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Curso: Direito Penal – Leis Penais Especiais

Aula: Análise dos Aspectos Gerais da Lei 9.455/97. Análise da


Prescritibilidade do Crime de Tortura.
Professor: Edézio Ramos

Resumo

Crime de tortura:

Trata-se de crime praticado com violência ou grave ameaça à pessoa, de modo que a progressão de regime
(com 1/8 de pena) não é cabível a tal hipótese.

Esclarece-se apenas que, quanto ao crime de tortura praticado por omissão, há divergência se será possível
ou não a progressão de regime (com 1/8 de pena).

Lei de tortura (nº 9.455/97) e implicações no ECA (nº 8.069/90): antes da Lei nº 9.455/97, o único
dispositivo, da legislação infraconstitucional brasileira, que tratava do tema tortura, era o art. 233, do ECA
(Lei nº 8.069/90).

Com o advento da Lei 9.455/97, o art. 233, do ECA foi revogado expressamente. Desta feita, atualmente, a
única legislação brasileira a tratar do tema tortura, ainda que verse sobre criança e adolescente, é a Lei nº
9.455/97.

ANTES DA LEI nº 9.455/97:


ECA, Art. 233. Submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a tortura: (Revogado pela Lei
nº 9.455, de 7.4.1997)

Pena - reclusão de um a cinco anos. (Revogado pela Lei nº 9.455, de 7.4.1997)

§ 1º Se resultar lesão corporal grave: (Revogado pela Lei nº 9.455, de 7.4.1997)

Pena - reclusão de dois a oito anos. (Revogado pela Lei nº 9.455, de 7.4.1997)

§ 2º Se resultar lesão corporal gravíssima: (Revogado pela Lei nº 9.455, de 7.4.1997)

Pena - reclusão de quatro a doze anos. (Revogado pela Lei nº 9.455, de 7.4.1997)

§ 3º Se resultar morte: (Revogado pela Lei nº 9.455, de 7.4.1997)

Pena - reclusão de quinze a trinta anos. (Revogado pela Lei nº 9.455, de 7.4.1997)

Crime de tortura é classificado, em regra, como crime comum: o Brasil é signatário de diversos Tratados
Internacionais que visam coibir a prática da tortura e de tratamentos degradantes em face do indivíduo.

Estes Tratados Internacionais reputam o crime de tortura como crime próprio, de modo que consiste em
crime praticado por funcionário público.

Seguindo as diretrizes traçadas pelos Tratados Internacionais, o Brasil instituiu a Lei nº 9.455/97, reputando,
contudo, a tortura enquanto crime comum, não se exigindo, em regra, nenhuma qualidade especial do

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sujeito ativo para a prática da tortura. Dito isto, como regra, no Brasil, não se exige do sujeito ativo qualidade
especial, por tratar-se de crime comum.

Eventual questão de prova: o crime de tortura, seguindo as diretrizes estabelecidas em Tratados


Internacionais, é considerado crime próprio? Resposta: Não, pois, conforme exposto anteriormente,
inobstante signatário dos Tratados Internacionais, o Brasil, por meio da Lei de tortura (nº 9.455/97),
considera o crime de tortura, em regra, como crime comum.

Crime de tortura e sua prescritibilidade: o crime de tortura, nos termos do art. 5º, XLIII, da CF, é considerado
como inafiançável e insuscetível de graça ou anistia, apenas.

Com isso, a Constituição Federal não veicula a tortura enquanto crime imprescritível (tal característica se
aplica, nos termos constitucionais, aos crimes de racismo e de ação de grupos armados, civis ou militares,
contra a ordem constitucional e o Estado Democrático, nos termos do art. 5º, XLIV, da CF).
CF, Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os
mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem; (Regulamento)

XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem
constitucional e o Estado Democrático;

Ocorre que, nos Tratados Internacionais dos quais o Brasil é signatário, há previsão do crime de tortura
enquanto crime imprescritível.

Há, portanto, antinomia entre a Constituição Federal e os Tratados Internacionais.

Para fins de prova, inclusive de primeira fase, deve o crime de tortura ser considerado como prescritível, em
razão da previsão constitucional (prevalece, portanto, o entendimento da Constituição Federal em
detrimento do Tratado Internacional).

