanto à necessidade do parecer do Conselho Penitenciário, não é mais exigida, pois a lei 10.792/2003
revogou expressamente o art. 70, I, da LEP, para excluir, no livramento condicional, a manifestação do Conselho
Penitenciário. Mas o tema é polêmico, pois o art. 131 da LEP exige expressamente a manifestação do Conselho
Penitenciário. A meu ver, desde o advento da lei 10.792/2003, operou-se a revogação tácita, neste aspecto, do
citado art. 131.

LIVRAMENTO CONDICIONAL E EXECUÇÃO PROVISÓRIA

É também possível o livramento condicional antes do trânsito em julgado da condenação, desde que
não caiba mais recurso para a acusação. Pendente recurso da acusação visando aumento da pena, não será
possível a concessão do livramento condicional, salvo se o condenado já cumpriu o tempo necessário
tomando-se por parâmetro a pena máxima.

LIVRAMENTO CONDICIONAL HUMANITÁRIO

É o concedido ao condenado que é portador de alguma doença grave, ainda que ele não tenha cumprido
o tempo necessário para obtenção do benefício.
Não é previsto pelo Direito Brasileiro.

PERÍODO DE PROVA E CONDIÇÕES

No livramento condicional, o período de prova é integrado pelo restante da pena. É nesse lapso de
tempo que o liberado se submete às condições legais e judiciais.
O período de prova tem início com a audiência admonitória, também chamada de cerimônia de
concessão, realizada no estabelecimento onde está sendo cumprida a pena (art. 137 da LEP). A audiência é
presidida e marcada pelo presidente do Conselho Penitenciário ou membro por ele designado, ou, na falta,
pelo juiz (inciso I do art. 137 da LEP). Nessa audiência, a sentença será lida ao liberando, na presença dos
demais condenados. Ao término da leitura, o liberando declarará se aceita as condições. Se não as aceita, o
livramento fica sem efeito, a menos que o juiz resolva alterá-las. Ao aceitar o livramento, o liberado recebe
uma caderneta contendo a sua identificação e as condições impostas (art. 138 da LEP), e na falta dessa
caderneta lhe é entregue um salvo conduto.
O período de prova pode ser reduzido em caso de remição pelo estudo, que é também cabível no
livramento condicional. A cada 12 horas de estudo, distribuídas em pelo menos 3 (três) dias abate-se um dia
de pena. O estudo deve ser em curso regular ou profissionalizante (art. 26, §6º da LEP).
São condições legais, isto é, obrigatórias:
a) Obter ocupação lícita, dentro de prazo razoável, se for apto para o trabalho. O prazo para a comprovação

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da ocupação lícita deve ser fixado pelo juiz. A expressão “ocupação lícita” compreende também cursos técnicos,
e não apenas o trabalho. Se o liberado for deficiente físico, isto é, inapto para o trabalho, não se lhe impõe essa
condição.
b) Comunicar periodicamente ao juiz sua ocupação. É o juiz quem fixa o intervalo dessa comunicação,
que, na prática, costuma ser mensal.
c) Não mudar do território da comarca do juízo da execução sem prévia autorização deste. Note-se que
a lei não fala em mudança da residência, e, sim, da comarca.
Além dessas condições obrigatórias, previstas no §1º do art. 132 da LEP, o juiz pode fixar as seguintes
condições judiciais (§2º do art. 132 da LEP):
a) não mudar de residência sem comunicação ao juiz e à autoridade incumbida da observação cautelar
e de proteção;
b) recolher-se à habitação em hora fixada;
c) não frequentar determinados lugares.
Ainda é possível outras condições judiciais adequadas ao fato e à situação pessoal do liberado. Se o
livramento é concedido pelo tribunal, em grau de recurso, as condições, a critério do tribunal, podem ser
fixadas pelo juízo da execução, aplicando-se, por analogia, o disposto no §2º do art. 159 da Lei de Execução
Penal. Nada obsta que o juiz da execução altere de ofício as condições, ouvindo o condenado (art. 144 da LEP).