No que tange à ação de reparação de danos (ação indenizatória), ajuizada em decorrência de tortura
praticada, por exemplo, no regime militar, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), decidiu que esta ação
indenizatória é imprescritível, porque se fundamenta nos direitos da personalidade (exteriorização da
dignidade da pessoa humana).
STJ: Este Superior Tribunal de Justiça tem entendimento no sentido de que "a prescrição quinquenal, disposta no art.
1º do Decreto 20.910/1932, é inaplicável aos danos decorrentes de violação de direitos fundamentais, que são
imprescritíveis, principalmente quando ocorreram durante o Regime Militar, época na qual os jurisdicionados não
podiam deduzir a contento suas pretensões" (AgInt no REsp 1.648.124/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda
Turma, julgado em 5/6/2018, DJe 23/11/2018 ).

Crime de tortura enquanto mandado de criminalização:

A Lei de tortura (nº 9.455/97) é, ainda, fruto de um mandado de criminalização penal, ou seja, de uma
determinação extraída diretamente do texto constitucional. O Poder Constituinte Originário (PCO) determina
ao Poder Legislativo a criação do crime de tortura.
CF, Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:

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XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os
mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem; (Regulamento)

Noções introdutórias do caput do art. Art. 1º, da Lei nº 9.455/97:

Constranger significa subjugar.

O crime de tortura não se mensura pelo nível de sofrimento infligido à vítima. É possível aplicar um
sofrimento consideravelmente alto e tal ato não caracterizar tortura, a título de exemplo.
Lei nº 9.455/97, Art. 1º Constitui crime de tortura:

I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:

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Curso: Direito Penal – Leis Penais Especiais

Aula: Análise da Tortura Crime e da Tortura Prova.


Professor: Edézio Ramos

Resumo

Lei nº 9.455/97, Art. 1º Constitui crime de tortura:

I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:

a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa;

b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;

c) em razão de discriminação racial ou religiosa;

Sujeito ativo:

Trata-se de crime comum. Desta feita, qualquer pessoa pode cometer este crime.

Sujeito passivo:

Trata-se, igualmente, de crime comum. Desta feita, qualquer pessoa pode cometer este crime.

Conduta punível:

Qualquer pessoa irá constranger, com emprego de violência ou de grave ameaça, a vítima, que pode ser,
igualmente, qualquer pessoa, com o fim de (finalidade específica) obter situação específica, qual seja:

1) Tortura prova ou tortura confissão – para fins de obter declaração, informação ou confissão da vítima
(art. 1º, inciso I, alínea “a”, da Lei de Tortura).

Exemplo: policial que submete (constrange) o preso, mediante violência ou grave ameaça, para que confesse
a autoria do crime.

Exemplo: homem que submete (constrange) namorada, mediante violência ou grave ameaça, para que
confesse o nome do amante.

Observação: trata-se de crime comum, de modo que pode ser praticado por qualquer pessoa e contra
qualquer pessoa.

Consumação:

A consumação se dá, não com a obtenção da declaração, informação ou confissão da vítima, mas com o
constrangimento causador do sofrimento na vítima (com o constrangimento, mediante violência ou grave
ameaça).

Segundo a doutrina, é perfeitamente possível a tentativa deste crime. Tal tese é admitida pela banca CESPE.

2) Tortura crime – para fins de provocar ação ou omissão de natureza criminosa (art. 1º, inciso II, alínea “b”,
da Lei de Tortura).

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Exemplo: sujeito ativo constrange a vítima, mediante violência ou grave ameaça (choques elétricos, por
exemplo), para que pegue uma arma e atire em determinada pessoa (determinar que a vítima pratique, no
caso, uma ação de natureza criminosa).

Exemplo: sujeito ativo constrange a vítima, mediante violência ou grave ameaça (choques elétricos, por
exemplo), para que pratique uma contravenção em benefício do sujeito ativo. Nesta hipótese, não haverá
tortura, já que o dispositivo menção faz expressa menção à natureza criminosa (ou seja, expressa menção ao
crime).

A inclusão da contravenção, na interpretação do dispositivo legal, é vedada, sob pena de caracterizar a


analogia in malam partem (que é vedada).

Responsabilização do torturado e torturador:

O torturado, que praticará o crime sob determinação do torturador, não comete crime.

Se eventualmente ceder às determinações do torturador e vier a praticar o crime, não responderá por este,
já que estará agindo sob coação moral irresistível, que exclui a culpabilidade.

Já o torturador responderá pelo crime de tortura (art. 1º, inciso I, alínea “b”, da Lei de Tortura) e pelo crime
eventualmente praticado pelo torturado, em concurso material. O torturador é considerado, pois, como
sujeito ativo mediato (aquele que se vale de interposta pessoa para praticar o crime).

Consumação:

A consumação se dá, não com a prática de ação ou omissão de natureza criminosa pelo torturado, mas com o
constrangimento.

Questionamento: o torturador necessariamente responderá pelo crime de tortura e pelo crime exigido pelo
torturar? Resposta: Não necessariamente, porque pode ser que o torturado, inobstante o constrangimento,
não venha a praticar crime algum. Nessa hipótese, o torturador responderá apenas pelo crime de tortura.

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Curso: Direito Penal – Leis Penais Especiais

Aula: Análise da Tortura Discriminatória. Análise das Modalidades de


Tortura Previstas no Inciso I do Art. 1 como Crimes Formais e como
Crimes de Tendências.
Professor: Edézio Ramos

Resumo

Dar-se-á continuidade aos temas tratados no bloco anterior.


Lei nº 9.455/97, Art. 1º Constitui crime de tortura:

I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:

a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa;

b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;

c) em razão de discriminação racial ou religiosa;

3) Tortura discriminatória ou tortura por preconceito – em razão de discriminação racial ou religiosa (art. 1º,
inciso I, alínea “c”, da Lei de Tortura).

Exemplo: individuo constrange a vítima, mediante violência ou grave ameaça, em razão de discriminação
relativa à orientação sexual, à classe econômica etc. Nestas hipóteses, não restará caracterizado o crime de
tortura discriminatória, haja vista que o tipo penal faz menção expressa, apenas, a preconceito de raça ou de
religião.

Exemplo: indivíduo constrange a vítima, mediante violência ou grave ameaça, em razão de discriminação em
razão de ser pessoa negra. Ou então, em razão de ser pessoa evangélica. Nestas hipóteses, restará
caracterizado o crime de tortura discriminatória, pois a discriminação por raça e por religião está
expressamente prevista no dispositivo legal.

Veja-se que, na hipótese do art. 1º, inciso I, alínea “c”, da Lei de Tortura, o autor não tem uma pretensão
específica, não esperando, por parte da vítima, a prática de determinado comportamento (tal como previsto
no art. 1º, inciso I, alíneas “a” e “b”, da referida Lei).

Conclui-se que, no art. 1º, inciso I, alíneas “a”, “b” e “c”, da Lei de Tortura, há a previsão de três espécies de
crime de tortura formais (é dispensada, para a consumação, o fim almejado), e de tendência/intenção (a
vítima é constrangida por violência ou grave ameaça com a intenção de), dentre as quais tortura prova (ou
tortura confissão), tortura crime e tortura discriminatória (ou tortura por preconceito).

Por se tratar de crime formal, caso o fim almejado seja realizado, haverá mero exaurimento do crime de
tortura.

Por se tratar de crime de tendência/intenção, além do dolo genérico, deve ser necessário o preenchimento
do especial fim de agir (o dolo genérico é constranger + especial fim de agir).

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Este especial fim de agir poderá ser a obtenção de informação, declaração ou confissão (alínea “a”), poderá
ser a determinação para que a vítima provoque ação ou omissão de natureza criminosa (alínea “b”) ou
poderá ser agir com fins discriminatórios, em razão de raça ou de religião (alínea “c”).

Exemplo: indivíduo constrange a vítima, mediante violência ou grave ameaça, sem especial fim de agir. Não
caracterizará o crime de tortura, nas modalidades do art. 1º, inciso I, alíneas “a”, “b” ou “c”, em razão da
ausência do especial fim de agir (relembrando que o crime de tortura, em suas modalidades previstas nos
referidos dispositivos legais, é de tendência).