REVOGAÇÃO OBRIGATÓRIA DO LIVRAMENTO (ART. 86)

O juiz pode revogar de ofício o livramento condicional, mas o condenado sempre deve ser ouvido. A
revogação, seja ela obrigatória ou facultativa, ensejará a expedição do mandado de prisão, o período de prova
não será computado para efeito de prescrição quinquenal da reincidência e também será desconsiderado para
o fim do cômputo do prazo bienal da reabilitação penal.
São duas as causas de revogação obrigatória do livramento condicional.
A primeira ocorre quando o liberado vem a ser condenado a pena privativa de liberdade, em sentença
irrecorrível, por crime cometido durante a vigência do benefício. Nesse caso, a revogação produz três efeitos:
a) Não se computa na pena o tempo em que esteve solto.
b) Não se concederá, em relação à mesma pena, novo livramento (arts. 88 do CP e 142 da LEP). Nada
obsta que ele obtenha o livramento condicional em relação a segunda pena, desde que cumpra integralmente
o restante da primeira, pois no que respeita a esta lhe é vedado novo livramento.
c) O restante da pena cominada ao crime, em sendo o livramento revogado, não pode somar-se à nova
pena para efeito da concessão de novo livramento. Suponha-se que, na primeira condenação, a pena tenha
sido fixada em seis anos. Após cumprir um terço, isto é, dois anos, ele vem a obter o livramento com um
período de prova de quatro anos. Durante esse período ele comete novo delito, pelo qual acaba
definitivamente condenado a seis meses de reclusão. O livramento condicional é então revogado. Ele terá de
cumprir quatro anos de reclusão (restante da pena anterior) e mais seis meses da nova condenação. No tocante
à primeira condenação, não poderá obter novo livramento. E, no exemplo ministrado, o benefício não poderá
ser concedido nem em relação ao delito subsequente, pois a condenação inferior a dois anos não admite o
livramento condicional, sendo ainda vedada a soma do tempo das duas penas para a concessão de novo
livramento.
A segunda causa de revogação obrigatória ocorre se o liberado vem a ser condenado a pena privativa
de liberdade, em sentença irrecorrível, por crime anterior. Vê-se assim que a condenação irrecorrível pela
prática de crime anterior ao início do período de prova também é causa de revogação obrigatória do
livramento. Mas, nesse caso, os efeitos não são tão drásticos. Senão, vejamos: a) o período de prova é
computado como tempo de cumprimento da pena (art. 141 da LEP); b) é possível a concessão de novo
livramento, desde que o condenado tenha cumprido a metade ou um terço, conforme seja ou não reincidente
em crime doloso, da soma do tempo das duas penas (art. 141 da LEP). Suponha-se, no entanto, que ao obter
o livramento ainda lhe restassem quatro anos de reclusão. Depois de dois anos e dez meses, transita em
julgado nova condenação de um ano de prisão. O livramento é então revogado. Porém, o tempo do período
de prova transcorrido, isto é, dois anos e dez meses, é computado como pena cumprida, restando-lhe,

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portanto, apenas dois anos e dois meses — um ano e dois meses da pena anterior e um ano da nova
condenação. As duas penas podem ser somadas, possibilitando novo livramento, após o cumprimento de mais
um terço ou metade, conforme seja ou não reincidente em crime doloso. Se a lei proibisse a soma das penas,
tornar-se-ia inadmissível novo livramento, porque, isoladamente, as penas são inferiores a dois anos.
A nosso ver, há um caso em que a condenação definitiva, por crime cometido antes da vigência do
benefício, não é causa de sua revogação. Tal ocorre se, ao tempo da concessão do livramento, caso o
condenado já ostentasse essa nova condenação, ainda assim fazia “jus” ao benefício. Suponha-se, por
exemplo, que um réu primário, condenado a três anos de prisão, só venha a obter o livramento condicional,
devido à demora da justiça, após ter cumprido dois terços da pena, isto é, dois anos de prisão. Um mês após
o início do período de prova, transita em julgado nova condenação, impondo-lhe pena de seis meses de
reclusão. Note-se que a soma do total das duas penas é de três anos e seis meses. Portanto, se as duas
condenações existissem desde o início da primeira prisão, para obter o livramento, ele teria de cumprir um
terço, ou seja, um ano e dois meses. Porém, como na ocasião do livramento ele já havia cumprido tempo
superior (2 anos de reclusão), não é justo revogar o benefício.