Questão provável de prova: o crime de tortura prova, tortura crime e tortura discriminatória exige, tão
somente, dolo genérico. Resposta: a assertiva está incorreta, porque, conforme exposto anteriormente, é
imprescindível, para além do dolo genérico, a presença do especial fim de agir.

Com isso, para a caracterização do crime de tortura, previsto no art. 1º, inciso I, alíneas “a”, “b” e “c”, da Lei
de Tortura, é necessária a conjugação do dolo genérico + especial fim de agir.

Outros tipos penais que exigem o especial fim de agir, para sua caracterização:

Exemplo: indivíduo discute com a vizinha. Em razão disso, levanta seu vestido, para expô-la e humilhá-la.
Praticou-se ato de libidinagem. Contudo, não caracterizará art. 215-A, do CP, pois não houve o especial fim
de agir, qual seja o de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro.
Importunação sexual (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)

CP, Art. 215-A. Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria
lascívia ou a de terceiro: (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018)

Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o ato não constitui crime mais grave. (Incluído pela Lei nº 13.718, de
2018)

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Curso: Direito Penal – Leis Penais Especiais

Aula: Análise da Tortura Castigo.


Professor: Edézio Ramos

Resumo

Antes de tecer comentários acerca da tortura castigo, necessário reprisar o conceito do crime de tortura,
visto na aula anterior:
Lei nº 9.455/97, Art. 1º Constitui crime de tortura:

I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:

a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa;

b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;

c) em razão de discriminação racial ou religiosa;

De acordo com o exposto, possível concluir ser a tortura um crime comum, haja que não se exige uma
característica especial em relação ao sujeito ativo, tampouco em relação ao sujeito passivo.
Lei nº 9.455/97, Art. 1º Constitui crime de tortura:

II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso
sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.

Pena - reclusão, de dois a oito anos.

O dispositivo penal supracitado é denominado de tortura castigo.

É a única modalidade de tortura em que a Lei exigiu o adjetivo “intenso”. Vê-se que, à exceção da tortura
castigo, as demais modalidades de tortura, para fins de enquadramento penal, não exigem o adjetivo
“intenso”, mas apenas a submissão da vítima à violência ou grave ameaça a sofrimento físico ou mental.

Sujeito ativo da tortura castigo:

Trata-se de crime próprio, ou seja, o sujeito ativo é uma pessoa específica, qual seja aquele que detém a
vítima sob a sua guarda, poder ou autoridade.

Sujeito passivo da tortura castigo:

Trata-se de crime próprio, ou seja, o sujeito passivo é uma pessoa específica, qual seja, a vítima que é
submetida a guarda, poder ou autoridade.

Conclusão:

A tortura castigo pode ser classificada como crime bipróprio, vez que reúne uma qualidade especial em
relação ao sujeito ativo e passivo. Dessa forma, vê-que não se trata de crime funcional, ou seja, praticado por
funcionário público contra a Administração Pública.

Esquema da característica biprópria do crime de tortura castigo:

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Sujeito ativo
Sujeito passivo
próprio (detém
próprio (é
a vítima sob a
submetida a Crime bi próprio
sua guarda,
guarda, poder
poder ou
ou autoridade)
autoridade)

Pergunta:

Segundo a Lei de Tortura, configura crime de tortura ou tortura prova ou discriminatória, caso o sujeito
infligir na vítima um intenso sofrimento físico ou mental?

Resposta: Não, vez que não se exige o adjetivo “intenso” como elemento do tipo penal.

Recapitulando: Qualquer pessoa poderá ser sujeito ativo ou passivo, em se tratando do crime de tortura
castigo? Não, tendo em vista que se exige, tanto para o sujeito ativo e passivo, uma qualidade especial. Assim
sendo, o sujeito ativo é aquele que detém sobre a vítima sob sua guarda, poder ou autoridade, ao passo que
a vítima é aquela que se submete em razão da guarda, poder ou autoridade.

Conclusão: Os legisladores adicionaram o adjetivo “intenso” de forma intencional a esse dispositivo penal em
comento, a fim de evitar que aqueles que detêm a criança sob poder ou guarda fossem enquadrados nesse
rol.