REVOGAÇÃO FACULTATIVA (ART. 87)

Nos casos de revogação facultativa, se o juiz optar pela manutenção do livramento condicional, deverá
advertir o liberado ou agravar as condições (parágrafo único do art. 140 da LEP).
São duas as hipóteses de revogação facultativa.
A primeira ocorre quando o liberado deixa de cumprir qualquer das condições constantes da sentença.
Se o juiz optar pela revogação, os efeitos serão os seguintes: a) não se computa na pena o tempo em que o
condenado esteve solto; b) não se concederá, em relação à mesma pena, novo livramento.
A segunda ocorre se o liberado for irrecorrivelmente condenado, por crime ou contravenção, a pena que
não seja privativa da liberdade. Denota-se que, enquanto a condenação, por crime, a pena privativa de
liberdade, é causa de revogação obrigatória, a condenação, por crime ou contravenção, a pena de multa ou
restritiva de direitos, dá ensejo à revogação facultativa.
Em caso de revogação facultativa, os efeitos, na hipótese de crime, ou contravenção, cometido durante
o período de prova, são os seguintes: a) não se computa na pena o tempo em que o condenado esteve solto;
b) não se concederá, em relação à mesma pena, novo livramento.
Tratando-se, porém, de revogação facultativa por crime ou contravenção cometido antes do período de
prova, computa-se na pena o tempo em que o réu esteve solto, sendo ainda permitido novo livramento
condicional em relação ao restante da pena.
Finalmente, a condenação a pena privativa de liberdade (prisão simples), em razão da prática de
contravenção, não é causa de revogação obrigatória nem facultativa. O cochilo do legislador não pode ser
suprido pela analogia in malam partem. Há quem sustente que o benefício deve ser revogado pois o
condenado será recolhido à prisão, inviabilizando o cumprimento do livramento condicional.

SUSPENSÃO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL

Referentemente à suspensão do livramento condicional, pode ser decretada pelo juiz da execução penal,
mediante inquirição do conselho penitenciário, que expedirá então mandado de prisão, na hipótese de o agente
praticar infração penal durante o benefício (art. 145 da LEP).
Trata-se de uma medida cautelar.

PRORROGAÇÃO DO PERÍODO DE PROVA

Dá-se a prorrogação quando o liberado estiver sendo processado por crime cometido durante a vigência
do livramento. Nesse caso, enquanto não passar em julgado a sentença, o juiz não poderá declarar extinta a
pena, prorrogando-se o período de prova até o trânsito em julgado da sentença.
Trata-se de prorrogação automática, prescindindo-se de despacho judicial, conforme se depreende da

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Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP).
Aluno Olivia Oliveira Guimarães
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análise do art. 89 do CP. Entretanto, o STF já decidiu que a prorrogação não é automática, exigindo decisão
judicial expressa. O argumento é que, na suspensão do livramento condicional, é preciso que haja uma decisão
judicial, conforme art. 145 da LEP, aplicando-se este dispositivo legal à prorrogação. Este último ponto de vista,
segundo a doutrina dominante, encontra-se consagrado na Súmula 617 do STJ.
Convém observar que não se opera a prorrogação na hipótese de o réu estar sendo processado por
contravenção penal, pois não se pode fazer analogia in malam partem.
Uma vez transitada em julgado a sentença, podem ocorrer as seguintes hipóteses:
a) O réu é absolvido. Nesse caso, o livramento condicional é extinto.
b) O réu é condenado, por contravenção, a pena de prisão simples. Nesse caso, o livramento condicional
também é extinto.
c) O réu é condenado a pena privativa de liberdade por crime cometido antes ou durante a vigência do
livramento. Nesse caso o livramento é obrigatoriamente revogado.
d) O réu é condenado, por crime ou contravenção, a pena que não seja privativa de liberdade. Nesse
caso, o juiz pode revogar o livramento ou então extinguir a pena.
Durante o período da prorrogação, desde é claro que já se tenha exaurido o período de prova normal, não
subsistem as condições do livramento condicional. Por último, não se opera a prorrogação se o réu estiver sendo
processado por crime cometido antes da vigência do livramento.