Exemplo de tortura castigo: O pai que exerce o poder sobre o filho com o exercício de intenso sofrimento
físico, ao bater demais na criança, enquadra-se na tortura castigo.

Vejamos algumas exemplificações que não se enquadram como tortura castigo:

Ex.: O pai que ameaça o filho a ficar dois meses de castigo, causando sofrimento emocional, não se enquadra
no crime de tortura castigo, eis que ausente o adjetivo intenso.

Ex.: Babá que detém uma criança sobre sua guarda e a coloca no berço, causando-lhe sofrimento emocional
(choro), também não comete o crime de tortura castigo, vez que ausente o adjetivo intenso.

Ex.: O sujeito que constrange a vítima com violência ou grave ameaça para que ela forneça informações não
comete o crime de tortura castigo, uma vez que ausente os elementos de guarda, poder ou autoridade.
Nesse caso, para configurar o crime de tortura, basta submetê-la a sofrimento físico ou mental.

Pergunta: O crime de tortura prova, de acordo com a Lei de Tortura, exige para sua configuração que o
sujeito ativo infrinja um intenso sofrimento físico? Resposta: Não.

Diferença entre a tortura castigo e o crime de maus tratos (muito cobrada em provas):

No crime de tortura castigo, o sujeito ativo submete a vítima a um intenso sofrimento físico ou emocional
com a finalidade de aplicar um castigo.
CP, Art. 136 - Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de
educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer
sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina:

Diferentemente do crime de tortura castigo, a finalidade do crime de maus-tratos supracitado é educar,


corrigir.

Ex.: Professora que mantém guarda dos seus alunos e os castiga, trata-se de um exemplo de tortura castigo.

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Ex.: Em outro cenário, caso essa professora, que nunca havia visto certa criança antes, causar um intenso
sofrimento físico, com a intenção de aplicar um castigo, não restará configurado o crime de maus tratos,
visto que ausente a finalidade educativa e também não configurará tortura castigo, visto que ausente a
qualidade de guarda, poder ou autoridade. Trata-se, em verdade, de lesão corporal.

Esquema da diferença entre a tortura castigo e o crime de maus tratos:

Tortura castigo: Maus tratos:


finalidade finalidade
castigar educar

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Curso: Direito Penal – Leis Penais Especiais

Aula: Análise da Tortura Prevista no § 1,Art. 1 e da Tortura por Omissão.


Professor: Edézio Ramos

Resumo

Lei nº 9.455/97, Art. 1, §1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a
sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal.

Primeiramente, há que se destacar que, diferentemente das demais modalidades de tortura analisadas
anteriormente, no dispositivo em comento não há necessariamente a presença da violência.

Sujeito ativo:

Trata-se de crime próprio e funcional, posto que somente o funcionário público terá acesso ao preso ou
àquele sujeito a medida de segurança.

Ex.: Carcereiro, médico ou enfermeiro do manicômio judiciário.

Diferentemente da tortura castigo, nesse dispositivo não há a presença do adjetivo “intenso”.

A expressão “ato não previsto em lei” diz respeito à Lei de Execução Penal, que prevê as penas.

Ex.: Carcereiro,
médico ou
Crime próprio Crime funcional
enfermeiro do
manicômio judiciário

Tortura por omissão ou tortura imprópria:


Lei nº 9.455/97, § 2º Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las,
incorre na pena de detenção de um a quatro anos.

Observação.: A tortura por omissão não é um crime equiparado a hediondo. A progressão de regime começa
com 16%.

Observação.: Esse tipo penal consiste em um crime omissivo próprio. Diante disso, nota-se que esse
dispositivo em comento não deve ser analisado à luz do artigo 13, §2º, Código Penal, o qual faz uma
correlação entre o agente garantidor e os crimes omissivos impróprios.
Relevância da omissão (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

CP, Art. 13, § 2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O
dever de agir incumbe a quem:(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado. (Incluído pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984)

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Sujeito ativo: É crime próprio, pois exige uma característica específica do sujeito ativo, qual seja, ser o agente
garantidor. No mais, há que se ressaltar que, conforme a atitude a ser tomada no caso concreto, os sujeitos
serão distintos. Veja-se:

Sujeitos que devem evitar a tortura: Delegado de polícia, agente da autoridade, pai ou a mãe. Não configura
crime funcional, em razão da figura do genitor.

Sujeitos que devem apurar a tortura: Delegado de polícia. Trata-se de crime funcional.

Questões para fixação:

O crime de tortura por omissão somente pode ser cometido por funcionário público? Não. Veja-se a figura
dos genitores que têm o dever de evitar a tortura de seus filhos.

O crime de tortura por omissão pode ser cometido por funcionário público? Sim, em se tratando
especificamente da modalidade sujeitos que devem apurar a tortura.

Núcleo do verbo Não é crime


"evitar" funcional
Tortura por
omissão ou
tortura imprópria
Núcleo do verbo
É crime funcional
"apurar"

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Curso: Direito Penal – Leis Penais Especiais

Aula: Análise das Qualificadoras da Tortura. Análise das Causas de


Aumento de Pena no Crime de Tortura. Análise dos Efeitos Extra Penais
da Condenação pelo Crime de Tortura.
Professor: Edézio Ramos

Resumo

Primeiramente, necessário ressaltar que a pena mínima da tortura prescrita no art. 1º, §2º, da Lei nº
9.455/97 é de um ano, cabível, pois a aplicação do art. 89, Lei 9.099/95, que traz a suspensão condicional do
processo, um dos institutos despenalizadores.
Lei nº 9.455/97, Art. 1º Constitui crime de tortura:

§ 2º Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na pena de
detenção de um a quatro anos.

Lei nº 9.099/ 95, Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou
não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a
quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime,
presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal).

Qualificadoras do crime de tortura (art. 1º, §3º, da Lei nº 9.455/97):

a) Tortura qualificada pela lesão corporal grave ou gravíssima.

b) Tortura qualificada pela morte.

Exemplo.: a intenção do sujeito ativo é torturar a vítima, havendo a morte preterdolosa.

Observação.: Não confundir a tortura qualificada pela morte (art. 1º, §3º, Lei nº 9.455/97) com a morte
qualificada pela tortura (art. 121, §2º, III, CP). O que difere ambas é o dolo do agente. No primeiro caso, a
intenção é torturar a vítima, ocorrendo a morte de forma culposa. Por outro lado, na segunda hipótese, a
intenção é matar a vítima utilizando-se da tortura.
Lei nº 9.455/97, Art. 1º, § 3º Se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena é de reclusão de
quatro a dez anos; se resulta morte, a reclusão é de oito a dezesseis anos.

Homicídio qualificado

CP, Art. 121, § 2° Se o homicídio é cometido:

(...)

III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa
resultar perigo comum;

(...)

Pena - reclusão, de doze a trinta anos.

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Tortura

Qualificada
Qualificada
pela lesão
pela morte
corporal

Grave Gravíssima

Divergência doutrinária:

Questionamento: As qualificadoras em comento se aplicam à tortura por omissão? Com relação a esse tema,
há divergência. Majoritariamente, entende-se que essa qualificadora do art. 1º, §3º, da Lei nº 9.455/97
somente incide na tortura direta, ou seja, aos torturadores ativos. Sendo assim, não se aplicaria à tortura por
omissão.

Exemplo.: Delegado responde pela tortura por omissão e os agentes respondem pela tortura prova, além do
resultado qualificador morte.
Lei nº 9.455/97, Art. 1º § 4º Aumenta-se a pena de um sexto até um terço:

I - se o crime é cometido por agente público;

II – se o crime é cometido contra criança, gestante, portador de deficiência, adolescente ou maior de 60 (sessenta)
anos; '(Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)

III - se o crime é cometido mediante seqüestro.

Atenção: Crime de tortura praticado contra criança não é qualificadora, mas aumento de pena.

O art. 1º, §5º, da Lei nº 9.455/97 trata do efeito extrapenal ou civil da condenação com relação ao crime da
tortura.