A Súmula 617 do STJ e a prorrogação não automática do livramento condicional

Dispõe a súmula 617 do STJ:


“A ausência de suspensão ou revogação do livramento condicional antes do término do período de
prova enseja a extinção da punibilidade pelo integral cumprimento da pena.”
Numa interpretação literal, esta súmula pouco esclarece, a não ser o óbvio.
Com efeito, tanto a revogação quanto a suspensão do livramento condicional exigem decisão judicial,
pois não se operam automaticamente.
Nesse aspecto, a súmula era desnecessária, pois sempre se entendeu que, expirado o período de prova,
sem revogação ou suspensão do livramento condicional, haveria a extinção da punibilidade. Nunca houve
qualquer questionamento sobre isso.
Na verdade, a redação correta para a aludida súmula deveria ser a seguinte:
“A ausência de suspensão ou prorrogação do livramento condicional antes do término do período de
prova enseja a extinção da punibilidade pelo integral cumprimento da pena.”
Há, de fato, um erro material na referida súmula, que inseriu a palavra revogação quando o correto
seria prorrogação.
De qualquer maneira, consagrou-se, ainda que implicitamente, o entendimento que repele a ideia de
prorrogação automática do livramento condicional. É esta a exegese esperada, sob pena de a sobredita súmula
revelar-se inócua.

Distinção entre suspensão e prorrogação do livramento condicional

A suspensão é a cessação temporária do livramento condicional. Depende de decisão judicial, pois o


livramento condicional nunca se suspende automaticamente. A causa de suspensão é a prática de novo crime,
durante o período de prova do livramento condicional. O efeito da suspensão é a expedição do mandado de
prisão.
A prorrogação, por sua vez, é o prolongamento do período de prova do livramento condicional. Há
discussão doutrinária se a prorrogação seria automática ou se dependeria de decisão judicial. A causa da
prorrogação é o fato de o agente ser processado por crime praticado durante o período de prova do livramento
condicional. Não basta, destarte, para a prorrogação, a prática de novo crime, sendo necessária a instauração
de processo, ou seja, o recebimento da denúncia ou queixa. O efeito da prorrogação não é a cessação
temporária do livramento condicional, mas, sim, a sua manutenção além do período de prova inicialmente
determinado.

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EXTINÇÃO DA PENA

Expirado o prazo do livramento sem revogação, suspensão ou prorrogação, considera-se extinta a pena
privativa de liberdade.
É meramente declaratória a decisão que decreta a extinção da pena; logo, sua eficácia é ex tunc,
retroagindo ao término do período de prova. Antes de decretar a extinção, o juiz deve ouvir o Ministério
Público. Não haverá prorrogação se, após o término do período de prova, o réu vier a ser processado por outro
crime.

LIVRAMENTO CONDICIONAL EM FAVOR DE ESTRANGEIRO

Ao estrangeiro residente no Brasil aplica-se o princípio da isonomia (CF, art. 5º, caput). Pode, assim,
obter o livramento condi-cional, a menos que por decreto do Presidente da República tenha sido determinada
a sua expulsão, após regular processo administrativo.
Já o estrangeiro que está apenas de passagem pelo Brasil, isto é, em caráter temporário, não pode obter
sursis nem livramento condicional, porque está proibido de exercer atividade honesta e remunerada, condição
obrigatória do livramento.

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