Via de regra, segundo o parágrafo único do artigo 91, CP, a perda do cargo depende de motivação na
sentença pelo juiz, a fim de ser aplicado. Diferentemente da regra prevista no Código Penal, a Lei da Tortura
dispõe que o efeito da perda do cargo é automático, ou seja, independe de motivação pelo juiz na decisão.
No mais, a perda do cargo aplica-se para qualquer tipo de tortura, inclusive em se tratando de tortura
imprópria.

Relembrando que o efeito penal é aplicar a pena, reincidência. Por outro lado, o efeito extrapenal engloba
tornar certa a obrigação de indenizar e perda do cargo do funcionário público, por exemplo.
Lei nº 9.455/97, Art. 1º, § 5º A condenação acarretará a perda do cargo, função ou emprego público e a interdição
para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada.

Efeitos genéricos e específicos

CP, Art. 91 - São efeitos da condenação: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

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I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984)

II - a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé: (Redação dada pela Lei nº
7.209, de 11.7.1984)

a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção
constitua fato ilícito;

b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do
fato criminoso.

§ 1o Poderá ser decretada a perda de bens ou valores equivalentes ao produto ou proveito do crime quando estes
não forem encontrados ou quando se localizarem no exterior. (Incluído pela Lei nº 12.694, de 2012)

§ 2o Na hipótese do § 1o, as medidas assecuratórias previstas na legislação processual poderão abranger bens ou
valores equivalentes do investigado ou acusado para posterior decretação de perda. (Incluído pela Lei nº 12.694,
de 2012)

Esquema dos efeitos da condenação penal:

Reparar o dano

Penais

Efeitos da Reincidência
condenação
penal

Extrapenais Perda do cargo

Lei nº 9.455/97, Art. 1º, § 6º O crime de tortura é inafiançável e insuscetível de graça ou anistia.

Quanto à característica inafiançável do crime de tortura, significa que não se admite liberdade provisória
mediante fiança.
Lei nº 9.455/97, Art. 1º, § 7º O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a hipótese do § 2º, iniciará o
cumprimento da pena em regime fechado.

O condenado pela prática de crime de tortura, salvo na tortura imprópria, iniciará o cumprimento da pena
em regime fechado.
STF, Informativo 789: É constitucional o início de regime fechado para aqueles que cometem tortura. Não há violação
do princípio da individualização da pena, em razão da gravidade excessiva desse crime. Sendo assim, o juiz não
poderá fixar o regime inicial aberto ou semi-aberto.

Lei nº 8.072/90, Art. 2º Os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o
terrorismo são insuscetíveis de:
o
§ 1 A pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime fechado. (Redação dada pela Lei nº
11.464, de 2007)

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Vê-se que a Lei dos crimes hediondos também prevê início de regime fechado. Ocorre que o Supremo
Tribunal Federal (STF) declarou esse dispositivo inconstitucional, por violar o princípio da individualização da
pena. Sendo assim, o juiz poderá fixar o regime inicial aberto ou semi-aberto.
Teses de Repercussão Geral: É inconstitucional a fixação ex lege, com base no art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/1990, do
regime inicial fechado, devendo o julgador, quando da condenação, ater-se aos parâmetros previstos no artigo 33 do
Código Penal. [Tese definida no ARE 1.052.700 RG, rel. min. Edson Fachin, P, j. 2-11-2017, DJE 18 de 1º-2-2018, Tema
972.]

Questão de prova: Caso uma questão dessa seja cobrada em prova, atentar se se trata de tortura ou crime
hediondo. Relembrar: Para fins de tortura, o início de cumprimento de pena é constitucional, enquanto para
os crimes hediondos ou equiparados a hediondos é inconstitucional.

Esquema da constitucionalidade ou inconstitucionalidade para fins de início de cumprimento de pena:

Para os crimes hediondos e


Salvo a tortura por omissão, equiparados, o STF
é constitucional o regime estabeleceu que é
inicial fechado inconstitucional o regime
inicial fechado

Lei nº 9.455/07, Art. 2º O disposto nesta Lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido cometido em território
nacional, sendo a vítima brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira.

Trata-se de situação de extraterritorialidade. À tortura praticada fora do Brasil, será aplicada a Lei da Tortura.

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